54467289 a Ordem Do Progresso Resumo

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MARCELO DE PAIVA ABREU DIONSIO DIAS CARNEIRO GUSTAVO H. B. FRANCO WINSTON FRISTCH LUIZ ARANHA CORRA DO LAGO EDUARDO MARCO MODIANO LUIZ ORENSTEIN DEMSTHENES MADUREIRA DE PINHO NETO ANDR LARA RESENDE ANTNIO CLUDIO SOCHACZEWSKI SRGIO BESSERMAN VIANNA MARCELO DE PAIVA ABREU (ORGANIZADOR)

A ORDEM DO PROGRESSOCEM ANOS DE POLTICA ECONMICA REPUBLICANA 1889-1989RESUMO BERNARDO LANZA QUEIRZ BRUNO CARAZZA DOS SANTOS CARLA AGUIAR GUSTAVO DE BRITTO ROCHA GUSTAVO C. PATRCIO HUMBERTO CARLOS FARIA TEIXEIRA JANETE DUARTE MARIA FERNANDA DIAMANTE BASQUES MATHEUS ALBERGARIA DE MAGALHES PATRCIA ALVARENGA BRUNO CARAZZA GUSTAVO BRITTO MATHEUS ALBERGARIA (ORGANIZADORES)

SUMRIO

Captulo 1- A Primeira Dcada Republicana............................................................................................3 Captulo 2 - Apogeu e Crise na Primeira Repblica: 1900-1930..............................................................6 Captulo 3 - Crise, Crescimento e Modernizao Autoritria, 1930-45....................................................9 Capitulo 4 - Poltica Econmica Externa e Industrializao: 1946-1951................................................11 Captulo 5 Duas Tentativas de Estabilizao: 1951-1954....................................................................13 Captulo 6 - O Interregno Caf Filho: 1954-55.......................................................................................17 Captulo 7 Democracia com Desenvolvimento 1956-61....................................................................20 Captulo 8 - Inflao, Estagnao e Ruptura: 1961-1964........................................................................23 Captulo 9 - Estabilizao e Reforma: 1964 / 1967 ................................................................................28 Captulo 10 - A Retomada do Crescimento e as Distores do Milagre: 1967-1973...........................32 Captulo 11 - Crise e Esperana: 1974-1980...........................................................................................37 Captulo 12 Ajuste Externo e Desequilbrio Interno: 1980-1984.........................................................43 Captulo 13 - A pera dos trs cruzados: 1985-1989...........................................................................48

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CAPTULO 1- A PRIMEIRA DCADA REPUBLICANAGustavo H. B. Franco (Gustavo C. Patrcio) 1. Introduo A primeira dcada do regime republicano foi das mais difceis para a poltica econmica. Tais dificuldades devem-se ao fato de que ai observam-se os momentos cruciais de importantes transformaes "estruturais" na economia do pas, destacadamente a sbita disseminao do trabalho assalariado no campo e o reordenamento da insero do pas na economia internacional. A dcada de 90 seria memorvel em seus debates em torno da orientao a ser dada a poltica macroeconmica. A Repblica teria como seu primeiro ministro da Fazenda um campeo papelista de indiscutvel talento, Rui Barbosa. Uma depreciao cambial em 1891 inauguraria um perodo de hesitaes e de progressiva deteriorao das contas externas, recebendo em contra partida, uma reao conservador avassaladora, a partir de meados da dcada, e em 1898, o pas lavaria um plano conservador de saneamento monetrio e fiscal as suas ltimas conseqncias. Os anos 90 conhecem, portanto, ambos os extremos do espectro doutrinrio. 2. O Brasil e a Economia Internacional O crescente envolvimento do Brasil com a economia internacional constitui um trao fundamental, da histria econmica do pas nos ltimos anos do sculo XIX. O valor das exportaes per capita, contudo, no chega a definir o Brasil como uma economia especialmente "aberta". Alm disso, a participao brasileira sobre o comrcio mundial ainda, muito pequena, inferior a 1% em 1913. A participao brasileira no tocante ao investimento internacional bem mais substancial. O montante do estoque de capital estrangeiro no Brasil em 1913, incluindo-se ai investimentos inglese, franceses, alemes e norte-americanos, diretos e de carteira representa cerca de 30% do total para a Amrica Latina e 5,4% do total mundial. Ao longo dos anos 90 a convivncia do pas com os mercados financeiros internacionais se enriquece sobremaneira. A conta capital passa a ter importncia crescente no contexto das contas externas do pas, tornandose um mecanismo atravs do qual a instabilidade da receita comercial poderia ser compensada, e que tambm permitia a manuteno de nveis de absoro maiores do que seria possvel na ausncia de capitais externos, em contra partida, argumenta-se comumente que exatamente, na articulao perversa entre movimentos de capital e as contas comerciais que se devem procurar as razes da instabilidade macroeconmica a que esteve sujeita a economia brasileira em sua fase caracteristicamente, primrio-exportadora. Este , na verdade, um debate que extravasa a historiografia brasileira. Os mesmos mecanismos que asseguram estabilidade macroeconmica nos pases centrais implicam instabilidade nos pases da chamada periferia. A evidncia disponvel no que tange aos pases centrais no definitiva, mas parece apontar na direo de um comportamento contracclico em se tratando de sadas de capital, e pr-cclico no que respeita aos termos de troca. Para o Brasil em particular, convm observar que, tomando o perodo 1870-1900, como um todo, a correlao entre movimentos de capital e termos de troca no revela nenhum padro dominante. A relao entre movimentos de capital e a evoluo da capacidade para importar melhor informa sobre a influncia daquele sobre o estado das contas externas do pas e consequentemente, sobre as flutuaes da taxa de cmbio. Em dois perodos onde as entradas de capital so reduzidas, 1876-1883 e ao longo dos anos 90, de fato se observaram dificuldades cambiais. A depreciao cambial assume dimenses de crise em 1891, em funo disso, observa-se uma significativa desvalorizao real da taxa de cmbio, o que certamente teve papel importante em reduzir o dficit em conta corrente. Esta forma de ajustamento fornece talvez um dos melhores exemplos disponveis do que se convencionou chamar, segundo anlise pioneira de Furtado, de "socializao das perdas". No tocante crise de 1891 a interpretao tradicional atribui o colapso cambial a expanso monetria provocada em ltima instncia, pelas reformas no sistema monetrio introduzidas por Rui Barbosa em 1890, o que tambm se aplica a crise que nos levou a moratria de 1898. comum o vis no sentido de se explicar as flutuaes cambiais nos anos 90 atravs das variaes no preo do caf. Vrios estudos no so conclusivos, gerando dvidas sobre interpretaes simplistas da relao entre taxa de cmbio, a moeda e aos termos de troca. 3. Trabalho Assalariado e a Poltica Monetria O aumento da importncia relativa do setor assalariado representou uma mudana qualitativa na organizao econmica do pas. Esta transio teve grande impacto monetrio, com elevado grau de monetizao e demanda por moeda na economia pela atividade agrcola, por exemplo. O sistema bancrio, quela poca, era bastante concentrado na capital e seu incipiente desenvolvimento o tornava vulnervel s variaes sazonais na procura por crdito e nos seus depsitos. Uma baixa propenso do

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pblico para reter moeda sob forma de depsitos bancrios impunha uma limitao estrutural capacidade dos bancos de expandir seus emprstimos, ou crditos. Uma preocupante sucesso de crises na dcada de 1880, com crescente gravidade medida que se aproximava o ano da Abolio, resultou em tornar inoportuna a poltica monetria deflacionista. Neste contexto, surgiu o primeiro grande projeto de reforma monetria, apresentado ao Senado em 1887. Contrapunham-se idias sobre expandir e contrair a moeda. Em 1889, s o que a reforma de 87 tinha alcanado fora restabelecer a adeso ao padro ouro paridade de 1846, o que tornou possvel ao Imprio propor a "emisso conversvel". 4. Poltica Econmica nos anos 1890 O retorno do pas ao padro ouro far-se-ia em funo de uma situao cambial extremamente favorvel: a taxa de cambio atingiria a paridade de 1846 em outubro de 1888, sem que isto estivesse associado a nenhum esforo deflacionista. Neste mesmo ano incorporado o Banco Nacional do Brasil (BNB) com faculdade emissora e responsvel pela "emisso conversvel". Sem sucesso, em fins de 1889 a necessidade de novas emisses j era exaltada em tons dramticos. Rui Barbosa, o primeiro ministro da Fazenda de Repblica foi por certo, um dos mais controvertidos. objeto de irrestrita admirao, mas atribuem-lhe a responsabilidade suprema da inundao de papel-moeda, que quase fez naufragar o pas com os desastres que nos levaram moratria de 1898. Sua principal medida de poltica econmica foi a lei bancria de 17 de janeiro de 1890, que estabelecia emisso bancrias a serem feitas sobre um lastro constitudo por ttulos da dvida pblica. Trs regies bancrias seriam formadas, a central pelo BEUB, Banco dos Estados Unidos do Brasil. Tal tentativa de se regionalizar a emisso bancria no seria bem sucedida. Algumas alteraes, que descaracterizaram o decreto de 17 de janeiro foram feitas para atender a demanda "reprimida" de numerrio. Dados pela Abolio, a entrada no pas de mais de 200 mil imigrantes, o grande impulso no nvel de atividade e o estado favorvel das contas externas, o papel-moeda emitido em setembro de 1890 j havia crescido 40% em relao a 17 de janeiro. A especulao burstil preocupa o governo que promove a fuso do BNB e do BB no Banco da Repblica dos Estados Unidos do Brasil (BREUB), com o propsito de constituir uma espcie de banco central; um grande banco de depsitos e descontos com poderes para regular o volume de crdito, atravs de emisso e mercado de cmbio. No incio de 1891, Rui Barbosa sucedido pelo conselheiro Alencar Araripe e em seguida pelo baro de Lucena. Uma queda inusitada da taxa de cmbio neste ano atribuda s omisses e hesitaes destes dois, aliadas a influncias "exgenas" tais como: o colapso da casa Baring Brothers em Londres e a moratria da Argentina. Emprstimos junto aos Rothschild tornam-se inviveis e pouco pde ser tentado a ttulo de poltica cambial em 1891. Acarretou-se a isto, a dissoluo do Congresso e a ascenso de Floriano Peixoto em novembro. Seu ministro da Fazenda, Rodrigues Alves, proporia um plano deflacionista em 1892, sem sucesso no Congresso. Serzedelo Correia - um industrialista de certa projeo - o substitui, ento. Pouco ou nada resultaria da tentativa de Serzedelo - atravs do BRB, Banco da Repblica do Brasil, fuso do BREUB com o BB - de "sanear a praa". A especulao na bolsa contaminara muito profundamente a carteira o prprio BRB. Ao mesmo tempo, a crise cambial aprofundava-se alimentada pela deteriorao da situao poltica que tornava claro o estado de paralisia decisria em que se debatia o governo. O dficit oramentrio cresceria de forma significativa aps a crise de 18891. Diante deste quadro a reao do novo governo que se instalou em fins de 1894 - tendo Prudente de Morais na Presidncia da Repblica e Rodrigues Alves, mais uma vez, na Fazenda - foi a de procurar insistentemente junto aos Rothschild prover-se de recursos para financiar suas despesas no exterior. Durante 1895 negociou-se um grande emprstimo em bases traduzidas nestas palavras dos prprios banqueiros: "acreditamos que o que o Brasil quer um ou dois anos de tempo para respirar a fim de permitir a um governo sbio e conservador colocar as finanas do pas em ordem, em carter permanente." Nenhuma melhora na situao cambial se observaria ao longo de 1896 e 1897, sendo o emprstimo de 1895 - no to grande assim - rapidamente consumido. O enfraquecimento dos preos de caf, reflexo dos plantios do comeo da dcada, debilitou ainda mais as contas externas do pas. As negociaes continuaram e por fim, um plano de refinanciamento de pagamentos finalmente acordado entre o governo brasileiro e a casa Rothschild, atravs do qual seria emitido o chamado funding loan. O plano tratava-se de rolar compromissos externos do governo, vale dizer, o servio da dvida pblica externa e algumas garantias de juros, em troca de severas medidas de saneamento fiscal e monetrio. A poltica econmica do ministro Joaquim Murtinho que, na verdade, constitui-se na execuo do funding scheme - estava fundada sobre concepo bastante rudimentares quanto a natureza do ajustamento necessrio para solucionar as dificuldades de pagamentos do pas. Tratava-se de uma seleo natural entre os diversos lavradores sem crdito. A reduo do papel-moeda em circulao , portanto, a pedra de toque do

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programa. A conseqncia mais imediata dessa poltica seria a avalanche de falncias bancrias ocorridas em 1900, uma torrente que tragou o prprio BRB. O programa conseguiria uma apreciao cambial distante da pretendida e ainda fora favorecida pela extraordinria recuperao das exportaes em 1899, para a qual a borracha contribuiu significativamente. Finalmente, novamente, no claro a priori em que medida a apreciao cambial se devia a contrao monetria ou a fatores exgenos associados ao balano de pagamentos. Alm disso, observa-se uma revitalizao das entradas de capital a partir da adoo do programa conservador. Um curioso fenmeno que se observa ao longo dos anos 90 e viria a se repetir muitas vezes nos anos seguintes, o fato de crises (ou melhorias) cambiais serem geradas de forma espria pelo "mau (ou bom) comportamento" das polticas monetrias e fiscais, no em funo dos efeitos diretos destas, mas em funo da percepo dos banqueiros internacionais tinham sobre estas polticas, pois esta percepo via de regra, era fundamental para determinar a magnitude dos fluxos de capital direcionados para o Brasil. NDICE CRONOLGICO 1887 - primeiro grande projeto de reforma monetria; junho de 1889 - surgimento do BNB, como fuso entre Banco Internacional e Banque de Paris et des Pays Bas, piv da fase da "emisso conversvel", frustrada ainda em 1889; 17 de janeiro de 1890 - lei bancria de Rui Barbosa, que j descaracterizada foi responsvel pelas crticas a pessoa de seu idealizador; 1890 - surgimento do BEUB, banco de emisso da regio central de Rui Barbosa; incio de 1891 - Rui Barbosa deixa a Fazenda, substitudo por Alencar Araripe; 1891 - ascenso de Floriano Peixoto, ano de grande depresso cambial; 1892 - primeira proposta de Rodrigues Alves de clara tendncia deflacionista, sem respaldo no Congresso; 7 de dezembro de 1892 - fuso do BREUB e BB, decorrente das propostas de Serzedelo Correia; 1893 - Revolta da Armada, em meio a qual a especulao da bolsa teria seu desfecho; Fevereiro de 1898 - moratria, que duraria at o ano de 1900; 1898 - plano conservador de saneamento monetrio e fiscal; 1899 - recuperao das exportaes, principalmente borracha, colaborando com melhoria no balano de pagamentos; 1900 - avalanche de falncias bancrias, consequncia mais imediata do funding scheme. Polticas: i) Monetria: expansionista a partir de 17 de janeiro de 1890, com Rui Barbosa, passando a conservadora a partir de Prudente de Morais, at meados da dcada seguinte; ii) Fiscal e cambial: em geral acompanharam a poltica monetria, no perodo.

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CAPTULO 2 - APOGEU E CRISE NA PRIMEIRA REPBLICA: 1900-1930Winston Fritsch (Bruno Carazza) 1. Introduo Apogeu, tenses e ruptura da insero da economia brasileira na Pax Britannica. Perodo caracterizado por uma sucesso de crises econmicas esgaram o tecido poltico alm de sua possibilidade de resistncia. No fim da Primeira Repblica temos o incio de uma dupla transio: 1) mudana de uma economia primrioexportadora baseada no caf, com regimes cambial e comercial relativamente livres, para uma economia voltada para dentro e com severos controles sobre o comrcio exterior e 2) de uma plutocracia paulista para algo mais difuso em termos de distribuio regional e social dos favores do Estado (Era Vargas). 2. Poltica Econmica na Primeira Repblica a) A Tendncia ao desequilbrio externo e o quadro institucional O problema da poltica econmica durante a Primeira Repblica estava em isolar a economia dos desequilbrios provocados pelas bruscas alteraes na posio externa brasileira. A economia primrio-exportadora brasileira estava sujeita a 2 tipos de choques exgenos: i) flutuaes abruptas da oferta de caf (quebras de safra, superproduo) e ii) flutuaes da demanda nos pases centrais e bruscas descontinuidades do fluxo de capital do centro para a periferia. b) Ciclos e Crises da Primeira Repblica A Era do Ouro, 1900-1913 Ciclo de crescimento entre o ajuste recessivo da virado do sculo e a desacelerao que precede a Primeira Guerra. Melhora da posio externa no Governo Rodrigues Alves (1902/06), com o crescimento das exportaes de borracha e o incio do boom de investimentos europeus na periferia. O controle monetrio imposto pelas negociaes da dvida com grupos internacionais e o crescimento da receita lquida de divisas foraram uma substancial apreciao cambial. Interesses do setor produtivo levaram criao de um mecanismo automtico de padro ouro a Caixa de Converso, em 1906 que possua o poder de emitir notas plenamente conversveis em ouro, a uma taxa fixa de cmbio. Agravamento do desequilbrio no mercado mundial do caf e uma breve mas grave crise financeira internacional fizeram com que o governo federal temesse um colapso dos preos do caf que, somado queda dos influxos de capital, comprometeria a posio externa. O governo acabou ento por avalizar, junto a seus banqueiros de Londres, um emprstimo que permitisse financiar os estoques de caf a longo prazo e garantir a estabilidade de preos no curto prazo. Com a normalizao dos mercados internacionais e o retorno do afluxo de capital, alm da ajuda da recuperao dos preos da borracha, o pas entrou numa fase de crescimento acelerado at 1913. Estgios iniciais desse crescimento: sbita melhora no Balano de Pagamentos, que causou grande expanso monetria via influxos de ouro na Caixa de Converso. Essa posio era extremamente frgil, pois uma retrao da entrada de capital e das exportaes no acompanhada automaticamente pela queda na demanda de importados. Em 1912 passou a haver uma situao de deteriorao do BP e dificuldades de levantar novos emprstimos. Esse cenrio toma dimenso de crise em 1913, devido reverso da posio do BP e a uma forte retrao da liquidez decorrente das operaes do padro-ouro.

O Impacto da Grande Guerra, 1914-18 A guerra teve efeito imediato sobre o fluxo de pagamentos externos, a receita tributria e a indstria do caf. Governo fechou a Caixa de Converso e autorizou uma grande emisso de notas inconversveis, que serviram para aliviar por um tempo a crise de liquidez e atender a despesas do governo. Negociao de um funding loan em 1914, que aliviou o BP. O principal impacto da guerra para o comrcio exterior brasileiro foi a estagnao das importaes, que afetaram o equilbrio fiscal do governo (uma vez que as tarifas de importao constituam um importante meio de receitas governamentais). Como a guerra persistia, o governo viu-se forado a tomar medidas mais radicais para ajustar a economia com vistas a equilibrar as finanas do setor pblico (com a ampliao de produtos sujeitos ao imposto de consumo e a manuteno das despesas a nveis baixos) e tambm para reverter o substancial aperto de liquidez (com a autorizao de uma nova emisso de notas do Tesouro e ttulos federais de longo prazo).

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A queda dos salrios reais em funo do aumento do preo dos alimentos levou primeira onda de greves operrias da Histria do Brasil. Enquanto isso, no incio de 1918, cresciam as preocupaes com a fragilidade da posio externa e da indstria do caf com o prolongamento da guerra. No entanto, com o fim do conflito, e uma forte geada que elevou os preos internacionais do caf, o Brasil emergia da guerra sem problemas de excesso de oferta de caf e com equilbrio externo.

O Boom e a Recesso do Ps-Guerra, 1919-22 Perodo influenciado pelo rpido e violento movimento de auge e recesso das economias aliadas. Aumento dos preos das commodities levou a um aumento explosivo das exportaes das exportaes brasileiras. Houve tambm uma rpida recuperao das importaes vinculada significativa demanda reprimida durante a guerra e a apreciao do mil-ris. No entanto, a adoo de polticas monetrias restritivas nos pases centrais precipitou o incio de uma forte recesso, refletida no colapso dos preos dos produtos primrios. O resultado imediato foi a reverso da balana comercial em 1920, seguida de recesso e depreciao cambial. Governo procurou adotar as seguintes medidas diante desses fatos: i) diminuir a velocidade e magnitude da desvalorizao cambial (dada a posio financeira do governo, com grandes despesas expressas em moeda estrangeira) e ii) emitir um pequeno lote de ttulos e criar a Carteira de Redesconto do Banco do Brasil, cedendo a presses do setor cafeeiro demandando maior liquidez e estabilidade. As dificuldades do governo em financiar seu crescente desequilbrio fiscal (em meados de 1921) tinha consequncias na viabilidade de um esquema de proteo do caf que foi remediado com um crdito de curto prazo junto a bancos comerciais ingleses. Esse severo desequilbrio fiscal decorrente do ps-guerra foi financiado por uma expanso da base monetria, aumentando a presso da inflao. Ao lado da necessidade de liquidar as dvidas de curto prazo, houve motivao para a adoo de uma poltica fiscal recessiva.

Recuperao, Desequilbrio Externo e Ajuste Recessivo, 1922-26 Fim do governo Epitcio Pessoa (1992) marcado pelo preo do caf em ascenso, reverso de tendncia de queda das exportaes e do dficit da balana e retomada da produo industrial. Por outro lado, seu sucessor, Artur Bernardes, herdava um BP vulnervel e crnica crise fiscal. Suas metas eram: i) transformar o Banco do Brasil em banco central, retirando os poderes de emisso do Tesouro, ii) fortalecer a posio externa, com a institucionalizao de um novo e ousado programa de defesa dos preos do caf (controle de oferta passou a ser feito atravs de reteno compulsria da safra em armazns reguladores, e no mais pela compra e estocagem do excedente pelo governo) e iii) reduzir drasticamente o dficit pblico. Dificuldades com a safra de caf (excesso de oferta) tornou necessria a emisso de ttulos por parte do Banco do Brasil, acelerando a depreciao cambial. A sada encontrada para evitar uma crise cambial que tinha impactos negativos sobre o dficit pblico e diminuir o ritmo das emisses seria um emprstimo a ser conseguido junto a banqueiros ingleses, com o objetivo de saldar parte da dvida do Tesouro para com o Banco do Brasil. Devido a imposies do governo britnico contra emprstimos externos, o dinheiro no saiu. Para complicar a situao, as revoltas militares de 1924 trouxeram consigo despesas imprevistas e a interrupo das transaes bancrias em So Paulo, levando a uma nova exploso de emisses: maiores presses inflacionrias. Havia ento a necessidade de elaborao de um programa rgido de ajuste externo e interno, que envolveu a transferncia da responsabilidade do programa de valorizao do caf para o Estado de So Paulo (1924) e o aumento das taxas de redesconto com vistas a reduzir a base monetria (incio de 1925), alm da continuidade do esforo para equilibrar o oramento. Os efeitos dessa poltica foram recesso, queda do crescimento e do investimento industrial, apreciao cambial e queda da inflao.

O Boom e a Depresso aps o Retorno ao Padro Ouro, 1927-30

O novo presidente Washington Lus promoveu uma mudana radical das polticas monetria e cambial.

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Atingiu-se uma recuperao econmica graas a uma poltica monetria mais expansionista por parte do governo e uma situao externa tambm favorvel em decorrncia da valorizao dos preos do caf e investimento e financiamentos externos. Ao adotar uma nova poltica restritiva de crdito em 1929, vinculada ao retorno do padro ouro (1927-30), a economia caminhou para um perodo de severa recesso. Essa situao foi agravada por uma safra recorde de caf e a restrio do financiamento externo. Com a grande depresso, os preos do caf caram vertiginosamente, decretando o golpe de misericrdia no equilbrio do BP.

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CAPTULO 3 - CRISE, CRESCIMENTO E MODERNIZAO AUTORITRIA, 1930-45Marcelo de Paiva Abreu (Bruno Carazza) 1. Superao da Crise e a Poltica Econmica do Governo Provisrio (1930-34) Em decorrncia da Crise de 1929, os preos das exportaes caram (sem aumento do quantum exportado) e interrompeu-se o influxo de capital: deteriorao do cmbio e queda das reservas. Adotou-se uma poltica cambial restritiva em 1930-31, com moratria do pagamento de dvidas em moeda estrangeira. Mil-ris sofreu uma desvalorizao de 55% entre 1930-31, prejudicando a economia cafeeira (pois a demanda internacional do caf praticamente inelstica em relao ao preo; com a desvalorizao, o caf fica mais barato no exterior, mas a receita cambial cai). Indstria foi protegida, graas ao controle das importaes e a queda generalizada dos preos das commodities. Dvidas pblicas cresceram tendo em vista a crise cambial. A dvida externa brasileira distribua-se principalmente entre dois credores: Reino Unido (num montante de US$ 600 milhes, com investimentos em queda e concentrados em setores tradicionais) e Estados Unidos (US$ 200 milhes, com investimentos que quadruplicaram de 1914 a 1930, concentrados em atividades comerciais e indstria de transformao). Essa composio gerou interesses divergentes entre os credores: enquanto os britnicos queriam maximizar os pagamentos atrasados e os americanos preferiam manter sua posio de influncia comercial no Brasil. A crise cambial brasileira e a recesso internacional afetaram os investimentos no pas, principalmente os provenientes da Europa (a participao americana cresceu nesse perodo). Enquanto Vargas parecia encarnar o Estado de Compromisso, tratando de acomodar os interesses conflitantes do caf e da indstria, sua atuao tendeu a favorecer principalmente a indstria. A crise cambial, com a deteriorao dos termos de troca, colaborou para que a recuperao da atividade psrecesso se desse de forma mais rpida. No entanto o governo federal, atravs do Conselho (depois Departamento) Nacional do Caf, efetuou uma significativa compra e posterior destruio dos estoques de caf, buscando reduzir o descompasso entre seu nvel e a capacidade de absoro do mercado mundial. O governo ampliou ainda outra poltica de reduo da oferta de caf, logo aps a Revoluo Constitucionalista (1932), com a destruio de mais de 70 milhes de sacas foram destrudas entre 1931 e 1943. A desvalorizao cambial e o controle de importaes reorientaram a demanda para produtos nacionais, levando a uma reverso do saldo do BP (via balana comercial). A poltica econmica do Governo Provisrio pode ser considerada pr-keynesiana devido inteno de acomodar um choque fiscal (recesso internacional) atravs de um aumento no dficit pblico. Abandono do padro-ouro em 1930: fim da presso sobre a base monetria (mecanismo: a partir de um choque externo h uma presso para desvalorizar a moeda, caem as reservas, Banco do Brasil vende US$ e compra mil-ris, com isso reduz-se a oferta monetria). A produo nacional caiu 9%, entre 1928 e 30, permaneceu estagnada em 1931-31 e cresceu a uma mdia de 10% ao ano entre 1932 e 1939. A participao das importaes na oferta total caiu de 45% em 1928 para 25% (1931) e 20% (1939). 2. Boom Econmico e Interregno Democrtico, 1934-37 Perodo marcado pela presso americana para o Brasil liberar um regime de cmbio especial para os EUA. Entre 1936 e 1937 as reservas acumularam-se, como resultado da ampliao das exportaes, enquanto as importaes permaneceram constantes. Essa folga cambial levou a um relaxamento dos controles de importao e a liberao das remessas de lucros, gerando um descoberto de 6 milhes de libras esterlinas no final de 1937. Apesar das dificuldades no BP, a economia crescia a 6,5% ao ano entre 1934 e 37, graas ao encarecimento das importaes e a adoo de polticas fiscal, cafeeira e monetria expansionistas. Agricultura cresceu a 2% ao ano, entre 1934-37, enquanto a indstria teve uma mdia de 11% ao ano (com crescimento mais elevado de setores no-tradicionais: borracha, papel, cimento, metalurgia, qumica e txtil). Acordo comercial com os EUA (1935): O Brasil concedeu redues tarifrias para produtos americanos (durveis de consumo), enquanto os EUA mantiveram as principais exportaes brasileiras livres de tributos (o que teve pouco impacto sobre a indstria nacional). Aproximao do Brasil com a Alemanha: Aumento das exportaes de caf e algodo e deslocamento de importaes tradicionalmente britnicas (carvo, material eltrico, Folha-de-flandres, etc.) para a Alemanha. Com isso as importaes americanas tambm ganharam participao.

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Poltica externa de comrcio de compensao: Vargas conseguia apoio dos Estados que exportavam para a Alemanha (Nordeste e Rio Grande do Sul). Participao alem no comrcio brasileiro passou, entre 1928 e 1938, de 12% para 25%, em detrimento dos EUA (27 para 23), Reino Unido (22 para 10) e Frana (6 para 3). Substituio drstica de produtos britnicos por alemes. 3. Estado Novo e Economia de Guerra, 1937-45 Centralizao do poder, com criao de agncias governamentais com objetivos reguladores na rea econmica. Estado transitou da arena normativa para a proviso de bens e servios. 1937: Escassez de divisas (elevao das importaes, investimentos pblicos, pagamento de servios da dvida), governo foi levado a desvalorizar a moeda domstica. Controles cambial e de importaes foram os principais instrumentos de poltica comercial no perodo. O comrcio de compensao foi gradativamente sufocado medida que se tornava perigoso acumular reservas em marcos, tendo em vista a possibilidade de guerra. Com a Segunda Guerra, at 1941 o pas teve dificuldades com o BP (queda dos mercados de exportao). A partir de 1941 a situao se reverte com a recuperao e ampliao das exportaes (suprindo economias em guerra) e com a estagnao das importaes: expanso dos saldos na balana comercial. Efeitos contraditrios na indstria: estmulo produo e exportao, mas com dificuldades de obteno de insumos e bens de capital. O PIB teve um efeito menor em razo do fraco desempenho da agricultura. 1942 representa um ponto de inflexo na economia brasileira: crescimento industrial acelerado, pas passa a acumular reservas cambiais (reduzidas desde os anos 20), entrada de capital americano, polticas fiscal, monetria e creditcia expansionistas a partir de 1942. Poltica monetria: moderada (fins de 1938 at fins de 1939) e expansionista a partir de 1940 reforma monetria de 1942 (aumento de liquidez na economia) e expanso do crdito, com crescimento inflacionrio. Acordos com os EUA para suprimento de matrias-primas e bens primrios, em contrapartida haveria a manuteno dos preos desses produtos. CSN: governo brasileiro viu-se obrigado a participar diretamente do projeto tendo em vista o desinteresse dos grandes produtores norte-americanos de ao.

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CAPITULO 4 - POLTICA ECONMICA EXTERNA E INDUSTRIALIZAO: 1946-1951Srgio Besserman Vianna (Humberto Carlos Faria Teixeira) O cenrio econmico internacional no perodo ps-guerra (1946-1951) foi marcado pela assinatura do tratado de Bretton Woods que previa a implementao de mudanas substanciais na organizao da economia mundial. No bojo do acordo, destacam-se propostas visando: o restabelecimento do padro-ouro divisas nos mercados cambiais, constituindo o dlar a moeda internacional de reserva, a transio para a livre convertibilidade das moedas e a criao do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comrcio) com o propsito de reduzir as barreiras ao livre comrcio entre os pases. O Fundo Monetrio Internacional (FMI), criado com o objetivo de zelar pelos acordos de Bretton Woods e efetuar emprstimos aos pases com dificuldades no balano de pagamentos e o Banco Mundial tambm datam dessa poca. Os acordos internacionais do perodo apresentavam, portanto, um carter eminentemente liberal. A poltica econmica adotada no Brasil no perodo 1946-1951 seguiu, em primeira instncia, os preceitos liberais. VIANNA (1988) argumenta, entretanto, que o pas no diagnosticou de forma precisa o ritmo e o prprio movimento nos mercados internacionais da poca. A interpretao equivocada do governo Dutra expressa-se em trs pontos: a idia de que o pais encontrava-se em situao confortvel em termos de reservas cambiais, a suposio de que uma poltica liberal de cmbio seria capaz de atrair expressivo fluxo de capitais externos ao pas e a aposta nos Estados Unidos como grande credor do pas em contrapartida a colaborao brasileira durante a segunda guerra mundial. Em linhas gerais, a poltica econmica adotada ento privilegiou o combate inflao, expressa na adoo de polticas monetria e fiscal contracionistas (notadamente at 1949). No que se refere balana comercial, nota-se que o Brasil apresentava um desempenho favorvel com os pases de moeda de baixa conversibilidade (moedas fracas) e desfavorvel com os pases de moeda forte (de elevada conversibilidade). No perodo ps-guerra, verifica-se ainda uma reduo das exportaes de matrias-primas e manufaturados brasileiros. Estas que representavam 20% da pauta de exportaes em 1945, reduzem-se para 7,5% em 1946 e atingem a marca de 1% em 1952. VIANNA (1988) atribui este processo recuperao econmica dos pases envolvidos na guerra marcado pelo retorno de antigos fornecedores ao mercado internacional. As importaes, por sua vez, eram pressionadas pela dependncia da produo nacional em bens de capital (equipamentos) estrangeiros. O elevado acrscimo dos preos desses bens (os preos dos equipamentos sobem 47% em 1947 em relao ao ano anterior) supera o aumento dos preos das exportaes (que sobem apenas 15% no mesmo perodo), prejudicando o desempenho da balana comercial brasileira. Percebida ento a modesta entrada de capitais externos no pas, um desempenho mais favorvel na balana comercial seria alcanado por intermdio de medidas de controles cambiais e uma poltica de contingenciamento de importaes.1 A vigncia de uma taxa de cmbio sobrevalorizada, conjuntamente com as medidas de restrio s importaes e controles cambiais (mencionadas acima) produziram trs efeitos: (a) efeito subsdio, beneficiando a importao de bens de capital e insumos bsicos para suprimento da produo nacional; (b) efeito protecionista, atravs das restries s importaes de bens substitutos ou concorrentes aos produzidos nacionalmente e (c) efeito lucratividade, decorrente da taxa de cmbio sobrevalorizada que, ao alterar a rentabilidade relativa entre a produo exportada e aquela alocada para o mercado domstico, beneficiou a produo voltada para o mercado nacional. Neste contexto, torna-se evidente o estmulo das medidas supracitadas em favor de um processo de substituio de importaes. O perodo marcado ainda, conforme mencionado acima, pela adoo de uma poltica econmica ortodoxa, enfatizando o combate inflao atravs de polticas fiscais e monetria contracionistas. Deve-se ressaltar, entretanto, que a poltica de crdito foi, em grande medida, expansionista dada a poltica de concesso de crdito efetuada pelo Banco Brasil. A poltica de crdito adotada visava facilitar investimentos nacionais no processo de substituio de importaes. A poltica de crdito, portanto, operava em contramo estratgia de se adotar uma poltica monetria e fiscal mais restritiva no incio do perodo. Vale mencionar tambm que cogitava-se na poca a adoo de uma reforma tributria como forma de ajustar as finanas pblicas. O projeto de reforma tributria, no entanto, no encontrou respaldo poltico suficiente, sendo abandonado em 1947. O perodo caracteriza-se ainda pela obteno de maior autonomia administrativa por parte de estados e municpios concedido pela Constituio de 1946. A maior autonomia relativa adquirida pelos estados e municpios em relao Unio comprometeu os esforos desta (a Unio) no sentido de promover o ajuste fiscal, prejudicando assim as finanas pblicas. Institui-se ento o regime de cmbio por cooperao, segundo o qual os bancos atuantes no mercado cambial vinham-se obrigados a vender 30% de suas compras no mercado livre ao Banco do Brasil taxa de cmbio oficial. O contingenciamento de importaes, por sua vez, era feito atravs da concesso de licenas de importao.1

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Quanto ao processo inflacionrio, verifica-se um crescimento dos ndices de inflao a partir de 1949. VIANNA (1988) ressalta os componentes estruturais desse repique inflacionrio: (a) presso de demanda advinda do processo de urbanizao e industrializao sobre a produo agrcola, alternando os preos relativos da economia em benefcio deste setor, refletindo-se em aumento generalizado de preos; (b) tendncia inflacionria subjacente ao aumento dos preos das exportaes e (c) a existncia de baixa capacidade ociosa na economia, reduzindo a possibilidade de choques de demanda serem absorvidos integralmente atravs de aumento da produo, ou seja, expanso da oferta agregada. NDICE CRONOLGICO 1944: Conferncia de Bretton Woods 1947: Proclamao da Doutrina Truman nos EUA, destacando-se a elaborao do Plano Marshall como instrumento de auxlio s economias europias arruinadas com a guerra 1947-48: Fim do mercado livre de cmbio e a adoo de um poltica de contingenciamento de importaes no Brasil entre meados de 1947 e incio de 1948. 1948: Constituio da Comisso Tcnica Mista Brasil - Estados Unidos, mais conhecida como Misso Abbink, que preconizava que o desenvolvimento brasileiro deveria centrar-se em trs pontos: a reorientao dos capitais formados internamente, o aumento mdio da produtividade e o afluxo de capitais estrangeiros.(VIANNA, 1988:117). 1949: Afastamento do ministro da Fazenda Correa e Castro em meados de 1949, indicando a passagem de uma poltica econmica contracionista, tipicamente ortodoxa, em direo a uma maior flexibilidade nas metas monetrias e fiscais. Sob sua gesto na Fazenda, os investimentos pblicos e a emisso de moeda foram reduzidos a praticamente zero em 1947. O crdito real indstria cresceu 38%, 19%, 28% e 5% nos anos de 1947, 1948, 1949 e 1950, respectivamente. 1949: Adoo do Plano Salte, considerada a nica iniciativa de interveno planejada do Estado para o desenvolvimento econmico (VIANNA, 1988:116). Previa investimentos pblicos nos setores de sade, alimentao, transporte e energia para os anos de 1949 e 1953. 1950: Surge a Unio Europia de Pagamentos (UEP), existente at 1958, que conjuntamente com a desvalorizao da libra esterlina em 1949, indicam uma transio lenta em direo s trocas multilaterais e conversibilidade geral das moedas. Poltica cambial: O cmbio foi mantido grosso modo paridade de 1939, de 18,5 Cr$/US$, sendo institudo o mercado livre, com a abolio das restries a pagamentos existentes desde os anos 30. Considerando-se que a inflao brasileira no perodo foi o dobro da verificada nos EUA, tornase evidente a sobrevalorizao cambial. Por outro lado, as importaes de bens considerados necessrios economia usufruam de acesso taxas de cmbio mais favorveis, caracterizando uma desvalorizao implcita da moeda. As importaes eram restringidas pela concesso de licenas de importao. Nota-se, entretanto, uma liberalizao na concesso das licenas de importao a partir de meados de 1950 com a alta do preo do caf (aumentando a capacidade importadora da economia) no mercado internacional e dada o elevado nvel de contingenciamento j alcanado nas importaes.

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CAPTULO 5 DUAS TENTATIVAS DE ESTABILIZAO: 1951-1954Srgio Besserman Vianna (Carla Aguilar) A conjuntura encontrada pelo governo Vargas pode ser resumida, no setor interno, pela retomada do processo inflacionrio e pela recorrncia do desequilbrio financeiro do setor pblico e, no setor externo, pela expectativa favorvel devido a elevao do caf e a mudana do governo dos Estados Unidos em relao ao financiamento dos programas de desenvolvimento do Brasil. tendo em vista este cenrio que o governo traou sua poltica econmica apoiada em um projeto de governo bem definido que tinha por objetivo dividir o governo em duas fases. A primeira (1951-1952) constituiria na estabilizao da economia utilizando-se como pilar as polticas fiscais e monetrias. A Segunda (1953-1954) seria para os empreendimentos e realizaes tendo como pilar seria a Comisso Mista Brasil - Estados Unidos (CMBEU), constituda em 19502. O CMBEU era importante, pois os financiamentos fornecidos pelo Banco Mundial e pelo Eximbank que assegurariam a estrangulamentos em setores bsicos da economia (energia, portos, etc.) que propiciariam uma ampliao do fluxo de capital dirigido para o Brasil. Tal afluxo de capital permitiria a fase das realizaes e empreendimentos concomitantemente com uma poltica econmica austera e ortodoxa. PERODO DE 1951-1952 Tendo em vista o quadro externo descrito acima, a poltica de comrcio exterior apoiou-se em uma taxa de cmbio fixa e sobrevalorizada e um regime de concesso de licena para importar (esta ltima poltica modificou-se ao longo do tempo, pois foi extremamente relaxada nos primeiros 7 meses de governo). A liberalizao na poltica de concesso deveu-se aos seguintes fatores: persistncia da presso inflacionria interna e de aguda propenso a importar; precrio abastecimento interno por produtos importados, perspectivas decrescentes de escassez internacional de matrias-primas e equipamento importvel em funo dos programas armamentistas; perspectivas favorveis da evoluo das exportaes dos principais produtos e posio cambial temporariamente favorvel. Essa extensa liberalizao na poltica de concesso impactou violentamente as reservas em moedas conversveis que reduziram de US$162 milhes para US$43 milhes de maro para julho de 1951. Diante disto, em 1 de agosto de 1951 o Conselho da Superintendncia da Moeda e do Crdito (Sumoc) define instrues para que a CEXIM reintroduza um regime mais severo de licenciamento. Apesar disso, os licenciamentos continuaram elevados at dezembro deste mesmo ano resultando na necessidade de uma nova restrio no princpio de 1952. Como as licenas que eram concedidas possuam vida til de 6 meses a 1 ano tal medida necessitou de um prazo extenso para refletir nas estatsticas de importao. A balana comercial apresentou um pequeno supervit em 1951. J, em 1952, a balana comercial foi deficitria e, alm disto, houve o esgotamento das reservas internacionais e o acmulo de atrasados comerciais. Tal situao ocorreu, principalmente, devido a uma no alterao no quadro das importaes (uma vez que havia uma defasagem na adoo da poltica de restrio e o seu efeito e somando-se a isso foi necessria a compra de trigo nos EUA por causa da seca na Argentina) e a uma reduo das exportaes em 20% se comparado com 1951. Esta queda deveu-se aos efeitos da sobrevalorizao do cruzeiro e das presses inflacionrias internas bem como crise enfrentada pela indstria txtil mundial que levou a uma paralisao das vendas de algodo segundo produto mais importante da pauta de exportaes brasileira. Pelos motivos apresentados acima e o baixo influxo de capital estrangeiro que no ajudou a diminuir tais dificuldades houve em 1952 uma crise cambial que resultou na fratura de uma das pernas que deveria sustentar o projeto do governo Vargas. A poltica econmica teve como objetivos nesta primeira fase: comprimir as despesas governamentais, aumentar na medida do possvel a arrecadao, adotar polticas monetria e creditcia contracionistas. Os trs primeiros objetivos foram alcanados. As despesas governamentais foram reduzidas tanto que o investimento pblico decresceu cerca de 3% em termos reais. As receitas governamentais aumentaram devido inflao, ao crescimento real da economia, melhoria da eficincia do sistema arrecadador e ao extraordinrio crescimento das importaes. Houve em 1951 um supervit global da Unio e Estados que no acontecia desde 1926. Em 1952 a poltica fiscal foi mantida fazendo com que o supervit da Unio fosse quase o mesmo do ano anterior, no entanto, no foi possvel o mesmo desempenho para os estados e municpios. A poltica monetria foi conduzida ortodoxamente assim como a poltica fiscal. A exceo foi a poltica creditcia que se moveu em direo contrria, pois o presidente do Banco do Brasil (Ricardo Jafet) tinha posio distinta da ortodoxa. Sendo assim, as redues das necessidades de emprstimos do Banco do Brasil ao Tesouro Nacional foram compensadas com a expanso do crdito s atividade econmicas. Os fatores que avalizaram tal2

O projeto sustentava-se em 2 pernas: o saneamento econmico-financeiro e o afluxo de capitais, devido a isso o governo Vargas foi comparvel aos governos Campos Sales e Rodrigues Alves.

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expanso foi em 1951 a recuperao de parte das disponibilidades antes imobilizadas em emprstimos ao setor pblico e em 1952 soma-se a este primeiro a expanso do aporte de recursos adicionais devido ao aumento nos depsitos correspondentes aos dbitos em divisas dos importadores em funo do acmulo de atrasados comerciais. Houve um aumento do PIB em 4,9% em 1951 e 7,3% em 1952. O aumento das importaes, nesse perodo, afetou positivamente o setor de servios que apresentou maior crescimento e negativamente a produo industrial que apresentou as menores taxas anuais de crescimento. A estagnao do caf e a queda da produo de algodo e cacau fizeram com que a agricultura apresentasse pequeno crescimento em 1951, mas em 1952 o crescimento da exportao de produtos agrcolas aumentou 17% provocando uma recuperao neste setor. Este perodo (1951-1952) foi marcado pela elevao das taxas de investimento e o aumento da participao do setor privado no investimento global em detrimento dos investimentos do setor pblico. As fontes de financiamento para esse investimento foram a liberalizao das importaes e a poltica creditcia. PERODO DE 1953-1954 A segunda fase do governo (empreendimento e realizaes) deveria comear em 1953 baseada na estabilizao e no acordo CMBEU. No entanto, a primeira no foi alcanada pelos fatores apresentados no item anterior e a segunda tambm no devido ao fim da Comisso Mista Brasil Estados Unidos. Sendo assim os dois pilares do governo Vargas ruram no primeiro semestre de 1953. Tais acontecimentos associados uma mobilizao social reinvidicadora e uma reacomodao poltica derivada das eleies municipais de 1953 levaram o governo a abandonar o projeto inicial e sustentar o propsito de estabilizao econmica. O encerramento da CMBEU ocorreu devido aos seguintes fatores: (i) a vitria de Eisenhower para presidente dos EUA fazendo com que a orientao da poltica norte-americana prioritria para a Amrica Latina passasse a ser o combate ao comunismo e, alm disso, sob o argumento de que precisaria manter gastos no financiaria mais os projetos que a comisso mista elaborasse. O apoio deste governo ao Banco Mundial em conflito com o Eximbank tambm prejudicou o Brasil, pois o primeiro era a favor de emprstimos de longo prazo do Eximbank para o desenvolvimento da Amrica Latina apenas quando no pudesse faz-lo. As razes para isso era que queria controlar mais as polticas econmicas dos pases demandantes de crdito. (ii) deteriorao da situao cambial brasileira ao longo de 1952 resultando no acmulo de vultosos atrasos comercias levando o Banco Mundial a mudar de postura para com o Brasil, passando a interferir na poltica econmica do governo. O primeiro semestre de 1953 foi marcado pela promulgao da Lei 1807(Lei do Mercado Livre) e pelo emprstimo de US$300 milhes de dlares junto ao Eximbank. A Lei do Mercado Livre tinha como objetivo aumentar as exportaes de gravosos sem prejudicar a receita proveniente do caf e do cacau; e reduzir a propenso a importar. Para tal adotou cinco taxas de cmbio do lado da oferta e duas do lado da demanda. As taxas para exportao eram: a taxa oficial aplicada a 85% das exportaes (limitadas ao caf, algodo e cacau), as trs taxas de cmbio flutuante (misturavam 15,30 e 50% da taxa oficial e a taxa de mercado livre) aplicada s demais exportaes e, por ltimo, a taxa de mercado livre que era aplicada s transaes financeiras (com algumas excees). As taxas estabelecidas para demanda eram: a taxa oficial utilizada para transaes essncias (2/3 das importaes totais) e remessas financeiras do governo de entidades pblica e semi-pblicas; e a taxa de mercado livre para o restante das importaes e remessas. A assinatura do acordo de emprstimo conseguida em 30 de abril de 1953 pelo governo brasileiro ocorreu devido a presses de exportadores e investidores norte-americanos no Brasil, que tendo em vista a Lei 1807, desejavam evitar a concorrncia entre a procura de dlares para remessas de rendimentos e aquela voltada para a obteno de divisas com o objetivo de pagamento de atrasados. Esse emprstimo foi concedido nas seguintes condies: deveria ser integralizado em trs anos, com pagamentos mensais a partir de 30 de setembro 1953. A taxa de juros adotada foi de 3,5% a.a., e o Brasil comprometia-se a liquidar os restantes dos atrasados comerciais no, cobertos pelo emprstimo, com os EUA at 31 de Julho do ano corrente. O principal objetivo da Lei 1807 (aumentar o desempenho das exportaes) no foi alcanado, pelo contrrio, as exportaes tiveram seu valor reduzido em 11% no primeiro semestre de 1953. Isto ocorreu porque as exportaes de gravosos no responderam bem poltica de desvalorizao com que foram beneficiadas e os exportadores passaram a reter os embarques com o objetivo de pressionar o governo. Esta evoluo pouco favorvel das exportaes fez que os atrasados comerciais aumentassem, levando o Eximbank a suspender o desembolso da segunda parcela do emprstimo conseguido em abril. Para agravar a situao interna do pas os meios de pagamento elevaram-se de Cr$7 bilhes contra menos de Cr$1 bilho no mesmo perodo de 1952, isso ocorreu devido ao aumento dos gastos do governo com a seca no Nordeste bem como o financiamento aos produtos dessa regio e ao socorro a bancos de estado. Tais acontecimentos levaram a uma impresso de perda do controle das autoridades econmicas. Paralelamente a essa situao o governo enfrentava dificuldades no plano social, pois em 23 de maro de 1953 eclodiu a greve dos trabalhadores em So Paulo o que sinalizava um enfraquecimento das bases de sustentao desse governo. Com o objetivo de fortalecer a coeso do governo, Vargas fez uma reforma ministerial na qual o ministro da Fazenda Horcio Lafer foi substitudo por Osvaldo Aranha e quem passou a ocupar a pasta do Ministrios do Trabalho foi Joo Goulart

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Ao assumir o ministrio, Aranha tomou como primeiras medidas a homogeneizao do benefcio dado s exportaes; introduziu o sistema de pauta mnima e cobrou a liberao da 2 parcela do emprstimo junto Eximbank. A primeira medida foi estabelecida reduzindo as cinco taxas de cmbio existentes em apenas trs, uma taxa oficial, uma de mercado livre e uma terceira, flexvel, resultante da mistura (em 50%) das duas primeiras. A segunda foi atravs da permisso para que exportadores de determinados produtos (caf, cacau, etc.) negociassem no mercado livre as divisas excedentes a cota mnima fixada para cada um deles. A terceira, foi apresentar junto aos financiadores como condio para renegociao a liberao da 2 parcela do acordo de emprstimo. Tais medidas alcanaram seus objetivos, a exportao de caf respondeu positivamente aumentando 56% e 81% em agosto e setembro, respectivamente, em relao a julho de 1953 e o emprstimo foi liberado. A poltica de Osvaldo Aranha consistia numa nova tentativa de estabilizao, mantendo-se a viso ortodoxa, no entanto, privilegiando o ajuste cambial. A primeira reforma implementada por este ministro foi a instruo 70 da Sumoc baixada, em 9 de outubro de 1953. A instruo 70 da Sumoc restabeleceu o monoplio cambial do Banco do Brasil e substituiu o controle quantitativo das importaes pelo sistema de leiles. Neste sistema as importaes foram divididas em 5 categorias de acordo com o critrio de essencialidade, a trs primeiras categorias absorviam aproximadamente 80% das importaes. As taxas sobre a importao passaram a ser trs, uma taxa oficial sem sobretaxa (vlida para importaes especiais como trigo e papel imprensa), uma taxa oficial com sobretaxa fixa (para importaes dos governos, autarquias e sociedade de economia mista) e, por ltimo, uma taxa oficial acrescida de sobretaxa varivel (segundo lances feitos em bolsa) para as demais importaes. Com relao s exportaes, as taxas mistas foram substitudas por bonificaes de Cr$5/US$ para o caf e Cr$10/US$ para as demais exportaes. Os primeiros resultados da instruo 70 foram positivos, houve supervit entre as exportaes (FOB) e importaes (CIF), e o governo aumentou significativamente suas receitas com a cobrana de gios sobre as importaes. Apesar da elevada receita a Unio apresentou dficit pblico, em 1953, devido aos gastos do governo na seca do Nordeste, ao aumento das despesas nas obras pblicas, a um abono elevado concedido ao funcionalismo civil da Unio, ao pagamento de atrasados comerciais feito pelo Banco do Brasil aos credores com recursos prprios e ao emprstimo concedido pelo Banco do Brasil ao tesouro paulista. A poltica creditcia, neste ano, foi afetada pelo dficit pblico, a sua tendncia foi invertida em relao aos dois anos anteriores e a sua composio foi modificada, os emprstimos do Banco do Brasil foram mais direcionados ao Tesouro Nacional e menos s atividades econmicas. A poltica monetria tambm foi expansionista. A inflao neste ano aumentou se comparada com a do ano de 1952, isso seria explicado pelas desvalorizaes cambiais resultantes da instruo 70 que pressionaram os custos das empresas conduzindo-as a reagir atravs do aumento de preos. O crescimento do PIB foi bem inferior ao dos anos anteriores, apesar do crescimento da indstria em 9,3%. O baixo crescimento do PIB foi devido ao baixo rendimento apresentado na agricultura (seca que aconteceu no pas) e estagnao do setor servios (esta devido a diminuio das importaes e reduo das atividades comerciais). Os investimentos privados foram reduzidos neste ano, devido principalmente s restries feitas s importaes, os investimentos do governo no cresceram em termos reais mantendo-se constante como proporo do PIB. As maiores dificuldades enfrentadas por Aranha na implementao do seu plano de estabilizao em 1954 foram o aumento do salrio mnimo de 100% e a crise enfrentada pelo caf. Estes dois fatores comprometeram profundamente o plano em meados de 1954. O aumento do salrio mnimo teve como objetivo melhorar a imagem do governo junto aos trabalhadores uma vez que Vargas estava interessado nas eleies de outubro de 1954. A crise do caf deveu-se primeiro, a uma geada que afetou uma das mais importantes reas de produo brasileira levando reduo das exportaes, e segundo devido ao boicote americano ao consumo de caf que fez com que reduzissem sua compras ao mnimo. O governo com objetivo de aumentar a receita cambial expediu, em junho de 1954, um decreto determinando preo mnimo elevado para o caf. Tal poltica fez com que o governo americano, em protesto, deslocasse suas compras para outros pases produtores de caf. No entanto, no se pode imputar a este decreto a reduo das exportaes, pois estas j vinham caindo antes de sua implementao e, alm disso, devido a presso dos cafeicultores e exportadores de caf essa medida durou apenas 45 dias. Osvaldo Aranha baixou a instruo 99 da Sumoc em 14 de agosto de 1954, esta resoluo no modificou a cotao mnima em cruzeiros estabelecida para a exportao de caf, mas alterou o sistema de bonificaes estabelecido pela instruo 70. Os exportadores passariam a receber Cr$5/US$ ou Cr$10/US$ sobre 80% das cambiais negociadas independente do produto, sobre os 20% restantes seria abonada a diferena entre a taxa oficial e a mdia das taxas de compra no mercado livre, para cada moeda, no dia til imediatamente anterior ao do fechamento de cmbio. A poltica creditcia adotada por Aranha nesse perodo foi expansionista, no por uma mudana em sua viso ortodoxa, mas pela necessidade de atender s demandas imediatas dos estados bem como s presses das indstrias para compensar as perdas devido ao aumento do salrio e instruo 70 da Sumoc (no ponto que se refere a defasagem entre o momento da licitao e a obteno da licena para importar). O descontentamento com Vargas estava presente em todas as classes, desde trabalhadores at capitalista, ele no conseguiu contentar o amplo espectro da sociedade sem nenhuma mudana estrutural e sem o apoio da

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sociedade civil organizada. O governo Vargas estava isolado politicamente e ficou vulnervel ao golpe que o deps em 1954. NDICE CRONOLGICO Julho de 1951-incio da atividades da Comisso Mista Brasil Estados Unidos. 1 de agosto de 1951-o Conselho da Superintendncia da Moeda e do Crdito (Sumoc) define instrues para que a CESIM reintroduza um regime mais severo de licenciamento das importaes. Apesar dessas instrues o licenciamento at dezembro do mesmo ano foram elevadas, sendo necessrias novas medidas de controle no incio de 1952. Janeiro de 1953-promulgao da Lei 1807 (Lei de Mercado Livre) que concedia ampla liberdade de movimentos pelo cmbio livre ao capital estrangeiro no Brasil e tinha por objetivo elevar as exportaes. Estas ao contrrio ao invs de aumentar diminuram e tal fato levou modificao desta lei posteriormente. 30 de fevereiro(?) abril de 1953-assinatura do acordo de emprstimo de US$300 milhes de dlares junto ao Eximbank, que seria liberada em parcelas. A primeira parcela foi entregue, mas devido ao no pagamento dos atrasados comerciais pelo Brasil junto aos EUA a segunda parcela foi adiada at a entrada do novo ministro da fazenda Osvaldo Aranha. 23 de maro de 1953-greve dos trabalhadores paulistas que chegou a paralisar 300 mil operrios. Abril de 1953-liberao da primeira parcela do emprstimo concedido pelo Eximbank. 15 de Junho de 1953-Horcio Lafer deixa o ministrio e substitudo por Osvaldo Aranha, esta mudana est inserida na reforma ministerial feita por Vargas. 9 de outubro de 1953-instituda a instruo 70 da Sumoc que introduziu importantes mudanas no sistema cambial. Obteve xito nos primeiros resultados, conseguindo elevar as exportaes e manter as importaes no nvel dos trimestres anteriores alm de elevar a receita do governo. 1 de maio de 1954-aumento do salrio mnimo em 100%, quando na realidade para recompor os salrios era necessrio apenas um aumento de 53%. Vargas tomou esta deciso imbudo pelos interesses eleitorais. Junho de 1954-decreto fixando um elevado preo mnimo para o caf com o objetivo de maximizar a receita cambial, devido a crise enfrentada por este produto no mercado interno e externo. Vigorou por apenas 45 dias. 14 de agosto de 1954-baixada a instruo 99 da Sumoc que alterou o sistema de bonificao institudo pela instruo 70 para as exportaes. Esta veio como resposta s dificuldades enfrentadas pelo caf no mercado externo. Polticas: Poltica Monetria: restritiva at incio de 1953 passando a partir de ento a ser expansionista por problemas conjunturais da economia. Poltica Fiscal: restritiva at 1952 tornando-se expansionista a partir de 1953. Poltica Creditcia: expansionista at sada de Jafet , foi restritiva at 1954 voltando a ser expansionista em 1954.

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CAPTULO 6 - O INTERREGNO CAF FILHO: 1954-55Demosthenes Madureira de Pinho Neto (Bruno Carazza) O perodo compreendido entre o suicdio de Vargas e a posse de Juscelino Kubitschek costuma ser colocado em segundo plano na historiografia brasileira, dadas suas caractersticas de transio. Durante os poucos meses de durao, podemos delinear duas fases bastante distintas de poltica econmica: as administraes Gudin e Whitaker. Tendo em vista o perodo de instabilidade que se seguiu ao Governo Vargas, Caf Filho buscou sustentar seu governo em bases bastante heterogneas, embora o carter ortodoxo das figuras ligadas UDN e ao movimento antigetulista prevalecesse. Para a pasta da Fazenda foi indicado o nome de Eugnio Gudin, economista respeitvel e de grande prestgio junto a comunidade financeira internacional uma das virtudes que mais pesou na sua escolha. Gudin poderia ser considerado um severo crtico das propostas desenvolvimentistas e adepto a polticas ortodoxas, atribuindo o processo inflacionrio ao dficit pblico e expanso creditcia. Gudin assumiu ao Ministrio da Fazenda num momento de grave crise cambial, decorrente do colapso dos preos e das quantidades exportadas de caf. Mesmo com uma desvalorizao de 27% da moeda nacional no final do governo Vargas (ago/54), houve um grave impacto sobre as receitas de exportao, uma vez que a elasticidade da demanda internacional do caf era baixa no curto prazo. Outro problema que complicava a situao externa do Brasil era o acmulo dos atrasados comerciais e a necessidade de renegociar as dvidas brasileiras junto aos credores internacionais. Acontece que o governo americano, sob gesto de Eisenhower, mostrava-se intransigente com os pases em desenvolvimento, tendo inclusive manifestado que o problema do financiamento da dvida da Amrica Latina deveria ser resolvido por fluxos de capitais privados e no por auxlio econmico do governo americano. Destarte o fracasso de sua negociao com o governo americano em Washington, Gudin conseguiu levantar US$ 200 milhes junto a um consrcio de 19 bancos privados americanos, o que aliviava a situao cambial at que medidas mais profundas surtissem efeito junto ao Balano de Pagamentos. Neste sentido, Gudin mostra-se disposto a remover os obstculos ao livre fluxo de capital estrangeiro para o pas, expresso na Instruo 113 da Sumoc liberalizao da entrada de capital, voltada para o saneamento econmico e o financiamento domstico. O programa de estabilizao de Gudin sustenta-se em dois pilares: austeridade fiscal e contrao monetrio-creditcia. Sua poltica monetria valeu-se de diversas instrues da Sumoc, que envolveram a elevao dos juros e das taxas de redesconto (Inst. 105 e 106). A Inst. 108 determinou um aumento significativo dos compulsrios, agora recolhidos junto Sumoc, buscando uma eficcia maior de sua funo redutora, uma vez que os compulsrios eram recolhidos anteriormente ao Banco do Brasil (que tambm era um banco comercial). Essa instruo estabeleceu ainda um limite para os emprstimos das carteiras do Banco do Brasil, inclusive junto a entidades pblicas e ao Tesouro. Podemos definir suas polticas monetria e creditcia como fortemente contracionistas. Ao contrrio do lado monetrio, Gudin no obteve muito sucesso com a poltica fiscal. Gudin objetivava reduzir as despesas governamentais e ampliar a receita, mas no foi muito feliz em suas metas, uma vez que sua modificao mostrou-se invivel devido s dificuldades de aprovao de uma elevao da carga tributria no Congresso e o comprometimento do Oramento da Unio. Seu nico xito consistiu na reduo de verbas para alguns ministrios, resultando numa queda do investimento pblico. De um modo geral, as medidas adotadas por Gudin levaram a uma crise de liquidez, queda na formao bruta de capital fixo e nos investimentos em bens de capital (tendo em vista o esfriamento da atividade nesse perodo). As razes para a substituio de Gudin residem no descontentamento do setor cafeeiro com as medidas adotadas, sintetizadas naquilo que a oposio chamou de confisco cambial. Como o setor cafeeiro representava uma importante base poltica, sua presso resultou no pedido de demisso de Eugnio Gudin em 4 de abril de 1955. Para aplacar a fria da cafeicultura paulista, Caf Filho escolheu Jos Maria Whitaker para o ministrio da Fazenda, ex-ministro de Vargas durante o governo provisrio. Na gesto Whitaker podemos verificar uma inflexo na poltica econmica, dado que a inflao parecia preocup-lo apenas enquanto exerccio de retrica. Em maio de 1955, ainda em conseqncia das medidas contracionistas da poltica monetria de Gudin, aflora uma crise bancria decorrente da falta de liquidez do setor financeiro. Whitaker baixa ento a Instruo 116 da Sumoc, que nada mais faz do que refogar as instrues 106 e 108 tomadas pelo seu antecessor. Whitaker definia-se como seguidor da real bills doctrine, acreditando que as emisses destinadas aos setores produtivos no eram inflacionrias. Como resultado dessa viso, ampliaram-se as concesso de crdito ao setor privado e ao investimento pblico. Whitaker decretou ainda o fim temporrio da interveno brasileira no mercado do caf, baseado na tese de que a queda decorrente dos preos do caf beneficiaria o Brasil ao eliminar do mercado os produtores marginais e menos eficientes.

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Durante a gesto Whitaker o pas recebeu a visita de uma misso do FMI, cujo resultado foi o chamado Relatrio Bernstein, que apresentava como alternativas para a reforma cambial no Brasil i) a desvalorizao e unificao do cmbio, mantendo os leiles cambiais para importao e ii) o abandono do regime de taxas fixas, com a instituio de um mercado livre. A reforma realmente elaborada estipulava um regime cambial unificado por meio de taxas flutuantes, mantendo um regime diferenciado para o caf. No entanto, esse projeto foi sepultado pelo Congresso, tendo em vista as eleies presidenciais.

NDICE CRONOLGICO setembro de 1954: Gudin embarca para Washington (reunio anual do FMI). Consegue US$ 80 milhes de emprstimo da instituio e acerta outro de US$ 200 milhes com um consrcio de bancos privados. Outubro de 1954: Institudas as seguintes Instrues da Sumoc: 105 (fixava os juros pagos aos depsitos a vista e a prazo em 3% e 7% ao ano), 106 (elevava a taxa de redesconto das promissrias de 6 para 10% e das duplicatas de 6 para 8%) e 108 (aumentos dos compulsrios sobre depsitos a vista de 4 para 14% e a prazo de 3 para 7%). Tornava-se explcita a orientao contracionista do governo. Novembro de 1954: Instruo 109 da Sumoc: fixou-se a bonificao para a venda de caf no mercado internacional (a poltica vigente anteriormente estabelecia que essas bonificaes flutuariam conforme o mercado) Janeiro de 1955: Instruo 112 da Sumoc: Governo eleva as bonificaes para os demais produtos de exportao (incluindo algodo e cacau) 27 de janeiro de 1955: publicada a Instruo 113 da Sumoc, que concede significativos instrumentos para a entrada de capitais externos no pas. Fevereiro de 1955: Dada a insatisfao da cafeicultura diante daquilo que chamou-se de Confisco cambial, o governo volta atrs e equipara a bonificao do caf com a das demais mercadorias (Instruo 114 da Sumoc). 4 de abril de 1955: Gudin deixa o governo em virtude da presso da cafeicultura paulista. Assume o ministrio em seu lugar o banqueiro paulista Jos Maria Whitaker. Abril de 1955: Whitaker suspende temporariamente a compra de caf, insatisfeito com a prtica intervencionista do governo brasileiro na sustentao dos preos mnimos do caf, que acabava privilegiando os concorrentes do produto nacional. Maio de 1955: Atravs da Instruo 116 da Sumoc Whitaker revoga as Instrues 106 e 108 assinadas por Gudin. Os compulsrios e redescontos voltaram aos nveis anteriores. Agosto de 1955: Forte geada fora o governo a adotar uma desvalorizao gradual do cmbio-caf. Setembro de 1955: Reforma cambial. Unificao do cmbio atravs de taxas flutuantes, com um regime diferenciado para o caf (a fim de eliminar os efeitos do confisco cambial). Contexto internacional O perodo marcado pela indisposio do governo Eisenhower em financiar o endividamento dos pases latino-americanos. Essa deciso apenas refora uma tendncia j verificada, em diferentes intensidades, durante todo o ps-guerra, como atesta o fim prematuro da Comisso Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU) j no governo Vargas. O pas viu-se ento forado a negociar, na gesto Gudin, emprstimos junto ao setor financeiro privado internacional, criando ainda mecanismos para atrair a entrada de capital (Instruo 113 da Sumoc). No ministrio de Whitaker o governo estabeleceu contatos com o FMI a fim de implementar uma reforma cambial. Poltica Monetria Fortemente contracionista durante o ministrio Gudin. O ministro implementou medidas que aumentavam os juros, compulsrios e redescontos (Instrues 105,106 e 108 da Sumoc). Esse perodo considerado como um dos mais efetivos na conduo de uma poltica de cunho restritivo-ortodoxo j implementadas no pas, resultando numa significativa crise de liquidez. J na gesto Whitaker essa poltica de estabilizao seriamente afetada pelas medidas que revogaram as instrues que implementavam uma poltica monetria creditcia. Esse perodo tambm marcado pela ampliao do crdito ao setor produtivo, especialmente a agricultura.

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Poltica Fiscal Gudin considerava o processo inflacionrio como fruto da expanso monetria (j combatida pelo programa contracionista descrito acima) e dos dficits pblicos. Para combater esse segundo ponto, Gudin pretendia ampliar a arrecadao mediante a elevao da carga tributria, e reduzir as despesas. Devido s dificuldades de aprovar no Congresso uma medida impopular, Gudin s conseguiu uma reduo da dotao de verbas para os ministrios, reduzindo a participao do governo na formao bruta do capital.

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CAPTULO 7 DEMOCRACIA COM DESENVOLVIMENTO 1956-61Luiz Oreinstein e Antnio Cludio Sochaczewski (Bruno Carazza) O Brasil encontrava-se em meados da dcada de 1950 num dilema que envolvia a necessidade de levar adiante o processo desenvolvimentista de substituio de importaes e a queda no saldo disponvel das divisas internacionais. A diminuio das receitas de exportao e o aumento das importaes que determinavam o desajuste externo contrastava com a necessidade de aumentar a entrada de bens de capital e matrias-primas para incentivar o crescimento industrial. A nica soluo vivel para esse problema de Balano de Pagamentos (BP) seria a entrada lquida de capitais autnomos, a fim de manter alta a taxa de investimento e no afetar o fluxo de importaes. Para tanto o governo JK tomou como uma das medidas iniciais de seu governo a criao de um arcabouo institucional para estimular a entrada de capital, mesmo que isso se desse a custo de maiores presses no BP. O governo levou adiante ainda uma reforma cambial (1957), reduzindo as taxas mltiplas (de 5 para 2, a geral e a especial, que tornava certas importaes mais caras), impondo tarifas ad-valorem e desvinculando recursos obtidos com os leiles cambiais (permitindo assim maior flexibilidade de gastos do setor pblico). De um modo geral essa reforma buscou compatibilizar a contradio entre prover a importao a baixo custo de equipamentos e matrias-primas e estimular a produo interna. Essa determinao em levar adiante com maior flego o processo de desenvolvimento era evidente desde a posse do governo. Alm dessas medidas de reforma cambial e estmulo entrada de capitais, o governo JK j no incio de 1956 criou o Conselho de Desenvolvimento, encarregado de elaborar o que no final do ano foi lanado como Plano de Metas, que resumia os objetivos de atuao das esferas pblica e privada no estmulo ao crescimento econmico. O Plano de Metas baseou-se nos diagnsticos elaborados por programas como o CEPAL-BNDE (1953), e da Comisso Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU, segundo governo Vargas), que definiam reas-chave de investimento e os pontos de gargalo da economia brasileira. O plano trabalhava com um espao de tempo de 5 anos e definia o campo de atuao do Estado em investimentos em reas bsicas e de infra-estrutura e no estmulo aos investimentos privados. Contemplava-se cinco reas principais: energia, transporte, alimentao, indstria de base e educao, alm da construo de Braslia (que no estava orada no Plano). Do total de recursos necessrios para tanto, 71,3% se concentrariam nos setores de energia e transporte (quase que totalmente arcados pelo setor pblico), 22,3% na indstria de base (envolvendo o setor privado, financiado por entidades pblicas) e apenas 6,4% para os setores de alimentao e educao. O desembolso ficaria em 50% a cargo do setor pblico, 35% viria da esfera particular e 15% de agncias internacionais que financiariam programas tanto pblicos quanto privados. Lessa (1981) define quatro pontos bsicos para o Plano de Metas: 1. Tratamento especial para o capital estrangeiro 2. Financiamento dos gastos pblicos e privados via expanso dos meios de pagamento e do crdito provocando forte presso inflacionria. 3. Ampliao da participao do setor pblico na formao bruta de capital. 4. Estmulo iniciativa privada atravs de reserva de mercado para a produo nacional (lei do similar nacional), cmbio preferencial para a importao de bens de capital para setores especiais (automobilstica e naval, por exemplo) e crdito com carncia e juros subsidiados do BNDE e do Banco do Brasil. O governo previa para os anos seguintes um dficit decrescente do BP, alcanando o equilbrio em 1961. Estabelecia-se uma meta inflacionria de 13,5% ao ano e dficits oramentrios de 2,2% do PIB por parte do setor governamental o que parece incompatvel, uma vez que a nica forma de se financiar esse dficit seria a emisso de moeda, o que desencadearia uma srie de presses inflacionrias. No final do perodo pode-se constatar que a maioria das metas especficas do Plano de Metas alcanaram altas taxas de realizao (referentes a expanso da malha rodoviria, energia, produo industrial, etc.). O PIB cresceu taxa mdia anual de 8,2% (o PIB per capita cresceu 5,1%) e a inflao mdia, porm, ficou em 22,6% ao ano ambas superiores ao objetivo, s que a primeira com efeito positivo e a segunda, negativo. O perodo apresentou ainda fortes dficits no BP, resultado da queda dos preos do caf e da estagnao de outros componentes da pauta de exportao de 1958 a 60. Pode-se delinear como impactos do Plano de Metas a preocupao com os pontos de estrangulamento da infra-estrutura e a modernizao e ampliao do parque industrial, ainda que s custas do aprofundamento das desigualdades sociais e regionais. As principais dificuldades enfrentadas no perodo foram a ausncia de definio dos mecanismos de financiamento das metas (como por exemplo a elevao da carga fiscal, dado a pouca expressividade do sistema financeiro nacional), a resistncia do empresariado frente a medidas de controle

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inflacionrio e a atitude dbia da poltica monetria, ao tentar tornar compatveis metas antagnicas como crescimento, estabilidade, altos lucros e baixo custo de vida. O papel do setor pblico Alm da tendncia verificada desde o incio dos anos 50 de atribuir ao setor pblico a soluo para os problemas de infra-estrutura que dificultassem a industrializao, a partir da segunda metade da dcada delega-se tambm ao Estado o provimento de insumos bsicos. O governo controlava nesse perodo as trs maiores siderrgicas do pas (CSN, Cosipa e Usiminas), detinha o monoplio da produo e refino do petrleo (Petrobrs), produo e exportao do minrio de ferro (CVRD), participao crescente no setor energtico (CHESF, Furnas), importncia fundamental nos transportes (atravs da RFFSA, Lloyd Brasileiro, DNER e DER) e ainda o controle sobre o crdito (Banco do Brasil) e a comercializao do caf, cacau, borracha, acar, etc. atravs dos vrios institutos. O governo contou como suas principais fontes de recursos no perodo o imposto sobre o consumo, imposto de renda e o saldo de gios e bonificaes do imposto de importaes. A participao da receita do governo no PIB, que permaneceu entre 19 e 20% at 1957, chegou a 23.2% no auge do Plano de Metas. No entanto o governo ampliou o peso de seus gastos de 19% do PIB em 1952 para 23,7% em 1961, colocando em risco a capacidade de poupana do setor pblico. Os investimentos do setor pblico concentraramse no setor industrial (qumica e minerao, mais transportes e comunicaes a partir de 1958, com a formao da RFFSA). Ao exercer uma demanda autnoma de investimentos, o Estado exerceu posio central para a sustentao do ciclo econmico, principalmente para o setor de bens de capital. Polticas fiscal e monetria Durante o governo JK as polticas monetria e fiscal ficaram para segundo plano, ficando vinculadas ao processo de industrializao. No campo monetrio a poltica econmica era gerenciada pela Sumoc, Banco do Brasil e pelo prprio Tesouro. Cabia Sumoc a poltica cambial, a fixao das taxas de redesconto e compulsrios, a fiscalizao do capital estrangeiro e dos bancos comerciais e as operaes de open market. O Tesouro emitia papel-moeda e amortizava-o atravs da Caixa de Amortizao. As funes do Banco do Brasil, no entanto, eram as mais contraditrias. Ao Banco do Brasil estava delegada a operao da carteira de redescontos (para crdito seletivo e de liquidez) e da caixa de mobilizao bancria (emprestador de ltima escolha), operava ainda a carteira de cmbio e de comrcio exterior (Cacex) implementando decises da Sumoc. O Banco do Brasil recebia ainda a arrecadao tributria e efetivava os pagamentos da unio (banco do Tesouro), sendo responsvel ainda pelo servio de compensao de cheques e o depsito das reservas voluntrias dos bancos comerciais. A ambigidade das funes do Banco do Brasil residia no choque entre seus papis de banco comercial e autoridade monetria (no existindo limites rgidos emisso de papel-moeda) e por outro lado de depositrio das reservas dos bancos comerciais e ele mesmo sendo um banco comercial (no havendo limite para suas operaes ativas). Durante o perodo JK a cobertura do dficit de caixa governamental se fez quase que exclusivamente atravs de emprstimos do Banco do Brasil ao Tesouro. Como o BB exercia funes de banco central e banco comercial, qualquer crdito contra ele tornava-se base monetria (e no moeda escritural secundria). Logo, a cobertura dos dficits do Tesouro com crdito em conta corrente no Banco do Brasil representava expanso primria dos meios de pagamento. Alm dessa controversa atuao do Banco do Brasil, o governo encontrava dificuldades na utilizao dos instrumentos tradicionais de poltica monetria para restringir a expanso do crdito: i) as operaes de open market eram praticamente inexistentes, pois no havia um montante suficiente de letras do Tesouro em circulao, ii) as autoridades relutavam em utilizar o depsito compulsrio, uma vez que esse meio seria lento e de grande impacto, iii) o redesconto tambm foi pouco utilizado. As autoridades monetrias contaram ento com dois instrumentos heterodoxos: a manipulao dos emprstimos das diversas carteiras do BB e a compra e venda de divisas de cmbio as chamadas PVCs (Promessas de Venda de Cmbio). Dessa forma a eliminao do dficit do Tesouro s poderia se dar atravs do aumento da receita tributria (que se fazia desinteressante para o Congresso), lanamento de ttulos da dvida pblica (havia no entanto restries com relao ao patamar de sua taxa de juros) e a compresso de despesas afetando diretamente o investimento, pois o funcionalismo pblico era bastante forte. Como a inflao havia saltado de 7% (57) para 24,3% (58), Lucas Lopes assumiu o Ministrio da Fazenda encaminhando ao Congresso o Programa de Estabilizao Monetria. Seus principais objetivos: num primeiro momento, reduzir o ritmo da inflao mediante distribuio de renda e orientao de investimentos e preos; posteriormente, limitar a expanso dos meios de pagamento, com vistas estabilizao. Associado ao conservadorismo e s polticas ortodoxas do FMI em plena euforia do 50 anos em 5, o plano sofreu um rpido desgaste junto classe poltica e opinio pblica. O resultado foi a queda de Lucas Lopes e Roberto Campos (ento presidente do BNDE) e o rompimento do governo com o FMI.

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NDICE CRONOLGICO Agosto de 1957: Nova reforma do sistema cambial, com o objetivo de simplificar o sistema de taxas mltiplas e introduzir um mecanismo de proteo especfica por produtos da mesma categoria. 27 de outubro de 1958: encaminhado ao Congresso o Programa de Estabilizao Monetria do ministro Lucas Lopes. Janeiro de 1959: Liberao das exportaes de manufaturados pelo mercado livre (Instruo 167 da Sumoc) Abril de 1959: Liberao dos fretes (Instruo 181) Dezembro de 1959: Transferiu todas as exportaes para esse mercado, com a exceo de caf, cacau, leo mineral cru e mamona (Instruo 192). Meados de 1959: Lucas Lopes substitudo no Ministrio da Fazenda por Sebastio Paes de Almeida (ento Presidente do Banco do Brasil), Roberto Campos d lugar a Lcio Meira no BNDE e o governo brasileiro rompe com o FMI. Poltica cambial: Reforma implementada em agosto de 1955, introduzindo apenas duas taxas de cmbio: a Geral (matrias-primas, equipamentos e bens sem suprimento nacional) e a Especial (bens de consumo e outros com similar nacional). Um dos objetivos dessa reforma foi estimular o processo de substituio para o setor de bens de capital (que, em conseqncia, cresceu a uma taxa de 26,4% ao ano entre 1955 e 1960). Plano de Metas: Previso e Resultados (1957-61) Previso o Energia eltrica (1.000 kw) 2.000 1.650 82 Carvo (1.000 ton) 1.000 230 23 Petrleo-produo (1.000 barris/dia) 96 75 76 Petrleo-refino (1.000 barris/dia) 200 52 26 Ferrovias (1.000 km) 3 1 32 Rodovias-construo (1.000 km) 13 17 138 Rodovias-pavimentao (1.000 km) 5 Ao (1.000 ton) 1.100 650 60 Cimento (1.000 ton) 1.400 870 62 Carros e caminhes (1.000 unid) 170 133 78 Nacionalizao (carros) (%) 90 75 Nacionalizao (caminhes) (%) 95 74 Fonte: Banco do Brasil, Relatrio e Anurio Estatstico. Apud (Orenstein & Sochaczewski, 1997) Poltica monetria: A cobertura do dficit de caixa do governo se fez quase que exclusivamente atravs de emprstimos do Banco do Brasil ao Tesouro. Desta forma, a cobertura dos dficits por meio de crdito em conta corrente no Banco do Brasil implicou permanente expanso primria dos meios de pagamento. Dada a reao negativa do Programa de Estabilizao Monetria (PEM), optou-se pela continuao do projeto desenvolvimentista sem polticas de controle monetrio. A partir da as tentativas de estabilizao de preos restringiram-se a frustrados Planos de Conteno da despesa oramentria. Poltica fiscal: Alm das despesas de custeio, o item mais importante de gasto do governo referia-se aos subsdios s empresas de transporte de propriedade do governo federal. Elas receberam subvenes do governo federal da ordem de 12 a 13% da sua receita em 1955-60. O governo mostrou-se incapaz de conter os gastos correntes, principalmente com a folha de pagamentos (dada a fora poltica do funcionalismo pblico. Realizad %

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CAPTULO 8 - INFLAO, ESTAGNAO E RUPTURA: 1961-1964Marcelo de Paiva Abreu (Matheus Albergaria de Magalhes) 1.A Tentativa Ortodoxa sob Quadros Jnio Quadros assumiu a presidncia do pas no dia 31 de janeiro de 1961, com sua vitria sendo conseqncia de uma coalizo momentnea entre o voto conservador e setores populares da sociedade, sensibilizados pelo apelo populista de suas propostas. O novo presidente denunciou ento, as dificuldades econmicas herdadas de seu antecessor, que eram basicamente as seguintes: acelerao inflacionria, indisciplina fiscal e deteriorao do balano de pagamentos. Neste cenrio, dominava uma viso conservadora na formulao e implementao da poltica econmica. Em maro de 1961, o governo realizou uma importante reforma no regime cambial vigente, a partir da Instruo 204 da Superintendncia da Moeda e do Crdito (SUMOC), onde procurava atingir dois objetivos bsicos: a) desvalorizar a taxa de cmbio; e b) unificar o mercado cambial. Os motivos primordiais para que tal reforma fosse feita relacionam-se a dificuldades do balano de pagamentos e a preocupaes com a inflao. Para tanto, foram tomadas as seguintes medidas: i)a categoria geral do regime cambial vigente anteriormente foi transferida para o mercado dito livre; ii)o cmbio de custo aplicvel a importaes preferenciais (trigo, petrleo, etc.) foi desvalorizado em 100%. iii)o sistema antes vigente, de diferir a entrega de cambiais aos importadores, foi substitudo pelo sistema das Letras de Importao. (Neste sistema, os importadores, ao comprarem divisas para realizar suas importaes, eram obrigados a realizar simultaneamente, uma operao colateral, onde deveriam depositar o valor em cruzeiros correspondente importao no Banco do Brasil durante 150 dias. Em troca, receberiam as Letras de Importao). Adicionalmente, foram editadas novas instrues da SUMOC que, alm de extinguirem o cmbio de custo, determinavam a reteno de US$ 22 por saca de caf exportada e que as exportaes seriam realizadas taxa do mercado livre. Ao longo dos meses de maio e junho de 1961, o governo teve sucesso nas negociaes com credores norte-americanos e europeus, conseguindo novos emprstimos e um significativo reescalonamento da dvida externa que venceria entre 1961 e 1965 (ou seja, conseguiu adiar o pagamento de parte da dvida referente a esse perodo). Apesar disto, no que diz respeito poltica externa, o governo assumiu uma posio singular, distanciando-se da posio norte-americana de isolar Cuba, bem como procurando reatar relaes com a Unio Sovitica e apoiar a descolonizao da frica. ( a chamada poltica externa independente). No dia 25 de agosto de 1961, Jnio Quadros renunciou ao poder, o que acabou por resultar no colapso de seu programa de estabilizao. Devido curta durao de seu mandato, passa a ser bastante difcil realizar uma avaliao criteriosa dos resultados de suas polticas econmicas, uma vez que a crise poltica de agosto a setembro de 1961 teve como conseqncia o descontrole monetrio, fiscal e creditcio. 2. O Impasse Parlamentarista Com a renncia de Jnio Quadros, foi instaurado no pas o regime parlamentarista, devido ao veto militar posse do Vice-Presidente (tal como estabelecia a constituio), com tal regime durando de setembro de 1961 a janeiro de 1963. O primeiro gabinete parlamentarista foi formado sob a presidncia do ento deputado Tancredo Neves, tendo o banqueiro Walter Moreira Salles como Ministro da Fazenda. O programa de governo apresentado durante esse perodo era muito genrico, onde apesar de ter a baixa taxa de crescimento da economia como principal problema a ser resolvido, estabelecia diversos objetivos que admitia no serem todos compatveis entre si. Para tanto, o governo propunha-se a elevar a taxa de poupana (via uma reforma fiscal) e realizar a conteno do dficit de custeio das empresas pblicas, bem como estabeleceria prioridades e corrigiria desperdcios para melhorar a composio dos investimentos, e introduziria tcnicas de planejamento. No caso, eram contemplados trs nveis de planejamento: o Plano Perspectiva (20 anos), o Plano Qinqenal e o Plano de Emergncia. No que diz respeito s polticas monetria, bancria e financeira, o governo estabeleceu medias de emergncia e de reforma institucional. Em relao rea monetria, o governo demonstrou enorme preocupao com a expanso monetria, impondo controles quantitativos de crdito at o final de 1961, e estabelecendo mecanismos de depsito compulsrio sobre depsitos vista dos bancos privados (j que houvera um certo volume de expanso monetria durante a crise poltica). Quanto a reformas institucionais, foi feita meno criao do Banco Central e do Banco Rural, bem como foi feita uma reforma da legislao bancria vigente. Em relao poltica financeira pblica, o governo propunha-se a aplicar o Plano de Economia de gastos aprovado por Quadros e a financiar o dficit programado de 1962 de forma no-inflacionria (ou seja, sem emitir moeda

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para cobrir tal dficit). Em termos das reformas, a reforma vista como bsica era a da rea fiscal. J em relao poltica cambial, o programa defendia a adoo de uma taxa de cmbio nica, fixada em um nvel realista. Contraditoriamente, enfatizava ao mesmo tempo, a necessidade de manter o controle quantitativo de importaes no-essenciais. Nessa poca, o novo presidente, Joo Goulart (que tomou posse em 07/09/1961) comprometeu-se ainda com a realizao da reforma agrria. Neste perodo, as relaes Brasil-EUA acabaram por sofrer um certo desgaste devido a modificaes na legislao econmica brasileira, que acabavam por prejudicar a remessa de lucros de capital estrangeiro, bem como cancelavam certas concesses feitas a companhias norte-americanas. A poltica externa independente inaugurada por Jnio Quadros teve continuidade com Joo Goulart. De qualquer forma, mesmo com a renncia de Jnio Quadros, os resultados econmicos de 1961 foram bastante razoveis. A inflao manteve-se estvel em torno de 30%, o PIB cresceu 8,6%, o balano de pagamentos foi beneficiado pela recuperao das exportaes e a renegociao da dvida externa. A formao bruta de capital fixo (um importante indicador do nvel de investimento do pas), no entanto, reduziu-se de 15,7% do PIB em 1960 para 13,1% em 1961, seu menor valor desde 1949. Estes bons resultados, no entanto, no duraram muito. Em maio de 1962, o dficit de caixa do governo aumentou significativamente devido ao aumento das despesas pblicas e o aumento da taxa de expanso da oferta monetria. (A principal presso sobre os gastos pblicos provinha do dficit das empresas do governo no setor de transportes). No final de maio de 1962, ocorreu uma crise poltica interna ao governo que acabou por culminar na renncia coletiva do gabinete Tancredo Neves. O nome indicado para suced-lo foi o de Santiago Dantas, mas que acabou no vingando, devido a certa resistncia poltica do Congresso. Aps algum tempo, foi aprovado o nome de Brochado da Rocha. O programa poltico de Brochado da Rocha abordava diversos temas, desde a reforma agrria at a energia nuclear. Suas propostas revelavam-se, no entanto, bastante vagas, o que dificultava sua aceitao no Congresso. Seu programa econmico pretendia estabilizar a inflao em torno de 60% em 1962 e reduzi-la para 30% em 1963. Seu gabinete procurou obter poderes especiais para legislar sobre diversos temas, inclusive as reformas de base, bem como na antecipao da data de realizao do plebiscito acerca da permanncia do sistema parlamentarista de governo. A maior parte dessas propostas acabou sendo recusada no Congresso, o que levou renncia do gabinete Brochado da Rocha em setembro de 1962. A proposta relativa antecipao do plebiscito, no entanto, foi aceita, com sua realizao sendo marcada para o dia 06 de janeiro de 1963. Durante esse perodo de transio, o gabinete foi chefiado por Hermes Lima. Apesar de haver um programa de transio que inclua um plano de controle da inflao, este acabou sendo comprometido pela concesso do 13 salrio aos trabalhadores urbanos. As relaes com os EUA continuaram a desgastar-se no perodo, com o Brasil finalmente concordando com o bloqueio a Cuba (apesar de ser contra a interveno armada naquele pas). As conseqncias de tamanha instabilidade poltica acabaram sendo refletidas a nvel econmico no segundo semestre de 1962. O governo perdeu o controle de suas contas no final do ano, a expanso dos meios de pagamento aumentou enormemente, a inflao aumentou e a taxa de crescimento PIB reduziu-se para 6,6% (tal taxa havia sido de 8,6% em 1961). 3.O Plano Trienal e seu Fracasso Em fins de dezembro de 1962 foi apres