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ANLISE DA INCOSTITUCIONALIDADE DE PATENTE PIPELINE:
REVALIDAO OU CONCESSO ORIGINRIA?
SONEGO, Elisabetha Leal. Aluna do curso de Direito Unifra; CEZNE, Andrea Nrriman. Orientadora Doutora UFRGS, Professora do Curso de Direito. Trabalho de Pesquisa_UNIFRA Curso de Direito do Centro Universitrio Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil E-mail: [email protected]
RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade uma anlise da possvel inconstitucionalidade das
patentes pipeline levantada pelo STF na ADIn 4234, devido a sua natureza jurdica de revalidao e
no como requisito de concesso originria. Por isso, faz-se um breve estudo sobre patentes de
medicamentos, a legislao envolvida, os requisitos para concesso, a produo e o
desenvolvimento de medicamentos como mecanismo de promoo da sade. Analisa-se a aplicao
de princpios constitucionais como a primazia do interesse pblico, especificamente o direito sade,
o princpio da exclusividade sobre o novo e a funo social das patentes de medicamentos. O estudo
ser realizado atravs do mtodo de abordagem dialtico, partindo-se da anlise da Lei de
Propriedade Industrial LPI n9279/96.
Palavras-chave: Patente; Medicamentos; Sade; Revalidao; Propriedade Industrial.
1.INTRODUO:
O tema em questo escolhido, das patentes na Indstria Farmacutica, desperta
interesse entrelaando a rea farmacutica e a proteo propriedade, confrontando com o
direito sade, e outros princpios constitucionais. Discute-se a inconstitucionalidade dos
artigos 230 e 231 da LPI n 9279/96(Lei da Propriedade Industrial), que tratam das patentes
Pipeline, do qual resultou na ADIn 4234, ainda no julgada pelo Superior Tribunal Federal.
Questiona-se a natureza jurdica de revalidao dos produtos patenteados por este
mecanismo e no como uma concesso originria, visto que esta patente est vinculada ao
primeiro depsito do invento no pas de origem e por isto no deve seguir as mesmas regras
aplicadas a concesso de patentes de produtos novos.
um tema interessante, pois permite analisar a relao da LPI com os princpios
constitucionais e os interesses da sociedade, principalmente quanto primazia do interesse
pblico, no que se refere promoo da sade. Quanto ao princpio constitucional da
primazia do interesse pblico, convm ressaltar que se trata do fundamento principal para
qualquer legislao. Com isto as limitaes que so impostas ao setor privado quanto s
suas descobertas visam buscar um equilbrio entre o pblico e o privado (que tem direitos
em relao a sua descoberta), porm sempre privilegiando a funo social.
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A produo e o desenvolvimento de medicamentos constitui uma anlise
primeiramente quanto sua principal finalidade que a promoo da sade. Porm outros
aspectos relevantes devem ser analisados, como a produo de riquezas das indstrias
envolvidas neste processo e o desenvolvimento cientfico na busca de novas descobertas.
Analisa-se a importncia da proteo patentria, os requisitos para a concesso da patente,
como tratada tal proteo na Legislao Brasileira e o que levou inconstitucionalidade
levantada em relao aos artigos 230 e 231 da LPI.
Justifica-se tambm a anlise do tema observando que os interesses econmicos
envolvidos da indstria farmacutica constituem elevados valores, fazendo-se necessrio a
interferncia estatal para que seja assegurada a finalidade maior que a sade e os
interesses sociais.
A produo de medicamentos tem por natureza destinar-se ao comrcio, cujas
aquisies so feitas tanto pelo setor pblico, quanto pelo setor privado. O setor pblico de
pases com grande disparidade social, como o caso do Brasil, faz com que o governo
necessite de elevados gastos com medicamentos para tratar tanto doenas simples
decorrentes da falta de saneamento bsico quanto doenas graves como medicaes para
o tratamento de cncer, visto que o direito sade est garantido conforme artigos 6 e
196 da Constituio Federal, e invocado por quem de fato necessita.
Entretanto o direito sade muitas vezes torna-se prejudicado com a proteo dada
a medicamentos (atravs das patentes) que inclusive j caram em domnio pblico (caso da
patente Pipeline), pois no permite a concorrncia na sua produo, elevando assim os
preos.
O Brasil preocupou-se em colocar na Lei n9279/96 uma proteo na forma de
patentes de medicamentos novos, como forma de estmulo pesquisa e desenvolvimento
de novos produtos, e tambm como forma de recuperar parte do investimento feito pela
Indstria para a comercializao destes novos produtos, visto que se trata de altos valores
investidos em pesquisas e desenvolvimento.
O objetivo principal do trabalho explorar a questo da inconstitucionalidade das
patentes Pipeline devido a sua natureza jurdica de revalidao e no como requisito de
concesso originria. Essas patentes Pipeline foram inseridas no ordenamento jurdico em
violao CF/88 em seu artigo 5, inciso XXIX, que trata do Principio da exclusividade sobre
o novo, o que gerou a ADIn 4234, pois faltaria o requisito da novidade absoluta necessrio
para a concesso de uma patente.
A patente Pipeline um dispositivo legal transitrio que permite o reconhecimento de
patente para produtos e processos, desde que no tenham sido colocados em nenhum
mercado do mundo. Este perodo de transio ocorre entre a revogao de uma antiga Lei e
o incio de vigncia de outra, nova, que preveja o reconhecimento de patentes em reas que
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a antiga no previa. O Brasil, em 1945, deixou de reconhecer patentes para produtos das
reas qumica, farmacutica e alimentcia e 24 anos mais tarde estendeu a proibio aos
processos farmacuticos, confirmada na Lei n5772 (Cdigo de Propriedade Industrial)
vigente at 14 de maio de 1997. Com a sano da Lei n9279, em 14 de maio de 1996, que
admitiu o patenteamento de produtos e processos farmacuticos, iniciou-se o perodo de
transio entre as Leis, no qual se aplicou o Pipeline. Portanto, em 14 de maio de 1997,
quando a Lei n9279 entrou em vigor, o pipeline perdeu a sua eficcia. O prazo de vigncia
desta patente transitria limitado no mximo em 20 anos.
O conhecimento que est em domnio pblico pode ser explorado de acordo com o
sistema da livre concorrncia o que pode gerar uma reduo nos custos e preos em
benefcio da sociedade.
Em razo a estes argumentos apresentados e outros que sero tratados no trabalho
verifica-se a importncia deste tema para a promoo da sade na sua forma mais ampla,
pois atualmente observa-se a grande demanda por medicamentos principalmente por uma
populao hipossuficiente de recursos que acaba requisitando ao setor pblico a satisfao
de suas necessidades.
2.DESENVOLVIMENTO:
2.1. A LEGISLAO SOBRE PATENTES NO CENRIO BRASILEIRO, O CONCEITO DO MECANISMO DE PROTEO APLICADO AOS PRODUTOS FARMACUTICOS E SEUS REQUISITOS.
No perodo de 1945 a 1969, o Brasil concedia patentes apenas para processos
farmacuticos e no para produtos. Com o advento do Cdigo de Propriedade Industrial de
1971, foi excludo qualquer tipo de proteo patentria de processos e produtos
farmacuticos, ficando assim um intervalo sem regulao na rea. A Lei n9279/96 uma
decorrncia de acordos internacionais assumidos pelo Brasil, como por exemplo, o Acordo
TRIPS (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights) e a Conveno de Paris.
A Lei n 9279/96 trouxe ento ao cenrio brasileiro a regulamentao das invenes
patenteveis, que desde ento pouco se falava. A nova Lei respeitando as regras de
Tratados e Convenes Internacionais que regulam o assunto prev a concesso de
patentes em todos os setores tecnolgicos, inclusive para produtos qumicos, alimentos e
frmacos que eram excludos da proteo patentria pelo Cdigo da Propriedade Industrial
de 1971 - Lei n5772/71. Dispe a Conveno de Paris:
As naes podem formular suas leis de patentes, desde que as regras bsicas sejam respeitadas. Cabe, ento, a cada nao o direito de disciplinar a concesso de patentes conforme seus interesses ou anseios socioeconmicos e at mesmo polticos. (DI BLASI, 2002. pag 35)
Inicialmente se faz necessrio analisar o conceito de patente, sua previso legal no
ordenamento jurdico brasileiro e o uso para produtos farmacuticos. Patente um conjunto
de regras destinadas a proteger as invenes. um direito concedido pelo Governo de uma
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nao a uma pessoa (fsica ou jurdica) que lhe confere exclusividade na explorao de sua
inveno, durante um determinado perodo, em todo territrio nacional. uma forma de
gratificar o inventor pelo seu esforo e investimentos na pesquisa e desenvolvimento de um
novo produto. Assim proporciona equilibrar os interesses do inventor pela sua criao e
permitir sociedade usufruir do benefcio da descoberta. Conceitua PICARELLI em sua
obra:
A patente ttulo de propriedade temporrio concedido pelo Estado, que confere aos inventores ou a empresas um direito exclusivo de explorao da inveno protegida. Ao inventor que oferece sociedade um produto ou um processo novo, reconhecido, mediante sua demanda, um direito privativo em troca da relao dos meios de sua inveno. (PICARELLI,2011.pag.39)
O desenvolvimento de novos produtos no seria possvel, ou ento eficiente se no
houvesse a proteo da propriedade industrial e a garantia de um retorno financeiro com o
monoplio de explorao permitido pela patente. Cada vez mais se torna necessrio o
desenvolvimento de produtos mais sofisticados e no caso dos medicamentos mais
eficientes, com menos efeitos colaterais, contra doenas que at ento no eram
conhecidas. O fenmeno mundial da globalizao permite o acesso informao,
atualidades, estudos de caso, matrias primas, tecnologia para um aprimoramento neste
setor de grande importncia, para proporcionar uma evoluo nos tratamentos de sade.
notrio o grande salto que houve na rea de sade quanto ao descobrimento de
medicamentos nas ltimas dcadas e isto se deve, em parte, ao retorno financeiro que os
laboratrios possuem com suas descobertas. Aparentemente esse direito antagnico de
promoo da sade X lucro das empresas importante para que se desenvolvam novos
produtos mais elaborados, mesmo sabendo que isto s ocorrer se houver uma
lucratividade considervel para a empresa que o produz.
O direito de propriedade e a proteo das invenes esto previstos na Constituio
Federal em seu artigo 5, incisos XXII e XXIX e dependem de regulamentao especial. A
Lei n9279/96 determina quais os requisitos para obteno de patente para um determinado
produto farmacutico. O primeiro requisito para a concesso de patente o carter de
novidade da inveno. Segundo o Tratado de Cooperao em Matria de Patentes, uma
inveno considerada nova se, data do correspondente depsito do pedido de patente,
no se encontrar compreendida pelo estado de tcnica. Este estado de tcnica tudo que
se tornou acessvel ao pblico, atravs de divulgao, publicao ou comercializao. No
Brasil, segundo a doutrina, aplica-se o princpio da novidade Absoluta, ou seja, produtos
patenteveis no podem ter entrado no estado de tcnica, conforme dispe o artigo n11 da
Lei 9279/96:
Art. 11. A inveno e o modelo de utilidade so considerados novos quando no compreendidos no estado da tcnica.
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1 O estado da tcnica constitudo por tudo aquilo tornado acessvel ao pblico antes da data de depsito do pedido de patente, por descrio escrita ou oral, por uso ou qualquer outro meio, no Brasil ou no exterior, ressalvado o disposto nos arts. 12, 16 e 17. 2 Para fins de aferio da novidade, o contedo completo de pedido depositado no Brasil, e ainda no publicado, ser considerado estado da tcnica a partir da data de depsito, ou da prioridade reivindicada, desde que venha a ser publicado, mesmo que subsequentemente. 3 O disposto no pargrafo anterior ser aplicado ao pedido internacional de patente depositado segundo tratado ou conveno em vigor no Brasil, desde que haja processamento nacional.
O segundo requisito para concesso de patente a atividade inventiva, ou seja,
refere-se capacidade de criao humana, que quando uma criao, para um tcnico no
assunto, no consequncia bvia do estado da tcnica, como determina o artigo 13 da
Lei n9279/96: A inveno dotada de atividade inventiva sempre que, para um tcnico no
assunto, no decorra de maneira evidente ou bvia do estado da tcnica.
O terceiro requisito para obteno da patente a utilizao industrial que est
relacionada ao fator econmico e a possibilidade de ser materializada, produzida inclusive
em escala industrial, como descrito no artigo 15 da Lei n9279/96:
Art.15: A inveno e o modelo de utilidade so considerados suscetveis de aplicao industrial quando possam ser utilizados ou produzidos em qualquer tipo de indstria.
Assim, podemos resumir que so patenteveis as invenes que atendam aos
requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicao industrial, conforme determina o
artigo 8 da Lei n9279/96.
Declarado aceito o pedido de patente a Constituio Federal de 1988 confere ao
titular do direito a explorao, a produo, a utilizao, a comercializao da inveno e os
lucros patrimoniais obtidos com a devida exclusividade, conforme descrito no artigo 5,
inciso XXIX:
Art.5, inciso XXIX: a lei assegurar aos autores de inventos industriais privilgio temporrio para sua utilizao, bem como proteo s criaes industriais, propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnolgico e econmico do Pas.
2.2. O CONCEITO DE PATENTE PIPELINE E SUA RELAO COM OS PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS DA NOVIDADE E O DIREITO SADE; ANLISE DOS ARTIGOS 230 E 231 DA LEI DE PROPRIEDADE INTELECTUAL E SUA POSSVEL INCONSTITUCIONALIDADE
Como houve uma transio entre o Cdigo de 1971 que no previa nenhuma
proteo patentria aos produtos farmacuticos e a Lei de 1996 que prev tais medidas
protetivas, esta ltima lei criou um mecanismo de transio, chamado Patente Pipeline.
Trata-se de regra transitria e excepcional, inserida no ordenamento por iniciativa exclusiva
do legislador interno, visto que no consta no acordo TRIPS que determina em seu artigo
70: no haver obrigao de restabelecer proteo da matria, que, na data de aplicao
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deste Acordo para o Membro em questo, tenha cado no domnio pblico. A Lei 9279/96,
que entrou em vigor em 14 de maio de 1996, estabeleceu o prazo de um ano, contado da
data da publicao, para a solicitao do privilgio pipeline, prazo este que se encerrou em
15 de maio de 1997. A proteo ter o prazo mximo de vigncia de 20 anos, como no
registro de pedido de patente originria.
O mecanismo de transio Pipeline gera controvrsias quanto a sua
constitucionalidade por ter uma possvel natureza jurdica de revalidao, patenteando
produtos que se encontram em domnio pblico, resultando na ADIn n4234. Assim
conceitua-se a patente pipeline como:
a denominao dada a um dispositivo legal transitrio que permite o reconhecimento de patente para produtos e processos, desde que estes mesmo que j pesquisados ou desenvolvidos no tenham sido colocados em nenhum mercado do mundo. Isto ocorre no perodo de transio, entre a revogao de uma antiga lei e o incio de vigncia de outra, nova, que preveja o reconhecimento de patentes em reas que a antiga no previa. (DI BLASI, 2002. Pag.159)
Este mecanismo tem como finalidade proporcionar a proteo para produtos e
processos, dos inventores nacionais e estrangeiros, de criao j divulgada, mas
anteriormente no patentevel.
A patente Pipeline est prevista no artigo 230 da Lei n 9279/96 que assim dispe:
Art.230: Poder ser depositado pedido de patente relativo s substncias, matrias ou produtos obtidos por meios ou processos qumicos e as substncias, matrias, misturas ou produtos alimentcios, qumico-farmacuticos e medicamentos de qualquer espcie, bem como os respectivos processos de obteno ou modificao, por quem tenha proteo garantida em tratado ou conveno em vigor no Brasil, ficando assegurada a data do primeiro depsito no exterior, desde que seu objeto no tenha sido colocado em qualquer mercado, por iniciativa direta do titular ou por terceiro com seu consentimento, nem tenham sido realizados, por terceiros, no Pas, srios e efetivos preparativos para a explorao do objeto do pedido ou da patente.
O referido artigo busca a proteo das substncias descritas no Brasil, de acordo
com a data do primeiro depsito no exterior, desde que o objeto da descoberta no tenha
sido colocado em qualquer mercado. Trata-se de uma forma de revalidao de patentes
concedidas no exterior, e como no havia previso legal na Lei anterior, estas substancias
no eram protegidas no territrio brasileiro, sendo assim muitos pedidos de patentes de
substancias farmacuticas foram depositados no estrangeiro, observados os requisitos
impostos no territrio de origem.
Dispe tambm sobre o assunto o artigo 231 da Lei n 9279/96:
Art.231: Poder ser depositado pedido de patente relativo s matrias de que trata o artigo anterior, por nacional ou pessoa domiciliada no Pas, ficando assegurada a data de divulgao do invento, desde que seu objeto no tenha sido colocado em qualquer mercado, por iniciativa direta do titular ou por terceiro com seu consentimento, nem tenham sido realizados, por terceiros, no Pas, srios e efetivos preparativos para a explorao do objeto do pedido.
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Com a leitura deste artigo verifica-se que um dos principais problemas levantados
em relao patente Pipeline quanto ao requisito da novidade absoluta, previsto na
mesma Lei 9279/96 em seu artigo 8, que assim dispe: patentevel a inveno que
atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicao industrial. J foi visto que
para a concesso da patente indispensvel que se trate de um produto novo e a se
encontra um dos motivos da inconstitucionalidade, uma vez que a natureza jurdica da
patente Pipeline de revalidao de algo que j se encontra no domnio pblico, logo no
h motivos para se criar um monoplio de tecnologias de produo. A patente Pipeline tem
carter de revalidao porque est vinculado ao primeiro depsito do invento no pas de
origem. No h o carter da novidade absoluta aplicado na legislao brasileira, pois se a
tecnologia para a qual se pede a proteo j entrou no estado da tcnica em qualquer lugar,
no se pode falar em privilgio e exclusividade de direitos.
Este monoplio considerado ilegtimo afetou principalmente a indstria farmacutica
e como leciona o Procurador Geral da Repblica Antonio Fernando Souza:
A pretexto de incentivar a pesquisa cientfica acabou-se por tornar patentevel e, portanto, sob controle monopolstico de algumas indstrias farmacuticas, a produo de determinados medicamentos que se encontravam em escala de produo de mercado por diversas fontes dentro da poltica econmico-social de oferta de genricos e de produtos medicamentosos a preos mais acessveis populao mais carente.
Este monoplio tem influencia direta nos preos, pois a ausncia de concorrncia
gera aumento considervel de preos que repassado ao consumidor, prejudicando assim
o direito sade e o interesse social.
2.3 A SITUAO DA ADIN N 4234 E OS ARGUMENTOS LEVANTADOS PELOS INTERESSADOS
A Procuradoria Geral da Repblica ajuizou a Ao Direta de Inconstitucionalidade
ADIn 4234 no Superior Tribunal Federal, em 24 de Abril de 2009, contra os artigos 230 e
231 da Lei n 9279/96, que tratam da regulamentao das patentes Pipeline. O debate foi
iniciado a partir da solicitao feita pela FENAFAR (Federao Nacional dos
Farmacuticos), pela REBRIP (Rede Brasileira pela Integrao dos Povos) e ABIA (Agncia
Brasileira Interdisciplinar de AIDS) junto Procuradoria Geral da Unio.
Vrios so os motivos levantados de inconstitucionalidade das patentes pipeline e
questionados na ADIn 4234, como violao ao princpio da novidade absoluta, do direito
sade, do interesse pblico, interesse social, do devido processo legal, funo social da
propriedade, princpio da isonomia, entre outros.
Os artigos 230 e 231 da Lei n 9279/96 em questo permitem a revalidao de
patentes de produtos que j se encontram em domnio pblico, mas que anteriormente no
eram protegidos, em detrimento direto ao princpio da novidade. Alm disso, a patente
Pipeline permite que as indstrias ingressem com o pedido de reconhecimento de patentes
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de produtos estrangeiros sem anlise tcnica e anuncia prvia da ANVISA (Agncia
Nacional de Vigilncia Sanitria) como exigido para o registro de produtos nacionais, ou
seja, para os produtos estrangeiros so aceitos os requisitos para concesso de patente do
pas de origem. Este tratamento de pedido de patente diferenciado entre nacional e
estrangeiro afronta o Princpio da Isonomia.
Outro argumento analisado que as patentes Pipeline no constam nos Acordos
Internacionais, ou seja, foram inseridas no ordenamento jurdico brasileiro por iniciativa do
legislador interno, levando em conta interesses de particulares, em detrimento ao interesse
pblico violando assim o princpio da primazia do interesse pblico.
Como pode observar-se a patente Pipeline possui natureza jurdica de revalidao e
no de concesso de patente originria, visto que est vinculada ao primeiro depsito do
invento no pas de origem e por isto no deve seguir as mesmas regras aplicadas a
concesso de patentes de produtos novos. Desta forma verifica-se que se no h o requisito
da novidade, no h que se falar em exclusividade na produo destes medicamentos, e
isto seria de grande interesse da populao brasileira, pois vrios remdios poderiam custar
at 50% menos se fossem permitidos os genricos destes produtos protegidos.
Desde a data de incio da questo, at hoje, a ADIn 4234 no foi julgada, pois est
em questo interesses polticos que dificultam a celeridade do julgamento. Ao todo foram
realizados 1.182 pedidos de patentes Pipeline, incluindo medicamentos importantes para
sade pblica, como os usados no tratamento da AIDS, cncer, sade mental, entre outros
(Pedro VILLARDI, 2010). Alguns medicamentos usados para o tratamento de leucemia e
AIDS, por exemplo, esto com monoplio de produo em funo da patente Pipeline. A
decretao de inconstitucionalidade destes artigos ter reflexo direto no preo de muitos
medicamentos uma vez que ser possvel a livre concorrncia favorecendo o acesso a
medicamentos mais baratos, diminuindo consideravelmente os gastos com medicamentos
custeados pelo poder pblico e pela populao em geral. De acordo com a Federao
Nacional dos Farmacuticos (FENAFAR):
Um parecer de economistas que integrou o pedido para ajuizamento da ADI diz que, especificamente no caso de cinco medicamentos utilizados no combate ao vrus da Aids, o Brasil gastou a mais US$ 420 milhes (em comparao com os preos mnimos da Organizao Mundial de Sade - OMS), entre 2001 e 2007.
Porm, h argumentos de uma corrente contrria a decretao da
inconstitucionalidade onde alegam que a Lei n9279/96 e a Constituio Federal de 1988
no fazem meno expressa para a necessidade do requisito da novidade Absoluta, que
esta foi fruto de entendimentos doutrinrios. Os que defendem este mecanismo, como por
exemplo, o constitucionalista CANOTILHO, em sua obra sobre o assunto, alega que a
patente pipeline uma forma de corrigir uma omisso da antiga Lei de 1971 compensando
assim os inventores, pelas suas criaes. Como o Cdigo de 1971 anterior a Constituio
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de 1988, para esta corrente, no h como cogitar que as invenes, anteriores a 1996,
teriam cado em domnio pblico e a necessidade da novidade absoluta, pois no havia
legislao determinando estes requisitos e a prpria Constituio Federal de 1988, no faz
referncia novidade absoluta, sendo objeto de Lei infraconstitucional.
3. METODOLOGIA:
Ser usado na pesquisa o mtodo de abordagem Dialtico, partindo da anlise da
Lei de Propriedade Industrial n9279/96 e dos princpios da novidade e o direito sade.
Verifica-se um conflito na interpretao dos artigos 230 e 231 da LPI e os requisitos para a
concesso de uma proteo pelo mecanismo de patente.
4.CONCLUSO:
O estudo mostrou que um dos aspectos controvertidos levantados pela ADIn 4234
quanto ao requisito da novidade absoluta que no considerado, nas j estudadas patentes
Pipeline.Note-se que muitos interesses econmicos e polticos esto envolvidos nesta briga
judicial entre os rgos que desejam a extino dos artigos 230 e 231 da Lei 9279/96 e os
que defendem a continuao e aplicao destes dispositivos legais. Controvrsias a parte
deve-se optar pela posio que melhor represente a populao em geral, o bem estar social
e a aplicao dos princpios constitucionais do direito sade e a primazia do interesse
pblico, aqui representado pelo acesso aos medicamentos.
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