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2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO SÉCULO XXI 1. A nova gerência pública (Derry Ormond & Elke Löffler) – RSP, abr- jun/1999 ........................................................................................... 02 a 32 2. Desafios da administração pública brasileira: governança, autonomia, neutralidade (Maria das Graças Rua) – RSP, set-dez/1997 ........... 33 a 52 3. O impacto do modelo gerencial na Administração Pública: um breve estudo sobre a experiência internacional recente (Fernando Luiz Abrucio) – ENAP, 1997 ................................................................... 53 a 101 4. A reforma do Estado e a concepção francesa do serviço público (Jacques Chevallier) – RSP, set-dez/1996 .................................. 102 a 125 5. A reforma administrativa francesa (Valdei Araújo) ENAP, 1997............................................................................................... 126 a 149 6. A reforma administrativa da Nova Zelândia nos anos 80-90: controle estratégico, eficiência gerencial e accountability (Wagner Carvalho) – RSP, set-dez/1997 ....................................................................... 150 a 180 7. Fortalecer o serviço público e valorizar a cidadania: a opção australiana (Adriana de Sá Mesquita & Sílvia Pereira Ferreira) – RSP, set- dez/1997 ....................................................................................... 181 a 206 8. Reforma administrativa: o caso do Reino Unido (Marcelo Ernandez Macedo & Andréa Moraes Alves) – RSP, set-dez/1997............... 207 a 228 9. Reforma do setor público e participação sindical: o caso do sistema de pensão italiano (Lucio Baccaro & Richard M. Locke) – RSP, mai- ago/1997 ...................................................................................... 229 a 259 10. Metodologia para medir a satisfação do usuário no Canadá: desfazendo mitos e redesenhando roteiros (Geoff Dinsdale & D. Brian Marson & Faye Schmidt & Teresa Stuckland) – ENAP/00........... 260 a 400 11. Clinton e a reinvenção do governo federal: o National Performance Review (Flávio da Cunha Rezende) – RSP, jan-mar/1998.......... 401 a 448 12. Novos padrões gerenciais no setor público: medidas do governo americano (Bianor Scelza Cavalcanti & Roberto Bevilacqua Otero) – ENAP, 1997 ................................................................................... 449 a 480

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2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO SÉCULO XXI

1. A nova gerência pública (Derry Ormond & Elke Löffler) – RSP, abr-jun/1999 ........................................................................................... 02 a 32

2. Desafios da administração pública brasileira: governança, autonomia, neutralidade (Maria das Graças Rua) – RSP, set-dez/1997 ........... 33 a 52

3. O impacto do modelo gerencial na Administração Pública: um breve estudo sobre a experiência internacional recente (Fernando Luiz Abrucio) – ENAP, 1997 ................................................................... 53 a 101 4. A reforma do Estado e a concepção francesa do serviço público (Jacques Chevallier) – RSP, set-dez/1996 .................................. 102 a 125 5. A reforma administrativa francesa (Valdei Araújo) – ENAP, 1997............................................................................................... 126 a 149 6. A reforma administrativa da Nova Zelândia nos anos 80-90: controle estratégico, eficiência gerencial e accountability (Wagner Carvalho) – RSP, set-dez/1997 ....................................................................... 150 a 180 7. Fortalecer o serviço público e valorizar a cidadania: a opção australiana (Adriana de Sá Mesquita & Sílvia Pereira Ferreira) – RSP, set-dez/1997 ....................................................................................... 181 a 206 8. Reforma administrativa: o caso do Reino Unido (Marcelo Ernandez Macedo & Andréa Moraes Alves) – RSP, set-dez/1997............... 207 a 228 9. Reforma do setor público e participação sindical: o caso do sistema de pensão italiano (Lucio Baccaro & Richard M. Locke) – RSP, mai-ago/1997 ...................................................................................... 229 a 259 10. Metodologia para medir a satisfação do usuário no Canadá: desfazendo mitos e redesenhando roteiros (Geoff Dinsdale & D. Brian Marson & Faye Schmidt & Teresa Stuckland) – ENAP/00........... 260 a 400 11. Clinton e a reinvenção do governo federal: o National Performance Review (Flávio da Cunha Rezende) – RSP, jan-mar/1998.......... 401 a 448 12. Novos padrões gerenciais no setor público: medidas do governo americano (Bianor Scelza Cavalcanti & Roberto Bevilacqua Otero) – ENAP, 1997 ................................................................................... 449 a 480

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RSP

Revista doServiçoPúblico

Ano 50Número 2Abr-Jun 1999

A nova gerênciapública1

Derry Ormond e Elke Löffler

1. Introdução

O termo nova gerência pública (New Public Management— NPM) é freqüentemente utilizado em muitos dos países-membro daOCDE, bem como no resto do mundo. O termo parece descrever umatendência global em direção a um certo tipo de reforma administrativa,mas rapidamente se faz evidente — especialmente em conferênciasinternacionais — que assume diversos significados em diferentes contextosadministrativos, inclusive na comunidade acadêmica, onde ainda não sechegou a um acordo sobre o que significa o paradigma da nova gerênciapública. Em todo caso, o termo é também relativamente equivocadoporque seus elementos não são tão novos, razão pela qual tem sido acu-sado de vender “vinho velho em garrafas novas”. Exceto nos EstadosUnidos, a gerência pública não foi um termo utilizado até os anos 80.Outrossim, as reformas na gerência pública estão avançando medianteuma ampla variedade de formas e em diversos contextos envolvendopreocupações e necessidades nacionais completamente diferentes. Oprocesso de transformação dos países da Europa Central e Oriental éjustamente um exemplo.

Ainda que não se possa dizer a priori o que é a nova gerênciapública, cabe assinalar que ela tem contribuído para a elaboração de umavisão mais econômica e gerencial da administração governamental. AOCDE/PUMA (ver Anexo 1) esteve entre as primeiras organizaçõesque tentaram introduzir um conceito mais amplo de gerência pública, espe-cificamente vinculado às necessidades de microreforma e ajuste estrutu-ral, nos anos 80. A necessidade dessa abordagem abrangente pode ser

Derry Ormondtrabalhou naOrganizaçãopara aCooperação eDesenvolvimentoEconômico(OCDE) de1962 a 1998,na área degerênciapública, o queoriginou acriação doPublicManagementCommittee(PUMA).Elke Löfflertrabalha naOCDE, desde1997, noServiço deGerênciaPública

Traduzido porRené Loncan

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RSPexplicada pelo conjunto de desafios globais confrontados pelos países eque continuam sendo amplamente válidos no presente:

• limitações fiscais ao crescimento do setor público versus a infini-dade de demandas efetivadas por cidadãos mais educados;

• busca intensiva de formas mais efetivas para a implementaçãode políticas públicas;

• manejo da incorporação a um mundo de interdependência acele-rada e de dinâmica imprevisível;

• pressão crescente de grupos empresariais e da indústria a fim depromover um setor público mais direcionado aos negócios, aos investi-mentos e ao fornecimento eficiente de serviços;

• mudança de valores que questionam a administração pública tan-to do interior quanto do exterior da mesma;

• mudanças tecnológicas, especialmente em relação ao potencialpara a difusão da informação;

• mudanças nos perfis sócio-demográficos, especialmente com oenvelhecimento das populações.

Estas pressões têm colocado em questão não apenas as estruturasadministrativas e a tomada de decisões políticas estabelecidas, mas tambéma forma de pensar acerca da administração pública e do serviço civil, e decomo a mudança se faz possível.

Uma onda de reformas da gerência pública tem tido lugar em todosos países-membro da OCDE, freqüentemente inspiradas e alimentadas pelochamado paradigma da nova gerência pública. Por isso é legítimo abordara questão sobre o que aproveitar e o que abandonar desse paradigma.

Como uma introdução, este documento apresenta algumas obser-vações sobre a experiência prática do PUMA e a interação com os paí-ses-membro da OCDE, ao invés de discutir a nova gerência pública emqualquer classe de constructo formal.

O que se pretende sustentar com este documento é o seguinte:1) Estamos procurando identificar uma gerência pública que se

adapte às necessidade atuais e que seja capaz de manejar os problemasdo futuro. Isso inclui a capacidade para gerenciar efetivamente as orga-nizações públicas e conceber, orientar, implementar e avaliar as refor-mas. Em outras palavras, coincidindo com o ponto de vista que percebe osetor público como uma organização que aprende, que deveria melhorarconstantemente, ao invés de procurar implementar um modelo particularde gerência pública — ainda que receba o nome de nova gerência públi-ca, reinvenção, reengenharia, gerência de qualidade total, new steeringmodel ou qualquer outra denominação.

2) Não existem modelos pré-estabelecidos; a mudança deveenraizar-se na configuração específica da história, das tradições e estru-turas constitucionais e legais, nas forças político-administrativas, nas

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RSPperspectivas econômicas e sociais e na posição internacional do país. Poroutra parte, não existe solução única para o setor público como um todo.Diferentes partes da administração pública podem requerer diferentessistemas de gerência pública, dependendo, por exemplo, de se tratar dofornecimento de um serviço de natureza redistributiva ou uma tarefa ver-dadeiramente autônoma.

3) A maioria dos elementos da nova gerência pública não são,realmente, novos no sentido de que inúmeros países implementaram nopassado alguns destes elementos, de fato com outras denominações. Porexemplo, o estabelecimento de uma ampla variedade de agências na admi-nistração estatal alemã nos anos 70, por um lado tem sido interpretado àluz da tradição neocorporativa alemã e por outro como reação ao cresci-mento do setor público. O que é novo em relação à NPM é que o concei-to global tem evoluído a partir de um movimento orientado para a prática,que teve início de forma independente em vários países. Igualmente, adisponibilidade da tecnologia moderna da informação nos permite agoraproduzir e analisar a classe de dados referentes ao desempenho que esta-va faltando nas reformas administrativas anteriores.

4) Os países que têm adotado um enfoque mais gradual no que serefere à NPM, agora se confrontam com um problema de estruturas duaisno setor público: ilhas de reforma com orientação fazem a NPM coexistircom organizações públicas gerenciadas de forma tradicional. Esta situaçãogera tensões no processo de reformas, como resultado de estruturas deincentivo em conflito, e em alguns casos inclusive, chega a questionar o quetem sido obtido até o momento. Por exemplo, as reformas baseadas naNPM em nível municipal não podem concretizar o potencial pleno do au-mento da eficiência, se a supervisão municipal e o sistema intergovernamentalde subsídios não permitirem uma determinada flexibilidade gerencial, o quepode desta forma sustentar argumentos oponentes à NPM.

5) Existem também importantes desafios concernentes à gestãode governo, que não estão, necessariamente, incluídos no debate sobre aNPM, alguns dos quais podem ter sido exagerados pelas reformas járealizadas, como por exemplo:

• a permanência de tomada de decisões efetivas do governo centralem um contexto de devolução e globalização;

• gerência da ética no governo:• educação e responsabilidade cívica na sociedade;• novas relações com a sociedade civil e o setor privado;• as relações em processo de transformação entre o Executivo e o

Legislativo;6) Dessa forma, o que devemos deixar para trás são noções presas

a dogmas, modelos e preconceitos da antiga e da nova administração

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RSPpública. O modelo de uma nova gerência pública nunca existirá na reali-dade, assim como a administração pública weberiana nunca existiu emsua forma ideal.

7) Devemos manter um conjunto equilibrado de valores da gerên-cia pública. A gerência pública não deveria referir-se somente a promoçãode valores econômicos. A tarefa que temos adiante é a de dar maiorênfase aos produtos e resultados efetivos, de acordo com os princípioslegais e políticos da administração pública. O peso dado a estas diferentesracionalidades e suas relações será diferente de um país a outro, depen-dendo de sua tradição de governo e seus marcos políticos e legais.

2. A abrangência danova gerência pública

Devido a ambigüidade do termo, se faz necessário explicitar a classede elementos que estão incluídos dentro do rótulo de NPM. Temos duasclasses de conceitos fundamentais relativos à nova gerência pública.

Primeiro, um conceito restrito percebe a nova gerência pública comosendo a união de duas correntes de idéias diferentes (Hood, 1991:5). Umadelas decorre da nova economia institucional, que discute novos princí-pios administrativos, tais como contestabilidade, a escolha do usuário, atransparência e uma focalização estreita nas estruturas de incentivos.A segunda corrente deriva da aplicação dos princípios gerenciais do setorempresarial privado ao setor público.

Em termos práticos, essa concepção restrita da NPM implica numaênfase da gerência de contratos, na introdução de mecanismos de mer-cado no setor público e na vinculação estabelecida entre o pagamento e odesempenho. A NPM pode, dentro dessa definição restrita, equiparar-secom numerosas reformas da gerência pública realizadas na Nova Zelândia,e em menor escala na Dinamarca e no Reino Unido.

Grande parte das críticas que se fazem à NPM dizem respeito asua relação com um paradigma claramente simplista, centrado exclusiva-mente na eficiência. Embora seja verdade que numerosos comentaristasadmitem que essa versão da NPM pode funcionar em múltiplas situaçõesnos países mencionados, eles têm dúvidas sobre a possibilidade de queessa versão da NPM possa ser transferida a outros países (ver, por exem-plo, Kickert, 1997). Apesar dessa classe de filosofia da NPM, com umaclara ênfase nos mercados e na privatização, que não poderia ser transfe-rível como um regime de governo, existem, porém, numerosos instrumentosque podem ter importância para outros países. Por exemplo, ainda queprovavelmente, o mecanismo primário de governo da Espanha, comomotivador, esteja apoiado na descentralização e na devolução mais do

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RSPque na competência de mercado e na privatização, alguns elementos dotipo mercado têm sido introduzidos em setores específicos de políticas,especialmente em nível regional (OCDE, 1997a: 327-338). As Comuni-dades Autônomas de Catalunha e de Galícia agora passam recibos aospacientes dos hospitais. A competência entre hospitais começa a se esta-belecer. As medidas do desempenho estão proliferando nas políticas desaúde e de educação, sendo ambas também responsabilidades regionais.Os governos locais também realizam experimentos com mecanismos dotipo mercado, tal como acontece na inovadora Administração Metropo-litana de Bilbao, que introduziu a cobrança aos usuários no departamentode bombeiros (para mais detalhes, ver OCDE, 1998).

Segundo, um ponto de vista mais amplo sobre a NPM adotaria umenfoque mais pragmático, não percebendo-a desde uma perspectiva filosó-fica, senão como uma resposta racional a algumas das pressões enfren-tadas pelos governos. Considerando que devido à globalização as pressõessão semelhantes em todos os países, caberia esperar que as respostas com-partilhassem certas características e como conseqüência, sejam, em algu-ma medida, convergentes. Porém dever-se-ia enfatizar (e talvez nãotenhamos insistido nisso claramente no nosso trabalho no PUMA) queconvergência não quer dizer uniformidade. Inclusive se as questões dareforma são convergentes, isso não implica que a implementação da NPMseja a mesma em todos os países. As diferenças entre um país e outropodem ser consideradas como o resultado de interesses políticos e de ideo-logias subjacentes à NPM (Pollitt, 1990), de dificuldades na operacionalizaçãode princípios bastante abstratos tais como a transparência, de diferençasnos sistemas políticos e administrativos e na forma de adaptá-los, assimcomo de histórias obviamente diferentes. Uma comparação das pesquisasanuais por países realizada pelo PUMA ilustra como esses fatores podemgerar dinâmicas de reforma completamente diferentes nos países-membroda OCDE em matéria de velocidade, orientação e abrangência dasreformas (OCDE, 1997b); ver também a página web do PUMA(http://www.oecd.org/puma/country).

De toda forma, é possível distinguir um certo número de traços-chave das reformas da gerência pública nos países-membro da OCDE.O documento Governance in Transition (OCDE, 1995:28) identifica osseguintes temas comuns à reforma, formulados para se chegar a adminis-trações direcionadas para resultados:

• devolver autoridade, outorgar flexibilidade;• garantir o desempenho, o controle e a responsabilidade;• desenvolver a competência e a escolha;• fornecer serviços adequados e agradáveis aos cidadãos;• melhorar a gestão dos recursos humanos;

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RSP• explorar a tecnologia da informação;• melhorar a qualidade da regulamentação;• fortalecer as funções de governo no centro.Essa ampla definição não impõe um modelo apto para todas as

circunstâncias e faz com que os princípios da NPM possam ser transfe-ríveis. Enquanto não existir um enfoque melhor, cada governo direcionadoà reforma deverá considerar em que grau e como esses traços-chavepodem ser incorporados no seus sistemas de gerência pública. Isso poderiaimplicar em reformas radicais seletivas da gerência pública ou reformasadicionais, com adaptações progressivas dependentes do marco institucio-nal de cada país. Em alguns países, talvez não seja necessária a implemen-tação de reformas com relação a determinados temas, porque já foramrealizadas anteriormente (com uma denominação diferente) ou porque jáexistem estruturas equivalentes, tais como as agências na Suécia ou algunsórgãos semi-autônomos na França.

Essa definição ampla e não prescritiva da nova gerência públicapermite identificar e avaliar diversos tipos de estratégias e caminhos paraa reforma, ao mesmo tempo em que se reconhecem alguns princípiosconvergentes. Fazendo com que as práticas e experiências da novagerência pública sejam transparentes, os governos têm a oportunidade deescolher entre diversas alternativas e de tomar decisões bem informadassobre os instrumentos de políticas.

3. Alguns aspectos danova gerência pública

3.1. Devolução de autoridade

Em numerosos países existe um claro consenso em torno de ummodelo centralizado de fornecimento de serviços que já não satisfaz asnecessidades e as condições da gerência pública. Os esforços de reformatêm se centrado na devolução de autoridade no interior das agências públi-cas e/ou ministérios/departamentos e agências executoras, e/ou entreo governo central e os escalões inferiores de governo, o mercado e oterceiro setor. O processo de devolução tem se orientado pela premissade que a flexibilidade gerencial é um pré-requisito, ou pelo menos umamedida complementar, para a consolidação fiscal a longo prazo. Essaposição baseia-se, no mínimo, em três conjuntos de argumentos clássicos:em primeiro lugar, para muitos serviços, a devolução resultaria potencial-mente num aumento da capacidade de resposta às demandas cidadãs;em segundo lugar, as vantagens no nível da informação aumentam aeficiência administrativa; e em terceiro lugar, a inovação se vê facilitadaem nível local. No entanto, a devolução deve também ser comparada em

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RSPrelação às economias de escala na produção de serviços públicos, aoscustos potenciais dos efeitos da difusão entre diversas jurisdições e aosefeitos da competência governamental e da migração.

A devolução de funções públicas criou uma nova dimensão qualita-tiva e atualizou o antigo debate entre centralização e descentralização. Osambientes transformados colocam, novamente, a questão básica do fede-ralismo fiscal: que distribuição de funções e responsabilidades satisfaz me-lhor as necessidades de subsídios e corresponde, razoavelmente, àdistribuição dos recursos fiscais? A nova questão (da gerência pública) dizrespeito aos mecanismos apropriados para implementar os deslocamentosdas funções públicas em direção a níveis inferiores de governo. Tradicio-nalmente, na maioria das federações européias as constituições exigemque uma parte substancial das leis federais sejam administradas pelosEstados. Esse tipo de descentralização administrativa encontra-se tambémsendo processada em outros países-membro da OCDE, onde os governosnacionais têm transferido numerosas funções em níveis subnacionais degoverno. Uma ferramenta primordial para essa devolução é o manejo demecanismos que conferem, aos níveis subnacionais de governo, novos espa-ços para a implementação de programas intergovernamentais. Essesnovos espaços suscitam preocupação sobre a extensão e a certeza da apre-sentação de contas por resultados. As emergentes “associações para odesempenho” (performance partnerships) entre diversos níveis de governoprometem ser um instrumento de transformação das relações, altamenteproblemáticas, com as agências, em acordos contratuais que reduzem osseus custos e permitem o aumento da eficiência, podendo concretizar-se apartir da descentralização administrativa. Essa idéia básica é ilustrada nosetor do mercado de trabalho canadense, onde o governo desse paísredesenhou as responsabilidades federais e provinciais (CanadaEmployment Insurance Commission, 1997: 19-26). A parte II daEmployment Insurance Act (EI) permite que as províncias e territóriosdesenhem e executem os seus próprios programas de emprego apoiadospor fundos do EI, mediante acordos de associação com o Ministério deDesenvolvimento de Recursos Humanos. Os governos provinciais ou terri-toriais que preferirem não assumir a responsabilidade plena pelo desenhoe execução das medidas e benefícios relativos ao emprego ativo, nos ter-mos da parte II da Lei, podem, alternativamente, optar pela formalizaçãode acordos de co-gestão. Os acordos negociados até o presente refletemambas modalidades.

3.2. Orçamento

No caso da elaboração do orçamento, a flexibilidade pode serintroduzida em diversas etapas do ciclo orçamentário. O processo deformulação do orçamento depende em grande parte da estruturação da

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RSPLei Orçamentária e do nível de detalhamento com que o Legislativo exer-ce o controle das despesas. Existem duas tendências principais que vi-sam outorgar maior flexibilidade, que podem ser identificadas nesta fase:em primeiro lugar, os países-membro da OCDE afastam-se cada vezmais do enfoque clássico, que parte da base em direção ao vértice para aformulação do orçamento, promovendo agora um exercício que parte dovértice e dirige-se à base (top-down), onde o Conselho de Ministros es-tabelece tetos fixos para o total dos gastos governamentais que deveriaser alocado a cada ministério. Esse novo processo promove o controle dogoverno sobre as despesas consolidadas e facilita a realocação de recur-sos. Em segundo lugar, em alguns dos países-membro, os Parlamentosnão discutem as alocações individuais senão a direção e as tendênciasgerais das despesas do governo. Por exemplo, na Suécia, o Parlamentodeve aprovar primeiro a divisão da despesa consolidada em 27 áreas dedespesas, antes de aprovar as alocações individuais.

No que diz respeito à implementação do orçamento, cabe distinguirdiferentes níveis de flexibilidade para as transferências. O menor grau deflexibilidade corresponde, obviamente, ao caso no qual as transferênciasnão estão permitidas em absoluto. Uma maior flexibilidade é possibilitadapelas estruturas institucionais nas quais as transferências são, via de regra,permitidas para determinadas categorias de despesas, tais como as de ope-ração e investimento. Alguns países-membro têm combinado todas asalocações para as operações das oganizações de governo dentro de ummontante total para cada organização. Por exemplo, na Suécia as agênciasrecebem atualmente uma única alocação de recursos para o financiamentode todos seus custos correntes, sem restrições na atribuição de insumos.

Uma segunda opção de transferências diz respeito à redistribuiçãode recursos entre anos fiscais. Não há flexibilidade alguma quando asalocações não utilizadas devem ser devolvidas ao centro no final do anofiscal. As disposições legais que permitem adiar a execução de todasas despesas até um certo limite especificado fazem possível essaflexibilidade gerencial.

Até que ponto os países-membro da OCDE fizeram uso das diver-sas opções para flexibilizar o orçamento em nível central de governo?Recente pesquisa realizada entre os altos funcionários do orçamento(PUMA, 1998) sugere a existência de marcadas diferenças entre os paí-ses-membro da OCDE no que concerne ao número de itens de alocaçãoe em nível de detalhamento do controle parlamentar do orçamento.A flexibilidade nas transferências existe, na maioria dos casos, para ascontas de despesas correntes, e em menor grau para os custos de progra-mas. A maioria dos estados-membro da OCDE permite um certo grau derealocação dos recursos entre anos fiscais. Essa breve resenha da devolu-ção da autoridade orçamentária por parte dos governos centrais demonstra

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RSPque todos os estados-membro da OCDE têm flexibilizado seus processosorçamentários, ainda que em graus variáveis. Em muitos estados-membro,nos quais as reformas da gerência pública têm adotado, em grande medida,a forma de um enfoque a partir da base em direção ao vértice, a devoluçãoda autoridade orçamentária tem tido uma influência maior nos níveis infe-riores do governo do que nos níveis centrais.

O monitoramento estatístico inicial do impacto da devolução daautoridade orçamentária sobre o desempenho fiscal sugere que flexibi-lidade gerencial tem uma influência considerável no sucesso do esforçode estabilização, entendido como a redução do déficit e da dívida a médioprazo, após a iniciação do esforço de consolidação. Isso tem sido plena-mente verificado no caso do sistema orçamentário sueco, onde o processode formulação do orçamento tem experimentado mudanças fundamentaisno decurso dos últimos quatro anos, em resposta à convicção das auto-ridades de que o processo orçamentário em si mesmo tinha contribuído,significativamente, para o estado de deterioração do equilíbrio orçamen-tário naquele país.

Caberia esperar que os efeitos fiscais positivos da flexibilidade orça-mentária sejam ainda maiores no caso em que os países venham tambéma redefinir as relações entre as instâncias centrais e agências operativas.Um estudo do PUMA sobre a implementação da flexibilidade orçamen-tária em cinco países membros da OCDE — Austrália, França, NovaZelândia, Suécia e o Reino Unido — destaca que à exceção da Suécia,todos os países têm enfrentado dificuldades para traçar uma clara linhadivisória entre as responsabilidades das instituições centrais e as agên-cias operativas (OCDE, 1997c:14).

3.3. Gerência de pessoal

De maneira similar à flexibilidade do orçamento, a devolução deautoridade na gerência de pessoal envolve também várias escolhas emtermos dos elementos e graus de flexibilização. Tem se dado uma grandeatenção à determinação do pagamento mas as flexibilidades da gerênciade pessoal podem implicar, igualmente, muitos outros elementos, (OCDE,1996a:17-22), tais como:

• sistemas de classificação de cargos;• mobilidade;• termos dos processos de recrutamento/emprego;• acordos trabalhistas.A flexibilidade no pagamento é uma área complexa per se. O PUMA

tem desenvolvido uma escala de avaliação que permite comparar as dife-rentes dimensões da flexibilidade no pagamento (OCDE, 1997d:101):1) nível de negociação sobre o pagamento; 2) gerência descentralizada

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RSPda folha de pagamento; 3) nível de flexibilidade dos ajustes anuais dafolha de pagamento definida no nível central; 4) nível de flexibilidade nacomparação do pagamento individual.

À exceção de Nova Zelândia e Reino Unido, que têm atingido umelevado grau de descentralização, os outros países da OCDE têm adotadouma abordagem mais limitada em relação a flexibilidade do pagamento.Porém, em todos os países-membro o papel desempenhado pela agênciacentral de pessoal continua sendo importante. Inclusive nos países ondeforam implementadas mudanças abrangentes no sistema de pagamentono setor público (como por exemplo Nova Zelândia e Austrália), persistea necessidade de acompanhamento e de garantir padrões comuns de éticano conjunto do serviço público.

A devolução de autoridade na gestão de pessoal tem trazido bene-fícios indiscutíveis. Os órgãos centrais de gerência de pessoal informamque se tem verificado aumento da eficiência e da efetividade geral e sefacilita a inovação (OCDE, 1995: 56). Essa apreciação confirma-se pelaanálise empírica. Em particular, ficou demonstrado que a flexibilidade,tanto na determinação da composição do staff como na negociação edeterminação dos salários individuais, contribuiu para minimizar as taxasde crescimento do pagamento de salários (OCDE, 1997d:106).

No entanto, em todos os países que têm devolvido a gerência depessoal, o equilíbrio entre o controle e a flexibilidade continua sendo instável.Numerosos governos têm procurado assegurar-se de que retêm o con-trole sobre o montante geral das despesas públicas em matéria de remu-nerações, ainda que o detalhamento esteja sujeito a certas variações locais.Os sistemas centralizados para a determinação do pagamento no setorpúblico encontram-se, freqüentemente, associados com a idéia de queeles facilitam mais o controle dos custos trabalhistas do que os sistemasde determinação do pagamento mais descentralizados.

Outrossim, existem preocupações relativas ao equilíbrio entre per-mitir que os departamentos e agências desenvolvam suas próprias práticasde gerência de pessoal e manter um certo grau de unidade e um conjuntocomum de valores em todo o serviço público. Algumas tentativas, que vi-sam fortalecer uma perspectiva coletiva, se refletem nos acordos centra-lizados para a designação e a gerência de funcionário civis do alto escalãoe nos esforços realizados em alguns países para desenvolver a capacidadedos órgãos centrais em matéria de planejamento estratégico e políticas derecursos humanos em todos os serviços. O debate que gira em torno dadefinição dos aspectos essenciais e dos elementos comuns que deveriamser mantidos no serviço público, bem como qual o grau desejável de devo-lução está longe de ter sido resolvido e continuará sendo uma questãochave na gerência pública nos próximos anos.

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RSP3.4. Mecanismos tipo mercado

A aplicação dos chamados mecanismos tipo mercado (MTM) nosetor público tem sido objeto de uma atenção considerável. Novamente,isso não implica uniformidade, uma vez que “o conceito de MTM abrangetodos os arranjos nos quais está presente, pelo menos, uma das caracte-rísticas significativas dos mercados — competência, fixação de preços,tomada de decisões dispersa, incentivos monetários etc.” (OCDE 1993:11).Fica evidente, que essa definição exclui os dois casos opostos do tradici-onal fornecimento público e da privatização total. Tomando-se em consi-deração a diversidade de MTMs é impossível discuti-los como um conjuntohomogêneo, motivo pelo qual discutem-se aqui três classes de MTM: acontratação externa, a cobrança ao usuário, e os vouchers.

3.4.1. Contratação externa

A contratação externa diz respeito à situação em que o setor públicoadquire, no setor privado, algo que tradicionalmente havia produzidointernamente. Quando se permite que as operações internas participemtambém como licitações, fala-se de market testing.

O incentivo que está implícito na contratação externa é simples.Estudos internacionais têm demonstrado, de forma consistente, que é pos-sível obter uma poupança sustentável de aproximadamente 20% contra-tando-se atividades externamente, enquanto são preservados ou melhoradosos níveis de qualidade do serviço, tal como aparece na tabela a seguir:

Poupança de custos por contratação externa (em porcentagem)

Estados Unidos 20%

Reino Unido 20%

Austrália 15-20%

Suécia 9-25%

Islândia 20-25%

Dinamarca 5-30%

Fonte: PUMA (1998b:70).

As práticas de contratação externa variam amplamente entre osestados-membro da OCDE. Não obstante, parece existir um amplo acordoem torno de que serviços de apoio tais como manutenção e limpeza, ofornecimento de alimentos e a impressão gráfica, entre outros, sejam candi-datos apropriados para a contratação externa. Os países-membro quecontam com uma forte tradição de contratação externa, tais como a Austrá-lia, Nova Zelândia, Reino Unido, Estados Unidos e os países nórdicos

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RSP(Dinamarca, Islândia), foram além da contratação externa de serviços deapoio, em áreas que poderiam ser consideradas inerentemente governa-mentais há pouco tempo atrás. Exemplos disso incluem os serviços debombeiros nos Estados Unidos, os serviços carcerários no Reino Unido,serviços para os desempregados na Austrália, lares para tratamento deindivíduos com problemas comportamentais na Islândia, funções doescritório nacional de auditoria na Nova Zelândia (muitos desses casossão revisados numa recente publicação do PUMA: 1997a, ContractingOut Government Services). O PUMA publicou, recentemente, um PolicyBrief com as melhores diretrizes práticas para a contratação de serviçosgovernamentais, destacando os fatores-chave para uma contrataçãoexterna de sucesso.

3.4.2. Cobrança ao usuário

Os países estão financiando, cada vez mais, os serviços governa-mentais mediante a cobrança ao usuário. O objetivo de cobrar do usuárionão é apenas conseguir recuperar os custos, senão também fazer comque os serviços governamentais sejam mais eficazes e eficientes. Isso seconsegue através da visibilidade clara de custos e benefícios dos serviçosoferecidos aos usuários pelos fornecedores, impondo disciplina no que dizrespeito às demandas ao mesmo tempo em que promove a tomada deconsciência sobre os custos e a orientação oferecida. Mas ainda, acobrança ao usuário oferece um marco para o desenvolvimento dos mer-cados e da concorrência.

Um exemplo clássico dos benefícios acarretados pela cobrança aousuário é o do Australian Bureau of Statistics. Quando começaram acobrar por suas publicações, registrou-se uma súbita queda da demanda,indicando que a relação dos que recebiam, gratuitamente, as publicaçõespelo correio continha um grande número de pessoas que realmente nãoqueria a publicação. O mais interessante foi que entre os que manifesta-ram seu desejo de assinar a publicação, vários assinalaram que o fariamsomente no caso em que o formato e os conteúdos fossem modificadosde maneira determinada, para satisfazer suas exigências. Esse caso exem-plifica a margem de benefícios que pode ser obtida a partir da cobrançaao usuário — aumento da receita, aumento da apropriação por parte dousuário, melhores produtos.

O PUMA elaborou algumas diretrizes para melhorar as práticasem matéria de cobrança ao usuário, assinalando os riscos que devem serlevados em consideração no momento de criar um sistema desse tipo(OCDE, 1998:7-11). As diretrizes esclarecem que a cobrança ao usuárioconstitui um exigente MTM, dado que para a sua otimização se faz

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RSPnecessário um sistema de apresentação de contas progressivo, uma boamedição do desempenho e flexibilidade gerencial da organização públicapara estabelecer e adaptar a cobrança.

3.4.3. Vouchers

Em contraste com os MTMs considerados anteriormente, a intro-dução de esquemas de vouchers ou quase-vouchers tem se desenvol-vido muito pouco com relação à discussão teórica de suas vantagens elimitações. Os vouchers podem ser definidos como regimes nos quais osindivíduos recebem (mediante um pagamento ou por alocação) a titularidadede um bem ou um serviço que podem “fazer efetivo” mediante um determi-nado conjunto de fornecedores, quando eles o descontam em efetivo ouem formas equivalentes por parte de um órgão financiador (Cave,1998: 3). Tradicionalmente, os vouchers têm assumido a forma de recibosde papel autorizando uma pessoa nomeada para receber um serviço espe-cífico, a partir de uma relação de fornecedores designados. As caracterís-ticas básicas dos vouchers são sua não-transferibilidade entreconsumidores e sua falta de flexibilidade comparada com o dinheiro efetivo.

As principais vantagens atribuídas aos vouchers são sua capaci-dade de melhorar a eficiência dos custos, induzindo processos concorrentesentre fornecedores. O segundo objetivo é a melhoria da eficiência daalocação, mediante a ampliação do leque de escolhas do consumidor. Emterceiro lugar, os vouchers para serviços públicos também oferecem avantagem, para o governo, de orientar o consumo e redistribuir a renda.

Embora os vouchers não tenham sido implementados em grandeescala, eles têm suscitado um considerável interesse, particularmente comorecurso para prover serviços fundamentais tais como educação, atendi-mento a crianças e anciãos bem como moradia. Os estudos sobre a utiliza-ção dos vouchers em programas de moradia para os pobres nos EstadosUnidos e a introdução de quase-vouchers em casas de atendimento deenfermaria no Reino Unido, pesquisaram, em particular, as dificuldades deimplementação e os benefícios que tinham sido discutidos superficialmentena prática, tais como a concorrência imperfeita para promover a demandalatente, o marco de regulamentação, etc. (ver OCDE, 1993: 43-53).

Os resultados desses estudos de caso demonstraram que osvouchers levavam a um rápido ajuste no fornecimento, implicavam baixoscustos administrativos e ofereciam uma correspondência satisfatória entreas preferências dos receptores e os serviços obtidos, sempre que houvessemercados verdadeiramente competitivos, de fácil acesso, pequena margempara a apropriação de benefícios por parte de outros que não fossem ossupostos receptores bem como informação acessível. No entanto, osvouchers, por si sós, não podem compensar a incerteza na previsão dasapropriações, e portanto, os custos poderiam continuar sendo incontroláveis.

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RSPEm síntese, no que diz respeito aos mecanismos tipo mercado,vários países têm dado uma ênfase especial aos MTMs visando geraraumento de eficiência e melhoria do desempenho do setor público.Os MTMs têm sido, geralmente, reconhecidos como propiciadores designificativos ganhos de eficiência, em um período de tempo relativa-mente pequeno.

3.4.4. Contratação por desempenho

Com a devolução de autoridade e a criação de mercados internosno seio do setor público, o conceito clássico de responsabilidade, baseadonas hierarquias e no controle dos insumos e dos processos, deixou de serapropriado. Uma abordagem tem tentado esclarecer e formalizar as rela-ções entre indivíduos, organizações e níveis administrativos do setorpúblico por meio dos chamados contrato por desempenho. Esta classe dequase-contrato é um acordo mútuo entre duas partes do setor público,nos quais uma parte (o principal ou o comprador) especifica um nível derecursos que é dado à outra parte (o vendedor ou agente) bem como otipo, quantidade e qualidade do desempenho a ser produzido em um de-terminado período de tempo. Os contratos por desempenho não necessa-riamente determinam o uso dos recursos e dos processos. No entanto,eles oferecem a um setor público mais descentralizado um marco deresponsabilidade potencialmente diferente. Em todos os casos em queexiste devolução, existe também um espaço e uma necessidade potencialpara os contratos por desempenho: entidade superior e empregado, uni-dades de serviço de apoio e unidades administrativas centrais, entre orga-nizações do setor público na esfera do Executivo e o Parlamento bemcomo entre diversos níveis de governo.

Os contratos por desempenho podem apresentar-se sob diferentesformas, dependendo da estrutura da administração pública, do marco legale do desenvolvimento da medição de desempenho em um país. Um projetodo PUMA em andamento, relativo à contratação por desempenho,examina o uso específico e os conteúdos dessa modalidade de contrataçãoem vários países (para maiores informações, ver http://www.oecd.org/puma/mgmtres/pac/performcon.htm). Estudos de caso em nove paísespermitiram realizar algumas observações preliminares relacionadas comsuas práticas e seus resultados. Os contratos por desempenho entre minis-térios/departamentos e agências têm sido freqüentes enquanto que osacordos contratuais, que incluem diferentes níveis de governo, consti-tuem um fenômeno ainda emergente.

Em grandes linhas, os contratos por desempenho podem ser consi-derados como uma ferramenta útil para promover uma gerência dirigidaa resultados e à avaliação no setor público. Os contratos por desempenho

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RSPobrigam a todas as partes envolvidas a especificar metas de desempenho,a revisá-las e, o que é mais importante, a estabelecer um diálogo entre elas.Em vários países está acontecendo um debate sobre se os contratos dedesempenho legais que não geram obrigações poderiam e deveriam se trans-formar em contratos por desempenho legais geradores de obrigações.O risco é, no entanto, que a possível solução judicial dos conflitos resultasseem custos de transação mais elevados. Outra questão controvertida é se aimplementação dos contratos por desempenho entre duas partes (quefreqüentemente se colocam numa relação vertical) introduz uma novahierarquização no setor público, que em última estância levaria a uma maior(e indesejável) fragmentação. A presente tendência a estabelecer maisassociações no setor público pareceria assinalar uma virada na direção deuma coordenação melhorada ou de uma produção conjunta por meio dedeterminados tipos de contrato por desempenho horizontais.

4. Alguns problemas transversais

A introdução de princípios econômicos e gerenciais ( do setor pri-vado) no setor público não somente modifica as organizações do setorpúblico envolvidas, mas também muda em profundidade a natureza doEstado como um todo. A nova situação representada pelos contratos eagências gera alguns problemas transversais referentes às relações nointerior do Estado, mas que vão além na medida em que as relações entreo Estado, o mercado e a sociedade estão envolvidas. Por outro lado, osnegociadores, freqüentemente, desconsideram a dimensão temporal dasreformas da gerência pública. Isso significa não apenas que os problemasde implementação sejam subestimados. Freqüentemente, pode-se verificara existência de um conhecimento inadequado sobre as diferentes etapasdo processo de reforma, bem como da demanda por ele apresentada desoluções diferentes e de mudança das aptidões gerenciais. Muitas dasimplicações de longo prazo das reformas organizacionais e gerenciais sóse tornam visíveis na atualidade. Em todo caso, fica evidente, para todosos países que implementaram elementos da nova gerência pública, quenão há um caminho de volta em direção às antigas formas do Estado e daadministração pública. O estudo de alguns dos principais problemas trans-versais demonstra que a nova gerência pública é muito mais exigente doque poderia sugerir uma olhada superficial aos princípios de gerência.

4.1. Responsabilidade (accountability)

A questão mais discutida da nova gerência pública, sem dúvida, é aimplicação para as relações de responsabilidade (accountability) entre os

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RSPgerentes públicos e os empregados, os ministérios e os órgãos autônomos ouagências, entre a administração pública e as autoridades políticas, a adminis-tração pública e os cidadãos, o Legislativo e o poder Executivo do governo, eentre os setores público e privado para o fornecimento de serviços.

A responsabilidade mantém uma relação estreita com a nova gerên-cia pública, já que seu crescimento tem sido um dos objetivos explícitosde todas as reformas administrativas. O ponto de vista estritamente ins-trumental da responsabilidade por parte da nova gerência pública— que se centra nos resultados — promoverá mecanismos de responsa-bilidade atentos aos objetivos da ação pública (Martin, 1997). Os mecanis-mos de responsabilidade correspondentes serão compatíveis com as idéiasbásicas da gerência de desempenho, que inclui a tarefa de estabelecerexpectativas do desempenho, o registro da informação confiável a respeitodo que foi alcançado, a necessidade de avaliar se as expectativas préviasforam satisfeitas, e a necessidade de oferecer retroalimentação sobre odesempenho alcançado, mantendo a responsabilidade por meio de incen-tivos positivos ou de sanções negativas.

Os dilemas emergem do fato de que a responsabilidade poderiatambém ser considerada como uma finalidade em si mesma. Esse é ocaso, especificamente, de países com Leis Administrativas, nos quais ofuncionamento da administração pública baseia-se em princípios e proce-dimentos democraticamente legitimados, centrados mais nos insumos doque nos resultados. Essas duas posições podem não ser inerentementeincompatíveis, na medida em que a responsabilidade baseada nos insumosé capaz de melhorar quando se soma a ela o interesse com relação aosresultados. Não obstante, a ênfase colocada nos meios em oposição àênfase colocada no objetivo, também estabelece limites à devolução daautoridade. Duas classes de conseqüências podem decorrer dessa situa-ção: a nova gerência pública poderia ter de realizar transações entre aeficiência e outros valores do setor público tais como a eqüidade, ou podeser que a plena realização da nova gerência pública exija mudanças maisamplas no marco legal e institucional de alguns países.

A área cinza entre a responsabilidade gerencial e a responsabilida-de política continua sendo, particularmente, problemática. No Reino Unido,em particular, há um permanente debate a respeito da responsabilidadeministerial em oposição à responsabilidade pública dos funcionários. En-quanto alguns comentaristas argumentam que o aumento da transparênciado comportamento dos funcionários fortalece os princípios de responsabi-lidade política (Martin, 1997:4), outros afirmam que a disponibilidade deinformação sobre o desempenho tem fortalecido a responsabilidadegerencial, mas simultaneamente, tem enfraquecido a responsabilidadepolítica (Pollit, Birchall & Putnam, 1998:26).

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RSPUma observação relevante nesse contexto é que “a reforma dagerência do serviço público não tem sido geralmente acompanhada deníveis significativos de reforma política” (Walsh, 1995:221). Os debatespolíticos continuam centrados nos insumos mais do que nos resultados enos produtos, e a gerência por desempenho não está, suficientemente,integrada no processo orçamentário.

4.2. Ética

As reformas na gerência pública têm afetado também a gerênciado comportamento ético de várias maneiras. Os críticos da nova gerênciapública fazem predições de aumento da corrupção no novo “Estado decontratos e de agências”, que outorga mais liberdade às organizações dosetor público e aos empregados do setor, individualmente considerados.Outra linha de crítica afirma que a nova gerência pública promove unila-teralmente, valores econômicos em detrimento de outros valores tais comoo bem comum. Esses argumentos baseiam-se em percepções individuais,quando não em preconceitos, mais do que nos fatos. Certamente, há pou-cos estudos empíricos, se é que os há, que comparam o comportamentoético antes e depois da implementação de reformas significativas na ge-rência pública.

Não obstante, é evidente que tais reformas têm questionado osvalores tradicionais do setor público. Um olhar mais atento às implica-ções da nova gerência pública em relação à gerência ética identifica,nesta área, os problemas abaixo (OCDE, 1996b:19-26):

• As reformas incluíram mudanças no status das organizaçõesdo setor público em conseqüência da corporatização ou semiprivatização.Isso coloca a pergunta de em que medida as corporações públicas eorganizações similares tendem a se encaixar dentro das mesmas diretrizeséticas e comportamentais que o centro do setor público.

• As reformas levaram ao desenvolvimento de novas formas deorganizações no setor público, tais como os órgãos (semi) autônomos.Estas novas agências, freqüentemente, têm utilizado sua liberdade gerencialpara definir seus próprios parâmetros éticos. Essa tendência tem sidoreforçada pelo incremento do recrutamento no setor privado, geralmentepara os cargos de gerência ou para posições de liderança. Como conse-qüência, coloca-se a questão da possível ruptura da coerência do ethosanterior do serviço público e da sua possível e progressiva fragmentação.

• O aumento da liberdade gerencial no seio das organizações públi-cas aumentou também as oportunidades para a configuração de um com-portamento irregular. O comportamento irregular não é um problema éticoquando ele reflete mais uma inovação do que um desvio de conduta. Oaumento da liberdade de ação, porém, passa a se constituir num problema

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RSPético quando os sistemas de informação gerencial e as estruturas de respon-sabilidade não avançam no mesmo ritmo que a devolução de autoridade.Conseqüentemente, a devolução exige o estabelecimento de uma novainfra-estrutura ética.

• As reformas tenderam a dissipar a fronteira entre o setor públicoe o setor privado. O aumento do intercâmbio entre os setores público eprivado coloca novos e numerosos dilemas que devem ser assumidos emnível político. Por exemplo: a concorrência de mercado entre organiza-ções dos setores público e privado implica que o setor público tambémtem direito a revelar informações aos cidadãos no caso da existência deefeitos negativos para a concorrência?

A necessidade de uma conduta ética no serviço público tem sidoorientada pela globalização e intensificação do comércio internacional. Pararesponder a estes desafios, os países da OCDE desenvolveram doze prin-cípios, orientando os países a revisar as instituições, os sistemas e osmecanismos de que dispõem para promover a ética no serviço público (verAnexo 2). Essa relação criada para a gerência da ética foi adotada comouma recomendação da OCDE em abril de 1998. Ela cria o marco adequa-do para a revisão das experiências nacionais, visando a promoção de umaprendizado recíproco no campo da gerência e da ética no serviço público.

4.3 Eleição de políticas einstrumentos de políticas

Os problemas de responsabilidade, bem como os dilemas nãoresolvidos em questão de ética, colocam e revelam o fato de que as refor-mas da gerência pública envolvem a interação de processos políticos,organizações, políticas públicas e instrumentos de políticas.

Uma eleição mais racional dos instrumentos de políticas requeruma nova infra-estrutura institucional e capacidades gerenciais da partedos políticos eleitos. Por exemplo, na Suécia, a revisão nacional do pro-cesso central de orçamento evidenciou que a expansão dos níveis deassessoria parlamentares ou a criação de um escritório de orçamentoindependente e responsável, junto ao Parlamento, ajudaria os políticoseleitos a dispor de mais informações relativas ao desempenho do PoderExecutivo e a fazer melhor uso dessa informação.

Uma pesquisa da OCDE sobre o papel do Legislativo no processoorçamentário revela que em todos os países da OCDE, os corpos políticoseleitos do nível central, freqüentemente, não se ajustaram às novas reali-dades na administração pública. As estruturas parlamentares, orçamen-tárias e regulamentadoras, bem como o controle parlamentar, continuamsem mudanças em grande parte, embora cada vez mais sejam percebidos

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RSPcomo inadequados pelos parlamentares. Atualmente, observam-se qua-tro tipos de tendências:

1) mais declarações agregadas de políticas fiscais junto ao Legis-lativo, onde os níveis consolidados de rendas governamentais, despesas,déficit e dívidas são propostos de maneira geral;

2) aumento do papel dos comitês, incluindo uma divisão maisacentuada de responsabilidades entre o comitê orçamentário e os comi-tês setoriais;

3) melhorias nos relatórios apresentados ao Legislativo, podendoincluir um leque de medidas que a abrangem desde a simples atualizaçãodo formato da documentação orçamentária até a introdução de mudan-ças fundamentais no seu conteúdo;

4) mais recursos para o Legislativo através da promoção do staffnão-político dos comitês, estabelecendo escritórios para dar assistênciaaos parlamentares e aumentando os fundos dos partidos políticos, com afinalidade de propiciar um grau mais elevado de conhecimento em maté-ria orçamentária.

Da parte do Poder Executivo, os instrumentos tradicionais depolíticas estão, geralmente, ligados às instituições ou ao contexto cultu-ral das áreas particulares das políticas públicas. Por exemplo, umaagência responsável pelo controle da poluição da saúde pública poderiaconsiderar que a substituição de um instrumento como os incentivoseconômicos por uma regulamentação direta seria difícil de ser aceita,ou sequer ser considerada objetivamente, em função da incerteza dosresultados e da percepção de perda de poder. Um estudo do PUMAsobre a escolha dos instrumentos de política desenvolveu um marcogeral identificando e reunindo 22 instrumentos segundo as classes derecursos utilizados. Esses instrumentos agrupam-se nas cinco catego-rias abaixo (PUMA, 1997b:3):

• financiados pela despesa nacional direta do orçamento nacional;• custos orçamentários indiretos ou intermitentes;• disposições impositivas especiais para alcançar objetivos

programáticos;• créditos e seguros;• controle público não financiado ou influência da atividade privada.O marco sugere que os instrumentos de política podem ser anali-

sados em termos de eficiência, efetividade, eqüidade, custos, intrusividadee responsabilidade (PUMA, 1997:3). Isso pode ser percebido como umtipo de ferramenta capaz de avaliar os custos e os benefícios de instru-mentos específicos que fazem parte de reformas, em andamento oufuturas, da gerência pública.

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RSP5. Preocupações persistentes

A NPM não é, em absoluto, um conceito simples. A decisão doslíderes políticos ou administrativos de introduzi-la no setor público envolveopções difíceis tais como que classes de elementos escolher dentro domenu da NPM e como combinar esses elementos. Como foi demonstra-do na discussão de alguns problemas transversais, a introdução da NPMleva também a uma série de problemas de segunda ordem que devem serenfrentados.

5.1. Pré-requisitos para aintrodução da NPM

Na medida em que esses problemas aparecem, há uma maiorconscientização da parte dos países de que a NPM não apenas requeruma concepção consistente da reforma, senão também uma bem funda-mentada gestão da mudança em todos os níveis e em todas as etapas doprocesso da reforma. Os obstáculos que vários países, incluindo aquelespioneiros, têm enfrentado ao implementar as reformas, coloca tambémuma questão fundamental relativa à aplicabilidade geral das mesmas. Emespecial, a experiência dos países da Europa Central e Oriental (CEEC)indica que devem cumprir-se algumas condições prévias para ser capazde implementar com sucesso alguns conceitos da gerência moderna. Senão se conta com estruturas e sistemas fundamentais, é pouco provávelque a NPM seja a resposta adequada.

Por exemplo, oito anos depois do início da transição à democracia,a administração pública na CEEC continua enfrentando uma série deproblemas estruturais. Um projeto europeu de pesquisa identificou quatroproblemas principais na Bulgária, Hungria e Eslováquia (ver Erheijen,1996: 8f; Erheijen, 1997:207-219):

• fragmentação vertical e horizontal, conduzindo a ineficiência e àduplicação, bem como a atrasos no desenvolvimento e na implementaçãodas políticas;

• alta rotação entre os funcionários dos primeiros escalõesdo serviço civil, resultando num elevado nível de instabilidade da adminis-tração pública;

• falta de capacidade para a elaboração das políticas agravadapelo alto nível de rotação entre os servidores públicos de maior hierarquiae a ausência de indução e de facilidades para o treinamento em serviço;

• debilidade dos sistemas de responsabilidade, em função da faltade instituições básicas, tais como os escritórios de auditoria.

Devido aos problemas estruturais dos países que fazem parteda CEEC, é inevitável ter dúvidas a respeito da viabilidade de algumasreformas no sentido da NPM. A fragmentação da administração num

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RSPdeterminado número de unidades menores direcionadas a tarefas, prova-velmente agravará os problemas de coordenação já existentes. Cabeesperar, também, que a liberalização das condições de emprego, no estadoatual do serviço civil desses países, levem ao aumento da politização,promovendo conseqüentemente a instabilidade, ao invés de reduzi-la. Aintrodução da NPM poderia, inclusive, incrementar o nível de corrupção,se não se elaboram mecanismos transparentes para a nomeação dos chefesexecutivos das agências. Em termos gerais, a experiência demonstra quea aplicação integral da NPM em sistemas de administração imaturos nãoé desejável em função da ausência de resultados positivos e também dosurgimento de disfunções provocadas por tais reformas. O potencial au-mento de eficiência que se poderia alcançar, mediante a adoção das re-formas da NPM, certamente seria superado pelos custos resultantes dosproblemas de coordenação e do aumento da instabilidade.

5.2. Gerenciando o processo de reforma

À primeira vista, muitas reformas com a orientação da NPM pare-cem sugerir que o progresso normal de uma reforma da gerência públicasegue um padrão racional, com uma primeira etapa de natureza conceituale um subseqüente processo de implementação. Esse padrão simples dereformas administrativas baseia-se na idéia de que existe uma única formaótima de se chegar aos objetivos, que toda a informação necessária sobreestratégias e instrumentos está disponível, que não existem riscos envolvi-dos e que os objetivos originais da reforma permanecem imutáveis no tempo.

No decurso da primeira onda de reformas nos anos 80, ficou evi-denciado que as reformas direcionadas à NPM seguem diversos rumos,impulsionadas pela pressão de uma informação incompleta; e face à in-certeza a respeito das condições para atingir os objetivos, implicamassumir riscos e complicam-se pela modificação dos objetivos, por partedos participantes envolvidos.

A decisão em favor de uma ou outra estratégia de reforma baseia-se, geralmente, em alguns pressupostos relativos a sua superioridade emcomparação com outras estratégias de reforma. Um país, por exemplo,pode necessitar escolher entre limitar, inicialmente, as reformasdirecionadas à NPM, a determinados setores da administração pública, eum enfoque de reforma global desde o início. Envolvido nesta escolhaestá o enfoque de precaução, que permite aprender fazendo, e um enfoqueradical que evita atrasos na implementação e implica em incerteza e ris-cos aumentados. Em geral, os agentes de mudança possuem escassainformação sobre as diversas conseqüências práticas vinculadas com asdecisões adotadas e com os respectivos fatores de sucesso.

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RSPEssa falta de informação envolve, automaticamente, um certoincremento do risco. Certamente, há esquemas disponíveis que conside-ram que o risco-médio de fracasso nas inovações organizacionais nosetor privado chegam a 70-80%. Há motivos para pensar que o riscomédio de fracasso é menor no setor público? Os problemas de imple-mentação que vários países têm enfrentado ao longo do processo dereforma administrativa demonstram a existência de poucas razões paraser otimista. Ao mesmo tempo, o exagero subjetivo do risco, que freqüen-temente surge em etapas críticas do processo de reforma, tem comoconseqüência o debilitamento das reformas. Por conseguinte, é impor-tante para o sucesso da reforma da gerência pública que se desenvolvauma estratégia de manejo do risco, desde o início do processo, e se coloqueem andamento mecanismos de monitoramento e avaliação das reformas.

6. Conclusões

Após uma década e meia de reformas direcionadas à NPM emalguns países-membro da OCDE, existem muitos indicadores sobre o queaproveitar e o que abandonar desse enfoque. O debate ideológico realiza-do tem percebido a NPM como uma finalidade em si mesma, que defineum estado desejável da administração pública em termos de estrutura,funcionamento e resultados. No entanto, a evolução da NPM demonstraque ela deve ser compreendida e utilizada como um conjunto de princípi-os capazes de constituir as bases para a solução de alguns problemasespecíficos, em determinados setores da administração pública, sendo osmesmos implementados adequadamente.

Este ponto de vista sobre a NPM origina as seguintes sugestões:1) Os países deveriam adotar um enfoque pragmático para as refor-

mas da administração pública, ao invés de seguir dogmas ou modas nessecampo. A implementação da NPM em vários países tem demonstradoque, primeiramente, deve-se levar em consideração as circunstâncias na-cionais e locais, bem como a diversidade organizacional dentro de cadapaís. Um determinado conceito relativo à reforma poderia funcionar emum determinado setor de políticas mas não necessariamente em outro,uma vez que as estruturas e as culturas organizacionais são diferentes.

2) Existe a necessidade de identificar e de definir, claramente, unspoucos objetivos de reforma, que deverão estabelecer-se após uma cui-dadosa análise dos problemas enfrentados pela administração pública.Num segundo momento, deverão ser exploradas as possíveis alternativas,que serão avaliadas em termos de custos e benefícios.

3) É essencial incluir a dimensão humana no processo de reforma.Uma das razões clássicas pela qual numerosas reformas da gerência

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RSPpública fracassaram no passado foi a falta de informação às pessoassobre a direção da mudança, a fim de que elas pudessem contribuir como processo e apoiá-lo adequadamente, quando as críticas aumentaram.

4) Ao se fazer a opção pela reforma, é preciso examinar se secumprem os pré-requisitos necessários a uma implementação de sucesso.Por exemplo, antes do lançamento de uma política de contratação externa,deve-se ter a certeza de que existe um setor privado em funcionamento,de que os sistemas de responsabilidade funcionam bem e de que existecapacidade para gerenciar um contrato.

5) As capacidades de adaptação e de aprendizado devem existirno setor público. O estabelecimento de mecanismos de aprendizagemtais como as avaliações regulares, as pesquisas de opinião de cidadãos eempregados não constituem apenas um fator de sucesso para manejartoda a classe de processo de reforma da gerência pública, mas tambémsão um incentivo para que os líderes políticos olhem além das reformasem andamento e demonstrem ter capacidade de resposta diante dosdesafios do futuro.

No presente período de intensas mudanças e de turbulência poten-cial, cada país terá que se perguntar quais são os desafios em relação aoseu próprio bom governo. A nova gerência pública pode ser utilizada comoveículo para aproximar-se de algumas das respostas e para acessar outrosproblemas que exigem ser enfrentados.

Notas

1 Versão corrigida do documento apresentado no III Congresso Internacional do CLADsobre a Reforma do Estado e da Administração Pública, realizado em Madrid, Espanha,de 14 a 17 de outubro de 1998. Os pontos de vista expressos neste documento perten-cem aos autores e não, necessariamente, representam os da OCDE nem os do seu Serviçode Gerência Pública. O presente artigo foi publicado na Revista del CLAD, Reforma yDemocracia, n.13, febrero/1999.

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RSPAnexo 1

OCDE/PUMA

O Comitê de Gerência Pública (PUMA) da OCDE, depois de tersido o primeiro nesse campo, tem se transformado em um fórumintergovernamental de vanguarda em relação aos problemas do governo,da gerência e da reforma do setor público, bem como da modernizaçãoadministrativa. É amplamente utilizado pelos 29 governos-membro da OCDE,e é cada vez mais utilizado mundialmente, como fonte original de informa-ção autorizada. Em 1996, realizou um simpósio para ministros.

Atualmente, as atividades do Comitê estão relacionadas com: políticaspúblicas e processos decisórios; regulamentação efetiva; gerência orça-mentária e financeira; problemas de desempenho; recursos humanos; éticano serviço público; pagamentos no setor público; interação com os cida-dãos e a sociedade civil; e relações entre os diferentes níveis de governo.

O Serviço PUMA fornece ao Comitê informação, análises e avalia-ção; promove intercâmbios de experiências entre altos funcionários gover-namentais; e prepara relatórios e diretrizes para responsáveis pela elaboraçãodas políticas. Ao proporcionar comentários bem informados solicitados porum país em particular, pode desempenhar um papel fundamental de apoioaos esforços nacionais para a reforma. A informação comparativa de-senvolvida oferece um ponto de referência a partir do qual os países podemavaliar como se localizam em relação a outros membros da OCDE, forne-cendo, assim, ferramentas para a mudança.

O PUMA também trabalhou com a Europa Central e Oriental pormeio do SIGMA (Support for Improvement in Governance andManagement). Trata-se de uma iniciativa conjunta do Centro para a Coo-peração com Não-Membros (CCNM) e do Programa PHARE da UniãoEuropéia, financiado fundamentalmente por PHARE. SIGMA apóia osesforços de reforma da administração pública em 13 países em transição.

Desde 1990, o PUMA tem publicado mais de 6 relatórios sobregerência pública. Mais informações podem ser obtidas no site:www.oecd.org/puma.

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RSPAnexo 2

Princípios para gerenciar aética no serviço público

Texto da Recomendação da OCDE 1998

Prefácio

1) A observação de uma conduta impecável no serviço públicopassou a ser uma exigência crítica para os governos dos países-membroda OCDE. Os valores tradicionais do serviço público têm sido questionadospelas reformas da gerência pública que implicam numa maior atribuiçãode responsabilidades e de discricionariedade aos servidores públicos, pe-las pressões orçamentárias e pelas novas formas de fornecimento deserviços públicos. A globalização e os avanços no desenvolvimento dasrelações econômicas internacionais, incluindo o comércio e o investimen-to, exigem parâmetros de conduta no serviço público capazes de suscitarum amplo reconhecimento. A prevenção dos desvios de conduta é tãocomplexa como o fenômeno do desvio de conduta em si mesmo, sendonecessário contar com um leque de mecanismos integrados para alcan-çar o sucesso nesta área, incluindo sistemas bem fundamentados paragerenciar a ética. A crescente preocupação em torno do declínio da con-fiança no governo e da corrupção, levou os governos a reverem suasposições em relação ao comportamento ético.

2) Em respostas aos desafios anteriormente mencionados, os paísesda OCDE desenvolveram um conjunto de princípios expostos a seguir.Os doze princípios foram estabelecidos visando ajudar os países a revisaras instituições, os sistemas e os mecanismos de que dispõem para promovera ética no serviço público. São identificadas as funções de orientação,gerência ou controle em relação às quais podem ser comparados os siste-mas de gerência da ética. Esses princípios condensam a experiência dospaíses da OCDE, e refletem pontos de vista compartilhados em relação auma gerência da ética bem fundamentada. Os países-membro encontra-ram suas próprias formas de equilibrar aspirações e concepções, visandoconcretizar um marco efetivo adequado as suas próprias circunstâncias.

3) Os princípios podem ser utilizados pela gerência em níveisnacionais e subnacionais de governo. Os líderes políticos podem utilizá-lospara revisar os regimes de gerência da ética e avaliar em que medida amesma é operacionalizada nas dependências governamentais. Os princípios

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RSPpretendem ser um instrumento que os países adaptaram às suas condiçõesnacionais. Eles não são suficientes em si mesmos, mas deveriam ser vistoscomo uma forma de integração da gerência da ética no contexto mais am-plo da gerência pública.

Princípios para a gerência daética no serviço público

1) Os parâmetros éticos para o serviço público deveriam ser claros.Os servidores públicos necessitam conhecer os princípios básicos

e os parâmetros que se espera que eles apliquem em seus trabalhose onde se encontram os limites de um comportamento aceitável. Umadeclaração concisa, bem divulgada dos parâmetros de ética essenciaise dos princípios que orientam o serviço público, por exemplo, na formade um código de conduta, pode cumprir essa diretriz, criando um consen-so compartilhado nas dependências governamentais e no seio da comu-nidade em geral.

2) Os parâmetros éticos deveriam estar refletidos num marco legal.O marco legal é a base para a comunicação dos parâmetros míni-

mos e dos princípios de comportamento para todos os servidores públicos.As leis e os regulamentos deveriam estabelecer os valores fundamentaisdo serviço público e oferecer um marco de referência para a orientação,a pesquisa, a ação disciplinar e a efetivação dessa ação.

3) A orientação ética deveria estar à disposição dos servidorespúblicos.

A socialização profissional deveria contribuir para o desenvolvi-mento dos conceitos e das aptidões, capacitando os servidores públicos aaplicar princípios éticos em circunstâncias concretas. O treinamento pro-picia a conscientização desde o ponto de vista ético e pode desenvolveras aptidões essenciais para a análise ética e o raciocínio moral. Umaassessoria imparcial pode contribuir para criar um contexto no qual osservidores públicos estejam mais propensos a enfrentar e a resolvertensões e problemas de índole ética. Mecanismos de orientação e deconsulta interna deveriam estar à disposição dos servidores públicos paraajudá-los na aplicação de parâmetros éticos em seu trabalho.

4) Os servidores públicos deveriam conhecer seus direitos e obriga-ções caso seja descoberta alguma atuação incorreta.

Esse conhecimento é necessário para o reconhecimento de umaatuação incorreta real ou suposta no serviço público. A esse respeito,deveriam incluir-se normas e procedimentos claros a serem seguidos pe-los funcionários e uma cadeia formal de responsabilidades. Os servidores

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RSPpúblicos necessitam saber qual é a proteção a que poderão ter direito nocaso em que seja descoberta uma atuação incorreta.

5) O compromisso político com a ética deveria reforçar o compor-tamento ético dos servidores públicos.

Os líderes políticos são responsáveis pela manutenção de um eleva-do nível de honestidade na realização de suas tarefas oficiais. Seu compro-misso demonstra-se através do exemplo, levando a cabo ações que somentesão possíveis em nível político, por exemplo, estabelecendo acordos emtorno de disposições legislativas e institucionais capazes de reforçaro comportamento ético, gerando sanções contra as formas incorretas deprocedimento, oferecendo apoio e recursos adequados para as atividadesrelacionadas com a ética em todas as dependências governamentais,e evitando a exploração de normas e leis éticas com objetivos políticos.

6) O processo de tomada de decisões deveria ser transparente eaberto ao escrutínio.

O público tem direito de conhecer como as instituições públicasutilizam o poder e os recursos que lhes são confiados. O escrutínio públi-co deveria ser facilitado por processos transparentes e democráticos,supervisionado pelo Legislativo e acessível à informação pública. A trans-parência deveria ser promovida cada vez mais através de medidas taiscomo a abertura dos sistemas e o reconhecimento do papel desempenha-do por meios de comunicação ativos e independentes.

7) Deveria haver diretrizes claras para a interação entre os setorespúblico e privado.

Normas claras que definam os parâmetros éticos deveriam orien-tar os comportamento dos servidores públicos nas suas relações com osetor privado, por exemplo, no que diz respeito à procuradoria pública, àcontratação externa ou às condições de emprego público. O incrementoda interação entre os setores público e privado requer que se preste umamaior atenção aos valores do serviço público e que se exija dos partici-pantes externos o respeito desses valores.

8) Os gerentes deveriam demonstrar e promover um comporta-mento ético.

Um ambiente organizacional no qual se promovam elevados níveisde comportamento através de incentivos apropriados para o desenvolvi-mento desse tipo de conduta, tais como condições adequadas de trabalhoe uma efetiva avaliação do desempenho, exerce um impacto direto naprática cotidiana de valores e parâmetros de ética no serviço público. Osgerentes desempenham um papel importante neste aspecto, oferecendouma liderança consistente e cumprindo o papel de modelo em termos deética e de comportamento na sua relação profissional com líderes políti-cos, com outros servidores públicos e com os cidadãos.

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RSP9) Políticas, procedimentos e práticas de gerência deveriam pro-mover um comportamento ético.

As políticas e as práticas de gerência deveriam demonstrar o com-promisso da organização com os parâmetros éticos. Não é suficiente paraos governos terem, somente, estruturas baseadas na norma ou no consen-timento. Os sistemas baseados, exclusivamente, no consentimento podem,inadvertidamente, estimular os servidores públicos a funcionar simplesmenteno limite da ilegalidade, argumentando que já que não estão violando as leis,estão atuando eticamente. As políticas governamentais não deveriamapenas delinear os parâmetros mínimos a partir dos quais as ações dosfuncionários não seriam toleradas, mas articular também claramente,um conjunto de valores do serviço público aos quais os empregados deve-riam aspirar.

10) As condições do serviço público e a gerência de recursos hu-manos deveriam promover uma conduta ética.

As condições do emprego público, tais como as perspectivas decarreira, o desenvolvimento pessoal, uma remuneração adequada e polí-ticas de gestão dos recursos humanos deveriam criar um ambiente propí-cio ao comportamento ético. A adoção de princípios básicos, tais como omerecimento, de forma consistente nos processos cotidianos de recruta-mento e de promoção, contribuem para a operacionalização da integrida-de no serviço público.

11) Mecanismos adequados de responsabilidade deveriam insta-lar-se no seio do serviço público.

Os servidores públicos deveriam ser responsáveis pelas suas açõesjunto a seus superiores, e de maneira mais geral, junto ao público. Aresponsabilidade deveria centrar-se na aceitação de norma e princípioséticos, bem como na obtenção de resultados. Os mecanismos de responsa-bilidade podem ser internos a uma agência, ou estarem em vigor paratodas as dependências governamentais, ou podem ser colocados pelasociedade civil. Os mecanismos que promovem a responsabilidadepodem ser desenhados para oferecer controles adequados, ao mesmotempo em que permite uma apropriada flexibilidade gerencial.

12) Procedimento e sanções apropriadas deveriam existir paramanejar os desvios de condutas.

Os mecanismos para a detecção e a investigação independente dasações incorretas, tais como a corrupção, constituem uma partenecessária da infra-estrutura ética. É preciso contar com procedimentos erecursos confiáveis para monitorar, informar e investigar as transgressõesdas normas do serviço público, bem como para aplicar as correspondentessanções administrativas ou disciplinares com o efeito de desestimular essastransgressões. Os gerentes deveriam capacitar-se para fazerem uso apro-priado destes mecanismos quando se faz preciso empreender ações.

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RSPResumoResumenAbstract

A nova gerência públicaDerry Ormond e Elke Löffler

Os autores discorrem sobre o significado do conceito de nova gerência pública, oriundodo termo New Public Management (NPM), a partir do enfoque com que o mesmo éutilizado na prática em vários países-membro da OCDE. De certa forma, retratam a experiên-cia que ambos adquiriram no trabalho desenvolvido no PUMA (Public ManagementCommittee), enquanto organismo dedicado aos problemas do governo, gerência e reformado setor público e sua respectiva modernização administrativa. São abordados vários temassob a ótica do novo paradigma, entre eles a devolução/descentralização de autoridade, aflexibilização do processo orçamentário e da gerência de pessoal, a adoção de mecanismosde mercado (contratação externa, cobrança ao usuário, vouchers e contratos por desempe-nho), bem como os problemas resultantes ligados à accountability, ética, escolha de políti-cas e instrumentos mais adequados. Os autores apontam os pré-requisitos para a introduçãoda NPM bem como a necessidade de um cuidadoso processo de gerenciamento da reforma.

La nueva gerencia públicaDerry Ormond e Elke Löffler

Los autores discurren sobre el significado de nueva gerencia pública, oriundo del térmi-no New Public Management (NPM), a partir del enfoque con que el mismo es utilizado enla práctica en varios países miembros de la OCDE. De cierta manera, los autores retratan laexperiencia que ambos adquirieron en el trabajo desarrollado en el PUMA (PublicManagement Committee), en su calidad de organismo dedicado a los problemas del gobierno,de la gerencia y reforma del sector público y de su respectiva modernización administrativa.Se abordan varios temas bajo la óptica del nuevo paradigma, entre ellos la delegación/descentralización de autoridad, la adopción de mecanismos de mercado (contratación exter-na, cobro al usuario, vouchers y contratos por desempeño) y asimismo los problemasresultantes vinculados a la imputación de responsabilidad, a la ética, la elección de políticase instrumentos más adecuados. Los autores indican los requisitos previos para la introduccióndel NPM y la necesidad de un cuidadoso proceso de gerencia de la reforma”.

The new public managementDerry Ormond e Elke Löffler

The authors elaborate on the meaning of the concept of new public management (NPM),starting from the approach with which it is used in practice in several OECD membercountries. They depict, somehow, the experience both of them acquired in the work theydeveloped within PUMA (Public Management Committee), as an organisation devoted togovernment, management and public sector reform problems and their respective administrativemodernisation. Several subjects are dealt with therein, under the optics of the new paradigm,amongst them the delegation/decentralisation of authority, the changes in the budgeting processand of personnel management aimed at rendering them more flexible, the adoption of marketmechanisms (outsourcing, collection form users, vouchers and performance contracts), aswell as the ensuing problems pertaining to accountability, ethics, and the choice of the mostappropriate policies and instruments. The authors indicate the prerequisites for introducingNPM, as well as the need for a careful process of reform management.”

Revista doServiçoPúblico

Ano 50Número 2Abr-Jun 1999

Derry Ormondtrabalhou naOrganizaçãopara aCooperação eDesenvolvimentoEconômico(OCDE) de1962 a 1998,na área degerênciapública, o queoriginou acriação doPublicManagementCommittee(PUMA).Elke Löfflertrabalha naOCDE, desde1997, noServiço deGerênciaPública

Contato com o autor: [email protected]

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RSPDesafios da administraçãopública brasileira: governança,

autonomia, neutralidade1

Maria das Graças Rua

1. Introdução

O objetivo deste texto é contribuir para o debate do problema daneutralidade da burocracia versus o requisito da autonomia de decisão,elemento fundamental do modelo de administração pública gerencial.

Este problema assume especial relevância frente aos objetivos deaumentar a governança do Estado e constitui um dos desafios centrais doPlano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, particularmente noque diz respeito à forma de administração do chamado “núcleo estratégico”— responsável pela definição das leis e políticas públicas — e das “ativida-des exclusivas de Estado” — caracterizadas pelo exercício do poder delegislar e tributar, fiscalizando, regulamentando e transferindo recursos.

Não ambiciono apresentar soluções. Ao contrário: pretendo somenteiniciar um levantamento das graves dificuldades que o problema impõe.Para isto, organizei a discussão em quatro seções. Na primeira, apresentorapidamente os conceitos de governabilidade e governança, procurandochamar a atenção para o fato de que a distinção entre eles representaapenas um recurso analítico e argumento que: a) a atividade política estápresente em ambos; e b) o modelo de administração pública burocráticaexibe contradições não somente devido aos desafios colocados à atividadegovernamental pelas mudanças do mundo contemporâneo, mas tambémem razão das clivagens que estabelecem entre racionalidade instrumentale neutralidade burocrática, por um lado, e o exercício da autoridade e dadecisão política, por outro.

Na segunda seção, a partir das distinções clássicas de Max Weberentre política e administração, políticos e burocratas, procuro caracterizara neutralidade burocrática e mostrar que representa, na realidade, apenas

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

Maria dasGraças ésocióloga,doutorada emCiência Polí-tica peloIUPERJ eprofessora doDepartamentode RelaçõesInternacionaisda UnB

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RSPum dos elementos de uma construção típico-ideal, cada vez mais distantede qualquer correspondência com o mundo real. E sustento que, aindaque a neutralidade burocrática fosse realmente possível, cabe indagarpelo menos sobre: a) como torná-la uma característica efetiva e consoli-dada do comportamento dos agentes da administração pública; e b) quaisas suas conseqüências sob a ótica dos valores democráticos mais amplos.

Em seguida, comento rapidamente o processo de mudança domodelo de administração pública; e apresento algumas das característicasdo chamado Modelo de Administração Pública Gerencial que, em lugarda neutralidade, implicam elevado grau de autonomia por parte dos agentesburocráticos — em especial a flexibilidade, a descentralização e horizon-talização das estruturas e a participação dos atores sociais.

Por fim, apresento algumas considerações finais, procurando mostrarque, da mesma maneira que a neutralidade, a autonomia burocrática apre-senta dificuldades e que a proposta da “autonomia imersa” ou “autonomiainserida” exibe implicações que merecem reflexão mais demorada.

2. Governabilidade, governança eadministração pública burocrática

Dentre os muitos e complexos desafios da reforma do Estado, umvem se destacando pela sua recente inclusão no debate político e acadê-mico: a capacidade do sistema político de responder satisfatoriamente àsdemandas da sociedade e de enfrentar os desafios da eficiência e eficáciada ação pública em contextos de complexidade e incerteza crescente.Nesse sentido, dois diferentes conceitos têm ocupado o centro da discus-são, cada um deles referindo-se a uma dimensão do problema.

A primeira refere-se às condições sistêmicas do exercício do poder,e envolve as características do sistema político, a forma de governo, asrelações entre os poderes, o sistema partidário, o sistema de interme-diação de interesses e outras (DINIZ, 1996). Trata-se da dimensão dagovernabilidade, cuja discussão remonta à década de 60 (HUNTINGTON,1968; 1975; HABERMAS ,1987; O’CONNOR , 1973)

A outra diz respeito à maneira pela qual o poder é exercido naadministração dos recursos econômicos e sociais, tendo em vista o desen-volvimento e envolve os modos de uso da autoridade, expressos medianteos arranjos institucionais que coordenam e regulam as transações dentroe fora dos limites da esfera econômica (MELO, 1996). Trata-se da dimensãoda governança, cujo conceito — de formulação bastante recente — podeser resumido como o conjunto das “condições financeiras e administrativasde um governo para transformar em realidade as decisões que toma”(BRESSER PEREIRA, 1997).

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RSPEsta última dimensão mostra-se particularmente relevante no casobrasileiro, quando se tem em mente as constatações recentes de que, emlugar da suposta paralisia decisória, o que tem se observado é a incapaci-dade do governo no sentido de implementar as decisões que toma. Dessaforma, à hiperatividade decisória da cúpula governamental contrapõe-sea falência executiva do Estado, que não se mostra capaz de tornar efetivasas medidas que adota e de assegurar a continuidade das políticas formu-ladas (DINIZ, 1996).

Neste sentido, vale assinalar que, ao contrário do que eventual-mente se supõe, refletir sobre os dois conceitos e/ou optar por um delescomo elemento de recorte analítico não significa assumir a existência dequalquer disjuntiva entre uma dimensão propriamente política do processode governo (governabilidade) e uma outra, restrita às rotinas degerenciamento despolitizado (governança). Uma perspectiva desta natu-reza é exatamente o que pretendo questionar neste texto, uma vez quesustento, primeiro, que administração é política; e segundo, por implicação,a existência de um vínculo indissolúvel e de uma articulação dinâmicaentre governabilidade e governança. Na realidade, a distinção entre asduas significa apenas um recurso de análise.

A governança compreende duas importantes capacidades: a finan-ceira e a administrativa. A primeira refere-se à disponibilidade derecursos para realizar investimentos, assegurar a continuidade das polí-ticas em andamento e introduzir novas políticas públicas. A segunda dizrespeito à disponibilidade de quadros executivos, ao estilo de gestão eaos limites impostos à ação administrativa. Neste sentido, Bresser Pereira(1997) assinala que, se nos anos 80 as tentativas de solucionar a crisedo Estado privilegiavam as políticas de ajuste fiscal, nos anos 90 osesforços nesse sentido não bastam: é necessário que se combinemconsistentemente com a busca da maximização da capacidade gerencialdo Estado.

De acordo com o mesmo autor, este último problema resulta deuma contradição intrínseca ao modelo de administração pública vigenteno mundo ocidental moderno desde o século XIX: o modelo de adminis-tração burocrática:

“...a administração pública burocrática, que Weber descreveucomo uma forma de dominação ‘racional-legal’, trazia embutida umacontradição intrínseca. A administração burocrática é racional, nostermos da racionalidade instrumental, à medida em que adota osmeios mais adequados (eficientes) para atingir os fins visados. É,por outro lado, legal, à medida em que define rigidamente os objetivose os meios para atingi-los na lei. Ora, em um mundo em plena trans-formação tecnológica e social, é impossível para o administrador ser

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RSPracional sem poder adotar decisões, sem usar de seu julgamentodiscricionário, seguindo cegamente os procedimentos previstos emlei”. (BRESSER PEREIRA, 1997:41).

Talvez caiba acrescentar que enquanto a adoção dos “meios maisadequados para atingir os fins visados” supõe escolher entre alterna-tivas previamente estabelecidas e delimitadas pela autoridade legal, adefinição dos “objetivos e os meios para atingi-los na lei” remete aomundo da política, esfera na qual as próprias alternativas são construídase as decisões são tomadas em resposta a interesses, necessidades e de-mandas freqüentemente conflituosos.

Neste sentido, ao enfatizar a racionalidade enquanto ação instru-mental de adequação entre meios e fins, o modelo de administração buro-crática como mecanismo de dominação racional-legal implica umadicotomia entre administração e política que é, ela própria, contraditória.

Essas considerações remetem a uma das mais instigantes questõesacerca da política administrativa e da reforma do Estado: o significado, adesejabilidade e os limites da neutralidade burocrática nas democraciascontemporâneas.

3. Um (entre vários) paradoxos dogoverno no estado democrático

Entre os diversos atores que transitam na esfera pública, dois assu-mem papéis especialmente relevantes e, de certa maneira, mais visíveis:os políticos e os burocratas.2

Idealmente, os políticos têm como missão promover o interessepúblico, isto é, o bem comum, contribuindo para o desenvolvimento dasociedade e o bem-estar geral. Para isto, são investidos de autoridadedecisória e supõe-se que venham a exercê-la conforme padrões univer-salistas. A realidade, entretanto, é bem distinta: o que leva os indivíduosao exercício da atividade política freqüentemente é o desejo do poder,da glória e da riqueza e a capacidade de usar a autoridade para benefi-ciar interesses particulares, de grupos específicos, mesmo quando nãose trata de vantagens estrita ou diretamente pessoais. Este é um dosparadoxos do governo.

Esta tensão entre o ideal e o mundo real da política, entre o bempúblico e o interesse particular, tem sido objeto da reflexão política e doesforço de construção de mecanismos institucionais que configuram oque hoje conhecemos como democracia liberal: a regra da maioria, aseparação e independência dos poderes, o mandato representativo limitado,as eleições livres e regulares, e outras.

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RSPEmbora a discussão desse problema, no que diz respeito aos políticos,remonte ao século XVII, preocupações correspondentes aos burocratassão muito mais recentes, apesar das apreensões manifestadas por autorescomo Stuart Mill, já no século XIX.

Isto se deve, em parte, ao fato de que a moderna burocracia émuito mais recente do que a moderna classe política, já que o modelo deadministração pública burocrática, hoje generalizado nas sociedades oci-dentais, só veio substituir o modelo de administração pública patrimonialistano século XIX. Por outro lado, deve-se também ao fato de que o modelode administração pública burocrática surge, tendo a neutralidade comoum dos seus princípios.

De fato, em “Burocracia”, Max Weber (1979) indica ser caracterís-tica do processo de burocratização e da burocracia o cumprimento “obje-tivo” das tarefas, significando isso, primordialmente, um cumprimento detarefas a partir do conhecimento técnico especializado e segundo regrascalculáveis e “sem relação com pessoas”. Este é o princípio do sine iraet studio: um comportamento de tal forma neutro que exclui dos negóciosoficiais o amor, o ódio, as preferências, todos os elementos pessoais, irracio-nais e emocionais, que fogem ao cálculo.

Nas sociedades contemporâneas, Weber constata ser essa a natu-reza específica da burocracia, louvada como sua virtude especial. E quantomais complexa e especializada se torna a cultura moderna, tanto maisrequer o perito despersonalizado e rigorosamente objetivo, em lugar domestre das velhas estruturas sociais, que era movido pela simpatia e pelaspreferências pessoais, pela graça e gratidão (1979: 250-251).

E em A política como vocação (1979), Max Weber estabeleceprecisamente a diferença entre políticos e burocratas ao constatar que:

“Tomar uma posição, ser apaixonado — ira et studium — é oelemento do político e, acima de tudo, o elemento do líder político.Sua conduta está sujeita a um princípio de responsabilidade (...)pessoal exclusiva pelo que ele faz (...)” (1979: 116-117).

Já os burocratas se distinguem pela atribuição de executar conscien-ciosamente as determinações dos políticos, como se resultassem de suaspróprias convicções, ainda que lhes pareçam erradas; o compromisso deevitar envolvimento com partidos ou líderes políticos, de modo a consti-tuir-se em instrumentos de qualquer governo legítimo; o dever de atuarcomo conselheiros desinteressados e imparciais na execução das decisõesgovernamentais. De acordo com Weber, o princípio de responsabilidadeque rege a ação do servidor público é exatamente o oposto daquele quecaracteriza o político:

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RSP“Sine ira et studio — sem ressentimento nem preconceito —ele administrará seu cargo. Daí não fazer precisamente o que opolítico, o líder bem como seu séquito, tem sempre e necessaria-mente de fazer, ou seja, lutar (...). Sem essa disciplina moral e essaomissão voluntária, no sentido mais elevado, todo o aparato cairiaaos pedaços.” (1979: 116-117)

Nesses termos, segundo Caiden (1996), o conceito de neutralidadeé aparentemente muito simples, baseando-se nos princípios de:

a) separação entre as carreiras políticas e administrativas eb) de despolitização do serviço público.Os políticos formulam os fins, decidem e ordenam; os burocratas

se encarregam da provisão dos meios e executam as decisões de acordocom as ordens recebidas. Os políticos conquistam seus cargos mediantea competição na arena política, com base na sua competência política,sendo julgados pelos seus pares e pelo eleitorado.

Os burocratas são selecionados mediante sua competência técnicaem arena de competição administrativa, sendo julgados pelos seus parese pelos seus superiores políticos. Os burocratas não se envolvem ematividades político-partidárias, nem expressam publicamente suas opiniõesacerca da atividade política ou governamental.

Portanto, administração e política são esferas distintas e separadasa partir da proibição legal de acúmulo ou superposição de funções. Aatividade burocrática deve ser regida pelos critérios da expertise, confia-bilidade, confidencialidade, impessoalidade, imparcialidade, moralidade,entre outros.

A esta altura, cabem diversas indagações. O que é que autorizasupor que o comportamento burocrático exiba tais características? Porque estariam os burocratas infensos ao paradoxo do governo acima mencio-nado? Seria a neutralidade burocrática apenas uma construção hipotética,um recurso conceitual? Ou seria efetivamente constatável no mundo dasrealidades efetivas? Aparentemente tão desejável, quais seriam as con-seqüências não antevistas da neutralidade burocrática?

Em primeiro lugar, nada autoriza supor que haja uma “natureza”própria dos agentes burocráticos, capaz de torná-los distintos dos outroshomens e de impedir que sejam maximizadores e ambicionem a glória, ariqueza e o poder. Assim sendo, os administradores públicos estariamsubmetidos ao paradoxo do governo, acima mencionado, da mesma ma-neira que os políticos.

Na realidade, o próprio modelo de administração burocrática, coma sua ênfase nos controles, processos e rituais surgiu, em grande parte,como tentativa de resolver tal paradoxo, à medida que se destinava acercear a corrupção, o nepotismo e o clientelismo típicos da administraçãopública patrimonialista.

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RSPEntretanto, apesar do inegável avanço que representou neste sentido,ainda assim, os controles burocráticos têm se mostrado formalísticos einsuficientes diante das grandes tentações que um poder cada vez maissólido e abrangente coloca aos que exercem os cargos administrativos.

De fato, no mundo contemporâneo, o poder administrativo é capazde sustentar ou de destruir instituições. Numa sociedade cada vez maisavançada tecnologicamente, onde a informação representa um recurso depoder inestimável, e onde os meios de execução das decisões são cada vezmais complexos, o destino dos líderes políticos encontra-se intimamentedependente do desempenho dos quadros administrativos. Na realidade, oequilíbrio de poder vem se alterando consistentemente em benefício dosadministradores e em detrimento dos políticos (CAIDEN, 1996: 30).

Contudo, enquanto os políticos são regulamente submetidos à ava-liação eleitoral, a burocracia, por definição, não apenas é politicamenteirresponsável, como também deve ser protegida das turbulências do jogopolítico, mantendo-se estável e segura em suas posições através de suces-sivas mudanças de governo — já que os quadros administrativos sãoelementos constitutivos do Estado e não do governo.

Nessas condições, como impedir que os agentes administrativos— da mesma forma como ocorre com os políticos — usem seus recursosde poder e sua autoridade em favor de interesses particulares e em detri-mento do bem público?

Este ponto mostra-se tão mais importante quando se tem em menteque, no mundo real da política o próprio processo de representação deinteresses não se limita às lideranças políticas e aos políticos autorizadospelo voto. Todavia, existem sérias restrições ao processo burocrático derepresentação de interesses, pois, conforme coloca Reis:

“(...) discrimina contra interesses não organizados; tende a selimitar ao âmbito de setores funcionais particulares, (...) mostran-do-se incapaz de articular interesses intersetoriais; revela um ine-vitável conservadorismo, (...) porque a agregação de interesseslograda cristaliza a correlação de forças existente.” (1989: 103).

Para solucionar o problema, têm sido propostos arranjos como arotatividade dos cargos, com períodos de curta duração, de modo a evitara personalização do poder; mecanismos de avaliação interna; comissõesexternas de avaliação e fiscalização; descentralização das decisões eações; estabelecimento de instituições rivais que venham a competir pelopoder e cooperar quanto aos fins; processos de treinamento, que incluama disseminação de normas de comportamento compatíveis com o interessepúblico; e a criação de mecanismos que tornem a burocracia dotada deresponsiveness frente à sociedade, sujeita ao controle social.

O problema tem sido como operacionalizar tais arranjos de maneiraeficaz: não existe, para o controle da burocracia, uma engenharia política

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RSPgeneralizadamente adotada, como aquela estabelecida com relação aospolíticos nas democracias liberais.

Assim, o princípio da neutralidade burocrática parece representarapenas um elemento da construção típico-ideal weberiana, muito distantedo que se constata no mundo empírico.

De fato, estudos recentes têm mostrado que, diversamente doque pretendia a separação analítica entre política e administração, ficaclaro que os agentes administrativos não são neutros, mas sim dotadosde interesses próprios, que tentam maximizar. Agem como atores polí-ticos, mostrando-se capazes de mobilizar recursos políticos, como in-formação e apoio de grupos de interesse da sociedade. Além disso,possuem capacidade para desenvolver concepções próprias sobre aspolíticas governamentais e sobre o seu próprio papel no jogo político,independentemente de considerações de natureza estritamente técnica.Finalmente, são capazes não apenas de competir com os políticos, masde efetivamente entrar em conflito com eles, visando não somente deci-sões favoráveis às suas propostas quanto a policies específicas, masaté mesmo disputando o controle do processo político (RUA, 1992; RUA

e AGUIAR, 1995).Esses diversos aspectos do comportamento da burocracia têm se

manifestado com regularidade em governos de diversos países demo-cráticos, não sendo possível descartar sua importância sob o argumentode que representam distorções características dos regimes autoritáriosou das democracias ainda não consolidadas. Essas regularidades cha-mam a atenção de Peters, que introduz a hipótese do “governo burocrá-tico”, compreendida em termos da possibilidade de os agentes burocrá-ticos assumirem o controle do processo governamental, restando aospolíticos apenas funções de legitimação das decisões burocráticas(PETERS, 1981).

Desta forma, chega-se à última deste primeiro conjunto dequestões: seria a neutralidade burocrática um valor absoluto, desejávelem si mesmo? Ou implicaria conseqüências que imporiam a discussãoacerca da sua desejabilidade ou conveniência? Esta discussão parececonduzir a um dilema.

Sem qualquer sombra de dúvida, os valores implícitos no princípioda neutralidade burocrática são, considerados abstratamente sob aperspectiva ética, extremamente desejáveis. Sob a ótica dos valores demo-cráticos, de todos os matizes, não há como negar a importância do combateao favoritismo, à patronagem, à venalidade, à discriminação, em favor doprofissionalismo, do mérito e da imparcialidade. São esses valores queorientam padrões de conduta destinados a assegurar a previsibilidade essen-cial à realização dos fins individuais e coletivos sob o império da lei(calculabilidade a partir de normas universais estáveis).

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RSPEntretanto, a experiência histórica tem mostrado que a contrapartidada neutralidade burocrática pode ser a irresponsabilidade política e aausência de compromisso com valores democráticos. De fato, umaburocracia despolitizada, que se conduz como simples instrumento de exe-cução das ordens dos seus superiores, tanto pode servir à democracia,como pode ser importante recurso para a implantação de regimes ditato-riais e tirânicos, como mostram, entre outras, as experiências ainda re-centes do nazismo e das ditaduras latino-americanas.

4. A mudança do modelo de administração pública

Na primeira metade da década de 70 iniciou-se uma grande criseeconômica de escala mundial, cujo marco inicial mais visível foram asduas grandes crises do petróleo (1973 e 1979). Até então, o mundocapitalista vivia num período de altas taxas de desenvolvimento econô-mico e de um amplo consenso quanto ao papel do Estado de promovero crescimento econômico e o bem-estar social. No início dos anos 80,encerra-se esta fase de prosperidade vivida desde o fim da SegundaGuerra e inicia-se uma prolongada recessão, cujos efeitos são uma acen-tuada crise fiscal, acompanhada de uma crise do modo de intervençãodo Estado e de uma crise de governabilidade.

Além disso, um processo que vinha se desenvolvendo de maneiraacentuada desde a Segunda Guerra — a globalização e as grandes trans-formações tecnológicas, especialmente nas áreas de microeletrônica etelecomunicações — assume uma dinâmica mais acelerada a partir dofim da década de 80. Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, e com adissolução da União Soviética em 1991-1992 acabam-se as principaisdistinções políticas e econômicas entre o mundo ocidental, democrático ecapitalista e o mundo oriental, autoritário e socialista.

Nesse novo ambiente, aumenta a interdependência das nações, osEstados nacionais passam a dispor de menor capacidade regulatória, tor-nam-se mais vulneráveis às forças transnacionais (desde as corporaçõesaté os investidores individuais, desde os empreendimentos legítimos até ocrime organizado), perdem boa parte do seu controle sobre os fluxos finan-ceiros e comerciais e sobre a tarefa de decidir autonomamente as suaspolíticas macroeconômicas.

Embora a crise econômica e a crise fiscal pudessem ser contornadascom a redefinição do papel do Estado na economia e com o corte depolíticas sociais, o mesmo não se aplicava à crise de governabilidade eaos desafios da globalização. Na verdade, não apenas o Estado passou acontar com menos recursos, mas também passou a dispor de menos poderefetivo. Logo, a solução não poderia se limitar à esfera econômica, masdeveria se estender ao modelo político-administrativo.

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RSPDe fato, soluções econômicas não seriam suficientes para superara inflexibilidade da burocracia: seu conservadorismo, sua relutância emse afastar dos precedentes, sua adesão à letra estrita da lei, seu comporta-mento refratário à inovação e sua generalizada conformidade aos padrõesgrupais. As mudanças em andamento impunham a presença de quadroscriativos, flexíveis e capazes de inovar, competitivos e comprometidos emmelhorar o seu desempenho, orientados para a sociedade em lugar deauto-referidos, dotados da motivação resultante da capacidade de acreditarno que estivessem realizando.

É nesse contexto que se iniciam as medidas de modernização dosetor público que, por longos e diversos processos de ensaio e erro, acaba-ram resultando no modelo que se convencionou chamar de administraçãopública gerencial.

No final da década de 70 e início de 80 constatava-se a existência,nos países anglo-saxônicos, de uma opinião pública desfavorável à burocra-cia pública e ao mesmo tempo uma inclinação em valorizar o modelo degestão adotado pelo setor privado. Com a eleição do governo conservadorna Grã-Bretanha e republicano nos EUA, iniciou-se a implantação, nosetor público, de formas de gestão importadas diretamente do setor privado,nas quais a ênfase recaía sobre o objetivo de cortar custos e aumentar aprodutividade, e onde era possível observar a ausência da percepção dasdiferenças entre a atividade privada e a atividade pública (ABRUCIO, 1996).

Basicamente, apesar dos diversos arranjos adotados em diferentesmomentos e em experiências diversas, o modelo gerencial puro, importadodiretamente do setor privado, exibia as seguintes características:

a) uma lógica de completa separação entre a esfera da política e aesfera da administração;

b) uma concepção estritamente econômica, baseada na avaliaçãotécnica de custo/benefício;

c) um princípio central: a eficiência, compreendida como eficiênciaoperacional, que implica o aumento da consciência dos custos e requeruma rígida especificação de objetivos e controles;

d) objetivo de produtividade e dinâmica da competição à maneirada concorrência no mercado; e

e) público-alvo concebido como o conjunto dos consumidores, nasua condição de contribuintes.

Pode-se discutir vários ângulos de cada uma dessas características.Entretanto, a fim de não alongar excessivamente o debate, basta apontarque alguns dos seus problemas decorrem, basicamente, do fato de que omodelo gerencial puro é totalmente apolítico — e por isso mostra-se ina-dequado à administração pública.

Vale observar que a sua lógica de absoluta separação entre política eadministração, curiosamente, é a mesma que orienta o modelo de

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RSPadministração burocrática, mas também é a mesma que orienta todasas concepções que, por assim dizer, se baseiam na mística do mercado.Para estas, política e mercado devem ser não apenas esferas separadas,mas completamente estanques — e o mercado funcionaria tão melhorquanto menor fosse a ingerência da política. Esta visão totalmente ingê-nua e equivocada já foi suficientemente discutida e criticada por diversasvertentes do pensamento político. Aqui basta lembrar de que a políticasurge sempre que há conflito de interesses materiais ou ideais e talconflito potencialmente se manifesta sempre que há mais de um indiví-duo desenvolvendo uma atividade qualquer ou simplesmente existindo(SCHMITTER, 1974).3

Assim, na segunda metade da década de 80, importantes mudançascomeçaram a ser introduzidas, a partir da percepção das diferenças entrea gestão do setor privado e do setor público. As duas principais transforma-ções foram:

a) a priorização dos conceitos de flexibilidade, planejamentoestratégico e qualidade, alternando a dinâmica interna das organizaçõespúblicas; e

b) a orientação dos serviços públicos para as demandas e anseiosdos cidadãos, sem abandonar o conceito empresarial da busca da eficiência(ABRUCIO, 1996).

Na tentativa de encontrar uma solução que compatibilizasse asvantagens da administração gerencial com as características próprias dosetor público, diversas propostas surgiram, dando origem a diferentesmodelos. Não cabe aqui discuti-los. Vale apenas mencionar característicascentrais de alguns deles que, reunidas, compõem o que hoje se entendecomo modelo de administração pública gerencial e que têm orientado osesforços em direção à reforma administrativa no Brasil:

a) O foco é o cidadão, e as atividades se orientam para a busca deresultados.

b) O princípio da eficiência econômica cede espaço ao princípio daflexibilidade.

c) Ênfase na criatividade e busca da qualidade;d) Descentralização, horizontalização das estruturas e organização

em redes.e) Valorização do servidor, multiespecialidade e competição admi-

nistrada.f) Participação dos agentes sociais e controle dos resultados.

Diversos destes aspectos contemplam (ou podem contemplar) adimensão política da administração pública. É o caso princípio daflexibilidade, que implica a tentativa de superar a rigidez burocrática e aorientação primária de maximização custo/benefício e de admitir a

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RSPinteração com o ambiente social. O mesmo pode ser dito da descentra-lização e da horizontalização das estruturas, que implicam autonomia degestão e tendem a romper com o princípio da hierarquia e com a éticada obediência situados na base da neutralidade e despolitização daburocracia. Por fim, é o caso, especialmente, da participação dos agentessociais, que implicam as noções de gestão participativa e se baseiamnos conceitos de transparência, accountability, participação política,eqüidade e justiça.

5. Considerações finais: os dilemas daautonomia burocrática

Nesse sentido, um conceito fundamental e freqüentemente poucoexplicitado é o de autonomia. Em acepção ampla, pode ser entendidocomo a capacidade de um ator ou agência de formular preferências eexecutar decisões, sem sofrer constrangimentos decorrentes de relaçõesde subordinação. Vale assinalar que, conforme coloca Bresser Pereira(1997:43), “o conceito de autonomia da burocracia pública não deveser confundido com o de insulamento burocrático, ou seja, o isola-mento das agências estatais em relação às influências políticas”,proposto como recurso de separação entre a política e a administração ede despolitização da burocracia, de maneira a protegê-la do populismoeconômico e do clientelismo.

Mais precisamente, o conceito de autonomia da burocracia públicapode ser operacionalizado como a capacidade de ocupar posições centraisno governo; de formular preferências políticas; de ajustar os objetivosaos procedimentos já estabelecidos; a disponibilidade de qualificaçõespara comando ou gerenciamento das atividades; e a capacidade de con-trolar a implementação das decisões públicas (ROSE:1974; PETERS: 1987).

Estas capacidades podem se consolidar mediante o arranjo denomi-nado “autonomia imersa” ou “autonomia inserida” proposto por PeterEvans (1995:248), segundo o qual, para que as agências governamentaisganhem eficácia e sejam capazes de realizar transformações, devem estarimersas em uma densa rede de relações sociais que as vinculam aos seusaliados na sociedade a partir de objetivos de mudança. Para o autor estaseria a forma de assegurar a democracia, evitando que a burocracia venhaa se tornar governo, em substituição aos políticos.

Esta concepção apresenta diversos problemas. Em primeiro lugar,conquanto a idéia de autonomia governamental não ofereça dificuldadesdo ponto de vista conceitual, o mesmo não acontece com “autonomiaimersa” ou “autonomia inserida”. Conforme colocam Tavares de Almeidae Moya (1997:121):

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RSP“Não fica claro o que seja ‘autonomia inserida’ e no que ela sedistinguiria das condições normais de operação dos governos nasdemocracias antigas e estáveis. A menos que se imagine que ogoverno não é senão o comitê executivo dos interesses predomi-nantes na sociedade, alguma capacidade de iniciativa autônoma ealguma sustentação político-parlamentar são traços típicos de todogoverno democrático que não esteja à beira do colapso.”

Eu acrescentaria que não apenas a sustentação político-parlamentaré típica desse tipo e condição de governo, como também o são os vínculoscom as diversas coalizões de interesses que se constituem como atorespolíticos em sociedades minimamente inclusivas.

Entretanto, quanto ao conceito de autonomia de Peters, acrescen-ta-se o arranjo de Peter Evans, tem-se o que o primeiro destes autoresindica serem os pré-requisitos para um governo burocrático. Este é odilema da autonomia burocrática: para atender aos imperativos dagovernança numa ordem em transformação, é necessário autonomia. Masa autonomia — do mesmo modo que a neutralidade, embora por viastransversas — não assegura democracia, nem mesmo a autonomia imersaou inserida, ao contrário do que pretende Peter Evans.

Além disso, o conceito de autonomia imersa ou inserida temsubjacente o suposto de um conjunto de atores sociais forte egeneralizadamente atuantes em busca de resultados da ação pública quesatisfaçam seus interesses e demandas. Ou seja, não basta constituir buro-cracias autônomas: é necessário ter atores sociais envolvidos e mobilizadosem torno da consecução de metas públicas.

Pelo menos desde Schumpeter (1978) e, mais tarde, de Olson (1971;1982), são conhecidas as dificuldades para que isso ocorra. Enquanto oprimeiro enfatiza o problema da racionalidade política do cidadão médio,o segundo não deixa dúvidas quanto às dificuldades da ação coletiva —os elevados custos de organização e coordenação vis-à-vis, o caráterindivisível e não excludente dos bens públicos — nem quanto às nefastasconseqüências da hipertrofia dos pequenos grupos (OLSON, 1982 ).

Na verdade, é possível sugerir que a resposta (mas não a solução)ao problema de Olson encontra-se em Michels: a provisão de bens públicospara os grandes grupos — inclusive o controle social — só ocorre efeti-vamente mediante a ação do empresário político — figura não necessaria-mente restrita aos políticos dotados de mandato eletivo. Em que medidaisto seria diferente dos modelos tradicionais de atuação dos agentespúblicos, não somente os políticos, mas também os burocratas?

Ademais, supondo que sejam resolvidos os desafios da ação cole-tiva e haja organização dos atores sociais, coloca-se ainda, conforme mostraMichels (1982), o problema da oligarquização das organizações

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RSPdemocráticas (não apenas partidos políticos, mas também associações,sindicatos, conselhos comunitários e setoriais, etc): em que medida asentidades organizadas da sociedade civil são, de fato, representantes doscidadãos enquanto usuários dos bens públicos?

Se a proposta da autonomia imersa se destina a resolver o problemada vinculação entre a administração pública e a sociedade de maneira aobter agilidade e eficácia, sem perda do controle democrático, uma questãocentral a ser enfrentada é a de como tornar generalizada e efetiva aparticipação dos atores sociais.

Desta forma, a autonomia imersa pode levar a uma situação defortalecimento dos laços dos agentes/agências burocráticas com clientelasespecíficas, impondo dificuldades à construção de consensos e estabele-cendo novos padrões de favorecimento político, em lugar da universalizaçãodas relações de cidadania. Por outro lado, pode representar um novopatamar no fortalecimento dos atores burocráticos, em prejuízo dos polí-ticos, quando é possível pensar que é a competição entre os dois tipos deatores — e não a assimetria e subordinação entre eles — que favorece ademocracia (REIS, 1989).

Assim, conforme procuro chamar a atenção em um outro artigo(RUA, 1997), Max Weber ensina que o grande drama da dominação moder-na situa-se no campo das relações entre os dominadores: os políticos e aburocracia. Particular destaque teria, na dinâmica dessas relações, a dis-tinção entre as éticas e os tipos de racionalidade característicos de cadaum desses atores. Enquanto a burocracia seria orientada pela ética daobediência e pela racionalidade formal, sendo a competência técnica e omérito as fontes da legitimidade burocrática, os políticos teriam comotraços predominantes a ética da responsabilidade e a racionalidade subs-tantiva, fundamentos da legitimidade política.

O efetivo dilema a ser enfrentado pelas democracias seria consi-derado o inexorável processo de complexificação e burocratização dasociedade moderna e dadas as características de cada um dos agentes dojogo político e os seus recursos de poder, como impedir que a burocraciavenha a usurpar o poder e como assegurar que permaneça, sendo apenasum elo de ligação entre dominadores e dominados? Para Weber, a incapa-cidade de solucionar este problema estaria na base do declínio dos grandesimpérios da história (WEBER: 1993). Isto, certamente, não pode seresquecido quando do debate da autonomia burocrática, especialmente daautonomia imersa.

Finalmente, se este debate sugere que o exercício da autonomia buro-crática implica a rejeição do princípio da neutralidade, deve ficar claro queisto significa descartar ambas as suas facetas: não somente a indiferençadescompromissada, mas também o universalismo. Quais as conseqüênciasdisso sobre a governabilidade e a governança democráticas?

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RSPQuanto mais presentes se tornarem esses dilemas, maior será arelevância da discussão acerca das relações entre governança, neutrali-dade burocrática e autonomia para a reforma do Estado e da administraçãopública, onde o que está em jogo, em última instância, é a democraciaenquanto valor maior.

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RSPNotas

1 Agradeço a Evelyn Levy por ter me chamado a atenção para a relevância desta temáticano âmbito da reforma administrativa brasileira. Este artigo representa uma versão maiselaborada de um outro que apresentei na Semana Max Weber, UnB, setembro de 1997.

2 Considero políticos aqueles cujas carreiras se baseiam no exercício do mandato político.E burocratas, em geral, aqueles cujas carreiras estão orientadas para o exercício de ativi-dades administrativas, com base no conhecimento técnico especializado. Nesse sentido,existem diversos outros atores públicos, como os magistrados e os militares, por exem-plo, cujos papéis e lógica de comportamento exibem efetivas distinções com relação aospolíticos e aos burocratas propriamente ditos.

3 Pessoalmente, considero a definição do conceito de política proposto por Schmitterdemasiado amplo e, portanto, pouco operacional. Em outros textos tenho sugeridoque a política consiste no conjunto de instituições e processos destinados à soluçãopacífica dos conflitos em torno de bens públicos. Acrescento que mesmo esta defini-ção que proponho, é questionada por todos aqueles que compartilham os pressupos-tos da escola realista das relações internacionais, para a qual a “solução pacífica dosconflitos” exclui a guerra, que é considerada “a continuação da política por outrosmeios”.

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RSPResumoResumenAbstract

Desafios da administração pública brasileira: governança, autonomia, neutralidadeMaria das Graças Rua

O objetivo deste texto é iniciar um levantamento da dificuldades impostas à reformaadministrativa a partir da consideração do problema da neutralidade da burocracia versuso requisito da autonomia de decisão, elemento fundamental do Modelo de AdministraçãoPública Gerencial. Tal problema assume especial relevância frente aos objetivos de au-mentar a governança do Estado e constitui um dos desafios centrais do Plano Diretor daReforma do Aparelho do Estado, particularmente no que diz respeito à forma de adminis-tração do chamado “núcleo estratégico” — responsável pela definição das leis e políticaspúblicas — e das “atividades exclusivas de Estado” — caracterizadas pelo exercício dopoder de legislar e tributar, fiscalizando, regulamentando e transferindo recursos. Paraisso, a discussão está organizada em quatro seções. Na primeira, são rapidamente apre-sentados os conceitos de governabilidade e governança, com ênfase no fato de que adistinção entre eles representa apenas um recurso analítico.

Na segunda seção, a partir das distinções clássicas de Max Weber entre política eadministração, políticos e burocratas, busca-se caracterizar a neutralidade burocrática emostrar que representa, na realidade, apenas um dos elementos de uma construção típico-ideal, cada vez mais distante de qualquer correspondência com o mundo real.

Em seguida, comenta-se rapidamente o processo de mudança do modelo de adminis-tração pública; e são apresentadas algumas das características do chamado Modelo deAdministração Pública Gerencial que, em lugar da neutralidade, implicam elevado grau deautonomia por parte dos agentes burocráticos.

Por fim, são tecidas algumas considerações, procurando mostrar que, da mesmamaneira que a neutralidade, a autonomia burocrática apresenta dificuldades e que a pro-posta da “autonomia imersa” ou “autonomia inserida” exibe implicações que merecemreflexão mais demorada.

Desafíos de la administración pública brasileña: gobernación, autonomía,neutralidad

Maria das Graças Rua

El objetivo de este texto es iniciar un inventario de las dificultades impuestas a lareforma administrativa a partir de la consideración del problema de la neutralidad de laburocracia versus el requisito de la autonomía de decisión, elemento fundamental del Mo-delo de Administración Pública Gerencial. Tal problema asume especial relevancia ante losobjetivos de aumentar la gobernación del Estado, y constituye uno de los retos centrales delPlan Director de la Reforma del Aparato del Estado, particularmente en lo que se refiere ala forma de administración del llamado “núcleo estratégico” - responsable de la definición delas leyes y políticas públicas - y de las “actividades exclusivas del Estado”- caracterizadaspor el ejercicio del poder de legislar y tributar, fiscalizando, reglamentando y transfiriendorecursos. Para ello, la discusión está organizada en cuatro secciones. En la primera sepresentan repetidamente los conceptos de gobernabilidad y gobernación, con énfasis en elhecho de que la distinción entre ellos representa solamente un recurso analítico.

En la segunda sección, a partir de las distinciones clásicas de Max Weber entre políticay administración, políticos y burócratas, se trata de caracterizar la neutralidad burocráticay mostrar que representan, en realidad, solamente uno de los elementos de una construccióntípica-ideal, cada vez más distante de cualquier correspondencia con el mundo real.

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

Maria dasGraças ésocióloga,doutorada emCiência Polí-tica peloIUPERJ eprofessora doDepartamentode RelaçõesInternacionaisda UnB

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RSPEn seguida, se comenta rápidamente el proceso de cambio del modelo de administraciónpública, y se presentan algunas de las características del llamado Modelo de AdministraciónPública Gerencial que, en lugar de la neutralidad, implican un elevado grado de autonomíapor parte de los agentes burocráticos.

Por último, se elaboran algunas consideraciones, tratando de mostrar que, de la mismaforma que la neutralidad, la autonomía burocrática presenta dificultades, y que la propuestade la “autonomía inmersa” o “autonomía insertada” exhibe implicaciones que merecenuna reflexión más detenida.

Challenges facing the brazilian public administration: governance, autonomyand neutrality

Maria das Graças Rua

The purpose of this article is to start a survey of the difficulties facing administrativereform in view of the problem of neutrality of the bureaucracy as opposed to therequirement for autonomy in decison-making, a key element in the Managerial Model ofPublic Administration. This problems becomes particularly relevant given the objectiveto increase State governance and constitutes one of the major challenges in the SateReform Master Plan, particularly with regard to the so called “strategic core”, which isresponsible for establishing laws and public policies as well as those “activities exclusiveto the State”, characterized by the exercise of the power to legislate and tax, inspect,regulate and transfer resources. The article has been organized in four sections. In thefirst, the concepts of governability and governance are briefly introduced, with specialemphasis placed on the fact that a distinction between them merely serves an analysispurpose.

In the second section, based on classical distinctions by Max Weber between politicsand administration, politicians and bureaucrats, the article seeks to characterize bureauraticneutrality and to show that, in fact, it represents only one of the elements in a typicallyideal construction, increasingly distant from the real world.

The article then briefly discusses the change process in the model of publicadministration and some of the characteristics of the so called Managerial Model ofPublic Administration are described; these, instead of neutrality, involve a high degree ofautonomy on the part of bureaucracy agents.

In conclusion, the article seeks to evince that, just as in the case of neutrality,bureacratic autonomy involves certain difficulties and that the proposal for an “embeddedautonomy” or “inserted autonomy” has implications that require a more careful study.

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CadernosENAP

O impacto do modelogerencial naAdministração PúblicaUm breve estudo sobre aexperiência internacional recente

Fernando Luiz Abrucio

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O impacto do modelogerencial naAdministração PúblicaUm breve estudo sobre aexperiência internacional recente

CadernosENAP

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Cadernos

O impacto do modelogerencial naAdministração PúblicaUm breve estudo sobre aexperiência internacional recente

Fernando Luiz Abrucio

ENAP

Fernando Luiz Abrucio, 26 anos, doutorando em Ciência Política na

Universidade de São Paulo (USP), pesquisador do Centro de Estudos de

Cultura Contemporânea (Cedec), é professor da Fundação Getúlio Vargas

(FGV-SP) e da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP).

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ABRUCIO, Fernando Luiz.A164i O impacto do modelo gerencial na administração pública

Um breve estudo sobre a experiência internacional recente.52 p. (Cadernos ENAP; n. 10)

ISSN: 0104-7078

1. Modelo gerencial-setor público 2. Administração pública -Brasil 3. Reforma Administrativa 4. Reforma do Estado I.Titulo II. Série

CDD: 350-102

Cadernos ENAP é uma publicação da Fundação Escola Nacional de Administração

Pública

Editora

Vera Lúcia Petrucci

Coordenadora Editorial

Norma Guimarães Azeredo

Editoração eletrônica

Acácio Valério da Silva Reis

© ENAP, 1997

Tiragem: 1.500 exemplares

Brasília, 1997

Fundação Escola Nacional de Administração Pública - ENAPDiretoria de Pesquisa e Difusão

SAIS - Área 2-A

70610-900 - Brasília - DF

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Fax: (061) 245 2894

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Sumário

I. Introdução 6

II. Condições materiais e intelectuais para o surgimento do modelo gerencial 9

III. O desenvolvimento do modelo gerencial no setor público: a experiência anglo-americana 11

1. O modelo gerencial puro 13

2. Novos caminhos do modelo gerencial: flexibilidade

de gestão, qualidade dos serviços e prioridade

às demandas do consumidor (consumerism) 20

3. Public Service Oriented (PSO):

a construção da esfera pública 26

4. Reinventando o governo: novos caminhos

para a administração pública americana 29

IV. Conclusão: Os desafios para a administraçãopública do século XXI 37

Notas 42

Bibliografia 44

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I. Introdução

“O governo não pode ser uma empresa mas pode se tornar maisempresarial”.

Gerald Caiden

“(...) o setor público não está numa situação em que as velhasverdades possam ser reafirmadas. É uma situação que requer o desenvol-vimento de novos princípios. A administração pública deve enfrentar odesafio da inovação mais do que confiar na imitação. A melhora dagerência pública não é só uma questão de pôr-se em dia com o que estáocorrendo na iniciativa privada: significa também abrir novos caminhos”.

Les Metcalfe & Sue Richards

Em meados da década de 70, sobretudo a partir da crise do petróleoem 1973, uma grande crise econômica mundial pôs fim à era de prosperidadeque se iniciara após a Segunda Guerra Mundial. Era o fim da “era dourada” —na precisa definição de Eric Hobsbawn (HOBSBAWN, 1995) —, período emque não só os países capitalistas desenvolvidos mas o bloco socialista e partedo Terceiro Mundo alcançaram altíssimas taxas de crescimento. A principalreceita para o contínuo sucesso durante trinta anos foi a existência de umamplo consenso social a respeito do papel do Estado, o qual procuravagarantir prosperidade econômica e bem-estar social.

O tipo de Estado que começava a se esfacelar em meio à crise dos anos70 tinha três dimensões (econômica, social e administrativa), todas interligadas.A primeira dimensão era a keynesiana, caracterizada pela ativa intervenção estatalna economia, procurando garantir o pleno emprego e atuar em setores considera-dos estratégicos para o desenvolvimento nacional — telecomunicações e petró-leo, por exemplo. O Welfare State correspondia à dimensão social do modelo.Adotado em maior ou menor grau nos países desenvolvidos, o Estado de bem-estar tinha como objetivo primordial a produção de políticas públicas na áreasocial (educação, saúde, previdência social, habitação etc.) para garantir o supri-mento das necessidades básicas da população. Por fim, havia a dimensão relativaao funcionamento interno do Estado, o chamado modelo burocrático weberiano,ao qual cabia o papel de manter a impessoalidade, a neutralidade e a racionalidadedo aparato governamental.

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Grosso modo, a redefinição do papel do Estado na economia e atentativa de reduzir os gastos públicos na área social — tarefa esta nemsempre bem sucedida — foram as duas saídas mais comuns à crise dasdimensões econômica e social do antigo tipo de Estado. Para responder aoesgotamento do modelo burocrático weberiano, foram introduzidos, em largaescala, padrões gerenciais na administração pública, inicialmente e com maisvigor em alguns países do mundo anglo-saxão (Grã-Bretanha, EstadosUnidos, Austrália e Nova Zelândia), e depois, gradualmente, na Europa conti-nental e Canadá. É neste último ponto — a passagem do modelo weberianopara o gerencial — que se concentra a discussão deste trabalho.

Focalizo, primordialmente, o processo de surgimento e posteriordesenvolvimento do modelo gerencial (managerialism ou public manage-ment) no campo da administração pública, analisando seus limites e potencia-lidades, bem como se ele pode ser considerado um novo paradigma mundial.

Vale a pena fazer três observações antes de entrar nos pontos maisespecíficos do artigo. Embora tenha surgido em governos de cunhoneoliberal (Thatcher e Reagan), o modelo gerencial e o debate em tornodele não podem ser circunscritos apenas a este contexto. Pelo contrário,toda a discussão sobre a utilização do managerialism na administraçãopública faz parte de um contexto maior, caracterizado pela prioridade dadaao tema da reforma administrativa, seja na Europa ocidental (CASSESE,1989), seja no Leste europeu ou ainda no Terceiro Mundo (CAIDEN, 1991;KAUL & COLLINS, 1995). O modelo gerencial e suas aplicações foram eestão sendo discutidos em toda parte. Modelos de avaliação dedesempenho, novas formas de controlar o orçamento e serviços públicosdirecionados às preferências dos “consumidores”, métodos típicos domanagerialism, são hoje parâmetros fundamentais a partir dos quaisdiversos países, de acordo com as condições locais, modificam as antigasestruturas administrativas.

Aos que discordam totalmente do modelo gerencial, preferindo aténem discuti-lo, vai aqui a segunda observação. O fato incontestável nodebate internacional sobre administração pública, considerado mesmo poraqueles que são ferrenhos críticos do managerialism, é que o modeloburocrático weberiano não responde mais às demandas da sociedade con-temporânea (POLLITT , 1990). Voltado cada vez mais para si mesmo, omodelo burocrático tradicional vem caminhando para o lado contrário dosanseios dos cidadãos. É a partir deste processo que o modelo gerencialcomeça a preencher um vácuo teórico e prático, captando as principaistendências presentes na opinião pública, entre as quais se destacam o con-trole dos gastos públicos e a demanda pela melhor qualidade dos serviçospúblicos.

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Mas há ainda uma última observação que reforça a importância de seestudar as mudanças recentes na Administração Pública. Ao invés de seconstituir em uma doutrina rígida e fechada, o managerialism temapresentado um grande poder de transformação, incorporando as críticas àsua prática, e assim modificando algumas peças de seu arcabouço. Mais doque isso: as atuais transformações apontam para uma pluralidade deconcepções organizacionais que ultrapassam o mero gerencialismo, de modoque não existe um paradigma global capaz de responder, tal qual uma “receitade bolo”, a todos os problemas enfrentados pela crise do modelo burocráticoweberiano (HOOD, 1996).2

Neste contexto de pluralidade de concepções organizacionais, caberessaltar que foi o modelo gerencial, inicialmente em sua forma pura, opropulsor das primeiras mudanças no modelo burocrático weberiano.Somam-se a isso a força e a centralidade das propostas do managerialism,hegemônico em termos teóricos e práticos no atual estágio do debate acercadas reformas administrativas. O que não quer dizer que o modelo gerencialnão tenha limites e fraquezas. De fato ele tem muitas, e tento, no curtoespaço deste artigo, discuti-las, até porque é das insuficiências deste modeloque nascem novas práticas, as quais também se distanciam do antigo padrãoburocrático. Trata-se, em suma, de reconstruir o setor público sob bases pós-burocráticas, bases estas que encontram no managerialism um de seusprincipais fundamentos.

Este artigo está estruturado da seguinte maneira. Inicialmente façoum histórico das condições que propiciaram a ascensão do modelogerencial, focalizando a experiência anglo-americana. Em seguida,descrevo as principais características do managerialism, comparando-ascom as peças do antigo modelo weberiano. Adiante, concentrando-me maisna análise do caso inglês, mostro como ao longo da década de 80 eprincípio da de 90 o modelo gerencial foi se modificando. Como resultadodesta evolução, constato a existência, em termos típicos ideais, de trêstendências básicas: o modelo gerencial puro, o consumerism e o PublicService Orientation (PSO).

Continuo a discussão analisando a experiência americana atual e suaenorme influência no debate dentro do managerialism, concentrando-me,basicamente, no livro de David Osborne e Ted Gaebler (OSBORNE & GAEBLER,1994), Reinventando o Governo, que se tornou uma das peças-chave doprograma de governo do presidente Bill Clinton. Neste tópico, fica clara amodificação nos parâmetros iniciais do modelo gerencial.

Na conclusão, traço, em primeiro lugar, um perfil das principaismudanças administrativas que têm afetado o setor público em escala global.Depois, à luz da experiência internacional, faço um brevíssimo comentáriosobre o caso brasileiro.

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II. Condições materiais e intelectuais para osurgimento do modelo gerencial

Desde o final da década de 70, a reforma do Estado se tornou umapalavra de ordem em quase todo o mundo. O antigo consenso social arespeito do papel do Estado perdia forças rapidamente, sem nenhumaperspectiva de retomar o vigor. A introdução do modelo gerencial no setorpúblico faz parte deste contexto. Mas quais foram as condições materiais eintelectuais que permitiram esta mudança?

Em linhas gerais, quatro fatores sócio-econômicos contribuíramfortemente para detonar a crise do Estado contemporâneo. O primeiro foi acrise econômica mundial, iniciada em 1973, na primeira crise do petróleo, eretomada ainda com mais força em 1979, na segunda crise do petróleo. Ofato é que a economia mundial enfrentou um grande período recessivo nosanos 80 e nunca mais retomou os níveis de crescimento atingidos nasdécadas de 50 e 60. Neste momento de escassez, o Estado foi o principalafetado, entrando numa grave crise fiscal.

A crise fiscal foi o segundo fator a enfraquecer os alicerces doantigo modelo de Estado. Após ter crescido por décadas, a maioria dosgovernos não tinha mais como financiar seus déficits. E os problemas fiscaistendiam a se agravar na medida em que se iniciava, sobretudo nos EstadosUnidos e na Grã-Bretanha, uma revolta dos taxpayers (contribuintes) contraa cobrança de mais tributos, principalmente porque não enxergavam umarelação direta entre o acréscimo de recursos governamentais e a melhoriados serviços públicos. Estava em xeque o consenso social que sustentara oWelfare State.

Os governos estavam, ainda, sobrecarregados de atividades —acumuladas ao longo do pós-guerra —, “com muito a fazer e com poucosrecursos para cumprir todos os seus compromissos” (PETERS, 1992: 305).Além disso, os grupos de pressão, os clientes dos serviços públicos e todosos beneficiários das relações neocorporativas então vigentes não queriamperder o que, para eles, eram conquistas — e que para os neoliberais eramgrandes privilégios. O terceiro fator detonador da crise do Estadocontemporâneo, portanto, se constituía naquilo que a linguagem da épocachamava de situação de “ingovernabilidade”: os governos estavam inaptospara resolver seus problemas (HOLMES & SHAND, 1995: 552).

Por fim, a globalização e todas as transformações tecnológicas quetransformaram a lógica do setor produtivo também afetaram — eprofundamente — o Estado. Na verdade, o enfraquecimento dos governospara controlar os fluxos financeiros e comerciais, somado ao aumento do

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poder das grandes multinacionais resultou na perda de parcela significativado poder dos Estados nacionais de ditar políticas macroeconômicas.

Esta crise do Estado afetou diretamente a organização das burocraciaspúblicas. Por um lado, os governos tinham menos recursos e mais déficits.Com efeito, o corte de custos virou prioridade. No que tange à AdministraçãoPública isto teve dois efeitos. Primeiro, a redução dos gastos com pessoal eravista como uma saída necessária — os discursos das administrações deThatcher e Reagan representaram o ponto máximo desta tendência. Segundo,era preciso aumentar a eficiência governamental, o que implicava, para boaparte dos reformadores da década de 80, uma modificação profunda do modeloweberiano, classificado como lento e excessivamente apegado a normas —leia-se: o modelo weberiano era ineficiente.

Por outro lado, o Estado contemporâneo vinha perdendo seu poderde ação, especialmente se levarmos em conta os problemas da “governabili-dade” (governos sobrecarregados) e os efeitos da globalização. Portanto,surgia naquele momento não só um Estado com menos recursos; era umEstado nacional com menos poder. Para enfrentar esta situação, o aparatogovernamental precisava ser mais ágil e mais flexível, tanto em sua dinâmicainterna como em sua capacidade de adaptação às mudanças externas.

Corte de gastos — inclusive de pessoal —, aumento da eficiência eatuação mais flexível do aparato burocrático, tudo isto estava contido nacartilha do modelo gerencial, tal como era proposto pelos reformadores docomeço da década de 80. O managerialism substituiria o modelo weberiano,introduzindo a lógica da produtividade existente no setor privado. Noentanto, as condições materiais não eram suficientes para sustentar a defesado managerialism. Havia também um contexto intelectual extremamentefavorável às mudanças na Administração Pública.

A ascensão do teorias extremamente críticas às burocracias estatais,como o public choice nos Estados Unidos e o ideário neoliberal hayekiano(principalmente na Grã-Bretanha), abriu espaço para o avanço do modelogerencial como referência ao setor público. Mas a visão negativa a respeito daburocracia não se vinculava apenas a teorias intelectualmente mais elaboradas.De uma forma avassaladora, a perspectiva do senso comum contra a burocracia,normalmente anedótica, se expandia rapidamente no final da década de 70 e nocomeço da de 80. Nos Estados Unidos, o sentimento antiburocrático tomava aforma, na definição de Kaufman (1981), de uma epidemia generalizada.

Contribuía ainda mais para piorar a imagem da burocracia o fato deela ser classificada, à época, muito mais como um grupo de interesse do quecomo um corpo técnico neutro a serviço dos cidadãos. O thatcherismo seaproveitou bastante desta situação. Rayner, um dos seus principais ideólogos,dizia que “a ‘burocracia’ tem muitos amigos” (RAYNER, 1984: 8-9), uma

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alusão às relações clientelistas e corporativas mantidas pelo corpoburocrático.

Ao sentimento antiburocrático juntava-se a crença, presente em boaparte da opinião pública, de que o setor privado possuía o modelo ideal degestão. A administração das empresas privadas tinha uma ótima reputação,apesar dos vários escândalos ocorridos no final da década de 70 —bancarrotas, corrupção (CAIDEN, 1991: 24). Não por acaso, MargarethThatcher levou ao governo um administrador do setor privado (DereckRayner) para comandar seu plano de reforma administrativa.3

Mas este sentimento difuso contrário à burocracia estatal e favorávelaos ideais da iniciativa privada precisou de um catalisador político para seimpor. A vitória dos conservadores na Grã-Bretanha, em 1979, e dosrepublicanos nos Estados Unidos, em 1980, representou a vitória dos gruposque contestavam o antigo consenso social pró-Welfare State.

Foi neste contexto de escassez de recursos públicos, enfraquecimentodo poder estatal e de avanço de uma ideologia privatizante que o modelogerencial se implantou no setor público. Coube aos conservadores ingleses eaos republicanos americanos a iniciativa nesse sentido, introduzindo, numprimeiro momento, um modelo gerencial puro, em que prevalecia o ângulomeramente economicista (“cortar custos” como fim último) e o desconheci-mento da especificidade do setor público. Ao longo dos últimos quinze anos,entretanto, o managerialism sofreu um contínuo processo de transformação,como veremos a seguir. Da inicial perspectiva conservadora, o debate referenteao modelo gerencial tem avançado por terrenos cada vez mais dominados pelastemáticas republicana e democrática.

III. O desenvolvimento do modelo gerencial no setorpúblico: a experiência anglo-americana

Os conceitos do managerialism invadiram o setor público dosEstados Unidos e da Grã-Bretanha a partir da eleição dos governosconservadores. Era, inicialmente, uma maneira bem particular de se utilizaros instrumentos do modelo gerencial, por meio daquilo que chamo degerencialismo puro, mais direcionado à redução de custos e ao aumento daeficiência e produtividade da organização, como explicarei mais adiante. Ofato é que, naquele momento, as modificações no setor público estavamvinculadas a um projeto de reforma do Estado, caracterizado como ummovimento de retração da máquina governamental a um menor número de

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atividades. A palavra de ordem da primeira-ministra inglesa era “rolling backthe state”, o que na prática significou a privatização de empresas nacionali-zadas no pós-guerra, desregulamentação, devolução de atividades governa-mentais à iniciativa privada ou à comunidade e as constantes tentativas dereduzir os gastos públicos (CAIDEN, 1991: 75-80; BUTLER, 1993: 398-399).

Mas nos últimos anos o modelo gerencial não tem sido somenteutilizado como mecanismo para reduzir o papel do Estado. O managerialismse acoplou, dentro de um processo de defesa da modernização do setor públi-co, a conceitos como busca contínua da qualidade, descentralização e avaliaçãodos serviços públicos pelos consumidores/cidadãos. Portanto, há atualmentemais de um modelo gerencial; ou, melhorando a argumentação, no embate deidéias proporcionado pela introdução do managerialism na administraçãopública surgiram diversas respostas à crise do modelo burocrático weberiano,todas defendendo a necessidade de se criar um novo paradigma organizacional.

Na Grã-Bretanha havia um denominador comum no confronto entreas teorias de Administração Pública: o modelo burocrático Whitehall, quefuncionava de forma similar ao weberiano, e que tinha vigorado por décadas,não dava mais conta dos problemas do serviço público inglês. O modelogerencial puro foi o primeiro a apresentar, na prática, alternativas paramodernização do setor público. Ao longo dos últimos anos, outras teoriasapareceram, botando de cabeça para baixo os conceitos do modelo deWhitehall.

Na tabela abaixo, comparo as três visões da administração públicainglesa que surgiram do debate sobre o managerialism aplicado ao governo.Comparo-as, mais especificamente, quanto aos principais objetivos (linha 2)e na sua relação com a sociedade, ou melhor, com seus públicos-alvos (linha3). As teorias estão aqui separadas, da esquerda para a direita do quadro, emordem cronológica de criação.

Quadro I

Respostas à crise do modelo burocrático inglês (Whitehall)

Modelo gerencial puro Consumerism Public Service Orientation

Economia/Eficiência Efetividade/Qualidade Accountability/Eqüidade (Produtividade)

Taxpayers (contribuintes) Clientes/Consumidores Cidadãos

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Em primeiro lugar, é preciso ficar claro que fiz uma rígida divisãoentre as teorias apenas para facilitar a comparação entre elas. Na realidade,há um grau razoável de intercâmbio entre as teorias, principalmente no casodas duas últimas (consumerism e public service orientation). Existem atéautores que não se enquadram exatamente nesta classificação. Ademais, estaclassificação não vale para os autores americanos aqui estudados (BARZELAY,1992; OSBORNE & GAEBLER, 1994).

Entretanto, como ponto de partida para a discussão, estaclassificação traz duas importantes constatações. A primeira, e mais óbvia, éque há uma modificação substancial ao longo do tempo, do gerencialismopuro ao public service orientation. A constatação mais importante, noentanto, é que embora haja diferenças entre as teorias, elas não sãomutuamente excludentes. Ao contrário, o que se percebe é que há umaincorporação dos aspectos positivos de cada teoria. A passagem de umateoria a outra é realizada através de uma crescente inclusão de temas.

Como é, então, que ocorreram estas modificações no modelogerencial (ou a partir dele)? É o que mostrarei a seguir.

1. O modelo gerencial puro

O modelo gerencial puro foi o primeiro a ser implantado no casoinglês, como também ocorreu, com algumas ligeiras modificações, naexperiência americana do governo Reagan. Porém, algumas tentativasanteriores de implantar o modelo gerencial tinham ocorrido.

No caso inglês, o relatório da Comissão Fulton, que funcionou de1966 a 1968, já enumerava alguns dos problemas existentes no modeloburocratizado do Whitehall. No diagnóstico apresentado, eram destacadas afalta de preparação gerencial do civil service britânico, a excessiva hierarqui-zação e a falta de contato entre os burocratas e a comunidade que elesserviam (DREWRY & BUTCHER, 1991: 51-54). Sobretudo os dois primeirospontos influenciaram a reforma implementada posteriormente por Thatcher.

Mas havia antecedentes de propostas gerenciais não só na Grã-Bretanha. No Canadá, por exemplo, houve a Comissão Glassco (1961-1963),que, inclusive, foi montada antes da Comissão Fulton. Com uma clara visãogerencial, a Comissão Glassco questionava todos os conceitos administrati-vos tradicionais (CAIDEN, 1991: 56). Outro antecedente importante, e que épouco discutido na literatura, é o das comissões e organismos internacionaisque nas décadas de 60 e 70 propunham reformas administrativas para os

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países em desenvolvimento, defendendo a implantação de um modelo menosburocratizado e com instrumentos gerenciais (CAIDEN, idem: 54).

Todavia, é nos Estados Unidos que a discussão gerencial tem maistradição. O debate entre o Public Service orientation versus o PublicManagement orientation existe desde o século passado (MARTIN, 1993),quando Woodrom Wilson escreveu seu célebre artigo (The study of admin-istration), em 1887, defendendo a separação entre a política e aadministração. O modelo gerencial, no entanto, não conseguiu se tornarhegemônico nos EUA, principalmente porque a burocracia americana foisendo edificada, ao longo do século XX, para evitar a interferência daspolíticas de patronagem que eram comuns no final do século XIX. Por isso,a opção preferencial foi por um modelo que preservasse a neutralidade e aimpessoalidade do Estado, características estas que eram centrais no tipoburocrático weberiano.

A discussão gerencial renasce com vigor nos Estados Unidos dentrodo debate orçamentário travado ao longo da década de 70. Já nos anos 60 oproblema do controle mais racional dos gastos públicos ganhava importância,como demonstrara o presidente Lyndon Johnson ao introduzir o PlanningProgramming Budget (PPB) em todas as agências do governo federal(CARTER, KLEIN & DAY, 1992: 7). Mas foi na década seguinte que a questão setornou mais premente. Isto porque era um momento em que não só o Estadodemonstrava estar entrando em uma crise fiscal estrutural, mas em que houvetambém o aumento de exemplos de má gestão pública — sobretudo o dabancarrota da prefeitura de Nova York — que apontavam para a necessidadeurgente de se reformular, em termos gerenciais, as finanças públicas.

E é sob o signo da questão financeira, tanto nos Estados Unidos como naGrã-Bretanha, que o modelo gerencial puro foi implantado. O managerialismseria utilizado no setor público para diminuir os gastos em uma era de escassez epara aumentar a eficiência governamental. Em suma, o gerencialismo puro tinhacomo eixo central o conceito de produtividade (POLLITT, 1990: 2). Não poracaso um dos livros fundamentais àquela época chamava-se “Fazendo mais commenos” (Doing more with less) — UKELES, 1982.

O primeiro passo do modelo gerencial puro foi procurar cortar cus-tos e pessoal. Neste caso, o governo britânico foi muito mais bem sucedidodo que o americano. O governo Reagan de fato não conseguiu reduzir osgastos sociais — ao contrário, naquele período eles cresceram 16% comrelação ao PIB (POLLITT, 1990: 90). Pouco também foi feito em termos decorte de pessoal. O grande triunfo dos republicanos no sentido de atenuar osproblemas financeiros do governo federal foi diminuir as transferências derecursos para os estados e os diversos poderes locais (POLLITT, idem: 96).Desta forma, os governos subnacionais se viram com menos recursos e

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tiveram, portanto, que inovar em suas administrações. Conseqüentemente, asprincipais tentativas de elaborar um novo paradigma para a gestão públicaamericana surgiram a partir do estudo das experiências dos governos locais,como mostrarei mais adiante.

O sucesso britânico em cortar gastos públicos, no entanto, tem deser relativizado. Os principais cortes efetuados ocorreram no civil service(que reúne a maior parte dos funcionários do Poder Central) e no total deempregados das empresas estatais (em conseqüência das privatizações),como mostra a Tabela II. Já no importante contingente de servidores doNational Health Service (NHS), não houve redução de funcionários noperíodo 1978-1990, mas sim, um pequeno incremento. Aconteceu, ainda,uma ínfima redução da burocracia sediada no poder local. O que se podedizer, portanto, é que o governo Thatcher teve imensa dificuldade de cortaros funcionários da área social, assim como de reduzir o efetivo que atua na“ponta” do sistema, no âmbito local.

O ponto central do modelo gerencial puro é a busca da eficiência.Para tanto, parte do pressuposto de que é preciso modificar as engrenagensdo modelo weberiano. A burocracia tradicional (Whitehall para os ingleses)é definida como uma organização com estrutura rígida e centralizada, voltadaao cumprimento dos regulamentos e procedimentos administrativos e em queo desempenho é avaliado apenas com referência à observância das normaslegais e éticas. Contra essa visão de administração pública, o governoThatcher propunha:

a) definição clara das responsabilidades de cada funcionário dentrodas agências governamentais (BUTLER, 1993: 399);

b) clara definição dos objetivos organizacionais, analisados em suasubstância e não enquanto processo administrativo;

c) aumento da consciência a respeito do “valor dos recursos”(value money) públicos, procurando maximizar a relação financeira entreos recursos iniciais e os gastos realizados para a produção de políticas, ouseja, incorporando o valor da eficiência na lógica de funcionamento daburocracia.

Para cumprir cada um destes objetivos foram implementadosdeterminados instrumentos gerenciais. No primeiro momento foi dada maioratenção aos instrumentos de racionalização orçamentária, que deveriampossibilitar a incorporação de uma maior “consciência dos custos” (costconsciousness) no serviço público (METCALFE & RICHARDS, 1989: 50). Astécnicas de avaliação de desempenho e controle orçamentário foram usadaspara atingir este fim. A principal iniciativa neste sentido foi o FinancialManagement Iniciative (FMI).4

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Tabela I Evolução do quadro de pessoal na Grã-Bretanha (base mil)

1 7 8 8 8 8 8 8 8 8 8 8

978-79 9-80 0-81 1-82 2-83 3-84 4-85 5-86 6-87 7-88 8-89 9-90

Civil Service 7 7 6 6 6 6 6 5 5 5 5 5

34 19 97 78 58 36 21 97 98 87 74 67

Forças 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 Armadas

26 30 35 41 34 33 36 34 31 28 24 19

NHS

9 9 9 9 1 1 9 9 9 9 9 9

23 43 79 98 9 9 98 93 81 76 77 68

2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2

11 10 7 5 10 10 7 7 7 4 6 5

2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2

194 202 218 222 211 189 162 131 117 95 81 59

2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2

325 368 343 306 274 300 320 326 352 377 379 269

1 1 1 1 1 1 1 1 1 8 7 7

843 818 785 656 538 444 396 124 49 56 81 9

2 2 2 1 1 1 1 1 1 1 1 1

3 4 5 90 85 85 81 17 26 18 18 9

6 6 6 6 6 6 6 5 5 5 5 5

565 592 551 374 208 118 59 698 644 446 369 146

Fonte: Baseado em CLARKE (1993: 5)

Fundamentais em um momento de escassez de recursos, estastécnicas orçamentárias deram impulso à implementação das outras reformasadministrativas (CAIDEN, 1991: 85). Depois foram adotados, em larga escala,os instrumentos de avaliação de desempenho organizacional. Afinal, se o

Total doGovernoCentral

Total local

Indústriasnacionalizadas

Total do setorpúblico

EmpresasPúblicas

(NationalHealth Service)

OutrosSetores doGoverno Central

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objetivo era alcançar uma maior eficiência, havia a necessidade de se termecanismos objetivos de mensuração da performance governamental. Entreestes mecanismos utilizados, um bom exemplo é o chamado escrutínio deRayner, concebido pelo condutor das reformas de Thatcher para conhecer osprincipais problemas da administração pública e definir critérios demensuração de eficiência (METCALFE & RICHARDS, 1989: 26).

O governo inglês adotou três mecanismos para definir claramente asresponsabilidades, tanto das agências governamentais como dos funcionáriospúblicos. No âmbito organizacional, duas saídas institucionais foramencontradas. A primeira foi a adoção da Administração por Objetivos (Man-agement by Objectives), pela qual se procurou traçar linhas claras de ação àsagências, o que tornaria possível uma avaliação de desempenho baseada nacomparação entre os resultados obtidos e o que fora previamentedeterminado.

A descentralização administrativa constituiu-se em uma outra opçãoorganizacional importante. Seu objetivo precípuo foi aumentar a autonomiadas agências e dos departamentos. É importante notar que a descentralizaçãoera concebida a partir de uma definição clara dos objetivos de cada agência,os quais deveriam ser cumpridos sob a vigilância e controle do Poder Cen-tral. Desta forma, apesar da propaganda governamental favorável àdescentralização, o que acontecia era uma desconcentração de poderes.

À estrutura extremamente hierárquica característica do modeloWhitehall foi contraposto um modelo em que se procurava delegarautoridade (empowerment) aos funcionários. Dentro do contexto da culturagerencial, era preciso criar mais gerentes, com habilidade e criatividade paraencontrar novas soluções, sobretudo para aumentar a eficiênciagovernamental. Assim, a delegação de autoridade era uma resposta noprimeiro momento institucional, e que com o tempo poderia transformar acultura da burocracia.

Mas, ao enfatizar em demasia a estratégia da eficiência, o modelogerencial puro poderia estar jogando para segundo plano outros valoresfundamentais na atuação dos gerentes. Em particular, a flexibilidade paradecidir e inovar. Os critérios de medição da eficiência poderiam se tornartão rígidos e portanto ineficazes, nos termos do managerialism — quantoàs regras e procedimentos do modelo burocrático weberiano.

METCALFE e RICHARDS (1989: 62-63) estabelecem uma importantediferença entre a eficiência operacional e a adaptativa, que refina o debatesobre a avaliação de desempenho das organizações. O primeiro tipo deeficiência é vinculado ao incremento da “consciência dos custos” e portantodeve estar atrelado a uma rígida especificação de objetivos e controles. A

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eficiência adaptativa, por sua vez, responde ao critério da flexibilidade, sendoútil a instituições que sofrem processos de mudança.

Diante da atual realidade do Estado contemporâneo, pressionado pelaglobalização e pelas mudanças tecnológicas, com menos poder e recursos, defato a eficiência adaptativa é um valor mais importante para a administraçãopública, capaz de dotá-la da flexibilidade necessária para responder melhor àsdemandas internas e externas. O aumento da “consciência de custos”,resultado da eficiência operacional, também é importante, porém limitado sefor um objetivo em si mesmo.

O enfoque apenas da eficiência governamental possui outroproblema: a avaliação da efetividade dos serviços públicos não recebe adevida importância. Efetividade é entendida aqui como o grau em que seatingiu o resultado esperado (OSBORNE & GAEBLER, 1994: 381). Portanto, aefetividade não é um conceito econômico — como a eficiência pura — masde avaliação qualitativa dos serviços públicos.

Recupera-se, com o conceito de efetividade, a noção de que ogoverno deve, acima de tudo, prestar bom serviços. É a ótica da qualidade quecomeça a ser incorporada pelo modelo gerencial, como discutiremos napróxima seção. A valorização do conceito de efetividade também traznovamente à tona o caráter político da prestação dos serviços públicos, umavez que são os usuários dos equipamentos sociais que de fato podem avaliar aqualidade dos programas governamentais. E aqui enfocamos um doscalcanhares de Aquiles do modelo gerencial puro: a subestimação doconteúdo político da administração pública.

Em sua perspectiva inicial, o modelo gerencial era proposto como umatecnologia neutra destinada a modificar o funcionamento e a cultura do setorpúblico (GRAY & JENKINS, 1995: 81). Desta maneira, alguns gerencialistas maisradicais afirmavam que não existe diferença conceitual entre a administraçãoda empresa privada e a administração pública (MURRAY, 1975). Outrosaceitavam que há determinadas diferenças entre ambas; contudo, propunhamreformas ao setor público como se ele fosse uma organização homogênea — aburocracia vista caricaturalmente. O fato é que a administração pública seconstitui num sistema organizacional em que, internamente, há diferentestarefas e valores pertencentes a um contexto complexo de relações com aesfera política, a qual nunca pode ser negligenciada, pois caso isso ocorra,aumenta a possibilidade de os processos de reforma administrativa fracassarem(GRAY & JENKINS, idem: 85).

O modelo gerencial puro, na verdade, tem como base a separaçãoentre a política e a administração. Assim, caberia aos reformadores implantaro managerialism na administração pública independentemente do que ocorrena política. Essa perspectiva, entretanto, contradiz o próprio desenvolvi-

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mento do modelo gerencial na Grã-Bretanha, pois foi o forte apoio políticoobtido pelos conservadores que propiciou o avanço das reformas. Ao longodas décadas de 80 e 90 os integrantes do governo inglês enfrentaramdificuldades políticas, e somente a reconstrução da base de apoio àsmudanças ou a reformulação, ainda que parcial, das propostas puderam re-mover os obstáculos.

Em termos comparativos, para reforçar a argumentação acima bastalembrar de outra tentativa de reforma baseada no gerencialismo puro quefracassou sobretudo por razões políticas. Trata-se da experiência americanano período Reagan. Michel Crozier demonstra claramente que foram osobstáculos existentes no âmbito do Congresso, por um lado, e os erros daestratégia de negociação, por outro, as causas responsáveis pelo malogro daimplementação do modelo gerencial puro naquele país (CROZIER, 1992: 125-133). A experiência latino-americana recente igualmente dá base a essahipótese, visto que as reformas administrativas mais bem sucedidasdependeram fortemente de apoio político e construção de novos incentivosinstitucionais (HAGGARD, 1996).

Gerald Caiden observa, ademais, que as reformas administrativasapoiadas em técnicas gerenciais não servem apenas ao aumento per se dodesempenho organizacional. As reformas devem melhorar a performance dosetor público de acordo com objetivos públicos, ou seja, politicamentedefinidos (CAIDEN, 1991: 30).

Os gerencialistas puros, por fim, não consideraram que aespecificidade do setor público dificulta a mensuração da eficiência e aavaliação do desempenho tal qual ocorre na iniciativa privada. Na gestãopública, estão em jogo valores como eqüidade e justiça que não podem sermedidos ou avaliados por intermédio dos conceitos do managerialism puro(MAYORDOMO, 1990: 278-280).

Esta “despolitização” da administração pública, aliada à ênfase noconceito de eficiência governamental, fez com que Christopher Pollitt(1990), um dos maiores críticos do modelo gerencial inglês, classificasse omanagerialism como um “neotaylorismo”, isto é, uma proposta calcada nabusca da produtividade e na implantação do modelo de gestão da empresaprivada no setor público.

Pollitt reconhece, no entanto, que o modelo gerencial puro obtevealguns êxitos. O principal deles é que a ênfase na questão financeira de fatoelevou a consciência da burocracia inglesa sobre os custos das políticaspúblicas (POLLITT, 1990: 85). Este valor foi incorporado por todos os gover-nos que têm realizado reformas administrativas nos últimos anos. Isto mostraque a busca da eficiência governamental, embora em si não resolva todos osproblemas da burocracia, é um legado positivo do modelo gerencial puro.

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A discussão em torno do modelo gerencial se tornou complexa eganhou novos rumos a partir da metade da década de 80. Basicamente, duastransformações foram operadas no gerencialismo puro. Uma ligada àdinâmica intra-organizacional, priorizando os conceitos da flexibilidade,planejamento estratégico e qualidade. A outra transformação foi mais radicale muito mais importante para remodelar o managerialism. Trata-se daadoção de serviços públicos voltados para os anseios dos clientes/consumi-dores. É neste ponto que o modelo gerencial traz à tona o aspecto público daadministração pública, sem no entanto abandonar o conceitual empresarialvinculado à eficiência e à busca da qualidade dos serviços.

2. Novos caminhos do modelo gerencial: flexibilidade de

gestão, qualidade dos serviços e prioridade às demandas do

consumidor (consumerism)

As críticas mais pertinentes feitas ao modelo gerencial puro na Grã-Bretanha buscavam não a volta ao modelo burocrático weberiano, mas sim acorreção do managerialism no sentido de incorporar novos significados. Aênfase na flexibilidade da gestão foi uma das mudanças introduzidas.

A estratégia da eficiência, se levada às últimas conseqüências, podepetrificar a ação do gerente público, tal como mostramos no item anterior. Ocaso do Orçamento público é paradigmático. O estrito enfoque no controleorçamentário dificulta a adaptação a alterações que impliquem umredirecionamento do gasto público. No limite, a ótica da eficiência acreditaque há uma solução racional única para os problemas orçamentários. Noentanto, como bem observam METCALFE e RICHARDS (1989: 303), “oorçamento público é um problema contínuo sem uma solução permanente”.

No caminho da flexibilização da gestão pública, também podemoscitar a passagem da lógica do planejamento para a lógica da estratégia (CRO-ZIER, 1992: 93). Na primeira, prevalece o conceito de plano, o qualestabelece, a partir de uma racionalidade técnica, o melhor programa a sercumprido. Já na lógica de estratégia, são levadas em conta as relações entreos atores envolvidos em cada política, de modo a montar cenários quepermitam a flexibilidade necessária para eventuais alterações nos programasgovernamentais.

A utilidade da lógica de estratégia vai além da confecção dosprogramas governamentais. O contexto maior da reforma administrativa sebeneficia igualmente do conceito de estratégia, sobretudo porque a maioria

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dos Estados contemporâneos passa por três grandes crises: a fiscal; adecisória, uma vez que o quadro institucional mais atrapalha do que favorecea implementação de reformas; e, por fim, a de confiança, pois a populaçãodesconfia, cada vez mais, dos governos e de suas políticas. É neste ambienteque Michel Crozier propõe a utilização da estratégia, que não leva só emconta os objetivos dos programas e das reformas propostas, masprincipalmente requer um acompanhamento das reações da sociedade e dosfuncionários públicos frente às ações do governo (CROZIER, idem: 93-94).5

A busca da qualidade dos serviços públicos é outro conceito que omodelo gerencial vem incorporando. Desde a metade da década de 80, ogoverno britânico vem se utilizando do referencial da qualidade na avaliaçãode resultados das agências e dos programas. Isto ocorreu, em primeiro lugar,por causa das críticas contra a ênfase dada inicialmente à mensuração daeficiência e não da efetividade dos serviços públicos. Neste sentido, NormanFlynn afirma que “a imposição arbitrária da diminuição dos custos podeconduzir mais à redução do nível (de qualidade) dos serviços do que a umaumento de produtividade” (FLYNN, 1990:113).

É interessante notar que mesmo no setor privado houve, ao longo dadécada de 80, uma modificação no que se refere à antiga visão meramentequantitativa de avaliar o sucesso e o desempenho dos empregados e daorganização. Foi na iniciativa privada que nasceu a abordagem daadministração da qualidade total (Total Quality Management — TQM), queposteriormente foi introduzida no setor público. Nas empresas privadas, arazão da mudança foi o aumento da concorrência e do nível de exigência dosconsumidores. Desta maneira, os empresários tiveram que elevar a qualidadede seus produtos para sobreviver no mercado. Portanto, a busca permanenteda qualidade tem uma relação direta com o direcionamento da produção paraos anseios dos consumidores.

No setor público aconteceu um fenômeno semelhante. A introduçãoda perspectiva da qualidade surgiu quase no mesmo momento em que aadministração pública voltava suas atenções aos clientes/consumidores. Essatalvez tenha sido uma das principais revoluções no modelo gerencial. SueRichards, importante especialista na área de Public Management, acreditainclusive que houve uma mudança de paradigma com a recente ênfase dadapelo setor público às preferências do consumidor.

Para Richards, depois da Segunda Guerra mundial surgiram doisparadigmas na administração pública. O primeiro foi aquele vinculado à visãopolítica da burocracia, que deveria estar atrelada à consecução de objetivospoliticamente determinados. Esse primeiro paradigma, a meu ver, é o modeloburocrático weberiano. O segundo paradigma foi o da eficiência, associado,sobretudo, aos métodos gerenciais do setor privado — tal como foram

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aplicados pelo modelo gerencial puro. O novo paradigma, na opinião deRichards, resultaria da síntese entre os antigos valores do serviço público(ou do modelo weberiano) e a orientação para uma melhor performance dosetor público como um todo. Em suma, seria uma perspectiva voltada àsatisfação do público, intitulada paradigma do consumidor (consumer para-digm) (apud CLARKE, 1993: 7).

De fato, a administração pública inglesa vem implementando umaestratégia direcionada cada vez mais às demandas dos consumidores. Umimportante organismo do governo britânico, o Local Government TrainingBoard, definiu qualidade como aquilo que dá a satisfação ao consumidor.Além disso, esse mesmo órgão fez uma lista dos passos necessários paragarantir a qualidade do serviço público, na qual o conhecimento dasnecessidades dos consumidores estava no topo (apud CLARKE, idem: 16).

Mas o programa do governo inglês mais importante no sentido depriorizar o consumidor é, sem dúvida, o Citizen’s Charter. Baseado noprincípio de que os serviços públicos devem estar mais direcionados àsnecessidades definidas pelo público diretamente afetado (BUTLER, 1993:402), o Citizen’s Charter consiste na implantação de programas de avaliaçãode desempenho organizacional de acordo com dados recolhidos juntos aosconsumidores. A importância do programa aumenta na medida em que eletem sido uma das referências da atual gestão do primeiro-ministro JohnMajor, que, na defesa do Citizen’s Charter, disse que os “serviços públicostêm o dever especial de responder às necessidades dos seus consumidores eclientes” (CLARKE, 1993: 24).

A estratégia voltada à satisfação dos consumidores é reforçada pelogoverno britânico através da adoção de três medidas que fazem parte de umaestratégia para tornar o poder público mais leve, ágil e competitivo, desmon-tando assim o antigo modelo burocrático. A primeira dessas medidas é adescentralização. Como já afirmei anteriormente, na Grã-Bretanha ocorre umadescentralização administrativa (desconcentração) e não uma verdadeira des-centralização política. Não obstante, tem ocorrido uma significativa delegaçãode autoridade, partindo do princípio de quanto mais próximo estiver o serviçopúblico do consumidor, mais fiscalizado pela população ele o será.

A descentralização, no entanto, não basta para aumentar o poder doconsumidor. É preciso que haja opções caso determinado equipamento socialnão esteja funcionando a contento. Neste sentido, o governo britânico temprocurado incrementar a competição entre as organizações do setor público.Quando não há competição entre os serviços, existe uma situação de monopólioe, portanto, os consumidores não têm alternativa de escolha. O Citizen’s Charterenfatiza muito este aspecto, estabelecendo uma relação lógica entre a competiti-vidade e o aumento da qualidade dos serviços públicos (CLARKE, idem: 24).

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A terceira medida é a adoção de um novo modelo contratual para oserviços públicos. Esse modelo possui três dimensões (CLARKE, idem: 20):

a) Extensão das relações contratuais no fornecimento de serviçospúblicos entre o setor público, o setor privado e o voluntário/não lucrativo,criando uma nova estrutura de pluralismo institucional, contraposta ao antigomodelo de monopólio estatal;

b) Extensão das relações contratuais para dentro do setor público,envolvendo descentralização, delegação e mecanismos de quasi market;

c) Desenvolvimento de contratos de qualidade entre os provedoresde serviço e os consumidores/clientes.

A criação de relações contratuais origina-se de três pressupostos. Oprimeiro é de que numa situação de falta de recursos, como a atual, a melhorforma de aumentar a qualidade é introduzir relações contratuais decompetição e de controle. O segundo, quase como conseqüência doprimeiro, é de que a forma contratual evita a situação de monopólio. Por fim,o último pressuposto refere-se à maior possibilidade que os consumidorestêm de controlar e avaliar o andamento dos serviços públicos a partir de ummarco contratual.

O modelo contratual de prestação de serviços públicos não se res-tringe somente ao caso inglês. A partir de um estudo das principais inovaçõesgerenciais na Europa, Norman Flynn observa a existência de importantes arran-jos contratuais também na Suécia e na França. Em todos estes casos, porém,Flynn ressalta um problema fundamental deste modelo: o difícil equaciona-mento da relação entre as agências autônomas, o respectivo ministério quecontrola cada uma delas e o Ministério das Finanças.6 Aqui se encontra umsério obstáculo ao princípio da descentralização administrativa (desconcen-tração) presente tanto no gerencialismo puro como no consumerism.

Este obstáculo é fruto de um paradoxo cuja origem é a escassez derecursos públicos: essa mesma situação cria a necessidade do aumento daautonomia gerencial das agências e igualmente requer o fortalecimento docontrole orçamentário estrito sob a batuta do Ministério das Finanças.Assim, de um lado as agências movem-se pela lógica do output e, por outro,o Poder Central preocupa-se a todo instante em controlar os inputsfinanceiros do sistema, temendo o descontrole (FLYNN, 1996: 11). Nestaqueda de braço, o vencedor via de regra é o ministro das Finanças e suaspreocupações. O modelo gerencial, deste modo, pode ficar subordinado aosproblemas de curtíssimo prazo e não à construção de uma nova culturaorganizacional e de novos arranjos institucionais.

Embora tenha avançado muito com relação ao modelo gerencialpuro, o consumerism recebeu várias críticas, particularmente no terreno em

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que mais transformou os conceitos, isto é, na relação entre o governo comoprestador de serviços públicos e a população.

A crítica mais geral é direcionada ao conceito de consumidor deserviços públicos. Em primeiro lugar, com relação à diferença que existeentre o consumidor de bens no mercado e o “consumidor” dos serviçospúblicos. Como aponta Pollitt, é mais complexa a relação do prestador deserviço público com o consumidor, já que ela não obedece ao puro modelode decisão de compra vigente no mercado. Aliás, há determinados serviçospúblicos cujo caráter é compulsório, isto é, não existe a possibilidade deescolha, como provam a utilização em determinados momentos dos hospitaise dos serviços policiais (POLLITT, 1990: 125).

Para vários autores,7 o conceito de consumidor deve ser substituídopelo de cidadão. Isto porque o conceito de cidadão é mais amplo do que ode cliente/ consumidor, uma vez que a cidadania implica direitos e deverese não só liberdade de escolher os serviços públicos (STEWART & WALSH,1992: 507).

Na verdade, a cidadania está relacionada com o valor de accountabil-ity, que requer uma participação ativa na escolha dos dirigentes, no momentoda elaboração das políticas e na avaliação dos serviços públicos. Destaforma, mecanismos como os do Citizen’s Charter — cujo nome não corres-ponde à realidade, pois este programa é direcionado ao consumidor — sóenfatizam um aspecto da cidadania, o de controlar as políticas públicas. Oconsumidor é, no mais das vezes, um cidadão passivo.

O conceito de consumidor também não responde adequadamente aoproblema da eqüidade, valor fundamental na administração pública. Aprimeira pergunta não respondida pelo consumerism é quem são osconsumidores/clientes? Em grande medida, são aqueles que se organizampara atuar onde os serviços são prestados — o que, no limite, pode seconstituir num grupo de interesse. Os burocratas, por sua vez, poderãofazer de tudo, inclusive atos discricionários, para atender ao grupoorganizado de consumidores, já que os funcionários públicos dependem, nomodelo gerencial, da avaliação dos clientes para obter avanço profissional,melhoria de salários e até, em último caso, para manter o próprio emprego.Entre a avaliação dos consumidores e os atos dos funcionários devem havernormas e regras que permitam garantir o interesse público (FREDERICKSON,1992: 18).

A possibilidade de os consumidores se transformarem em grupode interesse se torna maior ainda numa era de escassez de recursospúblicos, como a que vivemos. Os que se organizarem mais podem setornar “mais consumidores do que os outros”. Assim, os consumidoresmais fortes podem se constituir em “clientes preferenciais do serviço

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público”. Ou como argumenta Clarke, “quando os recursos são limitados,o problema não é satisfazer os consumidores, mas quais consumidores(satisfazer)?”.8

O problema da eqüidade na prestação dos serviços públicos pode setornar ainda maior quando há competição entre os equipamentos sociais. Istoporque a unidade de serviço público que obtiver a melhor classificação nacompetição receberá provavelmente mais recursos, seus funcionáriosmelhorarão seus rendimentos (através de incentivos por produtividade), eportanto os mesmos consumidores que o aprovaram tenderão a utilizar esteserviço continuadamente. A premiação reflete, sem dúvida, um círculo vir-tuoso, saudável como técnica para tornar o Estado mais capaz de responderàs demandas da população. Mas, por outro lado, os equipamentos sociais quenão conseguirem as melhores avaliações dos consumidores caminharão paraum círculo vicioso, ou seja, receberão menos recursos, os seus funcionáriosnão terão incentivos financeiros e ficarão desmotivados, e seus consumi-dores continuarão insatisfeitos.

O pressuposto do modelo da competição é de que os consumidorespodem escolher a unidade de serviço público cuja qualidade for maior.Contudo, esse pressuposto nem sempre é verdadeiro, pois nem todos osconsumidores têm a possibilidade de escolher, de fato, o equipamento socialque lhes agradar, em virtude da existência de obstáculos geográficos efinanceiros os quais dificultam o acesso a todas as unidades de serviçopúblico. Ademais, se todos os consumidores (ou boa parte deles) escolheremum número limitado de equipamentos sociais, estes ficarão lotados etenderão, também, a perder qualidade. Enquanto isso, as unidades do serviçopúblico que tiveram inicialmente uma má avaliação, ficarão abandonadas ecom uma subutilização que por si só já resultará em desperdício de recursospúblicos.

O modelo da competição pode levar àquilo que a Ciência Políticadenomina de jogo de soma-zero. Isto é, o equipamento social vencedor(aprovado pela população) no começo do jogo, “leva tudo” (takes all),ganhando todos os incentivos para continuar sendo o melhor. Já a unidade deserviço público que obtiver as piores “notas” dos consumidores, “perdetudo”, o que resultará indiretamente na aplicação de incentivos para que esteequipamento social continue sendo o pior. Neste jogo, o maior perdedor é oprincípio da eqüidade na prestação dos serviços públicos, transformandoalguns consumidores em mais cidadãos do que os outros.

Para tentar introduzir os conceitos de accountability e eqüidade naprestação de serviços públicos, alguns autores criaram o Public ServiceOrientation (PSO), tendência que resumo rapidamente a seguir.

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3. Public Service Oriented (PSO): a construção

da esfera pública

Procurarei neste item resumir a discussão existente na corrente doPublic Service Oriented (PSO).9 Aqui serei mais breve do que nos outrostópicos por duas razões. A primeira é que a PSO faz parte de um debatemuito recente na Grã-Bretanha e, portanto, seus conceitos ainda estão emuma fase de amadurecimento. Como conseqüência disso, a PSO seconstitui mais como uma tendência que levanta novas questões e põe emxeque antigos valores do que como uma corrente com um arcabouçoteórico fechado.

Uma outra observação é necessária. O Public Service Orientation(PSO), embora retome temas pouco discutidos ao longo da década de 80, nãopropõe a volta a um modelo pré-gerencial, burocrático weberiano. A PSOprocura encontrar novos caminhos abertos pela discussão gerencial,explorando suas potencialidades e preenchendo boa parte de suas lacunas.

Toda a reflexão realizada pelos teóricos do PSO leva aos temas dorepublicanismo e da democracia, utilizando-se de conceitos como account-ability, transparência, participação política eqüidade e justiça, questõespraticamente ausentes do debate sobre o modelo gerencial. É interessantenotar, contudo, que o “objeto” que gerou a corrente do PSO foi “criado” pelomodelo gerencial. Trata-se da problemática da descentralização, a partir daqual foram formulados quase todos os conceitos do PSO.

A visão da descentralização destes autores, no entanto, éextremamente crítica quanto ao modelo implementado pelo governobritânico. O argumento de Hambleton (1992) resume a posição do PSO comrelação à descentralização.

“A justificativa central para defender o governo local não é que ele é umbom meio para prover os serviços (públicos) necessários, o que de fato ele é,mas que ele (o governo local) torna os cidadãos capazes de participar das deci-sões que afetam suas vidas e de suas comunidades” (HAMBLETON, 1992: 11).

Portanto, o PSO defende as virtudes políticas da descentralização.No modelo gerencial puro, a descentralização era valorizada como meio detornar mais eficazes as políticas públicas. Já no consumerism, o processode descentralização era saudável na medida em que ele aproximava o centrode decisões dos serviços públicos dos consumidores, pensados comoindivíduos que têm o direito de escolher os equipamentos sociais que lhesoferecer melhor qualidade. O ponto que aqui distingue o PSO das outrascorrentes é o conceito de cidadão. Pois, enquanto o cidadão é um conceitocom conotação coletiva — pensar na cidadania como um conjunto de

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cidadãos com direitos e deveres —, o termo consumidor (ou cliente) temum referencial individual, vinculado à tradição liberal, a mesma que dá, namaioria das vezes, maior importância à proteção dos direitos do indivíduodo que à participação política, ou então maior valor ao mercado do que àesfera pública (POLLITT , 1990: 129).

Ao trazer de volta para o debate os conceitos de accountability e departicipação dos cidadãos, o Public Service Orientation (PSO) rebate osargumentos dos conservadores ingleses. Para estes, as demandas por partici-pação política sempre foram equiparadas às formas neocorporativas de atua-ção que vigoravam no final da década de 70 (POLLITT, idem: 138). Osteóricos do PSO resgatam os ideais de participação política dentro de umconceito mais amplo, o de esfera pública, que se utiliza da transparênciacomo proteção contra novas formas particularistas de intervenção na arenaestatal, como o são o clientelismo e o corporativismo.

Portanto, é a partir do conceito de esfera pública (public domain)que é estruturado o conjunto de idéias do Public Service Orientation (PSO).Esfera pública vista como local de aprendizagem social. Isto é, a esferapública não é só o locus por excelência da participação dos cidadãos, massobretudo onde os cidadãos aprendem com o debate público.

O conceito de esfera pública como locus de transparência e deaprendizado social deve estar presente também na organização interna daadministração pública, sobretudo no momento de elaboração das políticaspúblicas. O planejamento estratégico, por exemplo, não pode estar confinadoà burocracia. Os objetivos políticos definidos pelo planejamento estratégicodevem ser discutidos e revelados num processo de debate público (POLLITT,idem: 150).

Outro conceito caro ao modelo gerencial, o de competição entreagências públicas, é repensado pelo Public Service Orientation (PSO). Nãoque a competição seja negada como princípio utilizável no setor público; maso que é mais ressaltado pela PSO é a possibilidade de cooperação entre asagências de modo a obter um melhor resultado global na oferta de serviçospúblicos. Desta forma, o princípio da eqüidade, fundamental dentro do PSO,pode ser garantido.

Por fim, o Public Service Orientation tem como uma de suas idéias-chave a conjugação entre a accountability e o binômio justiça/eqüidade. Paratanto, é preciso que no processo de aprendizado social na esfera pública seconsiga criar uma nova cultura cívica, que congregue políticos, funcionáriose cidadãos.

Para destacar as diferenças entre o modelo de administração adotadona iniciativa privada e aquele que deve ser adotado no setor público, Stewart eRanson (1988) fizeram o seguinte quadro:

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Quadro II. Comparação entre o modelo de administração privada e o

modelo de administração do setor público, segundo a teoria do PSO

Modelo do Setor Privado Modelo do Setor Público

Escolha individual no mercado Escolha coletiva na política

Demanda e preço Necessidade de recursos públicos

Caráter privado da decisão empresarial Transparência da ação pública

A eqüidade do mercado A eqüidade dos recursos públicos

A busca de satisfação do mercado A busca da justiça

Soberania do consumidor Cidadania

Competição com instrumento Ação coletiva como meio políticodo mercado

Estímulo: possibilidade de o Condição: consumidor podeconsumidor escolher modificar os serviços públicos

Fonte: Adaptado de STEWART & RANSON (1988: 15).

Embora faça fortes críticas ao modelo gerencial puro e ao consum-erism, o fato é que o Public Service Orientation (PSO) não joga fora asidéias desenvolvidas no seio do Public Management. Afinal, as discussõessobre eficiência, qualidade, avaliação de desempenho, flexibilidadegerencial, planejamento estratégico, entre as principais, não são negadas,mas há a tentativa de aperfeiçoá-las dentro de um contexto em que oreferencial da esfera pública é o mais importante.

Ademais, o modelo do PSO foi pensado dentro dos parâmetros dopoder local, onde os cidadãos tenderiam a controlar mais a qualidade dosserviços públicos. Mas, como conceber a coordenação do serviço público noâmbito nacional? E quais as medidas que devem ser tomadas para atenuar asdesigualdades regionais — menores no caso inglês, mas enormes em paísescomo o Brasil —, e garantir assim uma verdadeira eqüidade?

Estas são respostas que o modelo do PSO ainda não oferece. Umadas principais origens desta deficiência encontra-se na concepçãoextremamente otimista com relação à possibilidade dos cidadãos resolveremna esfera local todos os problemas do setor público (Pollitt, 1990: 1550). Acomplexidade do mundo contemporâneo e da democracia representativa —que não pode ser meramente substituída pela democracia direta — demandamrespostas mais abrangentes e articuladas.

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Entretanto, a PSO tem uma grande virtude, que é dizer não só como osetor público deve ser mas principalmente o que ele deve ser. Essa é uma dasprincipais lacunas da experiência do modelo gerencial implantado nosúltimos anos, como apontam Malcom Holmes e David Shand (1995: 556).Portanto, a PSO tenta reconstruir o setor público mais do que mudá-locosmeticamente. No outro lado do Atlântico, os americanos também têmrepensado o setor público no sentido de dizer o que ele deve ser, tentandoreinventar o governo.

4. Reinventando o governo: novos caminhos para

a administração pública americana

O presidente americano Ronald Reagan e a primeira-ministra inglesaMargareth Thatcher elegeram-se com um programa de governo muitoparecido, inclusive no que se refere à reforma administrativa. Ambospropunham, inicialmente, a implantação de um modelo gerencial puro, comênfase no corte de custos e no aumento da eficiência. Thatcher foi, emgrande medida, bem sucedida em seu programa de reformular o aparatoburocrático. Reagan não. Uma pergunta, portanto, fica no ar: qual a razão dofracasso do governo Reagan em implementar o modelo gerencial puro nosEstados Unidos?

A primeira razão do fracasso de Reagan, na verdade, refere-se a umobstáculo que outros presidentes anteriormente tentaram ultrapassar mas nãoconseguiram. Trata-se da tensão existente entre aumentar a flexibilidade e, aomesmo tempo, procurar manter as salvaguardas políticas contra a patronagem(NIGRO, 1982). O fato é que a constituição da burocracia pública americanase deu em um contexto marcado pelo combate à politização daadministração. No final do século passado e começo deste, na chamada EraProgressista, políticos como Woodrow Wilson, Theodore Roosevelt e LouisBrandeis (OSBORNE & Gaebler, 1994: 14) combateram esta politização, edeixaram para as futuras gerações o conceito de que a administração públicadeveria ter mecanismos protetores contra a patronagem. Esta idéia permeiatoda a cultura administrativa do setor público americano.

O curioso é que os Estados Unidos sempre foram o país porexcelência dos business, das técnicas “revolucionárias” da administraçãoprivada. Um dos livros que mais influenciou as administrações privadas epúblicas em vários lugares do mundo, sobretudo na Grã-Bretanha, foi o Insearch of excellence: lessons from America’s best — run companies, de

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Peters e Waterman (1982). Embora tenha sido muito discutido como meiode modificar a burocracia americana, suas idéias gerencialistas puras nuncaforam implantadas de fato no governo federal dos EUA.

E aqui entra a segunda razão para o insucesso reaganiano. O governonos Estados Unidos é extremamente descentralizado, ao contrário do bri-tânico. O poder local tem uma enorme autonomia e os governos estaduaistambém são fortes o suficiente para definirem um padrão de políticas públi-cas. É neles e a partir de suas culturas administrativas que as transformaçõesno setor público ganham corpo. Isto se tornou mais verdadeiro em virtudedos recentes cortes de subsídios federais efetuados pelo presidente Reagan.Assim, os governos subnacionais se viram mais compelidos a moldar seudestino político-administrativo.

Apesar da força da patronagem local nos EUA até pelo menos o come-ço deste século, a tradição democrática e republicana — o ideal de self gov-ernment, como já falava Tocqueville das comunidades americanas do séculoXIX —, sempre esteve presente nos contextos subnacionais de governo. Atual-mente, são eleitas 504.404 autoridades em solo americano, uma para cada 182eleitores (OSBORNE & GAEBLER, 1994: 77). Portanto, a segunda razão para ofracasso da implantação de um modelo gerencial puro nos Estados Unidos éque o managerialism teve que conviver com padrões de democratização dosetor público incompatíveis com os padrões gerenciais mais ortodoxos.

Isto não quer dizer que o managerialism não tenha força nos EUA.Aliás, foi lá que nasceu o chamado Public Management, que nunca se tornouhegemônico, mas algumas das suas técnicas gerenciais estão sendo utilizadaspragmaticamente há muito tempo, quando servem aos interesses da comuni-dade. Frente à escassez das últimas décadas, os governos locais têm procu-rado inovar e estabelecer novas respostas, incorporando grande parte doarsenal de conceitos do managerialism. Só que se procurou encontrar ummodelo que respondesse aos ditames da democratização, da busca da efici-ência e do aumento da qualidade dos serviços públicos. Em suma, nos EUAse tentou criar, desde o início, um modelo híbrido.

Além da tentativa de se constituir um modelo híbrido (gerencialismomais democratização), a experiência americana recente tem outra peculiaridade.Ela se refere à busca do novo significado que deve ter o setor público, ou, nostermos de Michael Barzelay (1992), a criação de um novo modelo organizacio-nal, o qual ele denomina de paradigma pós-burocrático. Como na Public ServiceOrientation desenvolvida na Grã-Bretanha, o objetivo tem sido o de dizer o quedeve ser o governo e não simplesmente como ele deve ser. É a procura de umnovo paradigma de governo, e não somente de administração pública.

A obra de David Osborne e Ted Gaebler, Reinventando o governo(1994), é o marco na nova discussão da administração pública americana.

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Trata-se de discutir os fundamentos do governo no que se refere à adminis-tração pública. Para tanto, é estruturado um modelo híbrido e eclético deanálise, incorporando conceitos que estiveram separados no desenvolvimentodo modelo gerencial inglês, tais como a implantação de uma administraçãopor objetivos — ou por missões —, a mensuração do desempenho das agên-cias através dos resultados, a busca da qualidade total como método adminis-trativo, a ênfase no cliente, a transferência do poder aos cidadãos e tentargarantir a eqüidade.

A discussão de Osborne e Gaebler começa subvertendo o ideal queimpulsionou o gerencialismo na Grã-Bretanha no início da década. Em vez depropor o “rolling back the state” thatcheriano, os autores propõem uma re-definição da atividade governamental.

“Nosso problema fundamental é o fato de termos o tipo inadequadode governo. Não necessitamos de mais ou menos governo: precisamos demelhor governo. Para sermos mais precisos, precisamos de uma melhoratividade governamental” (OSBORNE & GAEBLER, 1994: 25).

A atividade governamental é entendida como algo com uma naturezaespecífica, que não pode ser reduzida ao padrão de atuação do setor privado.Entre as grandes diferenças, a motivação principal dos comandantes do setorpúblico é a reeleição, enquanto os empresários têm como fim último a buscado lucro; os recursos do governo provêm do contribuinte — que exigem arealização de determinados gastos —, e na iniciativa privada os recursos sãooriginados das compras efetuadas pelos clientes; as decisões governamentaissão tomadas democraticamente e o empresário decide sozinho ou nomáximo com os acionistas da empresa — a portas fechadas; por fim, o objetivode ambos é diverso, isto é, o governo procura fazer “o bem” e a empresa “fazerdinheiro” (OSBORNE & GAEBLER, 1994: 21-23). Esta diferenças implicam,necessariamente, em procurar novos caminhos para o setor público, tornando-o sim mais empreendedor, mas não transformando-o em uma empresa.

Ao contrário também da epidemia generalizada contra a burocraciaque vigorou nos EUA no começo da década de 80 (KAUFMAN, 1981), oReinventando o governo não coloca a culpa dos problemas governamentaisem seus funcionários; o problema não está nas pessoas, mas no sistema(OSBORNE & GAEBLER, idem: XV). É a reforma das instituições e dosincentivos que tornará a burocracia apta a responder novas demandas.

A reforma do sistema significa, ao mesmo tempo, a introdução demétodos voltados para a produção qualitativa de serviços públicos com aprioridade dada aos clientes e cidadãos como razões últimas do setor público,o que quer dizer não só que eles devem ser bem atendidos, mas que devem sertambém chamados a participar do governo, definindo os destinos de suas co-munidades. A maioria dos exemplos do livro de Osborne e Gaebler mostra que

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a melhor resposta para tornar melhor um serviço público é chamar a comu-nidade a participar de sua gestão, seja fiscalizando, seja trabalhando volun-tariamente na prestação de serviços — constituindo-se numa resposta adequadatanto para a questão da eficiência como para o problema da transparência.Portanto, a modernização do setor público deve caminhar pari passu com oaumento da accountability.

Mas a reinvenção do governo deve ser realizada ainda garantindo oprincípio da eqüidade. Desta maneira, a introdução de mecanismos geren-ciais, tais como são propostos no livro, não é incompatível com a busca dejustiça redistributiva, um conceito que por muito tempo foi abandonado nodebate sobre reforma administrativa.

Osborne e Gaebler propõem dez princípios básicos para reinventar ogoverno, listados a seguir:

1 — Competição entre os prestadores de serviço;

2 — Poder aos cidadãos, transferindo o controle das atividades àcomunidade;

3 — Medir a atuação das agências governamentais através dosresultados;

4 — Orientar-se por objetivos, e não por regras e regulamentos;

5 — Redefinir os usuários como clientes;

6 — Atuar na prevenção dos problemas mais do que no tratamento;

7 — Priorizar o investimento na produção de recursos, e não em seugasto;

8 — Descentralização da autoridade;

9 — Preferir os mecanismos de mercado às soluções burocráticas;

10 — Catalisar a ação do setores público, privado e voluntário.

Não se trata aqui de comentar ponto por ponto a lista exposta acima,mas de discutir, rapidamente, algumas das idéias do Reinventando o gover-no. A primeira refere-se ao conceito de governo catalisador, que “navega emvez de remar”. O intuito desse conceito não é tornar o Estado mínimo, masredirecionar a atividade governamental. Inclusive, os autores renegam oconceitual privatista, típico do neoliberalismo. “A privatização é uma res-posta, não a resposta”, afirmam Osborne e Gaebler.

O sentido do governo catalisador é reformular as relações Estado/mercado e governo/sociedade. Neste sentido, o governo catalisador se aproxi-ma das idéias de Pollitt (1990: 149-150), que conceitualiza a relação públicaentre cidadãos e governo como uma parceria e não como uma dependência.

Indo para outra discussão do Reinventando o governo, encontramosum referencial interligado ao anterior, qual seja, o tratamento da população

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como cliente e como cidadão. Cliente dos serviços públicos, que deseja amelhor qualidade possível dos equipamentos sociais. E cidadão que quer etem como dever participar das decisões da comunidade, e por isso a descen-tralização da autoridade é um objetivo fundamental para alcançar esse grau deaccountability. Em suma, não há uma antinomia entre os conceitos de clientee cidadão, eles são complementares, e fazem parte da reinvenção do governoem sua relação com a sociedade.

No que tange à gestão da burocracia, são basicamente dois os instru-mentos propostos. O primeiro é a orientação administrativa por missões. Apartir dela, o governo pode ser mais flexível, como também torna-se maisfácil a avaliação de cada agência, comparando-se o objetivo inicialmenteformulado com o resultado efetivamente alcançado. A orientação por mis-sões, portanto, é um mecanismo que congrega os ideais do Consumerism(flexibilidade) com os da corrente gerencial mais preocupada com a avalia-ção de resultados.

Entretanto, a discussão em torno da avaliação de resultados na obra deOsborne e Gaebler toma um rumo diferenciado daquele proposto pelo geren-cialismo puro. Para os dois autores, a avaliação da eficiência não pode serdissociada da avaliação da efetividade. Pois, se a eficiência mede o custo doque foi produzido, a efetividade mede a qualidade dos resultados (OSBORNE &GAEBLER, 1994: 381). Desta maneira, “quando medimos a eficiência, podemossaber quanto nos custa alcançar uma produção determinada; ao medir a efetivi-dade, sabemos se nosso investimento valeu a pena. Nada mais tolo do que fazercom eficiência o que não deveria continuar a ser feito” (idem: 381).

Osborne e Gaebler tentam definir a relação entre eficiência e efetivi-dade a partir dos objetivos do governo. E concluem:

“Não há dúvida de que o público quer um governo mais eficiente, masele deseja ainda mais um governo efetivo” (OSBORNE & GAEBLER, idem: 382).

Há mais dois pontos do Reinventando o governo que gostaria decomentar. Um é a definição da competição como um dos valores fundamentaisde um setor público reconstruído. A competição seria uma forma de melhorara qualidade do governo, uma vez que garante o controle dos serviços públicospela população. Competição, para os autores, não é um conceito que só temvalidade no contexto do setor privado. O ambiente competitivo, na verdade,serve para acabar com o monopólio — que tanto pode reinar no setor públicocomo no privado — e encorajar a inovação organizacional. Por isso, Osborne eGaebler afirmam que para resolver os problemas da prestação de serviçospúblicos, “a questão não é público versus privado, mas competição versusmonopólio” (OSBORNE & GAEBLER, idem: 80).

Cabe uma observação aqui que toca num ponto não resolvido pelaidéia de reinventar o governo. Na opinião dos autores, a competição entre

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os serviços públicos tem que ocorrer mantendo-se o princípio da eqüidade.Há, no entanto, uma grande dificuldade para alcançar tal objetivo. Apreocupação é louvável, mas de fato Osborne e Gaebler não apresentamuma resposta institucional para o dilema competição ou eqüidade — quequer eles queiram ou não, apresenta-se na realidade como um gigantescodilema.

Por fim, uma das questões mais instigantes levantadas pelo Reinven-tando o governo é o peculiar conceito de planejamento estratégico elaboradopelos autores. Na literatura internacional, o planejamento estratégico — ou alógica da estratégia, nos termos de Crozier (1992) — refere-se à possibilidademais flexível de gestão frente às constantes mudanças do mundo contem-porâneo. Portanto, é uma visão de mais curto prazo. Para Osborne e Gaebler,contudo, o planejamento estratégico procura antecipar o futuro, prevendotendências de mais longo prazo.

Mas a antecipação de tendências futuras não pode ser uma atividadeconfinada à burocracia. O planejamento estratégico tem que envolver a so-ciedade e ser incorporado à cultura dos funcionários. Para Osborne eGaebler, não é o planejamento estratégico que importa, mas sim o pensa-mento estratégico e a conduta estratégica.

“O elemento importante não é o plano, mas sim, a atividade doplanejamento. Ao criar consenso em torno de uma determinada visão defuturo, a organização ou a comunidade promovem em todos os seus membrosuma percepção comum a alcançar” (OSBORNE & GAEBLER, 1994: 256).

A este conjunto de princípios apresentados pelo Reinventando ogoverno, muitas críticas foram feitas. Uma das principais trata da dificuldadede lidar com os aspectos institucionais mais gerais da administração públicaamericana. Isto não se verifica, porém, pois eles enfatizaram, em determi-nada passagem do livro, os obstáculos político-institucionais presentes nosEUA, sobretudo a fraqueza dos partidos e a natureza do presidencialismo, eacreditam que o contexto político é fundamental. Comentando a respeito daspressões contrárias à reforma administrativa nos Estados Unidos, Osborne eGaebler deixam clara a influência institucional.

“Quando os partidos políticos (americanos) eram mais fortes, eles,às vezes, podiam superar essas pressões (contrárias às reformas). Um pre-sidente podia definir uma plataforma coerente, de longo prazo, e usar adisciplina partidária para obrigar os legisladores a cooperar, dando-lhes acobertura política para isso. (“Sei que meus eleitores não gostam da idéia,mas fiz isso pelo presidente”). Nos sistemas parlamentaristas ainda é o queacontece. Nos Estados Unidos, contudo, (hoje) os partidos políticos são tãodébeis que os congressistas funcionam em larga medida como indivíduos,levantando fundos próprios, obtendo êxito ou insucesso conforme sua

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reputação e a maneira como votam. Por isso, não há praticamente qualquerincentivo para olhar além dos interesses de curto prazo do eleitorado. E, numsistema eleitoral dominado pelo dinheiro, isso significa, muitas vezes, apredominância dos interesses de curto prazo dos principais contribuintes dacampanha eleitoral” (OSBORNE & GAEBLER, 1994: 258).

Em resumo, os incentivos institucionais são fundamentais para arealização de qualquer reforma administrativa. Ninguém pode acusar Osbornee Gaebler de não terem dado atenção à esfera política.

A maior crítica ao Reinventando o governo foi feita por CharlesGoodsell, em seu texto Reinvent government or Rediscover it? (1993), noqual ele afirma que Osborne e Gaebler estão tentando apenas retomar algunstemas abandonados pelo debate gerencial na década de 80, mas mesmo assimnão conseguiram entender a natureza da administração pública da gestãodemocrática. Como contraponto, Goodsell apresenta o seu decálogodefinidor do que deve ser uma administração pública democrática.

1 — Através de seus representantes eleitos, os cidadãos, e não osempresários, devem estar a cargo do governo;

2 — A função de governo é servir o interesse público, não criarreservas de mercado ou alimentar “egos empresariais”;

3 — O governo tem que operar sob as regras da Constituição e dasleis, e não a partir de missões comandadas por particulares;

4 — O governo pode entrar em associações com entidades privadas,sempre e quando for o sócio principal;

5 — O governo deve ser flexível e inovador, porém também deve sersuscetível à prestação de contas ao público;

6 — O governo deve buscar resultados, todavia sem atropelar aquelesque vão desempenhar as tarefas, ou seja, os funcionários públicos;

7 — No governo, a conduta dos gerentes deve se submeter ao idealde igualdade de oportunidades;

8 — É importante simplificar regras, contanto que se respeite aintegridade dos processos legais;

9 — A flexibilização orçamentária é aceitável, mas não a redução decontroles destinados a proteger os recursos públicos;

10 — Os problemas políticos devem ser solucionados com criativi-dade, sem no entanto dar vantagens a quem pode se beneficiardas mudanças (Goodsell, 1993).

É fundamental tecer alguns comentários a respeito do decálogoelaborado por Goodsell. Em primeiro lugar, a contraposição que ele fazpressupõe a caracterização da obra de Osborne e Gaebler como um exercício

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de gerencialismo puro, o que a meu ver é um tremendo engano. Osborne eGaebler consideram imprescindíveis os conceitos de eqüidade, accountability eparticipação dos cidadãos no governo a fim de reconstruir o setor público. Ade-mais, defendem a reinvenção do governo, e não sua substituição pelo mercado.

Além disso, Goodsell não percebe que com a crise do Estado con-temporâneo em todas as suas dimensões — as quais descrevi na introdução—, é necessário repensar a relação do Estado com a sociedade e do governocom os cidadãos. É preciso redirecionar a atividade governamental, tentandoconjugar no setor público qualidade com eficiência, flexibilidade organiza-cional com accountability, criatividade com busca de eqüidade. Estas com-binações de valores de fato não são fáceis de serem obtidas; contudo, odesafio é exatamente este: encontrar novas saídas através da imitação do quedeu certo (inclusive no setor privado) e tentar sempre inovar. Tudo isto numaera de escassez, rápidas mudanças sociais (no padrão de emprego, porexemplo) e tecnológicas, globalização e, como já foi dito antes, falta de umconsenso totalmente estruturado acerca de qual deve ser o papel do Estado.

O problema de Goodsell é que ele se agarra ao antigo modelo deEstado, e seu correspondente no âmbito administrativo, o modelo buro-crático weberiano. Num momento de incertezas como o atual, a adoção dospadrões de valores que realmente deram certo em uma época de prosperidadetem uma certa lógica. Mas, infelizmente, tais padrões não respondem àsdificuldades atuais. É preciso encontrar novas saídas, e Osborne e Gaeblerapresentam um eclético conjunto de princípios que nos instigam a refletirsobre quais caminhos devem ser utilizados pelo setor público no futuro.

O comentário mais pertinente sobre o Reinventando o governo foi feitopor Grant Jordan (1994). Entre as várias críticas endereçadas ao livro, uma sedestaca. Para Jordan, os autores só contam os casos de sucesso e não analisamsituações em que não foram encontradas respostas satisfatórias. Assim, perde-seo nexo explicativo, ou seja, não podemos saber como sair de situações realmentecomplicadas. Com isso, os valores enunciados pelos autores, como qualidade eredirecionamento da atividade governamental, podem se tornar apenas e tãosomente truísmos, aceitos por todos, mas que ninguém sabe de fato como im-plementá-los, sobretudo se tentarmos transportar o estudos de casos feitos nosEUA para outras realidades, historicamente distintas.

Aqui está o grande problema do livro de Osborne e Gaebler. Elesconseguem enunciar uma conjugação de valores importantes para reinventaro governo, mas não criam um arcabouço teórico que explique e possibilite aimplementação de reformas no setor público. Para isso, o melhor caminhotalvez seja aumentar os estudos comparativos, ressaltando as similitudes e aspeculiaridades dessa revolução pós-burocrática que toma conta não só dosEstados Unidos e da Grã-Bretanha mas de uma gama enorme de países.

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IV. Conclusão

Os desafios para a administração pública do século XXI

O impacto da crise da burocracia weberiana e da implementação domodelo gerencial em vários lugares transformou o atual debate na área deadministração pública. A reforma administrativa ligada ao managerialismentrou na ordem do dia. Como nota B.G. Peters, “mesmo quando a noção de‘privatização’ tem conotações negativas, como na Escandinávia, a expressão‘modernização’ aparece como positiva para a maioria dos cidadãos” (1992:307).

O modelo gerencial, no entanto, não é um corpo teórico fechado. Elevem sofrendo uma série de mudanças e sendo adaptado aos países em quefincou raízes. Mas mesmo assim não é possível dizer que o managerialism seconstitui num novo paradigma, no sentido de Thomas Kuhn, ou seja, ummodelo que substitui por completo o antigo padrão burocrático weberiano.Na verdade, o que mostram estudos comparados como os realizados porHood (1996), Cassese (1989) e Flynn (1996) é que as respostasadministrativas dos vários países perpassam por técnicas gerenciais dediversos matizes, democratização da relação entre o Estado e a sociedade emesmo a manutenção de determinados elementos burocráticos weberianos.Trata-se de um pluralismo organizacional sob bases pós-burocráticasvinculadas aos padrões históricos (institucionais e culturais) de cada nação.Nesta nova situação, o gerencialismo cumpre um importante papel, mas nãose transforma num paradigma.

Apresento a seguir, de forma sucinta, as principais tendências demodificação no antigo padrão burocrático weberiano, vinculadas a estruturaspós-burocráticas profundamente influenciadas pelo debate em torno domodelo gerencial.

a) Incentivo à adoção de parcerias com o setor privado e com asorganizações não governamentais (ONGs);

b) Ampla introdução de mecanismos de avaliação de desempenhoindividual e de resultados organizacionais, atrelados uns aos outros, ebaseados em indicadores de qualidade e produtividade;

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c) Maior autonomia às agências governamentais e, dentro delas, aosvários setores, horizontalizando a estrutura hierárquica;

d) Descentralização política, apoiada no princípio de que quantomais perto estiver do cidadão o poder de decisão com relação às políticaspúblicas, melhor será a qualidade da prestação do serviço e, de fundamentalimportância, maior será o grau de accountability. Os governos também têmatuado no sentido de implantar políticas de coordenação entre as váriasesferas administrativas;

e) Estabelecimento do conceito de planejamento estratégico,adequado às mudanças no mundo contemporâneo e capaz de pensar, também,as políticas de médio e longo prazo;

f) Flexibilização das regras que regem a burocracia pública,principalmente o Direito Administrativo, com efeitos inclusive em paísescom modelos extremamente burocratizados, como a Espanha, a França e aItália (D’ALBERTI, 1992). A negociação coletiva, a introdução de ganhos deprodutividade e novos critérios de promoção têm flexibilizado aadministração de pessoal no setor público. Como aponta o último relatóriodo Banco Mundial sobre o mundo do trabalho, a globalização vai obrigartambém o Estado a mudar suas políticas de pessoal.

“Muitos governos estão se dando conta de que uma exposição maiorà concorrência internacional requer burocracias flexíveis que funcionembem. Para serem empregadores eficazes e assegurar serviços de altaqualidade, os governos necessitam reformar suas políticas de remuneração,seleção e promoção de pessoal (...)” (RELATÓRIO DO BANCO MUNDIAL,1995: 109).

g) Mesmo com a flexibilização da política de pessoal, aprofissionalização do servidor público continua sendo prioridade, como bemo demonstra o caso italiano, em que 2/3 das reformas administrativas ocor-reram na área de Recursos Humanos, sobretudo nos Planos de Carreira(CASSESE, 1989). Robin Butler, alto funcionário da burocracia inglesa, escre-veu recentemente que a manutenção do conceito de carreira no serviço públi-co é um dos objetivos primordiais de qualquer governo (BUTLER, 1993: 404).Além disso, as políticas de motivação têm recebido grande atenção, uma vezque pouca atenção foi dada a esta área no início da implantação do modelogerencial. Como argumenta Pollitt, o managerialism “enfatizava mais ocontrole de pessoal do que o seu desenvolvimento; mais à avaliação do que oestímulo; mais no (controle) dos recursos do que na formação moral dosfuncionários” (POLLITT, 1990: 60).

Atualmente, há também uma revalorização da questão da ética noserviço público (GREEN, 1994; DENHARDT, 1994).

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h) Desenvolvimento das habilidades gerenciais dos funcionários, emparticular os de nível médio e os do alto escalão burocrático. Neste sentido,os funcionários precisam possuir uma grande versatilidade, atuando emvários funções. As principais funções são a de administrador, vinculada àcapacidade de trabalhar com os regulamentos rotineiros; a de produtor, ligadaao aumento da produtividade com qualidade; a de inovador, capaz de encon-trar novas respostas e modernizar o fluxo de decisões; e a de integrador,habilitado à congregar seu grupo a atuar em conjunto na busca de um obje-tivo. Este conceitos são relacionados no quadro abaixo.

Quadro III: As funções do dirigente público

Fonte: apud METCALFE & RICHARDS (1989: 72).

A grande pergunta que fica é como esta discussão pode ajudar noentendimento do caso brasileiro. O quadro administrativo brasileiro é mar-cado por uma multiplicidade de situações, um modelo híbrido muito peculiar.Em primeiro lugar, a estrutura administrativa brasileira é influenciada por umlado, pelo Direito Administrativo ibérico e francês, o que resulta em umarigidez organizacional maior — um maior engessamento, como se diz nosdias atuais. Por outro ângulo, no entanto, a influência americana advinda domodelo presidencialista, que dá uma configuração peculiar ao organogramado Executivo, e sobretudo ao federalismo, que torna mais consorciativo oEstado brasileiro, resulta em um maior grau de flexibilidade e politização donosso sistema administrativo.

O híbrido administrativo brasileiro também é formado pela convi-vência entre setores administrativos atrelados a uma burocracia meritocrá-tica, outros nichos dominados pelo patrionialismo e cartorialismo (princi-palmente no nível subnacional e nos escalões mais baixos do GovernoFederal), e ainda outra parcela do Estado preenchida pelo sistema de spoil

INTEGRADOR INOVADOR

ADMINISTRADOR PRODUTOR

Regularidade deprocedimento

Estabilidade

Mudanças

Melhora deresultados

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system, no seu sentido mais moderno, que politiza o alto escalão do orga-nograma estatal, podendo ou não levar em conta a racionalidade técnica.10

Por fim, a Administração Pública brasileira moderna é dividida emDireta e Indireta, sendo a segunda historicamente mais autônoma, com salá-rios melhores e mais flexível, enquanto a Administração Direta é a menospermeada por padrões meritocráticos, bem como a que oferece horizontesprofissionais menos promissores aos seus funcionários. Mudanças que nãolevem em conta este hibridismo a fim de alterá-lo de fato podem, na verdade,acentuar as tensões dentro do modelo.

Ora, na primeira vez que se tentou uma reforma administrativa comcunho gerencial no País, a partir do Decreto-Lei 200 em 1967, a tensãodentro do modelo foi exacerbada. É lógico que é importante ressaltar seusaspectos positivos, entre os quais a sua originalidade e sentido inclusivevanguardista no cenário internacional — como salienta um dos maioresespecialistas em Administração Pública no mundo, Gerald Caiden (1991) —;sua ênfase na descentralização e flexibilidade administrativa; a introdução doespírito gerencial em alguns segmentos da Administração Pública. Noentanto, o arranjo institucional montado pelo Decreto-Lei 200 não deu contado caráter híbrido de nosso modelo administrativo, aumentando parcela deseus problemas. Um deles é o conflito entre a Administração Direta eIndireta. Segundo Luciano Martins (1995), este conflito cresceu ainda maiscom a reforma de 1967, pela seguinte razão:

“A ausência de regras institucionais claras, como por exemplo, noscontratos de gestão europeus, para regulamentar os vínculos entre o PoderExecutivo do governo e a administração do setor paraestatal e das empresascontroladas pelo Estado, introduziu uma espécie de tensão permanentenesse relacionamento, quando não efeitos desastrosos para ambos oslados” (MARTINS, 1995: 21).

Atualmente, os aspectos do híbrido administrativo brasileiro estãoenvoltos pelas regras da Constituição de 1988, que tornou a legislaçãoreferente à burocracia muito mais rígida, às vezes garantindo até a efetivaçãodas boas características do antigo modelo weberiano, mas que, infelizmente,muitas outras vezes serviu apenas para defender o corporativismo do corpode funcionários públicos e não aos interesses do cidadão. Ademais, o modeloweberiano não responde mais a uma série de dilemas administrativos postosao Estado-nação, como tentei demonstrar ao longo do texto.

Neste sentido, o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado éum grande avanço, partindo da experiência internacional, maisparticularmente da vertente gerencial inglesa, e apontando para a necessidadede se construir uma Administração Pública condizente com as mudançasocorridas no mundo. Não há espaço aqui para comentar mais pormenoriza-

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damente o Plano Diretor, nem é este o intuito do trabalho. Mas ressalto que,apesar do progresso representado pela proposta, ela tem, em termos gerais,dois grandes problemas. Primeiro, transforma o modelo gerencial inglês, queper si já não é monolítico, em paradigma global de mudança, devendo sertransportado assim à realidade brasileira. Porém, o que há hoje é um pluralis-mo organizacional no setor público, adequando-se desta maneira às respostasadministrativas às especificidades das nações. Não existe uma resposta única,e precisamos aprender com diversas experiências para adequá-las ao nossomodelo híbrido. É este o desafio.

Segundo, a atual proposta não dá conta do hibridismo da estruturaadministrativa brasileira. Novamente, não posso desenvolver aqui a contentoeste ponto, mas é possível citar dois problemas não tocados pelo PlanoDiretor: os efeitos da organização federativa na Administração Pública e odimensionamento dos cargos em comissão, base do spoil system do País, eresponsável pelo enfraquecimento da burocracia meritocrática do alto escalão.

Mesmo com esses problemas, o Plano Diretor pode caminhar para aconstrução de uma Administração Pública pós-burocrática, passo fundamentalpara melhoramos a performance do Estado. E mais: pode realizar, se bemconduzido politicamente, algo inédito em nossa história administrativa: refor-mar profundamente a Administração Pública em um período democrático,contrastando com as duas outras grandes reformas deste século, a do EstadoNovo e o Decreto-Lei 200, ambas implementadas por regimes autoritários.

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Notas

1 Agradeço a leitura atenta do texto feita pelo ministro Luiz Carlos BresserPereira e pelos alunos do curso de gestores da ENAP (turma de 1996).Incorporei, na medida do possível, as críticas, mas as responsabilidadespelos eventuais erros são todas minhas.

2 Christopher Hood mostra, na verdade, que no panorama atual a pluralidadede respostas não exclui inclusive dinâmicas burocráticas weberianas paradeterminados problemas da Administração Pública (HOOD, 1996: 171).

3 É interessante observar que várias pessoas ligadas a interessesempresariais participaram dos debate sobre as reformas das burocraciaspúblicas nos Estados Unidos e Grã-Bretanha. A Comissão Grace montadapelo governo Reagan para repensar o papel do Estado, por exemplo,possuía diversos líderes empresariais preocupados em recomendar que osetor privado poderia exercer muito melhor certas atividades do que osetor público (POLLITT, 1990: 137).

4 Outras técnicas de avaliação de desempenho e controle orçamentário são acost-benefit analysis (CBA), o planning programming budgeting (PPB)e o zero-based budgeting (ZBB).

5 Para Crozier, enquanto a antiga visão de planificação estatal implicava emalcançar o melhor resultado técnico, a lógica da estratégia procura alcançaro equilíbrio entre as demandas dos atores envolvidos, principalmentelevando em conta a representatividade e o poderio de cada grupo (CROZIER,idem: 93-94).

6 FLYNN, 1996: 10-11. Dos textos utilizados aqui, este é o que melhorconsegue mostrar, ao mesmo tempo, as similitudes entre as diversasexperiências européias e o caráter pluralista das atuais reformas admi-nistrativas. De modo que sua conclusão aponta para a força e importânciado modelo gerencial, mas ressaltando o diferente uso das técnicas ge-renciais e a subordinação destas às peculiaridades institucionais e cul-turais de cada país.

7 Ver, entre outros, WALSH, 1991; POLLITT, 1990; CLARKE, 1993; STEWART &RANSON, 1988; FREDECKSON, 1992.

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8 CLARKE, 1993: 22.9 Pollitt (1990) faz um excelente resumo das idéias do Public Service

Orientation (PSO) e dele eu faço uso em quase toda a discussão realizadanesta parte do artigo.

10 Faço uma diferenciação não usual na literatura brasileira entrepatrimonialismo e spoil system, no sentido mais moderno desta palavra. Oprimeiro refere-se à apropriação privada dos cargos públicos, apenas e tãosomente, levando quase sempre à irracionalidade da ação estatal nestessetores. O segundo também é um preenchimento político dos cargospúblicos, vinculado ao alto escalão e à busca do apoio aos projetos doExecutivo no Legislativo num nível mais macro, e que por vezes podelevar à racionalidade da ação estatal, uma vez que a eficiência dosocupantes destes cargos será relevante na barganha política. Um exemplodisso é qualidade dos ocupantes de boa parte dos DAS, como mostram osexcelentes estudos de BEN SCHENEIDER (1994) e de BRESSER PEREIRA

(1996), cargos estes quase sempre preenchidos pelo spoil system. Emsuma, o patrimonialismo e o spoil system podem ter efeitos diferentes; noentanto, o que os iguala é o seu caráter político, a possibilidade de des-continuidade administrativa presente em suas lógicas e, principalmente, oenfraquecimento da burocracia meritocrática que eles trazem em seu bojo.Talvez seja este último aspecto o mais deletério de todos.

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A reforma do Estado e aconcepção francesado serviço público

Jacques Chevallier

Gostaríamos de tentar avaliar, nesta oportunidade, os efeitosda reforma do Estado e dos serviços públicos — divulgada pelacircular do dia 26 de julho de 1995 — sobre a concepção tradicionaldo serviço público.

1) Esta confrontação é, à primeira vista, problemática. Porquefoi contruída no curso da evolução histórica, a “concepção francesado serviço público” repousa, na realidade, sobre a combinação e afusão de três dimensões: funcional, axiológica e jurídica:1 ela secaracteriza pela extensão da esfera da gestão pública, pelaespecificidade dos valores que governam seu funcionamento e pelaparticularidade das regras jurídicas que a ela se aplicam; ora, areforma do Estado não atinge nenhum destes aspectos. Ela nãovisa resolver o sensível problema da delimitação da área de açãodos serviços públicos. É verdade que a circular do dia 26 de julhode 19952 fizera desta delimitação seu primeiro “objeto prioritário”.Tratava-se de tornar claras as funções do Estado e a área de açãodos serviços públicos”, notadamente definindo, “domínio por domínio,a fronteira entre as funções que pertencem às pessoas públicas eaquelas que podem remontar a protagonistas privados”; mas esteobjetivo desapareceu do documento de trabalho,3 cujas diretrizesdeterminaram a abertura, em março de 1996, de uma extensacomposição entre as diferentes pessoas envolvidas nesta supressãoque, sem dúvida, resultou dos movimentos sociais que agitaram osetor público, em dezembro de 1995. A reforma do Estado não tem

Revista doServiçoPúblico

Ano 47Volume 120Número 3Set-Dez 1996

Jacques Chevallieré professor daUniversidade deParis II,Panthéon — Assas.

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mais a ambição de promover uma nova axiologia aplicável ao público,mas antes pretende aprofundar e ampliar as referências tradicionais;também não modifica a própria essência do regime administrativo,mesmo se ela pretende inverter a regra segundo a qual o silêncio daadministração provoca uma decisão implícita de recusa.

Ainda mais explicitamente, o documento de trabalho indicaque não se trata “nem de modificar o estatuto da função pública”,“nem de atacar os princípios do serviço público”. A reforma doEstado pretende, ao contrário, ser “fiel aos princípios fundamentaisda nossa tradição republicana”: na França, o Estado identificar-se-ia, com efeito, à República, e este “Estado Republicano”,“responsável pela coesão social da nação, pela igualdade de acessode todos aos grandes serviços públicos, pelo respeito ao direito, peladefesa dos interesses da França no mundo”, não poderia ser postoem causa; tratar-se-ia apenas, então, “de adaptar os serviçospúblicos às exigências do mundo moderno.” A continuidade emrelação à circular Rocard de 23 de fevereiro de 1989,4 segundo aqual os serviços públicos deveriam ser capazes de assegurar ocumprimento “das funções primordiais do Estado, ou seja, a defesados valores republicanos, a defesa do interesse geral e a promoçãodo progresso econômico e social”, é, neste aspecto, surpreendente.

2) Convém, no entanto, ir além desta primeira apreciação. Porum lado porque a reforma do Estado não pode ser dissociada dosmovimentos paralelos de reforma que afetam alguns serviços públicos,particularmente sob a pressão das diretrizes européias: a reformadas telecomunicações que foi adotada em junho de 1996 é um bomexemplo disto; a reforma do Estado intervém num contexto no qualos serviços públicos são constrangidos a um processo de redefiniçãoque destrói seus modos de organização e de funcionamento, o quenão deixa de lhe conferir um colorido singular. Por outro lado, porqueela mesma atinge alguns aspecto – talvez menos visíveis mas nãomenos essenciais – da “concepção francesa do serviço público”: aforaos elementos anteriormente evocados, esta concepção implica, comefeito, em uma certa visão da relação entre a administração e asociedade, do exercício do poder no interior do Estado (hierarquia) eda arquitetura administrativa (unidade), que é precisamente a metada reforma do Estado; também o impacto do movimento em cursosobre o serviço público não poderia ser subestimado.

a) Sob este aspecto, a reforma do Estado apresenta-se,aparentemente, como representante da política de modernizaçãoadministrativa que foi desenvolvida na França, como em outros paísesocidentais, a partir do início dos anos oitenta.5 Pondo em questão asestruturas axiológicas e práticas sobre as quais repousava a ação

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pública, a crise do Estado-provedor provocou, com efeito, a retomadado reformismo administrativo: esta retomada foi expressa de iníciopelo surgimento de novas temáticas (produtividade, avaliação, no-vas tecnologias, inovação, transparência...); em seguida, estasdiversas dimensões foram integradas a uma problemática global dereforma sustentada pela idéia de modernização. Diversas variantesdesta política foram sucessivamente elaboradas: o caminho da“qualidade”, asseverado pelo governo Chirac em 1986, visavamelhorar as performances dos serviços públicos, inspirando-seacentuadamente em métodos de gestão privada; a “renovação doserviço público”, expedida pelo governo Rocard em 1989, apoiava-se em funcionários instituídos como motores de mudança e sobre odesenvolvimento do diálogo social nos serviços; quanto à reformado Estado, conduzida pelo governo Juppé em 1995, ela coloca emprimeiro plano o administrado — “melhor servir os cidadãos” aparececomo o objetivo primeiro de uma reforma que visa “situar o usuáriono centro da administração”, “o cidadão no coração do serviçopúblico”. A ordem das prioridades é, então, evolutiva; mas, alémdestas diferenças, perfilam-se fortes elementos de continuidade:trata-se ainda de buscar uma maior eficácia administrativa,atenuando-se a rigidez interna e externa inerente à concepçãotradicional do serviço público, fortemente marcada pela racionalidadeburocrática.

Este reformismo não é exclusivo da França: em toda parte asadministrações públicas confrontaram-se com os mesmos desafiose foram forçadas a adaptar seus modos de organização e de ação;6

se estas políticas variam em função dos contextos nacionais e dosequilíbrios partidários, elas se caracterizam por uma convergênciaevidente de inspiração e envolvem implicações idênticas(abrandamento dos métodos de gestão, responsabilização dosdirigentes, melhoria do serviço prestado aos usuários).

b) Não deveríamos, todavia, ir tão longe nesta via, sob o riscode resvalar num esquema determinista (haveria uma única trajetóriade reforma) e um pouco fatalista (a sucessão dos rumos dasreformas testemunharia, ao mesmo tempo, a amplitude dasresistências e a dificuldade de fazer as coisas evoluírem). Aspolíticas de modernização administrativa não são uma simplesrepetição literal de um processo recorrente: cada uma delas deveser considerada na sua singularidade: ademais, elas contribuem paraa reformulação do problema da reforma administrativa, uma vezque o conduzem em novas direções. Se, então, a reforma do Estadose situa no prolongamento das polít icas precedentes demodernização, em especial da “renovação do serviço público”, isto

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não significa que ela não apresente elementos próprios, que devemser postos em evidência.

Uma das dificuldades da análise provém do caráter bastanteheterogêneo de uma reforma cujos objetivos se situam em níveismuito diferentes, mais do que da necessidade de se detalhar asmúltiplas medidas pontuais,7 relativas, por exemplo, à simplificaçãoe à qualidade, ou de se interessar pelas reformas setoriais, visandomelhor organizar a ação pública numa série de áreas como a saúde,a cultura, o ensino superior ou a pesquisa; nós nos deteremos àsorientações de conjunto, que testemunham inflexões não negligen-ciáveis no que concerne à condução da mudança (I), à relaçãoadministrativa (II), ao estatuto dos agentes (III) e à arquiteturaadministrativa (IV). Uma questão permanece colocada, questão queconstitui, sem dúvida, o ponto cego da reforma, a saber, qual vem aser o lugar do serviço público na economia e na sociedade, o queserá conveniente evocar na conclusão.

I – A condução da mudança

A maneira de se conduzir o processo de mudança adminis-trativa não constitui um simples problema de método ou de estratégiade reforma: ela constitui, na realidade, o revelador da lógica quepreside a construção do serviço público. É por este motivo que oestilo autoritário, que por muito tempo prevaleceu na França emmatéria de reforma administrativa, era indissociável da concepçãotradicional do estatuto dos funcionários: os funcionários eram tidoscomo sujeitados, não dispondo, enquanto tal, de um direito deconsideração, fiscalização e controle das regras que comandam ofuncionamento administrativo;8 e, desde então, sofrem o impactodas reformas decididas sem sua participação — e na verdade con-tra eles — na medida em que a problemática clássica da reformaadministrativa era, durante a terceira República, do tipo deflacionista.Desde os anos oitenta, uma nova visão da modernização adminis-trativa foi apresentada: é claro que esta modernização não pode serlevada a cabo sem a adesão e a participação ativa dos agentes; eladeve ocorrer com, e mesmo pelos agentes. Este novo estilo con-sensual de reforma mostra que os funcionários perderam a condiçãode sujeitados para tornar-se protagonistas, devendo estar totalmenteenvolvidos nas grandes decisões concernentes ao serviço público.Há, assim, congruência entre o estilo de reforma adotado (autoritário/consensual) e a própria concepção do que é o serviço público.

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O processo em curso é caracterizado por alguns elementossignificativos.

1) De início, a existência de uma vigorosa força política. Istoé, a bem dizer, uma característica geral das políticas de modernizaçãoadministrativa que surgiram a partir dos anos oitenta no mundoocidental (por exemplo, o programa Next Steps no Reino Unido em1988, o programa Reform 88 nos Estados Unidos no governoReagan, ou ainda o projeto “Reinventar o Estado” no governoClinton): em todos estes casos, o que se elaborou foi um programaglobal de reforma, resultado do trabalho de especialistas, elevado àcondição de prioridade da ação governamental. Do mesmo modo,na França, a política da “renovação do serviço público”, fortementeinspirada pelos trabalhos da associação “Serviços públicos” econcebida em estreita relação com os trabalhos da comissão“Eficácia do Estado”, foi promovida pelo governo Rocard à condiçãode “grande canteiro de obras da ação governamental; e sua aplicaçãoconcreta foi garantida pela organização de um trabalhointerministerial contínuo e de uma condução administrativaassegurada pela Direção Geral da Administração e da FunçãoPública (DGAFP).

A reforma do Estado foi ainda mais longe no sentido de umvoluntarismo, em função da definição de um calendário e doestabelecimento de estruturas ad hoc encarregadas de assegurar oacompanhamento. Um calendário: a circular do primeiro-ministrode 26 de julho de 1995, definindo as orientações de conjunto foiseguida, no dia 14 de setembro, de um seminário governamental,durante o qual foram examinadas as “notas estratégicas” que osministros haviam sido encarregados de redigir e determinar osprincipais eixos de um “plano trienal” de reforma; após a elaboração,em março de 1996, do documento de trabalho preparatório colocadoem discussão, a versão definitiva foi concluída no fim de junho.9

Estruturas ad hoc: um decreto de 13 de setembro de 199510 criou,com duração de três anos, um “comitê interministerial” e tambémuma comissão encarregada de elaborar todas as propostas dereforma, coordenar a preparação das decisões governamentais ezelar por sua execução. A criação destas estruturas especializadasencarregadas de conduzir a reforma cria, evidentemente, problemasde distribuição das atribuições com as estruturas existentes, emespecial com a DGAFP.

Este voluntarismo faz lembrar a abordagem top-down clássicaque, por muito tempo, dominou, em se tratando de reformaadministrativa; ele também evoca a configuração tradicional dasrelações entre o poder político e a administração, na qual a

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administração é transformada em “bode expiatório” e alvo dasreformas determinadas pelos governantes; esta configuração estevemuito presente no Reino Unido e nos Estados Unidos, onde a políticade modernização foi incluída no rol das ofensivas contra aadministração, tendo surgido de uma verdadeira campanha dedifamação dos funcionários. As condições nas quais a reforma doEstado foi anunciada (em julho), e a insistência do novo Presidenteda República em asseverar a necessidade do restabelecimento doleadership político11 sobre a administração, prenunciava umareativação do estilo autoritário de reforma; mas o movimento socialde dezembro de 1995 produziu um reajuste e o retorno a um modelomais consensual, ao preço de se ultrapassar os prazos fixados noinício para a elaboração da reforma.12

2) Seguindo esta reorientação, um processo de concertaçãodesenvolveu-se em torno dos eixos da reforma: o documento detrabalho elaborado em março serviu de base a um vasto debate nasrepartições, mas também com os sindicatos e, mais amplamentecom os eleitos, associações e especialistas; o objetivo destaconcertação era permitir “validar e tornar mais pontuais osdiagnósticos, enriquecer as proposições, escolher soluções maisadequadas, refletir a respeito dos meios de executá-las.”13

Por este viés, os sindicatos de funcionários foram reintegrados,in extremis, em um processo de reforma do qual haviam sido, aocontrário do que tinha se passado na “renovação do serviço público”,14

excluídos no início; e a negociação com eles deve continuar no planoda execução. Estas flutuações mostram que a posição dos sindicatosde funcionários das estruturas administrativas continua ambígua eque o problema de seu envolvimento no processo de modernizaçãoem curso permanece. Pelo menos quatro posições são possíveis aeste respeito: ou a modernização se efetua contra os sindicatos, cujainfluência se pretende diminuir, utilizando-se especificamente todosos recursos do gerenciamento participativo;15 ou ela é decidida semeles, partindo do postulado de que são, por essência, hostis à mudança;ou, ainda, ela é conduzida com a participação deles, buscando integrá-los ao movimento; inversamente, a idéia de uma modernizaçãoconduzida pelos sindicatos de funcionários corresponde a uma visãoultrapassada do sindicalismo que figurava, no início do século, nocentro da doutrina dita “sindicalismo integral”. A oscilação da reformado Estado entre a exclusão e o envolvimento dos sindicatos testemunhauma dificuldade persistente em avaliar corretamente o fato sindicalna função pública; e, neste caso, para que os sindicatos fossemintegrados ao processo em curso, tornou-se necessário manifestarsua existência por meio de ações diretas nas ruas.

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Inversamente, e mesmo que a circular de 26 de julho de 1995advertisse ser “a força ativa ” dos agentes públicos no empreendi-mento da reforma “uma condição indispensável para o sucesso”, ospróprios funcionários foram, neste momento, muito pouco envolvidosna reforma do Estado, enquanto que a “renovação do serviçopúblico” havia feito deles “os personagens principais das evoluçõesa serem executadas”. Sem dúvida a “recusa” e a “execução” dareforma do Estado devem, segundo o documento de trabalho, ser“assunto da competência de todos”, um chamamento feito à“mobilização” dos agentes: trata-se de “fazer com que cadafuncionário assuma o risco da responsabilidade”; mas este anseiopermanece, presentemente, como mera “boa intenção”, enquantonão se definem as condições e o modo de se efetuar esteenvolvimento.

3) Um interesse em racionalizar o processo de mudançaaparece, enfim, através de duas novas idéias.

A primeira é a avaliação. Esta via se aplica, de imediato, aopassado: a primeira ambição do documento de trabalho era avaliaras ações de modernização introduzidas ao longo dos últimos anos— providência que já fora adotada após o ano de 1993, com ainstalação da comissão Sérieyx encarregada de realizar um balançodos projetos de serviço na administração;16 não se trata mais depretender fazer do passado uma tabula rasa, mas de partir do quejá foi feito. A generalização à total idade dos serviçosdescentral izados dos modos de gestão dos créditos defuncionamento, experimentados nos quadros dos centros deresponsabilidade, é a tradução concreta deste método. Mas a idéiade avaliação diz respeito também às novas ações que serãolançadas, função que adquire, deste então, apoio na comissão paraa reforma do Estado.

A segunda é a experimentação. Não há dúvidas de que areforma do Estado privilegia a via top-down em relação à bottom-up, muito apreciada nos anos oitenta, momento em que as políticasde modernização apoiavam-se freqüentemente sobre as iniciativastomadas, quer na periferia do aparelho (especialmente nos serviçosdescentralizados), quer por administrações inovadoras (equipamento,telecomunicações), num esforço de extensão e generalização:17

todavia, no plano da execução, busca-se modificar pouco a pouco osmétodos de trabalho, os procedimentos, as organizações, justamenteatravés da experimentação; e os fundos para a reforma do Estadosão chamados a contribuir no financiamento destas inovações.

A condução do processo de mudança confirma, então, a evo-lução que ocorreu, desde os anos oitenta, nas representações do ser-

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viço público e na definição dos protagonistas envolvidos na moder-nização administrativa. A inflexão estratégica que se produziu apósdezembro demonstra claramente que os funcionários e suas organi-zações tornaram-se os personagens principais deste processo, sem aadesão e o envolvimento dos quais toda reforma corre o risco defracassar.

II – A relação administrativa

Com a relação administrativa nós nos encontramos no pontocentral daquilo que constitui a especificidade do serviço público:enquanto as organizações privadas são “introvertidas”, quer dizer,constituem o seu próprio fim, as organizações públicas são, por suaparte, “extrovertidas”, isto é, colocadas a serviço de interesses queas ultrapassam, de modo que toda reforma administrativa visa, destaforma, a uma melhor satisfação do “administrado”, restando, porém,um equívoco quanto a se saber se o “administrado” se refere aosusuários ou ao público em geral.18

Este objetivo estava presente em diversos programas demodernização executados desde os anos oitenta, porém de maneiravariável. A política da qualidade visava muito claramente melhorara prestação dos serviços públicos. A “renovação do serviço público”recorreu a um caminho um pouco mais complexo: sendo o objetivomelhorar o funcionamento dos serviços públicos em geral, tratava-se de responder às aspirações dos funcionários tanto quanto“satisfazer os usuários’, e a transformação das relações de trabalho(o primeiro ponto e o mais desenvolvido da circular de 23 defevereiro de 1989) era claramente transformado em objetivoprioritário e em ferramenta da mudança; inversamente, a parteconcernente aos usuários era muito mais decepcionante, a “políticade acolhimento e de serviço” preconizada pela dependência dodesenvolvimento da informação do público, da personalização dasrelações, da simplificação das formalidades e trâmites, da associaçãodos usuários, às tarefas.

A reforma do Estado modifica a ordem das prioridades,conforme uma orientação esboçada após o ano de 1993:19 “levarmais em conta as necessidades e as expectativas dos cidadãos”figura como segundo item (logo após a clarificação das funções doEstado) na circular de 26 de julho de 1995; e o documento de trabalhoinsiste em sua ambição de “recolocar o usuário no centro daadministração” ou ainda “ situar o cidadão no coração do serviço

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público”. Antes de examinar as expressões concretas desta ambição,deve-se investigar se a concepção mesma do administrado seencontra modificada.

1) A reforma administrativa está à procura de um novo perfildo administrado sobre o qual se apoiar, representação necessária àadministração levando-se em conta a lógica de extroversão quedomina seu funcionamento. Este perfil não pode mais ser o dosubmisso, que evoca o modelo clássico de relações fundadas sobrea unilateralidade, nem mesmo o do simples usuário, na medida emque o usuário pode ser um “usuário cativo”,20 o que nos remete aomodelo precedente. Viu-se, desta forma, emergir vários novos perfisdo usuário que implicam representações diferentes do administradoe desembocam em diferentes perspectivas de reformas: o usuárioprotagonista, dotado de um poder de intervenção no andamento dosserviços (de onde decorre o tema da participação); o usuárioparceiro, capaz de se colocar como um interlocutor de serviços (daío tema da transparência); o usuário cliente, cujas aspirações devemser satisfeitas pelos serviços públicos (donde o tema da qualidade).Todos estes perfis permanecem, todavia, equívocos, na medida emque a participação pode ser ilusória, a parceria uma aparênciaenganosa e a clientela manipulada.

Um novo personagem tende a emergir a partir do início dosanos noventa, o do cidadão: figura sintetizante, cuja tendência éabsorver e ultrapassar os aspectos precedentes; figura que implicao reconhecimento dos direitos (fenômeno de “juridicização”concomitante ao movimento mais geral de retorno ao direito); figura,enfim, que faz surgir uma dimensão suplementar na relaçãoadministrativa, a dimensão propriamente cívica, que vai além dasimples imposição de obrigações ou concessão de prestações. Nãoobstante, esta figura, também, não escapa aos equívocos: na França,a cidadania esteve tradicionalmente ligada à nacionalidade e situadana ordem política; sua promoção no terreno administrativo traz orisco de alimentar uma certa “politização” do ato administrativo.Sua utilização supõe, portanto, não apenas uma disjunção entrecidadania e nacionalidade, mas ainda uma considerável ampliaçãode uma noção que não caracterizaria apenas uma relação do tipopolítico, mas repercutiria também nos processos mais gerais deintegração “social”. Mais do que pretender condensar a relaçãoadministrativa numa figura única, convém sublinhar a existência defiguras múltiplas, que apontam para uma diversidade de modos derelações possíveis com os serviços públicos, frente aos quais nóssomos ora submissos, ora devedores, ora usuários, ora clientes, ouainda cidadãos...

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A reforma do Estado tende a assimilar e a fundir as figurasdo usuário e do cidadão: o documento de trabalho fala, comsimplicidade, na mesma página,21 em “recolocar o usuário no centroda administração” e “ situar o cidadão no coração do serviço público”(se esperaria antes o contrário); as categorias de usuário e de cidadãodefinem-se, portanto, mutuamente numa relação paradigmática desubstituição, como se pudéssemos recorrer indiferentemente a umaou outra. A idéia, bem francesa, de codificar a totalidade dos direitosdos usuários cidadãos num documento único — que figurou na cir-cular de 26 de julho de 1995 (item 2.1) — foi, no entanto, abandonada:tal documento, em relação ao qual o documento de 1992 constituiuuma prefiguração, corria o risco de ser muito geral, muito abstratoe, no limite, pouco operante; de todo modo, este documento teriasido meramente uma reprodução do “código da administração”, cujaelaboração figura no programa geral de codificação anunciado pelacircular de 30 de maio de 1996.22

2) O arsenal de reformas pretendidas se inspira numa vontadede ampliação do serviço público. A circular de 26 de julho de 1995desejava acrescentar aos três princípios tradicionais de “neutra-lidade” (curiosamente substituto do princípio de “mutabilidade” queera, no entanto, a terceira “lei de Rolland”), “igualdade,continuidade”, não menos do que oito novos princípios: “qualidade,acessibilidade, simplicidade, rapidez, transparência, mediação,participação, responsabilidade”; deste modo, ela sobrecarregouexcessivamente, de uma só vez, — e não sem redundância (todosestes princípios originavam-se de um modo ou de outro da idéia dequalidade) e contradição — a barca do serviço público, correndo orisco de diluir a especificidade de seu regime.23 O documento detrabalho é menos ambicioso e menos loquaz: coloca em primeiroplano apenas os novos princípios de “qualidade, acessibilidade,simplicidade”,24 sendo a reforma do Estado inspirada, de modo geral,em “princípios de simplicidade, de responsabilidade e de eficácia”,25

para finalmente deter-se no capítulo 1 nos princípios de “simplici-dade” (que englobam a “acessibilidade”) e de “qualidade”.

Acham-se, assim, senão esquecidos ao menos diminuídos, ostemas da participação e da transparência que haviam sidoprivilegiados (o primeiro nos anos sessenta, o segundo nos anossetenta) como pontas de lança e vetores da transformação dasrelações com o público: nenhuma nova medida foi considerada comrespeito à participação, tendo, ademais, a Força Operária sedeclarado, em 9 de abril de 1996, diante da comissão de modernizaçãodos serviços públicos, hostil a qualquer forma de “co-gestão”, tantoquanto à presença de usuários nas instâncias administrativas de

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decisão; e, com relação à transparência, é apenas previsto que oacesso aos documentos administrativos será melhorado e clarificado,os poderes do mediador achando-se, por outro lado, reforçados —estando estas medidas significativamente ligadas ao tema daqualidade. A passagem destes temas ao segundo plano revela umapercepção nova dos presumidos anseios do público.

Os dois objetivos de simplicidade e de qualidade aparecemindissociáveis desde que adotemos uma acepção ampla de qualidade:uma administração de qualidade é, de início, uma administraçãosimples e acessível; é, portanto, como conseqüência de uma definiçãorestrita da qualidade (a saber, a qualidade das próprias prestações)que esta distinção é feita aqui.

a) A simplicidade é um tema enganosamente simples, namedida em que procedimentos e formalidades são indispensáveispara assegurar a proteção dos direitos dos administrados.26 Muitasmedidas essenciais são previstas nesta direção. A primeira é aextensão das decisões implícitas de aceitação. Sabemos que a regraestabelecida em 1864, segundo a qual o silêncio mantido pelaadministração faz surgir uma decisão implícita de recusa ao final deum prazo de quatro meses, foi elevada à condição de regra geral dodireito administrativo: apenas uma lei poderia derrogá-la; e odesenvolvimento progressivo, especialmente a partir dos anoscinqüenta, de textos prevendo decisões implícitas de aceitação,27

suscitou inflamadas reações tanto da administração como do juizadministrativo, em nome da proteção do direito de terceiros, doimperativo da seguridade jurídica e da defesa do interesse geral. Oseminário de 14 de setembro de 1995 decidiu, sem contrariar a regraprecedente, desenvolver amplamente o número de casos nos quais“o silêncio mantido pela administração valerá como aceitação”,28

notadamente a cada vez que há um regime prévio de autorizaçãoadministrativa. Na realidade, o objetivo essencial desta medida éobrigar a administração a responder às demandas que lhe sãoendereçadas: a circular de 9 de fevereiro de 1995, relativa aotratamento das reclamações endereçadas à administração, járessaltava, com veemência, que uma “resposta explícita é semprepreferível à ausência de reação”, a fim de prevenir o recurso à viade contenda; a fórmula é aplicada a todas as situações nas quais aadministração é envolvida por demandas da parte dos administrados.Em seguida, aparece a redução do número de autorizações prévias.Também aqui, o princípio foi decidido pelo seminário governamentalde 14 de setembro de 1995, tendo uma circular de 15 de maio de1996 29 convidado os ministros a preparar o inventário dos regimesaplicáveis nos seus setores e a fornecer propostas de supressão. A

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circular de 15 de maio de 1996 relativa à execução do plano dereforma do Estado julgou as proposições insuficientes para que osobjetivos fixados fossem atingidos: proposições complementares sãorequisitadas aos ministros, e o princípio de “séries sucessivas desupressões e transformações” de agora até o fim de 1997 foiconservado, com o objetivo de “suprimir o maior número possívelde regimes,”30 e simplif icar aqueles que forem mantidos,particularmente através da extensão do princípio do acordo implícitoe da descentralização do poder de decisão. Enfim, a vontade deconter a proliferação de textos e de aumentar sua legibilidadeconduziu, por um lado, à imposição de que, ao menosexperimentalmente,31 os novos textos fossem acompanhados de um“estudo de impacto” dotados de uma análise precisa das vantagensvisadas e das múltiplas incidências do texto (circular de 21 denovembro de 1995)32 e, por outro lado, levou à elaboração de umprograma geral de codif icação do conjunto das leis eregulamentações num prazo de cinco anos (circular de 30 de maiode 1996). O documento de trabalho prevê, mais amplamente, paraassegurar uma maior proximidade com o público, a introdução deuma nova função, a de “facilitador administrativo”, assim como apolivalência dos serviços públicos, tema presente desde os anossetenta.

b) Quanto à qualidade, o documento de trabalho prevê, alémde medidas pontuais, a elaboração, conforme o modelo dos Citi-zen’s Charts britânicos, “cartas de qualidade em cadaadministração” que comportem objetivos numéricos de qualidade einstrumentos de medida da satisfação dos usuários. A influência domodelo britânico faz vir à tona equívocos nascidos de um tema quepode significar, quer, na versão dura, identificação com o privado eo tratamento do administrado como “cliente”, quer, na versão suave,melhoramento da prestação de serviços, de modo que o problemareside na possibilidade de se definir normas ou padrões de qualidadee indicadores de realização.

A reforma do Estado não acarreta, portanto, uma transfor-mação profunda da relação administrativa como demonstra o refluxodos temas da participação e da transparência, cujas potencialidadeseram muito mais promissoras: fora de uma catalogação de medidaspontuais úteis, ela pretende apenas prolongar e ampliar as políticasem curso (simplificação, qualidade), buscando elevar o nível desatisfação do público.

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III – O estatuto dos agentes

A reforma do Estado se curva, por sua vez, ao tema da“gestão de recursos humanos” (GRH) que se impôs desde os anosoitenta como um tema consensual por excelência e como um dosobjetivos privilegiados da reforma administrativa. A administraçãopública não extrairia todo o partido possível do excepcional potencialhumano que possui:33 ela deveria renovar profundamente suasrelações com os seus agentes, passando de uma “administração depessoal” baseada exclusivamente em preocupações jurídicas eorçamentárias, a uma autêntica “gestão de recursos humanos”,levando em conta os aspectos organizacionais e pessoais. Na mesmalinha da “renovação do serviço público” que preconizava uma “gestãomais dinâmica de pessoal”, o documento de trabalho estabelececomo segundo objetivo a “renovação da gestão de recursoshumanos.”

1) Confrontada com o problema da possibilidade de umagestão de recursos humanos no setor público, a reforma do Estadonão consegue dissipar as grandes incertezas que pesam sobre esteponto. A gestão de recursos humanos foi, com efeito, introduzidaem empresas privadas como um dos instrumentos de seugerenciamento; trata-se de saber se a sua transposição aos serviçospúblicos é possível, especialmente tendo em conta a existência deum estatuto da função pública, comandado por uma lógica diferente.Como foi notado com precisão,34 uma autêntica gestão de recursoshumanos suporia a reunião de duas condições. Por um lado, umadiferenciação das carreiras segundo as performances dosinteressados, pela recompensa do mérito e pela sanção de carências,o que exigiria não apenas a implantação de um sistema de avaliaçãoreal destas performances, como também a possibilidade de se extrairconclusões concretas: ora, esta diferenciação é incompatível tantocom o estatuto da função pública, baseado na idéia de igualdade,como com a existência de instâncias (as comissões administrativasparitárias) que lutam por uma homogeneização cada vez maior dascarreiras. Por outro lado, é necessária uma responsabilização dosquadros de funcionários, que lhes permita gerir as carreiras dosempregados sob sua autoridade, mas que também os exponha arecompensas ou sanções segundo os resultados obtidos; ora, osinteressados não estão prontos a assumir as conseqüências de talresponsabilização. Sem estas duas condições, a gestão de recursoshumanos na administração corre o risco de se encerrar num planoquase que exclusivamente retórico, ou então limitar-se a ser merocoadjuvante, não tocando o essencial.

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A reforma do Estado visa renovar a função pública, porém“sem pôr em questão os princípios fundadores, particularmente oestatuto geral da função pública”, e sem ameaçar a existência deinstâncias paritárias, que são uma das aquisições essenciais doestatuto de 1946, cuja discussão seria pouco recomendável; ela visa,no entanto, no plano da afirmação da gestão descentralizada depessoal, desenvolver comissões administrativas paritárias locais. Nãohá dúvidas de que as comissões nacionais serão mantidas, com umafunção de harmonização; mas vemos aparecer aí uma brecha nosistema de gestão de carreiras e um esboço de diferenciação queos sindicatos de funcionários se empenharão, sem sombra de dúvidas,em reabsorver. A descentralização de uma série de decisões relativasaos agentes, e a experimentação de um novo espaço de trabalhonos quadros dos “contratos de serviço” chamados a tomar o lugardos centros de responsabilidade, é claramente o elemento mais aptoa produzir mudanças, rompendo com um igualitarismo estrito.

2) As modalidades de gestão de recursos humanos nãoapresentam qualquer aspecto realmente original: elas se situam emcontinuidade direta com as reformas anteriormente empreendidas.

A gestão preventiva de empregos, que visa adaptar a estruturados empregos à evolução das funções e assegurar a alocação ótimados empregos em função das necessidades, deve ser “melhororganizada e generalizada” a partir de uma melhor previsão dasnecessidades do Estado: a esse respeito, um documento metódicodeve ser elaborado no segundo semestre de 1996, seguido de umesquema diretor por ministério em 1997. Seria isto suficiente paraassegurar, no futuro, a alocação ótima dos empregos, imposta pelararefação dos recursos orçamentários? Podemos duvidar disto: hámais de quinze anos 35 que se fala em gestão preventiva dosempregos, e a administração sempre foi incapaz de prever a evoluçãodas funções administrativas e organizar os remanejamentosnecessários de um setor a outro, que não fosse sempre à últimahora, sob o império da necessidade; a France Télécom encontra-sefrente a um grave problema de inadaptação da estrutura dosempregos, que não foi capaz de prever nem de gerir de maneirasatisfatória.

A ênfase na formação contínua não é nova: o novo acordoassinado em 22 de fevereiro de 1996 se situa na mesma linha dosacordos anteriores de 29 de junho de 1989 e 10 de julho de 1992: elesimplesmente se restringe a aumentar os recursos financeirosconsagrados à formação contínua (3,8 % da massa salarial em 31de dezembro de 1998), aumentar a duração mínima de formaçãoreconhecida a cada funcionário (cinco dias para as categorias A e

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B, seis dias para a categoria C), reforçar o aspecto avaliativo (fichaindividual de formação para cada agente, curso anual de formação,balanço profissional a pedido de agentes que totalizam mais de dezanos de serviços efetivos...), assim como assegurar a gestãodescentralizada dos créditos de formação. Este acordo constitui oplano de ação do Estado neste domínio, para os próximos três anos.

A renovação dos procedimentos anunciados de notação e deentrevista individual foi largamente estimulada ao longo dos últimosanos, sem que os resultados tivessem sido tão convincentes. Todaalteração do sistema de notação, quaisquer que sejam os defeitosfreqüentemente apresentados,36 choca-se com a hostilidade dossindicatos, na medida em que isto é percebido por eles como umatentativa de reduzir a co-gestão das carreiras, de restaurar aautoridade hierárquica e de recriar perfis de carreira diferenciadosatravés do questionamento do sistema de repartição e, portanto, decomprometer o poder sindical.37 Quanto à fórmula de entrevista deavaliação, cujo estatuto permanece equívoco (é paralela ou articuladaaos procedimentos de notação?), ela não poderia tomar o seu lugar;a personalização da relação hierárquica que ela envolve é, alémdisto, excessivamente subordinada às tradições burocráticas paraque não suscite resistências.

A idéia de favorecer a mobilidade e a polivalência profissionaisatravés do reagrupamento em fileiras, também não é nova: há muitotempo denuncia-se a atomização como um fator de rigidez e deesclerose da função pública. Aí estaria situado o elementoindiscutivelmente mais suscetível de abalar as estruturas do edifício:o exemplo dos PTT mostra que a resistência que uma tal medidasuscita pode ser superada, mas ao preço de um constante diálogosocial, e somente se esta medida é percebida como favorável pelosinteressados, ou seja, ligada a uma reforma de qualificações, a umareordenação da pirâmide” e ao aumento das remunerações;38 ora,se o documento de trabalho fala sobre “renovar o regime dasremunerações”, os contornos desta renovação não se desenhamcom clareza e o contexto de rarefação de recursos acaba por reduziras conseqüências positivas para os interessados.

A reforma do Estado pretende flexibilizar e fornecer maiorespaço de trabalho em matéria de gestão de pessoal, suprimindocertas intransigências presentes na aplicação do estatuto; a gestãodescentralizada dos recursos humanos aparece como um meio privi-legiado para a realização deste objetivo. No entanto, as prováveisresistências que os sindicatos oporão a medidas que coloquem em

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questão o poder por eles adquirido provavelmente atenuarão o impac-to das medidas pretendidas. Reencontramos, assim, o último aspecto.

IV – A arquitetura administrativa

A idéia central da reforma do Estado a respeito da arquiteturaadministrativa é distinguir claramente as funções ditas “estratégicas”,pertencentes ao Estado central, e as funções “operacionais” deexecução, que devem se originar de estruturas periféricas (serviçosdescentralizados, estabelecimentos públicos, e mesmo parceirosprivados): como indica o documento de trabalho, “não pertencemao Estado central, de maneira genérica, tarefas relativas a assuntosde gestão ou de prestação de serviços. Estas devem ser de responsa-bilidade dos serviços operadores, serviços descentralizados decompetência nacional ou territorial ou estabelecimentos públicos.”39

Esta orientação compartilha da mesma orientação das reformas que,em inúmeros países ocidentais40 levou a distinguir, conforme o modeloaplicado no Reino Unido após o relatório Next Steps de 1988,41 asresponsabilidades de elaboração de políticas, distribuídas pelosdepartamentos ministeriais, das tarefas de gestão, confiadas a“agências” autônomas: a França permaneceu à margem destemovimento, ainda que “centros de responsabilidade” tenham sidoinstituídos em caráter experimental, no âmbito da “renovação dosserviços públicos — mas sua fonte de inspiração foi totalmentediferente daquela 42 — e que estruturas explicitamente qualificadasde “agências” tenham sido criadas, particularmente no domínio so-cial e em questões do meio ambiente;43 mas uma série de relatórioshavia preconizado recentemente que o recurso a esta fórmulaconstituía um meio de transformação das estruturas administrativas.44

Além das críticas suscitadas pelas condições nas quais estasoperações de reestruturação foram conduzidas,45 e pelos efeitosperversos que freqüentemente produziram,46 convém notar que opostulado segundo o qual a distinção entre funções estratégicas eoperacionais garantiria uma boa gestão é cada vez mais contestadonos países que o puseram em ação: a idéia de que seria possívelestabelecer uma linha de demarcação clara entre a elaboração e aexecução, ou ainda entre política (encarregada de definir asorientações) e a administração (encarregada de executá-las) parecenão apenas irrealista mas também custosa e, no limite, contrária aoimperativo de eficácia; ela privaria a política dos meios de açãonecessários, implantando uma forma de “governo à distância”, e

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impossibilitaria um controle real sobre os serviços que se tornaramautônomos. Também o modelo das agências autônomas foiparcialmente questionado em certos países que o haviamexecutado:47 em última instância, a gestão dos assuntos públicosseria mais eficaz quando da responsabilidade dos ministériosintegrados, nos quais se articula a orientação política e a execução,e não repartidos em departamentos centrais e agências executivas.Podemos, então, perguntar pelo fundamento da concepção daarquitetura administrativa sobre a qual se assenta a reforma doEstado.

Este postulado determina um conjunto de mudanças que visamconsolidar cada um destes níveis ou pólos da ação pública.

1) Do lado das funções operacionais, a reforma do Estadopreconiza “um poderoso movimento de delegação de responsa-bilidades”;48 ela se situa, neste ponto, no centro da política de“renovação do serviço público” que elevou a descentralização àcondição de “regra geral da repartição de atribuições e de meios”nos serviços do Estado (art. 1 da carta da descentralização de 1 dejulho de 199249) e conferiu aos serviços descentralizados uma maiorliberdade de gestão (especialmente pela utilização em seu benefícioda fórmula dos centros de responsabilidade). Trata-se, segundo odocumento de trabalho, de “concluir, garantir e comandar a descen-tralização”, particularmente através de novas transferências de res-ponsabilidade na direção dos serviços descentralizados, e da afir-mação de sua autonomia de gestão: é previsto que o modo de gestãodos créditos de funcionamento presentemente utilizados pelos centrosde responsabilidade será estendido à totalidade dos serviços descen-tralizados e que, mais além, serão experimentadas novas flexibiliza-ções no âmbito dos “contratos de serviço”. Por outro lado, e sobretu-do, medidas de simplificação da organização territorial, já projetadas,serão implantadas; uma tal simplificação é evidentemente in-dispensável tendo-se em conta a complexidade do sistema francêsde organização territorial. Para além destas medidas, convémassinalar que a unidade dos processos de descentralização (territorialou funcional), assim como sua freqüente superposição, são, destemomento em diante, percebidas claramente; passamos, assim, parauma visão global da descentralização, inserida numa problemáticacentro/periferia.

As funções operacionais podem ainda ser confiadas a estruturaspersonalizadas (estabelecimentos públicos), mesmo a outrospersonagens (coletividades territoriais, organizações profissionais): oEstado adentra, então, a lógica de uma parceria que, nos termos dodocumento de trabalho, constituiria, em inúmeros domínios, “o meio

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mais eficaz de mobilizar as vontades e os meios”. Em se tratando dagestão personalizada, o desenvolvimento atual da fórmula das agênciasdemonstra a preocupação em extrair todas as conseqüências da lógicada personalização inerente ao estatuto do estabelecimento público,através da atribuição de uma autonomia de gestão aumentada. Quantoà atração de parceiros de fora, evoca-se irresistivelmente a lógica daprivatização: o Estado deve em realidade procurar “confiar a terceiroso cuidado com funções das quais ele não seria necessariamente omelhor executor”; e esta lógica esteve efetivamente presente,especialmente no Reino Unido, através da fórmula do market test-ing, toda vez que se pretendia distinguir funções estratégicas defunções operacionais. Reencontramos, por este viés, o item 1 da cir-cular de 26 de julho de 1995, a respeito da clarificação do campo doserviço público; mas nenhum elemento de clarificação incidiu sobreos critérios de avaliação da oportunidade de evocar a iniciativa privada.

2) Do lado das funções estratégicas (o documento de trabalhofala, aliás, explicitamente de um “Estado estrategista”), encontramosum conjunto de medidas que visam tornar o Estado central maiseficaz. Esta abertura é nova em relação à “renovação do serviçopúblico” que apresentava somente a idéia de avaliação das políticaspúblicas, mas também em relação ao reformismo administrativotradicional, que, afinal, pouco se ocupava com a parte maissedimentada do Estado central; isto é, incontestavelmente, um dospontos centrais da reforma. Convém, todavia, não exagerar a respeitode sua novidade, uma vez que se trata, antes de mais nada, de umasíntese de elementos que até o momento se encontravam dispersos,por exemplo, no que se refere às condições dos recursos ao direito,50

aos procedimentos de preparação orçamentária, à elaboração eavaliação de política públicas, à tutela de empresas públicas, ao“enxugamento” das estruturas ou, ainda, à renovação da gestãopública; a ênfase colocada sobre a política patrimonial do Estado é,inversamente, específica.

O elemento mais interessante, que não deixa de nos espantar,é a ênfase dada ao reforço das capacidades de elaboração daspolíticas públicas, que conduz à reativação da concepção, tradicionalna França, de um Estado “cérebro da sociedade”: o Estado encontra-se, com efeito, referendado no seu papel de previsão — a função“estatística e estudos econômicos” deve ser racionalizada — pros-pectiva, mas também de planificação, através da reforma pretendidado Comissão Geral do Plano: o Estado “estrategista” não é, portanto,de modo algum, um “Estado modesto”, mas, como dizia o presidenteda República,51 um Estado “forte”, capaz de construir um projeto

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de desenvolvimento e de manter a coesão social. Podemos nosperguntar se esta visão, tão gaulliana, é ainda compatível com oprocesso de internacionalização em curso.

A reforma do Estado impele o movimento de fragmen-tação do Estado, perceptível a partir dos anos oitenta, ainda antes,pela delegação sistemática de responsabilidades de gestão e deautonomização dos serviços gestionários; ela pretende, no entanto,paralelamente, preservar a coerência das políticas públicas atravésde um reforço da capacidade estratégica do Estado central: umatensão existe, assim, entre dois movimentos contraditórios, fundadosna aposta gerencial da dissociação entre o operacional e oestratégico.

Por todos estes aspectos, a reforma do Estado atinge,verdadeiramente, a concepção tradicional do serviço público:

• a condução da mudança tende a promover um estilo con-sensual de gestão no interior das estruturas administrativas;

• a relação administrativa é modificada pela promoção dafigura do usuário cidadão;

• a função dos agentes é flexibilizada pela introdução dagestão descentralizada de recursos humanos;

• por fim, a arquitetura administrativa deve ser reordenadaem torno dos pólos estratégico/operacional.

O ponto cego continua sendo, todavia, o problema da posiçãodo serviço público na economia e na sociedade. A reforma do Estadonão dá, com efeito, respostas claras a este problema, a despeitodas afirmações teóricas sobre a importância dos serviços públicose o apego à “concepção francesa do serviço público”.

No que concerne à posição dos serviços públicos com relaçãoao mercado, convém lembrar que uma ligação estreita foi estabelecidana França entre serviço público e monopólio: consideramos por muitotempo que o serviço público implicava o monopólio; supunha-se queos interesse coletivos, que justificaram sua instituição, não poderiamser protegidos senão na ausência de concorrência. A regressão dosmonopólios públicos, ao menos no domínio econômico, sob a pressãoeuropéia, coloca a questão de se saber como garantir a realizaçãodas finalidades do serviço público num contexto de concorrência.Segundo o documento de trabalho, o Estado deve “zelar ao mesmotempo pelo cumprimento dos objetivos do serviço público e pelorespeito a regras leais de concorrência”; é um pouco como aquadratura do círculo, ainda que a “função de regulação” seja“organizada com cautela”; o dispositivo previsto pela lei dastelecomunicações servirá, evidentemente, sobre este ponto, comoreferência.

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Quanto ao lugar dos serviços públicos na sociedade, um con-junto de questões permanece referentes ao grau de especificidadedos serviços com relação às outras atividades sociais,52 às finalidadesque lhes são destinadas, à esfera a eles destinada. Ainda sobre todosestes pontos, a reforma do Estado não traz elementos de resposta:mas poderia fazê-lo, uma vez que estas questões são, por essência,abertas, e dependem, antes de mais nada, de uma dinâmica social epolítica.

Notas

1 CHEVALLIER, J., Le service public, 3ª ed. Paris: PUF, 1994, Col. "Que sais-je?"2 Circular de 26 de julho de 1995 relativa à preparação e à execução da reforma do

Estado e dos serviços públicos, JO de 28 julho de 1995, p. 11217.3 “Réflexion préparatoire à la reforme de l'Etat", Documento de trabalho publicado

em 8 de março de 1996, 81p.4 Circular de 23 de fevereiro de 1989 relativa à renovação do serviço público, JO

de 24 de fevereiro de 1989, p. 2526.5 CHEVALLIER , J., “A política francesa de modernização administrativa”, In

L'État de droit-Mélanges en l'honneur de Guy Braibant, Paris: Dalloz, 1996,pp. 69-87.

6 Ver "Les administrations en Europe: d'une modernisation à l'autre", RFAP, nº75 julho setembro de 1995.

7 THOENIG, J., C. fala a respeito destas "medidas muito heteróclitas" relativas a umverdadeiro "inventário à Prevert" (Reforma da administração e reforma do Estado,In Revue politique et parlementaire, n. 982, março/abril 1996, p.56).

8 CHEVALLIER , J., “Os funcionários e a modernização administrativa”, Revue ad-ministrative, n. 271, janeiro de 1993, pp. 5 e seguintes.

9 Esta versão permanece fiel às orientações definidas no documento de trabalhode março (ver a apresentação feita pelo primeiro-ministro na Ouest France, nodia primeiro de julho, e a entrevista do Ministro da Função Pública do mesmodia): ele prevê tornar a administração "mais simples", particularmente pelasupressão de um certo número de autorizações administrativas e da multiplicaçãode casos nos quais a não resposta da administração vale como um acordo tácito,"mais próximo” dos cidadãos, pela reafirmação da desconcentração, "maismoderna e mais responsável, por uma série de medidas destinadas a favoreceruma maior eficácia de ação pública: no que concerne aos agentes, o pontoessencial reside na elaboração de uma "nova forma de avaliação individual".

10 Decreto n. 95 1007 de 13 de setembro de 1995, relativo ao comitê inter-ministerial para a reforma do Estado e à comissão para a reforma do Estado, JOde 14 de setembro de 1995, p. 13558.

11 Trata-se, segundo J. Chirac (Le Monde, 6 de maio de 1995) de "reencontrar oequilíbrio dos poderes que o general de Gaulle havia desejado": "pouco a poucoo poder político diluiu-se em favor da administração que é, por natureza,

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conservadora e reticente a mudanças"; "é necessário restabelecer a primazia dopoder político, ficando a administração destinada às funções de proposição eexecução que lhe são próprias".

12 Na origem, o plano trienal deveria ser publicado no final de dezembro; após aetapa intermediária e nova do documento de trabalho submetido à consulta dosinteresses, os prazos foram ampliados, primeiro para abril, depois para junho,e, por fim, o excesso de formalismo acabou sendo abandonado.

13 Réflexion préparatoire, p. 5.14 A circular de 23 de fevereiro de 1989 insistia sobre a necessidade da "proteção

do pessoal e de suas organizações sindicais" para a estratégia da reforma; defato, as posições dos sindicatos relativas à "renovação do serviço público"foram elencadas a partir da adesão à desconfiança.

15 Os ciclos de qualidade vieram, assim, abalar as estruturas oficiais de participação,sobre as quais se apóia o poder sindical na função pública.

16 L'État dans tous ses projets – un bilan des projets de service dansl'administration, Paris: A documentação francesa, 1994.

17 Isto foi visto com os ciclos de qualidade (CHEVALLIER, J., “Le discours de laqualité administrative”, RFAP n. 46, 1988, pp. 21 e segs.) ou ainda com asnovas práticas de descentralização da gestão de créditos ou da avaliação deagentes (CURAPP, L'évaluation dans l'administration, Paris: PUF, 1993). Comoassinala justamente J. C. THOENIG (op. cit. p. 57), a reforma administrativa éantes de tudo "um assunto de dinâmica de terreno, ou seja, de confrontaçãoentre experimentações e situações diversificadas": trata-se de "impelir o terrenoa tomar iniciativas, fornecer-lhe autonomia e avaliar os resultados deste modoobtidos", mais do que lhe dizer, "em seu lugar, o que se deve fazer" ou deenunciar "medidas que ele já utiliza".

18 A nuance é importante na medida que os serviços públicos podem ser levados,em nome de um "interesse geral" do qual o Estado é o único juiz, a tomarmedidas eventualmente contrárias aos interesses específicos e categorias dosseus usuários – o que leva a legitimar a primazia da oferta (administrativo)sobre a demanda (social).

19 O relatório Picq (L'Etat en France: Servir une nation ouverte sur le monde,Paris: A documentação francesa, 1995, col. "Rapports officiels") pretendia,também ele, "situar os cidadãos no centro da administração".

20 CHEVALLIER, J., “Figures de l'usager”, In Psychologie et science administrative,Paris: PUF, 1985, pp. 44 e segs.

21 Réflexion préparatoire, p. 5.22 Circular de 30 de maio de 1996, relativa à codificação dos textos legislativos e

regulamentares, JO de 5 de junho de 1996, p. 8263.23 O documento dos serviços públicos de 1992 acrescentara: transparência,

participação, simplificação.24 Réflexiom préparatoire, p. 4.25 Réflexion préparatoire, p. 4.26 Ver BULLINGER, M., ed., “Von der bürokratischen Verwaltung Smanagement

zum” (“De l’administration bureaucratique au management administratif”) –Colóquio franco-alemão, Friburgo 26-27, junho 1992, Verwaltung 2000 1993(ver especialmente as contribuições de R. Drago, M. Le Clainche, J., Chevallier,M. Fromont, D. Truchet).

27 Ver MONNIET, M., Les décisions implicites d'acceptation de l'administration,Paris: LGDJ 1992, e também Fromont, M., op cit.

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28 COLLIN DEMUMIEUX , M., “Quelques éléments nouveaux sur les décisionsimplicites d'acceptation”, Les Petites affiches, 1996.

29 Circular de 15 de maio de 1996, relativa à execução do plano de reforma doEstado: redução do número de autorizações e declarações administrativasprévias, JO de 27,28,29 de maio de 1996, p. 7922.

30 Só devem ser mantidos regimes fundados no interesse público indiscutível eatual, justificando uma intervenção administrativa prévia.

31 A experimentação iniciou em 1º de janeiro de 1996 para a totalidade dos projetosde lei (exceto as leis de finanças), devendo ser feito um balanço ao final doprimeiro semestre; após o dia 1º de julho de 1996, ela foi estendida para atotalidade dos decretos regulamentares no Conselho de Estado, e uma avaliaçãoglobal deve ocorrer no fim de 1996.

32 Circular de 21 de novembro de 1995, relativa à experimentação de um estudo deimpacto acompanhando os projetos de lei e de decreto no Conselho de Estado,JO de 1º de dezembro de 1995, p. 17566.

33 Segundo o documento de trabalho, “Os funcionários são a principal riqueza doEstado” p. 4.

34 VERRIER, P. E., “Les spécificités du management public: le cas de la gestiondes ressources humaines”, Politiques et management public nº. 4, 1989, pp.47 e segs.

35 Sobretudo com o modelo CHEOPS: ver Badeyan G. “Un nouvel instrumentpour la politique de l'emploi dans la fonction publique”: CHEOPS, BulletinRCB, nº 50, setembro 1982, p.15 e segs., e também: “Notion et connaissancedes effectifs dans la fonction publique: la diversité des points de vue” In Revueadministrative, n 232, 1986, p. 393 e segs. Ver o suplemento “ La gestionprévisionnelle des persolnels”, In Cahiers français, nº 197, julho-setembro1980, sobre a função pública.

36 Ver por exemplo VERRIER, P. E., “Y a-t-il de mauvais fonctionnaires? Remarquessur l'infaillibilité administrative et la notation”, "Politiques et managementpublic", 1989, n. 2, pp. 81 e segs., GONZALES, J., “En finir avec la notation desfonctionnaires”, Regards sur l'actualité, setembro/outubro de 1989, pp. 23 esegs.

37 RANGEO, F., “La notation des fonctionnaires en question”, Politiques et man-agement public nº. 2, 1992, pp. 193 e segs.

38 Mesmo neste contexto, as oposições podem ressurgir na fase de aplicação; épor isto que a despeito das vantagens concedidas, o procedimento de reclas-sificação suscitou o descontentamento social da PTT (BARREAU, J., La reformedes PTT – quel avenir pour le service public? Paris: La Découverte, 1995).

39 Réflexion préparatoire, p. 31.40 Ver “La réforme de gestion: agences gouvernementales et administrations

centrales”, Revue internationale des sciences administratives nº. 4, 1995.41 O relatório preconizava a transformação dos serviços prestadores de serviços

e cuja atividade pudesse ser individualizada em "agências de execução" (Exe-cutive Agencies), dispondo de maior autonomia de gestão, e dirigidas por umChief Executive, nomeado por um período de cinco anos e pessoalmenteresponsável por seu desempenho (ver particularmente STEVENS, A., “Lesagences d'exécution et leur impact sur le Civil Service”, in RFAP, n. 55, 1990,pp. 485 e segs.): em 1992, 75 agências deste tipo já haviam sido criadas, 300000 agentes, praticamente a metade do Civil Service nelas trabalhava; quandoa aplicação do programa estiver concluída, 79% dos funcionários estarãovinculados a 173 agências.

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42 Não apenas os centros de responsabilidades instalados em caráter experimen-tal (209 em 1º de janeiro de 1994) beneficiam-se de uma flexibilizaçãoorçamentária, mas, sobretudo, a fórmula beneficia quase que exclusivamente osserviços descentralizados.

43 BRAUD, C., “La notion d’agence en France: réalité juridique ou mode administra-tive?”. Les Petites affiches n. 104, 30 agosto de 1995, pp. 4 e segs. Do modocomo é atualmente concebida na França, a agência é simplesmente uma variantedo estabelecimento público que se caracteriza pela injeção de competênciastécnicas, pela introdução de dispositivos de avaliação e sanção dos resultados,enfim, por uma autonomia de gestão nos aspectos financeiro e de pessoal.

44 O relatório Blanc do XI plano (1993) faz dela uma meio privilegiado dedescentralização funcional: o Conselho invoca a si mesmo no relatório de 1993para "aprofundar uma reflexão sobre as agências"; enfim, o relatório Picq incitaa "criar novas agências para gerir de outro modo o serviço público".

45 Para B. HOGWOOD (“Les familles de Whitehall: les administrations centrales etles types d'agences en Grande-Bretagne” , RISA, op. cit. pp. 587 e segs.), "ainiciativa Next Steps não foi bem definida, nem executada".

46 Ver por exemplo HOOD, C., “L'évolution de la gestion publique au Royaume-Uni et la suppression des privilèges de la fonction publique”, RFAP n. 70,1994, pp. 295 e segs.

47 Particularmente na Dinamarca (T.B. Jorgensen e C. A. Hansen) e nos PaísesBaixos (W. Kickert e F. Verhaak) RISA, op . cit.

48 Réflexion preparatoire, p. 31.49 Decreto n. 92.601 de 1º de julho de 1992, sobre o protocolo de descentralização,

JO de 4 de julho de 1992, p. 8898.50 Os termos da circular Juppé de 26 de julho de 1995 se aproximam, neste

ponto, dos da circular Rocard de 25 de maio de 1988.51 No seu discurso de 3 de fevereiro de 1996, J. Chirac insistia na idéia de que o

"Estado não deve ser modesto. São seus servidores que possuem o dever damodéstia. Já o Estado, ele deve ser grande.

52 A confrontação com a noção européia de "serviço universal" contribuiu paramelhor esclarecer suas implicações. Ver, por exemplo, Debene, M., "Sur leservice universel: renouveau du service public ou nouvelle mystification?", InActualité juridique Droit administratif, março de 1996, pp. 183 e segs. e também"Le service public et la construction communautaire", Revue française de droitadministratif, 1995, n.3.

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ResumoResumenAbstract

A reforma do Estado e a concepção francesa do serviço públicoJacques Chevallier

O artigo pretende avaliar os efeitos da reforma do Estado sobre a concepçãofrancesa tradicional do serviço público, a qual repousaria sobre três dimensões: afuncional, relativa à extensão da esfera da gestão pública, a axiológica, pertinente aosvalores que governam seu funcionamento e a jurídica, associada ao conjunto de leisque a ela se aplicam. O autor sustenta que a iniciativa de reforma do Estado teverepercussão nos seguintes aspectos: a condução da mudança, pela promoção de umestilo consensual de gestão no interior das estruturas administrativas; a relaçãoadministrativa, modificada pela promoção da figura do usuário-cidadão; o estatutodos agentes, flexibilizado pela introdução da gestão descentralizada de recursoshumanos e a arquitetura administrativa, reordenada em torno dos pólos estratégicoe operacional. O autor afirma que a reforma do Estado não contempla um pontofundamental, qual seja, o problema da posição do serviço público em relação àeconomia e à sociedade.

La reforma del Estado y la concepción francesa de los servicios públicosJacques Chevallier

El artículo pretende evaluar los efectos de la reforma del Estado desde el puntode vista de la concepción francesa tradicional del servicio público, la cual estaríabasada en tres puntos: la funcional, que se refiere al alcance de la gestión pública, laaxiológica, pertinente a los valores que gobiernan su funcionamiento y la jurídica,asociada al conjunto de leyes a las cuales se aplica. El autor sostiene que la iniciativade la reforma del Estado repercutió en los siguientes aspectos: la conducción alcambio, tras la promoción de un estilo consensual de gestión en el interior de lasestructuras administrativas; la relación administrativa, modificada por la promociónde la figura del usuario-ciudadano; el estatuto de los agentes, flexibilizado por laintroducción de una gestión descentralizada de recursos humanos y la arquitecturaadministrativa, reordenada alrededor del polo estratégico y del operacional. El autorsostiene que la reforma del estado no contempla un punto fundamental que es elproblema de la posición del servicio público con relación a la economía y a lasociedad.

The reform of the State and the French concept of public service.Jacques Chevallier

The article aims at the evaluation of the effects of the reform of the State onthe traditional French concept of public service, which is based on three aspects:the functional aspect, relating to the size of the public management domain; theaxiological aspect, which has to do with the values that govern its operation; andthe legal aspect, associated with the set of laws that are applicable to it. Theauthor argues that the State reform initiative made an impact in the followingaspects: the management of the change, by promoting a management style, within

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Texto para discussãoENAP

A reforma administrativafrancesa

Valdei Araújo

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Texto para discussãoENAP

A reforma administrativafrancesa

Valdei Araújo

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Brasília — DFoutubro/1997

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Texto para Discussão é uma publicação daFundação Escola Nacional de Administração Pública

EditoraVera Lúcia Petrucci

Coordenador EditorialFlávio Carneiro Alcoforado

Supervisora de Produção GráficaFatima Cristina Araujo

RevisãoMarluce Moreira Salgado

Editoração eletrônicaDanaé Carmen Saldanha de O. Alves

© ENAP, 1997

Fundação Escola Nacional de Administração Pública — ENAPSAIS — Área 2-A70610-900 — Brasília - DFTelefone: (061) 245 6189Fax: (061) 245 2894

Brasília - DF

ARAÚJO, Valdei.

A663r A reforma administrativa francesa: da crise da funçãopública a uma nova racionalidade da ação coletiva, umadifícil transição. Coord. de Sonia Fleury. Brasília: FGV/EBAP/ENAP, 1997.

26f.(Texto para discussão, 20)

1. Reforma Administrativa - França 2. Reforma doEstado - França 3. Administração Pública I. Programa deEstudos e Pesquisas em Reforma do Estado e GovernançaII. Título III. Série

CDD 353.073

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A reforma administrativa francesa:da crise da função pública a uma novaracionalidade da ação coletiva,uma difícil transição1

I - O Estado contra a sociedade

Com o fim da segunda guerra mundial, o Estado francês desenvolveuenormes esforços para elevar o país no nível das nações industriais do Oci-dente. O caminho para atingir o estágio industrial passaria pelo fortalecimentodo Estado nos moldes keynesianos. Com De Gaulle, iniciou-se a construção dalegitimidade do modelo a partir do princípio de monopólio estatal da açãocoletiva, ou seja, o Estado representa a única instância legítima de ação pública,encarnando dessa forma a “Vontade Geral”. Paralelamente ao fortalecimento doEstado, fortalecia-se uma “casta” burocrática, legitimada pelo saber técnico.

A partir da década de 70, esse modelo será criticado por diversos seto-res da sociedade francesa, que viam nele um verdadeiro “leviatã”, inibindo aparticipação social na gestão das questões comuns. O Estado ossificado peloexcesso de controles, corporativização, etc. chocava-se contra a sociedade quese transformava rapidamente. O modelo francês de Estado mostrou-se plena-mente eficaz no que se refere ao desenvolvimento industrial, em especial,durante os “trinta gloriosos” do pós-guerra. Entretanto, simultaneamente aoprocesso de industrialização, ocorreram a burocratização e a formalização dasrelações sociais, a ponto de constituir um dos fatores das revoltas sociais doano de 1968.

Segundo Michel Crozier,2 a sociedade francesa perdeu algumas ocasiõespropícias à modernização do Estado. A primeira, ocorrida durante o governode Georges Pompidou que, contando com a maioria parlamentar obtida em1968 pelos gaullistas e com a opinião pública favorável a mudanças, poderiater iniciado um profundo processo de transformação do Estado. Pompidouoptou, entretanto, por uma estratégia meramente quantitativista, que pre-servou e mesmo ampliou a intervenção do Estado, e que não resistiu à pri-meira vaga da crise do petróleo em 1973.

A segunda oportunidade, de que nos fala Crozier, ocorreu em maiode 1974, no governo de Valéry Giscard d’Estaing. Possuindo igualmente

* Bacharel em História, mestrando do curso de História da UERJ e pesquisador da EBAP/FGV/RJ.

Valdei Araújo*

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maioria parlamentar, embora menos ampla que Pompidou, Giscard d’Estaingcontava com grande apoio da opinião pública,3 mas preferiu continuar a políticaindustrial de Pompidou. Omitiu-se nos planos social e econômico, perdendoassim a oportunidade para uma ampla transformação cultural que fora abertapela crise do pensamento marxista junto às elites intelectuais do país.

Com a vitória de François Mitterand em 1981, fechava-se o ciclo deoportunidades dadas à direita francesa para modernizar o Estado e a sociedade.Nos dois primeiros anos de governo socialista, foi ampliada, sensivelmente, apresença do Estado na economia e na sociedade. Diversas empresas foramnacionalizadas, e outras empresas públicas criadas. No final deste período,houve um enorme crescimento do déficit público que obrigou os socialistasreverem sua política, iniciando um período menos “ideológico” e timidamentereformista. Nas palavras de Crozier:

“Chamada ao poder contra a austeridade dos tecnocratas, a esquerda não faziasenão agravar esta paixão quantitativista que pervertia as elites francesas.”4

Apesar da manutenção e ampliação do Estado tecnocrático, a esquerdatomou algumas iniciativas no âmbito da Reforma, em especial, no processo dedescentralização e desconcentração, assim como no que se referia à moderniza-ção do serviço público.

Com Jacques Chirac, em 1986, a direita tem novamente a chance deempreender reformas visando modernizar a sociedade. Na administração Chirac, aFrança experimenta a tentativa de estabelecer o “liberalismo por decreto”. A faltade conhecimento da realidade social, somada à incapacidade de comunicar-secom os agentes afetados, acabou por levar Chirac aos impasses representadospelas manifestações estudantis e a greve dos funcionários da SNCF,5 em 1986.

A instabilidade política francesa — depois de 1981, três mudanças demaioria parlamentar em sete anos — resultou na ausência de um programa dereforma administrativa coeso e contínuo. Na verdade, tem-se preferido falarmais de uma modernização do que de uma reforma administrativa.

Um dos marcos da reforma francesa é a crise da gestão pública. Comotodos sabemos a crise da gestão pública é um fenômeno hoje universal que setorna visível a partir da década de 70, especificamente com a crise do petróleo.Com o fim do conflito Leste/Oeste em 1989, esta crise torna-se mais evidentee vêm-se reforçadas suas conotações ideológicas. No caso francês, ao lado destacrise mundial, os analistas identificam uma crise específica, a saber, a falênciado modelo de Estado. Dentre os países industrializados do Ocidente, o Estadofrancês é, sem dúvida, um dos que mais intervém na vida social, econômica epolítica.

O modelo político administrativo que caracteriza a especificidadefrancesa nasce nos anos posteriores à II Guerra Mundial, articulando a tradiçãode intervenção do Estado-providência à lógica do novo regime estabelecidopela Quinta República. Este modelo pode ser caracterizado, em linhas gerais:

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— pela prioridade dada às funções de concepção e decisão sobre as deexecução e avaliação das políticas públicas;

— pela clientelização da sociedade pelo Estado, que impõe seu modode organização aos diversos atores sociais;

— pelo desequilíbrio entre informação ascendente e descendente,encobrindo o jogo real das políticas públicas.6

Segundo Crozier,7 o princípio que legitima o Estado francês tem acentona hierarquização das funções e dos níveis, só concebível se imaginarmos que oEstado sozinho encarne o interesse geral da sociedade. No âmbito da funçãopública, este modelo pressupõe a existência de um funcionário autônomo e im-parcial, legitimado por seu estatuto e capacidade técnica para gerir o destinocoletivo e mediar os conflitos de interesses da sociedade civil.

Além dos problemas de modelo, tipicamente francês, podemos apon-tar como causas do processo de reforma administrativa a convergência de trêsfenômenos, a saber:

— a crise do Estado providência;— a necessidade de redução dos gastos públicos;— as exigências diante da adaptação à integração européia.8

Além dos fatores acima referidos, Luc Rouban nos chama a atençãopara a relação entre a crise do setor público na França e as transformaçõesprofundas nas formas de legitimação do poder típicas da Quinta República. Odescrédito dos homens públicos e a crítica à atividade partidária indica, clara-mente, um deslocamento dos lugares de organização dos conflitos.

Os sintomas da crise são antigos, e os remédios têm sido muitas vezesformulados de maneira correta, mas dissolvem-se diante da racionalidade domodelo. Um interessante exemplo deste paradoxo podemos encontrar na expe-riência das administrações por missão.9 O conceito foi formulado por EdgarPisani num artigo de 1956, e tinha como objetivo renovar a ação do Estado. Asadministrações por missão deveriam colaborar para a renovação da vida admi-nistrativa através da criação agências incumbidas de tarefas específicas. Estasagências tiveram, de fato, um importante papel no planejamento regional, naconsultoria e no financiamento em matéria de urbanização, auxílio aos podereslocais, desenvolvimento da pesquisa, etc. Compostas por funcionários de origensdiversas, destacados de seus quadros originais, assim como de empregados não-estatutários, recrutados em função de suas habilidades profissionais, estas organi-zações atuavam ora como consultoria ora como especialistas em engenharia finan-ceira. Públicas ou para-públicas, as agências eram quase todas de direito privado.

O sucesso inicial das agências logo foi escurecido pela crescente burocra-tização e rotinização dos procedimentos. Foi o que aconteceu com o DGRTS,agência que tinha por função criar formas inovadoras de financiamento à pesquisaque pudessem superar os procedimentos tradicionais do CNRS.10 Após o êxitoinicial, seus procedimentos tornaram-se tão rotineiros quanto os do CNRS.

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Enquanto em países como a Inglaterra as reformas se concentram sobre abandeira da privatização, na França, o problema manifesta-se, principalmente, pelacrise da função pública e em questões como a descentralização/desconcentraçãode poderes. Neste último caso, procura-se avaliar as conseqüências da especi-ficidade do modelo unitário como um desafio a mais para estas políticas. Confor-me afirmam Claisse & Meininger, a delegação de poderes não tem o mesmosentido em um Estado unitário ou no centro de um Estado Federal.11 Esse fenô-meno é apenas um exemplo de situações diversas que surgem da dialética entre asfórmulas “universais” de reforma e as realidades histórico-culturais de cada paísou localidade. Ao analisarmos as diversas reformas somente como reflexos demovimentos globais, corremos o risco de simplificar uma realidade extremamen-te matizada e complexa. Somente através de uma confrontação entre as aborda-gens sistêmica e culturalista, é possível encontrar um compromisso heurístico,minimizando as distorções que uma análise ortodoxa poderia trazer.

II - A sociedade contra o Estado

1. A crise da função pública

Em 1981, a palavra-chave da reforma administrativa era democratiza-ção. Acreditava-se que o Estado estaria cada vez mais presente na vida social, e,por conseqüência, precisaria gerar novos instrumentos de intervenção adminis-trativa. Entretanto, devido à cultura autoritária — “herdada dos governos anteri-ores”— os funcionários não estavam preparados para a democratização cres-cente da administração. Dentro da ótica socialista, o Estado francês, controladodesde o fim da II Guerra pela “direita”, havia incorporado uma cultura autoritá-ria e antidemocrática que era preciso superar.

Segundo Martine Bellon,12 a administração deveria se adaptar aosnovos tempos que viriam após maio de 1981. Essa adaptação deveria caminharem duas direções básicas: afirmar a responsabilidade dos funcionários econtribuir, através de uma maior participação, para o aperfeiçoamento eeficácia da administração, da qualidade dos serviços prestados aos usuários edas relações entre estes e a administração.

O diagnóstico dos problemas da administração focalizavam doisdesafios estruturais a serem superados:13

1) A existência de uma profunda crise econômica e social, que temcomo principal conseqüência a expansão da intervenção estatal e a necessida-de de administração;

2) A atitude autoritária dos governos anteriores que moldaram os com-portamentos e multiplicaram as oportunidades de conflitos entre funcionáriose usuários.

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Para enfrentar estes desafios, o governo socialista direcionou seusesforços para uma política de descentralização administrativa. Em linhasgerais, a descentralização prevista na lei de 2 de março de 1982 previa trêsorientações fundamentais:

1) Atribuía às coletividades locais (comunas, departamentos, regiões) opoder de livremente administrarem-se, tendo sido o Poder Executivo transferi-do do prefeito para os representantes eleitos das regiões e dos departamentos.14

2) Tornou as autoridades eleitas plenamente responsáveis, mediante asupressão do controle, a priori, dos prefeitos (que passam a se chamar comis-sários da República).

3) Deu às coletividades locais maiores possibilidades de intervençãoeconômica.

De forma complementar a descentralização, foram tomadas medidasno sentido da desconcentração de atividades. Para isto, atribuiu-se ao comis-sário da República uma dupla missão: como depositário da autoridade doEstado, ele zela pelo respeito às leis e interesses nacionais; como represen-tante do Primeiro Ministro e de cada um dos demais ministros, coordena osserviços do Estado nos departamentos e nas regiões.

Durante a gestão socialista, realizaram-se grandes esforços parademocratizar o ingresso à alta função pública, com o objetivo de torná-laacessível a toda sociedade. Apesar das intenções, as medidas tomadas leva-ram a um agravamento da crise. Houve uma abertura da alta função para seto-res menos favorecidos da sociedade, ampliando-se os privilégios da funçãopública a todo o pessoal não-estatutário. Durante o processo ocorreu umsensível aumento dos poderes sindicais, assim como a promoção a postos deresponsabilidade de funcionários militantes, não originados da alta função.Foi necessária a criação de uma nova casta de funcionários capazes de gerir oEstado, uma espécie de núcleo operacional dentro da alta função pública,agora ampliada de forma inoperante. Segundo Crozier:

“A chegada de novos homens não impediu que fosse detonada uma crise dagestão que trouxe de volta os membros dos grandes corpos de funcionários nogoverno Fabius. Nesse ínterim, havia-se acentuadamente aumentado a rigidezdos estatutos administrativos com a entrada potencial na função pública de cercade 700.000 auxiliares e não-estatutários. Havia se tornado mais difícil ainda aadaptação ao mundo exterior de um sistema que o peso sindical e o enfraqueci-mento da autoridade tornavam prisioneiros de suas dificuldade internas.”15

Nos seus primeiros esforços em direção a reforma administrativa, agestão socialista mostrou-se bastante relutante em questionar o “poder doEstado”, acreditava-se que a democratização poderia se dar através de movi-mentos internos, não havendo iniciativas reais no sentido de gerar maior parti-cipação da sociedade civil na gestão da república.

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No decorrer da década de 80, a crise da função pública agravou-se.Podemos observar os seguintes problemas:

— defasagem na formação profissional;— congelamento das carreiras;— contestação das hierarquias;— falta de atratividade do setor público;— evasão de quadros altamente qualificados;— politização dos funcionários.Nas funções ocupadas por pessoal com alto nível de conhecimento

técnico, a falta de atratividade da carreira pública leva a uma progressivamigração para o setor privado (em 1989, 5% dos engenheiros deixaram oserviço público).16

Como já foi dito acima, na França, o Estado Nacional constitui-se,enquanto único, poder legítimo na estruturação da vida social. Nesta sua mis-são, o Estado conta com seu braço secular: a função pública. Dentro destaconcepção hegeliana, o Estado, entendido como realização máxima da razão,demanda um corpo burocrático homogêneo, imparcial, sábio, que esteja acimadas paixões irracionais e dos interesses mesquinhos da sociedade civil.

Dois movimentos questionaram os pilares do tipo descrito acima, deum lado, a crítica à administração enquanto poder tecnocrático, decorrente deum movimento mais amplo que questiona o discurso da neutralidade técnica; deoutro, a crescente organização da sociedade civil, que mais consciente dosmecanismos de tomada de decisão, passa a reivindicar um maior controle etransparência das medidas governamentais.

Além disso, a politização crescente dos funcionários desde o pós-guerra tem tornado evidente, para a sociedade francesa, que a administraçãonão pode mais arrogar-se o direito de única detentora dos saberes/poderes dagestão coletiva.

O sistema francês de função pública está fundado na noção de carrei-ra. O indivíduo escolhe uma profissão específica que é “o serviço do Esta-do”, este engajamento materializa-se na noção de carreira. Toda a vida profis-sional do funcionário público é organizada em função de regras gerais cujocaráter impessoal visa garantir a igualdade dos funcionários diante de possí-veis arbitrariedades dos seus superiores. O recrutamento faz-se através deconcursos, nos quais é cobrado o domínio de conhecimentos gerais; a ascen-são tem como critério a antigüidade, e a remuneração evolui em função deuma escala pré-determinada. Este conjunto de princípios, que formam o cerneda administração pública “tradicional”, tem sido duramente questionado,inclusive pelos próprios funcionários. Busca-se transformar este quadro emduas direções: a reorientação da formação do funcionário, a fim de que setorne mais especializada, e a personalização das tarefas, o que implica oestabelecimento de novos critérios de responsabilidade.17

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O funcionalismo é recrutado com base em concursos cujos progra-mas, fixados em nível nacional, contemplam conhecimentos gerais. Neces-sário em nível de formação inicial, este método de seleção tem levado osfuncionários a duvidar de sua capacidade de responder aos novos desafiostrazidos pelo rápido desenvolvimento tecnológico e a especialização deseus domínios de intervenção.

A fim de suprir esta brecha de formação, tem-se insistido na necessida-de de programas de formação contínua. Um acordo neste sentido foi assinadoem 29 de junho de 1989 entre o ministro encarregado da função pública e cincoorganizações sindicais, por um prazo de cinco anos. O financiamento destasações ficou a cargo de cada ministério que deveria contribuir inicialmente com1,2% da massa salarial, elevando-se a 2% em 1992.

O modelo clássico de administração, adotado na França, pode ser clara-mente definido como weberiano. Neste sentido, considera-se como uma medi-da eficaz aquela que se enquadra nas normas e regulamentos preestabelecidos.Este postulado tem sido questionado em nome da flexibilização da gestão,cujo paradigma é inquestionavelmente a gestão privada. Os funcionários sãoconvocados a modificar sua escala de valores, buscando novas formas de atua-ção que permitam conciliar a efetividade do direito com a qualidade da gestão.

Da mesma forma, busca-se conciliar a especialização da formação neces-sária diante das novas demandas, com a manutenção da formação geral. Pois, sepor um lado, as novas tecnologias exigem um funcionário especializado, poroutro, a formação geral é indispensável ao exercício da inovação. A formaçãocontínua é vista, como foi dito acima, como a solução para este dilema.

Essencialmente, buscou-se realizar a formação contínua em quatrodomínios prioritários:18

1) Gestão de recursos humanos;2) Auxílio à gestão de mudanças no quadro dos “projetos de serviço”

(em particular a comunicação externa e interna);3) A preparação dos gestores à introdução de novas tecnologias e pro-

cedimentos administrativos.4) Iniciação às políticas e ao direito comunitário.

2. Os quadros superiores da função pública

Outra característica marcante da crise da função pública é a preocu-pação com a “alta função”, ou como alguns preferem dizer, os “quadros supe-riores da função pública. A política de renovação, lançada em 1989, acredita-va que a modernização deveria passar pela transformação dos papéis atribuí-dos às diferentes categorias funcionais. Como vimos acima, a política dosprimeiros anos do governo socialista, na intenção de democratizar o “acesso”à função pública, acabou por aprofundar a crise de identidade do setor.

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Entre os anos de 1991-1993, o pesquisador francês do CNRS, LucRouban,19 realizou uma pesquisa quantitativa junto aos quadros superiores dafunção pública. Nesta pesquisa, o autor pôde mapear alguns dos principaisproblemas do setor.

Rouban observa que a discussão do papel atribuído aos quadros superio-res pode ser avaliada de dois ângulos. O primeiro, estritamente administrativo,diz respeito ao sentido da modernização do setor público, caso se entenda areforma meramente como a generalização de práticas de gerência pública,sendo que a transformação dos funcionários em gerentes é fundamental. Poroutro lado, pode-se entender a reforma como a construção de uma administra-ção adaptada aos sistemas políticos em devir, ou seja, às conseqüências daunião européia, da desregulamentação mundial, e a descentralização, etc. Aestes itens, Piganiol20 acrescenta a política de desconcentração, o progressotecnológico, a descoberta do usuário; o anseio pela modernização por parte dospróprios funcionários; a crise econômica e a evolução do papel do Estado.Segundo Rouban:

“D’un côté, la prestation du service public s’est dissociée de la citoyennetéau nom du rendement financier, mais de l’autre, elle s’est chargée denouvelles demandes d’imputation, à mesure que le personnel politiqueperdait de sa légitimité. Dans bien des cas, les administrations constituentle dernier rempart contre la dislocation de mécanismes démocratiquesinadaptés à la vie moderne, qu’il s’agisse de parer à la dualisation socialeou à la barbarie communautaire. Du statut social des fonctionnaires, et plusparticulièrement de celui réservé aux cadres supérieurs, dépendra donc lacapacité de réponse collective aux nouveaux enjeux.” 21

Perguntados sobre a existência de congruência entre a remuneração e asresponsabilidades na função exercida, os funcionários responderam:

Respostas Grandes corpos Total Administrações Total Serviços Totaladministrativos centrais desconcentrados

Sim, totalmente 24,2 12,9 6,7 37,758,1 48,9

Sim,em grande parte 33,9 36 31

Não, muito pouca 24,2 31,7 34,737,1 49,7 60,7

Não, nenhuma 12,9 18 26

Sem resposta 4,8 1,4 1,7

Percebeu-se, ainda, uma sensível variação por faixa de idade. Os funcio-nários entre 41 e 50 anos estão mais descontentes, 26,9% “Não, Nenhuma” ,contra 15,9% para os com menos de 40 anos.

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Outro aspecto relevante constatado pela pesquisa diz respeito à poli-tização da alta função pública. O princípio da imparcialidade e neutralidadecaracterístico do modelo burocrático-legal, e tido como princípio sagrado daQuinta República, é cada vez mais uma lembrança distante. Atualmente, obser-va-se uma crescente politização da alta função. A pergunta “Você acha que afunção pública é mais politizada, nem mais nem menos politizada, ou menospolitizada que há alguns anos”. Obteve-se as seguinte cifras: 47,5% considerama função pública mais politizada, 44,9% não vê alteração, 5,6% considerammenos politizada.

Para Rouban, alguns fatores podem ser apontados como causas destapolitização, a saber, menor significado do Estado e do serviço público entre osfuncionários, vontade política de acompanhar a execução de certos projetos;reação à vontade dos eleitos de controlar mais de perto o trabalho administrativo;resposta à politização crescente de todos os debates na sociedade francesa.22

A nova forma de relacionamento com a esfera política gera progressiva-mente uma sensação de aparelhamento do Estado por parte dos funcionários, oque põe, em cheque, seu potencial de autonomização diante das demandas tantodos políticos quanto da sociedade civil.

3. A política de privatização

Em 1981, com o governo socialista de Mitterand, teve início um amploprocesso de nacionalizações, o primeiro desde os anos iniciais do governo DeGaule entre 1945-1946. Os efeitos desta política mostraram-se desastrosos numcontexto altamente recessivo como o de início dos anos 80, o que fez com que ogoverno socialista revisse sua política econômica. Entretanto, o inchamento dosetor público permaneceu uma realidade pouco combatida. Somente com a coali-zão liberal de 1986 iniciou-se uma política de privatizações. A opinião públicaque em 1981 era amplamente favorável às nacionalizações, em 1986, a situaçãose inverteu a favor das privatizações.

Podemos apontar três fatores que contribuíram para a mudança da opi-nião pública em favor da política de privatização:23

1) Renascimento do liberalismo com as experiências Reagan e Thatcher.A reforma do estado inglês teve um forte impacto na opinião pública francesa,seguida pela publicação de manuais e breviários liberais.

2) Dificuldade cada vez maior do Estado em resolver as questõesessenciais da vida coletiva, o que leva ao questionamento de sua presença emáreas não-essenciais.

3) Crescimento excessivo do setor público. No momento das privatiza-ções de 1986-1987, o setor público da economia recobria mais de 650 socie-dades, empregando aproximadamente dois milhões e duzentas mil pessoas.

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Estava presente em setores como: eletrônica, automóveis, farmácia, equipa-mento de segurança, vidros, informática, metais não-ferrosos, química, arma-mento, transportes aéreos, crédito, carvão, correios, transportes ferroviários,eletricidade, telecomunicações, etc...

O texto da lei de privatizações de 2 de julho de 1986 previa em seuartigo 4o que: “Será transferido do setor público ao setor privado, no mais tardaraté março de 1992, a propriedade das participações majoritárias detidas direta-mente ou indiretamente pelo Estado nas empresas que aparecem na lista anexa.”Ao todo a lista comportava 65 empresas.

Podemos identificar três objetivos24 básicos da política francesa deprivatizações:

1) A reestruturação da economia, liberando as empresas dos encargosadministrativos, a fim de torná-las mais competitivas;

2) Criação de uma ampla participação acionária da população;3) Obtenção de recursos complementares, por parte do Estado (esti-

mou-se a receita a ser obtida pelo processo de privatização em torno de 70milhões de francos).

Os efeitos das privatizações junto aos funcionários das empresasprivatizadas podem ser observados principalmente quanto às transformaçõesadvindas da mudança do “status” de funcionário de uma grande empresa públi-ca. Em teoria, a privatização não produz efeitos sob o estatuto funcional, jáque os empregados de empresas públicas não são considerados funcionáriospúblicos, nem mesmo de uma categoria mais ampla como a de agentes públi-cos. Eles são submetidos em quase sua totalidade ao direito privado.

Portanto, a transferência de empresas do setor público para o setorprivado não acarreta mudança alguma no estatuto jurídico funcional. É ver-dade que os empregados das empresas públicas possuíam salários e vanta-gens superiores aos praticados no setor privado, não em função do caráterpúblico destas empresas, mas da sua importância e tamanho. Com a passa-gem para o setor privado isto não se modifica substancialmente, não haven-do grandes alterações salariais.

Se do ponto de vista jurídico a mudança não apresenta traumasprofundos, do ponto de vista sociológico a situação é, substancialmente,outra. Por um lado, a precariedade do emprego é maior no setor privado,há menos estabilidade. Em algumas empresas públicas a estabilidade defato era quase tão grande quanto na função pública propriamente dita. Oscasos de demissão eram extremamente raros, com exceção de empresasem crise como a Renault. O que ocorre é que, com a passagem para osetor privado, o estatuto jurídico do setor se faz presente mais integral-mente, sem as mediações corporativas tradicionalmente instaladas nasempresas, o que provocou forte reação dos sindicatos.

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4. Políticas de avaliação

A crescente queda do PIB, a partir de 1989, e o acirramento da crisefiscal, na virada da década de 80 (vide gráficos 1 e 2), levaram, dentre outrosfatores, a uma nova onda de discussão sobre a reforma administrativa.

Gráfico 1: Evolução do PIB, em volume, depois de 1982

Fonte: http:/www.tresor.finances.fr/oat/fr/rap0596/ev1.html

Gráfico 2: Déficit do orçamento do Estado em execução(em milhões de francos)

Fonte: http:/www.tresor.finances.fr/oat/fr/rap0596/ev2.html#1

Dentre as temáticas levantadas, a questão da avaliação destaca-se. A discus-são sobre a avaliação de políticas públicas na França é relativamente recente, maisrecente ainda são as primeiras experiências neste sentido. As primeiras iniciativassérias são dos anos 80, especificamente a partir de 1986. Refletindo essa despreo-cupação com a questão da avaliação, Sylvie Trosa25 constata a ausência de um con-ceito francês de avaliação. A autora propõe então a seguinte definição:

-2

-1

0

1

2

3

4

5

1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995

1990 1991 1992 1993 1994 1995-350

-300

-250

-200

-150

-100

-50

0

1990 1991 1992 1993 1994 1995

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15

“A avaliação procura pôr em evidência as relações de causalidade entre objetivos,implícitos ou explícitos, e os efeitos reais, os impactos das políticas públicas. Aavaliação deve ser entendida mais como um mecanismo de compreensão do quede julgamento.”26

A mesma autora define como meta da avaliação a organização de umdebate sobre os objetivos da ação pública e a reflexão sobre as condições e mei-os de organização deste debate, que deve reunir especialistas, intelectuais, etodos os atores sociais envolvidos nas políticas. Pela definição da autora, a avali-ação deixa de ser somente uma verificação do cumprimento de objetivos, para setornar mecanismo de sua formulação. Mais que uma rotina burocrática, a avalia-ção passa a ser vista como uma produção de saberes, não só sobre a realização deobjetivos, mas sobre as situações relacionais envolvidas na sua execução.

Ainda segundo Trosa, a avaliação repousa sobre duas bases, a primeira é aprodução rigorosa de informações sobre hipóteses levantadas pelos gestores, asegunda, um trabalho de clarificação e melhor definição dos problemas públicosa partir da evidenciação da concepção de cada ator da política a ser avaliada.27

Somente em 1990, através do decreto de 22 de janeiro, relativo a avalia-ção de políticas públicas, criou-se um dispositivo institucional organizando umaatividade de avaliação com vocação geral e permanente. Pode-se depreender dotexto do decreto que a avaliação tem por objetivo verificar se os meios jurídicos,administrativos ou financeiros empregados permitem produzir os efeitos espera-dos da política e atender aos objetivos que lhes são atribuídos. 28

O modelo de avaliação implícito nesta definição de princípios supõe queos objetivos das políticas estejam suficientemente explícitos para possibilitar aanálise. Na realidade, o que se observa é que um dos principais entraves às políti-cas de avaliação têm sido os objetivos confusos e insuficientemente definidos.

Segundo Nioche,29 o novo dispositivo de avaliação pode ser incluídodentro de uma política mais ampla de melhoria dos serviços públicos em-preendida pelo Primeiro Ministro M. Rocard em 1988. Esta política tinhacomo prioridades, estabelecidas em uma carta de Rocard aos ministros em23 de fevereiro de 1989, a renovação das relações de trabalho no seio dafunção pública, melhoria do atendimento e do serviço aos usuários, desen-volvimento da responsabilidade pela descentralização orçamentária e amensuração dos resultados e o desenvolvimento da avaliação das políticaspúblicas nos âmbitos individuais e organizacionais.

À primeira vista, pelo conceito e intenções anunciadas, a avaliação estariasendo entendida num âmbito gerencial, entretanto, uma das conseqüências diretasdesta abordagem seria a conexão da política de avaliação com os procedimentosorçamentários, visando à redução do déficit público. Paradoxalmente isto não iráocorrer, já que, na estrutura dos dispositivos não está prevista a articulação dosprocedimentos avaliadores com as esferas de decisão orçamentária. A interpreta-ção da estrutura montada leva-nos, facilmente, a concluir que, na verdade, ocorre

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um fortalecimento do Executivo em detrimento dos demais poderes, em especialdo Parlamento. Vejamos a estrutura do processo:

A estrutura estabelecida pelo decreto de 22 de Janeiro de 1990 é com-posta de três elementos principais: o Comitê Interministerial de Avaliação(CIME); o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Avaliação (FNDE) e o Con-selho Científico de Avaliação (CSE).

O CIME, integrado pelos principais ministros, é presidido pelo Primei-ro Ministro. O Comitê coordena as iniciativas governamentais em matéria deavaliação. Os projetos de avaliação são propostos pelos ministros, podendo sersugeridos pelo Conselho de Estado ou pelo Tribunal de Contas. O CIME perma-nece soberano na escolha das avaliações financiadas pelo FNDE.

O FNDE assegura o financiamento das avaliações decididas pelo CIME;estas representam 4/5 de suas receitas anuais, o 1/5 restante é reservado aavaliações solicitadas pelo Conselho Econômico e Social, desde que tenhamparecer favorável do CSE.

O CSE é constituído de 11 pessoas, escolhidas em função de sua com-petência científica, nomeados pelo Presidente da República para um mandato deseis anos, não podendo ser renovado. O CSE produz dois pareceres sobre cadaprocesso de avaliação. O primeiro parecer sobre os métodos é dado antes daadoção dos projetos pelo CIME. O segundo parecer é dado após a realizaçãodos trabalhos de avaliação, e trata da qualidade de sua execução. O relatório daavaliação e o segundo parecer são divulgados simultaneamente para o CIME,que então decide pela publicação ou não da avaliação.30

Além de produzir pareceres, o CSE está encarregado de organizar adocumentação, a pesquisa e a formação em matéria de avaliação.

O Comissariado Geral do Plano31 é o responsável hierárquico pelosdiversos dispositivos criados para a avaliação.

8.Deliberação do CIMEsobre a seqüência da

avaliação

1.Proposição dos objetos

de avaliação pelo CIME epor equipes de avaliação

2.

Avaliação dos projetos

3.Primeiro parecer do CSE

sobre a metodologia a seraplicada

4.Decisão do CIME sobre

financiamento dos projetospelos créditos do FNDE

5.Realização do projeto poruma equipe de avaliação

6.Segundo parecer do CSEsobre os resultados da

avaliação

7.Publicação da avaliação e

do parecer do CSE

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Embora os relatórios que precederam o decreto de 22 de janeiro de 1990insistissem sobre a composição plural e autônoma da política de avaliação, emparticular os relatórios Deleau (1986) e Viveret (1989), o projeto, que veio à luz,constitui, de fato, um monopólio da avaliação dominado pelo Poder Executivo.

Em 1993, o CSE somava dois anos de atividades. Neste período produziu15 pareceres sobre projetos de avaliação, além de ter produzido para a Presidênciada República um estudo comparativo sobre os processos de avaliação em outrospaíses e os realizados na França. Neste trabalho, formula-se uma doutrina “france-sa” de avaliação, cuja singularidade é o conceito de “instância de avaliação”.

O conceito de “instância de avaliação”, criado pelo CSE, tem gerado umvivo debate sobre sua pertinência. A “instância de avaliação” é constituída paraexecutar e dirigir o projeto de avaliação. Ela deve associar os diversos atoresadministrativos relacionados com a política avaliada, os usuários (externos), osutilizadores (internos) da política e os especialistas do setor. Esta composiçãodeve construir os pareceres a partir de um amplo debate onde as conclusõesdeverão refletir uma decisão colegiada. Procura-se, dessa forma, ultrapassar adicotomia demandas científicas versus necessidades políticas de um lado, e aoposição entre avaliação interna e externa de outro.

Segundo Nioche, claramente contrário ao mecanismo, pode-se evocarduas origens para a noção de “instância avaliadora”. A primeira, tipicamente fran-cesa, evoca a experiência dos grupos de pilotagem dos “estudos prioritários” daRCB (Rationalisation des Choix Budgétaires), criados a partir de 1976. A outrainspiração vem de uma corrente do movimento avaliador, denominado nos EUA,segundo os autores e variantes, Stake-holders evaluation, NaturalisticEvaluation, Utilisation-focused evaluation, ou ainda Fourth generationevaluation. Esta abordagem procura compreender a avaliação como um processode constituição de uma realidade pela negociação entre os atores envolvidos napolítica. O avaliador é um negociador, procurando fazer surgir uma opinião cole-giada, sob a qual se construirá o julgamento da política em questão.32

Concluindo pelo caráter incipiente do modelo criado em 1990, Niocheaponta algumas questões sobre a avaliação na França:

1) A avaliação é uma atividade em desenvolvimento, mas sem reconhe-cimento institucional.

2) Os trabalhos existentes são dispersos e geralmente com pouco rigormetodológico.

3) Não existe uma instituição especializada: a avaliação é uma atividademarginal.

4) A administração do Estado é, ela mesma, a principal requisitora efornecedora de avaliações. O Parlamento não é nem requisitor nem utilizadorde avaliações, e o Tribunal de Contas começa timidamente a se interessar.

5) O papel da avaliação no debate público e no processo de decisãoainda é medíocre.

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A contradição entre a circular de 23 de fevereiro de 1989, que estabe-lecia o postulado de independência dos avaliadores, com o decreto de 1990,que cria um mecanismo puramente governamental, não passou despercebidoaos membros do CSE. A fim de resolver essa contradição, o CSE propôs,como condição, que a avaliação, mesmo quando solicitada por uma administra-ção particular, devia ser gerida por uma instância autônoma e independente,obedecendo os seguintes critérios:

1) Composição equilibrada — presença da administração, dos usuários,dos experts.

2) Liberdade de trabalho — somente a instância de avaliação é responsá-vel pelo relatório de avaliação.

3) Distinção entre a instância e o lugar de negociação — os membros dainstância de avaliação não devem representar o organismo ao qual estão ligados.O Conselho científico deve incentivar que a escolha recaia sobre indivíduoscapazes de entrar num processo de trabalho coletivo.33

III - Em busca de uma racionalidade do bem comum?

Nos últimos 25 anos, a França tem realizado esforços com o objetivo deconciliar Estado e sociedade na construção de um modelo singular e apto aos tem-pos modernos. O modelo surgido no pós-guerra, tecnocrático e monopolizador,tendia a desprezar a sociedade, vista como espaço do senso comum e do interesseegoísta. A crítica liberal ao Estado tecnocrático, em especial aquela oriunda dospaíses de língua inglesa, tende a ver a sociedade meramente como um ajuntamentode indivíduos e grupos de interesses, cada qual voltado unicamente para suas neces-sidades. Nesta versão, o Estado é encarado simplesmente como mais um ator numjogo onde a regra é lucrar sempre.

Apesar de toda retórica liberal, muitas vezes importada, o caminho dereforma, adotado pela França, está, sem dúvida, longe daquele considerado idealpelos arautos do Estado mínimo. A velocidade das reformas deixa a desejar, nãose tem feito esforços significativos no sentido de ampliar a participação e ocontrole da sociedade civil sobre a administração. O Estado e mais especifica-mente o Executivo agem ainda como detentores da “Vontade Geral”, presos a ummodelo estreito de democracia representativa. Pouco se tem feito no sentido decontrolar a corporativização do serviço público. Os mecanismos de avaliação,além de não estarem conectados com os procedimentos orçamentários, valori-zam, excessivamente, os atores internos (técnicos, funcionários) em detrimentodo cidadão/usuário. A política de privatização quase que se limitou a reverter asnacionalizações realizadas no início da década de 80. A crescente politizaçãodos funcionários deixa evidente que a universalidade/imparcialidade datecnocracia é cada vez mais um mito, entretanto, essa mesma politização, rever-

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tida em corporativização, impede que o modelo fundado neste mito seja trans-formado.

O peso da “história nacional” talvez seja o maior desafio aos reformadoresfranceses. A identidade entre Estado e nação é um fato que dura mais de 200 anosna França. O questionamento desta identidade, envolta na mística revolucionária, écondição primeira para a construção de uma nova racionalidade/ética da ação cole-tiva, que possa conceber a sociedade civil como agente capaz de partilhar com oEstado a gestão da república. A busca desta “racionalidade do bem comum” deveráestar, entretanto, para além da dicotomia maniqueísta que opõe Estado e sociedade.

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Notas

1 Este artigo foi realizado com o financiamento da ENAP Escola Nacional deAdministração Pública. Constitui um dos produtos da pesquisa sobre burocraciaestatal, do Programa de Pesquisas e Estudos sobre Reforma do Estado eGovernança, mantido pela FGV/EBAP, sob a coordenação da professora SoniaFleury, doutora em Ciência Política, professora do curso de Mestrado emAdministração Pública da EBAP-FGV, coordenadora do Programa de Estudos ePesquisas sobre Reforma do Estado e Governança, mantido pela FGV/EBAP.Contou, ainda, com a contribuição especial dos seguintes pesquisadores:Adriana Mesquita, Sílvia Ferreira e Wagner Carvalho.

2 Crozier: 1989, p. 19.3 Crozier: 1989, p. 22.4 Crozier: 1989, p. 26.5 Companhia responsável pelo transporte ferroviário francês.6 Rouban: 1990, p. 528-529.7 Crozier: 1989, p. 56.8 Claisse & Meininger: 1995, p. 442.9 O exemplo é dado por Crozier: 1989, p. 76-77.10 Centre Nacional de Recherche Scientifique, órgão de fomento a pesquisa

científica.11 Claisse & Meininger: 1995, p. 444.12 Em 1984, era chefe da missão permanente — renovação e futuro da

Administração —, pelo Ministério do Serviço Civil e das ReformasAdministrativas (França).

13 Bellon: 1984, p. 23.14 Bellon: 1984, p. 23.15 Crozier: 1989, p. 79.16 Rouban: 1990, p. 531.17 Montricher: 1991, p. 435-436.18 Montricher: 1991, p. 435.

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19 Rouban: 1994, p. 181-195.20 Piganiol: 1994, p. 198-199.21 Rouban: 1994, p. 182.22 Rouban: 1994, p. 189.23 Bourdon (et alli): 1989, p. 126.24 Bourdon (et alli): 1989, p. 133.25 Sylvie Trosa era relatora geral adjunta do Conselho Científico de Avalição em

1993, quando escreveu o artigo infra-referido.26 Trosa: 1993, p. 242.27 Trosa: 1993, p. 242.28 Nioche: 1993, p. 210.29 Nioche: 1993, p. 211.30 Nioche: 1993, p. 210-211.31 Órgão encarregado da elaboração do Plano Qüinqüenal.32 Nioche: 1993, p. 213.33 Trosa: 1993, p. 243.

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RSPA reforma administrativa daNova Zelândia nos anos 80-90:controle estratégico, eficiência

gerencial e accountability1

Wagner Carvalho

1. Introdução

A década de 80 assistiu a um movimento geral de reformas deEstado e reformas administrativas em diversos países, que pode, resumi-damente, ser expresso em termos de dois objetivos básicos: redução dodéficit público e diminuição do crescimento do setor estatal. Os governosdestes países realizaram uma tentativa de mudança, tanto da dimensãoinstitucional quanto da ideológica, visando a uma reorganização do setorpúblico: mudança institucional no sentido de que seria necessário alterartanto a estrutura como o funcionamento do setor público, possibilitandoum acréscimo de sua autonomia, maior eficiência na consecução dosresultados, e ao mesmo tempo e em contrapartida, um maior controledaquele setor por parte da sociedade. Na dimensão ideológica, por repre-sentar uma mudança no paradigma que tem orientado a burocracia esta-tal: a chamada “burocracia weberiana” deveria dar lugar a uma “buro-cracia gerencialista”, com a conseqüente introdução de práticas típicasde mercado na administração pública.

Esse movimento parece ter-se universalizado: tanto os governosde países que dispõem de setores públicos considerados grandes — comoa Suécia — mas também governos de países com pequenos setores estatais— como a Inglaterra — têm conduzido reformas de Estado de naturezae objetivos similares.

Essa tendência reformista do Estado cursa, em paralelo, e mesmodecorre das grandes transformações que tiveram origem a partir do fimda Guerra Fria, sendo potencializada pelo desmoronamento do comunismoe da crise do Estado de Bem-Estar. A superação da polarização Norte-Sul gerou um padrão bem mais monocórdico, facilitando a implantação

Mestrando emadministraçãopública daEBAP/FGV/RJ,analista doBanco Centraldo Brasil

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

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RSPde padrões universais de consumo e orientados segundo as forças demercado. Os Estados, segundo os teóricos reformistas, acham-sedespreparados para as novas pressões desse ambiente globalizado e poristo precisam ser repensados.2

O diagnóstico e a justificativa que nortearam — e ainda norteiam— esse movimento de reformas também são comuns: o setor públicocaracteriza-se por ser “inchado”, ineficiente, abrangendo áreas da eco-nomia às quais poderiam ser assumidas pela iniciativa privada e, princi-palmente, pelo setor estatal considerado como o maior responsável pelodéficit público. Em outro nível, presume-se que o setor privado é, geral-mente, mais eficiente que o público na produção de bens e serviços. Daí,uma atividade somente deve ser realizada pelo Estado, quando houveruma razão bastante persuasiva que justifique tal finalidade.3

Mudanças dessa natureza envolvem um enorme esforço, o qualnão se resume somente em uma vontade política dos novos governantes,mas pressupõe uma correlação de forças políticas majoritárias, que for-neça a sustentação necessária para a aprovação de profundas alteraçõesna ordem constitucional-legal. Caracteristicamente, esses processos sãonormalmente lentos e dependentes de acordos e alianças políticas; o queindica, para sua viabilização, uma continuidade das práticas políticas pos-tas em ação. O processo político, assim, precisa ser dimensionado paramais de um período legislativo, o que significa que a fração política domi-nante deve ter, como um dos principais objetivos, a necessidade de semanter uma continuidade no poder, ou seja, de antemão, está prevista anecessidade de reeleição.

Esta foi a concepção básica das reformas na Inglaterra, e assimtambém ocorreu na Nova Zelândia. Outros países tentaram a mesma solu-ção, tais como Austrália, Dinamarca, Suécia. Desta forma, uma variávelque parece importante para a concretização das reformas é a que repre-senta a manutenção da correlação das forças políticas reformistas — blocopolítico dominante bastante sólido que consegue reeleger-se por váriosmandatos consecutivos e dar continuidade ao processo. Países que conse-guiram implementar reformas consideradas radicais — Inglaterra e NovaZelândia — apresentaram essa característica.4 Até que ponto essa variá-vel pode ser considerada como determinante para o aspecto da “radicalidadereformista” é um aspecto que precisa ser melhor avaliado.

Na Nova Zelândia, as reformas ocorreram a partir de 1984, com achegada ao poder do Partido Trabalhista, sendo consolidadas com a reeleiçãoem 1987. Esse processo teve continuidade e mesmo foi intensificado a partirde 1990, com a vitória eleitoral do Partido Nacional. Antes mesmo, e ao longodos anos 70 e 80, organizações intergovernamentais como Organização paraa Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Fundo Monetário

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RSPInternacional (FMI) indicaram a necessidade de privatização das empresasestatais e de uma mudança drástica no setor público. Essa receita reformistarequeria forte redução dos custos financeiros, diminuição do número de em-pregados do setor estatal e chamava atenção para a questão dairresponsabilidade que imperava no setor público. Essas duas organizações,fortemente influenciadas pela abordagem teórica da Public Choice, tambémpropiciaram treinamento para os burocratas do setor econômico e fiscal doEstado, o que explica a origem das propostas desses burocratas para a refor-ma administrativa, como se verá mais adiante.

Em sua primeira parte, o artigo discute a situação da Nova Zelândiano período pré-reforma, delimitando um ponto de partida que permite pos-teriormente, a comparação do panorama anterior com o cenário atual, ouseja, avaliar os resultados da reforma.

Em seguida, estudam-se as formas incrementadas no nível da bu-rocracia dirigente, e, especialmente, os contratos de gestão entre os exe-cutivos-chefe e os ministros e a assunção de responsabilidades pela con-secução dos resultados contratados.

Posteriormente, procurar-se-á mostrar como ocorrem, hoje, na NovaZelândia, as contratações no serviço público, e de uma forma geral, estudara questão da política de recursos humanos e seus subsistemas: seleção,qualificação, avaliação de performance e indicadores de desempenho.

Por último, traça-se um perfil da Nova Zelândia pós-reforma, e, deforma resumida, discute-se o ferramental teórico que deu suporte às re-formas naquele país. Dentro deste escopo, e baseado na literatura dispo-nível, procuraremos responder algumas questões, tais como: quais as van-tagens e desvantagens da política de avaliação periódica dos contratos degestão entre executivos e ministros? Com a implementação desses me-canismos, os ministros tornaram-se, efetivamente, mais capacitados paraexercer controle sobre os departamentos e agências? E os altos executi-vos, responsáveis pelos departamentos, tornaram-se mais responsáveisperante os ministros?

2. O modelo administrativo anterior a 1984

O modelo administrativo neozelandês obteve êxito, no século XIX,no desmonte do aparato burocrático colonial e na subseqüente substitui-ção deste aparato por um novo modelo de administração de caráterestatizante. Essa nova administração, baseada no modelo weberiano,possibilitou a eliminação dos abusos e vícios coloniais, permitindo umaescalada na ascensão social, melhorou a qualificação dos funcionáriosatravés de políticas de qualificação e garantiu condições de trabalho sufi-cientemente estáveis.5

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RSPO êxito inicial do novo modelo acabou por constituir uma culturahostil às mudanças que, com o passar do tempo, e em decorrência daaceleração do ritmo das transformações econômicas, sociais e políticas,— mas precisamente com a crise dos anos 70 — passou a ameaçar aestabilidade e sobrevivência do próprio sistema. Fez-se necessário, maisuma vez, empreender esforços para renovar aquele modelo administrati-vo, tarefa agora dificultada por atitudes e procedimentos já ossificadospela tradição.

Até os anos 70, a economia neozelandesa logrou um respeitávelcrescimento e estabilidade econômica, graças a uma balança de paga-mentos amplamente favorável, fruto da exportação de matérias-primas eda possibilidade de captação de crédito para a cobertura dos gastos go-vernamentais. Com a degradação da economia mundial estas condiçõesdesapareceram, a balança comercial apresentou seus primeiros déficits,a inflação sofreu sensível elevação, assim como a taxa de desemprego.O setor público, pouco adaptado às situações adversas, passou a apre-sentar seguidos déficits orçamentários, escala crescente de endividamento,fatores estes evidenciados na desvalorização da moeda.

Três revisões sucessivas no sentido de compatibilizar os pagamen-tos e receitas do setor público foram realizadas na década de 60 e 70, nãoresultando, entretanto, em mudanças significativas.

Especialmente a partir dos anos 80, organizações de caráterintergovernamental, tais como o FMI e a OCDE reforçaram a necessida-de de uma revisão do setor público. As principais dificuldades apontadaspor essas organizações em relação ao setor público eram:

— crescimento dos custos financeiros;— gerência financeira irresponsável;— aumento do empreguismo.A área de recursos humanos também era problemática. Antes dos

anos 80, a Nova Zelândia não dispunha de um sistema formal de acompa-nhamento da performance dos altos escalões das burocracias estatais.Os executivos chefes eram escolhidos a partir de uma lista de servidorespúblicos mais experientes. Esta escolha poderia ser objeto de veto pelosministros, mas, tradicionalmente, esta prerrogativa raramente era utiliza-da. Os executivos selecionados, geralmente com média de idade em tor-no de 45-50 anos, permaneciam nestes departamentos até a idade de 60anos, constituindo o chamado “quadro permanente”.6

Apesar das tentativas de reorganização mencionadas, o setor pú-blico continuou a se expandir. O gasto público total, na Nova Zelândia,apesar de ter apresentado, neste período, taxa de elasticidade superior a1 (um) em relação ao PIB, ficou, em contrapartida, abaixo da média dospaíses da OCDE.7 (Tabela 1)

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RSPTabela 1: Indicadores econômicos governamentaisanteriores às reformas

Déficit em conta Déficit fiscal Gasto Emprego no corrente — % — % PIB governamental Setor Público — do PIB total — % PIB % da força de trabalho

Austrália 3,9 4,2 38,6 17,4

Dinamarca 4,0 9,2 61,2 30,2

Nova Zelândia 6,0 8,9 35,3 24,9

Suécia 3,3 7,1 66,3 32,9

Média OCDE 0,3 4,2 45,8 18,0

1 - 1982 para Dinamarca, Suécia; 1983 para Austrália; 1984 para Nova Zelândia.2 - Emprego no Setor Público: 1984 para todos os quatro países.

(Retirado e adaptado de: SCHWARTZ, 1994, op.cit., p. 53)

Antes das reformas atuais, existiam três tipos de empresas públi-cas — SOE’s:8

a) departamento do governo: assessoria, regulamentação e fun-ções comerciais, tais como Serviço Postal, Serviço Florestal, Ministériosdo Trabalho, Desenvolvimento e Energia.

b) companhias governamentais com responsabilidade limitada,regidas pelo Companies Act, de 1955, tendo, usualmente, o Ministrodas Finanças como único acionista. Exemplos dessas companhias: AirNew Zealand, Bank of New Zealand, Petrocorp e a ShippingCorporation.

c) corporações públicas estabelecidas sob o Acts of Parliament,tais como Housing Corporation, a Railways Corporation e o Rural Bank.

As SOE’s estavam envolvidas em uma grande diversidade de ati-vidades, como seguros, atividades bancárias, construção civil, habitação,atividades florestais, turismo, comércio, radiodifusão, telecomunicação,transporte, produção de energia e sua distribuição, manufaturas, produ-ção primária, pesquisa e desenvolvimento, assessoria e serviços. Em al-guns casos, tais como distribuição de energia e serviços de telecomunica-ção, grandes empresas públicas desfrutavam de monopólio; em outroscasos, como atividades bancárias e seguros, elas competiam diretamentecom o setor privado. Obviamente, com o Estado envolvido em tão extensalista de atividades, ele se tornara responsável por um impacto importanteem toda performance da economia. Este nível de intervenção foi o res-ponsável, segundo Boston, por uma taxa de crescimento econômico abai-xo dos padrões internacionais: em termos de renda per capita, o país,que detinha o terceiro lugar na classificação internacional até o início dosanos 50, caiu para vigésimo quinto lugar na metade dos anos 80.

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RSP3. Os objetivos e os princípios da reforma

No final de 1985 o governo anunciou as principais linhas que nor-teariam a reorganização administrativa do setor público. Em setembro de1986 foi introduzida a legislação State-Owned Enterprises Bill, dandoinício à execução efetiva da reforma. O Treasure estimou que, para operíodo 1986/1987 as medidas iriam reduzir o gasto do governo em tornode 900 milhões de dólares neozelandeses; para 87/88, em 1.200 milhõesde dólares e 1.400 milhões de dólares para o período de 88/89.9

De acordo com Richardson, os objetivos da reforma buscaram me-lhorar a performance e garantir controle social, transparência e respon-sabilização sobre os atos dos agentes estatais — accountability, confor-me abaixo especificado:

— melhorar a relação custo-efetividade da produção de bens eserviços pelo setor estatal;

— melhorar a qualidade desses bens e serviços;— tornar o setor público provedor de bens e serviços mais respon-

sável perante as necessidades dos consumidores;— dar aos representantes eleitos maior controle sobre os recursos

que foram utilizados.Richardson10 cita os seguintes princípios que nortearam das refor-

mas: controle estratégico, clareza na definição dos objetivos, descentra-lização, accountability, competição e presunção sobre maior eficiênciado setor privado.

Boston11 enumera oito princípios, que, por sua abrangência, englo-bam e explicam melhor a dinâmica das reformas. São eles:

1) Separação das funções comerciais das não-comerciais.A justificativa baseia-se no conflito, na definição e execução do ob-

jetivos. Quando uma agência possui objetivos conflitantes, geralmente, ne-nhum desses objetivos é bem realizado. A forma de resolver tal problemafoi separar as atividades comerciais das não-comerciais. O principal resul-tado tem sido remover as funções comerciais dos departamentos do gover-no, e colocá-las em corporações públicas independentes. De acordo comRichardson12, a separação das atividades comerciais das não-comerciaisalcança outro objetivo: deixa claro, de um lado, o núcleo do setor estatal ede outro, o setor empresarial do governo. Estes dois setores necessitam dediferentes estruturas organizacionais e regimes de accountability.

2) Separação entre as funções administrativa e de assessoria.Este princípio relaciona-se à proibição de que as agências respon-

sáveis pela administração e implementação das políticas forneçamconsultoria aos ministros em matéria de políticas públicas. Noutro aspectoargumenta-se que os ministros devem dispor sempre de uma fontealternativa de consultoria; ou seja, para cada visão de um problema, uma

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RSPconsultoria diversa. Por exemplo, na área de proteção ambiental, umamesma agência não deverá fornecer consultoria nas áreas de conservaçãoe desenvolvimento, ou em eficiência e eqüidade.

3) Princípio do “quem usa paga” (user-pays).Este princípio afirma a necessidade de se cobrar o preço real pelos

serviços e bens produzidos pelos departamentos e agências do Estado, noque se refere à comercialização intragoverno. Ele visa eliminar uma prá-tica arraigada no serviço público, de se fazer um preço especial, sempremais baixo, ou mesmo não se cobrar, quando o cliente era um órgão dopróprio Estado. Os objetivos deste princípio são:

a) tornar claro para o administrador público que nada mais é degraça, e encorajar uma mudança de comportamento;

b) sendo o preço o mesmo, tanto o setor público quanto o privado,ambos são forçados a avaliar o quanto o serviço é realmente importante,o que proporciona economia;

c) aumentar a renda auferida com a prestação do serviço;d) evitar desperdício, já que somente irá comprar aquele que real-

mente necessitar do serviço ou do produto.4) Transparência na concessão de subsídios.Desde a entrada em vigor do State-Owned Enterprises Act, de

1986, o principal objetivo das nove corporações públicas foi operar com afilosofia de sucesso gerencial, visando à obtenção de lucros. Ou seja,deverão ser “lucrativas e eficientes como as empresas que não são depropriedade da Coroa”, e ao mesmo tempo, serem “boas empregadoras”,exibindo “um senso de responsabilidade social”.13

No caso de o governo necessitar de bens e serviços de uma em-presa governamental (SOE), de natureza não-lucrativa, tal como a extensãode energia elétrica, ou de estradas de rodagem para áreas não economi-camente rentáveis, ele deverá fazer um contrato formal com a empresaprestadora dos serviços.

O que se deseja é que serviços que necessitam ser subsidiados,sejam claramente definidos e publicamente abertos, ou seja, deve havertransparência no processo.14

5) Neutralidade competitiva.Este princípio relaciona-se ao anterior. O seu objetivo é garantir

uma competição justa entre as empresas do Estado e as empresas privadas.Ele garante que as empresas públicas deverão ser livres de entraves econtroles burocráticos que as possam prejudicar na livre competição demercado, e, ao mesmo tempo, garante uma igualdade de competição, nãopermitindo a elas privilégios especiais, tais como a manutenção de direitosde monopólio, garantia de clientela ou financiamento subsidiado.

Exige, também, que as novas SOE’s adquiram seus bens e ativosdo governo, após uma apropriada avaliação mercadológica. Isto tem provo-cado bastante controvérsia, porque diferentemente da avaliação de uma

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RSPpropriedade, que é relativamente fácil de ser feita, a avaliação de recur-sos naturais, tais como um reserva hídrica ou de carvão, uma reservaflorestal, é bem mais complexa, e, sendo mal conduzida, pode impactarnegativamente a performance e a estrutura de preços da empresa.15

6) Descentralização e aumento do poder discricionário do admi-nistrador.

A descentralização do processo decisório tem sido um elementobásico para conferir maior eficiência, adaptabilidade e responsabilidade àburocracia, na reforma neozelandeza.

Os administradores públicos detêm agora grande responsabilidadepelas decisões a respeito de compras, estabelecimento de preços, inves-timentos, delegação de autoridade para níveis de competência, etc.16

7) Melhoramento da accountability.Ao lado do movimento pelo aumento da autonomia gerencial acha-

se a questão da eficiência, eficácia e transparência dos controles finan-ceiros das agências públicas — accountability, em relação ao Parla-mento e ao Executivo.17

Na Nova Zelândia, a accountability é assegurada através de du-plo acompanhamento: ministerial e parlamentar, visando verificar até queponto a agência ou departamento cumpriu seus objetivos. As formas quefacilitam esse processo podem ser resumidas da seguinte forma:

a) as agências governamentais devem estabelecer objetivos clarose específicos, indicadores de performance em conjunto com o ministro aoqual seja subordinada;

b) o relatório da agência deve estabelecer a relação entre o que foirealizado e o que foi estabelecido anteriormente;

c) regime de incentivos e sanções para os administradores;d) reforma do Parlamento, concedendo-lhe maiores poderes para

manter investigações e dotando-o de recursos para melhorar seu quadrode staff.18

8) Assistência durante o período de transição.A reorganização administrativa do Estado não foi realizada sem trau-

mas: alterou a vida de milhares de empregados públicos, com desempregoe aumento de preços ao consumidor. Compreendendo esta situação, e paraminimizar os custos sociais decorrentes das mudanças, o governo introdu-ziu várias medidas de caráter transitório. As mais importantes compuseramo Permanent Staff Deployment Package, negociado com representaçõesde classe do setor público no final de 1986. Aos empregados consideradoscomo excessivos na formação das novas SOE’s, foram oferecidos quatroopções: aposentadoria precoce, retreinamento, recolocação em outro setordo governo, demissão voluntária, sendo que esta última forma foi oferecidapela primeira vez na história do serviço público da Nova Zelândia.19

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RSPO maior impacto da estratégia de corporatização foi sentida pelascomunidades cuja economia se baseava na extração de carvão, no setor deminas de carvão e pelos trabalhadores do setor florestal, gerando um climade revolta, nestas regiões.20 Mesmo assim, apesar de todo sofrimento quedecorreu das reformas, a opinião pública, pesquisada no início de 1987,dava suporte às medidas saneadoras. Isto foi confirmado pela reeleição,em agosto de 1987, do governo trabalhista, o qual conseguiu ampla maioria.

4. O processo e as etapas da reforma administrativa

Na Nova Zelândia as empresas governamentais (State-OwnedEnterprises — SOE) têm sido, há muito tempo, ineficientes na utilizaçãodos recursos públicos e na ausência de accountability. Até recentemen-te, as reformas tinham sido realizadas de forma esporádica e limitadas noseu escopo. Entretanto, com a eleição do gabinete trabalhista, em julho de1984, esta situação foi bastante alterada. O governo trabalhista transfor-mou a administração da economia e implementou uma vasta reforma emvários campos da política pública, como política monetária e cambial, po-lítica salarial e de relações industriais, política de impostos, política co-mercial e política externa.

Estas mudanças na estrutura, organização e administração do Es-tado têm sido particularmente dramáticas e, sem dúvida, são as mais sig-nificativas reformas desde a ocorrida em 1912.21

4.1. As reformas do governo trabalhista: 1984 a 1990

O processo de reforma teve início no primeiro dia do governo Lange,com a introdução da política de flutuação da moeda neozelandesa, o dólarda Nova Zelândia. Essa medida acelerou o processo geral de desregula-mentação econômica, o que incluiu também a remoção dos controles edesburocratização das importações. No entanto, a principal meta do gover-no neste primeiro período foi a reforma administrativa do setor público.22

Três grandes iniciativas, neste sentido, foram anunciadas pelo go-verno durante o primeiro gabinete trabalhista, no período 1984-1987:

a) comercialização de muitas funções realizadas pelas organiza-ções estatais;

b) separação, onde possível, das atividades comerciais dos departa-mento, das não-comerciais, e a transferência das atividades comerciaispara “corporações públicas”. Em abril de 1987, nove novas SOE’s, co-brindo uma larga escala de atividades comerciais — bancos, telecomuni-cações, serviços postais, etc., foram estabelecidas como companhias deestatuto de responsabilidade limitada, incorporadas sob o Companies Act,de 1955. A Tabela 2 detalha estas mudanças.

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RSP

Fonte: Robert Gregory, The Reorganization of the Public Sector. In Boston, op. cit., 1987, p.425

* State Owned Enterprise (SOE)

Tabela 2: A reforma do setor estatal na Nova Zelândia(em vigor a partir de abril de 1987).

AgênciasEliminadas

NZ ForestService

Dept. ofLands andSurvey

Commissionfor theEnvironment

NZ Post Office

Departamentosdo Governo

Ministry ofForestry

Dept. ofConservation

Dept. of Survey &Land Information

Ministry of theEnvironment

Outras

ParlamentaryCommission

Funçõestransferidas paraoutras agências

Historic PlacesTrustDept. ofInternalAffairs

Wildlife Div.Dept. of InternalAffairs

Civil AviationMinistry ofTransport

Eletricity Div.Ministry ofEnergy

Mines Div.Ministry ofEnergy

States ServicesCommissionGovernmentOfficeAccommodationBoard

Novas Agências

Empresas depropriedade do

Estado *

Forest Corp.

Land Corp.

NZ Post

Post Office Bank

Post OfficeTelecom

Airways Corp.

Electricity Corp.

Coal Corp.

GovernmentProperty Services

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RSPCada uma dessas companhias tem o conjunto de diretores nome-ados pelo governo. Dois acionistas — shareholders — o ministro dasfinanças e um outro ministro designado tornam-se responsáveis peranteo Parlamento pelo acompanhamento de toda a performance das empre-sas. Em adição, cinco corporações foram alteradas, a partir da legisla-ção existente desde 1986 — o State-Owned Enterprise Act, que pos-sibilitou uma maior uniformidade, tanto da estrutura institucional comoda política de controle. Foram afetados diretamente cerca de 60 milservidores públicos — aproximadamente 25% da força de trabalho dogoverno central — e realizada a transferência de bens públicos do Es-tado para novas corporações.23

c) o governo anunciou um plano para introduzir importantes mu-danças no sistema de fixação de salário no setor público. A nova políticaprocura caminhar de um sistema de pagamento centralizado para umsistema comparável ao do setor privado, de caráter descentralizado, comum sistema baseado na barganha ou negociação.

Além destas, outras medidas importantes foram introduzidas:a) os administradores seniores ganharam bastante autonomia para

utilização dos recursos;b) os monopólios de algumas SOE’s foram eliminados ou reduzidos;c) novos pacotes de empregos para economistas e analistas finan-

ceiros foram introduzidos; algumas funções desempenhadas pelos depar-tamentos governamentais passaram a ser desempenhadas pelo setor pri-vado, a partir de contratações.

Durante este período, importantes iniciativas foram planejadas:— reorganização dos governos locais, com a transferência de ati-

vidades comerciais sendo contratadas pela iniciativa privada.— remodelação total da estrutura da administração do governo

central, visando à formação de um núcleo do serviço público. O planeja-mento previa, por exemplo, de dez a doze ministérios, agrupados atravésde afinidades funcionais, tais como administração econômica, desenvol-vimento social, ambiente, comércio, recursos nacionais e administraçãodo setor público. Estes teriam a finalidade de produção e organização dasinformações, fornecer consultoria ao ministro, propor legislação e regula-mentações, preparar propostas orçamentárias.

— estabelecimento de novas agências para implementar a políticado governo. Cada agência seria operada de forma separada, com direto-ria independente, mas todas sujeitas à orientação do governo. Este arran-jo, permitiria aos ministros, livres da administração do dia-a-dia, dedica-rem maior tempo às questões políticas e ao conjunto de prioridades.

O ritmo das reformas foi consideravelmente diminuído após a reelei-ção do gabinete trabalhista, em 1987, dando origem ao epíteto ‘pause for a

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RSPcup of tea’ referindo-se ao Primeiro-Ministro Lange. O processo somentefoi acelerado novamente após 1990, com a renovação do gabinete e substitui-ção do governo trabalhista pelo governo do Partido Nacional.

4.1.1. A dinâmica e a lógica da reforma

O governo trabalhista, por ocasião das eleições de 1984, foi bas-tante evasivo no que tange às reformas: o Policy Document, documentodo Partido Trabalhista de 1984, dedicou menos que uma página relaciona-da diretamente aos serviços prestados pelo Estado, e na sua maior parte,endossava os arranjos organizacionais existentes, baseados no sistemade pagamento fixo e centralizado. Isto reafirmou a confiança do Partidoem um ativo papel do Estado no desenvolvimento social e econômico dopaís. Entretanto, ele também sugeria importantes mudanças a serem fei-tas, como, por exemplo, iniciar e implementar novas idéias para melhorarserviços, aumentar a eficiência e, onde fosse apropriado, elevar a produ-tividade, dar maior flexibilidade e independência administrativa paragerenciar o pessoal do Estado.

Posições pró-reformas também ficaram evidenciadas nos escritose em entrevistas de políticos mais antigos do partido, os quais se manifes-tavam favoráveis a mudanças significativas na estrutura do serviço públi-co e no sistema de accountability financeira. Outras manifestações nomesmo sentido foram feitas pelos partidos de oposição, por comentaris-tas políticos, por experts em direito constitucional, e pela comunidadeacadêmica.24

Outra área favorável às mudanças estava dentro do próprio gover-no: eram os técnicos e especialistas do Treasure, que lamentavam a po-breza da economia e recomendavam políticas de mudanças, fornecendosugestões como:

— perseguir uma política macroeconômica;— liberação comercial;— desregulamentação do trabalho;— significativa redução do papel do Estado;— maior ênfase na assistência e ao bem-estar;— reforma do setor público;— venda das melhores empresas do governo (SOE).A base filosófica que orientou esse movimento era essencialmente

ligada ao liberalismo econômico — individualismo, preferência pelo setorprivado, limitado papel do Estado, confiança na competição de mercadoslivres e a escolha dos consumidores como forma de satisfazer às necessidadese desejos humanos. Os principais objetivos eram: alocação economicamenteracional do recursos, rápido crescimento econômico, expansão da liberda-de dos indivíduos e um sistema de bem-estar mais eqüitativo.

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RSPNo Economic Management, editado logo após as eleições de julhode 1984, afirmava-se a posição dos especialistas do Treasure, principal-mente, no que tangia às deficiências dos outros departamentos do governo:

— a maioria dos departamentos do governo não tinham objetivosclaramente definidos;

— a maioria dos departamentos não possuíam um plano de admi-nistração claramente especificado;

— os administradores tinham pouca liberdade para introduzir mu-danças em seus departamentos visando alcançar seus objetivos. Faltavaautonomia para, dentro de um determinado limite orçamentário, decidircomo produzir melhores resultados;

— muita ênfase no controle das entradas — inputs, em vez de seenfatizar a consecução dos resultados — outputs;

— não existiam mecanismos efetivos de controle e avaliação deperformances para os administradores dentro dos departamentos.

Além disto, havia outros fatores que estimularam o gabinete doPartido Trabalhista a executar as reformas, tais como:

a) a crise de confiança pela qual passava a moeda nacional, odéficit fiscal que alcançava a cifra de 9% do PIB, o déficit no comércioexterno e o enorme peso da dívida externa;

b) o pensamento, em alguns setores do governo, de que, a menosque se tornassem as SOE’s mais eficientes, as propostas de privatizaçãoacabariam tendo de ser aprovadas, devido às pressões da comunidadeempresarial.

4.2. Os principais instrumentos legais da reforma

Três instrumentos ou diplomas legais transformaram as relações, ealteraram o status dos administradores, tanto nas agências estatais quantonas empresas públicas: o primeiro dele, o State Owned Enterprise Act, de1986, como citado anteriormente, separou as atividades comerciais mantidaspelo Estado das atividades de regulação e controle, corporatizando-as emnove grandes empresas comerciais (vide Tabela 2). Isto resultou, segundoLaking,25 na redução de cerca de 52 mil empregos no serviço público — de88.000 em 1985 para 36.000 em 1993. Uma parte dessa força de trabalhofoi aproveitada pelas novas empresas, mas uma quantidade considerávelde pessoal ficou desempregada.

O segundo, o State Sector Act de 1988, e o Public Finance Actde 1989, editados após o período de reeleição e conseqüente fortaleci-mento do governo trabalhista, estabeleceram novas formas de gestão edisciplina para o trabalho, e visaram ao setor não-comercial do Estado. OState Sector Act regulamentou e introduziu novas formas e prerroga-tivas, tanto para a questão dos direitos trabalhistas quanto para a questão

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RSPsalarial do serviço público, similares as linhas traçadas pelo IndustrialRelations Act, de 1987, que regulamentou o setor privado. Alterou radi-calmente as relações trabalhistas dos administradores públicos, que pas-saram a compor uma classe administrativa, a Senior Executive Service(SES). O Public Finance Act, de 1989, alterou a orientação dos contro-les financeiros realizados sobre as agências: de um sistema de controlesbaseado nas entradas ou input-oriented para um baseado nos resultadosalcançados, ou seja, output/outcome-oriented controls.

Apesar de o gabinete trabalhista se mover em direção a uma filo-sofia de livre-mercado, ele se esquivou de executar um programa maisefetivo de privatização como o que foi perseguido, por exemplo, pela Grã-Bretanha e França. A razão disto decorre, em parte, da influência queexerceu a ala esquerda do governo trabalhista, e parte, pelo desejo deevitar medidas que provocassem rachas políticos dentro do Partido.

A entrada no poder do Partido Nacional, eleito em 1990, provocouuma intensificação das mudanças, principalmente através da ênfase naresponsabilidade fiscal. Para isto, foi editado o Fiscal ResponsabilityAct, em 1994, quarto diploma legal, tendo como princípio básico a redu-ção total do débito público para níveis prudentes, ou seja, que o gasto totaldo governo em cada ano fiscal deveria ser inferior às receitas totais nomesmo exercício fiscal.26

4.3. A reforma gerencial: controle estratégico, especificação deobjetivos e responsabilização

Visando retificar as deficiências na gerência do setor público, já apon-tadas anteriormente, foi realizada uma série de mudanças, cuja ênfase con-centrava-se na clarificação dos relacionamentos cadeia hierárquica. O ob-jetivo era evitar situações em que ocorressem conflitos de interesse, talcomo uma agência responder hierarquicamente a mais de um ministro.

O setor público necessitava de uma estrutura que possibilitasse aespecificação da performance desejada, uma apropriada delegação datomada de decisão, acompanhamento dos contratos de gestão e uma cui-dadosa aplicação de incentivos e sanções.

De acordo com o State Sector Act (1988) e o Public Finance Act(1989), cada departamento deve preparar, anualmente, um detalhado pla-no corporativo,27 que especifique seus outcomes e outputs e os indica-dores de performance requeridos, baseados em critérios de qualidade,quantidade, prazos, etc.

Três conceitos, aqui, merecem destaques: outcomes, outputs einputs. Os outcomes poderiam ser expressos como sendo os propósitosdas atividades do governo. Clareando o conceito, o outcome representa onível de abstração necessário que fornece aos ministros condições de

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RSPconcentrar seus esforços na dimensão estratégica e, conseqüentemente,ao conjunto de prioridades visando a uma boa alocação dos recursos pú-blicos. Os outputs podem ser expressos em termos dos bens e dos servi-ços produzidos pelos departamentos do governo. Este conceito é tão im-portante na Nova Zelândia, que é considerado como central na compre-ensão da accountability. Os outputs de um determinado departamentosão determinados pelo ministro e especificados em um contrato formalacordado entre o ministro e o executivo-chefe do departamento. Alémdisto, toda a alocação orçamentária dos departamentos é realizada combase nesses outputs. A ênfase nos inputs, ou seja, os recursos utilizadospara produzir os outputs, era a prática adotada anteriormente, que resul-tou em uma enormidade de controles sobre a utilização desses recursos.Com a mudança de ênfase, de input para output, os executivos-chefesdos departamentos passaram a gozar de uma grande liberdade para utili-zação dos recursos.

Para isto, foi necessário deixar bem clara a linha de autoridade eresponsabilidade entre a burocracia e o Executivo: as relações entre osexecutivos-chefes dos departamentos e os ministros foram simplificadase pautadas pela accountability. Cabe ao ministro a tarefa de determinaras prioridades departamentais, especificar os outcomes desejados e osoutputs que os departamentos devem alcançar. Além disto, devemonitorar a consecução dos resultados e a performance dos departa-mentos sob sua responsabilidade. De outra parte, os ministros são res-ponsáveis pela escolha dos outcomes e dos outputs e respondem pelosseus atos diretamente ao Primeiro-Ministro e ao Parlamento. Ao execu-tivo-chefe cabe garantir o alcance dos resultados requeridos pelo minis-tro, e, por outra parte, é o responsável direto por qualquer falha na conse-cução dos objetivos departamentais.

4.3.1. Os contratos de gestão baseados em performance

Os contratos de gestão baseados na performance constituem umaforma inovadora, havendo poucos países no mundo que utilizam este ins-trumento de controle gerencial. Eles representam uma forma prática efuncional de, a partir da definição e especificação dos outcomes e outputsdos departamentos, cristalizá-los na forma de um contrato formal, nego-ciado entre o ministro e um executivo-chefe. De acordo com o ‘Guidelinesfor Preparing Chief Executives Performance Agreements’, desenvol-vido em 1989 pela SSC,28 o contrato de performance tem o propósito dedefinir, claramente, a responsabilidade e accountability entre as partescontratadas, principalmente no que se refere ao relacionamento entre oexecutivo-chefe e um ou mais ministros.

Três níveis devem ser considerados e incluídos na elaboração deum contrato de performance:

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RSPa) nível pessoal: um contrato de performance pessoal entre o mi-nistro e o executivo-chefe, o qual deve registrar os objetivos e as tarefasprioritárias e consensuais entre ambos, visando facilitar o relacionamentopessoal e direto durante a vigência do contrato;

b) nível departamental: um contrato operacional no nível de depar-tamento, consistente com os elementos básicos do plano corporativo, en-volvendo a produção de outputs e demais requisitos administrativos queforam contratados;

c) nível geral: um contrato geral de administração, que prescreveuma consistência entre as ações e os objetivos de todos os departamen-tos, incluindo as responsabilidades do executivo-chefe e os suportes rela-tivos ao interesse público.

Visando desenvolver mecanismos que melhorassem a performancee minimizassem os comportamentos oportunísticos, foi criada uma novaestrutura de incentivos para a carreira dos executivos-chefes: a) formade pagamento, fixada em contrato por tempo determinado; b) possibilida-de de renegociação desses contratos; c) incremento salarial baseado naperformance.

A alocação dos executivos-chefes passou a ser centralizada peloSenior Executive Service (SES), podendo os mesmos serem contrata-dos por um período que varia entre dois e cinco anos de contrato. Aperformance é avaliada anualmente pela State Services Commission(SSC), e a remuneração e promoção na carreira dependem da habilidadeindividual para alcançar os outputs contratualmente fixados durante asnegociações com os ministros.29 É também responsabilidade da SSC afixação da remuneração dos administradores. Os critérios para fixaçãoda remuneração, a cargo da SSC, giram em torno do nível de responsabi-lidade, na importância da função e na quantidade de trabalho a ser reali-zado. As condições de contrato para cada função, apesar de serem nego-ciadas entre a SSC e o chefe-executivo, devem estar de acordo com aslinhas básicas traçadas pelo governo.30

Isto significa que os ministros podem agora concentrar-se na for-mulação estratégica maior, e ficam livres da estressante tarefa de nego-ciação contratual com os executivos-chefes, o que, como foi dito acima,está a cargo da SSC.

Antes de outubro de 1990, quando a eleição do governo do PartidoNacional, poucos executivos-chefes alcançaram as metas negociadas comos ministros. No período de 1989-1990, somente 15 dos 30 executivosentrevistados por Whitcombe31 satisfizeram as cláusulas contratadas. Em1991, Kim Bolger afirmara que somente uns poucos executivos-chefesainda mantinham contatos com os ministros e atendiam à solicitação legal

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RSPde apresentar o plano estratégico dos seus departamentos. Esta situaçãoparece ter sido alterada no decorrer do ano de 1991. Cerca de dois terçosdos ministros entrevistados afirmaram ter firmado contrato de performancecom seus executivos.

Apesar de todo o otimismo sobre contrato de performance, certosministros não estão convencidos dos benefícios que tal instrumento acar-reta para a consecução dos resultados do governo. Consideram que oscontratos não garantem uma boa performance, e além disto, baseiam-sena quantificação da performance, deixando de lado a dimensão qualitati-va, que reside, justamente, no relacionamento entre ministro e executivo-chefe. Outro fator que compromete a realização dos objetivos é o fre-qüente turnover dos executivos-chefes, que reduzem a eficiência eefetividade do processo gerencial, ocasionado por trocas ministeriais de-vidas a mudanças no governo.

4.3.2. As relações de trabalho no setor público

Atualmente, todo o pessoal contratado pelo Estado é regido peloEmployment Contracts Act, a mesma legislação que vige no setor priva-do. Desta forma, os executivos-chefes de cada departamento têm auto-nomia e liberdade para nomear, demitir e promover seus funcionários. Oscontratos podem ser firmados individual ou coletivamente, por departa-mento, e as negociações sobre condições contratuais são conduzidas, in-dividualmente, departamento por departamento. Por outro lado, a formade incremento salarial está sendo alterada: a fórmula clássica de incre-mentos anuais está sendo abandonada, para dar lugar a um sistema debônus baseado em performance.

Novas formas de contratação e novos sistemas de recompensatêm sido experimentados. Por exemplo, existem possibilidades de umagrande flexibilização em termos de horas por dia de trabalho e empregosocasionais. Segundo os reformadores, estes mecanismos beneficiam oempregador, pela economia que proporcionam, e agradam alguns empre-gados, que não dispõem de todo o horário diário para dedicar-se ao servi-ço público, seja por terem outras atividades fora do Estado, seja pelanecessidade de uma maior assistência aos filhos.

5. A situação atual

Em um curto espaço de tempo, a Nova Zelândia tornou-se umanação transformada: as condições vigentes até 1984, ano que marcou oinício de uma década de grandes reformas do mercado, iniciadas com aeleição do governo trabalhista de David Lange, desapareceram: de uma

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RSPdas economias mais protecionistas tornou-se uma das mais abertas eprodutivas.

O núcleo do serviço público, drasticamente reduzido, conta atual-mente com apenas 38% departamentos, cobrindo uma variedade de fun-ções: implementação de políticas, serviços, operações comerciais.32

A Nova Zelândia começou seguindo a trilha percorrida pela Aus-trália, através de uma reforma microeconômica em 198433: desregula-mentação econômica, tendo como ponto central a flutuação do dólaraustraliano.

Desde o advento da Lei de Contratos de Trabalho, que começou avigorar em 1991, a Nova Zelândia experimentou transformações no rela-cionamento empregador-empregado e grandes avanços na produtividadeda mão-de-obra. Sentenças judiciais com abrangência nacional deixaramde existir e a posição protegida dos sindicatos foi eliminada. Todos ostrabalhadores passaram a estar empregados sob contratos individuais oucoletivos.

Devido ao superávit orçamentário alcançado — em torno de 2 a3% do Produto Interno Bruto — além de um Banco Central com grandecredibilidade, de uma conta corrente aproximando-se do equilíbrio e deum sistema industrial que realmente relaciona os aumentos de salários aganhos em produtividade, os neozelandeses estão muito menos sujeitos ater de enfrentar nova escalada de taxas de juros.

O crescimento do nível de empregos é o indicador mais óbvio dosucesso do mercado de trabalho. Este nível está crescendo em 4% aoano — seu maior percentual em quase sete anos. À medida em que ocrescimento do Produto Interno Bruto de 6,1% aquece a economia, cres-ce o número de empregos e os salários sobem em quase todos os setoresda Nova Zelândia. Os principais dados estão representados nas tabelas 3,4, 5 e 6, abaixo.

Alguns indicadores macroeconômicos indicam, entretanto, a ne-cessidade de cuidados especiais: o déficit da conta corrente, que é decerca de 1,4% do PIB, tende a aumentar substancialmente e a dívidaexterna líquida pode estourar a curto prazo. A dívida pública acumula-da, no entanto, permanece alta, em torno de 39% da economia, o que,entretanto, poderá ser revertido com a entrada de recursos oriundos deuma forte campanha de privatização. Além disto, sua inflação é baixa eestável — em torno de 1 a 2 % ao ano — e seu orçamento tende a umsuperávit.

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RSPTabela 3: Indicadores sociais — comparação entre o períodopré-reforma e o pós-reforma.(o Brasil está presente como fator comparativo)

Percentagem da Taxa de mortalidade Analfabetismo Percentagem do gasto Países população com infantil de adultos em serviços sociais

acesso a serviços em relação à despesa médicos total

1980 1994 1980 1994 1980 1994 1980 1994

Austrália 99 - 11 6 <5% <5% 45,5 57,5

Nova Zelândia - 100 13 7 <5% <5% 57,0 69,1

Japão - 100 8 4 <5% <5% - 59,2

Coréia - 100 32 12 <5% <5% 22,0 32,0

Brasil - - 74 56 17 17 32,3 36,7

Dados: Banco Mundial. Relatório sobre o desenvolvimento mundial - 1996.

Tabela 4: Indicadores econômicos — comparação entre operíodo pré-reforma e o pós-reforma.(O Brasil está presente como fator comparativo)

Taxa média de Taxa média de Taxa média anual Superávit/déficit Países crescimento anual(%) crescimento anual(%) de inflação global

das exportações das importações (como % do PNB)

1980/90 1990/94 1980/90 1990/94 1973/84 1990/94 1984 1994

Austrália 5,8 8,1 4,9 5,1 10,4 1,2 -2,5 -2,9

Nova Zelândia 3,6 5,4 4,6 5,5 13,6 1,2 -9,5 0,8

Japão 6,0 3,3 4,9 -6,7 4,5 1,1 - -1,6

Coréia 13,7 7,4 11,2 7,7 5,9(**) 6,3 -2,3(*) 0,3

Brasil 6,1 6,6 -1,5 8,5 71,4 1.231,5 -3,6 -4,0

Dados: Banco Mundial. Relatório Sobre o Desenvolvimento Mundial - 1996.

Tabela 5: Força de trabalho x desemprego

Força de trabalho Valores Médios

Unidade 1993 1994 1995

Força total de trabalho 1000 1.643,4 1.693,2 1.728,0

Homens 1000 928,8 949,1 968,8

Mulheres 714,6 744,2 759,3

Taxa de desemprego % 10,2 9,5 6,9

Homens % 10,7 9,6 6,9

Mulheres % 9,7 9,4 6,9

Fonte: Nova Zelândia: http://www.govt.nz

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24

RSP

O sistema fiscal da Nova Zelândia foi simplificado, e a alíquotamais alta do imposto de renda de pessoas físicas é agora de 33%, alinha-da com a alíquota do imposto de renda de pessoas jurídicas.

Alegar que as reformas na Nova Zelândia não foram dolorosasseria faltar com a verdade. O povo experimentou queda em seu padrãode vida e muitos trabalhadores perderam seus empregos como resultadodas mudanças estruturais.

6. Suportes conceituais da reforma

Reformas administrativas não constituem processos inovadores, tí-picos da atualidade: de fato, como afirma Kettl,34 “if there is anythingmore ageless than government itself, it is the effort to improve it”.

No entanto, a reforma atual diferencia-se das demais em, pelo me-nos, dois pontos: primeiro, por seu caráter universal, ou seja, constituir ummovimento no qual todos os países estão se engajando; segundo, por apre-sentar, de forma homogênea, a mesma base conceitual, qual seja: o movi-mento gerencialista, a teoria da Public Choice e a teoria Principal-Agente.

Tabela 6: Indicadores econômicos, sociais e demográficos daNova Zelândia em comparação com alguns países que tambémpassaram por reformas.(O Brasil está presente como fator comparativo)

(*) - média dos últimos 5 anos.

(**) - após o plano Real .Fonte: Nova Zelândia: http://www.govt.nz ; Banco Mundial - Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 1996

Unidade Ano Nova EstadosAustrália Inglaterra Noruega Japão Coréia Brasil

Zelândia Unidos (**)

Área Km2 (000) 1995 2 6 6 9.373 7.687 2 4 5 3 2 4 3 7 8 9 9 8.547

População 1.000.000 1995 3.6 2 6 3 1 8 58,6 4,4 125,3 44,8 164.4

Densidade habitantes / Km2 1995 1 3 2 8 2 2 4 0 1 4 3 3 0 4 5 2 1 9

Estatísticas Vitais

Taxa de nascimento por 1.000 habitantes1995 16,4 16,0 14,5 13,5 13,6 10,0 14,9 21,4

Taxa de mortalidade por 1.000 habitantes1995 7,8 8,5 7,1 11,0 10,0 7,1 5,5 7,0

Taxa de mortalidade infantil por 1.000 1995 7,1 8,5 5,8 6,6 5,0 4,2 11,0 5 6

Expectativa de vida ao nascimentos

nascer homens 1993 7 3 7 3 7 5 7 3 7 4 7 6 6 9 6 5

mulheres 1993 7 9 8 0 8 1 7 8 8 0 8 2 7 6 7 0

PIB 1995 5 2 6.840 3 3 3 1.056 1 1 3 4.750 3 8 7 5 5 5

PIB per capita (*) % anual 1995 14,400 26,000 18,500 18,000 26,000 38,00 8,600 2,970

Crescimento do PIB 1995 2.5 2.2 2.3 1.5 3.1 1.2 7.7 2,2

Comércio Exterior

Importações - bens e bilhão US$ 1995 1 6 8 8 9 6 8 2 8 9 4 2 3 5 6 1 2 0 3 6

serviços

Exportações - bens e bilhão US$ 1995 1 6 7 7 6 6 3 2 8 0 4 9 4 5 0 1 1 6 4 4

Serviços

Contribuições Setoriais

Serviços % do PIB 1995 6 2 6 7 6 7 6 6 6 3 5 5 4 4 5 2

Força de trabalho 1000 1995 1,730 124,959 8,696 27,635 2,180 65,450 21,059 7 4

Taxa de desemprego % 1995 6,3 5,7 8,3 8,2 5,2 3,0 2,0 5,6

Saúde

Quantidade de médicos por 1.000 habitantes1991 1,9 2,4 2,3 1,4 2,2 1,6 1,0 1,3

Gasto com saúde % PIB 1993 5,7 4,4 5,6 5,5 5,8 5,0 0,1 2,6

Gasto do setor privado em % orçamento / 1993 2,9 5,2 4,0 1,6 2,3 2,9 4,5 —

saúde residência

Taxa de câmbio ($NZ) em 31.03.95 1995 1,0 0,61 0,82 0,39 4,19 60,6 484,7 0.61

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RSPO movimento gerencialista preconiza para o setor público, a partirdo modelo de competição de mercado, que a estrutura administrativa nãoseja superdimensionada de forma a superar as necessidades de governo.Eficiência, economia, produtividade constituem indicadores básicos paracaracterizar uma boa administração. A ênfase, dentro do pensamentogerencialista, é na existência e na aplicabilidade prática de um conjuntode instrumentos gerenciais, que se acredita poderem ser aplicados uni-versalmente, e em diferentes tipos de organizações, sejam elas públicasou privadas.

A teoria da Public Choice defende os seguintes pontos básicos: 35

1) incremento nos incentivos econômicos ou de mercado para agerência do setor público;

2) os indivíduos são egoístas — agem racionalmente em direçãoao próprio interesse;

3) a burocracia estatal é vista como participante ativa do governo,e os burocratas apresentados, diferentemente do modelo weberiano, comoagentes dinâmicos que lutam para aumentar sua dotação orçamentária,para ampliar seu círculo de poder, e principalmente, para se manteremnos cargos;

4) os diversos agentes políticos são vistos como “egoístas’, ou seja,a racionalidade de cada um visa, unicamente, maximizar seus própriosinteresses;

5) nesse jogo de maximização de interesses cruzados e inter-rela-cionados, nessa arena de atores egoístas, o resultado final é o bem co-mum. Destaca, também, que o interesse individual é sempre diferente dointeresse coletivo.

A teoria Principal-Agente parte do princípio de que, em um modeloideal, os agentes oferecem seus serviços ao principal, e atendem perfei-tamente às demandas e necessidades daqueles.

Além disto, a estrutura institucional do serviço público reforça atendência em direção ao rent seeking, ou seja, os agentes somente aten-dem aos propósitos dos principais quando tais propósitos coincidem comos seus próprios interesses. Isto conduz a um tipo de assimetria entre ostrabalhadores do setor público — que seriam os agentes — e o governo,que, presumivelmente, seria o principal: os primeiros, por deterem gran-de conhecimento institucional, poderiam ludibriar os principais a respeitodos processos burocráticos, dos quais são grandes conhecedores. Situa-ção semelhante ocorre entre agências estatais que possuem monopóliosobre serviços e produtos: os consumidores principais desta relação nãopodem escolher um produto ou serviço alternativo36 .

Trabalhando com a teoria Principal-Agente, Przeworsky37 propõeum modelo com quatro blocos de interação. O primeiro bloco seria dainteração entre o Estado e os atores privados. O segundo refere-se à

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RSPinteração entre políticos x burocratas. No terceiro dá-se a relação entrecidadãos e políticos e por último, a relação entre burocratas e cidadãos.

1) Estado e atores privados: aqui, o Estado, como provedor daspolíticas públicas, é o principal enquanto os agentes privados, que têmuma tendência natural de procurar defender seus próprios interesses, se-riam os agentes. Por isto, o Estado deve desenvolver e aplicar mecanis-mos de regulação, capazes de fazer com que os agentes funcionem emfunção do principal. Daí, quanto melhor for a qualidade da regulação,melhor será a qualidade da intervenção estatal. Seriam três os fatoresprimordiais para que uma boa regulação estatal se efetuasse: os interes-ses públicos deveriam se sobrepor aos interesses privados; manter acredibilidade do governo e garantir a permanência das “regras do jogo”, econtar com uma boa rede de informações do governo sobre o funciona-mento e os anseios dos membros do setor privado.

2) Políticos x burocratas: os burocratas do setor público seriam osagentes que deveriam ser conduzidos a agir em função do bem-estarpúblico, e não em busca de seus próprios interesses; os políticos, comoprincipais, devem estabelecer os controles, tais como: zelo nas contrataçõesvisando melhor produtividade; competição entre as diversas agências edescentralização administrativa, visando estabelecer uma maior proximi-dade entre burocratas e cidadãos.

3) No nível de relação entre cidadãos e políticos, o modelo pres-creve que, sendo os políticos representantes dos cidadãos, eles são osagentes e os cidadãos os principais. A forma de controle mais eficaz é anão-reeleição dos maus políticos, o que, no entanto, é dificultado pelapouca visibilidade dos atos dos políticos.

4) Burocratas x cidadãos: os últimos são os principais, sendo osburocratas os agentes. Neste caso, deve-se estimular a cobrança da so-ciedade sobre a burocracia, no sentido de que cada órgão público tenha oseu ombudsman, capaz de ouvir as reclamações do público; que os cida-dãos, prejudicados pela atuação pública, acionem o Poder Judiciário atra-vés de tribunais apropriados.

O grande problema na implementação de um modelo baseado nateoria principal-agente reside no âmbito das relações de poder, ou seja, queou quais atores políticos terão a prerrogativa de definir quem será o agentee quem será o principal nas diversas cadeias de relacionamentos?

7. Conclusões

1) A partir de 1984, o governo da Nova Zelândia deu início a umagrande reforma do setor público, cujo objetivo principal foi a rentabilidadecomercial. A partir daí, qualquer meta social a ser implementada pelas

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RSPempresas estatais deveria ser, preliminarmente, aprovada pelo Parlamen-to e financiada pelo orçamento público. Além disto, as empresas estataisforam postas na mesma situação jurídica das empresas privadas, expos-tas à concorrência e forçadas a buscar financiamento em condições demercado, sem garantias públicas.

A propriedade das empresas saíram dos ministérios setoriais, pas-sando ao controle direto do novo ministro das Empresas Estatais e aoTesouro. Estes passaram a nomear a diretoria de cada empresa, asquais passaram a ser compostas quase exclusivamente por represen-tantes do setor privado. Esses diretores nomeavam os administradoresdas empresas, a partir dos contratos de performance, fixando e contro-lando objetivos anuais, com a prerrogativa de demiti-los em caso defracasso administrativo.

O governo do Partido Nacional, eleito em 1990, privatizou váriasdessas empresas a despeito do lucro e da produtividade crescente por traba-lhador, resultantes das iniciativas precedentes. A justificativa para a priva-tização foi o receio de não se conseguir sustentar, a longo prazo, as refor-mas. Este receio teve origem na premissa de que, em tempos de vacasmagras, os governos conseguem tomar medidas saneadoras, priorizandoos objetivos comerciais, concedendo autonomia aos administradores e ado-tando orçamentos rigorosos, mas passada a crise ou à vista de interessespolíticos importantes, a prioridade empresarial desaparece, cedendo espaçoaos interesses corporativos. Isto é particularmente dramático para as em-presas que são consideradas estratégicas do ponto de vista eleitoral.

O modelo de privatização adotado atingiu a maioria das empre-sas estatais, ficando fora do programa a empresa encarregada dadistribuição de energia elétrica, os institutos de pesquisa — CrownResearch Institutes (CRI) e as empresas de saúde — Crown HealthEnterprises (CHE).

2) Os dados contidos na Tabela 4, 5 e 6 merecem alguns comentá-rios. Primeiramente, cumpre ressaltar que os países comparados, excetu-ando-se a Coréia e, principalmente, o Brasil, acham-se no estreito círculodas mais ricas e desenvolvidas nações do mundo. Já superaram algunsaspectos críticos ainda presentes para os países em desenvolvimento,como analfabetismo, acesso aos recursos relacionados à saúde, má dis-tribuição de renda, etc. Basta, por exemplo, comparar a situação dessesdois países, em termos de taxa de mortalidade infantil, ou de renda percapita para visualizar este aspecto. Portanto, a comparação entre resul-tados de reformas deverá, pelo menos preliminarmente, levar em consi-deração o grau de desenvolvimento sócio-econômico de cada país.

Em segundo lugar, a área física, medida em Km2, parece não seruma variável relevante, caso o grupo de comparação seja homogêneoem termos de desenvolvimento sócio-econômico. Assim, tanto países

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RSPcom grande extensão geográfica, como EUA e Austrália, quanto paísespequenos, como Inglaterra, Noruega, Japão, Nova Zelândia, apresen-tam indicadores estatísticos vitais e PIB per capita sem grandes dis-crepâncias. Na Coréia, por outro lado, observa-se uma quase ausênciado Estado no setor saúde, evidenciado tanto pela percentagem do PIBgasto no setor saúde quanto pela percentagem do orçamento familiargasto com a saúde. Este fato é agravado pelo indicador quantidade demédicos por 1.000 habitantes, onde apresenta a mais baixa relaçãodentre os demais países, refletindo este fato na taxa de mortalidadeinfantil, que é a mais alta.

Em terceiro lugar, parece ficar evidente, a partir das três tabelas,que o resultado positivo das reformas condiz com a manutenção e mesmoo aumento das despesas com o setor social (considerado aqui como edu-cação, saúde, previdência social, habitação e serviços comunitários). Tantoa Austrália quanto a Nova Zelândia, que anteriormente já despendiamcerca de 50% do total das despesas na área social, aumentaram aindamais esse percentual no período pós-reforma.

Por último, a abertura do mercado interno às importações compor-tou-se, tanto Nova Zelândia quanto na Austrália, no sentido de compen-sar o déficit global da economia, ou seja, parece ter sido utilizada umapolítica de incentivo às exportações associada à melhoria na performancee na produtividade das empresas, de forma a compensar o aumento, emquantidade de dólares, das importações. Portanto, a reforma não foi rea-lizada em troca do sacrifício das empresas nacionais, sejam elas estataisou privadas.

3) Enquanto a Public Choice defende a não-intervenção estatal, eno limite, a inutilidade do Estado, aceitando como ideal a regulação totalpelo mercado, a teoria Principal-Agente baseia-se na necessidade decoordenação dos esforços para consecução dos objetivos e metas dasorganizações, prescrevendo controle e intervenção, e mesmo, a necessi-dade de intervenção estatal permanente, devido mesmo ao agir egoístados agentes privados. Traduzindo melhor a contradição: enquanto a pri-meira corrente teórica preconiza estratégias tipicamente mercadológicas,a segunda possui uma fundamentação na dimensão social.

Na prática, essa contradição acha-se localizada, por exemplo, nasustentação dos objetivos e prioridades sociais do Estado na NovaZelândia. Enquanto as empresas estatais devem se guiar por metas tipi-camente comerciais, a fixação dos objetivos sociais deve ser aprovada,antecipadamente, pelo Parlamento e inscrita no orçamento público. Ouseja, pode ocorrer uma dada situação na correlação de forças políticasque propicie o Parlamento se negar a fixar qualquer meta social (porexemplo, a extensão de energia elétrica para comunidades não-lucrati-vas), prejudicando o cidadão menos privilegiado, ou o Parlamento passar

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RSPa aprovar determinadas medidas sociais, as quais passam a inviabilizareconomicamente as empresas estatais.

4) A experiência reformista da Nova Zelândia constitui um pro-cesso em andamento, com vários elementos ainda em progresso. Entre-tanto, dois aspectos e duas lições básicas podem ser citados a partir daatual experiência reformista. O primeiro aspecto é a necessária firmezana determinação em se realizar as reformas e a certeza de que os bene-fícios serão colhidos no futuro. Uma máxima popular pode ser utilizadapara clarear esse pensamento: “não se pode cruzar um abismo com doispulos”.37 O segundo aspecto refere-se à necessidade de distinguir e re-conhecer, claramente, as especificidades dos setores e dos mercados quese deseja reformar. Assim, o setor de saúde e o setor de ciência etecnologia, devido às suas características especiais, tiveram um trata-mento diferenciado.

A primeira lição a ser tirada é simples: é melhor com reforma do quesem ela. Os dados apresentados nas diversas tabelas no decorrer do artigorespondem por si mesmos. A segunda lição refere-se à necessidade de uminvestimento financeiro inicial nas empresas a serem corporatizadas ouprivatizadas, para adaptá-las ao ambiente de mercado. A não compreen-são desse fato pode jogar por água todo o esforço realizado.

5) Finalmente, o estudo ora realizado baseou-se em fontes secundá-rias, o que, se por um lado não lhe tira o valor, pelo menos sugere a impor-tância de se aprofundar em novas pesquisas, principalmente as de caráterprioritariamente analítico e comparativo, baseadas no estudo de dados pri-mários que garantem uma análise mais acurada desta experiência.

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RSPNotas

1 Este artigo foi realizado com recursos da ENAP Escola Nacional de AdministraçãoPública. Constitui um dos produtos da pesquisa sobre burocracia estatal, do Progra-ma de Pesquisas e Estudos sobre Reforma do Estado e Governança, mantido pelaFGV/EBAP, sob a coordenação da professora de mestrado em administração públicae doutora em ciência política Sonia Fleury. Contou, além da atuação do autor comopesquisador-adjunto do Programa, com a contribuição especial dos seguintes pesqui-sadores: Adriana Mesquita, Sílvia Ferreira e Valdei Araújo.

2 “O conflito Leste-Oeste ocultou a emergência de forças que agem desde 1950 e queaparecem como elemento chave para a organização internacional: a globalização econô-mica e cultural, a massificação das trocas comerciais, a emergência das questões plane-tárias, as migrações demográficas, por exemplo.” Marisol Touraine. Le Bouleversementdu Monde. Géopolitique du XX1e Siècle. Paris, 1995, p. 198. Ver também: Fleury, Sonia.Saúde e Qualidade de Vida: combater a desigualdade e a exclusão. Setembro, 1996.

3 Richardson, Ruth. The New Zealand Public Sector. Brasília: Mare. 1996, p. 102.4 Herman Schwartz. Public Choice Theory and Public Choices. Bureaucrats and State

Reorganization in Australia, Denmark, New Zeland, and Sweden in the 1980s.Administration & Society, v.26, 1994, p.52.

5 Gerald Caiden. Reformas Administrativas Recientes en Australlia. Revista Internacio-nal de Ciencias Administrativas. Madrid. v.57, n. 1, março/91, p. 9.

6 Jonathan Boston. Assessing the Performance of Departamental Chief Executives:Perspectives from New Zealand. Public Administration. v.70. Agosto 1992 , p.407.

7 Organization for Economic Cooperation and Development — OECD - 1979 —Employment in the public sector. Paris, citado por Schwartz, op. cit, p. 51.

8 Jonathan Boston. Transforming New Zealand’s public sector: Labour’s quest forimproved efficiency and accountability. Public Administration, v. 65, 1987, p. 427.

9 Jonathan Boston. op. cit., p.431.10 Richardson, 1996, op. cit., p.102.11 Boston, 1987, op.cit., p.432.12 Richardson, 1996, op. cit., p.103.13 State-Owned Enterprises Act, 1968, Seção 4 - citado por Boston, op.cit, 1987, p. 433.14 McKinlay. Corporatisation: the solution for state-owned enterprise? Wellington:

Victoria University Press, 1987, apud. Boston, op.cit. 1986, destaca os seguintesbenefícios dessa prática: a) pelo cálculo do custo para os serviços não-lucrativos, épossível avaliar acuradamente a performance comercial de cada empresa; b) os servi-ços subsidiados passam a sofrer um maior escrutínio público, tornam-se abertos, epossibilitam uma política eficaz de controle. De outra forma, o Treasure passa acobrar dos ministros uma justificativa para a prorrogação dos subsídios, ou procuraruma forma mais barata para alcançar os mesmos resultados.

15 A colocação em prática desse princípio exigiu grandes mudanças em termos de legislação:liberalização de mercados e eliminação de protecionismos; cancelamento de subsídiosfinanceiros; pagamento de taxas e dividendos ao governo por parte das SOE’s; eliminaçãoda exigência de que agências do governo, sempre que possível, efetivassem suas comprasem outras agências governamentais; reforma do sistema de pagamento fixo de salários, paradar maior competitividade às empresas públicas. Boston, op. cit., 1987, p.434.

16 Segundo Boston, op. cit., 1987, 95% dos 2 mil ou mais instruções contidas no PublicService Manual foram eliminadas. O manual foi totalmente reescrito, dando-se prefe-rência por dotá-lo com princípios gerais, para orientação dos administradores,e nãopor rígidas prescrições formais.

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RSP17 O princípio norteador é que a responsabilidade pelo estabelecimento das políticas edos objetivos das agências públicas cabem ao ministro, além de aprovar as estratégiaspara alcancá-los. Ao mesmo tempo, garante aos administradores das agências ummínimo de interferência política.

18 Para informações detalhadas sobre a reforma eleitoral na Nova Zelândia, ver: Vowles,Jack. The Politics of Electoral Reform in New Zealand. International Political ScienceReview, v.16, n.1, p.95-115 1995.

19 Até a metade de 1987, cerca de 5 mil empregados públicos solicitaram demissãovoluntária e mais ou menos 200 se aposentaram precocemente. O custo para o Estadoficou em torno de 100 milhões de dólares. Além disto, mais de 2.000 funções públicasforam extintas durante o período 1986/1987 como resultado da comercialização dosvários serviços públicos. Boston, 1987, op.cit., p.436.

20 Há de se destacar que, tanto na região de mineração como na florestal, o índice dedesemprego, anterior às reformas, era o mais alto do país, o que agravou ainda mais asituação dos atingidos pela reforma. Além disto, a grande maioria dos postos detrabalho extintos pertenciam às minorias étnicas. Boston, 1987, op. cit., p.436.

21 A reforma de 1912 criou uma carreira de serviço público, de caráter permanente, unificada,politicamente neutra e meritocrática. Jonathan Boston, 1987, op.cit., p.424.

22 Basil Walker. Reforming the public sector for leaner government and improvedperformance: The New Zealand experience. Public Administration and Development.v.16, p.354, 1996

23 Jonathan Boston, 1987, op.cit, p. 424.24 Jonathan Boston, op. cit, p. 429.25 Rob Laking. Developing a culture of success: Reflections from New Zealand experience.

Public Administration and Development. v.15, 1995, p. 284.26 Ainda hoje o débito público na Nova Zelândia acha-se em níveis bastante altos,

estando a economia vulnerável diante de eventos adversos. Richardson, op.cit., p.112.27 Exemplo de plano corporativo pode ser obtido em: Nova Zelândia: http://

www.mdcentre.govt.nz//cplan95.htm28 Jonathan Boston, 1992, op.cit. p. 411.29 Herman Schwartz, 1994, op.cit., p. 60.30 Para os novos administradores, o modelo prescreve que deverão receber em torno de

95% da base salarial, prevendo-se incrementos a partir daí, até o máximo de 110 % dabase salarial. Uma escala de 1 a 5 é utilizada pelo SSC para decidir a magnitude dosincrementos salariais. Jonathan Boston, 1992, op. cit., p. 409 e 424-425.

31 Apud Jonathan Boston, 1992, op.cit., p. 414.32 New Zealand. Statistics. http://www.mdcentre.govt.nz/stats/2eoa_272.html, 1996.33 Peter Osborn. Remodelação da Nova Zelândia supera em brilho a da Austrália. In:

Ohmae, Kenichi. O fim do Estado Nação. Editora Campus. Rio de Janeiro, 1996.,p.173-176.

34 Donald Kettl. Reforming Government Sector Management. Brasília, MARE, 1996, p.38.35 R.C. Mascarenhas. Building an enterprise culture in the Public Sector: Reforma of the

Public Sector in Austrália, Britain and New Zealand. Public Administration Review,v.53, n.1, jul./agos 1993, p.319-328.

36 Herman Schwartz, 1994. op.cit., p.56.37 Adam Przeworsky. On the Design of the State: A Principal-Agent Perspective. Brasília.

MARE, 1996. O modelo de Przeworsky, apesar de não ter tido impacto na reformaadministrativa da Nova Zelândia, pelo menos na sua fase mais recente, está sendocitado com o objetivo de contribuir para um maior entendimento da questão teórica.

38 Presidente Václav Havel, da República Tcheca. Apud Relatório Anual do desenvolvi-mento Mundial. 1996, p.9.

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RSP

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3

Set-Dez 1997

Mestrando emadministração

pública daEBAP/FGV/RJ,

analista doBanco Central

do Brasil

RICHARDSON, Ruth. ”The New Zealand Public Sector Reforms”. In: A Reforma do Estadona América Latina e no Caribe: rumo a uma administração pública gerencial. Semi-nário Internacional - MARE/BID/ONU. Brasília, 16 e17/05/96, p.99-120.

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RSPResumoResumenAbstract

A reforma administrativa da Nova Zelândia nos anos 80-90: Controle estraté-gico, eficiência gerencial e accountability

Wagner Carvalho

O artigo discute o processo de reforma administrativa implementada na NovaZelândia a partir de 1984, com a chegada do Partido Trabalhista ao poder, abordandoseus principais desdobramentos nos anos 90. Parte de uma apresentação do modeloadministrativo em vigor na Nova Zelândia antes das reformas empreendidas em 1984,delimitando dessa forma o quadro referencial para comparar a situação anterior com aatual, de maneira que proporcione uma avaliação sobre os impactos das medidas empre-endidas. Em seguida, apresenta uma descrição dos objetivos e princípios norteadoresda reforma tais como, separação das funções comerciais das não-comerciais; separaçãoentre as funções administrativas e de assessoria; princípio do “quem usa paga”, userpays; transparência na concessão de subsídios; neutralidade competitiva, descentra-lização e aumento do poder discricionário do administrador; melhoramento daaccountability, entre outros. A seguir, são apresentadas as principais medidas empreen-didas pelo governo trabalhista entre 1984 e 1990, dando ênfase à metodologia adotadapara a implementação e accountability dos contratos de gestão firmados entre os execu-tivos-chefe e os ministros. Posteriormente, o autor apresenta as modificaçõesintroduzidas nas regras de contratação de pessoal no serviço público neozelandês e, deum modo mais geral, na política de recursos humanos. Finalmente, é traçado um perfilda situação atual da Nova Zelândia, bem como é feita a apresentação sucinta daquelesque o autor considera como sendo os “suportes conceituais da reforma”: o movimentogerencialista, a teoria do Public Choice e a teoria Principal-Agente.

La reforma administrativa de Nueva Zelandia en los años 80-90: Control estra-tégico, eficiencia gerencial y accountability

Wagner Carvalho

El artículo discute el proceso de reforma administrativa que se está llevando a cabo enNueva Zelandia a partir de 1984, con la llegada del Partido Laborista al poder, enfocandosus principales despliegues en los años 90. Parte de una presentación del modelo adminis-trativo en vigor en Nueva Zelandia antes de las reformas emprendidas en 1984, delimitandode esa manera el cuadro de referencia para comparar la situación anterior con la actual, de talforma que proporcione una evaluación de los impactos de las medidas adoptadas. Enseguida presenta una descripción de los objetivos y principios que nortearon la reforma,tales como separación de las funciones comerciales de las no comerciales; separación entrelas funciones administrativas y de asesoramiento; principio de “quien usa paga”, user pays;transparencia en la concesión de subsidios; neutralidad competitiva, descentralización yaumento del poder discrecional del administrador; y mejoramiento de la accountability,entre otros. A continuación se presentan las principales medidas adoptadas por el gobiernolaborista entre 1984 y 1990, dando énfasis a la metodología seguida para la puesta enmarcha y la accountability de los contratos de gestión firmados entre los ejecutivos-jefes ylos ministros. Posteriormente, el autor presenta las modificaciones introducidas en lasreglas de contratación de personal en el servicio público neozelandés y, de manera másgeneral, en la política de recursos humanos. Finalmente, se traza un perfil de la situaciónactual de Nueva Zeladia, haciendo, además, la presentación sucinta de los que el autorconsidera como siendo los “soportes conceptuales de la reforma”: el movimiento gerencial,la teoría de la Public Choice y la teoría del Principal-Agente.

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RSPAdministrative reform in New Zealand in the 80s and 90s: strategic control,managerial efficiency and accountability

Wagner Carvalho

This article discusses the administrative reform process implemented in New Zealandas of 1984, when the Labor Party came to power, and addresses its major developmentsin the 90s. It starts with an explanation of the administrative model in effect in NewZealand prior to the reforms undertaken in 1984, thus establishing the reference frameworkin which to compare the previous state of affairs vis-à-vis the current one in such a wayas to provide an assessment of the impact of the measures introduced. The article thengoes into a description of the major reform objectives and principles, such as separationof commercial and non-commercial functions; separation of administrative and advisoryfunctions; the user pays principle; transparency in the granting of subsidies; competitiveneutrality; decentralization and increase in administrators’ discretionary power;improvement in accountability, among others. The main measures carried out by theLabor government between 1984 and 1990 are then highlighted, with special emphasis onthe methods used to ensure implementation and accountability of management contractsentered into by top executives and ministers. The article further addresses the changesintroduced in the rules governing personnel contracting in New Zealand’s civil serviceand, in a more general sense, in the human resources policy. Finally, an outline of thecurrent situation in New Zealand is drawn, followed by a brief discussion of the“conceptual underpinnings of the reform”, namely the managerialist movement, thePublic Choice theory and the Principal Agent theory.

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RSPFortalecer o serviço público evalorizar a cidadania:

a opção australiana1

Adriana de Sá MesquitaSilvia Pereira Ferreira

1. Década de 80: o mundo em mudança

A década de 80 caracterizou-se por um movimento crescente dereforma de Estado, onde se insere a questão da modernização ou reformaadministrativa. O movimento de reforma do Estado vem se estabelecendode forma crescente adquirindo um status global. Governos de todos ospaíses, independente de seu tamanho e de seu nível de desenvolvimentopolítico, econômico e social, procuram através de variadas maneiras adap-tarem-se a uma nova realidade que parece exigir Estados mais flexíveis,menos extravagantes em gastos, mais eficientes, menos interventores nosmecanismos de mercado, mais “enxutos” e responsáveis.

As causas para este movimento de caráter “universal” ainda nãoestão bem claras. Entretanto, em termos gerais, ele constitui também umaresposta às transformações nas relações entre Estado, sociedade civil emercado, iniciadas desde o final da Segunda Guerra Mundial. Esse proces-so de transformação, encoberto durante o período da Guerra Fria, tornou-se mais evidente a partir da queda do Muro de Berlim em 1989.2

Já sem preocupações de ordem ideológica para se contrapor, emconseqüência do fim da Guerra Fria e do desmoronamento do comunismo,juntamente com a escassez de recursos para manter grandes investimen-tos em questões antes básicas, os Estados expõem a necessidade de mu-danças em suas estratégias e nas formas de gestão dos recursos públicos.

O atual movimento reformista3 encerra dois dilemas centrais, oprimeiro consiste na construção de governos eficientes, ou seja, governosque “trabalhem melhor e também custem menos”; e o segundo que colocaa questão em torno do papel e função que o Estado deve desempenhar,ou seja, decidir “o que o Estado deve fazer”.

Adriana émestre emadministraçãopública EBAP/FGV/RJe especialistaem políticaspúblicas egestãogovernamentalno MARE eSilvia ésocióloga eprofessorada UnB.Ambas sãoassistentessociais epesquisadorasdaEBAP/FGV/RJ

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

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RSPEsses dois pontos indicam o sentido comum das diversas reformasadministrativas, e a forma como elas se inserem no contexto da reforma doEstado, onde visam priorizar a eficiência econômica, a redução de pessoal,as políticas de responsabilidade e informação, a maximização da relaçãocusto/serviço, a simplificação dos procedimentos e a adoção, no setor esta-tal, de procedimentos e modos de gerenciar típicos do setor privado.

Pelo menos duas vertentes bem específicas têm orientado as re-formas administrativas nas décadas de 80 e 90 deste século. Uma consi-dera que o Estado ainda possui uma função primordial no espaço globali-zado, e por isso deve sofrer uma reforma no sentido de fortalecê-lo; outra,vê o Estado como algo que vem comprometendo o desenvolvimento capita-lista, devido ao seu grau de intervencionismo, de ineficiência, de corrupção,de mal atendimento aos consumidores, ou seja, considera que se faz neces-sário reformar o Estado para enfraquecê-lo de forma a não permitir queinterfira nos mecanismos de mercado.4 Considerando-se essa classifica-ção, mas ressaltando que a realidade é sempre mais matizada e menosmaniqueísta, podemos afirmar que, em linhas gerais, a reforma australianaenquadra-se no primeiro modelo.

A reforma iniciada na década de 70 tinha por base a supressão daresistência burocrática. Constatou-se a necessidade de uma valoração ci-entífica das práticas diretivas com o objetivo de maximizar a administraçãopública. De acordo com Halligan5 , a reforma australiana caracterizou-se,na década de 80, por uma difusão do conceito de Função Executiva Supe-rior, pelo impulso a direção política dentro da gestão da administração públi-ca e pela utilização de métodos gerenciais do setor privado no setor público.

2. A reforma administrativa australiana: aspectos gerais

2.1. Antecedentes históricos

A Austrália, no início deste século, havia obtido êxito na organizaçãode uma burocracia estatal altamente qualificada para o exercício da funçãopública. Fez parte deste processo a construção da empresa estatal e umareforma dos serviços públicos, visando combater práticas patrimoniais eestabelecer regras de impessoalidade no acesso aos serviços públicos.

Segundo Caiden6 , a recente reforma australiana deve ser entendi-da a partir do êxito obtido pelos reformadores do século passado. Aolivrarem a administração pública dos abusos e das insuficiências herdadasdas burocracias coloniais britânicas do século XIX, conquistaram importantereconhecimento através de seus experimentos sociais e suas inovaçõesno espaço da democracia social. A reforma trouxe consigo condições detrabalho seguras e competitivas, estando o Estado australiano munido de

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RSPpessoas competentes atuando no setor público. A cristalização deste mo-delo constituiu um dos empecilhos à sua modernização, pois, como sabe-mos, uma das características do modelo burocrático-legal é, justamente,a falta de flexibilidade e opacidade às mudanças nas “regras do jogo”.

A reforma do século passado buscou introduzir um modelo burocrá-tico aos moldes do que seria chamado por Weber de modelo burocrático-legal, que primou pela impessoalidade dos procedimentos, a fim de com-bater a corrupção e garantir o acesso de todos os cidadãos aos serviços.Em contrapartida, ficaram relegados a segundo plano a competição e aprodutividade da administração pública.

O modelo, que parecia ter solucionado a questão da administraçãopública através de uma reforma radical, tornou-se conservador diantedos problemas administrativos que emergiam no interior de uma sociedadeem constante processo de transformação. Assim, os setores públicos tor-naram-se espaços da inércia e da falta de crítica, onde o trabalho concen-trava-se mais nos procedimentos burocráticos do que na realização dasatividades-fim.

As normas e regras tornaram-se obstáculos para as mudanças quese faziam necessárias, diante das rápidas transformações do mundo nopós-guerra.

A década de 70 marca um novo espaço de reflexão em torno dasquestões que emergiam no interior do processo de administração pública.Nesse momento, torna-se claro a falta de soluções inéditas de cunhoaudacioso e inovador, evidenciando a falência e inadaptabilidade do mo-delo vigente até aquele momento. Diante deste quadro, tornou-se claro anecessidade de um novo processo de reforma que possibilitasse o surgi-mento de uma nova cultura administrativa.

Segundo Halligan7 , nesta década, iniciou-se um redirecionamentoda relação entre a burocracia e os políticos, onde a primeira foiconsiderada como elitista, independente e não representativa. Questio-nou-se, então, o monopólio dos funcionários públicos no assessoramentoaos ministros e a sua indispensável participação nos processos gerenciais.A partir desse diagnóstico, pretendeu-se democratizar a burocracia, au-mentando a influência dos ministros na execução e controle das políti-cas públicas.

2.2. Organização político-governamental

Uma das especificidades do processo de reforma australiana re-fere-se às diferentes velocidades e ênfases das reformas, que irão va-riar segundo o nível de poder no qual são empreendidas. Esta caracte-rística só é possível em função da grande autonomia detida pelos esta-dos da federação.

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RSPPerante a especificidade acima referida, torna-se relevante apresen-tar o sistema político australiano. Tal sistema, segundo Domberger8, divi-de-se em três níveis:

1) União (Commonwealth): Na Constituição, lhe é garantido pode-res específicos de abrangência nacional. Dentre as suas responsabilidadesestão as relações internacionais, defesa, correio, telecomunicações, legisla-ção comercial e industrial, arrecadação de imposto de renda e pagamentoda seguridade social.

2) Estados: Têm poder legislativo sobre todas as funções não espe-cificamente assinaladas na Constituição para o poder central. Políticas deserviços, leis de propriedade e criminais, saúde e educação.

3) Governo local: Opera sob controle legislativo dos governos esta-duais. Através do Local Governments Acts lhes foram garantidos poderpara prover ou regular serviços como estradas locais, uso da terra, coletade lixo, bibliotecas, etc.

Em 1992, a Austrália possuía nada menos que 846 conselhos locaisem todo o território, cifra considerada excessiva, o que tem motivado ogoverno da União a incentivar processos de racionalização e fusão. Oestado de Victoria, um dos maiores da Austrália, possuía 210 governoslocais, sendo que atualmente este número foi reduzido para 78.

De uma forma geral, a participação dos governos locais na geraçãode receitas ou despesas é relativamente pequeno se comparado com osEUA e a Inglaterra. As localidades, entre 1989-1990, contribuíram comapenas 3,5% da receita australiana e representaram 5,7% das despesas.9

2.3. O processo: desenvolvimento,princípios, objetivos e estratégias

O processo de reforma pelo qual passou a Austrália, a partir dadécada de 70, teve como metas prioritárias o aumento da eficiência, adiminuição de custos dos bens e serviços providos pelo Estado, a eqüidadede acesso dos australianos aos serviços públicos e uma administraçãobaseada no modelo de efetividade e igualdade na gestão de pessoal.

Dentre os princípios da reforma administrativa, em particular daadministração de recursos humanos, pode-se destacar a busca por umamaior responsabilidade dos ministros e do Parlamento (accountability),mais eficiência, efetividade e igualdade com meios mais racionais para adistribuição dos recursos em atividades prioritárias, dando aos administra-dores grande flexibilidade na gerência destes recursos, proporcionandomaior mobilidade e flexibilidade às políticas, auxiliando-os na tarefa derecrutar melhor o pessoal e alcançar qualidade e resultados.

Podemos apontar ainda, os seguintes itens, como princípios10básicosque nortearam todo o processo de reforma:

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RSPa) Aperfeiçoamento das organizações: fusão e consolidação deagências e órgãos administrativos; racionalização de estruturas e melhordefinição das funções de cada agência.

b) Direção executiva ou gerencial: os ministros passaram a partici-par da direção das agências, conduzindo políticas, influindo nas atitudes,implantando uma cultura empresarial e melhorando a comunicação e otrabalho em equipe.

c) Sistemas diretivos de pessoal e finanças: as agências de controlecentral foram reduzidas ou suprimidas, substituindo-as por agências desupervisão e assessoramento em matéria de políticas públicas, permitindoàs agências executivas uma maior autonomia, desde que observadas asorientações e procedimentos universais.

d) Elitismo diretivo: através da criação do Serviço Executivo Supe-rior (SES) que se orienta por resultados e possui um sistema de compen-sações com base em avaliações de rendimentos.

e) Desburocratização: descentralização, nivelamento e aperfeiçoa-mento das hierarquias, eliminação das sobre-regulações, redução de formu-lários, controles de eficiência, simplificação de procedimentos e integraçãode serviços.

f) Nova cultura diretiva: o servidor passa a ser avaliado por suacapacidade de demonstrar eficiência, maior responsabilidade e liberda-de pessoal de ação. Criou-se incentivos e prêmios por produtividade einovação.

Podemos observar duas fases na efetivação destes. A primeira, noinício da década de 80, quando observa-se a ascensão de jovenstecnocratas que operaram como agentes aceleradores das reformas.11

Este movimento coincide com o governo trabalhista de Hawke, que em-preende um processo reformista amplo, mas bastante moderado, quasenão havendo menção às práticas gerencialistas. Como objetivos destaprimeira fase, podemos apontar a busca de uma administração mais sensí-vel e responsável diante dos políticos eleitos; o aumento da eficiência eeficácia dos serviços; a garantia de eqüidade no acesso ao emprego pú-blico; e a criação de um sistema de proteção dos direitos funcionais maisindependente e aperfeiçoado.

Para atingir os objetivos da primeira fase, foram traçados uma sé-rie de estratégias, dentre elas a criação de um novo SES; a implantaçãodo programa de controle dos recursos orçamentários da União — PPMGF— programas e planos de melhoria de gestão financeira; a implementaçãode um sistema de controle orçamentário para as agências; e a criação deuma nova política de pessoal abrindo as carreiras no setor público.

A segunda fase da reforma é marcada pelo acirramento da crisefiscal e pelo aprofundamento do processo de globalização da econo-mia. Diante destes movimentos sentiu-se a necessidade de aprofundar

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RSPa reforma, em especial no que diz respeito aos métodos de aquisição debens e serviços por parte do Estado. Numa clara ruptura com sua tradiçãopolítica, o partido trabalhista “roubou” da oposição liberal a bandeira deintrodução de práticas do gerenciamento privado na administraçãopública. Isto pode ser evidenciado no lema da campanha eleitoral destepartido em 1982: “dirigir o Estado como uma empresa”.

Podemos destacar da segunda fase os seguintes objetivos: reco-nhecer a rentabilidade do dinheiro como objetivo principal das aquisições;reorientar a formação profissional buscando a melhoria das práticas ecapacitação do pessoal, visando a uma maior eficiência no processo aqui-sitivo; a adoção do princípio de competição aberta e eficaz como guia dasaquisições, evitando a normatização desnecessária; o desenho de um mar-co central de políticas públicas e diretrizes ministeriais nos quais possamoperar os departamentos; e a concessão aos departamentos do controledetalhado de aquisições.12

Na direção destes objetivos, foram traçadas as seguintesestratégias: utilização de consultores empresariais e expert demultinacionais, emprego de métodos empresariais e de contabilidadepara investigar as organizações públicas, traçando estratégias e planosdiretivos; o emprego, pelos diretores públicos, de métodos para reduçãode custo e aumento do rendimento; a gestão por objetivos; e a informa-tização dos serviços.

A nova política radicalizou o processo de importação de práticasempresariais, procurando tirar lições do estudo das relações entre com-prador e vendedor, cliente e prestadores de serviço.

As estratégias utilizadas na reforma administrativa da Austráliaapontam três aspectos que denotam sua essência: a valorização da cida-dania, do pessoal (funcionários públicos) e a relação com o setor privado.Passaremos agora a analisar, mais detalhadamente, o desenvolvimentode cada um destes três aspectos.

3. Valorização da cidadania

Na busca da melhora da qualidade dos serviços públicos, a admi-nistração australiana criou uma estratégia de controle dos serviços pelapopulação, baseada na atuação dos ombudsmen. Para Lee, o trabalhotípico dos ombudsmen é o de realizar pesquisas, esforçar-se por resol-ver conflitos, e caso não se resolva, de fazer recomendações com obje-tivo de modificar os procedimentos das agências governamentais emdecorrência das queixas.13 O ombudsman foi introduzido na Austráliana década de 70, exatamente na tentativa de inovar a administraçãopública.14

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RSPPara a correta compreensão dos êxitos e limites da experiênciaaustraliana com as Agências de Ombudsmen (AO), a análise do sistemapolítico vigente, sistema de Westminster, é uma variável fundamental.

As características do sistema de Westminster que influenciamno processo de queixas e no recurso as AO podem ser resumidas nosseguintes itens:

a) fusão dos poderes Executivo e Legislativo. A emergência deum Executivo forte enfraquece a possibilidade do Parlamento controlaras ações dos agentes da administração, em particular dos ombudsmen.

b) os tribunais são fracos neste tipo de sistema e não julgam asdecisões administrativas a fundo, consideram-se que esta responsabili-dade é dever do Parlamento.

c) o partido político em um sistema Westminster pode exercer suadisciplina sobre o primeiro ministro e sobre outros ministros assim comosobre o Parlamento. Isto pode servir aos interesses do cidadão no sentidode fazer pesar as pressões do partido sobre os agentes da administração.

d) individualmente, os membros do Parlamento, mais particular-mente os não ligados a uma Pasta, jogam sempre um papel corretor deinjustiças em favor dos cidadãos lesados pelos órgãos governamentais.

e) as comissões parlamentares não têm muito poder na Austrália,mas elas podem transformar-se atualmente em órgãos fortes que pode-rão fiscalizar a administração do governo.

f) o pessoal legislativo, reduzido no sistema Westminster, limita apossibilidade do Parlamento fiscalizar as medidas administrativas.

g) as agências dos Controladores Gerais de Contas (Auditor Ge-ral) começam a aparecer e passam a assumir um papel similar aos doGeneral Accouting Office dos Estados Unidos, que praticam, em largaescala, avaliações de programas governamentais.

h) A “tradição do segredo administrativo” na Austrália limita a capaci-dade do Parlamento ou dos cidadãos de conhecer os processos de decisãoadministrativa e de exigir dos administradores responsabilidade por seus atos.

Segundo Lee, considerando os prós e contras, é visível que o con-trole da administração governamental é mais fácil em um sistema presi-dencial como o dos EUA do que num sistema Westminster.15

As agências de Ombudsmen devem ser compreendidas dentro deum conjunto de medidas empreendidas com o intuito de aumentar o contro-le político dos cidadãos sobre as medidas administrativas e a burocracia.

Desde a década de 70, foi promulgado um conjunto de leis impon-do aos órgãos administrativos normas processuais autônomas. AsSunshine Laws obrigam os organismos públicos como os conselhos mu-nicipais, as comissões dos estados e da União a tornarem suas assembléiasabertas e públicas.

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RSPCriaram-se, igualmente, leis sobre liberdade de informação (FOI)que garantem ao cidadão livre acesso a suas informações pessoais armaze-nadas em bancos de dados governamentais. Tanto a União quanto o estadode Victoria dispõem deste tipo de legislação. A legislação também res-tringe o poder do Estado de criar bancos de dados com informações pes-soais, e nos casos existentes, à inviolabilidade da informação.

Existem ainda legislações cruzadas, que obrigam as agências gover-namentais a avaliarem os efeitos de suas políticas sobre o meio ambientee a economia, além de obrigar as agências a limitarem a quantidade deformulários impostos sobre os cidadãos no requerimento dos serviços.

A singularidade das AO sobre as iniciativas acima citadas é queestas agências tratam especificamente de problemas individuais, que fre-qüentemente não estão previstos na legislação mais genérica.

As legislações regulamentadoras dos procedimentos administrativosconstituem a pedra angular na construção de uma gestão voltada para ocidadão. Elas prescrevem as normas que os agentes devem respeitarpara emitir regulamentações e para se pronunciarem sobre questões deviolações presumidas na regulamentação.

O Administrative Procedure Act de 1946, promulgado nos EUA,representa um marco neste tipo de legislação. Entretanto, a Austrália nãopossui uma lei deste tipo e sua ausência constrange os cidadãos que bus-cam reparação e reduz a eficácia dos Ombudsmen sobre as queixas emi-tidas pelos cidadãos.

Os processos ligados à gestão orçamentária permitem igualmenteum maior controle das agências burocráticas, tornando-as mais responsá-veis. Na década de 80, o governo da União e o estado de Victoria criaramsistemas orçamentais para programas com o objetivo de tornar os órgãosgovernamentais responsáveis pela qualidade, eficiência e efetividade dosserviços prestados.16

Foram criadas, pelo Executivo, agências independentes ou semi-independentes com o objetivo de vigiar as operações administrativas.Nomearam-se Comissários de Contas que foram paulatinamente ampliandosuas atribuições da verificação financeira para o exame das conseqüên-cias programáticas das despesas governamentais.

No decorrer da década de 80, foram sendo criados diversos procedi-mentos administrativos que permitem ao cidadão apelar de medidas toma-das por agências governamentais, reforçando a responsabilidade dos agen-tes sobre tais medidas. Em caso de reparações, o cidadão pode enca-minhar suas queixas aos tribunais constituídos no interior da própria agência,questionando-a, ou a um tribunal geral com ampla competência judiciária.Um antigo combatente que deseje, por exemplo, apelar de uma decisãorelativa a sua pensão, pode se endereçar a uma comissão que trata

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RSPespecificamente desta questão, ou apelar de uma decisão frente a umtribunal de competências mais amplas como o Administrative AppealsTribunal (AAT) da Austrália ou o AAT do Estado de Victoria.

Se por um lado os tribunais internos das agências podem desenvol-ver um nível específico de competência sobre as questões pertinentes, aagência a qual pertence, por outro, os tribunais gerais, embora com menorcompetência específica, possuem uma maior autonomia de juízo.

Os funcionários, por sua vez, possuem um tribunal próprio parareceber suas apelações, que trata-se do Mérit Protection and ReviewAgency.

As comissões especiais têm sido um recurso freqüentemente utili-zado pelos governos australianos como forma de limitar os poderes daburocracia. A Austrália conheceu numerosas comissões ad hoc depoisde 1970. Estas comissões têm como principal objetivo passar em revistaos procedimentos jurídicos de suas respectivas administrações e recomen-dar modificações. (vide anexo)

As agências de Ombudsmen devem ser compreendidas nesteconjunto de medidas visando maximizar os mecanismos de controle sobrea burocracia. Podemos identificar nos governos australianos algumasAO de caráter geral, que tratam de problemas relativos ao conjunto daadministração — é o caso da AO do estado de Victoria que se ocupa dequestões muito amplas. As AO podem igualmente tratar de questõesmuito específicas.

Lee (1991) expõe em seu artigo uma grande variedade de defini-ções dos objetivos das AO. Abraham (1960), um dos primeiros adeptosdas AO nos EUA, as compreende como “um cão de guarda vigiando aadministração”, enquanto que Gellhorn (1966 e 1967) as define como umserviço à disposição dos cidadãos que se julgam lesados pela administra-ção para ouvir as suas queixas.

Hill (1976) descreve as AO como sendo “um engenho cibernéticoexercendo uma mediação no nível das relações entre governantes e gover-nados”. Esta definição vai além do simples tratamento das reclamações.Considera-se que as AO humanizam a democracia, protegendo os direi-tos humanos, assegurando um controle democrático e proteção contra ocomportamento patológico das burocracias. Os ombudsman trabalhamnão somente para retificar as distorções que vitimam os cidadãos, mastambém para defender os funcionários injustamente acusados. Gormley(1989) deixa entender que os ombudsman podem servir de controle cata-lítico, permitindo aumentar a consciência da burocracia para as questõesde interesse particular dos cidadãos/beneficiários dos serviços.17

Assim como as definições, as práticas também irão variar sensi-velmente segundo as administrações, particularmente no que se refereaos deveres e às atribuições.

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RSPAs AO apareceram na Austrália no início dos anos 70, na seqüênciado que se chamou “Nova legislação administrativa”, que tratou da criação detribunais administrativos de apelação, da promulgação de leis sobre liberdadede informação e da votação de uma legislação permitindo o exame judiciáriode medidas administrativas. Estas reformas visavam responder ao que seconsiderou ser um “novo despotismo” dos chefes das burocracias.18

Os seis estados da Austrália criaram AO por volta dos anos 70:Austrália Ocidental em 1971, seguida pela Austrália Meridional em 1972e Victoria em 1973. O governo nacional criou uma AO independente noTerritório do Norte, uma região do país pouco habitada. A AO da Uniãofoi criada em 1976 e conta com um numeroso efetivo, sem símile emqualquer outra parte do mundo, algo em torno de 70 empregados. As AOgeralmente se esforçam por cooperar umas com as outras e, no caso daTasmânia, o ombudsman do estado federado joga igualmente o papel deagência regional do ombudsman da União.

Para efeito comparativo, transcrevemos do artigo de Lee (1991)uma tabela que estabelece uma comparação entre as AO do estado deVictoria e da União.

O estado de Victoria é um dos estados mais importantes da Austrá-lia, ele abriga a cidade de Melbourne, a segunda cidade mais importantedo país. As AO da União e de Victoria possuem competências seme-lhantes. A agência de Victoria se ocupa de questões ligadas a administra-ção do estado e das administrações locais, já a AO da União trata dequestões relativas a federação e ao território da capital federal onde estásituado o governo nacional de Canberra.

As AO possuem competência sobre as questões administrativas,mas não sobre as políticas. Não são suas atribuições, igualmente, os atosdos ministros, do Parlamento e dos tribunais.

A função principal dos ombudsman da União e de Victoria é realizarpesquisas (inquéritos) sobre as queixas. A AO de Victoria somente aceitaqueixas por escrito, o que tem a vantagem de fornecer um documentoformal relativo a identidade do queixoso, a data da queixa e sua natureza.O pessoal da AO fornece assistência às pessoas incapazes de prepararsozinhas as queixas escritas.19No que se refere ao Ombudsman da União,somente 30% das queixas recebidas são escritas, a maioria, 70% sãofeitas oralmente.

As AO de Victoria e da União obrigam o cidadão a notificar suasqueixas às agências apropriadas antes de recorrer aos Ombudsmen. OOmbudsman da União não se limita a exigir que a agência apropriadaseja notificada, mas insiste igualmente que a agência tome uma decisãona questão. Desta maneira, o ombudsman da União assegura-se de queexaminará as medidas administrativas bem diferentes dos procedimentosou das medidas já examinadas.

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RSPQuadro: Comparação entre os Ombudsmen do estado de Victoriae da Commonwealth da Austrália.

Victoria

Criado pelo Ombudsmen Act de 1973.

Atribuições:

Administração do Estado e Administraçãolocal.

Decisões administrativas, mas não questõespolíticas.

Limitações:

Atos dos ministros, do Parlamento e das Cortes.

Competência limitada quanto aos emprega-dos do setor público.

Funções principais:

Inquérito sobre as reclamações.

As reclamações devem ser formuladas porescrito.

O Ombudsman não deve aguardar uma medidaadministrativa definitiva para intervir.

O agente não é um advogado.

Quase não dispõe de poderes de antecipação.

Há um acesso quase ilimitado a informaçãonecessária ao inquérito sobre uma reclamação.

Atividades concentradas sobre a administra-ção geral, questões correcionais, administra-ção local.

Inquéritos realizados compulsando os arquivos,por telefone e por meio de contatos pessoais.

Ocupa-se de questões ligadas à liberdade deinformação.

Poder de recomendação. Não pode se opor àuma decisão administrativa.

Caso particular: a polícia.

Ligações com o Tribunal Administrativo deApelação (AAT), outros tribunais e cortes.

Problemas com instâncias concorrentes.

Independência limitada, Governos e Parla-mento, limitações orçamentárias.

Commonwealth da Austrália

Criado pelo Ombudsmen Act de 1976.

Atribuições:

Administração da Commonwealth e Territórioda capital australiana.

Decisões administrativas, mas não questõespolíticas.

Limitações:

Atos dos ministros, do Parlamento e das Cortes.

Competência limitada quanto aos empregados dosetor público com exceção do pessoal da Defesa.

Funções principais:

Inquérito sobre as reclamações.

As reclamações podem ser formuladas por es-crito ou oralmente.

O Ombudsman deve aguardar medidas adminis-trativas definitivas antes de intervir.

O agente não é um advogado.

Dispõe de poderes de antecipação.

Há um acesso quase ilimitado a informação ne-cessária ao inquérito sobre uma reclamação.

Atividades concentradas sobre a seguridade so-cial, rede telefônica, a fiscalização, a defesa.

Inquéritos realizados compulsando os arquivosou por telefone.

Implicado nas questões ligadas à liberdade deinformação.

Poder de recomendação. Não pode se opor àuma decisão administrativa.

Caso particular: a defesa.

Ligações com o Tribunal Administrativo deApelação (AAT), outros tribunais e cortes.

O Ombudsman é uma “loja de uma única seção”

Independência limitada, Primeiro Ministro eParlamento, limitações orçamentárias.

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RSPO ombudsman da União ou do estado federado jamais age comose fosse um porta-voz ou advogado do indivíduo lesado. O Ombudsman éuma parte neutra que tenta estabelecer os fatos de uma situação e reco-mendar uma solução que alie as normas da lei e da eqüidade. Em 50%das questões estudadas, o Ombudsman de Victoria informa aos queixososque a agência acusada agiu de maneira apropriada. Este procedimento éinteressante, pois permite fornecer aos cidadãos explicações quanto àsmedidas tomadas pelas agências governamentais.

A AO de Victoria trata apenas das queixas e espera que os proble-mas sejam levados a sua atenção. Em contrapartida, a AO da Uniãopode antecipar as queixas, tomando a iniciativa das medidas.

Os Ombudsmen de Victoria e da União podem realizar pesquisa(inquéritos) sob uma base informal, podendo caminhar a etapas mais for-mais. Estas pesquisas informais permitem tirar as queixas não fundadascontra os funcionários, embora um procedimento mais formal, como aredação de uma carta endereçada à agência denunciando a queixa, poderápôr em perigo a boa reputação de um funcionário, sobretudo se a cartaobtiver a atenção da mídia. De outro lado, quando uma pesquisa formal éaberta, o Ombudsman deve informar ao ministro responsável por escrito.

As agências de Ombudsmen da União estão divididas e especia-lizadas em agências centrais e regionais. As questões de seguridade socialde rotina são tratadas pela AO da União na região onde elas aparecem,mas os dossiês mais complicados são transmitidos à AO de Canberra. AAO de Sydney é especializada em questões fiscais, enquanto que a AOde Melbourne em questões telefônicas.

Há uma diferença entre os Ombudsmen de Victoria e os da União:os primeiros enviam seu pessoal sobre o terreno para encontrar as pes-soas implicadas na questão, enquanto que a AO da União trabalha portelefone e sobre a base de arquivos e dossiês.

Os Ombudsmen de Victoria e da União se ocupam das leis sobre aliberdade de informação (FOI). Nos dois casos é possível que os particu-lares queixem-se que certos departamentos demoram a liberar informaçõesou mesmo recusam-se. A AO de Victoria pesquisa sobre as situaçõesnas quais um departamento afirma que um documento não existe, quandona verdade deveria existir. O Ombudsman de Victoria joga, de certo modo,um papel de guardião que seleciona as questões antes que elas sejamsubmetidas ao AAT, que é responsável pela interpretação da lei (FOI)neste estado.

Um problema delicado, que se coloca para as AO dos estados e daUnião, é o da aplicação das leis sobre a liberdade de informação sobre osseus próprios arquivos. A AO da União já está conformada com numerosassolicitações de informação. A lei do estado foi emendada em 1987, a fimde excluir o ombudsman dos requerimentos de informação.

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RSP4. Valorização do servidor público

A partir de uma avaliação sobre a reforma gerencialista australia-na, realizada pelo Management Advisory Board (MAB), foi desenvolvidoum relatório intitulado Building a Better Public Service, o qual sugereuma estratégia futura para o serviço público, identificando três elementos-chave para o processo de continuidade das mudanças em direção à melho-ria de performance e de uma maior integração da natureza das reformascom a cultura do serviço público. São elas:

— avaliação objetiva de performance;— melhoria da liderança; e— melhoramento contínuo através de uma intervenção no nível da

cultura organizacional.De acordo com o relatório do MAB,“Since the Public Service is a service industry its greatest assets

will always be the knowledge, skills and capabilities of its people. Thisespecially is an area where change cannot be simply mandated andwhere the attitudes and behaviour of staff and the culture oforganizations may have powerful effects.”20

No âmbito das estratégias de política de recursos humanos, a agênciaresponsável pela política de administração de recursos humanos é a PublicService Comission (PSC). Ela procurou, dentro da agenda da reforma,articular valores e princípios de um moderno e profissional serviço público,através do desenvolvimento de políticas que visam práticas honestas eequitativas, para proporcionar às agências melhores práticas na administra-ção de RH. Neste contexto, foram estabelecidas regras para o aprimora-mento do servidor público, com vistas à:

— projeção de uma estrutura adequada, em termos de políticaspúblicas e linhas de ação na área de desenvolvimento de pessoal;

— comunicação e promoção da estruturação do item acima;— monitoramento e obtenção de feedback relativo à implementação;— identificação e comunicação das melhores práticas;— promoção de uma metodologia de avaliação;— revisão da política quando necessário, e reinício do ciclo.Procurou, com isto, enfatizar os novos valores gerencialistas —

necessidade de maior responsabilidade por parte do governo, gerênciapara resultados e aumento da accountability — não descartando al-guns valores tradicionais considerados positivos, pois “... the new andthe old should reinforce each other”. Lança, então, o conceito de“New Profissionalism”, que procura integrar o que há de melhor nogerencialismo, com os melhores valores tradicionais (veja figura 1).

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RSPFigura 1: Novo profissionalismo

Working together for resultsFigura 1 - Conceito de “Novo Profissionalismo” para os servidores públicos, adaptado de

Denis Ives, p.324.

Nesta perpectiva, a comissão procurou unir o melhoramento deperformance a uma estratégia de gerência de pessoal, buscando ainda,integrar valores e práticas de recursos humanos com os objetivos dasorganizações.

Na tentativa de estabelecer uma moderna cultura e um ethos pró-prio do serviço público australiano, a comissão propôs, como valores, aresponsabilidade para com o governo, o foco na consecução dos resultados,o mérito como valor básico, os altos níveis de integridade, a probidade econduta, a maior confiança na accountability e o melhoramento contínuoatravés das equipes e dos indivíduos.21

A proposta trazida pela Comissão tem como direção a construçãode um novo profissionalismo, qualificado como um processo que englobaos elementos positivos das práticas de melhoramento administrativo comos “bons” valores tradicionais do serviço público australiano. Tal propostareconhece a centralidade da administração de pessoal e a importânciados valores das pessoas e do seu potencial, criando um ambiente no qualesse potencial possa ser realizado.

Este modelo, segundo seus formuladores, proporciona uma necessá-ria transição entre os “velhos” conceitos do serviço público e os que oratornam-se necessários para a atual e futura ambiência. Este período detransição é justificado como forma de auxiliar os servidores públicos asuperarem esta etapa e a se sentirem mais confortáveis dentro do processode mudança.

Tanto o Building a Better Public Service quanto o NewProfissionalism proporcionam um arcabouço conceitual e uma direção

Os melhores valorestradicionais

• Mérito• Eqüidade• Probidade• Integridade• Conduta ética• Independência

política

• Cultura gerencialista

• Liderança

• Conhecimento organizacional

• Accountability

• Recursos gerenciais

• Foco nos resultados

• Valorizar o dinheiro

• Avaliação

As melhores práticas do“new management”

• Gerentes

• Estrutura de HRM

• Negociação

• Performance gerencial

Performance

responsável

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RSPestratégica consistente, para conduzir, com sucesso, a agenda de reformaadministrativa. O modelo reconhece o inter-relacionamento de três dimen-sões: a performance das organizações, os indivíduos e as equipes. Aomesmo tempo, reconhece que o melhoramento da performance e o alcancedos objetivos organizacionais dependem basicamente das pessoas — poristo a ênfase no desenvolvimento de pessoal e da gerência.

Com o objetivo de auxiliar os gerentes a enfrentarem os desafios ea tirarem as melhores vantagens das oportunidades através de um geren-ciamento de pessoal de boa qualidade, a Public Service Commissionadotou uma série de estratégias para integrar os novos valores no dia-a-dia de serviço. Desenvolveu-se um plano orientador para a gerência —Human Resource Management (HRM). O objetivo do HRM é promoverum melhor gerenciamento de pessoal no serviço público, e foi especialmen-te projetado para auxiliar o gerente a melhor compreender as novas regrase as suas responsabilidades. Essa estratégia identifica seis áreas-chavepara a administração e gerência de pessoal, conforme esquematizado noquadro abaixo:

Desta forma, outras práticas e políticas foram implementadas pelareforma administrativa australiana, tais como a negociação no local detrabalho, prática da mobilidade, o plano de oportunidades igualitáriasde emprego, o plano de treinamento e especialização.

A prática de negociação caracteriza-se por ser um instrumentode gerenciamento utilizado nos locais de trabalho, sendo parte de umaestratégia para desenvolver a cultura de resultados e de melhoria

1) Human Resouce Planning

2) Staffing Practices

3) Working Conditions

4) Performance management

5) Human Resouce Development

6) Staff Relations

assegurar um apropriado relacionamento entre o HRM e aestrutura organizacional para a consecução dos objetivosorganizacionais e o aproveitamento correto da especializaçãoe das habilidades das pessoas.

garantir processos corretos e efetivos tanto no que se refere àseleção quanto à demissão do staff, visando às necessidadesorganizacionais.

garantir formas atrativas para manter o staff, assegurando amelhoria da performance, através de condições apropriadas,inclusive no que se refere à remuneração.

facilitar a melhoria da produtividade e efetividade, viamaximização da performance individual.

objetiva a melhoria da efetividade organizacional e daperformance individual.

fomentar e manter um bom nível de relacionamento entre aspessoas e a organização, já que, segundo reconhece, existeuma dependência mútua entre esses dois níveis.

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RSPcontínua. Tem como finalidade a negociação e a implementação indivi-dualizada, por agência e departamento, permitindo aos administradoresde departamentos negociarem variações da remuneração e das condi-ções de trabalho, sempre tendo em vista o interesse da produtividade,eficiência da organização.

O processo de negociação contempla uma contratualização for-mal por tempo definido, ou seja, dois anos. Em termos de remuneração,o contrato prevê um incremento remuneratório de 4,9% durante a vidado contrato. Uma parte deste reajuste destina-se ao pagamento pelaprodutividade e eficiência alcançadas, e outra pela recuperação do po-der aquisitivo do salário, em decorrência de perdas causadas pela infla-ção. Outro objetivo é manter um nível remuneratório compatível com orealizado pelo setor privado. Basicamente, o contrato pode prever asseguintes práticas:

— incremento de pagamentos, como vista anteriormente;— recompensa pelo esforço de produtividade da equipe de trabalho;— jornada de trabalho em meio-expediente (part-time work);— procedimentos em caso de ineficiência;— práticas de combate ao absenteísmo;— melhoria da competência baseada no treinamento e especialização.Já a mobilidade permite e estimula os funcionários a transitarem

entre os diversos departamentos através de critérios de promoção outransferência. Assim, a carreira de serviços é larga e não se limita aodepartamento em que o funcionário está lotado.

Ives22 expõe que os secretários de departamento têm, usualmente,trabalhado em dois ou mais departamentos ao longo de suas carreiras. OsSeniors Executive Service, representando a administração executiva doserviço público, são geralmente nomeados com base na sua práticaconseguida através de transferências entre serviços. Esta prática da mobi-lidade é difundida também para as médias e baixas gerências, o que resultaem um ganho em termos de versatilidade, possibilidade de carreira,profissionalismo e planejamento de sucessão.

Foi desenvolvido também o Equal Employment OpportunityStrategic Plan (EEO), um plano estratégico para os anos 90, editado em1993, o qual fornece os meios para o desenvolvimento da administraçãode recursos humanos através da promoção da eqüidade e do mérito noserviço público.

Basicamente, o plano introduz medidas para promover oportunida-des iguais de emprego no serviço público e combater a discriminaçãoinjustificada contra os membros de grupos normalmente discriminados(grupos EEO): mulheres, deficientes, aborígenes e pessoas que desconhe-cem a língua inglesa.

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RSPTrês princípios básicos nortearam o plano:a) igualdade de acesso ao processo de seleção, à promoção e trans-

ferência, ao treinamento e desenvolvimento de pessoal, e também emrelação aos termos e condições de serviço;

b) capacitar os membros de grupos EEO a competirem por promo-ção e transferência, seguindo carreira em condições igualitárias;

c) incrementar ou manter a representação dos grupos EEO nosdiversos níveis e estruturas do serviço publico, tendo como base a compe-tição validade pelo mérito.

Visando ao treinamento e ao desenvolvimento do serviço público,foi criado o Competency Based Training (CBT). Esta política justifi-ca-se pela demanda crescente em propiciar altos níveis de especializaçãoe desenvolvimento visando à consecução dos objetivos organizacionais.Essa abordagem de treinamento tem seu foco na especialização e noconhecimento requerido pelos locais de trabalho, ou seja, busca-se umaforma de direcionar e focalizar o treinamento de acordo com os objeti-vos organizacionais. Além disto, este processo procura incorporar nofuncionalismo público os aspectos necessários para dar continuidade àagenda de reforma governamental e, ao mesmo tempo, reforçar as polí-ticas e valores promovidos pelo Building a Better Public Service.

Em futuro próximo, todos os novos gerentes juniores serão subme-tidos a um programa de treinamento, o qual fará parte do processo deseleção e admissão. Para o nível de média gerência, existe uma grandevariedade de opções de treinamento, incluindo o acesso ao Public SectorManagement Course, já tendo sido treinados mais de 1.200 gerentes.Por sua vez, os gerentes executivos da Public Service Commission tam-bém participam de cursos para alta gerência.

5. Política de contratualização de serviços públicos

A política de contratualização realizada na Austrália foi fortementeinfluenciada tanto pelos modelos de reforma administrativa do Reino Unidoquanto pelo da Nova Zelândia. A prática da contratualização surge numcontexto de questionamento da capacidade e eficiência do Estado para aprodução direta de bens e serviços.

Entrementes, as pressões orçamentárias, a diminuição dasbarreiras alfandegárias e o incremento da internacionalização da eco-nomia, que atinge rapidamente a Austrália, foram fatores decisivos naadoção de políticas para redução do custo efetivo de cada bem ou ser-viço prestado pelo Estado. Notou-se rapidamente que o “Custo Estado”era a variável fundamental para o incremento da competitividade geralda economia.

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RSPSegundo Domberger & Hall23, a implementação dos CTC(Competitive Tendering and Contracting) envolvem quatro momentosdistintos:

1) Especificação do serviço a ser oferecido;2) Solicitação para oferecimentos; (request for tenders);3) Avaliação e seleção do contratante;4) Gestão e controle após contratação.As bases teóricas para as contratualizações (CTC) foram dadas

por Coase (1937) e Willianson (1985), embora somente tenham penetra-do no campo administrativo a partir da década de 70. Autores como Kettl(1993) têm sublinhado os riscos que estes programas potencialmente po-dem oferecer às estruturas de governos democráticos à medida em quepulverizam a responsabilidade.

A contratualização está presente na Austrália, mesmo que de for-ma pouco sistemática e informal, desde a década de 70, mas nos anos 80,acompanhando o acirramento das reformas, ganha maior regularidade. Acontratualização é explicitamente recomendada na “Coombs RoyalCommission on Australian Government Administration”, onde inicia-se um processo de reavaliação das funções abertas ao setor privado.

Assim como na Nova Zelândia, também na Austrália tratou-se dedistinguir as funções do governo enquanto comprador de serviços emnome dos cidadãos e enquanto provedor direto dos mesmos. Da mesmaforma, reorientou-se as prioridades que deixaram de concentrar-se mera-mente sobre os inputs, e passaram a focalizar, prioritariamente, para ava-liação, os outputs e outcomes.

O princípio geral que rege estas iniciativas é a necessidade demaximizar os recursos públicos, melhorando a relação custo/serviço. Oincentivo à competição é tido como o caminho privilegiado para alcançarestes objetivos.

Os partidos liberais da Austrália foram os primeiros a adotarem abandeira do estilo gerencial de administração pública, embora a introduçãode políticas gerenciais tem tido um forte impacto, através da reforma dosetor público, sobre todo o espectro político, sejam trabalhistas ou liberais.

Um exemplo desta quase unanimidade partidária é o fato dos tra-balhistas, no poder desde 1983 no âmbito da União, terem adotado umapolítica marcada por um estilo econômico racionalista e uma atitude prag-mática, embora não formal ou doutrinária, em relação à questão dacontratualização.24

Sendo a Austrália um modelo federativo, observou-se que os esta-dos resistiram mais às demandas por reformas. O que se pode notaratualmente é uma grande variedade de reformas tanto no que se refereaos ritmos quanto à abrangência, incluindo, obviamente, as políticas de

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RSPcontratualização que variam de estado a estado. Estas variações podemser atribuídas a variáveis como fatores históricos, circunstâncias locais,ideologias políticas e situações econômicas.

A situação fiscal é uma variável de extrema importância na reali-zação de políticas reformistas. O estado de Queensland, o mais robustoem nível fiscal da federação, não empreendeu políticas de contratualização.Entretanto, a generalização das contratualizações entre os demais esta-dos demonstra que a saúde fiscal de Queensland era uma exceção dentrode um quadro geral deficitário.

O estado de New South Wales (NSW) foi o primeiro a adotar acontratualização a partir de 1988, através de uma política formal e umadireção centralizada. Outros importantes estados como Victoria eWesterns Austrália adotaram políticas semelhantes em 1992 e 1993,respectivamente.

Os principais critérios para contratação adotados por estes esta-dos são os que seguem:

1) Custo/efetividade.2) Acesso às novas tecnologias.3) Combate a desempenhos insuficientes ou culturas inapropriadas

da força de trabalho interna.4) Necessidade de contornar práticas trabalhistas restritivas.5) Dificuldade para pagar e manter um competente quadro técnico.Em 1994, o governo de Victoria tomou a vanguarda do processo,

introduzindo uma política de competitividade compulsória. Até então, ascontratualizações eram implementadas por meio de incentivos às agências.Victoria ofereceu aos governos locais um percentual progressivo dos gastosanuais para serem empregados na contratualização. Gradualmente os gastoslocais sujeitos à competição elevaram-se a 30, 40 até 50% dos gastos anuaisem 1996-1997. A iniciativa de Victoria abriu um intenso debate nos outrosestados que, entretanto, mantiveram a política de incentivos.25

Em um estado como Western Austrália, os CTC estão vetadospara atividades como provisão de equipamentos para o governo, certasfunções regulatórias e/ou emergenciais, serviços essenciais das ForçasArmadas, etc. Estas atividades estratégicas são consideradas incompatíveiscom a participação da iniciativa privada.

O governo da União tem encorajado os departamentos a utilizaremos CTC, à medida em que avaliam que sua utilização possa trazer umamelhoria dos serviços. A aplicação tem sido gradual. Através do “FinancialManagement Improvement Program” introduziu-se alterações no relatóriofinanceiro, a fim de se incentivar o princípio da “maximização dos recur-sos”. Em 1989, esta idéia foi novamente evocada, reconhecendo-se a impor-tância da competição como instrumento para sua realização.26

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RSPA política de competição entre agências tem sido um dos pontospolêmicos do processo de reforma, sua implementação varia de estado aestado. Agências como a Commonwealth Department of AdministrativesServices (DAS) e a NSW Comercial Services Group (CSG) realizamserviços para outras agências governamentais. Com o aumento do númerode agências provedoras, as pressões competitivas têm aumentado.

No nível da União, agências como a DAS prestam serviços dereparos, manutenção, avaliação, suprimento e distribuição. Entretanto, asagências governamentais não estão obrigadas a contratar a DAS, e nempodem utilizar seu status de agência estatal para competir deslealmentecom outras empresas do setor privado. As agências da União estão igual-mente autorizadas a competir com agência de outros níveis (estaduais oulocais) ou mesmo com o setor privado — a Australian Protection Serviceoferece seus trabalhos competindo com firmas de segurança privada,entretanto, esta não tem sido a regra entre os estados.

6. Considerações finais

A reforma australiana caracterizou-se por partir de um modeloanterior bem-sucedido, baseado na concepção weberiana, que conseguiutransformar no século passado uma administração tradicionalista num siste-ma centrado em regras impessoais, que conseguiu eliminar, quase comple-tamente, o problema da corrupção no serviço público.

A cristalização das práticas burocrático-weberiana trouxe, comoconseqüência, uma grande resistência tanto estrutural quanto cultural emtransformar tal modelo. Esta resistência foi um dos maiores entraves àsreformas recentes.

O motivo condutor da reforma australiana tem sido o rearranjamentodos papéis desempenhados pelos atores sociais (administração pública,sociedade civil, mercado) na gestão do bem comum. Procurou-se aumentara eficiência do setor público, buscando formas inovadoras de gerencia-mento, muitas das quais importadas do setor privado, orientadas em funçãode um melhor atendimento ao cidadão-usuário.

Embora tenha utilizado diversas práticas e conceitos típicos do setorprivado, ao fim e ao cabo, podemos afirmar que o Estado resultou forta-lecido, visto que maximizou as formas e mecanismos de intervenção nasociedade. Um Estado que melhor serve ao cidadão é, sem dúvida, umEstado mais forte.

O modelo federativo australiano marca algumas especificidadesdesta reforma. Diferente da Nova Zelândia, onde o modelo unitário ecentralizado permitiu uma evolução célebre e homogênea das reformas,na Austrália, a existência de sete níveis de poder “autônomos” (a União e

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RSPseis estados) determinou um processo mais heterogêneo, embora, comuma surpreendente comunhão de princípios.

Dentre os mecanismos utilizados, as agências de Ombudsmenmerecem ser destacadas como um dos símbolos desta reforma. Atra-vés destas agências ampliou-se o espaço do cidadão na gestão da respublica, assim como a responsabilidade dos funcionários diante de seusatos. Apesar das limitações que o sistema de Westminster impõe àspolíticas de accountability, os Ombudsmen têm obtido êxito na mediaçãodos conflitos entre usuários e provedores. No que se refere ao Brasil,que já possui uma legislação punitiva para o comportamento desleal dosservidores públicos, a lentidão da justiça e a falta de mecanismo, queauxiliam o cidadão lesado no seu direito, fazem perpetuar alguns víciosno serviço público que poderiam ser minimizados por mecanismos si-milares ao do ombudsman.

No que diz respeito à política de pessoal, a Austrália soube mantero equilíbrio entre os antigos valores de probidade e integridade do servidorpúblico com a nova demanda por qualidade, produtividade, autonomia eresponsabilidade. Ao contrário dos adeptos do desmonte rápido do modeloburocrático weberiano, os administradores australianos optaram por ajustá-lo a nova realidade, evitando assim, a crise deontológica que se instalouem outras reformas. As visões simplificadoras e maniqueístas, escondem,quase sempre, uma incapacidade teórica para pensar a complexidade doreal e propor soluções para além dos clichês.

Podemos concluir que se por um lado a existência de um modeloburocrático cristalizado dificultou ou mesmo retardou o processo de reformaadministrativa na Austrália, por outro, sua existência possibilitou uma passa-gem segura para formas mais flexíveis de gerenciamento do setor público.

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RSPAnexo

Comissões instaladas até 1985

Title Chairman Dates

Committee of Inquiry intothe Public Service of SouthAustralia

Board of Inquiry into theVictorian Public Service

Royal Commission onAustralian GovernmentAdministration

New South WallesMachinery ofGovernment Review

Review of New SouthWales GovernmentAdministration

Review of TasmanianGovernmentAdministration

Review of CommonwealthAdministration

Review of Public ServiceManagement (SouthAustralia)

Prof. D. C. Corbett

Sir Henry Bland

Dr H. C. Coombs

Hon T. J. Lewis to Jan 1975,Hon F. M. Hewitt from Jan1975

Prof. P. S. Wilenski

Phase 1: Task ForPhase 2: Sir GeorgeCartland

Mr J. B. Reid

Mr B. Guerin

May 1973-Apr 1975

Oct 1973-Oct 1975

Jun 1974 - Jul 1976

Jul 1974-Apr 1976

Feb 1977-Feb 1982

May 1978- Dec 1979

Mar 1979-Nov 1981

Sep 1982-Jan 1983

Jun 1983-Feb 1985

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RSPNotas

1 Este artigo foi realizado com recursos da ENAP Escola Nacional de AdministraçãoPública. Constitui um dos produtos da pesquisa sobre Burocracia Estatal, do Progra-ma de Pesquisas e Estudos sobre Reforma do Estado e Governança, mantido pelaFGV/EBAP, sob a coordenação da professora do curso de mestrado em administraçãopública e coordenadora do programa de Estudos e Pesquisas sobre Reforma do Estadoe governança Sonia Fleury. Contou, ainda, com a contribuição especial dos seguintespesquisadores: Wagner Carvalho e Valdei Araújo.

2 Marisol Touraine. Le Bouleversement du Monde. Géopolitique du XXIe Siècle. Paris:Seuil, 1995.

3 Donald Kettl. The Global Revolution: Reforming Government Sector Management.Brasília, 1996.

4 Sobre este tema ver: Adam Przeworsky. On the Design of the State: A principal-AgentPerspective. In “Reforma do Estado na América Latina e no Caribe: Rumo a umaAdministração Pública Gerencial”. Brasília. MARE. 1996. J.Prats Català. El NuevoJuego y sus Reglas : Construyendola Nueva Institucionalidad en la America Latina delos 90. Barcelona, 1996. Michael Crozier. Etat modeste, Etat moderne, Paris, Fayard,1987. Luc Rouban. La Modernisation de L’État et la Fin de la Spécificité Française in“Revue Française de Science Politique. v.40, n.4, agosto 1990, p. 521:544.

5 HALLIGAN , John. Función pública y reforma administrativa en Australia. In: RevistaInternacional de Ciencias Administrativa, Madrid: vol. 57, no.3, septiembre 1991, pp. 40

6 CAIDEN, Gerald E. Reformas Administrativas Recientes en Australasia. In: RevistaInternacional de Ciencias Administrativas, Madrid: vol. 57, no. 1, marzo 1991, p. 9-26.

7 HALLIGAN , .John, Op. Cit., p. 39.8 DOMBERGER, Simon; HALL , Christine. Contracting for Public Services: A review of

antipodean experience. In: Public Administration, v.74, n.1, Spring 1996.9 Idem ibidem, p. 134.10 CAIDEN, Op. Cit., pp. 13.11 Sobre a questão ver o trabalho de John HALLIGAN . Función Pública y reforma adminis-

trativa en Austrália. In.: Revista Internacional de Ciencias Administrativas. Madrid:v.57, n.3, Sept, 1991.

12 CAIDEN, Op. Cit., p. 15.13 LEE Jr, Robert D. Legal Parameters of Administration in a democratic society: the case

of Australia. In.: Administration & Society, London: v.23, n.2, August, 1991, p. 501.14 CAIDEN, Op. Cit., p.10.15 LEE Jr, Op. Cit., p.502-503.16 Idem ibidem, p. 506.17 Idem ibidem, p. 509.18 Idem ibidem, p. 509.19 Idem ibidem, p.511.20 Ives, Denis. Human resource management in the Australian public service: challenges

and opportunities. Public Administration and Development. London, v.15, n.3, p.324.21 Idem, ibidem, p. 32322 Idem, ibidem, p.327.23 DOMBERGER, S. & HALL , C., Op. Cit., p.130.24 Idem ibidem, p.133.25 Idem ibidem, p.135.26 Idem ibidem, p.135

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RSPResumoResumenAbstract

Fortalecer o serviço público e valorizar a cidadania: a opção australianaAdriana de Sá Mesquita e Silvia Pereira Ferreira

O artigo analisa o processo de reforma administrativa empreendida na Austrália aolongo das décadas de 70-80, destacando duas de suas principais tendências: o fortaleci-mento da “Função Executiva Superior”e a valorização da cidadania. Nele são descritos osprincípios básicos norteadores da reforma ao longo dos anos 70, bem como, os objetivosvisados com a segunda fase das reformas executadas a partir da década de 80, implementadaspor governos trabalhistas. Destaca-se a organização e o funcionamento do sistema dasAgências de Ombudsmen e dos Comissários de Contas responsáveis pela fiscalização egestão orçamentária. A seguir, são descritas algumas das ações encaminhadas pela PublicService Commission (PSC) no sentido de aperfeiçoar o gerenciamento e o melhor desem-penho dos recursos humanos, destacando a introdução do importante conceito de NovoProfissionalismo, assentado em valores como responsabilidade para com o governo,foco nos resultados, mérito como valor básico, altos níveis de integridade e probidade naconduta, desempenho com accountability e melhoramento contínuo do desempenho dasequipes e indivíduos. Outro importante instrumento analisado é o Human ResourceManagement, através do qual as autoridades australianas introduziram novas práticascomo negociação no local de trabalho, plano de oportunidades igualitárias no local detrabalho e o plano de treinamento e especialização. Para finalizar, o artigo enfoca apolítica de contratualização de serviços públicos adotada na Austrália — os CompetitiveTendering and Contracting, evidenciando os fatores indutores da adoção desta novaprática de gestão.

Fortalecer el servicio público y valorar la ciudadanía: la opción australianaAdriana de Sá Mesquita y Silvia Pereira Ferreira

El artículo analiza el proceso de reforma administrativa emprendida en Australia a lolargo de las décadas de los 70-80, destacando dos de sus principales tendencias: elfortalecimiento de la “Función Ejecutiva Superior” y la valoración de la ciudadanía. En élse describen los principios básicos orientadores de la reforma a lo largo de los años 70, asícomo los objetivos pretendidos con la segunda fase de las reformas ejecutadas a partir dela década de los 80, puestas en práctica por gobiernos laboristas. Se destaca la organizacióny el funcionamiento del sistema de las Agencias de Ombudsmen y de los Comisarios deCuentas responsables de la fiscalización y gestión presupuestaria. A continuación sedescriben algunas de las acciones encaminadas por la Public Service Comission (PSC) enel sentido de perfeccionar la gerencia y el mejor desempeño de los recursos humanos,destacando la introducción del importante concepto de Nuevo Profesionalismo, apoyadoen valores tales como responsabilidad para con el gobierno, foco en los resultados, elmérito como valor básico, altos niveles de integridad y probidad en la conducta, desempeñocon accountability y mejoramiento continuo del desempeño de los equipos e individuos.Otro importante instrumento analizado es el Human Resource Management, mediante elcual las autoridades australianas han introducido nuevas prácticas, tales como negociaciónen el lugar de trabajo, plan de oportunidades igualitarias en el sitio de trabajo y el plan decapacitación y especialización. Para terminar, el artículo enfoca la política de licitacionesy contrataciones de servicios públicos adoptada en Australia - Competitive Tenderingand Contracting, evidenciando los factores inductores de la adopción de esta nuevapráctica de gestión.

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

Adriana émestre emadministraçãopública EBAP/FGV/RJe especialistaem políticaspúblicas egestãogovernamentalno MARE eSilvia ésocióloga eprofessorada UnB.Ambas sãoassistentessociais epesquisadoras daEBAP/FGV/RJ

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RSPStrengthening the civil service and valuing citizenship: the australian choiceAdriana de Sá Mesquita and Silvia Pereira Ferreira

This article addresses the administrative reform process carried out in Australia overthe 70s and 80s and underscores two of its major trends, namely strengthening the“Higher Executive Function” and valuing citizenship. The primary principles guiding thereform process in the 70s are described, as well as the objectives set for the second phaseof reforms carried out as of the 80s and implemented by labor administrations. Theorganization and modus operandi of Ombudsmen Agencies and Accounts Commissioners,who are responsible for budget inspection and management, are given special highlight.The article then describes some of the measures taken by the Public Service Commission(PSC) with a view to improving both management and performance of human resourcesand underscores the introduction of the very important concept of New Professionalism,grounded on values such as responsibility towards the government, focus on results,merit as a basic value, high levels of integrity and probity in officials’ conduct, performancewith accountability and continuous peformance improvement of teams and individuals.Another equally important tool addressed herein is the Human Resource Managementsystem, whereby Australian authorities have introduced new practices such as negotiationat the workplace, the plan for equalitarian opportunities at the workplace and the trainingand specialization plan. In conclusion, the article addresses the public services contractingpolicy used in Australia, namely Competitive Tendering and Contracting, and underlinesthe factors that have led to the introduction of this new management practice.

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RSPReforma administrativa:o caso do Reino Unido1

Marcelo Ernandez MacedoAndrea Moraes Alves

1. Introdução

Com a eleição de um governo conservador em 1979, a Inglaterraassumiu a reforma administrativa como prioridade. Embora já constituíssetema de discussões desde os anos 60, a reforma da administração públicajamais havia alcançado tamanha valorização. Para a compreensão daspropostas e medidas adotadas pelo governo Thatcher, as quais provocarammodificações substanciais na configuração do serviço público inglês, nãopodemos desprezar as especificidades desse país no que se refere àscaracterísticas do seu sistema político e ao estado anterior de sua admi-nistração pública.

No que se refere ao sistema político inglês, este caracteriza-sepela presença de um governo partidário, com a alternância de dois partidosque historicamente disputam o poder: os conservadores e os trabalhistas.A conseqüência imediata e fundamental desse modelo é que, invariavel-mente, o sistema eleitoral atribui a maioria da Camâra dos Comuns a umdos partidos, o qual, ao escolher o primeiro-ministro, detém amplos pode-res executivos. Além disso, alguns outros fatores que em geral limitam asprerrogativas do Poder Executivo — um Senado forte; uma constituiçãoescrita; um sistema federativo; e um Judiciário ativo — estão ausentesno sistema britânico (COSTA, 1995:19). Portanto, apesar das tendênciasde flexibilização desse sistema, o modelo britânico fornece ao PoderExecutivo um grau de autoridade para governar, pouco visto em regimesdemocráticos. Este modelo facilitou a implementação das reformas defen-didas pelo governo conservador.

No que tange ao sistema administrativo inglês, um relatório apresen-tado pelo Comitê Fulton em 1968 marcou oficialmente o diagnóstico

Marcelo émestre emadministraçãopública EBAP/FGV/RJe especialistaem políticaspúblicas egestão gover-namental noMinistério daEducação e doDesporto.Andrea ésocióloga eprofessora daUniversidadede Brasília —UnB

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

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RSPnegativo em relação à qualidade e à organização do serviço público na-quele país. Além de críticas relativas à competência dos funcionários e àsua parcialidade no exercício das funções, o documento indicava a urgentenecessidade de inserção de um approach técnico na formação dos funcio-nários, principalmente em relação à assessoria dos ministros, função ocu-pada pelos chamados generalistas. O argumento básico apontava para anecessidade de alcance da eficiência nas operações departamentais e daefetividade nas políticas públicas em lugar dos funcionários preocupa-rem-se com “a turbulência política do dia-a-dia” (THOMAS, 1984:245). Nofinal dos anos 60, as idéias de eficiência e efetividade já conquistavamseu espaço no setor público provenientes de comparações com o desempe-nho de empresas privadas. A definição de objetivos e meios e a otimizaçãodos recursos para alcance dos resultados esperados ascenderam comovalores de um serviço público moderno.

Apesar das críticas, o Comitê Fulton não logrou abalar o prestígioque a tradição do serviço público britânico havia construído, nem foraesse seu objetivo. Reconhecia-se ainda a importância do trabalho dosgeneralistas que dominavam o conhecimento sobre o funcionamento doParlamento e dos departamentos, tinham habilidades como coordenadorese estavam associados a uma história de estabilidade e honestidade noserviço público, estreitamente ligada à formação de um modelo administra-tivo burocrático no país, marca inconfundível do regime britânico desde oséculo XIX.2 Mas, as novas noções esboçadas no relatório do Comitêpreviam a exigência de um perfil mais profissional e menos político paraos altos funcionários, caso contrário corria-se o risco de estagnação dasatividades do aparelho do Estado diante dos novos desafios impostos pelaeconomia e pela sociedade civil no mundo contemporâneo.

Uma década depois, com o advento dos conservadores ao poder,constatam-se as primeiras medidas efetivas com o objetivo de aumentara eficiência e a efetividade dos serviços públicos, o que, no caso inglês,significa a adoção de um perfil técnico para os funcionários, a reduçãodos gastos públicos, o estabelecimento de metas de qualidade nos serviçose um reordenamento institucional da organização estatal que torne possíveluma maior agilidade no cumprimento das funções públicas. Em últimainstância, visava-se instituir definitivamente os princípios do managerialismno setor público.

Pollitt (1996: 82) identifica três fases no processo de reforma admi-nistrativa iniciado por Margareth Thatcher. A primeira fase, que se estendede 1979 a 1982, caracteriza-se pela tentativa de redução de despesas. Paratal, 14% do total de servidores existentes em 1979 foram demitidos, e oDepartamento do Serviço Civil, estrutura encarregada da administração depessoal do governo, foi abolido, sendo substituído por uma nova estrutura(Management and Personnel Office — MPO) submetida diretamente

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RSPao gabinete do primeiro-ministro. O controle sobre o pagamento dos servi-dores passa a ficar a cargo do Tesouro. Inicia-se, ainda, nessa fase a im-plantação do “escrutíneos de Rayner”, grupos de trabalhos ministeriais en-carregados de racionalizar os gastos e eliminar os desperdícios.

Ciente das limitações políticas da simples proposta de redução dedespesas, o governo passou a enfatizar a eficiência ao invés da economia.A nova ênfase de “fazer mais com menos” caracterizou a segunda fasedas transformações implementadas pelos conservadores, a qual iria duraraté o final de 1987. É dessa fase a ampliação para toda a administraçãodo novo sistema de informações administrativas ( FMI — FinancialManagement Initiative — 1982); a implantação de um sistema de ava-liação que introduziu metas a serem cumpridas por cada funcionário, alémde um sistema de remuneração proporcional ao rendimento individual(1984/1985); e ainda o início de um amplo processo de privatização dosserviços públicos, operacionalizado tanto pela venda de diversas empre-sas como pela contratação externa para a prestação dos serviços, queiria expandir-se na fase seguinte.

A fase mais recente, iniciada com a terceira vitória consecutiva doPartido Conservador em 1987, caracteriza-se pela intensificação da utiliza-ção de mecanismos típicos de mercado; pela desconcentração na prestaçãodos serviços; pela retórica sobre a necessidade de qualidade no serviçopúblico; e pelo direcionamento dos serviços para o consumidor. Dandocontinuidade à reestruturação institucional iniciada na segunda fase, efeti-varam-se nesse período modificações substanciais na estrutura da adminis-tração pública através da instituição de novas formas de contratação.Atualmente, o serviço público britânico tem 65% do seu pessoal traba-lhando em agências que ganharam relativa autonomia em relação ao podercentral (JENKINS, 1996:90).

Apontados alguns tópicos importantes do processo de reforma admi-nistrativa na Inglaterra, é preciso ressaltar que, de acordo com o projetode pesquisa elaborado por nossa equipe de trabalho, este texto não pretendereproduzir a história do processo de reformas administrativas na Inglaterra,mas analisar alguns aspectos específicos desse processo, quais sejam:formas inovadoras de gestão no setor público; a contratualização das rela-ções nesse setor; e a política de gestão de recursos humanos, na qual seinserem os sistemas de avaliação de desempenho individual.

2. Aspectos da reforma administrativa na Inglaterra

A primeira forma inovadora de gestão no serviço público britânico,que merece ser analisada, é a formação dos “escrutíneos de Rayner”.

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RSPO primeiro governo Thatcher foi buscar no setor privado um con-sultor em administração, Sir Derek Rayner, com o objetivo de racionalizaros gastos e eliminar os desperdícios no serviço público. A partir de maiode 1979, Sir Rayner propôs dois tipos de exercícios: um particular(“escrutíneos”), relativo a investigações em funções e operações de cadadepartamento; e outro geral (“Lasting Reforms”), preocupado com refor-mas de caráter duradouro, que envolvem mudanças de comportamentopara o exercício das atividades (THOMAS,1984:241).

Os escrutínios, pequenos grupos formados por funcionáriosdepartamentais e assessorados por um grupo central (“Unidade de Efi-ciência”), esse por sua vez ligado diretamente ao gabinete do primeiro-ministro e chefiado pelo próprio Rayner, caracterizam-se pela realizaçãode avaliações departamentais. As avaliações visam responder a três per-guntas fundamentais para cada processo de trabalho examinado: 1) Quemé o responsável pelo processo? 2) Qual é o seu custo? 3) Quais são osresultados esperados? (JENKINS,1996:90). Os grupos departamentais têmtrês meses para produzir um relatório respondendo às questões. As deci-sões relativas às ações a serem implementadas são tomadas nos trêsmeses seguintes, e os resultados devem efetivar-se completamente dentrode dois anos, a contar do início da avaliação.

A atuação de Rayner durante o período do escrutínio compreendeu oapoio e a orientação aos funcionários departamentais, o auxílio ao ministro narevisão do relatório e na elaboração do plano de ação (“Action Document”),e ainda o acompanhamento dos progressos de cada departamento, repor-tando-os ao primeiro-ministro. Durante 1980, 39 escrutínios foram identifica-dos como potenciais economizadores de recursos, dos quais 24, quandoimplementados, significaram economias de 22 milhões de libras por ano(THOMAS,1984:241). Alguns escrutínios serviram de modelo para transforma-ções em processos semelhantes de outros departamentos, enquanto outrosexigiram a cooperação entre departamentos, como foi o caso do escrutíniopara o pagamento de benefícios a desempregados, o qual envolveu os depar-tamentos de Emprego e o de Saúde e Seguridade Social.

Segundo Thomas (1984), uma das características que diferencia aabordagem de Rayner dos demais programas implementados desde 1960 éo arranjo político-administrativo ao qual essa abordagem está associada.Este arranjo compreende: envolvimento do ministro no escrutínio, o quegarante o permanente interesse dos funcionários de alto nível; a indepen-dência dos funcionários departamentais encarregados do escrutínio em re-lação à rígida hierarquia de comando, e a importância dada pelo primeiro-ministro à essa ação, expressa pela vinculação da “Unidade de Eficiência”ao seu gabinete. Esse novo arranjo institucional representou a valorizaçãodo tema da eficiência como uma questão política e não meramente técnica.

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RSP Não obstante, a associação entre as propostas de Rayner e aspolíticas conservadoras do governo geraram muitas críticas por parte dossindicatos de servidores públicos. Os escrutínios são vistos como mecanis-mos de redução dos gastos públicos e do número de servidores públicos,e não como instrumentos de avaliação livres de valor. Essa imagem de-corre do fato de que os escrutínios não foram efetivamente acompanhadospor mudanças nas culturas organizacionais do serviço público. O exercíciogeral proposto por Rayner, “Lasting Reforms”, parece não ter sido intensi-vamente praticado. Diversos autores criticam a pouca atenção dada àdimensão cultural das reformas. Até mesmo Kate Jenkins (1996:94), umadefensora ardorosa das reformas da era Thatcher, adverte sobre a confusãoentre reformas administrativas e mudanças no rumo das políticas, alegandoque as primeiras envolvem mudanças comportamentais, e que a falta deatenção para esse fato tem sido um dos principais equívocos das reformas.

A segunda forma inovadora de gestão diz respeito ao desenvolvi-mento de sistemas de informações gerenciais. Em 1979, Michael Heseltine,secretário do Departamento de Meio Ambiente, desenvolveu o MINIS(Management Information System for Ministers). Esse sistema de in-formação apresentava ao secretário do Departamento de Meio Ambientetoda a estrutura administrativa que o cercava, permitindo o questionamentode seu desenho e a identificação das responsabilidades e prioridades decada subunidade. O MINIS, desenvolvido a partir de um exercício deRayner, tornou-se um escrutínio permanente, que permitia ao secretáriode Estado a revisão detalhada das atividades do departamento e das ne-cessidades de recursos humanos.

No entanto, esse sistema enfocava principalmente os gastos compessoal, omitindo informações a respeito das demais despesas administra-tivas, como diárias, viagens, postagem, telecomunicações, etc. A ausênciade informações nesse sentido foi suprida pelos “estudos de Joubert”, osquais resultaram no desenvolvimento do MAXIS ( ManagementAccounting System). Além da maior abrangência das informações, estesistema compreendia a criação de centros de custo locais, atribuindo acada subunidade a responsabilidade pela administração de seu próprioorçamento. Segundo Thomas (1984), isso representou a principal mudançana forma de controle dos custos administrativos.

Restrito ao Departamento de Meio Ambiente, o Tesouro conside-rou que esses sistemas de informação poderiam ser estendidos para todoo serviço público. Em 1982, o governo anunciou o Financial ManagementInitiative (FMI) para cobrir todos os departamentos. Essa iniciativa repre-sentou a integração entre o MINIS e o MAXIS em escala ampliada. Osobjtivos do FMI eram: 1) fornecer uma visão clara das metas e meiospara alcançá-las, medindo os resultados parciais sempre que possível;

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RSP2) definir responsabilidades para uma melhor utilização dos recursos, in-cluindo avaliações sobre os valores acrescentados por cada processo;3) garantir o acesso à informação, principalmente em relação a custos eao treinamento necessário para o exercício efetivo das responsabilidades.

O FMI foi operacionalizado da seguinte maneira: cada departa-mento foi chamado a produzir um plano para ser enviado ao MPO e aoTesouro, o qual deveria conter informações a respeito dos programas,seus financiamentos e formas de controle, assim como sobre os respon-sáveis pela execução de cada um dos projetos; uma unidade de adminis-tração financeira, composta por membros do Tesouro e do MPO, trabalhouna orientação dos altos gerentes para a formulação de seus planos.

Em 1986, o FMI foi revisto e estendido com a finalidade de introduzirresponsabilidades orçamentárias para os administradores de cadasubunidade, incorporando definitivamente o princípio descentralizador pre-conizado pelo MAXIS. Inclusive, esta iniciativa parece ter sido a únicaefetivamente descentralizadora desde o início da era Thatcher.

No entanto, conforme alega Pollitt (1990: 55), tanto a respeito dessainiciativa como também no que se refere ao pagamento por mérito e acontratação externa, o controle do governo central permaneceu forte. Aoestabelecer nos limites financeiros e as normas de performance para orepasse de recursos nos níveis locais, o governo conservador vem impondoobstáculos a uma descentralização genuína. Walker (1991:133) confirmaessa avaliação quando argumenta que, ao reduzir o ritmo de repasse derecursos, e ao limitar as possibilidades dos entes locais em adquirir deforma autônoma os seus recursos, o governo conservador operou umagrande centralização fiscal. Conforme alega esse autor, tais iniciativas decentralização fiscal correspondiam a anseios de maior eficiência no serviçopúblico e, como argumento legitimador, admitia-se que as administraçõeslocais não estavam preparadas para gerenciar recursos autonomamente.Para o governo central, seria necessário que as administrações locaisfossem mais prudentes, participativas e responsáveis na utilização dosseus recursos.

Uma terceira inovação no serviço público britânico, originada apartir de experiências locais trabalhistas em York e Lewhisham (HOOD,1994: 300), foi o programa Citizen’s Charter. Os Charters correspondema documentos nos quais são especificados objetivos e normas claros paracada serviço público, acompanhados dos recursos disponíveis para a suaexecução, assim como a identificação dos responsáveis pela sua provisão.Esses documentos são destinados a informar ao usuário acerca do funcio-namento dos serviços, sendo o primeiro documento elaborado ainda em1981, o que, segundo Jenkins (1996:92), significou uma abertura em relaçãoà tradição burocrática britânica de manutenção do sigilo sobre informações

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RSPa respeito do serviço público. Os Charters são elaborados em torno deum conjunto de seis princípios:

a) divulgação dos padrões esperados pelos serviços e sua perfor-mance em relação a eles;

b) informação acurada, publicada em linguagem acessível, sobre aadministração dos serviços, seu custo, seu desempenho e a definição dasresponsabilidades;

c) consulta sistemática ao usuário sobre os serviços, suas opiniõesdevem ser levadas em consideração na tomada de decisões;

d) os funcionários públicos têm o dever de serem corteses no trata-mento do usuário, sem distinções de nenhuma espécie;

e) se algum erro é identificado, deve haver uma explicação e ummeio efetivo de corrigí-lo. Os usuários devem ter acesso fácil aos locaisde reclamação;

f) processamento eficiente e econômico dos serviços, dentro dosrecursos que a nação dispõe. Deve haver uma validação independente daperformance em relação a esse item.

O governo Major não tem medido esforços para ampliar o programa,o qual já se estendeu, inclusive, para os serviços privatizados (água, gás,eletricidade e telecomunicações). Em 1995, existiam 39 charters cobrindoos principais serviços públicos, alguns deles foram republicados, contendopadrões de qualidade mais elevados. Naquela época, estava previsto olançamento de informações comparadas sobre a performance de escolas,hospitais e outros serviços locais. Já havia sido introduzido, em abril desseano, um novo código para a elaboração de informação governamental,coordenado por um Ombudsman (MOTTRAM ,1995:314).

Segundo esse autor, o Citizen’s Charter tem resultado, em reduçãoao tempo de resposta às reclamações dos cidadãos, mecanismos de com-pensação mais satisfatórios para o consumidor, melhores sistemas de aten-dimento, e na introdução de leigos na supervisão dos serviços. Além dis-so, circula quinzenalmente um boletim informativo sobre os serviços pú-blicos, e foi instituído um prêmio (The Charter Mark) destinado àquelesque alcançam níveis de excelência na prestação desses serviços, de acordocom os princípios estabelecidos pelo Citizen’s Charter. São ainda elabo-rados documentos oficiais reportando o progresso dos padrões de quali-dade estabelecidos.

Não obstante, pairam algumas críticas sobre essa iniciativa. A prin-cipal delas diz respeito ao caráter consumista do programa, problemaassinalado tanto por Hood (1994) como por Pollitt (1996:83). De acordocom o segundo autor:

“Os cidadãos são pouco freqüentemente mencionados após otítulo — o foco principal localiza-se nos clientes e consumidores

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RSPdos serviços ao invés de estar localizado num conceito coletivo decidadania mais amplo e mais explicitamente político. Os adminis-tradores devem consultar os clientes e a partir daí estabelecer pa-drões para o serviço em questão. Acordos para participação cole-tiva ou representação dos cidadãos não são discutidos. O supostoparece ser o de que o cliente, que o governo tem em mente, é oindividual, o consumidor que ativamente escolhe, ao invés do cida-dão preocupado com o público. Certamente há pouca coisa noCharter que estenda direitos dos cidadãos ou arranjos coletivos,mesmo que os cidadãos possam demonstrar seu poder pela partici-pação ativa.” (tradução dos autores).

Observadas as críticas e os benefícios trazidos pelo programa, ofato é que o Citizen’s Charter alcançou magnitudes inesperadas. Com15 anos de duração, o programa encontra-se amplamente disseminado,abrangendo tanto os serviços estatais como os recentemente privatizados.

Antes de introduzir o tema das formas de contratação, parece impor-tante dedicar algumas linhas ao amplo processo de privatização implemen-tado na era Thatcher, já que, conforme veremos, estes dois temas estãofortemente imbricados.

A principal forma de privatização operada na Inglaterra foi a vendade ativos. Segundo Wright (1992:130), mais da metade do setor industrialpertencente ao Estado passou às mãos de agentes privados até 1992;mais de um milhão de empregados do setor público foi transferido para osetor privado; foram desnacionalizados os serviços de gás, eletricidade,água e telecomunicações, assim como as indústrias estratégicas(aeroespacial, siderúrgica, British Arways). O autor aponta alguns motivospara o voluptuosidade do processo de privatizações na Inglaterra: a imagemnegativa do setor público; o fato de o governo central ser o proprietáriodas empresas; a inexistência de obstáculos constitucionais; a favorávelposição comercial e financeira das empresas.

De acordo com Dunsire (1990:57/8), emergem duas conseqüênciaspositivas do processo de privatizações na Inglaterra. A primeira delas advémda forma escolhida para a venda dos ativos, qual seja, a pulverização dasações das empresas entre os trabalhadores e a população em geral. Oresultado disso é que em 1979 havia apenas 2 milhões de acionistas naInglaterra, enquanto que em 1991 esta cifra alcançou os 13 milhões (WRIGHT,1992:131). A segunda conseqüência positiva foi a significativa redução dodéficit público.

Apesar das facilidades e conseqüências positivas enumeradasacima, alguns autores relutam em apontar o sucesso total do processo.No que se refere ao aumento de competividade após as privatizações, amaioria dos autores afirma que esse objetivo não foi alcançado. Dunsire

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RSPafirma existir consenso na literatura quanto à idéia de que propriedade eestrutura competitiva são questões distintas; a propriedade, seja ela públicaou privada, não se constitui per si uma medida de competitividade. SegundoVickers and Yarrow (in MARSH, 1991:466), devido à simplificação e àrapidez com que foi conduzido o processo, as falhas na efetiva introduçãode mecanismos regulatórios e de promoção da competição impedem queo programa de privatização venha, a longo prazo, constituir-se num sucesso.

A respeito do aumento da eficiência e do comprometimento dosnovos trabalhadores acionistas com as suas empresas, alega esse últimoautor que ainda são necessárias maiores investigações.

Todavia, a privatização na Inglaterra não se restringe à venda deativos. Os textos que versam sobre esse tema enumeram diversas outrasformas de privatização ocorridas nesse país: a desregulação, a supressãode serviços e investimentos públicos (na esperança de que o setor privadoocupe o espaço aberto), o aumento das taxas pagas pelo uso dos serviços.Além destas, destaca-se a contratação externa, tema sobre o qual nosdebruçaremos a seguir.

No Reino Unido, durante muitas décadas, firmou-se a tradição daprestação de serviços por funcionários públicos. Os laborists acreditavamque assim se impedia o desemprego e regulava-se o setor privado. Porisso, os contratos com empresas privadas para a prestação de serviçospúblicos não tiveram um desenvolvimento importante até 1979.

Segundo Abrucio (1996:21), citando Clarke (1993), uma das medidasadotadas para operacionalizar a estratégia de tornar o poder público maisleve, ágil e competitivo foi a adoção de um novo modelo contratual paraos serviços públicos. Esse modelo possui três dimensões:

a) a extensão das relações contratuais no fornecimento dos serviçospúblicos para o setor privado e para o setor voluntário não-lucrativo;

b) a extensão das relações contratuais dentro do serviço público;c) o desenvolvimento de contratos de qualidade entre os provedores

de serviços e os consumidores/clientes;A primeira dimensão do novo modelo foi desenvolvida principal-

mente através da contratação externa. Desde o começo da era Thatcheraté 1987, os conservadores haviam reduzido o emprego nos departamentoscentrais em 22.000 postos de trabalho por intermédio das contrataçõesexternas de serviços ( REHFUSS, 1991:174).

Um instrumento de contratação alternativo utilizado, e que integraa segunda dimensão acima citada, foi a “licitação competitiva”, a qualpermite que os próprios servidores públicos apresentem sua proposta paraa prestação dos serviços, em competição com agências privadas. Afacilidade de mobilização, o treinamento e a ajuda dos administradoresdas agências permitiram a organização de grupos de trabalho capazes deoferecer propostas para a execução de serviços, mantendo um mesmo

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RSPnível de qualidade a custos reduzidos. Em 1983, exigiu-se dos entessanitários distritais que os serviços de lavanderia, limpeza e assistênciasocial fossem submetidos à licitação competitiva.

Dados coletados no Instituto de Administração de Pessoal mostramque, até 1986, os 522 contratos firmados pelo NHS — Nacional HealthService — junto a seus próprios funcionários resultaram em economiasde 59.000, em média por contrato, frente às 140.000 libras, em média,economizadas com contratos privados. Os empregados próprios ganharam78% de todas as disputas (REHFUSS, 1991:185).

Até 1988, no entanto, poucos serviços locais haviam se adequadoao novo modelo de contratação. Finalmente, em agosto de 1989, a adminis-tração central exigiu aos entes locais que fossem licitados os seguintesserviços: recolhimento de lixo; limpeza de ruas; manutenção de veículos;conservação de terrenos; escolas e edifícios. A cada seis meses, um dositens desta lista deveria ser licitado.

A partir de um trabalho no qual entrevistou funcionários de diversasagências inglesas que vivenciavam processos de contratação, Rehfuss(1991) obtém pontos de vista bastante distintos a respeito das preferên-cias desses funcionários. Enquanto alguns mostram-se satisfeitos comos serviços contratados externamente, outros prefeririam estar traba-lhando com os antigos funcionários.

A principal preocupação dos contratantes a respeito dos contratadosprivados é com a queda na qualidade dos serviços prestados. É constatadaa falta de experiência desses trabalhadores, que muitas vezes utilizam oseu primeiro contrato para a formação profissional, como conseqüênciado fato de que no começo dos anos 80, havia poucas empresas privadasprestadoras de serviço na Inglaterra, e essas empresas remuneram malos seus trabalhadores, logo estes tendem a serem pouco qualificados. OServiço Nacional de Saúde (NHS), por exemplo, após o fracasso inicialdas experiências com contratos externos, tende atualmente a firmar con-tratos com os próprios funcionários (REHFUSS, 1991:180).

Ainda a respeito dos contratos firmados com agências formadaspelos próprios funcionários públicos, Pollitt (1996:83) afirma que as leisque governam as relações contratuais entre corpos públicos ainda nãoestão adaptadas à nova realidade administrativa, o que vem causandodiversas ambigüidades na operacionalização dos contratos.

Em 1988, como resultado de um relatório da Unidade de Eficiência,foi concebido o Next Steps, uma iniciativa que, conforme o próprio nomeindica, significa continuidade no objetivo de incrementar a eficiência nosetor público.

O último objetivo do Next Steps era que três quartos dos servidorespúblicos passassem a trabalhar em unidades separadas do núcleo centraldo Estado, este responsável pela elaboração das políticas (WILSON,

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RSP1991:23). Essas unidades seriam responsabilizadas pela execução daspolíticas públicas, teriam sempre um chefe executivo responsável pelasua performance, e as atividades seriam conduzidas a partir de contratosde gestão estabelecidos entre os departamentos e a administração cen-tral, esta representada pela Unidade de Eficiência. Pretendia-se atribuir-lhes autonomia para a gestão administrativa e de recursos humanos, oque inclusive implicaria dificuldades para o sucesso do programa, dada àinsistência do Tesouro em manter o controle centralizado dos recursos.

As agências têm, à disposição, quatro modelos de financiamento:a) Gross Running Costs, as agências têm seus orçamentos fixados;b) Net Running Costs, receitas e economias podem ser utilizadas paragastos administrativos adicionais; c) Trading Fund, um sistema de presta-ção de contas similar ao de uma organização comercial; e d) Government-owned Company, totalmente independente do serviço público. É notávelo fato de que a maioria das agências opera sob a forma de Gross RunningCosts, nenhuma delas constituiu-se como Government-owned, duas têmTrading Funds (HMSO e Royal Mint) e cerca de doze operam sob abase de Net Running Costs.

Apesar de ter iniciado de forma tímida, em unidades administrativaspouco polêmicas e que tinha objetivos de fácil concretização, a propostaera que o programa se estendesse às mais diversas áreas. Conforme jávimos, hoje 65% dos servidores públicos britânicos trabalham em agências.

Em 1992, o governo Major iniciou dois novos processos de contrataçãoconhecidos como Market Testing e Competing for Quality. Enquanto oprimeiro selecionava serviços que poderiam ser prestados via “licitaçãocompetitiva”, o segundo selecionava serviços que, estrategicamente, deve-riam ser providos exclusivamente por agentes privados (MOTTRAM,1995:315). Em relação ao Market Testing, devido à inclusão no programade serviços considerados estratégicos pelos funcionários de mais alto escalão,estes têm resistido a sua implementação, o que vem limitando o seu escopo(JENKINS, 1996:90).

Assim sendo, a adoção de novas formas de contratação significoua criação de um novo arranjo institucional no Reino Unido, o qual rompiacom o antigo modelo de monopólio estatal, e aumentava o pluralismoinstitucional na provisão de serviços públicos. Não se tem hoje uma exatanoção a respeito do futuro das agências públicas e privadas, apesar dessearranjo institucional já dominar a provisão dos serviços públicos. Enquantoalguns preferem o antigo modelo de prestação pública de serviços, outrosagradecem por ver agências internas reforçadas.

Outro aspecto relevante da reforma administrativa britânica, intima-mente associado às formas inovadoras de gestão e contratação, consistena gestão de recursos humanos.

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RSPConforme vimos, o começo da era Thacher elegeu a administraçãode pessoal como um dos pontos básicos a serem reformados. As primeirasmedidas foram a extinção do Departamento de Serviço Civil e a reduçãodo quadro de funcionários.

O Departamento de Serviço Civil havia sido criado imediatamenteapós a publicação do Relatório do Comitê Fulton, com a responsabilidadede controlar o número de servidores e seu pagamento, e promover aeficiência gerencial através do acompanhamento do desempenho das ativi-dades dos funcionários. Em suma, este órgão centralizava toda a gestãode recursos humanos. Em 1980, um comitê parlamentar apontou para aineficácia do departamento, alegando sua falta de controle sobre algumascaracterísticas básicas do quadro de pessoal. No final de 1981, a primeiraministra extinguiu o departamento, dividindo suas tarefas entre o Tesouroe uma nova unidade responsável pela gestão de recursos humanos, oMPO — Management and Personnel Office.

Ao MPO, estrutura interna ao gabinete da primeira ministra, coube-ram as tarefas de formulação, coordenação e supervisão da política derecursos humanos, seleção, recrutamento e treinamento de funcionários,assim como a promoção de estudos e pesquisas sobre organização emétodos. O Tesouro implementava o controle financeiro, a política deremunerações, e dimensionava os recursos humanos no setor público.Assim estava dividida a gestão dos recursos humanos em 1987, data quemarca a extinção do MPO, com suas principais funções passando a ficara cargo do Tesouro. A expansão do novo modelo de contratações (licitaçãocompetitiva e contratação externa) e a formação de centros de custoslocais ensejou conflitos com o mecanismo centralizado (no Tesouro) degestão de recursos humanos, então em vigor.

Ao lado de medidas relativas à alteração da estrutura organizacional,a política do governo conservador determinou mudanças em algumascaracterísticas do funcionalismo público. Tradicionalmente, os servidorespúblicos britânicos eram selecionados através de exames competitivos epromovidos por mérito, havia uma clara distinção entre o serviço públicoe o interesse pessoal e uma marcante delimitação de funções e compe-tências. Entre 1930 e 1960, verificou-se um substancial crescimento notamanho e no escopo do trabalho dos funcionários, devido à culturaintervencionista do Welfare State, o fortalecimento da estrutura sindical,e a dispersão regional dos servidores.

O advento da administração conservadora em 1979 significou aintensificação de algumas medidas propostas pelo relatório Fulton nosentido de aumentar a accountability, o profissionalismo e a valorizaçãodo custo dos serviços. Butler (1993:398) afirma que as mudanças nascaracterísticas do funcionalismo público podem ser observadas sob

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RSPquatro perspectivas: vinculação (pública/privada), administração,competitividade e abertura.

No que se refere à vinculação dos funcionários, até 1993, quaseum milhão de empregos no setor público foi transferido para a esferaprivada. Apesar da ênfase inicial ter recaído sobre os funcionários dasempresas estatais, recentemente o governo tem voltado sua atenção paraa administração direta. De algo em torno de 732.000 funcionários em1979 o setor público passou a possuir o efetivo de 580 mil em 1988(DUNSIRE,1990:43).

Em relação à administração, as inovações administrativas e o novomodelo de contratação significaram mudanças importantes na organizaçãodo trabalho. De uma estrutura montada essencialmente sobre uma largabase horizontal, com departamentos monolíticos dividindo as mesmascondições de trabalho, pagamento e graus de hierarquia, operou-se a trans-formação em direção a uma base mais vertical, com o núcleo centralencarregado pela elaboração das políticas públicas, e agências executivaspela sua implementação. Os funcionários departamentais passaram a termaior liberdade em relação ao centro, enquanto aqueles situados nasagências executivas são balizados por relações contratuais que incluemobjetivos, responsabilidades, pagamento, recrutamento e treinamento(BUTLER, 1993: 400).

Vale ressaltar a transformação exercida nos altos escalões. En-quanto num passado próximo os chefes de departamentos eram conside-rados intercambiáveis, podendo mover-se de um departamento para outrocom facilidade, agora esses funcionários tornaram-se chefes de agênciasexecutivas, operando sob contratos pessoais firmados junto aos ministros,os quais possuem prazos, exame de performance e permitem uma maiorremuneração de acordo com o desempenho.

Em relação ao treinamento dos funcionários, maior atenção pareceque tem sido dada à formação para os altos escalões governamentais.Em 1985, o Civil Service College introduziu dois novos cursos: TopManagement Programme e Senior Management DevelopmentProgramme, ambos para funcionários em ascensão. Pollitt (1990:61) cri-tica a negligência em relação à formação dos demais, apontando comomotivos os constrangimentos econômicos e ideológicos que fazem partedo contexto do governo conservador.

No que tange à terceira perspectiva analisada por Butler (1993),a competitividade, o governo conservador, desde o início, não têm medi-do esforços para estimular a competição tanto entre os funcionários dopróprio setor público (principalmente entre os de nível superior) comotambém entre estes e os do setor privado. As novas formas contratuaise as gratificações pela performance são os principais catalizadores paraa competitividade.

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RSPEssa terceira perspectiva influi diretamente sobre a quarta, qualseja, a abertura do serviço público. O aumento da competitividade, coma inserção de profissionais oriundos do setor privado na prestação deserviços públicos, minou a tradição de recrutar jovens universitários quefossem preparados para desenvolver uma carreira no serviço público. En-tre 67 diretores de agência, citados no Whitehall Companion de 1993-1994, nenhum correspondia ao perfil clássico do diplomado em Oxford comuma carreira de generalista passada quase inteiramente dentro do serviçopúblico (HOOD,1994:305). Atualmente, a divulgação dos concursos públicosé muito mais ampla e os requisitos para a inscrição menos restritos. Soman-do-se a isso a democratização da informação gerencial (FMI), percebe-sehoje um significativo processo de abertura no serviço público.

Ainda no que se refere ao recrutamento dos funcionários, esteagora é efetuado em nível departamental e das agências, sob a supervisãode uma comissão especializada, cujo papel restringe-se à salvaguardados princípios de justiça e competição aberta.

Outro ponto fundamental para a compreensão das inovações rela-tivas à gestão de recursos humanos é a avaliação de desempenho dosfuncionários. Item essencial, discutido desde o relatório do Comitê Fulton,o tema da avaliação de desempenho toma contornos mais definidos apartir de 1984, com a modificação do sistema anual de avaliação de pessoalem direção à introdução de objetivos para cada funcionário, cujo alcanceou frustração deveria ser discutido com a chefia.

O modelo pré-80 de pagamento dos servidores públicos britâni-cos era caracterizado por uma estrutura institucional durável, com umalto grau de centralização na determinação das condições de empregoe um estável processo de barganha, o qual envolvia diretamente asorganizações sindicais. O governo comprometia-se em prover o equilí-brio entre uma remuneração considerada justa e o controle dos gastospúblicos. Esse equilíbrio era constantemente negociado, baseado emuma comparação entre os ganhos salariais de empregados no setor pri-vado e os salários e funções similares dos funcionários públicos. Haviauma unidade responsável por coletar dados que possibilitassem a com-paração, a chamada Pay Research Unit (PRU). A partir do final dosanos 70, esse sistema entrou em colapso devido à mudança no ambien-te econômico e político.

No início da era Thatcher, desenvolveu-se uma preocupação como controle dos gastos públicos, e, dois dos itens considerados fundamentaispara esse controle diziam respeito ao número e aos proventos dos funcio-nários públicos. Quanto ao número, como já afirmamos, o corte no qua-dro de pessoal se deu imediatamente. Em relação aos salários, a buscapor um novo modelo de determinação do pagamento vem, até hoje, cau-sando controvérsias.

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RSPO governo conservador estabeleceu dois princípios gerais para nortearo debate da questão salarial. O primeiro refere-se à importância de se terum sistema estabelecido de pagamento; o segundo é a crença de que talsistema deve responder às necessidades da eficiência gerencial, sendo to-talmente comprometido com uma rígida disciplina de controle de gastos.

Nesse sentido, já em 1981, o governo revoga o PRU, sob o argu-mento de que o sistema, além de inflacionário, protegia os servidorespúblicos da concorrência benéfica ao mercado de trabalho. Para os con-servadores, qualquer novo sistema deveria estar alicerçado em bases muitomais gerenciais.

Com a extinção do PRU, firmas de consultoria passaram a sercontratadas para a realização da pesquisa comparativa. Muito debatetem sido provocado entre consultores, governo e sindicatos acerca dasmetodologias de trabalho adotadas, da análise dos dados e de seu usocomo parte do processo de negociação das políticas de pessoal. É impor-tante ressaltar que não houve uma completa negação da comparaçãocom o setor privado, em termos salariais e de condições de trabalho, maso seu uso passou a ser visto como uma ferramenta gerencial que forne-ceria informações sobre níveis competitivos de pagamento, de forma alidar com a necessidade de expansão ou de retenção dos quadros, e nãomais como um instrumento político de barganha entre o governo e ossindicatos.

Em 1985, iniciam-se experimentos com bônus ligados àperformance do funcionário — Performance Related Pay. Os servidoressubmetidos ao novo esquema encontravam-se nos níveis inferior e inter-mediário (graus 3 a 7) do serviço público. Em 1987, expande-se o novomodelo para o grau 2 da escala funcional. No entanto, essa expansãofragilizou-se já no ano seguinte, quando o Tesouro decidiu que aosservidores de graus 2 e 3 poderiam ser atribuídos pontos suplementaresde remuneração de acordo com a vontade de seus chefes. Portanto, aproporção do salário submetida à avaliação do desempenho pôde ser com-pensada por este mecanismo discricionário.

Os servidores de grau 1, responsáveis pela elaboração das políti-cas públicas, não têm seus ganhos salariais afetados pela performance,com a exceção dos chefes de agências executivas. Quanto aos demaisfuncionários, que verdadeiramente sofrem os efeitos do pagamento rela-cionado à performance, a parte da remuneração ligada ao desempenho érecebida sob a forma de prêmios anuais que não possuem um caráterpermanente. Não estando integrados ao salário, esses prêmios não contampara o cálculo da aposentadoria, representando apenas uma pequena partedo montante salarial desses funcionários (HOOD,1994, 303)

Como maneira de implementar a nova filosofia de pagamento, ogoverno começou a limitar o orçamento para inibir os aumentos do serviço

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RSPpúblico. Entretanto, houve necessidade de flexibilização dessa limitação,para evitar problemas com alguns grupos de funcionários.

As dificuldades enfrentadas pelo Performance Related Pay sãoexploradas por Ian Kessler (1993). Este autor argumenta que o tema temsido cercado de incertezas e tensões, as quais envolvem, tradicionalmente,os sindicatos e o governo e, mais recentemente, as agências executivas eo Tesouro. O programa seria um mecanismo discricionário que estariacontribuindo para a erosão da moral dos servidores e de sua motivaçãopara o trabalho, beneficiando alguns em detrimento de outros.

A avaliação da consultoria Hay MSL (KESSLER,1993,327) relata asvisões dos funcionários sobre o sistema de pagamento, definindo-o comonegligente, em relação ao estabelecimento de um firme critério de recom-pensas, e obscuro quanto aos procedimentos adotados.

Apesar disso, o governo conservador continua considerando a pos-sibilidade de ligação entre a performance e o pagamento como um obje-tivo ótimo para equacionar os problemas de racionalização do gasto público.Para Kessler (1993), permanece em aberto o sucesso do governo emdesenvolver o princípio do Performance Related Pay, não somente devidoàs resistências internas que dificultam a flexibilização, como também emrelação ao convencimento dos funcionários de que o sistema promovemaiores chances de realização profissional aliada à garantia da eficiência.

3. Considerações finais

Os resultados iniciais do processo de reforma administrativa naInglaterra não permitem conclusões definitivas, dada a incerteza acercado novo modelo de Estado proposto. Não obstante, dentro desse processo,dois pontos merecem ser destacados.

Em primeiro lugar, o próprio fato da reforma administrativa servista como um processo. Essa concepção possibilita a retomada constantedos caminhos da reforma, ocasionando avanços e recuos, e permitindoanálises mais abrangentes sobre as medidas a serem tomadas. Todavia,ainda prevalece a idéia de que mudanças estruturais são capazes de pro-mover transformações culturais. Conforme vimos, efetuaram-se modifi-cações significativas na configuração do Estado, mas que parecem estarainda longe de provocar uma substancial mudança cultural em direçãoaos princípios preconizados pelo gerencialismo. Alguns autores, comoHood(1994) e Poole et alli (1995), afirmam que alguns príncipios dogerencialismo já estão incorporados à prática dos servidores, enquantooutros, como Pollitt (1996), alertam sobre a debilidade das medidas acercada formação e da satisfação dos prestadores de serviços públicos.

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RSPO segundo ponto diz respeito ao caráter paradigmático do casoinglês. Isso se deve à transparência e à firmeza acerca da direção a serseguida, além das conhecidas especificidades políticas e administrativasdesse país. As medidas tomadas seguem nítida e publicamente a trilha dogerencialismo e da redução da presença do Estado em todos os âmbitos.Os defensores da proposta se esforçam para relativizar essa redução(rolling back the state), alegando que esta representa mais exatamenteuma mudança de papel de um Estado provedor para outro regulador.Nesse sentido, essa nova configuração do Estado, massificada pelo adje-tivo “neoliberal”, tem o caso inglês como modelo.

Assim sendo, o caso inglês constitui-se num importante referencialde análise sobre o tema “reforma administrativa”. Tanto pela observa-ção das inovações gerenciais e contratuais adotadas, como através dasua proposta de gestão dos recursos humanos, a Inglaterra forneceexemplos que podem servir de parâmetro para as reformas em outrospaíses. No entanto, é preciso ressaltar sempre a singularidade do pro-cesso inglês, evitando a transposição acrítica e descontextualizada demedidas isoladas.

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RSPNotas

1 Este artigo foi realizado com recursos da ENAP Escola Nacional de AdministraçãoPública. Constitui um dos produtos de pesquisa sobre Burocracia Estatal, do Progra-ma de Pesquisas e Estudos sobre Reforma do Estado e governança, mantido pela FGV/EBAP. Coordenado por Sonia Fleury, doutora em ciência política e professora demestrado em administração pública da EBAP/FGV, e coordenadora do Programa deEstudos e Pesquisas sobre Reforma do Estado e governança mantido pela FGV/EBAP.

2 Referimo-nos propriamente ao chamado modelo Whitehall, cuja expressão encontra-se no Northcote-Trevelyan Report of 1854. Esse modelo baseia-se nos seguintesprincípios: 1) divisão entre trabalho intelectual e tarefas mecânicas no serviço público;2) concurso público; 3) promoções baseadas no mérito; 4) unificação dos departamen-tos, dentro dos quais promoções e transferências ocorreriam. (MARION, 1993).

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RSPResumoResumenAbstract

Reforma administrativa: o caso do Reino UnidoAndrea Moraes Alves e Marcelo Ernandez Macedo

O artigo apresenta uma análise das principais características da reforma administra-tiva empreendida no Reino Unido a partir da do primeiro governo Thatcher em 1979.Inicialmente, são descritos dois aspectos peculiares que, segundo os autores, explicam aintensidade das reformas administrativas aí empreendidas: seu sistema político, no qualsobressai sobremaneira a alta capacidade decisória do Executivo, e as debilidades de seusistema administrativo, alvo de críticas reiteradas desde o Relatório do Comitê Fulton,publicado em 1968. A partir disso, os autores descrevem três fases recentes na reformaadministrativa inglesa pós-Thatcher. Nesta descrição, são enfocadas as principais carac-terísticas e experiências inovadoras adotadas, enfatizando, entre outros: 1) os chamados“escrutíneos de Rayner”; 2) os sistemas de informações gerenciais adotados (ManagementInformation System for Ministers e o Management Accounting System); 3) o programaCitizen’s Charter; 4) o processo de privatização inglês; 5) a experiência de contrataçãoexterna de serviços (com a adoção de instrumentos como a “licitação competitiva”, quepermite aos próprios servidores públicos apresentarem propostas para prestação deserviços em competição com as empresas privadas, além dos sistemas Market Testing eCompeting for Quality) e, por fim; 6) a política de gestão de recursos humanos, comdestaque para o forte processo de demissões no serviço público, o sistema de avaliaçãode desempenho dos funcionários e de remuneração por performance adotados no ReinoUnido.

Reforma administrativa: el caso del Reino UnidoAndrea Moraes Alves y Marcelo Ernandez Macedo

El artículo presenta un análisis de las principales características de la reforma admi-nistrativa emprendida en el Reino Unido a partir del primer gobierno Thatcher, en 1979.

Inicialmente se describen dos aspectos peculiares que, según los autores, explican laintensidad de las reformas administrativas que se emprendieron allí: su sistema político,en el que sobresale notablemente la alta capacidad decisoria del Poder Ejecutivo, y lasdebilidades de su sistema administrativo, blanco de críticas reiteradas desde el Informedel Comité Fulton, publicado en 1968. A partir de ello, los autores describieron tres fasesrecientes en la reforma administrativa inglesa post-Thatcher. En dicha descripción seenfocan las principales características y experiencias innovadoras adoptadas, enfatizando,entre otros 1) los llamados “escrutinios de Rayner”: 2) los sistemas de informacionesgerenciales adoptados (Management Information System for Ministers y el ManagementAccounting System); 3)el programa Citizen’s Charter; 4) el proceso de privatizacióninglés; 5) la experiencia de contratación externa de servicios (con la adopción de instru-mentos como la “licitación competitiva”, la cual permite que los propios servidorespúblicos presenten propuestas para la prestación de servicios, compitiendo con lasempresas privadas, además de los sistemas Market Testing y Competing for Quality; y,por último; 6) la política de gestión de recursos humanos, realzándose el fuerte procesode despidos en el servicio público, el sistema de evaluación del desempeño de los empleadosy de remuneración según su performance, adoptados en el Reino Unido.

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 3Set-Dez 1997

Marcelo émestre emadministraçãopública EBAP/FGV/RJe especialistaem políticaspúblicas egestão gover-namental noMinistério daEducação e doDesporto.Andrea ésociólogae professora daUniversidade deBrasília —UnB

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RSPAdministrative reform: the UK experienceAndrea Moraes Alves and Marcelo Ernandez Macedo

This article analyses the main features of the administrative reform undertaken in theUnited Kingdom as of the first Thatcher Administration in 1979. Firstly, two specificaspects are described in order to explain the comprehensiveness of the administrativereforms carried out in the UK, namely its political system, in which the ExeceutiveBranch’s high decison-making capability is particularly prominent, and the weaknessesof its administrative system, the target of repeated criticism since the Fulton CommitteeReport, published in 1968. Based on these points, a description is made regarding threerecent phases in the post-Thatcher British administrative reform. The main features andinnovative experiences are addressed, with special emphasis on 1) the so called Raynerscrutinies; 2) the management information systems used (Management InformationSystem for Ministers and Management Accounting System); 3) the Citizen’s Charterprogram; 4) the British privatization system; 5) the experience in contracting out services(through instruments such as competitive tendering, which allows civil servants themselvesto advance proposals for services provision in competition with private companies, inaddition to the Market Testing and Competing for Quality systems, and, finally, 6) thehuman resources management policy, underscoring the strong lay-off process in the civilservice, the employee performance assessment and performance-based pay system usedin the United Kingdom.

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RSP

Revista doServiçoPúblico

Ano 48Número 2Mai-Ago 1997

1. Introdução

Este é um documento sobre o papel dos sindicatos na promoção dareforma do setor público. Boa parte da literatura trata os sindicatos dosetor público como organizações rent-seeking, que tentam alcançar ganhosprivados às expensas dos benefícios públicos (e do Tesouro Nacional) (LOWI,1969; OLSON, 1982). Os sindicatos do setor público têm sido difamados, acu-sados tanto de bloquear vários esforços de reforma (CHUBB e MOE, 1992)quanto de ameaçar a legitimidade de instituições governamentais (MCCONNELL,1966). Resulta disso que uma reforma bem-sucedida só poderia ocorrer casoos sindicatos fossem evitados ou abolidos (PIERSON, 1994; 1996).

Este documento desenvolve um argumento alternativo. Através doestudo de caso da recente reforma no sistema de pensão italiano, vamosargumentar que os sindicatos podem ter um papel positivo na reforma dosetor público. Como em muitos outros países, os sindicatos italianos resis-tiram durante anos aos esforços de redução de benefícios sociais estataise de reforma do sistema de aposentadoria. Tais benefícios eram vistoscomo “direitos adquiridos”, produto de uma luta intensa durante as grevesdo Outono Quente de 1969. Ainda em tempo, a posição dos sindicatositalianos mudou. Mudou por várias razões — não somente pelo óbvio einsuportável custo do sistema vigente — mas principalmente porque elesforam convidados a integrar o processo de reforma. Em outras palavras,ao invés de serem colocados de lado ou derrotados durante aimplementação da reforma, os sindicatos italianos foram incluídos nasdiscussões/decisões relativas ao custo do sistema vigente e das alternati-vas de reforma propostas.

Reforma do setor público eparticipação sindical: o caso do

sistema de pensão italiano1

Lucio BaccaroRichard M. Locke

Baccaroé estudante dePhD doDepartamentode CiênciaPolítica eLocke éprofessorassociado derelaçõesindustriais eciênciapolítica doMassachussettsInstitute ofTechnology

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RSPEsse processo de participação não dependia somente das liderançasdos sindicatos. Seus membros ordinários também foram envolvidos no pro-cesso de reforma, através de um processo sistemático de consulta. Defato, esse processo foi a chave do esforço da reforma, pois gerou o apoiodas fileiras dos sindicatos à reforma e, conseqüentemente, garantiu a capa-cidade das lideranças dos sindicatos de manterem seu papel de negocia-ção. Em outras palavras, como o processo de reforma foi acompanhado deum extenso processo interno de deliberação, debate e eventualmente, vo-tação, os sindicatos foram capazes de superar a oposição de muitos gruposde trabalhadores e abraçar a reforma. O processo de deliberação e tomadade decisão democrática foi importante não somente porque agregou inte-resses existentes em torno de uma coalizão pró-reforma, mas também, etalvez o mais importante, porque contribuiu para o delineamento das váriaspreferências. Discussões e deliberações exaustivas dos sindicatos permiti-ram que eles mesmos filtrassem as preocupações mais particularísticas eabraçassem posições que acabaram mostrando-se benéficas para o bem-estar comum (BACCARO, 1996). Acreditamos que a experiência italiana coma reforma do sistema de pensão fornece lições importantes para o processode reforma do setor público em outras áreas, e também para outras nações.

O presente documento é dividido em quatro partes. Inicialmente,descrevemos o sistema de pensão italiano altamente fragmentado edisfuncional e como ele chegou a provocar sérios problemas econômicose distributivos no início desta década. Em segundo lugar, revisaremosvárias tentativas de reforma do sistema de pensão. Em terceiro,revisitaremos os esforços reformistas mais recentes — os quais incluemtanto a participação dos vários sindicatos nas negociações quanto asconsultas aos seus membros — explicando como este processo mais in-clusivo contribuiu para o sucesso da reforma. Concluímos, analisando aslições mais gerais, que este estudo de caso pode fornecer as tentativas dereforma no futuro.

2. O sistema italiano de pensão: da expansão à crise

O sistema italiano de pensão esteve entre os mais complicados einequitativos da Europa (DE CECCO e PIZZUTI, 1994). Camadas de legisla-ção particularista criaram um sistema altamente particularista, repleto deprovisões especiais e regras para as diferentes categorias trabalhistas.Historicamente, servidores públicos beneficiaram-se mais desse sistema,mas com o passar do tempo, os trabalhadores do setor privado tambémconseguiram melhorar seus benefícios. Por exemplo, em março de 1968,as três principais confederações, a Confederazione Generale Italianadel Lavoro (CGIL), a Confederazione Italiana Sindacati Lavoratori

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RSP(CISL) e a Unione Italiana Lavoratori (UIL) pressionaram o governoitaliano para aprovar uma reforma nas pensões que aumentasse a chamadataxa de reposição (isto é, a proporção entre os benefícios da pensão e oúltimo pagamento) de 40 para 65% para os trabalhadores que haviampago suas contribuições à previdência social durante 40 anos.2 Um anomais tarde, novas pressões das confederações (que organizaram duasgreves gerais, em novembro de 1968 e fevereiro de 1969) induziram ogoverno italiano à aprovação de novas e mais generosas modificaçõesnas pensões estatais. A taxa de reposição foi elevada de 65 para 74%, eas aposentadorias foram indexadas aos preços, para salvaguardar seupoder aquisitivo (ver TURONE, 1992: 359-62).3 Essas modificações, ao in-vés de abolirem os privilégios concedidos em anos anteriores aos trabalha-dores do setor público, acabaram por estender alguns dos benefícios dosistema a trabalhadores da iniciativa privada.

Como resultado de tantas leis e provisões, o sistema italiano depensão tornou-se altamente fragmentado e particularístico. Havia 47fundos de pensão, todos caracterizados por diferentes regras para adeterminação dos benefícios. A grande maioria das pensões (85%) erapaga pelo Istituto Nazionale della Previdenza Sociale (INPS); o res-tante, incluindo as pensões dos empregados do Estado, por um punhadode outras instituições. Mesmo no INPS, havia uma multiplicidade defundos de pensão especiais, que amparavam várias categorias de tra-balhadores. A idade mínima para aposentadoria dos trabalhadores daindústria era menor do que em todos os países ocidentais (60 anos parahomens e 55 para mulheres) (ver OIT, 1989: Tabela 18, p. 84). Os be-nefícios de pensão eram ligados não ao valor acumulado das contribui-ções, e sim à remuneração recebida anteriormente. Além do mais, ha-via diferenças marcantes na taxa de reposição entre as várias categori-as de trabalhadores. Por exemplo, no início dos anos 90, a proporção desubstituição era de 73% para trabalhadores da indústria e de 100% paraempregados de governos municipais e funcionários do sistema de saúde(ver PIZZUTI, 1994:98). Os índices de contribuição para a previdênciasocial também variavam enormemente entre as categorias de trabalha-dores e muitos dos fundos de pensão dos agricultores, artesãos ecomerciários — categorias com contribuições sociais muito baixas —foram amplamente subsidiados pelo estado (via o chamado integrazioneal minimo). (Para uma descrição mais detalhada das diferenças, verTabela 1).4 O resultado destas diferenças era uma variação tremendano valor médio das pensões entre diferentes grupos de trabalhadores(ver Tabelas 2 e 3).

Talvez a peculiaridade mais surpreendente do sistema italiano, etambém sua maior fonte de disparidades, era a chamada “pensão porantigüidade” ( pensione di anzianita). Originalmente introduzida em 1956

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RSPpara empregados do serviço público, as “pensões por antigüidade” foramconcedidas também aos trabalhadores da indústria, quase no final da dé-cada de 60. Pensões por antigüidade permitiam que os trabalhadores seaposentassem mesmo antes de atingirem a idade mínima para aposenta-doria, desde que eles tivessem contribuído para suas pensões por umdeterminado número de anos. Aqui, novamente, esse número variava muitoentre cada categoria: de 35 anos para operários da indústria a 20 anospara servidores públicos do sexo masculino e 15 anos para servidorespúblicos do sexo feminino que fossem casadas ou com filhos. Isto significa-va que uma datilógrafa, que começasse a trabalhar aos 20 anos de idadeem um dos tantos ministérios em Roma, poderia começar a receber seusbenefícios de pensão com 35 anos.5

As pensões por antigüidade significavam uma carga particularmentepesada para o estado, por serem pagas a pessoas relativamente jovens,com longa expectativa de vida6 e dependerem menos do valor das contribui-ções pagas do que dos salários recebidos durante os últimos anos dacarreira dos trabalhadores. Do ponto de vista da equidade, pensões porantigüidade não somente criavam diferenciações injustificadas entre gru-pos trabalhistas ao estabelecer condições desiguais de aposentadoria, comotambém (como outras pensões de idade avançada) favoreciam clara-mente aqueles que haviam começado a trabalhar muito jovens. Isto por-que, apesar de possuírem os mesmos valores de contribuições acumula-das, estes aposentados precoces recebiam benefícios por períodos detempo maiores.7

Somando-se a essas onerosas peculiaridades, o sistema de pensãoitaliana também sofria de outros problemas, comuns a outros sistemaseuropeus e ocidentais, baseados em esquemas de “pagamento na ativa”(“pay-as-you-go” ou PAYG).8 Tais sistemas baseiam-se em um pactoentre gerações, onde a população produtiva doa parte de seus saláriospara sustentar a população aposentada. A população produtiva aceitaeste ônus, pois espera ser sustentada, por sua vez, pelas futuras geraçõesprodutivas.9 Um sistema de pensão baseado no mecanismo de PAYG éextremamente vulnerável a choques econômicos ou mudanças demográ-ficas. À medida que, com o passar do tempo, haja mais ou menos a mes-ma proporção entre trabalhadores ativos e aposentados, o sistema PAYGdistribui custos de forma igualitária entre gerações diferentes. Entretanto,tão logo a estrutura de idade comece a mudar, de forma que haja, propor-cionalmente, mais aposentados que pessoas produtivas, a taxa de contri-buição da previdência social, necessária à geração ativa para sustentar amanutenção do sistema de pensão em equilíbrio financeiro, torna-se insu-portavelmente alta.

Outro problema com o sistema PAYG é que ele cria incentivospara decisões políticas “míopes”. Quando a proporção entre população

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RSPativa e aposentada é alta (como ocorreu nos anos 60 e 70 na Itália, emdecorrência dos efeitos do baby boom), torna-se praticamente irresistívelpara legisladores aumentarem os benefícios de pensão dos aposenta-dos, e/ou aumentarem o número de beneficiários, mantendo inalteradas(por vezes até reduzindo) as contribuições para a previdência social.10

Os efeitos dessas medidas no equilíbrio da folha do sistema de pensãopodem manter-se invisíveis por muitos anos.11 Porém, uma vezintroduzidas, as generosas modificações tornam-se dificilmente rever-síveis, visto que passam a ser percebidas como “direitos adquiridos”.Pessoas fazem planos baseados nas suas expectativas de renda, e ébastante natural que elas resistam a tentativas, mesmo que justificadas,de encurtar sua renda mensal no futuro. Esta situação de “decisão po-lítica míope” caracterizou a política das pensões na Itália durante osanos 60 e 70. De 1960 a 1975, os benefícios reais dos pensionistascresceram em média 6,5% ao ano. De 1975 a 1981 eles cresceramainda mais: 8,2% por ano (OIT, 1989: Tabela 2.2:99).

Esta situação começou a mudar na década de 80: váriasmodificações demográficas e econômicas desafiavam a estabilidade fi-nanceira dos sistemas de pensão, tanto na Itália quanto em outros paísesocidentais. Devido ao declínio das taxas de fertilidade e ao crescimentoda expectativa de vida, a composição da idade da população começou amudar drasticamente, de forma que menos pessoas jovens estavam sen-do responsáveis por sustentar uma fração crescente de pessoas maisvelhas e inativas. Na Itália, o envelhecimento da população tornou-separticularmente severo. No início dos anos 90, o número de filhos pormulher era 1,26 menor que em todos os outros países (ver CAZZOLA,1995;12). A essas tendências demográficas combinaram-se outras mu-danças econômicas: o crescimento do desemprego reduziu o número detrabalhadores ativos, que contribuíam para o sistema de pensão, ao passoque o aumento na idade dos novos ingressantes no mercado de trabalho(devido tanto pelo aumento dos anos de formação escolar quanto peloalto índice de desemprego entre jovens) diminuiu a média do período decontribuição. Como resultado desses acontecimentos, o equilíbrio entretrabalhadores ativos e aposentados desabou. Dentro do Fondo PensioniLavoratori Dipendenti (FPLD) (o maior fundo de pensão administradopelo INPS), essa proporção caiu de 2,62, em 1963, para 1,1 em 1994(CAZZOLA, 1995:10).

Após esta mudança, somente pela adoção de uma das três opçõespolíticas poderia ser mantido o equilíbrio financeiro do sistema de pensão:1) o aumento das contribuições da previdência social; 2) a redução médiados benefícios da pensão ou 3) o aumento das transferências do Tesouropara o sistema de pensão. As duas primeiras opções eram politicamentedifíceis, pois implicavam em responsabilizar grupos sociais específicos pelo

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RSPpagamento da dívida do sistema de pensão. A opção três significava que estadívida estava sendo de facto transferida para os ombros das futuras gera-ções (já que o aumento dos gastos públicos era financiado via déficit pú-blico e não através de novos impostos). Desnecessário dizer, os políticositalianos optaram pela terceira opção. Entre 1973 e 1994, o débito doINPS com o Tesouro italiano aumentou de 776 para 129.071 bilhões deliras (ver CAZZOLA, 1995:16).12

Desde o final da década de 70, virtualmente todo governo italia-no tinha se empenhado pela reforma do sistema de pensão. (Para umabreve descrição de cada um dos diferentes projetos de reforma, verTabela 4). Os vários projetos apresentavam algumas característicascomuns: todos tentaram aumentar a idade mínima para aposentadoria(para 65 anos para homens, e 60 anos para mulheres); todos propuse-ram limitar, por vezes eliminar, gradualmente, as “baby pensions”(isto é, pensões por antiguidade depois de 20 ou 15 anos de segurosomente) para empregados do serviço público; todos tentaram au-mentar o intervalo de tempo com base no qual a chamada remunera-ção pensionável era calculada;13 e finalmente, todos tomaram provi-dências para a introdução de esquemas de pensão suplementares,gerenciados por companhias financeiras privadas (como o projeto DeMichelis, por exemplo) ou pelo estado (como era o projeto Donat-Cattin).14 Ainda assim, nenhum dos projetos de reforma chegou a vera luz do dia. Ao contrário, foram todos bloqueados por uma aliançapeculiar (conhecida como triângulo de ferro) entre membros da Co-missão Parlamentar da Reforma do Sistema de Pensão (filiados tantoao partido majoritário quanto à oposição), vários grupos de interesse egerentes do INPS (ver REGONINI, 1995). Na verdade, a única reformalegislativa aprovada durante os anos 80 aumentava, ao invés de redu-zir, os benefícios das pensões.15

3. Três tentativas de reforma (1992-95)16

3.1. O Plano de Emergência Amato

Os esforços para enfrentar seriamente os problemas começaramem 1992, na gestão do primeiro-ministro Amato. Confrontado com umaséria crise política e econômica,17 o governo Amato lançou (com o apoiodas três principais confederações — CGIL, CISL e UIL) um plano deemergência que incluía, entre outras medidas, a abolição da scala mobile(gatilho salarial); mudanças importantes no sistema fiscal, como por exem-plo, a introdução do que ficou conhecido como imposto mínimo, que visavareduzir a evasão fiscal por parte dos pequenos comerciantes e autônomos;

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RSPe uma detalhada reforma no sistema de pensão. O objetivo principal des-se plano de emergência era a redução da dívida e do déficit público, he-ranças da burguesia italiana, na esperança de que isso restaurasse a con-fiança na lira nos mercados financeiros internacionais.18

A reforma do sistema de pensão de Amato pretendia:1) aumentar a idade mínima de aposentadoria para 65 anos para

homens e 60 anos para mulheres;2) aumentar de 5 para 10 anos o período utilizado como base de

cálculo para as remunerações pensionáveis;3) limitar a indexação das pensões (os benefícios das pensões não

seriam mais indexados aos salários, somente aos preços);4) padronizar os requisitos para pensões por antiguidade;19 e

finalmente5) atrasar por um ano as autorizações para pagamento de pensões

por antigüidade para trabalhadores que tivessem pago seus 35 anos deseguro. Foi estimado que a reforma iria reduzir as despesas com as pen-sões em 11,2 trilhões de liras em 1993, 15 trilhões de liras em 1994, e em20 trilhões de liras em 1995. Graças a esses cortes, os gastos do maiorfundo de pensão italiano, o Fondo Pensioni Lavoratori Dipendenti(FPLD) do INPS baixariam de 9.7 para 5.8% do PIB em 2025.20

Curiosamente, apesar desses cortes substanciais, os sindicatos nãose opuseram à reforma Amato. Eles tampouco convocaram greves, ape-sar de perceberem claramente o sentimento de inquietação que reinavaem suas próprias fileiras.21

Apesar de transformar significativamente o sistema de pensão ita-liano, a Reforma Amato deixou sem solução vários problemas fundamentais(ver CASTELLINO, 1996). Primeiro, mesmo quando inteiramente implemen-tada, a reforma manteria as diferentes idades mínimas para aposentado-ria de homens (65) e mulheres (60). Essa diferença, somada à maiorexpectativa de vida das mulheres, era tanto inequitativa quanto cara. Emsegundo lugar, mesmo tendo reformado algumas das disparidades vigentes(por exemplo, padronizando as exigências para as pensões por antigüida-de), o sistema italiano ainda fragmentava-se numa pluralidade de fundos,com diferentes regras e taxas de contribuição. Terceiro, a reforma Amatodeixou intocável a peculiar pensão por antigüidade italiana. Por último, etalvez o mais importante, a reforma Amato criou incentivos perversospara que os trabalhadores se aposentassem o mais cedo possível. Porexemplo, caso um trabalhador se aposentasse com 65 anos, após 43 anosde contribuição, receberia 23% a menos do que receberia se o fizessecom 57 anos de idade, tendo contribuído durante 35 anos.22 Tais incentivos,somados à possibilidade de aposentadoria após 35 anos de trabalho, contri-buíram para eliminar muitas das vantagens conquistadas pelo aumento dolimite para pensões de idade avançada.

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RSP3.2. O decisionismo de Berlusconi

Uma segunda tentativa de reforma foi lançada pelo governo decentro-direita de Silvio Berlusconi em 1994. Berlusconi não era favorávelao apoio dos sindicatos. Além disso, ao contrário de Amato, durante suacampanha eleitoral, ele comprometeu-se a reduzir a gigantesca dívidapública da Itália (bem acima dos 100% do PIB) sem aumentar a arreca-dação de impostos, somente com a redução de despesas. No entanto, asmedidas orçamentárias adotadas pelos governos anteriores deixavampouco espaço para cortes adicionais. Como resultado, ficou claro queeconomias no orçamento teriam de vir de um novo arrocho no sistema depensão. Rumores de que o governo Berlusconi planejava uma profundareconfiguração do sistema de pensão provocaram um aumento (de 84%)no número de solicitações de pensões por antigüidade (CAZZOLA, 1995:80).

O governo Berlusconi propôs as seguintes modificações no sistemade pensão:

1) uma rápida elevação da idade mínima para aposentadoria;2) em seguida, uma desindexação das pensões (elas deveriam ser

indexadas a uma inflação programada, menor que a inflação real);3) uma redução na taxa de aumento dos benefícios das pensões de

2 para 1.75% por ano;4) cortes nas pensões por antigüidade iguais a 3% para cada ano

que precedesse a idade mínima para aposentadoria.23

Por meio desses ajustes propostos, o governo Berlusconi pretendiaenviar um sinal claro à comunidade financeira internacional de que eracapaz de lidar pronta e eficientemente com os problemas macroeconômi-cos do país. Berlusconi esperava que esta atitude decisionista restauras-se a boa sorte da lira nos mercados internacionais. Apesar de as trêsconfederações (CGIL, CISL e UIL) terem declarado repetidamente quenão eram necessariamente contrárias à reforma, e terem demonstradosua boa-vontade e capacidade de cooperar com os governos anteriores, ogoverno Berlusconi, apoiado por uma associação de empresários, aConfindustria, deliberadamente manteve-as à margem.

Em resposta, as mesmas três confederações mobilizaram-se contraa proposta de reforma. Em 14 de outubro de 1994, organizaram umagreve geral de quatro horas, junto às demonstrações massivas nas ruasem todas as grandes cidades, em protesto contra o plano do governo.Estima-se que três milhões de trabalhadores participaram da greve. Quandoo governo Berlusconi recusou-se negociar com os sindicatos a respeitoda reforma do sistema de pensão, elas organizaram uma nova demons-tração de massa em Roma, em 12 de novembro do mesmo ano, desta vezcom a participação de cerca de 1,5 milhão de pessoas. Desde o OutonoQuente não se via tamanha mobilização de trabalhadores na Itália.24

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RSPTambém como no Outono Quente, trabalhadores e seus sindicatos acolhe-ram em suas fileiras milhares de estudantes, que protestavam contra aspropostas de mudança do sistema educacional. A esse protesto nacionalseguiu-se outro, dias depois, com greves limitadas em várias fábricas ecidades em todo o país.

Devido a essas mobilizações massivas, a coalisão parlamentar queapoiava o governo Berlusconi começou a desgastar-se. A Liga Norte jun-tou-se aos partidos de oposição, apoiando uma emenda legislativa que restau-rava a taxa anual de 2% de aumento das pensões. Mesmo a Confindustriasolicitou ao governo que reatasse o diálogo com os sindicatos de comércio.Os empregadores temiam que a atmosfera de confronto social intenso,provocada pela reforma do sistema de pensão, afetasse negativamente asrelações industriais na empresa e/ou em determinados níveis das fábricas.As três confederações continuaram a pressionar o governo, proclamandouma nova greve geral de oito horas para o dia 2 de dezembro de 1994. Navéspera, à noite, o governo assinou um acordo com as confederações e agreve foi cancelada. As medidas mais importantes da reforma foram reti-radas da Lei Orçamentária para 1995, para serem discutidas durante nego-ciações tripartite entre o governo, a Confindustria e as três principaisconfederações. Alguns dias depois de capitular as pressões, o governoBerlusconi apresentou sua renúncia.

3.3. Finalmente a reforma: o pacto deDini com os sindicatos

Após a queda do gabinete de Berlusconi, as três confederações enga-jaram-se em um novo conjunto de negociações com o governo tecnocratadirigido por Lamberto Dini.25 Em maio de 1995, após três meses de negocia-ções, um acordo sobre a reforma do sistema de pensões foi assinado eenviado para aprovação do Parlamento. O Parlamento aprovou a nova lei(Lei no 335/95) sem modificações substanciais, no dia 8 de agosto de 1995.

A nova reforma introduziu várias inovações estruturais no sistemaitaliano de pensão:

1) criava uma separação clara entre programas de seguro (ou seja,as pensões) e de assistência (por exemplo, benefícios de desemprego).Os primeiros deveriam ser financiados por contribuições à previdênciasocial, deduzidas dos salários e vencimentos; os últimos seriam pagospelo sistema geral de impostos.26

2) introduzia um novo sistema de cálculo dos benefícios de pensão,não mais baseado (como antes) na remuneração prévia, mas sim no valordas contribuições pagas por cada trabalhador.27

3) estabelecia o encerramento gradual das pensões por antigüidadee a criação de uma aposentadoria por idade flexível, dos 57 aos 65 anos.

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RSPCada trabalhador (homem ou mulher), desde que segurado por, pelo menos,cinco anos, poderia aposentar-se a partir dos 57 anos de idade. O valordas pensões, no entanto, dependeria diretamente do valor das contribuiçõesacumuladas. Deste modo, aqueles que tivessem períodos de contribuiçãomais longos receberiam pensões maiores. Além disso, a reforma estabele-cia multas para aqueles que se aposentassem antes dos 65 anos. Essasmultas equivaliam a aproximadamente 3% para cada ano antes dos 65anos. Assim, a multa de 3%, tão amargamente contestada pelos sindicatos,quando proposta por Berlusconi, era reintroduzida na Reforma Dini comapoio dos sindicatos (ver CASTELLINO, 1996: 187).28

4) o novo sistema unificava os vários esquemas de pensão para asdiferentes categorias trabalhistas. As contribuições foram uniformemen-te estabelecidas em 32% para todas as categorias de trabalhadores dosetores público e privado, e em 15 ou 16% para os autônomos.29

5) finalmente, estabeleceu-se uma estrutura para a criação de fun-dos suplementares de pensão, administrados pela iniciativa privada, combase em esquemas de financiamento integral. Muitos dos detalhes relati-vos à constituição destes novos fundos de pensão foram encaminhadospara negociação coletiva entre as partes envolvidas (sindicatos, empre-gadores e cooperativas). O governo estipulou, no entanto, algumas dire-trizes importantes, referentes à possibilidade do financiamento dessesfundos suplementares com parte das reservas acumuladas para o paga-mento de indenizações (conhecido como Trattamento di Fine Rapporto— TFR) e o abatimento parcial desses fundos do imposto de renda.30

A nova reforma estrutural do sistema de pensão criou incentivosclaros, para que os trabalhadores adiassem suas aposentadorias, aumentan-do dessa forma a entrada de capital por períodos de contribuição maislongos, ao mesmo tempo que reduzia a saída de capital limitando os paga-mentos da pensão para poucos anos.

Apesar de tudo, a implementação da Reforma Dini não aconteceusem dificuldades. No início do processo, a Confindustria retirou-se dasnegociações, negando-se mais tarde a assinar o acordo. A Confindustriaopunha-se à reforma, argumentando que ela não incluía reduções (defato, provocava até um ligeiro aumento) nas contribuições para a previdên-cia social (pagas, na sua maioria, pelos empregadores, e constituindo umaporção razoável dos custos laborais), e porque muitas das maiores e maisdiversificadas companhias representadas pela Confindustria esperavamampliar seu controle dentro do promissor mercado de fundos de pensãoprivados. Essas companhias argumentavam que uma reforma que garantiao pagamento de pensões equivalentes a, em média, 65% dos vencimentos,não deixava muito espaço para a constituição de fundos suplementaresprivados. Curiosamente, a redução de gastos prevista pela Reforma Diniera mais ou menos comparável àquela projetada pelo (fracassado) projeto

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RSPde Berlusconi (ver Tabela 5). As principais diferenças estavam na fontedos cortes. Enquanto a proposta de Berlusconi concentrava sua economiana redução de pensões por antigüidade, a Reforma Dini distribuía os custosdo arrocho entre uma base social maior (ver Tabela 6).31

Mas talvez a maior surpresa de todas seja o fato de uma reformaestrutural tão drástica ter realmente acontecido, especialmente consi-derando-se a extrema heterogeneidade dos interesses afetados.32

Empregados do setor público foram privados de todos os seus privilégiosespeciais. No setor de serviços, havia vários grupos de trabalhadoresque não poderiam mais contar com normas particularísticas utilizadasna determinação dos seus benefícios. Empregados do setor elétrico,por exemplo, tinham uma taxa de aumento de pensões de 3% ao ano, aoinvés dos 2% dos outros trabalhadores. Motoristas de ônibus tinhamsuas pensões calculadas com base numa remuneração pensionável queincluía somente os últimos seis meses de trabalho, e não os últimoscinco anos, e beneficiavam-se de uma taxa de aumento de 2,5%.33 Paratodos esses grupos, as regras foram unificadas. Mesmo nos setoresindustriais, os interesses eram diversificados. Trabalhadores do ramotêxtil, predominantemente do sexo feminino, tinham sido historicamentecontrários a todas as tentativas de aumento da idade pensionável paramulheres (ver REGONINI, 1990:353). Metalúrgicos, na sua maioria ho-mens de meia-idade, eram veementemente contra qualquer quebra daregra dos 35 anos para as pensões por antigüidade. Outros trabalhadores,como os do ramo da construção civil, estavam dispostos a abrir mão daspensões por antigüidade (a natureza descontinuada de seus empregosdificultava o acúmulo de 35 anos de contribuição), mas pretendiam man-ter inalterado o valor das pensões por idade. Como conciliar tantos inte-resses conflitantes? E por que os sindicatos italianos teriam concordadocom mudanças tão profundas no sistema de pensão?

4. A agregação de interesses pela via da decisão democrática

À primeira vista, a reforma do sistema de pensão italiano de 1995parece aproximar-se do clássico esquema neocorporativista, onde as polí-ticas sociais eram negociadas entre o governo e os aliados sociais. Segundovários autores, esta modalidade de decisão conjunta aumenta tanto a facti-bilidade quanto a legitimidade das políticas públicas (ver SCHMITTER, 1981;LEHMBRUCH, 1979). No entanto, a reforma italiana difere em grande partedo modelo neocorporativista, quando se considera o processo através doqual a agregação/intermediação de interesses foi alcançada. Ao contráriodas previsões da teoria neocorporativista, os sindicatos italianos pretendiamresolver os múltiplos conflitos surgidos a partir de suas formações, não

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RSPadotando estruturas hierárquicas de tomada de decisão, mas sim promo-vendo a discussão democrática entre diferentes grupos de trabalhadores.

Segundo grande parte da literatura sobre o processo decisório neo-corporativista, quando os sindicatos buscam representar bases diversas (ouseja, trabalhadores com aptidões distintas, empregados em setores diferen-tes), acabam engajando-se em uma negociação difícil entre o interesseparticular e o geral (REGINI, 1981). Por outro lado, sua preocupação com odesempenho econômico nacional encoraja-os a elaborar agendas de negocia-ção que tomam em consideração várias dificuldades macroeconômicas.Além do mais, eles subexploram o poder do mercado pelo menos de algunsgrupos trabalhistas. Como resultado dessas pressões conflitantes, o augedas discussões geralmente promove uma dissidência interna e uma fragmen-tação na organização dos sindicatos.34

A necessidade de isolar as lideranças trabalhistas dessas forçascentrífugas explica a importância que virtualmente todos os autores atri-buem a certas características organizacionais, tais como hierarquiainterna, centralização e monopólio da representação.35 Medidas comoreconhecimento legal, filiação compulsória, cobrança automática de dívi-das do sindicato são planejadas para evitar a saída dos trabalhadores desuas fileiras (OFFE, 1981). O acesso direto a fundos públicos fornece àslideranças trabalhistas recursos provenientes diretamente do Estado,tornando-as independentes do apoio voluntário de seus membros (LANGE,1984). Finalmente, a hierarquia organizacional e a centralização da tomadade decisão nas mãos de um limitado número de líderes sindicais restrin-gem a possibilidade de membros externarem suas preocupações.36

No entanto, a proteção da competição exterior e a obstrução dequalquer dissidência interna não se mostrou suficiente no sentido de evitara deslegitimação das hierarquias dos sindicatos e/ou de prevenir sua frag-mentação. Na Suécia, por exemplo, o considerável poder organizacionalexercido pela poderosa confederação operária Landsorganizationen iSverige (LO) sobre seus afiliados na indústria não evitou (talvez tenha atéimpulsionado) o surgimento de clivagens múltiplas entre os vários gruposde trabalhadores: especializados versus não especializados, homens versusmulheres, artesãos versus escriturários, empregados do setor privado versusempregados do setor público. Tais acontecimentos levaram ao colapso danegociação centralizada (MARTIN, 1992; PONTUSSON e SWENSON, 1993).

Na Itália, os esforços para que fossem introduzidas as pré-condiçõesinstitucionais para a tomada de decisão neocorporativista, através da cen-tralização de estruturas dos sindicatos, na verdade, aumentaram a frag-mentação e a descentralização das relações industriais.37 Inúmeras catego-rias trabalhistas (principalmente trabalhadores mais especializados do setorpúblico) sentiram que suas demandas eram pouco valorizadas pelos sindi-catos hierarquicamente organizados. Na segunda metade dos anos 80,

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RSPesses trabalhadores começaram a desertar e criaram suas próprias organi-zações autônomas (chamados sindacati autonomi ou comitati di basi —COBAS). Com seu agressivo comportamento nas negociações e o fre-qüente recurso da greve, essas novas organizações aumentaram a anar-quia e o conflito nas relações industriais italianas (LOCKE e BACCARO, 1996a).

O fracasso das práticas tradicionais neocorporativistas, tanto naItália como no exterior, influenciou visivelmente a liderança trabalhistaitaliana, à medida que estas passaram a participar das negociações so-bre a reforma do sistema de pensão. As confederações estavam cons-cientes de que arriscavam comprometer sua coesão interna, visto que areforma impunha perdas significativas para muitos grupos de trabalha-dores. Desta forma, elas resistiram à tentação de negociar com o go-verno “a portas fechadas” e, por sua vez, engajaram-se na que pode serconsiderada a maior experiência no terreno da democracia dos sindica-tos italianos.38

Em outras palavras, depois de elaborar sua posição na reforma dosistema de pensão, as três confederações consultaram suas bases pormeio de assembléias organizadas nas principais fábricas e escritórios emtoda a Itália. Essa consulta, em larga escala, aos membros mostrou quehavia grandes grupos de trabalhadores que se opunham aos cortes indis-criminados nas pensões. Em particular, muitos trabalhadores que participa-vam das assembléias recusavam-se a aceitar que a nova reforma reduzissea possibilidade dos trabalhadores de meia-idade de se aposentarem após35 anos de serviço, ou diminuísse a taxa de aumento das pensões. Emessência, os trabalhadores não queriam reduções generalizadas na taxade reposição, ou seja, a proporção entre a primeira parcela da pensão eo último pagamento.39

As confederações discutiram essas demandas com o governo ejuntos tentaram fazer a distinção entre as solicitações legítimas e as inacei-táveis. Por exemplo, o pedido de aposentadoria precoce seria considera-do justificável se partisse de trabalhadores envolvidos em trabalhos exte-nuantes ou de alta periculosidade,40 mas inaceitável por parte daquelesempregados desempenhando funções burocráticas em escritórios.41 Assim,a reforma de 1995 continha cláusulas especiais para os empregados emlavori usuranti (ou seja, funções monótonas, extenuantes e/ou de altapericulosidade). Tais trabalhadores podiam antecipar suas aposentadoriasem até dois anos. Também para evitar reduções generalizadas no valordos benefícios, a Reforma Dini concentrou as reduções de benefíciossobre aqueles trabalhadores que optassem pela aposentadoria antecipa-da. Por exemplo, um trabalhador de uma indústria que se aposentasseaos 65 anos (idade máxima para aposentadoria), após 43 anos de contri-buição receberia uma pensão 27% maior que no regime anterior. Entre-tanto, se o mesmo operário decidisse aposentar-se aos 57 anos de idade

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RSP(idade mínima para aposentadoria) e com apenas 35 anos de contribui-ção, receberia 12% a menos do que receberia de acordo com o sistemaprévio (ver BANCA D’I TÁLIA , 1994: Tabela 1, p. 17).

Após a primeira tentativa de assinatura do acordo, no dia 8 de maiode 1994, as confederações organizaram uma nova onda de assembléias(cerca de 42 mil) nas principais fábricas e escritórios, e um referendofinal sobre o acordo, realizado entre 30 de maio e 1o de junho de 1995.42

As assembléias eram geralmente estruturadas dessa forma: as liderançasde um sindicato detalhavam o conteúdo do acordo, discutindo ainevitabilidade da reforma, em decorrência das ineficiências e ineqüidadesinerentes ao antigo sistema, e explicando por que projetos alternativos dereforma eram indesejáveis. A essa apresentação seguia-se um debate,onde os trabalhadores perguntavam sobre a sua situação específica, ex-pressavam suas opiniões sobre assuntos morais/distributivos mais impor-tantes, como a necessidade de pensão assegurada para as futuras gera-ções,43 ou apresentavam sugestões de como eliminar as ineqüidadesexistentes (por exemplo, acelerando a transição para um novo regimepara servidores públicos).

Muitas vozes dissidentes foram ouvidas durante esses debates.Embora a Reforma Dini oferecesse uma transição gradual para o novoregime, ela negava a trabalhadores com menos de 28 anos de seguropago seu direito de receber pensões por antigüidade após 35 anos detrabalho. Esta era, em muitos casos, uma parcela crítica de trabalhadores.Muitos deles haviam entrado no mercado de trabalho no final dos anos60, e participado da onda de greves do Outono Quente, entre o final dadécada de 60 e o início dos anos 70 (PIZZORNO et al., 1978; SABEL, 1982).Esses trabalhadores estavam agora aproximando-se do momento daaposentadoria, e viam de forma muito crítica as novas regras que redu-ziam as pensões por antigüidade.44 Suas exigências foram prontamenteendossadas por alguns grupos de sindicatos mais esquerdistas, como oEssere Sindacato (uma facção interna do CGIL) e o Comitati di Basi(COBAS).45 Curiosamente, no entanto, mesmo aqueles trabalhadoresque recusaram o acordo, declararam publicamente, em várias ocasiões,que preferiam externar seu desacordo no interior dos seus sindicatosestabelecidos (e desta forma tentar convencer os colegas) do que de-bandar para outra organização e, desta forma, comprometer a unidadedo movimento trabalhista italiano.46

As 42 mil assembléias foram seguidas de um referendo. Entre 30de maio e 1o de junho de 1995 houve eleições em 49 mil diferenteslocais, em todo o país, incluindo fábricas, escritórios, sedes de sindica-tos e administrações municipais.47 Trabalhadores ativos (sindicalizadosou não), desempregados e aposentados puderam votar. Votaram 4,5milhões de pessoas, e 64% delas aprovaram a reforma (ver Tabela 7).

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RSPOs pensionistas, em peso, votaram a favor do acordo (91%). Esta nãofoi uma surpresa à medida que a reforma limitava somente os benefíciosdos futuros aposentados. Trabalhadores ativos também aprovaram areforma, porém com um percentual menor — 58% (ver Tabela 8). Amaior parte das federações industriais endossou a reforma, apesar deseu nível de apoio variar em setores e regiões. No entanto, na Lombardia,a região mais rica e industrializada da Itália, os trabalhadores ativosrejeitaram a proposta. Além disso, duas categorias trabalhistas impor-tantes, metalúrgicos e professores, também negaram o acordo. Ambasfederações tinham uma longa tradição de militância. Os metalúrgicosrepresentavam uma vanguarda histórica do movimento trabalhista italia-no. Foram eles que, entre o final dos anos 60 e o início da década de 70,iniciaram o movimento Outono Quente de greves. No início dos anos80, sua oposição às políticas salariais solapou a tentativa italiana deestabelecer uma modalidade de decisão política tripartite (GOLDEN, 1988).Os professores também eram extremamente militantes. Em 1986, elesiniciaram uma onda de greves ilegais que estendeu-se rapidamente aoutros setores públicos, como os ferroviários e empregados de trans-portes aéreos (BALDISSERA, 1988; BORDOGNA, 1988; LOMBARDI, 1989).Vários professores desertaram de seus sindicatos e criaram suas própriasorganizações, as chamadas Comitati di Base (COBAS).

Tempos atrás, a oposição de metalúrgicos (sem contar os profes-sores) e da maioria dos trabalhadores da Lombardia teria significado ofracasso da reforma, mas, em função do processo democrático pelo qualela foi discutida e votada, os metalúrgicos e professores acabaram aceitan-do-na. Em suma, a participação dos sindicatos no processo de reformanão levou nem à sua apropriação nem ao seu fracasso, mas garantiu oapoio político necessário para seu sucesso.

5. Considerações finais

Este documento descreveu os recentes esforços por uma reformano sistema de pensão italiano. O processo ilustrou dois pontos distintos,mas interligados. O primeiro refere-se ao papel potencial dos sindicatosna reforma do setor público. O segundo, enfoca a importância da delibera-ção democrática no desenho das preferências políticas.

Contrariando muito do que já se escreveu sobre a reforma do setorpúblico/estado de bem-estar, que invariavelmente receita o isolamentodos decisores governamentais das pressões de grupos de interesse, aexperiência italiana demonstra que os sindicatos podem desempenhar umpapel positivo na promoção da reforma. Para tanto, porém, eles devemparticipar do processo de reforma. Na Itália, sindicatos resistiram durante

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RSPanos às mudanças no sistema de pensão. Os benefícios vigentes haviamganhado o status de benefícios adquiridos e eram, assim, defendidos por todosos meios. Conseqüentemente, todos os repetidos esforços em direção a umareforma no sistema italiano de pensão, durante toda a década de 80, foramderrubados. No entanto, assim que foram convidados pelo governo Dini aparticipar do processo da reforma, os sindicatos conseguiram superar a opo-sição às medidas e apoiar a reforma.

A participação envolveu não só as lideranças trabalhistas quenegociaram as várias mudanças com altos funcionários do governo, mastambém os membros dos sindicatos, que participaram de milhares deassembléias e votaram a reforma proposta. Esse processo democráticode deliberação e tomada de decisão proporcionou aos trabalhadoresitalianos a oportunidade não somente de aprender mais sobre a proposta,mas de expressar suas opiniões sobre aspectos particulares da reforma.Em alguns casos, como na aposentadoria por idade para trabalhadorescom empregos fisicamente desgastantes, suas opiniões acarretarammodificações na própria proposta de reforma. Acima de tudo, as assem-bléias encorajaram um processo pelo qual as preferências não eramsomente expressas, mas também elaboradas de formas que filtrassempreocupações muito setorizadas. Em outras palavras, no decorrer dessedebates, alguns trabalhadores perceberam que, apesar de a propostadesafiar seus interesses imediatos, ela inegavelmente atendia a interes-ses sociais maiores, como a preservação do sistema de pensão para asgerações futuras. Grupos poderosos, como os metalúrgicos e professores,não mudaram suas preferências; no entanto, ao perceberem um pro-cesso aberto e democrático, eles concordaram com a decisão da maioriade apoiar a reforma.

Tal fato sugere que a tomada de decisão democrática tem umainfluência institucional poderosa sobre a formação e/ou manifestaçãode preferências políticas. A necessidade de justificar solicitações indi-viduais por meio de referência tanto a princípios quanto a interessesgeneralizados, leva os participantes de uma assembléia deliberativa asuprimirem aqueles argumentos políticos que, baseados somente em in-teresse próprio, não podem ser facilmente defendidos e aceitos por ou-tros. Isto, por sua vez, fornece aos argumentos que consideram os inte-resses de outras pessoas uma oportunidade privilegiada de emergir nodebate (BACCARO, 1996). É claro que a argumentação sobre democra-cia deliberativa não pode ser convincentemente demonstrada pela aná-lise deste caso. Ela necessita de uma pesquisa muito mais sistemática ecomparativa.

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139

RSPTabela 1: Regras de elegibilidade, esquemas de contribuição

e determinação de benefícios de pensão (1990)

INPS (a) Estado (b) Governos municipais (c)

Contribuição para 19,26% (emprega- não especificado 17,7% (empregadores)a previdência social dores)

7,15% (trabalha- 6,75% (trabalha- 6,55% (trabalhadores)dores) dores)

Pensão por idade 60 anos (homens) e 65 anos (homens) 60 anos (homens e55 anos (mulheres) e 60 anos (mulhe- mulheres) com 25com 15 anos de con-res) com 15 anos de contribuiçãotribuição de contribuição

Pensões por 35 anos de contri- 20 anos de contri- 25 anos de contribuiçãoantigüidade buição buição (15 anos (20 anos para mulheres

para mulheres casadas)

casadas)

Remuneração de remuneração média últimos salários últimos saláriospensões dos últimos 5 anos mensais (acresci- mensais

dos de 18%)

Valor da pensão 80% da base 95% do último 100% do últimopensionável (após salário (após salário (após 4040 anos) (d) 40 anos) anos)

Indexação Preços e salários Preços e salários Preços e salários

(a) O Istituto Nazionale per la Previdenza Sociale (INPS) administra fundos de pensãodiferentes, que amparam trabalhadores da indústria privada, agricultores, artesãos, lojistas eoutras categorias especiais (tais como funcionários de empresas de transporte, telecomuni-cações, eletricidade, clero, etc).

(b) Funcionários estaduais, incluindo professores.(c) Empregados de governos municipais e de serviços de saúde.(d) Corresponde a aproximadamente 83% do último salário.Fonte: Adaptado de Censis, Rapporto sulla situazione sociale del paese, 1991. Milão:

Franco Angeli, 1991: 434.

Tabela 2: Pensões de invalidez, idade avançada eviuvez para diferentes categorias trabalhistas (1992)

Número Média (milha- Valor (%) % do Produto(milhares) res de liras) Interno Bruto

1. Trabalhadores da indústria (FPLD) 10.005 10.868 96 7,2

2. Autônomos 3.536 6.783 60 1,6 2.1 agricultores 1.994 6.718 59 0,9 2.2 artesãos 787 7.177 63 0,4 2.3 lojistas 755 6.551 58 0,3

3. Servidores públicos 1.933 22.258 196 2,8 3.1 funcionários estaduais 1.276 23.258 203 1,9 3.2 funcionários municipais 657 20.685 192 0,9

4. Total 15.474 11.357 100 11,6

Fonte: Felice Roberto Pizzuti, “Note sul sistema pensionistico italiano.” Em Marcello De Cecco e Felice

Roberto Pizzuti, eds. La politica previdenziale in Europa. Bolonha: Il Mulino, 1994:Tab.1, p. 51

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140

RSPTabela 3: Número e valor das pensões de idade

avançada administradas pelo INPS no final de 1994

Trabalhadores Número de Valor médio por ano pensões (em milhares de liras)

Trabalhadores da indústria (FPLD) 5.130.007 14.796 106

Trabalhadores agrícolas 719.682 9.114 65

Artesãos 380.703 10.734 77

Lojistas 414.709 8.776 63

Trabalhadores de meios detransportes 63.043 31.565 225

Trabalhadores de meios decomunicação 26.218 35.289 252

Trabalhadores de fiscalizaçãotributária 6.213 26.044 186

Trabalhadores eletricistas 44.803 34.250 244

Funcionários de empresas aéreas 1.840 43.727 312

Mineiros 6.327 21.143 151

Trabalhadores de utilidade pública(como empresas de gás) 3.210 30.087 215

Coletores de impostos 5.574 35.816 256

Clero 13.129 9.452 67

Total 6.815.458 14.003 100

Fonte: Adaptado de Giuliano Cazzola, Le nuove pensioni degli Italiani. Bolonha: Il Mulino,

1994: Tabela 3, p. 48-9

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14

1

RS

P

Tabela 4:Resumo das reformas de pensões fracassadas (1984-91)

De Michelis (1989) Formica (1989) Donat Cattin (1990) Marini (1991)

Idade mínima para aposentadoria 65 (homens e mulheres) 65 (homens e mulheres) 65 (homens e mulheres) 65 (homens e mulheres)

Períodos de contribuição (mínimo) 20 anos 20 (homens) e 15 anos 15 anos 15 anos(mulheres)

Remuneração pensionável Remuneração média dosRemuneração média dos Remuneração média dosRemuneração média dosúltimos 10 anos últimos 10 anos últimos 10 anos últimos 10 anos

Pensão por antigüidade Após 35 anos Após 35 anos Após 40 anos Após 35 anos

Valor da pensão 80% do salário-base 80% do salário-base 80% do salário-base 80% do salário-base(após 35 anos) (após 35 anos) (após 40 anos) (após 40 anos)

Indexação salários salários salários salários

Harmonização entre regimes de sim sim sim simpensão para funcionários públi-cos e da iniciativa privada

Esquemas de pensão suplementar sim sim sim sim

Fonte: Adaptado de CENSIS, Rapporto sulla situazione generale del paese, 1991. Milão: Franco Angeli, 1991: 421

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RSPTabela 5: As reformas do sistema de pensão de Berlusconi e Dini.

Previsão de redução orçamentária (em bilhões de liras)

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Total

1. Berlusconi (a) 6.911 7.570 5.398 8.437 11.690 14.106 15.003 15.993 16.936 17.793 119.837

2. Dini (b) 8.629 6.816 8.224 9.22310.319 11.472 12.210 12.932 13.451 15.020 108.296

(a) cortes segundo cálculo do Gabinete de Orçamento. Os dados inicialmente fornecidos pelo Governo supe-restimavam a redução nos gastos.(b) dados (fornecidos pelo governo) correspondem às estimativas preparadas por Il Sole - 24 Ore (o maior jornalfinanceiro da Itália)

Fonte: Giuliano Cazzola, Le nuove pensioni degli Italiani. Bolonha, Il Mulino, 1995: Tabelas 7 e 8, p. 110-1 e 114.

Tabela 6: Análise da redução dos gastos orçamentários da

Reforma Dini no sistema de pensões (em bilhões de liras)

Redução % do total da redução (1996-2005) (1996-2005) (a)

1. Cortes nas pensões por 59.159 40 antigüidade

2. Contribuições sociais para o 30.827 21 “lavoro parasubordinato” (b)

3. Novas contribuições para a previdência social (c) 26.843 18

4. Mudanças nas pensões de viuvez (d) 16.424 11

a) A redução prevista no orçamento, em decorrência da Reforma Dini, é de 147.784 bilhõesde liras. Essa economia, no entanto, é em parte compensada pela entrada reduzida deimpostos (-34.835 bilhões de liras), em função principalmente do regime favorável deimpostos, transferidos para os fundos de pensão privados. (-13.639 bilhões de liras).

b) A categoria de “lavoro parasubordinato” inclui aqueles trabalhadores (especialmentejovens profissionais) que, enquanto contratados formalmente como consultores por meioperíodo, exercem de facto as mesmas tarefas que outros empregados contratados paraperíodo integral. Anteriormente, essa categoria não era coberta por nenhuma pensãoestadual, financiada por contribuições de previdência social. Conseqüentemente, os custoslaborais para empregados dessa categoria trabalhista eram menores que os custos comempregados com contratos para período integral. A Reforma Dini estendeu compulsori-amente as contribuições para a previdência social (iguais a 10% do pagamento, dos quais2/3 são pagos pelo empregador e 1/3 é pago pelo trabalhador) para o “lavoroparasubordinato” também.

c) A Reforma Dini elevou o total das contribuições para a previdência social em 0,7%:0,35% pagos pelos empregadores, 0,35% pelos empregados.

d) Redução dos pagamentos para viúvos ou viúvas de membros segurados.

Fonte: Giuliano Cazzola, Le nuove pensioni degli Italiani. Bolonha: Il Mulino, 1995: Tabela 7,p. 110-1 (cálculos dos autores).

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RSPTabela 7: Resultados do referendo sobre

o sistema de pensão (todos os eleitores)

Regiões Eleitores Votos Votos Votosválidos a favor (%) contra (%)

Piemonte 408.365 400.900 52,64 47,36

Valle D’Aosta 6.800 6.682 59,55 40,45

Liguria 150.235 147.875 58,84 41,16

Lombardia 881.604 867.128 52,45 47,55

Veneto 334.367 328.210 62,47 37,53

Trentino - Alto Adige 44.939 43.638 58,46 41,54

Friuli Veneza Giulia 83.702 82.106 64,08 35,92

Emilia Romagna 603.442 594.487 71,47 28,53

Toscana 323.665 319.124 64,86 35,14

Marche 112.148 110.201 69,38 30,62

Umbria 68.164 67.103 66,89 33,11

Lazio 353.799 349.789 64,40 35,60

Abruzzo 65.202 63.998 62,57 37,43

Molise 16.392 16.102 74,28 25,72

Campania 236.997 223.632 69,54 30,46

Puglia 192.907 190.332 73,56 26,44

Basilicata 30.576 30.115 73,16 26,84

Calábria 121.689 119.168 82,56 17,44

Sicília 304.556 298.903 79,53 20,47

Sardenha 89.547 87.842 68,94 31,06

Total 4.429.096 4.357.335 64,07 35,93

Fonte: Nuova Rassegna Sindacale, n. 26, 10 de julho de 1995.

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144

RSP

Tabela 8: Resultados do referendo sobre o

sistema de pensão (trabalhadores ativos)

Regiões Eleitores Votos Votos (%) Votosválidos a favor contra (%)

Piemonte 400.933 393.371 50,68 49,32

Valle D’Aosta 6.339 6.226 58,26 41,74

Liguria 125.048 122.786 51,99 48,01

Lombardia 782.930 768.694 47,38 52,62

Veneto 276.709 270.715 56,77 43,23

Trentino - Alto Adige 41.452 40.170 56,34 43,66

Friuli Veneza Giulia 70.601 69.045 58,67 41,33

Emilia Romagna 429.138 420.951 61,96 38,04

Toscana 258.914 254.660 58,29 41,71

Marche 84.642 82.790 61,56 38,44

Umbria 50.916 49.896 60,18 39,82

Lazio 311.853 308.035 60,45 39,55

Abruzzo 59.046 57.308 59,62 40,38

Molise 12.594 12.381 68,89 31,11

Campania 183.196 180.379 61,42 38,58

Puglia 155.996 153.418 69,20 30,80

Basilicata 24.306 23.845 71,70 28,30

Calabria 89.631 87.615 78,70 21,30

Sicília 194.019 190.588 75,57 24,43

Sardenha 67.004 65.299 62,17 37,83

Total 3.625.267 3.558.172 57,75 42,25

Fonte: Nuova Rassegna Sindacale, n. 26, 10 de julho de 1995.

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RSPTabela 9: Resultados do referendo sobre o sistema

de pensão (por categoria de trabalhadores)

Categorias Eleitores Votos Votos Votosválidos a favor (%) contra (%)

Pensionista 804.282 798.565 91,26 8,51

Agricultores 116.299 114.190 61,23 38,77

Trabalhadores da 267.620 262.753 53,44 46,53indústria química

Trabalhadores da 160.344 157.310 72,40 29,86construção civil

Metalúrgicos 732.945 717.533 44,68 55,32

Trabalhadores da 193.007 188.572 56,97 43,03indústria têxtil

Trabalhadores de gráficas 58.412 57.166 56,83 43,17

Trabalhadores de empre- 156.659 154.005 64,53 35,47sas de distribuição

Trabalhadores de empre- 161.191 158.681 50,72 49,28sas de transportes

Trabalhadores do setor 139.676 137.785 53,77 46,23de comunicações

Eletricitários 105.828 104.231 61,10 38,90

Trabalhadores de empre- 741.686 730.515 57,46 42,54sas estatais

Bancários e trabalha- 190.573 186.933 64,90 35,10dores de seguradoras

Pesquisadores, professo- 63.427 62.019 47,30 52,70res, funcionários de esco-las e universidades

Fonte: Nuova Rassegna Sindacale, n. 26, 10 de julho de 1995.

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146

RSPNotas

1 Documento apresentado na Reunião Anual da Associação Americana de CiênciaPolítica de 1996, no Hotel Hilton and Towers de San Francisco, de 29/08 a 1o/10/96.

2 Apesar das vantagens óbvias para os trabalhadores da indústria trazidas por essareforma, as confederações, particularmente a CGIL, contestaram-na. Mesmo tendosido negociada pelo governo e pelas três confederações principais, a reforma provo-cou protestos veementes em suas bases, induzidas pela CGIL a retirarem seu apoio.A CGIL argumentava que essa reforma só aumentava os benefícios para mineirosaposentados, e não para os mineiros ativos. Ela também organizou uma greve geral nodia 7 de março de 1968. A participação nessa greve foi tão massiva que ela foiposteriormente registrada como o início do chamado “autunno caldo” (Outono Quen-te). Ver Turone, 1992: 357-9.

3 Outras inovações trazidas pelas reformas do sistema de pensão no período 1968-69incluíram o cálculo dos benefícios com base na remuneração, e não na contribuição, ea modificação na estrutura de comando do Istituto Nazionale della Previdenza Sociale(INPS), na qual os “parceiros sociais”, e em particular, os sindicatos, recebiam tam-bém responsabilidades de gestão.

4 Para mais referências sobre as diferenças entre as taxas internas de reposição (IRR)para as várias categorias trabalhistas, ver Niccoli, 1991.

5 Pensões por antigüidade no posto eram uma peculiaridade italiana. Outros paíseseuropeus, tais como França e Alemanha, também permitiam formas de aposentadoriaflexível para trabalhadores que tivessem sido segurados por um determinado númerode anos. No entanto, tais pensões eram, em geral, pagas somente a trabalhadores comuma idade mínima (63-60, na Alemanha), ou então eram penalizadas em termos debenefícios (como na França). Para maiores referências sobre o assunto, ver OECD,1988: 120-2.

6 Por exemplo, caso um industriário começasse a trabalhar com 15 anos (como eracomum nos primeiros anos do pós-guerra), ele se aposentaria quando atingisse 50anos de idade.

7 Para mais referências sobre as diferenças no Imposto Interno de Retorno (IRR) sobreas contribuições para pensionistas “jovens” e “adultos”, ver Fornero, 1995; PadoaSchioppa Kostoris, 1995.

8 Para mais referências sobre a crise generalizada do sistema de seguro pay-as-you-go(PAYG) , ver OECD, 1988.

9 Para mais referências sobre as implicações desse pacto entre gerações, ver Somaini,1996.

10 Em um sistema PAYG, o equilíbrio entre entrada e saída de capital é definido pelaseguinte fórmula: cWA/R = Ponde c = taxa de contribuição; W = salário médio; A = número de trabalhadoresativos; R = número de trabalhadores aposentados e P = pensão média.A fórmula mostra claramente que o valor das pensões depende da proporção entretrabalhadores ativos e aposentados (por vezes definida como “grau de maturidade” dofundo de pensão). Quando essa proporção cresce, é possível aumentar os benefíciossem aumentar a taxa de contribuição, ou então reduzir a taxa de contribuição mantendoas pensões constantes. Para mais detalhes, ver Livi Bacci, 1995.

11 Para mais detalhes, ver Castellino, 1990.

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RSP12 Este conflito de interesses entre gerações na Itália foi, mais tarde, agravado por outroproblema, a fragmentação interocupacional. O sistema italiano de pensões era consti-tuído por uma pluralidade de esquemas ocupacionais, todos parecidos com o mecanismoPAYG. Tais fundos ocupacionais eram caracterizados por diferentes graus de maturi-dade, isto é, por diferentes proporções entre trabalhadores ativos e pensionistas. Osprimeiros fundos de pensão a se estabelecerem, como o FPLD, tinham uma propor-ção comparativamente baixa de trabalhadores ativos, apresentando, portanto, umaestrutura passiva. Outros fundos, como os que amparavam os autônomos, eram aindarelativamente jovens, e portanto, financeiramente equilibrados. Estes fundos podiam,desta forma, impor a seus associados taxas de contribuição mais baixas que outrosfundos. Era politicamente difícil transferir dinheiro de esquemas ativos para esque-mas passivos, ou mesmo equalizar as taxas de contribuição. De fato, as partes envol-vidas interpretavam a situação financeira de seus esquemas não (como elas deveriam)como o resultado de condições demográficas particulares, mas sim como a conseqüên-cia de capacidades gerenciais distintas. Em outras palavras, aqueles grupos trabalhis-tas cujos fundos de pensão estivessem ainda ativos argumentavam que eles eramcapazes de gerir melhor seus fundos de pensão do que outras categorias, e recusavam-se a financiar com o dinheiro deles os fundos passivos.

13 Os benefícios de pensão na Itália são calculados como um percentual do que secostuma denominar “remuneração pensionável”. Até 1992, isso correspondia à médiada remuneração mensal dos últimos cinco anos, para trabalhadores da indústria, e àúltima remuneração mensal para empregados do setor público. Este modo de determi-nar os benefícios de pensão levou, basicamente, a duas modalidades de distorção: 1)ele criava incentivos para a evasão de impostos e contribuições de previdência socialnos primeiros anos de trabalho, já que somente os últimos contracheques seriamconsiderados para a determinação das pensões; 2) ele favorecia os trabalhadores querecebiam os maiores aumentos salariais no final de suas carreiras. Para (em parte)prevenir tais problemas, todos os projetos de reforma da década de 80 pretendiamaumentar para 10 anos o período de referência da base que determina a remuneraçãopensionável.

14 O projeto de reforma Donat-Cattin era particularmente interessante, porque propu-nha financiar os esquemas suplementares de pensão com a utilização de parte dasreservas financeiras acumuladas para o pagamento de indenizações (o chamado FondoTrattamento di Fine Rapporto ou Fondo TFR). Essa idéia foi recentementeimplementada pela Reforma Treu/Dini de 1995.

15 Por exemplo, em 1990 uma nova lei modificava as pensões dos autônomos, introdu-zindo um sistema PAYG (que garante às primeiras gerações de pensionistas benefíciosmuito mais altos que as contribuições pagas) em seus fundos de pensão.

16 Tanto a presente seção quanto a próxima são baseadas em pesquisas de camporealizadas em julho de 1996.

17 O ano de 1992 foi difícil para a Itália. Primeiro, os principais partidos políticos,incluíndo do partido Democrata Cristão (DC) e o Partido Socialista (PSI) foramatingidos por uma onda de escândalos de corrupção que ficou conhecida como manipulite (mãos limpas). Alguns deles, como o Partido Socialista, desapareceram nosmeses que se seguiram. Em segundo lugar, a Máfia Siciliana lançou um ataque armadocontra o estado italiano: em maio e julho, dois dos mais famosos juízes antimáfia,Giovanni Falcone e Paolo Borsellino, foram assassinados. Por último, uma séria crisefinanceira forçou a lira para fora do Sistema Monetário Europeu em setembro, esti-mulando a desvalorização massiva da moeda italiana.

18 O governo Amato aprovou uma legislação que reduzia os gastos governamentais, e aumen-tava a arrecadação para um total de 120 trilhões de liras em 1992 (cerca de 7,5% do PIB).

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RSP19 O número mínimo de anos de contribuição aumentou de 20 (15 para mulheres) para35 — aplicando-se o mesmo limite para trabalhadores do setor privado. Deste modo,as chamadas baby pensions foram gradualmente eliminadas.

20 Tais dados pressupunham que pensões futuras seriam indexadas somente aos preços,e não aos salários. Ver Pizzuti, 1994: Tabela 7, p. 69.

21 As confederações só se opuseram a uma medida adicional que Amato pretendiaintroduzir: o aumento do período de contribuição necessário para pensões por anti-güidade de 35 para 36 anos. Pressionado por sindicados, Amato desistiu dessa modi-ficação adicional (ver CAZZOLA, 1996:55).

22 Dados baseados no valor atual das parcelas da pensão futura. Ver Banca d’Italia, 1995:Tabela 1, p. 17.

23 A Lei Orçamentária anterior preparada pelo governo Berlusconi para 1995 incluíacortes em pensões da ordem de 8.000 trilhões de liras, de 6,5 trilhões de liras nosgastos com saúde, e arrecadação por via dos chamados codoni, ou seja, a redução dasviolações tão comuns ao código fiscal e a divisão por distritos do pagamento dasmultas. Ao mesmo tempo, a nova Lei Orçamentária abolia o imposto mínimo quetinha elevado os impostos para autônomos.

24 Ver European Industrial Relations Review, 251, dezembro de 1994: 7.25 Lamberto Dini foi Ministro do Tesouro do governo Berlusconi. Nesse cargo, ele

apoiou os cortes nas pensões propostos por Berlusconi. Depois da renúncia doPrimeiro-Ministro, ele liderou um gabinete composto por técnicos, ou seja, especia-listas não explicitamente filiados a nenhum partido político. Seu novo Ministro doTrabalho era Tiziano Treu, um professor de direito trabalhista e especialista emrelações industriais que, no final dos anos 70, tinha defendido a necessidade da intro-dução de políticas neocorporativistas na Itália, a exemplo de vários países escandinavosou norte-europeus (ver, por exemplo, Treu 1984).

26 Foi estimado que 57% dos fundos transferidos do Tesouro para o INPS em 1992foram utilizados para financiar medidas de assistência, tais como impostos reduzi-dos para companhias em áreas economicamente deprimidas (as fiscalizzazione deglioneri sociali) ou aposentadorias precoces em setores em declínio (PIZZUTI , 1994: 58).Essas separações entre seguro e assistência visavam esclarecer tanto a fonte quantoo destino dos diferentes fundos.

27 O novo sistema de pensão da Itália estimulava um modelo autofinanciado, mas foimantido o sistema pay-as-you-go (PAYG). Em um modelo autofinanciado, cada traba-lhador acumula (por meio de suas próprias contribuições à previdência social) umfundo de reserva que será usado para financiar os seus benefícios de pensão. Em umsistema PAYG, os trabalhadores ativos financiam os pensionistas. No sistema PAYGitaliano, os benefícios eram calculados como se o sistema operasse como um modeloautofinanciado, no sentido que os benefícios eram determinados com base nas contri-buições acumuladas. Teria sido impossível simplesmente mudar de um sistema PAYGpara um modelo autofinanciado. Isto teria imposto uma carga muito pesada à geraçãoativa do momento, que iria responsabilizar-se pelo financiamento tanto dos recursosnecessários ao estabelecimento de esquemas autofinanciados quanto dos recursosnecessários para o pagamento das pensões dos aposentados.

28 No período de transição até a implementação total da reforma (ou seja, até o ano 2008), ostrabalhadores ainda terão o direito a pensões por antigüidade, mas o número mínimo deanos para pagamento de seguro aumentará gradualmente de 35 para 40. Uma alternativaserá os trabalhadores aposentarem-se após 35 anos de contribuição, caso eles tenhamalcançado a idade mínima, que também crescerá gradualmente de 52 para 57 anos.

29 A reforma também estendeu o seguro de pensão compulsório para grupos de trabalhado-res que não estavam previamente cobertos por pensões estaduais. Esses trabalhadores

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RSPforam designados coletivamente como lavoro parasubordinato. Essa categoria incluiuma variedade de contingentes de trabalhadores, especialmente jovens profissionais,contratados formalmente como consultores, mas que exercem de facto as mesmastarefas que os outros empregados. A reforma Treu/Dini introduziu o seguro compul-sório de pensão para esses trabalhadores também, financiado por contribuições de10% (2/3 pagos pelo empregador, 1/3 pago pelo empregado). A reforma tambémintroduziu pensões estaduais para trabalhadores imigrantes.

30 A reforma previa uma transição gradual do novo esquema de pensão. Na verdade, foiestabelecido que a nova regulamentação seria inteiramente aplicada somente aos traba-lhadores recém-contratados. Trabalhadores segurados pelos últimos 18 anos seriamsujeitos às regras anteriores (com uma exceção importante das severas regras parasolicitação de pensões por antigüidade). Trabalhadores segurados por menos de 18anos teriam suas pensões determinadas por meio de um sistema misto, que combinavaas regras vigentes até 1995 e as novas regulamentações.

31 Depois de assinado, o acordo foi enviado para o Parlamento com duas vertentescontrárias de críticas, provenientes tanto da direita quanto da esquerda. O Partido daRefundação Comunista (Rifondazione Comunista) denunciava que os cortes das pen-sões eram muito severos, ao passo que o partido neoliberal de Berlusconi (ForzaItalia) afirmava que a reforma era muito generosa e não tinha o rigor suficiente pararesolver os problemas da ainda altíssima dívida pública italiana. A atitude da pós-fascista Alleanza Nazionale era ambígua: de uma lado, ela por vezes unia-se às fileirasde sua aliada política Forza Italia; de outro, ela pretendia restaurar por meio deemendas legislativas muitas das cláusulas parlicularísticas que favoreciam os trabalha-dores do setor público e os autônomos (duas das suas maiores bases) que a ReformaTreu/Dini havia atenuado ou eliminado.

32 Para mais detalhes sobre as dificuldades de se impor medidas de arrocho devido àfragmentação dos interesses envolvidos, ver Pierson, 1996.

33 A utilização de períodos menores de tempo produzia distorções e, às vezes, verdadei-ras fraudes, no sentido de que os últimos salários (aqueles sobre os quais as pensõesdeveriam ser calculadas) eram em muitos casos aumentados artificialmente, de modoque o trabalhador poderia receber pensões mais altas.

34 Sobre a tendência à barganha política para comprometer a coesão de sindicatos, verPizzorno, 1978a e 1978b. Philippe Schmitter e Wolfgang Streeck expressam o mesmoconceito referindo-se a duas lógicas conflitantes de representação: a lógica da filiação e alógica da influência. (Ver SCHMITTER, 1989, e STREECK, 1994). De acordo com os autores,grupos de interesse em geral, e sindicatos em particular, eram comprometidos com duasempresas conflitantes. De um lado, eles precisavam satisfazer as exigências de suasbases para salvaguardar sua coesão interna (lógica da filiação). Do outro, eles precisamengajar-se em compromissos para maximizar seus próprios objetivos organizacionais(lógica da influência). Apesar das duas lógicas estarem claramente relacionadas (vistoque o apoio à filiação é necessário para adquirir-se influência política e de negociação evice-versa), a organização dos sindicatos parece visar constantemente ao alcance de umequilíbrio temporário entre essas duas forças antagônicas.

35 Ver, por exemplo, a original definição de coorporativismo de Schmitter (SCHMITTER,1979:13). O coorporativismo pode ser definido como o sistema de representação deinteresses, no qual as unidades constituintes organizam-se em um limitado número decategorias singulares, compulsórias, não-competitivas, ordenadas hierarquicamen-te e funcionalmente diferenciadas, reconhecidas ou licenciadas (se não criadas) peloEstado e brindadas com um monopólio de representação deliberado, dentro de suasrespectativas categorias, em troca da observação de determinados controles na seleçãode líderes e na articulação de demandas e apoio (itálico do autor).

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RSP36 O caráter não-democrático das organizações neocoorporativistas é talvez melhor ex-pressado por Wolfgang Streeck: “O que é liberal no coorporativismo liberal e, possivel-mente, na democracia liberal em geral é, ... a liberdade de entrar e sair, não de indivíduoscom relação aos seus sindicatos, mas de associações em relação às políticas estatais etentativas de implementação de ajustes sociais. Do ponto de vista da diferença entreautoritarismo e democracia, a liberdade de ação coletiva com relação ao Estadoparece mais importante que a liberdade dos indivíduos em participar de ações coleti-vas com relação às suas organizações”. Streeck, 1994: 11 (tradução para o inglês eitálico do autor)

37 Para uma comparação entre os Movimentos Trabalhistas sueco e italiano, ver Baccaroe Locke, 1996.

38 Essa experiência com a democracia dos sindicatos foi parte de um processo maior demudança organizacional. Confrontadas com uma crise séria de representação, as con-federações italianas (CGIL, CISL e UIL) tentaram um relançamento interno da demo-cracia, institucionalizando as eleições periódicas para representantes de locais detrabalho, organizando freqüentes assembléias para discutir as agendas de negociação,e sujeitando todas as negociações à aprovação dos trabalhadores, por meio de assem-bléias e referendos. Para mais detalhes sobre o assunto, ver Locke e Baccaro, 1996b.

39 O valor médio das pensões para idade avançada administradas pelo INPS era 14milhões de liras anuais no final de 1994 (cerca de 9 mil dólares). Esse valor nem sempreera suficiente para sustentar um trabalhador aposentado, principalmente nas grandescidades. Porém, muitos grupos de trabalhadores, do serviço público e do setor deserviços, receberam pensões bem mais altas (ver Tabelas 2 e 3).

40 Em algumas assembléias, os trabalhadores justificavam sua exigência em manter aspensões por antigüidade, declarando que certos empregos, como, por exemplo, emlojas de tintas, reduziam a expectativa de vida em até oito anos. Ver Nuova RassegnaSindacale, de 29 de maio de 1995:11.

41 No caso especial de serviços especializados, as pensões por antigüidade constituíamuma arma poderosa de negociação com relação aos empregadores. Quando um traba-lhador de serviços especializados atingia os 35 anos de contribuição, podia ameaçaraposentar-se e, desta forma, forçar o empregador a pagar-lhe melhores salários ou aoferecer melhores condições de trabalho.

42 Sobre esse tema, preparamos vários artigos, que foram publicados pela NuovaRassegna Sindacale (a revista semanal da CGIL) de maio e junho de 1995, descreven-do as referidas assembléias e debates.

43 É por isso, por exemplo, que uma empregada, do sexo feminino, do Gruppo FinanciarioTessile (uma grande empresa têxtil localizada perto de Turim) declarou durante umaassembléia realizada em sua fábrica: “Estou convencida de que a reforma tinha de serfeita, porque o dinheiro havia acabado. E eu também acredito que essa reforma podeajudar-nos a salvar algum dinheirinho para as pensões de nossos filhos. Nuova RassegnaSindacale, 29 de maio de 1995:12.

44 Entrevistado pela Nuova Rassegna Sindacale, um operário da fábrica Asea BrownBoveri (Sesto San Giovanni) declarou: “Isso é como uma corrida. Quando você final-mente chega à linha de chegada, exausto, você vê uma placa que diz: ‘Desculpe, nósnos enganamos. Você ainda tem de correr mais dez quilômetros’”. Nuova RassegnaSindacale, 5 de julho de 1995: 15 (tradução para o inglês do autor).

45 No Sul, industriários de meia-idade estavam muito menos preocupados com as pen-sões por antigüidade que seus colegas do Norte, visto que a falta de empregos estáveistornava muito difícil para qualquer trabalhador acumular 35 anos de contribuição. Ver,por exemplo, os comentários de um operário da fábrica da Fiat em Termini Imerese

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RSP(perto de Palermo): “Como podemos conseguir atingir 35 anos de contribuição aquina Sicília? Não há empregos aqui. (Cca travagghiu un ci nne’ em dialeto siciliano).Nuova Rassegna Sindacale, 8 de maio de 1995: 24 (tradução para o inglês do autor).

46 A convicção de que o debate interno era preferível à deserção foi claramente expressapor um membro do Consiglio di Fabbrica (Conselho Trabalhista) da Officine Savigliana(uma oficina mecânica próxima a Turim), entrevistado após o Consiglio di Fabricatinha rejeitado o acordo sobre o sistema de pensões: “Para nós, o mais difícil de engoliré o aumento na idade mínima para aposentadoria. Ainda assim,... creio que nós devemoslutar dentro do sindicato para mudar essas provisões que consideramos inaceitáveis.Para podermos fazê-lo. Nós devemos ser e continuar membros do sindicato”. NuovaRassegna Sindacale, 5 de julho de 1995: 16 (tradução para o inglês do autor).

47 Essas 49 mil estações eleitorais eram aproximadamente metade das que foram instala-das pelo Ministério do Interior na época das eleições legislativas. Ver Carlo Ghezzi,“Le lezioni del voto”. Nuova Rassegna Sindacale, 10 de julho de 1995:III.

46 Essas 49 mil estações eleitorais eram aproximadamente metade das que foram instala-das pelo Ministério do Interior na época das eleições legislativas. Ver Carlo Ghezzi,“Le lezioni del voto”. Nuova Rassegna Sindacale, 10 de julho de 1995: III.

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RSPResumoResúmenAbstract

Reforma do setor público e participação sindical: o caso do sistema de pensãoitaliano

Lucio Baccaro e Richard M. Locke

O paper estuda o caso da recente reforma da Previdência na Itália, ilustrando apossibilidade de uma participação positiva dos sindicatos — tradicionalmente contráriosàs reformas — no processo de transformação do setor público.

Após uma revisão do sistema previdenciário italiano, altamente fragmentado eparticularista na opinião dos autores, e o apontamento de suas principais deficiências, oestudo concentra-se na análise de três propostas de reforma ligadas aos governos deAmato (1992-93), Berlusconi (1994) e Dini (1995), respectivamente. O texto abordatanto as propostas concretas de mudança, trazendo contribuições sobre uma variedadeconsiderável de medidas, seu impacto e aceitação sociais e por categoria, como os objetivosvisados e o processo político relacionado à sua discussão e tramitação. Uma preocupaçãoconstante dos autores é a correlação entre a postura e a participação dos sindicatos emmatéria de reforma previdenciária, por um lado, e o avanço das propostas governamen-tais, por outro. Segundo o estudo, a ampla participação da força sindical na negociação doprojeto de reforma previdenciária do governo Dini representou um fator decisivo parasua aprovação e implementação bem-sucedidas.

Ao mesmo tempo, a deliberação democrática para conciliação de preferências e inte-resses (múltiplos no caso de assuntos norteados pela dicotomia bem comum/interesseparticular) — objeto da última sessão do estudo — é vista como uma forma de ampliar aparticipação sindical além das lideranças, passando a incluir os rank-and-file trabalhadores,um procedimento que traz, igualmente, a força de uma decisão majoritária.

A análise da reforma da Previdência italiana é ilustrada no paper com tabelas que trazeme comparam dados referentes à contribuição previdenciária, às categorias de beneficiados eàs diferentes propostas de reforma formuladas por sucessivos governos italianos.

La reforma del sector público y la participación de los sindicatos: el caso de lareforma de la Seguridad Social en Itália

Lucio Baccaro y Richard M. Locke

El artículo estudia el caso de la reciente reforma de la Seguridad Social en Itália, alilustrar la posibilidad de una participación positiva de los sindicatos - tradicionalmentecontrarios a las reformas - en el proceso de transformación del sector público.

Tras la revisión del sistema de Seguridad Social italiano, altamente fragmentado yparticularista según los autores, y el apuntameiento de sus principales deficiencias, elestudio se concentra en el análisis de tres propuestas de reforma ligadas a los gobiernosde Amato (1992-93), Berlusconi (1994) y Dini (1995) respectivamente. El texto abor-da tanto las propuestas concretas de cambio, aportando contribuciones sobre unavariedad considerable de medidas, su impacto y aceptación sociales y por categoria,como los objetivos visados y el proceso político relacionado a su discusión y tramitación.Una preocupación constante por parte de los autores es la correlación entre elcomportamiento y la participación de los sindicatos respecto a la matéria de la reforma

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RSPde la Seguridad Social, por un lado, y el avance de las propuestas gubernamentales, porotro lado. Según el estudio, la amplia participación de la fuerza sindical en la negociacióndel proyecto de reforma de Seguridad Social del gobierno de Dini representó un factordecisivo para el buen éxito de su aprobación e implementación.

Mientras tanto, la deliberación democrática para la conciliación de preferencias eintereses (múltiplos en el caso de asuntos orientados por la dicotomía bien común/interésparticular) - objeto de la última sesión del estudo - es considerada como una forma deampliar la participación sindical además de los liderazgos, pasando a incluir los obrerosrank-and-file, um procedimiento que aporta, igualmente, la fuerza de una decisiónmayoritaria.

El análisis de la reforma de la Seguridad Social italiana es ilustrada en el artículo contablas que aportan y comparan datos referentes a la contribución de la Seguridad Social,a las categorias de beneficiados y a las diferentes propuestas de reforma formuladas porsucesivos gobiernos italianos.

The reform of the public sector and the union participation: the case of thepension reform in ltaly

Lucio Baccaro and Richard M. Locke

The paper analyzes the case of the ltalian pension reform recently carried out, as anexample of a positive participation of labour unions — traditionally opposite to reforms— in the process of public sector reform.

After reviewing the ltalian pension fund system — highly fragmented andparticularistic, according to the authors’ view — and showing its main deficiencies, thepaper focus on the analysis of three reform proposals, designed by the of Amato (l 992-93), Berlusconi (1994) and Dini (1995) Governments, respectively. The text refers toconcrete reform proposals, that brought a considerable variety of measures, their socialimpact and acceptance, sorted by labour category, as well as the aimed goals and thepolitical process related to its discussion and implementation procedure. The authors arecontinually concerned with the correlation between unions’ attitude and participationregarding the pension reform, on one hand, and the advancement of governmentalproposals, on the other. According to this study, the broad participation of unions in thenegotiation of Dini’s proposed pension reform was a decisive factor for its successfulapproval and implementation.

Simultaneously, the democratic debate aimed at conciliating preferences and interests(diverse, in which refers to the dicotomy common good/private interest rest) — object ofthe last part of the study — is seen as a way of ensuring union participation beyond itsleadership, including rank-and-file workers, a procedure that equally brings the strengthof a majority decision.

The analysis of the ltalian pension reform is illustrated in the paper by tables thatprovide and compare data regarding pension contributions, beneficiary categories anddifferent reform proposals, designed by successive italian governments.

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CadernosENAP

Metodologia paramedir a satisfação dousuário no Canadá:desfazendo mitos eredesenhando roteiros

Geoff Dinsdale & D. Brian MarsonFaye Schmidt & Teresa Strickland

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Cadernos

Metodologia paramedir a satisfação dousuário no Canadá: desfazendomitos e redesenhando roteiros

ENAP

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Cadernos ENAP é uma publicação da

Fundação Escola Nacional de Administração Pública

Editora

Vera Lúcia Petrucci

Coordenadora editorialIsabella Madeira Marconini

Projeto gráfico

Francisco Inácio Homem de Melo

Supervisora de produção gráficaMaria Marta da Rocha Vasconcelos

RevisãoGalber José Oliveira MacielCleidiana Cardoso N. Ferreira

Editoração eletrônicaMônica Indig do Valle

TraduçãoRenê Loncan Filho

© ENAP, 2000

Escola Nacional de Administração Pública — ENAPMetodologia para medir a satisfação do usuário no Canadá: desfazendo mitos eredesenhando roteiros.Brasília: ENAP, 2000.165p. (Cadernos ENAP, 20)

1. Serviço Público 2. Satisfação do Usuário 3. Administração Pública 4. Dinsdale,Geoff 5. Marson, D. Brian 6. Schmidt, Faye 7. Strickland, Teresa I. Título II.Série.

Tiragem: 1.000 exemplares

Brasília, 2000

ENAP Escola Nacional de Administração Pública

SAIS — Área 2-A70610-900 — Brasília, DFTelefone: (0XX61) 445 7096 / 445 7102 — Fax: (0XX61) 245 6189site: www.enap.gov.bre-mail: [email protected]

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Metodologia paramedir a satisfação dousuário no Canadá: desfazendomitos e redesenhando roteiros

CadernosENAP

Geoff Dinsdale & D. Brian MarsonFaye Schmidt & Teresa Strickland

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Sumário

Apresentação 11

Texto I — Metodologia para medir a satisfação do usuário no Canadá:desfazendo mitos e redesenhando roteiros 15Geoff Dinsdale & D. Brian Marson

Prefácio 17Resumo Executivo 19

1. Introdução 23

2. Metodologia 252.1. Medidas de desempenho subjetivas versus objetivas 252.2. Pesquisas de cidadão e usuários: existe diferença? 26

3. Serviços do setor público e privado: distintos 27na sua concepção

4. Percepções de serviços 31

5. Comparando serviços do setor público e privado:maçãs com laranjas? 375.1. Comparando maçãs com maçãs 38

6. Quão bom é “bom”? 436.1. O índice de satisfação de usuários 456.1.1. O índice de satisfação de usuários é limitado na suacapacidade de orientar planos de melhoria de serviço 456.1.2. A aplicabilidade do modelo ao setor público é incerta 466.2. Metodologias de conversão de escala: a escala dopercentual ao máximo 476.2.1. Instrumentos de pesquisa padronizados 48

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7. Usando pesquisas de forma criteriosa 497.1. Identificação de fatores determinantes de satisfação /insatisfação 507.2. Prioridades para melhorias 527.3. Padrões de serviço 567.4. Usuários internos 57

8. Principais constatações 618.1. Serviços específicos versus gerais 618.2. A necessidade de parâmetros normativos 618.3. O valor das pesquisas 62

9. Áreas para pesquisas adicionais 639.1. O que determina a satisfação/insatisfaçãocom o serviço? 639.2. Qual é a relação entre as experiências específicascom os serviços e as percepções do desempenho dogoverno em geral? 649.3. Como o nível de satisfação dos cidadãos e usuárioscom os serviços específicos do setor público se comparaem termos do nível de satistação com os serviçosespecíficos do setor privado? 659.4. Quais são as prioridades da ação de cidadãos e usuários,incluindo suas prioridades no atendimento integrado dotipo single window, em nível nacional e por Estado? 659.5.Qual é a melhor maneira de desenvolver parâmetrosnormativos para serviços dentro do governo do Canadá enos Estados? 669.6. Quais são as expectativas dos cidadãos em relação apadrões genéricos dos serviços? 669.7. O que é um bom desempenho para serviços internos, equal é a relação entre as satisfações interna e externacom o serviço? 66

10. Conclusão 67

11. Informações adicionais 6911.1. O que determina a satisfação/insatisfaçãocom o serviço? 69

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11.2. Qual é a relação entre experiências específicascom o serviço e as percepções do desempenho dogoverno em geral? 7011.3. Como o nível de satisfação de cidadãos e usuárioscom serviços específicos do setor público se comparacom seu nível de satisfação com serviços específicosdo setor privado? 7011.4. Quais são as prioridades de cidadãos e usuáriospara ação, incluindo prioridades para centrais deatendimento integrado do tipo single window, emnível nacional e por Estado? 7011.5. Qual é a melhor maneira de desenvolver parâmetrosnormativos para serviços dentro do governo federal edos governos estaduais do Canadá? 7111.6. Quais são as expectativas dos cidadãos com relaçãoa padrões genéricos de serviço? 71

Notas 73

Referências bibliográficas 87

Anexo 1Pesquisa do Estado da Georgia: satisfação segundo aamostra do público em geral e de usuários recentes 91

Anexo 2Desempenho relativo dos serviços no setor público eprivado na Grã-Bretanha 93

Anexo 3Avaliações de PTM (Percentual Médio Ajustado aoMáximo) para Seviços Individuais 95

Anexo 4Quadro referencial para modernização da prestaçãode serviços do setor público 97

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Texto II — Satisfação do usuário: guia para o gerentepúblico no Canadá 99Faye Schmidt & Teresa Strickland

Agradecimentos 101

1. Introdução 1032. Por que pesquisar a satisfação do usuário? 106

2.1. O custo das pesquisas de satisfação de usuários? 1062.2. Seja pró-ativo! Seja preventivo! 1062.3. Correios do Canadá transformam-se por meiode avaliações de desempenho 1072.4. Os benefícios de se fazerem pesquisas desatisfação de usuários 1072.5. Medindo a satisfação do usuário: informaçõespesquisadas ao longo de mais de 10 anos 1082.6. Lições aprendidas 109

3. O que é importante considerar? 1113.1. A lacuna de serviço 1113.2. Elementos-chave do serviço a serem avaliados 1123.2.1. Expectativas dos usuários 1123.2.1.1. Uma palavra a respeito dos padrões de serviço 1123.2.1.2. Correios do Canadá — padrões deserviço e expectativas 1133.2.2. Percepções do serviço recebido 1143.2.3. O nível de importância 1143.2.4. Satisfação 1143.2.5. Prioridades para melhorias 1153.2.5.1. Centro de Material de Expediente (OPC) daComissão de Compras de British Columbia 1153.2.6. Demografia: quais são as necessidades de nossosgrupos específicos de usuários? 1163.2.6.1. BC Parks descobre a fonte de problema,compreendendo quem são seus usuários 1163.2.6.2. Características de atendimento: construindoblocos do seu serviço 117

4. Como começar 1194.1. Preparando a implementação 1204.1.1. Passo um: identifique seus serviços e usuários 120

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4.2. Passo dois: clarifique seus objetivos 1224.3. Passo três: desenvolva sua estratégia de medida 1234.4. Passo quatro: interprete, analise e relate 1274.5. Passo cinco: desenvolva um plano de melhorias 1294.6. Passo seis: avalie as melhorias e repita o ciclo 131

5. Conclusão 133

Referências bibliográficas 135

Anexo 1Parâmetros para modernizar a prestação de serviçosdo setor público 137

Anexo 2Ferramenta Comum de Medida (CMT) 139

Seção 1Prestação de serviço/fornecimento de produto 141

Seção 2Acesso e instalações 145

Seção 3Comunicação 147

Seção 4Custo 149

Seção 5Perguntas gerais 151

Seção 6Informações a seu respeito (Para Usuários Externos) 155

Seção 7Informações a seu respeito e da sua organização(Para Usuários Externos) 159

Seção 8Seus comentários são muito impotantes para nós 161

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Apresentação

A implantação do conceito de administração voltada para o usuário/cidadão dos serviços públicos destaca-se entre as iniciativas do atual pro-cesso de reforma do aparelho do Estado no Brasil em direção à gestão empre-endedora e voltada para resultados, que garanta uma prestação de serviçoseficiente e com qualidade.

Nesse contexto, a melhoria da qualidade dos serviços prestados aousuário/cidadão assume um papel muito importante: trata-se de colocar emprática novas idéias gerenciais, oferecendo à sociedade um serviço públicomais adequado às expectativas dos cidadãos, focando as ações naqueles queusufruem dos serviços públicos.

O direcionamento das ações da administração pública brasileira parao atendimento das necessidades do usuário/cidadão vem sendo paulatina-mente implementado no âmbito do governo federal por meio de diversasações. Foi realizada a 1a Pesquisa Nacional de Satisfação do Usuário dos Ser-viços Públicos, e editado o Decreto n. 3.507, de 13 de junho de 2000, defi-nindo diretrizes normativas para o estabelecimento de padrões de qualidadedo atendimento prestado por órgãos e entidades da Administração PúblicaFederal que atendem diretamente aos cidadãos. Adicionalmente, diversosprogramas do Avança Brasil apresentam o grau de satisfação do usuário comoindicador e a necessidade de mensurar. A satisfação do usuário foi menciona-da como aspecto que mais caracteriza o respectivo programa por 42% dosgerentes PPA 2000-2003 em pesquisa realizada pela ENAP Escola Nacionalde Administração Pública.

O objetivo de direcionar a ação do Estado para atender as expectati-vas do usuário-cidadão traz um desafio adicional — além da melhoria daprestação dos serviços públicos em si — que é o de implantar procedimentose instrumentos para medir a satisfação dos usuários com os serviços públi-cos. Existe um crescente reconhecimento de que a opinião dos usuários éuma parte fundamental da avaliação da efetividade de programas e políticas,sem a qual a avaliação tem legitimidade limitada.1 No entanto, a falta de co-nhecimento sobre os instrumentos necessários para a coleta de informaçõescom os usuários pode limitar progressos significativos nessa área.

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A necessidade de se acompanhar o nível de satisfação dos usuárioscom os serviços públicos e a utilização dessa informação para a melhoriacontínua dos serviços prestados confere crescente importância a instrumen-tos que possibilitem a medição dessa satisfação como uma ferramenta degestão. Trazer informações e conhecimentos que ofereçam subsídios parasolução de problemas concretos relacionados à avaliação da satisfação dousuário de serviços públicos específicos é o objetivo que motiva a publica-ção deste Caderno ENAP.

O Caderno ENAP é composto pela tradução de dois relatórios depesquisa elaborados no âmbito de uma rede de pesquisa formada por mais de200 altos administradores públicos dos três níveis de governo do Canadá, porrenomados acadêmicos e especialistas na área de prestação de serviços pú-blicos, denominada Citizen-Centred Service Network (CCSN).

A CCSN foi estabelecida em 1997 pelo Canadian Centre forManagement Development (CCMD)2 com o objetivo de contribuir para amelhoria da prestação de serviços públicos aos canadenses. A CCSN desenvolveum trabalho integrado além das fronteiras organizacionais e governamentais,busca identificar áreas em que são necessárias informações e conhecimento paraproporcionar uma melhoria nos serviços públicos e desenvolver as pesquisasnecessárias, divulgando os resultados entre seus membros.

Até o presente, os trabalhos da CCSN resultaram em seis relatórios,dois dos quais estão sendo publicados neste Caderno ENAP: Citizen/ClientSurveys: Dispelling Myths Redrawing Maps e Client SatisfactionSurveying: A Manager’s Guide.3

O objetivo desta apresentação é explicar porque esses relatórios quetratam de pesquisas de avaliação da satisfação dos usuários com os serviçospúblicos canadenses, um tema aparentemente tão específico, podem trazercontribuições importantes para se pensar a prestação de serviços públicosadequados às expectativas dos usuários/cidadãos no Brasil.

A pesquisa realizada pelo CCSN tem um ponto de partida específico:relativiza e comenta resultados de enquetes realizadas com usuário/cidadãoque apontam que os canadenses tem um baixo nível de confiança no governo,acreditam receber um serviço de má qualidade pelo valor do imposto que pa-gam e sentem que recebem melhores serviços do setor privado. Apesar desseponto de partida específico, a análise realizada é geral e fornece informaçõesrelevantes para se pensar a qualidade de serviços públicos e os instrumentospara sua aferição, conferindo ao texto um interesse mais amplo.

O texto não tem a pretensão de ser uma revisão acurada e exaustivada literatura mas, mais propriamente, uma primeira aproximação para odesenvolvimento de uma compreensão sobre a visão dos usuários/cidadãos arespeito dos serviços públicos e das pesquisas que a documentam.

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De acordo com o relatório Citizen/client surveys: Dispelling mythsand Redrawing maps os resultados das pesquisas realizadas no Canadá po-dem ser contestados porque as perguntas e comparações aplicadas nos levan-tamentos não são adequadas. Não consideram as especificidades dos serviçospúblicos e os fatores que afetam a percepção dos cidadãos sobre os serviçospúblicos, comparam serviços privados específicos com serviços públicos emgeral e não incorporam a experiência pessoal do usuário na avaliação da suapercepção do serviço público. Adicionalmente, é ressaltada a necessidade,com vistas à melhoria permanente dos serviços públicos, de se poder fazercomparações de desempenho do mesmo serviço público ao longo do tempo eentre serviços públicos diferentes e, para viabilizá-la sugere a adoção de umquestionário padrão de avaliação, a Common Measurement Tool — CMT(Ferramenta Comum de Medida).

A partir dessa discussão mais ampla é apresentado no segundo rela-tório Client Satisfaction Surveying: A Manager’s Guide um modelo dequestionário padrão que permite identificar áreas para melhoria dos serviçospúblicos que vão ao encontro das expectativas dos usuários. Além disso, éapresentada uma proposta de plano para implantar um processo de avaliaçãopermanente da satisfação do usuário — com a utilização do questionário pa-drão — e são relacionados os benefícios de se realizar permanentementeesse tipo de avaliação, entre eles: a identificação de oportunidades paramelhoria dos serviços, a alocação mais efetiva de recursos para atender asprioridades dos usuários, o desenvolvimento de respostas pró-ativas paraequacionar demandas emergentes, avaliação do cumprimento da missão daorganização etc.

A idéia de que o objetivo das pesquisas de avaliação com o usuárionão deve restringir-se a conhecer os níveis de satisfação, mas também auxi-liar no desenvolvimento de estratégias para resolver problemas, é tambémenfatizada pelo relatório.

Com a publicação desses dois relatórios, não se pretende apresentaruma experiência estrangeira com vistas à sua mera reaplicação na administra-ção pública brasileira, mas sim, trazer uma experiência concreta que possafacilitar o processo de desenho de um instrumento específico, observadas asespecificidades de cada instituição. A lista de critérios utilizados para aferi-ção da satisfação do usuário no questionário padrão apresentado deve ser en-tendida como um elenco inicial de itens a ser questionado, retrabalhado eampliado, de acordo com as características específicas de cada atividade.

Finalmente, a publicação deste Caderno ENAP, que visa a divulga-ção de um tema de alta importância no momento atual de ênfase da qualida-de dos serviços prestados pelo setor público e a criação de um ambiente deum serviço público voltado para o cidadão, representa mais uma ação do

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trabalho de cooperação entre a ENAP Escola Nacional de AdministraçãoPública e o Canadian Centre for Management Development (CCMD), ini-ciado no ano de 2000. Os trabalhos publicados destacam-se por oferecerinformação e conhecimento de qualidade que podem ajudar a resolver pro-blemas concretos da administração pública na linha da pesquisa aplicada.

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Texto I — Metodologia paramedir a satisfação do usuáriono Canadá: desfazendo mitos eredesenhando roteiros

Geoff Dinsdale é do Centro Canadense de Gestão e D. Brian Marsonpertenceu ao Centro Canadense de Gestão e atualmente está na Secreta-ria do Conselho do Tesouro do Canadá.Contato com os autores: [email protected]

Geoff Dinsdale &

D. Brian Marson

© Centro Canadense de Gestão 1999

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Prefácio

Este trabalho foi realizado para a Citizen-Centred Service Network— CCSN (Rede de Serviços Voltados para o Cidadão), criada em resposta àsolicitação do Head of the Public Sevice (Chefe do Serviço Público), a fimde tornar a melhoria do serviço público uma prioridade governamental. Como apoio do Canadian Centre for Management Development — CCMD(Centro Canadense de Gestão), os membros da Rede estão comprometidos atrabalhar em conjunto para melhorar o serviço aos cidadãos. Nesses mem-bros incluem-se mais de 200 servidores de alto escalão de todos os três Po-deres do governo, bem como membros da academia com especialização naárea de prestação de serviços.

Durante sua primeira reunião em julho de 1997, a Rede concluiu que,apesar do progresso na melhoria da prestação de serviços, ainda existia umadistância significativa entre as expectativas dos cidadãos com relação à pres-tação desses serviços e aquela que efetivamente recebem do governo. Osmembros da Rede comprometeram-se a reduzir essa distância, mas reconhe-ceram que qualquer estratégia de redução precisa estar ancorada em uma me-lhor compreensão das prioridades dos cidadãos com relação à melhoria dosserviços e numa estratégia coordenada do setor público para responder a es-sas prioridades. Isso levou à identificação de dez projetos de pesquisa. Estedocumento é o produto do Projeto 1: Uma Revisão do Conhecimento Exis-tente sobre as Expectativas e a Satisfação de Usuários/Cidadãos com os Ser-viços do Setor Público.

A pesquisa básica para este documento foi realizada entre novembrode 1997 e março de 1998. O propósito da revisão foi duplo:

• identificar e documentar o que já se sabia sobre os pontos de vistados cidadãos a respeito dos serviços governamentais;

• identificar as lacunas em nosso conhecimento que requerem pes-quisa adicional, a fim de os gestores poderem melhorar a forma de mensuraros serviços prestados aos cidadãos.

Identificando as lacunas em nosso conhecimento, este docu-mento veio fornecer uma fundação sólida para várias pesquisas subse-qüentes da Rede. De fato, muitas lacunas de conhecimento identificadas

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neste relatório foram ou estão em vias de serem complementadas por meiode pesquisas de seguimento.

Este relatório obteve um benefício valioso do feedback de muitosservidores públicos e professores. Os autores são especialmente gratos aRalph Heintzman, Samuel Wex, Faye Schmidt, Ken Kernaghan, Paul Thomas,Don Dickie, Maurice Demers, Bob Denhardt, Paul Reed, Donna Mitchell,Peter Aucoin e Colin Ewart. Quaisquer erros ou omissões são de responsabi-lidade dos autores, Geoff Dinsdale e D. Brian Marson.

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Resumo Executivo

Este documento procura reunir informações sobre as percepções dopúblico a respeito dos serviços prestados pelo setor público. Ele apresentauma base a partir da qual se pode realizar pesquisas posteriores, com o pro-pósito de fornecer aos gestores as ferramentas e as informações necessáriaspara melhorar o serviço público prestado aos cidadãos.

O documento identifica uma gama de fatores que, em maior ou menorgrau, geram satisfação com os serviços. Esses fatores incluem as expectativasde prestação de serviços, a real prestação de serviços (rapidez e cortesia, porexemplo), características do serviço envolvido ( voluntário versusinvoluntário), dados demográficos dos receptores do serviço e as percepçõesdo público com relação à confiança nos políticos e nos servidores públicos.Em seguida, são investigadas as diversas naturezas dos serviços do setor públi-co e privado e seu impacto é discutido. O documento enfoca as trêsconstatações básicas resultantes.

Em primeiro lugar, as pesquisas que relatam que usuários e cidadãosestão insatisfeitos com os serviços prestados pelo setor público ou que osserviços do setor privado são de uma qualidade superior aos do setor públicopodem não estar contando a história real. Na verdade, é inadequado compararcertos serviços do setor público com serviços do setor privado. Simplifi-cando: os serviços do setor público geralmente têm outras finalidades (pro-teger o interesse público), por meio de mecanismos diferentes (eqüidade edevido processo) daqueles dos serviços do setor privado, que visam ao lucro.Como resultado disso, os serviços do setor público, como os serviços dosetor privado, buscam maximizar a satisfação do usuário; mas, diversamentedo setor privado, no setor público, essa satisfação precisa ser equilibradacom a proteção do interesse público. Manter esse equilíbrio pode tornar al-guns serviços públicos inadequados para fins comparativos.

Apesar da restrição acima, as pesquisas realizadas pela InsightResearch em 1992, pela Ekos Research Associates Inc, em 1996 e peloNational Quality Institute em 1996 e 1997 compararam os serviços gover-namentais com certos serviços do setor privado. Sem exceção, essas pesqui-sas constataram que o público avaliou o desempenho dos serviços públicos

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significativamente abaixo dos serviços do setor privado (bancos, por exem-plo). A metodologia empregada nessas pesquisas, contudo, é questionável.Elas comparam as percepções dos cidadãos e dos usuários a respeito dosserviços governamentais com a percepção deles dos serviços específicos dosetor privado. A dificuldade com essa abordagem é que as perguntas sobre aspercepções dos usuários ou cidadãos com relação a entidades tão amplascomo governo ou serviço público parecem evocar mais percepções negativas(burocracia, por exemplo) que as perguntas a respeito da experiência especí-fica com os serviços. Ratificando essa constatação, as avaliações de experi-ências com serviços específicos provaram ser significativamente mais altasque as de serviços governamentais ou do setor público em geral. Isso sugereque a lacuna de desempenho que aparentemente existe entre os serviços pri-vados e os do setor público pode ser menor que relatada anteriormente, epara alguns serviços pode até não existir.

Em segundo lugar, é difícil atribuir significado a níveis de satisfaçãona ausência de parâmetros normativos. Não se trata apenas de uma variedadede metodologias de pesquisa utilizada para medir uma multiplicidade de ser-viços, mas certos serviços estão predispostos, por natureza, a receber avalia-ções altas ou baixas. Portanto, uma dada avaliação pode ser considerada boapara um tipo de serviço (prisões, por exemplo), mas ruim para outro (par-ques, por exemplo). Isso indica a necessidade de uma ferramenta oumetodologia padronizada para facilitar comparações confiáveis entre servi-ços similares e o desenvolvimento de parâmetros (benchmarks) normativos.Tais comparações poderiam ser feitas utilizando-se um dentre três métodos:convertendo as escalas de diferentes instrumentos de pesquisa, utilizando umíndice de satisfação de usuário, ou utilizando um instrumento padronizado depesquisa. A última dessas abordagens, argumenta-se, provê informação maisútil e de maior confiabilidade.

Em terceiro lugar, as pesquisas são uma ferramenta poderosa nãoapenas para determinar a satisfação de cidadãos e usuários com os serviços,mas para desenvolver estratégias visando a melhoria dos mesmos. Apesar desubutilizadas no passado, as pesquisas podem ajudar a assegurar que as estra-tégias de melhoria de serviços concentrem-se naqueles aspectos que farão adiferença maior para os cidadãos. De outra forma, as pesquisas ajudam agarantir que as melhorias dos serviços concentrem-se naquilo que os usuári-os/cidadãos desejam, em oposição ao que os tomadores de decisões achamque eles querem. Tendo isso em vista, o documento investiga como as pes-quisas podem informar os dirigentes a respeito das prioridades dos usuários/cidadãos com relação às melhorias, assim como ajudar a identificar padrõesde serviço apropriados e relevantes. As pesquisas também podem coletar

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essa informação dos usuários internos — servidores públicos que recebemserviços diretamente de outros servidores públicos.

O documento conclui que, a fim de melhorar serviços aos cidadãos demaneira mensurável, pesquisas adicionais fazem- se necessárias para identificar:

• o que determina a satisfação de usuários e cidadãos;• qual é a relação entre experiências específicas de serviços e as per-cepções do desempenho governamental em geral, incluindo as per-cepções de confiança;• nível de satisfação do público com serviços específicos do setorpúblico;• as prioridades de cidadãos e usuários para melhorias em âmbitonacional e do Estado;• parâmetros normativos de desempenho para serviços similares den-tro dos governos do Canadá e por meio deles;• as expectativas dos usuários com relação a padrões genéricos deserviços, em âmbito nacional e do Estado;• informações a respeito de serviços internos, incluindo os níveis desatisfação, a identificação dos parâmetros normativos, as prioridadespara melhoria e a relação entre a satisfação relativa aos serviçosinternos e externos.

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1. Introdução

As pesquisas de avaliação não têm nada de novo. Permanecem umaconstante nas caixas de ferramentas governamentais, devido à sua habilidadede informar os tomadores de decisão a respeito das expectativas, percepçõese preferências dos usuários/cidadãos.4

Pesquisas recentes entre usuários/cidadãos ganharam destaque em fun-ção das suas constatações de que os canadenses depositam um baixo nível deconfiança no seu governo, acreditam receber um serviço ruim pelos dólarespagos em impostos e sentem que recebem melhores serviços do setor privado.Na verdade, as pesquisas conduzidas pela Insight Research em 1992, pelaEkos Research Associates Inc., em 1996 e pelo National Quality Institute em1996 e 1997 constataram que o público avalia o desempenho dos serviços go-vernamentais como sendo significativamente inferior ao dos serviços do setorprivado. Será que essas e outras pesquisas estão fazendo as perguntas certas?As histórias que elas contam estão sendo precisas? São elas completas? Se aimportância dessas perguntas não é imediatamente aparente, imagine como osresultados das pesquisas podem ter um impacto dramático sobre os programasde ação do governo, sobre a percepção do público a respeito do governo e so-bre a percepção dos servidores públicos acerca de si mesmos.

Espera-se que este documento atue como um catalisador para discus-sões, debates e pesquisas posteriores referentes à criação e à interpretaçãode pesquisas entre cidadãos. Seu propósito é revisar pesquisas recentes pormeio dos olhos do usuário, levando em conta o que sabemos, o que não sabe-mos e o que precisamos saber. Isso será alcançado pela investigação maisespecífica dos seguintes aspectos:

• os fatores que influenciam as percepções dos cidadãos a respeitodos serviços;• a metodologia e validade das pesquisas que comparam serviços dosetor público e do setor privado;• as vantagens de utilizar um instrumento padronizado de pesquisas;• o potencial das pesquisas para que ajudem a identificar e retificarlacunas entre as expectativas dos usuários com relação aos serviçose as percepções dos serviços que recebem, concentrando-se nas

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prioridades por melhorias, nos padrões de serviço e em usuáriosinternos como exemplo;• as três constatações principais do documento;• a necessidade de pesquisa adicional elaborada a partir dasconstatações deste documento.

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2. Metodologia

O conteúdo deste trabalho deriva de uma série de pesquisas com usu-ários/cidadãos, de seus relatórios e da literatura acadêmica. Concentra-senos últimos dez anos e engloba três níveis de governo no Canadá e no exte-rior. O núcleo da pesquisa foi realizado entre novembro de 1997 e março de1998. Infelizmente algumas pesquisas importantes não puderam ser obtidas,porque não foram publicadas, apenas foram distribuídas aos usuários envol-vidos no processo, ou são uma coletânea de pesquisas disponíveis somentepara assinantes. Este documento, portanto, não deveria ser considerado comosendo uma revisão exaustiva da literatura, mas sim um primeiro corte no sen-tido de se desenvolver uma compreensão mais refinada, consistente e precisada dinâmica por detrás dos pontos de vista de cidadãos e usuários a respeitodos serviços do setor público e das pesquisas que os registram. Como resul-tado, os leitores são encorajados a contribuir com este trabalho contínuo,encaminhando materiais relevantes ao Grupo de Pesquisa e PlanejamentoEstratégico do Centro Canadense de Gestão.

2.1. Medidas de desempenho subjetivas versus objetivas

Este documento reconhece que as pesquisas somente podem forne-cer medidas de desempenho soft, subjetivas. Pode-se argumentar que medi-das de desempenho hard, objetivas, são mais importantes que as subjetivas.Na verdade, tanto as subjetivas como as objetivas são elementos importantespara a mensuração do desempenho. Contudo, o presente trabalho não trata dodesempenho do governo em geral, mas especificamente do desempenho deseus serviços, da mensuração desse desempenho por meio dos olhos dosusuários/cidadãos e de como utilizar as constatações para auxiliar namelhoria dos serviços. Na verdade, melhorar o serviço exige focalizar o queos usuários/cidadãos desejam, não o que os tomadores de decisão pensamque eles desejam. Isso significa dizer que os tomadores de decisão precisamolhar os serviços pela perspectiva dos cidadãos e não pela perspectiva das

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instituições. Por essa razão, este documento concentra-se na interpretação,ainda que subjetiva, da voz do cidadão/usuário — uma tarefa nada insignifi-cante para qualquer democracia.5

2.2. Pesquisas de cidadão e usuários: existe diferença?

Os termos usuário e cidadão já foram utilizados várias vezes nestetrabalho, mas ainda não foram definidos. A fim de assegurar clareza — oupelo menos evitar confusão — os termos aqui definidos foram: um cidadão,como membro de uma comunidade (em âmbito nacional, estadual e local),possui certos direitos e está limitado por certos deveres e obrigações; umusuário, por outro lado, não precisa ser um cidadão, mas, por necessidade, éum receptor direto de um serviço.6 Essa distinção é crucial, especialmentenum trabalho de pesquisa, uma vez que apenas os usuários de um dado serviçopodem responder às questões sobre uma experiência de serviço com conhe-cimento de causa. Conseqüentemente, as pesquisas de usuários concentram-se nas percepções que eles têm de um serviço, de acordo com a informaçãode suas experiências com o mesmo. As pesquisas de cidadãos, por outrolado, envolvem os eleitores dentro de uma dada jurisdição e focalizam maisas questões gerais de governabilidade (gastos e prioridades do programa,direcionamento estratégico e alocação de recursos, por exemplo), que nãoexigem necessariamente contato prévio com um serviço específico.7

A importância de se esclarecer essa diferenciação é imensa. Não setrata apenas de compreender por que se está realizando uma pesquisa e o queela procura alcançar, mas de assegurar que as perguntas feitas são relevantespara os propósitos almejados e adequadas para o público pesquisado. Contu-do, como se pode suspeitar, a diferença entre esses dois tipos de pesquisanem sempre é visível. Para ilustrar: uma pesquisa pode perguntar a umaamostra aleatória do público sobre aspectos de um determinado grupo deserviços. Nesse caso, os entrevistados podem incluir pessoas que nunca utili-zaram quaisquer dos serviços, pessoas que utilizaram todos os serviços e/oupessoas que utilizaram parte dos serviços. Além do mais, os entrevistadospodem responder assumindo diferentes “papéis”. Por exemplo, uma pessoa,como usuário, pode desejar níveis mais altos de serviço; mas como cidadãopercebe que os recursos necessários para fazê-lo seriam melhor alocados emoutra parte. Por fim, mesmo que a linha divisória entre as pesquisas de usuá-rios e as de cidadãos possa não ser sempre nítida, as definições oferecidasacima fornecem um ponto de partida bastante útil para enquadrar e esclareceresssa questão importante e complexa.8

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3. Serviços do setor público e privado:distintos na sua concepção

Diversas pesquisas compararam o desempenho dos serviços do setorgovernamental ou público com o do setor privado e concluíram que este últi-mo presta melhores serviços. Esses resultados receberam grande destaque,especialmente dentro do setor público. Comparar os setores público e pri-vado não é necessariamente inadequado, mas é preciso reconhecer que essessetores são filosófica e operacionalmente diferentes.9

Na maioria dos casos, o governo limita seu envolvimento naquelesbens e serviços que não podem ser eficientemente produzidos ou consumi-dos na sua ausência (isto é, falha de mercado) ou para os quais existe um mo-tivo legal, de segurança nacional ou de interesse público para prestação porparte do governo. A magnitude dos serviços resultantes é quase surpreen-dente. Para exemplificar, o governo federal envolve-se em assuntos relativosa comportamento e moral (políticas confidenciais, segurança nacional etc);serviços de informação (pesquisa científica, consultas etc); transferências(contribuições e subsídios); regulamentação, inspeção e fiscalização(encarceramento, policiamento etc); serviços legais e judiciais; gestãocorporativa, serviços administrativos e de apoio e outros serviços prestadosdiretamente ao público. Esses se manifestam em uma gama de atividades gover-namentais. Em âmbito federal, os negócios do governo vão da agricultura,parques, recursos naturais e meio ambiente até saúde, segurança e proteção,educação e treinamento, emprego e trabalho; da regulamentação de serviçosde infra-estrutura, impostos e desenvolvimento industrial até imigração, co-mércio internacional, relações exteriores e defesa nacional.

O serviço público também é diferente em sua gestão do risco e daresponsabilidade. Por exemplo, um fabricante de produtos eletrônicos podetolerar 10, 20 ou talvez até 50 falhas consecutivas em cada 100 tentativas eainda permanecer sendo uma entidade vibrante e lucrativa. Porém, na gestãodo dinheiro do contribuinte, um erro em 100 pode ser desastroso, necessi-tando de métodos rígidos de responsabilidade, especialização e padronizaçãode certas áreas do governo.10

Outras diferenças são aparentes no uso do termo usuário, no setorprivado, e do termo cidadão, no setor público.11 Diferentes da maioria dos

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seus colegas do setor público, os negócios do setor privado precisam lucrarpara sobreviver. Com essa finalidade, ele presta aos usuários um serviço sin-gular, muitas vezes colocando certos usuários acima de outros (usuário pre-ferencial ou com tratamento VIP). O setor público, por sua vez, não escolhefavoritos entre seus cidadãos, nem tem como meta obter lucro. Isso requerque todos os cidadãos recebam o mesmo nível de serviço, para assegurar aobediência aos valores democráticos (responsabilidade, lealdade, e a normada lei), aos princípios de justiça natural (justiça, devido processo e imparciali-dade) e à igualdade horizontal (tratamento igual para pessoas de diferentesgrupos e regiões). Portanto, tanto os meios (justiça,devido processo e probi-dade) como os fins (proteger o interesse público e obter bens públicos) dosetor público são diferentes daqueles do setor privado.12 Dever-se-iaenfatizar também que — distintamente dos usuários, que se limitam a ser recep-tores diretos de serviços — os cidadãos pertencem a uma grande comunidade— a democracia a que denominamos Canadá — e, portanto, não apenas pos-suem certos direitos, mas estão limitados por deveres e obrigações.13

Em outras palavras, no setor privado, o receptor direto de um serviço(o usuário) recebe todos os benefícios desse serviço, ou seja, não fluem paraoutros receptores. No caso de muitos serviços públicos, contudo — especi-almente em áreas de regulamentação e policiamento — uma grande parte dosbenefícios fluem para os cidadãos em geral, não só ao receptor direto do ser-viço (o usuário). Considere serviços como fiscalização de alimentos, controlede poluição e policiamento em que os cidadãos, não os receptores diretosdos serviços (os usuários, ou nestes casos talvez mais apropriadamente deno-minados usuários cativos), obtêm o maior benefício dos serviços.14 Eles sesentem seguros de que não serão envenenados pelo ar que respiram ou pelosalimentos que ingerem e de que não serão agredidos nas ruas pelas quais cami-nham. Por outro lado, aqueles que usufruem dos serviços geralmente não sãoapenas os receptores diretos dos mesmos, mas também os cidadãos que osrecebem (portanto, um cidadão como usuário). Os condenados, por exemplo,não são simplesmente usuários — receptores diretos dos serviços de corre-ção — mas também cidadãos. Eles estão cumprindo com suas responsabili-dades e obrigações com o Canadá por meio do cumprimento da sentença, aomesmo tempo que o sistema de correção assegura que seus direitos comocidadãos sejam respeitados. Portanto, quando uma pessoa é tanto cidadãocomo usuário, o primeiro abarca o segundo e pode ser considerado comoprovedor do contexto, ou da estrutura, dentro do qual o segundo existe.

A tensão que existe entre cidadãos e usuários é adequadamente des-crita no Report of the Deputy Minister’s Task Force on Public ServiceValues and Ethics (Relatório da Força-Tarefa dos Vice-Ministros sobre Valorese Ética dos Serviços Públicos)15: “... o verdadeiro papel dos servidores públi-

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cos não é simplesmente servir usuários, mas também equilibrar os interessese preservar os direitos dos cidadãos”.16 A discussão pode ser ampliada aindamais para incluir situações em que os interesses de usuários e cidadãos nãosão os mesmos; por exemplo, no caso em que o usuário do governo é umafábrica cuja poluição do ar é regulamentada pelo governo, e os cidadãos sãotodas as pessoas que vivem nas proximidades da fábrica. Obviamente, o governonão pode agir somente de acordo com os interesses do usuário, uma vez queos interesses dos cidadãos também estão direta e indiretamente sendo afeta-dos pelo efeito da poluição. Aqui também o beneficiário desse serviço regu-lador e de fiscalização não é o usuário (o receptor do serviço direto), mas oscidadãos em geral. Para ampliar ainda mais essa equação, considere os inte-resses de outras pessoas, tais como os investidores, empregados, gruposambientalistas e aqueles que vendem material para a empresa. Enfim, todosesses fatores precisam ser equilibrados no setor público, mas normalmentenão estão presentes no setor privado.

Deveria ficar claro, portanto, que o setor público engloba diferentesprincípios e valores, e precisa considerar e atender exigências, limitações einteresses diferentes daqueles do setor privado. Isso é que o torna diferente,e essa distinção é importante para os cidadãos. Evidências recentes sugeremque os cidadãos não querem que o setor público se desvie do seu papel deguardião do interesse público, ou, conseqüentemente, seu foco na eqüidade eno devido processo. Quando solicitado a indicar qual das seguintes afirmati-vas melhor representa seu ponto de vista —“Os governos precisam transfor-mar-se, para se assemelhar mais aos negócios” ou “Um foco muito acentuadonas práticas do setor privado irá enfraquecer a habilidade do governo de pro-teger o interesse público” — 63% dos entrevistados concordaram com aúltima afirmativa.17 Uma vez que essa missão diferente do interesse público éreconhecida, torna-se claro para o governo que a satisfação do usuário é ape-nas uma peça em um quebra-cabeças muito maior.

Isso levanta questões a respeito da validade de se comparar serviçosdo setor público com serviços do setor privado. Talvez seja mais adequadocomparar serviços governamentais semelhantes aos serviços do setor pú-blico, tais como a administração de parques ou o processamento de cheques,em outras palavras, serviços nos quais os benefícios fluem quase que inteira-mente e especificamente para o usuário ao invés de fluir para os cidadãos emgeral. Pelo contrário, pode ser inadequado comparar serviços do setor pri-vado com serviços governamentais que buscam preservar o interesse público(regulamentação e fiscalização, por exemplo), e assim atendem aoscumpridores e aos prisioneiros, em vez de usuários. Não se trata apenas deser sensível aos serviços dos setores público e privado que claramente são detipos diferentes (comparando maçãs com laranjas), mas também perceber as

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diferenças em grau (comparando Espartanos com McIntoshes). Como regrageral, se os benefícios de um serviço público fluem principalmente para oscidadãos em vez de fluirem para o receptor direto do serviço, é improvávelque aquele serviço tenha uma contraparte comparável no setor privado.

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4. Percepções dos serviços

Entre os diversos elementos que pesam sobre as percepções dos usuáriosa respeito dos serviços estão a cultura, as regras e o sistema de gestão da or-ganização, bem como o conhecimento, as habilidades e a atitude de cada fun-cionário com a qualidade do serviço. A cultura, os princípios e os valoresespecíficos do setor público também são importantes. Ampliando a questão,poder-se-ia dizer que cada usuário traz expectativas diferentes para a experi-ência com o serviço. As expectativas são informadas por meio das experiên-cias passadas dos usuários, bem como pela informação e a propagandafornecidas pelas organizações de serviço. É claro, a avaliação dos usuáriosdos serviços também é influenciada pela própria experiência com ele.

Mesmo que nem sempre sejam reconhecidos, existem vários fatoresque podem influenciar as avaliações dos serviços públicos que simplesmentenão existem no setor privado. Considere os motivos pelos quais os usuáriosbuscam os serviços. No setor privado, os prestadores individuais de serviçosquase sempre são solicitados como resultado de um desejo ou pelo menos daescolha; mas no setor público, há poucas opções quanto a prestadores. Emalguns casos, os serviços públicos são legalmente exigidos, o que significaque muitos usuários do governo na verdade o são involuntariamente. Comoexemplos temos usuários do corpo de bombeiros, da assistência financeira,da regulamentação, dos registros, do policiamento, da correção, da tributaçãoe dos serviços hospitalares. Da perspectiva dos servidores públicos, isso sig-nifica tentar satisfazer a todos os usuários, incluindo aqueles que, se tives-sem opção, não usariam o serviço.

Outro elemento que pode influenciar as percepções dos serviços dosetor público é a confiança dos cidadãos no governo, nos políticos e nos ser-vidores públicos. Em 1989, Goldfarb solicitou a indivíduos que avaliassematé que ponto eles acreditavam que integridade e honestidade estavam pre-sentes nos três níveis do governo. Combinando as duas categorias positivas,48 % dos entrevistados acreditavam que havia algum ou um alto nível de inte-gridade e honestidade em âmbito federal, 62 % compartilharam uma perspec-tiva semelhante com relação ao nível estadual, enquanto em âmbito munici-pal, 74 % compartilhavam desse sentimento.18 O padrão geral, portanto, vê o

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mais alto grau de confiança depositado nos governos locais, seguidos pelosestaduais e pelo governo federal. Fornecendo comentários relevantes e pos-sivelmente uma explicação parcial, Leslie Seidle observa que “Muitos cana-denses sentem-se mais próximos ao governo estadual e confiantes nele doque no governo federal — um desenvolvimento que pode ser observado des-de, pelo menos, a década de 70. Essa tendência pode muito bem influenciarna forma como os canadenses julgam o serviço público federal.”19

As avaliações de desempenho caem em efeito cascata dos níveis maisaltos aos mais baixos, através dos três níveis de governo. Para ilustrá-lo, umapesquisa realizada em 1989 pela Environics perguntou aos entrevistados se osimpostos que eles pagavam a cada nível do governo valiam a pena pelos servi-ços que recebiam em troca. No nível federal, 57 % dos entrevistados sentiamque os serviços que recebiam não correspondiam aos impostos que pagavam.No estadual, 45 % dos entrevistados demonstraram o mesmo sentimento,como também o fizeram 35 % dos entrevistados quanto ao governo local.20

A pesquisa de 1992, Perspectives Canada (Perspectivas Canadá), rea-lizada pela Insight Canada Research, solicitou aos entrevistados que avalias-sem os serviços recebidos de oito organizações, cobrindo os três níveis dogoverno. Os governos municipais receberam as avaliações mais altas (38 %avaliaram como bom/excelente), seguidos pelos governos estaduais (26 %) epor fim o governo federal (24 %).21 Em uma escala geral de qualidade de ser-viço, variando de 0 a 100 (0= extremamente pobre e 100= extremamente bom),os entrevistados da pesquisa de 1992 de Ontário, Best Value for Tax Dollars(Melhor retorno por dólares em impostos), deram uma avaliação de 55 a seu go-verno municipal, 45 ao governo de Ontário e 36 ao governo federal.22

Interrompendo um pouco essa cascata, a pesquisa realizada em 1997pela Ekos Research Associates Inc., intitulada Rethinking Government (Repen-sando o governo) constatou que o desempenho do governo federal era avalia-do um pouco abaixo dos governos locais, porém mais alto que os estaduais.Quando a Ekos perguntou aos entrevistados “Como você avalia o desempenhogeral do governo federal? ”, 37 % dos entrevistados avaliaram o serviço querecebiam do governo federal como sendo bom, 31 % avaliaram o desempe-nho do seu governo estadual como bom e 42 % avaliaram o desempenho doseu governo local como sendo bom.23 Ainda assim, o padrão geral parece serque os governos locais recebem uma avaliação de desempenho/satisfaçãomais alta que o governo federal. Permanece incerto se esse padrão está ligado ounão à confiança no próprio governo.

Entre 1980 e 1990, as percepções do público sobre confiança e res-peito relacionados a diferentes grupos (servidores públicos, políticos, bancos,organização religiosa, médicos e fazendeiros) foram investigadas. Os servido-res públicos foram melhor avaliados que os políticos, porém estiveram abaixo

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dos bancos, da imprensa, das organizações religiosas, dos médicos e dos fazen-deiros.24 Mais recentemente, o Índice Pollara de Confiança Pública de 1997constatou que apenas 21 % dos canadenses confiam muito nos servidorespúblicos, enquanto 32 % confiam muito em pessoas que administram bancos.25

Apesar de a confiança no governo ser baixa, ela não se encontra neces-sariamente em declínio. A pesquisa de 1997 conduzida pela Ekos, constatouque a confiança e a legitimidade do governo têm aumentado ao longo da dé-cada de 90. Quando a Ekos solicitou aos entrevistados que reagissem à afir-mativa “Creio que os padrões éticos do nosso governo federal decaíram mui-to na última década” — o que infelizmente exclui quaisquer distinções entrepolíticos e servidores públicos — 69 % dos entrevistados concordaramcom essa afirmativa em fevereiro de 1994, enquanto que apenas 60 % con-cordaram em janeiro de 1997. De maneira similar, a Ekos solicitou aos en-trevistados que indicassem se eles concordavam com a afirmativa “Tenho asensação de que os governos perderam de vista as necessidades do canadensecomum”. Em 1994, 76 % concordaram; em 1997, apenas 68 % concorda-ram.26 Ainda não está claro, se esse aumento na confiança representa umamudança na tendência. Vale a pena mencionar, contudo, que existe evidênciasignificativa para apoiar o argumento de que uma redução na confiança eminstituições cívicas está ocorrendo, em geral, em uma série de países.27

Como parte dessa mudança, as pessoas estão mais interessadas empolítica, contudo, têm uma confiança cada vez menor tanto nas instituiçõesgovernamentais tradicionais como nas não-governamentais que tendem a limitaras oportunidades de engajamento.28

Na verdade, a variedade e a extensão dos elementos que formam aequação da confiança pública ainda precisam ser identificadas. Fornecendoum ponto de partida, a Ekos concluiu que a confiança decrescente pode seratribuída “... a uma população cada vez mais idosa, a mudanças sociais etecnológicas rápidas, ao pluralismo crescente e a finanças públicas defici-tárias.”29 A emergência da “sociedade da informação” também precisa sermencionada, pois ela permitiu aos cidadãos acessar mais fontes de informa-ção em menos tempo que anteriormente.30 Esse fenômeno está diminuindo omonopólio dos governos sobre a informação e possivelmente está modifi-cando as expectativas dos cidadãos em relação a serviços governamentais,apesar de a extensão dessa influência permanecer desconhecida. Outro vetorpossível da confiança é a percepção dos usuários quanto à qualidade dos serviçosgovernamentais, apesar de que nenhuma evidência significativa poderia ser en-contrada para apoiar essa posição. Pesquisa adicional faz-se necessária paradeterminar se tal relação existe ou não.

É possível que sentimentos relativos a políticos e eventos políticos,amplamente divulgados pela mídia, sejam transmitidos para as percepções do

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público a respeito do serviço público e da prestação desses serviços. Isso sig-nifica dizer que a distinção entre política, governo e serviço público pode pare-cer difusa e, não-discernível aos olhos de muitos cidadãos. O documento de1990, Service to the Public: Task Force Report (Serviço para o público: Rela-tório da Força-Tarefa) sugere que o público realmente tem dificuldades emdistinguir o serviço público da esfera política.31 Seis anos depois, a Força-Ta-refa do Vice-Ministro sobre prestação de serviços relatou que “... mesmo quenão imune ao amplo ressentimento contra o governo, a maior parte da raiva ealienação do governo está direcionada aos políticos e à instituição do governocomo um todo.”32 Na pesquisa 1989 Decima Survey, os entrevistados foramquestionados se eles pensavam em políticos, servidores públicos, ou ambos, aoavaliarem sua confiança no governo. Um total de 67 % indicaram que eles pen-savam basicamente em políticos, 16 % disseram nos servidores públicos e 17% disseram em ambos.33 Supondo, portanto, que a confiança do público em relaçãoaos políticos e servidores públicos não seja plena, isso levanta a questão: oscidadãos separam seus pontos de vista sobre a confiança em políticos especifi-camente e o governo em geral, das suas avaliações do desempenho dos servi-ços? A resposta ainda não foi determinada de maneira conclusiva, mas comoresultado de seus estudos sobre as percepções públicas dos serviços, DavidZussman concluiu que, de fato, “As percepções do público a respeito da hones-tidade e integridade de seus governos afetam sua avaliação em relação aos ser-viços que recebem dessas instituições.”34

A imprensa merece uma menção especial. A pesquisa de 1997 daEkos, Rethinking Government VI (Repensando o Governo VI), constatou quea mídia é muito importante na formação da opinião das pessoas sobre o governo.Especificamente, 83 % dos entrevistados indicaram que os jornais têm algumaou muita inferência na formação de suas opiniões sobre questões políticas egovernamentais. 83% e 75% dos entrevistados avaliaram da mesma formarespectivamente a influência da televisão e das revistas (tais como aMacleans).35 Como ressalta Joseph Nye, os retratos do governo na mídia “...têm se tornado significativamente mais negativos ao longo da última gera-ção.” As “estórias de terror burocrático” apresentadas na mídia não foramelaboradas para serem representativas, mas para conseguirem atenção.36 Comoressaltam Joseph Capella e Kathleen Jamieson, o resultado é que, enquanto amídia provavelmente não é a única e principal causa das atitudes negativascom o governo, seus “... dados mostram — de uma maneira que somentepoderia ser sugerida por comentaristas anteriores — que a maneira pela quala nova mídia enquadra os eventos políticos estimula o cinismo.”37

Reconhecendo as complexidades envolvidas, a Figura 1 é oferecida comoprimeira tentativa de visualizar conceitualmente os vários fatores que influenciamas avaliações de cidadãos e usuários a respeito dos serviços governamentais.38

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Figura 1: Fatores que influenciam as avaliações dosusuários/cidadãos a respeito de serviços públicos

Percepçõesa respeito de

serviço público eservidores públicos:

• princípios e valores:eqüidade e

processamentoapropriado

Característicasdos receptores

de serviços:idade, sexo,

histórico

Expectativasde serviço:

• comunicações• necessidades pessoais

• experiência (s) passada (s)com serviços

Percepções arespeito das políticas e

dos políticos• níveis de confiança

• desempenho percebido• “contaminação política”

Prestação deserviços: número e

duração de contatos,custos, comunicação,

atitude econhecimento do

atendente

Características dosserviços prestados:

• tangível X intangível• voluntário X involuntário

• direto X indireto

Percepção dosServiços

Governamentais

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5. Comparando serviços do setor públicoe privado: maçãs com laranjas?

Como foi mencionado anteriormente, os setores público e privado,tanto filosófica como operacionalmente, são muito diferentes. Assim, acomparação dos serviços entre os setores é um tanto questionável. Mesmoassim, tais comparações são normalmente feitas e, sem exceção, a qualidadedos serviços fornecidos pelo setor público/governo (dependendo da formacomo a questão é feita) apresenta-se inferior à dos serviços prestados pelosetor privado. A pesquisa de 1992, Perspectives Canada (Perspectivas Ca-nadá), realizada pela Insight Canada Research, solicitou que os cidadãosavaliassem o serviço que eles recebiam do setor público local, estadual e fede-ral, (armazéns, bancos, lojas de departamentos, linhas aéreas e companhiasseguradoras). As constatações? Os entrevistados apontaram os serviços querecebiam do setor público federal como sendo os de pior qualidade.

Em pesquisas posteriores da Perspectives Canada, o público foisolicitado a avaliar suas impressões das instituições públicas numa escala de1 (totalmente desfavorável) até 10 (favorável).39 No outono de 1996, o servi-ço público federal (5,1) foi avaliado como estando acima das companhiasseguradoras de residências/automóveis (4,9) e de empresas de TV a cabo(4,7), porém abaixo de companhias farmacêuticas de marcas conhecidas(5,4), bancos (5,3), companhias telefônicas locais dos entrevistados em geral(6,1).40 Na pesquisa mais recente, o público avaliou as suas impressões dosserviços públicos federais (4,9) acima das empresas de TV a cabo (4,6) e dascompanhias seguradoras das residências/automóveis (4,8), porém abaixo dosbancos (5,1) e das companhias locais de telefonia (6,5).41

A pesquisa de 1996, Rethinking Government (Repensando o gover-no), realizada pela Ekos, provavelmente recebeu a maior atenção nos últimosanos. Perguntou-se ao entrevistados “Como você avaliaria o desempenho dosserviços do governo/seu banco em cada um dos seguintes atributos (os atri-butos são elementos genéricos do serviço, tais como cortesia e prontidão)?”Em todos os atributos, os cidadãos avaliaram suas experiências com bancoscomo sendo superiores as suas experiências com o governo.42 De maneirasemelhante, nas pesquisas realizadas em 1996 e 1997 pelo National QualityInstitute, vários setores da indústria (farmácias, linhas aéreas, bancos etc.)

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foram avaliados segundo uma variedade de características, incluindo: quali-dade geral dos serviços, prontidão na prestação do serviço, nível de cortesiae serviços pós-venda. Em todas essas áreas, os entrevistados avaliaram o go-verno com notas mais baixas.43

Como resultado dessas evidências, compreensivelmente foi concluídoem muitas áreas que o setor privado simplesmente presta melhores serviçosque o setor público. Concomitantemente, com o ataque à burocracia e às váriasreformas e o downsizing que os servidores públicos enfrentaram, essasconstatações podem muito bem contribuir para o baixo nível do moral encon-trado no setor público e podem exacerbar a percepção errônea demonstradapor 80 % dos servidores públicos federais de que o público pensa que elessão “preguiçosos e indiferentes”, quando na verdade menos de 20 % do pú-blico sustentam esse ponto de vista.44

Contudo, serão os serviços prestados pelo setor público realmente dequalidade tão baixa? Será que o ofício — supostamente comprometido comservir ao público — realmente presta serviços piores que sua contra-partidaque visa o lucro? A evidência fornecida até o momento sugere que a resposta ésim; essa resposta, contudo, pode ser prematura e talvez nem tão acurada.

5.1. Comparando maçãs com maçãs?

Independente das naturezas distintas dos setores público e privado,muito pode ser aprendido quando os serviços comparados são similares emtipo e alcance. Infelizmente, na maioria das vezes, esse critério não foi aten-dido. Em vez disso, os pontos de vista dos cidadãos sobre serviços específi-cos do setor privado foram comparados aos seus pontos de vista dos serviçosdo setor público ou do governo em geral. Por exemplo, a pesquisa de 1997do National Quality Institute (Instituto Nacional de Qualidade) compara ser-viços específicos do setor privado com o governo — sem qualquer qualifica-ção, como país, nível ou tipo de serviço do setor público. Porém, as pesqui-sas sugerem que tais comparações são de validade questionável. Na verdade,as pesquisas do Centro de Pesquisa da Universidade de Michigan concluíramque “... atitudes generalizadas com a burocracia estão baseadas não tanto nasexperiências concretas mas no impacto cumulativo da imprensa e nas crençasaceitas na cultura.45

Como ressalta a pesquisa de Ontário, Best Value for Tax Dollars (Omelhor retorno para dólares em impostos), “A qualidade geral dos serviços,quando aplicada a uma organização tão grande e diversa como o Governo deOntário, é vaga e não-específica, e pode evocar uma imagem estereotipada do‘grande governo’, enquanto a menção de uma área específica de serviço pode

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lembrar uma experiência pessoal.”46 Seguindo a mesma lógica, quando os entre-vistados eram solicitados a avaliar o desempenho do setor privado em geral, asrespostas deles podiam evocar imagens estereotipadas de corporações insen-síveis que queriam explorar indivíduos e o meio ambiente com o único propósi-to de expandir seus negócios. Por exemplo, a pesquisa de 1996 da Ekos,Rethinking Government (Repensando o governo), constatou que o desem-penho dos serviços bancários era avaliado como melhor que os serviços go-vernamentais. Porém, quando os grupos de foco comparavam os serviçosprestados pelo governo federal em oposição àqueles prestados pelo setorprivado, “os participantes estavam mais ou menos divididos a respeito dequem prestava os melhores serviços.”47

Permanece sendo uma incógnita, a razão pela qual os serviços dosetor público ou do governo são muitas vezes comparados com serviços es-pecíficos do setor privado. Se os cidadãos podem discernir claramente entreos níveis de serviço que eles receberam de bancos e de empresas de TV acabo, não podem diferenciar entre os vários serviços do setor público? Umameta-análise de 261 pesquisas de cidadãos no nível de governo local consta-tou que os residentes podem distinguir os bons dos maus serviços e, de fato,avaliam serviços distintos de maneira diferente.48 Por todas essas razões, ar-gumenta-se aqui que as comparações assimétricas (comparando um setor aum serviço específico) podem muito bem evocar respostas equivocadas, tor-nando tais constatações suspeitas.

A pesquisa de Ontário, Best Value for Tax Dollars (O melhor retornopara dólares em impostos), representa uma análise mais sofisticada e simé-trica, pois avalia o desempenho do serviço público de Ontário em geral, emseguida quatro categorias de serviços públicos diretos (inscrição, informa-ção, assistência financeira e fiscalização) e finalmente uma experiência con-creta de serviço (tal como conseguir uma certidão de nascimento ou registrode nome de empresa) em relação a 17 itens de qualidade de serviço. O ser-viço público obteve uma avaliação de 45 entre 100, comparando com 62 paraa loja de departamentos dos entrevistados, 71 para os seus supermercados e72 para sua companhia de investimentos. Isso sugere que o desempenho dosetor público de Ontário está bastante distante dos serviços específicos dosetor privado. Contudo, em apoio à proposta deste trabalho, o relatório dapesquisa conclui que, ao avaliar a qualidade do serviço, quanto mais específi-ca a experiência, mais alta a avaliação. Portanto, enquanto o serviço públicoem geral recebeu avaliações de 45 entre 100, as quatro categorias de servi-ços foram avaliadas em 64 dentre 100 (Gráfico 1).49 Sob esse ponto de vista,o desempenho de serviços específicos do setor público está em linha com ode serviços específicos do setor privado. Apoiando essa constatação, o 1997Survey of Albertans and Employees (Pesquisa de Cidadãos e Empregados de

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Alberta de 1997) descobriu que quando os entrevistados avaliavam a quali-dade do serviço prestado por servidores públicos, baseados em seu últimocontato e em oposição à avaliação dos serviços de servidores públicos emgeral, as notas aumentavam em média cerca de 11 %.50

Um elemento adicional a ser considerado é quão recentemente oentrevistado usou o serviço. Nas análises do Estado da Geórgia, Poister eHenry, constataram que as avaliações dos serviços utilizados por usuáriosrecentes (aqueles que utilizaram um serviço nos últimos seis meses) tendiama ser um pouco mais favoráveis que a amostra do público em geral (Grá-fico 2).51 De maneira similar, a Citizen Charter Customer Survey (Pesquisados Direitos do Cidadão como Usuário) de 1993, conduzida na Grã-Bretanha,constatou que os entrevistados que realmente haviam utilizado o serviçoidentificado avaliaram-no melhor que aqueles que não o tinham feito.52 Pararesumir, isso sugere que perguntar aos entrevistados sobre suas percepções arespeito de serviços governamentais ou do setor público geralmente implicauma avaliação inferior, o que não ocorreria se fossem solicitados a lembrarde uma experiência de atendimento — especialmente se recente.

Gráfico 1: Avaliações de experiências deserviços gerais, categorizados e específicos

Elaborado a partir de informações fornecidas em Continuous Improvement Services Inc. e ErinResearch Inc., Best Value for Tax Dollars: Improving Service Quality in the OntárioGovernment (O Melhor Retorno por Dólares em Impostos: Melhorando a Qualidade dos Serviçosno Governo de Ontário).

80

60

40

20

0Serviçospúblicosem geral

Média dequatro

serviços

Experiênciasespecíficas

Escala de 0 a 100

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É interessante observar que a pesquisa de 1997 da Ekos, RethinkingGovernment IV (Repensando o Governo IV), constatou que 62 % dos entre-vistados não tinham tido uma experiência direta de atendimento com o governofederal nos últimos três meses.53 Essa constatação sugere a necessidade ummaior controle metodológico ao se pesquisar as percepções da prestação deserviços do setor público. Ainda assim, parâmetros restritos de escopo etempo raramente foram utilizados nas pesquisas realizadas. Por exemplo, apesquisa de 1996 da Ekos estava limitada àqueles entrevistados que tinhamcontato com um departamento do governo federal, “... pessoalmente, portelefone, por correio, pela Internet ou quiosques, contanto que tenha ocorri-do nos últimos dois anos (grifos adicionados).”54 Supondo que os cidadãostêm contato relativamente constante com bancos, esse parâmetro parecequestionável para fins comparativos.

Uma dificuldade metodológica adicional refere-se à habilidade decidadãos e usuários em distinguir entre serviços do setor público e privado.O 1997 Survey of Albertans and Employees (Pesquisa de Cidadãos e Em-pregados de Alberta de 1997) constatou que 17 % dos cidadãos de Albertapensavam ter recebido serviços do Governo, quando de fato eles tinhamrecebido o serviço de uma organização do setor privado.55

Tudo isso sugere a necessidade de pesquisas adicionais, utilizandoestritos controles metodológicos. Pode ser que a tão freqüente relatada lacunade desempenho entre os setores público e privado seja menor que anterior-mente indicado, ou até nem exista. Na verdade, Poister e Henry , na sua pes-quisa, de um total de 18 serviços públicos e privados específicos, não encon-traram nenhuma diferença sistemática nas avaliações da qualidade do serviçoentre os setores público (governo local) e privado. Em uma escala de 0 a100, a avaliação média de nove serviços do setor privado foi de 67,5, enquanto aavaliação média dos serviços do setor público foi de 69. Quando experiênci-as recentes de serviços foram avaliadas, o setor privado obteve a nota média73, e os serviços do setor público, 73,5 (Anexo 1).56 Outro estudo realizadonos Estados Unidos, a pesquisa Roper de 1987, constatou que o serviço pos-tal ficava em segundo lugar entre 11 outros serviços não-públicos, como osfornecidos por supermercados, médicos e bancos.57

Obtendo resultados similares, a Citizen’s Charter CostumerSurvey (Pesquisa de Direitos dos Cidadãos como Usuários) constatou queusuários recentes, tanto dos serviços públicos como privados, avaliam-nosem um patamar relativamente semelhante. Também vale notar que, enquantoas pesquisas Repensando o Governo e Perspectivas Canadá constataram queos bancos eram avaliados acima do serviço público federal ou do governo,nesta pesquisa, de 28 serviços governamentais, o público avaliou os servi-ços postais, escolas básicas, coleta de lixo, alfândega, hospitais do Serviço

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Nacional de Saúde e a polícia, todos como sendo superiores aos bancos58

(Anexo 2).

Gráfico 3: Avaliação média dos serviços dogoverno local: percepção geral e usuários recentes

Quadro elaborado a partir de uma tabela apresentada em Theodore H. Poister e Gary T. Henry,“Citizens Ratings of Public and Private Service Quality: A Comparative Perspective” (Avaliaçõesde cidadãos da qualidade dos serviços público e privado: uma perspectiva comparativa), PublicAdminsitration Review (Revisão da Administração Pública) 54, no. 2 (março/abril de 1994), p. 155-160.

Parques e programasrecreativos

Todos os serviçospúblicos

Manutenção deruas

Escolas

Transportepúblico

Polícia

Coleta de lixo

Clínicas de saúde

Correios dosE.U.A.

Bombeiros

50 60 70 80 90 100

Usuários recentesPercepção geral

Escala de 0 a 100

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6. Quão bom é “bom”?

Várias pesquisas foram realizadas durante a última década para deter-minar a satisfação dos usuários/cidadãos com os serviços públicos. Basica-mente há duas maneiras de acompanhar a satisfação geral dos usuários: aolongo do tempo e em comparação com outros. Medir o próprio desempenhoao longo do tempo é um requisito fundamental para a melhoria contínua,medir o próprio desempenho comparando-se com outros também é um con-ceito importante, mas, quando a questão é obter dados válidos e confiáveis,torna-se muito mais difícil. Entretanto, sem essa informação, pode ser mui-to difícil determinar quão positiva é uma avaliação com o conceito “bom”(ou negativa é uma avaliação com o conceito “ruim”). Será que uma nota 60,70 ou 80 é boa, média ou ruim, e em que medida? O fato é que, na ausênciade um ponto fixo de referência para fazer comparações, é difícil atribuirqualquer significado real a essas avaliações.

Miller e Miller ajudam a responder essa questão usando uma analogiaparticularmente instrutiva:

“É o tipo de problema que um administrador escolar pode vir aenfrentar se, após os professores aplicarem um teste de estudos so-ciais a todos os alunos do 3o ano, for constatado que a maioria dascrianças acertaram 80 % das perguntas. O resultado certamente nãoparece ruim, mas talvez as perguntas sejam fáceis. Nesse caso, 80 %não é tão bom assim. Ou, e se as perguntas forem muito difíceis? Então80 % é uma nota fantástica. A dificuldade do teste não é um aspecto aser decidido por quem elabora o teste ou pelo diretor — da mesmaforma que a equipe do governo local ou os formuladores de políticasnão podem concluir se 70 % de “excelente ou bom” é uma avaliaçãoadequada. Saber se o teste é fácil ou difícil exigiria que nós soubés-semos como várias crianças são avaliadas no teste. Assim, os educa-dores utilizam testes padronizados que posicionam as notas obtidasem ciências sociais pelos alunos do 3o ano no contexto do desempenhode outros alunos de 3o ano no mesmo teste de estudos sociais.” 59

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Assim como as notas dos alunos são comparadas com as notas deoutras crianças de todo o país, seria benéfico se os serviços públicos pudes-sem ser comparados com serviços semelhantes em todo o país e entre paísesao longo do tempo. Na verdade, essa talvez seja a maneira mais eficaz de atri-buir significado aos resultados das pesquisas. Considere, por exemplo, asconstatações da pesquisa realizada em 1997 pelo Angus Reid Group,Canada and the World (Canadá e o Mundo). Em que se perguntou aos entre-vistados “Pensando no governo federal de...., você diria que você está... (muitosatisfeito, pouco satisfeito, pouco insatisfeito, muito insatisfeito) com seudesempenho geral?”, pouco mais de 50 % dos entrevistados canadenses indi-caram que eles estavam muito satisfeitos ou pouco satisfeitos com o seu de-sempenho. Até que ponto essa avaliação é positiva? À primeira vista, não pa-rece muito boa. Porém, quando comparado com outros 13 paísespesquisados, o desempenho do governo federal recebeu uma nota bastantealta. De fato, mais canadenses indicaram que estavam satisfeitos ou poucosatisfeitos com seu governo federal do que disseram os entrevistados dequalquer outro país, inclusive dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Ale-manha e do Japão.60

Em uma avaliação de pesquisas de pelo menos 60 comunidades,Miller e Miller constataram que certos serviços obtêm notas altas constante-mente, enquanto outros recebem constantemente notas baixas. Eles descobri-ram que em uma escala de 0 a 100: “Os serviços com notas mais altas foramo corpo de bombeiros, a biblioteca e a coleta de lixo (média de 75-80); osserviços que receberam as piores avaliações foram zoonoses, manutenção deruas e planejamento (média de 55-60)” (Anexo 3).61 Mais uma vez, se a inter-pretação dos resultados das pesquisas é relativa, e certos serviços estão pre-dispostos a receber avaliações mais altas que outros, como é possível saberquão boa efetivamente uma nota “boa” é? Uma avaliação de satisfação 65pode ser excelente para consertos de ruas, mas terrível para bibliotecas.

O motivo para essas avaliações absurdas ainda está por ser esclarecido, apesar de algumas teorias terem sido sugeridas. Talvez, fornecendo umapeça do quebra-cabeças, pesquisas em âmbito municipal sugerem que servi-ços homogêneos — onde todos os cidadãos esperam essencialmente o mes-mo nível de serviço (não existe segmentação de mercado), tal como a coletade lixo e a polícia — recebem avaliações mais altas de satisfação. Para servi-ços que são heterogêneos (o mercado é segmentado), tais como turismo e osserviços de recreação, é mais difícil agradar os diversos segmentos de usuá-rios. De fato, os recursos exigidos para agradar todo mundo podem simples-mente não estar disponíveis.62

Quaisquer que sejam os motivos que os cidadãos tenham para avaliarcertos serviços acima de outros, o fato é que eles o fazem, e, a fim de gerar

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parâmetros válidos, organizações semelhantes precisam ser comparadas comorganizações semelhantes (bibliotecas com bibliotecas, por exemplo). Infe-lizmente, há ainda outras dificuldades, na medida em que as organizações nãofazem as mesmas perguntas ou usam uma escala comum. Assim, uma organi-zação pode perguntar sobre a qualidade do serviço, enquanto outra perguntasobre o desempenho ou satisfação com relação ao serviço. Uma organizaçãopode utilizar uma escala de quatro pontos, outra, uma escala de dez pontos.Conseqüentemente, os problemas de comparabilidade persistirão.

A fim de superar essas dificuldades, é necessário encontrar umamaneira de comparar, de maneira válida e confiável, os resultados das pesqui-sas com outras organizações e ao longo do tempo. Três metodologias pare-cem atender a essa necessidade em graus diferentes: 1) um índice padrão desatisfação de usuários, tal como o Índice Americano de Satisfação de Usuári-os; 2) conversão de pesquisas de serviços similares em uma métrica comum;3) a utilização de um instrumento padrão de pesquisa. Os principais aspectose as fragilidades de cada uma dessas três abordagens serão discutidos a seguir.

6.1. O índice de satisfação de usuários

Atualmente, o Canadá não possui um índice de satisfação de usu-ários. Contudo, essa abordagem foi adotada por uma série de países. Basica-mente, um índice de satisfação de usuários funciona da mesma maneira queum indicador econômico nacional para todos os setores. Ele avalia a satisfa-ção de usuários em nível organizacional e então agrega esses dados paradeterminar medidas de qualidade industriais, setoriais e nacionais.63 Essaabordagem parece fornecer um grande número de benefícios, inclusive deter-minar se a qualidade está melhorando ou deteriorando em nível nacional, porsetor e por indústria. Porém, quando a meta é melhorar o serviço aos cida-dãos, certas perguntas precisam ser feitas a respeito da utilidade dos índicesde satisfação de usuários. A análise a seguir ressalta as potenciais falhasdessa abordagem, utilizando o modelo que existe nos Estados Unidos comoponto de referência.64

6.1.1. O índice de satisfação de usuários é limitado na suacapacidade de orientar planos de melhoria de serviço

Um índice nacional de satisfação informaria as organizações do se-tor público a respeito da satisfação com os serviços, permitindo compara-ções interorganizacionais, com a média da administração governamental/ pú-blica e ao longo do tempo. Porém, esse empreendimento abrangente e de alta

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demanda de recursos não informaria os tomadores de decisões a respeito decomo os usuários avaliam a importância dos serviços específicos ou as suasprioridades para melhoria; também não explicitaria o que usuários internospercebem como sendo barreiras para melhoria, nem ajudaria a orientar odesenvolvimento dos padrões de serviço. Em suma, ele não dirá aos gestoreso que eles precisam fazer para melhorar o serviço dos seus usuários.

Como será discutido posteriormente, esse tipo de informação é crí-tica, se os recursos tiverem que ser alocados de maneira eficiente e eficaz.

6.1.2. A aplicabilidade do modelo ao setor público é incerta

De acordo com o modelo, a satisfação dos usuários tem três antece-dentes: 1) qualidade/desempenho percebido, que é subdividido em dois com-ponentes da experiência de consumo: adaptação e confiabilidade; 2) nívelpercebido da qualidade do produto com relação ao preço pago; 3) as expecta-tivas do mercado atendido.65 Com relação ao primeiro antecedente, existeuma suposição de que a customização, para atender as necessidades dos usuá-rios, é boa; o que não necessariamente é o caso no setor público. Uma vezque o setor público está baseado em princípios de devido processo e deigualdade, ele geralmente é contra a idéia da adaptação ao usuário, ou seja,tratar os usuários do governo de maneira não eqüitativa, fornecendo-lhesdiferentes níveis do mesmo serviço. Quanto ao segundo antecedente (quali-dade com relação ao preço), a maioria dos serviços governamentais são cus-teados pelos impostos. Isso quer dizer que, uma vez que a maioria das infor-mações relativas a preço são desconhecidas do público — o custo éencoberto sob a forma de impostos gerais — é quase impossível para os usu-ários comparar qualidade com preço. O último antecedente (as expectativasdo mercado atendido) está baseado tanto nas experiências passadas de consu-mo quanto na habilidade das organizações de satisfazer o consumidor no fu-turo. Contudo, uma vez que muitos serviços públicos têm steakholders, masnão têm consumidores finais claramente definidos, o modelo não se aplica àsorganizações públicas em agricultura, pesca e recursos florestais. Gerandocomplicações adicionais, certos serviços governamentais procuram evitar oaumento no uso dos seus serviços. Uma vez que essa meta é um tanto contra-ditória com a filosofia de mercado, não está claro como serviços públicos,como assistência social ou busca e resgate, poderiam se encaixar nesse modelo.

O modelo também opera baseado na premissa de que maior satisfaçãotem como conseqüências a redução das queixas e um aumento na lealdade. Defato, “Lealdade é a variável dependente no modelo por causa do seu valor comouma proxy (variável substituta) da lucratividade.”66 Os usuários do governo,contudo, têm poucas ou nenhuma alternativa para os serviços governamentais.

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A aplicação da lealdade parece especialmente perversa com relação aos servi-ços involuntários e indesejados, tais como o sistema de correção, a previdên-cia e o seguro-desemprego. Como resultado disso, não está claro o quanto oconceito de lealdade se aplica ao setor público.

6.2. Metodologias de conversão de escala:a escala do percentual ao máximo

Essa segunda abordagem para comparação de desempenho envolve a uti-lização de metodologias de conversão de escala. Fornecendo um exemplo espe-cífico, Miller e Miller desenvolveram a escala do Percent to Maximum — PTM(Percentual ao Máximo). Utilizando a sua metodologia, as respostas indicadasem escalas de diferentes tamanhos e conceitos diversos são calculadas pela suamédia e então convertidas em uma escala padrão que vai de 0 a 100.

No seu trabalho, Miller e Miller converteram os serviços de 261pesquisas de cidadãos administrados em 40 Estados na escala PTM. As pes-quisas utilizadas eram diferentes em design, baseadas em escalas de dois,três, quatro ou cinco pontos; algumas eram contaminadas positivamente(excelente, bom, regular, ruim), enquanto outras eram simétricas (muito sa-tisfeito, satisfeito, insatisfeito, muito insatisfeito). Porque estas variaçõesafetaram a conversão em PTM, controles foram desenvolvidos a partir deanálises de regressão múltipla, para compensar. Apesar de a conversão nãopoder levar em conta todas as diferenças, ela, ainda assim, se mostrou con-sistente nos seus testes. Talvez a questão não seja tanto a conversão dosresultados de uma escala para outra, mas até que ponto o enunciado da per-gunta pode influenciar as perguntas negativa ou positivamente.

O valor real do trabalho de Miller e Miller é que ele permite que se váalém de adivinhar quão boa efetivamente uma avaliação de satisfação de 66 %ou 4,5 ou 5 é. Ele permite que avaliações díspares, baseadas em escalasdíspares, sejam convertidas em uma escala comum e então comparadas comserviços semelhantes em uma base percentual. Isso permite que os prestadoresde serviços determinem onde eles se encontram em comparação aosprestadores de serviços similares em outras localidades. Por exemplo, umdeterminado serviço pode ser avaliado entre os melhores ou piores de tais ser-viços em Ontário, Canadá ou até mesmo na América do Norte. Utilizando com-parações em base percentual, pode-se atribuir muito mais significado às avalia-ções, e as organizações podem identificar as melhores práticas das empresasconcorrentes e, se quiserem, aplicá-las dentro da própria organização.

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6.2.1. Instrumentos de pesquisapadronizados

O último método de comparação envolve o uso de um instrumentopadronizado de pesquisa. Não diferente da metodologia de Miller e Miller edo índice de satisfação de usuários, as organizações podem utilizar instru-mentos padronizados para gerar dados em um padrão comum e assim com-parar-se com fornecedores de serviços similares. Se a pesquisa é conduzidaem uma base regular, como é recomendado aqui, as organizações podemacompanhar o seu progresso com relação a si mesmas e a outras ao longo dotempo. Essa abordagem mantém os benefícios-chave das outras duas aborda-gens e supera muitas de suas dificuldades. Em suma, instrumentos padroniza-dos de pesquisa fornecem melhor equilíbrio entre operacionalizar a coletade informações úteis — e muitas vezes em situações específicas em umgrande número de níveis: organizacional, de programa e elementos de servi-ço, de um lado, e assegurar medidas comparáveis de outro.

O problema com essa abordagem é que existem poucos instrumentospadronizados em nível de governo. É claro, o outro aspecto dessa observaçãoé que existe uma oportunidade para os governos desenvolverem um instru-mento padronizado de modo a facilitar comparações. Uma vez que o investi-mento inicial de desenvolver um instrumento padronizado tenha sido feito, ascomparações seriam iniciativas com menor demanda de recursos. Esse é ocaminho que a Parks Canada adotou em 1996 para reduzir a demanda de re-cursos, bem como o volume de informação de visitantes/entrevistados.A Parks Canada usa seu instrumento padronizado para medir uma combina-ção de satisfação, apresentação de patrimônio, apoio à missão e outras ques-tões nas suas entradas de parques nacionais, áreas de acampamento, progra-mas interpretativos, entradas de locais históricos e áreas de canal. Isso tempermitido a Parks Canada comparar o desempenho e desenvolverparâmetros normativos para suas instalações em todo o país.

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7. Usando pesquisasde forma criteriosa

O propósito de conduzir pesquisas não é apenas acompanhar osníveis de satisfação, mas sim desenvolver estratégias para reduzir a lacunaentre o que os usuários/cidadãos desejam e o que eles recebem. Essa aborda-gem é coerente com o modelo de melhoria de serviço das “quatro caixas”(Anexo 4), desenvolvido pelo Centro Canadense de Gestão e pela Rede deServiços Centrados no Cidadão. Basicamente, o modelo procura reduzir alacuna que existe entre as expectativas dos cidadãos com relação aos servi-ços do setor público, de um lado, e a satisfação com os serviços que rece-bem, de outro. Isso é obtido utilizando-se informações de medida de desem-penho (pesquisas, por exemplo) para identificar, entre outras coisas, o que oscidadãos consideram como áreas importantes a serem melhoradas. Com basenesse tipo de informação, os recursos podem ser alocados — em algunscasos, realocados — para áreas onde eles terão maior impacto. É necessárioenfatizar que muitas vezes existe um desencontro entre o que nós pensamosque os usuários desejam e o que eles realmente desejam, e nós não podemossaber se esse é o caso, a não ser que perguntemos. Para ilustrar: a intuiçãopode sugerir que em áreas de acampamento as características de maiorimportância incluiriam a manutenção de estradas nos parques, o fornecimen-to de informações sobre o mesmo, sinalização, as condições das instalaçõese trilhas, e facilidade para registrar-se. Porém, em 1996, quando a BC Parksfez uma pesquisa entre usuários em um de seus parques, nenhum desses ele-mentos era nem mesmo um quinto tão importante quanto a limpeza dos ba-nheiros ou a sensação de segurança dos visitantes no parque.67 A questão é:você pode adivinhar o que seus usuários desejam, mas você não pode ter cer-teza, se você não perguntar!

As pesquisas podem informar decisões de melhoria de serviço, emoposição a simplesmente comentar a respeito das condições atuais, porqueelas fornecem um meio valioso e eficaz de iluminar os próximos passos paramelhoria dos serviço. Fazendo as perguntas corretas, as organizações podemdeterminar onde elas estão e assim identificar que coisas necessitam ser ajus-tadas e como esses ajustes podem ser feitos de maneira mais eficaz.68 É claroque as respostas das pesquisas irão diferir, dependendo do nível de governo,

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do serviço específico investigado e da região do país. Uma vez que isso tenhasido considerado, o princípio geral a ser lembrado é que as pesquisas devemfazer perguntas específicas o suficiente para gerar informações que irão dizeraos gestores o que eles precisam fazer, a fim de melhorar o serviço.

Assim, as pesquisas podem ser utilizadas para melhorar os serviçosem todas as áreas do governo, incluindo serviços regulatórios. Na verdade, apesquisa Responsible & Responsive Regulation for Ontario (Regulamenta-ção Responsável e Sensível para Ontário), de 1996, aborda as prioridadespara a reforma regulatória e identifica problemas com a regulamentação(duplicação e demora, por exemplo), prioridades para soluções e temas parareforma em diferentes ministérios.69 Se transformadas em ação, essasconstatações irão tornar mais fácil para os usuários cumprir regulamentaçõesgovernamentais, possivelmente melhorando a eficiência e as relações ao longodo processo. Outro bom exemplo é a Pesquisa de Atitudes e Opiniões(Survey of Attitudes and Opinions) da Polícia Regional de Peel, de 1994, eo subseqüente, de 1996. Os cidadãos foram interrogados a respeito de umavariedade de questões, incluindo fatores que influenciam a segurança da vizi-nhança, seus motivos para estarem satisfeitos/insatisfeitos com a polícia,como a polícia poderia abordar melhor os problemas da comunidade e comoela e os cidadãos poderiam trabalhar melhor em conjunto.70 O aspecto emquestão aqui é que, independentemente da natureza específica do serviço, asatisfação dos usuários/cidadãos pode ser melhorada, e as pesquisas podemajudar nessa tarefa, se as perguntas corretas forem feitas. Porém, ainda queas pesquisas sejam utilizadas com freqüência para medir a satisfação doscidadãos ou usuários, sua habilidade para orientar as melhorias dos serviçosmuitas vezes é ignorada. Particularmente, o potencial das pesquisas para aju-dar a desenvolver estratégias tem sido ignorado em quatro áreas: 1) identifi-cação de fatores determinantes de satisfação/insatisfação; 2) identificaçãodas prioridades de melhorias de cidadãos e usuários; 3) desenvolvimento depadrões de serviço; 4) consulta a usuários internos.

7.1. Identificação de fatores determinantesde satisfação/insatisfação

Os fatores determinantes da satisfação são aqueles que explicam avariância das avaliações da satisfação dos serviços. Fatores-chave, portanto,são aquelas três a cinco variáveis principais que explicam por que as pesso-as consideram ou não consideram satisfatória sua experiência com o servi-ço. Identificando os fatores-chave, os gestores podem então concentrar

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seus esforços em aprimorar aqueles elementos que irão fazer maior dife-rença aos olhos dos seus usuários. Os fatores podem incluir variáveiscomo rapidez, cortesia etc. Na Austrália, por exemplo, constatou-se que oatendimento imediato, a habilidade de falar com a pessoa certa e obter oque era desejado eram as três principais razões que as pessoas apresenta-ram para serem tratadas bem ou muito bem. Do contrário, não obter o queera desejado, o serviço lento e não ser capaz de falar com a pessoa certaeram as três razões básicas relatadas pelas pessoas que se sentiam mal oumuito mal atendidas.71

A pesquisa de 1992, Best Value for Tax Dollars (O melhor retornopor dólares em impostos), identifica cinco categorias de fatores como sendocentrais para a qualidade do serviço: pontualidade, acesso, confiança, capaci-dade de resposta e custo. Contudo, talvez ainda mais notáveis sejam suasconstatações a respeito de dois fatores específicos:

“ O número de contatos e o tempo exigido para completar o ser-viço são dois fatores que afetam profundamente a avaliação do públi-co a respeito do desempenho. Quando o serviço era executado emmenos de um dia ou com apenas um contato, as avaliações de desem-penho do OPS Ontario Public Service ( Serviço Público deOntário) eram significativamente mais altas e se comparavam aosfornecedores dos serviços do setor privado, tais como bancos e super-mercados. Aqueles que esperam por longos períodos de tempo ouque requerem muitos contatos para obter o serviço tendem a avaliaro desempenho como sendo muito ruim.” 72 (Gráficos 3 e 4).

Gráfico 3: Relação entre número de contatos e satisfação

Reproduzido de Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Value for TaxDollars: Improving Service Quality in the Ontario Government (O melhor retorno por dólaresem impostos: melhorando a qualidade do serviço no governo de Ontário), fevereiro de 1992.

80

60

40

20

0Quatroou mais

Dois outrês

Um

0 = extremamente ruim

100 = extremamente bom

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Gráfico 4: Relação entre satisfação eduração do contato

Reproduzido de Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Value for TaxDollars: Improving Service Quality in the Ontario Government (O melhor retorno por dólares emimpostos: melhorando a qualidade do serviço no governo de Ontário), fevereiro de 1992.

7.2. Prioridades para melhorias

Fornecendo aos cidadãos o que eles desejam, em oposição ao que ostomadores de decisão pensam que eles desejam, é um conceito-chave na pres-tação de serviços centrados no cidadão. Ainda assim, em alguns casos, as or-ganizações do setor público estão utilizando ferramentas de um novo kit degestão pública como prestação de serviços alternativos, reengenharia e quali-dade de serviço, na crença de que eles irão melhorar os serviços, porémestão falhando em consultar os usuários para verificar se essas mudanças sãoprioritárias para eles. Infelizmente, existe um valor restrito em concentraresforços em uma iniciativa que está em décimo ou vigésimo lugar — e nãoem primeiro ou segundo — nas listas de prioridades das melhorias dos usuá-rios. Com certeza, existem momentos em que os governos precisam ir alémdo que normalmente é visto como prioridade pelos usuários, para antecipardemandas e exigências futuras, mas isso é a exceção e não a regra.

No momento em que este trabalho estava sendo escrito, puderam serlocalizadas poucas pesquisas canadenses em âmbito local, estadual ou fede-ral, que considerassem as prioridades dos cidadãos para melhorias dos servi-ços num nível específico o suficiente para ser operacionalmente informativo.As exceções incluem a pesquisa de 1992 de Ontário, Best Value for TaxDollars (O melhor retorno para dólares em impostos) que perguntou aosentrevistados o que eles acreditavam que tornaria o serviço melhor na suacomunidade,73 e a pesquisa realizada em 1996, Responsible & ResponsiveRegulation for Ontario (Regulamentação responsável e sensível paraOntário), que perguntou aos usuários pelas suas prioridades para reformasregulatórias e as suas prioridades para soluções.74 Citamos também a Western

80

60

40

20

03 meses 2 meses 1 mês

0 = extremamente ruim

100 = extremamentebom

1 semana 1 dia

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Economic Diversification (WD) que pesquisou um dos seus parceiros(Community Futures Development Corporations ou CFDCs), para determi-nar como melhor poderia apoiá-lo. A pesquisa abordou os principais desafiosoperacionais enfrentados pelas CFDCs, como a WD poderia ser mais útilpara superá-los, a importância de cada área de suporte e os aspectos dosuporte da WD que necessitavam de melhoria.75

Considerando a mais recente ênfase em agrupar serviços de umaperspectiva do cidadão/usuário (ou seja, centrais de atendimento integrado esingle window ou one-stop services), é particularmente notável que estamoscientes de apenas duas pesquisas que perguntam aos cidadãos quais são suasprioridades de ação nessa área. A primeira é a pergunta encomendada peloCentro Canadense de Gestão como parte da primeira fase da pesquisa daEkos, Rethinking Government VI (Repensando o Governo VI), de 1997. Suasconstatações indicam que a prioridade para o atendimento single window sãoos desempregados (37 %), crianças e jovens (27 %), os idosos (18 %) e asempresas (12 %).76 Fica claro que essas constatações irão requerer pesqui-sas adicionais para determinar exatamente que aspectos dos serviços dedesemprego as pessoas gostariam de acessar, como e quando gostariam deacessá-los etc. A pergunta também foi limitada no sentido de que somente ascategorias de serviços pré-estabelecidas, os entrevistados podiam escolher,em oposição à abordagem escolhida de permitir que os próprios cidadãosidentificassem aqueles departamentos com que tinham tido contato, comrelação a um único evento ou questão nas suas vidas. A segunda pesquisa é de1993, Evaluation of Service New Brunswick (Avaliação de Serviços NewBrunswick), realizada por Baseline Market Research Ltd., que enfoca osdois Centros Piloto de Serviço de New Brunswick. Entre outras coisas, essapesquisa perguntou aos entrevistados quais eram os problemas com a presta-ção de serviços, que melhorias eles gostariam de ver nos Centros, que horá-rios gostariam de poder acessar os Centros e que outros serviços eles gosta-riam que fossem oferecidos.77

Uma palavra de advertência: o que as pessoas dizem que querem e oque elas estão dispostas a pagar por isso muitas vezes são duas coisas dife-rentes. Por exemplo, o Departamento de Água e Esgoto de Winnipeg recebeuinformações evidentes de que seus usuários desejavam ser cobrados mensal-mente, em vez da atual cobrança trimestral. Para obter informações maiscompletas, realizou então uma pesquisa. Constatou que aproximadamente umem cada três usuários preferiam ser cobrados mensalmente e não trimestral-mente. Contudo, quando a pesquisa informou aos entrevistados o aumentonos custos que a cobrança mensal acarretaria, o apoio caiu para um em cinco.Em um caso semelhante, a Cidade de Selkirk perguntou aos cidadãos se elesestariam dispostos a pagar mais impostos para aumentar o nível do serviço

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em uma dentre dez áreas. No final, os cidadãos estavam dispostos a pagarmais impostos por apenas uma área: melhorias em estradas e ruas.78 A lição,portanto, é que as pessoas desejam filas menores, serviços mais convenien-tes e melhor qualidade de atendimento. Quem não quer! Porém, num ambi-ente de restrições fiscais, melhorar os serviços muitas vezes significa inves-tir recursos adicionais que precisam ou ser transferidos de outras áreas oucobrados dos usuários (taxas de uso), ou dos cidadãos (aumento de impostossobre imóveis). Assim, em casos em que os recursos adicionais seriamnecessários para melhorar os serviços, é importante incluir o elemento cus-to, se possível, na pesquisa. Introduzindo esse componente, os cidadãos po-dem avaliar os custos e benefícios envolvidos e as trocas necessárias.

Uma palavra sobre metodologia. Muitas vezes os serviços que rece-bem avaliações de baixa satisfação são identificados como prioritários paraas melhorias, mas isso pode ser um equívoco. Baixa satisfação não necessa-riamente corresponde a alta prioridade para melhoria. Esclarecendo bem aquestão, a pesquisa dos Direitos do Cidadão, realizada na Grã-Bretanha,constatou que, ainda que 77 % dos entrevistados tenham avaliado os hospitaiscomo se saindo “bastante bem” ou “muito bem”, 37 % desejaram melhoriasno serviço. Na verdade, isso tornou os hospitais prioridade para a melhoria.Por outro lado, as rodovias federais foram avaliadas como sendo “bastanteboas” ou “muito boas” por apenas 53 % dos entrevistados, contudo apenas 8% desejaram ver melhorias nesse serviço.79

Um procedimento para identificar prioridades seria pesquisar as per-cepções de usuários e cidadãos sobre a importância e o desempenho de umserviço, e então fazer um gráfico das constatações sobre uma grade deimportância/desempenho. Esse processo está ilustrado no Gráfico 5.80 Quan-do a importância e o desempenho combinam, não existe lacuna. Esse resulta-do estaria localizado em algum lugar ao longo da linha diagonal. Se estiverlocalizado acima da linha à direita, a prestação dos serviços é eficaz e atendeàs necessidades dos usuários, mesmo que eficiências adicionais sejam possí-veis. Se estiver localizado abaixo da linha e à esquerda, os serviços estãoatendendo às necessidades dos usuários, mas poderia ser útil realocar algunsrecursos para áreas de maior importância. Se localizado dentro do quadranteinferior direito da grade, o desempenho está excedendo em importância, o quesugere a necessidade de realocar recursos para usos de maior relevância. Final-mente, se localizado no quadrante superior esquerdo da grade, a importânciaestá ultrapassando o desempenho. Esse quadrante representa a prioridademais elevada e a melhor oportunidade para aumentar o desempenho. Comoregra, quanto mais alta a avaliação da importância e quanto mais baixa a avali-ação do desempenho, tanto maior é a lacuna de desempenho e, portanto, maisalta é a prioridade por melhoria.

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Gráfico 5 — Importância percebida doserviço x desempenho

A partir dessas constatações, pesquisas mais específicas podem serrealizadas para se concentrar em elementos específicos dos serviços. Porexemplo, uma pesquisa pode descobrir que simplificar formulários e reduzira burocracia são as prioridades. Isso é informação insuficiente para tomardecisões operacionais, mas pode direcionar pesquisas adicionais (grupos defoco) para esclarecer em que formulários se refere e o que se quer dizercom burocracia. A partir dessas informações e de estratégias específicas eefetivas para a melhoria dos serviços, elas podem ser desenvolvidas.

Vale destacar, contudo, que algumas pesquisas como a pesquisa de1996 da Ekos, Rethinking Government (Repensando o Governo), para a For-ça-Tarefa do Vice-Ministro, pedem aos entrevistados para avaliar a importân-cia de certos critérios ou elementos (grau de desburocratização e prontidãode atendimento) em relação ao desempenho da prestação dos serviços dogoverno. Mais uma vez, a evidência sugere que perguntar sobre o desempe-nho do governo em geral poderia evocar imagens estereotipadas de uma enti-dade grande, rígida e ineficiente, fazendo com que as notas de avaliação dedesempenho sejam mais baixas que as avaliações da importância, e potencial-mente enfatizando lacunas de importância/desempenho.

Desempenho

100

80

60

40

20

020 40 60 80 100

Imp

ort

ân

cia

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7.3. Padrões de serviço

No orçamento federal de 1994, foi pedido que se desenvolvessempadrões de serviço para cada departamento do governo.81 No relatório de1996, o Auditor-Geral observou que, “... o progresso do governo emimplementar padrões de serviço tem sido lento e suas realizações, desi-guais.”82 Contudo, a pressão por padrões de serviço continua em função doreconhecimento dos seus benefícios potenciais: comunicar serviços disponí-veis, gerenciar expectativas de usuários, informá-los a respeito de mecanis-mos de queixas e de redirecionamento e fornecer critérios com relação aosquais o desempenho possa ser medido.

Alguns servidores públicos podem acreditar que os usuários na ver-dade desejam níveis irrealisticamente altos de serviço, dando-lhes poucoincentivo para consultá-los. Porém, as evidências sugerem que esse não é ocaso. A pesquisa de 1992 de Ontário constatou que os servidores públicos,em média, eram de 5% a 48 % mais exigentes que o público com relação aoque constitui serviço aceitável, em várias dimensões do serviço.83 Quaisquerque sejam as razões para evitar consultas, o resultado, ironicamente, é que ospadrões são estabelecidos para os usuários na ausência de informações dosusuários. Nessas condições, os padrões podem ser estabelecidos em níveisde serviço que a gerência e a equipe acreditam ser razoáveis. Eles até mesmopodem ser “esticados” para fornecer incentivos à equipe e melhorar odesempenho organizacional. Porém, na ausência de informações fornecidaspelos usuários, esses padrões poderiam ser estabelecidos para elementos doserviço que não são importantes para eles, ou para elementos relevantes,porém a níveis de serviço acima ou abaixo do que os usuários considerariamaceitáveis. Por um lado, isso poderia significar esforços e recursos intensifi-cados, destinados a atender padrões colocados acima do que é necessáriopara satisfazer os usuários, comprometendo recursos que poderiam serrealocados para usos de valor mais alto. Por outro lado, os padrões poderiamser definidos abaixo de um nível aceitável, amarrando a organização a umasituação onde ela está constantemente prestando serviços em padrões queseus usuários consideram insatisfatórios ou irrelevantes. Os padrões de ser-viço, contudo, precisam não apenas ser relevantes, mas apropriados. Por essemotivo, estabelecer padrões não é tão simples quanto consultar usuários,mas, por definição, envolve encontrar um equilíbrio entre as preferências dosusuários, de um lado, e as limitações do custo, limites orçamentários e res-trições legislativas, do outro.

A pesquisa de 1992 de Ontário fornece um excelente exemplo dopotencial para coletar informações para o desenvolvimento de padrões deserviço. Como pôde ser observado nos Gráficos 3 e 4, foi constatado que as

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avaliações dos usuários a respeito da satisfação com os serviços ficaramabaixo de 40 % quando a experiência com o serviço envolveu mais que trêscontatos ou durou mais que três meses. Isso sugere que estabelecer padrõesem mais que três contatos ou por mais de três meses para completar umatransação seria o mesmo que prometer serviços insatisfatórios para a maioriados usuários. A pesquisa também mediu o que seria necessário para obterserviço aceitável para três áreas genéricas: atendimento por telefone, atendi-mento no balcão e horários de atendimento agendado. No caso de atendimentopor telefone, responder à chamada em até três toques, sem sinal de ocupadoe sem ser colocado na espera84 eram três dentre os sete elementos necessári-os para satisfazer 90 % dos usuários.

De fato, muitas centrais de atendimento telefônico (call centres) dogoverno federal colocaram metas de acessibilidade e tempo de espera. Porexemplo, no call centre da Receita do Canadá em 1996, a meta estavaestabelecida em 70 % das chamadas tendo acesso ao sistema (não necessari-amente tendo contato com uma pessoa) na primeira tentativa, com um tempode espera subseqüente não superior a 180 segundos.85 É interessante notarque, se as constatações da pesquisa de Ontário são indicativas das expectati-vas dos cidadãos com relação ao atendimento telefônico em geral, mesmoque a Receita do Canadá alcançasse essas metas em 100 % do tempo, a maio-ria dos usuários não considerariam isso como um serviço aceitável.

Fornecendo um exemplo diferente, a Divisão de Parques de BritishColumbia utiliza as expectativas dos usuários para orientar o desenvolvi-mento dos padrões de serviço em todo o Estado. Chamados de padrões degerenciamento, esses parâmetros são estabelecidos no mesmo nível da notamais alta da satisfação alcançada nas suas pesquisas realizadas entre 1988 e opresente.86 Por exemplo, o padrão atual para limpeza dos banheiros é umnível de satisfação de 78 %. Utilizando um instrumento de pesquisa depadrões em todos os seus parques, os resultados de uma variedade de locali-dades podem ser comparados.

7.4. Usuários internos

Todas as pesquisas revisadas neste trabalho (com exceção da pes-quisa de Ontário, da pesquisa Foco Oakville e da Pesquisa sobre percep-ções de serviços para o Público de 1990) focalizam usuários externos àcusta dos usuários internos.87 Ainda assim, a maioria dos servidores pú-blicos ou são produtores internos ou usuários internos, e na maioria doscasos, ambos. Os produtores internos incluem uma gama de prestadoresde serviços, incluindo a Secretaria do Conselho do Tesouro, a Comissão

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de Serviço Público, o Departamento de Finanças e o Gabinete do Conse-lho Privado, bem como serviços de suporte interno, como serviços gráfi-cos, departamento jurídico, recursos humanos, informática, pagamentos ebenefícios, compras e logística. Ironicamente, enquanto todas as organi-zações utilizam serviços de suporte interno, há escassez de dados sobre odesempenho de serviços internos.

O fato de que serviços internos de má qualidade podem minar omoral dos funcionários e provocar um ambiente de trabalho desarmoniososuscita a necessidade de levar a sério a qualidade do serviço interno. Talvez atémais importante é o reconhecimento de que serviços internos de má qualidadedificilmente produzirão serviços externos de qualidade, e as pesquisas disponí-veis sugerem que existe espaço para a melhoria nos serviços internos. Porexemplo, a pesquisa de Ontário, citada anteriormente, incluía oito serviçosinternos que eram avaliados por usuários internos; as avaliações de desempe-nho variavam de 47 a 57, de um total possível de 100, sugerindo oportunidadespara melhoria. Assim, a prática de focalizar pesquisas sobre usuários externosà exclusão dos usuários internos parece um pouco equivocada.

Como as pesquisas de usuários externos, as pesquisas internas deve-riam almejar informações que pudessem levar a melhorias no serviço. Maisuma vez, existe pouco sentido em concentrar esforços em itens que estão emdécimo lugar na lista de prioridades dos usuários internos em termos de apro-vação, quando aqueles que estão entre o primeiro e o quinto ainda têm que serabordados. Em suma, as perguntas das pesquisas deveriam explorar que servi-ços são mais importantes para os usuários internos, quão satisfeitos eles estãocom esses serviços e por que, e o que eles vêem como barreiras tanto paramelhorias internas como externas do serviço.88 Coletando dados nessas áreas,as organizações podem começar a identificar as prioridades de ação, compararos parâmetros de umas com as outras e acompanhar o progresso ao longo dotempo. Com essa finalidade, algum progresso vem sendo feito. De acordo coma relatório de 1996, da Secretaria do Conselho do Tesouro, Quality Services:A Progress Report (Serviços de Qualidade: Um Relatório do Progresso), aVeterans Affairs Canada e a Agriculture and Agri-Food Canada atualmenteestão solicitando feedback dos usuários internos, e algumas outras organiza-ções estão planejando tais iniciativas no futuro. Infelizmente, a relação entrequalidade interna e externa de serviço ainda não é bem compreendida, continu-ando a ser uma área importante para pesquisas futuras.

Com relação aos padrões de serviço, a mesma pesquisa de 1992 deOntário foi a única pesquisa revisada que aborda o desenvolvimento de padrõesde serviço de rotina para usuários internos. É interessante notar que a pesqui-sa constatou que os usuários internos avaliavam a qualidade do serviço querecebiam em 52 (escala de 0 a 100), enquanto os prestadores de serviços

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internos avaliavam os serviços que eles forneciam em 82.89 Portanto, enquantoos prestadores do serviço acreditavam que seu próprio serviço era de altaqualidade, os receptores tinham um ponto de vista diferente. Não é diferenteda lacuna entre expectativa/percepção que pode existir em serviços externos;as lacunas internas também podem ser reduzidas, melhorando o serviço ouadministrando as expectativas de várias maneiras, incluindo o desenvolvi-mento de padrões de serviço.

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8. Principais constatações

Este trabalho revisou várias pesquisas e comentários sobre as per-cepções dos cidadãos em relação aos serviços públicos, a metodologia e osresultados das pesquisas realizadas até o momento, e também o potencial daspesquisas em orientar as melhorias na prestação dos serviços. A partir destetrabalho, constatam-se três resultados significativos para o serviço públicoem geral e para a melhoria da prestação dos serviços mais especificamente.

8.1. Serviços específicos versus gerais

As pesquisas que comparam a prestação dos serviços do governo, ouserviços públicos em geral, a serviços específicos do setor privado podem nãoestar contando uma história totalmente precisa. As pesquisas indicam que as ava-liações dos serviços governamentais ou do setor público em geral são significa-tivamente mais baixas que as avaliações de experiências específicas de serviçosdo setor público. Isso sugere que as lacunas de desempenho que supostamenteexistem entre os serviços do setor público e do privado podem ser menores queanteriormente relatado, e para alguns serviços podem até mesmo nem existir.

8.2. A necessidade de parâmetros normativos

É difícil atribuir significado a avaliações de satisfação na ausência deparâmetros normativos. Atualmente várias metodologias de pesquisas são utili-zadas para medir uma variedade de serviços públicos. Uma vez que alguns ser-viços estão predispostos a receber avaliações altas ou baixas, é difícil fazercomparações confiáveis. Se os prestadores de serviços do setor público pudes-sem comparar suas avaliações com similares de outros prestadores do setorpúblico, eles poderiam determinar quão bem estão se saindo em comparaçãoaos outros. Isso, por sua vez, permitiria o desenvolvimento de parâmetrosnormativos no âmbito do serviço público, das agências e dos programas. Ascomparações poderiam ser feitas utilizando-se metodologias de conversão deescalas, um índice de satisfação de usuários ou um instrumento padronizado depesquisa — este último forneceria o maior número de vantagens.

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8.3. O valor das pesquisas

As pesquisas são uma ferramenta poderosa para se identificar e redu-zir as lacunas entre as expectativas de usuários internos e externos com rela-ção aos serviços e sua satisfação com os mesmos. Eles foram, contudo,amplamente subutilizados no passado. Se as pesquisas fazem as perguntascertas, os resultados podem informar aos gestores o que eles precisam fazerpara melhorar o serviço aos seus usuários especificamente, e/ou para oscidadãos em geral.

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9. Áreas parapesquisas adicionais

Este trabalho ressaltou alguns resultados, características e usos daspesquisas e as suas aplicações para os governos como ferramentas para amelhoria nos serviços públicos. Porém, permanecem muitas lacunas emnosso conhecimento. Acredita-se que o conhecimento obtido com estudosadicionais nessas áreas ajudaria os governos a reduzir a lacuna entre as ex-pectativas de serviço dos cidadãos e usuários e satisfação com o desempenhodo serviço. Essas áreas são destacadas abaixo para considerações adicionais.

9.1. O que determina a satisfação/insatisfação com o serviço?

A fim de melhorar a satisfação com o serviço, seria útil verificar pri-meiro o que a determina. Sabe-se que vários elementos influenciam as per-cepções dos cidadãos e usuários sobre os serviços. Pesquisas adicionaisnessa área permitirão a verificação desses elementos, bem como a identifi-cação de outros elementos comuns ou específicos dos serviços que influen-ciam as avaliações de qualidade de serviço.

Normalmente, as pesquisas de usuários medem elementos genéricosdo serviço, tais como cortesia e habilidade de resposta. Contudo, o serviçopúblico adere a valores únicos, tais como o devido processo (due process) eeqüidade. Não está clara a importância desses elementos para os cidadãos eusuários; eles são mais, menos ou igualmente importantes como elementosgenéricos dos serviços? A pergunta sobre o papel do governo na pesquisa de1997 da Ekos, Rethinking Government IV (Repensando o Governo IV),sugere que esses elementos podem ser mais importantes para os cidadãos.Como esses princípios e valores são fundamentais para o serviço público,dever-se-iam considerar pesquisas adicionais a esse respeito.

A resposta para a pergunta acima também pode levar a uma questãocorrelata: por que o governo federal recebe avaliações de desempenhoiguais, ou inferiores, àquelas dos governos estaduais, e consistentementeinferiores às dos governos locais? Como foi observado anteriormente, bai-xos níveis de confiança em políticos e no governo, combinados com umainabilidade de discernir claramente entre política e governo, de um lado, e

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os servidores públicos e a prestação de serviços, do outro, podem ser umaparte importante da resposta.

Outra explicação provável é que as atividades dos governos munici-pais são mais visíveis e tangíveis que as atividades do governo federal. Consi-dere a natureza sutil de muitas das atividades do governo federal. Diferenteda maioria dos governos locais, grande parte da receita do governo federal éutilizada para pagar o ônus de juros sobre uma grande dívida (pagamentos dejuros de uma dívida total de $45 bilhões em 1996-97). Além disso, muitosdos serviços custeados pelo governo federal na verdade são realizados emoutros níveis do governo. Considere os $8,9 bilhões (1995-96) transferidospara os Estados, para ajudar a assegurar serviços semelhantes ou análogos emníveis comparáveis de impostos (no momento em que escrevemos, recebidospor todos os Estados, exceto Alberta, Ontário e British Columbia). Damesma forma, a Canada Health and Social Transfer — CHST (Saúde eTransferência Social do Canadá) assegura que os Estados tenham os meiospara fornecer assistência social e serviços sociais de saúde e de educaçãopós-secundária; a CHST totalizou $ 26,9 bilhões em 1996-97.90 Assim, mui-tos dos benefícios prestados por meio das receitas federais não são percebi-dos como sendo de nível federal em si, especialmente se comparados com asatividades tão visíveis dos governos locais, cujas receitas (algumas das quaisprovêm de outros níveis do governo) são quase totalmente alocadas paraprestar serviços diretos, como coleta de lixo, atividades de segurança pública(polícia, bombeiros etc.), serviços de infra-estrutura e atividades de obraspúblicas (manutenção de sinalização de trânsito, calçadas, ruas etc.). Em con-seqüência, diferentemente de suas percepções das atividades em nível fede-ral, os cidadãos podem ver o que seu governo local está fazendo por eles dia-riamente e de maneira tangível. Isso coloca a questão: se avaliações maisaltas estão diretamente relacionadas à visibilidade dos benefícios prestadospelos governos aos cidadãos, como essa situação deveria ser abordada pelosgovernos estadual e federal, se for o caso?

9.2. Qual é a relação entre as experiências específicas com os serviços e aspercepções do desempenho do governo em geral?

Enquanto as evidências sugerem que as avaliações de experiências espe-cíficas com os serviços são mais altas que as avaliações de serviços do governoem geral, não fica claro se as avaliações das primeiras terão um impacto sobre asavaliações das últimas. Quer dizer, será que uma avaliação melhor de uma experi-ência específica com os serviços irá afetar a avaliação de uma pessoa sobre odesempenho do governo em geral ou vice-versa? Diz-se muitas vezes que umamelhor prestação de serviços irá levar a uma melhoria na percepção do governoem geral, porém essa relação ainda está por ser demonstrada.

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Que fatores promovem a confiança no governo e quão forte é o eloentre a confiança e a satisfação com o serviço? Se os cidadãos têm um baixonível de confiança no governo, eles estão mais inclinados a avaliar a satisfaçãocom o serviço como sendo ruim? Por outro lado, se os usuários e cidadãosestão insatisfeitos com os serviços públicos, eles estão mais inclinados a ava-liar sua confiança no governo como sendo baixa? Para cada uma dessas pergun-tas, a relação entre confiança e desempenho em cada nível de governo deveriaser considerada. Para abordar essas questões eficazmente, dever-se-ia fazeruma distinção entre as avaliações das políticas e dos políticos, por um lado, eas avaliações de serviços públicos e dos servidores públicos, do outro.

9.3. Como o nível de satisfação dos cidadãos e usuários com os serviçosespecíficos do setor público se compara em termos do nível de satisfaçãocom os serviços específicos do setor privado?

O serviço público tem uma boa história para contar, mas essa históriapossivelmente foi bastante contaminada por resultados de pesquisas quesupostamente provam o desempenho ruim dos serviços do setor público,quando comparados aos serviços do setor privado. Uma análise dos dois se-tores sugere que tal comparação pode ser inválida, dados os seus diferentesmeios e fins. Contudo, deixando de lado essa possibilidade, a evidência suge-re que a lacuna entre as avaliações dos usuários e cidadãos do desempenhodos serviços dos setores público e privado pode ser menor que pensado ante-riormente, e até mesmo inexistente. Se essa constatação pudesse serverificada, poderia ter um impacto positivo sobre a percepção do público arespeito do desempenho do governo, do programa de ação do serviço públicoe da percepção dos servidores públicos a respeito de si mesmos. Como re-sultado, uma pesquisa comparando serviços específicos dos setores públicoe privado deveria ser considerada.

9.4. Quais são as prioridades da ação de cidadãos e usuários, incluindosuas prioridades no atendimento integrado do tipo single window, em nívelnacional e por Estado?

Em vez de supor que medidas como prestação de serviços alternati-vos e iniciativas de qualidade de atendimento irão melhorar o serviço, oscidadãos e usuários deveriam ser consultados a respeito de suas prioridadespara tais melhorias. Que áreas são prioritárias e como elas poderiam sermelhoradas? Que grupos de serviços os cidadãos gostariam de ter disponíveis namodalidade de atendimeno integrado do tipo single window? Ao identificar asrespostas a essas perguntas, os governos poderiam então concentrar-se naqueleselementos que fariam uma diferença significativa para os cidadãos.

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9.5 . Qual é a melhor maneira de desenvolver parâmetros normativos paraserviços dentro do governo do Canadá e nos Estados?

É difícil atribuir significado a resultados de pesquisa quando nãoexiste um ponto de referência com o qual compará-los. Para complicar oproblema, as pesquisas sugerem que certos serviços irão, constantemente,receber avaliações altas, e outros irão, constantemente, obter avaliações bai-xas. O uso de um instrumento padronizado de avaliação permitiria que depar-tamentos e agências desenvolvessem parâmetros normativos baseados emavaliações de serviços similares no governo canadense e nos Estados, e lhespermitiria determinar quão bem eles estão se saindo com relação a serviçossimilares do setor público. Por essas razões, mais considerações deveriamser feitas com relação ao desenvolvimento de um instrumento padronizadode pesquisa.

9.6. Quais são as expectativas dos cidadãos em relação a padrões genéricosdos serviços?

Existem muitos elementos dos serviços que são comuns a quasetodas as organizações, o tempo gasto em espera ao telefone ou numa fila nobalcão de um representante do governo, por exemplo. Identificando o que oscidadãos percebem como sendo níveis aceitáveis de serviço nessas áreasgenéricas, isso forneceria parâmetros valiosos, ajudaria as organizações aestabelecer padrões apropriados de serviço e, por fim, ajudaria a assegurarníveis consistentes de serviço ao usuário.

9.7. O que é um bom desempenho para serviços internos, e qual é a relaçãoentre as satisfações interna e externa com o serviço?

Os usuários internos são participantes essenciais na equação dequalidade dos serviços, e mesmo assim eles raramente são consultados parafins de melhoria. Infelizmente a baixa qualidade dos serviços internos podelevar a um baixo moral, a um ambiente de trabalho não harmonioso e, final-mente, a serviços externos de má qualidade. A fim de melhorar os serviçosinternos, é necessário um maior número de pesquisas para identificar asbarreiras e prioridades para a melhoria no serviço, estabelecer parâmetrosnormativos de desempenho e melhorar a relação entre satisfação interna eexterna com o serviço.

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10. Conclusão

O tema deste trabalho é simples, porém poderoso: melhorar os servi-ços prestados aos cidadãos requer identificar precisamente a sua satisfação eas suas prioridades para melhoria. Para isso, o trabalho explorou o que sabe-mos e o que não sabemos a respeito dos pontos de vista dos cidadãos sobreos serviços governamentais. De fato, o trabalho questiona crenças antigassobre o desempenho lento dos serviços públicos, especialmente se compara-dos a serviços específicos do setor privado. Mas também ressalta que o setorprivado provavelmente não é o instrumento de medida apropriado paramensurar o desempenho da maioria dos serviços do setor público. O que énecessário, portanto, é um instrumento padronizado de pesquisa que permitaaos gestores do setor público comparar o desempenho das suas organizações,tanto ao longo do tempo como com organizações similares do setor público.Uma vez que os gestores tenham uma imagem precisa de como o seu desem-penho é percebido por usuários/cidadãos e tiverem explorado as prioridadesde melhorias apresentadas por eles, as metas de melhoria podem ser defini-das com segurança. Se pesquisado regularmente, o desempenho pode seracompanhado ao longo do tempo. As pesquisas podem ajudar os gestores arealizar tudo isso, mas infelizmente, não fazem a pergunta adequada para ori-entar as melhorias dos serviços de maneira eficaz.

Está claro que ainda existe muita coisa que não sabemos sobre o queos usuários/cidadãos desejam dos serviços governamentais. Esse estudo possi-velmente não pôde completar, ou até mesmo, identificar essas lacunas doconhecimento, mas tentou fornecer uma base sobre a qual outros possam cons-truir. Por fim, outras pesquisas adicionais serão necessárias para fornecer aosgestores informações estratégicas (fatores de satisfação, por exemplo) e fer-ramentas (um instrumento padronizado de pesquisa, por exemplo) necessáriaspara que eles possam melhorar o serviço aos cidadãos de maneira mensurável.

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11. Informações adicionais

Desde a pesquisa e redação deste estudo, realizadas basicamente entrenovembro de 1997 e março de 1998, a Rede realizou um grande número de pro-jetos de pesquisa que preencheram muitas lacunas de conhecimento identificadasneste trabalho. Os dois projetos mais significativos, neste sentido, resultaramnos relatórios Citizens First (Primeiro os cidadãos) e Client SatisfactionSurveying: A Common Measurements Tool (Pesquisando a satisfação de usu-ários: uma ferramenta comum de mensuração). Citizen’s First91 é o relatório depesquisa nacional da Rede. Realizada pelo CCMD e co-patrocinada por organiza-ções federais e governos estaduais, ela foi a pesquisa mais sofisticada já reali-zada sobre o ponto de vista dos canadenses a respeito dos serviços federais, esta-duais e municipais. Também realizados por solicitação da Rede foram a ClientSatisfaction Surveying: A Common Measurements Tool e o seu relatório par-ceiro, Client Satisfaction Surveying: A Manager’s Guide.92 Conjuntamente,esses dois documentos fornecem aos gestores um novo instrumento padronizadode pesquisa e orientação para realizá-la.

Abaixo descrevemos, resumidamente, alguns dos novos conhecimen-tos e ferramentas geradas por esses projetos, e mostramos como eles fize-ram avançar o nosso conhecimento nas áreas identificadas anteriormenteneste relatório como necessitando de pesquisa adicional.

11.1. O que determina a satisfação/insatisfação com o serviço?

O Citizens First revelou que cinco fatores determinantes são res-ponsáveis por mais de 70 % da variação nas avaliações da qualidade do ser-viço pelos usuários:

• rapidez;• conhecimento/competência da equipe;• cortesia;• justiça;• resultado.Quando todos os cinco fatores obtinham uma avaliação elevada (4 ou

5, dentre 5), a avaliação geral de satisfação era de 85. Se apenas um dos

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cinco determinantes obtinha uma avaliação baixa, a satisfação geral caía de25 pontos, para 60 dentre 100.93

11.2. Qual é a relação entre experiências específicas com o serviço e aspercepções do desempenho do governo em geral?

O Citizens First relata que as opiniões dos cidadãos sobre o governoefetivamente afetam suas avaliações de experiências específicas com o ser-viço. Aqueles que acreditam que, em geral, os governos, políticos e servido-res públicos estão realizando um excelente trabalho tendem a avaliar a quali-dade mais alto que aqueles que não acreditam. Contudo, o estudo foi incapazde identificar se o oposto é verdadeiro — se um melhor atendimento aocidadão (e, portanto, avaliações mais altas de experiências específicas deserviços) levam a atitudes mais positivas com relação ao governo em geral.94

11.3. Como o nível de satisfação de cidadãos e usuários com serviços espe-cíficos do setor público se compara com seu nível de satisfação com servi-ços específicos do setor privado?

Dando seguimento às recomendações deste trabalho, a pesquisa emnível nacional, realizada pela Rede, solicitou aos entrevistados que avaliassem aqualidade dos serviços específicos dos setores público e privado. O CitizensFirst relata que os canadenses não avaliam a qualidade dos serviços do setorprivado mais alto que os serviços do setor público, desfazendo assim o mito.Quando os cidadãos avaliavam serviços específicos dos dois setores, eleslhes atribuíam valores semelhantes em média.95 O fato é que alguns serviçosdo setor público obtêm avaliações mais altas que alguns serviços do setorprivado, assim como o oposto também é verdadeiro.

11.4. Quais são as prioridades de cidadãos e usuários para ação, incluindosuas prioridades para centrais de atendimento integrado do tipo singlewindow, em nível nacional e por Estado?

O Citizens First identifica as prioridades dos cidadãos paramelhorias do processo, baseadas em uma experiência recente e específicaque eles tiveram com um serviço do governo. Os entrevistados que nãoderam uma avaliação positiva à qualidade do serviço em geral listaram suasduas principais prioridades, quais sejam, a redução da burocracia e a redu-ção de filas. Os entrevistados também foram solicitados a relatar situaçõesnas quais eles tinham que contatar mais de um departamento do governopara obter o serviço desejado (pergunta aberta). Ao final, a maioria dasexperiências de contato múltiplo resultam da necessidade de certificados

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pessoais/documentos, e o departamento mais freqüentemente contatado foia Fazenda do Canadá. Esse tipo de informação fornece um importante pontode partida para determinar como o governo pode agrupar serviços da me-lhor maneira possível, para atender às necessidades dos cidadãos em linhasde atendimento integrado do tipo single window.96

11.5. Qual é a melhor maneira de desenvolver parâmetros normativos paraserviços dentro do governo federal e dos governos estaduais do Canadá?

Partindo da pesquisa para este trabalho, a Rede desenvolveu um ins-trumento padrão de avaliação que ela denomina de ferramenta comum demedida (Common Measurements Tool – CMT).97 A CMT é um instrumentode pesquisa “pronto-para-uso” que foi especialmente elaborado para permitira comparação de resultados de pesquisa ao longo do tempo e com organiza-ções similares. Utilizando essa ferramenta e “hospedando” seus resultados naCCMD,98 pode-se construir uma base de dados que irá permitir aos gestoresidentificar quão bom é seu desempenho em comparação com outras organi-zações do setor público na sua linha de atuação. Como foi observado, o novoguia para gestores da Rede foi elaborado para ajudar os gestores ao longo detodo o processo de pesquisa.

11.6. Quais são as expectativas dos cidadãos com relação a padrões genéri-cos de serviço?

Por meio do Citizens First, a Rede identificou o que os cidadãospercebem como sendo níveis aceitáveis de serviço para os serviços genéri-cos/de rotina. Por exemplo, 97 % dos entrevistados responderam que umaespera de 30 segundos ao telefone é aceitável, 85 % relataram que lidar comaté duas pessoas diferentes ao telefone é aceitável, e 75 % relataram queuma espera de quatro horas para uma chamada telefônica de retorno é aceitá-vel. A pesquisa também forneceu informações a respeito das expectativas decidadãos com relação ao e-mail, atendimento no balcão e atendimento pelocorreio.99 Essa é uma nova informação estratégica que as organizações dosetor público podem usar para ajudar a orientar sua alocação de recursos, seudesenvolvimento de padrões de serviço e suas comunicações (gestão deexpectativas, por exemplo) com os usuários.

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Notas

1 KNOX, C., MCALISTER, D. (1995): “Policy evaluation: incorporating users’views”. Public Administration, v. 73, outono.

2 O CCMD é uma organização do governo federal canadense voltada paraapoiar altos dirigentes e gerentes públicos com programas de treinamentoe cursos, eventos de capacitação, pesquisa estratégica e outras atividadesde desenvolvimento de liderança.

3 Os demais relatórios são: Citizens First que contém resultados de umapesquisa nacional de avaliação dos serviços públicos canadenses; ClientSatisfaction Surveying: A Common Measurements Tool que apresenta umquestionário básico para levantar informações que levem à melhoria daqualidade dos serviços e facilitar a comparação de resultados entre orga-nizações semelhantes e o acompanhamento do desempenho da organiza-ção ao longo do tempo; Innovations and Good Practices in Single-Window Service que apresenta experiências de ‘balcão multi-serviços’ doCanadá para permitir que os gerentes públicos compreendam as oportuni-dades abertas por essa nova forma de prestação de serviço e GoodPractices in Citizen-Centred Service que apresenta experiências inovado-ras em prestação de serviço. Esses relatórios estão disponíveis no websitedo CCMD (http://www.ccmd-ccg.gc.ca).

4 Uma ampla lista das diversas aplicações de pesquisas de cidadãos é fornecidaem Kenneth Webb e Harry P. Hatry, Obtaining Citizen Feedback: TheApplication of Citizen Surveys to Local Government (Obtendo feedbackdos cidadãos: a aplicação de pesquisas de cidadãos ao governo local), Wa-shington: The Urban Institute, 1973.

5 Ao mesmo tempo em que traz alguns aspectos similares, uma comparaçãomais aprofundada da medição de desempenho objetiva vs. subjetiva éfornecida em Charles T. Goodsell, The Case for Bureaucracy: A PublicAdministration Polemic (O caso da burocracia: uma polêmica de Admi-nistração Pública), 3ª edição, New Jersey: Chatham House Publishers,Inc., 1994, p. 37-46.

6 Note que o termo serviço inclui atividades regulatórias. Para maiores infor-mações sobre a diferença entre usuários, usuários, cidadãos, beneficiários e

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interessados, veja Canada, Treasury Board of Canada Secretariat,Quality Services Guide XII: Who is the Client? – A Discussion Paper(Secretaria do Conselho do Tesouro do Canadá, 12º Guia de Serviços deQualidade: Quem é o usuário? — Um documento para discussão), Ottawa:junho de 1996, e Canada, Privy Council Office/Canadian Centre forManagement Development, A Strong Foundation: Report of the StudyTeam on Public Service Values and Ethics (Gabinete do Conselho Priva-do/Centro Canadense de Gestão, Uma Fundação Forte: Relatório da Equi-pe de Estudo sobre Valores e Ética no Serviço Público), Ottawa: 1996, p.39.

7 Na verdade, pesquisas de cidadãos podem ser ainda subdivididas entrepesquisas de cidadãos — aquelas que procuram informações sobre assun-tos como a busca de bens públicos e a proteção do interesse público — epesquisas de contribuintes — que buscam informações a respeito dematérias como alocação orçamentária e níveis de tributação. Ao mesmotempo em que essa é uma diferenciação importante, ela não desfaz a dife-renciação básica usuário/cidadão identificada acima e, portanto, não seráaprofundada no contexto deste trabalho.

8 Uma discussão útil da diferenciação entre pesquisas de cidadãos e de usu-ários é fornecida em um relatório para a Rede de Serviço Centrado noUsuário: Canada, Client Satisfaction Surveying: A Manager´s Guide(Pesquisas de satisfação de usuários: um guia para gestores), FayeSchmidt com Teresa Strickland, Ottawa: Centro Canadense de Gestão,dezembro de 1998.

9 Uma análise útil e lúcida do escopo e das operações do governo éfornecida em: Canada, Report of the Task Force on Service Delivery (Re-latório da Força Tarefa sobre prestação de serviço), v. 4, parte 3, Reviewand Analysis of Recent Changes in the Delivery of GovernmentServices (Revisão e análise das mudanças recentes na prestação de servi-ços governamentais), David Wright e David Zussman, Ottawa: Escritóriodo Conselho Privado/Centro Canadense de Gestão, 21 de maio de 1996.

10 Por exemplo, veja Peter Aucoin, The Design of Public Organizations forthe 21st Century: Why Bureaucracy Will Survive in Public Management(O Design das organizações públicas para o século XXI: por que a buro-cracia irá sobreviver na gestão pública), Canadian Public Administration40, no 2 (verão de 1997), p. 290-306.

11 Para maiores informações sobre a diferenciação entre usuário e cidadão,beneficiários e interessados, veja Canadá, Treasury Board of CanadaSecretariat (Secretaria do Conselho do Tesouro do Canadá), QualityServices Guide XII: Who is the Client? — A Discussion Paper (12º Guia

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de Serviços de Qualidade: Quem é o usuário? – Um documento para dis-cussão), Ottawa: junho de 1996.

12 Para informações adicionais sobre a diferenciação entre os serviços dosetor público e privado, algumas leituras sugeridas incluem Canada,Report of the Task Force on Service Delivery (Relatório da Força-Tarefasobre Prestação de Serviço), v. 4, parte 3, Review and Analysis of RecentChanges in the Delivery of Government Services (Revisão e análise dasmudanças recentes na prestação de serviços governamentais), DavidWright e David Zussman (Ottawa: Escritório do Conselho Privado/CentroCanadense de Gestão, 21 de maio de 1996); Graham T. Allison Jr., Publicand Private Management: Are They Fundamentally Alike in AllUnimportant Respects? (Gestão Pública e Privada: são elas fundamental-mente iguais em todos os aspectos não-importantes?), Federick S. Lane,ed., Current Issues in Public Administration (Questões atuais na Admi-nistração Pública), 3a ed., New York: St. Martin’s Press, 1986; HenryMintzberg, Managing Government, Governing Management(Gerenciando o governo, governando o gerenciamento), HarvardBusiness Review (maio-junho 1996), p. 75-83.

13 Diferentemente de usuários, cidadãos compartilham um propósito comumcom todos os canadenses e são obrigados a cumprir normas legais e a tra-balhar confinados no enquadramento legal do Canadá. Os direitos doscidadãos incluem coisas como justiça, segurança e a garantia de uma redemínima de segurança social.

14 Existe uma grande variedade de termos utilizados para descrever pessoasque recebem serviços ou benefícios do governo. Enquanto o termo usuá-rio foi intencionalmente escolhido para denominar os receptores diretosdos serviços governamentais, ele muitas vezes é substituído por outrasdenominações, dependendo da área de serviço. Exemplos de denomina-ções onde os receptores e beneficiários dos serviços são a mesma pessoaincluem: usuário (customer - o usuário paga pelos serviços), usuário(client - uma gama de serviços governamentais e serviços de informática),receptores (serviços sociais). Exemplos onde o beneficiário não é oreceptor do serviço, mas sim a sociedade como um todo, incluem:cumpridores e presos (regulamentação, impostos), acusados, presidiáriose transgressores (serviços jurídicos e correções).

15 Esse relatório está disponibilizado na home page do CCMD.16 Gabinete do Conselho Privado/Centro Canadense de Gestão. A Strong

Foundation: Report of the Study Team on Public Service Values andEthics (Uma Fundação Forte: Relatório da Equipe de Estudos sobre Valo-res e Ética no Serviço Público), Ottawa: 1996, p. 39. Em geral, esse docu-mento fornece uma excelente análise da natureza evolutiva dos valores e

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da ética dentro do governo. Também vale a pena mencionar o Departa-mento de Parques de British Columbia, que é singular, no sentido de queutiliza pesquisas entre usuários para obter informações específicas doparque e de seus usuários, e dos cidadãos sobre seus pontos de vista a res-peito do sistema do parque como um todo.

17 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government IV: Summary ofWave One Findings (Repensando o Governo IV: Resumo dasConstatações da Primeira Onda), dezembro de 1997.

18 Goldfarb 1999, conforme citado em David Zussman, Government Serviceto the Public: Public Perceptions (Serviços governamentais para o público:Percepções do Público), Optimum 22, no 4, 1991-1992, p. 13.

19 Leslie Seidle, Rethinking the Delivery of Public Services to Citizens(Repensando a prestação de serviços públicos aos cidadãos, Montreal:Instituto de Pesquisa sobre Políticas Públicas, 1995, p. 79.

20 Conforme citado em David Zussman, Government Service to the Public:Public Perceptions (Serviço do Governo para o público: percepçõespúblicas), Optimum 22, no 4, 1991-1991, p. 12.

21 Insight Canada Research, Perspectives Canadá 1 (Perspectivas doCanadá 1), no 4, 1992.

22 Continuous Improvement Services Inc., e Erin Research Inc. Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(Melhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade do ser-viço no Governo de Ontário, fevereiro de 1992, p. 69).

23 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government IV: Summary ofWave One Findings (Repensando o Governo IV: Resumo dasConstatações da Primeira Onda, dezembro de 1997). Quando as categoriasbom e neutro são combinadas, 73 % dos entrevistados de janeiro de 1997e 69 % dos entrevistados de novembro de 1997 avaliaram o GovernoFederal como tendo um desempenho bom ou neutro (nem bom, nemruim); apenas 59 % (janeiro de 1997) e 53 % (novembro de 1997) avalia-ram os governos estaduais como bom ou neutro. Em janeiro de 1997, 74% dos entrevistados indicaram um avaliação de bom ou neutro para o nívellocal, como o fizeram 69 % em novembro de 1997.

24 Paradoxalmente, em 1989, a Décima constatou que apenas 7 % do públicotinham uma grande confiança nos bancos, enquanto que 12 % tinham umagrande confiança no funcionalismo público. Mas, quando as categorias “ape-nas alguma confiança”e “muita confiança” foram somadas, 83% do públicoindicaram confiança nos bancos, e 75 % indicaram confiança no serviçopúblico. Goldfarb, 1989, conforme citado em David Zussman, GovernmentService to the Public: Public Perceptions (Serviços do governo para o pú-blico: percepções do público), Optimum 22, no 4, 1991-1992, p. 13.

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25 Pollara, Public Trust Index (Índice de Confiança Pública). Janeiro de 1997.26 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government (Repensando o

Governo). Apresentação perante o Centro Canadense de Gestão, novembro de 1997.

27 Veja por exemplo Robert D. Putnam, The Decline of Civil Society: HowCome? So What? (O declínio da sociedade civil? Por quê? E daí?). A pa-lestra de John L. Manion de 1996, Ottawa: Centro Canadense de Gestão,1991, p. 5-6.

28 Neil Nevitte, The Decline of Deference: Canadian Value Change inCross-National Perspective (O declínio da Deferência: A mudança devalor na perspectiva transnacional canadense), Peterborough: BroadviewPress, 1996, p. 55-70 e David Zussman, Do Citizens Trust TheirGovernments (Os cidadãos confiam em seus governos?), CanadianPublic Administration 40 (Administração Pública Canadense 40), no 2,pp. 234-254. As evidências sobre esse fenômeno estão estabelecidas noWorld Values Survey (Pesquisa Mundial de Valores) de 1981 e 1990,Environics Focus Canada Report (Relatório da Environics Focus sobre oCanadá), Toronto: Environics Research Group Ltd., 1996.

29 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government 1997 (Repen-sando o Governo1997), Ekos Research Associates Inc. CanadianPerspectives on Trust (Perspectivas Canadenses sobre a Confiança),Insights: Public Sector Management in Canada 2 (Insights: Gestão doSetor Público no Canadá), no 2, agosto/setembro de 1997, p. 6. Em buscade respostas dentro de um contexto norte-americano, a Escola de GovernoKennedy iniciou um projeto plurianual que procura ajudar a identificar asperguntas corretas, e, espera-se, identificar algumas das respostas. Paramais informações, veja Joseph S. Nye, Visions of Governance in theTwenty-First Century (Visões de governabilidade no século 21),Kennedy School of Government, Simpósio da Primavera, Universidade deHarvard, 1996, http://ksgwww.harvard.edu/visions/agenda.htm.

30 Para informações adicionais sobre a sociedade de informação, vejaSteven Rosell et al, Governing in an Information Society (Governandoem uma sociedade de informação), Montreal: Institute for Research onPublic Policy (Instituto para pesquisa de políticas públicas), 1992.

31 Canadá, Service to the Public: Task Force Report (Serviço para o público:Relatório da Força-Tarefa), Ottawa: 1990, p. 6.

32 Canadá, Report of the Task Force on Service Delivery (Relatório da For-ça-Tarefa sobre prestação de serviços), v. 4, parte 2. Perception ofGovernment Service Delivery (Percepções sobre prestação de serviçosGovernamentais), Ottawa: Gabinete do Conselho Privado/Centro Cana-dense de Gestão, 21 de maio de 1996, p. 8.

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71

33 David Zussman, Government Service to the Public: Public Perceptions,Optimum 22, no 4, 1991-1992, p. 15.

34 David Zussman, Government Service to the Public: Public Perceptions,Optimum 22, no.4 1991-1992, p. 13.

35 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government IV: Summary ofWave One Findings (Repensando o Governo IV: Resumo dasConstatações da Primeira Onda, dezembro de 1997.

36 Charles T. Goodsell, The Case for Bureaucracy: A Public AdministrationPolemic (Um caso a favor da burocracia: Uma polêmica da AdministraçãoPública), 3a ed., New Jersey: Chatham House Publishers, Inc., 1994, p. 9-10.

37 Conforme mencionado por Joseph S. Nye Jr., The Media and DecliningConfidence in Government (A imprensa e a confiança decrescente nogoverno), The Harvard International Journal of Press/Politics, 2, no 4,agosto de 1997, p. 5-7.

38 São de interesse potencial para pesquisa futura os pares de fatores inter-atuantes na Figura 1: o item expectativas de prestação de serviço é compara-do com a real prestação do serviço; as percepções das políticas e dos po-líticos são comparadas com as percepções do serviço público e dosservidores públicos; e as características do serviço utilizado são compara-das com as características dos receptores de serviços.

39 Essas constatações deveriam ser lidas cuidadosamente, uma vez queimpressões é um termo muito amplo que facilmente incluiria algumascombinações de satisfação, confiança, legitimidade etc.

40 Pollara, Perspectives Canada V, no 4 (1996).41 Pollara, Perspectives Canada V, no 2 (1997).42 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government (Repensando o

governo). Apresentação perante o Centro Canadense de Gestão, novembrode 1997.

43 National Quality Institute (Instituto Nacional de Qualidade), NationalConsumer Survey on Quality Industry Rankings (Pesquisa Nacional deConsumidores sobre Rankings das Indústrias de Qualidade, outubro de1997, e National Quality Institute, 1996 Canadian Consumer QualitySurvey — Government Series (Pesquisa Canadense de Qualidade do Con-sumidor — Serviços Governamentais).

44 Gabinete do Conselho Privado/Centro Canadense de Gestão, Report ofthe Deputy Ministers’ Task Force on Service Delivery Models (Relató-rio da Força-Tarefa dos Vice-Ministros sobre modelos de prestação deServiços), v. I e IV. Ottawa: outubro de 1996, p. 29 e Ekos ReserchAssociates Inc., Rethinking Government (Repensando o governo). Apre-sentação perante o Centro Canadense de Gestão, novembro de 1997.

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45 Charles T. Goodsell. The Case for Bureaucracy: A Public AdministrationPolemic (O Caso da Burocracia: Uma Polêmica sobre a AdministraçãoPública), 3a ed., New Jersey: Chatham House Publishers, Inc., 1994, p.10-37. Em geral, Goodsell fornece ampla evidência para apoiar sua argu-mentação de que os governos norte-americanos têm desempenho melhordo que é percebido normalmente. Como parte da sua argumentação, eleexplora o efeito de questões específicas versus gerais de questionáriopara as avaliações dos cidadãos dos serviços governamentais. Ele concluique, quando perguntado a respeito das suas experiências específicas/con-cretas, mais cidadãos percebem a sua experiência com o governo comosendo positiva.

46 Continuous Improvement Services Inc e Erin Research Inc., Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(O melhor retorno por dólares em impostos: Melhorando a qualidade dosserviços no Governo de Ontário, fevereiro de 1992, p. 78).

47 Gabinete do Conselho Privado/ Centro Canadense de Gestão, Report ofthe Deputy Ministers’ Task Force on Service Delivery Models (Relató-rio da Força-Tarefa dos Vice-Ministros sobre modelos de prestação deserviços, v. I, Ottawa: outubro de 1996, p. 12).

48 Thomas I. Miller e Michelle A. Miller. Citizen Surveys: How to Do Them,How to Use Them, What They Mean (Pesquisas entre cidadãos: comofazê-los, como usá-los, o que eles significam, Washington: InternationalCity/Country Management Association, p. 15).

49 Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Valuefor Tax Dollars: Improving service quality in the Ontario Government(O melhor retorno por dólares em impostos: Melhorando a qualidade dosserviços no Governo de Ontário, fevereiro de 1992, p. 78). Uma nota deprecaução: uma vez que inscrição, informação, assistência financeira efiscalização/policiamento são linhas de serviço se comparadas a loja dedepartamento, banco ou companhia financeira e supermercado, que sãoentidades de serviços, é questionável quão conclusivamente essasconstatações podem ser interpretadas.

50 TAG Research, City of Calgary Corporate Customer Satisfaction Survey(Pesquisa de satisfação de usuários corporativos da cidade de Calgary, julho de 1997).

51 Theodore H. Poister e Gary T. Henry, Citizen Ratings of Public andPrivate Service Quality: A Comparative Perspective (Avaliações decidadãos da qualidade dos serviços públicos e privados: uma perspectivacomparativa), Public Administration Review (Revisão da AdministraçãoPública 54, no 2, março/abril 1994, p. 158).

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52 ICM Research, Citizen’s Charter Costumer Survey: Research Report(Pesquisa dos direitos do cidadão como usuário: Relatório da Pesquisa,março-abril 1993).

53 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government IV: Summary ofWave One Findings (Repensando o Governo IV: Resumo dasConstatações da Primeira Onda, dezembro de 1997).

54 Gabinete do Conselho Privado/ Centro Canadense de Gestão, Report ofthe Deputy Ministers’ Task Force on Service Delivery Models (Relatórioda Força-Tarefa dos Vice-Ministros sobre modelos de prestação de servi-ços, v. IV, parte D, Ottawa: outubro de 1996, p. 8).

55 Governo de Alberta, Core Human Resources Measures Project (Projeto deMedidas Centrais de Recursos Humanos), 1997 Survey of Albertans andEmployees (Pesquisa de cidadãos e empregados de Alberta, outono de 1997).

56 Theodore H. Poister and Gary T. Henry, “Citizens Ratings of Public andPrivate Service Quality: A Comparative Perspective” (Avaliações decidadãos a respeito da qualidade dos serviços público e privado: uma pers-pectiva comparativa), Public Adminsitration Review (Revisão da Admi-nistração Pública 54, no 2, março/abril 1994, p. 158).

57 Conforme revisado em Charles T. Goodsell, The Case for Bureaucracy:A Public Administration Polemic (O caso a favor da burocracia: umapolêmica da Administração Pública, 3a ed., New Jersey, Chatham HousePublishers, Inc., 1994, p. 35-36).

58 ICM Research, Citizen’s Charter Customer Survey: Research Report(Pesquisa dos Direitos dos Cidadãos como Usuários: Relatório de Pes-quisa, março/abril 1993, p. 16).

59 Thomas I. Miller e Michelle A. Miller, Citizen Surveys: How to Do Them,How to Use Them, What They Mean (Pesquisas entre cidadãos: comofazê-los, como usá-los, o que eles significam). Washington: InternationalCity/County Management Association, p. 105.

60 Conforme citado em How Do We Compare (Como nós nos comparamos),Insights: Public Management in Canada (Insights: Gestão Pública noCanadá, no 2, agosto/setembro de 1997, p.6).

61 Thomas I. Miller e Michelle A. Miller, Citizen Surveys: How to DoThem, How to Use Them, What They Mean (Pesquisas entre cidadãos:como fazê-los, como usá-los, o que eles significam). Washington:International City/County Managerment Association, p. 114. O motivopara este fenômeno não está esclarecido; contudo, em uma apresentaçãorealizada em 15 de dezembro de 1997, perante o Centro Canadense deGestão, George Spears da Erin Research Inc., levantou a hipótese de queos serviços com uma avaliação consistentemente alta trazem benefíciosdiretos ao usuário, enquanto os serviços com avaliações consistentemente

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baixas não o fazem, e até mesmo podem ser vistos como uma ameaçapotencial ou desperdício.

62 Veja Hari Das, Mallika Das e Francis McKenzie, Assessing the ‘Will ofthe People: An Investigation into Town Service Delivery Satisfaction”(Avaliando o ‘desejo do povo’: uma pesquisa sobre a satisfação com aprestação de serviços municipais).

63 Veja, por exemplo, Claes Fornell et al. The American CustomerSatisfaction Index: Nature, Purpose, and Findings (O Índice Americanode Satisfação de Usuários: natureza, propósito e constatações), AmericanCustomer Satisfaction Index, 60 (outubro de 1996), p. 7-18.

64 Esta e outras falhas potenciais da adoção de um sistema como o Índice Ameri-cano de Satisfação de Usuários, tal como intensidade de recursos, foram for-necidos por Faye Schmidt, Diretora da Divisão de Apoio Organizacional naComissão de Relações com Empregados do Serviço Público do Governo deBritish Columbia, reunião, 11 de dezembro de 1997.

65 Claes Fornell et al. The American Customer Satisfaction Index: Nature,Purpose, and Findings (O Índice Americano de Satisfação de Usuários:natureza, propósito e constatações), American Customer SatisfactionIndex, 60, outubro 1996, p. 9.

66 Claes Fornell et al. The American Customer Satisfaction Index: Nature,Purpose, and Findings (O Índice Americano de Satisfação de Usuários:natureza, propósito e constatações”), American Customer SatisfactionIndex, 60, outubro 1996, p. 9.

67 British Columbia, British Columbia Parks, 1996 CampgroundSatisfaction Survey (Pesquisa de satisfação da area de acampamento).Haynes Point, Victoria, 1996.

68 Em reconhecimento à necessidade de pesquisa e análise em pesquisa, para queas reformas se ajustem a contextos organizacionais específicos, KennethKernaghan e Mohamed Charih desenvolveram as perguntas W5: What workswell, where and why? (O que funciona bem, onde e por quê?) em KennethKernaghan e Mohamed Charih, Emerging Issues in Contemporary PublicAdministration (Questões emergentes na administração pública contemporâ-nea), Canadian Public Administration (Administração Pública Canadense40, no 2, verão 1997, p. 219-233). É claro, se os serviços devem ser melhora-dos a curto prazo e mantidos a longo prazo, os sistemas, a estrutura, a culturae os incentivos de uma organização (por exemplo, gestão de recursos huma-nos, treinamento e desenvolvimento e liderança) precisam estar alinhadospara apoiar a iniciativa de melhoria do serviço.

69 Carr-Gordon Limited e Erin Research Inc., Responsible & ResponsiveRegulation for Ontario: A Report to the Red Tape Review Commision

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(Regulamentação Responsável & Sensível para Ontário: um relatório paraa Comissão de Revisão da Burocracia, maio 1996).

70 Polícia Regional de Peel, Survey of Attitudes and Opinions (Pesquisas deatitudes e opiniões, março 1994 e novembro 1996).

71 Australia, Commonwealth Government’s Advisory Board (Conselho Con-sultivo do Governo da Comunidade Britânica), The Australian PublicService Reformed: An Evaluation of a Decade of Management Reform(O serviço público australiano reformado: uma avaliação de uma décadade reforma de gestão), Canberra 1992, p. 399, 420.

72 Continuous Improvement Service Inc. e Erin Research Inc., Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(Melhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade dosserviços no governo de Ontário), fevereiro 1992, p. 13-14.

73 Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(Melhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade do ser-viço no governo de Ontário, fevereiro 1992).

74 Carr-Gordon Limited e Erin Research Inc., Responsible & ResponsiveRegulation for Ontario: A Report to the Red Tape Review Commision(Regulamentação responsável e sensível para Ontário: um relatório para aComissão de Revisão da Burocracia, maio 1996).

75 Canada, Western Economic Diversification (Diversificação EconômicaOcidental), 1988 Community Futures Development CorporationQuestionnaire (Questionário da Companhia de Desenvolvimento de Futu-ros Comunitários), 1996. Outras pesquisas que abordam as prioridadespara melhorias incluem Focus Oakville: Benchmark Quality of ServiceAnalysis (Foco Oakville: Parâmetros de Qualidade de Análise de Servi-ços), Ekos Rethinking Government Surveys (Pesquisas Ekos Repensandoo Governo), pesquisa da Washington Performance Partnership intituladaCitizen Satisfaction: Results From a Telephone Survey of WashingtonHouseholds About State Services (Satisfação de cidadãos: resultados deuma pesquisa telefônica de lares de Washington a respeito de serviçosestatais), Public Attitutes Toward B.C. Hydro (Atitudes públicas com B.C.Hydro), Divisão de Parques de British Columbia, e algumas perguntas depesquisas recentes encomendados pelo Centro Canadense de Gestão(CCMD) na primeira onda de Rethinking Government IV (Repensando oGoverno IV, 1997. Fora do Canadá, o Citizen’s Charter Customer Survey(Pesquisa dos direitos do cidadão como usuário) perguntou aos entrevis-tados quais três serviços eles mais desejavam que fossem melhorados.

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76 Ekos Research Associates Inc., Rethinking Government VI: Summary ofWave One Findings (Repensando o Governo VI: Resumo dasConstatações da Primeira Onda, dezembro 1997).

77 Baseline Market Research Ltd., Evaluation of Service New Brunswick:Final Report (Avaliação de Serviço New Brunswick: Relatório Final,dezembro de 1993).

78 Selkirk, Town of Selkirk Citizens Survey (Pesquisa de Cidadãos da Cida-de de Selkirk, 1998, p. 33).

79 ICM Research, Citizen’s Charter Customer Survey: Research Report(Pesquisa de usuários carta do cidadão: relatório de pesquisa, março-abril1993, p.15).

80 A grade de importância-desempenho está bem explicada em ContinuousImprovement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Value for TaxDollars: Improving Service Quality in the Ontario Government (O me-lhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade do serviçono governo de Ontário, fevereiro 1992, p. 7).

81 ICM Research, Citizen’s Charter Customer Survey: Research Report(Pesquisa dos direitos do cidadão como usuário: Relatório de Pesquisa,março-abril 1993, p. 15).

82 Canadá, Auditor-Geral, Report of the Auditor -General (Relatório do Au-ditor-Geral, Ottawa, setembro de 1996).

83 Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(O melhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade dosserviços no governo de Ontário, fevereiro 1992, p. 21-290.

84 Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc., Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(O melhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade dosserviços no governo de Ontário, fevereiro 1992, p. 29).

85 Canada, Auditor-Geral, Report of the Auditor- General (Relatório do Au-ditor-Geral, capítulo 14, Ottawa, setembro 1996).

86 British Columbia, British Columbia Parks, 1996 CampgroundSatisfaction Survey: Haynes Point (Pesquisa de satisfação de áreas deacampamento de 1996: Haynes Point, Victoria, 1996, p. 8).

87 Várias pesquisas abordam questões de envolvimento de empregados e de recur-sos humanos, mas isso é diferente de determinar suas percepções de satisfação,prioridades para melhorias e barreiras à melhoria como usuários internos.

88 Uma abordagem bastante equilibrada sobre como abordar empregados eusuários externos nas iniciativas de melhoria de serviços é fornecida emCanadá, Secretaria do Conselho do Tesouro do Canadá, Quality ServicesGuide XIII: Managers’ Guide to Implementing Quality Services (XIII

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Guia de Serviços de Qualidade: Guia de Gestores para Implementação deServiços de Qualidade, Ottawa, 1996).

89 Continuous Improvement Services Inc. e Erin Research Inc.,Best Valuefor Tax Dollars: Improving Service Quality in the Ontario Government(O melhor retorno por dólares em impostos: melhorando a qualidade dosserviços no governo de Ontário, fevereiro 1992, p. 23).

90 The Canada Health and Social Transfer (CHST) substituiu o EstablishedPrograms Financing (EPF) (Financiamento de Programas Estabelecidos)e o Canada Assistance Plan (CAP) (Plano de Assistência do Canadá) em1996-97. Ao invés de utilizar arranjos de compartilhamento de custos emvigor no CAP, o CHST é totalmente um fundo em bloco, como EPF.

91 Canadá, Citizens First (Primeiro os cidadãos), Erin Research Inc. Ottawa:Canadian Centre for Management Development, outubro de 1998. Estedocumento está disponível no website do CCMD em http://www.ccmd-ccg-gc.ca.

92 Canadá, Client Satisfaction Surveying: A Common Measuments Tool(Pesquisando a satisfação do usuário: uma ferramenta comum demensuração), Faye Schmidt com Teresa Strickland. Ottawa: Centro Cana-dense de Gestão, dezembro de 1998. Canada, Client SatisfactionSurveying: A Manager’s Guide (Pesquisando a satisfação do usuário: umguia para o gestor), Faye Schmidt com Teresa Strickland (Ottawa: CentroCanadense de Gestão, dezembro de 1998). Esses documentos estão dispo-níveis no website do CCMD em http://www.ccmd-ccg-gc.ca.

93 Canada, Citizens First (Primeiro os cidadãos), Erin Research Inc. Otta-wa: Canadian Centre For Management Development, outubro 1998, p.27-50. Este documento está disponível no website da CCMD em http://www.ccmd-ccg-gc.ca.

94 Canada, Citizens First (Primeiro os cidadãos), Erin Research Inc.(Ottawa: Canadian Centre For Management Development, outubro1998, p. 33-35. Este documento está disponível no website da CCMD emhttp://www.ccmd-ccg-gc.ca.

95 Canada, Citizens First (Primeiro os cidadãos), Erin Research Inc. Ottawa:Canadian Centre For Management Development, outubro 1998, p. 5-10,60-74. Este documento está disponível no website da CCMD em http://www.ccmd-ccg-gc.ca.

96 Canada, Citizens First (Primeiro os cidadãos), Erin Research Inc. Ottawa:Canadian Centre For Management Development, outubro 1998, p. 19-26.

97 Canadá, Client Satisfaction Surveying: A Common Measurements Tool(Pesquisando a satisfação do usuário: uma ferramenta comum de men-suração), Faye Schmidt e Teresa Strickland, Ottawa: Centro Canadense deGestão, dezembro 1998. Veja também Canadá, Client Satisfaction

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Surveying: A Manager’s Guide (Pesquisando a satisfação do usuário: umguia para o gestor), Faye Schmidt com Teresa Strickland, Ottawa: CentroCanadense de Gestão, dezembro 1998. Este documento está disponível nowebsite do CCMD em http://www.ccmd-ccg-gc.ca.

98 CCMD concordou em coletar os resultados de pesquisa da CMT até queum repositório permanente possa ser estabelecido para servir aos trêsPoderes do governo.

99 Canada, Citizens First (Primeiro os cidadãos), Erin Research Inc.,Ottawa: Canadian Centre For Management Development, outubro1998, p. 51-58. Este documento está disponível no website do CCMDem http:www.ccmd-ccg-gc.ca.

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Anexo 1

Pesquisa do Estado da Georgia:

Satisfação segundo a amostra do público em geral e de usuários recentes

Público em geral Consumidores recentes

Serviços Públicos Média N Desvio Padrão Média N Desvio Padrão

Bombeiros 80,0 333 16,9 82,8 16 21,8

Correio dos EUA 82,8 386 19,6 76,1 340 21,2

Clínicas de Saúde Pública 70,5 248 22,0 74,4 41 22,7

Coleta municipal do lixo 70,2 314 19,9 75,7 197 23,0

Polícia 70,1 363 24,5 71,3 95 31,4

Parques e Progr. Recr.66,1 341 27,1 77,1 182 19,3

Transporte público 65,1 192 27,2 76,6 63 16,7

Escolas públicas 63,5 334 27,2 68,2 172 27,7

Manutenção de ruas 63,0 372 26,5 59,2 380 26,7

Todos serv. públicos69,0 73,5

Serviços Privados

Correio privado 81,2 369 16,2 84,5 213 15,4

Armazéns 75,1 382 19,3 77,1 408 17,3

Bancos 71,2 364 22,7 81,7 301 20,2

Médicos particulares 70,7 360 21,2 80,6 278 19,6

Lanchonetes 68,9 355 23,1 68,5 374 20,9

Cinemas 67,3 280 23,6 75,5 200 17,4

Oficinas de automóveis 61,2 334 24,5 71,7 219 27,9

Provedores de TV a cabo 58,2 288 27,6 66,2 260 26,3

Táxis 54,2 168 24,6 59,6 34 30,8

Todos serv. privados67,5 73,9

Recriado a partir de: Theodore H. Poister e Gary T. Henry. Citizen Ratings of Public and PrivateService Quality: A Comparative Perspective (Avaliações dos Cidadãos da Qualidade dos Servi-ços Públicos e Privados: Uma Perspectiva Comparativa). Public Administration Review 54, no 2(março/abril de 1994), p. 155-160.

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84

Anexo 2

Desempenho relativo dos serviços do setor público e privado naGrã-Bretanha

Tipo de Serviço Desempenho Melhorias

(% muito bom ou bastante bom) (% desejando melhorias)

Supermercados 93 3

Serviços postais 92 3

Médicos 91 9

Escolas primárias 84 25

Coleta de lixo 83 9

Alfândega (portos e aeroportos) 78 1

Hospitais do Sist. Nac. de Saúde 77 37

Polícia 74 24

Bancos 70 19

Fazenda 70 5

Ônibus 68 24

Limpeza de ruas municipais 65 19

Previdência 64 14

Estradas de ferro 57 26

Agências de emprego/desemprego 57 21

Estradas municipais 48 26

Cortes de Justiça 46 17

Prisões 45 15

Observação: pesquisa de 1993 com amostragem aleatória para a Unidade de Direitos do Cidadãodo Reino Unido, de 3.097 entrevistados. Recriado a partir de: ICM Research, Citizen’s CharterCustomer Survey: Research Report (Pesquisa de usuários da carta do cidadão: Relatório de Pes-quisa), março-abril de 1993.

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85

Anexo 3

Avaliações de PTM (Percentual Médio Ajustado ao Máximo) paraServiços Individuais

Recriado a partir de: Thomas I. Miller e Michelle A. Miller, Citizen Surveys: How to Do Them,How to Use Them, What They Mean (Pesquisas de cidadãos: como realizá-los, como utilizá-los, oque eles significam). Washington: International City/County Management Association, 1991.

%

B o m b eiro s

B ib l io teca

C o le ta d e lix o

Á g u a/esg oto

P arq u es

P o líc ia

E sco las

R ecreação

R em o ção d e n ev e

Ilu m in ação p ú bl ica

L im peza pú b lica

M an u tenção g eral

S e rv iço s de saúd e

Ô n ib u s/trân s ito

C o n tro le de an im a is (zoo n o ses)

M an u tenção d e ru as

P lan ejam en to

E sgo to

4 0 5 0 6 0 7 0 8 0 9 0

7 5 º pe rcent il

5 0 º pe rcent il

ava liação m éd ia a ju stad a

2 5 º pe rcent il

Te rce ira id ad e

P arq u es/rec reação

P o lic iam en to d o có dig o

percentil

percentil

o

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86

Anexo 4

Quadro referencial para modernização da prestação de serviços dosetor público

© Centro Canadense de Gestão 1999

• C om un icaçõ es rea listas• A dm in is trar ex pec ta tivas• C on sulta a c idad ão s• En g a jam ento d os c id ad ãos• Treinam en to e d esen v o lv im en to de c id ad ãos

• A SD /A P D• Pa rce rias• • R e-en g enh aria• Q ua lid ad e d o serv iço• G Q T• • Tecn o lo g ia• Prá ticas in o vad o ras• R ecu peração de cu s to s

F erram entas de C om u n icação e E n ga jam en to

C a ixa d e F erram en tas d o G overn o p a ra M e lh o ria d os Serv iços

F erram entas para M elh or ia d os Serv iços

S in g le w ind o w

B ench m a rk in g

E xp ec ta t ivas dos C id ad ãos com R e lação à P restação d e Serv iços d o G overn o

• Pe rcep çõ es dos c id adão s a respe ito d o se rv iço go v ern am en ta l• En v o lv im en to do s c id adão s n a elab o ração d e se rv iço s• Pr io r id ad es dos c id ad ão s p ara m e lh o rias

R edu z irL acu n a

L acu n a d e P restação d e S erv iços sob re

D esem p en h o e R esp on sab ilid ad e

F ed eral

P restação d e Serv iços d o G overn o

• A tend im ento e in o v ação de linh a d e frente in teg rad a• C ultu ra d e serv iço• Es tra tég ia e s is tem as d e se rv iço• L id eran ça

P rov inc ia l

M ed id a e R elató rio

M un ic ipa l

O u tros S e to res

R edu z irL acu n a

Federal

Municipal

Outros Setores

Estadual

Reduzirlacuna

Reduzirlacuna

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Texto II — Satisfação do usuário:guia para o gerente público noCanadá

Faye Schmidt e Teresa Strickland pertencem à Rede de ServiçoCentrado no Cidadão — Centro Canadense de Gestão.Contato com os autores: [email protected]

Faye Schmidt &Teresa Strickland

© Centro Canadense de Gestão 1999

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Agradecimentos

A elaboração deste guia tem sido verdadeiramente um esforço decolaboração de muitos servidores públicos de todo o Canadá. Nós gostaría-mos de agradecer as contribuições feitas pelas seguintes organizações eindivíduos em apoio a este trabalho:

O Canadian Centre for Management Development — CCMD (Cen-tro Canadense de Gestão) tem sido o órgão central de apoio contínuo destetrabalho e reforçou este projeto por meio da experiência e do encorajamentodo seu corpo docente. Mais especificamente, gostaríamos de agradecer aRalph Heintzman e D. Brian Marson, atualmente da Secretaria do Conselhodo Tesouro, e a Samuel Wex e Geoff Dinsdale, do CCMD.

A Rede Nacional de Serviços Centrados no Cidadão forneceu a basecom a qual este trabalho foi iniciado e ofereceu apoio contínuo ao projeto. Oimpulso para o desenvolvimento deste guia veio da agência da Rede emOntário. Representantes-chave do Grupo Regional de Ontário, incluindo ArtDaniels, Barry Malmsten e Bill Pascal, forneceram a orientação e a direçãoiniciais para o desenvolvimento deste guia.

O conselho consultivo formal para este projeto ofereceu conheci-mento e apoio contínuo e foi crucial para o seu desenvolvimento. Os mem-bros do conselho consultivo: John Cumberford, Estado de Manitoba, KenDobell, cidade de Vancouver, Paul Reed do CCMD e da Statistics Canada, eRichard Tobin, da Secretaria do Conselho do Tesouro.

Muitas organizações compartilharam suas experiências e percepçõesespontaneamente. Sem elas e suas histórias reais, este guia teria pouca rele-vância para os gerentes. Agradecemos à BC Parks, à Companhia Canadensede Correios, à Comissão de Compras de British Columbia, à Direção doAeroporto Internacional de Vancouver e à cidade de Ajax por seu apoio.

Gostaríamos também de expressar nossa gratidão ao Estado deBritish Columbia por ceder os direitos do material de publicação do EstadoListening to Costumers, an Introduction (Ouvindo o Usuário, Uma Introdu-ção), escrita por D. Brian Marson, Greg J. Conner e Scot A. Woodhouse, quese mostrou útil para a elaboração deste guia.

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Agradecimento especial a minha colega Teresa Strickland da Univer-sidade de Victoria. A pesquisa e a redação que levaram à criação deste guiasão em grande parte o resultado dos seus diligentes esforços.

Faye SchmidtEstado de British Columbia

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1. Introdução

Este guia visa auxiliar os gerentes dos serviços públicos em todo o Ca-nadá, ao fornecer as melhores práticas para a pesquisa de satisfação do usuá-rio com esses serviços. A principal meta deste projeto é ajudar a melhorar osserviços públicos que são oferecidos aos nossos usuários e cidadãos.

Em julho de 1997, a Rede de Serviço Centrado no Cidadão notou queainda persistia no Canadá um vácuo significativo de serviços entre as expec-tativas dos cidadãos e os serviços efetivamente fornecidos, apesar dos esfor-ços substanciais realizados no sentido de modernizar a prestação de serviços.A Rede reconheceu a necessidade de ampliar a compreensão das expectativasde cidadãos/usuários e seus níveis de satisfação e prioridades para a melhoriados serviços. O desenvolvimento deste guia é o resultado do impulso forne-cido pela Rede.

Espera-se que este guia para a pesquisa de satisfação do usuário indu-za mais organizações de serviços públicos a começarem tais pesquisas, faci-litando o aperfeiçoamento na forma que nossos serviços públicos são presta-dos. Essencialmente, o objetivo deste projeto é auxiliar na construção de ummeio ambiente no serviço público que seja voltado para o usuário, que irábeneficiá-los diretamente e indiretamente aos cidadãos a quem servimos.

“Venha para a beirada”, ele disse.Eles disseram: “Temos medo.”“Venham para a beirada”, ele disse.E eles vieram.E ele os empurrou.E eles voaram.Guillaume Apollinaire

Este guia explica os benefícios potenciais das pesquisas de satisfa-ção do usuário e fornece instruções sobre como elas deveriam ser planejadase implementadas. Além disso, o que é mais importante, é que este guia esboçacomo usar as informações valiosas que resultam de tais pesquisas, possibili-tando assim melhorias na prestação dos serviços públicos.

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91

Este guia também introduz uma nova ferramenta de pesquisa de satis-fação do usuário — a Common Measurements Tool — CMT (FerramentaComum de Medida), elaborada para responder à necessidade identificada pelaRede Nacional de Serviço Centrado no Usuário de uma ferramenta consis-tente de pesquisa com usuários. A CMT oferece um conjunto de itens de ava-liação comumente utilizados e um sistema consistente de medida para orga-nizações de serviço público. As organizações podem utilizar a CMT comoum modelo para a elaboração de um instrumento adaptado aos seus objetivose serviços específicos. Uma vez que a CMT seja adaptada e implementada poruma organização, organizações semelhantes — que assim o desejarem —poderão comparar seus resultados e medir o progresso ao longo do tempo.A CMT está incluída neste guia (Anexo 2), junto com instruções sobre seuuso. Cópias deste documento e o relatório de pesquisa que estabelece oparâmetro e o valor da CMT (Pesquisando a Satisfação do Usuário: Ferra-menta Comum de Medida) podem ser obtidos no website do Centro Cana-dense de Gestão em http://www.ccmd-ccg.gc.ca.

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2. Por que pesquisar asatisfação do usuário?

A gestão eficaz requer tomadas de decisão apropriadas. A tomada dedecisão apenas é tão precisa e confiável quanto a informação na qual estábaseada. Em um contexto de restrições fiscais, as organizações de serviçospúblicos dependem do feedback de seus usuários, para tornar as decisõesefetivas a respeito dos serviços prestados.

Ao mesmo tempo, muitas organizações de serviço público enfrentamo desafio de atingir o equilíbrio entre uma demanda crescente por serviços elimitações contínuas em seu orçamento. Outras se defrontam com a expan-são de serviços e recursos que requerem um tipo diferente de equilíbrio. Aorealizar pesquisas a respeito dos seus usuários, para avaliar suas expectativasem termos de serviços, bem como seus níveis de satisfação, as organizaçõesobtêm a informação de que precisam para auxiliar na tomada de decisões eno planejamento estratégico.

Realizar pesquisas entre usuários a respeito dos serviços poderá aju-dar a revelar as áreas que demandam recursos e a identificar áreas onde osrecursos estão sendo gastos sem necessidade. Nas demandas (as expectativasdos usuários) que estão além dos recursos alocados, as informaçõescoletadas irão auxiliar as organizações a estabelecerem metas em termos deáreas de serviço em que uma estratégia de comunicação é necessária, a fimde administrar as expectativas.

Acessar informações por meio de pesquisas de satisfação de usuáriospode ajudar a organização a chegar mais próximo de alcançar um equilíbrioentre estes dois fatores conflitantes, conforme ilustra a Figura 1.

Figura 1: O desafio atual do serviço públicoD em and a

p or se rv iços

Verb as p úb licas

O rg anização d e serv iço pú b l ico

In form açõ es p ara p la nejam en to

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93

2.1. O custo das pesquisas desatisfação de usuários

“Podemos nos dar o luxo de realizar pesquisas de satisfação entrenossos usuários?”

“Podemos nos dar o luxo de não o fazer?”As pesquisas de satisfação de usuários exigem recursos em termos

de tempo, esforço humano e verbas. Contudo, ao avaliar esses custos, exis-tem alguns fatores importantes a serem considerados.

Acredita-se geralmente que para cada dólar não gasto na prevençãode erros ou problemas típicos do serviço, as organizações podem esperargastar pelo menos 10 vezes mais — ou até 100 vezes —, consertando as coi-sas depois de o erro ocorrer (Figura 2). Isso pode ser visto facilmente nasorganizações do setor público. Por exemplo, uma vez que um problema ocor-reu e um usuário toma a iniciativa de escrever uma carta ao ministro/exe-cutivo responsável, e/ou envolve a imprensa, os custos para atender e respon-der ao problema são alarmantes.

As restrições tributárias são a realidade atual do serviço público, oque é uma razão ainda maior para buscar, pró-ativamente, evitar erros ou pro-blemas antes de eles acontecerem. Realizando pesquisas de satisfação deusuários, as organizações coletam informações que potencialmente podemajudá-las a evitar esses problemas onerosos, respondendo às necessidades eexpectativas dos usuários, realizando mudanças ou administrando as expecta-tivas por meio da comunicação.

Figura 2: O custo da qualidade

2.2. Seja pró-ativo! Seja preventivo!

As informações coletadas pelas pesquisas de satisfação de usuáriosfornecem à organização seus pontos de vista. Essas informações permitem

C usto C ustos d eprodução

C ustos d e p revenção

C ustos d e inspeção e correção

C ustos d eproblem as

de área-fim

• pessoal• m a teria l• • e tc .

overh ea d

• tre inam ento• m e lhorias de s is tem as• coletando e u sando

de u suáriosfeedba ck

• conse rtan do erros A N T E S de e les ating irem seus u suários

• consertan do erros D E P O IS de eles ating irem seus u suários

“O B om ”(1x)

“O R u im ”(10x)

“O H o rríve l”(100x)

3 0-5 0% d os custos em problem as típ icos do serv iço

fim

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94

que a organização compreenda a perspectiva dos seus usuários e que secomunique com eles de maneira eficaz.

2.3. Correios do Canadá transformam-sepor meio de avaliações de desempenho

Em 1980/81, no ano da transformação do departamento de correiosdo governo federal em corporação da Coroa, a Corporação Correios doCanadá apresentou perdas de $ 487 milhões. Em 1996/7, essa organizaçãoregistrou lucros de $ 112 milhões.

Os Correios do Canadá, um departamento federal imerso em dívidas,tornaram-se uma corporação dinâmica, centrada no usuário e rentável, pormeio da avaliação do desempenho dos serviços prestados, realizando pesqui-sas de satisfação tanto entre os usuários como entre os empregados. Seu sis-tema integrado de avaliação de serviço, supervisionado pelo Departamento deMedida e Análise Corporativa, fornece-lhe informações que são utilizadaspara direcionar desenvolvimentos em todos os setores, desde operações,coleta e entrega, estratégia de vendas, desenvolvimento de produtos até ser-viços ao usuário.

As pesquisas de satisfação de usuários e funcionários são realizadaspor meio de entrevistas telefônicas e via correio, elaboradas para se adequa-rem ao assunto pesquisado. Os comentários são mantidos na formulação ori-ginal e agregados a outros dados, e então analisados e relatados. O relatórioentão é remetido para o grupo de funcionários representantes dentro de umasemana. Esse grupo de funcionários é responsável por desenvolver planos deação e por implementar soluções.

Por exemplo, no caso de um grande usuário corporativo, o relatórioé encaminhado ao representante comercial responsável por aquele usuário. Orelatório permite ao representante lidar caso a caso, baseado em informa-ções a respeito das suas preocupações. O prazo para a implementação dofeedback pelo representante é de duas semanas.

2.4. Os benefícios de se fazerem pesquisasde satisfação de usuários

Existe um forte motivo para investir em pesquisas de satisfação deusuários. Ao pesquisar a satisfação de usuários com os serviços, a organiza-ção será capaz de:

• identificar oportunidades para melhorias nos serviços;• identificar o que os usuários desejam, em oposição ao que as pró-

prias organizações acham que eles desejam;

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95

• alocar recursos mais eficazes para atender às prioridades dos usuá-rios, ao visar as prioridades de serviços mais cotadas, reduzindo ou elimi-nando os serviços que os usuários não valorizam (quando adequado);

• desenvolver respostas pró-ativas para demandas emergentes de usu-ários, reduzindo as crises e o stress para a equipe e os usuários;

• fornecer feedback para o pessoal de linha de frente, a gerência e oslíderes políticos, a respeito da eficácia do programa;

• avaliar o cumprimento do mandato da organização e até mesmoconsubstanciar emendas ao mandato;

• fortalecer o processo de planejamento estratégico;• avaliar a eficácia de novas estratégias para o programa (por exem-

plo, avaliar o sucesso de tecnologias recentemente implementadas a partir daperspectiva do usuário);

• validar solicitações que busquem mais recursos para as áreas quenecessitam de melhorias.

British Columbia Parks

2.5. Medindo a satisfação do usuário: informaçõespesquisadas ao longo de mais de 10 anos

Atualmente a BC Parks (Parques do Estado de British Columbia) éum dos maiores fornecedores de acomodações para pernoite em BritishColumbia. Essa organização tem cerca de 11.500 locais para camping, com430 áreas para acampamento e quase 450 áreas para uso diurno (praias, insta-lações para piqueniques, marinas etc.).

Um dos motivos pelos quais a BC Parks iniciou suas pesquisas desatisfação de usuários foi o número decrescente de visitantes nas áreas deacampamento do Estado. Obviamente essa era uma grande preocupação dosexecutivos da BC Parks.

Gráfico 1: Visitação das áreas para acampamentoS em pe squ isas de satis fação P esqu isas de satisfa çã o

(em

milh

ares

)

3 000

2800

2600

2400

2000

1800

16001975 1977 1979 1981 1983 1985 1987 1989 1991 1993 1995

2200

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96

Em resposta à visitação decrescente, a BC Parks comprometeu-se amelhorar a qualidade do serviço de maneira pró-ativa. Um componenteimportante de sua iniciativa de qualidade de serviço foi realizar pesquisasrotativas entre os usuários nos parques. Essas pesquisas, especificamente,perguntaram aos visitantes quais eram suas expectativas de serviços, quãosatisfeitos eles estavam com os serviços fornecidos e que elementos dosserviços eram importantes para eles.

Os dados coletados pelas pesquisas de usuários indicaram que osvisitantes queriam chuveiros/banheiros nas áreas de acampamento. As infor-mações dessas pesquisas internas dos usuários dos parques, acrescidas àspesquisas domiciliares entre os moradores de British Columbia, permitirama BC Parks apresentar uma proposta de negócios consistente, a fim de obterverbas no final dos anos 80, visando construir novos chuveiros/banheirospara visitantes nos parques do Estado.

Esse processo indicou que, atendendo a essas expectativas, a satisfa-ção dos usuários aumentou significativamente. O resultado final foi umaumento generalizado na visitação dos parques do Estado.

As informações das pesquisas entre usuários fornecem uma base paradeterminar que melhorias nos serviços são mais necessárias ou desejadas e,portanto, para onde os recursos limitados precisam ser destinados. Isso émuito útil ao desenvolver prioridades para planos de negócios.

As pesquisas de satisfação contribuíram de uma maneira tangível paraque nossa agência fosse mais sensível e responsiva às necessidades e desejosde nossos usuários. As pesquisas entre os usuários ajudaram nossa organiza-ção a compreender melhor as suas expectativas e, quando possível, a respon-der a elas, seja por meio de melhorias nos serviços, com nossa estratégia decomunicação, quando as expectativas não podem ser atendidas, ou incorpo-rando-as ao nosso planejamento futuro de negócios.

2.6. Lições aprendidas

• Mantenha contato com seus usuários. • Aja — use as informações coletadas para beneficiar o usuário e a

organização. • Dados de usuários podem apoiar, eficazmente, solicitações de recursos. • Dados de usuários podem ser utilizados para monitorar os efeitos

de mudanças nos serviços e nas instalações.

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3. O que é importanteconsiderar?

3.1. A lacuna de serviço

A satisfação do usuário mede até que ponto as expectativas dele comrelação aos serviços são atendidas. A satisfação do usuário é alcançada quando aqualidade do serviço recebido equipara-se ou ultrapassa as suas expectativas.

O objetivo último das pesquisas de satisfação de usuários é identifi-car as “lacunas de serviço” entre o que os usuários esperam ou necessitam daorganização (expectativas) e o nível de serviço que eles realmente percebem(percepção do serviço). O diagrama abaixo ilustra esse conceito.

Figura 3: A lacuna de serviço

Uma vez que a organização descobriu as lacunas de serviços, elapoderá reduzi-las, seja:

• melhorando a prestação dos serviços para aumentar a satisfação, ou• administrando as expectativas dos usuários quando essas ultrapassa-

rem as limitações ou o mandato da organização.Um modelo mais completo da lacuna de serviço pode ser encontrado

no Anexo 1.

E xpectativas

L acuna de S e rv iço

S erv iço

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98

3.2. Elementos-chave do serviçoa serem avaliados

A fim de fornecer à organização informações que poderão ser usadaseficazmente para realizar melhorias, as pesquisas de satisfação de usuáriosprecisam fazer perguntas sobre as seguintes áreas:

1. Expectativas dos usuários.2. Percepções da experiência com os serviços.3. Nível de importância.4. Nível de satisfação.5. Prioridades para melhorias.Além disso, é importante coletar informações demográficas a res-

peito dos seus usuários.

3.2.1. Expectativas dos usuários

Utilize escalas de graduação e/ou perguntas abertas, a fim de desco-brir qual o nível de serviço que seria considerado muito satisfatório para ascaracterísticas individuais dos serviços. As expectativas dos seus usuárioslhe dirão, em termos operacionais, o que eles desejam/necessitam para esta-rem plenamente satisfeitos. Enquanto a satisfação e a importância lhe dizemque características precisam de melhoria, as expectativas dizem-lhe o que otermo melhoria significa para o usuário.

Se a sua organização não pode atender às expectativas dos usuários,você irá:

• ter dados para apoiar uma solicitação para mais recursos, ou• precisar administrar as expectativas deles por meio da comunicação

com os mesmos.

3.2.1.1. Uma palavra a respeito dos padrões de serviço

Os padrões de serviço são essencialmente diferentes das expectati-vas dos usuários. Os padrões de serviço são indicadores do melhor nível deprestação de serviço que uma organização pode oferecer de maneira realista,com os recursos disponíveis. Bons padrões de serviços são significativospara os usuários e desenvolvem-se tendo em mente as expectativas e infor-mações dos mesmos. Contudo, essas expectativas podem ou não ser transfor-madas realisticamente em padrões, considerando os recursos e o mandato emquestão. Quando os padrões de serviços são bem definidos e comunicadosaos usuários, as expectativas podem ser administradas até certo ponto.

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É possível para uma organização revelar que ela está atendendo aosseus padrões de serviço em um alto nível, e ainda assim os seus usuários nãoestarem satisfeitos. Realizando pesquisas entre usuários a respeito das suasexpectativas e níveis de satisfação, uma organização dispõe de informaçõesvaliosas para aproximar as expectativas dos seus usuários e a experiência doserviço recebido.

Como foi mencionado anteriormente, a Corporação dos Correios doCanadá utilizou medidas de desempenho para transformar a organização. Orelato abaixo fornece uma lição valiosa aprendida por essa organização comrelação aos padrões de serviços e níveis crescentes de satisfação do usuário.

3.2.1.2. Correios do Canadá — padrõesde serviço e expectativas

Como já foi dito, os Correios do Canadá têm avaliado o desempenhocorporativo em relação aos padrões de serviço desde 1987. O relato que sesegue serve para enfatizar a importância da diferença entre seus padrões deserviço e o nível de satisfação de seus usuários.

Em 1993, tornou-se claro para os Correios do Canadá que, mesmocom um sistema de avaliação de desempenho eficaz, eram necessárias pes-quisas adicionais, a fim de que continuassem competitivos no mercado emque estavam posicionados.

Apesar de os dados indicarem que a corporação estava cumprindocom seus padrões de serviço em 96 a 97 % das vezes, as pesquisas de entregarevelaram que a correspondência de cartas estava decrescendo enquanto fon-te de rendimento. Além disso, a corporação identificou que grandes usuários,com diferentes necessidades de serviços, exigiam atenção pró-ativa, caso acorporação desejasse continuar competitiva. Esses fatores combinadosresultaram em um novo enfoque no usuário dentro da corporação.

Nessa época, os Correios do Canadá decidiram implementar e inte-grar pesquisas de satisfação do usuário e dos funcionários regularmente,junto com a avaliação de desempenho, já existente, dos padrões de serviço.

No final de 1996, seu índice de satisfação de usuário corporativocomeçou a subir. Hoje, ele encontra-se 11 % acima do que era quando o pro-grama de avaliação de desempenho começou.

A lição aqui é que uma avaliação dos padrões de serviço não abasteceuma organização com informações suficientes para assegurar que as expecta-tivas dos usuários estejam sendo atendidas. Avaliar os níveis de satisfaçãocom relação a uma gama de elementos de serviço permite a uma organizaçãopriorizar as áreas de melhoria que são perceptíveis apenas aos usuários.

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100

3.2.2. Percepções do serviço recebido

É importante compreender as percepções dos usuários quanto ao atendi-mento recebido, a fim de identificar como fazer melhorias perceptíveis a eles.Como foi mencionado anteriormente, as percepções dos usuários são uma variá-vel-chave da lacuna do serviço e, portanto, é crucial considerá-las.

O exemplo a seguir ilustra como diferentes percepções do mesmoincidente podem criar problemas de serviço. Um usuário vê a equipe de aten-dimento como sendo não-prestativa, porque ele é reconduzido a outro bal-cão. A equipe de atendimento, por outro lado, percebe essa resposta comosendo prestativa, uma vez que o usuário foi redirecionado para a equipe apro-priada de atendimento. Em um nível, o problema nessa situação é uma per-cepção diferente da mesma experiência de atendimento. Em outro, o pro-blema pode residir no próprio atendimento.

Identificando as percepções dos usuários no que se refere ao atendi-mento, o problema pode ser resolvido pela agência de atendimento. A organi-zação pode escolher clarear os pontos de contato por meio da comunicação,ou pode reorganizar o processo de prestação de serviço reduzindo o númerode contatos necessários para que o usuário receba o atendimento adequado.

3.2.3. O nível de importância

Compreender quão importantes são as características do atendimentopara os seus usuários ajuda a organização a escolher áreas de melhoria quesejam significativas para eles. Dados sobre a importância, combinados comavaliações de satisfação, fornecem à organização informações altamente efi-cazes para a tomada de decisões.

3.2.4. Satisfação

Peça aos usuários que avaliem sua satisfação com o desempenho daorganização, tomando como base um conjunto de características relevantes doatendimento, e colete uma avaliação da satisfação geral para mapear o progressoa longo prazo, na medida em que você repete o processo de pesquisa.

As avaliações de satisfação ou desempenho dir-lhe-ão onde estão equão grandes são as lacunas de serviço. Contudo, você ainda precisará saber:

• que características são importantes para os usuários (para ajudá-losa priorizar as questões a serem resolvidas);

• especificamente, quais são as expectativas de seus usuários (ouseja, o que seria necessário para satisfazê-los plenamente).

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101

3.2.5. Prioridades para melhorias

Compreendendo a satisfação dos usuários com as característicasindividuais do atendimento, a organização poderá tomar importantes decisõessobre onde investir recursos, a fim de resolver problemas que são importan-tes para o usuário.

As características do atendimento com os menores índices de satis-fação (as maiores lacunas) não serão necessariamente as prioridades dosusuários para melhoria. Fazer com que eles também indiquem a importânciade cada uma das características também irá ajudar a direcionar recursos paraas melhorias que terão o maior impacto.

O exemplo do Centro de Material de Expediente (OPC) da Comissãode Compras de British Columbia ilustra como essa informação pode levar amelhorias que realmente fazem a diferença para seus usuários. A informaçãocoletada pela OPC foi analisada utilizando uma matriz de satisfação (desem-penho) por importância, semelhante àquela já citada. Qualquer organização,uma vez que tenha coletado informações sobre satisfação e importância dosseus usuários, é capaz de conduzir análises semelhantes para seus propósitosde planejamento. Em um contexto de restrições tributárias, essa é uma ferra-menta poderosa de tomada de decisão para se ter disponível.

3.2.5.1. Centro de Material de Expediente (OPC) daComissão de Compras de British Columbia

O OPC é uma unidade de distribuição que abastece ministérios, cor-porações da Coroa e outras agências mantidas pelo governo com uma gamade papéis, materiais de escritório e brindes protocolares. Utilizando uma es-cala de avaliação de cinco pontos para aferir o desempenho e a importânciade várias características do serviço, o OPC foi capaz de identificar as áreasde serviço que necessitavam de melhorias, em um estudo realizado em 1992.A matriz a seguir ilustra alguns dos resultados desse estudo.

As características do serviço que estavam baixas em satisfação ealtas em importância (quadrante superior esquerdo) foram identificadascomo sendo prioritárias para serem melhoradas. As prioridades nesse casoforam ter produtos chegando na data solicitada pelo usuário e uma rápida res-posta às suas queixas. Por outro lado, as características do serviço que foramavaliadas como sendo altamente satisfatórias e de pequena importância(quadrante inferior direito) eram áreas cujos recursos eventualmente poderi-am ser melhor gastos em outra parte. Nesse caso, pedidos e faturamentoeletrônicos on-line foram identificados. Essa informação valiosa permiteque uma organização planeje a destinação de recursos em consonância comas necessidades e expectativas dos usuários.

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Quadro 1: Matriz de satisfação/importância

Satisfação (desempenho) Importância Baixa Alta Alta • Atributos que necessitam de • Aspectos fortes e atuais da organi-

atenção — áreas onde as prioridades zação.deveriam ser concentradas.Características do serviço: Características do serviço:• produtos recebidos pontualmente; • equipe gentil e prestativa;• resposta rápida às queixas dos • entrega do serviço no mesmo dia. usuários.

Baixa • Prioridade reduzida • Aspectos positivos desnecessários — possíveis exageros.

Características do serviço: Características do serviço:• visitas pessoais feitas pelos • pedidos eletrônicos on-line; representantes de atendimento • faturamento eletrônico.

ao usuário.Adaptado de: Alan Dutka. AMA Handbook for Customer Satisfaction (Manual da AMA paraSatisfação de Usuários). Illinois: NTC Publishing Group, 1994.

3.2.6. Demografia: quais são as necessidadesde nossos grupos específicos de usuários?

Colete informações demográficas para determinar as necessidadesespecíficas e as lacunas de serviços entre os diferentes grupos de usuáriosem sua pesquisa.

As categorias demográficas usuais incluem: faixa etária, gênero,nível de renda, área de residência, ocupação, a localização da unidade, os ser-viços específicos utilizados e a familiaridade ou experiência do usuário comos serviços. Seja cuidadoso e use apenas aquelas categorias que serão rele-vantes para os seus objetivos.

3.2.6.1. BC Parks descobre a fonte de problema,compreendendo quem são seus usuários

O relato que se segue ilustra a importância de se coletarem informa-ções demográficas com os usuários e mostra como essas informaçõespodem ajudar na solução de problemas de atendimento.

Um gerente distrital da BC Parks observou freqüentes comentáriosfeitos por visitantes, indicando que as placas de sinalização do parque nãoeram suficientemente claras. Inicialmente foi difícil para os funcionáriosentenderem isso, pois eles pensavam que as placas eram claras e bemposicionadas. As informações das pesquisas também indicavam que os usuá-rios novos estavam menos satisfeitos com a sinalização do que os visitantes

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freqüentes. Quando o gerente distrital dirigiu-se até o parque e olhou a situa-ção a partir da perspectiva de um novo visitante, ele conseguiu entendermelhor como esse visitante poderia ficar confuso com relação às placas desinalização do parque. As placas foram reposicionadas e as queixas diminuí-ram consideravelmente. Compreender os usuários e as suas necessidadescontribuiu para melhorar o serviço.

3.2.6.2. Características de atendimento:construindo blocos do seu serviço

Existem cinco características gerais que as organizações deveriamconsiderar ao planejar pesquisas de satisfação de usuários. São elas: capaci-dade de resposta, confiabilidade, acesso e instalações, comunicações e cus-tos. Cada característica do serviço tem numerosos elementos, conformelistados a seguir.

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Quadro 2: Características de atendimento

Capacidade de resposta • entrega pontual do serviço;• número de contatos para ser atendido;• tempo de espera;• reação eficaz para preocupações manifestadas.

A equipe de serviço • empática;• gentil;• prestativa;• hábil e competente;• dispõe de informações atualizadas;• respeitosa;• flexível;• justa;• capaz de proteger minha privacidade/confidencialidade.

Confiabilidade • prestou o serviço necessário;• prestou o serviço prometido;• cumpriu as políticas e padrões;• mínima taxa de erro.

Acesso e instalações • localização conveniente;• acesso físico ao edifício;• conforto dos escritórios e locais de espera;• estacionamento adequado;• horário de expediente;• aparência, nitidez e localização das placas;• facilidade para agendar compromissos;• acesso a telefone;• uso de tecnologia;• variedade de modos de acesso.

Comunicação • questões foram respondidas;• disponibilidade de informações;• linguagem simples;• consistência das informações/recomendações;• serviços prestados nos idiomas oficiais;• facilidade de compreender informações e documentos;• facilidade de compreender procedimentos.

Custo • facilidade de faturamento/pagamento;

• custo razoável.

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4. Como começar

Apesar de exigirem tempo e recursos, as pesquisas precisam tornar-seum processo contínuo, ao invés de um esforço ocasional para assegurar que ogoverno seja plenamente responsivo às necessidades cambiantes do público.

A ilustração a seguir identifica os passos envolvidos no desenvolvi-mento e na implementação de um processo de pesquisa de satisfação de usu-ários e descreve as várias estratégias e ferramentas de pesquisa que podemser utilizadas.

Quadro 3: Processo de pesquisa de satisfação de usuários

Passo 1Identifique serviços e usuários:

• liste todos os seus serviços e os usuários para cada um deles.Passo 2Clarifique seus objetivos — de que informações você necessita?

• envolva seus usuários;• use informações sobre o serviço já existente;• planeje uma abordagem ampla.

Passo 3Desenvolva uma estratégia de medida:

• métodos de entrevista;• métodos de questionários;• métodos de feedback contínuo.

Passo 4Interprete, analise e relate:

• faça uma análise do conteúdo dos dados qualitativos;• decodifique e analise os dados quantitativos.

Passo 5Desenvolva um plano de melhoria:

• use o feedback dos usuários para estabelecer novos padrões de serviço;• atribua responsabilidades pela implementação.

Passo 6Avalie e repita (retornar ao passo 1)

• avalie as melhorias repetindo o processo;

• modifique seus instrumentos, mas mantenha a comparabilidade a longo prazo.

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4.1. Preparando a implementação

4.1.1. Passo um: identifique seus serviços e usuários

Quem deveria ser envolvido no planejamento?

Como foi mencionado anteriormente, as pesquisas exigem tempo,dinheiro e esforço humano. Os montantes de cada uma dependerão dos seusobjetivos e da estratégia que você escolher. Existem muitas abordagens paraa implementação de pesquisas de satisfação de usuários. É importante incluirfuncionários de todos os níveis da sua organização no estágio de planeja-mento, se possível. Envolver funcionários de todos os níveis irá assegurarque a elaboração da sua pesquisa de satisfação de usuário será relevante eapropriada. O planejamento é o estágio mais crucial desse processo.

Após definir sua equipe de satisfação do usuário, a primeira tarefanesse processo é identificar todos os seus serviços e os usuários de cada umdeles. Isso é um exercício mais complexo e importante do que a maioria daspessoas imagina. Uma análise detalhada nesse ponto irá permitir identificaro(s) grupo(s) relevante(s) de usuário(s) pesquisado(s), na medida em quevocê desenvolve seus objetivos, e irá assegurar que um feedback valioso nãoseja ignorado.

Serviços múltiplos

Cada ministério ou agência governamental oferece uma ampla varie-dade de serviços; isso normalmente é verdade para departamentos individuaise agências independentes. Sua organização precisa identificar seus serviços-chave e os serviços ou resultados específicos dentro de cada um deles, demaneira que todos os usuários da organização possam ser identificados.

Usuários: internos e externos

Os usuários são os receptores diretos dos serviços governamentais(Figura 4). Eles podem ser ainda divididos em dois subgrupos: usuários internose externos. Usuários internos são os funcionários do setor público que recebemserviços diretamente dos colegas prestadores de serviços governamentais, a fimde, por sua vez, prestarem serviços aos seus usuários. Usuários externos são osmembros do público que são receptores diretos dos serviços públicos. O usoaqui do termo cidadão refere-se aos contribuintes que nem sempre se benefi-ciam diretamente de um serviço, mas que podem obter um benefício indireto,que contribuem para ele e, portanto, têm interesse nele.

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Este exemplo pode servir para ilustrar essas definições. Um cidadãopode não receber seguro-desemprego e ainda assim ter interesse em sabercomo o sistema funciona; o verdadeiro receptor de um pagamento dessanatureza seria um usuário externo. Um escritório regional de pagamento deseguro-desemprego, que depende de uma agência central para recebê-lo,seria um usuário interno.

Figura 4: Serviço ao usuário/cidadão

Uma vez que você tenha identificado os serviços específicos e deter-minado se os usuários são internos, externos ou ambos, você pode começar apensar sobre como realizar pesquisas junto a eles quanto a seus serviços.

Administração do AeroportoInternacional de Vancouver

A Administração do Aeroporto Internacional de Vancouver (YVR)fornece um excelente exemplo de como métodos consistentes de pesquisa eanálise ajudam a estabelecer parâmetros ao longo do tempo, facilitandotomadas de decisão e planejamento eficazes. Além disso, essa empresa éconhecida por separar seus grupos de usuários com base no uso dos seus di-ferentes serviços. A YVR também realiza pesquisas trimestralmente, obtendoinformações importantes para as características de serviços que são específi-cas de determinadas épocas do ano (por exemplo, Natal versus verão).

Desde 1993, a administração do aeroporto vem monitorando osníveis de satisfação dos passageiros trimestralmente, como uma ferramentapara estabelecer parâmetros, a fim de formular futuras iniciativas e avaliaro impacto de melhorias em equipamentos e instalações da atenção dada aoatendimento ao usuário. A metodologia consistente e a análise têm sido

U suário C idadão

In te rno E x terno

Prestação d ire ta do se rv iço /bene fíc io

(recep tor)

B ene fíc io ind ireto gera l ( in teressado)

Usuário Cidadão

Externo

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essenciais para permitir a essa organização estabelecer parâmetros para osníveis de satisfação do usuário ao longo do tempo.

Para todas as medidas de satisfação do usuário, solicita-se aos passagei-ros que dêem notas para avaliar seu nível geral de satisfação, considerando inú-meras variáveis-chave que contribuem para a sua experiência com o aeroporto.

As notas são avaliadas em uma escala Likert de 5 pontos, com res-postas que vão de muito insatisfeito até muito satisfeito, com um pontoneutro central.

Em 1997, 2.738 entrevistas completas foram realizadas junto a pas-sageiros que utilizavam o aeroporto; isso corresponde a 680 entrevistas portrimestre. Os entrevistados foram divididos em vários grupos de usuários:passageiros partindo, em conexão e chegando, todos eles com 18 anos oumais. Todos os três grupos de usuários foram avaliados por meio de entrevis-tas conduzidas pessoalmente e/ou questionários de satisfação auto-aplicados.

Os objetivos específicos da pesquisa para o programa demonitoramento da satisfação do usuário da YVR continuam sendo:

• medir, monitorar e estabelecer parâmetros de avaliações da satisfa-ção do usuário;

• manter um perfil atualizado dos passageiros baseado em caracte-rísticas demográficas e do uso das instalações;

• identificar e monitorar as respostas dos usuários para as melhoriasespecíficas de produtos, serviços e instalações.

4.2. Passo dois: clarifique seus objetivos

Clarificar seus objetivos pode ser a parte mais importante do seuprojeto de pesquisa. A maioria dos problemas tipicamente encontrados emestágios subseqüentes do processo de pesquisa podem ser evitados,despendendo-se esforços suficientes nessa etapa.

Desenvolvendo seus objetivos de pesquisa

Os objetivos são a referência para o projeto de pesquisa. Para fins declareza, é crucial que você veja seus objetivos como as questões gerais a quevocê quer que sua pesquisa responda. Abaixo listamos exemplos de objetivosde pesquisa mencionados na forma de perguntas — qualquer um ou todospodem ser os objetivos de uma única pesquisa.

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Perguntas gerais de pesquisa:

• Quão satisfeitos estão nossos usuários com os serviços queprestamos? • Quais, dentre nossos serviços, são os mais importantes paranossos usuários? • Que melhorias no serviço são prioritárias para nossos usuários? • Que padrões de serviço nossos usuários esperam de nós?Para formular as suas perguntas de pesquisa, nós recomendamosque você:• envolva seus usuários;• utilize informações de serviço já existentes;• planeje uma abordagem abrangente.

4.3. Passo três: desenvolva suaestratégia de medida

Uma vez que os objetivos da pesquisa estejam especificados, seugrupo pode escolher uma estratégia de pesquisa apropriada e desenvolvero(s) instrumento(s) de medida (ou seja, roteiro de entrevista, questionárioetc.) que você irá utilizar para coletar informações. Consultores são muitasvezes contratados para auxiliar nesse estágio do processo, a fim de assegurarque a informação coletada dos seus entrevistados seja confiável e válida.Recomenda-se que as organizações pré-testem suas pesquisas, para garantirque as perguntas sejam relevantes e importantes para os usuários, e não ape-nas para os gerentes. Envolver os usuários na elaboração de um instrumentode avaliação muitas vezes é eficaz.

A avaliação da satisfação do usuário não deve ser confundida comoutros estudos, tais como auditorias ou avaliações de programas. Mediçõesde satisfação do usuário não substituem outras medições de desempenho quetambém são utilizadas como ferramentas para a tomada de decisões.

As estratégias de medida

Abaixo estão algumas das estratégias de pesquisa para obter informa-ções de seus usuários. A estratégia que você escolher irá depender dos obje-tivos e dos recursos de que você disponibiliza.

Métodos de entrevista:• entrevistas profundas;• focus group;• entrevistas de saída.

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Métodos de questionário:• pesquisas via correio;• pesquisas via telefone;• avaliação de reação;• pesquisas via e-mail.

Mecanismos de input contínuo:• telefones de chamada gratuita (0800);• caixas de sugestões;• cartões-resposta.

A Ferramenta Comum de Medida (CMT)

A CMT encontra-se no final deste guia. A CMT oferece à sua organi-zação uma ferramenta completa de pesquisa, incluindo seções em que sepode inserir informações especificamente relevantes para a sua organização.Como já foi mencionado, ess a pesquisa inclui perguntas a respeito da satis-fação dos seus usuários, suas percepções da experiência, suas expectativas,bem como quão importantes os elementos do serviço são para eles e quais assuas prioridades com relação às melhorias. A maioria das questões são quan-titativas, utilizando uma escala de cinco alternativas com uma opção para “nãose aplica”. Além disso, foram incluídas perguntas que são qualitativas em suanatureza, e pretende-se que lhe forneçam informações mais detalhadas.

No final da CMT, estão incluídas perguntas gerais sobre a prestação deserviços e as necessidades dos seus usuários. Finalmente, para que a CMT possaser utilizada para pesquisar tanto usuários internos como externos, a seçãodemográfica é apresentada duas vezes — uma para cada grupo de usuário.

Utilizando a CMT

Mais que ser um conjunto rígido de itens que precisa ser usado exata-mente da mesma maneira a cada vez, a CMT oferece um conjunto de itens eescalas de respostas para que se forme um banco de itens, a partir do qual asorganizações possam fazer escolhas. Antecipa-se que as organizações podem:

• usar alguns dos itens comuns junto com outros itens específicos;• usar diferentes subconjuntos de itens da CMT em diferentes momentos;• usar a CMT inteira.Há questões metodológicas que são cruciais para que as organiza-

ções se adaptem à CMT. Três fatores precisam ser observados são: a) aredação de itens e escalas de resposta; b) a ordenação comum dos itens;

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c) as definições dos termos utilizados. Em todas essas três áreas, aconsistência é uma preocupação fundamental.

O primeiro fator, a redação dos itens, assegura que cada entrevistadoreceba exatamente o mesmo estímulo. Sem isso, a comparabilidade entre osresultados em diferentes organizações não é possível. Tendo isto em mente,os itens na CMT são redigidos de uma forma genérica, de maneira que elessejam apropriados para os grupos mais amplos possíveis de entrevistados.Sugere-se que a redação de itens somente seja alterada para especificar oserviço/produto fornecido pela organização, a fim de assegurar a relevância ea compreensão do item. As organizações podem querer incluir uma referên-cia exata ao seu serviço, substituindo as palavras serviço/produto por renova-ção de carteira de motorista, passaporte, solicitação de seguro-desempregoetc. Isso permite às organizações adaptar e utilizar a CMT para avaliar áreasespecíficas do serviço/produto, o que é mais focalizado que umquestionamento mais amplo em nível organizacional.

A ordenação comum dos itens também é importante. Existem evidênciasindicando que respostas a certos tipos de questões variam dependendo dos itensque as precedem ou seguem. Com essa finalidade, recomenda-se que, quando asorganizações usarem itens da CMT com outros que são adaptados para atender anecessidades específicas, essas perguntas adicionais formem uma seção separadada pesquisa, incluída imediatamente após o conjunto dos itens da CMT e antesdos itens demográficos (ver nota na página 72 do Anexo 2).

Finalmente, as definições e explicações são necessárias para forne-cer aos entrevistados esclarecimentos consistentes, a fim de assegurar a vali-dade dos dados coletados. Para facilitar esta consistência, as definições dostermos-chave estão incluídas na CMT.

A seção sobre demografia requer adaptação cuidadosa por parte daorganização que usa a CMT, especificamente quando aplicada a usuáriosexternos. Ela oferece tantos itens demográficos quanto uma organizaçãopode necessitar. Contudo, as organizações deveriam considerar com cuidadoas metas da sua pesquisa antes de decidir que itens demográficos são adequa-dos. O motivo por trás dessa observação de cautela prende-se ao fato de cer-tos entrevistados considerarem algumas perguntas invasivas e, portanto,escolherem pular todos os itens demográficos. Por exemplo, as organizaçõespodem se questionar se saber se os entrevistados são aborígenes é realmenteimportante ou não. Incluir um item que não é claramente relevante pode fazermais mal que bem, diminuindo o valor dos dados coletados. As organizaçõesdevem incluir apenas os itens a respeito dos quais elas realmente precisamser informadas.

A consideração primordial no uso da CMT é que você retira delaitens que vão de encontro às suas necessidades, mas ainda assim mantém-se

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próximo o bastante dela, de forma que seus resultados podem ser compará-veis com os resultados de outras organizações, quando for desejado. Uma vezque um item é selecionado para uso, ele deveria ser utilizado exatamenteconforme apresentado na CMT (ou seja, a redação deveria permanecerinalterada, as escalas de medida e o leque de perguntas relacionados a cadadimensão do serviço — percepção da experiência, expectativas, nível desatisfação, nível de importância e prioridades para melhoria — deveriam serincluídos). Apesar de preso a esses elementos de avaliação, as organizaçõesainda assim têm a liberdade de selecionar que itens usar dentre as cincodimensões amplas de serviços (capacidade de resposta, confiabilidade, acessoe instalações, comunicações e custos).

O exemplo seguinte pode ajudar a esclarecer esse processo. Umaagência estadual pode excluir itens da CMT relativos a custo, uma vez que oserviço que ela deseja avaliar não tem um ônus direto para os usuários. Alémdisso, se seu serviço é prestado indiretamente por meio de diferentes tiposde meios de comunicação (telefone, correio, e-mail, fax ou Internet), elatambém irá ignorar os itens relacionados ao acesso aos locais do serviço (es-tacionamento, localização etc.). Se introduziu um novo serviço de correio devoz, eles poderão querer acrescentar perguntas adicionais a respeito da suafuncionalidade (facilidade de uso, adequação do número de níveis de respostaetc.). É crítico que todos os itens selecionados da CMT sejam utilizados pre-cisamente como apresentados neste documento e que as organizações obte-nham todas as informações de que precisam.

Observe que a CMT pode ser utilizada para vários tipos de pesquisa.Essa ferramenta, uma vez adaptada por você, poderá ser utilizada para pesqui-sas por correio, como avaliação de reação, ou pesquisas por telefone. O con-teúdo dela também poderá ser usado para desenvolver vários tipos de entre-vista, tais como entrevistas de avaliação de reação ou focus group. A fim defazer com que ela funcione em um formato de entrevista, você deverá efetuarmais adaptações.

Espera-se que posteriormente haja um repositório dos dados de pes-quisas da CMT, possivelmente no CCMD. Isso irá facilitar comparações ebenchmarking interorganizacionais, caso seja de interesse das organizações.Para esse fim, as organizações são encorajadas a utilizar tantos itens da CMTquanto forem apropriados às suas necessidades.

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Utilizando informações de avaliaçãopara planejamento

4.4. Passo quatro: interprete, analise e relate

Se seu planejamento foi cuidadoso até este estágio, suas entrevistase questionários trarão uma coleção de dados primários de qualidade. A ma-neira pela qual você decodifica, interpreta e analisa seus dados irá dependerdo fato de as informações serem qualitativas ou quantitativas.

Maximizando o valor da sua análise e relatório

Dependendo das perguntas que estão direcionando sua pesquisa, vocêpode querer fazer as seguintes comparações ao analisar e relatar:

• fornecer comparações ao longo do tempo e entre diferentes escri-tórios e áreas geográficas;

• comparar dados como satisfação, importância etc., entre gruposdemográficos;

• priorizar as melhorias de serviços que são indicadas;• determinar se seus padrões de serviço atendem às expectativas dos

usuários;• avaliar se as expectativas dos usuários são viáveis, considerando

seu mandato;• determinar se as expectativas de usuários variam entre os grupos;• construir uma linha de base para cada atributo com a finalidade de

comparações futuras.

Relatando os resultados

Fazer os resultados da pesquisa circularem entre os gerentes e aequipe irá aumentar a consciência do processo de melhoria e ajudar a conse-guir apoio. Isso é particularmente importante para a equipe envolvida com aimplementação das melhorias. Além disso, é muito importante deixar seususuários conhecerem os resultados da pesquisa. Os usuários desejam saberse as respostas deles serão utilizadas — relatar a eles indica que sua organi-zação prosseguiu até o estágio seguinte com essa informação.

Utilize métodos visuais descomplicados, tais como tabelas e gráfi-cos, para expressar os resultados de uma maneira que será lida e utilizada.Um método simples de relatório, tal como o Cartão de Relatório de Usuário(Quadro 4), lista as características de serviço avaliadas no lado esquerdo damatriz, na ordem das prioridades dos usuários, e então esboça as expectativas

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deles e os níveis de satisfação para cada uma delas. Esse é apenas um exem-plo hipotético do que incluir e de como facilitar a leitura e a compreensãodos dados coletados.

Ao relatar seus resultados, algumas organizações agrupam todas as avali-ações de satisfação que estão acima do nível médio ou aceitável e consideram osusuários como estando satisfeitos nessas áreas. Um exemplo seria relatar umataxa de 90 % de satisfação, em que 60 % disseram estar satisfeitos e 30 % disse-ram estar muito satisfeitos com o serviço em geral. Melhorias contínuas comvistas a obter a avaliação muito satisfeito é o objetivo de realizar pesquisas donível de satisfação de usuários com os serviços, e ignorar as lacunas menores éuma armadilha perigosa que pode levar à complacência. A diferença entre ver osserviços como sendo prestados em um nível aceitável e fornecer o mesmo servi-ço que leve os usuários a se sentirem muito satisfeitos significa uma grandediferença para um paciente hospitalizado, para um usuário da assistência socialou para qualquer usuário.

Quadro 4: O Departamento de Licenciamento de VeículosCartão de Relatório de Usuários de 1997

Características do serviço Avaliação da satisfação Expectativas do usuário(em ordem de prioridade 1= muito insatisfeitodos usuários) 5= muito satisfeitoTempo de espera 2 90% esperam um máximo

de 5 minutos de tempo de espera.Horário de expediente 1 Uma noite por semana até 21h e

aberto aos sábados.Tempo para processamento 4 Reduzir o tempo médio de

processamento para 10 dias úteis.Gentileza da equipe 5 Ser cumprimentado gentilmente a

cada vez.Local de espera 2 Usar um sistema numérico que

permita sentar ou retornar dentro

de x minutos.

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4.5. Passo cinco: desenvolva um plano de melhorias

Para aumentar o comprometimento e captar informações valiosas,envolva ativamente a equipe no planejamento das melhorias indicadas pelapesquisa. Considere os seguintes aspectos:

• Planeje as melhorias na ordem das prioridades determinadas pelosusuários, considerando também a magnitude ou a simplicidade das mudançasnecessárias.

• Use as expectativas dos usuários para identificar os níveis de ser-viço almejados que sejam desafiadores, porém realistas. Quanto mais clara-mente você conseguir que os entrevistados indiquem onde e como as mudan-ças deverão ocorrer, mais simples esse processo pode ser.

• Atribua responsabilidades e um horizonte temporal para atualiza-ções e correções. Podem-se formar grupos de trabalho de funcionários paraprojetar e implementar melhorias em cada área.

• Planeje lidar com quaisquer expectativas não-realistas dos usuários,melhorando a comunicação externa que expresse suas limitações ou esclareçao mandato da sua organização.

• Revise seu atual sistema de prestação de serviços para identificaros obstáculos a um melhor atendimento.

Melhorar sua prestação de serviços exige identificar e remover osobstáculos dos seus atuais sistemas de atendimento. Tenha em mente queseus sistemas de gestão, não seu pessoal, são a origem das suas deficiênciasde atendimento. Por exemplo, pode haver demasiada ênfase em políticas eprocedimentos e muito pouca autonomia ou incentivo dado à equipe para elaresponder ativamente aos usuários. Envolver a equipe e seus sindicatos namelhoria dos seus sistemas de gestão e processos de trabalho será mais pro-dutivo que ficar apontando falhas alheias.

Dê poder e motive a equipe

Para obter o comprometimento e a participação da equipe, dê a seusfuncionários a liberdade e as habilidades necessárias para responder àsnecessidades dos usuários com novas maneiras. Eles devem sentir-se investi-dos de poder, e não forçados, para identificar e superar atitudes burocráticastradicionais do serviço; empregando uma filosofia voltada ao usuário. Treina-mento nessa área é um fator-chave a se considerar. Enquanto a sensação depoder pode prover seu próprio incentivo, o reconhecimento formal e infor-mal dos esforços para o serviço dos funcionários irá ajudar a tornar a respos-ta ativa ao usuário uma parte da cultura da sua organização.

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Comunique os resultados aos seus usuários

Informe seus usuários, especialmente aqueles que participaram da pes-quisa, dos resultados e das melhorias propostas. Isso lhes permite saber quesua contribuição tem valor e que a organização é sensível às necessidades de-les. Contudo, seja cauteloso em não prometer demais: é melhor fazer mais queo prometido que prometer mais do que você pode realizar.

O relato a seguir do sistema de qualidade da cidade de Ajax é um ex-celente exemplo de uma organização pública plenamente comprometida emalcançar padrões de qualidade por meio de políticas e procedimentos queassegurem que todo o feedback dos usuários é ouvido, respondido e utilizadono planejamento.

Cidade de Ajax: feedback de usuários é tido como um presentede planejamento estratégico

Crença no serviço da cidade de Ajax

“Nós acreditamos que o feedback dos usuários é um presente valio-so a ser recebido com gratidão e apreciação. Por causa dessa crença,nós nos esforçaremos para obter tantos feedbacks de usuários quantoforem possíveis, sabendo que essa é a melhor maneira de atender ede superar as expectativas de nossos usuários, permitindo assim queaperfeiçoemos continuamente nossos serviços.”

A cidade de Ajax iniciou seu enfoque na prestação de serviços em1994 e documentou esse comprometimento formalmente na seguinte Decla-ração de Qualidade:

“Nós estamos comprometidos em atender ou superar as expec-tativas de nossos usuários e os Padrões de Qualidade ISO 9000. Uti-lizando uma abordagem de equipe que enfatiza uma melhor qualidadeno serviço, buscaremos continuamente melhorar todos os serviçosque prestamos”.

Essa organização pública orgulhosamente ressalta que seu Sistema deQualidade foi feito em Ajax, por funcionários de Ajax e está baseado nosseguintes princípios:

• atendimento ao usuário;• trabalho em equipe;• constante aperfeiçoamento.

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Durante o desenvolvimento inicial desse Sistema de Qualidade, quase500 procedimentos-padrão de operação e instruções de trabalho foram docu-mentados e implementados com relação a essa nova iniciativa de serviço.

O retorno dos usuários é coletado de maneira contínua nos locais deatendimento, por escrito e verbalmente, por meio dos formulários de feedbackdos usuários.

As políticas e os procedimentos-padrão documentados com relação àsrespostas dos usuários estipulam que os funcionários “irão assegurar que todas aspreocupações, comentários, sugestões e elogios serão ouvidos e equacionados demaneira que seja consistente com sua política de qualidade.”

A cidade de Ajax, como parte do seu Sistema de Qualidade, elaborouum programa para assegurar que todo comentário do usuário seja analisado,relatado e seja respondido de uma maneira ou de outra.

Os gerentes/supervisores do Departamento Geral são responsáveis porrevisar trimestralmente todos os formulários de feedback e de sugestões dosusuários, a fim de determinar tendências e identificar áreas problemáticas.Eles são responsáveis por fornecer ao diretor do departamento um resumo tri-mestral das respostas dos usuários. Todos os funcionários de tempo integral eparcial recebem treinamento sobre como lidar com o feedback dos usuários,como o Sistema de Qualidade funciona e qual seu papel nesse contexto.

Os Padrões de Gestão de Qualidade ISO 9000 são um padrão globalpara qualidade, conforme definido pela Organização Internacional para a Pa-dronização, na Suíça.

4.6. Passo seis: avalie as melhorias e repita o ciclo

Um ciclo contínuo de melhorias

O último passo do processo de pesquisas de usuários é avaliar o efei-to das suas melhorias nos serviços. Isso é feito repetindo-se o ciclo da pes-quisa, uma vez que as mudanças necessárias tenham sido implementadas, eprocedendo assim regularmente a partir desse momento. Comparando as me-didas originais ou de base com as informações mais recentes, você poderáacompanhar o sucesso dos seus esforços e continuamente ajustá-los às suasnecessidades, à medida que essas mudam.

A BC Parks é um exemplo de uma organização que tem usado repeti-das pesquisas de usuários para melhorar seu desempenho. Os padrões de ser-viço da BC Parks são baseados nas avaliações de satisfação dos visitantes.Quando ocorrem melhorias nos serviços e são dadas notas mais altas nas ava-liações. Esse sistema assegura que haja um esforço constante para manter oumelhorar os serviços.

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Medidas contínuas de satisfação

Os resultados da satisfação geral dos usuários com o desempenhopodem ser colocados em um gráfico para uma série de pesquisas subseqüen-tes, a fim de avaliar o sucesso do processo de pesquisa de usuários ao longodo tempo. Como mostra o gráfico a seguir, a lacuna entre a avaliação dodesempenho e a plena satisfação tornou-se menor, na medida em que as orga-nizações identificaram e resolveram as lacunas de serviço emergentes.

Gráfico 2: Satisfação geral ao longo do tempo

Aprimorando seu processo de pesquisa ao longo do tempo

As necessidades e expectativas de seus usuários mudarão ao longo dotempo, assim como o meio ambiente do seu programa. Você pode adaptarseus instrumentos de medição a essas mudanças acrescentando ou descar-tando características de serviços na medida em que as lacunas são resolvidase novos aspectos surgem. Seus mecanismos de feedback contínuo e suasinvestigações preliminares irão alertá-lo com relação a essas mudanças.

É importante manter aspectos-chave do seu instrumento de pesquisa(tais como a escala de avaliação e o item da satisfação geral) consistentes aolongo do tempo. Isso lhe permite acompanhar seu progresso a longo prazo.

S atisfação M u ito S atisfe ito

L acuna 1 L acuna 2 L acuna 3

Pesqu isa 1 P esqu isa 2 P esqu isa 3

5

4

3

2

1

0

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119

5. Conclusão

Espera-se que esta publicação encoraje mais organizações de serviçopúblico a se engajarem em pesquisas de satisfação do usuário. A Rede Nacio-nal de Serviços Centrados no Usuário e seus membros comprometeram-se atrabalhar para a melhoria dos serviços públicos por todo o país. O estabeleci-mento dessa Rede e as suas atividades oferecem a todas a organizaçõespúblicas do Canadá acesso a informações sobre as melhores práticas, ferra-mentas eficazes e um intercâmbio aberto entre organizações de serviço pú-blico com desafios semelhantes.

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Referências bibliográficas

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Anexo 1

Parâmetros para modernizar a prestação de serviços do setor público

Copyright CCMD, 1998

• A SD /A P D• Pa rce rias• • R e-eng enh a ria• Q ua lid ad e d o serv iço• T Q M• • A dm in is tra r ex pec ta tivas• P rá ticas in o vad o ras• Tecn o lo g ia• R ecu pe ração de cu sto s

C a ix a d e fer ram en tas d o g o verno pa ra m e lh o r ia d eserv iço s g ov ern a m en ta is

S in g le W in do w

B e nc hm a rk in g

E x p ec ta t iv a s d os c id a d ã os co m re la çã o à p restaçã o d e se rv iços d o go v ern o

• E n g a jam e nto d os c id ad ão s• Av al ia ção p e lo s c idad ãos d o s serv iços g ov e rn am en tais• E n v o lv im en to do s c ida dãos na e lab o ração d os se rv iço s• P r io r id ad es d os c id ad ão s p ara m e lh o rias

R edu z irlacun a

M o n ito ra m e n to ed esem p enh o

e resp o n sa b il id a d e

Federal

P restaçã o d e se rv iços g o verna m en tais

• A tend im en to e in o v ação da linh a d e fren te in teg rad a• C u ltu ra d o se rv iço• E s tra tég ia e s is tem as d o se rv iço• L id erança

Estadua l

L a cu n a d e p resta çã o d e serv iços

M un ic ipa l

O utros Se to res

R edu z irlacun a

Reduzirlacuna

e

l

l

l

s

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122

Anexo 2

Ferramenta Comum de Medida (CMT)

Instruções para as organizações

À primeira vista, a CMT parece ser uma pesquisa de satisfação deusuários pronta para uso, mas não é. A CMT, como se apresenta, é mais longado que a maioria das organizações gostaria que uma pesquisa de satisfação deusuários fosse. A adaptação por parte do usuário é essencial para sua eficáciana implementação. A CMT fornece uma coleção ampla de itens de pesquisaque podem ser escolhidos pelas organizações de serviço público ao elaboraruma pesquisa de satisfação de usuários.

Antes de prosseguir com a adaptação, existem algumas recomendaçõesmetodológicas que as organizações deveriam considerar. A CMT foi elaboradapara facilitar a consistência e a análise comparativa entre organizações públicassemelhantes, que escolherem utilizá-la. Além disso, ela irá oferecer às organiza-ções um sistema de pesquisa de fácil utilização, a fim de estabelecer parâmetros(benchmarks) dentro de sua própria organização. Isso é alcançado pelo uso repe-tido da ferramenta e com a comparação dos resultados.

Pelos motivos acima mencionados, é importante manter a escala demedida e a redação dos itens que são selecionados pela organização. Alémdisso, a ordem dos itens também deve ser mantida. A CMT tem uma seçãopré-estabelecida, onde as organizações podem acrescentar as perguntas quesão específicas à sua realidade — o posicionamento dessas questões tambémdeveria ser mantido na seção designada para aumentar os efeitos que essasperguntas têm sobre os outros itens incluídos na pesquisa.

O processo de adaptação irá envolver os seguintes passos:1. Defina as metas da sua pesquisa de satisfação de usuários.2. Revise a CMT na íntegra.3. Decida que itens são relevantes à sua organização e as metas do

seu estudo.4. Identifique quaisquer perguntas que você deseje fazer e que podem

não estar incluídas na CMT.

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5. Elabore essas perguntas e acrescente-as à seção designada paraperguntas adicionais.

6. Adapte a redação da Introdução para adequá-la à sua organização.7. Adapte a redação (serviço/produto) de toda a CMT, a fim de torná-

la relevante para sua organização e para o serviço específico ao qual a pes-quisa se aplica.

Recomenda-se que as organizações conduzam pré-testes da ferramentaadaptada que irão indicar onde quaisquer ajustes podem ser necessários antes deimplementar a pesquisa, evitando erros aos quais os usuários seriam expostos.

© Centro Canadense de Gestão

Pesquisa de satisfação de usuários

Pretende-se que esta pesquisa de satisfação de usuários forneça à (aorganização completa com seu nome) informações que irão auxiliá-la a me-lhor atender suas necessidades. Esta pesquisa fornece a você, usuário, umaoportunidade de nos dizer como estamos nos saindo e de como podemos me-lhorar. Estamos interessados em saber o que você tem a dizer a respeito donosso serviço/produto e respeitamos o tempo que você está usando paracompletar esta pesquisa. Muito obrigado!

Nós estamos pesquisando usuários que tenham usado nosso serviçonos(as) últimos(as) (a organização preenche com o período de tempo). Osparticipantes são selecionados aleatoriamente (ou a organização preenchecom o critério usado). As informações coletadas por meio desta pesquisaserão utilizadas por (organização), para melhor compreender as suas necessi-dades e ajudar-nos a realizar melhorias na forma como prestamos nosso ser-viço e fornecemos nosso produto. Suas respostas permanecerão anônimas,uma vez que estaremos consolidando todas as informações que recebemos.

Esta pesquisa faz perguntas sobre vários aspectos da sua experiênciacom nossos serviços/produtos. Isto inclui como você foi atendido, quãoconfiável nosso serviço/produto foi, a facilidade de acesso e outros.

Quando você tiver completado esta pesquisa, por favor (método dedevolução especificado pela organização, ou seja, coloque-o na caixa dispo-nível, remeta-o por correio aos nossos escritórios usando o envelope já en-dereçado e preencha com a data).

Se você tiver quaisquer perguntas a respeito desta pesquisa e o usodestas informações, contate (preencha o nome da pessoa de contato) no (pre-encha com o telefone de contato).

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Seção 1 – Prestação de serviço/fornecimento de produto

Esta seção pergunta a respeito da maneira como este serviço/produtofoi prestado/fornecido a você pela equipe de atendimento.Para as perguntas seguintes (nos 1-10), favor circular a resposta que melhordescreve sua experiência.1. Você já recebeu o serviço/produto, ou o processo de prestação do serviçoestá em andamento neste momento?a) serviço/produto recebido ® vá para a pergunta no 2b) prestação do serviço/fornecimento do produto está em processo

® vá para pergunta no 6Observação para as organizações: os intervalos para as perguntas 2 e 3 podemreferir-se a minutos, horas, dias ou semanas, dependendo da natureza da orga-nização que está utilizando o instrumento.2. Quanto tempo levou para você receber o serviço/produto — desde omomento em que você contatou a organização que lhe prestou o serviço/for-neceu o produto até você receber o serviço/produto?

0-4 5-9 10-14 15-19 20-24 25-29 30+3. Qual o tempo aceitável para se receber este produto/serviço?

0-4 5-9 10-14 15-19 20-24 25-29 30+4. Quantos contatos foram necessários para você receber seu serviço/pro-duto? Um contato é cada telefonema, e-mail, carta, fax ou visita ao escritório.1 2 3 4 5 6 7 8+5. Qual o número de contatos aceitável para receber este serviço/produto?1 2 3 4 5 6 7 8+6. Você foi a um posto de atendimento para acessar o serviço/produto?Sim ® vá para a pergunta no 7Não ® vá para a pergunta no 9, na próxima página7. Quanto tempo você teve que esperar no local de atendimento antes de tercontato com a equipe que fornece o serviço/produto? As respostas são emminutos.

1-5 6-10 11-15 16-20 21-30 31-45 45-59 60 +

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8. O que é um tempo de espera razoável no local de atendimento antes de tercontato com a equipe que fornece o serviço/produto? As respostas são emminutos.

1-5 6-10 11-15 16-20 21-30 31-45 45-59 60 +9. Com quantas pessoas diferentes você teve que lidar para conseguir aquilode que você necessitava?1 2 3 4 5 6 7 8 ou mais10. O que é um número aceitável de pessoas para conseguir o que vocênecessitava?1 2 3 4 5 6 7 8 ou mais11. No fim, você conseguiu o que precisava da nossa organização?

SimNão

Consegui parte do que eu necessitava12. O serviço/produto foi fornecido sem erros?

SimNão

Se você respondeu NÃO à pergunta no 12, favor comentar os erros que vocêencontrou ao receber nosso serviço/produto.

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Favor circular a resposta que melhor descreva sua satisfação com relação aosseguintes aspectos do nosso serviço/produto.

Quão satisfeito você Quão importante esteficou com este aspecto aspecto do nosso servi-do nosso serviço/produto? ço/produto é para você?

1= Muito insatisfeito 1=Muito pouco importante2= Insatisfeito 2= Pouco importante3= Neutro 3= Neutro4= Satisfeito 4= Importante5= Muito satisfeito 5= Muito importanteN/A – Não se aplica N/A – Não se aplica

A. Tempo exigido para prestação 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Ado serviço/entrega do produto.

B. Número de contatos com a 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aorganização necessários parareceber o serviço/produto.

C. Tempo de espera no local 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Ade atendimento.

D. Número de pessoas com as 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aquais lidei para receber oserviço/produto.

E. O serviço foi prestado de 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Amaneira justa e igualitária.

F. Ficou claro o que fazer 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Acaso eu tivesse um problema.

A Equipe de atendimento foi:G. Gentil 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

H. Prestativa 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

I. Atenciosa 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

J. Competente 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

K. Dispunha de informações 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aatualizadas.

L. Respeitosa 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

M. Flexível 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

N. Atendeu às minhas 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Anecessidades de segurança.

O. Protegeu minha privacidade 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A/confidencialidade.

P. Em geral, quão satisfeito 1 2 3 4 5 N/Avocê ficou com a maneira coma qual o serviço foi prestado/oproduto foi fornecido pelaequipe de atendimento?

Q. Se você somente pudesse melhorar três das áreas acima, quais você focalizaria? Favor circu-lar três.

A B C D E F G H I J K L M N O P

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13. Favor fornecer quaisquer comentários adicionais que você possater sobre as pessoas que o atenderam.

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Seção 2 – Acesso einstalações

Favor circular a resposta que melhor descreve sua experiência nestas áreas.

Quão satisfeito você Quão importante esteficou com este aspecto aspecto do nosso servi-do nosso serviço/produto? ço/produto é para você?1= Muito insatisfeito 1=Muito pouco importante2= Insatisfeito 2= Pouco importante3= Neutro 3= Neutro4= Satisfeito 4= Importante5= Muito satisfeito 5= Muito importanteN/A – Não se aplica N/A – Não se aplica

A unidade que prestou esteserviço/forneceu este produto:A. Foi facilmente acessada por 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Atelefone.

B. Estava em local de fácil acesso. 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

C. Tinha um horário de expediente 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aadequado.

D. Tinha estacionamento adequado. 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

E. Foi facilmente acessível (por 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aex., não havia barreiras para entrarfisicamente e utilizar os prédios).

E. Tinha escritórios e áreas de 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aespera confortáveis.

F. Tinha placas de sinalização 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A fáceis de serem localizadas.

G. Tinha placas de sinalização 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A fáceis de serem entendidas.

H. Foi fácil agendar um horário 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Acom a equipe de atendimento.I. Ofereceu vários métodos de acesso 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A(fax, Internet, telefone, e-mail).

J. Em geral, quão satisfeito você 1 2 3 4 5 N/Aficou com a facilidade de acesso aoserviço prestado/produto fornecido?

K. Em geral, quão satisfeito você 1 2 3 4 5 N/Aficou com as instalações doserviço/produto?

Q. Se você somente pudesse melhorar três das áreas acima, em quais você se concentraria?

Favor circular três. A B C D E F G H I J K

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1. Se você achou que a localização do atendimento não era conveni-ente, onde você gostaria que as instalações estivessem localizadas?

2. Qual é sua maneira preferida de acessar este serviço?Favor completar com os números 1, 2 e 3 em frente a três dos itens

abaixo, para indicar suas preferências.PessoalmenteTelefoneFaxInternetE-mailCorreioOutro___________________

3. O horário de expediente normal atende às suas necessidades paraacessar este serviço/produto?

a) Simb) NãoSe você respondeu NÃO à pergunta no 3, favor responder à pergunta

abaixo:Se o horário de expediente normal não atende às suas necessidades e

se nós pudéssemos ampliar nosso horário, qual seria a sua preferência paraampliação do expediente? (Circule uma resposta)

a) Iniciar mais cedo pela manhã, um dia por semana (às 7h00, por ex.).b) Manter o escritório aberto até mais tarde, uma vez por semana (até

19h00, por ex.).c) Abrir o escritório um dia, durante o fim de semana.d) Outras sugestões___________________________.4. Favor fornecer comentários adicionais que você possa ter sobre o

acesso ao serviço/produto e as instalações nas quais você o recebeu. (Porexemplo, você tem alguma necessidade especial que não foi atendida?)

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Seção 3 – Comunicação

Para receber este serviço/produto, vários aspectos da nossa comunicação comvocê podem ter afetado sua experiência. Favor circular a resposta que melhordescreve sua experiência do atendimento.

Quão satisfeito você Quão importante esteficou com este aspecto aspecto do nosso servi-do nosso serviço/produto? ço/produto é para você?1= Muito insatisfeito 1=Muito pouco importante2= Insatisfeito 2= Pouco importante3= Neutro 3= Neutro4= Satisfeito 4= Importante5= Muito satisfeito 5= Muito importanteN/A – Não se aplica N/A – Não se aplica

Ao receber este serviço/produto:A. Minhas perguntas foram 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Arespondidas.

B. A informação de que eu 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Anecessitava estava disponível.

C. Recebi informações/instruções 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aconsistentes.

D. A linguagem escrita e oral era 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aclara.

E. Tive opção entre os idiomas 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Ainglês e francês.

F. A equipe de atendimento era 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Afacilmente compreendida.

G. Os documentos e outras informações 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A eram facilmente compreendidos.

H. Os formulários eram fáceis de 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aserem entendidos e preenchidos.

I. Os procedimentos eram 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Adescomplicados e facilmentecompreendidos.

J. Foi fácil descobrir como 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aobter o serviço.

K. Fui informado de tudo que eu 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aprecisava para obter o serviço/produto.

L. Quão satisfeito você ficou com 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aa nossa comunicação?

Q. Se você somente pudesse melhorar três das áreas acima, em quais você se concentraria?

Favor circular três. A B C D E F G H I J K L

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1. Qual(is), dentre as sugestões abaixo, seria(m) a(s) melhor(es)maneira(s) para nós nos comunicarmos com você a respeito do nosso servi-ço/produto? Circule tantas quantas desejar.

a) Propaganda na mídia (jornais, rádio, TV)b) Panfletos/livretos pelo correioc) Cartazesd) Informação na Internete) E-mailf) Outras_______________________.2. Favor fornecer comentários adicionais que você possa ter sobre a

comunicação que acompanhou o produto/serviço que você recebeu.

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Seção 4 – Custo

Para receber este serviço/produto, você pagou uma taxa (por ex., licença, regis-tro, pedágio). Favor circular a resposta que melhor descreve sua experiênciacom o atendimento quanto ao custo.

Quão satisfeito você Quão importante esteficou com este aspecto aspecto do nosso servi-do nosso serviço/produto? ço/produto é para você?1= Muito insatisfeito 1=Muito pouco importante2= Insatisfeito 2= Pouco importante3= Neutro 3= Neutro4= Satisfeito 4= Importante5= Muito satisfeito 5= Muito importanteN/A – Não se aplica N/A – Não se aplica

A. O faturamento do serviço/produto 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Aocorreu no tempo adequado.

B. O processo de faturamento foi 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/Adescomplicado.

C. O método de pagamento foi prático. 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

D. O prazo para pagamento foirazoável. 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

E. O custo foi razoável. 1 2 3 4 5 N/A 1 2 3 4 5 N/A

F. Em geral, quão satisfeito você 1 2 3 4 5 N/Aficou com o custo do serviçoprestado/do produto fornecido?

Q. Se você somente pudesse melhorar uma das áreas acima, em qual você se concentraria?

Favor circular três. A B C D E F

1. Qual é seu método de pagamento preferido? (Favor circular um)a) Dinheirob) Chequec) Cartão de Débitod) Cartão de Crédito2. O prazo mais razoável de pagamento seria dentro de: (Circular um)a) 1 semanab) 2 semanasc) 3 semanas

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d) 4 semanase) 5 semanasf) mais de 5 semanas3. Um patamar de custo razoável para este serviço/produto seria:(Complete) $________ até $ _____________.4. Favor fornecer quaisquer comentários adicionais que você possa ter sobreo custo do serviço/produto recebido.

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Seção 5 – Perguntas gerais

Favor circular a resposta que melhor descreve seu uso deste serviço/produto.1. Se você utilizou este serviço mais de uma vez, quantas vezes você o fez?Usuários novos® vão para a pergunta no 3A cada:a) 1 semana ou menosb) 2 semanasc) 1 mêsd) 2-5 mesese) 6-11 mesesf) anog) 2-5 anos2. Quando foi a última vez que você utilizou este serviço?Na(s) última(s) / no(s) último(s):a) semana ou menosb) 2 semanasc) mêsd) 2-5 mesese) 6-11 mesesf) anog) 2-5 anos3. Minha utilização deste serviço foi:a) uma exigência legal ® vá para a pergunta no 6b) de minha escolha ® vá para a pergunta no 44. Você irá utilizar este serviço novamente?a) Sim ( vá para a pergunta no 6)b) Não ( vá para a pergunta no 5)5. Favor dizer por que você não irá usar este serviço novamente.

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6. Você se deparou com algum dos seguintes problemas para obter o referidoserviço? Assinale todos os que ocorreram.

Eu não sabia onde buscar.Eu não consegui encontrar o serviço nas Páginas Amarelas da listatelefônica.Eu fui jogado para lá e para cá, de um funcionário para outro.Telefones ocupados.

——Tive dificuldades com sistemas de atendimento automático de telefonee de correio de voz.Recebi informações incorretas.Recebi informações conflitantes de pessoas diferentes.Tive que viajar uma distância muito longa.Foi difícil estacionar.Ninguém se deteve para me dar explicações.Outros (complete)________________________________________.

Favor circular a resposta que melhor descreve o quanto você concorda ou dis-corda das seguintes afirmativas gerais sobre este serviço/produto.

1= Discordo intensamente2= Discordo3= Neutro4= Concordo5= Concordo enfaticamenteN/A – Não se aplica

A. Esta organização atendeu bem às minhas necessidades. 1 2 3 4 5 N/A

B. A equipe que me atendeu fez um excelente trabalho. 1 2 3 4 5 N/A

C. O que eu precisava deste serviço, eu sabia aonde ir para obtê-lo. 1 2 3 4 5 N/A

Favor circular a resposta que melhor descreve seu nível geral de satisfaçãocom a prestação deste serviço/o fornecimento deste produto.

1= Muito insatisfeito2= Insatisfeito3= Neutro4= Satisfeito5= Muito satisfeito

D. Em linhas gerais, quão satisfeito você ficou com esteserviço/produto? 1 2 3 4 5

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7. Se você pudesse melhorar apenas três áreas na prestação deste serviço eno fornecimento deste produto, em quais dentre as seguintes nós deveríamosnos concentrar?Favor escrever os números 1, 2 e 3 em frente aos itens selecionados, paraindicar a primeira, segunda e terceira áreas mais importantes a serem melho-radas:

Prazo de tempo para receber o serviço/produtoNúmero de contatos necessários para receber o serviço/produtoTempo de espera em filaTempo de espera ao telefoneTempo de espera para respostas por correioMais meios para acessar o serviço/produto (Internet, e-mail, fax)Horário de expediente adequadoFacilidade de acesso aos escritóriosCordialidade da equipe de atendimentoHabilidade/competência da equipe de atendimentoFacilidade para acessar informações a respeito do serviço/produtoFormulários simplesInstruções/orientações clarasInformações precisas e consistentesConfiabilidade do atendimentoMétodos convenientes para pagamentoCusto razoável para o serviço/produtoOutras___________________________________________.

Observação: É aqui que as organizações podem colocar itens adicionaisespecíficos.

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Seção 6 – Informaçõesa seu respeito (Para Usuários Externos)

Nós gostaríamos de saber mais a respeito de nossos usuários, paramelhor entender suas necessidades com relação a este serviço/produto. Estainformação é utilizada para auxiliar nossa organização no planejamento demelhorias e na forma como prestamos nosso serviço/fornecemos nosso pro-duto a você. Agradeceríamos se você respondesse às perguntas que seseguem. Esta informação será confidencial — não temos como identificarqualquer pessoa que responder a estas perguntas.Favor circular o que melhor descreve sua situação.1. Gêneroa) Femininob) Masculino2. Idadea) 18-24 anosb) 25-34 anosc) 35-49 anosd) 50-64 anose) 65+ anos3. Favor indicar o tipo de residência em que você mora.a) Casab) Casa geminadac) Apartamento secundário em uma residênciad) Apartamentoe) Outro_____________________________.4. Você:a) Alugab) É proprietário5. Favor indicar o tipo de família em que você vive.a) Casal sem filhos dependentesb) Casal com um ou mais filhos dependentesc) Pai ou mãe com um ou mais filhos dependentesd) Adulto solteiro

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e) Mais de um adulto solteiro, compartilhando uma residênciaf) Grupo familiar com outros parentesg) Outro_______________________.6.Você atualmente está empregado?a) Sim ® vá para a pergunta no 7b) Não ® vá para a pergunta no 107. Se você está empregado, você trabalha?a) Tempo integral (35 horas ou mais por semana)b) Tempo parcial (menos de 35 horas por semana)8. Qual é sua principal ocupação?a) Dona de casab) Gerente, executivo, empresárioc) Trabalho de escritório, vendas, prestação de serviçosd) Profissional liberale) Autônomof) Estudanteg) Artesão, operárioh) Outro_____________________.9. Favor circular a letra apropriada para indicar o tipo de organização na qualvocê trabalha.a) Governo municipalb) Governo estadual ou territorialc) Governo federald) Outra organização pública, (sistema de saúde pública, sistema escolar, uni-versidade, justiça etc).e) Nenhuma das alternativas anteriores10. Se você não está empregado, você:a) É aposentadob) É estudantec) Está recebendo seguro-desempregod) Outro______________________.11. A qual dos seguintes itens você tem acesso pessoal? Circule todos os quese aplicam.a) Computadorb) Internetc) Faxd) Correio Eletrônico (e-mail)12. Qual é seu nível de educação formal até o momento?a) Primeiro ou segundo grau incompletosb) Completou o segundo grauc) Algum estudo pós-segundo grau

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d) Completou faculdade ou universidadee) Pós-graduação ou especialização profissional13. Qual é sua renda familiar bruta aproximada? Sua família inclui todos osmembros da sua família que moram com você.a) Abaixo de $ 10.000b) $ 10.000 a $ 19.999c) $ 20.000 a $ 29.999d) $ 30.000 a $ 49.999e) $ 50.000 a $ 69.999f) $ 70.000 a $ 89.999g) $ 90.000 ou mais14. Você é membro de um grupo minoritário visível?a) Simb) Não15. Você é aborígene (índio)?a) Simb) Não16. Onde você mora?(a organização inclui opções relevantes aqui, por exemplo, dentro da comuni-dade, região, Estado).17. Há quanto tempo você vive no Canadá: Estado/Região/Município/Comu-nidade?(a organização seleciona a variável apropriada)a) Por toda a minha vidab) Dez anos ou maisc) Menos de dez anos

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Seção 7 – Informações a seu respeitoe da sua organização (Para Usuários Externos)

Estamos coletando informações sobre você e a sua organização paradar mais significado às respostas que você nos forneceu. Essas informaçõessão utilizadas para auxiliar a nossa organização a planejar melhorias na formacomo prestamos nosso serviço/fornecemos nosso produto.Favor completar as lacunas.1. O nome da sua organização.

2. O nome da divisão ou área na qual você trabalha.

3. Sua posição/título.

4. Período de tempo em que você tem trabalhado nesta posição (em meses).

5. Período de tempo em que você tem trabalhado para este empregador (emmeses).

6. O número de pessoas subordinadas diretamente a você.

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Seção 8 – Seus comentários sãomuito importantes para nós

Favor escrever quaisquer comentários adicionais que você tenha arespeito deste serviço/produto governamental. Sinta-se à vontade para dis-correr a respeito de perguntas da pesquisa ou quaisquer outras idéias quevocê deseje remeter com relação à prestação de nosso serviço.

Muito obrigado por fornecer estas informações!

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RSP

Revista doServiçoPúblico

Ano 49Número 1Jan-Mar 1998

Doutorando emplanejamento epolíticaspúblicas pelaCornellUniversity,financiada pelaCapes-Brasil

Clinton e a reinvenção dogoverno federal: o National

Performance Review 1

Flávio da Cunha Rezende

Introdução

Este artigo analisa a natureza e a formação da agenda de reformas(agenda setting), a seqüência de implementação, as principais inovações,a dinâmica político-institucional e alguns dos resultados alcançados peloNational Performance Review, programa de reforma administrativa naadministração do presidente Bill Clinton implementado em 1993.2

A discussão sobre a natureza e a formação da agenda do programatem por objetivos centrais entender os princípios e os objetivosprogramáticos deste programa de reforma do setor público, ressaltando asbases conceituais em que se assenta este esforço de reforma, os pontos deinovação sobre formas de pensar e agir sobre a administração pública ame-ricana, sobre o papel e missão do governo federal na economia e na socie-dade americana, bem como as principais especificidades desta agenda emrelação a outras experiências de reformas nos Estados Unidos e no planointernacional. A atenção central dos esforços desta análise permite enten-der o novo paradigma empreendedorialista proposto pelo NPR para o fun-cionamento da burocracia no governo federal americano.

A avaliação dos resultados do programa tem por objetivo dotar otrabalho de uma base empírica capaz de permitir compreender comoalguns dos resultados pretendidos pelo programa foram obtidos nas prin-cipais agências e departamentos do governo americano. A análise dosresultados obtidos pelo NPR utiliza as seguintes variáveis: redução donúmero de funcionários, controle dos political appointees (cargos de con-fiança); efetividade na redução do gasto público e efetividade naimplementação das recomendações propostas pelo programa. Esta breveaferição de alguns resultados pontuais do programa não permite avalia-

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RSPções de natureza normativa sobre o sucesso ou insucesso do programa,3 ese constitue como um elemento suporte para os pontos principais apre-sentados ao longo do texto em torno dos objetivos programáticos do NPR.

O artigo está organizado da seguinte forma: na primeira parte, osprincípios, objetivos e a natureza da agenda do programa são apresentados.Em seguida, o foco se volta para uma compreensão da formação da agen-da e da seqüência de implementação das reformas. Na terceira parte,privilegia-se a análise da dinâmica político-institucional em torno do pro-grama de reformas, com destaque para as tensões entre o Legislativo eExecutivo em torno das reformas, e o seu impacto sobre a mudanca depreferências na agenda do programa. A última parte apresenta um painelempírico sobre alguns dos resultados obtidos pelo programa em agênciase departamentos do governo em áreas de interesse à análise. Na partefinal também são apresentados comentários finais e alguns pontos deinteresse para a condução das reformas administrativas em curso no Bra-sil.

1. Contextualizando a necessidade de reformas nosetor público nos Estados Unidos

A iniciativa de reorganização do Executivo federal constitui temarecorrente na agenda de políticas públicas nos Estados Unidos. Tantopara republicanos como para democratas de diversas orientações e visõessobre o papel do governo federal, a preocupação com a melhoriaqualitativa dos padrões de administração federal foi materializada emprogramas específicos de reformas, com diferentes objetivos e missõesao longo do tempo. A literatura temática assinala 11 (onze)macroprogramas federais destinados a alterar padrões de administraçãofederal desde o início do século.4 No período anterior ao New Deal, ostrês governos republicanos (1905-1924) formulam e implementam trêsprogramas: a Keep Commission, o President's Commission on Economyand Efficiency, e a Joint Commission on Reorganization, os quais tinhamcomo objetivo central realizar alterações nos sistemas de orçamento dasagências, gestão de pessoal, controle da informação, e ainda estruturar asfunções do governo federal. A partir do New Deal, quando o governofederal americano inaugura a era democrática, tais questões permane-cem reavivadas num momento de expansão dos governos e dos gastospúblicos. Com o presidente Franklin Roosevelt (1901-1909) o governofederal inaugura a agenda de reformas no President's Commission onAdministrative Management (1936-1937). Tal esforço programático setransforma na famosa Primeira Comissão Hoover (1947-1949)implementada durante o governo de Henry Truman (1945-1953), onde o

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RSPgoverno passa a se preocupar com a questão orçamentária de forma maissignificativa. A segunda Comissão Hoover (1953-1955) que viria a acon-tecer nas duas gestões do republicano Dwight Eisenhower (1953-1961)focaliza-se em alterações, na redistribuição de funções administrativasno Executivo. Nos anos 60, a reorganização federal na agenda republica-na reaparece com Nixon (1969-1974), com a implementação da AshCommission, um programa focalizado na reestruturação do Executivofederal num contexto de completa transformação dos padrões degovernança nos Estados Unidos. No governo de Carter (1977-1981), asquestões de reorganização interna do governo são condensadas no CarterReorganization Effort (1977-1979), um tímido esforço de reformas, masque, no entanto, tinha por objetivo central reorganizar os processos inter-nos nas estruturas da administração pública. Contudo, é nos anos 80,com o governo Reagan (1981-1989), que a preocupação com o controledos custos do governo e uma maior austeridade fiscal do governo se tor-na objetivo programático da agenda de reformas. Pela primeira vez, asreformas administrativas se associariam de modo mais intenso com aquestão da restrição de recursos, onde os imperativos de eficiência e qua-lidade na gestão pública se tornam os princípios balizadores de tais polí-ticas públicas.

Na grande parte dos estudos realizados no escopo destes programas,o diagnóstico recorrente, sob diversas orientações, é o de que a administra-ção federal apresenta problemas derivados de excessiva regulação interna,centralização da gestão e coordenação das decisões no Legislativo e naPresidência, superposição de competências e funções, alta hierarquização,resistência à mudança e inovação nos procedimentos e mecanismos in-ternos de regulação da burocracia, descompasso entre demandas por re-cursos e objetivos das agências, e ainda deficiências nos sistemas inter-nos de controle e difusão da informação para tomada de decisões. Esteselementos têm contribuído para uma burocracia que funciona com redu-zida accountability, associada a excessivos gastos públicos, combinaçãoque tem orientado de modo decisivo os programas de reformas e reorga-nizações no sistema de administração do Executivo federal americano.

Tais problemas se tornaram visivelmente mais agudos com a en-trada em cena da crise econômica e financeira desencadeada no anos 80,quando os padrões democráticos de expansão do governo eficiente tor-naram-se absolutamente incompatíveis com a governança. Os governostêm progressivamente se preocupado com a questão do controle do gastopúblico e procurado implementar mecanismos voltados para reduzir osprogramas governamentais, desregular e privatizar funções públicas, esobretudo, alterar o papel do governo federal numa economia progressiva-

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RSPmente competitiva e global, e numa sociedade democrática, com intensademanda por melhores serviços públicos.

Diante de tais requisitos, os padrões e os modos de administraçãopública tradicionais têm sido profundamente questionados em torno desuas capacidades de se ajustar aos novos imperativos por melhor governoem ambientes marcados por controle orçamentário e fiscal. O argumentode que os padrões tradicionais de gestão pública devem ser revistos temadquirido considerável visibilidade na formulação das agendas dereformas administrativas, tornando-se decisivo a partir de meados dosanos 80, quando o Presidente Reagan, com sua orientação neoliberalcentrada nos princípios do supply-side economics, lança de modo agres-sivo um programa de combate à burocracia e um programa deprivatizações, fazendo com que o governo passe a ser a raiz dos diversosproblemas econômicos e financeiros do país.

É exatamente neste período que os programas federais de reor-ganização federal passam a ser profundamente atrelados à questão fiscal,a qual tinha sido questão secundária no momento de expansão do gover-no. Os governos nos anos 80 - Reagan (1981-1989), e Bush (1989-1993)— implementam esforços programáticos no sentido de alterar o padrãode intervenção do governo federal na economia e na sociedade america-na, e ainda o padrão de envolvimento dos mercados nas políticas públi-cas. A crítica ao padrão centralizado e hierárquico produzido pelo modode pensar e organizar a administração pública federal, no entanto, passadespercebida por tais programas de reformas. O ataque à burocracia e ocontrole austero das finanças públicas, descentralização, devolução deautoridade para os governos locais, desregulamentação e privatizaçãoassumem o comando da agenda.

Tais programas promoveram uma significativa inflexão no padrãode gastos públicos nos EUA. Como apresentado no Gráfico 1, o ano fis-cal de 1985 representa um ponto de inflexão do padrão histórico de gas-tos do governo, onde a partir do qual o controle do gasto público assumedecisiva e marcante presença. As reformas administrativas passam, por-tanto, de instrumentos apenas de melhoria das organizações em si, dosseus processos internos, para uma conexão mais profunda com os propó-sitos mais amplos de controlar a expansão do governo. Em diferentesagendas e ambientes políticos, as reformas administrativas que emergema partir dos anos 80, diferentemente daquelas formuladas e implementadasnos períodos anteriores, podem ser entendidas como políticas públicas

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RSPque expressam as preferências políticas em atingir o objetivo de controle

dos gastos e equilíbrio orçamentário federal.

Gráfico 1: EUA — Evolução dos gastos federais 1970/1996

Tal preferência política balizou a agenda de políticas públicas dopresidente democrata Bill Clinton (1993-1996) no seu programa de re-formas do setor público. Para o governo Clinton, os imperativos da compe-titividade econômica na arena internacional, o avanço da era dainformação e as demandas internas por melhores políticas públicas fizeramdas reformas uma das prioridades da agenda, juntamente com a questãodo NAFTA — North American Free Trade Agreement; e o crônico pro-blema de melhoria dos sistemas de seguridade social, atenção à saúde,educação e proteção ao meio ambiente. Para o governo Clinton, inde-pendente de posição partidária dos democratas, o governo americanoprecisaria enfrentar reformas mais profundas, as quais deveriam ir alémdas tentativas de controle dos gastos, mas, que pudessem dar respostasconcretas às demandas por melhor e mais eficientes serviços públicos. Odesafio central para a agenda Clinton seria, portanto, o de encontrar me-canismos pelos quais fosse possível combinar controle dos gastos públi-cos (balance the budget) ao melhor funcionamento da administraçãopública federal. Tais objetivos se revelam logo num dos primeiros pro-nunciamentos do presidente Clinton para o Congresso de maioria demo-crática em 1993, quando este afirma que "a era do big government aca-bou", e que um novo padrão de organização e funcionamento do governoque funcionasse melhor e custasse menos, fosse introduzido de formapermanente, revisando profundamente as estruturas e os modos sob osquais a administração pública federal vinha funcionando desde o iníciodo século. Tal ambiciosa missão seria materializada na sua agenda de

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RSPreformas, no programa National Performance Review formulado emmarço de 1993, a qual introduziu a necessidade de reinvenção5 do gover-no federal no sentido de lidar de forma efetiva com os crônicos proble-mas e patologias da administração pública federal. Como afirma o pró-prio Clinton, o objetivo central do programa de reformas é:

"o de dar ao povo americano um governo mais efetivo, eficiente,e responsivo: um governo que custa menos e funciona melhor.6

O NPR começou em 3 de março de 1993, quando solicitei ao vice-presidente, Al Gore, para conduzir um diagnóstico de seis mesessobre como o governo federal funciona. O vice-presidenteorganizou uma equipe de experientes funcionários federais nas di-versas áreas do governo para examinar tanto as agências como ossistemas inter-agências, tais como os sistemas de orçamentação,gestão financeira, regulamentação e gestão de pessoal".7

O programa de reinvenção introduzido pelo governo Clinton pre-tendeu superar os problemas burocráticos no sistema de governança ame-ricano ao introduzir mudanças significativas nas relações formais de po-der e autoridade no interior das agências e departamentos do governo,entre os poderes Executivo e Legislativo, e ainda nas relações inter-agên-cias, elementos considerados fundamentais para uma qualitativa trans-formação do papel do governo na economia e na sociedade. A análisedos princípios, da natureza da agenda e dos objetivos programáticos doNPR é realizada na parte seguinte.

2. A agenda de reformas e o NPR

2.1. Natureza da agenda, objetivos e princípiosgerais do programa de reformas

A agenda de reformas do presidente Clinton ficaria demarcada commaior precisão a partir do lançamento do relatório Creating a governmentthat works better and costs less, o qual contém o conjunto de recomenda-ções e iniciativas a serem perseguidas no programa National PerformanceReview (NPR). O ponto de partida para a materialização de tal agenda foibaseado num detalhado diagnóstico realizado em seis meses por umaequipe, contando com os melhores especialistas (mais de 250 funcioná-rios) nos diversos setores da burocracia federal sobre o funcionamentodas diversas agências e departamentos do governo, seus problemas prin-cipais e oportunidades para as reformas.

A equipe de alto comando responsável pela preparação do primeirorelatório do NPR envolveu David Osborne, um dos autores e principais

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RSPdifusores da idéia de reinvenção do governo, como orientador especialdo programa; Elaine Lamarck, a qual se tornaria a principal consultorado vice-presidente Al Gore; Robert Stone, que viria a ser o diretor doprojeto NPR; Billy Hamilton, com experiência no funcionamento de di-versas agências do governo; John Kamensky, especialista em sistemasde orçamento e sistemas de gestão de pessoal; Bob Kinsley, especialistaem questões de natureza fiscal; e Carolyn Lukensmeyer, especialista emquestões da dinâmica interna e das comunicações.8

O estudo realizado pelos formuladores do NPR expressa sintoniacom o diagnóstico de especialistas de diversas formações teóricas e ideoló-gicas (FIORINA 1981; OSBORNE & GAEBLER 1992; DI IULIO, GARVEY & KETTL

1993; DI IULIO 1994) de que grande parcela dos problemas daadministração pública federal estariam associados aos sistemas de estru-turas de incentivos sob os quais estas funcionam e se organizam. Comefeito, a forte crítica dos especialistas do NPR recaiu sobre a excessivainterferência do Legislativo sobre a burocracia federal. Nesta perspecti-va, os incentivos internos de funcionamento da burocracia federal eramincompatíveis com a autonomia gerencial das organizações públicas, asquais eram fortemente constrangidas no sentido de orientar suas açõespor padrões de qualidade e eficiência na prestação de serviços para oconsumidor final. Esta crítica ao excesso de regulação do Legislativoviria a ser o ponto nevrálgico de todas as reformas propostas pelo NPR.Baseado neste diagnóstico, o programa de reinvenção do governo foiconcebido e fundamentalmente implementado no sentido de alterar osmecanismos internos (incentivos) pelos quais a burocracia federal operae se organiza, fazendo com que esta se volte gradualmente para prestarmelhores serviços para os usuários e clientes dos programas governa-mentais, a partir de uma gradual "desregulamentação" dos mecanismosque inibem o melhor funcionamento das organizações do governo. Esteobjetivo deveria ser alcançado a partir de uma revisão das relações depoder e autoridade entre o Legislativo e Executivo na questão da admi-nistração pública. Ao assumir tal premissa como fundamental às refor-mas, a reinvenção traria à tona uma necessidade de rever, mais ampla-mente, as bases de organização e funcionamento da burocracia.

Neste sentido, o NPR propõe um novo paradigma para orientar aburocracia, e mais amplamente a organização do governo. Este tema ti-nha estado ausente nas experiências anteriores de reformas, as quaisdeixaram relativamente intacto o modo de pensar e tratar os problemasburocráticos. O NPR introduz a noção de que a burocracia é, na reali-dade, um conjunto extremamente heterogêneo e fragmentado de agên-cias, que devem ser melhor entendidas a partir de abordagens quepossibilitem compreender estas especificidades, sobretudo no que se re-fere às necessidades específicas de reformas em cada setor e organização

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RSPdo governo federal. Esta concepção fragmentada de entender o funciona-mento e os problemas burocráticos, como comentaremos adiante commaior detalhe, faria com que o NPR fosse dimensionado a partir de cadaagência e departamento, porém, sob coordenação de princípios geraisformulados pelo governo federal. As visões homogeneizadoras pratica-das no passado por outras experiências de reformas do governo deveriamser evitadas no processo de reinvenção.

O estilo fragmentado do NPR se deve ainda ao fato de que cadaorganização do governo, dado a natureza pluralista da política america-na, apresenta uma "política" própria à qual tem significativa conseqüên-cia no grau em que cada organização se ajusta ao processo de reformasproposto. A experiência histórica das reformas nos EUA mostrou o rela-tivo fracasso das visões mais "homogêneas", as quais privilegiaram ini-ciativas mais generalizadas para os problemas burocráticos num ambien-te de alta diversidade. A abordagem fragmentada e concebida no bottom-top poderia ser mais efetiva em lidar com as resistências políticas emcada micro ambiente organizacional em que as reformas fossemimplementadas.

Segundo os relatórios do programa, a preferência dos formuladoresdo NPR pela fragmentação das reformas foi claramente expressa, umavez que aproximadamente 2/3 das recomendações originalmente propostastiveram um caráter individualizado por agências e departamentos, sendoo terço restante comum a todas as agências ou voltadas para organizaçõesdo governo que tratam com relações inter-agências. No que se refere ànatureza das recomendações propostas, estas fundamentalmente se orien-taram no sentido de que agências e departamentos passassem a alterarseus procedimentos e princípios de organização gerenciais, suas estruturasde incentivos internos, missões e objetivos organizacionais, prioridadesalocativas, graus de autonomia e descentralização, sistemas de gestão econtratação de pessoal, no sentido de garantir eficiência e accountabilityna oferta de serviços públicos.

Um dos pontos de sofisticação e de inovação institucional trazidospelo NPR e seu paradigma conceitual seria aquele de necessariamenteconhecer melhor e alterar (quando necessários) os padrões internos defuncionamento de cada organização do governo. Tal questão permane-ceu em grande medida intacta em esforços anteriores de reformas nosEUA, os quais apenas propunham técnicas mais generalistas de controle,planejamento, redução dos custos com a administração, modificaçõesnos sistemas gerenciais sem, no entanto, verificar mais detidamente comoo governo funciona e se organiza. O NPR passa a deixar de se preocuparcom o que o governo faz (o papel do governo) e ter como prioridade aorientação de como o governo e suas organizações funcionam.

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RSPPara os formuladores do NPR, a reinvenção dos mecanismos inter-nos seria uma forma de romper com os padrões históricos defuncionamento marcados pela centralização, reduzida accountability,reduzida conexão dos funcionários com resultados e missões, e outrasérie de falhas burocráticas. Tal escolha de foco, no entanto, estariaprofundamente atrelada a reformas mais amplas no balanço de poder eautoridade entre o Executivo e o Legislativo, adicionalmente. Assim, areinvenção viria a ser um ponto catalizador para tentar promover umaalteração na tensão estrutural no sistema de governança americano entrecentralização e descentralização de poder e autoridade entre os poderes.Tal tensão, que permanece viva no sistema de governança americano,origina-se no tempo dos federalistas, refletida nas tensões entre Hamil-ton (com preferência por maior centralização e controle) e Jefferson (prefe-rência por maior descentralização e self-governance). O modo tradicionalde organizar o governo teria sido inspirado no modelo hamiltoniano,privilegiando centralização, estruturas hierárquicas e maior controle doLegislativo sobre o Executivo. O NPR viria tentar resgatar a visãojeffersoniana, a qual se inclina por alternativas e mecanismos queprivilegiam descentralização, autonomia, e self-governance, sendo, por-tanto, uma solução que pende para uma redução da interferência doLegislativo sobre a burocracia. Com efeito, os objetivos programáticosdo NPR associam, portanto, eficiência e performance na oferta de servi-ços públicos a uma revisão nas relações entre Legislativo e Executivo, eainda a uma capacidade das organizações em ajustar seus mecanismosinternos (incentivos) a tais imperativos.

Durante a formulação do NPR, o congresso democrata não foi con-sultado acerca do programa de reformas administrativas. O único eloinstitucional entre o Congresso e os formuladores das reformas naquelemomento foi a aprovação do Government Performance and Result Act(GRPA) em 1993, uma iniciativa do Legislativo que revela as preferênciaspolíticas sobre a questão da performance da administração pública federal.O NPR foi formulado, portanto, sobre os princípios do GRPA, mas, noentanto, considera que os efeitos do Legislativo sobre a burocracia sãodanosos à performance. O NPR parte do pressuposto que o Congresso,por razões políticas, impõe regras e procedimentos que prejudicam ofuncionamento das agências e departamentos do governo em termos desua capacidade de inovação, de autonomia gerencial, de melhores resul-tados e de controle de custos. No caso americano, a relação entre o Con-gresso e a burocracia tem demonstrado que o Congresso contribui emmuito para uma administração pública movida pela estrita obediência àsregras, as quais desassociam os objetivos organizacionais de questõesdecisivas como performance, qualidade, resultados e accountability.

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RSPOutro ponto central diagnosticado pelos formuladores das reformasfoi o excesso de centralização exercido por algumas agências do governocomo o General Services Administration (GSA), o Office of PersonnelManagement (OPM), e o Office of Management and Budget (OMB),agências responsáveis pela centralização e hierarquia acerca dos modose padrões de prestações dos serviços no sistema de administração pública.O papel e as responsabilidades destas agências deveriam ser fundamen-talmente revistas com as reformas, sobretudo no que se refere aos seusgraus de interferência nas decisões individuais das agências e na defini-ção das prioridades de gastos e controle de custos.9

No plano interno das organizações, as propostas de reinvençãofocalizaram-se na necessidade de promover incentivos de mercado nasagências e departamentos do governo em áreas específicas, tais comogestão de recursos humanos, uso de tecnologias, compra de material,salários, padrão de prestação de serviços, e.g. Tais incentivos de mercadopotencializariam instrumentos necessários para transformar o modo deorganização e funcionamento das agências do governo, passando de am-bientes "regulados" para ambientes marcados por competição e resultados,em similaridade a firmas privadas operando em ambientes de mercado.Tal transformação estratégica permitiria, por exemplo, que as ações indi-viduais dos funcionários (reguladas por contratos de trabalho) fossemconectadas à performance e eficiência na oferta de serviços para a orga-nização, premiando desempenho individual, inovação, criatividade eperformance no desempenho das atividades no trabalho. Os incentivosde mercado viriam, portanto, possibilitar formas de conduzir as organi-zações a ajustarem suas missões e objetivos organizacionais a resultadose custos, desviando-se das tradicionais formas de estrita obediência àsregras.10 Com isto, cumulativamente, pretendia-se promover uma mu-dança significativa na cultura organizacional do setor público.

Caberia, portanto, a cada organização se envolver de modo ativopara a reinvenção dos designs dos incentivos necessários para as diversasagências e departamentos. O novo padrão de incentivos poderia seraltamente produtivo, caso fossem formulados a partir de um esforçocoordenado do governo federal com o envolvimento das agências edepartamentos, no sentido de detectar e alterar seus padrões defuncionamento e organização, orientando as reformas necessárias. Dadatal condição, cada agência assumiu considerável responsabilidade emcooperação com o governo federal para promover estratégias concretasde realinhamento dos seus procedimentos internos para a reinvençãodo governo.

A justificativa para tal forma de concepção e implementação dasreformas, num esforço de síntese, ocorre, portanto, por vários fatorescombinados. Primeiro, as formas anteriores de concepção e tratamento

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RSPdos problemas burocráticos haviam mostrado os seus limites de alterar ofuncionamento da burocracia. Segundo, tal forma de entender o setorpúblico se associa diretamente às novas formas teóricas dominantes noatual mainstream do pensamento acadêmico na economia, na adminis-tração pública e nas políticas públicas, às quais concebem a burocracia eas organizações a partir dos pressupostos da new economics oforganization11 e do novo institucionalismo econômico, princípios queprivilegiam a relação entre as instituições (as regras do jogo ou a estruturade incentivos), a performance e eficiência das organizações. Assim,reinventar o governo inexoravelmente passaria por uma tentativa de reveras "regras do jogo" no interior das organizações. Terceiro, a redução dasresistências políticas. A forma fragmentada de condução das reformasteria mais a ver com a deliberada estratégia do governo em ajustar asreformas às especificidades da natureza da política de cada organização,evitando ir de encontro às mesmas. Os princípios gerais do paradigma deadministração pública proposto pelo NPR são analisados a seguir.

2.2. O NPR e o paradigma empreendedorialista

Os formuladores do NPR partiram do princípio geral de que grandeparcela dos problemas e patologias da burocracia federal resultavam deuma crise mais ampla de paradigma, no qual se moldaram as estruturasdo governo federal. O diagnóstico da crise de paradigma apontava para aevidência de que princípios e formas tradicionais de organização e defuncionamento da burocracia federal eram pouco compatíveis com asdemandas por melhor governo. Para reinventar o governo alterando omodo como este funciona, seria fundamental que as formas gerenciais,os princípios e o modo de organizar a burocracia fossem profundamentealterados através de uma concepção diferente em torno de um novoparadigma para a administração pública.

Baseado nas experiências de reformas em corporações do setorprivado, em experiências de reformas em diversos governos locais nosEUA, e numa série de inovações teóricas na administração pública e te-oria das organizações a partir dos anos 80, o NPR trouxe consigo a intro-dução de um novo paradigma para a administração pública: oempreendedorialismo, o qual parte da premissa de que a administraçãopública pode ser mais eficiente e efetiva com a introdução de mecanis-mos de mercado na gestão pública.12

Em contraposição ao paradigma gerencialista, o paradigmaempreendedorialista se assenta na idéia de similaridade nos princípiosde organização e funcionamento dos setores público e privado, a qualsinaliza para a possibilidade do setor público de se organizar e funcionarcom sistemas gerenciais movidos por resultados, objetivos, e por perfor-mance, como fazem as organizações do setor privado em ambientesconcorrenciais. O governo e suas organizações podem orientar-se, por-

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RSPtanto, por padrões de qualidade, eficiência e resultados. Por outro lado,em organizações funcionando dentro de incentivos de mercado, os funcio-nários públicos podem ter seus contratos de trabalho acoplando saláriosà performance,13 o que permite que as organizações tenham resultadoscom seus objetivos organizacionais e missões na estrutura de governo.

O segundo princípio empreendedorialista informa que as organiza-ções do governo podem funcionar de forma mais eficiente em ambientescompetitivos com outras agências, e mesmo com firmas do setor priva-do. O estímulo à competição impulsiona as agências do governo no sen-tido de uma definição mais precisa dos serviços a serem ofertados, dassuas clientelas, dos custos dos serviços e das formas institucionais ne-cessárias para atingir resultados, e ainda por um uso qualitativamentesuperior de recursos e tecnologia para a consecução de resultados. Oterceiro princípio informa sobre a questão do tamanho do governo, oqual é uma função direta do número de servidores civis empregados emtempo integral (full-time employees). O último princípio estabelece quea gestão e os gastos das agências do governo federal devem ser necessa-riamente atrelados às prioridades orçamentárias, restringindo a capaci-dade da administração pública em elevar deliberadamente os seus gas-tos.

Uma administração pública empreendedorialista, na visão dosformuladores do NPR, deve perseguir permanentemente os seguintesestados desejados:

a) eliminar procedimentos e regulamentações gerenciais desneces-sárias;

b) transformar a cultura organizacional através da descentralizaçãode autoridade e devolução de responsabilidades para as partes mais peri-féricas da administração;

c) voltar-se para a performance, eficiência e satisfação do consu-midor-cidadão;

d) procurar alternativas viáveis para funcionar melhor e custar menos.O empreendedorialismo do NPR não constitui novidade quando

comparado a experiências internacionais. Na realidade, os empreendedo-rialistas americanos se balizam — porém, com diferenças substanciaisno uso dos instrumentos da governança dado as especificidades dasestruturas entre os diferentes países — por princípios importados de ou-tras experiências de reformas, partindo de pressupostos e conceitos utili-zados nos governos da Nova Zelândia, Austrália e Inglaterra.14

No caso americano, em contraste aos casos examinados no quadroabaixo, o setor público assume papel central no processo de rule-steeringtanto na dimensão primária da regulação quanto no modo de governança.Este modelo de governança típico do governo americano a partir dos anos

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RSP80 não sofre mudanças drásticas. O NPR se volta para dar continuidade auma concepção de governança em que o setor público tem o papel funda-

mental de promover uma condução da regras de funcionamento (rulesteering regime), evitando implementar soluções radicais de privatizaçãoou expansão excessiva dos mecanismos de mercado, embora considere-osfundamentais. Para os empreendedorialistas, o papel do governo se mostraingrediente essencial na organização dos mercados.

Quadro 1: EUA, Inglaterra e Nova Zelândia. Regimes degovernança e mecanismos regulatórios 1980-1993

Neste sentido, pode ser explicado por que o NPR assume traço dis-tintivo em relação às experiências desencadeadas por Reagan nos EUA oupor Thatcher na Inglaterra, nas quais as privatizações e a apologia ao setorprivado assumem o comando das iniciativas. Os formuladores da reinvençãoreconheceram a importância e a necessidade do papel do governo nas soci-edades organizadas pelo mercado, assumindo um perfil mais nitidamenteinstitucionalista ao assumir a idéia de que as instituições representam ele-mentos necessários para a eficiência dos mercados e dos governos.O empreendedorialismo se volta, portanto, para reinventar os mecanismosinternos de funcionamento da burocracia como princípio, afastando-se deconcepções que teorizam sobre os males da presença do governo e dosseus padrões. O NPR combate os excessos de regulação do Legislativosobre a burocracia e mostra que o ajuste entre organizações e incentivostem profunda conexão com accountability e eficiência.

2.3. Exemplificando a reinvenção dos incentivos daburocracia: os laboratórios de reinvenção

Uma das principais inovações institucionais trazidas pelo NPR foia criação dos laboratórios de reinvenção, organizações criadas no interi-or de cada agência, no sentido de promover os mecanismos necessáriospara o melhor funcionamento das organizações. Os laboratórios repre-sentaram as experiências-piloto responsáveis pelo design e ajuste do pro-cesso de alteração dos incentivos no interior de cada instância do governo.

Regulação Inglaterra Nova Zelândia Estados Unidos

Primária mercados privatização mercados privatização steering rule

Secundária competitividade competitividade competitividade

Terciária steering results steering results privatização

Tipo de Governança setor privado

regimes de mercado

setor privado

regimes de mercado

rule steering regime

Fonte: Naschold (1996)

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RSPO governo federal estimulou de modo ativo a formação destas organiza-ções, premiando as inovações e os resultados obtidos por cada organizaçãodentro do programa de reformas. Estas organizações, formadas por geren-tes, funcionários e membros do governo federal, foram o locus para adifusão de processos de inovação e recriação dos padrões tradicionais,da postura das agências com relação a resultados, qualidade, performance,e ainda uma forma organizacional em que os membros da reinvençãopoderiam mais participativamente entender, lidar e propor reformas ade-quadas às especificidades — culturais e organizacionais — de cadaorganização. Os labs têm ainda um papel relevante na permanente avali-ação, monitoramento e discussão dos resultados obtidos com as refor-mas, sem perder de vista os objetivos de redução de custos e melhorfuncionamento. Tais laboratórios foram pensados como estruturas per-manentemente ativas para introduzir inovações nas estruturas internasde incentivos, mudanças na cultura organizacional das agências,descentralização, empowerment, realinhamento dos objetivos organi-zacionais e missão das agências, e, fundamentalmente para transformaros padrões de prestação dos serviços de atendimento ao consumidor-cidadão.15

Os laboratórios de reinvenção seriam, portanto, a marca registradado estilo difuso e fragmentado das reformas no contexto do NPR. Entrarcom precisão para alterar e ajustar os mecanismos internos, missões, pri-oridades, objetivos organizacionais representou per se uma mudança ra-dical na concepção centralizada e hierárquica de lidar com a burocracia eseus problemas nos EUA.

Como afirmam alguns autores, a noção da permanente geração deinovações pelos gerentes no front-line, no sentido de melhorar a qualidadedos serviços prestados pelas agências do governo, foi fundamental paragarantir o feedback necessário entre incentivos e performance. Esta con-cepção se mostra incompatível com esquemas centralizados de comando eestruturas verticalizadas de autoridade, pontos que o governo federal visa-va fundamentalmente eliminar com a reinvenção. Por outro lado, o maiorconhecimento interno acerca das regulações necessárias ao funcionamen-to das organizações seria um grande passo para que as "regulações desne-cessárias" fossem eliminadas. Neste sentido, os laboratórios de reinvençãoforam criados estrategicamente no sentido de minimizar interferências decontrole central sobre as reformas. O grande risco dos laboratórios seria ograu elevado de fragmentação, o qual seria problemático em termos deaccountability, caso o governo federal não permitisse meios para coordenaro amplo volume de mudanças geradas por todos os laboratórios.

3. Implementando a reinvenção

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RSP3.1. A seqüência das reformas

A primeira fase do NPR, conhecida na literatura temática como oRego I, foi concebida para implementar as seguintes iniciativas no interi-or das agências e departamentos do governo: downsizing;16

descentralização de funções e de autoridade; desregulamentação internae alteração dos padrões de prestação de serviços para o consumidor final.

No plano da implementação, este conjunto de atividades se voltoupara difundir programas de treinamento de funcionários federais no quese refere a padrões de atendimento ao consumidor, para a criação doslaboratórios de reinvenção, e ainda a formação de conselhos interagências,os quais seriam responsáveis por um sistema de monitoramento de infor-mações para o acompanhamento de 1.250 iniciativas de reinvenção denaturezas diferentes nas diversas agências e departamentos do governona sua fase inicial, a qual seria fundamental para elevar a accountabilitye performance do programa.

No que diz respeito às iniciativas de downsizing, o Rego I focalizou,na implementação de iniciativas em cortes de pessoal, a redução de proce-dimentos e regulações intraburocráticas em 50%, e ainda a introdução deprincípios e padrões para a prestação geral de serviços públicos pelasdiversas agências do governo.17 As primeiras recomendações sinalizarampara a redução de 252 mil funcionários federais,18 e redução estimadados custos com o governo em torno de $108 bilhões.

No período 1995-1999, a redução de custos com o governo foiplanejada a partir de quatro áreas de reinvenção: cortes em programasgovernamentais; redução de pessoal;19 desregulamentação interna; mu-danças na cultura organizacional; introdução de mecanismos de mercadono interior da burocracia e implementação de tecnologias de informação.

0

2

4

6

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10

12

14

1995 1996 1997 1998 1999

ano

$ bilhões

Alteração dos Padrões de IncentivosDesregulamentação Interna da BurocraciaTecnologia de InformaçãoCustos AdministrativosMudanças Individuais nas Agências

Fonte: Relatório NPR

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RSPAs metas programadas para a redução de custos por natureza de reformaestão apresentadas no Gráfico 2 abaixo. Os dados revelam que as inicia-tivas de alterações de padrões internos de incentivos, desregulamentaçãoe mudanças internas nas agências e departamentos deveriam produzir agrande parcela das reduções de custos programados com as reformas.

Gráfico 2: NPR — Estimativa de redução dos custospor natureza de reforma

No que tange a concepção da redução dos custos com o governo,estaria claro para os formuladores do programa que, no médio e longoprazo, os resultados efetivos das reformas dependeria em grande parte dograu de compromisso das agências ao programa proposto. Ajustes graduaise novas recomendações seriam de fundamental importância ao longo doprocesso dando o ajuste fino qualitativo (fine-tunning) das reformas, sobre-tudo aquelas de natureza menos tangível, como as mudanças nos processos,incentivos e cultura organizacionais. A redução dos custos com o governodeveria ocorrer a partir da contínua reinvenção das estruturas de incentivosinternas e comuns às agências e não apenas a partir de uma simples execuçãodas recomendações formuladas pelo programa.

No sentido de apreender como o NPR pretendeu atingir a reduçãode custos, é importante compreender como os formuladores do programapretenderam fazê-lo ao longo do tempo. Considerando todas as agências

no período 1996-2000 — a segunda fase do programa Rego II — comoapresentado no gráfico abaixo, a redução dos gastos públicos apresenta-ria três fases a saber: a primeira, que compreende o período de 1996 a1998, em que as reformas produziriam, caso bem-sucedidas, uma agres-siva redução dos gastos públicos. O período 1998-1999 seria estável,seguindo-se de uma nova redução agressiva de custos.

0

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RSPGráfico 3: Redução estimada dos gastos dogoverno 1996/2000 (Todas as agências)

3.2. A segunda fase da reinvenção: quando as reformas encontramas exigências da política

No segundo relatório lançado em 1994, Putting Costumers First:standards for serving for the american people, o objetivo programáticode funcionar melhor assumiu as principais iniciativas da agenda dereformas, dando continuidade às preferências da primeira fase. O gover-no federal havia conduzido o plano tático das reformas, estimulando asagências a trabalharem intensivamente numa mais precisa definição dosseus padrões de prestação de serviços, na alteração dos incentivos in-ternos e na promoção de difusão de poder e autoridade para os níveismais de ponta da organização.

Tal concepção teria uma forte dose de estratégia política. O gover-no Clinton pretendia utilizar suas energias iniciais num forte esquema de"incentivos" para o empowerment das agências, de combate ao red tape,e desregulamentação da burocracia, fazendo com que a visibilidade e oenvolvimento das partes do sistema federal se motivassem em torno dosobjetivos programáticos do NPR num primeiro momento.Deliberadamente, o governo partiria para políticas de reinvenção da cul-tura organizacional e das estruturas de incentivos internos como o pri-meiro golpe tático, o qual criaria o ambiente necessário para aimplementação dos cortes previstos de pessoal e dos custos, que viriaminevitavelmente na segunda fase da reinvenção.

Por outro lado, ao proceder num esforço primeiro em explorar aspossibilidades de fazer com que o governo funcionasse melhor, os estrate-gistas em Washington pretendiam minar possíveis resistências internasàs mudanças, ajustando as reformas ao modo específico de como cadaorganização cooperaria com as mudanças, o que em muito dependeria decomo "a política" das reformas se processaria no plano individual decada uma das agências e departamentos do governo.

No terceiro relatório do NPR, o Common Sense Government (1995),o governo federal introduziu mais 180 recomendações novas para asreformas. Neste relatório, os formuladores do programa difundem a noçãode que as reformas propostas pela administração Clinton seriam o modoconsensual pelo qual os agentes políticos e administrativos deveriamposicionar-se em relação à reinvenção do governo. Este momento seriacrucial para a administração Clinton e o seu programa de reformas, umavez que o novo Congresso eleito provavelmente exigiria maior

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RSPagressividade no combate aos custos com o Executivo, como prometidospelo governo Clinton. Certamente, as tensões políticas seriam decisivasnesta fase delicada das reformas.

A visão de que a reinvenção do governo representaria um consensopara os atores políticos no Executivo, no Legislativo e em outras organiza-ções de relevância (sindicatos, partidos, etc) seria apenas um rótuloestratégico para aliviar a batalha política entre o Executivo e o Legislativo,que viria ocorrer quanto ao encaminhamento e as preferências em tornoda condução das reformas do governo, e sobretudo, em relação aos cortesdos custos do governo. Até então, a administração Clinton e os estrate-gistas do programa de reinvenção teriam optado pela estratégia deimplementar o politicamente realizável, sem procurar criar fortes ten-sões com o poder Legislativo, sobretudo porque as reformas pretendiamalterar o modo de relacionamento entre os poderes Legislativo e Execu-tivo. Dado que no fundo das propostas do NPR estava explícito a amplia-ção da autonomia das agências administrativas, o novo Legislativo poderiacriar poderosas resistências à aprovação de legislação necessária paraimplementar as reformas pretendidas.

O primeiro round da batalha política entre o Legislativo e os formu-ladores do programa em Washington se tornou claro já em 1993, no mo-mento da definição das prioridades para o orçamento nacional, e conti-nuou de modo decisivo em 1995. Passados dois anos do início doprograma, em 1995, contrariamente às expectativas dos formuladores doprograma, apenas 66 das 280 recomendações propostas pelo programahaviam sido aprovadas pelo Congresso; 70% das propostas de legislaçãorelacionadas com a reinvenção estavam pendentes, demandando signifi-cativo esforço político. O montante correspondente a este conjunto delegislações representou, segundo relatórios oficiais, US$ 58 bilhões.

O apoio do Congresso de maioria democrática, sobretudo na pri-meira fase do programa, não se mostrou verdadeiro. Ironicamente, naaprovação do orçamento do ano fiscal de 1993, o Congresso apenas apro-vou uma tímida porção dos cortes propostos:

"A batalha na definição do orçamento de 1993 ajudou a definir oresultado das tensões internas do programa. Os senadores segura-ram os votos decisivos para aprovar os proposals da administraçãono orçamento. As barganhas da administração com os membros-chave do Congresso colocaram algumas das idéias de money-savingdo programa de lado. ... Como resultado, o fantasma da redução dodéficit inibiu qualquer promessa de transferir poder para os funcioná-rios no sentido de melhoria da performance. ... Na realidade haviaum conflito interno entre os objetivos de work better and cost less(...) durante o primeiro ano dos cortes de pessoal, 2/3 destes vieram

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RSPdo departamento de Defesa (...). Algumas outras agências atingirampequenas reduções de suas despesas. ...Em outubro de 1993, a admi-nistração condensou algumas de suas reformas no proposal H.R.3400, conhecido como o Government Reform and Savings Act.A administração estimou que tal proposal poderia produzir US$ 6bilhões em redução de custos nos próximos cinco anos. Entretanto,o Congressional Budget Office revisou a proposta do governo, eestimou que a redução dos custos deveria ser de apenas $ 2.5 bi-lhões, quantidade menor do que a metade do que o pretendido pelaadministração" (KETTL, 1995).20

Apesar dos esforços internos das agências para reinventar incenti-vos e a cultura organizacional das agências, tais medidas, por natureza,demandam um longo tempo para sedimentação e apresentam pouca visi-bilidade nos resultados atingidos. Dado que a visibilidade política dogoverno Clinton em um ambiente marcado por mudanças no Legislativoe as preferências políticas em torno das reformas se alteraram de modoradical: downsizing e combate aos custos com o governo passaram a sera prioridade do NPR. Tal preferência era coincidente com alguns dosformuladores mais radicais em Washington, os quais pressionavam o pre-sidente com o argumento de que sem a redução do tamanho do governoo NPR seria apenas mais um programa na história das reformas federaisnos EUA, e um provável malogro seria o cenário mais provável. Apesardos ganhos que adviriam com as mudanças na cultura organizacional, nomédio e longo prazo, o processo de cortes no tamanho do governo mos-traria uma dimensão inevitável das reformas. As mudanças na culturaorganizacional e desregulamentação das agências não gerariam os efei-tos-demonstração necessários no curto prazo para assegurar o objetivoprogramático de fazer com que o governo custe menos. Com a vitóriatática das forças de downsizing, o dilema passou a ser o de como realizaros cortes. A questão decisiva para os estrategistas pode ser resumida doseguinte modo: onde cortar o governo para que ele funcione melhor egaste menos, com maiores benefícios do ponto de vista político no apoioàs reformas no Congresso?

Tal questão viria a assumir mudanças drásticas na agenda de refor-mas, sobretudo considerando a possibilidade de que o novo Congressoseria republicano, dado que historicamente as bancadas partidárias sealternariam no meio de cada governo, independente do partido no po-der.21 A partir de novembro de 1994, momento em que o novo Legislativoseria eleito segundo as regras do jogo no sistema de governança nos EUA, o principal objetivo do governo quanto às reformas administrativas se-ria fazer valer a promessa de cortes significativos nas despesas do gover-no, abolindo departamentos, reduzindo o número de funcionários e uma

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RSPsérie de conhecidas estratégias de downsizing. Pela primeira vez, a capa-cidade política do governo seria testada para fazer valer suas intençõesde reinventar o governo.

3.3. O novo Congresso e a reinvenção do governo

A mudança das preferências na segunda fase das reformas estáfundamentalmente atrelada ao novo ambiente político que se configuroua partir de 1995. O novo Congresso republicano, marcadamente dispostoa maior agressividade na redução do tamanho do governo, viria a exigirmais esforços do presidente e de seu programa em torno da redução doscustos com o governo. A materialização institucional da posição de maioriarepublicana no Legislativo em torno das reformas se deu com a agendamontada em torno do Contrato com a América (Contract with America),um programa republicano visando restringir o papel e o poder do gover-no federal, estimulando privatização de funções e devolução de poder eautoridade para os estados e governos locais como alternativa para asreformas do governo federal.

As preferências políticas dos republicanos em torno das reformasno interior do Congresso se materializaram com a elaboração do conhe-cido Horn Report (HR), formulado pelo congressista Stephen Horn doestado da Califórnia, o qual assumiu o papel de presidente do Subcommiteeon Government Management, Information, and Technology, criado emsubstituição ao House Committee on Government Reform and Oversight,o qual ficou responsável pelas principais decisões em torno das reformasadministrativas no Congresso anterior. O novo subcomitê responsávelpelas reformas, o qual representa institucionalmente o locus do conflitopolítico em torno das reformas administrativas, como se verá adiante demodo mais detalhado, era de maioria republicana, juntamente com umaminoria de 23 democratas. A fragmentação das preferências políticas emtorno da questão se dividiu em duas posições bastante claras e conflituosas:os republicanos apoiavam as recomendações e as linhas programáticasdo Horn Report, e os democratas defendiam as do NPR.

Logo no início do ano de 1995, o subcomitê tomou a decisão derealizar um completo reexame da administração federal, na qual figura-ria uma completa revisão do NPR. Paradoxalmente, os republicanos pas-saram a defender uma posição em apoio a uma maior centralização,controle e hierarquização da administração pública, em diametral con-traste às posturas do programa original de reinvenção. Assim, configu-rou-se institucionalmente o grau de conflito em torno do programa. O

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RS

P

Fonte Carrol and Lynn (1996).

Quadro 2: Preferências políticas em 1995 para a reforma administrativa

Questão central Preferências do NPR (democratas)

Constitucional

Econômica

Política

Uso de Tecnologiade Informação

CulturaOrganizacional

Organização daGestão Federal

Quem deve ser responsável pelaadministração federal, em que aspectos,e de que modo?

Como a administração pública pode serreorganizada de modo a se ajustar aosnovos imperativos econômicos?

Qual o número apropriado e papel dospolitical appointees na administraçãopública?

Como promover uma revoluçãotecnológica na administração pública?

Que atitudes e valores devem serconsiderados mais relevantes de modoa melhorar a administração federal?

Qual será a melhor forma deorganização e gestão para o governofederal?

. Centralização reduz capacidade gerencial e performance.

. Associa devolução de autoridade com a estratégia para obtençãode resultados.

. Reduzir custos com o governo eliminando posições semreferência com missão ou papel do governo.

. Recuperar poupança e investimento público via cortes nogoverno como justificativa econômica das reformas.

. Redução dos cargos de carreira na administração federal.

. Aumento de poder e controle dos political appointees aliado a umamaior autonomia dos funcionários nas instâncias de contato diretocom os usuários e clientes das agências do governo.

. Accountability na gestão e coordenação da informação associadasà difusão de autoridade e descentralização.

. Uso estratégico de tecnologias de informação visando atingirobjetivos como redução de instâncias e tempo na tomada dedecisão no interior da burocracia.

. Desenvolver práticas gerenciais integradas voltadas para amedição da performance do governo.

. A questão central é como o governo funciona e não o que ogoverno faz.

. Estímulo ao corte de posições e cargos independentes do papeldo governo.

. Estímulo à descentralização e devolução de autoridade para asinstâncias mais periféricas da burocracia.

. Despreocupação com estruturas organizacionais.

. Esforços para uma mudança fundamental na cultura e nosprocessos gerenciais internos às agências.

Dimensão Preferências do HORN Report (republicanos)

. Ampliação do controle centralizada do Congresso e daPresidência sobre a administração federal.

. Administração por “obediência às regras”, e pela manutenção deestruturas hierárquicas.

. Crítica à abordagem ad hoc e instável proposta do NPR.

. A missão e papel do governo como questão central na reforma.

. Equilíbrio do Orçamento Público como justificativa econômicapara as reformas..

. Political appointees no alto escalão da administração produzreduzidos ganhos de expertise para a administração pública.

. Fortalecimento de programas de carreiras na administração federal.

. Propõe redução drástica do número de political appointees.

. Ampliação do papel do Office of Management na gestão ecoordenação centralizada do uso de tecnologia de informação nasagências e departamentos.

. Accountability na gestão e coordenação da informação nãonecessariamente associadas à difusão de autoridade edescentralização.

. Uso estratégico de tecnologias de informação visando atingirobjetivos como a redução de instâncias e tempo na tomada dedecisão no interior da burocracia.

. Desenvolver práticas gerenciais integradas voltadas para mediçãoda performance do governo.

. Compromisso e lealdade.

. Missão e papel do governo como norteadores da reforma.

. Forte apoio ao desenvolvimento de carreiras na burocraciafederal.

. Controle presidencial na gestão do governo federal.

. Apoio à posição tradicionalmente da administração pública.

. Combate a problemas de duplicação e superposição de atividadese responsabilidades entre departamentos e agências.

. Alinhamento e consolidação de programas das agências federaispor objetivos.

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RSPsinal dado pelos republicanos de oposição ao NPR, em uma leitura maisdetalhada, seria uma forma indireta de mostrar ao presidente e seus es-trategistas o descontentamento com a lenta tomada de decisão em rela-ção às políticas mais agressivas em relação aos custos do governo. Poroutro lado, tradicionalmente, os republicanos têm como preferência po-lítica uma visão hamiltoniana de governo, na qual o Executivo deve sercontrolado de modo mais centralizado, do que a visão jeffersonniana deself-governance e descentralização. Uma descrição panorâmica do mapade preferências políticas reveladas pelos dois grupos citados no subcomitêem torno das reformas é apresentada no quadro a seguir.

A resposta dos democratas à posição republicana de rever o NPRse deu de imediato, quando a minoria democrática composta por 19 mem-bros de um total de 23 democratas assinou um documento no Committeeon Government Reform and Oversight, propondo uma abordagem alter-nativa à posição do HR, e defendendo de modo ativo a posição do NPR.Assim consolida-se politicamente a estratégia do NPR de orientar o ser-viço público por padrões de melhor qualidade na oferta de serviços, deevitar interferência excessiva do Legislativo na burocracia, de garantirdescentralização, revisão dos incentivos internos das agências e departa-mentos do governo, entre outros pontos de interesse. A posição da mino-ria democrática converge para a hipótese de que a centralização ehierarquização burocrática representam elementos nocivos à eficiência eaccountability na administração do governo. A qualidade da administra-ção pública requer fundamentalmente uma descentralização de autoridadepara o Executivo, sobretudo para os gerentes públicos e funcionários nasinstâncias mais periféricas do governo.

Tais tensões no plano da política, no entanto, fariam com que o pro-grama finalmente se voltasse para um maior combate às estratégias dedownsizing.22 Ao assumir esta preferência para conduzir as reformas23 ogoverno Clinton entra numa mais trama complexa: o aprofundamento doscortes no governo poderiam, no curto prazo, gerar incentivos perversospara a qualidade no funcionamento da administração federal.

Especificamente, os cortes de pessoal poderiam fazer com que osmelhores e mais qualificados funcionários federais, sobretudo os de na-tureza political appointee, pudessem rapidamente migrar para outroscargos no setor privado, reduzindo a capacidade do governo em funcionarmelhor, paradoxalmente. Anunciando um programa agressivo dedownsizing, o governo poderia, paradoxalmente, entrar numa progressivaredução de sua capacidade de funcionar melhor.

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RSPContudo, o objetivo de reduzir o tamanho do governo se tornou ofoco central do NPR na fase Rego II. Os cortes no governo poderiam terimpacto no Legislativo para aprovação das reformas num congresso demaioria republicana, garantindo ainda a visibilidade do programa, e am-pliando as margens políticas de reeleição. O ano eleitoral, o novo con-gresso e as tensões internas acerca das reformas administrativas seriamos fatores decisivos para a mudança de preferências. A escolha políticapor downsizing seria, por outro lado, justificada a partir dos interesses dopresidente Clinton em garantir a reeleição. O ideário de encolher o go-verno a todo custo seria uma poderosa arma para conseguir o apoio elei-toral, tal qual o fizera em 1992 no plano do discurso, o candidato presi-dencial, Ross Perot, conseguindo aproximadamente 19% dos votos naseleições presidenciais.

4. Acessando resultados do programa

Nesta seção são apresentados alguns resultados da implementaçãodas reformas, em algumas variáveis de interesse, tais como: efetividadena redução dos gastos públicos; redução do número de funcionários fe-derais (nas categorias Schedule C e non-career); número e redução donúmero de political appointees nas agências do governo. Uma compreen-são do comportamento destas variáveis nos permitirá realizar compara-ções no tempo entre o NPR e outras experiências de reforma nos EUA, eainda, comparações entre agências e departamentos do governo em tornodos resultados obtidos em áreas específicas das reformas.

Quadro 3: NPR — Efetividade na redução dos gastos poragência e departamento em 1996

NPR — Efetividade na redução de gastos Redução Redução Efetividade

por departamento e agências (ano 1996) estimada efetiva

Agriculture 148 0 0%

Commerce 16 51 319%

Education 113 109 96%

Energy 820 1.673 204%

Health and Human Services 15 0 0%

Interior 29 6 21%

Labor 40 0 0%

Transportation 2.845 25 1%

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RSPTreasury 112 619 553%

Veterans Affairs 11 0 0%

Corps of Engineers 29 0 0%

Federal Emergency Management Agency 34 0 0%

National Aeronautics and Space 226 226 100%Administration

National Science Foundation 104 103 99%

National Business Administration 230 143 62%

Interstate Commerce Commission 4 4 100%

Federal Deposit Insurance Corporation 79 0 0%

Chemical Safety and Hazard 1 1 100%Investigation Board

All Agencies 4.856 2.960 61%

Fonte: Relatórios do NPR (Elaboração do autor)

Para uma primeira tentativa de avaliar a efetividade do programaem termos das agências e departamentos, procedeu-se a uma quantificaçãodo objetivo central do NPR: a redução dos custos. A questão central aquifoi perguntar como e em que intensidade cada departamento e agência dogoverno havia, num período de tempo significativo em relação ao início doprograma, conseguido reduzir os custos de acordo com as metasprogramáticas. Para tal avaliação, procedeu-se a uma comparação da redu-ção estimada (proposta pelos formuladores do programa) e a redução efe-tiva (consolidada em cada agência, segundo dados oficiais do OMB).O quociente entre a redução efetiva e a estimada nos fornece a efetividadepor agência. A efetividade global do programa foi considerada como arelação entre o total entre as mesmas variáveis para o total das agências.

Os dados apresentados revelam uma profunda diferenciação emtorno dos resultados atingidos. Isto revela que a redução dos custos tem aver com as especificidades dos universos políticos e organizacionais decada uma das organizações do governo. Tal evidência revela, de modobastante aproximado, como e por que o NPR tentou perseguir uma estra-tégia fragmentada de reformas. A alta variabilidade das agências e asiniciativas de redução de custos revelam, por outro lado, o grau de coo-peração e resistência à mudança. Em termos gerais, considerando todasas agências e departamentos do governo, a efetividade na redução dosgastos no ano de 1996 foi de 61%, mostrando que passados três anos,pouco mais do que a metade do estimado pelos estrategistas em Wa-shington, havia ocorrido no mundo real. Alguns departamentos, comoAgriculture, Health and Human Services (HHS), Labor, Veterans Affairs,Corps of Engineers, e outras agências menores mostraram uma nula re-dução dos gastos, revelando uma indiferença aos programas de redução

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115

RSPde custos neste ano. Por outro lado, departamentos como Commerce,Energy e Treasury mostraram elevadíssima efetividade, superando em

muito as expectativas dos programas. Algumas agências como a NASA eo Interstate Commerce Commission apresentaram efetividade 100%,correspondendo às expectativas do governo federal.

Após esta breve avaliação dos resultados relativos à redução doscustos, partiremos para avaliar os resultados obtidos pelas reformas noseu propósito de reduzir do número de funcionários. Os dados apresenta-dos no gráfico 4 abaixo mostram que a redução de funcionários revelauma tendência histórica das várias administrações americanas desde oano de 1970. Contudo, os dados mostram claramente que após a imple-mentação do NPR, o número de funcionários full-time declina para umponto mínimo em 1995, mostrando que o NPR apresentou uma maiorcapacidade de levar a cabo a tarefa de reduzir a força de trabalho nogoverno federal do que outras experiências de reformas.

Gráfico 4: EUA — Evolução do número de funcionáriosfederais 1940-1995

Uma análise mais cuidadosa da questão da redução do númerodos funcionários requer a compreensão do fator político no crescimentodo setor público federal. Para muitos analistas da administração federalamericana isto tem a ver com o alto escalão da burocracia, o qual temum número expressivo de political appointees,24 fazendo com que oscustos com o governo sejam elevados de modo considerável. Por outrolado, o número de political appointees revela em que medida as diversasinstâncias da burocracia são dependentes dos ambientes políticos. Utili-zamos aqui o número de political appointees nos diversos departamen-

0

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1000

1500

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ano

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116

RSPtos e agências do governo para interpretar o fenômeno de como o NPRconseguiu lidar com a dimensão política da burocracia. No sentido depermitir uma comparação dos resultados entre diferentes administrações,analisaremos as três gestões da década de 80: Reagan (1981-1989), Bush(1989-1993) e a gestão Clinton, no sentido de verificar a efetividade dogoverno em reduzir duas categorias específicas de political appointees:os Non-Career Senior Executive Service (SES)25 e o Schedule C 26 nonível de todas as agências e departamentos do governo.

Os dados revelam que o governo Clinton com o seu programa dereformas conseguiu manter estável o nível dos funcionários SES, fatoque não havia sido verdadeiro para as administrações Reagan e Bush,evidenciando o argumento de que o NPR conseguiu ser mais efetivo emsua relação com o universo político no que se refere a esta questão espe-cífica do que as experiências anteriores de reforma.

Gráfico 5: Funcionários non-career por administração(Reagan, Bush e Clinton)

Quando os dados relativos à redução dos SES por administraçãosão desagregados nos principais departamentos e agências do governo

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721 704 704

Reagan Bush Clinton

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início final

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117

RSPamericano, o que se verifica são as seguintes evidências: primeiro, aalta variabilidade dos resultados entre agências e departamentos, reve-lando o intenso grau de diversidade no que se refere à cooperação coma implementação das reformas. Isto revela, em grande medida, como osdiferentes “universos políticos” de cada uma destas organizações res-ponde às reformas propostas pelo governo federal; segundo, numa pers-pectiva comparativa simplificada, os dados revelam que a administra-ção Reagan conseguiu em sua gestão reduzir em apenas três agências —Energy (-12 funcionários ) , Labor (-1 funcionário), e Veterans Affairs (-2 funcionários) — ao mesmo tempo que os departamentos de Defesa,Justiça e Agricultura aumentaram significativamente o número de SES.A gestão Bush conseguiu reduzir o número de SES em sete departa-mentos. No NPR no entanto, apenas seis agências sofreram redução nonúmero de SES.

Quadro 4: Redução dos funcionários non-career poradministração e por agência

Agency Reagan Bush Clinton1980/1983 1988/1991 1992/1994

Agriculture 13 6 - 9

Commerce 2 - 4 12

Defense 28 16 16

Education 1 4 1

Energy - 12 19 - 4

EPA 5 6 3

General Service Administration 9 8 - 7

HHS 6 14 0

HUD 8 - 1 6

Interior 4 0 - 7

Justice 27 1 - 6

Labor - 1 - 3 9

NASA 8 - 1 0

OMB 5 - 5 3

OPM 6 - 5 2

State 5 12 - 5

Transportarion 4 - 3 2

Treasury 3 0 7

Veterans Affairs - 2 0 4

All Agencies 104 62 0

Fonte: OMB (1995). Budget of the United States Government: Historical Tables. Washington D.C.

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118

RSPQuando comparados os dados relativos aos funcionários do tipoSchedule C, como será mostrado no gráfico a seguir, observa-se que existena gestão Clinton uma reversão da tendência das gestões anteriores, qualseja de redução significativa no número de political appointees nestacategoria específica de funcionários.

Quando observados os dados oficiais relativos aos Schedule C nonível dos principais departamentos e agências do governo, verifica-seque tanto a gestão Reagan como a Bush reduziram o número destes fun-cionários em apenas seis agências, enquanto que a administração Clintona fez em 11, apresentando, portanto, uma maior capacidade de controlara expansão de tal categoria de funcionários. Novamente, vale a pena desta-car a intensa variabilidade de resultados por agência no tempo. Cadauniverso de reformas possui uma intensa diferenciação das capacidadesde lidar com as mesmas organizações.

Gráfico 6: Funcionários Schedule C por administração

Quadro 5: Redução dos funcionários Schedule C por administração epor agência

Agency Reagan Bush Clinton1980/1983 1988/1991 1992/1994

Agriculture 43 15 -18

Commerce - 18 38 38

Defense 15 20 26

Education 35 - 7 -13

Energy - 4 16 -31

administração

fun

cio

nár

ios

0200

400600800

1000

1200

1400

1600 12345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678123456781234567812345678

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14561595

1516

1714 1699 1613

Reagan Bush Clinton

1234123412341234

início final

1800

2000

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119

RSPEPA 8 16 - 1

General Service Administration 17 9 -10

HHS - 3 7 -19

HUD 7 - 1 23

Interior 9 0 0

Justice - 9 - 5 33

Labor - 18 22 1

NASA - 3 0 4

OMB 6 - 5 - 14

OPM 15 - 3 8

State 25 16 - 37

Transportarion 13 - 7 - 2

Treasury 5 43 - 15

Veterans Affairs 6 8 - 1

Fonte: OMB (1995). Budget of the United States: Historical Tables. Washington D.C.

Em termos da efetividade de implementação das recomendaçõespropostas pelo programa, os dados revelam que em 1996 aproximada-mente 750 das 1.500 recomendações gerais foram completamente reali-zadas nas agências e departamentos do governo. Tais iniciativasimplicaram a redução direta de 291 mil cargos públicos, possibilitandouma redução de despesas da ordem de 118 bilhões de dólares nos gastoscom a administração federal.

No que se refere à desregulamentação interna das agências, dadosoficiais revelam que, ao final do mesmo ano, as agências do governoreduziram cerca de 640.000 páginas de suas regulações e procedimentosinternos de funcionamento. As agências regulatórias reduziram aproxima-damente 16 mil páginas de suas regulações afetando o público, e reescreve-ram aproximadamente outras 31.000 páginas, no sentido de torná-las maisfacilmente entendidas. No que diz respeito aos padrões de prestação deserviços, as agências do governo ficaram absolutamente comprometidascom o governo federal em atender aos 3.500 padrões de prestação deserviços (customer service standards), melhorando a qualidade de ofer-ta de serviços ao consumidor. Ademais, o vice-presidente Al Gore pre-miou aproximadamente 800 "times de reinvenção", que trabalharam nosentido de promover as reformas no nível das agências e departamentosdo governo. As agências criaram, no período, mais de 300 laboratóriosde reinvenção, os quais promoveram significativos resultados, gerandoum sem número de experiências bem-sucedidas.

5. Considerações finais e pontos de interesse para asreformas em curso no Brasil

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120

RSPComo considerado anteriormente, o NPR traz para a administra-ção pública uma série de pontos inovadores que o diferencia de outrasagendas americanas para as reformas do setor público. O NPR promovemais do que reformas, um novo modo de lidar com a burocracia, com asorganizações e, fundamentalmente, com o modo de realizar as reformaspretendidas. O estilo descentralizado de promover transformações nomodo como o governo funciona, mostra-se decisivo, para uma maiorcapacidade de realizar mudanças.

Outro ponto importante a ser discutido é o fato de que muito emborao NPR apregoe o combate às formas burocráticas tradicionais, e apesarde ter o setor privado e o mercado como referências para a reinvenção dogoverno, os formuladores do NPR não afastam a idéia de que o governoe a administração pública são necessários e condições essenciais para ofuncionamento de uma economia de mercado. Este é um traço distintivodas reformas americanas. O governo tem um papel importante nas regrasdo jogo, no funcionamento da economia e da sociedade. Este princípiopermite admitir que mesmo indo radicalmente de encontro aos princípi-os de centralização, de obediência às regras e à regulação, o NPR preser-va o papel da burocracia e da administração pública, porém, sob novosprincípios de funcionamento, onde a qualidade dos serviços, a preocupa-ção com os custos e com a eficiência passam a ser para cada organizaçãoum elemento balizador das ações gerenciais.

O segundo ponto de interesse diz respeito às contradições trazidaspelo NPR. Se para os governos tradicionais funcionarem melhor represen-ta custar menos, o NPR aposta que isto depende em larga medida do padrãode incentivos internos das organizações. As organizações, como mostramos dados apresentados, respondem diferentemente às intenções de reformaspropostas pelo governo federal. A lógica descentralizada e de estímulo aoconhecimento e transformação gradual das estruturas de incentivos foi omodo como os formuladores driblaram as possíveis tensões políticas emtorno das reformas. Os objetivos aparentemente contraditórios do progra-ma adquirem uma lógica clara que tem a ver com a seqüência deimplementação: os ganhos com a mudança dos incentivos seriam mais fa-cilmente introduzidos na primeira fase, e as reduções de custos com o go-verno, a qual dependeria em muito do Legislativo e das tensões políticasque viriam no processo, seriam mais complicadas. O plano de implemen-tação das reformas, conduzidas pelos estrategistas em Washington, revelaque o duplo objetivo permitiria enfrentar nas dimensões micro (no interiordas organizações e nos seus ambientes políticos específicos) e macro (noLegislativo), todas as formas de resistências políticas que poderiam minaros programas de reforma. O tom fragmentado à reinvenção se mostra uminstrumento estratégico para lidar com as resistências políticas, e ainda o

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121

RSPúnico mecanismo capaz de permitir a transformação dos incentivos sob osquais as organizações funcionam na realidade.

O NPR por ser praticamente um programa agency-based permiteque os princípios e as técnicas utilizadas para a reinvenção busquem, basea-das nos diversos ambientes organizacionais, encontrar linhas de menorresistência e de maior adaptabilidade às demandas específicas de cadaorganização. Longe de assumir a tradicional noção de que a reinvençãodeveria ser homogênea em relação às técnicas a serem utilizadas, dos re-sultados, ou desencadeadas a partir de um esquema único, centrado emcortes de custos, o programa buscou formas flexíveis para entender e alteraros padrões de incentivos de cada instância, propondo diferenças terapêuti-cas para problemas gerenciais e organizacionais diferenciados, porémrealizados dentro de uma lógica geral de coordenação.

Fez-se necessário entrar numa permanente reinvenção em cadaagência, procurando ver como tais organizações respondem a diferentespadrões de incentivos, ampliando simultaneamente os níveis deaccountability e a qualidade no atendimento às demandas dos cidadãos-consumidores. Em termos gerais e de relevância para o caso brasileiro,foi a seqüência com que o NPR foi sendo implementado: em primeirolugar, partindo de uma maior preocupação com mudanças na culturaorganizacional, empowerment dos funcionários e satisfação para o clien-te. Em seguida, as políticas de downsizing foram sendo introduzidas emcombinação a mudanças na cultura organizacional e no padrão de incen-tivos das organizações do governo. Esta combinação permanente permi-tiu "calibrar" as demandas das reformas, sempre ajustando melhoria daperformance à questão da redução dos custos.

Tal seqüência geral confere especificidade ao programa, e traz àtona a noção de que a redução do tamanho do governo se apresenta numadimensão quase inevitável das reformas administrativas, e que o caso ame-ricano não se constitui exceção. No entanto, mesmo na experiênciaamericana, e que serve como ponto de reflexão para o caso brasileiro, al-gumas questões relativas aonde cortar o governo, por onde começar, e quaisos riscos e impactos envolvidos nestas políticas são issues revisitadas nes-tas iniciativas. No caso do NPR, tais questões foram problemáticas, e nãotem sido fácil implementar os pretendidos objetivos de downsizing. Assu-me relevância a habilidade política para lidar com as poderosas coalizõescongressionais no sentido de obter cooperação. A experiência do caso doNPR aponta para um forte embate entre o tecnicamente planejado e o po-liticamente realizado. Diante de conflitos, a dimensão do politicamenterealizável parece ser uma agenda plausível de encaminhamento das refor-mas. O avanço das reformas sobre dois importantes fronts permite, emgrande medida, manobras para encontrar no momento adequado as linhasde menor resistência, ganhando tempo na implementação das reformas.

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122

RSPHabilidosos formuladores de reformas não deveriam esquecer a dimensãopolítica delas, o que exige bastante flexibilidade tanto no plano técnico deimplementação como no de formulação das mesmas.

Por outro lado, a engenharia institucional do NPR, tal como aquestão das mudanças na cultura organizacional e das estruturas de in-centivos das organizações do governo, embora não enfrentando da mes-ma maneira as resistências reais do Congresso, e dependendo mais dograu de envolvimento individual de cada agência com os objetivos geraisdo programa de reformas, serve como referência e reflexão para o casobrasileiro. A busca do conhecimento acerca dos padrões de funciona-

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123

RSPmento, dos padrões gerenciais e das estruturas de incentivos, como per-seguido pelo NPR, mostra que o conhecimento institucional das realida-des das diversas organizações que compõem o governo constitui um fa-tor de sucesso para as reformas administrativas. Outro ponto a ser desta-cado aqui é o fato de que a permanente preocupação de "entrar na reali-dade das organizações", entender os padrões internos de funcionamentodas organizações, ajustar as reformas ao dia-a-dia das organizações, temem muito a ver com o espírito das reformas do NPR, e serve como pontode reflexão para as reformas no Brasil. Se o NPR traz para o Brasil umensinamento, este é o de entender melhor as organizações, encontrar osmecanismos adequados para as reformas antes de entrar em combate comos problemas burocráticos crônicos. Primeiro, entender; segundo, reme-diar; e terceiro, ter habilidade política para eliminar excessos.

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124

RSPLista de anexos

Data de im-plementaçãodo programa

1905-1909

1910-1913

1921-1924

1936-1937

1947-1949

1953-1955

1953-1968

1968-1971

1977-1079

1982-1984

1993 -

Presidente

TheodoreRoosevelt

WilliamTaft

WarrenHanding

FranklinRoosevelt

HenryTruman

DwightEisen-hower

DwinghtEisen-hower

RichardNixon

JamesCarter

RonaldReagan

WillianClinton

Partido

Republicano

Republicano

Republicano

Democrata

Democrata

Republicano

Republicano

Republicano

Democrata

Republicano

Democrata

Programa dereformaadministrativa

Keep Commis-sion

President’sCommission onEconomy andEfficiency

Joint Commis-sion onReorganization

President’sCommision onAdministrativeManagement

First HooverCommission

Second HooverCommission

Study Commis-sion onExecutiveReorganization

Ash Council

Carter Reor-ganizationEffort

Grace Commis-sion

NationalPerformanceReview

Missão e objetivoprogramático

Gestão de pessoal esistemas de informação

Definição doOrçamento dasAgências do Executivo

Redistribuição defunções executivasentre departamentos

Gestão de Pessoal,formas de contrataçãode serviços, e Gestãode Informação

Orçamento Nacional

Redistribuição deFunções no Executivo.

Reorganização doSistemaAdministrativo

Reestruturação doExecutivo

Reorganização dosprocessos internos dogoverno

Controle de Custoscom o Governo

Reinventar Governo:funcionar melhor ecustar menos.

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RSPAnexo 1: Breve cronologia dos programas federais de reformas no Executivo america-no (1905-1993)

Principais iniciativas

Organizaçõesvoltadas para aperformance

Definição dosserviços prestadospor cada agência

Parceriasregulatórias

Performance-based partnershipgrants

Mudanças nasrelações detrabalho

Objetivo Geral

. Aumentar níveis de accountability. Orientação porresul- tados e qualidade

. Melhorar relação entre as agências do governo e clientela

. Reduzir ineficiências decorrentes da ação regulatória dogoverno. Melhorar a capaci- dade de enforcement do governo.

. Estimular o desen- volvimento de par- cerias entre três níveis de governo em áreas de políticas públicas de respon- sabilidade de mais uma esfera de gover- no, evitando super- posição de compe- tências.

. Reformar padrões de incentivos nas relações entre fun- cionários públicos e agências do governo, visando orientação por resultados, performance e qua lidade dos serviços prestados ao consu- midor final.

Natureza da mudança

Alterar estruturainterna de incenti-vos nas agênciasdo governo.

Definir serviços aserem prestados porcada agência edepartamento

Alterar padrões deregulação pública,alterandoincentivos eestruturas de re-gulação de agênciase entre agências.

Melhorar as rela-ções entre as esfe-ras de governovisando melhoresresultados, e am-pliando o uso qua-litativo de recursosfederais.

Alterar padrões deregulação nas rela-ções entre funcio-nário público e oserviço em áreascomo: acesso aocargo, salários, egestão interna depessoal.

Ação realizada (1996)

Criação de Perform-ance BasedOrganizations (PBO)

Desenvolver emcada agência pa-drões de prestaçãode serviços(customer service)

Estimular o uso deiniciativas envol-vendo regulaçãoconjunta entreagências, e evitaras relaçõesadversariais entre osetor público eprivado.

Associar dotaçõesfederais a formaçãode parcerias eperformance; for-mação de parceriasentre agênciaslocais e federais.

Investir na força detrabalho;Alterar regulaçõesajustando incenti-vos às especificida-des de cada agênciae ao padrão deserviços a seremprestados.

Fonte: Relatório do NPR.

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126

RSPAnexo 2: NPR - Reinvenção do governo: iniciativas, objetivos, mudanças e ações rea-

Principaisproblemas

. Centralização e reduzida capa- cidade do siste- ma empromover eficiência e accountability.

. Agências têm reduzido poder decisório sobre padrões de ges- tão dos seus funcionários.

. Inflexibilidade nos critérios de classificação ede remuneração.

Evidências

. Performance tem reduzida conexão com objetivos e missão das orga- nizações.

. Gerentes têm redu- zida capacidade de aproveitar as melho- res capacidades dos funcionários.

. Accountability redu- zida ao atendimento a procedimentos, comandos e normas, pouco tendo a ver com a performance individual dos fun- cionários.

Necessidade demudança

. Redefinir o significado da accountability.. Associar accountability ao mérito, a missão e ao senso de orienta- ção pela eqüidade e igualdade de opor- tunidades.

. Agências devem ter seus próprios siste- mas de gestão de pessoal, adaptado às especificidades de seus objetivos e cultura organizacio- nal.

. Aumentar poder e responsabilidade dos executivos e gerentes federais no design e elaboração dos sistemas de gestão de pessoal.

. Qualidade e efetivi- dade do sistema de gestão de pessoal deve ser mensurado em termos do que este produz em termos da missão, objetivos e priori- dades das agências.

Recomendações geraisdo NPR

. Criação de sistemas descentralizados de gestão de pessoal voltados para auto- nomia, accountabil-ity e performance.

. Reformulação do sistema de classi- ficação de pessoal.

. Estímulo a progra- mas de melhoria do ambiente e das rela- ções de trabalho no interior dasagências.

. Orientação pelos princípios de igual- dade de oportuni- dades no atingimento de resultados e performance individual.

. Formação de parce- rias entre gerentes e trabalhadores no design dos sistemas de incentivos.

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127

RSPlizadas em 1996

Problemas

. Centralização das decisões no Office of Personnel and Management (OPM).

. Reduzida capacidade para atender às necessi- dades dos seus usuá rios.

. Pouco estímulo a compe- titividade na seleção e avaliação de candidatos.

Evidências e impactos

. Reduzido envolvimento dos gerentes no recruta- mento, seleção e avalia- ção dos candidatos.

. Aplicantes são deses- timulados.

. O sistema estimulalon- longo tempo para efe- tivar a contratação de pessoal;

. Complexidade do sis- tema gera a necessi- dade de pessoal alta- mente especializado para interpretação e aplicação das normas.

. Ênfase no princípio da eqüidade interna reduz capacidade do governo em competir por recur- sos humanos adequa- dos no mercado.

. Reduzidos incentivos para inovação.

Necessidade demudança

. Autorizar as agências para estabelecer seus próprios mecanismos de recrutamento de pessoal.

. Permitir que os departa- mentos e agências deter- minem suas próprias necessidades de recru- tamento de pessoal.

. Permitir que os departa- mentos e agênciassejam responsáveis diretamen- te pela contratação de pessoal.

. Permitir que os funcio- nários em regimetempo- rário busquem competir por regime de perma- nência no trabalho, de acordo com procedi mentos determinados internamente.

. Criar uma estruturageral de qualificaçãopermitin- do que as agências e departamento progressi- vamente alterem seus padrões.

. Eliminar as regras esta- tutárias acerca de posi- ções de regime tempo-rá- rio de trabalho.

. Promover um sistema geral de informações sobre oportunidades de emprego no governo federal.

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128

RSPAnexo 3: Sistemas de gestão de pessoalAnexo 4: Sistemas de contratação de pessoalBox 1: O sistema americano de melhoria da performance individual e das organiza-ções do governoBox 2: Mecanismos institucionais para o controle do gasto e déficit público no governoamericano (1974-1993)

Anexo 1: Breve cronologia dos programas federais dereformas no Executivo americano (1905-1993)Adaptação de Di Iulio, Kettl and Garvey (1993). Improving Governmental Performance: an owner’s manual.

Washington D.C. Brookings Institution.

Anexo 2: NPR — Reinvenção do governo: iniciativas, objetivos,mudanças e ações realizadas em 1996

Anexo 3: Sistemas de gestão de pessoal

Fonte: Relatório do NPR.

Anexo 4: Sistemas de contratação de pessoalFonte: NPR — Vários relatórios (elaboração do autor).

Box 1: O sistema americano da melhoria da performanceindividual e das organizações do governo

Nos Estados Unidos, o setor público e suas organizações desde oCivil Service Reform Act de 1978 funcionam de modo orientado pelaperformance e desempenho individual. Para tal, o governo federalestabeleceu a criação de sistemas de gestão da performance para osfuncionários federais, os quais associam o salário à performance indivi-dual no trabalho. Tal sistema foi montado de modo a funcionar como umveículo para a melhoria da performance individual mediante a melhoriadas comunicações relativas à performance esperada dos funcionários esupervisores. Um plano de trabalho anual, contendo os elementos críti-cos e os padrões de performance, tem sido o elemento orientador do pla-nejamento individual das agências e do acompanhamento dos trabalhos.Um sistema de permanente feedback, vindo de cada supervisor, alimentaas informações para a produção de um sistema de feedback para os funcio-nários, e ainda para a produção de informações de um relatório finalanual. As decisões gerenciais nas promoções, premiações, treinamento eretenção estão ligadas diretamente ao processo de gestão da performance.Atualmente, existem sistemas separados de gestão da performance parasupervisores e para gerentes gerais (general managers), os quais são in-

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RSPcluídos no Performance Management and Recognition System (PMRS).Os funcionários são incluídos no General Schedule.

Em maio de 1993, o Office of Personnel Management produziuum relatório de trabalho, o Principles and Features of PerformanceManagement Reform, visando mudanças nos sistemas de performance,cujas recomendações eram em alguma medida bastantes similares àquelasgeradas pelo programa National Performance Review. O diagnóstico detal relatório era de que os sistemas existentes de performance, na pers-pectiva de instituições como o General Accounting Office, Merit SistemProtection Board, National Academy of Public Administration, NationalResearch Council, e outros, haviam progressivamente perdido suas ca-pacidades de melhorar a performance individual e das organizações. Osfatores principais que haviam produzido tal condição eram de diversasnaturezas, os quais poderiam ser listados da seguinte forma:

1) Os sistemas de gestão da performance haviam sido dimensio-nados para atender múltiplos, e por muitas vezes, propósitos conflitantes.

2) Os sistemas operam para o governo como um todo, são bastanteinflexíveis, e não suficientemente adequados para atender às necessidadesvariáveis das diversas culturas organizacionais das agências federais.

3) Os sistemas não são internalizados pelos gerentes que têm defazer com que estes funcionem, mas, sim pelo Office of PersonnelManagement.

4) Ênfase exagerada em lidar com aqueles que têm performanceconsiderada baixa, e ao mesmo tempo, insuficiente ênfase na melhoriada performance da maioria dos empregados que têm expectativas sobreaquilo que eles podem fazer melhor no futuro.

5) Os sistemas são percebidos como sistemas de controle top-down,ao invés de serem instrumentos para dotar os funcionários de poder, eainda os supervisores para melhoria da performance.

6) Ênfase na performance individual, e pouco suporte aos esforçosemergentes para o gerenciamento de grupos e performance organizacional.

7) Os funcionários federais sempre se reportam aos sistemas comotendo comunicação inadequada das expectativas da performance, e aindasobre o feedback do sistema para os funcionários.

8) Existem problemas na classificação das performances, nasquotas, e percepções negativas acerca de um sistema satisfatório que per-mita a classificação pela performance.

9) Os relatórios de performance representam sempre uma ameaçaao funcionário e ao supervisor, inibindo as oportunidades de comunica-ção efetiva entre eles.

10) Os escores de performance são geralmente pensados para sereminflacionados, não revelando os verdadeiros esforços individuais, e ain-

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RSPda não são igualmente distribuídos de acordo com critérios como forma-ção profissional, sexo, ocupação, locação geográfica, e por agência.

De modo a lidar com tais pontos críticos, o NPR considera comosistema ideal de gestão da performance aquele que funciona centradonum único objetivo: a melhoria da performance individual eorganizacional. As agências do governo devem ser estimuladas a desen-volver programas de gestão de performance, dimensionados para aten-der suas necessidades individuais e em sintonia com suas culturasorganizacionais. Tais programas procurarão melhorar a performance detodos os funcionários, e não apenas aqueles que atingem padrões espera-dos de performance. Os funcionários e seus representantes serão envol-vidos na concepção e implementação de programas de gestão daperformance. Os sistemas internos de feedback, durante e no final doperíodo, devem ser orientados pelo princípio de como melhorar aperformance futura. Para reforçar a ênfase em tal princípio, os sistemasde rating da performance, assim como as premiações, devem serdisassociados e independentes. As decisões relativas ao reconhecimentodevem incluir fatores específicos para o trabalho de grupo, missão e cul-tura das organizações.

O NPR assume como necessárias as seguintes ações:a) autorizar as agências a elaborarem os seus próprios programas

de gestão da performance (to design);b) implementar programas de gestão da performance baseado nos

seguintes princípios:— melhoria da performance individual e organizacional;— os funcionários e/ou seus representantes devem estar envolvidos

na concepção e implementação dos programas, bem como no desenvol-vimento da performance esperada, e receber feedback pela melhoria daperformance futura;

— no mínimo, dois níveis de performance devem ser identifica-dos: atingir ou não as expectativas;

— descentralização da gestão da performance dentro de uma estru-tura de princípios gerais para todo o governo porém, atendendo às neces-sidades individuais de cada agência;

c) as agências devem ser capazes de desenvolver seus programasindividuais de gestão da performance voltados para todos os funcionári-os, e essencialmente gerenciados e controlados pelos gerentes das agên-cias.

Box 2: Mecanismos institucionais para o controle do gasto edéficit público no governo americano (1974-1993)

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RSPO ano de 1974 introduz uma profunda mudança no sistema polí-tico-institucional americano no que se refere às relações de poder nasdecisões sobre o processo orçamentário, visando eficiência e racionalidadeno uso de recursos públicos, e por conseqüência, um maior compromissodo Legislativo e do Executivo nesta questão. Neste sentido, o Congressoaprovou o Budget Impoundment Act, o qual introduz dispositivos permi-tindo uma maior racionalidade e controle do Legislativo sobre o proces-so e as questões orçamentárias, alterando as relações históricas entre oPresidente e o Congresso na definição do Orçamento Nacional. Com asinovações trazidas pelo Budget Impoundment Act, as decisões congres-sionais relativas ao orçamento foram altamente descentralizadas para oscomitês e subcomitês na House of Representatives e no Senado, ao mes-mo tempo que ampliou a difusão da informação sobre o orçamento entreos membros do Congresso. A partir de então, verifica-se, no Congresso,um maior controle sobre as propostas orçamentárias do Presidente. OBudget Impoundment Act regulou as decisões no processo orçamentárioaté 1984, quando o presidente Reagan introduziu novas e mais mudançasinstitucionais radicais com a formulação de um novo mecanismo, especial-mente elaborado para lidar com a redução dos gastos públicos em 1985.O Congresso americano aprovou, em 1985, o Gramm-Rudman-HollingsAct, conhecido como o Balanced Budget and Emergency Deficit ControlAct, o qual ampliou a participação do Legislativo introduzindo um dis-positivo automático dos cortes nos gastos públicos, caso os históricosconflitos entre Presidência e Legislativo se tornassem muito longos nadefinição do orçamento nacional, sobretudo no que se refere aos cortesdos gastos nas agências do governo. Com as novas regras do jogo, opresidente e o diretor do Office of Management and Budget (OMB),juntamente com líderes do Congresso, ficaram responsáveis por encon-trar acordos sobre pontos conflituais na definição das prioridades do or-çamento, sobretudo no que se refere ao nível de gasto e controle do défi-cit. A principal inovação institucional do Gramm-Rudman está no con-trole do déficit público, onde o orçamento nacional passou a ser definidode modo a que os déficits anuais sejam progressivamente reduzidos até oponto em que o déficit público seja zerado e equilibrado o orçamento. OGramm-Rudman tornou claro para os atores institucionais, que, em casode insucesso na redução do déficit público num dado ano fiscal, umcorte generalizado em todas as agências (este processo é chamado desequestration) seria realizado indiscriminadamente pelo Legislativo, atra-vés do General Accounting Office (GAO), em todas as agências do Exe-cutivo. Em 1986, dado o intenso poder dado ao GAO neste novo meca-nismo institucional, a Supreme Court declarou o ato de 1985 inconsti-tucional, alegando que a responsabilidade no processo de seqüestro derecursos deveria ser exercida por uma agência do poder Executivo e nãopelo Legislativo. As revisões do Gramm-Rudman, no sentido de torná-loconstitucional, foram atendidas em 1986, e permanecem até hoje. Nestanova versão, o Gramm-Rudman transfere o poder de seqüestro do GAO

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RSPNotas

1 Este trabalho foi especialmente realizado no contexto da pesquisa sobre ExperiênciasInternacionais de Reformas Administrativas na Escola Nacional de AdministraçãoPública — ENAP/BR. Sou devidamente grato à orientação recebida do prof. TheodoreLowi na Cornell University durante a fase de preparação do material necessário àpesquisa bibliográfica, e sobre a condução do estudo, durante o estudo independen-te em políticas públicas sob sua supervisão no fall de 1997. Ainda sou grato aoscomentários e sugestões da Diretoria de Difusão e Pesquisa — DPD, os quais foramindispensáveis para que o trabalho assumisse esta forma final.

2 A fonte primária do trabalho corresponde aos relatórios oficiais gerados pelo NationalPerformance Review ao longo de suas fases. As fontes secundárias aqui utilizadas sãovárias: para as séries históricas de dados apresentados nos gráficos ao longo do texto,quando não especificadas as fontes, são os documentos oficiais do Office ofManagement and Budget (OMB), General Accounting Office (GAO), livros, artigosde jornais, documentos congressionais e ainda artigos publicados sobre o tema nasprincipais revistas especializadas sobre políticas públicas e administração públicanos Estados Unidos.

3 Diversas análises e estudos realizados sobre o NPR consideram que uma avaliaçãoprecisa dos resultados dos NPR, dado sua natureza extremamente fragmentada, trata-se de tarefa de difícil mensuração objetiva, sobretudo no que se refere à parte maisqualitativa do programa de reformas. Seguindo tal recomendação analítica, este tra-balho apresenta um reduzido painel quantitativo com resultados alcançados pelo pro-grama, servindo apenas para inferir de modo geral de como os objetivos programáticosdo NPR foram processados de modo diferente nos diversos setores do governo, bemcomo cada um destes setores respondem de modo diferenciado ao programa de refor-mas, e não como elementos que permitem avaliar normativamente o programa, obje-tivo que transcende em muito aos propósitos deste trabalho.

4 No anexo 1 é apresentado uma síntese da cronologia das reformas administrativasnos EUA, considerando os seus objetivos e missão programática.

5 A expressão reinventar o governo se constituiu na base do discurso das reformasClinton. Tal expressão é claramente tomada emprestada do livro Reinventing theGovernment: How the Entrepreneurial Spirit is transforming the Public Sector, es-crito por David Osborne e Ted Gabler em 1992. Neste período, o presidente Clintonestava em campanha presidencial, e foi de pronto atraído pela idéia da reinvenção, aqual já vinha sendo há muito aplicada em diversos governos locais dos EUA comconsiderável sucesso. A influência de tais idéias na formulação do programa pode sermelhor entendida quando David Osborne integrou a equipe de consultores durante aelaboração do primeiro relatório do NPR em 1993.

6 A expressão work better and cost less aparece no discurso oficial do programa e é omotivo central do programa de reinvenção, em todas as suas fases. Na expressão,estão presentes os objetivos principais (as forças motrizes) desta política pública, eque em si encerram uma forte tensão dado o grau de conflito entre funcionar melhore custar menos, como será explorado adiante.

7 No original "The goal of the NPR is to provide the American People with a moreeffective, efficient and responsive government — a government that works better andcosts less. The NPR began in March 3, 1993, when I asked Vice President Al Gore toconduct an intensive 6 months review of how the Federal Government works. The

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RSPVice President organized a team of Federal employees from all the corners ofgovernment to examine both agencies and cross-cutting systems, such as budgeting,financial management, procurement, and personnel”. Cf. Congressional Record, p.S14380 — Report of Proposed Legislation entitled "Government Reform and SavingsAct of 1993: Message from the President", MP 62. (House and Senate, October 26,1993).

8 Após a elaboração do primeiro relatório, a equipe técnica ficou responsável pelaimplementação de diversas iniciativas nas agências do governo, tais como: treina-mento de funcionários federais sobre serviços de atendimento ao consumidor-cida-dão; criação dos laboratórios de reinvenção; reorganização das funções nas estrutu-ras organizacionais e administrativas, e ainda apoiando na criação dos ConselhosInter-Agências, tais como o National Partnership Council, the President Management,e.g.

9 No Box 2 em anexo são apresentadas as principais especificidades dos mecanismosinstitucionais utilizados pelo governo americano desde os anos 70 para controle dodéficit e do gasto público. De acordo com os mecanismos institucionais disponíveisdesde 1985, o OMB passou a ter um elevado papel no controle e na definição daagenda alocativa do governo, sobretudo no seu poder constitucional de exercer osequestration como mecanismo automático de redução do déficit público nos EUA apartir do governo Reagan.

10 Um dos fundamentos teóricos que apóiam a idéia de que as organizações do governo,em alguma medida, podem funcionar a partir de mecanismos de mercados é a princi-pal-agency theory, no campo da economia institucional e teoria das organizações, eainda na economia do trabalho. Nesta perspectiva téorica, os argumentos vão nadireção da correlação positiva entre introdução de incentivos de mercados nos con-trato e ganhos de eficiência. Neste sentido, os incentivos contratuais fazem a diferen-ça nas relações entre entre a ação individual e organizacional, sobretudo no que serefere a problemas de compliance. A literatura aponta alguns conhecidos sistemas deincentivos nos contratos: pay for performance, contratos lineares, não lineares, e.g.Uma essencial revisão da literatura recente ver GIBBONS, Robert (1996). Incentivesand Careers in Organizations. National Bureau of Economic Research, ou. ainda,Gibbons, Robert (1996). Game Theory and Garbage Cans. Ithaca. Cornell University.mimeo.

11 Um amplo panorama das principais correntes teóricas da economia das organizaçõese instituições, ver FOSS, Pal (ed) (1995)., Economic Approaches to Organizationsand Institutions: an Introduction. Brookfield. Dartmouth.

12 No Anexo 2, apresentado no final do texto, pode ser visualizado uma panorâmicaexposição sumária das iniciativas, objetivos, natureza da mudança e açõesimplementadas no ano de 1996. Para maiores detalhes sobre tais iniciativas específi-cas cf. http://www.npr.gov, ou ainda consultar os relatórios de acompanhamento doprograma.

13 Em anexo é apresentado o Box 1 — O Sistema americano de melhoria da performanceorganizacional e individual, o qual traça em breves linhas uma história do modeloamericano de gerenciamento de performance na organização pública desde o CivilService Reform Act de 1978, suas falhas, e ainda as principais propostas gerais detransformação sugeridas pelos formuladores do NPR.

14 Um amplo panorama das reformas administrativas no setor público em diversos go-vernos locais e centrais europeus pode ser encontrada em NASCHOLD, Frieder (ed)(1996). New frontiers in public sector management: trends and issues in state andlocal government in Europe. New York: Walter de Gruyter. Em breves linhas, asreformas do setor público na Nova Zelândia e Inglaterra apresentam pontos comuns

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RSPem termos dos princípios, porém diferem em alguma medida nas técnicas utilizadaspelos reformistas. No primeiro caso, pode-se observar um radical movimento nadireção da reengenharia no setor público através da introdução de mecanismos demercado para o funcionamento das agências do governo. No caso inglês, a orienta-ção das reformas seguiu o caminho mais próximo da privatização radical, de meca-nismos de mercado e de modernização interna das agências do governo.

15 No que se refere aos padrões de prestação dos serviços, vale salientar, por exemplo,que em 1994, uma das maiores iniciativas do programa foi a de ajudar as agências adefinir os seus padrões de prestação de serviços (customer service standards). Emnúmeros, os dados oficiais revelam que um ano depois do primeiro relatório doNPR, aproximadamente 150 agências do governo haviam definido com precisãomais de 1.500 padrões de serviços a serem prestados. No ano seguinte, 214 agênciasdo governo haviam produzido cerca de 3.000 padrões de serviços. Tal detalhamentodos serviços a serem prestados aos consumidores possibilita, em grande medida,definir claramente o que cada componente do setor público será responsável perantesua clientela e com qual padrão, gerando, assim, maior possibilidade de ampliar osníveis de accountability.

16 A idéia de downsizing, i.e., reduzir o tamanho do governo, continuaria de modo maisforte assumindo a posição central das preferências do formuladores doNPR durantesua segunda fase de implementação em 1995. Naquele momento, os resultados preten-didos pela primeira fase da reinvenção não haviam sido de longe conseguidos, eainda haviam grandes imprecisões no que se refere às mudanças nas preferênciaspolíticas do Congresso, o qual exerceria uma nova demanda por reformas, especial-mente caso este se constituísse de uma maioria republicana conservadora em termosde governo e gastos públicos. Para uma compreensão deste momento específico, vero relatório produzido por Kettl, Donald and John Di Iulio Jr (1995). CuttingGovernment. Washington D.C. Brookings Institution.

17 Os Anexos 3 e 4 mostram de forma breve e esquemática os problemas, os pontoscríticos nos sistemas de gestão e contratação de pessoal nos EUA, bem como anatureza das mudanças propostas com as reformas do NPR.

18 De acordo do OMB, o número de funcionários federais (Full-Time Equivalent —FTE) em 1993 era de 2.139.000. O número total de funcionários federais, incluindooutras categorias e political appointees atingia a marca de 2.157.000 funcionários,sendo que 42% destes pertenciam no Departamento de Defesa. Cf. OMB (1997).Budget of the United States Government: Historical Tables. Washington D.C

19 O corte de pessoal, de acordo com fontes oficiais, foi um dos pontos que demandouintenso esforço dos decisores em Washington, dado o grau de risco e incerteza quan-to os impactos de tais iniciativas sobre o funcionamento da administração pública,bem como pelo custo político de tais medidas. O elevado grau de incerteza em rela-ção aos cortes se daria na medida em que os formuladores do programa não tinhamuma sólida base empírica para efetuar tais cortes de pessoal. O Relatório Horn, ela-borado pela maioria republicana pelo subcomitê responsável pelas reformas admi-nistrativas, expressa profunda crítica a tal imprecisão na proposta do NPR. Além dasincertezas acerca de em que setores da administração seriam realizados os cortesnecessários, estas eram também relativas a natureza de funcionários que seriam oalvo das reformas. Em linhas gerais, o diagnóstico dos relatórios oficiais do progra-ma colocavam que os middle managers seriam o alvo de tais iniciativas. Tal diag-nóstico, contudo, não é consensual entre os analistas dos problemas da burocraciafederal, os quais expressam forte crítica às ineficiências decorrentes do excesso dostop managers e political appointees. Sobre o problema dos political appointees edas políticas de pessoal no governo americano, ver o artigo Ingraham, Patricia W.,

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RSPJames R. Thompson and Elliot F. Einsenberg (1995)., "Political ManagementStrategies and Political/Career Relationships: Where are We now in the FederalGovernment". Public Administration Review. May/June, v. 55. n.3. p.263-272.

20 No original "The August 1993 budget battle helped define the outcome. Senatorsholding the critical votes to approve the administration's first budget insisted oneven bigger cuts. The administration's bargains with key members of the Congresspushed some of the NPR's money-saving ideas off the table.... The $ 108 billion indeficit reduction soon become the bedrock of the movement. .. As a result, the ghostof defict reduction lurked behind every promise of empowering workers of improvingperformance. ... There's a major conflict between the "works better" and "costs less"objectives. ... during the first full-year of the personnel cuts, two-thirds of the reductionwas to come from the Defense Department as part of the brader reduction in thedefense establishment. Some other agencies were to achieve relatively smallreductions. Nor was the downsizing uniform across the levels of the bureaucracy orbetween Washington and field offices. ... In October 1993, the administration packagedsome of the reforms in H.R. 3400, the Government Reform and Savings Act.Administration officials estimated that the bill would produce $6 billion in savingsover five years. However, the Congressional Budget Office reviewed the bill andestimated that savings would be only $2.5 billion, less than a half the amount claimedby the administration"

21 Para ver uma análise formal dos efeitos das escolhas partidárias nas políticas públi-cas no governo americano, considerando o efeito da alternância dos partidos comoescolha estratégia dos eleitores para garantir um "maior controle sobre o governo"ver a refinada análise de Alesina, Alberto & Howard Rosenthal (1995)., PartisanPolitics, Divided Government, and the Economy. New York. Cambridge UniversityPress.

22 No que tange aos cortes de pessoal, o NPR teve como objetivo o encolhimento dasagências administrativas, não diferindo de similares experiências internacionais.No plano da implementação, entretanto, a tática utilizada foi reduzir o número deagências, reduzir o nível do gasto, e mais ainda, e especialmente, o número dosfuncionários. Na realidade, tal estratégia aparece nos EUA no nível dos estados nomeio dos anos 70, e depois veio a se tornar um princípio para ações no governodesde meados dos anos 80. O Presidente Reagan e a sua Grace Commission foramos primeiros a utilizar a noção de downsizing no governo federal. O Relatório inicialda comissão Grace em 1984 produzira 2.478 recomendações destinadas a reduzir osgastos das agências do governo em aproximadamente $424.4 bilhões em três anos.

23 Esta preocupação se torna nítida no próprio título do documento produzido pelaBrookings Institution em maio de 1995, Cutting Government.

24 O Office of Personnel Management (1988) regula o número de political appointees,e define várias categorias para sua utilização no Executivo federal.

25 Segundo a regulamentação específica do OPM, os funcionários SES representam opreenchimento de aproximadamente 700 cargos no nível de chefia dos departamen-tos e agências.

26 Funcionários do tipo Schedule C correspondem a aproximadamente 1.600 cargosfederais preenchidos com pessoas do nível G-15 e abaixo, que atuam no nível deformulação de políticas públicas, determinando posições e fortemente envolvidoscom os interesses políticos e as networks de poder no interior da burocracia.

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RSPResumoResumenAbstract

Clinton e a reinvenção do governo federal: o National Performance ReviewFlávio da Cunha Rezende

O artigo analisa o National Performance Review (NPR), programa de reforma ad-ministrativa na gestão do presidente Clinton, implementado em 1993, e que traduz onovo paradigma empreendedorialista proposto para o funcionamento da burocracia dogoverno federal americano.

Na primeira parte são apresentados os princípios, objetivos e natureza da agenda,ressaltando-se as suas bases conceituais. Segue-se uma análise sobre a formação daagenda e a seqüência da sua implementação. A 3 a parte compreende uma visão da dinâ-mica político-institucional, com destaque para as tensões observadas entre o Legislativoe o Executivo, e o impacto destas nas mudanças da agenda. Na última seção, apresenta-se um painel empírico sobre alguns dos resultados em determinadas agências e departa-mentos do Governo, pretendendo-se oferecer contribuições ao processo de reformasadministrativas atualmente em curso no Brasil.

Clinton y la reinvención del gobierno federal: el National PerformanceReview

Flávio da Cunha Rezende

El artículo analisa el National Performance Review (NPR), programa de reformaadministrativa en la gestión del presidente Clinton, implementado en 1993, y que traduceel nuevo paradigma emprendedor propuesto para el funcionamiento de la burocracia delgobierno federal estadounidense.

En la primera parte se presentan los principios, objetivos y naturaleza de la agenda,distinguiéndose sus bases conceptuales. En seguida, se hace un análisis sobre la formaciónde la agenda y la secuencia de su implementación. La tercera parte comprende unavisión de la dinámica político-institucional, destacándose las tensiones observadas en-tre el Legislativo y el Ejecutivo, y el impacto de éstas en los cambios de la agenda. En laúltima sección, se presenta un panel empírico sobre algunos de los resultados en deter-minadas agencias y departamentos del gobierno, buscándose ofrecer contribuciones alproceso de reformas administrativas actualmente en curso en Brasil.

Clinton and the reinvention of federal government: the NationalPerformance Review

Flávio da Cunha Rezende

The paper analyses the National Performance Review (NPR), the programme foradministrative reform in president Clinton´s administration, implemented in 1993, whichtranslates the new entrepreneurial paradigm proposed for the functioning of the Americanfederal government´s bureaucracy.

In the first part, the principles, objectives and the nature of the agenda are presented,with special emphasis on its conceptual bases. It is followed by an analysis of the agen-da background and the sequence of its implementation. The third part covers a vision ofthe political and institutional dynamics, highlighting the tensions observed between theLegislative and the Executive Branches, and the impact of these on the changes in theagenda. In the last section, an empirical panel about some of the outcomes in certainGovernment agencies and departments is shown, intending to offer contributions to theadministrative reform process currently under way in Brazil.

Revista doServiçoPúblico

Ano 49Número 1Jan-Mar 1998

Doutorando emplanejamento epolíticaspúblicas pelaCornellUniversity,financiada pelaCapes-Brasil

Contato com o autor: [email protected]

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Texto para discussãoENAP

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Novos padrões gerenciaisno setor público: medidas dogoverno americano

Bianor Scelza Cavalcanti eRoberto Bevilacqua Otero*

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Brasília, DFJunho/1997

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Novos padrões gerenciaisno setor público: medidas dogoverno americano

Bianor Scelza Cavalcanti eRoberto Bevilacqua Otero*

Texto para discussãoENAP

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Texto para discussão é uma publicação daEscola Nacional de Administração Pública

EditoraVera Lúcia Petrucci

Coordenação editorialFlávio Carneiro Alcoforado

RevisãoMarluce Moreira Salgado

Editoração eletrônicaMaria Marta da Rocha Vasconcelos

© ENAP, 1997

CAVALCANTI, Bianor Scelza

C376m Novos padrões gerenciais no setor público: medidas do governo americano orientadas para o desempenho e resultados/Bianor Scelza Cavalcanti, Roberto Bevilacqua Otero. Brasília: MARE/ENAP, 1997.

31 f. (Texto para discussão, 16) 1. Administração pública. I. Otero, Roberto Bevilacqua. II. Título. III. Série

CDD 350

Brasília, DF

ENAP Escola Nacional de Administração PúblicaSAIS — Área 2-A70610-900 — Brasília, DFTelefone: (0XX61) 445 7096 / 445 7102 — Fax: (0XX61) 445 7178Site: www.enap.gov.brE-mail: [email protected]

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Novos padrões gerenciais no setor público:medidas do governo americano orientadaspara o desempenho e resultados

Bianor Scelza Cavalcanti e

Roberto Bevilacqua Otero*

Apresentação1

O estudo realizado envolve um benchmarking de novos padrões geren-ciais adotados pelo governo dos Estados Unidos, notadamente no que se referea formas inovadoras de gestão, de controle de gestão, de gestão orçamentária ede avaliação institucional.

Para a realização do presente trabalho, os autores valeram-se de con-sulta bibliográfica a livros e documentos produzidos nos últimos cinco anos,cabendo destacar, dentre os diversos documentos citados nas referênciasbibliográficas e notas, os estudos produzidos pela National Academy of PublicAdministration — NAPA e pelo General Accounting Office — GAO sobre oprocesso de “reinvenção do governo” americano.

Integram, também, o presente trabalho informações obtidas através departicipação em seminários e palestras conduzidas pela NAPA e pela VirginiaPolytechnic Institute and State University, no período de 03 a 14 de junho de1996, no âmbito de projeto de Avaliação de Programas Públicos Orientada paraResultados, desenvolvido pela Escola Brasileira de Administração Pública daFundação Getúlio Vargas (EBAP/FGV) para o Tribunal de Contas da União(TCU) do Brasil.2

Tais palestras incluíram, dentre outros assuntos, a visão geral daavaliação no âmbito do governo federal americano; o papel do Office ofManagement and Budget (OMB) na avaliação e mensuração de desempenho; aevolução da auditoria interna e externa, bem como a avaliação de programasefetuada pela Rand Corporation.

Finalmente, ainda no âmbito do programa referido, foram utilizadosmateriais e informações coletadas a partir de entrevistas efetuadas em organi-zações governamentais como, dentre outras, o U.S. Department of Health andHuman Services, e em organizações particulares que realizam avaliação de

* Bianor Scelza Cavalcanti é mestre em administração pública pelo Washington Public Affairs Centerda University of Southern California e professor da EBAP/FGV-RJ; e Roberto Bevilacqua Otero émestrando em administração pública e professor na EBAP/FGV-RJ.

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programas, por força de contratos de prestação de serviços, como o UrbanInstitute, a Mathematic Policy Research e a Maximus, todas situadas emWashington D.C..

1. Introdução

Em 3 de agosto de 1993, transformou-se em lei, nos Estados Unidos, oGovernment Performance and Results Act (GPRA). Esta nova legislaçãorefere-se ao estabelecimento de planejamento estratégico e mensuração dedesempenho no governo federal, com planos estratégicos plurianuais e planosanuais de desempenho para as agências federais, a partir de setembro de 1997.Os objetivos desta lei são desenvolver a gerência no nível federal e o processodecisório do Congresso, aumentar a confiança do público no governo e iniciaruma reforma no desempenho dos programas com uma série de projetos-pilotonos anos de 1994, 1995 e 1996.

O GPRA pode representar uma oportunidade significativa para o desen-volvimento da gerência no governo federal americano, com efeitos no processodecisório e nos sistemas de informação gerencial das agências federais, nacomunicação dos resultados e na avaliação dos programas, bem como no uso ena aplicação dos conceitos e terminologia da gerência de desempenho.

Esta estrutura conceitual requer das agências a clara definição de visãoe missão estratégica; o estabelecimento de objetivos e metas de longo prazo; oestabelecimento de metas anuais de desempenho; o desenvolvimento de indica-dores de desempenho e a coleta de dados; o uso de indicadores de desempenhopara a melhoria da efetividade dos programas levados a cabo pelas agências; e acomunicação dos resultados de desempenho para o público e os policymakers.

Por outro lado, as agências, no esforço de desenvolvimento de um processomais dinâmico de trabalho e voltado para resultados, se ressentem, em muitos casos,do aparato de leis, muitas vezes limitadoras ou até impeditivas de uma produçãoeficiente e eficaz. Assim, institucionalizou-se o mecanismo da concessão dewaivers3 para fomentar a flexibilidade gerencial e o orçamento de desempenho.

Finalmente, insere-se neste contexto com força redobrada a abordagemde avaliação de programas orientada para resultados, como componente funda-mental de aferição da efetividade das ações de governo e como estímulo aodesenho de programas que incorporem mecanismos de feedback que capacitemos gerentes e os policymakers a avaliarem o funcionamento dos programas emtermos de sua implementação e do atingimento dos objetivos estabelecidos eseus impactos, com implicação ao desenvolvimento de sistemas de mensuraçãode insumos, carga de trabalho, produtos, resultados, eficiência e produtividade,satisfação do beneficiário e do empregado, qualidade do serviço e rapidez desua prestação.

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Assim, o documento a ser desenvolvido tratará dos temas ora aborda-dos, com exemplos da aplicação por agências dos instrumentos citados.

O modelo esquemático, a seguir, ilustra os aspectos fundamentais cons-tantes das práticas em desenvolvimento pelas agências do governo americano,objeto do presente estudo.

2. O “Government Performance and Results Act” (GPRA)

Transformado em lei em agosto de 1993, o GPRA pretende estabelecer umsistema compreensivo de planejamento estratégico e de mensuração dedesempenho para o governo federal americano. É disposto que todas as agênciasfederais devem desenvolver estratégias para vários anos, identificar objetivos emetas de longo prazo, preparar declarações de missões que identifiquem asprincipais funções da organização, assim como preparar planos anuais dedesempenho e relatórios relacionados a cada programa desenvolvido.

Os planos anuais deverão estabelecer os níveis de desempenho projetados,baseados em indicadores específicos que têm de ser objetivos, quantificáveis emensuráveis. Na medida do possível, estas medidas devem ser orientadas pararesultados e focadas na realização dos objetivos dos programas ao invés dasatividades específicas dos programas. Há obrigatoriedade da produção de relatóriosanuais para a aferição do atingimento dos níveis de desempenho antecipados (targets)e avaliação do progresso em relação ao atingimento dos objetivos programáticos.

Práticas de apoio- delegação- fortalecimento dos funcionários- flexibilidade e orçamento de desempenho- tecnologia de informação- obsessão por qualidade

Dimensão estratégica- missão e objetivos- resultados- planos de longo e de curto prazo- projeção de desempenho (ênfase em mensuração)- foco no cliente

Avalialção de programas- sistemas de monitoramento de desempenho- avaliação de resultados (impacto) e de eficiência

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O preparo de planos estratégicos, declarações de missões e planosoperacionais não representam, necessariamente, uma novidade,4 porém, o foco,em níveis quantitativos de desempenho, e uma clara preferência para relatóriosorientados para resultados constituem-se em processos significativamentedistintos dos atuais. Há uma crença de que a implementação com sucesso destanova orientação mudará a atenção dos gerentes governamentais das atividadespara as realizações, desenvolvendo, desta forma, a gerência dos programas eaumentando a responsabilidade pública.5

Na realidade, esta medida do Poder Legislativo foi abraçada pelo PoderExecutivo americano, que justamente realizava o movimento levado a cabo pelovice-presidente Al Gore — o National Performance Review, o qual se constituinuma iniciativa de reforma do governo federal americano para funcionar melhore custar menos, baseada em princípios de “eliminar a burocracia, colocar osclientes em primeiro lugar, fortalecer os funcionários no sentido de obter re-sultados e reduzir-se ao básico”, ou seja, um plano de reinvenção do governofederal (Reinventing Government).

Por um lado, as recomendações do relatório gerado pelo NationalPerformance Review buscam ter efeitos relacionados a: redução de regulamen-tos internos; modernização dos sistemas de pessoal; compras e orçamento;integração das informações orçamentárias, financeiras e de desempenho dosprogramas; privatização de atividades administrativas; devolução de autoridadenos níveis mais baixos da burocracia pública e redução das agências.

Por outro lado, o foco do GPRA, na mensuração do desempenho, noplanejamento estratégico e no orçamento de desempenho, objetiva ter substan-cial impacto de longo prazo na avaliação e conseqüente melhoria dos programasgovernamentais, requerendo que as agências incorporem as avaliações de resul-tados nos seus planos estratégicos e planos de desempenho anuais.

Com a finalidade de se iniciar o desenvolvimento deste novo enfoque,foram aprovados projetos-piloto em agências do governo federal.

As agências envolvidas no processo (71 projetos-piloto aprovados em1994, incluindo 27 departamentos e agências do governo federal americano)têm verificado a complexidade de identificar bons indicadores de desempenho ede desenhar uma estrutura programática significativa. Esta deve favorecer aclara identificação de objetivos, o que requer ampla revisão dos indicadores dedesempenho de programas, deslocando a ênfase do foco contábil tradicional emrecursos e produtos para o foco de indicadores mais apropriados que reflitamresultados e impactos.

É bem verdade que, em termos práticos, o processo orçamentário e asestruturas organizacionais vigentes oferecem grande dificuldade de convivênciacom uma estrutura mais dinâmica de atividades, que seja mais voltada para famí-lias de atividades com resultados e impactos comuns relacionados aos processos

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fundamentais das organizações. Mas, por outro lado, há uma base para ainstitucionalização da gerência focada em desempenho no governo americano,proveniente do uso, há pelo menos duas décadas, de técnicas de avaliação deprogramas para melhorar o desempenho dos programas.

Ainda, há quatro questões que têm persistentemente importunado osesforços desenvolvidos em avaliação de programas:6

— falta de clara concordância em torno dos objetivos do programa edos critérios de avaliação;

— metas irreais, dada a disponibilidade de recursos;— a indisponibilidade de dados para avaliar o desempenho do programa; e— a inabilidade ou má vontade dos gerentes em utilizar as descobertas

e recomendações das pesquisas de avaliação para melhoria da gerência doprograma.

Há aspectos cruciais que devem ser tomados em consideração para aimplementação das medidas previstas no GPRA. Tais aspectos identificados sãofruto de estudo realizado pela National Academy of Public Administration,publicado em novembro de 1994:7

2.1. Responsabilidade pelo desenvolvimento dosindicadores de desempenho

As lideranças das agências têm de ter um papel fundamental no plane-jamento estratégico e na mensuração do desempenho, incluindo-se a formu-lação e o desenvolvimento dos sistemas de gerenciamento do desempenho daagência, ao mesmo tempo em que os gerentes de programa devem ter um papelfundamental na identificação de tais elementos no âmbito de seus programas.

Por outro lado, o governo federal, liderado pela agência de planeja-mento, deve desenvolver metodologia para examinar o escopo dos indicadoresde desempenho das agências e dos programas, para identificar missões interre-lacionadas e superposições, a fim de verificar quais partes de que indicadoresdevem ser atribuídas a quais programas e agências.

2.2. Relacionamento entre os indicadores dedesempenho e os objetivos estabelecidos emlei e as missões das agências

As agências devem desenvolver declarações de missão e objetivos delongo prazo com tal clareza que permita que os indicadores de desempenho e asmetas possam ser relacionados.

O indicador de desempenho constitui-se em parte integrante do sistemade desempenho gerencial que liga a missão, os planos estratégicos, metas e os

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planos anuais de desempenho. Tais indicadores de desempenho devem serconsistentes com os planos estratégicos, a fim de permitir o acompanhamentodo progresso dos planos.

Ao mesmo tempo, as operações dos programas e as missões devem serclaramente articuladas e relacionadas com os objetivos maiores estabelecidospelo Congresso e pelos policymakers do alto escalão. As agências devem,ainda, ser encorajadas a não permitir que a atual disponibilidade de informaçõessirva para suprimir passos na busca dos dados necessários para a identificaçãodos principais aspectos da missão do programa.

Neste sentido, necessita-se identificar com clareza os clientes e osstakeholders da agência, a fim de se selecionar os indicadores de desempenhoadequados.

Há, também, a necessidade de se estabelecer uma hierarquia de missõese de indicadores de desempenho.

2.3. Natureza e complexidade dos indicadores dedesempenho e a necessidade de qualidade de dados

Os indicadores necessitam de ser classificados por categorias como:indicadores de desempenho, de metas (targets), de insumos, de produtos, deresultados (impactos), a fim de serem colocados em sua perspectiva apropriada.

Há, também, a imperiosidade de se atribuir, nos esforços de mensuração dodesempenho, maior ênfase aos aspectos relacionados à clientela (sua satisfação),bem como às preocupações dos stakeholders (comitês, outras agências,programas ou níveis de governo, setor privado e fornecedores, cidadãos), numprocesso de negociação das várias expectativas da atuação da agência.

Finalmente, resta o desafio de se identificarem indicadores que reflitamtais aspectos, condicionados pela capacidade de coleta de dados a custosrazoáveis e através de procedimentos que garantam um apropriado controle dequalidade dos dados coletados pela agência, de forma a se prover informaçãoconfiável, válida e oportuna, e a custos pertinentes.

2.4. O uso dos indicadores e das metas de desempenhopara a melhoria do desempenho do programa

Os programas devem prover informação sobre a descrição das basespara o estabelecimento de suas metas de desempenho (por exemplo: caso seplaneje introduzir novos procedimentos que venham afetar os resultadosesperados, ou se cortes esperados no orçamento afetarão o atingimento dosníveis de resultados até então obtidos).

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As metas de desempenho têm de ser realistas, porém devem encorajar oprogresso em torno dos níveis históricos de desempenho, sendo recomendávelidentificar o que seja considerado um desempenho excelente para se aplicar osistema de mensuração de forma a se estimular o seu atingimento.

Devem, também, ser incluídos loops de feedback para que as metas eos indicadores possam ser revistos, na medida que se tenha mais informaçãodisponível.

Há necessidade de desagregação dos dados, para se identificar onde osprogramas estão e onde não estão atingindo os resultados (serviço regional,área geográfica, grupos de clientela, por exemplo).

Tais medidas estimulam o uso gerencial da informação em prol dodesenvolvimento dos programas, seja pelos responsáveis pelos programas,diretores das agências, bem como pelos outros decisores de governo.

2.5. Uso dos indicadores de desempenho para comunicaras realizações do programa ao Congresso e ao público

Os planos de desempenho e os indicadores devem ser apresentados com clarasexplicações sobre o contexto do programa e suas atividades e definição dos termos.

Podem ser utilizados diagramas das operações do programa e exemplosilustrativos para auxiliar as pessoas não familiarizadas com o programa a entendê-lo.

Desta forma, cumpre-se um dos objetivos deste sistema que se refereao aumento da responsabilidade pelos resultados do administrador públicoperante a sociedade (accountability), bem como para o aumento da confiançapública nos serviços prestados.

A seguir, são apresentados quadros ilustrativos de categorias deindicadores de resultados.

Quadro 1 - Exemplos de indicadores de qualidade8

1. Oportunidade

2. Pontualidade e exatidão do serviço

3. Forma amigável/amena de prestação do serviço

4. Conveniência e acessibilidade:

. do local

. do tempo de operação

. do cliente poder encontrar alguém com quem conversar

5. Conhecimento dos serviços prestados no âmbito do programa

6. Condições das facilidades para uso pelos clientes

7. Satisfação geral dos clientes (alegria)

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Quadro 2 - Exemplo de “seqüência de resultados” numprograma de combate ao fumo9

Programas implementados Número de programas

Fumantes atendidos Número de atendimentos

Fumantes que completaram o Número de fumantes no final

programa do programa

Fumantes que pararam de fumar Número de fumantes que

pararam de fumar

Ex-fumantes que melhoraram Número de doenças relacionadas

de saúde ao longo prazo aos ex-fumantes

3. O caso da agência de auditoria do Exército —Projeto piloto do GPRA

3.1. Progresso na melhoria do desempenho,eficiência e serviço ao cliente

A Agência de Auditoria do Exército (U.S. Army Audit Agency) emprega700 pessoas, das quais 600 são auditores profissionais. Opera em Alexandria,Virginia, na região metropolitana de Washington D.C., com 31 serviços de campoem vários locais do mundo. O seu orçamento para 1995 foi de $51.4 milhões.

A agência realiza auditoria e serviços de consultoria para todas as orga-nizações, atividades, programas e funções do Exército americano.

As suas atividades podem ser categorizadas em três tipos: financeira,funcional e consultoria. Audita os relatórios financeiros anuais e analisa osdados de mensuração de desempenho do Exército. O trabalho funcional rela-ciona-se à análise das funções específicas do Exército como prontidão, logís-tica e aquisição. Os trabalhos de consultoria consistem em análises efetuadas,quando demandadas pelo Exército, como, por exemplo, Suporte de Contratos noHaiti, Operações no Kuwait após a “Operação Tempestade no Deserto” e oplanejamento estratégico para algumas atividades do Exército.

↓ ↓

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↓ ↓

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A agência possui quatro áreas estratégicas em seu planejamento:10

— serviço ao cliente;— organização orientada para qualidade e recursos humanos;— tecnologia avançada; e— gerência de qualidade total.Em julho de 1994, a Agência de Auditoria do Exército americano foi

designada pelo Departamento de Defesa como projeto-piloto para implemen-tação do GPRA. A agência assessora a Secretaria do Exército na realização desuas responsabilidades estatutárias, e assessora os gerentes do Exército natomada de decisões, solução de problemas e uso eficaz dos recursos.

No esforço de desenvolvimento de um plano estratégico, a agênciaestabeleceu como objetivo geral de desempenho para o ano de 1995 o aumentoda satisfação da clientela através da melhoria dos serviços prestados.

Tal objetivo geral foi desmembrado em 06 (seis) sub-objetivos paraapoiá-lo, quais sejam:

— Redução do tempo para realização dos compromissos.— Aumento da concordância dos clientes com os produtos da auditoria.— Aumento de relatórios que identifiquem economia de custos.— Diminuição do custo por dia de trabalho.— Aumento da implementação das recomendações efetuadas pelas equipes.— Aumento do uso dos sistemas de suporte de decisão da agência.No desenvolvimento do esforço estratégico da agência, são identificadas

sua missão, visão e valores, conforme as declarações da própria agência, a seguir.

a) Missão

Servir o Exército americano através da prestação de auditagens objetivase independentes e de serviços de consultoria. Estes serviços auxiliam o Exércitoa tomar decisões com informação, resolver problemas, aplicar os recursos deforma eficaz e satisfazer as responsabilidades estatutárias e fiduciárias.

b) Visão

A agência transformar-se-á na melhor organização de auditoria dogoverno federal. Nós superaremos as expectativas de nossos clientes, através deserviços oportunos e valiosos.

c) Valores

A forma como realizamos nossa missão e nos movemos em torno denossa visão conta muito sobre nós como uma organização e como indivíduos.Nossos valores expressam as crenças e os ideais que queremos adotar para ter

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sucesso. Eles também refletem como nós desejamos tratar nossos clientes e acada um. Os valores que enfatizamos são:

— Qualidade do serviço. Nós prestamos os serviços de maior qualidadeque sejam úteis, oportunos e compreensivos aos gerentes do Exército, através derelações efetivas empregado-cliente, consistentes com os padrões profissionais.

— Ética. Somos reconhecidos por nossa integridade, credibilidade ecometimento com a responsabilidade.

— Crescimento pessoal e segurança. Nós cuidamos e provemos o bem-estar, a segurança no trabalho e a moral de nossos empregados. Nós provemosoportunidades justas, iguais e estimulantes para todos os empregados assumi-rem riscos, se expressarem e crescerem.

— Progresso. Nós somos uma organização que se adapta rapidamente àmudança, explora novas tecnologias, procura e institui abordagens e técnicasinovadoras.

— Trabalho em equipe. Nossos empregados, em todos os níveis,trabalham juntos como um time para desenvolver nossa missão e objetivos.

— Profissionalismo. Temos uma força-de-trabalho profissional que éaltamente dedicada, ética e que está equipada com os últimos avançostecnológicos. Somos comprometidos com o contínuo crescimento profissionalatravés da educação e da participação ativa em organizações profissionais.

— Independência. Nós mantemos nossa liberdade para desenvolvernossa missão.

3.2. O contexto

A agência instituiu um programa compreensivo de gerência de qualidadepara incluir iniciativas de reengenharia relacionadas, desde 1992, investindorecursos em equipes de melhoria de processos. Isto representou, em 1995, 5% dotempo total disponível das pessoas em iniciativas de melhoria e de reengenhariade processos, com aumento do estresse dos empregados e alguma perda deprodutividade, durante este período de aprendizagem, em nome de benefíciosfuturos. Acredita-se que o comprometimento com o conceito de qualidadeinduzirá um modo de operação universalmente aceito pela força-de-trabalho, queeste será mais flexível e que as mudanças serão aceitas como uma ocorrênciarotineira e não mais como uma fonte de turbulência e de ameaça ao trabalho.11

Em 1995, a agência iniciou um processo de total reestruturação organi-zacional, com término previsto para 1996, incluindo ações como: reestruturar edesburocratizar os centros de operações; consolidar o suporte de auditoria e asfunções administrativas, bem como reduzir as posições administrativas e aestrutura gerencial; delegar mais autoridade/responsabilidade de tomada dedecisões para os níveis gerenciais operacionais e rever inteiramente a infraes-trutura de automação.

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A força-de-trabalho da agência foi reduzida em torno de 35% desde1990, o que afetou a alocação de recursos para as demandas de serviços deauditagem local que aumentaram no período, originando um desequilíbrio entrea força-de-trabalho e a carga de trabalho da agência.

O orçamento para 1996 foi reduzido em $5 milhões, com impacto jánas decisões tomadas no exercício de 1995.

3.3. As metas de desempenho e as realizações

a) Serviço ao cliente

Objetivos estratégicos:— Até 1998, obter uma nota média de 4,5 ou mais dos clientes

externos, dentro do limite possível de 5,0 na Pesquisa de Satisfação do Cliente.— Até 1998, aumentar a clientela em 50%.Metas de desempenho anual para 1995:— Geral: atingir nível de satisfação do cliente em 3,9.— Reduzir o tempo médio requerido para realizar as atividades em 10%.— Aumentar a concordância da clientela com os produtos de 92% para 94%.

— Aumentar o percentual de relatórios de auditoria que identifiquem economia de recursos de 32% para 37%.

O índice de satisfação do cliente é formado pela média de notasatribuídas pelos clientes a cinco áreas relacionadas com o produto da auditoria:satisfação com o processo de auditagem, satisfação com o produto da audita-gem, benefício gerado pela auditagem, suficiência das instruções resumidasentregues e efetividade dos auditores e das equipes.

A nota alcançada em 1995 foi de 3,96, resultante de esforços em obterdiretamente das áreas auditadas sua perspectiva em como melhor servir suasnecessidades de curto e de longo prazos através da instituição de equipes, paraidentificar e analisar o processo de auditoria desde o planejamento até a publi-cação dos relatórios, bem como da inclusão dos clientes no processo de revi-são, para obter dos mesmos a visão preliminar dos resultados das auditorias.

Quanto à meta de reduzir em 10% o tempo requerido para realizar ostrabalhos, houve redução de 18,7% no tempo dos relatórios formais de audito-ria, de 17,3% nos relatórios através de memorandos e de 14,8% nos relatóriosde consultoria. As reduções decorreram de medidas, tais como: eliminação deníveis de revisão, aumento do poder dos auditores e impressão interna de rela-tórios, dentre outras.

Quanto ao aumento da concordância da clientela com os produtos, ocritério é estabelecido pela freqüência de concordância em implementar asrecomendações e pela real implementação.

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Quanto à meta de relatórios que identifiquem economia de recursos, oindicador evoluirá para a identificação de montante de recursos economizadospela implementação das recomendações.

b) Organização orientada para a qualidade e recursos humanos

Objetivos estratégicos:— Desenvolver continuamente uma organização flexível que coloque as

pessoas certas nos lugares certos e no tempo certo para atender às necessida-des das clientelas externa e interna, da forma mais eficiente e eficaz possível.

— Fortalecer a educação e o programa de treinamento dos empregados.— Lutar para exceder as expectativas dos empregados e obter no míni-

mo a nota de 4,5 dos 5 pontos possíveis da pesquisa da clientela interna.— Criar, nos empregados, o sentido de propriedade pelos processos e

estabelecer responsabilidade (accountability) nos menores níveis da organização.Meta anual de desempenho (1995):— Reduzir o custo por dia de trabalho em 5%.

c) Tecnologia avançada

Objetivos estratégicos:— Até 1998, ter hardware de tecnologia de comunicação e informação

que melhor atenda às necessidades internas e dos clientes.— Até 1999, ser reconhecido como líder na aplicação de tecnologias avançadas.Meta anual de desempenho (1995):— Aumentar o número de sistemas de suporte à decisão em 50% (de 4

para 6 sistemas).— Aumentar o número de novos pedidos para os sistemas de suporte à

decisão das atividades externas em 10% (de 42 para 46).

d) Gerência de qualidade total

Objetivos estratégicos:— Até 1998, implementar completamente o programa de qualidade total.— Assistir a todas as atividades interessadas em promover, desenvolver

e facilitar iniciativas de qualidade total no Exército.Meta anual de desempenho (1995):— Aumentar os níveis de implementação das recomendações efetuadas

pelas equipes de processo de 60% para 70%.12

Em 1995, foi efetuado um trabalho de auto-avaliação, baseado noscritérios do Malcolm Baldrige National Quality Award Criteria, paraidentificar as principais competências distintas da agência e as áreas de desafio,

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bem como para expandir o conhecimento sobre aspectos necessários àorganização para tornar-se a melhor, dentre outras.

Tal conhecimento adquirido está sendo capitalizado para se transformarem mais um produto a ser oferecido às demais agências do Exército, qual seja,avaliar esforços do gênero e assessorar na implementação de melhorias.

Esta experiência, conforme relatório da agência, está permitindo enten-der a ligação entre o planejamento estratégico, o plano anual de desempenho, asmetas de desempenho e os indicadores de desempenho como poderosos instru-mentos gerenciais de estímulo e identificação de melhorias de processos paraas operações e efetividade da agência.

4. O governo voltado para o cliente

Consentâneo com as reformas em curso no governo federal americano,o enfoque das agências voltadas para os clientes integra a abordagem de inspi-ração empresarial em implementação.13

Uma das fortes razões alegadas para tratar as pessoas com a mesmaatenção que as empresas de sucesso dispensam à sua clientela se deve à tenta-tiva de “restaurar a fé americana no sistema de autogoverno”.14

Esta abordagem tem tido tal impacto nas agências que, para muitas, oprimeiro passo tem sido a identificação de quem é o cliente. Como o cliente éaquele que se tenta satisfazer, para muitos, a clientela é o chefe, ou o Congresso,pois os sistemas burocráticos têm sido, regularmente, desenhados para satisfazereste tipo de clientela, independentemente de sua importância.

Os clientes são, na verdade, “as pessoas que usam os parques nacionais, asflorestas; pessoas que são elegíveis para os benefícios de seguro social; pessoas cujasvidas são reduzidas pelo desemprego, analfabetismo, crime, poluição e problemas dascidades grandes”.15 Tal abordagem coloca as pessoas na frente das atividades.

Os padrões de bons serviços à clientela devem ser obtidos com a pró-pria clientela, verificando o que desejam. Portanto, passa a ser crucial a reali-zação de pesquisas junto aos clientes, para se obterem informações a respeitode suas necessidades, bem como sobre formas de melhorar o atendimento.

Conforme consta do documento referido, “se o governo já tivesse sidototalmente reinventado na direção do cliente, como uma organização de classemundial, você saberia. O Serviço Postal Americano estaria cabeça-a-cabeçacom a FedEx nas entregas;... a verificação de seus benefícios do seguro socialseria como você verifica a sua conta do Visa”.16

Em setembro de 1993, o presidente dos Estados Unidos, através daOrdem Executiva 12862, estabeleceu as bases para a adoção, pelo governofederal, do enfoque de orientação para o cliente, instituindo que as agênciasadotassem as seguintes ações:

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— identificar quais sejam ou devam ser os clientes servidos pela agência;— pesquisar junto à clientela, para determinar o tipo e a qualidade dos

serviços que desejem e seu nível de satisfação com os serviços existentes;— definir padrões de serviços e medir os resultados contra os padrões

definidos;— efetuar benchmark do desempenho dos serviços à clientela em

relação ao que fazem as melhores empresas;— pesquisar junto aos empregados da linha-de-frente sobre barreiras e

idéias para se equiparar às melhores empresas;— oferecer aos clientes a possibilidade de escolha em termos de fontes

de serviço e meios de sua prestação;— desenvolver sistemas de informação, serviços e reclamações com

facilidade de acesso; e— prover meios de endereçar as reclamações dos clientes.Apresentam-se, a seguir, exemplos de agências que já adotaram este

enfoque na definição de seus processos e serviços.

a) Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano —Serviço de Habitação

Estimula a habitação através de financiamento direto, garantias a em-préstimos, taxas de juros subsidiadas, seguros a hipotecas, etc.

Você pode esperar que seus empregados observem os seguintes padrões:

Respeito:— A todo cliente é dado um tratamento cortês.— Qualquer empregado representa o Serviço de Habitação.— Disponha o nome em placas ou use crachás da forma apropriada.— Identifique-se e a sua organização, sempre que estiver com um cliente.— “Não deixe a peteca cair” — direcione a correspondência ou o

telefonema para o local correto.— Ao transferir um cliente verifique, para garantir, que a assistência ao

mesmo possa ser obtida, falando com a outra parte do serviço, para certificar-sede que o cliente não está sendo despachado para um destino incerto.

— Após assistir a um cliente, oferecer provimento de assistênciaadicional, caso haja necessidade em outra ocasião.

— Ofereça uma alternativa de “pessoa real” para todas as mensagens,porventura existentes.

— Consiga oferecer alternativas para estrangeiros e para surdos emudos, quando necessário.

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18

Produtos de qualidade:— Apresente toda a informação disponível a um cliente na primeira

chamada ou carta; assegure-se de que todas as questões sejam respondidas.— Escreva de forma normal, não de forma técnica ou no jargão

governamental.— Verifique, com freqüência, para assegurar que estão sendo

oferecidos produtos de qualidade.— Aconselhe os clientes/parceiros a escrever quando novas políticas ou

mudanças estejam sendo consideradas; envolva-os na fase de desenvolvimento.— Considere as necessidades dos clientes/parceiros ao desenvolver

produtos ou procedimentos.— Notifique os clientes/parceiros sobre problemas operacionais; não

espere pela chamada do cliente, para informá-lo de que o sistema de que eleprecisa está fora do ar.

— Alcance os clientes — vá aos seus escritórios, quando possível;conduza conferências regulares.

— Inclua um nome de contato, organização, número de telefone e dataefetiva em todos os documentos.

Serviço no tempo oportuno:— Assegure o atendimento pelo telefone durante todo o horário

comercial; responda a todas as chamadas telefônicas até o terceiro toque.— Responda a todos os pedidos pelo telefone dentro de 24 horas.— Responda à correspondência escrita dentro de 10 dias úteis.— Ofereça uma resposta provisória, quando uma resposta completa

venha a requerer tempo extra para pesquisa ou haja uma sobrecarga de trabalho.— Ofereça números de serviço ao cliente do tipo 1-800, quando

possível e economicamente viável.

Resultados:— Estabeleça metas quantitativas de serviço aos clientes e incorpore-as

nos padrões de desempenho e no plano do serviço quando possível.— Estabeleça padrões quantitativos de processamento para cada

programa ou função.— Solicite feedback, e reaja aos comentários do cliente.— Treine todos os empregados regularmente em iniciativas de serviços

aos clientes.— Institua verificações aleatórias de supervisão de controle de

qualidade para assegurar-se de que estejam sendo oferecidos serviços aosclientes apropriados e adequados.

— Encoraje o trabalho em equipe, a fim de que todo o pessoal semantenha informado.

— Ofereça programa de treinamento básico ao pessoal, em particularaos que lidam diretamente com o público.

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19

b) Serviço de gerência de pessoal — Sistema Federal deInformação de Emprego

Assiste a quem procura emprego através da prestação de informaçõessobre emprego na área federal.

Para assisti-lo na condição de um candidato a emprego federal:— Prestaremos serviços no tempo oportuno e com cortesia.— Atualizaremos nossa listagem nacional de empregos todos os dias úteis.— Teremos especialistas em informação sobre empregos disponíveis

para responder às suas questões.— Ofereceremos acesso 24 horas por dia, sete dias na semana, à

informação nacional sobre emprego e a serviços de pedidos de emprego, atravésde uma variedade de mídia eletrônica.

— Responderemos às suas solicitações para emprego e/ou informaçõesde rotina dentro de um dia útil.

— Usaremos suas sugestões e críticas para melhorar continuamentenossos serviços. Sempre lembrar-nos-emos que trabalhamos para você, o pú-blico americano.

c) Serviço Postal dos Estados Unidos

Estes são os padrões estabelecidos para o serviço:— Sua correspondência de primeira classe será entregue em qualquer

lugar nos Estados Unidos dentro de três dias.— Sua correspondência de primeira classe local será entregue durante a noite.— Os serviços nos balcões do correio serão prestados em até cinco minutos.— Você pode obter informação postal 24 horas por dia, através de

chamada local.

5. A flexibilidade e o Instituto do “waiver”

O waiver, que pode ser traduzido como “renúncia” ou “dispensa”,representa um importante instrumento para a obtenção de maior flexibilidadenos processos administrativos e orçamentários das agências, a fim de seaumentar a possibilidade de atingimento dos resultados esperados, no âmbitodos respectivos programas aprovados.17

A própria lei que instituiu o GPRA prevê que os “planos de desempenhoestabelecidos possam incluir propostas de renúncia a controles e requerimentosprocessualísticos administrativos, incluindo especificação de níveis do pessoal,limitações na compensação ou remuneração, e proibições ou restrições nastransferências de fundos entre as classificações orçamentárias... de cada orçamento

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anual, em troca da responsabilidade individual ou organizacional específica ematingir uma meta de desempenho.”

Ainda, de acordo com a referida lei: “... a proposta deve descrever osefeitos antecipados no desempenho resultantes da obtenção de maior flexibilidade,discrição e autoridade gerencial ou organizacional, e deve quantificar as melhoriasesperadas no desempenho resultantes de qualquer waiver. As melhorias esperadasdevem ser comparadas ao desempenho real atual e aos níveis de desempenho proje-tados que deveriam ser atingidos independentemente de qualquer waiver.”

Esta forma de “renúncia” decorre da constatação de que, embora asnumerosas leis, regras e regulamentos sejam motivados por desejos bem-inten-cionados e até mesmo de forma racional, o seu conjunto pode criar mais pro-blemas à execução que resolvê-los, em muitos casos, especialmente num con-texto de mudanças cada vez mais aceleradas.

Neste sentido, a aplicação do instituto do waiver, além de aumentar aschances de experimentação de novos mecanismos, sem necessariamente reque-rer profundas e demoradas alterações nas estruturas e na legislação, apresenta-se como uma excelente oportunidade para o legislador verificar potenciaisnecessidades de alteração na legislação vigente.

O waiver tem como características o fato de ser limitado e determi-nado no seu escopo e duração, aprovado pela própria instância que regulamentao assunto objeto de “renúncia”, e requer da agência contemplada instrumentosde comprovação dos benefícios a serem obtidos através da sua concessão.

Constitui-se, também, em importante mecanismo para o estímulo aoconceito de orçamento de desempenho ou orçamento de missões, onde prevalecea identificação de recursos a resultados sobre categorias da despesa ou atividades.

O governo federal americano tem-se valido da aplicação de waiverspara cortar os custos da burocracia e oferecer maior flexibilidade aos estados emunicípios. Por exemplo, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos(Department of Health and Human Services) concedeu waivers a 37 estadosno seu programa de bem-estar, permitindo que experimentassem novas formasde prover os serviços do referido programa.18

Através deste tipo de “renúncia” concedida, inclusive em conjunto comoutros departamentos como, por exemplo, o da Agricultura para o Estado deSouth Carolina, é permitida a combinação de recursos de diversos programasfederais de governo para aplicação em determinado programa estadual que tenhapropósitos relacionados com os de nível federal, mediante condições especi-ficadas em contrato com o próprio Estado.

Dentre as cláusulas contratuais para a concessão do waiver, cabe res-saltar a importância atribuída ao processo de avaliação de programas orientadapara resultados que a agência tem de instituir, como condição de flexibilizaçãoda estrutura normativa pela autoridade concedente.

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6. A avaliação de programas orientada pararesultados: o exercício do controle

O processo de controle, seja externo ou interno, tem de ser coerentecom os demais processos gerenciais. Assim, o foco em resultados, fator deter-minante dos mecanismos de planejamento e gerência das agências de governo,também influencia e estabelece orientação distinta daquela presente noprocesso de controle burocrático tradicional.

Reforça-se, assim, a implementação em larga escala do processo deavaliação de programas, seja pelo controle externo federal exercido peloGeneral Accounting Office (GAO), seja pelos controles internos executadospelos Inspector General Offices (IGO), seja no âmbito das agências executoras,nos seus processos de monitoramento e avaliação dos programas.

Apresentam-se, a seguir, as bases conceituais da atividade de avaliaçãode programas públicos.

6.1. Auditoria de desempenho

Avaliação do desempenho de uma organização governamental, programa,atividade ou função, a fim de gerar informações aos órgãos competentes paradecisões relacionadas a ações corretivas que se façam necessárias.

A auditoria de desempenho pode ser desdobrada em auditoria deeficiência e auditoria de programa.

6.1.1. A auditoria de eficiência focaliza o exame do uso dos recursos pelaentidade de forma econômica e eficiente, a causa das práticas antieconômicas e aobservância da legislação atinente à eficiência, considerando, por exemplo:

a) a observância de práticas corretas de aquisição, quanto ao tipo, àqualidade, quantidade e aos custos apropriados;

b) a preservação e manutenção apropriada dos recursos;c) a existência de duplicação de esforços, de trabalho desnecessário, de

ociosidade ou de sobrecarga gerada por má distribuição do trabalho;d) a adoção de procedimentos operacionais eficientes;e) a aplicação eficiente dos recursos (pessoal, equipamentos, material e

serviços) na produção ou prestação da quantidade apropriada de produtos ouserviços, com qualidade e no tempo adequado;

f) a observância das normas pertinentes;g) a existência de adequados sistemas de controle gerencial para

aferição, acompanhamento e avaliação da eficiência dos programas, quecontemplem medidas de desempenho válidas, confiáveis e regulares.

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A auditoria de eficiência se vale, fundamentalmente, de mecanismos deavaliação de processo e de custos.

6.1.2. A auditoria de programa enfatiza o exame do alcance peloprograma dos resultados ou benefícios estabelecidos pela legislação que oinstituiu; da efetividade das entidades, programas, atividades ou funções; bemcomo da observância, pela entidade executora, da legislação aplicável aoprograma, considerando, por exemplo:

a) a adequação dos objetivos do programa à legislação que o instituiu;b) o alcance dos resultados esperados pelo programa ou por seus

componentes, nos termos em que foi instituído;c) a identificação de fatores que inibem o desempenho satisfatório;d) o gerenciamento do programa de forma a prover mecanismos que

garantam o atingimento dos resultados desejados com eficiência;e) a existência de duplicações ou conflitos com outros programas existentes;f) possibilidades de um melhor funcionamento do programa;g) a observância da legislação relacionada com o programa;h) a existência de adequados sistemas de controle gerencial para

aferição da efetividade do programa, que contemplem medidas de desempenhoválidas, confiáveis e regulares.

A auditoria de programa se vale fundamentalmente de técnicas deavaliação de impacto e de monitoramento de desempenho.

A auditoria de desempenho pode importar em auditoria de eficiência,auditoria de programa ou de ambas.

6.2. Estratégias de avaliação e o desenho de sistemas para aexecução de auditoria de desempenho

6.2.1. Sistemas de avaliação de impacto, que buscam verificar as ques-tões de causalidade:

a) Desenhos experimentais:Grupos ou indivíduos são estabelecidos de forma aleatória antes de se

iniciarem os serviços. O grupo de “tratamento” será designado para receber osserviços, com a finalidade de se verificar o atingimento dos resultados clara-mente especificados. O grupo de “controle” não recebe os serviços. Os resul-tados do grupo de tratamento são comparados com os do grupo de controle parase avaliar o impacto do programa.

b) Desenhos quase-experimentais:De forma semelhante ao sistema anterior, avaliações quase-experimentais

comparam os resultados dos participantes do programa aos resultados de gruposde comparação que não recebem os serviços oriundos do programa. A diferençapara o modelo anterior é que a escolha dos grupos não é aleatória.

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c) Avaliações de impacto não-experimentais:Exame de mudanças na clientela atendida pelo programa, sem incluir

grupos de comparação ou outros grupos não atendidos pelo programa.— Comparações antes/depois: os resultados do programa são medidos

antes e após a execução do programa e uma avaliação de impacto é inferida apartir das diferenças observadas.

— Desenhos de séries temporais: uma extensão do sistema anterior, queutiliza múltiplas medidas de variações de resultados antes do início da execuçãodo programa, bem como durante os estágios de execução do programa.

— Comparações cruzadas: realização de pesquisas de grupos de partici-pantes, conduzidas após a execução do programa, para estimar correlações entreresultados e diferenças na duração, tipo e intensidade dos serviços recebidos.

— Painéis: uso de grupos para realizar avaliações.

6.2.2. Sistemas de monitoramento de desempenho, que buscam verificaros aspectos-chave relacionados à operação do programa e à extensão do alcancedos objetivos estabelecidos, focando avaliações de:

a) existência, pertinência e clareza de objetivos;b) existência, pertinência, confiabilidade e viabilidade de medidas de

insumos, processo, produtos e resultados;c) monitoramento de qualidade dos serviços prestados;d) identificação de falhas na produção dos resultados pelo programa,

para aplicação na gerência e redesenho das operações do programa;e) eficiência, efetividade e produtividade do programa através da

relação entre os recursos aplicados e os produtos e resultados.6.2.3. Sistemas de análise de processos, que buscam: determinar se o

modelo do programa está sendo implementado como especificado; identificarconseqüências imprevistas e resultados não esperados do programa (externa-lidades); e compreender o programa na perspectiva da gerência, dos participantese da clientela, através de mecanismos, como, por exemplo, estudos de caso:

— Análise detalhada de partes ou clientela selecionada do programapara determinar como o mesmo está operando, quais os obstáculos existentes eque recursos ou capacidades são necessárias.

Para tanto, podem ser aplicados métodos de entrevistas semi-estrutu-radas, grupos de discussão ou observação participante.

6.2.4. Sistemas de análise de custos, que buscam identificar quantocusta o programa, explorando-se, inclusive, usos alternativos dos recursos(custo/oportunidade) e os benefícios produzidos pelo programa, a fim de exa-minar questões relacionadas à análise de custo/efetividade e monetarização dosbenefícios à clientela servida pelo programa.

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6.3. Natureza da avaliação

A avaliação, quanto à natureza, pode ser classificada como somativa ouformativa.

6.3.1. Avaliação somativa objetiva prover uma avaliação final sobre ovalor do programa para auxiliar na decisão de aplicar recursos, manter oucancelar o programa.

6.3.2. Avaliação formativa objetiva prover informações no sentido deauxiliar na melhoria do desempenho do programa, buscando-se verificar osaspectos positivos e negativos do programa, a fim de se desenvolver alter-nativas de mudanças que ofereçam soluções aos problemas identificados.

7. Considerações finais

É importante notar, no esforço de benchmarking efetuado, que existeuma história do processo gerencial contextualizada por um universo políticopróprio que embasa as iniciativas ora apresentadas em contraposição à idéia, porvezes veiculada, de que os americanos são dados a simples modismos no desen-volvimento e implementação de práticas gerenciais.

Observa-se, de um lado, a evolução conceitual das tecnologias gerenciaisde cunho programático em movimentos sucessivos, determinada pela internaliza-ção e consolidação de idéias-chave e absorção e integração de novos conceitos.

Por exemplo, na área orçamentária, já em 1949, o conceito de orça-mento de desempenho foi introduzido através da Hoover Commission, com aidéia de identificação de atividades das agências e de sua apresentação na formade classificações funcionais amplas. Nos anos 60, os sistemas de planejamento,programação e orçamento tentaram avançar nas técnicas orçamentárias atravésda apresentação de escolhas orçamentárias mais explícitas em termos deidentificação de objetivos. Nos anos 70, a implementação do orçamento debase-zero representou uma tentativa de analisar as mudanças incrementais nosprodutos dos programas a partir de diferentes níveis de financiamento. Agora, oCongresso demonstra renovado interesse no uso de medidas de desempenhoassociadas ao processo de planejamento e orçamento através do GPRA.

Este caráter evolutivo e incremental é verificado, também, em relaçãoaos quadros conceituais e referenciais teóricos mais abrangentes, tais como oDesenvolvimento Organizacional (DO), o Management by Objectives (MBO), aReeengenharia, a Qualidade Total e a proposta do Reinventing Government.

Pode-se, por outro lado, verificar o mesmo tipo de evolução com rela-ção a abordagens técnicas mais específicas. A auditoria de eficiência (orientadapara processos) não é simplesmente relevada a um segundo plano, mas a ela seintegra, de forma simbiótica, a auditoria de programas (orientada para resul-tados), sob a noção mais geral de desempenho.

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É permitido inferir, com base nas constatações efetuadas, que o atualesforço de melhoria de funcionamento da máquina governamental americana sedá de forma integrada entre a busca infrene de melhoria do desempenho e demudanças organizacionais e de processos de gestão.

Tal esforço, resultante de um processo seletivo de desdobramentosconceituais e técnicos sucessivos, é calcado no conceito de gerência orientadapara resultados, que envolve a articulação de missão e objetivos, o desenvolvi-mento de planos e indicadores de desempenho relacionados com a missão, e ouso de informações sobre o desempenho para avaliar e melhorar os resultadosdos programas de governo, via intervenções corretivas.

Nunca é demais enfatizar que este aparato técnico-conceitual não funcionade forma mecanicista. Decisões e ações corretivas são estimuladas no correr deexercícios fiscais e legislaturas sucessivas, de modo que atores políticos eadministrativos diferenciados servem-se de relatórios e bases de dados gerados deacordo com suas responsabilidades específicas: o Congresso, o GAO, os inspetoresgerais internos, os gerentes de agências e programas, e outros.

Isto fica claro quando destacamos, no presente documento, os aspectosrelacionados à introdução da dimensão estratégica da gestão institucionalizada nogoverno americano através do Government Performance and Results Act (GPRA)do Congresso, o enfoque da orientação voltada para o cliente instituído pelo PoderExecutivo, a partir de 1993, os instrumentos de flexibilização do processo de ges-tão das agências governamentais e, finalmente, o exercício do controle orientadopara resultados, em harmonia com os demais processos de gestão.

No entanto, cabe enfatizar que o Government and Performance ResultsAct criou um ambiente governamental de forte pressão para mudanças no go-verno federal, requerendo esforços de reengenharia dos processos nas agências.

Em estudo realizado pela National Academy of Public Administration —NAPA,19 abrangendo 35 organizações governamentais, onde é constatado que apartir dos anos 80 uma nova onda de reforma ganhou força nos Estados Unidos,alimentada por maiores demandas de serviços governamentais mais eficientes eefetivos, numa era de recursos mais escassos, são identificados seis fatores críticosde sucesso nas agências que implementaram reengenharia nos seus processos,conforme a seguir:

a) Entendimento sobre a reengenharia: amplo entendimento comumsobre reengenharia; e abordagem de melhoria confrontada com resultados.

b) Desenvolvimento de um clima político e de negócios para iniciar esustentar a reengenharia: criar razões necessárias e suficientes para a mudança;desenvolver cometimento e capacidade organizacional; e buscar suporte político.

c) Adoção de uma abordagem de gerência de processos: diretrizes emetas estratégicas orientadas para processos; orientação gerencial; fortaleci-mento das gerências; e estruturas organizacionais de apoio.

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d) Gerência do projeto de reengenharia para resultados: desenvolvi-mento de forte espírito de equipe; times bem treinados e diversificados; ela-bordagem disciplinada e estruturada.

e) Prática de gerência de mudança e provisão de suporte: estratégias degerência de recursos humanos; estratégias de recursos de informação e suportetécnico; grupos de apoio; e programas de comunicação e educação.

f) Mensuração e avaliação contínua do desempenho: avaliação dodesempenho dos processos a partir dos clientes e dos stakeholders; gerênciade desempenho no âmbito e entre os processos; e partilha do aprendizado.

As características citadas constituem-se nos fatores comuns encontra-dos nas agências que têm implementado esforços de mudança radical com vistaà melhoria de seu desempenho, notadamente no que diz respeito à redução dotempo e dos custos e ao aumento considerável na qualidade e quantidade dosprodutos e serviços prestados.

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Notas

1 O presente documento resulta de atendimento a demanda de estudos sobreexperiências internacionais de reforma administrativa efetuada através dechamada, realizada pela Fundação Escola Nacional de Administração Pública— ENAP, vinculada ao Ministério da Administração Federal e Reforma doEstado — MARE — do Brasil.

2 O nome dos palestrantes e os respectivos temas abordados são indicados no Anexo.3 Waivers: ver “A flexibilidade e o instituto do waiver”, p.21.4 Em sucessivos governos, desde a década de 60, consideráveis esforços

foram efetuados nesta direção, envolvendo diferentes conceitos,metodologias e técnicas tais como o “program budget”, o “PPBS”, o“Management by Objectives” e o “Zero-base Budget” .

5 KIMM , Victor J. GPRA: early implementation. In: The Public Manager,The New Bureaucrat, Spring 1995, p. 11.

6 WHOLEY, Joseph S., HATRY, Harry P. And NEWCOMER, Kathryn E., (eds.).1995. Handbook of Practical Program Evaluation. (book review)Government Finance Review. 11/4 (August), p. 57.

7 National Academy of Public Administration — NAPA. Toward UsefulPerformance Measurement. Washington, November, 1994.

8 Informação apresentada por Harry P. Hatry (Diretor do Programa deAdministração Pública do Urban Institute), durante palestra proferida em06.06.95, na National Academy of Public Administration (Washington),para o estamento técnico do Tribunal de Contas da União, no âmbito doprograma de Avaliação de Programas Públicos Orientada para Resultadosdesenvolvido junto à Fundação Getúlio Vargas, no ano de 1996.

9 Idem nota 7.10 É interessante notar, e isto não passa desapercebido aos observadores atentos

que acompanham a evolução conceitual no campo da administração nos USA,como os americanos, a despeito dos modismos, vão internalizando conceitos eos desenvolvendo no âmbito de tecnologias gerenciais sucessivas. No caso emquestão, reedita-se, de certa forma, o conceito de “áreas-chave de resultados”,tomado ao “management by objectives” introduzido no governo americano nadécada de 70 pelo Office of Management and Budget (OMB).

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11 Este comprometimento com a mudança contínua, através de processos auto-sustentados, que capacitam as organizações a se adaptarem às transformaçõesambientais e conviverem com a incerteza, constituiu-se num dos pilares domovimento intitulado “Desenvolvimento Organizacional” (DO), que teve forçamáxima nos anos 60 e 70 nos Estados Unidos. Para uma visão geral do DO esuas implicações no setor público, ver: CAVALCANTI , Bianor. “DO:considerações sobres seus objetivos, valores e processos”, em Revista deAdministração Pública (RAP), Rio de Janeiro, FGV, vol.13, n.2, 1979.

12 A meta para 1996 foi alterada para “realizar pelo menos 70% dos benefíciosidentificados nas recomendações”.

13 A abordagem de inspiração empresarial tem sido, também, objeto de estudoscríticos, que indagam sobre a conveniência da transferência de conceitoscomo o de “clientes” para o governo e da compatibilidade entre esta “visão”e a realização de outros objetivos e valores públicos. Tais estudos exami-nam os riscos da “energização” (empowerment) de funcionários, numafilosofia mais empresarial, onde a competição substitui o esquema gerencialde comando e controle, e os possíveis óbices de se vir a criar uma vasta rededesintegrada de operadores independentes no governo. Para tanto, verKETTL, Donald, bem como WAMSLEY, Gary L. e outros, citados nas referên-cias bibliográficas.

14 Putting Customers First. Standards for serving the american people. In:Report of the National Performance Review. Washington: U.S. GovernmentPrinting Office, September 1994, p. 5.

15 Idem nota 13, p.6 e 7.16 Idem nota 13, p.1.17 O instituto do waiver é o equivalente estadunidense ao “contrat de gestion”

francês. Ver:(1) SILVA , Carlos Eduardo Souza e. Contratos de gestão nasempresas estatais: estrutura, problemas e acompanhamento. Revista deAdministração Pública (RAP), Rio de Janeiro, FGV, 29 (4), out./dez. 1995; e(2) LIMA , Sheyla Maria Lemos. O contrato de gestão e a conformação demodelos gerenciais para as organizações hospitalares públicas. Revistade Administração Pública (RAP), Rio de Janeiro, FGV, 30 (5), set./out.1996.

18 Budget of the United States Government — Fiscal Year 1997. BudgetSupplement, chapter 13: Improving Government Performance, p.130.

19 National Academy of Public Administration. Reengineering for results -keys to success from govenment experience. Washington, D.C., August1994, página 6.

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Anexo — Fonte de informações:Palestras no âmbito do projeto deavaliação de programas públicosorientados para resultados

· Visão geral da avaliação no âmbito do governo federal americano.Palestrante: Harry Havens (ex-controlador Geral Assistente do U.S.

General Accounting Office - GAO).

· O GAO e seu relacionamento com o Congresso.Palestrante: Roger L. Sperry (Diretor de Estudos Gerenciais da

National Academy of Public Administration).

· O papel do inspetor geral na avaliação de programas.Palestrante: June Gibbs Brown (Inspetora Geral do U.S. Department of

Health and Human Services).

· A evolução do processo de avaliação no GAO.Palestrante: Elmer B. Staats (Presidente do Conselho da Harry S.

Truman Scholarship Foundation, ex-controlador Geral dos Estados Unidos).

· Problemas e oportunidades relacionados com o papel do inspetor geral.Palestrante: Paul Light (Diretor de Política Pública do Pew Charitable

Trusts, ex-Consultor Especial em Administração Pública do U.S. SenateGovernmental Affairs Committee).

· O papel do inspetor geral e sua relação com o Poder Executivo e oPoder Legislativo.

Palestrante: Charles L. Dempsey (Consultor, ex-presidente da ChuckDempsey & Associates e ex-Inspetor Geral do U.S. Department of Housing andUrban Development).

· O papel do Office of Management and Budget — OMB na avaliaçãoe mensuração de desempenho.

Palestrante: Jonathan D. Bruel (Consultor Senior do Deputy Directorfor Management do U.S. Office of Management and Budget).

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. Mensuração de desempenho na esfera federal.Palestrante: Harry P. Hatry (Diretor do Programa de Administração

Pública do Urban Institute).

. A evolução da auditoria interna e da avaliação no Departamento de Defesa.Palestrante: Stephen E. Keefer (Auditor Geral Delegado da U.S. Army

Audit Agency).

. O GAO e a mudança organizacional.Palestrante: Richard Fogel (Controlador Geral Assistente para

Programas Governamentais Gerais do U.S. General Accounting Office).

. O papel dos chief financial officers do governo federal.Palestrante: Arnold G .Holz (Secretário de Finanças da National

Aeronautics and Space Administration - CFO/NASA).

. A avaliação de programas efetuada pela Rand Corporation.Palestrante: David S. C.Chu (Diretor do Departamento de Pesquisas de

Washington da RAND Corporation).

. O General Accounting Office - GAOPalestrante: Roger L. Sperry (Diretor de Estudos Gerenciais da

National Academy of Public Administration).

. Seminário sobre o processo de avaliação de programas (o que é,objetivos, características, limites, aplicações) e os diferentes tipos deavaliação, realizado na George Mason University, no período de 07 a 14 dejunho.

Palestrante: Blue Wooldridge (Professor Associado do Departamentode Ciência Política e Administração Pública da Virgínia CommonwealthUniversity).

Palestrante: Nicholas Zacchea (Professor da New York University e ex-gerente Regional Assistente do U.S. General Accounting Office - New York).