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A PERFÍDIA CIENTÍFICA DE DESCARTES, HOBBES & ROUSSEAU (e suas trágicas consequências) Apresentação Esse aspecto genético do paralelo entre o desenvolvimento científico e o político não deveria deixar maiores dúvidas. Thomas Kuhn O que teria a Física a influenciar não só a Engenharia, a Arquitetura, ou até mesmo a Medicina, mas também a Filosofia, o Direito, a Sociologia, a Psicologia, a Economia? Que princípios daí emanados seriam fortes para acender inclusive o fogo do ódio entre os povos ocidentais? Infelizmente as ciências, especialmente as humanas, amarram-se em ingênuas metafísicas, riscadas há muitos séculos; felizmente, porém, podemos assistir, já no limiar do século passado, esses antigos métodos de averiguação e prática serem completamente abandonados, por falsidade de propósito, flagrados pela própria ciência exata que os consagrara. No século XXI, o da maioridade civil, as disciplinas de humanidades começam a promover sua mutação. Dentre os dedicados e reconhecidos pelas faculdades exatas, também pela filosofia, Descartes ocupa destacado pedestal no panteão dos monstros sagrados, mercê de seu pioneirismo metodológico. Atinge inequívoco sucesso, comprovado pelos séculos, mas o buraco negro que provoca traga incontáveis talentos que dele se aproximam, mas também não menor número

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A PERFÍDIA CIENTÍFICA DE

DESCARTES, HOBBES & ROUSSEAU (e suas trágicas consequências)

Apresentação

Esse aspecto genético do paralelo entre o desenvolvimento científico e o político não deveria deixar maiores dúvidas.

Thomas Kuhn O que teria a Física a influenciar não só a Engenharia, a Arquitetura, ou até mesmo a Medicina, mas também a Filosofia, o Direito, a Sociologia, a Psicologia, a Economia? Que princípios daí emanados seriam fortes para acender inclusive o fogo do ódio entre os povos ocidentais? Infelizmente as ciências, especialmente as humanas, amarram-se em ingênuas metafísicas, riscadas há muitos séculos; felizmente, porém, podemos assistir, já no limiar do século passado, esses antigos métodos de averiguação e prática serem completamente abandonados, por falsidade de propósito, flagrados pela própria ciência exata que os consagrara. No século XXI, o da maioridade civil, as disciplinas de humanidades começam a promover sua mutação. Dentre os dedicados e reconhecidos pelas faculdades exatas, também pela filosofia, Descartes ocupa destacado pedestal no panteão dos monstros sagrados, mercê de seu pioneirismo metodológico. Atinge inequívoco sucesso, comprovado pelos séculos, mas o buraco negro que provoca traga incontáveis talentos que dele se aproximam, mas também não menor número

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de oportunistas que dessas justificativas se servem, a saciar torpes ideais. O cimento cartesiano uniu os tijolos do edifício totalitarista de Thomas Hobbes - que aprendera diretamente com o mestre sua composição – e foi revestido pela mão do descendente Jean-Jacques Rousseau, apagão do Iluminismo. Muito se tem escrito sobre o trio, mas de modo individualizado. Poucos estabelecem seus relacionamentos, suas conexões científicas e, principalmente, os efeitos que obtiveram suas premissas. Diante de tanta importância e até atualidade, tomamos a iniciativa de apresentar esta mini, porém densa obra, carregada com a centena de trabalhos consultados, ínfima contribuição ao vedamento da formidável lacuna. Com você, o pavio da impostura científica, política, social e os cinco séculos de devastações.

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A PERFÍDIA CIENTÍFICA DE

DESCARTES, HOBBES & ROUSSEAU (e suas trágicas consequências)

Sumário INTRODUÇÃO............................................................... 4 I. A REBABEL...............................................................7 1. Trilhos (por mal entendidos) estendidos.......... 7 2. Física Social........................................................13 3. Epiléptica Dialética.............................................16 II. NO RASTRO DO LEVIATÃ....................................... 25 III. O AXIOMA DO MÊDO.............................................. 28 IV. O PARASITA..............................................................41 NOTAS.............................................................................63 BIBLIOGRAFIA................................................................72

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A PERFÍDIA CIENTÍFICA DE

DESCARTES, HOBBES & ROUSSEAU (e suas trágicas consequências)

A Ricardo, com carinho.

Introdução

Sê inventivo e crítico (...) Trata-se de uma lei normativa, não uma descrição da história da ciência, antes um conselho aos cientistas para que melhorem a situação da ciência.

Karl Popper (1)

O século XVI testemunhou várias descobertas, de inúmeros matizes. Simultâneos acontecimentos abalavam as concepções ocidentais sobre Terra, Deus e Universo. Fosse por Copérnico ou Colombo, os novos panoramas aguardavam por intrépidos e destemidos. África, México, Perú, China e Japão reservavam aos navegadores, conquistadores e missionários, culturas antigas e respeitáveis, pacíficas e harmônicas, algumas desenvolvidas, embora ignorantes de ensinamentos bíblicos e do correspondente sistema de privilégios e castigos. Havia necessidade da substituição dos velhos conselhos espirituais, até por causa dos muitos absurdos inexplicáveis, ou, principalmente, pela realidade oferecida no telescópio de Galileu, a ciência e a experiência calculável, por isso certa e acessível, por tudo, real. Quem se mantinha na fé, passava a acreditar que Deus formulara Seu

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plano para ser decifrável com o código acessado pelos mais merecedores:

“Para construir esse sistema com todos seus movimentos, foi necessário uma Causa que compreendeu e comparou as quantidades de matéria dos vários corpos diferentes; essa causa não pode ser uma simples conseqüência cega do acaso, mas sim uma especialista em mecânica e geometria.” (2)

A ciência se foi: “É óbvio que um tal Deus não pode ser enganador.” (3)

A fatalidade assim se abateu sobre a civilização. Incontáveis enganos, mas principalmente deliberadas mistificações daí oriundas alçaram o infindável vôo, no tempo e no espaço, pelo sôpro de grandes formuladores, subvertendo o curso natural de todas as famílias, e por séculos. René Descartes, pelo lado da física, da matemática, da ciência exata; Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau, pelo lado do Direito, da Sociologia, da estratégia política, das ciências humanas, são desses constantemente abordados. Existem incontáveis obras que investigam as razões do Método, de Leviatã e do Contrato Social, mas geralmente as enquadram de modo isolado, visando a especialização, o detalhe, a aproximação da lente; raros são os trabalhos que levantam os relacionamentos dessas distintas produções. Nós, das letras, excluímos os números. Os físicos, advindos do estudo básico cartesiano, sequer tem na filosofia ou na ciência política alguma preocupação. Não há dúvidas, contudo, desta simbiose e de modo decisivo; por isso apresentamos a dura exumação, ao gáudio do velho Popper.

O motivo seria inócuo, entretanto, se essas teorias e os episódios que deram causa se tivessem resumido àquela parca época, mas não: os intelectos desses monstros sagrados da ciência combinaram-se para empurrar a humanidade ao precipício da insensatez, do massacre coletivo, desde as peripécias de Cromwell até ao oportunismo de Napoleão, emergente de uma sangrenta Revolução travestida de democrática e daí às guerras civis e mundiais que se sucederam. Embora o linchamento de Mussolini e a queda do muro, infelizmente suas perfídias não se extinguiram; até hoje impregnam muitas constituições, sempre conservadas pelo poderoso de plantão como a ferramenta ideal para a dominação total, objetivo de todos “partidos”.

A permanência desses obtusos pré-fabricados torna-se indesculpável. Mais do que nunca, é possível atingir suas subterrâneas e camufladas bases pseudo-científicas, raízes de onde emanaram as ervas daninhas e o podre odor suavizado pelas gotas dos seus falsos ideais. Chegaremos mais próximos da reorganização e de um reacomodamento natural, paradoxalmente, lançando um cocktail desintegrativo na torpe novela que dimensionaram. Como disse Ortega Y Gasset, “o homem que descobre uma nova verdade científica precisou, anteriormente, despedaçar em átomos tudo o que aprendera, e chega à nova verdade com as mãos sujas de sangue do massacre de mil superficialidades”. (4)

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Para a melhor compreensão dos cabos que ligam Hobbes, Descartes e Rousseau rumo aos desatinos, anexamos bibliografia de centena de obras; permeamos o texto com conceitos dos magníficos John Locke, Adam Smith e Albert Einstein, os quais, curiosamente, também possuem mútua correlação. No caleidoscópio investigativo buscamos atender a recomendação do velho químico, o filósofo Gaston Bachelard, para quem “um conhecimento mais profundo é sempre acompanhado de uma abundância de razões coordenadas.”(5)

As informações, outrora truncadas, herméticas, enfeixadas, censuradas por perigosas, ou de acesso dificultado, nos dias de hoje são desvendadas ao mundo dos normais. O cidadão comum vê emergir, apesar de uma infinidade de mitos e obstáculos dogmáticos, a majestosa reversão científica que, sob os auspícios do gênio científico da humanidade, modifica nosso entendimento simplesmente sobre tudo.

A moderna física é pródiga e encontra no sistema liberal seu álibi, sua razão. Na mesma aridez científica que outrora ofuscou a vã filosofia, surge o horizonte desta nova era, nova ordem que parece desordem, que brota nem toda expressa por números ou códigos comportamentais (posto que infinitamente mais ampla), mas faz-se também legal e legítima, cientificamente correta e apreciada, procedimento de reversão por convergência de aceleração geométrica, sem dialéticas, mas por “somaléticas”, onde a ética não se fratura. À guisa de atenuar a forte tonalidade de nossas observações, apropriamo-nos das palavras iniciais de Einsten... “Se, no que se segue, eu vier a expressar minhas idéias um tanto dogmaticamente, será apenas em nome da clareza e da simplicidade”- (6) ...consignando, entretanto, a ressalva: diferentemente do gênio, não apresentamos, de modo direto, novas idéias - o livro é menos escrito por nós, muito mais pelos vultos; mas atiramo-nos na chance de uni-las. Com você, a perfídia científica, deliberada ou não, de Hobbes, Descartes e Rousseau, acrescida de algumas das suas mais graves consequências epistemológicas, sociais, econômicas, ecológicas, políticas, jurídicas e morais.

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Capítulo I A REBABEL

Nenhuma disciplina poderá outorgar para si própria um lugar de onde deduzir um saber absoluto e final. Quando as ciências, a prestigiosa matemática ocupou este lugar, revelou-se então mais mutiladora do que a rainha!

Michel Serres (1)

A história das descobertas científicas

e técnicas revela-nos quanto o espírito humano carece de idéias originais e de imaginação criadora.

Albert Einstein (2)

1. Trilhos (por mal entendidos) estendidos

Galileu Galileu e Niklas Copérnico já haviam escandalizado o mundo. Os Discorsi ecoaram em Paris, para inaugurar a gloriosa estação francesa. Ali aguardava René Descartes (1596-1650), o “fundador da moderna filosofia”: “Ao saber do processo contra Galileu em 1633, Descartes sustou a publicação de um importante tratado de física no qual adotava a teoria de Copérnico.” (3) Dono de uma vida peregrina, René passou a vida se alistando em exércitos estrangeiros. Entremeios, formulava anotações. A França não lhe convinha. Holanda e Baviera, Bretanha e finalmente Suécia, países coincidentemente estranhos à comunidade latina, até receberam seus esforços, mas não lhe renderam homenagens. Eram poucas as pessoas que sabiam ler; menos ainda as que sabiam línguas estrangeiras. Em Estocolmo, desgostoso com a negligência das pessoas, Descartes acabou falecendo. No post mortem tornou-se mundialmente conhecido; mais ainda, praticado. Muitas linhas se prendem à história pessoal de Descartes. Começamos transcrevendo os notáveis exemplos de pretensão... e péssima redação:

“Penso que tive muita sorte em me ter encontrado desde a juventude em certos caminhos que me conduziram a considerações e a máximas com as quais formei um método pelo qual me parece que tenho possibilidades de aumentar gradualmente o meu conhecimento e levá-lo ao mais alto ponto a que a mediocridade do meu espírito e a curta duração de minha

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vida poderão permitir-me chegar; já tirei dele tais frutos que, embora no juízo que faço de mim próprio trate sempre de me inclinar para o lado da desconfiança mais que para o da presunção, e que, olhando com olhos de filosófo as diversas ações e empresas de todos os homens, não haja quase nenhuma que não me pareça vã e inútil, não deixo de receber uma extrema satisfação dos progressos que penso já ter feito na procura da verdade e de conceber tais esperanças para o futuro que, se entre as ocupações dos homens puramente homens houver alguma que seja solidamente boa e importante, ouso crer que é a que eu escolhi... Espero que ele (este escrito) venha a ser útil a alguns, sem ser nocivo para ninguém, e que todos apreciarão minha franqueza”.(4)

Que modéstia comovente, encantadora! O comentário de Alexander Koyré o aniquila:

“... Que um sábio nos conte a sua biografia, aí é que é surpreendente. Imaginamos Einstein ou Broglie a contarem-nos a vida, mesmo espiritual, antes de exporem a Teoria da Relatividade ou a Mecânica Ondulatória? Ora, Descartes fá-lo... dizendo que teve a sorte de descobrir um “método” que lhe permitira fazer grandes progressos no estudo das ciências e que expõe a fim de que os leitores o possam aproveitar.” (5)

No que pode consistir esse método? Responde-nos Gilles-Gaston Granger:

"Convém efectivamente distinguir dois pólos de todo irredutíveis da idéia de método. Um corresponde às noções de ´receita´, ´procedimento´, ´algoritmo´, que descrevem detalhadamente a concatenação do que deve ser feito. O outro corresponde ao conceito de estratégia, que não fornece necessariamente uma indicação particularizada dos actos a cumprir, mas somente do espírito dentro do qual a decisão deve ser tomada e do esquema global no qual as acções devem decorrer... o aspecto principal parece ser o método como estratégia." (6)

Descartes fez história a partir da primeira da crise, ao sair da escola por excesso de dúvidas e decepções no estudo das letras. Fora buscar conhecimentos claros e certos, advindos de um saber, mas apresentavam-se muitas discussões. Presumia ser possível passar pela vida sem portar dúvidas. Como traçar uma estratégia com tantas opções sugeridas? Como saber qual delas seria a verdade? “... Tinham-lhe, em suma, prometido uma ciência e uma sabedoria (sagesse). E não lhe tinham dado nem uma nem outra”(7).

Deram-lhe, pelo menos, a desculpa para vadiar. Folgado, saiu ao turismo, curtir bisbilhotices, futilidades e tolices, logradas com raro sentimento de oportunismo, tudo confesso em sofrível estilo literário, inexorável consequência da precoce autoformatura filosófica:

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“Assim que a idade me permitiu sair da sujeição aos meus professores, deixei inteiramente o estudo das letras; e resolvendo-me a não procurar outra ciência senão aquela que poderia encontrar-se a mim mesmo ou então no grande livro do mundo empreguei o resto de minha juventude a viajar, a ver cortes e exércitos, contatar com pessoas de diversos humores e condições, a recolher diversas experiências, a experimentar-me a mim mesmo nos encontros que a fortuna me propunha, e por todo o lado a fazer reflexões sobre as coisas que se me apresentavam de modo a poder tirar delas qualquer proveito... (8)

O oportunista escolhia a mesma trilha refletiva dos seus famosos contemporâneos e alguns antecessores já elencados. Tencionava, como eles, enxergar as metáforas da natureza por algo que não fosse a simples e sempre discutível palavra. Só a matemática oferecia verdades encadeadas e certas, “por causa da certeza e da evidência de suas razões” (9).

A direção do espírito, o método para alcançar o conhecimento deveria se cingir na descoberta dos segredos da natureza “por este grande livro que está permanentemente aberto aos nossos olhos”(10)... em forma matemática. Em “Experiência da dor” Eduardo Jardim de Moraes ironiza a pretensão:

“O que ocorreu modernamente é que um instrumento veio a demonstrar que não se devia confiar no testemunho dos sentidos para aprender a realidade, pois, como disse o próprio Descartes, talvez numa única oportunidade de real brilho, que “é de prudência nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez”.(11) Pearson assevera: “Não são os fatos que fazem a ciência, e sim o método pelo qual são tratados.” (12)

A rainha mathésis universalis vinha sendo desde o nascedouro exibida por sábios interlocutores, os reverenciados de Platão:

“O radical da palavra grega “mathemática” é mathein, que quer dizer captar, aprender, apanhar. A captação é mathéma (ou mathésis) de que deriva a nossa palavra matemática, designando não uma construção mental, mas uma captação de uma realidade já existente.” (13)

É completo sofisma, hábil inversão dialética. Eis, provavelmente, o grande dogma, até maior do que o Sagrado, pelo qual a humanidade foi traída.

Descartes formulou as “Regras para Direção do Espírito”; e lá se foi o trem, na direção riscada. A “má tese” se orientou por má temática; o homo faber, trocado pelo homo mathematicus:

“A ciência ocidental tornou-se matematizada. A linguagem matemática da ciência, que causa tanto desânimo ao leitor de outras áreas, implantou-se como resultado do conflito entre as visões de mundo eclesiástica e leiga e seu propósito era justamente causar o afastamento do público comum.” (14)

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A. Lemkow assinala o aspecto mais desumano que pode constatar: “Descartes sustentava que não apenas os vegetais e os animais, mas também o próprio corpo humano eram máquinas.” (15).

Tampouco neste particular Descartes soube ser original: André Vesálio, em 1543, já havia proposto De Humani Corporis Fabrica. (16) Canguilhem explica:

“A analogia com a mecânica animal tinha por efeito reduzir o maravilhoso, negar a espontaneidade do existente e garantir a ambição de uma dominação racional no curso da vida humana. A matemática cartesiana ignorava analogias e admitia apenas as equivalências” (17)

A simploriedade mental decretava: “Toda a filosofia é como uma árvore cujas raízes são a

metafísica, o tronco a física, e os galhos que saem desses troncos são todas as outras ciências, que se reduzem a três principais – a medicina, a mecânica e a moral.” (18)

Não consta que tenha se preocupado com o significado de moral, mas, no tratado “O Homem”, Descartes sabe abordar a “medicina” com princípios afetos aos “animais-máquinas”, presunção que o levava a aplicar seus remédios baseados nas leis da física mecanista (19). Para a garganta inflamada, que tal um lubrificante sintético? Pois o engenhoso empirista descreve-nos portadores de um sistema hidráulico, irrigado por “tubos” condutores da constante circulação dos fluídos. Nas artérias e nas veias, nestes “tubos”, circula o sangue. O trânsito é movido pelo motor denominado coração. Contração e dilatação produzem a pressão e impulsionam o movimento pelas artérias, tudo baseado em ações mecânicas de trações e inchamentos:

“Assim como podeis ter visto, nas grutas e nas fontes que estão nos jardins dos nossos reis, é a simples força pela qual a água se move ao sair da nascente que move diversas máquinas e até toca alguns instrumentos, ou pronuncia algumas palavras, consoante a diversa disposição dos tubos que a conduzem... E deveras se podem perfeitamente comparar os nervos da máquina que vos descrevo aos tubos das máquinas destas fontes; os seus músculos e os seus tendões, aos outros diversos engenhos e molas que servem para as mover; os seus espíritos animais, a água que as movimenta, de que o coração é a nascente e as concavidades do cérebro são as aberturas...”. (20) Hoje podemos bem distinguir. Somos outros compostos:

“... Seu corpo é totalmente caótico em determinados níveis - átomos rodopiantes de oxigênio penetram na sua corrente sangüínea a cada respiração, numerosas enzimas e proteínas enchem cada célula, e até a descarga de neurônios em seu cérebro é uma incessante tempestade elétrica. No entanto, esse caos é apenas uma das faces da ordem, pois não há dúvida de

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que nossas células são obras-primas de uma função organizada, que nossa atividade cerebral resulta em pensamentos coerentes.” (21)

No tempo de Descartes a vela era a rainha da noite. A concepção da natureza como uma máquina perfeita a tornava previsível por que governada por leis matemáticas exatas, pretensão sem par: “Não havia propósito, vida ou espiritualidade na matéria. A natureza funcionava de acordo com leis mecânicas, e tudo no mundo material podia ser explicado em função da organização e do movimento de suas partes.” (22)

O “homem” surgido dessa pretensa racionalidade fez-se ambíguo: “objeto” para o saber e “sujeito” que conhece. Japiassu acrescenta: “A antiga oposição homem/Deus substituía-se pela oposição homem/mundo.Melhor ainda: pela oposição Sujeito/Objeto.” (23)

Conseqüências? Podem delineá-las modernos cientistas: “Sabe-se de antemão que o mal continua. A ciência com seu

método propõe a dicotomia sujeito-objeto, a curiosidade desinteressada e o desapego do primeiro, o isolamento e controle do segundo, a provocação de experiências com vista a fins bem delimitados, a ignorância dos elementos não-essenciais e o esquecimento do todo. A ciência contém no seu método os germes que levaram as suas mais famosas aberrações como atividade social.” (24)

Descartes não se desfez da fé; apenas supôs que o bom Deus não iria enganar suas criaturas. Ele havia colocado tudo aos nossos pés; cabia-nos rastrear suas charadas. O racionalismo “legitimava-O”, eis que Ele não seria a causa do erro, que provinha do “gênio mau”, “manhoso e enganador”, sempre empenhado no seu papel, o tal “Diabo”, caricaturado por Descartes no esboço filosófico-platônico denominado “Meditação Primeira”. Em carta a Mersena, Descarte assegura: “Não temais, eu vos peço, em afirmar e publicar em toda parte que é Deus quem estabelece essas leis na natureza, assim como um rei estabelece leis em seu trono.” (25)

Deus foi aceito como o criador do movimento, em sete dias. Pressupô-se, claramente, que todo o sistema seria originário do impulso inicial deste Alguém que, tendo elaborado ponto a ponto uma espécie de um colossal relógio, apenas lhe necessitasse a dar corda. O mundo funcionaria, depois do sexto dia da criação, automaticamente. Só o pensamento exato levaria ao conhecimento destas leis inteligíveis, à verdade buscada por todos. Este é o exemplo mais clássico, evoluído desde Bacon - a previsão do tempo discorrendo num eterno linear, tique-taque previsível: “A confecção de relógios, por exemplo, é certamente delicado e trabalhoso, de tal modo que as suas rodas parecem

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imitar as órbitas celestes ou o movimento contínuo e ordenado do pulso dos animais.” (26)

Com tanta indicação, partia o esperançoso Descartes atrás da “chave do universo”. Sabidamente jamais a encontrou. O funcionamento do mundo, obviamente, não se apresenta desse modo tão rudimentar. Prigogine comprova-nos:

“A natureza não tem um nível simples. Quanto mais tentamos nos aprofundar, maior a complexidade com que nos defrontamos. Nesse universo rico e criativo, as supostas leis de estrita casualidade são quase caricaturas da verdadeira natureza da mudança. Há uma forma mais sutil de realidade, uma forma que envolve leis e jogos, tempo e eternidade... Em lugar da clássica descrição do mundo como um autômato, retornamos ao antigo paradigma* grego do mundo como uma obra de arte.” (27)

Roszac aponta o porquê do alargamento da picada cartesiana para o despenhadeiro, na qual ainda transitam devastadores ecológicos, sociológicos, políticos, jurídicos, econômicos: “A natureza só é bela para o cientista depois de classificada e arrumada. A façanha está na descoberta desta “ordem.”(28)

No “Discurso”, Descartes apresentou os tickets de viagem para a “Estação Sucesso”. Vangloriava-se, eis que a física (a ciência ) “nada mais era do que geometria”(29).

Voltaire foi fulminante na crítica deste pressuposto que (des)norteou o ancestral patrício: “A geometria era um guia que de algum modo poderia tê-lo guiado.Impeliu seus erros metafísicos até o ponto de pretender que dois mais dois são quatro porque Deus assim o quis.”(30)

O método cartesiano, malgradas escassas advertências, ascendeu fulgurante, com o slogan de libertador! Finalmente a ciência racional poderia “desenvolver-se para extrair verdades seja de que assunto for” (31), como augurava Platão, mas não Aristóteles, que por meio indireto moldou Voltaire. Observa Koyré:

“Ocorre que para Aristóteles a geometria era apenas uma ciência abstrata. Por isso, a geometria nunca poderia explicar o real. As suas leis não dominam o mundo físico. O estudo da geometria não precede o da física. Uma ciência do tipo aristotélico não se apoia numa metafísica. Conduz a ela, em vez de partir dela. Uma ciência tipo cartesiana, que postula o valor real do matematismo, que constrói uma física geométrica, não pode dispensar uma metafísica. E tem mesmo que começar por ela. Descartes sabia-o. E Platão, que fora o primeiro a esboçar uma ciência desse tipo, sabia-o igualmente.” (32) Descartes apenas pegou o bonde errado: “Durante seu desenvolvimento pelo pensamento grego, a filosofia da natureza enveredou por um caminho equivocado. Esse pressuposto errôneo é vago e fluído no Timeu, de Platão.” (33)

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O Timeu desconcertou Descartes: “No fundo, o que pretende Descartes é reconstruir o sistema verdadeiro do mundo. Pretende realizar o projeto platônico de construção de uma física matemática, de uma ciência matemática do mundo.” (34) Descartes pretendeu, construiu e convenceu. Nós é que fomos para o fundo. 2. Física Social

O extraordinário filósofo e jurista Isidore Auguste Marie François

Xavier Comte (1798-1857), nosso conhecido e amado Augusto Comte, conseguiu transplantar o método de aferição científica consagrado por Descartes, Newton e Rousseau ao estudo e principalmente contrôle da massa avolumada. Pela arquitetura ordenativa-normativa, era possível e recomendável balizar as ciências jurídicas, econômicas, sociais e governos, pela contundência de comparações expressadas, como esta, de Descartes:

“Tal como uma casa construída por um só arquiteto será mais bela que aquela na qual vários construtores trabalharam, também uma cidade construída por gerações sucessivas não tem tanta ordem como a que foi construída de uma só vez... [ele só não pode conhecer o tédio de Brasília!] do mesmo modo também as ciências, tendo sido construídas pouco a pouco, não possuem nenhuma certeza e não ensinam a ordem verdadeira das coisas. Por isso, seria preciso que alguém empreendesse, de uma vez para sempre, reconstrui-las e pô-las em ordem.” (1) O barro cartesiano, pintado com cores de Platão e as pioneiras proposições de Rousseau, consagradas por Saint-Simon, que lhe foi mestre, formaram lastro e pano da cama elástica onde tomou impulso o “juspositivismo”*, o “direito” da imposição: ____________________________________________________ * Positivismo: conforme F. Hayek, caracteriza-se por presumir que "todo o conhecimento verdadeiro e cientifico, no sentido que ele descreve a coexistência e a sucessão de fenômenos observáveis". Dado a importância que a doutrina assumiu, na teoria e na prática, dedicamos boa parte de nosso trabalho, em especial em capítulo adiante, seu significado completo e as consequências de sua adoção. * Positivismo:“Postura filosófica segundo a qual o único conhecimento genuíno é o obtido pelos métodos da ciência. É, portanto, aliado do EMPIRISMO e do MATERIALISMO, e oposto à METAFÍSICA e à teologia.” Nader, P., p. 179.

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“Descartes nos diz com toda a clareza, na segunda parte do

Discurso do Método, que uma legislação que é obra de um só vale mais do que a que foi elaborada por vários através das transformações da história, pois é mais fácil a um só seguir um plano racional e apartar-se das contingências que constituem os hábitos e os costumes dos habitantes do país.” (2)

Hitler, Mussolini, Lenin e Napoleão agradecem. Sorman endossa e aponta a gravidade do rumo tomado pelo trem:

“... a culpa inicial cabe a Descartes. Ele foi o primeiro a negar a sabedoria inconsciente, persuadindo-nos de que só o que era demonstrável, era verdadeiro. Rousseau substituiu-o, imaginando que não havia leis fora das desejadas pelo homem. Finalmente veio Augusto Comte, que instalou de vez a universidade no positivismo, fez as ciências humanas oscilarem para a sociologia e eliminou todo o ensinamento sério da economia...” (3)

Não foi mesmo necessário utilizar nenhuma originalidade: “O próprio Descartes esboçara as linhas gerais de uma

abordagem mecanicista da física, astronomia, biologia e medicina. Os pensadores do século XVIII levaram esse programa ainda mais longe, aplicando os princípios da mecânica newtoniana às ciências da natureza e da sociedade humana. As recém-criadas ciências sociais geraram grande entusiasmo e alguns de seus proponentes proclamaram terem descoberto uma “física social”. (4)

Russel qual interesse subjacente: “A humanidade positiva será regida pela autoridade moral de

uma élite científica, ao passo que o poder executivo será confiado a especialistas técnicos. Este arranjo não é diferente do estado ideal da República de Platão.” (5)

Bohr os enquadra fina ironia: “Qual a diferença entre um especialista e um filósofo? Um

especialista é alguém que começa sabendo um pouco sobre algumas coisas, vai sabendo cada vez mais sobre cada vez menos e acaba sabendo tudo sobre o nada. Já um filósofo é alguém que começa sabendo um pouco sobre algumas coisas, vai sabendo cada vez menos sobre cada vez mais e acaba sabendo nada sobre tudo.” (6)

O erro foi crasso. Seu dano, ainda maior. Ninguém menos do que o genial Louis de Broglie constatou:

“No comêço do desenvolvimento da ciência moderna, Descartes dizia que devíamos esforçar-nos em explicar os fenômenos naturais por figuras e movimentos. As relações de incerteza exprimem precisamente que uma tal descrição com todo rigor é impossível, pois que nunca se pode conhecer ao mesmo tempo a figura e o movimento. ” (7)

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O star acumulou todos os (pré)conceitos cartesianos em sua “Teoria Geral da Sociologia”, a qual, pela formosura, alcançaria todas as atenções acadêmicas: “Augusto Comte criou, em 1839, a palavra “Sociologia”, formada pela fusão de duas raízes, uma latina, outra grega - “socius” e “logos”. (8) Guiou-lhe também Timeu, a obra cosmológico-platônica. Tal qual Descartes, Augusto utilizou justamente as premissas religiosas de que o tempo e o Universo tinham nascido “quando o Divino impôs forma e ordem no caos”.* A presunção espatifa-se pelo Big-Bang, mas Na época, veio a calhar. A tradição e o mito esperavam novel anunciante:

“Outro exemplo de Ser Positivo é o “Deus Organizador”, em que a divindade (ou divindades) exerce o papel de controlador da oposição primordial entre Ordem e Caos. O Caos representa o Mal, a desordem, e é simbolizado em vários mitos por monstros como serpentes ou dragões, ou simplesmente deuses maléficos que lutam contra outros deuses em batalhas cósmicas relatadas muitas vezes em textos épicos, como no caso do Eubuma elis dos babilônios”. (9)

O ideal do homem, à Sua imagem e semelhança, deveria também “colocar as coisas em ordem”. Então, pela lógica, o homem (o próprio, Comte, como Platão e Descartes) pôs-se a ordenar as coisas... nos termos de sua percepção ou interesse. A tanto, somente a clareza matemática é que poderia calibrar, ordenar até as relações sociais em proporções precisas, em progressão regular da simplicidade à complexidade, “único caminho capaz de nos libertar do erro e levar-nos ao conhecimento da verdade” (10).

No tortuoso caminho, percorrido com tanta escuridão, Comte "enxergou" uma sociedade evoluindo na ordem que entendia natural e explícita: primeiro, o indivíduo subordinado à ordem social; depois, a ordem vital e material, na obediência às tais “leis invariáveis”: “Doravante, em filosofia política, não haverá ordem e acordo possíveis senão sujeitando os fenômenos sociais e todos os demais a leis naturais invariáveis.”(11)

Para fundar pilares a tão inalcançável profundidade, Comte e Descartes mergulharam no universo da precisão querida, limitada à matemática. Com o decifrar, com o cálculo, por ironia, ambos se persuadiram; e induziram a humanidade a subir, degrau por degrau, a cobertura da inútil torre, a nova babel que ainda sobe, a “Rebabel”. ________________________________________________________ *Caos: “Na linguagem corrente, a palavra "caos" está indefectivelmente ligada à idéia de profunda desordem, aplicando-se tanto a uma disposição espacial quanto a uma situação social perturbada." in Witkowski, Nicolas, Ciência e Tecnologia Hoje, por Bergè, Pierre, O Caos, manual do usuário, p. 275.

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Leibniz ainda dar-lhes-ia razão - o mundo estava realizado de acordo com os cálculos divinos: “Cum Deus calculat, fit mundus.” (12)

Mesmo Albert Einstein veio impregnado; malgrada a confirmação dos fenômenos quânticos, da incerteza e das probabilidades, não aceitou de plano as novas conjeturas - “Deus não joga dados”. Demorou anos ao iconoclasta científico aceitar os revolucionários fenômenos aferidos, anomalias inexplicáveis por matemáticas, paradoxos afiançados por Max Planck e Niels Bohr. A aparente desordem nada mais é do que uma "ordem invisivel". A suposição de alcançar a certeza através da obediência a um método atado em conjunto de regras palpáveis, naturalmente com a melhor das intenções, visando facilitar o acesso ao pensado verdadeiro, caminho percorrido por progressão contínua, ordenada, por isto pretensamente clara, do simples ao complicado, técnicas aprendidas na Lógica, da análise dos Geômetras e na Álgebra, apenas descreve incríveis coincidências. Pascal incitara. Platão sobrevivera. Partindo do pre(mal)suposto, Descartes escreveu período que o condena:

“Não admito como verdadeiro o que não possa ser deduzido, com a clareza de uma demonstração matemática, de noções comuns de cuja verdade não podemos duvidar. Como todos os fenômenos da natureza podem ser explicados deste modo, penso que não há necessidade de admitir outros princípios da física, nem que sejam desejáveis” (13). Albert Einstein e Leopoldo Infeld acabaram se divertindo deles próprios: “Quando se estuda Mecânica pela primeira vez tem-se a impressão de que tudo nesse ramo da ciência seja simples, fundamental e resolvido para sempre. Dificilmente se suspeitaria da existência de uma pista importante que ninguém notou durante trezentos anos. A pista negligenciada está relacionada com um dos conceitos fundamentais da Mecânica, o de massa.”(14)

3. Epiléptica Dialética

Sob o aspecto cultural-filosófico-eclesiástico, a postura do homem como substituto, ou filho, ou herdeiro de Deus, na sua imagem e semelhança, conduziu-nos ao algoz domínio da Terra, “submetendo-a”, conforme ofereciam as escrituras: “A filosofia mecânica forneceu uma resposta para o problema da ordem cósmica e, portanto, da ordem social, mas ao fazê-lo indicou a necessidade de poder e domínio sobre a natureza.” (1) Descartes pôs-se “tático da ocupação” para o definitivo domínio da inimiga. No batalhão de Bacon, despejou:

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“Compreendendo as ações do fogo, da água, do ar, das estrelas e dos céus, podemos usar essas forças em todos os propósitos para as quais são apropriadas, e assim tornamo-nos senhores e dominadores da natureza.” (2) Granger preferiu ser espirituoso:

“Um viajante conta que, nas florestas do Equador, vivem tribos índias sem contato algum com os civilizados. Um dia chegam ao seu território centenas de caminhões, escavadoras, “bull-dozers” que, ao ser de uma Cia de Petróleo, abrem estradas, furam poços, modificam a floresta. Eis como os índios, estupefatos, explicaram entre eles semelhante acontecimento: “Acabam de chegar animais novos. Domesticaram os homens, que lhes obedecem e os servem como escravos. E os homens brancos alimentam-nos e abrem-lhes passagem através da floresta...” (3)

O domínio cartesiano, tratado “científico” (?!), versa pela aplicação da força bruta diretamente no objeto, vetor mais eficaz. A natureza curva-se aos pés do senhor. Raízes milenares, de todas as espécies, terminam ceifadas:

“Hoje em dia não existem espíritos da natureza porque os mortais decidiram se separar da natureza. O antigo impulso de viver dentro da natureza cedeu espaço ao seu oposto, o impulso de conquistá-la. Esse impulso se esgotou quase ao ponto do desastre. O retorno à natureza está sendo desesperadamente buscado em toda a parte, talvez no último instante.” (4)

O que resta? Em “Considerações sobre Descartes” Koyré responde-nos:

“Um amontoado de riquezas e um amontoado de escombros: tal é o resultado desta atividade fecunda e confusa, que tudo demoliu e nada soube construir, ou, pelo menos, acabar. O homem sente-se perdido num mundo incerto, privado de suas normas tradicionais. Onde nada era seguro. Onde tudo era possível.” (5)

Bateson, já numa implícita alusão a Darwin, não deixou por menos: “A lógica é um instrumento muito elegante e fizemos bom uso dela nesses dois mil anos. O problema é que quando a aplicamos aos caranguejos e às tartarugas, às borboletas e à formação do hábito... Bem, para todas essas coisas lindas a lógica simplesmente não serve”. (6)

O talentoso Descartes até preocupou-se com os desígneos humanistas, mas o erro proveniente de falsa premissa dialética trouxe ao baile o “cogito”, o “penso, logo existo”, lançado em seu “Discurso do Método”, de 1637, (portanto, o que não pensasse não existiria...)

Russel também ironiza: “De outro modo, poderíamos dizer igualmente “Ando, logo existo”, pois, se ando, é certo que devo existir.” (7)

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Ao elementar equívoco Antônio Damásio contrapõe com o leitmotiv de sua obra: “No entanto, antes do aparecimento da humanidade os seres já eram seres.” (8)

Percebia o francês tudo dividido, configurado numa sobreposição hierarquica, parte por parte, tal qual o Universo para ele se mostrava: “Não há nada no conceito de corpo que pertença a mente, e nada na idéia de mente que pertença que ao corpo” (9).

Hegel, também sem originalidade, numa espécie de vulgata epistemológica, dois séculos após, usou o mesmo princípio, até para se valorizar: “Ser é ser pensado”. (10)

E viva a dialética, propulsora da insensatez. O mundo teria se livrado das barbáries se ambos não tivessem pensado.

Corpos e espíritos, estanques e heterogêneos, na teoria cartesiana não assimilam comunicação, exceto contrariedades, antagonismos. O esteio é prejudicial por vários motivos, mas ainda baliza a civilização:

“A partir dessa perspectiva a divisão entre mente e corpo tornou-se verdade absoluta, ao mesmo tempo que cada face se tornou antagônica à outra, coexistindo dentro do mesmo ser como as duas faces hostis da mesma moeda. Alguns séculos depois do sonho febril de Descartes continuamos a nos deparar justamente com essa divisão, que está na base do seu pensamento, estampada nos diversos aspectos da vida moderna.”(11)

O poeta e ensaísta Octavio Paz relata seu diálogo com Joseph Brodsky:

“As origens do autoritarismo estão em Hegel. Alí começou o mal”. Ao que retruca Brodsky: “Não, vem muito antes. O mal começou com Descartes, que dividiu o homem em dois e que substituiu a alma por eu”. (12)

Georg Wilhelm Friederich Hegel (1770-1831), de fato, era apenas mais um notável condutor do monumental equívoco:

“A filosofia política moderna acha sua primeira forma sistemática em Hobbes; mas seu germe vital está em Maquiavel, de quem Hegel foi - não preciso lembrar - um grande admirador. E uma história que tem no Príncipe sua revelação, no Leviathan seu símbolo e - podemos também acrescentar, na vontade geral de Rousseau sua solução ideal, não podia deixar de ter como conclusão o deus-terreno de Hegel”.(13)

Concentrando-se na res cogitan e na res extensa, com as ciências humanas ocupando-se da primeira e as chamadas ciências naturais da segunda, os vértices do conhecimento chamado objetivo se entenderam duplicados. Pensando em simplificar e ordenar o estudo, a tentativa de elucidar os fenômenos passou por esta protodecomposição desvirtuante, prejudicando, de plano, a correta apreciação dos respectivos objetos:

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"O princípio da simplificação, que animou as ciências naturais, conduziu às mais admiráveis descobertas, mas são as mesmas descobertas que, finalmente, hoje arruínam nossa visão simplificadora." (14)

Trata-se da flamante postura platônica, vetores contrapostos, empírica e epiléptica dialética assim criticada por Villey:

“Descartes rompeu algo ao dividir o mundo em res cogitans e res extensa, quer dizer, o pensamento e a matéria que, como sintetizou Villey, representam respectivamente “o mundo das lamas, suporte de pensamento e da vontade, do ato livre e o “mundo objetivo da física quantitativa, o “mundo das coisas, inerte, passivo, submetido às leis determinantes da mecânica”. Assim vão surgindo outros dualismos: sujeito e objeto, homem e natureza, conhecimentos morais e ciências denominadas objetivas, valor e fato, dever ser e ser, etc. Assim a natureza fica mutilada: das qualidades (o belo, o justo) que não se admitem cientificamente por não serem mensuráveis e sim obscuras e imprecisas das causas finais, que tampouco se prestam aos cálculos e pressupõem uma ordem teleólogica numa natureza não cindida dos conjuntos sociais naturais, reduzidos a uma soma de indivíduos isolados, objeto também de cômputo e comparação quantitativa.” (15)

Decompondo o pensamento e ordenando-o nessa pretensa lógica, da “intuição” a “dedução”, Descartes e seus seguidores (praticamente a totalidade dos cientistas e pesquisadores) acabaram rompendo a homogenia do todo. Na ânsia pela “câmera em close” à visão pormenorizada, suprimem do foco movimentos periféricos, eventualmente responsáveis pelo objeto analisado. Obtém, destarte, um conhecimento incompleto e obtuso, errando na identificação da fonte, desorientando o investigador pela falsidade de base. Em outras palavras, fomentando apenas a especialização e desprezando o conhecimento abrangente, completo, seu trem epistemológico tem conotação própria de dinâmica desenhada para rápido desenvolvimento tecno-estratégico; não suporta, todavia, o selo científico. O erro metodológico condena seu produto. Marcelo Gleiser ensina:

“Não é uma coincidência que em 1947, quando Bohr foi condecorado com a Ordem do Elefante da Coroa dinamarquesa, ele tenha escolhido o símbolo taoísta do Yin e Yang como seu brasão de armas, com a seguinte inscrição em latim “contraria sunt complementa”, “os opostos se complementam”. (16)

A natureza vista “rebelde”, cheia de conflitos, é o palco da confusão cartesiana, onde cérebro e mente assumem estranhos e independentes papéis. Ela, passa a mero artefato, subdividido nos diferentes compartimentos dele, fértil arquitetura à manipulações. Fracionado o objeto ad lib, cabia atender à

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questão primeira: dividido o próprio homem em duas substâncias, como poderia Descartes depois reuni-lo? (17)

Chopra realça: “A necessidade de dualidade do ego gerou um mundo de bem e mal, certo e errado, luz e sombra.”(18)

Foi este o campo de consagração (ou “campo de concentração”) do famoso professor dr. Sigmund Freud (1856-1939), embora ao seu tempo já existisse o conselho de David Bohm:

“É urgente que compreendamos o perigo de continuar com o processo de fragmentação do pensamento. Seria como procurar sempre o caminho mais difícil e doloroso para se chegar ao mesmo destino...”(19)

A observação procede. Nem Descartes tampouco Freud conseguiriam colar este ser tão esfacelado, ao contrário - o último acabou afirmando que a histeria/esquizofrenia instalada não poderia ser “extirpada”, o doente jamais teria cura total; mas propunha seus “trabalhos” para amenizá-la, assim como se baixa a febre. Ao velho sizudo era conveniente a mais completa mistificação; nunca curando, arrumava proventos até a falência ou morte do paciente.

Freud e muitos diletantes ignoraram as revoluções científicas que aconteciam já no início do século XX. Finalmente, não há mais dúvidas, nem desconhecimento, tampouco lugar para empulhação:

“O cérebro e o corpo encontram-se indissociavelmente integrados por circuitos bioquímicos e neurais recíprocos dirigidos um para o outro. Existem duas vias principais de interconexão. A via em que normalmente se pensa primeiro é a constituída por nervos motores e sensoriais periféricos que transportam sinais de todas as partes do corpo para o cérebro, e do cérebro para todas as partes do corpo. A outra via, que vem menos fàcilmente à mente, embora seja bastante mais antiga em termos evolutivos, é a corrente sangüínea; ela transporta sinais químicos, como os hormônios, os neurotransmissores e os neuromoduladores”. (20)

O pesquisador contemporâneo Michel Serres arrola a grande perda de tempo ocasionada pela indução ao método cartesiano de averiguação e exercício em todos os campos de formação científica:

“As disciplinas foram fragmentadas e, ao se fazer isto, impediu-se o diálogo e a polêmica intercientífica. A física descobre agora a necessidade de conceber outras operações para melhor perceber a complexidade da matéria. As ciências contemporâneas progridem com a contradição: a partícula se manifesta ora como onda, ora como partícula. A pesquisa de ponta se acha obrigada a reintroduzir o observador na observação. Estes percursos casuais e aleatórios nos remetem a Cristóvão Colombo. Não foi traçando seu destino que ele descobriu a América.” (21)

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Apenas um reparo – onda e partícula não são contraditórias, embora num primeiro instante assim fossem observadas; elas perfazem a intrigante complementariedade. Fowler reforça-nos: “O mundo é uma rede complexa de inter-relações na qual as categorias de sujeito e objeto se fundem, embotando as distinções dualistas tradicionais.” (22)

Agora preocupa-nos a total profilaxia, desde a raiz: “É esse o erro de Descartes: a separação abissal entre corpo e a mente, entre substância corporal, infinitamente divisível, com volume, com dimensões e com funcionamento mecânico de um lado, e a substância mental, indivisível, sem volume, sem dimensões e intangível, de outro; a sugestão de que o raciocínio, o juízo moral e o sofrimento adveniente da dor física ou agitação emocional poderiam existir independentemente do corpo... Descartes pensava que o calor fazia circular o sangue, que as finas e minúsculas partículas do sangue se transformavam em espíritos animais, os quais poderiam mover os músculos. Porque não censurá-lo por uma dessas noções? A razão é simples: há muito tempo que sabemos que ele estava errado nesses aspectos concretos, e as perguntas sobre como e por que circula o sangue receberam já uma resposta que nos satisfaz completamente. O mesmo não sucede com as questões relativas à mente, ao cérebro e ao corpo, em relação as quais o erro de Descartes continua a prevalecer. Para muitos, as idéias de Descartes são consideradas evidentes por si mesmas, sem necessitar de nenhuma reavaliação.” (23) Enquanto descobríamos a América, tapávamos a ciência. A civilização seguiu o penoso caminho, por séculos enganada em todos os ramos do conhecimento, para o lamento do grande Werner Heisenberg, recém há algumas décadas atrás: “A cisão cartesiana penetrou fundo na mente humana nos três séculos após Descartes e levará muito tempo para ser substituída por uma atitude realmente diferente diante do problema da realidade.” (24) Posta a coerência aparentemente lógica, a ciência físico-matemática cartesiana ainda encoraja milhares de pesquisadores, das ciências exatas, ainda mais das humanas, contemporâneos e, podemos dizer, futuros, a trilharem a mesma trajetória, a embarcarem no trem... com destino inverso ao pretendido: “O segundo preceito do método cartesiano “dividir cada uma das dificuldades... em tantas parcelas que forem possíveis e requeridas para melhor resolvê-las”, válido até certo ponto na matemática e nas ciências físico-químicas, mostra-se inutilizável em ciências humanas onde o progresso do conhecimento não caminha do simples ao complexo, mas do abstrato ao concreto por uma oscilação contínua entre o conjunto e as partes.” (25)

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Foram escassos os questionamentos e dúvidas suscitadas; foi fácil estender o trilho a todas estações. Descreve-nos Alquié: “Graças ao cartesianismo - mas não só a ele - a idéia mecanicista do mundo torna-se uma idéia adquirida muito para além dos círculos científicos; ela contribui muito para reformar a visão comum da natureza.” (26) No afã de conhecer pormenores, não passou pela cabeça de Descartes e seus cometas reverem a possibilidade do átomo, tampouco a do vácuo ou mesmo imaginar uma possibilidade de condutividade espacial. Relatam-nos Coveney e Highfield: “Os atomistas também usaram os átomos para explicar fenômenos sensoriais como o paladar e o olfato. Infelizmente as idéias deles foram lançadas ao esquecimento pela influência nefasta de Platão e Aristóteles. Os pais da filosofia ocidental argumentavam que a matéria conseguia se dividir infinitamente e que não existia nenhuma unidade, por menor que fosse que não pudesse ser dividida ainda mais. O atomismo foi derrotado e permaneceu nas sombras durante 2.500 anos.” (27) A física nuclear Anna Lemkow também levanta o alto custo da experiência: “Podemos julgar uma filosofia por seus frutos. A visão reducionista-mecanicista-materialista cultivou inúmeras dicotomias, cismas, fragmentações, alienações: alienação de si (o vácuo espiritual) e, por conseqüência, dos outros; alienação da natureza (autômatos não podem sentir muito por outros autômatos - se somos apenas máquinas, podemos muito bem nos apoderar do máximo possível, conquistar e explorar a natureza por completo); a dicotomia entre conhecimento e valores, meios e fins, mente e matéria, universo de matéria e universo de vida, entre ciências e humanidades, entre ricos e pobres, industrializados e de Terceiro Mundo, entre gerações presentes e gerações futuras.” (28) “Descartes deu início ao que veio a ser chamado dualismo cartesiano - a incomensurabilidade de mente e matéria, corpo e mente, observador e objeto, que dominou,- e enfeitiçou - o pensamento filosófico e científico até os nossos tempos”. (29) Parte do pensamento filosófico e científico, entretanto, conseguiu se safar; John Locke, o construtor da democracia britânica e Adam Smith, (1723-1790) o mais notável arquiteto econômico que produziu a civilização, aos quais dedicaremos obra completa, logo perceberam as armadilhas, a falsidade das premissas que teciam a base cartesiana: “Foi igualmente pela recusa do dualismo cartesiano, e pela defesa da observação e da análise contra o espírito sistemático que Locke se impôs como um “mestre de sabedoria” aos filósofos franceses do século XVIII.” (30)

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O depoimento de Smith simplesmente antecipa as preocupações e as provas que seriam oferecidas por Einstein: “Um sistema de filosofia natural pode parecer muito plausível, encontrar uma recepção generalizada no mundo e mesmo assim não ter fundamento sobre a natureza, nem guardar nenhuma espécie de semelhança com a verdade. Por quase todo um século, uma nação muito engenhosa considerou os vértices de Descartes uma explicação bastante satisfatória para as revoluções dos corpos celestes. Entretanto, a humanidade se convenceu com a demonstração de que as supostas causas desses efeitos maravilhosos não apenas não existiam de fato, como eram absolutamente impossíveis, e, caso realmente existissem, não poderiam produzir os efeitos que lhes eram atribuídos.” (31) A Teoria da Relatividade, a ciência nuclear e a realidade virtual, visivelmente demonstrada em qualquer monitor, consagram Locke, Smith e atestam a impropriedade metodológica cartesiana. Por ironia, é a própria ciência que, pela mesma cadeira matemática endeusada, deparou-se com a paradoxal impossibilidade da verdade absoluta: “Outra noção que chegou ao mundo da ciência como um soco no estômago, trazida pela Teoria do Caos, foi o reconhecimento de que, a partir de uma certa escala de considerações, é impossível separar as coisas, resolvê-las individualmente e depois tornar a juntá-las para obter a solução final. Idem para a proporcionalidade de causa e efeito. Causas pequenas se amplificam em efeitos catastróficos.” (32) Não nos seria lícito e muito menos justo, todavia, simplesmente lançar às chamas todo o trabalho e técnica empregada, esforços aperfeiçoados e exercitados por mais de três séculos. O apoio logístico cartesiano serve à investigação e ao conforto. Inúmeras dessas ferramentas foram e serão, reconheça-se, essenciais para o desenvolvimento da vida e da mais avançada ciência. Por seu método alcançamos construir nossas moradias e velozes veículos; a correlação algébrico-geométrica, traduzida atualmente como geometria analítica, permite à NASA o sucesso de suas empreitadas; a biologia, a medicina em geral, diante às prementes soluções que se vêem envoltas, nele se agarram desde a primeira lição. A matemática e a exumação esbanjam resultados, importantes e necessários, até para o trivial. Quase tudo se deve ao método, impossível pensar em sua ausência... provocaria um buraco negro na existência da civilização. Em nome do atual estágio científico e social, porém, urge enfatizar: Descartes se equivocou nas premissas, por incompletas e preconceituosas. O tempo, malgradas coincidências, não é tão toscamente engrenado tal qual relógio, quando se sabe que depois das tres, vem as quatro. São apenas convenções. Nem

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satélites, tampouco computadores podem descrever o que virá. Certamente nunca conseguirão. O futuro é delineado a cada instante, pela natureza e por cada um de nós, ao preenchermos a tábula rasa de Locke na unidade cósmica de Einstein.

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Capítulo II NO RASTRO DO LEVIATÃ

Perdendo a pátria o antigo perde tudo, bens, família, liberdade e religião, pois além dos muros urbanos cada homem passa a ser estrangeiro, sem defesa, exposto à ira dos inimigos e de seus deuses, sem direitos, podendo ser morto ou reduzido a escravidão.

Fustel de Coulanges (1)

Estado: dominação dos perversos. Leon Tolstói (2)

Duas estratégias de domínio da natureza, específicamente

domínio sobre uma parte da natureza, a dos seres humanos, surgiram de modo simultâneo e complementar. A primeira, “Seis Livros da República”, de Johannnes Althusius (1557-1638) até hoje obtém êxito:

“Assim como o navio não é mais do que madeira, sem forma de embarcação, quando lhe tiramos a quilha, que sustenta o costado, a proa, a popa e o convés, também a República, sem um poder soberano que una todos os seus membros e partes, e todos os lares e colégios, num só corpo, não é mais República.” (3)

O sociólogo professor Doutor Fernando Henrique Cardoso, Honoris Causa pela Universidade de Bologna, dentre várias, soube comparar: “A Economia não é uma ciência exata. É uma espécie de navegação. O importante é não encalhar nos bancos de areia.” (4) Infelizmente, depois que assumiu o timão sua Excia., estamos encalhados não num banco de areia, mas no banco Central, iceberg do mar de lama; e nosso navio, com o casco furado e luz apagada, melhor seria se não tivesse quilha. Convém trazer, en passant, o desconcertante diálogo entre Alexandre e um pirata, trazido por Bobbio: “Tendo-lhe perguntado o rei por qual motivo infestava o mar, o pirata respondeu com audaciosa liberdade: ‘Pelo mesmo motivo pelo qual infestas a terra; mas como eu faço com um pequeno navio sou chamado de pirata, enquanto tu, por fazê-lo com uma grande frota, és chamado imperador”. (5)

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O advogado Jehan Bodin (1530/1596) nascera um pouco antes de Althusius, a tempo de ser cognominado “pai” do governo absoluto. Na respeitável observação do senador italiano Norberto Bobbio, este é mais relevante do que Althusius e até mesmo do quase contemporâneo Maquiavel: “A obra mais importante do período de formações dos grandes Estados territoriais é De La Republique, de Jean Bodin.” (6) O rigor e a lógica da soberania de Bodin só se põem verdadeiros na relevância da indivisibilidade(7) do poder, algo que seria, também duzentos anos depois, revivido pelo patrício intelectual Rousseau, e sua criação prática, Napoleão; depois desta dupla, pelo filósofo da catástrofe, Hegel e seus executores Lenin, Stálin, Hitler e Mussolini. Dividir o poder seria dissolvê-lo; coesos marcharam hipnotizados nazistas e soviéticos, mesmo sem nenhuma dinastia a encantá-los, exceto a utopia impregnada. O Estado só poderia servir forte e centralizado: “A responsabilidade absoluta do soberano exige e pressupõe a dominação absoluta de todos os sujeitos.” (8) “É necessário que os soberanos não estejam, de forma alguma, sujeitos às ordens de outrem e que possam dar leis aos súditos, quebrando ou aniquilando as leis inúteis para fazer outras...” (9) A legislação de outrora, quase toda lastreada nas formulações do Direito Romano, de Aristóteles e de Santo Tomás de Aquino, se esvaiam execradas, pisoteadas. Tornavam-se, pois, inúteis. Legislar, verbo originário de legere - leitura daquela natureza - pela pena racionalista virava facere, agere, no canto positivista. Ética, se havia alguma, viu-se envolta pela interessante mística: “...mesmo os ateus estão de acordo acerca de que não há coisa que mais mantenha os Estados e as Repúblicas do que a religião, e que esse é o principal fundamento do poderio dos monarcas, da execução das leis, da obediência aos súditos, da reverência dos magistrados, do temor de proceder mal e da amizade mútua para com cada qual; cumpre tomar todo o cuidado para que uma coisa tão sagrada não seja desprezada ou posta em dúvida por disputas; pois deste ponto depende a ruína das Repúblicas.” (10). O trem políticoplatônico havia sido reanimado por Descartes: “A idéia cartesiana de um Deus legislador, por exemplo, aparece somente depois da teoria de Jean Bodin sobre a soberania.” (11) No esquema infalível do Vaticano, a França recebeu o absolutismo aperfeiçoado na ascendência do Rei Francisco I (1515-1547), seguido pelo duque de Guise - chefe da fação católica mais fanática; depois, Catarina de Médici, pupila de Maquiavel, a regente responsável pelo extermínio de milhares de huguenotes na famosa noite de São Bartolomeu, em 24 de agosto de 1572. Na Guerra dos Cem Anos, sobrou um aumento sempre crescente de poder. Richelieau, outra versão francesa do maquiavelismo, levou a idéia da razão de Estado na busca de

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fazer da França a maior potência européia, no que o seguiu Colbert, ambos responsáveis diretos pelo mercantilismo francês. Na Guerra dos Trinta Anos o objetivo se pensara alcançado e o reinado viu-se mais forte. Há sempre que se considerar, além da costumeira má-fé de inúmeros aspirantes, a óbvia ignorância dos responsáveis pela sobrevivência das gentes, os operadores do festival de barbarismos apontados pela história. Embora embriões da sociedade civil, já vimos sobejamente que os sistemas se baseavam na força bruta. Governos não podiam titubear, discutir. Suas respostas, levando sempre em conta as invasões, deviam ser prontas e objetivas. O “inimigo comum” estava perfeitamente identificado; imperioso liquidá-lo. A insegurança disseminada, de propósito ou não e a necessidade premente de união para enfrentar a ficção ou a circunstância faz a teoria absolutista girar pelo tempo e espaço. Sagazes dela se locupletam para sedimentarem escusos arquétipos. Bodin continua saboreando homenagens: “Suas teorias tiveram grande repercussão na França e na Inglaterra, perdurando ainda hoje. Sua obra exerceu influência nos escritos de Hobbes e Filmer.” (12) Que crédito científico pode merecer essa sociologia, essa ciência política amante de “divindades” reais e lucros irreais?

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Capítulo III O AXIOMA DO MÊDO

Sim, antes da cultura, o mundo sonhou muito. Os mitos saíam da terra, abriam a terra para que com o olho dos seus lagos ela olhasse o céu. Um destino de grandeza escalava abismos. Os mitos atingiam assim imediatamente uma voz de homem, a voz do homem que sonha o mundo dos seus sonhos. O homem exprimia a terra, o céu, as águas. O homem era a palavra desse macro-anthtropos que é o corpo monstruoso da terra. Nas fantasias cósmicas primitivas, o mundo é corpo humano, olhar humano, sopro humano, voz humana. Quem poderia convencer um sonhador de cosmos que a terra gira sobre ela mesma e de que ela voa pelos céus? Não se sonha com idéias ensinadas.

Gaston Bachelard (1)

Foram os estóicos os iconoclastas da tribo orgânica.

Universalizaram o homem no seu valor individual. Para Sêneca, o ser iluminava-se pela alma. Comenta Foucault:

“Pode-se dizer que, em toda a filosofia antiga, o cuidado de si foi considerado, ao mesmo tempo, como um dever e uma técnica, uma obrigação fundamental e um conjunto de procedimentos cuidadosamente elaborados”(2).

Com o descobrimento, entretanto, desaparecia a filosofia antiga e, por consequência, a estóica; junto, o indivíduo. O descortínio de um mundo tão grande, tão vasto, reduziu o ser a insignificante tamanho, próprio a ser tragado a granel pela garganta do bem superior, o Estado e seus eventuais governantes. A liberal Holanda curiosamente deu o primeiro passo à diplomacia mercantilista ensinando o caminho mais rentàvel às Índias:

“Os Portugueses monopolizaram o comércio das Índias Orientais durante cerca de um século, e só indiretamente e através deles é que as outras nações europeias conseguiam enviar ou receber bens desse país. Quando os Holandeses, no início do século passado, começaram a intrometer-se, os Portugueses outorgaram todo o comércio das Índias Orientais a uma companhia exclusiva. Os Inglêses, Franceses, Suecos e Dinamarqueses seguiram todos este exemplo, de modo que nenhuma grande nação europeia se beneficiou ainda da liberdade de comércio para as Índias Orientais.” (3)

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A Inglaterra se enrolava nos percalços de Cromwell e acabou por aderir ao toque determinista-mercantilista que ecoava cada vez com maior ímpeto. Havia muitas descobertas, geográficas, científicas e, principalmente, econômicas. Só novas instituições é que poderiam enfrentar o novo quadro, sob pena da perda total de controle. Nesse ambiente vieram ao mundo as primeiras companhias privilegiadas inglêsas - dádivas do soberano a seus amigos e parentes; e, graças aos privilégios, a Companhia Inglêsa das Índias Orientais pode fincar sua administração no seio da Índia, açambarcando o imenso território como se fosse sua propriedade natural, aventura de duzentos anos. A Companhia da Baía de Hudson colonizava o Novo Mundo; a Companhia de Plymouth seguia-lhe os passos; a Companhia de Londres formava o quarteto de maior realce.

A Espanha levava a vantagem inicial pelo domínio da inesgotável fonte da América Latina. Não necessitavam seus governantes muita criatividade para tratar do ingresso de divisas no País, exceto para enganar e depois dizimar o povo inca. Felipe II, “O Torturador”, mantinha fortíssimo controle sobre o comércio e a agricultura, até porque daí saía a alimentação para o enorme contingente requisitado na formação da “Invencível Armada”. Foi quando um grande retrógrado e sofista da ciência política inglêsa dava o primeiro e último suspiro no fog democrático que Manchester estava prestes a plenamente respirar. Na pole position da infortunada disseminação, Thomas Hobbes (1588-1679), famoso criador do Estado Leviathan, no dizer de Bobbio, “o maior filósofo político da Idade Moderna, até Hegel”(4).

Robert A. Nisbet quase concorda: “poucos são os escritores que tiveram maior influência do que Hobbes no desenvolvimento do moderno Estado centralizado.” (5) As contribuições dos cidadãos inglêses para com a Coroa, mesmo com a avalanche de argumentos bélicos, eram controladas, restritas pelo Parliament; assim declarava a Petição de Direito, de 1628. Pela metade do século, a moderna democracia engatinhava célere, exercitando libertar-se de intempéries políticas e barbarismos governamentais, mas a brasa da tirania reascendeu pelas mãos do segundo Stuart, Carlos I. O déspota sabia como sugar recursos provenientes do suor alheio, contornando o poder legislativo ao revigorar leis obsoletas, multas por descumprimentos e tungas diversas, especialmente as ship moneys *.

Stuart culminou a afronta ao anglo-cidadão com a coincidente simpatia ao monopolismo católico-romano. * Ship moneys : Contribuição pecuniária compulsória à construção de navios.

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A guerra civil precipitou-se levada a cabo pelo destemido puritano deputado Cromwell, primeiro e único verdadeiramente “ditador” conhecido em terras inglêsas, glória de Hobbes (6).

O próprio Bobbio relembra como “as primeiras histórias das instituições foram histórias do direito, escrita por juristas que com frequencia tiveram um envolvimento prático direto nos negócios de Estado.” (7)

Não nos é tão difícil remeter a imaginação àquela época, a fim de aferir a intensidade do obscurantismo e conseqüentes rapinagens predatórias. Como morcego, o imperialismo preconizado por Maquiavel e agora por Hobbes fazia da escuridão geral seus instantes prediletos.

Thomas Hobbes tinha nascido de parto prematuro, quando da aproximação da Invencível Armada à costa britânica. A mãe dava à luz a um semi-macunaíma e o pai “ foi um vigário de pouca cultura e temperamento violento, que desapareceu em Lonres quando Hobbes ainda era criança”. (8)

O filho do vigário cresceu em Oxford, para depois ser estigmatizado por outras atrozes coincidências: embora amigo íntimo dos Stuart (pelo menos se passava com tal) e até tutor de Lord Cavendish, presenciou a conspiração de Poudres, em 1605; o assassinato de Henrique IV, (1610) em Paris; as execuções de Strafford e Laud, a derrota naval de Naseby (1645); por fim, estava presente na execução do próprio “amigo” Carlos I (1648), para a ascensão do encomendado Oliveiros Cromwell:

“Hobbes, que havia freqüentado assiduamente a corte fazendo-se passar por matemático (mesmo que pouco soubesse dessa disciplina) se desgostou ali, regressou à Inglaterra nos tempos de Cromwell e publicou uma obra muito malvada, de título muito raro: Leviathan. Sua tese principal era de que todos os homens atuam devido a uma necessidade absoluta, tese apoiada, aparentemente, pela doutrina dos decretos absolutos, doutrina de geral aceitação nesses tempos... Sustentava que o interesse e o mêdo eram os princípios fundamentais da sociedade...” (9) Chevallier complementa: “Hobbes justifica racionalmente o poder absoluto, a partir duma concepção puramente materialista da natureza do homem, egoísta e perseguido por fobias.” (10) Bemvindos eram os avalistas à essa pretensa verdade objetiva : “Nos primeiros anos, fez tres viagens de estudo ao Continente (1610-1613, 1629-1630, 1634-1637) que lhe permitiram entrar em contato com os grandes filósofos e cientistas da época (aproximou-se de Descartes e Galileu).” (11)

Russel levanta: “Durante esses anos em Paris, mais uma vez associou ao

círculo de Mersenne e conheceu Descartes...A admiração de

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Hobbes pela matemática era maior do que sua habilidade nessa ciência, e o professor facilmente venceu a controvérsia.” (12)

Na grande ilha, Hobbes chegou a conviver com outro belo par - o carrasco da natureza:

“Thomas Hobbes é outro filósofo cuja vida está vinculada à monarquia inglêsa; não menos que a Bacon, a política e as intrigas da Corte afetaram sua existência e, sem dúvida, também seu pensamento filosófico. Pelo relato de um antiquário seu contemporâneo, sabe-se que Hobbes, em certas ocasiões entre 1621 e 1625, secretariou Bacon ajudando-o a traduzir alguns de seus Ensaios para o latim. “ (13) Quem poderia melhor entender estes movimentos? Enquanto aguardava sua oportunidade, Thomas atravessava o canal da Mancha, para se alojar declaradamente entre os fãs de Descartes. Wilson de Lima Bastos levanta sua eloquente ficha: “Sucessor de Bacon, sofreu influência da filosofia matemática de Descartes e afirmava que toda a substância é corpórea e todos os fenômenos se reduzem a movimentos. Foi adepto da moral utilitarista.”(14) Até Engels pode reconhecer suas raízes: “Hobbes sistematiza o materialismo de Bacon. A sensoriedade perde seu brilho e converte-se na sensoriedade abstrata do geômetra. O movimento físico sacrifica-se ao movimento mecânico ou matemático, a geometria é proclamada à ciência fundamental...” (15) Confuso em pensamento, em discurso, em desejo, encarando o rigor mecanicista das forças naturais, Hobbes só podia mesmo conceber o “homem-máquina”, produto da circulação de seu sangue, movimento “animal” um pouco diferenciado porque “suscetível a paixões e vontade pelo lado interno, recebendo impulsos provocados por corpos em ação externa,” configurações tipicamente dialéticas e cartesianas que os trens da psicologia e da tirania souberam muito bem transportar ao longo dos séculos: “O conceito de pessoa cede lugar ao de máquina; desse modo, o Estado poderá ser figurado como o primeiro produto artificial da idade moderna, que será chamado precisamente de idade da técnica. E a partir dessa figuração do Estado como máquina, inicia-se certamente aquele processo de tecnicização do Estado, pelo qual este último - tornando-se independente de qualquer conteúdo político ou convicção religiosa - converte-se em Estado neutro, em Estado com mecanismos de comando. Eis-nos, assim, pela primeira vez, diante do Estado moderno... do positivismo jurídico, que está a milhares de quilômetros do Estado medieval...” (16) Chevallier o entende: “É fruto da curiosa combinação de um potente e rigoroso espírito, fanaticamente mecanicista, com as obssessões de um

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coração cheio de temor, ávido de paz para si próprio, como para seu país.” (17) Russel enfatiza: “Assim como Galileu e Descartes, Hobbes sustenta que tudo o que experimentamos é causado pelo movimento mecânico dos corpos externos...” (18) Se para Jean-Baptiste Rousseau a filosofia de Descartes cortara o pescoço da poesia, a filosofia de Hobbes “foi pior ainda”: “Para ambos a tarefa da filosofia foi de reduzir tantos fenômenos como fora possível a um sistema de explicações baseado nas leis de movimento... Para Hobbes, Deus não era mais do que o primeiro motor, o primeiro passo de uma cadeia causal que uma vez em movimento não necessitava maior ajuda.”(19) O transplante foi desastroso: “A concepção do universo que por sua influência alcançou aceitação geral era um mecanismo dirigido por princípios matemáticos e falta de cor, perfume, sabor e som. A ciência havia estendido os limites do universo, mas convertido em máquina sem vida, que marchava de acordo com forças capazes de ser formuladas matematicamente, não a expressão poética”. (20) Ralph Cudworth protesta: “Criaram um mundo morto e de madeira, como se fora uma estátua talhada, sem nada vital nem mágico nele, em nenhuma parte.” (21) Hobbes se interessou pela moral e política objetivando emprestar-lhe aquele estatuto científico, mecanicista, utilitarismo tão bem apanhado por Bastos: “O essencial para Hobbes não era a desmistificacão do poder, mas antes a representação da ordem política como um gigantesco autômata, que autorizaria a intervenção de técnicos qualificados. Governantes sensatos, inspirados pela razão científica, poderiam modificar o curso da vida social num sentido favorável a maioria dos interessados”. (22) Para tanto, nada mais exato do que a matemática, a geometria, aquela que ele mesmo diz ser “a única ciência que até agora Deus quis presentear o gênero humano... cujas conclusões tornaram-se atualmente indiscutíveis.” (23) Por isso suas aventuras no campo: “Sabe-se que Thomas Hobbes ficou fascinado pela geometria euclidiana.” (24) O protótipo mecanicista-social veio no Short Tract on First Principles, de 1630: “À maneira de Descartes, mas antes de Descartes, conforme prova claramente esta obra, ele concebe o mundo nos termos de um estrito mecanismo, em termos de movimentos que caracterizam corpos definidos pela sua extensão e forma.” (25) Thomas, como os dedicados de então, indicava o próprio homem como repositório de mecanismos. Nossas ações seriam previsíveis porque se pensava restritas a apetites ou aversões à

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matéria, tudo embrulhado no puro e primário empirismo*; mas combinava. Marx não o menciona, mas a afinidade é evidente por vários ângulos: “Materialista inveterado, Hobbes via tudo como tangível e todos os fatos como mecânicos” (26) O homem dotado de razão é o único capacitado a operar cálculos. “Ratiotinatio est computatio”. Então, o que o platônico Euclides fizera para a geometria, Galileu para a física, Descartes para ambos, julga-se Hobbes à altura para revolucionar a política, coroando-a com a pretensa cientificidade que reduz a nação à mera engrenagem, já velha analogia do relógio, machina machinarum: “Na própria introdução ao De Cive declara que, para se conhecer uma coisa, é preciso conhecer os elementos de que ela é constituída, dando o exemplo do relógio, cujo funcionamento só pode ser plenamente compreendido quando desmontamos.” (27) Os ensinamentos foram exercitados em Paris (1646), ao futuro rei Charles II, na França também de quarentena. Como Bacon e Maquiavel, Hobbes gravitava em torno do poder, mesmo virtual, não hesitando em professorar essa matéria cuja essência arranhava, mas os franceses souberam discriminá-lo. Foi logo visto como oportunista e repudiado até por outros exilados, enquanto o governo francês o tinha sob suspeita devido a seus ataques ao papado. Em 1651 apresentava o resultado dos mirabolantes cálculos: The Leviathan. Em fins do mesmo ano Hobbes consagrar-se-ia pioneiro da sociologia positivista, ao galante de Cromwell: “De volta à Inglaterra, tornou-se um dos precursores do materialismo positivista, considerando a filosofia como uma espécie de matemática, que soma, subtrai, combina e separa as coisas suscetíveis dessas operações.” (28) Somada ao grave equívoco metodológico, a traumatizada sensibilidade pessoal foi, inevitavelmente, alocada a serviço da sua “produção teórica”: “O medo constante de uma morte violenta impede a humanidade de respirar.” (29) Ele próprio não teve escrúpulos em esconder: “O temor e eu somos irmãos gêmeos” (30). _______________________________________________________ *Empirismo: "O empirismo sustenta que toda a afirmação para que expresse conhecimento está limitada por algum processo experimental"; Hayek, Friedrich August von, Os erros do socialismo - Arrogância Fatal - p. 88; Empirismo: "Doutrina, defendida em particular por D. Hume, segundo a qual qualquer conhecimento deriva da experiência, e apenas dela", Lacoste, Jean, "A Filosofia no Século XX", p. 223.

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Que belo motivo para uma ciência política. Trevor Roper sintetiza este programa (problema) mental de Hobbes, o qual tomamos emprestado para anúncio do capítulo, com as consequências: “O axioma, o medo; o método, a lógica; a conclusão, o despotismo.”(31) Sem dúvida que os traumas pessoais foram preponderantes na formulação teórica desse triste sujeito. A presunção de reincidência dos infortúnios vividos só poderia excluir a democracia e a liberdade, como assegura Dewey: “Um empirismo que se contente com a repetição dos fatos passados não encontra possibilidade para a liberdade”.(32) Decerto ele nem sabia o que com ela fazer: “A tradição de Hobbes nunca concebia a imaginação como força criadora. Para Hobbes a mente humana, como o universo, é uma simples máquina, e de uma máquina não cabe esperar nenhuma criação.” (33) As fontes de Bodin e Bousset continuavam usadas a justificar a pretensa lógica do Estado absolutista para a defesa da população. Na imprescindível religião, o “Rei divino” defenderia o povo diante das fatalidades impostas pelo espírito “maligno” do indivíduo. Nos trinta anos de reinado católico dos sucessores Charles II e Jaime II invocou-se a autoridade religiosa para a imposição dos respectivos desmandos, mas coube a Cromwell, armado por Hobbes, impor a doutrina de Bodin e Boussuet: “Afirmando que a autoridade provinha de Deus, ele restabeleceu o que praticamente equivalia ao direito divino dos reis.”(34) Além de Deus, portanto excedendo a Verdade, o simples capricho real já determinava a obediência incondicional: “Autorictas, non veritas, facit legem.”* (35)

O individualismo benevolente e confiante do internacionalista Hugo Grotius diluia-se no pessimismo dito realista de Hobbes: “Retirem seja de que Estado for a obediência (e conseqüentemente a concórdia do povo) e ele não só não florescerá, como a curto prazo será dissolvido. E aqueles que empreendem reformar o Estado pela desobediência verão que assim o destróem”. (36)

Para melhor aquilatarmos a preponderante mediocridade que comandou o raciocínio de Thomas Hobbes, vejamos a seqüência do seu pensamento pelo detalhista Prelot:

“A essência da natureza humana é o egoísmo e não a necessidade altruísta da vida em comum.

___________________________________________________

* Autorictas, non veritas, facit legem: É a autoridade, e não a verdade, quem faz as leis.”

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Quando o homem procura a comunidade, não o faz a fim de conseguir a sua realização pessoal, ou, como pensava o fundador da Escola, em virtude de uma tendência natural que o faz procurar seus semelhantes, mas unicamente com vista ao seu próprio interesse... nasce do temor mútuo que existe entre os homens, e não da boa vontade mútua.” (37)

Não é o que pensa o notável neurocientista chileno Humberto Maturana, por exemplo: “A constituição biológica humana é a de um ser que vive no cooperar e compartir, de modo que a perda da convivência social traz consigo doença e sofrimento.” (38)

Giddens também desfaz a confusão de Hobbes: “No entanto, o egoísmo deveria ser distinguido do individualismo, que nem brota dele, nem (necessariamente) leva a ele.” (39) Tanto para o novo maquinista do Estadomonstro, como para Maquiavel no século anterior, o povo deveria conceder tudo ao soberano, em troca da segurança. Noutras palavras: cabia a cada um anular-se diante do bem comum a ser preservado. A sociedade vista por Hobbes é a mesma massa ignorante, irracional: “Nas sociedades dos irracionais (das abelhas, formigas, térmitas, etc.) a defesa da espécie parece ser o objeto soberano. Desinteressada e indiferente, mantém-se a comunidade, ante a sorte individual de seus componentes. Em verdade, nesses agrupamentos, os indivíduos são apenas partes de um todo e, em conseqüências, integralmente submetidos aos interesses da sociedade global. (40) Thomas não conheceu Marilyn: “Uma formiga submete-se a seu destino; um ser humano modela o seu.”(41) Toynbee não perdoa o absurdo: “Em termos religiosos, este tratamento do indivíduo, considerado simplesmente como parte da comunidade, é uma negação da relação pessoal entre a alma e Deus e uma substituição do culto de deus por um culto da comunidade humana - o Leviathan, isto é, a repulsa ao isolamento que está onde não devia estar... O culto do Leviathan é uma enormidade moral, (no sentido de um grande absurdo ou de uma anomalia moral) mesmo em sua forma mais nobre ou suave.” (42) O Leviathan (presumia-se) só poderia realizar o bem à nação; afinal, ele era “a razão em ato”.(43) Dessa máquina perfeitamente racional, lógica, ordenada e completamente governada saiu a fumaça que contaminou a capacitada mente de Hegel e o “cientismo marxista” (44) ou, quiçá mais apropriado, “marxiano”, ou, ainda, “marciano”, pelo que possui de inusitado e desumano. Acreditava Hobbes que o povo não teria razão de queixa quando um governante se tornasse um tirano, pois este seria escolhido “democraticamente” pela designação da maioria. Em De Cive, por dois capítulos, no primeiro e segundo, ele sai rechaçando a

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formação e a vigência de partidos, factions or conspiracies, virtuais desestabilizadores. Ingenuidade ou esperteza? Em 1640, em The Elements of Law Natural and Politic, o “filósofo do medo” chegara à célebre conclusão: homo homini lupus.* De Cive saiu dois anos depois; daí ao Leviathan, foram nove anos de pensamentos pessimistas e mau juízo sobre nossa natureza: “O Estado de Natureza descrito por Hobbes é aquele em que cada um vive por sua conta e precisa cuidar da própria defesa, pelo que termina em uma guerra de todos contra todos”.(45) Einstein, em tese, pode explicar: “Com o homem primitivo é acima de tudo o medo que invoca noções religiosas - medo de fome, bestas selvagens, doença, morte. Já que nesse estágio da existência a compreensão das conexões causais é geralmente pouco desenvolvida, a mente humana cria seres ilusórios mais ou menos análogos a ela mesma, de cujas vontades e ações dependem esses acontecimentos temerosos...” (46) A superstição, as crenças infundadas já vinham atravessando gerações: “A afirmação mitológica da maldade inata na natureza humana encontra-se, como se sabe, na Bíblia. Ela está explicitada no episódio de Caim e Abel, como corolário da tese do Pecado Original; e foi filosoficamente elaborada por Santo Agostinho.” (47) Na queda religiosa, o medo recíproco e generalizado poderia ser minimizado com a praticidade leviatânica. Taine desconsidera essa “natureza” humana sentida por Hobbes: “O homem não é inimigo do homem a não ser por meio de um falso sistema de governo.”(48) A consequência do “falso sistema” pilhado por Taine foi lamentada por Bertrand de Jouvenel: “O Minotauro é um protetor sem limites, mas, por isso mesmo, autoritário sem limites (...) As pessoas têm o sentimento de que já não há espaço para o que dantes se chamava de vida privada.” (49) Manuel da Costa Andrade reitera: “Nada, por isso, mais instante e mais oportuno do que a proclamação e apelo para a dignidade humana como valor polar da ordenação constitucional”. (50) Estaria Hobbes, contudo, interessado numa produção constitucional? Além de abominar partidos, ele não vislumbrou nenhum papel ao Judiciário. O estado civil só seria possível mediante a condução paternalista autoritária, por isto também exclusiva, do Poder Executivo. ____________________________________________________ * Homo homini lupus: o homem é lobo do homem.

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A prepotente e covarde antítese proposta - Estado x cidadão - tornava cada vez mais nítida a discrepância da contenda. O cidadão sucumbia diante do todo, em nome do todo, pela segurança do todo, “legitimado pela maioria.”, embora para Thoreau e para muitos a maioria governe não porque possui “maior probabilidade de estar com a razão, nem porque isso pareça mais equitativo para com a minoria, mas porque é fisicamente mais forte...” (51) A célebre obra tem o título extraído da Bíblia - O Leviathan - termo citado em Jó (41:1) e nos Salmos (74:14, 104:26) - “uma espécie de crocodilo, dragão, baleia ou serpente marinha,” como aduz J. Penna (52). A capa original traz o desenho do monstro formado por uma multidão de indivíduos microscópicos grudados como sanguessuga no corpo do boi. O modelo mostra a certeza da onipresença salvadora do soberano e seu Estado, montado e mostrado como uma engenharia perfeitamente organizada, apta a prestar socorro contra aquela natureza perversa do semelhante: “É como um gigante constituído de homens comuns, um Leviathan. É maior e mais poderoso do que o homem e, por conseguinte, é como um deus, embora compartilhe com os homens comuns a mortalidade.” (53) Penna aprimora o liame: “A afirmação mitológica da maldade inata na natureza humana encontra-se, como se sabe, na Bíblia. Ela está explicitada no episódio de Caim e Abel, como corolário da tese do Pecado Original; e foi filosoficamente elaborada por Santo Agostinho.” (54) Tudo veio mesmo relembrado pelos pregadores católicos da Idade Média, mormente quando Aurelius Augustinos * valorizou o sino daquele pecado original e da essencial maldade do homem enquanto habitante da Terra: “Está escrito que Caim fundou uma comunidade; mas Abel não fez o mesmo, fiel ao seu caráter peregrino e de hóspede temporário. É que a Comunidade dos Santos não é deste mundo, embora aqui tenha dado origem a cidadãos através dos quais se realiza sua peregrinação até que chegue o tempo de seu reino, quando todos se congregarão” (55) Até lá, mister, a presença do grande protetor substituto, o Estado e seus tentáculos que penetram as veias sociais a rientar, defender, prover e congregar: “Recordem o esquema do Leviatã: enquanto homem construído, o Leviatã não é outra coisa senão a coagulação de um certo número de individualidades separadas, unidas por um conjunto de elementos constitutivos do Estado; ____________________________________________________ Aurelius Augustinos : Verdadeiro nome de Santo Agostinho.

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mas no coração do Estado, ou melhor, em sua cabeça, existe algo que o constitui como tal e este algo é a soberania, que Hobbes diz ser precisamente a alma do Leviatã”(56) Einstein rechaça a premissa usada por Bodin, Boussuet e Hobbes: “É nisso que aqueles que se empenham em melhorar a sorte do homem podem fundar suas esperanças: os seres humanos não estão condenados, em razão de sua constituição biológica, a aniquilar uns aos outros ou ficar a mercê de um destino cruel que eles mesmos se afligem.” (57) Einstein, entretanto, sequer estava nos planos; Cromwell estava. Ungido na sagração indireta, pelo Parliament, na qualidade de membro, aí obteve seu maior triunfo, do qual soube dispor o demagogo deputado para assumir o total poder inglês. O governante absoluto agora poderia ser escolhido pelo próprio povo, diferentemente da linha eletiva por hereditariedade real sugerida por Maquiavel, Boussuet e Bodin, embora até então propugnasse o filósofo do medo pela soberania real. O direito divino foi direito à morte: “Uma cabeça de rei cortada: espantoso sacrilégio que pudera ser cometido sem que o fogo do Céu aniquilasse imediatamente os culpados!” (58) Descreve-nos sobre o significado dessas confusões o prof. Rohden: “O conceito espiritual do reino de Deus degenerou numa instituição eclesiástica, jurídica, política, militar, financeira que, substituindo a força do espírito pelo espírito da força, fez da Civitas Dei uma Civitas Terrena, com o agravante que esta cidade terrena é acintosamente proclamada como sendo a cidade de Deus.” (59) Todos possuiam sobradas razões para se resignarem com o pressuposto de que o estado natural do homem seria a guerra. De fato, não foram poucos os quadros tingidos com sangue, mas isso poderia ser bloqueado ou abandonado, rápido, no status civilis (60), ordem e obediência incondicional ao Estado. E foi com essa balela que Hobbes acabou influenciando, não só a vida imediata inglêsa, como até a França. Os ingleses atiraram a garrafa do gênio ao mar, mas na costa francesa Rousseau a cataria para destampá-lo, ensejando um “Cromwell” bem mais faminto - Napoleão Bonaparte. G. Davy corrobora-nos: “O De Corpore Político e o De Cive contém uma imensa quantidade de conceitos políticos em que se inspiraram, mais ou menos confessadamente (antes menos do que mais) tantos autores que se seguiram, a começar por Rousseau.”(61) Poder-se-ia aproveitar algo de Hobbes se ele não propusesse a confirmação da ciência pelo poder totalitário e neste ponto há uma concordância geral de muitos estudiosos, desde Tom Paine a Jacques Mourgon (62), mas a intenção era nítida: “A última

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conseqüência lógica da filosofia de Hobbes é o absolutismo estatal, a ditadura entronizada como lei suprema.” (63) Carl Schmitt (64) não deixa por menos: Hobbes foi, claramente, um precursor do totalitarismo; e liga-o com Maquiavel, Vico, Nietzsche e Sorel - ídolo e mentor intelectual de Mussolini. Joseph Viatoux confirma e acrescenta: “A doutrina do Estado de Hobbes é a mesma doutrina do Estado totalitário contemporâneo.” (65) Thomas Hobbes também foi pioneiro no empunhar a bandeira do altruísmo social, protótipo da ética utilitarista que sensibilizaria gerações futuras, mesmo inglêsas, a começar pelo mais ferrenho defensor do “utilitarismo” britânico, Jeremy Bentham. Ambos exibiam o mesmo desiderato, mas os fenômenos objeto de computação só poderiam ser, tão somente, aqueles produzidos pelas rudimentares ferramentas e parca imaginação. O raciocínio político encetado por cálculo, por tudo que pode ser “tomado em conta” só pode forjar um sistema de pensamentos encadeado num subjetivismo extremado: “O utilitarismo considera que o prazer e a dor são critérios que determinam a justeza da ação do indivíduo”. (66) Esta filosofia não pode ser mais preconceituosa. Sua tradução numérica não pode ser mais arbitrária. Hobbes e Bentham não souberam atentar para o fato de que tanto animais irracionais como o próprio homem são submissos a necessidades elementares, a instintos, mas o homem, embora repleto deles e de sentidos, é dotado de cérebro consciente. Como muito bem diz Japiassu, “a inteligência só pode aplicar-se à vida reconhecendo a originalidade da vida”. (67) Convém relembrar, por fim, a flagrante influência de Hobbes no pensamento de dois alemães defensores do extermínio - Hegel e Nietzsche. Rohden destaca o maniqueísmo estratégico, idêntico nas proposituras da dupla alemã: “A filosofia política de Hobbes culmina na conclusão de que “might is right” - poder é direito, sendo o Governo suprema norma ética, não havendo ética contrária a ele. O chefe de governo paira acima do bem e do mal. Tudo o que favorece o nacionalismo é bom; o que o desfavorece é mau. (68) Hitler e Mussolini estrelaram ótimas performances e ainda tiveram muitas crias. Destarte, de nação em nação, de continente a continente, as trágicas conseqüências foram gradualmente ampliadas, atingindo o ápice da performance em pleno século vinte, também o começo de seu declínio, depois de levar de roldão numerosos adeptos, ideólogos, interesseiros, oportunistas líderes políticos e inocentes povos, embarcados em inúmeras estações, rumo ao precipício da estupidez. O equívoco ou o ardil científico-filosófico oferecido por Thomas Hobbes foi por demais grandioso, no tempo e no espaço.

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Capítulo IV

O PARASITA

A ciência contém no seu método os germes que levaram as maiores aberrações como atividade social.

George H. Sabine (1)

Os livros de física, que vem sendo copiados uns dos

outros, pacientemente, fornecem aos nossos filhos uma ciência tão socializada, tão imobilizada que, graças a permanência curiosíssima dos concursos universitários, chega a passar por “natural”.

Gaston Bachelard (2)

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No continente europeu, o medo da morte, de saques e violências provocava o desespero de todas as gentes. Qualquer alienação era preferível ao terror, sacrifício à sobrevivência na guarida requerida por Maquiavel e, ultimamente, por Thomas Hobbes. O relativista sistema de Direito Natural * formulado pelas filosofias políticas de Locke, Spinoza, Lessing, Montesquieu e pelos vários artífices iluministas ficaria congelado na primeira moldura. ___________________________________________________

* Direito Natural: proveniente do jusnaturalismo, caracterizado por Norberto Bobbio "como a doutrina segundo a qual existem leis não postas pela vontade humana - que por isso mesmo precedem a formação de todo o grupo social e são reconhecíveis através de pesquisa racional - das quais derivam, como em toda e qualquer lei moral ou jurídica, direitos e deveres que são, pelo próprio fato de serem derivados de uma lei natural, direitos e deveres naturais." (Bobbio, Norberto, Liberalismo e Democracia, p. 12.) John Locke enalteceu o “Direito Natural” como a principal fonte, para não dizer a única científica, confiável e justa da própria Ciência Jurídica. Foi claro: “Se eliminas a lei da natureza, eliminas, ao mesmo tempo, entre os homens, toda a cidadania, todo o poder, a ordem e a sociedade”. (Locke, J., Essays on the law of nature, cit. Bobbio, Norberto, Locke e o Direito Natural, p.127) Baruch Spinoza antecipara-se na observação de que “ninguém transfere a outros o próprio direito natural de modo tão definitivo que depois não volte a ser mais consultado; mas o defere à parte maior da inteira sociedade, da qual ele é um membro.” (Spinoza, B., cit. Bobbio, N., Estado, governo, sociedade; para uma teoria geral da política, p. 145.) Alexis Tocqueville, já lembrando Montesquieu quando propugnara pela virtude, atributo sem o qual não pode haver o sistema democrático, enunciou o comportamento da cidadania pelas relações: “A idéia de direitos é meramente a idéia da virtude inserida no mundo político. Na base de tudo está a convicção, trazida pela longa experiência, de que os que possuem direitos são compelidos a respeitá-los, pois, no caso contrário, eles próprios serão os principais prejudicados. Dentro do contexto de democracia inglêsa, a liberdade política não estimula um individualismo arrojado. Ao contrário, ela reforça a coesão e a unidade da sociedade, pois somente os homens livres podem cooperar verdadeiramente.” (Tocqueville, A, American Democracy, p. 283; cit. Prof. Zevedei Barbu, apresentação de Tocqueville, A, O Antigo Regime e a Revolução, p. 17/18.) John Rawls oferece concernente apreciação: “Todas as formas de cooperação social legítima são portanto obra de indivíduos que nela consentem voluntariamente; não há poderes nem direitos exercidos legalmente por associações, inclusive pelo Estado, que não sejam direitos já possuídos por cada indivíduo que age sozinho no justo estado de natureza inicial.” (Rawls, John, Justiça e Democracia, p. 11.)

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Os povos, tratados como manadas, ou matilhas, deveriam estar unidos, dificultando predadores ou dividindo carniças. Para alcançar a meta e refrear este “homem lobo do homem”, mister um outro tipo de contrato (?!) no qual cada subscritor concordasse em renunciar ao direito de governar a si mesmo. Só um contrato no qual um dos contratantes deixava de sê-lo (?!), para entregar-se nas mãos de um gestor, tonificado e investido de um poder soberano ainda maior do que os antigos reis, porque proveniente da soma dos poderes de todos, imbuído da competência de a tudo julgar, de acordo com sua concepção (interesse), para a paz (guerra) de todos e comum defesa (ataque), é que poderia salvar a população. Na cascata de Bodin, o povo imaginou-se governante... com a sucumbência individual. Em lugar do bem inerente a cada nascido, levantado pelo Direito Natural, recomeçava a enxurrada de teorias utilitaristas de moral, política e valor econômico, tudo salpicado na abstrata bandeira do bem e da necessidade geral. Para encaminhar o lamentável destino, não faltou o voluntário conhecedor de alguns mapas de acesso à fornalha do fatídico trem. O coletivo e seu correspondente científico - o determinismo cartesiano - foram prestigiados com a força extraordinária de um insígne e letrado tripulante, conhecido “inimigo na trincheira” do Grupo Enciclopédia, “peso pesado” de fama mundial, freqüentemente tomado como um dos “iluministas”, mas que se fez como um dos maiores “corta-luzes”, quiçá principal responsável pela confusão que ainda perdura no conceito de democracia e que redundou no cobertor de todas as ditaduras que se seguiram, duzentos anos adiante, pelo mundo afora. As aventuras megalomaníacas tem tudo a agradecer a este excepcional sofista. Sua filosofia: a “lógica” político-matemática. Seu nome: Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Rousseau, desde o início assemelhado com Hobbes, também veio com sua vida pautada pelo desastre. Os sintomas patológicos foram equivalentes: “Rousseau alude expressamente ao medo da morte que, como em Hobbes, domina o homem. À natureza, diz, compele o homem usar todos os meios à disposição para escapar da morte.” (3) Já em seu nascimento Jean-Jacques convivera com a morte - a mãe era sacrificada. Crescendo, fracassou em quase todas ocupações. Pregava sublimes reformas educacionais, mas abandonou seus próprios filhos num asilo de enjeitados: “O verdadeiro erro de J.-J. Rousseau não foi o de ter entregue cinco crianças às Crianças Abandonadas, foi o de se ter deixado preceder, para manifestar esta verdade, pelo libelo anónimo, injurioso, que Voltaire escreve sob o título O Sentimento dos Cidadãos (1765): o tumulto provocado na alma de Rousseau

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leva-o à redaccção das Confissões. Por isso ele é mais sincero do que nunca ao contar – escrever – o roubo da fita da pobre Marion e o silêncio que dá origem à expulsão injusta, mais sincero que nunca ao dizer – escrever – que chegou a negar o ter tido filhos (Devaneio, 4. Caminhada)”. (4) Em Èmile, propôs o que lhe atenuava a consciência, à “teoria aberrante segundo a qual não convém ensinar as ciências à criança: esta deve descobri-la por seus próprios meios” (5). Por seu próprios meios, Rousseau só aprendeu bobagens: “ Descobriu-se que Rousseau estava de posse de uma fita que roubara da patroa... Essa dama, consideravelmente mais velha do que o jovem leviano, foi para ele simultaneamente mãe e amante.” (6) Historiadores qualificam a personalidade: “Caráter volúvel, inconstante, deixou o calvinismo e se tornou católico; mais tarde, voltou ao calvinismo. Sua vida é uma longa cadeia de romances, cada qual mais descontrolado e superficial.” (7) Os doze anos decorridos entre 1744 e 1756, época em que Rousseau viveu em Paris, permitiram-no estreitar uma ligação com o círculo da Enciclopédia. Infelizmente, até para ele próprio, não lucrou com o convívio; sua estada serviu apenas à clarividência de que não se afinava ao grupo. Optou combatê-lo, opondo-se especialmente a Voltaire, depois de ter-lhe enviado o “Discurso sobre a Desigualdade dos Homens”, um edifício de asneiras, nas quais fulgura o decreto: “O homem que pensa é um animal degenerado”. (8) O sagaz ativista respondeu-lhe na lata: “Recebi, meu prezado senhor, seu novo livro contra o gênero humano; muito obrigado... Nunca foi usada tanta inteligência humana para nos reduzir a meros animais; a gente tem ganas de se jogar de quatro patas depois de ler sua obra. Entretanto, como já há mais de sessenta anos perdi esse hábito, sinto que é infelizmente impossível readquiri-lo.” (9) Jean-Jacques preferia evidenciar uma aura de estoicismo e auto-suficiência por truque ou má índole, melhor expressados na suspeita àqueles que recebiam sua amizade, na descoberta de complicadas e imaginárias conspirações para traí-lo e arruiná-lo, logo ele, o “idealista democrático”. E tome perfídias: "Rousseau não receia reconhecer que lhe aconteceu mentir e mentir muito, quando estava na sociedade dos seres vivos... mas uma coisa é mentir, negando a verdade e ofendendo a justiça - e a recordação do pobre Marion persegue Rousseau durante cinquenta anos - outra, o prazer da imaginação, que não prejudica ninguém (4. Caminhada)." (10) Prejudicou, e muito. Para estudar Rousseau urge “máscara anti-poluente”. A dialética platônica cobre sua própria personalidade, profundamente dividida, conflituosa, embora soubesse ser

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integralmente maquiavélica. Condutas mórbidas de sexo e religião ocupavam a primeira fila de seus desejos: “Os meus gostos e pensamentos parecem oscilar sempre entre o nobre e o vil.”(11) Rohden comenta os procedimentos do “confesso”: “No seu famoso livro “Confissões” desabafa, diante de si e do mundo, todas suas misérias internas, talvez por um impulso do subconsciente de encontrar libertação psíquica nessa confissão pública dos seus pecados mais íntimos. Aliás, a vida e a pessoa desse homem prestam-se admiravelmente para estudos de psicanálise”. (12)

Verso próprio mostra o que espelhava sua alma: “Deplace par le sort, trahi par la tendresse, Mes maux sont comptes par mes jours, Imprudent quelquefois, persecute toujours, Souvent le chatiment surpasse la faiblesse.” (13) O Parlamento de Paris o motivou à vida errante. A cidadania

suíça - de que tanto se orgulhava - foi-lhe suprimida: Genebra também identificou o adereço. Simplesmente o rejeitou. Diderot, que pode bem conhecer a figura, dedicou-lhe uma obra romanceada – “Jacques, o fatalista e seu amo”, onde bem caracteriza a personalidade obtusa do renegado, sem acusá-lo frontalmente. Bizarro foi o mundo ocidental transformar o fatalista em herói post-mortem, como alguém que só fosse reconhecido muito tempo depois, “porque seus contemporâneos não foram capazes de alcançar tão alto conhecimento”. Seus contemporâneos, todavia, demonstraram muito mais conhecimento, inclusive, do que gerações que lhe sucederam, haja visto o hiato subsequente.

Outro paradoxo foi enterrá-lo na mesma tumba do grande desafeto Voltaire, o que, para Rousseau, certamente foi uma honra e uma necessidade; afinal, renomados historiadores, após examinarem inclinações e caráter, freqüentemente definem o autor do “Contrato Social” como um “parasita” (14).

Sob o crivo teórico, Rousseau não alcançou, não se interessou em captar as mensagens expressas por Locke e Montesquieu, sobre as quais se deitou a recompô-las à sua maneira, nada criando, apenas contrapondo, no velho estilo platônico. John Locke e Montesquieu se anteciparam a Rousseau e a Revolução Francesa ao requererem a separação entre Estado e Igreja, para o vigor da soberania popular; porém, mesmo com o entendimento empírico exposto na “Tábula Rasa”, Locke não precisou atacar convicções religiosas e se afastou do determinismo materialista cartesiano. O “filosofo político” francês teve comportamento antagônico, preocupando-se no ataque:

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"Locke escrevera a história da alma, recusando-se a fazer dela um romance, que provém sempre de uma racionalidade artificial; mas sua análise é falsamente histórica, visto que "supõe aquilo que está em questão". (15)

Cada vida, para Locke, tinha existência peculiar, riscada por livre escolha, responsabilidade individual. A Rousseau interessava somente a apreciação coletiva. Costumes inglêses eram detestáveis. Hábitos alimentares, especialmente o beef, sofreram a ridicularização deste Rousseau ocupado em demonstrar, “a tantos quantos quisessem”, que “as rubras postas de carne era uma das causas da notória barbárie inglêsa.” (16)

Será que spaguetti poderia “endireitar” os inglêses? E Napoleão, logo comeria carne ou criancinhas? Ou os dois e mais um pouco? O que diria Rousseau se conhecesse as parrilladas argentinas ou o espeto corrido do gaúcho? Mas teria ele, vago no mundo, disponibilidade financeira para pagar sequer um filet a cavalo?

Embora demonstrasse só hostilidade, conseguiu confundir. Aproveitando-se da acepção inglêsa de que no nascimento o bebê não tenha o “pecado original”, sempre alardeado pela Igreja Católica, porque ele próprio responsabilizar-se-ia pelo seu destino, desde que houvesse um governo verdadeiramente democrático, ele a distorceu; na habilidade retórica, Jean-Jacques propunha os românticos preceitos que iriam livrar escravos de patrões, o povo do rei, os jovens dos velhos, os oprimidos dos opressores, o feio, do bonito: “O homem nasce livre em todo o lugar se encontra acorrentado”. (17)

Ao que pondera Von Mises: “... talvez soe bem, mas na verdade o homem não nasceu

livre. Nasceu como uma frágil criança de peito. Sem a proteção dos pais, sem a proteção proporcionada a esses pais pela sociedade, não teria podido sobreviver. Liberdade na sociedade significa que um homem depende tanto dos demais como estes dependem dele.” (18)

A exceção conseguiu sobreviver, mesmo órfã, para enxergar nos cidadãos britânicos os “burros de carga”, meros figurantes do teatro real, na ironia aos preceitos de Locke lá adotados: “Todo o povo é aquilo que a natureza de seu governo o faz; tudo é possível a um legislador hábil e sábio pois, perante esse legislador, o indivíduo é uma tábula rasa.” (19)

Havia alguma concordância com o contemporâneo e patrício Montesquieu, mas não com o método, tampouco com as concepções do inigualável autor de “O Espírito das Leis”. Ambos prepararam a Revolução; porém, enquanto Montesquieu dispôs a expressa divisão do poder na alternativa à Monarquia, a fim de evitar radicalismos, precipitações, mesmo crimes e para que as decisões fossem, antes de promulgadas, pensadas, pesadas,

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estudadas, debatidas e resolvidas, (prerequisitos essenciais à virtude democrática), Rousseau advogava a simples transferência do poder, mantendo-o unificado numa pretensa vontade popular representada por ação ditatorial, na “alienação total de cada associado com toda a comunidade”. Dessa total alienação emerge um comandante moralmente inatingível, eventual abusado penalmente safado que usa sua soberania em causa própria, covardemente, na promovida união de todos os indivíduos contra cada cidadão! Pobre do cidadão:

“A ideologia chega ao seu ponto máximo quando coloca o direito como instrumento acionado por uma “vontade”, a da maioria, através de seus “representantes” - de “legisladores racionais”. Jamais se questiona se os “representantes” não estariam sujeitos as conveniências políticas.” (20)

O professor Bonavides retoma: “Até mesmo o cidadão que Rousseau fizera rei na ordem política, como titular de um poder soberano e inalienável, acabou se alienando no partido ou no grupo, a que vinculou seus interesses”. (21)

Os representantes, além de se ocuparem com interesses particularizados, são via de regra malformados, péssimos tradutores e piores formuladores, mas qualquer ideologia, mesmo a mais irracional, se bem divulgada, tem chance de êxito, ainda mais numa sociedade totalmente atrasada. Em 1792 continuava fácil subjugar as massas. Bastava, a tanto, “que se conhecesse suas paixões dominantes e houvesse boa mão no encadeá-la através de ilusões”(22).

Benjamin Constant (1767-1830) alertava para a perfídia: “Nossos contemporâneos imaginaram um poder único, tutelar,

onipotente, mas eleito pelos cidadãos; combinam centralização e soberania popular. Isso lhes dá um pouco de alívio. Consolam-se do fato de estarem sob a tutela pensando que eles mesmo escolheram os tutores... Num sistema desse gênero, os cidadãos saem por um momento da dependência, para designar o seu patrão, e depois nela reingressam.” (23)

Thoureau também formulou o alerta até hoje negligenciado, na singela analogia:

“Qualquer eleição é uma espécie de jogo, como o de damas ou o gamão, com um ligeiro matiz moral, um jogo com o bem e o mal, com questões morais,, e as apostas a acompanham naturalmente. O caráter dos eleitores não é comprometido. (...) Até mesmo votar pelo direito não é fazer alguma coisa por ele. É apenas expressar timidamente aos homens o nosso desejo de que ele prevaleça. (...) Há muito pouca virtude nas ações das massas de homens.” (24)

O jogo continua: recomenda-se não se alterarem regras, mas sabemos de antemão serem elas sempre alteradas... para

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beneficiar seu mentor, o jogador. Peões são fáceis de serem movimentados:

“A massa se rege por sentimentos, emoções, preconceitos, como a psicologia social já demonstrou exaustivamente. A opinião das massas formando a opinião pública será por conseqüência irracional. Não se iluda o publicista democrático a esse respeito, cunhando a expressão agora uso corrente no vocabulário político da propaganda: o ‘estereótipo’, ou seja o ‘clichê’, a ‘frase feita’, a idéia pré-fabricada, que se apodera das massas e elas, numa economia de esforço mental, como diz Prelot, aceitam e incorporam ao seu ‘pensamento’, entrando assim a constituir a chamada opinião pública.” (25)

Napoleão de cara, Lênin e Hitler depois, souberam construir a "opinião pública":

“A fim de melhor compreender a arte da propaganda, Hitler estudou as técnicas propagandistas dos marxistas, a organização e os métodos da Igreja Católica, a propaganda britânica da Primeira Guerra Mundial, a publicidade norte-americana e a psicologia freudiana.” (26)

Mais do que atacar as proposições básicas do iluminismo britânico, fato que deve ter contribuído à sua exclusão do grupo Enciclopédia, Rousseau obtinha justamente no espólio cartesiano sua razão de existir e de propor:

"Depois de ter percorrido o círculo estreito do seu vão saber, é necessário acabar por onde Descartes começara. Eu penso, logo existo. Eis tudo o que sabemos." (27)

“É assim que o cartesianismo, no século, XVIII, aparece sob dois aspectos indissolúveis e complementares: de um lado, como Idéia da Razão, como método analítico, inspira Holbach, Helvetius, Diderot, o próprio Rousseau; é ele que encontramos na fonte dos panfletos anti-religiosos assim como na origem do materialismo mecanicista...” (28)

Bertrand Russel também relaciona: “Afinal, o rígido determinismo da explicação cartesiana do

mundo material, tanto físico como biológico, contribuiu muito para promover o materialismo dos séculos XVIII e XIX, em especial quando associado à física de Newton.” (29)

O próprio Engels confirma: “Entretanto, o materialismo transferiu-se da Inglaterra para a França onde se encontrou com uma segunda escola materialista de filósofos, que havia surgido do cartesianismo e com a qual se refundiu.” (30)

Se E=mc2, se matéria é apenas energia estática, o materialismo não tem objeto, mas a racionalidade cartesiana inverteu até mesmo as razões humanísticas. Não só o Corso, também Bismarck, Hitler, Perón, Mussolini, Lênin e Stálin, para não mencionar outros menos citados, gostaram da inversão; valeram-se, precisa e ladinamente, do subterfúgio. Tomaram

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para si o destino milhões, mercê da tal “inalienabilidade” de poder, onde o todo se concentrou num só corpo, aclamado como “justo”, “democrático” porque nascido como produto da chamada “vontade geral”, esta expressa, contada e “legitimada” por estratégicos plebiscitos apurados em arbitrários resultados, assim questionada por Hans Kelsen:

“Rousseau introduz aqui o conceito da “vontade geral” distinguindo-o do conceito de “vontade de todos”, um conceito extremamente misterioso que ele nunca define com clareza” (31).

É impossível a definição, diz Karl Jaspers: “A verdade é que nunca dominamos a história, mesmo a nossa própria história, porque estamos sempre dentro dela... Quando se trata do todo, somos impotentes...” (32)

O sofisma, entretanto, era pretensioso e parecia elementar: “Os indivíduo podem enganar-se; a volontè générale, jamais.” (33)

Michel Villey detectou o charlatanismo: “Certamente o mito de “uma vontade geral com a qual se

identifica a própria vontade de um modo quase místico, de tal maneira que, ao obedecer a vontade do povo somente, alguém permanece tão livre como no estado de independência nativa foi apresentado como premissa axiomática. “ (34)

Axiomática deriva do grego axia, significando “valor” em sentido de qualidade, não no sentido físico de quantidade. Ives R. Simon reforça: “O ideal de emancipar-se das velhas ataduras e o não menos certo propósito de formar um Estado altamente centralizado e racional foram proporcionados, de fato, pela vontade geral.”(35)

Talvez por esta contradição semântica tenhamos conhecido as declarações de Henry David Thoreau:

“Saibam todos, pela presente, que eu, Henry Thoureau, não desejo ser considerado membro de nenhuma sociedade juridicamente constituída a qual não tenha me associado... Afinal, a razão prática por que se permite que uma maioria governe, e continue a fazê-lo por um longo tempo, quando o poder finalmente se coloca nas mãos do povo, não é a de que isto pareça mais justo para uma minoria, mas sim que a maioria é fisicamente mais forte.” (36)

Einstein também arrasou com a “vontade coletiva” guiada pelos executores:

“Creio que a missão mais importante do Estado é proteger o indivíduo e possibilitar que ele desenvolva uma personalidade criativa. O Estado deveria ser o nosso servidor; nós não deveríamos ser escravos do Estado.” (37)

Rohden o explica por outros termos:

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“... Einstein admite que tudo que gira no plano das facticidades empírico-analíticas está numa dimensão meramente quantitativa, sujeita às categorias ilusórias de tempo, espaço e casualidade e que deste mundo de facticidades quantitativas não há nenhum caminho causal para o mundo da Realidade qualitativa. Somando e multiplicando-se quantidades, nunca teremos qualidades; somando ou multiplicando zeros...nunca chegaremos a ter o valor positivo do “1”. Horizontal mais horizontal não dá vertical. Factual mais factual não dá Real.” (38)

Thoreau era tido como “anarquista”, portanto “nocivo”, um revoltado que não merecia atenção, exceto a cadeia. Mas Einstein, a quem interessaria?

Depois das funestas experiências de Hitler e Mussolini, Hans Kelsen admitiu:

“Não se pode negar que, enquanto massa de indivíduos de diferentes níveis econômicos e culturais, o povo não tem uma vontade uniforme, que somente o indivíduo tem uma vontade real, que a chamada “vontade do povo” é uma figura de retórica e não uma realidade.” (39)

Kelsen faz-se num dos maiores, senão o maior jurista de nosso século. Bonavides o acompanha:

“Nem sequer um doutrinário da democracia como Rousseau, com a concepção organicista da volonté générale, princípio tão aplaudido por Hegel, pode forrar-se a essa increpação uma vez que o poder popular assim concebido acabou gerando o despotismo de multidões, o autoritarismo do poder, a ditadura dos ordenamentos políticos.” (40)

Os russos demoraram setenta anos para se darem conta do engôdo. Tiveram que esperar Gorbachev. A Perestroika significa a (re)ascenção do velho paradigma de estóicos e de J. Locke: “É também extremo respeito pelo indivíduo e consideração pela dignidade pessoal”. (41)

Rousseau vira em Maquiavel um “grande republicano” que, obrigado pelos tempos, desdenhou seu amor pela liberdade fingindo dar lições aos reis para educar des grandes aux peuples. Fillipo Burzio notou que tal interpretação, em vez de justificar moralmente o maquiavelismo, na realidade projeta um “maquiavelismo ao quadrado: o autor do Príncipe não só daria conselhos sobre fraudes mas também com fraudes”, (42) para a desgraça daqueles que lhe seguiram! Schwartzenberg foca Rousseau acompanhando de perto a Maquiavel, “tolerando” o indivíduo no homem extraordinário e mitológico em dois casos: “Legislador”, para fundar o Estado e lhe fornecer suas leis e “Ditador” para garantir sua sobrevivência (43).

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No “Plano Para a Constituição da Córsega” Rousseau chegou a dizer que o Estado devia ser o único proprietário, reputando a propriedade privada como principal origem de infortúnio, motivo pelo qual dever-se-ia extingui-la. (Ele só não foi marxista-leninista porque não viu a realização do seu sonho, para todos pesadelo, morrendo duzentos anos antes da tragédia russa.) O arsenal de ataque desfilou naquele “Discurso”. No “abre-alas” saltita a idéia política mais característica, a “Vontade Geral”, embora não se saiba, com certeza, se foi ele ou Diderot quem cunhou a expressão; de qualquer modo, Rousseau dela se apropriou. Bertrand de Jouvenel, Tocqueville e até Trotsky perceberam a manobra implícita, a chicana centenária em nome dessa tal vontade até hoje cometida:

“Jouvenel inspira-se na intuição de Tocqueville no sentido de que o movimento revolucionário democrático, ao derrubar o feudalismo e o absolutismo monárquico, gerara, sem o saber, um verdadeiro Frankstein: uma nova classe de democratas. Na verdade, nosso autor é, talvez, o primeiro analista moderno a usar essa expressão “Nova Classe Dirigente” - aquilo que os russos chamam a Nomenklatura - a classe político-burocrática que, sustentada na retórica da Justiça Social e da Redistribuição, apodera-se do Estado para dele se locupletar. Ninguém melhor para julgar o fenômeno do que o próprio Trotsky... que observava: “aquele a quem esta afeta a redistribuição jamais se esquecerá de si próprio...” (44)

Enquanto a Inglaterra partira decidida, há séculos,* às soluções verdadeiramente democráticas, quando o povo retirava paulatinamente o poder do rei em sua própria defesa e os EUA proporcionavam ao mundo verdadeiras lições de cidadania e civilidade, graças a competência dos compatriotas Rousseau e Descartes, os cidadãos franceses e vizinhos, até a Rússia e a África, submeteram-se, por muitos anos, a perversos domínios.

Jefferson se reportou: “Quanto à Revolução Francesa, a lenda nacional pretende que

ela colocou no lugar da Monarquia de um rei despótico o reinado glorioso da liberdade, da igualdade e da fraternidade. Essa suave apresentação elimina as desordens sangrentas, cuja multiplicação, que era impossível de dominar, impôs ao País o reinado do Terror. As boas intenções converteram-se no horror do massacre e da guerra civil, a custa de centenas de milhares de vítimas e de enormes devastações. O turbilhão suicida só pode ser estancado pela instauração de uma ditadura militar, mais absoluta que a Monarquia do Antigo Regime.” (45)

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* Relembremos que a Magna Carta inglêsa é de 1215.

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As “desordens” sangrentas foram estratégicamente promovidas, ordenadas, criados e fomentados conflitos, tensões de toda a espécie. Burke também estava por perto:

“Diferentemente de seus vizinhos do outro lado do Canal, os franceses foram privados - ou se privaram - de um conjunto básico de circunstâncias que são necessárias para a experiência da liberdade política, isto é, a cooperação e a participação nos assuntos públicos... Primeiramente as idéias dos filósofos, particularmente Rousseau, foram adotadas pelos líderes da Revolução e transmitidas as massas, na linguagem mais simples e sugestiva, com o propósito de criar apoio para suas políticas. Nesse estágio, o papel dos intelectuais era totalmente correlacionado com o dos políticos, cuja tarefa central era de mobilizar as massas, ou, em outras palavras, definir o papel das massas no contexto político em questão.” (46)

Resultado: aquele povo, participativo e aspirante democrata, não conheceu nem democracia, nem liberdade, muito menos igualdade e, menos ainda, fraternidade - exceto se encararmos como “fraternidade” o terrorismo praticado antes, durante e depois da Revolução, na repartição dos saques e, em seguida, pelo mundo afora, com o intrépido “herói” Napoleão: “A vontade geral que não tolera exceção é a exceção pura e simples. Assim a soberania de Rousseau revela-se uma ditadura permanente.” (47)

“Vendido” como meio de salvação nacional a um custo barato, o homem comum acabou por aderir, até entusiasticamente, aos condutores do infortúnio, mesmo que estes o carregassem aos trágicos destinos, conseqüências e exatas predições assim proferidas por Benjamin Constant:

“Examinarei, pois, o sistema do mais ilustre desses filósofos, J. J. Rousseau e mostrarei que, transportando para os tempos mais modernos um volume de poder social, de soberania coletiva que pertencia a outros séculos, este gênio sublime, que era animado pelo amor mais puro a liberdade, forneceu, todavia, desastrosos pretextos a mais de um tipo de tirania”. (48)

Alexis Tocqueville nunca duvidou - sob a capa do “governo do povo” escondia-se o monstro totalitário. Norberto Bobbio lhe explica:

“Tocqueville se revela um escritor liberal e não-democrático. Jamais demonstra a menor hesitação em antepor a liberdade do indivíduo à igualdade social, na medida em que está convencido de que os povos democráticos, apesar de terem uma inclinação natural para a liberdade, tem “uma paixão ardorosa, insaciável, eterna, invencível” pela igualdade e embora “desejem a igualdade na liberdade são também capazes, se não podem obtê-la, de “desejarem a igualdade na escravidão”.

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O enigma da igualdade é seu objeto, preocupação do Nobel de Economia 98 Amartya Sen*.

À tirania da maioria Tocqueville dedica o capítulo sétimo da segunda parte do Livro I de “A Democracia na América”. O princípio da maioria é um principio igualitário na medida em que pretende fazer com que prevaleça a força do número sobre a força da individualidade singular; repousa sobre o argumento de que “existem mais cultura e mais sabedoria em muitos homens reunidos do que num só”, no número mais do que na qualidade dos legisladores. É a teoria da igualdade aplicada à inteligência”. (49)

Hayek também distingue as razões de Tocqueville: “O liberalismo exige que todo o poder - e, portanto, também o

da maioria - seja submetido a limites. A democracia, ao contrário, chega a considerar a opinião da maioria como o único limite aos poderes governativos.” (50)

O socialista Lukács reputa à causa rotulada democrática o eclipse liberal durante os séculos XIX e XX:

“Para Lukács, o liberalismo – que se inspirava na doutrina econômica clássica. Que supunha suficiente a garantia de liberdade jurídico-formal para ação do homo economicus engendrar automaticamente um estado social e cultural de felicidade – foi desmoralizado, na prática, pela intervenção do Estado na vida econômica, pelo contrôle alfandegário, pelo protecionismo e sobretudo pelos monopólios.” (51)

A grande sociedade passou a ser dedicada a esse pretenso bem-estar da maioria, preparo e educação para a democracia de massa, aquilo que Paul Goodman aponta como “sociolatria” (52).

Além da rejeição à vida inglêsa, Jean-Jacques buscou obstinadamente desmoralizar o trabalho de Locke, especialmente as concepções sobre o estado da natureza. Cego, de espírito tão mecanizado, tão repleto de preconceitos, empirismos e metas pessoais, através de uma construção redacional de apurado maniqueísmo, lógica que não hesita em relegar o indivíduo à esterilidade criativa, quando não nefasta, punha-se a decretar:

“O estado de natureza, o puro e verdadeiro estado de natureza, é, pois, o estado selvagem, no qual os homens foram criados e viveram durante milhares de anos. Implica o isolamento vagabundo, a ausência de toda a linguagem, de toda a relação regular, o sono da razão e o desconhecimento da moralidade. O homem no estado de natureza é robusto, são e ágil.” (53)

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“A pergunta central na análise e avaliação da desigualdade é, como aqui sustento, “igualdade de quê?” Sen, Amartya, p. 21.

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Este estado estúpido confundido como selvagem, esta natureza, vista como Bacon, indomável, a descrença nos semelhantes, o desprezo e o desrespeito ao ser, ao indivíduo, ao cidadão, compuseram a mesma aquarela que serviu à badalação de Hobbes e seus trancados. Não precisava usar a menor criatividade, só traduzi-lo. Repressão virou “orientação educacional- coercitiva”: “Mas a admiração pelo legislador - por aquele que, “assumindo a iniciativa de fundar uma nação, deve sentir-se capaz de mudar a natureza humana” chega até Rousseau.” (54)

O mestre Miguel Reale observa como os verdugos sobrevivem aos tempos:

“O que efetivamente caracteriza o homem moderno é a confiança em seus poderes demiurgos, em sua capacidade de penetrar nas leis da natureza, não pelo prazer estético-intelectual de expressá-las, mas pela necessidade de convertê-las em instrumento de seus projetos existenciais.” (55)

Goffredo Telles Junior também explica como se perpetua a prática da lex sugerida:

“Isto também pode suceder quando um governo impõe a uma sociedade um Direito Objetivo em discordância com os ideais do sistema de referência da coletividade. Em tais casos, o Direito Objetivo é um Direito artificial. É um Direito que não exprime a realidade biótica da sociedade. É um Direito corrompido e corruptor. Ele forçará o surgimento de interações humanas à margem do campo de sua competência. Grande parte da vida social se processará fora de seus domínios.” (56)

O maior e mais conhecido exemplo deste direito artificial vem pela lei do trabalho, a fascista. Antecipando-se no rumo invertido, Rousseau, em 1762, portanto a tempo de influir diretamente na sangrenta Revolução e nos seus terríveis desdobramentos, publicou o “seu” “Contrato Social”, onde o cidadão perdia sua liberdade natural em troca dessa pseudo-liberdade apregoada, chamada civil para diferenciar-se da religiosa, copiando neste particular a propositura de John Locke; a obra francesa, todavia, desvirtuou-a, não descuidando de enfeitá-la com uma sofisticada engambelação, nítida tendência reacionária à espontaneidade individual demagogicamente arranjada, a qual permitiu e até induziu a que as cúpulas reutilizassem alguns maquiavélicos ditames, aperfeiçoando-os:

“Assim é que em Locke, antes do contrato, os indivíduos em estado de natureza são completos, dotados de todas as suas características civilizadas, quer dizer, da razão, do julgamento moral, do direito de propriedade e da liberdade. Vê-se logo o contraste com Jean-Jacques Rousseau e com a tradição francesa, para qual é o Estado que cria, a partir do indivíduo

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natural, ainda não efetivamente humano, um ser novo a quem deverá ensinar tudo.”(57)

Enfeitando o manto filosófico, resplandece o colar da república platônica de Hobbes; se Rousseau não o tingisse com as cores da soberania popular, poder-se-ia chamá-lo “plagiador”, até por repetir a cátedra de colocar o ser humano como carente de norma de ação mais elevada além de impulsos, apetites e más inclinações. O homem não poderia ser possuidor de regra de pensamento mais importante do que fantasias subjetivas, alheias à formação social. Considerado isoladamente, o indivíduo se apresenta nocivo, um animal governado por instintos bruscos; para ser corretamente entendido, ele deve considerar-se só como membro da sociedade e por ela subordinado. O ordenamento requer a esterilização de cada um em particular... em massa. Quando alguém deseje isoladamente algo diverso da ordem imposta, é entendido como um capricho proveniente de alguém que “não percebe corretamente seu próprio bem, nem seus desejos naturais”. Prelot o atinge com o exocet * :

“Para sua mais completa felicidade e também para sua desgraça, os homens possuem duas faculdades: a liberdade de aquiescerem ou de resistirem e a possibilidade de se aperfeiçoarem.” (58)

Com Hobbes, o genebrino compartilhava daquelas idéias sobre nosso estado natural e a guerra assume a preponderância; explicitou-a na exposição do famoso Discurso. Este foi o Estado “vendido” como natural:

“A guerra é a saúde do Estado. Ela coloca em movimento, automáticamente, em toda a sociedade, aquelas forças irresistíveis que buscam a uniformidade e cooperam com o governo entusiásticamente na tarefa de coagir grupos minoritários e os indivíduos isolados sem identificação com o grupo, obrigando-os a obedecer. Os mecanismos do governo não só estabelecem as punições mas aplicam-nas fazendo com que essas minorias sejam silenciadas pela força ou passem por um processo sutil de persuasão que acabará por convencê-las de que foram convertidas...a nação atinge uma uniformidade de sentimentos, uma hiererarquia de valores que culmina com o ápice do ideal do Estado, que só poderia ser obtido através da guerra... cada indivíduo se identifica com o todo e sente-se muito mais forte com esta identificação...

________________________________________________________ *Exocet: Míssil de longo alcance, de fabricação francesa, muito

utilizado na Guerra das Malvinas.

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Um povo em guerra volta a ser criança no sentido mais literal do termo: são obedientes, respeitosos, confiantes, cheios de fé ingênua na total sabedoria e no poder absoluto do adulto que toma conta deles, impondo-lhes suas regras firmes mas bondosas e em quem podem depositar todas as suas ansiedades, temores e responsabilidades... E você dirige um olhar cheio de adoração para o Estado, como um filho olha para o Pai, como se o Estado fosse o símbolo quase pessoal da força do rebanho, e o líder e determinante de todas as suas ações concretas e de todas as suas idéias.” (59)

A “opinião publica” francesa, construída de cima para baixo, por “economia de esforço mental” foi assimilada, desaguando a tal “vontade geral” de modo claramente irracional, em que pese tudo de Rousseau, como de Descartes, Maquiavel e Hobbes, tivessem a pretensão da “racionalidade”. Hans Kelsen, depois de trinta anos de estudos, dobrou-se a grande diferença: “É o valor da liberdade e não o da igualdade que determina, em primeiro lugar, a idéia de democracia.”(60)

Norberto Bobbio reforça: “O conceito de democracia é inseparável do conceito de direitos

do homem. Se se elimina uma concepção individualista da sociedade, não se pode mais justificar a democracia. Tenho dito freqüentemente que, quando nos referimos a uma democracia, seria mais correto falar de soberania dos cidadãos e não soberania popular. “Povo” é um conceito ambíguo, do qual se serviram também todas as ditaduras modernas”. (61)

Isso demonstra a certeza de Tocqueville. Pelo fato de excluir qualquer minoria em nome da maioria, evidentemente, por mais dourada que possa ser a receita de Rousseau, ela é, por tudo, antidemocrática, determinista, mecanicista, preconceituosa, parcial, dogmática. Em uma palavra, falsa. Mas não perde sua máxima característica: a de constituir excelente estratégia à conquista e manutenção de poder por qualquer príncipe que a adote. E, de fato, conseguiu sucesso, dado a vagueza do carácter, na reinversão objetiva do direito natural rumo ao despotismo, este devidamente consubstanciado no invólucro democrático. Alemães e japoneses da década de quarenta que o digam. Se alguns milagres de virtude foram produzidos pela maioria, dita espelho nacional do aclamado patriotismo, este também reproduziu, até em maior escala, inegáveis sentimentos de inveja, frustração, cobiça, ódio e destruição. E por ele, Lênin, Hitler, Mussolini, Hiroíto e Mao Tsè Tung jogaram seus conterrâneos aos precipícios dos desatinos. Aprendamos com Einstein:

“Nos mecanismos universais, o mecanismo Estado não se impõe como o mais indispensável. Mas é a pessoa humana, livre, criadora e sensível que modela o belo e exalta o sublime, ao

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passo que as massas continuam arrastadas por uma dança infernal de imbecilidade e embrutecimento.” (62)

Não deve ser considerada tão fora de propósito, pois, outra frase de Thoreau:“Não há senão uma escassa virtude na ação de multidões de homens.” (63)

O argumento iluminista era desprezível porque as “nossas idéias e até o próprio egoísmo nasciam junto com esta sociedade”. O homem deveria modificar-se e adaptar-se em favor do meio social... até perder sua própria personalidade, pelo todo absorvido. A exceção Rousseau reservou a si próprio, ávido em se afirmar. Jamais admitiu que sua personalidade fosse absorvida pelo todo; contrariu sensu, jamais saberíamos de sua existência. Seria, apenas, um Jean-Jacques a mais. O “absolutismo”, este claro excludente de democracia, virava, pela habilidade do artífice francês, princípio “democrático-racional”:

“Torna-se necessária (ao Estado ou a Cidade) uma fôrça universal e compulsiva para mover e dispor cada parte da maneira mais conveniente a todos. Assim, como a natureza dá a cada homem o poder absoluto sobre seus membros, o pacto social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus.” (64)

Obviamente trata-se de um dos mais notáveis sofismas; porém, podemos desmanchá-lo com a simples lembrança de que não temos nenhum poder, nenhuma opção para dispor e comandar, sequer, a metade de nossas operações pessoais. A respiração, o funcionamento do fígado e a impossibilidade de andarmos de cabeça para baixo, entre inúmeras outras, podem, de plano, evidenciar o ardil da premissa; mas Jean-Jacques era coerente com o pensamento do patrício Descartes e isto não se pode negar: “Este pensador peculiar - embora freqüentemente considerado irracionalista ou romântico - também se apoiou no pensamento cartesiano e dele dependeu fundamentalmente.” (65)

Miguel Reale tem no genebrino “o Descartes da política”.(66) Rousseau oferece à mostra o tamanho da mordida que sofreu

da mosca da ciência exata, da física, do número, quando dispõe sobre a fôrça necessária para mover as coisas e quando se manifesta sobre os membros, reduzindo a diversidade, homogeneidade e universalidade de cada ente, de cada pessoa, a simples objeto manipulável por um comando absoluto.

Para Hayek, “a substituição por Rousseau, Hegel e seus seguidores da palavra “opinião” pelo termo “vontade” foi provavelmente a inovação terminológica mais fatídica na história do pensamento político (67).

Macksoud renova: “Esta substituição teve fundamento no cartesianismo de Rousseau e foi o produto de um racionalismo construtivista que imaginava que todas as leis foram inventadas como expressões de vontade para um dado fim...” (68)

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Bonaparte espreitava a chance do colossal mal-entendido: “Para Rousseau, como para outros edificadores da Cidade

Ideal do Racionalismo desarvorado, o legislador é responsável por tudo. É um deus ex-machina. Algo que será como Napoleão, que pretendeu representar o novo César e o novo Augusto do cesarismo imperial francês”. (69)

Sobre cada qual, a aritmética cartesiana, arbitrária e friamente, coloca com eficiência o abstrato numeral da soma de todos como a verdade suprema a ser seguida e acatada, caso “colado” em Maquiavel: “A soma de todos os bens individuais é, sem a menor dúvida, o ideal supremo de Machiavel.” (70)

Realmente até poderia ser uma meta plausível, não fosse um pequeno desvio semântico: é impossível a soma todos. Ou, por outra: a tradução do anseio geral, pelo todo maior, dita uma norma não condizente com ninguém em particular. (A lei, destarte, não se torna utópica e irreal, posto que desatende a cada um, portanto a todos?) É, então, a proposta roussoniana completamente inverossímel, desconforme com a ciência de ponta pelo bizarro: “A relatividade consiste em conceber o mundo não como uma soma de acontecimentos (ou de pessoas, digo eu) mas de relações”. (71)

Vejamos, pelo mesmo lado, a abalizada observação de Jacques Barzun: “Por um paradoxo da existência social do homem, porém, a vida das comunidades não é uma simples soma das vidas individuais.” (72)

Se misturarmos todas as cores, teremos um cinza escuro, quiçá preto, os quais sequer são considerados cores... Finalmente, relembrando Thoreau, como denominar “Contrato” (trato com outro) um termo no qual uma das partes é forçada a participar? A “autoridade soberana” tampouco é divisível como preconizou Rousseau - que falem seus próprios contemporâneos e os sofridos operários russos. Sobrou-lhes algum resquício de poder das tais Revoluções, ditas democráticas? A trama, a ardilosa dubiedade de Rousseau, entretanto, foi oportuna e convenceu. Conseguiu restringir homem e política àquela mera questão aritmética: “Se o Estado for composto de dez mil cidadãos, cada um deles terá a décima milésima parte da autoridade soberana”. (73)

Ou seja, fatalmente, quanto mais gente, menos poder para cada um... Pode isto ser chamado de “método democrático”?

Na característica de infalibilidade, Rousseau tentou estigmatizar a soberania como algo que jamais faria algum mal ao povo, não tendo igualmente porque o governante prejudicar alguém em particular. Necessariamente, o “imperador quererá o melhor para todos”, algo notoriamente extraído do Leviathan e do princípio da divindade que tanto sustentaram loucos e oportunistas. Podemos verificar ainda similitude e inspiração nos

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escritos eclesiásticos que davam conta da voz do povo como a voz de Deus - Vox Populi vox Dei. Na controvérsia própria dos imperfeitos humanos, bastaria simplesmente equacionarem-se os contendores. A maior soma expressaria a Vox apregoada. Será que a voz do povo francês vibrando com o movimento da guilhotina poder-se-ia dizer originaria ou expressão divina?

Lembrando o longo período em que acreditávamos ser o centro do Universo, não podemos mais uma vez dar razão a Thoureau, inspirado em Hippólyte Taine quando este se referia que “...10 milhões de exemplos de ignorância não fazem o conhecimento...” (74)

Kant também alertara: “Um governo fundado no princípio da benevolência para com o

povo, como é o caso do governo do pai em face dos filhos, ou seja, um governo paternalista, no qual os súditos, como filhos menores que não podem distinguir entre eles o que lhes é útil ou prejudicial, são obrigados a se comportar passivamente, para esperar que o chefe do Estado julgue de que modo eles devem ser felizes, esse governo é o pior despotismo que se possa imaginar.” (75)

Quantos, todavia, naquela França, poderiam conhecer as obras de Taine, Thoureau, ou as de Kant? O arremedo paternalista rodou na mesma estrada já tantas vezes trilhada: Napoleão manteve seu povo não por sentir-se responsável, muito menos por caridoso, mas para usufruir de fortes e destemidos lutadores, conforme a lápide:

“Afinal, um povo sadio trabalha melhor, produz mais riquezas para o Estado e sua Corte, além de que se reproduz mais, aumentando a população disponível para o alistamento militar. Povo bem cuidado, mais carne para canhão.” (76)

E tome imposto para recruta forçada da carne à granel: “Sabe-se que o objetivo da talha foi de permitir ao rei comprar

soldados que dispensassem os nobres e seus vassalos do serviço militar. Mas no século dezessete o serviço militar obrigatório foi novamente imposto sob o nome de milícia... e desta vez só recaiu sobre o povo e quase exclusivamente sobre o camponês... “A mediocridade do soldo do soldado”, escreve um deles, “a maneira como está deitado, vestido, alimentado e toda sua dependência tornariam por demais cruel pegar um outro homem que um homem do baixo povo.” (77)

O princípio regente da “Vontade Geral” vingou pelas atrações lingüísticas e étnicas, laços psicológicos de identificação e manifestações espirituais emergentes de comum condicionamento, na analogia ao princípio vital dos organismos, combustível da satânica locomotiva do Dr. Hegel que passaria por perto. São de Rousseau as palavras:

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“A sensibilidade recíproca é a correspondência interna de todas as partes... O Corpo político, por conseguinte, é também ente moral possuidor de vontade; e essa vontade geral, que tende sempre à preservação e bem-estar do todo e de suas partes, e que dá origem às leis, constitui para todos os membros do Estado, em suas relações mútuas e com o Estado, a norma do que é justo ou injusto.” (78)

Os conceitos de Einstein rechaçam os de Rousseau, Hobbes, Hegel e Marx:

“O homem solitário pensa sozinho e cria novos valores para a comunidade. Inventa assim novas regras morais e modifica a vida social. A personalidade criadora deve pensar e julgar por si mesma, porque o progresso moral da sociedade depende exclusivamente de sua independência. A não ser assim, a sociedade estará inexoravelmente votada ao malogro, e o ser humano privado da possibilidade de se comunicar.” (79)

(Talvez pudéssemos especular um pouco, dando razão a Hobbes e a Locke ao mesmo tempo: enquanto indivíduo, o homem tem comportamento responsável, porque identificado; ou seja, liberdade com responsabilidade. Na massa, o homem altera, freqüentemente, seu comportamento. Permanece “livre” no interior dela, sem responsabilidade. Tudo pode acontecer, então, como nas revoluções francesa e russa.)

O “Contrato Social”, precipitando a cascata da comunidade possuidora de uma personalidade corporativa ou moi commun, a analogia organicista transladada a averiguação do grupo social, a doutrina do ser corporativo estabelecendo padrões morais válidos para seus membros e o teórico condicionamento implícito do governo, instrumento desta vontade geral, abstração rigorosamente improvável, não passou desapercebida nem por alguns simpáticos teóricos marxistas (80), alguns bem marcando a mistificação:

“Por existir de forma tão abstrata e ao mesmo tempo tão violenta, o Estado continua cada vez mais a impedir a liberdade individual em nome da mentira chamada “bem comum”, que obviamente representa os exclusivos interesses da classe dominante” (81)

O senhor Jean-Jacques sempre tendeu a parcialidade; capacitado a elaborar frases de efeito, alardeava que, com seu método, atingir-se-ia a liberdade das massas, como se massa pudesse ter liberdade: “Não há liberdade do povo sem poder do povo - portanto sem poder do Estado: pois o Estado é o povo como Soberano”. (82)

Ainda tinha um maior sofisma reservado: “A fim de que o contrato social não se torne fórmula vazia,

assume ele tacitamente a disposição... de que quem quer que recuse obedecer a vontade geral será compelido a fazê-lo pelo

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todo. Isto nada mais significa que forçá-lo a ser livre... Isto, apenas, dá caráter legitimo às disposições civis que, sem ele, seriam absurdas, tirânicas e passíveis dos mais terríveis abusos.”(83)

Forçar a ser livre? É possível ou compreensível esta formulação? Samuel Johnson conforta-nos: “Rousseau sabe que está falando bobagem e ri do mundo por lhe dar atenção.” (84)

Fomos e somos, mesmo, por demais ingênuos; os bairristas franceses e seus descendentes também:

“A doutrina da soberania nacional dominou quase todo o direito político da França pós-revolucionária na idade liberal de seu constitucionalismo... Com efeito, o art. 3. da Declaração assevera que ‘o princípio de toda a soberania reside essencialmente em a Nação’ e que ‘nenhuma corporação, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente” (85).

Não por acaso, pois, Benjamin Constant expressou o lamento: “A França viu-se molestada por experiências inúteis cujos

autores, irritados pelo pouco êxito que alcançaram, tentaram forçá-la a usufruir de um bem que ela não desejava e contestaram-lhe o bem que ela queria.” (86)

Rousseau não presenciou o massacre da Revolução de seus patrícios e o desdobramento da sua vontade, “vendida” como Geral. Como Voltaire, faleceu onze anos antes. Sua passagem, entretanto, foi profícua o suficiente para ser muito bem aproveitada... até hoje:

“Muitos outros filósofos modernos, como Hanna Arendt, Aron e Kolakowski, concordam com a tese de que o socialismo representa aquela pseudo “religião civil” que Rousseau pretendeu criar, para substituir a Igreja com o culto patriótico do Estado Ressacralizado” (87)

Todos os candidatos a príncipes que se seguiram, na França e em todo o mundo, encontraram na maquiagem democrática que lhe foi peculiar, o disfarce necessário para surpreender as gentes de seus respectivos tempos e lugares:

“Não nos espantemos, portanto ao observar com que maravilhosa facilidade a centralização foi restabelecida na França no começo deste século. Os homens de 89 tinham derrubado o edifício, mas suas fundações permaneceram na p´ropria alma de seus destruidores e foi sobre estas fundações que puderam erguê-lo novamente e torná-lo mais sólido do que jamais o fora.” (88)

Ao povo, estar o poder nas mãos de tirano por herança ou por soma de votos não altera nada; mas o revestimento da democracia pervertida consegue tornar lógico e por isto legitima as tiranias extremadas levadas a cabo pelos que implementam a cartilha. O cidadão se restringe aos ditames da massa, ou do partido mais forte ou, ainda, mais freqüentemente, de um grupo

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ou mesmo de um indivíduo que se apossa do poder, em nome de todos, para o próprio desfrute. Aí reside a “liberdade” apregoada pelos teóricos Rousseau, Hegel, Fichte, Descartes, Hobbes, Comte, Georges Sorel, Karl Marx e F. Engels. Aí a escada de acesso a locomotiva do infortúnio, pilotada por Napoleão, Bismarck, Lênin, Stálin, Mussolini, Hitler e seus admiradores mais ou menos fiéis.

A mais realista e significativa homenagem Jean-Jacques Rousseau a recebeu no cemitério de Ermenonville - ninguém x menos do que o próprio Napoleão Bonaparte pode reconhecer e enaltecer as qualidades do defunto: “Era um mau homem, um homem perverso. Sem ele não haveria Revolução Francesa... É verdade que eu também não seria nada... Mas talvez a França fosse mais feliz com isto.” (89)

O mundo também, com certeza!

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A PERFÍDIA CIENTÍFICA DE DESCARTES, HOBBES & ROUSSEAU

(e suas trágicas consequências)

NOTAS

Apresentação

Kuhn, Thomas, p. 126-7 Introdução

1. Popper, Karl & Lorenz, K., O Futuro está Aberto, p. 54. 2. Newton, Isaac, cit. Schwartz, Joseph, p. 45/48. 3. Alquié, Ferdinand, Galileu, Descartes e o Mecanismo, p. 42. 4. Jose Ortega y, “Rebelião das massas”, cit. Rohmann, Cris, p.

298. 5. Bachelard, Gaston, A Filosofia do Não, p. 21. 6. Einstein, Albert, Escritos da maturidade: artigos sobre ciência,

educação, relacões sociais, racismo, ciências sociais e religião, p. 178.

Capítulo I - Rebabel 1. Trilhos (por mal entendidos) estendidos

1. Serres, Michel, cit. Descamps, Christian, p.98 2. Einstein, Albert, Como Vejo o Mundo, p. 198. 3. Descartes, R., cit. Russel, B., 2001, p. 277. 4. Descartes, R., cit. Koyré, Alexandre, Considerações Sobre

Descartes, p. 18. 5. Descartes, cit. Koyré, Alexandre, idem, ibidem. 6. Granger, Gilles-Gaston, Método, in Método-Teoria/Modelo

(Enciclopédia Einaudi, vol. 21) Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1992, p. 58; cit. Silva, Porfírio, p.302.

7. Descartes, cit. Koyré, Alexandre, p. 38/39. 8. Idem, p. 40. 9. Idem, ibidem. 10. Descartes, Rene, cit. Capra, Fritjof, O Ponto de Mutação, p. 54. 11. Moraes, Eduardo Jardim de, "Experiência da dor", especial para

o jornal Folha de São Paulo, 18 de junho de 1995, "O Pensamento de Hannah Arendt está marcado pela urgência em compreender o totalitarismo", Caderno 5 p. 8.

12. Pearson, K., cit. Oliva, Alberto, Ciência e Sociedade, do consenso è revolução, p. 61.

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13. Rohden, H., Einstein, o Enigma do Universo, p. 136. 14. Schwartz, Joseph, p. 18. 15. Descartes, Rene, cit. Lemkow, Anna F., Princípio da Totalidade,

p. 84. 16. Vesálio, André (1514-1564), cit. Henry, John, p. 38. 17. Canguilhem, G. Ètudes d'histoire et de philosophie des sciences,

p. 221 e 222; cit. Descamps, Christian, p. 91. 18. Descartes, R., Les Principes de la Philosofie, cit. Oliva, Alberto,

Ciência e sociedade: do consenso à revolução, p. 84/5 19. Descartes, Rene, O Homem, cit. Alquié, Ferdinand, p. 30. 20. Descartes, Rene, cit. Alquié, Ferdinand, Galileu, Descartes e o

Mecanismo, p. 66. 21. Chopra, Deepak, O Caminho do Mago, Vinte lições espirituais

para você criar a vida que deseja, p. 97. 22. Descartes, Rene, cit. Capra, Fritjof, p. 56. 23. Japiassú, Hilton, Nascimento e Morte das Ciências Humanas, p.

28. 24. Deus, Jorge Dias de organizador e artigos de R.K.Merton,

T.S.Kuhn, W.O.Hagstrom, J.Haberer, G.B. van Albada, Ph.Roqueplo, F.Gil, R.Horton, A.Maslow, A.N.Whitehead, p. 24.

25. Descartes, R., cit. Japiassú, Hilton, A Revolução Científica Moderna, p. 173/4.

26. Bacon, Francis, Novo Organum ou Verdadeiras Indicações Acerca da Interpretação da Natureza, p. 67.

27. Prigogine, Ilya, cit. Ferguson, Marilyn, A Conspiração Aquariana, p 164.

28. Roszac, Theodore, A Contracultura, p.226. 29. Descartes, Rene, cit. Alquié, Ferdinand, Galileu, Descartes e o

Mecanismo, p. 29. 30. Voltaire, cit. "Voltaire, Vida e Obra," Coleção Os Pensadores,

Cartas Inglêsas, 14. Carta, p. 25. 31. Descartes, Rene, "Regulae ad directionem ingenii", (Regras a

direção do espírito) obra incompleta escrita provavelmente antes de 1628, impressa apenas em 1701.

32. Koyré, Alexandre, Considerações Sobre Descartes, p. 81. 33. Whitehead, Alfred North, p. 31. 34. Descartes, R., cit. Japiassú, Hilton, A Revolução Científica

Moderna, p. 82. 2. Física Social

1. Descartes, cit. Koyré, Alexandre, Considerações Sobre Descartes, p. 44.

2. Perelman, C., p. 363. 3. Sorman, Guy, A Solução Liberal, p. 54. 4. Descartes, cit. Capra, Fritjof, " O Ponto de Mutação", p. 63. 5. Bohr, Niels, cit. Pais, Abraham, Einstein viveu aqui, p. 42. 6. Russel, B., 2001, p. 397. 7. De Broglie, Louis, Théorie de la Quantification dans la Nouvelle

Mécanique, p. 31; cit. Bachelard, Gaston, O novo espírito científico, p. 123.

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8. Comte, Augusto, cit. Bastos, Wilson de Lima, "Nos Meandros da Política", p. 192.

9. Gleiser, Marcelo, A Dança do Universo Dos Mitos de Criação ao Big-Bang, p. 31.

10. Comte, Augusto, cit. Koyré, A., p. 22/30. 11. Comte, Augusto, Cors. t. IV, p. 310, cit. Japiassú, Hilton,

Nascimento e Morte das Ciências Humanas, p. 129. 12. Leibniz, cit. Perelman, C., p. 672. 13. Descartes, Rene, cit. Capra, Fritjof, p. 55. 14. Einstein Albert e Infeld, Leopold, A Evolução da Física, p. 36.

3. Epiléptica Dialética

1. Henry, John, p. 101. 2. Descartes, Rene, cit. Burns, Edward McNall, Lerner, Robert E. e

Standish, Meacham, Vol 2, p. 455. 3. Granger, Gilles-Gaston, A Razão, p. 125. 4. Chopra, Deepak, O Caminho do Mago, Vinte lições espirituais

para você criar a vida que deseja, p. 153. 5. Koyré, Alexandre, p. 25. 6. Bateson, Gregory, Steps to na ecológy of mind, Nova York,

Ballantine, 1972, cit. Capra, Fritjof, Sabedoria Incomum, Conversas com pessoas notáveis, p. 63.

7. Russel, B., 2001, p. 281 8. Damásio, A, p. 279. 9. Descartes, Rene, cit. Capra, Fritjof, p. 55. 10. Hegel, W. G., cit. em Reale, Miguel, O Direito Como Experiência,

p. 48 11. Sousa, Walter de, O Novo Paradigma, p. 24. 12. Brodsky, Joseph, cit. Paz, Octávio, O mal começou em

Descartes, jornal "La Nación", transcrito pelo jornal "Zero Hora", Porto Alegre, 30 de marco de 1996, Caderno Cultura, p. 2.

13. Hegel, G.W , Bobbio, Norberto, Estudos Sobre Hegel, Direito, Sociedade Civil, Estado, p. 42.

14. Morin, Edgar, Ciência com Consciência, p. 28. 15. Villey, Michel, cit. Goytisolo, Juan Vallet de, p. 51. 16. Gleiser, Marcelo, A Dança do Universo Dos Mitos de Criação ao

Big-Bang, p. 307. 17. A partir de 1643 Descartes corresponde-se abundantemente

com a Princesa Isabel, mas não soube responder, suplicando a Isabel que se "digne atribuir matéria e extensão a alma, pois tal não é mais nem menos que concebê-la unida ao corpo..." fonte: Alquié, Ferdinand, p. 45/46.

18. Chopra, D , O Caminho do Mago, Vinte lições espirituais para você criar a vida que deseja, p. 181.

19. Bohm, David, cit. Sousa, Walter de, p. 45. 20. Damásio, Antônio R., p. 280/81 21. idem, p. 113. 22. Serres, Michel, cit. Descamps, Christian, p. 103. 23. Fowler, Dean R., “Einstein´s Cosmic Religion” 1979, cit.

Jammer, Max, p. 103.

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24. Heisenberg, W., cit. Capra, Fritjof, Sabedoria Incomum, Conversas com pessoas notáveis, p. 16

25. Goldman, Lucien, Ciências Humanas e Filosofia - Que é a Sociologia, p. 72.

26. Alquié, Ferdinand, p. 60. 27. Coveney, Peter e Highfield, Roger, p. 96. 28. Lemkow, Anna F., p. 15. 29. Idem, p. 82/8 30. Locke, John, cit. Châtelet, F., História da Filosofia, vol.II, p. 228 31. Smith, Adam, Teoria dos Sentimentos Morais, p. 388/9 32. Nóbrega, Clemente, p. 242/243.

Capítulo II - No rastro do Leviatã

1. Coulanges, Fustel, (1945) cit. Bastos, Wilson de Lima, Nos Meandros da Política, p. 18.

2. Tolstoi, Leon, cit. Fadiman, Clifton org., p. 163. 3. Frase de Althusius, Johannnes, criador do método qualificado

como "genético"; considerava a família como última instância, desprezando o interesse do indivíduo, porque submisso à causa maior. Cit. Chevallier, ob cit. Tomo I, p. 316.

4. Cardoso, Fernando Henrique, jornal O Pioneiro, Caxias do Sul, 9 de janeiro de 1997, p. 18.

5. Bobbio, N., Estado, governo, sociedade; para uma teoria geral da política, p. 87.

6. Bodin, Jean, cit. Bobbio, Norberto, A Teoria das Formas de Govêrno, p. 95.

7. Bodin, Jean, cit. Chevallier, Jean Jacques, p. 56. 8. Bodin, Jean, République, 1576; cit. Perelman, C., p. 325. 9. Koselleck, Reinhart, p. 22. 10. Bodin, Jean, cit. Chevallier, Jean Jacques, p. 55. 11. Japiassú, Hilton, A Revolução Científica, p. 173. 12. Bodin, Jean.; Hobbes, Thomas.; Filmer, Robert, cits. Bastos,

Wilson de Lima, Nos Meandros da Política, p. 172.

Capítulo III - O axioma do mêdo

1. Bachelard, Gaston, cit. Quillet, Pierre, ob. cit. p. 105 2. Foucault, Michel, Resumo, p. 122. 3. Smith, Adam, Inquérito sobre a Natureza e as Causas da

Riqueza das Nações, 748. 4. Hegel, W. e Hobbes, T., cits. Bobbio, Norberto, A Teoria das

Formas de Govêrno, p. 107 e 119. 5. Nisbet, Robert A., Hobbes, Thomas, cit. Bobbio, Norberto,

Thomas Hobbes, p. 154. 6. Hobbes, Thomas, cit. Bobbio, Norberto, A Teoria das Formas de

Govêrno, p. 119.

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7. Bobbio, Norberto, Estado, governo, sociedade; para uma teoria geral da política, p. 54.

8. Russel, Bertrand, 2001, p. 273. 9. Hobbes, T. cit. Brett, R. L., La Filosofia de Shaftesbury y la

estetica literaria del Siglo XVIII, p. 14. 10. Hobbes, Thomas, cit. Chevallier, Jean-Jacques, As grandes

obras políticas de Maquiavel a nossos dias, p. 19. 11. Hobbes, Thomas, cit. Bobbio, Norberto, Thomas Hobbes, p. 25. 12. Russel, Bertrand, 2001, p. 274. 13. Hobbes, T., cit. Cobra, Rubem Q., Thomas Hobbes, in Página

de Filosofia Moderna, Geocities, Internet, 1997. 14. Hobbes, Thomas, cit. Bastos, Wilson de Lima, p. 173. 15. Hobbes, Thomas e Bacon, Francis, cit. Engels, F., Do

Socialismo Utópico ao Socialismo Científico, p. 9. 16. Hobbes, T., cit. Brett, R. L., ob. cit, p. 12. 17. Hobbes, Thomas, O Leviathan, cit. Chevalier, Jean-Jacques,

As grandes obras políticas de Maquivel a nossos dias, 2 edição, 1966, p. 62

18. Russel, Bertrand, 2001. 19. Hobbes, T., cit. Brett, R. L., ob. cit, p. 12. 20. Hobbes, Thomas, cit. Gusdorf, Georges,, p. 164; também em

Bastos, Wilson de Lima, p. 173. 21. Cudworth, Ralph, cit. Brett, R. L., p. 13. 22. Hobbes, T., cit. Bastos, Wilson de Lima, p. 173. 23. Hobbes, Thomas, Leviathan, 21, 27, cit. Bobbio, Norberto,

Thomas Hobbes, p. 29. 24. Hobbes, Thomas, cit. Henry, John, p. 35. 25. Descartes, R. e Hobbes, Thomas, cits. Alquié, Ferdinand, p. 75. 26. Rohmann, C., p. 61. Também em p. 198 27. Hobbes, T., De Cive; Leviathan; cit. Koselleck, Reinhart, p. 26. :

"Por temor, Hobbes torna-se o mais forte defensor do Estado”. 28. Hobbes, Thomas, cit. Bobbio, Norberto, Thomas Hobbes, p.

76/77. 29. Bobbio, Norberto, Thomas Hobbes, p. 194. 30. Hobbes, Thomas, cit. Chevalier, Jean-Jacques, As grandes

obras políticas de Maquivel a nossos dias, 2 edição, 1966, p. 61. 31. Roper, H. R. Trevor, cit. Bobbio, Norberto, Thomas Hobbes, p.

191. 32. Dewey, J, Philosophy and Civilization, 1937, p. 24; cit. Reale,

Miguel, Pluralismo e Liberdade, p. 59. 33. Hobbes, Thomas, cit. Brett, R. L., p. 29. 34. Cromwell, Oliveiros, cit. Burns, Edward McNall, Lerner, Robert

E. e Standish, Meacham, p. 432. 35. Hobbes, T. Leviathan II, 18, cit. Koselleck, Reinhart, p. 31. 36. Hobbes, Thomas, O Leviatã, "Os Pensadores", p. 206. 37. Hobbes, Thomas, cit. Prelot, Marcel, vol II, Vol. II, p. 258. 38. Maturana, Humberto, cit. Pellanda, Nize M.C. e Pellanda,

Eduardo Campos, p.115. 39. Giddens, A. p. 144. 40. Telles Junior, Goffredo, O Direito Quântico, p. 255. 41. Ferguson, Marilyn, p. 160.

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42. Hobbes, T., cit. Toynbee, Arnold J., Estudos de História Contemporânea - A civilização posta à prova", p. 219.

43. Hobbes, Thomas, cit. Polin, Raymond, Galileu, Descartes e o Mecanismo, p. 77.

44. Idem, ibidem. 45. Thoureau, H., in Downs, Robert Bingham, p. 75. 46. Einstein, Albert, cit. Pais, Abraham, Einstein viveu aqui, p. 139. 47. Penna, O.M., O espírito das revoluções, p. 83. 48. Taine, H., cit. Paine, Thomas, Os Direitos do Homem, p. 122. 49. Jouvenel, Bertrand de, cit. Andrade, Manuel da Costa,

Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, Uma perspectiva jurídico-criminal, p. 28.

50. Idem, ibid. 51. Thoureau, H., Desobedecendo, A Desobediência Civil e outros

escritos. 52. Penna, J. Meira, O Espírito das Revoluções, p. 83 53. Russel, Bertrand, 2001, p. 276 54. Penna, J. O. de Meira, O espírito das Revoluções, p. 19. 55. Santo Agostinho: De Civitae Dei, Livro XV, cap. I. 56. Hobbes, T., cit. Foucault, Michel, Microfísica do Poder, p. 183. 57. Einstein, A. , Escritos da maturidade: artigos sobre ciência,

educação, relações sociais, racismo, ciências sociais e religião, p. 133.

58. Hobbes, Thomas, cit. Chevalier, Jean-Jacques, As grandes obras políticas de Maquivel a nossos dias, 2 edição, 1966, p. 60

59. Rohden, Huberto, Filosofia Contemporânea, p.28 60. Polin, Raymond, cit. Prelot, Marcel, vol II, p. 259. 61. Davy, G., L'anne sociológique, p. 169; cit. Prelot, Marcel, vol II,

p. 266. 62. Mourgon, Jacques, La science du pouvoir totaliteire dans le

Leviathan de Hobbes, p. 281 e seguintes. 63. Hobbes, Thomas, cit. Rohden, H., ob. cit. p. 54. 64. Schmitt Carl, cit. Prelot, Marcel, vol II, p. 266. 65. Viatoux, Joseph, cit. Prelot, Marcel, vol II, Vol II, p. 263. 66. Hayek, Friedrich August von, Os erros do socialismo -

Arrogância Fatal, p. 88. 67. Japiassú, Hilton, Nascimento e Morte das Ciências Humanas, p.

101 68. Hobbes, T., cit. Rohden, Huberto, Filosofia Contemporânea, p.

53. Capítulo IV - O Parasita

1. Sabine, George H., História das Teorias Políticas, p. 543. 2. Bachelard, Gaston, cit. Quillet, Pierre org. p. 32. 3. Rousseau, J.J. Euvres Complète, II, 346, diz: “...uma vez que,

de todas as aversões que a natureza nos dá, a mais forte é a de morrer, decorre daí que tudo é permitido por ela a qualquer um que não tenha outro meio possível de vida”. Rousseau, J.J., Hobbes, T., cits. Koselleck, Reinhart, p. 146.

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4. Rousseau, J.J., cit. Châtelet, F., História da Filosofia, vol.II, p. 271.

5. Perelman, C., p. 331/2. 6. Rousseau, J. J., cit. Russel, B., 2001, p. 338. 7. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Rohden, H, Filosofia

Contemporânea, p. 132. 8. Rousseau, J.J., Discurso Sobre a Desigualdade dos Homens,

cit. Santos, Francisco de Araújo, Voltaire tinha razão – Os avanços tecnológicos não são a causa do desemprego, in jornal Zero Hora, Porto Alegre, 27 de janeiro ed 2001, Especial, p. 5

9. Voltaire, cit. idem, ibidem. 10. Rousseau, J. J., cit. Châtelet, François, p. 274. 11. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Prelot, Marcel, vol II, História

das Idéias Políticas, Volume III, p. 78. 12. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Rohden, Huberto, Filosofia

Contemporânea, p. 132. 13. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Sabine, G., p. 567. 14. Como em Sabine, George, p. 567. 15. Locke, J., Rousseau, J.J., cits. Châtelet, F., p. 275. 16. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Jorge, Fernando, p. 295. 17. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Mises, Ludwig Von, As Seis

Lições, p. 19; também Weber, Eugen, da UCLA, especial para TV Senado em 17/4/2001.

18. Mises, Ludwig von, As seis lições, p. 19. 19. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Falcon, Francisco José

Calazans, Iluminismo, p. 68. 20. Coelho, Luiz Fernando, Teoria Crítica do Direito, p. 341. 21. Rousseau, J.J., cit. Bonavides, Paulo, Ciência Política, p. 217. 22. Necker, Du Pouvoir Executif dans les Grandes Etats, v.2, p.

226; cit.idem, p. 459. 23. Constant, Benjamim, cit. Bobbio, Norberto, Liberalismo e

Democracia, p. 59. 24. Thoreau, H., cit. Downs, Robert Bingham, p. 76. 25. Bonavides, Paulo, Ciência Política, p. 459. 26. Downs, Robert B., p. 147. 27. Rousseau, J.J., Devaneios, 3. caminhada, cit. Châtelet, F., , p.

289. 28. Holbach, Helvetius, Diderot, Rousseau, cits. Sartre, Jean-Paul,

O existencialismo é um humanismo; A imaginação; Questão de método, p. 114.

29. Russel, B., 2001, p. 283. 30. Engels, F., p. 19. 31. Kelsen. H., p. 141. 32. Jaspers, K., cit. Konder, Leandro, Lukács, p. 81 33. Rousseau, J.J., O Contrato Social, II, 3, cit. Koselleck,

Reinhart, p. 142 34. Villey, Michel, cit. Goytisolo, Juan Vallet de, p. 91. 35. Simon, Ives R., cit. Goytisolo, J. V. idem, ibidem. 36. Thoreau, Henry David, A Desobediência Civil, p. 8 e 35.

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37. Einstein, Albert, New York Times, 22 de novembro de 1931, cit. Pais, Abraham, Einstein viveu aqui, p. 205.

38. Rohden, H., Einstein, o Enigma do Universo, p. 140. 39. Kelsen, Hans, p. 141. 40. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Bonavides, Paulo, p. 56. 41. Gorbachev, M., p. 36. 42. Burzio, Felipe, cit. Gramsci, Antônio, Maquiavel, a Política e o

Estado Moderno, p. 133. 43. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Schwartzenberg, Roger-Gérard,

O Estado Espetáculo, p. 13. 44. Jouvenel, Bertrand, cit. Penna, Osvaldo de Meira, prefácio de

Jouvenel, Bertrand de, A Ética da Redistribuição, p. 15. 45. Barbu, Zevedei, in apresentação de Tocquevile, A, O Antigo

Regime e a Revolução, p. 18. 46. Burke, Edmund, Reflexões sobre a Revolução em França; cit.

Bobbio, Norberto, A Era dos Direitos, p. 87. 47. Schmidt, Carl, Die Dixtatur, Munique, 1921, 116 ss, cit.

Koselleck, Reinhart, p. 142. 48. Constant, Benjamin, Da Liberdade dos Antigos Comparada a

dos Modernos, Tradução de textos escolhidos de Benjamin Constant, por Gauchet, Marcel Org., De la Libertè chez les Modernes.

49. Tocqueville, Alexis, cit. Bobbio, Norberto, Liberalismo e Democracia, p. 57.

50. Hayek, F. cit. Bobbio, Norberto, idem, p. 88. 51. Lukács, G. , cit. Konder, Leandro, Lukács, p. 80 52. Goodman Paul, The Empire City, p. 277. 53. Rousseau, Jean-Jacques, O Contrato Social. 54. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Bobbio, Norberto, A Era dos

Direitos, p. 56. 55. Reale, Miguel, Pluralismo e Liberdade, p. 22. 56. Junior, Goffredo Telles, O Direito Quântico, p. 280. 57. Bonavides, Paulo, Ciência Política, p. 217. 58. Rousseau, Jean Jacques, cit. Prelot, Marcel, vol II, ob. cit. p.

83. 59. Gusdorf, Georges, p. 18. 60. Kelsen, Hans, A Democracia, p. 99. 61. Bobbio, Norberto, A Era dos Direitos, p. 101. 62. Einstein, Albert, "Como Vejo o Mundo", in "Einstein por ele

mesmo", p. 75. 63. Thoreau, Henry, p. 17/18. 64. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Derathè, R., Jean-Jacques

Rousseau et la science politique de sons temps, Paris, 1970, pp 113-20; cit. Rawls, John, A Justiça e a Democracia, p. XXII

65. Rousseau, Jean-Jacques, cit. Hayek, F. A., Arrogância Fatal, p. 74.

66. Rousseau, J. J. e Descartes, R., cit. Reale, Miguel, Pluralismo e Liberdade, p. 161.

67. Hayek, F., cit. Maksoud, Henry, p. 39. 68. Idem, ibidem. 69. Penna, J. O Meira, O Espírito das Revoluções, p. 366/67.

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70. Machiavel, Nicolau, cit. Faria, Octávio, Machiavel e o Brasil, p. 73.

71. Rousseau, Jean Jacques, Du Contrat Social, Liv. III, Cap. I, p. 274; cit. em Bonavides, P., p. 130.

72. Rohden, Huberto, Um bonde chamado relatividade, in Einstein, A, O enigma do universo, p. 207.

73. Barzun, Jacques, Sobre a História, cit. Fadiman, Clifton org. O Tesouro da Enciclopédia Britânica - O melhor Pensamento Humano desde 1768, p. 6.

74. Taine, Huppolyte, cit. Leoni, Bruno, A Liberdade e a Lei, p. 167.

75. Kant, Immanuel, cit. Bobbio, Norberto, A Era dos Direitos, p. 107.

76. Mascarenhas, Eduardo, p. 90. 77. Tocqueville, A, O Antigo Regime e a Revolução, p. 134. 78. Rousseau, Jean Jacques, cit. Sabine, G., p. 575 e 576. 79. Einstein, Albert, Como Vejo o Mundo, p. 15. 80. Como em Althusser, Louis, Sobre el Contrato Social, in Levi-

Strauss, Claude, Presencia de Rousseau, p. 70 e seguintes. 81. Bakunin, Michael, A Igreja e o Estado, 1910, cit. Woodcock,

George, p. 77. 82. Rousseau, Jean Jacques, cit. Sabine, G., p. 581. 83. Idem, ibidem. 84. Johnson Samuel, cit. Challita, Mansour, Os Mais Belos

Pensamentos de Todos os Tempos, p. 78. 85. Bonavides, Paulo, Ciência Política, p. 131. 86. Constant, Benjamin, Da Liberdade dos Antigos Comparada a

dos Modernos. 87. Penna, José Osvaldo de Meira, Apresentação à Edição

Brasileira, in Jouvenel, B., A Ética da Distribuição, p. 10. 88. Tocqueville, A. , O Antigo Regime e a Revolução, Livro II,

cap. VI, p. 100. 89. Rousseau, Jean-Jacques e Bonaparte, Napoleão, cits Jorge,

Fernando, p. 71.

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A PERFÍDIA CIENTÍFICA DE DESCARTES, HOBBES & ROUSSEAU

(e suas trágicas consequências)

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