28
Pesquisa e planejamento educacional nos anos 1960 em Santa Catarina: desenho de um projeto escolar meritocrático Maria das Dores Daros Ione Ribeiro Valle Marilândes Mól Ribeiro de Melo Resumo Estudos têm mostrado que a educação brasileira, desde a década de 1930, foi alvo de disputas e objeto de diferentes interesses, o que impulsionou alguns grupos a buscarem status científico para a definição de suas propostas educacionais. Nesse quadro de referência se inscrevem as primeiras pesquisas realizadas pelo Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE), que diagnosticaram a situação do Estado catarinense visando oferecer subsídios à reforma educacional e possibilitar a solução de problemas que vinham se acumulando ao longo dos tempos. O presente estudo analisa aspectos que fundam um projeto escolar meritocrático a partir das pesquisas e publicações do CEPE, as quais expressam as apostas no planejamento educacional em Santa Catarina. Tais apostas buscaram orientação de organismos internacionais, como a UNESCO, objetivando organizar o sistema estadual de ensino. Para entender o perfil meritocrático da educação desenhado na década de 1960, inspiramo-nos em estudos sociológicos contemporâneos com foco na meritocracia escolar, visando compreender intenções implícitas e explícitas nos estudos educacionais realizados por esse organismo de pesquisa. Palavras-Chave: Pesquisa Educacional. Planejamento Educacional. Meritocracia escolar. Educational research and planning in the 1960’s in Santa Catarina, Brazil: a meritocratic school project picture Abstract Studies show that education in Brazil since the 1930s has been subject of disputes and different interests which has spurred scientific status seeking groups for the definition of educational proposals. Within this framework lie the first surveys conducted by the Center for Educational Research and Studies (CEPE) who analyzed the situation in the state of Santa Catarina, Brazil with efforts to implement education reform and to solve problems

2161-2962-1-PB

Embed Size (px)

DESCRIPTION

maria das dores daros

Citation preview

  • Pesquisa e planejamento educacional nos anos 1960 em Santa Catarina: desenho de um projeto escolar

    meritocrtico

    Maria das Dores Daros Ione Ribeiro Valle

    Marilndes Ml Ribeiro de Melo

    Resumo Estudos tm mostrado que a educao brasileira, desde a dcada de 1930, foi alvo de disputas e objeto de diferentes interesses, o que impulsionou alguns grupos a buscarem status cientfico para a definio de suas propostas educacionais. Nesse quadro de referncia se inscrevem as primeiras pesquisas realizadas pelo Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE), que diagnosticaram a situao do Estado catarinense visando oferecer subsdios reforma educacional e possibilitar a soluo de problemas que vinham se acumulando ao longo dos tempos. O presente estudo analisa aspectos que fundam um projeto escolar meritocrtico a partir das pesquisas e publicaes do CEPE, as quais expressam as apostas no planejamento educacional em Santa Catarina. Tais apostas buscaram orientao de organismos internacionais, como a UNESCO, objetivando organizar o sistema estadual de ensino. Para entender o perfil meritocrtico da educao desenhado na dcada de 1960, inspiramo-nos em estudos sociolgicos contemporneos com foco na meritocracia escolar, visando compreender intenes implcitas e explcitas nos estudos educacionais realizados por esse organismo de pesquisa.

    Palavras-Chave: Pesquisa Educacional. Planejamento Educacional. Meritocracia escolar.

    Educational research and planning in the 1960s in Santa Catarina, Brazil: a meritocratic school project picture Abstract Studies show that education in Brazil since the 1930s has been subject of disputes and different interests which has spurred scientific status seeking groups for the definition of educational proposals. Within this framework lie the first surveys conducted by the Center for Educational Research and Studies (CEPE) who analyzed the situation in the state of Santa Catarina, Brazil with efforts to implement education reform and to solve problems

  • lingered over time. This article examines some aspects of a merit based school project from CEPE publications expressing educational planning beliefs based on the guidance of international organizations like UNESCO through its technical expertise aiming at organizing the state education system. The meritocratic education profile was analyzed from contemporary sociological studies focusing on school meritocracy to understand both implicit and explicit intentions in studies carried out by CEPE.

    Keywords: Educational Research. Educational Planning. School Meritocracy.

    Desde o final da 2a. Guerra Mundial, com a criao de um vasto

    sistema de organizaes internacionais de natureza intergovernamental (Organizao das Naes Unidas ONU -, a Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura UNESCO -, a Organizao Europia de Cooperao Econmica Oece -, a Organizao de Cooperao e de Desenvolvimento Econmico OCDE -, o Fundo Monetrio Internacional FMI - e o Banco Mundial, principalmente), deu-se um impulso internacionalizao da problemtica educacional. Os pases da periferia e da semiperiferia10 do sistema mundial passaram a depender cada vez mais, para a formulao de suas polticas, da legitimao e da assistncia tcnica das organizaes internacionais, o que possibilitou uma rpida difuso das teorias do capital humano e da planificao educacional (TEODORO, 2001, p. 127), sobretudo na dcada de 1960.

    A UNESCO, criada em 1945, figura como uma das principais iniciativas voltadas promoo da educao, tendo como objetivos: fomentar o conhecimento, dar novo e vigoroso impulso educao popular, difundir a cultura e ajudar na conservao, progresso e difuso do saber (GARRIDO, 1991, p. 77). Desde a sua fundao, fomentou um

    10 Entendem-se como pases semiperifricos aqueles que contabilizam a globalizao hegemnica de modo mais incerto e nos quais os resultados so os mais imprevistos. Neles, as agitaes e divises aparecem com maior intensidade. Esses pases possuem uma capacidade relativa para acumular vantagens e uma vulnerabilidade tolervel frente aos riscos oferecidos pela globalizao hegemnica. Podem tom-la como fundamento para elevar-se nas hierarquias do sistema mundial ou servir-lhe de montaria, o que os leva a baixar de nvel nessa hierarquia (BOAVENTURA SANTOS, 2001).

  • elevado nmero de conferncias, misses e assistncias tcnicas a diferentes pases, dentre os quais o Brasil. Nos anos 1960, esta organizao firma com o Ministrio de Educao e Cultura MEC um convnio (Convnio MEC/UNESCO ) que visa a assessorar os estados brasileiros no planejamento e na estruturao dos seus sistemas de ensino.

    Para promover essa ajuda internacional, so firmados convnios com as secretarias estaduais de educao de vrios estados brasileiros, inclusive Santa Catarina, sendo disponibilizados peritos estrangeiros que vo atuar como assessores das autoridades educacionais e oferecer-lhes assistncia tcnica. No quadro deste convnio, foram promovidos os Colquios Estaduais para a Organizao dos Sistemas Estaduais de Ensino (CEOSE), cuja finalidade era estrutur-los e/ou reestrutur-los, respondendo assim ao que havia previsto a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei 4.024/1961)11. Vale lembrar que a noo de sistema remete a um dos princpios fundamentais desta lei, a saber, a descentralizao. Este princpio, como mostra Valle (2003), expressa, juntamente com a autonomia e a democracia representativa, o carter nitidamente liberal da poltica educacional daquele perodo.

    Em Santa Catarina, o CEOSE ocorreu no ms de julho de 1967 e contou com a participao de dois desses peritos: Jacques Torfes e Michel Debrun. Dentre suas principais deliberaes, ressalta-se a constituio de uma comisso para a elaborao do primeiro Plano Estadual de Educao (PEE) do estado, que vigorou de 1969 a 198012. Jacques Torfes j antes de

    11 A Lei n 4.024, de 20 de dezembro de 1961, fixava as Diretrizes e Bases da Educao Nacional. 12 Daros, em seu trabalho Plano Estadual de Educao: concretizao das orientaes polticas da educao (1984), afirma que o objetivo principal da assistncia internacional era efetivar a existncia dos sistemas de ensino, criados pela Len. 4.024, de 1961 (Lei de Diretrizes e bases da Educao Nacional (p. 86). Como recomendao dos peritos Debrun de Torfes, uma comisso desejvel para a elaborao do plano estadual de educao deveria incorporar especialistas ligados economia, estatstica, educao, administrao pblica, ou seja, ser uma equipe tcnica (DAROS, 1984). A assessoria fornecida pelos peritos da UNESCO no s definiu os aspectos tcnicos da elaborao de um plano, como tambm envolveu aspectos polticos, relacionados a quem deveria participar da elaborao do documento (1984, p. 89). 12 Esses centros foram criados por Ansio Teixeira quando diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos - Inep -, entre os anos de 1952

  • participar deste colquio vinha colaborando com os trabalhos do CEPE, criado em 1963 pelo governo Celso Ramos (1961-1965) junto Faculdade de Educao da ento Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina - Udesc. Este centro foi responsvel pela institucionalizao da pesquisa no mbito educacional. Sua principal misso era fundamentar, cientificamente, as polticas pblicas estaduais e prestar assistncia tcnica e/ou pedaggica ao corpo docente.

    Buscando responder ao trip que sustentava seu Plano de Metas do Governo - PLAMEG , a expanso econmica, o meio e o homem, Celso Ramos solicitou ao MEC, em 1962, a instalao de um Centro Regional de Pesquisas Educacionais - CRPE -13 no estado de Santa Catarina. Porm, aps longos debates e estudos, a instalao desses centros ficou ao encargo de cada unidade federada, em funo do dispositivo de da Lei 4.024/1961. Ao ento Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos - Inep -14 caberia apenas orientar tecnicamente sua implantao.

    Devido relevncia atribuda pesquisa em educao, o Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais aparece como instituio inovadora, voltada produo de levantamentos e diagnsticos sistemticos sobre as condies educacionais no estado. Alm disso, este centro se engajou na elaborao dos estudos que orientaram o primeiro plano de educao,

    e 1964, nos estados de So Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Bahia. 13 Esses centros foram criados por Ansio Teixeira quando diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos - Inep -, entre os anos de 1952 e 1964, nos estados de So Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Bahia. 14 O Inep foi criado pela Lei n 378, de 13 de janeiro de 1937. Esta lei reestruturou o Ministrio da Educao e Sade Pblica. Inicialmente, essa instituio recebeu o nome de Instituto Nacional de Pedagogia. Pelo Decreto-Lei n 580, de 30 de julho de 1938, sua denominao foi alterada para Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos, o que originou a sigla Inep, pela qual conhecida at hoje. O nome Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira foi homenagem a esse educador pela Lei n 10.269, de 29 de agosto de 2001. BRASIL, INEP. A trajetria do Inep. Disponvel em: . Acesso em: 21 fev. 2011.

  • deixando um legado importante construo de parte da histria da pesquisa e da (re) estruturao do sistema de ensino catarinense.

    O CEPE integra, portanto, as iniciativas que concorrem para a constituio do campo educacional brasileiro, que, da dcada de 1950 at meados de 1960, sob a liderana de Ansio Teixeira, procuravam estabelecer os pilares de um projeto mais amplo de reconstruo nacional, fundado na reconstruo educacional. Tais iniciativas se pautavam no thos da pesquisa e da cincia, justificado pela necessidade de tornar cientfica e profissionalizar a educao brasileira. Partia-se do pressuposto de que, para que fossem efetuadas reformas, urgia uma investigao profunda, que deveria servir de base sobre as quais as novas propostas educacionais iriam se instalar (DAROS e MELO, 2006, p. 4).

    Diferentes estudos tm mostrado que a educao, desde a dcada de 1930, havia sido alvo de disputas e de diferentes interesses, o que impulsionou alguns grupos a buscar status cientfico, para que, partindo do conhecimento cientfico acerca da situao educacional concreta, dela emergissem as bases de investimentos seguros e sem desperdcios (DAROS e MELO, 2006, p. 5-6).

    nesse quadro de referncia que se inscrevem as primeiras pesquisas realizadas pelo CEPE, as quais procuram diagnosticar a situao do estado com vistas a oferecer subsdios a uma reforma educacional e possibilitar a soluo de problemas que vinham se acumulando ao longo dos tempos. A reforma se concretiza pela aprovao da Lei n 4.394, de 20 de novembro de 1969, que dispe sobre o Sistema Estadual de Ensino de Santa Catarina.

    Com o presente estudo, propomo-nos analisar aspectos que fundam um projeto escolar meritocrtico presentes nas pesquisas desenvolvidas e publicadas pelo CEPE na dcada de 1960. Para tanto, procuramos identificar fatores cognitivos e estruturais que expliquem as diferenas de rendimento dos alunos, relacionadas, particularmente, aptido, motivao pessoal e inteligncia. Detivemo-nos, igualmente, no estudo de alguns fatores comportamentais (de ordem moral), que validam e justificam a punio, a premiao e os veredictos escolares. Esses fatores so discutidos tanto nos boletins15, quanto nas pesquisas do

    15 Os boletins constituam o principal veculo de divulgao das pesquisas realizadas pelo CEPE, embora tambm abordasse os procedimentos cotidianos da instituio. Segundo Melo (2008, p. 72), o primeiro nmero foi lanado em maio de 1966 sendo denominado de Mensrio do CEPE. Este ttulo foi mantido at o nmero 25, quando passou a chamar-se

  • CEPE. Ora, quando a eficcia do sistema que est em jogo, o olhar dos pesquisadores do CEPE, alm de se ater s suas condies estruturais, no deixou de considerar a capacidade e a conduta dos alunos.

    Nosso interesse pelas publicaes desse centro se inspira na afirmao de Caspard (1997, p. 46), para quem os peridicos da imprensa pedaggica so profusos e diversos, pois se trata de uma mdia muito mais interativa que os tratados ou os manuais e dessa maneira constitui um dos melhores observatrios do movimento social na obra da escola e da formao. Esta perspectiva tambm sublinhada por Bastos (1997), que considera a imprensa pedaggica como um excelente instrumento de pesquisa, visto que revela informaes preciosas acerca do contexto educacional e permite avaliar as polticas de cada momento histrico, assim como suas preocupaes e ideologias.

    Ideologia meritocrtica, objeto de estudos sociolgicos contemporneos

    Como no podemos ignorar a ausncia de consenso em torno da

    educao escolar e os estudos histricos da educao que sistematicamente tm confirmado essa premissa, procuramos nos pautar nos ideais que parecem ter predominado nas polticas educacionais do perodo. Referimo-nos aos ideais meritocrticos. Eles tm fundado as lutas por escolarizao nas sociedades modernas e legitimado a dinmica das prticas escolares. Sabemos que, historicamente, tem sido depositada uma confiana incomensurvel na educao e na metafsica do mrito como meio de promoo da justia social. Alm disso, a sociologia contempornea da educao demonstrou que o campo de aplicao do mrito tem sido sobretudo o escolar, que incorpora sua principal forma de expresso e

    Boletim do CEPE. A inteno de fazer intercmbio com outras instituies de pesquisas educacionais atravessava o conjunto dos boletins. O CEPE desenvolvia um sistema de permuta de publicaes que possibilitava a circulao de um nmero significativo de pesquisas desenvolvidas em Santa Catarina e o recebimento de pesquisas desenvolvidas no Brasil e no exterior. Esse intercmbio envolvia o ento Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos (INEP), o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), os Centros Regionais de Pesquisas Educacionais (CRPEs) e organismos internacionais como a UNESCO e a CEPAL.

  • considerado a alavanca da democratizao. escola se atribui a responsabilidade de revelar os talentosos e de justificar suas classificaes, como demonstram os estudos de Bourdieu e Passeron, desde os anos de 1960, preenchendo, assim, uma funo legitimadora de toda hierarquia econmica e social. Ora:

    no podendo invocar o direito de sangue que sua classe historicamente recusou aristocracia nem os direitos da Natureza, arma outrora dirigida contra a distino nobilirquica, nem as virtudes ascticas que permitiam aos empreendedores da primeira gerao justificar seu sucesso atravs de seu mrito, o herdeiro dos privilgios burgueses deve apelar hoje para a certificao escolar que atesta simultaneamente seus dons e seus mritos (BOURDIEU e PASSERON, 1975, p. 218).

    Como o mrito est focado no indivduo, acaba exercendo uma funo de dupla legitimao: ele legitima e consagra os que obtiveram xito nas diferentes formas de seleo escolar, e justifica o fracasso dos no bem-sucedidos. Presume-se que estes ltimos no tenham sabido - ou querido se beneficiar do princpio jurdico da igualdade de oportunidades. , portanto, sobre a concretizao desta igualdade que recaem as crticas de grande parte dos socilogos da educao. o modelo meritocrtico que aparece como alvo dessas crticas. Ao refletir sobre o que poderia ser uma escola justa16 ou uma escola o menos injusta possvel, Dubet (2008, p. 9) considera que a igualdade meritocrtica de oportunidades permanece como a figura cardinal da justia escolar, sendo vista como a nica maneira de produzir desigualdades justas: se os indivduos so fundamentalmente iguais, somente o mrito pode justificar as diferenas de remunerao, prestgio e poder que influenciam as diferenas de performance escolar e profissional. Seus estudos demonstram, no entanto, que os interesses, sobretudo dos grupos privilegiados, em estabelecer uma igualdade de acesso aos estudos esto longe de engendrar uma igualdade real das oportunidades (DUBET, 2008, p. 11-12).

    16 Ao se perguntar: O que uma escola justa?, o que supe articular vrios princpios de justia, Franois Dubet (2008) analisa a escola das oportunidades na Frana e apresenta uma reflexo que abrange quatro dimenses, a saber: a igualdade meritocrtica das oportunidades, a igualdade distributiva das oportunidades, a igualdade social das oportunidades e a igualdade individual das oportunidades.

  • Tal constatao nos autoriza a refletir, com Pierre Bourdieu, sobre os dispositivos geradores da distino social, ou seja, a considerar que o capital cultural produto da transmisso cultural assegurada inicialmente pela famlia (habitus primrio) e, em seguida, pela escola (habitus secundrio). Portanto, aqueles que adquirem, [apenas] pela e para a escola, o essencial de seu capital cultural se distinguem dos que receberam uma importante herana cultural (BOURDIEU, 2007, p. 64). Mas a distino se estabelece tambm na maneira de compreender e de se engajar no jogo escolar, de desvendar os cdigos escolares e, enfim, de utilizar os instrumentos disponveis no campo escolar. O maior ou o menor domnio nessa esfera constituem:

    uma manifestao simblica, cujo sentido e valor dependem tanto daqueles que a percebem quanto daquele que a produz; compreende-se que a maneira de usar bens simblicos e, em particular, daqueles que so considerados como atributos de excelncia, constitui um dos marcadores privilegiados da classe, ao mesmo tempo que instrumento por excelncia das estratgias de distino (BOURDIEU, 2007, p. 65).

    Assim, a competncia cultural e sua utilizao pressupem dois

    modos de acessar a cultura legtima: o primeiro, pensado como aprendizado total, que se adquire precocemente e de forma insensvel, efetuado desde a pequena infncia no seio da famlia e prolongado pela aprendizagem escolar que o pressupe e o completa (BOURDIEU, 2007, p. 65). Este se encarna no esprito e no corpo, tornando-se um habitus, que leva a mover-se no interior do campo escolar de modo quase natural. Neste sentido:

    a competncia de conhecer, controle inconsciente dos instrumentos de apropriao que o produto de uma lenta familiarizao e serve de fundamento familiaridade [...], s pode ser transmitida [...] por preceitos ou prescries, e cuja aprendizagem pressupe o equivalente do contato prolongado entre o discpulo e o mestre em um ensino tradicional, ou seja, o contato repetido (BOURDIEU, 2007, p. 65).

  • Diferentemente, a aprendizagem tardia metdica, acelerada e caracterizada no pela impresso de um verniz cultural, como pensam muitas ideologias, mas pela modalidade de relao com a linguagem e a cultura que [...] tende a inculcar como suplemento; h, portanto, maneiras diversas de se escolarizar. O aprendizado depende de quem o percebe e de quem o produz e confere certeza de si, correlata da certeza de deter a legitimidade cultural e a abastana, a qual serve para identificar a excelncia (BOURDIEU, 2007, p. 65).

    Que legitimidade e abundncia pode haver em uma igualdade meritocrtica de oportunidades que se projeta desigual em seus fundamentos, isto , na herana familiar, na qual as regras podem muitas vezes ser adquiridas inconscientemente? Como a igualdade meritocrtica das oportunidades pode democratizar a cultura e universalizar o acesso e, principalmente, o xito na educao escolar, quando questes sociais, econmicas e polticas produzem to pronunciadas desigualdades sociais?

    Ora, a ideologia do dom, considerado natural, extrai suas aparncias e sua eficcia ao naturalizar diferenas reais, convertendo diferenas nos modos de aquisio da cultura em diferenas da natureza, reconhecendo como nica e legtima a relao com a cultura, [...] que apresenta o menor nmero de vestgios de sua gnese (BOURDIEU, 2007, p. 66). Ela permite, assim, diferentes explicaes atravs do capital cultural adquirido na escola, que no podem se consideradas seno na relao com a origem social.

    A partir destas reflexes, apresentadas de maneira breve, pode-se depreender que a igualdade meritocrtica implica uma forma de dominao que goza de grande legitimidade nas sociedades modernas. Nesse aspecto, o sistema escolar pode contribuir no apenas para reafirmar as diferenas sociais de origem, mas tambm para reproduzi-las. Para Pierre Bourdieu, as trs instncias principais, a Famlia, a Igreja e a Escola, [...] objetivamente orquestradas, tendiam a garantir at muito recentemente o trabalho de reproduo por terem em comum o fato de agirem sobre as estruturas inconscientes (BOURDIEU, 2010, p. 103). Sob esta perspectiva, a escola, ainda que defenda a laicidade de seus procedimentos, prossegue na propagao das conjecturas das representaes inscritas nas suas estruturas tradicionais e hierrquicas.

    Enfim, as perspectivas de anlise se multiplicam e se diversificam no que concerne meritocracia escolar. Para Dubet (2008, p. 11), a igualdade meritocrtica das oportunidades designa o modelo de justia, permitindo a cada um concorrer numa mesma competio, sem que as desigualdades da riqueza e do nascimento determinem diretamente suas

  • oportunidades de sucesso e de acesso a qualificaes escolares relativamente raras. No entanto, a escola, quando hierarquiza unicamente pelo mrito individual, no elimina, como pretende e promete as inmeras desigualdades que dividem e, muitas vezes, segregam os indivduos.

    Polticas educacionais e meritocracia escolar

    Pensar o desenho de um projeto escolar meritocrtico a partir das pesquisas e publicaes do CEPE exige recorrer a reflexes que focam a poltica educacional brasileira e, particularmente, situam a realidade catarinense. Valle e Ruschel (2009 e 2010), ao analisarem as polticas oficiais destinadas educao brasileira e catarinense da dcada de 1930 aos dias de hoje e seus impactos sobre o acesso ao ensino fundamental e mdio, procuram situar o planejamento educacional nos anos 1960, em Santa Catarina, em sua perspectiva meritocrtica. Entre os anos 1946 e 1969, o princpio da igualdade de oportunidades apreendido em termos de seleo e diferenciao, constatam as autoras. Nesse perodo, o discurso meritocrtico ganha fora, mas a expanso das oportunidades escolares lenta, gradual e ocorre essencialmente pela via privada. Este o caso tambm do estado de Santa Catarina, que acompanha de perto os ndices nacionais de expanso da oferta escolar. Seus estudos demonstram que a igualdade de oportunidades [...] no se efetivou: o princpio da seleo justificou o no acesso e a restrio do direito educao; a diversificao favoreceu apenas os bem-nascidos e no os melhores (VALLE e RUSCHEL, 2009, p. 87).

    Como se revelou premente a adequao do Estado brasileiro aos novos tempos, ou seja, aos projetos desenvolvimentistas de base urbana e industrial dos anos 1950 e 1960, as polticas educacionais se propuseram a responder s demandas econmicas, mas tambm aos anseios da populao por ampliao das oportunidades de escolarizao. A constituio de um sistema nacional de educao figurou desde o incio como a melhor forma, ou a nica, de viabilizar as metas governamentais no mbito das diferentes esferas (federal, estadual e municipal). Todavia, de acordo com diversos estudos, a descentralizao no se mostrou eficaz: os ndices de escolarizao ficaram muito aqum dos propsitos oficiais e das demandas sociais. A tenso entre o prometido e o realizado tornou-se cada vez mais evidente.

    Inspiradas no princpio constitucional da igualdade de oportunidades que fundamentava as polticas educacionais das dcadas de 1950 e 1960, as pesquisas do CEPE se depararam com a necessidade de

  • no apenas diagnosticar as condies de acesso e permanncia na escola, veementemente explicitadas por alguns setores sociais, mas tambm de indicar caminhos para a extenso do perodo de escolarizao obrigatria, que passaria de quatro para seis e depois para oito anos e abrangeria a faixa etria dos 7 aos 14 anos. Esta expanso assumiu carter de prerrogativa legal com a aprovao do primeiro Plano Estadual de Educao (PEE 1969/1980) e foi ratificada em seguida pela reforma do ensino de 1 e 2 grau (Lei n. 5.692/1971). Nesta reforma, o princpio de igualdade de oportunidades seguido de um vasto conjunto de medidas, com o propsito de expandir as redes de ensino e atender, em especial, aos que demonstrassem aproveitamento, aptido, capacidade, talentos individuais, e fossem selecionados pelos diversos mecanismos de avaliao postos disposio pelos sistemas de ensino (VALLE e RUSCHEL, 2009 e 2010).

    O lugar da ideologia meritocrtica nas pesquisas e nos boletins do CEPE

    O termo mrito est no centro do projeto republicano e constitui-

    se numa de suas principais bandeiras de luta, vinculando-se diretamente s noes de liberdade, cidadania, educao do povo, nao, defesa de um tipo particular de cultura, como assinalamos anteriormente. Nesse projeto, a escola aparece como a instituio e provavelmente a nica capaz de revelar e desenvolver os talentos e dons individuais e de garantir o reconhecimento dos merecedores, preparando-os para ocupar uma funo profissional adequada s suas capacidades individuais. Revelar as aptides pessoais figura, portanto, como um desafio para a escola, que cada vez mais se confronta com um grande escndalo: o do aluno brilhante e motivado, impedido de prosseguir seus estudos por causa de obstculos econmicos e sociais (FORQUIN, 1995). No entanto, como mostram os estudos sociolgicos da educao, a escola mantm um papel capital em termos de legitimao das desigualdades sociais, ou seja, sua funo ideolgica (latente) tem primazia sobre sua funo instrumental (manifesta) (DURU-BELLAT e ZANTEN, 1992, p. 78). Essa escola, observam Dubet e Martuccelli (1996, p. 36), procura articular vrios princpios e diferentes dimenses, a priori contraditrios. Afirmando a confiana no progresso e na unidade nacional, ela se inscreve numa tradio pedaggica que objetiva uma socializao estvel, construindo ofertas escolares apropriadas a pblicos relativamente homogneos, mas claramente cindidos. No caso brasileiro, e catarinense, evidentemente, essa diferenciao se materializa principalmente na distribuio dos alunos nas diferentes redes de ensino: pblica (federal, estadual, municipal) e privada.

  • Numa conjuntura marcada pela expectativa de mobilidade social e pela promessa de superao de todos os problemas sociais via modernizao, a escola e a escolarizao ganha importncia e passa a compor a agenda dos diferentes governos e representantes polticos. Na pesquisa educacional, no apenas diagnstica, deposita-se, evidentemente, uma grande esperana, seja para indicar os caminhos para a expanso das oportunidades escolares, seja para melhorar sua qualidade. Este quadro de referncia, mas tambm as mudanas estruturais impostas pelo regime ditatorial vo orientar e (re)definir os projetos de pesquisa desenvolvidos e publicados pelo CEPE.

    Dois perodos parecem se evidenciar: o primeiro, abrange os anos de 1963 a 196517; o segundo, de 1966 a 1971, durante o qual trs pesquisas constituram-se referncia, marcadas pelo esprito vigoroso dos tempos de implantao do CEPE, ainda influenciadas pelo impulso transformista dos anos ps-segunda guerra. Nesse perodo, atribui-se educao um papel central no projeto de desenvolvimento estadual, com a pretenso de atender ao homem, ao meio e expanso econmica. As pesquisas elaboradas pelo CEPE propunham-se diagnosticar a educao catarinense em seus diferentes nveis. A pesquisa Sobre a condio do processo educacional em Santa Catarina, realizada em 1966 e publicada em 1967, objetivava obter dados globais acerca do processo educacional que vigorava no estado; a pesquisa Expanso da Escolaridade Primria at a 6 srie, realizada em 1967 e publicada em 1968, d continuidade anterior, tendo-se proposto investigar em profundidade sobre problemas na ampliao do ensino primrio de quatro para seis sries (SANTA CATARINA. UDESC/Faed/Boletim do CEPE. Ano II, n 51 maio/junho, 1976, p. 11). Finalmente, a pesquisa Evaso escolar e

    17 Algumas pesquisas de menor flego, mas no de menos importncia, foram realizadas durante os anos de 1964 e 1965. Em 1964 foram quatro pesquisas: A zona rural da Ilha de Santa Catarina; A marcha da repetncia nas escolas primrias de Santa Catarina; Movimento escolar primrio de Florianpolis em 1963 e Dados bsicos para o delineamento da subrea cultural dos campos de Lages. Em 1965, efetivaram-se mais nove pesquisas: A formao do professor e o currculo na escola primria (1 srie); reas suburbanas e marginais de Florianpolis; Preliminares para a compreenso do desenvolvimento do processo educacional primrio do Vale do Itaja; Subsdios ao plano qinqenal de educao do Estado de Santa Catarina; Levantamento das crianas que no esto frequentando escolar no municpio base do Censo Escolar (SANTA CATARINA, 1966).

  • repetncia nas comunidades pesqueiras de Santa Catarina, tambm desenvolvida em 1967, tinha como finalidade caracterizar a escola nas comunidades pesqueiras, atravs de observao in loco: o levantamento de dados estatsticos da populao geral e da populao infantil das comunidades pesqueiras e o estabelecimento de um gradient em termos do desenvolvimento do litoral pesqueiro (SANTA CATARINA, 1967, p. 1).

    O segundo perodo tem incio em 1974, quando voltam a ser publicados os boletins do CEPE, aps uma interrupo de quase trs anos (1971 e 1974)18. Como estamos diante de uma nova conjuntura poltica e econmica, o organismo sofreu importantes mudanas em relao composio da sua equipe tcnica, dos seus pesquisadores e colaboradores, devendo-se adaptar s demandas do regime ditatorial. Analisando as caractersticas das trs pesquisas elaboradas e publicadas nesse perodo, observa-se que ocorreu um importante deslocamento temtico. Se, no perodo anterior, se evidencia a presena do iderio meritocrtico no que concerne escolarizao, sobretudo em seus aspectos sociais e pedaggicos, no segundo so principalmente as questes psico-pedaggicas e cognitivas que prevalecem, embora sem deixar de se pautar nos princpios meritocrticos.

    Essas temticas aparecem desde o ttulo das pesquisas desenvolvidas: Dificuldades na iniciao da aprendizagem (1970) que buscavam compreender os problemas de alfabetizao das 2.943 crianas da 1 srie da rede pblica de Florianpolis; Estudos sobre problemas de aprendizagem (1973/1974 no publicada), que pretendeu acompanhar 85 alunos remanescentes da amostra anterior, os quais no estavam ainda alfabetizados no ano de 1973, j no seu 4 ano de escolaridade (SANTA CATARINA, 1976, p. 38); O aluno de aprendizagem lenta do ensino de 1 grau (1973/1974), que tinha como foco identificar o aluno de aprendizagem lenta, deficiente fsico e mental para atendimento em classes especiais (SANTA CATARINA, 1976, p. 51).

    Apesar da indiscutvel influncia dos princpios meritocrticos no segundo perodo, neste momento nos ateremos apenas ao primeiro grupo de pesquisas, uma vez que nosso recorte histrico a dcada de 1960;

    18 Esta interrupo ocorreu certamente devido necessidade de adaptao s polticas do novo regime, definido como Ditadura Militar, que se instalou em 1964 no Brasil.

  • alm disso, nosso objetivo to s analisar o desenho de um projeto escolar meritocrtico para Santa Catarina.

    Tais princpios, como se pode ver, aparecem na maior parte dos temas abordados e abrangem diferentes dimenses da prtica pedaggica, dos profissionais do ensino, dos alunos, de suas famlias. Assim, analisamos os prprios temas e sua recorrncia, tendo por base as trs pesquisas elaboradas no perodo. Dentre os temas, destacamos19: Rendimento escolar; problemas na aprendizagem; repetncia; evaso; desenvolvimento infantil; alfabetizao (16); Educao pr-primria (15); Escola e sociedade; o papel na vida dos jovens (9); A formao do professor primrio; salrio do professor; Escola Normal (8); Desenvolvimento; histria de Santa Catarina (7); Ensino superior (6); Educao e poltica (6); Recursos udio visuais; mtodos ativos; mtodos de ensino (5); Reformas educacionais (4); Pesquisa social; educacional (4); Ensino obrigatrio (4); Ensino do segundo grau; Ensino mdio (4); Planejamento integral da educao (4); Administrao escolar; estrutura da escola; currculo (3); Neobehaviorismo; Freud; Piaget (3); Famlia e educao (3); Administrao escolar; estrutura da escola; currculo (3); Recursos humanos (2); Ensino tcnico (2); Educao rural (2); Educao indgena (1); Ensino de filosofia (1); Ensino de artes (1) e A escola e as diferenas (1).

    A escolha dos temas no foi aleatria, mas concebida a partir das reflexes desencadeadas pelos trabalhos dos prprios pesquisadores, estabelecendo, evidentemente, um dilogo com os princpios meritocrticos. Vejamos, por exemplo, o Mensrio nmero 1: ao apresentar a populao de 0 a 14 anos do municpio de Florianpolis, recenseada no ano de 1964, revela, num total geral de 43.067, que 1.983 crianas no frequentavam a escola por motivos de deficincia, falta de vagas, concluso do ensino primrio, trabalho, pobreza, dentre outros, e que 42.672 no apresentavam qualquer deficincia, fsica ou cognitiva. Nesta publicao, fatores quantitativos se entrecruzam com fatores

    19 Os nmeros entre parnteses representam a quantidade de vezes que os temas so mencionados nos boletins do Cepe. Foram levantados por Thayse Vasconcelos Olivaes, bolsista do programa Pibic/CNPq BIP/UFSC 2006/2007, durante o desenvolvimento de sua pesquisa de iniciao cientfica, intitulada: A Ideologia Meritocrtica: uma incurso nas pesquisas do Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE/UDESC) de Santa Catarina (1960-1970).

  • qualitativos e expem a fragilidade da igualdade de oportunidades: alm de os ndices de atendimento na faixa etria serem muito baixos, os ndices de repetncia so bastante elevados, sobretudo no ensino primrio catarinense20. Em 1966, a repetncia chegava a 40,6% para alunos de primeira srie; no conjunto (1 a 4 srie e classes preparatrias para a 5 e a 6 srie), o percentual era de 28,1% dos alunos matriculados (SANTOS, 1970).

    Esses dados adquirem maior relevncia se pensados em relao ao nmero de alunos matriculados em 1963: na primeira srie, eles chegavam a 162.639. Desse total, em 1966, 47.060 matricularam-se na quarta srie; 115.579 (71,06%) haviam ficado pelo caminho, devido a reprovao, causa muitas vezes de abandono. Alm disso, o ndice dos que no conseguiam cumprir o trajeto no ensino primrio sem reprovao era alarmante, o que reafirmava, segundo os pesquisadores, a premncia da melhoria da qualidade de ensino no estado. A disponibilidade de dados tornava difcil a elaborao de um diagnstico mais preciso, pois no se conheciam, por exemplo, o percentual de aprovados em 1966 que realmente havia ingressado na primeira srie em 1963, nem o nmero dos ingressados nos anos anteriores, includos nos percentuais dos repetentes. Para Santos (1970, p. 11), com base nos dados censitrios de 1960 e na taxa de crescimento da populao da ordem de 3,2%, que em 1966 havia em Santa Catarina apenas 278.236 crianas com idade entre 7 e 10 anos, esse era, teoricamente, o nmero de crianas que deveriam estar frequentando as quatro sries primrias. Entretanto, nesse mesmo ano, o movimento escolar das quatro primeiras sries acusou a presena de 441.039 crianas matriculadas.

    A carncia de docentes habilitados no ensino primrio aparece como outro fator responsvel pelos aspectos catastrficos da educao escolar em Santa Catarina. Em 1966, o nmero de normalistas nas vrias redes de ensino primrio era inferior a 50%. De acordo com o relatrio da pesquisa, Sobre a condio do processo educacional em Santa Catarina, o corpo docente se apresentava da seguinte forma:

    29% do professorado primrio normalista de 2 ciclo. Dos demais, 28% so regionalistas, 30% no titulados e 13% substitutos. Entretanto, existem na rede estadual 1.188 normalistas e outros 2.315 professores de vrias categorias que, embora fazendo parte do quadro funcional, no esto atuando

    20 Sobre a expanso do ensino fundamental catarinense, ver Valle, Mizuki e Castro (2004).

  • diretamente no ensino primrio. Nos quadros municipais a incidncia de normalistas mnima (SANTA CATARINA, 1976, p. 7).

    A razo do baixo ndice de pessoal habilitado no decorria apenas da ausncia de escolas normais, sublinhavam os pesquisadores, mas sobretudo do fato de que muitas concursadas eram beneficiadas, ao ingressarem na carreira, por polticas tradicionalistas, que as deslocava para a Secretaria Estadual de Educao ou para os rgos regionais de educao, deixando as escolas desprovidas de professores habilitados. Persistiam, portanto, os velhos hbitos do clientelismo poltico, geradores da improvisao, do recrutamento apressado de jovens sem nenhuma formao ou de egressos do ginsio normal21. Multiplicavam-se, assim, algumas das razes para o chamado estrangulamento do sistema de ensino (SANTOS, 1970).

    As pesquisas realizadas pelo CEPE, j anteriormente mencionadas, apresentam, em suas concluses, algumas orientaes a serem seguidas no intuito de tornar a escola catarinense mais democrtica no que concerne a estrutura e funcionalidade e mais bem preparada para fazer face desigualdade que atinge suas diversas vertentes. Desse modo, segundo esta pesquisa (Sobre a condio do processo educacional em Santa Catarina), a no-regulamentao, a falta de controle, a ausncia de consenso entre professores, diretores e

    21 Schneider (2008) demonstra, em sua dissertao de mestrado, que o processo de ampliao das oportunidades educacionais em Santa Catarina ao ensino secundrio se deu pela expanso do ciclo ginasial normal. Prevalecia, no contexto estudado (1946-1969), uma dualidade estrutural nesse curso, evidenciada por meio dos dois tipos de curso oferecidos: o ginasial e o colegial. O ciclo ginasial como via para a democratizao do ensino secundrio no perodo foi responsvel pela formao (recrutamento apressado) dos professores que atuavam no ensino primrio. Segundo ela, a expanso dos cursos pblicos de formao de professores no perodo de 1950 a 1959 ocorreu essencialmente nos Cursos Normais Regionais, que ofereciam, conforme o Decreto-Lei federal n 8.530, de 1946, e o Decreto-Lei estadual n 257, de 1946, o primeiro ciclo do Ensino Normal (2008, p. 62).

  • autoridades escolares quanto aos objetivos do ensino pr-primrio22 so fatores que fazem com que aes particulares e clientelistas se coloquem em primeiro plano.

    Embora as pesquisas e publicaes do CEPE apresentassem um carter prospectivo, pautado em indicadores que visavam ao governamental, foram levantadas questes pertinentes crtica do sistema estadual catarinense que perduram at os dias atuais, pois concernem aos seus fundamentos meritocrticos. Retomemos, por exemplo, os estudos de Pierre Bourdieu, que no permitem ignorar que todo fato existe em funo das condies sociais de sua produo e de sua reproduo, que os resultados escolares s podem ser compreendidos se consideradas as relaes de fora que esto na base dos sistemas educacionais. Fica evidente que a educao, em Santa Catarina, ao longo da sua histria, desde a educao infantil, foi privilgio de herdeiros culturais e econmicos. A meritocracia escolar atuou, portanto, como legitimadora de privilgios de nascimento.

    A anlise dos artigos publicados nos boletins do CEPE mostra que a dvida da escola catarinense para com suas crianas comea muito cedo, desde o antigo ensino pr-primrio. A ausncia quase total de oferta dessas escolas impedia as crianas de se prepararem para se movimentar no mundo escolar, incorporando as regras e os cdigos escolares, considerados indispensveis ao xito nas sries iniciais. Como sublinham os pesquisadores, esse nvel escolar no figurava como responsabilidade do Estado, embora considerado crucial para estabelecer as bases da educao e ajudar a combater a repetncia:

    No tarefa para o Estado proporcionar a todas as crianas, de maneira indistinta, a educao pr-primria. Deve sim, atender obrigatoriamente quelas que provm de lares impossibilitados de realizarem de forma conveniente sua misso educacional. Quanto s crianas pertencentes chamada elite intelectual ou econmica, poderiam, se suas famlias assim desejassem, frequentar as escolas pr-primrias particulares existentes, que no entanto passariam a ser mais controladas e orientadas pelo poder pblico. Vemos, porm, que no esta a situao atual em Santa Catarina. Os nossos jardins de infncia ou classes

    22 As crianas com acesso a esse ensino eram em nmero de apenas 9.050, todas oriundas de camadas mdias e altas da sociedade catarinense.

  • pr-primrias anexas a estabelecimentos primrios vm sendo freqentados por filhos de profissionais liberais, altos funcionrios pblicos, comerciantes, industriais, enfim, de famlias que podem pagar as anuidades escolares. Enquanto isso, a criana que realmente necessita de um amparo educacional no perodo pr-escolar tem permanecido sem qualquer atendimento (SANTA CATARINA, 1976, p. 25).

    As pesquisas tambm atribuem as desigualdades presentes no interior do sistema de ensino ao monoplio da rede estadual na oferta do ensino primrio, assim como ao tipo de oferta: 84% do nmero de escolas eram escolas isoladas. Alm de atuarem com um currculo inadequado s necessidades dos alunos, estas escolas, em sua maioria, no contavam com professores habilitados. Independentemente do grau de formao, as tcnicas pedaggicas por eles assumidas eram vistas como tradicionais. No havia preocupao com o desenvolvimento das potencialidades das crianas, nem se observava sua maturidade quanto a leitura e escrita por meio do ensino preconizado pela escola renovada (SANTA CATARINA, 1976, p. 17), afirmam os autores.

    As crianas mais prejudicadas eram, evidentemente, as das camadas sociais mais desfavorecidas, assim como as residentes em zonas rurais. A precariedade do ensino da leitura e da escrita no lhes imprimia o desejo de incluso escolar, de prolongamento de sua escolarizao, de expanso de suas potencialidades individuais. Essas escolas configuravam-se, ao contrrio, como um espao de dominao, por reterem a criana num mundo que era considerado o seu, impossibilitando a incorporao de novos habitus, transformando seu destino escolar em destino social, impedindo a mobilidade social prometida pela escola meritocrtica.

    Esta configurao do Sistema Estadual de Ensino, marcada pelos baixos ndices de escolarizao e por uma qualidade de ensino questionvel, contraria o projeto desenvolvimentista proposto para Santa Catarina. Da reestruturao das escolas e da formao dos professores dependia a concretizao desse projeto, pois estavam em jogo a qualificao das novas geraes e a potencializao do capital humano, fatores indispensveis consolidao da modernizao do estado.

    Da emerge a necessidade de realizao de duas outras pesquisas: a primeira, de carter mais geral, intitulada: Expanso da Escolaridade Primria at a 6 srie; a segunda, circunscrita a uma nica comunidade, denominada: Evaso escolar e repetncia nas comunidades pesqueiras de Santa Catarina. certamente a primeira pesquisa que oferece pistas para o desenvolvimento de aes educacionais no mbito estadual, embora

  • as constataes da segunda tambm permitam ampliar a reflexo crtica sobre a educao catarinense. Ela permitiu constatar que a 5 e a 6 srie eram preparatrias ao ensino mdio23, fugindo sua finalidade primeira, que era ampliar os conhecimentos do aluno e sua iniciao nas tcnicas de artes aplicadas adequadas ao sexo, idade e ao meio (SANTA CATARINA, 1976, p. 11).

    Segundo o relatrio dessa pesquisa, necessrio:

    proceder a uma reviso de toda a estrutura do sistema de ensino catarinense, ajustando-a a uma nova posio, seguramente capaz de transformar o quadro [...] do processo educacional do Estado, cujo aprimoramento reclama um trabalho seriamente planejado e, por conseqncia, a abolio da improvisao no tratamento dos problemas que devam ser encarados com especificidades e base de raciocnio cientfico (SANTA CATARINA, 1976, p. 11).

    Enfim, as principais pesquisas e publicaes do CEPE, em sua

    idade de ouro, refletem o esforo de um grupo de pesquisadores de consolidar o Sistema Estadual de Ensino, nos termos dos princpios preconizados na poca. Esses princpios, de carter meritocrtico, abrangem tanto fatores cognitivos e estruturais, quanto fatores comportamentais. So sublinhados num dos boletins, que apresenta um carter bastante prospectivo, como se pode ver a seguir:

    a implantao de uma srie preparatria ao curso primrio com

    23 Compreendia-se, por ensino mdio, o nvel de ensino posterior ao ensino primrio, sendo ministrado em quatro sries. De acordo com os artigos 33 e 34 da Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, esse ensino se dava em prosseguimento ao ensino primrio e era ministrado em dois ciclos distintos: o ginasial e o colegial. Ele abrangia os cursos secundrios, tcnicos e de formao de professores para o ensino primrio e o pr-primrio. No entanto, a Reforma do ensino de 1 e 2 graus, n. 5.692 de 11 de agosto de 1971, em seus artigos 17 e 18, nomeia esse nvel de ensino de ensino de 1 grau, sendo que o mesmo passa a ter a durao de oito anos.

  • um currculo prprio;

    o treinamento de professores para a srie preparatria;

    a melhoria da escola primaria atravs de: currculo adequado, perodo letivo obrigatrio de 4 horas dirias mnimas e superior a 180 dias, redistribuio da rede escolar, aperfeioamento do professor primrio e a supresso gradativa do professor no titulado, ordenao da matricula de acordo com a idade cronolgica, novo sistema da avaliao do rendimento escolar, reaparelhamento das unidades escolares e modernizao do material didtico e eliminao progressiva das escolas isoladas e escolas reunidas, transformando-as em grupos escolares (SANTA CATARINA, 1976, p. 11).

    Todas as transformaes pelas quais deveria passar a escola catarinense indicam o desejo de assegurar que o estado trilhe definitivamente os rumos da modernidade. Sustentado num modelo de expanso econmica, num tipo de atendimento ao meio e ao homem, o projeto de desenvolvimento proclamou a prioridade da educao. No entanto, como lembra Patto (1990, p. 90), ao mesmo tempo em que havia defesa da educao escolar igualitria, havia um lembrete a respeito da existncia de aptides desiguais, a servio da justificativa da desigualdade de oportunidades e do carter seletivo da escola numa sociedade de classes.

    Estava, portanto, em curso um projeto escolar meritocrtico, que tornava possvel confrontar o desejo de igualdade com uma realidade muito hierarquizada e desigual. Como assinalam Valle e Ruschel (2009 e 2010), as dificuldades no se restringiam ao fato de que alguns tivessem mais xito do que outros, ou de que algumas habilitaes formassem a elite e outras a massa, mas ao carter seletivo e diferenciador de um sistema educacional situado numa sociedade desigual. Nela, a escola estabelecia uma ligao estreita e constante entre o nascimento e o destino social.

    Algumas concluses possveis

    Ao analisar aspectos fundantes do desenho de um projeto escolar meritocrtico em Santa Catarina, constatamos que a prtica social da pesquisa e do planejamento educacional nos anos de 1960 estabelece o matiz pelo qual tal desenho se projetaria nos anos subsequentes. Consideramos que a coroao desse projeto se deu com a concretizao do

  • Plano Estadual de Educao (PEE), que vigorou entre 1969 e 1980, tendo sido o primeiro plano para a educao catarinense. A educao se colocava, por conseguinte, como um aspecto essencial para o desenvolvimento preconizado, constituindo-se no principal investimento do processo de modernizao do Estado catarinense.

    Para deflagrar a modernizao da educao, foi montado um esquema para a educao, tendo sido fundamental, a partir do ano de 1963, a criao de trs instituies: o Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE), responsvel pelo desenvolvimento de pesquisas profundas - de 1966 a 1971 -, que promoveram o levantamento, atravs de um survey24, das condies da educao, o qual institucionalizou a prtica da pesquisa em educao em Santa Catarina, contribuindo assim para a (re)configurao do campo educacional; a Faculdade de Educao (FAEd), centrada no compromisso de qualificar o corpo docente e modernizar os mtodos de ensino para romper com o desequilbrio existente entre o sistema de ensino e o processo de modernizao econmica (TEIVE e DALLABRIDA, 2003, p. 82-83); e a Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (UDESC):

    nascida sob a tutela do governo de Celso Ramos, tendo a criao do CEPE e da FAEd como seus pilares sustentadores, carrega uma carga considervel da ideia de uma instituio voltada para o desenvolvimento, para a modernizao do Estado, por meio da produo da pesquisa e do conhecimento tcnico e cientfico, servindo como suporte das aes do governo (MELO, 2010, p. 155).

    Todavia, o movimento de modernizao desencadeado em Santa Catarina no estava isolado. Criar a Faculdade de Educao e a Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina articulava-se concepo de educao como fator de acelerao do desenvolvimento e noo de capital humano, ideias fortes nos anos 1950, pautadas nos acordos de cooperao tcnica estabelecidos entre o Brasil e os EUA. Vale lembrar que esses convnios, conhecidos como acordos

    24 Um survey consistia em realizar levantamentos, estudos sobre educao e cultura, inquritos, apoiados em metodologias inovadoras tais como os Estudos de Comunidade, Estudos de Caso, as Histrias de Vida, as Enquetes, os Depoimentos, entre outros, praticados principalmente pela Antropologia e Sociologia, mas que se adequam s demais cincias (MELO, 2010, p. 165-166).

  • MEC/Usaid, ganharam fora a partir de 1964, com a emergncia do regime militar (TEIVE e DALLABRIDA, 2003).

    Esses convnios, como se demonstrou, propiciaram a presena dos peritos da UNESCO, que assessoraram tecnicamente a realizao do CEOSE, colquio que permitiu colocar frente a frente autoridades e tcnicos competentes em educao de Santa Catarina e especialistas internacionais, para a concretizao do primeiro Plano Estadual de Educao (1960/1980), considerado por Teive e Dallabrida (2003, p. 80) como extenso da prtica de planejamento para a rea educacional. Os requisitos para a elaborao desse plano j haviam sido incorporados no Estado e permitiu vincular os objetivos econmicos e sociais gerais ao plano educacional. Este se apoiou; em tcnicas que dominavam os conhecimentos de estatstica, planejamento e pedagogia.

    Inicialmente, os peritos da UNESCO sugeriram uma abrangncia de vinte anos para a vigncia do plano de educao, no perodo previsto para que a formao do cidado catarinense completasse, da educao pr-primria universidade. Contudo, seus detalhamentos deveriam ser quinquenais, o que permitiria uma previso mais precisa das perspectivas da evoluo econmica e financeira e da orientao geral do Estado (SANTA CATARINA/CEOSE, Documento n 7, p. 2). No primeiro momento, a sugesto de Torfes de Debrun era de que se intensificassem os trabalhos de planejamento, incorporando pessoal numeroso e qualificado para realizar uma operao contnua de um sistema eficiente de consultas e deliberaes (SANTA CATARINA/CEOSE, Documento n 7, 1967).

    O Plano Estadual de Educao, como concretizao das orientaes polticas da educao (DAROS 1984, p. 98), deveria concentrar esforos na resoluo de problemas referentes ao ensino primrio e ao ensino mdio. A ateno se voltaria, nesse aspecto, criao de uma srie preparatria ao ensino primrio e ao ensino pr-primrio, facilitao do contedo de 1 srie e redefinio dos contedos de ensino primrio, barrando a repetncia e evaso, elevando o fluxo ao ensino mdio e fortalecendo a confiana dos pais nos professores. Enfim, essas medidas possibilitariam a extenso da escolaridade obrigatria de oito anos para o ciclo bsico, sendo este um dos aspectos essenciais das polticas de ajuda que se harmonizariam com as prerrogativas da Constituio Brasileira de 1967.

    Em Santa Catarina, a aposta na democratizao do ensino (VALLE, 2010) ocorreu com restrio das discusses sobre os caminhos a trilhar em termos de polticas para a educao, contribuindo para que as orientaes dadas pela ajuda internacional, por meio dos acordos

  • MEC/UNESCO, fossem atendidas, possibilitando com isso a adaptao das polticas educacionais s polticas econmicas. Exigia-se, de igual modo, o compromisso de manuteno da estrutura mnina de organizao e de assistncia, sem as quais eram vetados aos estados os convnios dos quais decorreriam os benefcios econmicos (DAROS1984).

    Estas medidas constituam um verdadeiro credo, ou seja, ampliar o acesso escola seria garantia de igualdade de oportunidades e de sucesso ao longo do percurso escolar das crianas, inclusive daquelas das classes sociais menos favorecidas, como se defendia nos anos 1960. Constata-se, porm, que a instituio escolar, apesar do grande prestgio social de que gozava e de promover socializaes que podiam gerar transformaes sociais, por preencher funes e perseguir objetivos distintos de acordo com os clamores sociais, nunca foi fonte de sucesso e de justia social.

    Assim, o predomnio do mrito na educao escolar revelado sob trs aspectos: o desempenho do aluno, a formao do professor e o papel da educao. Considerando que o problema do rendimento aparece reiteradas vezes nos boletins do CEPE, a medida mais agressiva tomada para igualar as chances foi a realizao de testes psicolgicos, associados a processos de alfabetizao. Quanto s crianas que no lograram xito na alfabetizao ao longo do processo, assinalou-se que, alm da baixa qualidade do atendimento pedaggico, fatores como pequena capacidade intelectual, problemas no desenvolvimento psico-motor, condies fsicas, problemas socioeconmicos e emocionais poderiam tambm afetar o processo de ensino-aprendizagem da criana.

    No que pertinente ao segundo aspectos, a figura do professor, como agente central na distribuio da igualdade meritocrtica de oportunidades, evidenciada nos boletins tanto pela sua formao na Escola Normal quanto pela questo da baixa remunerao. O professor identificado como facilitador do aprendizado. O fortalecimento da relao professor-aluno, bem como a importncia da interao em sala de aula, so considerados como alternativa para combater o fenmeno da evaso e da repetncia.

    O terceiro aspecto, papel da educao, v a escola a como responsvel pela formao do comportamento social desejado pela sociedade e pelo ajustamento do indivduo, isto a finalidade da educao estava em constituir o ser social. Mais do que a estrutura da escola ou os recursos disponveis para a educao, a responsabilidade do sucesso escolar do aluno atribuda s suas prprias potencialidades. Enfim, entram em cena em todas as suas dimenses os princpios meritocrticos.

  • Referncias

    BASTOS, Maria Helena Cmara. Apndice: a imprensa peridica educacional no Brasil: de 1808 a 1944. In: CATANI, Denice Brbara; BASTOS, Maria Helena Cmara (Orgs.). Educao em revista: a imprensa peridica e a histria da educao. So Paulo, Escrituras, 1997.

    _______. As revistas pedaggicas e a atualizao do professor: a revista do ensino do Rio Grande do Sul (1951-1992). In: CATANI, Denice Brbara; BASTOS, Maria Helena Cmara (Orgs.). Educao em revista: a imprensa peridica e a histria da educao. So Paulo, Escrituras, 1997.

    BOAVENTURA, de Sousa Santos (Org.). Prefcio do Volume 1. In:_______. Globalizao: fatalidade ou utopia?. Edies Afrontamento, Porto: Portugal, 2001.

    BOURDIEU, Pierre. A distino: crtica social do julgamento. So Paulo: EDUSP; Porto Alegre: Zouk, 2007.

    _______. A dominao masculina. Traduo de Maria helena Khner. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.

    _______ e PASSERON, J. C. A reproduo: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975.

    BRASIL. Ministrio da Educao. Lei N 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixava as diretrizes e Bases da Educao Nacional.

    _______.Ministrio da Educao. Lei N 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixava as diretrizes e Bases da Educao Nacional.

    _______. INEP. A trajetria do Inep. Disponvel em: . Acesso em: 21 fev. 2011.

  • CASPARD, Pierre e Penlope. Imprensa Pedaggica e Formao Contnua de Professores Primrios (1815-1939). In: CATANI, Denice Brbara; BASTOS, Maria Helena Cmara (Orgs.). Educao em revista: a imprensa peridica e a histria da educao. So Paulo, Escrituras, 1997.

    DAROS, Maria das Dores. Plano Estadual de Educao: concretizao das orientaes polticas da educao. 1984. 138 f. Dissertao (Mestrado em Sociologia) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2008.

    _______e MELO, M. M. R. A configurao do campo da pesquisa em educao no Estado de Santa Catarina nas dcadas de 1950 e 1960. In: VI Congresso Luso-Brasileiro de Histria da Educao. Percursos e Desafios da Pesquisa e do Ensino de Histria da Educao. Uberlndia/MG, 2006.

    DUBET, F. ; MARTUCCELLI, D. lcole. Sociologie de lexprience scolaire. Paris: Seuil, 1996.

    _______. O que uma escola justa?A escola das oportunidades. Traduo de Ione Ribeiro Valle. Reviso tcnica de Maria Teresa de Queirz Piacentini. So Paulo: Cortez, 2008.

    DURU-BELLAT, M. ; ZANTEN, A.H.V. Sociologie de lcole. Paris: Armand Colin, 1992.

    FORQUIN, J. C. A Nova Sociologia da Educao na Gr-Bretanha: orientaes, contribuies tericas, evoluo (1970-1980). In: FORQUIN, J. C. (Org.). Sociologia da educao, dez anos de pesquisa. Petrpolis: Editora Vozes, 1995. p. 145-174.

    GARRIDO, J. L. G. Fundamentos de Educacin comparada. Madrid: Dykinson, 1991.

    HAGUETTE, Andr. Educao: bico, vocao ou profisso. Educao e Sociedade, Campinas, n.38, p. 109-121, 1991.

  • MELO, M. M. R. Slvio Coelho dos Santos: um intelectual moderno no Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE) - SC: pertencimento, misso social e educao para a formao/modernizao (1960/1970). 2008. 176 f. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis.

    _______.A educao como baluarte do desenvolvimento: em torno do trip CEPE, FAEd e UDESC. In: VALLE, Ione Ribeiro; SILVIA, Vera Lcia Gaspar da; DAROS, Maria das Dores (Orgs.). Educao escolar e justia social. Florianpolis: NUP, 2010. Srie pesquisas.

    PATTO, Maria Helena Souza. A produo do fracasso escolar. So Paulo: T. A. Queiroz, 1990.

    SANTA CATARINA. Secretaria de Educao e Cultura. Lei n 4.394, de 20 de novembro de 1969. Dispe sobre o Sistema Estadual de Ensino de Santa Catarina.

    _______. UDESC/Faed/Mensrio Informativo do CEPE. n. 1, jun. 1966.

    _______. UDESC/Faed/Mensrio Informativo do CEPE. n. 8, jun. 1967.

    _______. UDESC/Faed/Boletim do CEPE. a. II, n. 51 mai./jun. 1976.

    SANTOS, Slvio Coelho dos. Um esquema para a educao em Santa Catarina. Florianpolis-SC: EDEME - Editora Empreendimentos Educacionais Ltda., 1970.

    SCHNEIDER, Juliete. A democratizao do acesso ao ensino secundrio pela expanso do ciclo ginasial normal em Santa Catarina (1946-1969). 2008. 171 f. Dissertao (Mestrado em Educao) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis.

    TEIVE, Gladys Mary Ghizoni; DALLABRIDA, Norberto. A faculdade de educao nos anos 60: releitura da idade de ouro. PerCursos: Revista do Ncleo

  • de Estudos em Polticas Pblicas da UDESC. Florianpolis, v. 4, n. 1, p. 91-106, out. 2003.

    TEODORO, Antonio. Organizaes internacionais e polticas educativas nacionais: a emergncia de novas formas de regulao transnacional, ou uma globalizao de baixa intensidade. In: STOER, Stephen R.; CORTESO, Luza; CORREIA, Jos Alberto (Orgs.). Transnacionalizao da educao: da crise da educao educao da crise. Porto: Portugal: Edies Afrontamento, 2001.

    VALLE, I. R. e RUSCHEL, E. A meritocracia na poltica educacional brasileira (1930-2000). Revista Portuguesa de Educao. Instituto de Educao e Psicologia/ Universidade do Minho. Porto/Portugal: v. 22, n. 1, p. 179-206, 2009.

    _______e RUSCHEL, E. Poltica educacional brasileira e catarinense (1934-1996): Uma inspirao meritocrtica. Revista Eletrnica de Investigacin y Docncia. v. 3, p. 73-92, 2009.

    _______; MIZUKI, G. E. P. e CASTRO, I. M. F. Democratizar, descentralizar, municipalizar: A expanso do ensino fundamental catarinense. Cadernos de Pesquisa. Fundao Carlos Chagas. So Paulo: Autores Associados, n. 121, p. 187-212. jan./abr., 2004.

    _______. Justia na escola: das desigualdades justas igualdade sem adjetivos! In: VALLE, Ione Ribeiro; SILVA, Vera Lcia Gaspar da; DAROS, Maria das Dores (Orgs.). Educao escolar e justia social. Florianpolis: NUP. Srie pesquisas, 2010. p. 20-48.

    Maria das Dores Daros Professora Ttular de Sociologia da Educao do Curso de Pedagogia do Centro de Cincias da Educao - Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Doutora em Educao pela Universidade de So Paulo. E-mail: [email protected] Ione Ribeiro Valle

  • Professora Associada de Sociologia da Educao do Curso de Pedagogia do Centro de Cincias da Educao - Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Doutora em Educao pela Universit Ren Descartes - Paris V Sorbonne. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nvel 2. E-mail: [email protected] Marilndes Ml Ribeiro de Melo Doutoranda do Programa de Ps-Graduao em Educao - Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Bolsista da Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (Capes). E-mail: [email protected]

    In_ CADERNOS DE EDUCAO. N 42, 2012: http://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/caduc/issue/view/177