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5. O naming
5.1. O processo
Um bom nome de marca deve carregar a essência da marca. Deve conotar
associações favoráveis e ajustar-se aos propósitos da empresa ou produto. O nome
da marca é o foco de todas as impressões criadas para a empresa ou produto e
percebidas por seus diversos públicos. Assim, é recomendável que, antes de
começar o processo de desenvolvimento do nome, tenha-se uma idéia clara do
plano estratégico da marca.
A declaração da missão, uma visão do futuro da empresa, um plano para
diferenciar o negócio dos da concorrência, a descrição detalhada do mercado onde
vai atuar, e os valores pelos quais a companhia irá trabalhar. Para Murphy (1987:
97), com a segmentação e especialização dos mercados e a internacionalização de
hábitos, gostos, o trabalho de desenvolver o nome de marca fica cada vez mais
crítico.
Segundo Kapferer (1998: 107) “o nome é uma das fontes mais fortes de
identidade”. Quando a marca é questionada sobre sua identidade, é conveniente
analisar o nome, a fim de reencontrar a lógica que teria presidido à seleção desse
nome.
Wheeler (2003:78) diz que o Naming é um processo complexo, criativo e
interdisciplinar, que requer habilidades em diversos conhecimentos como
lingüística, marketing, pesquisa e legislação de marca registrada. Apesar de todas
as qualidades desejáveis para um bom nome de marca – ser significante,
memorável, orientado para o futuro, protegível, “visual” e com associações
positivas, criar um nome de marca que possa ser legalmente protegido atualmente,
é o maior desafio para os especialistas .
96
Murphy (1987:86) evidencia que, apesar do importante papel que o nome de
marca representa, é impressionante a freqüência com que os nomes são
selecionados - com pouca ou nenhuma real consideração, dada às funções
complexas que representam. Muitos nomes são escolhidos de um modo casual, e
mostram ser inadequados ou inaptos para o registro em países estrangeiros e não
raramente em mercados internos também. Às vezes, são focados em um benefício
ou atributo especifico do produto que, com o passar do tempo, pode se tornar
menos importante ou até mesmo prejudicial. Ou ainda, o nome é tão particular
para um produto que impede qualquer forma de extensão de linha1.
Usar extensões de linha é uma maneira para introduzir novos produtos no
mercado que é mais eficiente e menos dispendiosa do que adotar nomes de marca
diferentes para cada produto individualmente. Pelo uso de um nome de marca
comum, os custos de design de embalagem, desenvolvimento de nome de marca,
propaganda de lançamento, promoção e distribuição podem ser nitidamente
reduzidos. (Fig. 26)
Fig. 26 Exemplo de extensão de linha do óleo LISA, que possui variações de sabores e
formato de embalagem, mas utiliza o mesmo nome de marca.
Além dos problemas inerentes à capacidade de registro de um nome de
marca, segundo Murphy (1987:87), muito freqüentemente, os gestores da marca
não estão atentos a planos de expansão do produto em escala internacional, ou não
consideram essa questão suficientemente importante para ser incluída na
1 É quando uma marca utiliza o mesmo nome para produtos de uma mesma categoria mas quevariam em sabores, formatos de embalagem, fórmulas, etc. Por exemplo o sabão OMO usa omesmo nome para suas versões em pó e liquida.
97
estratégia de Naming. Quando esta consideração não é levada em conta, pode
resultar depois em perda de tempo, custos extras consideráveis, e possíveis perdas
de negócios.
Para Kapferer (1998: 107) “a tentação de desprezar o nome está ligada a
uma interpretação apressada do principio de autonomia da marca. De fato, a
experiência mostra que a marca adquire uma autonomia: ela se deslexicaliza; em
outros termos, ela dá um outro sentido as palavras”. Segundo Gelli (2004:
entrevista gravada) a interjeição OI de uso bastante corrente em língua portuguesa
deixou de ser pronunciada nos corredores de uma empresa de telefonia porque
agora significa o nome da concorrente. É comum as pessoas nomearem todas as
lâminas de barbear, independente de seu fabricante, pelo nome GILLETE, o nome
do fundador da primeira empresa a fabricar essas lâminas. Ao contrário do que
muitos pensam, o nome da marca de sorvetes HÄAGEN-DAZS (Fig. 27) é de
Nova Iorque. Essas duas palavras foram inventadas e baseadas em um olhar
“europeu” dos norte-americanos. Os dispositivos de ortografia aplicados ao nome
invocam os sistemas de ortografia usados em vários países europeus, como o uso
do trema na letra “a” bastante empregado na língua alemã e finlandesa. Isto é fruto
do processo de auto-simbolização ocasionado pela comunicação da marca e do
retorno das experiências de seus consumidores.
Fig. 27 Logotipo/símbolo da HÄAGEN-DAZS
No caso específico desta marca, o conceito de estética “européia” não é
encontrado somente no nome, mas em toda a identidade que foi intencionalmente
desenvolvida para causar essa impressão. O design foi fundamental nesse
processo de construção simbólica. Segundo Stolarski (2004: entrevista gravada)
qualidades visuais intrínsecas a um nome, concisão, tanto em relação à facilidade
98
de aplicação visual ligada ao seu comprimento quanto à simplicidade da
pronuncia, são essenciais para uma marca.
Gobé (2002: 209) cita o exemplo da LANCÔME em que a rosa e o acento
sobre o “o” são os dois sinais mais importantes, que dão significado e
personalidade à imagem da marca. A rosa é obviamente o símbolo da
feminilidade, mas o acento circunflexo no “o” , gramaticalmente desnecesssário,
denota a origem francesa da marca e conota sensualidade. (Fig. 28)
Fig. 28 Logotipo/símbolo da marca LANCÔME
O designer contribui para a construção da identidade de marca de modo
mais coerente, quando é envolvido em todas as etapas deste processo, Kurlanski
(1987: 98) enfatiza que o papel do designer no desenvolvimento de uma marca é
determinado pela natureza do projeto, mas pode começar mais cedo que a maioria
dos proprietários de marca acreditam. Existe dúvida quanto ao que o designer
pode proporcionar à imagem de uma marca, antes do momento do tratamento
visual ser necessário. A participação no desenvolvimento da identidade da marca
pressupõe conhecimento da função do produto, ação, estética, ergonomia,
mensagem e nome. O designer está apto a trabalhar na escolha do nome da marca,
como também na determinação do tamanho e forma e na determinação da
natureza de uso em uma embalagem.
Os entrevistados foram unânimes ao afirmar que o nome pode interferir
positivamente ou negativamente na construção da identidade de uma marca.
Matsumoto (2004: entrevista gravada) diz que “muitas vezes o nome é a fonte
inspiradora do conceito criativo, bem como, do posicionamento do
produto/serviço”. Para Lauria (2004: entrevista gravada) o nome da marca tem a
capacidade de associação à instituição, de memorização e de reconhecimento
superior aos demais elementos formadores da identidade e por isso tem um papel
fundamental à construção da identidade.
99
Stolarski (2004: entrevista gravada) completa com a idéia de que, às vezes,
o nome sobrevive ao desenho da marca. Em outras, o nome é muito mais forte que
o seu desenho, e, sem dúvida nenhuma, o trabalho de construção da identidade de
qualquer atividade, tende a passar cada vez mais pela construção do nome.
A PETROBRAS, é um exemplo da força que um nome de marca pode
adquirir. Em 2001, uma possível mudança de nome da marca para PETROBRAX
(Fig.29), gerou reações acaloradas em diversos setores, da economia ao design, e
em todo o país. "Resistências ideológicas" à mudança do nome, proclamavam que
esse era um artifício “cultural” e “marqueteiro” para viabilizar politicamente o
processo de privatização da companhia. Muitos designers criticaram não só a
mudança de nome como também a do conjunto símbolo/logotipo, projeto que na
época foi comandado pelo escritório de design paulista UND. Rafael Rodrigues,
sócio da PVDI, escritório que desde 1970 cuidava da identidade visual da
empresa, criticou o símbolo que lembrava a silhueta de uma chama dizendo: “a
chama significa para o petróleo aquilo que é descartado. Nas refinarias sempre
aparece uma chama queimando petróleo”. (in Revista Design Gráfico 46: 52-53).
Esse caso demonstra o cuidado que deve ser tomado em uma transição de nome
de marca.
Fig. 29 – proposta de símbolo/logotipo para a mudança de nome de PETROBRAS para
PETROBRAX
5.1.1 O briefing
O processo do Naming consiste em algumas etapas importantes. A primeira
delas envolve o levantamento de dados relativos às necessidades do projeto. Nesta
100
fase é primordial conhecer o posicionamento da marca, através de informações
relativas à empresa ou produto e seus respectivos mercados. Um exame cuidadoso
do conceito da empresa ou produto e do que faz; suas propriedades especiais e sua
posição no mercado; o modo que isto será usado; a satisfação que traz ao usuário;
sua relação com os concorrentes; a distribuição e o plano de mídia; se o produto
faz, ou fará parte de uma linha; os pontos de venda; o “sexo” do produto; a relação
do nome da companhia e suas marcas registradas existentes, além de estabelecer
os países, culturas e idiomas onde o registro será buscado, e conseqüentemente
onde o nome deverá ser particularmente apropriado. (Murphy, 1987: 89)
Para Murphy (1987: 87) existem algumas questões estratégicas essenciais
que devem ser levantadas no inicio do desenvolvimento do nome de uma marca.
A primeira delas é se a marca é de um produto inovador ou não. Se a resposta for
positiva, é sensato desenvolver um nome que claramente diferencie o produto de
seus concorrentes menos interessantes e inovadores. Até mesmo se o produto
novo não é particularmente inovador, há uma oportunidade de diferenciá-lo da
competição por meio de um nome de marca interessante e distintivo.
A segunda questão é a respeito de a nova marca ter ou não uma abrangência
internacional no futuro. Marcas internacionalmente fortes normalmente possuem o
mesmo nome em todos os países. Fato que exige grandes esforços envolvendo
pesquisas e testes relacionados com a percepção e particularidades inerentes ao
idioma em que os nomes deverão ser implantados. O uso de um único nome
também proporciona vantagens na diminuição de gastos com comunicação. Há
significantes 'overlaps' (superposição de mídias) promocionais entre países,
principalmente, depois da popularização dos canais de TV a cabo - muita TV
americana é vista no Canadá, muitos consumidores irlandeses assistem a TV
britânica, e quase um milhão de adultos italianos assiste a TV suíça diariamente.
(Murphy, 1987: 87) É interessante, ainda, a possibilidade da redução de custos
com desenvolvimento e produção de embalagens quando existe sinergia entre
mercados. O uso de nomes de marca globais em um mundo onde as distâncias se
encurtam, faz com que as marcas sejam referências importantes para uma pessoa
que chega em um país estranho e não tem conhecimento da língua.
101
Um exemplo de troca de nomes para ocasionar sinergia entre mercados foi
da mudança dos nomes dos chocolates da Nestlé KRI e LOLLO para CRUNCH e
MILKYBAR, como estratégia da empresa para integração global de suas marcas.
Excluindo aqueles consumidores “saudosos” que possuíam uma forte relação
afetiva com os nomes (na internet é possível encontrar diversos sites que
evidenciam essa relação), a transição foi considerada tranqüila e obteve grande
sucesso.(Fig.30)
Fig. 30 Transição de nomes de marca na Nestlé – KRI para CRUNCH e LOLLO para
MILKYBAR
Outras empresas, porém, valorizam a relação de afetividade e preferem
trabalhar com diversos nomes regionalizados, mesmo que sejam para produtos
semelhantes. Um caso interessante é o da estratégia da UNILEVER para suas
marcas de sorvete. Ela utiliza vários nomes como por exemplo: ALGIDA na
Eslováquia, Polônia, Rússia e Turquia; FRISKO na Dinamarca; FRIGO na
Espanha; HB na Irlanda; KIBON no Brasil e Argentina; LANGNESE na
Alemanha: LUSSO na Suíça; OLA na Bélgica e Holanda; OLÁ em Portugal e
WALL’S na Inglaterra e Paquistão. Apesar de ser um modelo que exige mais
gastos, o interessante nesse processo foi que a UNILEVER encontrou uma
maneira de causar alguma sinergia entre as marcas utilizando o mesmo símbolo
em forma de coração e um alfabeto institucional comum na assinatura das marcas.
(Fig. 31)
102
Fig. 31 Marcas de sorvetes da UNILEVER
Muitas dessas marcas foram frutos de aquisição, inclusive a KIBON, que foi
fundada na década de 40 e era inicialmente chamada de A U.S. Harkson do Brasil
Indústrias Alimentícias, com sede no Rio de Janeiro, foi a pioneira ao introduzir o
sorvete industrializado no Brasil. Em 1942 lançou no mercado as marcas
ESKIBON e CHICABON. Dezoito anos mais tarde, a Harkson mudou seu nome
para Kibon. Em 1960, a companhia foi comprada pela norte-americana General
Foods e abriu uma fábrica em São Paulo. A primeira parceria ocorreu em 1971,
com a Sorvane, na região Nordeste do País. Em 1985, o conglomerado Philip
Morris adquiriu a General Foods, incorporando a marca Kibon, que foi vendida
em 1997 para a UNILEVER pelo valor de 930 milhões de dólares, e grande parte
desse montante foi devido a notoriedade da marca no mercado brasileiro.
A China se tornou um dos mercados mais atraentes para as empresas e tem
exigido um esforço na adaptação de suas marcas a esse país. Segundo Baccarin
(2004: 36):
“As multinacionais têm optado por três caminhos na hora de traduzir ou adaptarsuas marcas. O primeiro é traduzi-las a partir da semelhança sonora da palavra.Considerada como a opção mais simples, essa estratégia foi adotada, por exemplo,pelo McDonald's (Maidangnao), pela Danone (Da neng) e pela Ford (Fute). Asegunda possibilidade é traduzir somente o significado. Essas marcas originalmentetêm a característica de ser constituídas por palavras de uso comum e, portanto,mais fáceis para tradução. Por exemplo, a suíça Nestlé traduziu Ninho direto para omandarim. Assim como Ninho (Quechao), os nomes General Motors (automóveisgerais ¿ Tongyong qiche) e Volkswagen (automóveis do povo ¿ Dazhong qiche)também foram traduzidos literalmente para o mandarim.“
A terceira opção é considerar a semelhança sonora e também o significado positivodo nome em mandarim. Trata-se, portanto, de adotar a combinação de caractereschineses e criar um jogo de palavras que tenha semelhança tanto com a pronúnciacomo também com os valores da marca. Um caso de sucesso é o da Coca-Cola, que
103
em mandarim ficou Ke kou ke le, que significa gostoso e delicioso de beber. Ouseja, os valores da marca estão ali, presentes. Esta opção é a mais difícil, mas, aomesmo tempo, mais interessante, desafiadora e inteligente sob o ponto de vistacultural”.
A terceira questão levantada por Murphy (1987: 88) diz respeito à
capacidade da marca para produzir extensões de linha.
A última questão é relativa à natureza da proteção que pode ser dada à
marca. Se o novo produto é garantido por um processo de patente que os
competidores não podem imitar, ou se a empresa desfrutar de uma posição de
monopólio, pode haver poucas chances das marcas dos concorrentes aparecerem
no mercado. Então, nomes de marca descritivos, que normalmente não são
facilmente registráveis, podem ser aceitáveis. Se por outro lado, a resposta
competitiva for poderosa é provável que um nome de marca forte e protegível
possa ser inerentemente essencial.
5.1.2 As linhas criativas
De posse dessas informações é possível passar para a segunda etapa quando
serão determinados os critérios do projeto e a linha criativa a ser adotada.
Segundo Guardado (2004: entrevista gravada), pode-se seguir duas linhas
criativas subsequentes, a primeira delas é a “explosão de idéias” ou, o
brainstorming. Pelo uso desta técnica, existe a grande possibilidade de conseguir
uma grande quantidade de idéias de “qualidade discutível e depois separar o joio
do trigo” até chegar a uma proposta viável. A outra linha pode ser descrita como
de “imersão” e consiste em uma “profunda e obsessiva” busca do “núcleo” da
idéia do futuro nome. A partir desse núcleo é usada a técnica do campo semântico.
Por exemplo, a partir da palavra “rosa”, imediatamente é possível remeter a flor,
uma determinada cor, etc. um pouco mais adiante é possível ter as palavras
perfume e espinho. Indo mais além, tem-se “relação amorosa” e assim por diante.
Tudo desenvolvido a partir do núcleo da idéia “rosa”. É uma técnica para
compreender a idéia central que está por trás da marca e que pode gerar nomes
com “conteúdo” mais apropriado.
104
Nessa etapa é necessário o uso de várias ferramentas criativas. Para Murphy
(1987: 91), buscar palavras em bancos de dados existentes e dicionários
computadorizados; identificar nomes que possuam os atributos exigidos; baseado
em aspectos fonéticos, usar técnicas de junção de palavras para construir novos
nomes, podem auxiliar bastante no desenvolvimento do nome. Leite (2004:
entrevista gravada) acredita que a melhor ferramenta de auxilio para o
desenvolvimento de nomes de marcas ainda é o uso de dicionários.
Existem também softwares de criação de nomes. Segundo Murphy (1987:
92), na prática, programas de geração de nomes por computador geralmente
trabalham com construções de vogal/consoante e mais algumas seqüências de
letras mais comuns. Milhões de nomes podem ser gerados, mas a maioria é
totalmente inútil. Programas de criação de nome por computador podem ter
alguma utilidade, como projetos de Naming para produtos farmacêuticos ou de
substâncias químicas. Porém, a maioria dos nomes de marca precisa ter um
elemento qualitativo, ser associado de algum modo com o produto ou seu
desempenho ou as satisfações que o produto traz. Para ser útil, então, estes
softwares precisam trabalhar dentro de parâmetros qualitativos. Devem também
levar em conta o idioma natural, a fonética e a lingüística. O acesso a dicionários
computadorizados de sinônimos e de idiomas estrangeiros pode aumentar de
forma substancial a qualidade da produção e pode ajudar no processo de Naming.
Para efeito de curiosidade, em 1971, por exemplo, Décio Pignatari já
utilizava o computador para gerar combinações de fonemas, que o auxiliou na
criação do nome LUBRAX. Mas o fato curioso é que, apesar da quantidade de
combinações encontradas, apenas este nome foi apresentado à diretoria da
empresa. (Rezende; Rodrigues, 2004: entrevistas gravadas)
Há um momento em que toda e qualquer sugestão deve ser observada,
inclusive aquelas que possam surgir em reuniões decisórias com clientes e seus
funcionários. Muitas idéias de nomes interessantes surgem nessas situações. Leite
(2004: entrevista gravada) cita o caso de uma empresa têxtil que tinha como
principal diferencial o uso de motivos relacionados à cultura brasileira, onde a
temática inicial seria baseada em grafismos indígenas. Na ocasião ele optou por
105
buscar palavras da língua tupi-guarani, mas abandonou esse caminho quando a
cliente propôs como solução o uso de seu próprio nome, ANA, e lhe deu um
caráter de sigla com a expressão “Arte Nativa Aplicada”.
Outra possibilidade de via criativa é observar a maneira como os seus
principais públicos “apelidam” a empresa ou produto. Nomes como BAND
(Rádio e TV Bandeirantes), FEDEX e LEITE MOÇA surgiram da relação que o
consumidor tem com essas empresas/produtos e a forma afetiva em que eles
reconstruíram estes nomes. No Brasil, quando o produto leite condensado
começou a ser importado, em 1890, adotou-se inicialmente, por falta de um
equivalente adequado em português, o nome inglês "Milkmaid", adaptação de "La
Laitière". Mas os consumidores tinham dificuldade para pronunciar esse nome e
passaram a chamar o produto de "o leite da moça", referindo-se à ilustração da
camponesa no rótulo. (Fig. 32) A Empresa optou pela solução inteligente de
utilizar uma designação criada espontaneamente por seus consumidores. (Accioly
et al., 2003: 82-87)
Fig. 32 Evolução dos rótulos e embalagens do Leite Moça a partir da adoção deste
nome.
Todos os profissionais consultados nesta pesquisa já estiveram envolvidos
de alguma forma em um processo criativo de nomes para marcas. Seja para suprir
as necessidades de seus clientes ou até mesmo por esse tipo de atividade já fazer
parte do conjunto de serviços de seus escritórios. Escritórios como Ana Couto
Design e Branding, GAD’ Design, Tátil, M Design, Dia Design, OZ Design,
Cauduro/Martino, PVDI e Pós-Imagem já contam com equipes interdisciplinares
para desenvolvimento de nomes ou parceiros que são convocados caso haja
necessidade eventual. Esses escritórios cobram por projetos de Naming, alguns
deles como a PVDI e o Cauduro/Martino desenvolvem nomes a mais de 30 anos.
Entretanto, alguns profissionais desenvolvem nomes para suprir necessidades
106
emergenciais de seus clientes, e, muitas vezes, sem nenhuma remuneração,
acabam por incorporar aos valores dos projetos de desenvolvimento de uma
identidade visual, por exemplo.
Nem todos são unânimes em afirmar que o designer está apto para criar
nomes para marcas. Couto (2004: entrevista gravada) diz que esse não é o foco
principal do designer. Grumach (2004: entrevista gravada) também concorda com
essa posição ao dizer que: “até possa ser um designer que venha a fazer um nome,
mas ele não o fará sozinho”. Acredita que a formação do designer não o habilita a
trabalhar com texto, mas que o mesmo pode ser um gerenciador desse processo.
Para Rezende (2004: entrevista gravada) criar nomes implica em ter vivência, “é
preciso ser poeta pra criar nomes”, é uma questão de sensibilidade verbal que o
designer, que tem uma sensibilidade visual, pode até acertar, mas não está no
conjunto de seu conhecimento. O contato com a linguagem no sentido da língua é
a demanda numero um nesse processo. A experiência de poeta é que proporciona
esse tipo de sensibilidade e permite avaliar o desempenho das palavras. Não é
nem tanto uma questão de capacidade criativa, mas é uma capacidade de avaliação
da denotação e conotações inerentes a cada palavra, conforme uma expressão de
Décio Pignatari “é um design da linguagem”.
Kurlanski (1987: 99) acredita que, se durante todo o processo, a “expertise”
do designer estiver disponível, não somente o designer torna-se perfeitamente
familiarizado com as novas forças e características da marca, mas sua experiência
também contribui no nome, estilo, embalagem, cores, tipografia, símbolos - no
ponto certo do processo de desenvolvimento. Sendo assim, o designer deve ser
introduzido no processo de desenvolvimento do conceito da identidade de uma
marca no estágio inicial.
Não é fácil um designer trabalhar com um nome de marca que não
proporciona uma solução correta de design. Se uma análise conduzir o designer à
conclusão de que com um nome mais curto trabalharia melhor e a ele foi dado um
nome longo como uma 'missão cumprida' - então há um conflito, conclui
Kurlanski. A escolha de um nome curto pode ser importante para alguns produtos,
principalmente aqueles que precisam usar a embalagem como “display” no ponto
107
de venda, ou, por questões de legibilidade causadas por limitações de tamanho da
embalagem, como no caso de artigos de toalete, vendidos em frascos e exibidos
verticalmente em uma prateleira. Neste caso é preferível escolher uma palavra
curta.
O tamanho do nome não é a única consideração. O próprio nome solicita
imagens, sentimentos e cores que o designer tem que respeitar. As letras que
compõem o nome também podem apresentar uma oportunidade ou uma restrição
na solução de design. Freqüentemente os melhores resultados de um plano de
Branding podem ser alcançados se for permitido ao designer um papel mais
abrangente, desenvolvendo o nome e o design como um conceito total.
Gobé (2002: 208) diz que um nome precisa ser analisado em seu contexto
geral. É recomendável olhar os nomes grafados com vários alfabetos tipográficos
– que podem assumir aspectos diferentes, quando expressos com tipos diferentes.
Aplicar o novo nome em uma peça de comunicação pode auxiliar a ver a
visualidade do nome. Também é interessante testá-lo verbalmente em situações de
uso comum como em um atendimento via telefone.
5.1.3 A seleção
Após gerar uma lista de nomes, inicia a terceira etapa do processo, quando é
analisada a coerência dos nomes com o posicionamento da marca e posterior
viabilidade de registro legal. Nessa fase, é bastante viável o auxilio da ferramenta
on-line de busca prévia do INPI. Dependendo da complexidade do projeto (nomes
internacionais, por exemplo), também é necessária a participação de um consultor
jurídico para detectar possíveis impedimentos legais. Paralelamente, é importante
verificar qualquer possível constrangimento ligado ao significado do nome; as
qualidades fonéticas e gráficas exigidas na marca registrada.
Os casos observados neste trabalho podem evidenciar os problemas que um
nome “emprestado” de um outro país pode gerar, como conotações indesejáveis.
O caso do carro Ford Corcel quase sofreu esse problema, segundo o publicitário
Mauro Salles da agência Salles Darcy:
108
“A antiga Ford planejava lançar o Cortina europeu e lá na matriz, emDearborn, a poderosa turma do “n.i.h.” (not invented here) optava peloCortina. Dizia, inclusive, que o nome, mundialmente consagrado, seria umapoderosa arma de vendas. Eles perderam, mas depois voltaram com a idéiade usar Capri, que estava registrado mundialmente. Nossa agência caiu depau e eles desistiram. Dissemos que o carro precisaria ter imagem jovem,esportiva, inclusive por causa da versão “GT”, já decidida. Então lembrei o conceito do Mustang. Dearborn aprovou. Aí um talento delá sapecou o nome Ford Pinto, explicando: “É o nome de um pônei que osíndios americanos – e os caubóis – tornaram famoso”. Do lado de cá,morremos de rir. Preparei dois textos destinados a demonstrar ossignificados mais conhecidos, em português, para a palavra pinto. O do filhoda galinha e o outro que... deixa pra lá”.
O nome PAJERO também causou problemas para a empresa Mitsubishi, a
palavra é uma gíria usada em países de língua hispânica para designar
“masturbador”. A solução foi utilizar outro nome, MONTERO, para os paises
hispânicos. (Fig. 33)
Fig. 33 Mitsubishi MONTERO e PAJERO
Outro exemplo é o do medicamento chamado VIADIL, fabricado pelo
laboratório chileno Pharma Investi, que causaria constrangimentos a empresa caso
fosse comercializado no Brasil. (Fig. 34)
Fig. 34 Medicamento VIADIL da Pharma Investi
109
É importante ainda verificar a semelhança do nome da marca com outros de
outras categorias para evitar confusão quanto aos benefícios do produto, pois os
nomes despertam “territórios” de percepção na mente das pessoas. A Nestlé ao
decidir investir em alimentos para animais domésticos resolveu não endossar os
produtos com nome clássico e utiliza o nome PURINA, e as sub-marcas ALPO,
BONZO, FRISKIES GATSY e KANINA. Outro exemplo que pode gerar
confusão e ruídos de comunicação da marca é do medicamento para má-digestão
chamado GASTROL, devido a semelhança com o nome da marca de lubrificantes
para automóveis com o nome CASTROL. (Fig. 35)
Fig. 35 Produtos com as marcas GASTROL e CASTROL
Esses problemas geralmente são detectados com técnicas de pesquisa.
Quando o sigilo é de vital importância é necessário que seja efetuado o registro
antes do inicio das pesquisas de análise de conotações do nome.
Apesar de algumas empresas no Brasil não investirem em pesquisa de
inserção de novos nomes no mercado, Rezende (2004: entrevista gravada) diz
categórico “não dou um passo sem pesquisa, em qualquer situação de maior
responsabilidade”. As técnicas mais utilizadas, segundo ele, são o focus group,
que funcionam como “clinicas” onde são reunidas pessoas identificadas como
consumidores potenciais para aquela determinada marca, a entrevista individual
em profundidade e também a técnica de diferencial semântico. Esta última, trata-
se de uma técnica desenvolvida por psicólogos que consiste em quantificar o
significado de um signo, a avaliação é realizada através de uma escala, contendo de
110
cinco a nove pontos e possuindo um par de adjetivos bipolares (antônimos). O
sujeito de teste escolhe um dos pontos da escala de acordo com a que melhor
representa sua impressão. Segundo Pereira (1986: 02) o propósito do diferencial
semântico é o de medir o significado afetivo de um ou vários conceitos, para um
ou vários indivíduos. (Fig. 36)
Fig. 36 Modelo de escala de diferencial semântico usado para analisar nomes de marca
Para Rezende (2004: entrevista gravada), com essa técnica é possível traçar
um perfil de percepção do nome da marca, desvendar o que esse nome provoca
emocionalmente nas pessoas, a sua reação subjetiva. Essa técnica é muito
interessante, porque independe de culturas e de classes sociais. Rezende cita
também um método de pesquisa chamado de Connotation Check desenvolvido
pela Thomson&Thomson, uma empresa americana de assessoria de registro de
marca, que busca todos os tipos de conotações negativas que um nome pode ter
nos países onde será implantado.
Azevedo (2004: entrevista gravada) diz que sempre utiliza o método de
entrevista individual em profundidade e o focus group só é utilizado quando há a
necessidade de escolha entre cinco propostas de nomes.
5.1.4 O Registro
Após os testes de conotação e visualidade do nome, o último passo consiste
em efetuar o registro legal em todos os países e categorias que o planejamento da
marca prevê. Para uma marca internacional, é preciso registrar o nome em todos
os paises onde ela atuará, mesmo que em algum deles a implantação não seja
imediata. Prevendo possíveis extensões de linha, é necessário registrar a marca em
111
todas as categorias de registro que contemplem essas extensões. Como
praticamente todos os segmentos já utilizam a internet, mesmo que somente de
forma institucional, é necessário também efetuar o registro de domínio de internet
que no Brasil é concedido pela FAPESP – Fundação de Amparo a Pesquisa do
Estado de São Paulo.
Para Murphy (1987: 97), a marca registrada é um ativo importante e uma
grande elemento estratégico. A consciência de sua importância, e a vontade para
gastar tempo e dinheiro no seu desenvolvimento, aplicação, e proteção pagará
dividendos enormes para que as empresas se engajem na batalha diária pela
atenção do consumidor.
O nome é, sem dúvida, um dos pontos de contato mais importantes para
uma marca e pode contribuir positivamente na construção da identidade. Como
dito anteriormente é o “gatilho” de associações da empresa ou produto. É o
elemento que desperta todos os pensamentos, impressões, experiências e
promessas da marca que estão na mente de uma pessoa. E a única forma legal de
protegê-lo é através do registro.
5.6. Referências bibliográficas do capítulo 5
AZEVEDO, Simone. São Paulo, 14 out. 2004. 1 fita cassete (60 min.). Entrevistaconcedida a Delano Rodrigues.
BACCARIN, Camila. Mais perto dos chineses. Revista VOCÊ SA, São Paulo, n.76. n. 76, p.36. out 2004.
BLECHER, Nelson; MARTINS, José Roberto. Quanto vale a Coca? a Nike? a...?. Revista EXAME, São Paulo, n. 662. 08 abril 1999
BRITO, Adriano Naves. Nomes próprios: semântica e ontologia. Brasília.Editora UNB. 2003. 207 p.
COLLINS, Leslie. The Psychology of names. In: MURPHY, John.(Org.)Branding: A key marketing tool. London. McMillan. 1987. 22-31 p.
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