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3 6 Em 2008, parte da plateia de um seminário promovi- do pelo Ministério da Cultura surpreendeu-se diante da afirmativa de um palestrante: Se o livro (infantil) encalhar ou vender um milhão de exemplares, o ilustrador ganha o mesmo. Além do desconcerto, estes ouvintes, muitos deles advogados, deram mostras de indignação. Como? O ilustrador não recebe direitos autorais? A pergunta não era exatamente correta, uma vez que não se recebem direitos autorais, ainda que seja expressão comum. Recebe-se pela cessão temporária dos direitos patrimoniais, o que permite à editora a exploração comercial da obra. O que se pretendia saber, na verdade, é se o ilustrador não é remunerado tal como se costuma remunerar o escritor, através do recebimento de um per- centual sobre as vendas. Mesmo com a ilustração brasileira atingindo elevados níveis de qualidade, muitas editoras seguem negando a condição autoral do ilustrador e tratando-o de forma distinta do escritor naquilo que eles têm em comum. Há, contudo, indícios de mudança. Já temos um bom número de editoras incluindo em seus contratos de ilustração o pagamento na forma de um percentual, ainda que pequeno, sobre os exemplares vendidos. Esta cláusula visa principalmente as vendas para o governo, que, mesmo com enormes descontos, compensam pela quantidade. Assim, é importante para o ilustrador estar atento a alguns aspectos dos contratos de ilustração: – Cuidado com os chamados contratos de prestação de serviço. De cara, eles recusam o caráter autoral da ilus- tração, qualificando-a como serviço prestado, em que a remuneração é feita através de um pagamento único, fixo e definitivo. – A cessão de direitos de publicação deve ser feita, tal como a do texto, com uso, tempo e abrangência geográfica bem definidos. Se um contrato de texto para um livro tem duração média de cinco anos, por que a cessão dos direitos da ilustração do mesmo livro deveria ser eterna? – Também não é justo uma editora pagar para usar imagens num livro de LIJ e depois utilizá-las, sem pagamento adi- cional, num livro didático ou em qualquer outro uso além do livro previsto ou sua divulgação. – Ainda que os percentuais pagos sejam pequenos, é importante incluí- los no contrato. Mesmo com os descontos, uma venda para o PNBE pode gerar um valor igual ou superior ao de um pagamento fixo. – O ideal é que o ilustrador receba um valor inicial pela primeira tiragem (já que o seu tempo de tra- balho foi empregado por solicita- ção da editora e não espontanea- mente) e valores adicionais pelas tiragens seguintes, de preferência com base no número de exemplares vendidos. Estes são apenas alguns pontos iniciais da questão. Espera-se que sejam úteis para que ilustradores, escritores e editores possam perce- ber a ilustração como obra autoral, bem como as mudanças decorrentes deste entendimento, com reflexos diretos sobre os contratos de cessão de direitos autorais. Mauricio Veneza Ilustradores, Contratos e Direitos Autorais Já temos um bom número de editoras incluindo em seus contratos de ilustração o pagamento na forma de um percentual, ainda que pequeno, sobre os exem- plares vendidos. Em qualquer grupo de ilustradores, seja num encontro no Salão do Livro ou em um fórum na Internet, é usual que se discuta a questão de valores e contratos. O aprendizado sobre a Lei dos Direitos Autorais e sua aplicação nos contratos de uso das ilustrações é um divisor de águas na carreira do autor, separando os ilustradores amadores daqueles pro- fissionais bem colocados no mercado. Desinformados e desamparados, não raro vemos ilustradores novatos assinarem contratos de cessão total de direitos repletos de cláusulas abusivas, injustificáveis. Mas não é preciso muito tempo para que se perceba que assinar esses contratos é cometer suicídio profissional. É com indignação que vejo ilustrações feitas por mim em meu início de carreira serem reutilizadas nos mais diferentes produtos sem que eu receba a remuneração correspondente. Por outro lado, pude gerenciar o uso de outras tantas ilustrações, estas sim, com seu uso gerido por contratos corre- tos, onde percebem-se valores na pro- porção de seu uso. Hoje tenho um belís- simo acervo ao meu dispor. Pude licen- ciar imagens de livros que viraram capas de CD de músicas para crianças, e outras que apareceram em revistas voltadas para a educação. Tenho as que comercializo como gravuras. Outros ilustradores também usam suas artes em calendários, animações, camisetas, cartazes, e todo tipo de suporte que abrigue uma bela criação visual. O fato é que a ilustração do livro infantil tem muito mais aplicações fora da publi- cação original do que o texto. Felizmente, pude contar com a orien- tação de colegas mais experientes que me ensinaram como gerir meus direitos de autora e como escrever contratos jus- tos. Contudo, é de se espantar que não exista em nossa formação uma cadeira específica para contratos e direitos. Cursei Belas Artes na UFRJ e o Curso Técnico Especial de Programação Visual do SENAI de Artes Gráficas, fora outras tantas especializações. Mas foi apenas buscando cursos na área de Direito que obtive o conhecimento necessário, senão básico, de direitos autorais, para ter uma carreira em arte. Sem esse conhecimento, ficamos todos vulneráveis ao abuso dos contratos leoninos. Hoje, quanto mais me aprofundo no conhecimento da Lei, mais percebo os contratos de cessão total como ver- dadeiras bombas-relógios, prontas a detonarem quando os ilustradores, cientes de seus direitos, reivindicarem a rescisão dos contratos com base em suas cláusulas abusivas. Como ilustradora sei que não posso aceitar contratos leoninos, sob o risco de enter- rar minha carreira. E como editora, sei que não devo exigir a assinatura destes contratos absurdamente prejudiciais aos autores que, no devido tempo, poderão, com justiça, reclamar de seus termos. Thais Linhares é ilustradora, escritora e editora da Ygarapé. UMA ILUSTRAÇÃO, MUITOS USOS Além do Papel PDF, PPS, FLASH, EBOOK, IPAD, KINDLE, COOL-ER, o que estas siglas têm a ver com a nossa vida? Pois é, além do papel existe vida inteligente e que chegou para ficar! A coisa é: o que fazer com o que fazemos, diante disso tudo? Criar! Essa é a saída! Desenvolver novos produtos, novos anteparos, novas formas de utilização, novos, novos! É isso! E, é agora ou nunca! Se você é ilustrador, escritor, editor, livreiro, qualquer que seja a sua profissão ligada ao livro, preste atenção no que está acontecendo e procure se adaptar. Algumas idéias estão rolando por aí: um livro que a criança escreve e desenha, você envia para a editora e recebe de volta encadernado, leitores digitais que já vêm com uma enorme biblioteca, livros infantis em formato digital onde a criança interfere na história; estes exemplos já existem, já estão fazendo sucesso e são uma amostra da reação de pro- fissionais do livro a esse mercado maluco que cresce desordenadamente, rápido demais para nós, seres do século passado! PREVISÕES Bem, não sou exatamente o Pai JP, mas zinfins... antenado que sou nessa loucura, posso dizer que tal qual o rádio não desapareceu com a chegada da TV, nem a carta com o e-mail, o livro não desaparecerá! Pois um bom e velho livro de papel não precisa de eletricidade, não necessita de boot, não trava, nem perde páginas! Ah, e ainda por cima tem aquele cheirinho... JPVeiga Internet: de vilã a heroína Foi graças à Internet que ilustradores não só do Brasil, mas de todo o planeta, puderam começar a trocar impressões e experiências sobre suas carreiras. Agora é praticamente impossivel um caso de plágio ou contrafração passar desapercebido. A própria publicação na Internet valendo como prova. Nos sites de relacionamento os autores passam notícias de cursos, técnicas, novos trabalhos e parcerias. Nunca em toda história houve tal avanço no tocante às relações profissionais dos autores. Agora temos acesso constante a informações sobre direitos autorais, decisões judiciais e modelos de contratos. Há aqueles que justificam a apropriação ilegal das obras e a simples pirataria porque ‘“ficou fácil’. Mas não é porque algo é “fácil” que deixa de ser ilegal. Afinal, ninguém pensa em entrar numa lavoura e arrancar para si os tomates cuidadosamente cultivados só porque é fácil pular a cerca e se esbaldar. Claro que não! Então porque é tão dificil entender que nós, os autores, não podemos dispor de nosso trabalho gratuitamente? Ele também é fruto de um cultivo cuidadoso e dispendioso. Por outro lado, aqueles que lucram com a veiculação de nossa arte devem sim reser- var parte destes ganhos aos criadores do conteúdo cultural, artístico e científico da Internet. Thais Linhares Capa ... o que é mesmo isso? Enquanto ainda estamos perdidos e perplexos com o mundo digital, nossos filhos apontam caminhos e soluções. Os novos músicos já nem pensam em direito autoral. Usam os meios digitais apenas como veículos de divulgação para seus shows. Dinheiro? Só de gente de carne e osso, que entra pela bilheteria. Escritor não dá show. Não se pode comparar o que ganhamos por palestra com o que fatura um astro do rock, do funk ou do axé. Por outro lado, sem que a gente perceba, as publicações digitais ganham espaço. Não é futuro. Entre os aplicativos gratuitos para IPods, já encontram-se pequenos livros ilustrados, alguns deles muito interessantes. A Apple pagou por essas obras – não uma porcentagem das vendas, mas um preço fixo. Pessoalmente, já fiz livros de encomenda por esse sistema. O editor podia vender quantos exemplares quisesse no prazo de vigência do contrato. Ganhei bem e não me arrependi. O que talvez esteja na hora de pensar é em outras configurações para o DA, fora dos tradicionais 10% sobre o preço de capa. Capa ... você sabe o que é capa, não é? Aquela cobertura de papel que envolve e protege um volume de folhas costuradas ou coladas ... Rosa Amanda Strausz E o que dizer do futuro? Parece fácil, simpático, mas é crime. Copiar livros e colocar na web sem a devida autorização é crime. É o mesmo que entrar numa livraria, pegar um livro e levar para casa sem pagar. O que nos causa mais espanto é que isso está sendo feito (e ampla- mente apoiado) por professores que se consideram verdadeiros heróis em prol da leitura. A Internet é uma ferramenta incrível, todos concordamos, mas existem meios legítimos de se obter livros: seja através de anunciantes (como na TV aberta e nos jornais de distribuição gratuita), patrocinadores (empresas que disponibilizam conteúdo aos seus clientes em forma de bônus) ou pelo simples repasse da publicidade visível (número de acessos proporcional ao repasse, prática utilizada por sites de conteúdo). Diga não à pirataria! Diretoria AEILIJ

6 3 E o que dizer do futuro? · ao de um pagamento fixo. ... nem a carta com o e-mail, o livro não desaparecerá! ... Poe era alcoólatra, além de sofrer um proces-

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3366Em 2008, parte da plateia de um seminário promovi-

do pelo Ministério da Cultura surpreendeu-se diante daafirmativa de um palestrante: Se o livro (infantil) encalharou vender um milhão de exemplares, o ilustrador ganhao mesmo. Além do desconcerto, estes ouvintes, muitosdeles advogados, deram mostras de indignação. Como?O ilustrador não recebe direitos autorais? A pergunta nãoera exatamente correta, uma vez que não se recebemdireitos autorais, ainda que seja expressão comum.Recebe-se pela cessão temporária dosdireitos patrimoniais, o que permite àeditora a exploração comercial da obra.O que se pretendia saber, na verdade,é se o ilustrador não é remunerado talcomo se costuma remunerar o escritor,através do recebimento de um per-centual sobre as vendas. Mesmo com ailustração brasileira atingindo elevadosníveis de qualidade, muitas editorasseguem negando a condição autoral doilustrador e tratando-o de forma distintado escritor naquilo que eles têm emcomum. Há, contudo, indícios demudança. Já temos um bom número deeditoras incluindo em seus contratos deilustração o pagamento na forma de umpercentual, ainda que pequeno, sobre os exemplaresvendidos. Esta cláusula visa principalmente as vendaspara o governo, que, mesmo com enormes descontos,compensam pela quantidade.

Assim, é importante para o ilustrador estar atento aalguns aspectos dos contratos de ilustração:– Cuidado com os chamados contratos de prestação deserviço. De cara, eles recusam o caráter autoral da ilus-tração, qualificando-a como serviço prestado, em que a

remuneração é feita através de um pagamentoúnico, fixo e definitivo. – A cessão de direitos de publicação deve ser feita,tal como a do texto, com uso, tempo e abrangênciageográfica bem definidos. Se um contrato de texto paraum livro tem duração média de cinco anos, por que acessão dos direitos da ilustração do mesmo livro deveriaser eterna?– Também não é justo uma editora pagar para usar

imagens num livro de LIJ e depoisutil izá-las, sem pagamento adi-cional, num livro didático ou emqualquer outro uso além do livroprevisto ou sua divulgação.– Ainda que os percentuais pagossejam pequenos, é importante incluí-los no contrato. Mesmo com osdescontos, uma venda para o PNBEpode gerar um valor igual ou superiorao de um pagamento fixo. – O ideal é que o ilustrador recebaum valor inicial pela primeiratiragem (já que o seu tempo de tra-balho foi empregado por solicita-ção da editora e não espontanea-mente) e valores adicionais pelas

tiragens seguintes, de preferência com base nonúmero de exemplares vendidos.

Estes são apenas alguns pontos iniciais daquestão. Espera-se que sejam úteis para queilustradores, escritores e editores possam perce-ber a ilustração como obra autoral, bem como asmudanças decorrentes deste entendimento, comreflexos diretos sobre os contratos de cessão dedireitos autorais.

Mauricio Veneza

Ilustradores, Contratos e Direitos Autorais

Já temos um bomnúmero de

editoras incluindoem seus contratos

de ilustração opagamento naforma de um

percentual, aindaque pequeno,

sobre os exem-plares vendidos.

Em qualquer grupo de ilustradores,seja num encontro no Salão do Livro ouem um fórum na Internet, é usual que sediscuta a questão de valores e contratos.O aprendizado sobre a Lei dos DireitosAutorais e sua aplicação nos contratosde uso das ilustrações é um divisor deáguas na carreira do autor, separandoos ilustradores amadores daqueles pro-fissionais bem colocados no mercado.Desinformados e desamparados, nãoraro vemos ilustradores novatosassinarem contratos de cessão total dedireitos repletos de cláusulas abusivas,injustificáveis. Mas não é preciso muitotempo para que se perceba que assinaresses contratos é cometer suicídioprofissional. É com indignação que vejoilustrações feitas por mim em meu iníciode carreira serem reutilizadas nos maisdiferentes produtos sem que eu receba aremuneração correspondente.

Por outro lado, pude gerenciar o usode outras tantas ilustrações, estas sim,com seu uso gerido por contratos corre-tos, onde percebem-se valores na pro-

porção de seu uso. Hoje tenho um belís-simo acervo ao meu dispor. Pude licen-ciar imagens de livros que viraram capasde CD de músicas para crianças, eoutras que apareceram em revistasvoltadas para a educação. Tenho as quecomercializo como gravuras. Outrosilustradores também usam suas artesem calendários, animações, camisetas,cartazes, e todo tipo de suporte queabrigue uma bela criação visual. O fato éque a ilustração do livro infantil temmuito mais aplicações fora da publi-cação original do que o texto.

Felizmente, pude contar com a orien-tação de colegas mais experientes queme ensinaram como gerir meus direitosde autora e como escrever contratos jus-tos. Contudo, é de se espantar que nãoexista em nossa formação uma cadeiraespecífica para contratos e direitos.Cursei Belas Artes na UFRJ e o CursoTécnico Especial de ProgramaçãoVisual do SENAI de Artes Gráficas, foraoutras tantas especializações. Mas foiapenas buscando cursos na área de

Direito que obtive o conhecimentonecessário, senão básico, de direitosautorais, para ter uma carreira em arte.Sem esse conhecimento, ficamos todosvulneráveis ao abuso dos contratosleoninos.

Hoje, quanto mais me aprofundo noconhecimento da Lei, mais percebo oscontratos de cessão total como ver-dadeiras bombas-relógios, prontas adetonarem quando os ilustradores,cientes de seus direitos, reivindicarem arescisão dos contratos com base emsuas cláusulas abusivas. Comoilustradora sei que não posso aceitarcontratos leoninos, sob o risco de enter-rar minha carreira. E como editora, seique não devo exigir a assinatura destescontratos absurdamente prejudiciais aosautores que, no devido tempo, poderão,com justiça, reclamar de seus termos.

Thais Linhares é ilustradora, escritora e editora da Ygarapé.

UMA ILUSTRAÇÃO, MUITOS USOS

Além do PapelPDF, PPS, FLASH, EBOOK, IPAD, KINDLE, COOL-ER, o que estas siglas têm a ver com a nossa vida? Pois é, além

do papel existe vida inteligente e que chegou para ficar! A coisa é: o que fazer com o que fazemos, diante disso tudo?Criar! Essa é a saída! Desenvolver novos produtos, novos anteparos, novas formas de utilização, novos, novos! É isso!E, é agora ou nunca! Se você é ilustrador, escritor, editor, livreiro, qualquer que seja a sua profissão ligada ao livro,

preste atenção no que está acontecendo e procure se adaptar. Algumas idéias estão rolando por aí: um livro que a criança escreve e desenha, você envia para a editora e recebe

de volta encadernado, leitores digitais que já vêm com uma enorme biblioteca, livros infantis em formato digital onde acriança interfere na história; estes exemplos já existem, já estão fazendo sucesso e são uma amostra da reação de pro-fissionais do livro a esse mercado maluco que cresce desordenadamente, rápido demais para nós, seres do século passado!

PREVISÕESBem, não sou exatamente o Pai JP, mas zinfins... antenado que sou nessa loucura, posso dizer que tal qual o rádio

não desapareceu com a chegada da TV, nem a carta com o e-mail, o livro não desaparecerá! Pois um bom e velholivro de papel não precisa de eletricidade, não necessita de boot, não trava, nem perde páginas! Ah, e ainda por cimatem aquele cheirinho...

JPVeiga

Internet: de vilã a heroínaFoi graças à Internet que ilustradores não só do Brasil, mas de todo o planeta, puderam começar a trocar

impressões e experiências sobre suas carreiras. Agora é praticamente impossivel um caso de plágio ou contrafraçãopassar desapercebido. A própria publicação na Internet valendo como prova. Nos sites de relacionamento os autorespassam notícias de cursos, técnicas, novos trabalhos e parcerias. Nunca em toda história houve tal avanço no tocanteàs relações profissionais dos autores. Agora temos acesso constante a informações sobre direitos autorais, decisõesjudiciais e modelos de contratos.

Há aqueles que justificam a apropriação ilegal das obras e a simples pirataria porque ‘“ficou fácil’. Mas não éporque algo é “fácil” que deixa de ser ilegal. Afinal, ninguém pensa em entrar numa lavoura e arrancar para si ostomates cuidadosamente cultivados só porque é fácil pular a cerca e se esbaldar. Claro que não! Então porque é tãodificil entender que nós, os autores, não podemos dispor de nosso trabalho gratuitamente? Ele também é fruto de umcultivo cuidadoso e dispendioso. Por outro lado, aqueles que lucram com a veiculação de nossa arte devem sim reser-var parte destes ganhos aos criadores do conteúdo cultural, artístico e científico da Internet.

Thais Linhares

Capa ... o que é mesmo isso?Enquanto ainda estamos perdidos e perplexos com o mundo digital, nossos filhos apontam caminhos e soluções. Os

novos músicos já nem pensam em direito autoral. Usam os meios digitais apenas como veículos de divulgação paraseus shows. Dinheiro? Só de gente de carne e osso, que entra pela bilheteria.

Escritor não dá show. Não se pode comparar o que ganhamos por palestra com o que fatura um astro do rock, dofunk ou do axé. Por outro lado, sem que a gente perceba, as publicações digitais ganham espaço. Não é futuro. Entreos aplicativos gratuitos para IPods, já encontram-se pequenos livros ilustrados, alguns deles muito interessantes. AApple pagou por essas obras – não uma porcentagem das vendas, mas um preço fixo.

Pessoalmente, já fiz livros de encomenda por esse sistema. O editor podia vender quantos exemplares quisesse noprazo de vigência do contrato. Ganhei bem e não me arrependi.

O que talvez esteja na hora de pensar é em outras configurações para o DA, fora dos tradicionais 10% sobre opreço de capa.

Capa ... você sabe o que é capa, não é? Aquela cobertura de papel que envolve e protege um volume de folhascosturadas ou coladas ...

Rosa Amanda Strausz

E o que dizer do futuro?

Parece fácil, simpático, mas é crime.

Copiar livros e colocar na web sem a devida autorização é crime. É o mesmo que entrar numa livraria, pegarum livro e levar para casa sem pagar. O que nos causa mais espanto é que isso está sendo feito (e ampla-mente apoiado) por professores que se consideram verdadeiros heróis em prol da leitura. A Internet é uma ferramenta incrível, todos concordamos, mas existem meios legítimos de se obter livros:seja através de anunciantes (como na TV aberta e nos jornais de distribuição gratuita), patrocinadores(empresas que disponibilizam conteúdo aos seus clientes em forma de bônus) ou pelo simples repasse dapublicidade visível (número de acessos proporcional ao repasse, prática utilizada por sites de conteúdo).Diga não à pirataria!

Diretoria AEILIJ

Ano passado, um dos maiores autores da LiteraturaMundial, o americano Edgar Allan Poe, criador da moder-na novela policial e grande destaque da ficção de horror,completou 200 anos de nascimento. A data foi comemora-da, saudada, louvada no mundo inteiro.Muitas breves notícias biográficas circularamna imprensa. E não deixaram de lembrar quePoe era alcoólatra, além de sofrer um proces-so de degeneração mental que o levou a serencontrado vagando, sozinho e imundo, nasruas de Baltimore, depois de dias desapareci-do. Dali, Poe foi internado e faleceria no hos-pital.

No entanto, há toda uma outra história portrás dessa, que raramente é lembrada. Opoema O Corvo, de Poe, foi um dos maisreproduzidos, vendidos, etc, nos EUA e emtodo o mundo. Poe, no entanto, jamais ganhouum centavo, além da merreca pela qual vendeuO Corvo para a primeira publicação em jornal.

Poe sofreu de problemas financeiros a vida inteira. Suamulher, Virgínia, com quem viveu uma paixão profunda,morreu de tuberculose e penúria. Poe não teve recursospara tratá-la. O trauma o levou ao alcoolismo. E daí decor-reram os demais problemas.

Temos muitos exemplos no Brasil de escritores desucesso que viveram em dificuldades financeiras. Paraficar somente nos clássicos, depois da morte de JoaquimManuel de Macedo, a família, sem recursos, foi forçada a

pedir uma pensão à Princesa Isabel. Sua obraA Moreninha foi o nosso primeiro grandesucesso, que inclusive abriu caminho para aprofissionalização (parcial) do mercado e pos-sibilitou a edição de obras de autoresbrasileiros.

José de Alencar, patrono do romancenacional, e também grande sucesso de público,morreu prematuramente, aos 47 anos, de tuber-culose. Conta-se que Machado de Assis, seuamigo, ficou desolado com o estado de miséria aque a família ficou reduzida.

No entanto, como ficaria a nossa Literatura sefosse privada desses talentos, dessas obras, queinsistiram em criar, apesar das dificuldades?

Enfim, nossa luta em defesa dos Direitos Autorais temhistória. E nem sempre uma história bonita, nem com finalfeliz. A verdade é que SEM DIREITO AUTORAL NÃO HÁAUTOR... E SEM AUTOR, NEM MESMO A LITERATURASOBREVIVE.

Luiz Antonio Aguiar

Sucesso de Público, de Crítica... E na Miséria.

Velhos tempos, velhas práticas...Meu saudoso pai, Osmar Barbosa, professor, poeta, gramático e tradutor, publicou dezenas de

livros nos anos 60 por uma das maiores e mais poderosas editoras brasileiras. Obras, em sua mai-oria, sobre a gramática portuguesa, além de diversos dicionários, antologias e traduções. Muitos deseus títulos continuam sendo vendidos até hoje, mas ele nunca recebeu direitos autorais.

Lembro-me dele, debruçado sobre sua velha máquina portátil, datilografando sem parar, atéde madrugada. Trabalhava sempre à noite, ou nos fins de semana, já que lecionava durante odia. Recordo-me, também, ainda menino, de acompanhá-lo várias vezes a um dos subúrbios doRio, com o calhamaço de seu novo original debaixo do braço. Recebia, na hora, uma determina-da quantia por cada texto e nada mais. Com que alegria embolsava o cheque que complemen-tava a sua pequena renda. Velhos tempos, velhas práticas...

Rogério Andrade Barbosa

Sobre o pedido de doações de livros

Nosso Coordenador da AEILIJ no RS, Hermes Bernardi Jr, recebeu um pedido de doação de livros, dirigido a ele e outrosautores. Abaixo, reproduzimos a resposta que enviou a este pedido. O caso foi lançado na nossa Lista de Debates na Internet,e a grande maioria dos participantes se manifestou apoiando a atitude do autor.

Cara Diretora,

É genuíno o teu pedido, mas fiquei pensando se não seria esta a oportunidade de fazeres um movimento junto ao poderpúblico para a aquisição de obras. Afinal, nós autores vivemos da venda de nossos livros e, acredito, o poder público tem obri-gação de sanar tua necessidade. O meu trabalho é escrever e esperar que mais e mais leitores possam dialogar com as minhasobras, bem como a de tantos outros escritores. Não tenho como distribuir livros gratuitamente, pois seria injusto com meus cole-gas de ofício que tentam, lutam desesperadamente por mais dignidade no trato com Literatura para a formação e qualificaçãode leitores mais reflexivos, longe do imaginário estereotipado, padronizado e massificado por nossos veículos de imprensa. Háuma frase de uma importante atriz brasileira, Cacilda Becker, que quando solicitada a se apresentar gratuitamente, disse: "Nãome peçam de graça a única coisa que tenho para vender.” Fico sensibilizado com teu pedido, mas isso me faz pensar em quan-to dinheiro desviado poderia aprimorar os acervos de inúmeras bibliotecas ou construir muitas novas e bem equipadas Brasilafora. Tudo é uma questão de vontade política. Creio que a vontade tu tens, mas creio que há outros caminhos possíveis. Sugirofazeres algum tipo de movimento junto à sociedade civil, aos pais das crianças que frequentam a tua biblioteca, à tua comu-nidade, no sentido de tornares pública a deficiência do acervo e exigires do poder público uma atitude mais consciente.Precisamos de mais pessoas com atitude, de pessoas que não se acomodem junto às negativas, que busquem o que lhes é dedireito através dos meios cabíveis.

Tu já pensaste se nós – escritores e ilustradores – tivéssemos de atender aos milhares de pedidos de doações que noschegam? Certamente não teríamos como pagar nossas próprias contas. E não se trata de incompreensão negar a tua solicitação.

Trata-se de aplaudi-la e auxiliá-la a ir em busca de teus objetivos através dos meios criados para isso. Não sei se conheceso programa PNBE – Programa Nacional Biblioteca na Escola, do MEC, através do FNDE, que distribui livros de literatura infan-til e juvenil às bibliotecas escolares. Procure se informar a respeito via WEB, ou através de sua Secretaria de Educação ou daCultura. Trata-se de um dos caminhos possíveis para atualizar acervos. Ainda que seja insuficiente, ajuda. Muitos dos autoresa quem encaminhas o teu pedido tem suas obras selecionadas nesse Programa. Eu, inclusive. Vais conseguir algumas dasobras mais indicadas para continuares o teu trabalho de formação e qualificação do teu leitor. E terás, certamente, muito do quese orgulhar por teres feito este movimento em prol de teu leitor. Espero ter colaborado com tua admirável iniciativa.

Ano passado, um projeto de adaptação cinemato-gráfica foi barrado num edital de Lei de Incentivoporque os roteiristas não apresentaram a autorizaçãooriginal (ou pelo menos a cópia autenticada) doescritor adaptado, um tal Fiodor Dostoievski...

Leo Cunha

Ao entrar com o pedido de registro do texto de umade minhas histórias, um reconto da fábula A cigarra e aformiga, na Biblioteca Nacional, fui surpreendida com oseguinte: uma carta do Escritório de Direitos Autoraisexigia a autorização por escrito, com assinatura reco-nhecida em cartório, do autor da obra original na qual euhavia me inspirado para escrever A outra história dacigarra e da formiga, ou seja, Esopo, grego que viveu entre620 a 560 antes de Cristo. Tive que explicar que a obra jáestava em domínio público, tinha sido mundialmente difun-dida séculos depois pelo francês La Fontaine (1621-1695).Mais surpresa ainda: solicitaram, numa segunda carta, aautorização também de La Fontaine.

Alessandra Pontes Roscoe

5544

...é que no meu país, eles exigem asua assinatura no contrato,

entende?

Monsieur Esopo, tem gente no Brasil queacredita em mortos-vivos!