13
Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990 68 A Aprendizagem Cooperativa na melhoria do autoconceito de alunos com e sem Necessidades Educativas Especiais The Cooperative Learning in improving the self-concept of students with and without SEN Lúcia Gonçalves 1 * / Maria Helena Santos Silva** / José Pinto Lopes** * Colégio Salesiano de Poiares, Régua, Portugal; ** Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal e CIIE – Centro de Investigação e Intervenção Educativas da Universidade do Porto RESUMO Introdução. O impacto da Aprendizagem Cooperativa na melhoria da motivação escolar de alunos com e sem N.E.E é um aspeto largamente salientado na literatura. Este estudo teve como principal objetivo analisar de que forma o modelo de ensino baseado na aprendizagem cooperativa pode contribuir para o desenvolvimento da autoestima em alunos com e sem NEE. Método: Na análise dos dados recolhidos foi utilizada a metodologia quantitativa para análise da Escala de Piers-Harris Children`s self-concept scale. Resultados: Os resultados sugerem que o modelo de ensino baseado na aprendizagem cooperativa possibilita globalmente aos alunos aumentarem o nível de autoconceito relativamente aos diferentes fatores do autoconceito. Conclusão: A Aprendizagem Cooperativa pode tornar-se cada vez mais relevante na escolha de práticas pedagógicas diferenciadas e inovadoras, dada a influência positiva que a mesma tem no desenvolvimento do autoconceito dos alunos tenham ou não NEE. Palavras-chave: Necessidades Educativas Especiais (N.E.E); Tutoria entre Pares; Cabeças Numeradas Juntas; Autoconceito 1 A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Lúcia Gonçalves, Colégio Salesiano de Poiares, Régua, Portugal E.mail: lucia.goncalvespoiares.salesianos.pt) Submissão: 2.02.2015 Aceitação: 25.07.2015

A Aprendizagem Cooperativa na melhoria do autoconceito de ...edupsi.utad.pt/images/PDF/revistaN2/4º-A_Aprendizagem_Cooperativa... · O método Cabeças Numeradas Juntas, criado por

Embed Size (px)

Citation preview

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

68

A Aprendizagem Cooperativa na melhoria do autoconceito de alunos

com e sem Necessidades Educativas Especiais

The Cooperative Learning in improving the self-concept of students

with and without SEN

Lúcia Gonçalves1* / Maria Helena Santos Silva** / José Pinto Lopes**

* Colégio Salesiano de Poiares, Régua, Portugal; ** Universidade de Trás-os-Montes e

Alto Douro, Vila Real, Portugal e CIIE – Centro de Investigação e Intervenção

Educativas da Universidade do Porto

RESUMO

Introdução. O impacto da Aprendizagem Cooperativa na melhoria da motivação escolar de alunos com e sem N.E.E é um aspeto largamente salientado na literatura. Este estudo teve como principal objetivo analisar de que forma o modelo de ensino baseado na aprendizagem cooperativa pode contribuir para o desenvolvimento da autoestima em alunos com e sem NEE. Método: Na análise dos dados recolhidos foi utilizada a metodologia quantitativa para análise da Escala de Piers-Harris Children`s self-concept scale. Resultados: Os resultados sugerem que o modelo de ensino baseado na aprendizagem cooperativa possibilita globalmente aos alunos aumentarem o nível de autoconceito relativamente aos diferentes fatores do autoconceito. Conclusão: A Aprendizagem Cooperativa pode tornar-se cada vez mais relevante na escolha de práticas pedagógicas diferenciadas e inovadoras, dada a influência positiva que a mesma tem no desenvolvimento do autoconceito dos alunos tenham ou não NEE.

Palavras-chave: Necessidades Educativas Especiais (N.E.E); Tutoria entre Pares;

Cabeças Numeradas Juntas; Autoconceito

1 A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Lúcia Gonçalves, Colégio Salesiano

de Poiares, Régua, Portugal E.mail: lucia.goncalvespoiares.salesianos.pt)

Submissão: 2.02.2015

Aceitação: 25.07.2015

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

69

ABSTRACT

Introduction: The impact of Cooperative Learning in improving school motivation of students with and without special needs is a widely noted aspect in literature. This study aimed to analyze how the teaching model based on cooperative learning can contribute to the development of self-esteem in students with and without special needs. Method: To analyze the collected data the quantitative methodology was used to analyze Piers-Harris Children`s self-concept scale. Results: The results suggest that the teaching model based on cooperative learning enables students globally increase the self-concept level for the different self-concept factors. Conclusion: Cooperative Learning may become increasingly relevant in the choice of differentiated and innovative teaching practices, given the positive influence it has on the development of self-concept of students, they have or not SEN. Keywords: Special Educational Needs (SEN); Peer tutoring; Numbered Heads

Together; self-concept

INTRODUÇÃO

Para melhor compreender a importância da Aprendizagem Cooperativa na melhoria

da motivação escolar de alunos com Necessidades Educativas Especiais (NEE) e sem

NEE torna-se oportuno começar por esclarecer o entendimento de alguns autores

sobre o conceito.

Maset (2001) concebe a Aprendizagem Cooperativa como um recurso ou estratégia

para atender à diversidade. De acordo com Johnson e Johnson (1999), pioneiros na

promoção deste tipo de aprendizagem desde 1960, assim como na perspetiva de

outros autores tais como Johnson, Johnson e Stanne (2000), Kagan (1992) e Lopes e

Silva (2009), a Aprendizagem Cooperativa é uma metodologia de ensino que consiste

em pôr os alunos a trabalhar em grupo, devendo cada um contribuir individualmente

com o seu trabalho para o trabalho comum criando-se, deste modo, uma

interdependência positiva entre os diferentes elementos. Ou seja, os alunos se

ajudam no processo de aprendizagem, atuando como parceiros entre si e com o

professor, visando adquirir e/ou reforçar conhecimentos e competências sobre um

dado assunto.

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

70

Os sistemas educativos mundiais têm-se debruçado na análise e no sentido a dar à

inclusão educativa, tendo em conta as práticas prescritas. O modelo inclusivo refere

práticas que têm como principal objetivo proporcionar a todos os alunos, com e sem

NEE, um ensino útil e de qualidade em que a inclusão promove a sensibilização e a

consciencialização dos membros de uma determinada comunidade pelo facto de

possibilitar uma maior visibilidade dos alunos NEE (Correia, 2003).

Atendendo às características dos alunos participantes do estudo e ao seu objetivo

foram selecionados os métodos cooperativos Tutoria entre Pares e Cabeças

Numeradas Juntas para a implementação das atividades de ensino- aprendizagem do

conteúdo programático correspondente ao módulo 2, «Organizar o quotidiano». Esta

escolha resultou das potencialidades de ambos os métodos a nível da aprendizagem

de conteúdos, de competências de entreajuda, melhoria da motivação e do espírito

de satisfação tanto individual como coletivo.

A Tutoria entre Pares tem sido um dos métodos cooperativos mais utilizados para no

contexto da Educação Especial porque possibilita que todos os alunos com e sem

N.E.E trabalhem juntos e usufruam das mesmas oportunidades de aprendizagem

(Damon & Phelps, 1989 e 1998; Hardin & Hardin, 2002). Permite uma maior

participação de cada aluno nas suas próprias aprendizagens e nas aprendizagens dos

seus pares a partir de um processo interativo (IUFM, 2000).

De acordo com Lopes e Silva (2010), a Tutoria entre Pares possibilita que os alunos

se tornem professores dos seus colegas-tutores e conduz a que estes aprendam tanto

como aqueles a quem ensinam-tutorados. Isto possibilita, entre outros benefícios, o

aumento da autoestima (Topping, 2000), quer de tutores quer de tutorados.

Contudo, o professor deve ter atenção especial na escolha dos tutores, pois, segundo

Hardin e Hardin (2002), nem todos os alunos estão preparados para trabalhar com

um par com N.E.E.

O método Cabeças Numeradas Juntas, criado por Spencer (Kagan, 1992), é outro

método cooperativo que envolve ativamente todos os alunos nas atividades de

aprendizagem (Hardin & Hardin, 2002). Na perspetiva de Lopes e Silva (2010), este

método implica a preparação em grupo das respostas a questões ou atividades

propostas pelo professor, durante um tempo estipulado por este, devendo cada aluno

de cada um dos alunos dos diferentes grupos ser capaz de responder às questões

colocadas. Isto implica que todos os alunos tenham de saber responder às questões

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

71

ou tarefas propostas pelo professor, o que permite desenvolver a responsabilidade

individual e tornar os alunos mais dispostos a assumir riscos e a sugerir ideias, dado

que as respostas às questões foram anteriormente discutidas por todos no grupo.

Igualmente permite aumentar o espírito e a satisfação da equipa (Lopes & Silva, 2008

e 2009).

Assim, o objetivo que conduziu ao desenvolvimento deste estudo foi analisar de que

forma a utilização da aprendizagem cooperativa pode contribuir para o

desenvolvimento da autoestima em alunos com e sem NEE.

Metodologia

Participantes

Os participantes do estudo foram dez alunos, 4 deles com NEE de uma turma cuja

lecionação foi da responsabilidade de um dos autores do estudo.

O estudo desenvolveu-se na disciplina de Língua estrangeira - Francês, de um Curso

de Educação e Formação. De acordo com o diagnóstico efetuado pelo Departamento

Psicopedagógico da escola, os alunos com N.EE apresentavam características

relacionadas com competências cognitivas e sociais pouco desenvolvidas. Para a

avaliação destes alunos foi realizado um Relatório Técnico-Pedagógico por referência

à CIF - Classificação Internacional do Funcionamento, Incapacidade e Saúde (OMS,

2004).

Procedimentos

O estudo decorreu durante 24 tempos letivos de 45 minutos e abrangeu a planificação

das aulas do módulo 2, «Organiser le quotidien», do Programa – Componente de

Formação Sociocultural e Científica.

Atendendo ao objetivo do estudo e às atividades desenvolvidas, este foi dividido em

três fases com o intuito de facilitar a sua descrição:

- Fase de Pré-implementação. Foram planificadas as atividades de aprendizagem a

serem implementadas com recurso aos métodos cooperativos Tutoria entre Pares e

Cabeças Numeradas Juntas.

Elaboraram-se fichas de trabalho, fichas informativas, guias do tutor e do tutorado,

onde estavam registadas as funções dos alunos de acordo com o papel a assumir,

Grelha de Resultados Cabeças Numeradas Juntas, onde era registada a pontuação

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

72

obtida por cada equipa, Grelhas de avaliação dos alunos e do professor, Documento

de reflexão «O meu testemunho», constituído por perguntas abertas, com o objetivo

de os alunos prestarem um testemunho sobre o trabalho desenvolvido no âmbito da

implementação da Aprendizagem Cooperativa, ou seja, onde emitiram a sua opinião

sobre a experiência pedagógica implementada.

Para trabalhar com o método Tutoria entre Pares, foram constituídos grupos de dois

alunos: um com NEE – o tutorado (t) e o outro sem NEE – o tutor (T). Dado que os

alunos com NEE eram 4, restavam 2 alunos sem NEE. O critério seguido para designar

o tutor e o tutorado neste grupo teve por base o rendimento escolar, ou seja, a

média dos resultados obtidos pelos alunos no final do 2.º período _ nota de base. O

aluno com rendimento inferior tornou-se tutorado- at e o aluno com um melhor

rendimento escolar tornou-se tutor- AT.

Para trabalhar com o método cooperativo Cabeças Numeradas Juntas, houve a

intenção de manter os grupos de pares formados para trabalhar com o método

Tutoria entre Pares. Assim, mantiveram-se os grupos de pares constituídos por um

aluno com NEE e um aluno sem NEE. Seguindo este critério, apenas um par não foi

mantido, pelo facto de nele não constar nenhum elemento com N.E.E.

Com o objetivo de recolher dados sobre o autoconceito dos alunos antes da

realização do estudo foi efetuada a primeira aplicação da Escala Piers-Harris

Children`s self-concept scale (Piers & Hertzberg, 2002; Veiga, 2006).

- Fase de Implementação abrangeu a implementação na sala de aula das atividades

de ensino-aprendizagem planificadas, com recurso aos métodos cooperativos

selecionados.

- A Fase de Pós-implementação envolveu a segunda aplicação da escala de

autoconceito.

Instrumentos de recolha dos dados

Escala de autoconceito

A escala de autoconceito foi aplicada duas vezes durante o desenvolvimento do

estudo, uma na fase da Pré-implementação e outra na fase da Pós-implementação.

A escala de «Piers-Harris Children`s self-concept scale» (PHCSCS), elaborada por

Piers e Hertzberg (2002) foi adaptada para a população portuguesa por Veiga (1989).

O PHCSCS é um dos instrumentos de avaliação do autoconceito não académico mais

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

73

utilizado na investigação (Veiga, 1989). É uma escala do tipo Thurstone (itens

dicotómicos), com 60 afirmações em que o aluno deve assinalar «sim» ou «não»,

conforme o enunciado do item seja ou não aplicável a si próprio. A cada resposta na

direção do autoconceito positivo atribui-se um ponto (Veiga, 1989). A escala inclui

diferentes fatores: Fator I – Aspeto comportamental (AC) que se refere à perceção

que o sujeito tem do seu tipo de comportamento em situações várias e da

responsabilidade pelas suas ações, designadamente em casa e na escola; Fator II –

Ansiedade (AN) que se refere à insegurança, às preocupações, aos medos e

inquietações com que a pessoa se encara a si própria e às situações. Tem a ver com

emoções e expetativas negativas; Fator III – Estatuto intelectual e escolar (EI) que

sugere a forma como a pessoa se vê a si própria relativamente ao rendimento obtido

nas tarefas intelectuais. Tem a ver com a admiração que pensa que lhe é dispensada

na turma, devido às suas ideias e capacidades de aprendizagem; Fator IV –

Popularidade (PO) que se refere à maneira como o sujeito se percebe nas relações

com os colegas, à facilidade em fazer amigos, ao grau de popularidade e ao modo

como se sente incluído e desejado nos desportos e noutras atividades de grupo; Fator

V – Aparência e atributos físicos (AF) que pretende avaliar o que a pessoa pensa

acerca da sua aparência física; Fator VI – Satisfação-felicidade (SF) que sugere a

satisfação que a pessoa sente por ser como é, tem a ver com o seu nível de felicidade

geral.

Será de salientar que aos scores mais elevados, em todos os fatores (incluindo o fator

ansiedade) correspondem níveis superiores de autoconceito. A pontuação total

obtida na escala é alcançada pela soma da pontuação em cada um dos 60 itens e não

pelo somatório das pontuações nos fatores (Paiva, 2003).

Tratamento e Análise de Dados

Escala de autoconceito

A Escala de Autoconceito (Piers & Hertzberg, 2002, adaptação portuguesa por Veiga,

1989 e 2006) permite obter dados relativos ao autoconceito global e aos diferentes

fatores: aspeto comportamental, ansiedade, estatuto intelectual e escolar,

popularidade, aparência e atributos físicos e satisfação-felicidade. Para cada

resposta direcionada para o autoconceito positivo atribui-se o valor um e, para cada

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

74

reposta no sentido do autoconceito negativo, atribui-se o valor zero. Foram

calculados as médias e os desvios padrões do autoconceito global e de cada um dos

fatores. Para a determinação das diferenças das médias da amostra (antes da

intervenção e depois da intervenção) foi utilizado o teste de Wilcoxon (z). Calculou-

se a magnitude do efeito da intervenção (d de Cohen).

Apresentação e Discussão dos resultados

A tabela 1 regista os dados recolhidos com a aplicação do questionário – escala de

«Piers-Harris Children`s self-concept scale» (PHCSCS), no que se refere ao

autoconceito global da amostra antes e após a aplicação dos métodos cooperativos

Tutoria entre Pares e Cabeças Numeradas Juntas.

A média do autoconceito global dos tutores e tutorados passou de 30,5 para 37,5 da

fase da Pré para Pós-implementação (Tabela 1). A diferença de médias é significativa

(Z = - 2,67, p<.008), o que pode inferir que há diferenças significativas entre os

resultados globais do autoconceito da fase de Pré para Pós-implementação. A

magnitude do efeito foi significativa (d= 0,65), representando um ganho de 24

percentis.

Da análise da tabela 1, verifica-se ainda que todos os alunos, à exceção de AT5 que

manteve o mesmo valor, apresentam valores de autoconceito global mais elevados,

após a intervenção pedagógica.

O aluno at3 foi quem mais melhorou a nível do autoconceito global, tendo obtido

mais 19 pontos na fase de Pós-implementação. O tutor que mais ganhos obteve

globalmente foi o aluno AT1 (mais 8 pontos).

Tabela 1

Resultados Obtidos com a Aplicação da Escala do Autoconceito Global, Antes e Após

a Intervenção Pedagógica

N=10

AUTOCONCEITO GLOBAL

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

75

Antes da intervenção

Após a intervenção

Tutorados

at1 36 42

at2 31 47

at3 31 50

at4 8 9

at5 24 26

Média 26 34,8

Tutores

AT1 39 47

AT2 38 42

AT3 33 41

AT4 33 39

AT5 32 32

Média 35 40,2

Média global 30,5 37,5

Desvio padrão 8,95 12,3

z -2,67

p <.008

Legenda : AT – aluno tutor at – aluno tutorado

O tutorado at4 foi o aluno que obteve ganhos menores. Contudo, é de destacar que,

relativamente às perguntas nº 22 «sou um membro importante da minha turma», nº

29 «preocupo-me muito» e nº36 «odeio a escola», o aluno respondeu de forma

diferente na fase de Pré e de Pós-implementação. Tinha respondido na fase de Pré-

implementação às duas primeiras questões negativamente e afirmativamente à

última e na fase de Pós-implementação respondeu de forma inversa. Apesar de os

resultados obtidos nas duas aplicações do questionário serem semelhantes, a

alteração das suas respostas a estas questões parece-nos importante, uma vez que

pode sugerir uma atitude mais positiva em relação a si e à escola. Ou seja, as

respostas dadas em Pós-implementação parecem indicar uma melhoria a nível do

autoconceito.

Na tabela 2, apresentam-se os dados recolhidos com a aplicação da Escala de «Piers-

Harris Children`s self-concept scale» (PHCSCS), relativamente aos diferentes fatores

do autoconceito, antes e após a realização do estudo.

Tabela 2 Resultados Obtidos a Nível dos Diferentes Fatores da escala de Autoconceito, Antes e Após a Intervenção

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

76

N=10 Legenda : AT – aluno tutor at – aluno tutorado

Da análise desta tabela, constata-se que no final do estudo existiu um aumento da

média global da turma em todos os fatores de autoconceito, quer por parte dos

tutorados, quer dos tutores. Verifica-se, ainda, que os ganhos menores se situaram

no Aspeto Comportamental. Os ganhos mais elevados são a nível do Estatuto

intelectual e escolar (2,3), tendo os tutorados aumentado 2,6 pontos e os tutores 2

pontos. Os tutores obtiveram, comparativamente aos tutorados, ganhos mais

elevados em todos os fatores, à exceção do fator Popularidade.

A análise individual de cada fator possibilita constatar que o tutorado at3 foi quem

mais ganhou (19 pontos), pois obteve ganhos significativos em todos os fatores.

FATORES DO AUTOCONCEITO

Aspeto comportament

al

Ansiedade Estatuto intelectual e escolar

Popularidade Aparência e atributos

físicos

Satisfação e

felicidade

Pré-ensino

Pós-ensino

Pré-ensino

Pós-ensino

Pré-ensino

Pós-ensino

Pré-ensino

Pós-ensino

Pré-ensino

Pós-ensino

Pré-ensino

Pós-ensino

Tutorados

at1 7 8 5 7 8 4 6 9 3 6 7 8

at2 11 12 3 6 2 9 6 7 3 5 6 8

at3 11 12 0 4 5 12 3 7 5 7 7 8

at4 1 2 1 0 3 4 3 2 0 0 0 1

at5 9 6 1 3 2 4 4 1 5 6 3 6

Média 7,8 8 2 4 4 6,6 4,4 5,2 3,2 4,8 4,6 7,8

Tutores

AT1 9 8 7 8 3 9 8 9 5 6 7 7

AT2 12 11 4 5 7 9 5 7 2 3 8 7

AT3 10 11 2 3 6 8 6 8 2 4 7 7

AT4 7 9 2 3 8 7 8 10 3 3 5 7

AT5 7 6 1 3 3 4 8 6 7 6 6 7

Média 9 9 3,2 4,4 5,4 7,4 7 8 3,8 4,4 6,6 7

Média global 8,4 8,5 2,6 4,2 4,7 7 5,7 6,6 3,5 4,6 5,6 6,6

Desvio padrão 3,1 3,2 2,1 2,3 2,4 2,8 1,9 2,9 2,0 2,1 2,4 2,0

Z -.432 -2,57 -1,89 -1,18 -2,20 -2,15

p 0,66 0,11 0,58 0,23 0,27 0,31

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

77

Estes resultados reforçam as investigações de Topping (2000), de Cunha (2007) e de

Ramos (2008) quando referem a melhoria da autoestima com a utilização da

metodologia de aprendizagem cooperativa.

Conclusão

Os métodos de aprendizagem cooperativa utilizados revelaram-se importantes no

desenvolvimento do autoconceito.

Comparando os resultados obtidos na escala de autoconceito foi possível verificar

terem sido os tutorados que obtiveram uma maior percentagem de ganhos, ao nível

do autoconceito face à escola:

- Os resultados obtidos na escala de autoconceito permitiram verificar que os

tutores, alunos sem N.E.E, obtiveram ganhos globais no autoconceito, embora os

ganhos tivessem sido inferiores aos dos tutorados que apresentavam, no início do

estudo, valores inferiores relativamente a estes aspetos.

Dos 10 alunos participantes no estudo, todos os alunos, à exceção um aluno tutor,

aumentaram o seu autoconceito. Ou seja, os métodos cooperativos utilizados,

Tutoria entre Pares e Cabeças Numeradas Juntas, refletiram-se na melhoria do

autoconceito global dos alunos com e sem NEE.

No que diz respeito ao fatores do autoconceito, onde se verificaram maiores ganhos

foi no estatuto intelectual e escolar.

Pode-se, por conseguinte, concluir que os alunos da amostra, alunos com e sem NEE,

melhoram a autoestima, ao longo do desenvolvimento do estudo.

De acordo com Hourcade (2002) e com Katz e Mirenda (2002), os tutores podem

ajudar os colegas com NEE através da aprendizagem cooperativa de modo a facilitar-

lhes a aquisição não apenas de competências cognitivas mas também de

competências sociais.

Em suma, à semelhança de estudos como os de Farlow (1994), Johnson e Johnson

(1999) e Tomasik (2007), para além de outros já referidos, a utilização da

Aprendizagem Cooperativa, mais especificamente dos métodos cooperativos Tutoria

entre Pares e Cabeças Numeradas Juntas, refletiu-se na melhoria do autoconceito

de alunos com e sem N.E.E. Assim, a Aprendizagem Cooperativa pode tornar-se cada

vez mais relevante na escolha de práticas pedagógicas diferenciadas e inovadoras,

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

78

dado a influência positiva que a mesma tem no desenvolvimento do autoconceito dos

alunos.

Referências

Agência Europeia para o Desenvolvimento em Necessidades Educativas Especiais

(2003). Educação Inclusiva e Práticas de Sala de Aula. Relatório Síntese.

Recuperado em https://www.european-

agency.org/sites/default/files/inclusive-education-and-classroom-

practices_iecp-pt.pdf

Bardin, L. (1994). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.

Correia, L. (2003). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais- Um guia para

educadores e professores. Porto: Porto Editora.

Cunha, A. (2007). A aprendizagem cooperativa no ensino das Ciências Naturais- A

utilização dos métodos Jigsaw, Cabeças Numeradas Juntas e Trocar Perguntas/

Problema STAD. Dissertação de mestrado, Universidade de Trás-os-Montes e Alto

Douro, Vila Real.

Damon, W., & Phelps, E. (1989). Strategic Uses of Peer Learning in Children's

Education. In T. J. Berndt & G. W. Ladd, Peer Relationships in Child Development

(pp. 135-157) New York: John Wiley and Sons.

Damon, W., & Phelps, E. (1998). Three Approaches of Peer Learning and Their

Educational Uses. Paper presented at the annual meeting of the American

Educational Research Association, April, New Orleans, LA.

Farlow, L. (1994). Cooperative Learning To Facilitate the Inclusion of Students with

Moderate to Severe Mental Retardation in Secondary Subject-Area Classes.

Department of Counseling and Special Education California State University,

Fresno.

Hardin, B., & Hardin M. (2002). Into the Mainstream Pratical Strategies for Teaching

in Inclusive Environments. The Clearing House: A Journal of Educational

Strategies, Issues and Ideas, 75(4), 175-178. DOI: 10.1080/00098650209604925

Hourcade, J. J. (2002). Mental retardation: Update 2002. Boise, ID: Boise State

University. (ERIC Document Reproduction Service No. EDO-EC-02-15)

IUFM (2000). CNRE - Questions d`éducation. Rapport de l`équipe IUFM d’Aix-

Marseille. LAMES.

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

79

Johnson, D.W. & Johnson, R.T. (1999). Learning together and alone. Cooperative,

competitive, and individualistic learning (5th ed). Boston, MS: Allyn and Bacon.

Johnson, D.W., Johnson, R.T., & Stane, M. (2000). Cooperative Learning Methods: A

Meta-Analysis. Recuperado em

http://www.ccsstl.com/sites/default/files/Cooperative%20Learning%20Research%2

0.pdf

Kagan, S. (1992). Cooperative learning. San Juan Capristano, CA: Resources for

teachers, Inc.

Katz, J., & Mirenda, P. (2002). Including students with developpement disabilities in

general education benefits. International Journal of Special Education, 17(2),

25-35.

Lopes, J. & Silva, M. H. (2008). Métodos de Aprendizagem Cooperativa. Porto: Areal

Editores.

Lopes, J. & Silva, M. H. (2009). A Aprendizagem Cooperativa na sala de aula – um

guia prático para o professor. Lisboa: Lidel, Edições Técnicas.

Lopes, J. & Silva, M. H. (2010). O professor faz a diferença. Lisboa: Lidel, Edições

Técnicas.

Maset, P. (2001). Atención a la diversidad y aprendizaje cooperativo en la educación

obligatoria. Málaga: Ediciones Aljibe.

Paiva, J. (2003). As tecnologias de informação e comunicação: utilização pelos

alunos. Lisboa: Ministério da Educação.

OMS (2004). Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde -

CIF. Genebra: Autor.

Piers, E. V., & Herzberg, D. (2002). Piers-Harris Children’s Self-Concept Scale (2nd

ed.). Wilshire Boulevard, CA: Western Psychological Services.

Ramos, R. (2008). A aprendizagem cooperativa no ensino das Ciências Naturais- o

método STAD. Dissertação de mestrado, Universidade de Trás-os-Montes e Alto

Douro, Vila Real.

Tomasik, M. (2007). Effective inclusion activities for high school students with

multiple disabilities. Journal of Visual Impairment and Blindness, 66, 657-659.

Topping, K. J. (2005). Trends in peer learning. Educational psychology, 25, 631-645.

Veiga, F. H. (1989). Escala de autoconceito: adaptação portuguesa do "Piers-Harris

Children's Self-Concept Scale". Psicologia, VII(3), 275-284.

Revista Eletrónica de Educação e Psicologia edupsi.utad.pt

Ano 2, Volume 2, 2015, pp. 57-69 ISSN 2183-3990

80

Veiga, F. H. (2006). Uma nova versão da escala de autoconceito Piers-Harris

Children’s Self-Concept Scale (PHCSCS-2). Psicologia e Educação, 5(1), 39-48.