View
217
Download
0
Embed Size (px)
DESCRIPTION
Galeria Estação | Exposição NINO | Curadoria André Parente | De 15 de março a 30 de abril de 2016
NIN
O G
ALERIA
ESTA
O
2016
NINO CURADORIA ANDR PARENTE
Frames do Video Nino Direo Andr Parente1980, 28 min Edio Lucas ParenteDigitalizao e tratamento de imagem Video ShackProduo + 2 Produes Culturais
abertura 15 de maro 19 h
NINO
curadoria Andr Parente
So Paulo 2016
Sem ttulo, 1997Escultura em madeira94 x 80 x 20 cm
2
3NINO Vilma Eid
Iniciamos o ano de 2016 com grandes responsabilidades.
A primeira delas que, aps termos recebido o ttulo de Melhor galeria de arte em
2015, no podemos deixar a peteca cair.
Se merecemos essa honraria, que nos foi conferida por um jri indicado pelo
Guia da Folha de S.Paulo, foi graas ao empenho de uma equipe apaixonada e com-
prometida com as diretrizes traadas h doze anos, quando abrimos a Galeria Esta-
o. Aos nossos artistas e ao pblico que nos prestigia e acredita no nosso trabalho,
muito obrigada.
O que eu chamaria de segunda grande responsabilidade abrir o ano com a expo-
sio do escultor cearense de Juazeiro do Norte Joo Cosmo Felix, mais conhecido
como Nino.
Eu o conheci no incio dos anos 90, e foi amor primeira vista pelo homem e pela
obra. De uma humildade e suavidade tocantes, suas esculturas liberam toda a sua
virtuosidade interior. Estrela de primeira grandeza no cenrio artstico brasileiro e
internacional, Nino faleceu em 2002, deixando-nos, felizmente, trabalhos tocantes
e fortes, histrias e personagens do seu cotidiano.
4Eu no resisto s suas esculturas. Passei a compr-las, primeiramente dele e, de-
pois, de colecionadores, leiles, galerias e em todos os lugares onde elas estivessem
disponveis. A Galeria Estao conseguiu reunir um belo acervo e agora chegou o
momento de mostrar essas obras. Quem sabe a partir daqui elas passaro a morar
em outras casas.
Germana Monte-Mr me contou que o Andr Parente, artista, conheceu o Nino
e tinha horas de gravao com ele. Por isso o convite para ele curar a mostra foi um
processo natural. Andr editou trinta minutos desse material indito, que exibimos
na exposio.
Nino, foi um privilgio conhec-lo e sua obra.
Obrigada.
5
6Sem ttulo, 2014Acrlico sobre tela50 x 40 cm
Sem ttulo, sem dataEscultura em madeira140 x 33 x 33 cm
7NINO Andr Parente
Viver de graa mais barato.
Joo Guimares Rosa
Na casa de meus pais, convivemos desde cedo com obras de artistas populares como
Mestre Noza, Nino, Cia do barro cru e Atade, e ao mesmo tempo com artistas como
Antonio Bandeira, Aldemir Martins (gravuras abstratas dos anos 1950), Helio Rola,
Aderson Medeiros, entre muitos outros. Como meu amigo Ben Fonteles em seu be-
lssimo livro Nem erudito, nem popular,1 considero que um dos pontos altos da arte
e da cultura brasileiras o hibridismo entre o popular e a alta cultura na obra de ar-
tistas como Caetano Veloso, Hlio Oiticica, Joo Guimares Rosa, Hermeto Pascoal,
Glauber Rocha, Mrio de Andrade, Villa-Lobos, Alfredo Volpi, s para citar alguns
dos meus artistas preferidos.
Quando cheguei pela primeira vez casa de Nino, em Juazeiro do Norte, em
fevereiro de 1980, ele estava acocorado defronte da casa, com a camisa semiaberta e
o chapu de feltro. Deviam ser umas 4 horas da tarde e o calor escaldante comeava
a diminuir. Quando atravessei a rua ele se levantou, apertou a minha mo e disse:
Estou lhe esperando desde ontem, o Aderson2 me mandou um recado. A mulher
dele, Perptua, apareceu e me ofereceu gua e um banco.
Nino, apelido de Joo Cosmo Flix, nasceu em torno de 1920, em Juazeiro do
Norte, onde veio a falecer, em 2002, em decorrncia de problemas pulmonares. Nino
8morou praticamente toda a vida de adulto na rua General Sampaio, em um bairro po-
pular. Foi casado duas vezes, sendo sua segunda esposa Perptua Ceclia da Concei-
o, ela tambm artista. Em comparao com o carter quase calado e ensimesmado
de Nino, Perptua era mais expansiva e gostava de uma prosa. Nas diversas vezes que
os visitei, em 1980, Perptua no parava de interferir em nossas conversas. Durante
as mais de trs horas de gravaes de vdeo que fiz na casa de Nino, a voz de Perptua
ouvida ao fundo, como se ela tivesse uma necessidade premente de se fazer ouvir,
de aparecer, de participar da conversa, de dar sua opinio.
Como a maioria dos artistas populares da regio do Cariri, um dos maiores ce-
leiros da arte popular brasileira, Nino teve outras profisses antes de se dedicar
escultura que o tornou conhecido, entre elas a de cortador de cana e a de ferreiro.
Tendo percebido que esses trabalhos no podiam garantir seu sustento, resolveu
tentar a sorte fazendo bonecos de madeira e lata, em particular carrinhos e maca-
cos. A princpio ele age como um arteso que aceita encomendas, como a de fazer
ex-votos e algumas figuras das festas folclricas, os Mateus dos reisados, sem ainda
possuir um estilo e um repertrio prprio. Pouco a pouco, nos anos 1970, Nino j se
destacava como um artista que possua um estilo inconfundvel, e com o tempo veio
a conquistar entre seus pares, e em funo do sucesso que seu trabalho adquiriu nas
lojas, galerias e colecionadores de arte popular, o status de mestre.
A obra de Nino se diferencia facilmente pelo material empregado (madeira e tinta),
bem como pelo estilo do escultor, ou seja, pelas formas e cores. Geralmente, seu univer-
so no tem nada a ver com o universo religioso e mtico. Trata-se, no mais das vezes, de
homens e animais, que, exceo do elefante, so parte do universo nordestino: crian-
as, mulheres, Mateus, soldados, cangaceiros, caadores, vaqueiros, policiais; e animais
como macacos, pssaros, peixes, cavalos, cachorros, onas, cobras, jacars e elefantes.
Nino em geral usa as madeiras da regio, imburana ou umburana de cambo e
aroeira (muito raramente timbaba). As madeiras so algumas vezes tratadas com
gs, depois de cortadas, para matar o cupim. Mas o gs utilizado no previne a pra-
ga. O artista usa poucas ferramentas para esculpir. Em geral ele costuma desbastar
o tronco com um faco e uma machadinha. Para finalizar, apenas s vezes utiliza o
formo e a goiva. As formas empregadas por Nino so simples, e podem ser classi-
ficadas em dois tipos principais: no primeiro tipo, as peas ganham a forma de um
homem ou de um animal esculpido: um Mateus, um menino, uma mulher, uma ca-
bea, um macaco, um elefante. Enfim, neste caso, a obra representa uma nica figu-
ra, e se diferencia da dos demais artistas pela forma um tanto inclinada ou curva da
madeira, j que ele aproveita ao mximo a forma do tronco, e fazendo o mnimo de
intervenes possveis, ou pelo emprego das cores. Nino costuma usar certas com-
binaes de cores vibrantes. Poucas cores definindo certas reas. Mas muitas vezes,
sobre essas cores, ele d umas pinceladas com preto e branco, criando uma textura
sobre a cor, como se a cor tivesse sofrido um desgaste.
O segundo tipo de escultura realizado por Nino absolutamente original. Neste
caso, ele mantm o toco sem grandes intervenes em termos de entalhe. Ele
mestre em vislumbrar em um tronco, no qual s vezes so preservados os galhos, um
conjunto de figuras, e toda uma situao de relao entre elas. Muitas vezes a parte
de cima contm uma figura maior, e na parte de baixo so delineadas, em baixo-rele-
vo, figuras que compem um conjunto e uma narrativa. Poderia ser o contrrio. Mas,
em geral, o que est embaixo est em baixo-relevo, ao contrrio da tridimensionali-
dade da forma da figura de cima. O uso da cor (ele usa tanto cores primrias como
secundrias), a mistura entre figuras tridimensionais e figuras em baixo-relevo ou
mesmo desenhadas, a relao, narrativa ou no, que se tece entre as figuras, que
10
Sem ttulo, sem dataEscultura em madeira98,5 x 29 x 23 cm
11
demanda muitas vezes do espectador que ele circunde a pea para ter uma viso do
todo, fazem com que as esculturas de Nino possuam um estilo inconfundvel.
Nem sempre a narrativa clara para quem no est familiarizado com o universo
do artista. Sem dvida Nino tem explicaes para todas as suas peas. Ele um ar-
tista sujeito a muitas fabulaes. Uma vez entrando em seu vocabulrio, percebemos
que h uma rede de relaes interligando as diversas figuras da pea como um todo.
Pode se tratar de uma caada, e ao mesmo tempo uma caada que est sob o controle
de um policial que persegue ou observa o caador. Pode ser uma brincadeira de rei-
sado, pode ser algo que diz respeito relao dos homens com os animais, pode ser
algo que apela para a associao livre entre as figuras.
Tanto para as esculturas do primeiro como para as do segundo tipo, Nino tem
uma explicao muito simples, que costuma ser reproduzida aqui e ali de formas dis-
tintas. Segundo Nino, o tronco de madeira j carrega em si, como que virtualmente,
as figuras que dele o artista pode extrair. Todos os comentadores da obra de Nino
destacaram isso, que o artista repete sem cessar. Mas quem exprimiu a ideia de Nino
do modo mais simples e
Recommended
View more >