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A arquitectura do universo robert jastrow (Director do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da NASA e professor de Geofísica na Universidade de Colúmbia). a arquitectura do universo (dos astros, da vida, dos homens) Tradução portuguesa revista por jorge branco (do Centro de Cálculo Científico da Fundação Calouste Gulbenkian) edições 70 Tradução de Verónica Ferreira e Margarida Cabrita Capa de Arcângela Marques c 1967, 1971 by Robert Jastrow Todos os direitos reservados para a lingua portuguesa por Edições 70, Lda.,Lisboa - PORTUGAL edições 70. lda, Av. Elias Garcia, 81 r/c - 1000 LISBOA Telef. 762720, 762792, 762854 Telegramas: SETENTA Telex: 64489 TEXTOS P universo da ciência a nova física. a biologia. a cosmologia. a genética. as novas tecnologias. o mundo quântico. a geologia e a geografia. Textos rigorosos, mas acessíveis. a divulgação científica de elevada qualidade. "somos irmãos das rochas e primos das nuvens" harlow shapley uma nuvem de gás no interior da qual estão a nascer estrelas (a) \\\\\

A Arquitectura Do Universo

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A arquitectura do universorobert jastrow

(Director do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da NASA e professor de Geofísica na Universidade de Colúmbia).

a arquitectura do universo

(dos astros, da vida, dos homens)

Tradução portuguesa revista por jorge branco(do Centro de Cálculo Científico da Fundação CalousteGulbenkian)

edições 70

Tradução de Verónica Ferreira e Margarida CabritaCapa de Arcângela Marques

c 1967, 1971 by Robert JastrowTodos os direitos reservados para a lingua portuguesapor Edições 70, Lda.,Lisboa - PORTUGAL

edições 70. lda,Av. Elias Garcia, 81 r/c - 1000 LISBOATelef. 762720, 762792, 762854Telegramas: SETENTATelex: 64489 TEXTOS P

universo da ciência

a nova física. a biologia. a cosmologia. a genética. as novas tecnologias. o mundo quântico. a geologia e a geografia. Textos rigorosos, mas acessíveis. a divulgação científica de elevada qualidade.

"somos irmãos das rochas e primos das nuvens"harlow shapley

uma nuvem de gás no interior da qual estão a nascer estrelas(a)

\\\\\ (a) Esta edição não reproduz as figuras insertas nesta obra, todavia, transcrever-se-ão as legendas que as acompanham.

Prefácio à edição revista

Os principais acontecimentos científicos dos últimos anos exigiram grandes revisões nos capítulos de Red Giants and White Dwarfs que tratam de astronomia e de ciência espacial.Os astronautas desceram na Lua em 1969 e recolheram 36 quilos de rocha lunar que, depois de analisados em laboratórios na Terra, se descobriu incluírem as matérias mais antigas encontradas até hoje no sistema solar. Estas descobertas confirmaram aquilo que alguns cientistas suspeitavam havia muito tempo: que a Lua conservou vestígios do seu passado muito melhor do que a Terra e que possui indicações dos primeiros anos do sistema solar, indicações essas que não se podem obter no nosso próprio planeta. Marte e Vénus foram explorados por naves espaciais não tripuladas, americanas e russas, em vários voos extraordinários, entre 1967 e 1969, que preencheram lacunas no nosso conhecimento das condições de superfície nestes planetas e forneceram uma base melhor para calcular as possibilidades de encontrar vida em qualquer outra parte do sistema solar. Descobriram-se"pulsares" em 1968 que foram identificados, pouco tempo depois, como sendo estrelas de nêutrons - os objectos mais densos conhecidos no Universo. A descoberta posterior de um "pulsar" na Nebulosa do Caranguejo relacionou "pulsares" com explosões de supernovas e adicionou um elemento, importante e anteriormente insuspeito, à história da vida das estrelas.

Foram escritos capítulos completamente novos sobre a Lua, Marte e Vénus para incluir estes resultados fascinantes e foi acrescentado um parágrafo novo sobre "pulsares" e estrelas de nêutrons ao capítulo sobre a evolução estelar. Procedeu-se a outras modificações ao longo do texto para apresentar sugestões de leitores e colegas. Foi agradável receber ininterruptamente um grande número de correspondência de leitores do mundo inteiro, nos últimos três anos, exprimindo o seu contentamento por poderem compreender, pela primeira vez, muitos dos mistérios da ciência, através da leitura deste livro.

Estou profundamente reconhecido ao Professor Paul W. Gast do Observatório geológico Lamont-Doherty da Universidade de Colúmbia e do Centro de Naves Espaciais Tripuladas, em Houston, pela orientação inestimável na interpretação das descobertas resultantes das experiências das naves Apolo 11 e Apolo 12 e por muitos debates agradáveis sobre as complexidades da geologia lunar, gostaria de agradecer também ao Professor s. Ichtiaque Rasool do Instituto de Estudos Espaciais Goddard pelas várias discussões valiosas sobre os resultados das missões Mariner a Marte.

Prefácio

Este livro teve origem numa série de cinquenta e sete programas de meia hora na televisão, intitulada "Semestre do Verão", que fiz para a rede da CBS em 1964, como lições da parte da manhã sobre ciência espacial. Decidi explicar nestes programas todos os campos da ciência moderna, porque as experiências levadas a cabo no programa espacial envolvem quase todos os problemas científicos importantes, e eu queria que o público compreendesse por que é que estas experiências são necessárias. Foquei a maior parte do espectro científico - Física, Astronomia, Geologia e Biologia.

Para o fim da série de programas, tive uma revelação que nunca até ali, em quinze anos de cientista, me tinha ocorrido. Compreendi que os últimos progressos nos diferentes campos da ciência, fascinantes em si próprios, são os fragmentos vivamente coloridos de um mosaico que, quando visto à distância, forma uma imagem do próprio observador humano e das suas origens. A ciência tem vindo a revelar provas que sugerem que devemos a nossa existência a acontecimentos que tiveram lugar, há milhares de milhões de anos, nas estrelas que viveram e morreram muito antes de o nosso sistema solar se ter formado. A história

científica da criação toca nos problemas centrais da existência do Homem: Que sou eu? Como cheguei aqui? Qual é a minha relação com o resto do Universo? As idéias são simples e encantadoras; podem ser expressas em linguagem clara, sem o uso de gíria ou matemática. A história das origens do Homem vai muito para além das teorias de Darwin; começa antes do tempo dos nossos antepassados que viviam nas árvores, e muito antes do período, há alguns milhares de milhões de anos, em que as formas mais elementares de vida apareceram pela primeira vez sobre a face da Terra; atravessa o limite entre o mundo animado e o inanimado e remonta ao tempo da nuvem-mãe de hidrogênio de que provêm todas as coisas que existem.

Levado por estas idéia s fascinantes, pus de lado os aspectos sobre foguetões e satélites dos meus primeiros programas de televisão, deixando-os para outro volume, e concentrei-me num livro que trataria da evolução das estrelas, dos planetas e da vida.

Muitos colegas ajudaram-me na preparação deste volume. Estou especialmente reconhecido a várias pessoas que se dignaram dispor do tempo necessário para uma leitura cuidadosa e para a preparação de críticas detalhadas de capítulos particulares. Nestes estão incluídos os Professores Bengt Stromgren e A.G.W. Cameron e o Dr. Richard Stothers nos capítulos sobre o nascimento e a morte de estrelas e sobre cosmelogia; os Professores Harold Urey, Gordon J. F. MacDonald e Paul W. Gast nos capítulos sobre a origem do sistema solar e da Lua e sobre a história da Terra; o Dr. Gordon M. Tomkins e os Professores Joshua Lederberg e Stanley L. Miller no capítulo sobre a origem da vida e os Professores Edwin Colbert, John Imbrie, Armand V. Oppenheimer, Colin Pittendrigh e G. G. Simpson nos capítulos sobre a evolução.

Gostaria de expressar a minha especial gratidão a um grupo de amigos e associados, trabalhadores e dedicados. Entre eles destacam-se principalmente Kate Oliver e Ruth McCarthy, ambas dotadas de espírito aberto e de um excelente sentido para a linguagem; o livro deve-lhes muitíssimo pelas suas inúmeras sugestões quanto à exposição de idéia s científicas difíceis. A minha mãe, Marie Jastrow, leu o manuscrito cuidadosamente e indicou as passagens que podiam ser difíceis para o leigo. As suas sugestões aparecem por todo o livro. Agradeço a Nicholas Panagakos pelo seu excelente conselho quanto a problemas de substância e exposição em todos os capítulos. Nancy Stepan, DeLorah Kaplan, Nancy Martin, Joseph Goldstein, Bonnie Neustadter e Alice Turner forneceram valiosos conselhos no que respeita a passagens obscuras. Gostaria de agradecer a George Goodstadt e a Barrett Gallagher e à esposa Timmy pela orientação na selecção e classificação das ilustrações. Barrett e a esposa Timmy também deram sugestões úteis que melhoraram o manuscrito, especialmente nos primeiros capítulos sobre matéria e forças. Philip Paris e Barbara Rusciolleli Stewart transcreveram as fitas gravadas dos programas de televisão para uma primeira redação do manuscrito, e contribuíram com muitas correcções editoriais nesse processo. Estou agradecido a Inman King e a Kay Roman pela sua ajuda na preparação do manuscrito.

Prólogo

Aos trinta anos, comecei a sentir-me cada vez mais insatisfeito com o meu trabalho. Tinha dado aulas teóricas de Física em Yale e em Colúmbia; trabalhado no Laboratório de Física Nuclear da Universidade da Califórnia, em Berkeley, e tinha estado, durante algum tempo, no Instituto de Altos Estudos, em Princeton. Agora continuo ainda a dedicar-me aos problemas teóricos de estrutura nuclear, desta vez no Laboratório de Pesquisa Naval em Washington. As minhas investigações tinham-se restringido aos campos da Física Atómica e Nuclear, não sentindo então qualquer atracção pelos aspectos científicos que envolviam acontecimentos fora do laboratório. Mas não era por isso que eu deixava de estar interessado nas actividades de um grupo de cientistas que estava absorvido por um objectivo completamente diferente, numa outra parte do Laboratório de Pesquisa Naval. Refiro-me às pessoas que trabalhavam no Projecto Vanguarda, o primeiro programa americano de lançamento de um satélite artificial.

O Projeto Vanguarda captou a minha atenção, e decidi trabalhar nele se, por acaso, houvesse alguma possibilidade. Com este fim em vista, apresentei-me um dia, no Outono de 1956, a J. W. Siry, o principal responsável teórico pelo Projeto. O Dr. Siry falou-me de um problema que considerava importante mas de que ele próprio não se podia ocupar por causa do trabalho que tinha em mãos, referente aos preparativos para o primeiro lançamento do Projecto. O problema que propôs foi calcular a diminuição de velocidade de um satélite em órbita resultante das suas colisões com as moléculas de ar. Fiz os cálculos com a colaboração do Dr. C. A. Pearse. Os resultados a que chegámos sugeriram efeitos eléctricos estranhos no movimento do satélite. Estas investigações introduziram-me noutro campo da Física - o dastrajectórias de satélites artificiais.

Em Outubro de 1957, os Russos, e não os Americanos lançaram para o espaço o primeiro satélite feito pelo Homem. Animado por este acontecimento extraordinário, entrei pela primeira vez na sala de controle do Projeto Vanguarda e depararam-me com as redes de rastreio do Projeto a seguirem o Sputnik, à medida que ele descrevia a sua órbita à volta da Terra. Ainda não havia métodos de avaliação rigorosos, destinados a seguir os satélites, visto que o programa americano estava empenhado no lançamento do satélite Vanguarda, previsto para ir para o ar alguns meses mais tarde.

A equipa do Vanguarda tinha de fornecer informações acerca da posição do Sputnik. Perguntei, então, se poderia dar uma ajuda, fazendo os cálculos preliminares da órbita. Um oficial da Marinha e um outro colaborador, formado em Matemáticas e saído recentemente do Instituto Superior Middlebury, estavam a trabalhar em secretárias, numa sala grande. Aparelhos de telétipo emitiam os resultados das posições rádio do Sputnik, recolhidas nas estações dos Estados Unidos encarregadas de seguir os satélites, espalhadas por toda a América do Norte e do Sul. No decurso de cálculos muito rudimentares, cheguei à conclusão que esperava, isto é, que o Sputnik estava a perder energia constantemente, por efeito do atrito da atmosfera. Partindo-se do cálculo da perda de energia, poder-se-ia calcular a densidade da atmosfera superior da Terra. Através de tal circunstância travei conhecimento pela primeira vez com a Física Atmosférica.

Os trabalhos sobre as trajectórias dos satélites artificiais levaram a um convite para participar numa Conferência Internacional de Foguetões e Satélites, marcada para Julho de 1958, em Moscovo. Na mesma altura fui nomeado para outro cargo. Tinham-se recebido notícias de um objecto brilhante que sobrevoava o Alasca e a parte Ocidental dos Estados Unidos, por volta da mesma altura em que o atrito da atmosfera teria feito regressar à Terra o foguetão que havia posto o Sputnik em órbita. Os russos declararam que o foguetão descera sobre território americano, e que o queriam recuperar. O primeiro-ministro Khruchtchev pediu-o pessoalmente. Sem dúvida que o governo dos Estados Unidos teria ficado encantado em aceder a este pedido, mas não tinha o foguetão e não o conseguiram encontrar.

Examinei os relatórios e as observações de radar que possuía das trajectórias finais do foguetão e cheguei à conclusão de que ele tinha permanecido em órbita durante ainda seis ou oito horas depois da sua última passagem sobre os Estados Unidos, e que o mais provável seria que ele tivesse descido em qualquer parte ao longo de um arco de 3000 quilômetros, traçado entre a parte Oriental da União Soviética e a China.

Durante a conferência de Moscovo, em Julho, apresentei as minhas conclusões acerca do destino do foguetão. Poder-se-ia ter ouvido um alfinete cair no salão enquanto eu expunha o resumo frio dos meus cálculos. Das várias centenas de cientistas russos que estavam presentes ninguém me fez qualquer pergunta, e, quando os correspondentes dos jornais estrangeiros registaram os seus artigos, a censura soviética deteve-os, embora a sua publicação fosse permitida no dia seguinte. Ainda hoje não sei se os cientistas soviéticos acharam a análise convincente, ou se simplesmente supuseram que eu tinha sido encarregado pelo governo americano de elaborar os resultados.

Depois da conferência de Moscovo seguiu-se a segunda Conferência dos Estados Unidos sobre a Utilização Pacífica da Energia Atómica, cumprindo, assim, o que veio a ser o

meu último cargo como físico nuclear. Ao regressar aos Estados Unidos no Outono, pediram-me que entrasse para a NASA, a recém-criada Administração da Aeronáutica Nacional e do Espaço que tinha acabado de ser instituída pelo governo em resposta ao desafio da União Soviética. Estava encarregado de criar uma Divisão Teórica da NASA, a qual deveria ser dedicada à investigação básica em Astronomia e Ciências Planetárias.

De maneira geral, a área de investigação da nova divisão era óbvia. Incluiria todos os problemas científicos que podiam ser estudados por instrumentos transportados em satélites e foguetões interplanetários. Mas esta definição da tarefa podia ter abrangido a maior parte da Ciência. O problema estava em escolher alguns problemas importantes e concentrarmo-nosneles. Quais eram os problemas importantes?

Tomei posse a 10 de Novembro de 1958 e, três semanas depois, atravessei os Estados Unidos para me dirigir ao laboratório em La Jolla, na Califórnia, e lá me encontrar com um homem que me tinham dito ser capaz de me dar alguns conselhos. O Professor Harold Clayton Urey escrevera um livro acerca da Lua e doutros planetas, e era bem conhecido pelo seu grande interesse pelo estudo Científico destas matérias. Quando cheguei, apresentei-me e pedi-lhe que sugerisse alguns problemas para a Divisão Teórica da NASA procurar resolver, os quais nos dariam experiência num campo tão desconhecido para nós.

O Professor Urey pareceu ficar contente por ser procurado por um físico a trabalhar para uma nova agência espacial. Pediu que me sentasse, passou-me para as mãos um livro sobre planetas aberto no capítulo relativo à Lua e começou a falar da única importância que este corpo árido e sem vida tem para alguém que deseje compreender a origem da Terra e dos outros planetas. Fiquei fascinado com o relato dele, relato que nunca ninguém me fizera antes, em catorze anos de estudo e investigação em Física. Harold Urey tem a maravilhosa qualidade de possuir uma curiosidade intensa e quase infantil no que respeita aos aspectos do mundo natural. Tal espécie de curiosidade é uma qualidade rara. Através dos olhos de Harold Urey e de outros, que eu conheci depois, familiarizei-me pela primeira vez com problemas da ciência que eram desconhecidos para mim e completamente diferentes da Física laboratorial que tinha dominado a minha experiência anterior. Como licenciado, a minha vida girara à volta do átomo e de núcleo. No meu mundo, as leis da Física aplicada e todos os acontecimentos eram governados pela acção das forças fundamentais da Natureza - gravidade, electromagnetismo e forças nucleares. A Astronomia e a Geologia - o estudo do impacte destas forças numa escalaimponente - eram um livro fechado para mim, e a Biologia constituía um assunto a que era completamente alheio.

Aprendi então pela primeira vez como as estrelas e os planetas nasciam, como o sistema solar foi formado, quais as condições que poderão ter prevalecido sobre a Terra primitiva, e como é que a vida se pode ter desenvolvido sobre o nosso planeta. O meu trabalho anterior na Física nunca me levara a considerar estes pontos. Contudo, o facto é que um único fio de evidência parte do átomo e do núcleo, passando pela formação de estrelas e planetas, para as complexidades do organismo vivo. Descobertas das últimas décadas estabelecem uma relação entre o mundo do núcleo e o mundo da vida numa cadeia de causa e efeito que se estende por muitos milhões de anos, começando com a formação das estrelas na nossa galáxia e terminando com o aparecimento do Homem sobre a Terra. No princípio desta história existiam apenas átomos do elemento primitivo, hidrogênio, que redemoinhava no espaço exterior em nuvens enormes. Estas nuvens foram a matéria-prima a partir da qual as estrelas, os planetas e os homens foram criados. Ocasionalmente, os átomos de uma nuvem eram atraídos uns para os outros pela força da gravidade; com o passar do tempo, a enorme nuvem contraiu-se numa esfera pequena e densa de gás; aquecida por autocompressão, a sua temperatura elevou-se até que, a um nível de alguns milhões de graus, o centro irrompeu em fogo nuclear. De tais acontecimentos nasceram as estrelas.

No interior da estrela recém-nascida estabeleceu-se uma série de reações nucleares, nas quais todos os outros elementos do Universo foram produzidos a partir do ingrediente básico, o hidrogênio. Finalmente, estas reações nucleares cessaram, e a vida da estrela

terminou. Privada dos seus recursos de energia nuclear, ela contraiu-se em virtude do seu próprio peso e, em conseqüência da contração, deu-se uma explosão, pulverizando para o espaço todos os materiais que tinham vindo a ser criados no interior da estrela durante a sua vida.

Com o decorrer do tempo, novas estrelas, algumas com planetas à sua volta, condensaram-se a partir destas matérias. Tanto o Sol como a Terra foram formados desta maneira, há quatro mil milhões e meio de anos, a partir das matérias fabricadas no interior de outras estrelas, nos primeiros tempos da vida da Galáxia, e dispersaram-se, depois, para o espaço quando aquelas estrelas explodiram.

Logo após a sua formação a Terra deve ter permanecido estéril, mas num espaço de tempo de mil milhões de anos aproximadamente surgiu vida na sua superfície. Como é que podemos explicar este fato? Quais foram as condições que prevaleceram sobre a Terra durante esse primeiro milhar de milhões de anos? Descobertas recentes forneceram indicações para a resposta. Os biologistas descobriram que certas moléculas são as unidades constituintes de todos os seres vivos; criaram estas moléculas no laboratório, a partir das espécies de produtos químicos que existiram na atmosfera e nos oceanos da Terra primitiva e afirmam que provavelmente a vida se desenvolveu sobre a Terra a partir de tais moléculas, muitos milhões de anos atrás.

Fósseis conservados nas rochas da crosta da Terra mostram que, durante os três mil milhões de anos seguintes, um milhão de variedades de plantas e de animais evoluíram a partir daqueles primeiros organismos vivos. Por que razão surgiram aquelas plantas e animais específicos e não outros? Quais as forças que obrigaram a vida a tomar as formas que agora possui? A teoria da evolução de Darwin fornece uma resposta: ao longo da história da Terra, as pressões da luta pela existência têm agido constantemente sobre todas as criaturas, formando e moldando as formas de vida, até que cada espécie adquira a melhor probabilidade possível de sobreviver no seu meio ambiente. O testemunho de fósseis revela os resultados deste processo; mostra a proliferação gradual de muitas variedades de vida, cada uma adaptada especialmente a um conjunto de condições. Com o passar do tempo, e sucessivas mudanças de clima, novas formas de vida surgiram, e as antigas extinguiram-se. No fim da longa cadeia de desenvolvimento aparece o Homem, como um produto de uma linha de evolução que remonta muito para além dos seus antepassados que habitavam as árvores, e mesmo para além das primeiras formas de vida sobre a Terra. A história do Homem começou muitos milhões de anos antes de o próprio sistema solar se ter formado; iniciou-se numa nuvem de hidrogênio em redemoinho, na qual tudo teve origem. Essa é a história que irei contar no presente livro.

1. a dimensão das coisas

Tive, certa vez, oportunidade de fazer um depoimento perante o Senado Espacial e a Junta da Aeronáutica dos Estados Unidos, relativamente aos aspectos científicos do programa espacial. O meu discurso tratou da maneira segundo a qual todas as matérias no Universo são formadas a partir da união de nêutrons, prótons e elétrons, como as unidades constituintes fundamentais. Depois de eu ter abandonado a sala, um funcionário superior da NASA continuou com um resumo dos maiores empreendimentos da ciência do espaço, levados a bom termo durante o ano anterior. Aparentemente, a minha exposição tinha deixado os Senadores confusos, embora estes estivessem ansiosos por compreender os conceitos que eu havia apresentado. No entanto, o à-vontade do funcionário da NASA restituiu-lhes a confiança, e um de entre eles perguntou àquele: "De que tamanho é o elétron? Quantas vezes é mais pequeno do que um grão de poeira?" O funcionário da NASA respondeu-lhe corretamente que o tamanho de um elétron está para um grão de poeira assim como este está para a Terra inteira.

O elétron é, na verdade, muito pequeno. O seu diâmetro mede um milionésimo de bilionésimo de milímetro, um milhão de vezes mais pequeno do que o que pode ser visto com o melhor microscópio eletrônico. O seu peso é correspondentemente pequeno: 10000 bilhões de bilhões de elétrons pesam pouco menos de 30 gramas. Como é que podemos ter a certeza de que um objeto tão pequeno exista? Nunca ninguém apanhou um elétron com uma pinça e disse: "Aqui está um." As provas da sua existência são todas indiretas. Durante os 150 anos decorridos desde a segunda metade do século dezoito até ao começo do século vinte, foi levada a cabo uma grande variedade de experiências sobre a passagem da corrente elétrica através de líquidos e gases. A existência do elétron não ficou concludentemente provada por nenhuma destas experiências. Contudo, a maior parte destas podia ser mais facilmente explicada se o físico pressupusesse que a eletricidade era transportada por uma corrente de pequenas partículas, cada uma das quais carregando a sua própria carga elétrica. Gradualmente os físicos pressentiram, chegando quase à convicção, que o elétron existe realmente.

O problema era agora saber de que tamanho é o elétron, e que quantidade de carga elétrica cada um deles transporta. A resposta mais precisa a esta questão foi dada por um físico americano, Robert Millikan, que estudou o problema na Universidade de Chicago, nas primeiras décadas do século vinte. Millikan concebeu um esquema, brilhante pela sua simplicidade, em que um atomizador produzia um vapor de gotinhas de óleo muito pequenas, mesmo por cima de um pequeno orifício na extremidade superior de um recipiente Algumas das gotas passavam através do orifício e iam-se depositando lentamente no fundo do recipiente. Millikan podia ver muito claramente os movimentos daquelas gotinhas, pois iluminava-as de lado com uma luz forte de modo a que aparecessem como pontos brilhantes, em contraste com um fundo escuro. Millikan descobriu que algumas destas gotinhas transportavam alguns elétrons extra, que tinham sido recolhidos no processo de atomização. Pela aplicação de uma força elétrica às gotinhas, e estudando depois os seus movimentos em resposta a esta força, ele pôde deduzir a quantidade de carga elétrica transportada pelos elétrons em cada gotinha. Chegou-se à conclusão de que esta carga é excessivamente diminuta. A demonstração da sua pequenez é simples - é necessária uma corrente elétrica equivalente ao fluxo de um milhão de bilhões de elétrons por segundo, para acender uma lâmpada de 10 "watts" Tudo isto teve lugar muito recentemente na história da ciência. As primeiras medições precisas de Millikan foram concluídas em 1914.

O pequeníssimo elétron, e duas partículas da mesma espécie, são as unidades constituintes a partir das quais toda a matéria no mundo é construída. As duas partículas da mesma espécie do elétron são os prótons e os nêutrons. Estes foram descobertos ainda mais recentemente do que o elétron; os prótons foram identificados em 1920 e os nêutrons foram descobertos em 1932. A massa de quaisquer destas duas partículas é enorme, comparada com a do elétron - 1840 vezes superior -, mas é ainda de uma leveza inconcebível, se forem adotados padrões vulgares. As três partículas combinam-se de uma maneira surpreendentemente simples para formar os objetos que todos nós vemos e sentimos. Um forte poder de atração une os nêutrons e prótons uns aos outros, formando um corpo denso ecompacto, chamado núcleo, cujo tamanho é um pouco inferior a um milionésimo de milionésimo de um centímetro. Os elétrons são atraídos para o núcleo e giram à sua volta do mesmo modo que os planetas giram em redor do Sol, formando assim um sistema solar em miniatura. Os elétrons, juntamente com o núcleo, formam o átomo.

O tamanho de um átomo-tipo é de cinquenta milionésimos de centímetro. Para ter a idéia da pequenez do átomo comparado com um objeto macroscópico, imaginemos que podemos ver os átomos numa mesa de cozinha, e que cada átomo é do tamanho de um grão de areia Nesta escala de ampliação, a mesa terá então 3500 quilômetros de comprimento.

A comparação de um átomo com um grão de areia implica que o átomo seja um objecto sólido. Na realidade, o átomo consiste, em grande parte, em espaço vazio. Cada um dos átomos que formam a superfície de uma mesa consiste num número de elétrons

descrevendo órbitas à volta de um núcleo. Os elétrons formam um invólucro difuso à volta do núcleo, marcando o limite exterior do átomo. O tamanho do átomo é 10.000 vezes maior do que o tamanho do núcleo que está no centro. Se o invólucro exterior de elétrons no átomo fosse do tamanho da cúpula que cobre o estádio de basebol de Houston, o núcleo seria uma bola de pingue-pongue no centro do estádio. Esta é, pois, a vacuidade do átomo.

Se a maior parte do átomo é espaço vazio, por que será que o tampo da mesa oferece resistência quando fazemos pressão sobre ele com o dedo? A razão é que a superfície da mesa é constituída por uma barreira de elétrons, elétrons esses pertencentes à camada mais exterior de átomos no tampo da mesa; a superfície do nosso dedo é também constituída por uma barreira de elétrons; ao seu contacto, forcas potentes de repulsão elétrica impedem os elétrons na ponta do nosso dedo de penetrar através dos elétrons exteriores no tampo da mesa e de atingir o espaço vazio existente dentro de todos os átomos. Um projétil atômico como, por exemplo, um prótons, acelerado a alta velocidade num ciclotrão, poderia passar facilmente através destes elétrons, que são, apesar de tudo, bastante leves e incapazes de repelir um objecto movendo-se rapidamente. Mas seria necessário empregar mais força do que a pressão do dedo pode produzir para afastá-los para o lado e penetrar no espaço interior do átomo.

A descoberta da vacuidade do átomo é recente. Isaac Newton descreveu os átomos como "partículas sólidas, maciças, duras, impenetráveis e móveis". Durante o século dezenove, os físicos continuaram a considerá-los pequenos objetos sólidos. Lord Rutherford, o mais notável físico experimental do seu tempo, disse, em certa ocasião: "Ensinaram-me a considerar o átomo como um companheiro simpático e duro ao mesmo tempo, de cor vermelha ou cinzenta, conforme o gosto." No começo do século vinte, J. J. Thomson, um físico inglês e um dos pioneiros da investigação da estrutura da matéria, acreditava que o átomo fosse um pudim de ameixa esférico, de carga elétrica positiva, no qual os elétrons carregados negativamente eram embebidos como passas. Ninguém sabia que a massa do átomo, tal como a sua carga positiva, estavam concentradas num pequeno núcleo denso, situado no centro, e que os elétrons giravam à volta deste núcleo, a uma distância considerável. Mas, em 1911, Rutherford, levado por uma suspeita, deu instruções ao seu ajudante Hans Geiger e a um estudante graduado de nome Marsden para dispararem um raio de partículas alfa contra umafolha delgada de ouro. Estas partículas alfa são projéteis atômicos que se movem extremamente depressa, e que, portanto, deveriam ter penetrado na folha de ouro e saído pelo outro lado. Foi precisamente isto o que aconteceu com a maior parte delas, mas, no entanto, Geiger e Marsden descobriram que, em pouquíssimos casos, as partículas alfa saíram da folha pelo mesmo lado por que tinham entrado. Rutherford disse mais tarde: "Foi o acontecimento mais inacreditável que já alguma vez me sucedeu na vida. Foi quase tão inacreditável como se alguém lançasse uma granada contra um lenço de papel e ela voltasse para trás e atingisse a pessoa que a tinha lançado." Mais tarde, Geiger contou do seguinte modo o que se tinha passado: "Um dia (em 1911), Rutherford, obviamente satisfeitíssimo, entrou no meu quarto e disse-me que já sabia de que forma era constituído o átomo e também como explicar os grandes desvios das partículas alfa." Rutherford chegara à conclusão de que o que tinha acontecido era que de vez em quando uma partícula alfa batia num objeto maciço na folha, o qual a repelia imediatamente para trás. Compreendeu que os objetos maciços deviam ser muito pequenos, visto que as partículas alfa só muito raramente batiam neles. Concluiu ainda que a massa do átomo se concentra num corpo compacto que está no centro, ao qual deu o nome de núcleo. A descoberta de Rutherford abriu a porta para a era nuclear.

Vamos, pois, continuar com a descrição da maneira segundo a qual o Universo se encontra constituído a partir das suas partículas básicas. Os átomos juntam-se em grupos para formar moléculas, como é o caso da água, que consiste em dois átomos de hidrogênio juntos a um átomo de oxigênio. Grande número de átomos ou de moléculas cimentados formam matéria sólida. Há um bilhão de bilhões de átomos em 20 centímetros cúbicos de uma

substância sólida vulgar, o que perfaz, mais ou menos, o número dos grãos de areia em todos os oceanos da Terra.

A Terra, por si só, é uma coleção particularmente grande de átomos unidos em conjunto, formando uma bola de rocha e de ferro com 12.700 quilômetros de diâmetro, pesando 6 milhões de trilhões de toneladas. Ela é um dos nove planetas que estão ligados ao Sol pela força da gravidade. O conjunto do Sol e dos planetas forma o sistema solar. O maior dos planetas é Júpiter, cujo diâmetro mede 140.000 quilômetros; Mercúrio, o mais pequeno, tem de diâmetro 5000 quilômetros, é três vezes mais pequeno do que a Terra, e pouco maior do que a Lua. Todos os planetas parecem anões, comparados com o Sol, que tem 1.600.000 quilômetros de diâmetro. O seu peso é 700 vezes maior do que o peso junto dos nove planetas. Tal como o átomo, o sistema solar consiste num corpo central de enorme massa – o Sol - rodeado por corpos pequenos e leves - os planetas – que giram à sua volta a grandes distâncias.

O Sol é apenas uma entre 100 mil milhões de estrelas que estão unidas em conjunto pela força da gravidade, formando um numeroso enxame de estrelas chamado Galáxia. As estrelas giram à volta do centro da Galáxia, tal como os planetas giram à volta do Sol. O próprio Sol participa neste movimento de rotação, completando um circuito em redor da Galáxia em 200 milhões de anos. Em virtude do seu movimento de rotação, a Galáxia toma a forma achatada de um disco, cuja espessura é mais ou menos um quinto do seu diâmetro. A maior parte das estrelas da Galáxia estão neste disco, embora algumas se encontrem fora dele. Um aglomerado esférico de estrelas, relativamente pequeno, chamado o núcleo da Galáxia, está situado na zona central. Toda a estrutura se assemelha a um chapéu mexicano duplo, com o núcleo galáctico por copa e o disco por aba. O Sol está situado na aba do chapéu, a cerca de três quintos da distância que vai do centro à orla. Quando olhamos para o céu na direção do disco, vemos tantas estrelas que se torna impossível observá-las como pontos distintos de luz, mas sim fundidas numa faixa luminosa que se estende pelo céu. Tal faixa é denominada a Via Láctea. As estrelas que fazem parte da Galáxia estão separadas umas das outras por uma distância de 50 bilhões de quilômetros. Para se evitar a repetição freqüente de números tão extravagantemente grandes, as distâncias astronômicas são expressas geralmente em unidades de anos-luz. Um ano-luz é definido como a distância percorrida num ano por um raio de luz, o qual se desloca a 300.000 quilômetros por segundo. Esta distância é, na verdade, de 10 bilhões de quilômetros: por conseguinte, a distância em média entre estrelas na Galáxia é de cinco anos-luz, e o diâmetro da Galáxia mede 100.000 anos-luz.

Apesar do tamanho enorme da nossa galáxia, os seus extremos não marcam o limite do universo observável. O telescópio de 5 metros instalado no Monte Palomar tem ao seu alcance nada menos do que 10 mil milhões de outras galáxias, cada uma delas comparável à nossa em tamanho e contendo um número aproximado de estrelas. A distância média entre estas galáxias é de um milhão de anos-luz. A extensão do universo visível, tal como pode ser observado pelo telescópio de 5 metros, é de 10 mil milhões de anos-luz. Uma analogia ajudará a esclarecer o significado destas distâncias enormes. Imaginemos o Sol do tamanho de uma la anja; nesta escala de valores a Terra será um grão de areia circulando em órbita à volta do Sol a uma distância de 9 metros; o planeta gigante Júpiter, 11 vezes maior do que a Terra, será um caroço de cereja girando à volta daquele a uma distância de 60 metros ou de um quarteirão deedifícios; Saturno será outro caroço de cereja a dois quarteirões do Sol; e Plutão, o planeta mais afastado, será ainda outro grão de areia a uma distância de dez quarteirões do Sol.

Na mesma escala, a distância média entre as estrelas é 3500 quilômetros. O vizinho mais próximo do Sol, a estrela Alfa de Centauro, está a 2000 quilômetros de distância. No espaço compreendido entre o Sol e os seus vizinhos nada mais há do que uma escassa distribuição de átomos de hidrogênio, formando, assim, um vácuo muito melhor do que qualquer jamais conseguido na Terra. Ainda segundo a mesma escala, a Galáxia é um monte de laranjas separadas por uma distância média de 3500 quilômetros, tendo o monte inteiro 35 milhões de quilômetros de diâmetro.

Uma laranja, alguns grãos de areia a umas poucas de dezenas de centímetros de distância, e depois alguns caroços de cereja circulando lentamente à volta da laranja a uma distância de um quarteirão de edifícios. A 3500 quilômetros está outra laranja, talvez com alguns pontinhos de matéria planetária circulando à roda dela. Este é o vácuo do espaço.

elétrons - nêutrons e prótons

O núcleo e o átomo. A matéria é constituída de três componentes fundamentais: uma partícula leve - o elétron – e duas partículas relativamente pesadas - o nêutrons e o prótons -, ambos 1840 vezes mais maciços do que o elétron. Estreitamente unidos uns aos outros, os nêutrons e os prótons formam uma massa compacta que se denomina núcleo.

Os elétrons são atraídos em direção ao núcleo pela carga positiva dos prótons e giram em torno do núcleo sob a influência desta atração. Ao conjunto do núcleo e dos seus elétrons satélites dá-se o nome de átomo. Um átomo de carbono (figura de cima) é composto de seis elétrons que gravitam em torno de um núcleo formado por seis prótons e seis nêutrons. O diâmetro de um átomo-tipo é 2,54 centi-milionésimos de um centímetro.

Moléculas e matéria sólida. Os átomos agregam-se de modo a formar moléculas. Uma molécula de água consiste em dois átomos de hidrogênio ligados a um átomo de oxigênio. Outros compostos de hidrogênio com elementos comuns são, por exemplo, o metano (um átomo de carbono ligado a quatro átomos de hidrogênio) e a amônia(um átomo de nitrogênio ligado a três átomos de hidrogênio). A matéria sólida resulta da agregação de grandes quantidades de átomos ou moléculas. Os cristais de sal comum (figura da esquerda) compõem-se de átomos de sódio (Na) e cloro (Cl), dispostos em grade (figura do centro). Um grão de sal contém um milhão de bilhões de átomos. Na representação desta grade, os átomos ficam muito distanciados entre si por uma questão de clareza; na realidade, porém, têm a disposição de um cacho (figura da direita).

A TERRA. A Terra é uma imensa formação de átomos unidos numa bola rochosa de cerca de 12.800km de diâmetro e de seis milhões de trilhões de toneladas de peso. No seu centro encontra-se um "núcleo" constituído por níquel e ferro fundidos, com um diâmetro de aproximadamente 2900 km. Este "núcleo" de metais fundidos é revestido por uma camada derochas solidas com uma espessura de cerca de 3500km. Esta camada é por sua vez revestida por uma crosta de rochas menos densas cuja espessura média orça os 24km. O SISTEMA SOLAR. A Terra é um dos nove planetas que giram em torno do Sol e a ele se ligam pela força da gravidade. O peso do Sol é 700 vezes maior do que o peso combinado dos nove planetas. O Sol, os planetas, os seus trinta e dois satélites e um elevado número de outros corpos secundários, que incluem os asteróides e os cometas, formam o Sistema Solar.

As orbitas de todos os planetas, à exceção de Mercúrio e Plutão, situam-se, apenas com uma pequena diferença de graus, dentro de um mesmo plano. Todas as orbitas se aproximam de círculos perfeitos, à exceção de novo das orbitas de Mercúrio e de Plutão. Este revolve em torno do Sol a uma distância que varia entre os 5 e os 6,5 miares de milhões de quilômetros. A órbita de Plutão constitui o limite exterior do Sistema Solar.

No espaço interplanetário, assim como para além do limite exterior do Sistema Solar, existe uma tênue nuvem de gases de hidrogênio com uma densidade que varia entre 1 e 10 átomos de hidrogênio por cmâ3. A distância que vai do Sol e dos planetas do seu sistema à mais próxima das estrelas que se conhecem, a Alfa, na constelação do Centauro, é de aproximadamente 40 bilhões de quilômetros, ou 5000 vezes a envergadura do Sistema Solar. O espaço exterior, à semelhança do espaço interior do átomo, apresenta-se quase vazio.

O sistema solar: Sol

Mercúrio Vênus Terra Cintura de asteróides Marte Júpiter Saturno Urano Netuno Plutão

a nossa galáxia. O Sol é uma dos 100 mil milhões de estrelas ligadas entre si pela força da gravidade, formando um vasto agregado denominado galáxia. Somente alguns escassos milhares destas estrelas são visíveis a olho nu; no entanto, muitas mais foram já fotografadas com o auxílio de grandes telescópios. Na fotografia da direita são visíveis cerca de 10.000 estrelas, ainda que esta fotografia represente apenas a milésima parte da área do céu noturno. Esta fotografia foi obtida com um telescópio de 10 polegadas (25,4 cm) e uma exposição de diversas horas.

A Galáxia vai adquirindo a forma de um disco devido ao seu movimento de rotação. O diagrama (abaixo) mostra a estrutura da Galáxia, vista de perfil, com o Sol situado sensivelmente a meia distância entre o centro do disco e uma das extremidades.

As distâncias entre as estrelas são normalmente expressas em anos-luz, sendo o ano-luz a distância percorrida no espaço de um ano por um raio de luz à velocidade de 300.000km por segundo. Um ano-luz corresponde à distância de 9 bilhões e 654 mil milhões de quilômetros. O diâmetro da Galáxia é de 100.000 anos-luz e o disco central tem uma espessura aproximada de 2000 anos-luz.

A concentração de estrelas no disco central da Galáxia confere-lhe uma luminosidade particularmente intensa quando vista de perfil. Numa noite clara, quando nos encontramos longe das luzes citadinas, podemos ver esta faixa luminosa que se estende pelo céu e a que se dá vulgarmente o nome de Via Láctea.

Nas páginas seguintes insere-se uma montagem fotográfica que representa a Via Láctea. :a via láctea. A nossa galáxia vista de perfil. esta montagem de fotografias representa a galáxia vista de perfil, como se apresentaria a um observador situado no nosso sistema solar.as 7000 estrelas de maior brilho foram representadas em separado. as nuvens brilhantes e luminosas são formadas por milhares de milhões de estrelas individuais, enquanto as regiões sombrias que se estendem irregularmente pela parte central da via láctea são nuvens de poeiras que absorvem a luz que chega ao nosso sistema solar vinda de estrelas distantes da galáxia.

1. Galáxias vizinhasOs nossos vizinhos extragalácticos mais próximos são duas pequenas galáxias, satélites

da nossa, que as atrai com a força gravitacional dos seus 100 mil milhões de estrelas. Cada uma destas galáxias satélites contém alguns milhares de milhões de estrelas. Estas galáxias, denominadas Nuvens de Magalhães, são visíveis a olho nu e assemelham-se a tênues halos luminosos.

Dentro de um raio de 3 milhões de anos-luz da nossa galáxia existem cerca de doze galáxias, cujas designações que lhes são atribuídas nos catálogos de astronomia e posições relativas figuram no quadro abaixo.

A galáxia mais próxima e cuja envergadura se compara à da nossa é a Grande Nebulosa de Andrômeda, situada a aproximadamente 2 milhões de anos-luz de nós. Quer pelo tamanho, forma e número de estrelas, a galáxia de Andrômeda assemelha-se muito à nossa. A fotografia da direita, obtida com o telescópio de 200 polegadas (5,08m) de Monte Palomar, mostra-nos a

galáxia de Andrómeda. Os pequenos pontos luminosos são estrelas isoladas pertencentes à nossa própria galáxia, mas visíveis para o observador da galáxia de Andrômeda. As duas zonas luminosas situadas acima e abaixo da galáxia de Andrômeda são galáxias satélites, análogas às Nuvens de Magalhães.

2. As formas das galáxiasA série de fotografias da página seguinte ilustra perfeitamente a forma da nossa

galáxia. Podemos ver quatro galáxias diferentes, em forma de disco, que se assemelham à nossa, ainda que se apresentem com diversas inclinações em relação ao plano dos nossos olhos. As galáxias são identificadas pelo número de catálogo atribuído a cada uma delas pelos astrônomos. O Sol encontra-se situado sensivelmente, numa galáxia análoga a estas, a meia distância entre o centro e uma das extremidades.

Na quarta fotografia podemos ver os braços em espiral, que são característicos do tipo de galáxia a que pertence o Sol. Estes braços em espiral são concentrações de gases e poeiras nas quais nascem as estrelas.

Nem todas as galáxias têm esta forma. Umas são esféricas, outras elípticas e ainda outras irregulares. A fotografia de baixo representa uma galáxia de um tipo especial, a M 82, que se situa a dez milhões de anos-luz da nossa galáxia. Pelo estudo das radiações emitidas por esta galáxia verificamos que brotam do seu centro jactos de hidrogênio a temperaturas muitoelevadas. A M 82 é um exemplo das chamadas galáxias explosivas. Também há indícios de que ocorrem explosões idênticas no centro da nossa própria galáxia, cujas causas se desconhecem.

NGC (New General Catalogue) 4565 Galáxia vista de perfil;

NGC 4216 Galáxia com uma inclinação de 15 graus;

NGC 7331 Galáxia com uma inclinação de 30 graus;

NGC 628 Galáxia vista de frente.

3. Grupos de galáxiasTotalizam dez mil milhões as restantes galáxias que se encontram ao alcance do

telescópio de 200 polegadas (5,08 m) de Monte Palomar. Na sua maioria, estas galáxias apresentam-se em grupos que reúnem entre três e dez mil galáxias. A distância média que separa as galáxias é de um milhão de anos-luz. A nossa galáxia faz parte de um pequeno grupo denominado Grupo Local, que inclui a grande galáxia de Andrômeda e aproximadamente doze outras. No diagrama da pág. 36 podemos ver várias galáxias pertencentes ao Grupo Local. A fotografia da página seguinte apresenta um conjunto de cerca de cinqüenta galáxias situadas no centro do gigantesco grupo galáctico da constelação de Hércules, a uma distância de aproximadamente 300 milhões de anos-luz. Este grupo de Hércules, que se compõe de mais de dez mil galáxias, é um dos mais importantes sistemas de matéria organizada no Universo. Na mesma fotografia, os corpos pontiagudos e algumas das manchas perfeitamente circulares são estrelas individuais pertencentes à nossa galáxia; todos os outros agregados são galáxias que fazem parte do grupo de Hércules.

Os grupos de galáxias constituem os mais vastos sistemas de matéria organizada que conhecemos, ocupando o topo da estrutura hierárquica do Universo.

4. Gigantes vermelhas, anãs brancas e pulsares

As estrelas parecem imutáveis, mas não o são. Elas nascem, evoluem e morrem tal como os organismos vivos. A história da vida de uma estrela começa com o elemento mais abundante e mais simples na Natureza, que é o hidrogênio. O Universo está cheio de tênues nuvens de hidrogênio, as quais redemoinham no espaço entre as estrelas. Nos movimentos em torvelinho destas tênues nuvens, os átomos, por vezes, juntam-se e formam pequenas bolsas de gás. Estas bolsas são condensações temporárias num outro ambiente diferente altamente rarefeito. Normalmente os átomos movimentam-se separados de novo, por um curto espaço de tempo, como conseqüência dos seus movimentos desordenados, e a bolsa de gás dissipa-se rapidamente no espaço. Contudo, cada átomo exerce uma pequena atração gravitacional sobre o que lhe está mais próximo, atração essa que se opõe à tendência dos átomos de voarem separados. Se o número de átomos na bolsa de gás for suficientemente grande, a acumulação de todas estas forças isoladas mantê-la-á unida indefinidamente. Será então uma nuvem de gás independente, preservada pela atração de cada átomo da nuvem sobre o que lhe está mais próximo.

Com o decorrer do tempo, a influência ininterrupta da gravidade, atraindo os átomos uns para os outros, faz com que a nuvem se contraia. Os átomos individuais caem para o centro da nuvem, devido à força da gravidade; à medida que eles caem, ganham velocidade e a sua energia aumenta. O aumento de energia aquece o gás e eleva a sua temperatura. Tal bola de gás, que se vai contraindo e aquecendo a si própria, é uma estrela em embrião.

Ao mesmo tempo que as nuvens de gás se contrai devido à pressão do seu próprio peso, a temperatura no centro eleva-se constantemente Quando atinge 55.00o graus centígrados, os átomos de hidrogênio existentes no gás colidem com suficiente violência para desalojar todos os elétrons das suas órbitas em torno dos prótons. O gás original de átomos de hidrogênio, consistindo cada um deles num elétron girando à volta de um prótons, torna-se numa mistura de dois gases, um composto de elétrons e o outro de prótons.

Nesta fase, o globo de gás já se contraiu do seu tamanho original, com 15 mil milhões de quilômetros de diâmetro, para um diâmetro de 15omilhões de quilômetros. Para compreendermos melhor a amplitude da contração, imaginemos o dirigível de Hindenburg contraindo-se para o tamanho de um grão de areia.

A enorme bola de gás - composta agora de prótons e de elétrons separados - continua a contrair-se devido à força do seu próprio peso, e a temperatura no centro continua também a aumentar. Depois de 1omilhões de anos, a temperatura atingiu o valor crítico de 12 milhões de graus centígrados (1). Por esta altura, o diâmetro da bola já se contraiu para 1.500.000 quilômetros, que é o tamanho do nosso Sol e de outras estrelas típicas.

Porque é que 12 milhões de graus é uma temperatura crítica?A explicação está relacionada com as forças entre os prótons na nuvem que se vai

contraindo. Quando dois prótons se encontram separados por grandes distâncias, repelem-se eletricamente porque cada um conduz uma carga elétrica positiva. Mas, se os prótons se aproximam a distância bastante pequena um do outro, a repulsão elétrica dá lugar à força ainda mais potente da atração nuclear. Os prótons têm de estar mais próximos uns dos outros do que um bilionésimo de centímetro para a força nuclear produzir efeito. Em circunstâncias normais, a repulsão elétrica atua como um obstáculo que impede uma aproximação tão curta como esta. Numa colisão de extrema violência, contudo, os prótons podem atravessar a barreira elétrica que os separa e penetrar no raio de alcance da atração nuclear por eles exercida As colisões do grau de violência necessário começam a ocorrer quando a temperatura do gás atinge os 12 milhões de graus.

Logo que a barreira entre dois prótons é atravessada quando se dá uma colisão, eles ganham velocidade, como resultado da sua atração nuclear, e precipitam-se um para o outro. No momento final da colisão a força da atração nuclear é tão grande que funde os prótons um com o outro, formando um único núcleo. Ao mesmo tempo, a energia da colisão de ambos é libertada sob a forma de calor e luz. Este desprendimento de energia marca o nascimento da estrela.

A energia passa para a superfície e é irradiada sob a forma de luz, em virtude da qual nos vemos a estrela no céu. O desprendimento de energia, que é um milhão de vezes maior do que a libertada pela explosão de 15ogramas de TNT, detém de vez a contração da estrela, que passará o resto da sua vida num equilíbrio entre as pressões exteriores produzidas pelo desprendimento de energia nuclear no seu centro e as pressões interiores criadas pela força da gravidade.

A fusão de dois prótons num único núcleo é apenas o primeiro passo numa série de reações pelas quais é desprendida energia nuclear durante a vida da estrela. Em colisões subseqüentes, mais dois prótons se unem aos dois primeiros, formando um núcleo com quatro partículas. Dois dos prótons perdem as suas cargas positivas, tornando-se nêutrons no decurso do processo. Daí resulta um núcleo com dois prótons e dois nêutrons. Este é o núcleo do átomo de hélio. Assim, a continuação das reações transforma prótons, ou núcleos de hidrogênio, em hélio. (2).

A transformação de hidrogênio em hélio é a primeira e a mais longa fase da história de uma estrela, ocupando cerca de 99 por cento da duração da sua vida. Através deste longo período, o aspecto da estrela muda muito pouco, mas para o fim da fase em que o hidrogênio vai ardendo, e quando a maior parte já se transformou em hélio, a estrela começa a evidenciar os primeiros sinais de velhice. Os sintomas são uma dilatação e avermelhamento das camadas exteriores, iniciando-se imperceptivelmente e progredindo até que a estrela se tenha convertido numa enorme bola vermelha 100 vezes maior do que o seu tamanho inicial. O Sol atingira esta fase dentro de outros 5 mil milhões de anos, altura pela qual se terá dilatado, formando uma vasta esfera de gás, engolfando os planetas Mercúrio e Vênus e estendendo-se até quase à órbita da Terra. Este globo vermelho cobrirá a maior parte do céu quando visto do nosso planeta. Infelizmente nós não poderemos deter-nos a observar a vista magnífica, pois os raios do Sol dilatado aquecerão a superfície da Terra a 200º graus centígrados e, conseqüentemente, evaporarão a sua matéria. Talvez que, por essa altura, Júpiter constitua um habitat conveniente para nós Mais provavelmente, já teremos fugido para outra parte da Galáxia.

A tais estrelas dilatadas e avermelha das dão os astrônomos o nome de Gigantes Vermelhas. Exemplo de uma gigante vermelha é a Betelgeuse, estrela bastante brilhante da constelação de Orionte que, observada a olho nu, é nitidamente vermelha.

Uma estrela continua a viver como gigante vermelha até que as suas reservas de combustível de hidrogênio se extingam. Gasto o seu combustível, a gigante vermelha já não pode produzir as pressões necessárias para se defender da aniquiladora força interior da sua própria gravidade e as camadas exteriores começam a ceder para o centro. A gigante vermelha sucumbe.

No centro da estrela que se vai contraindo há um núcleo de hélio puro, produzido por transmutação de hidrogênio ao longo dos primeiros tempos da existência da estrela. O hélio não produz núcleos mais pesados à temperatura estelar ordinária de 12 milhões de graus, porque o seu núcleo, com dois prótons, possui uma carga dupla de eletricidade positiva e, em conseqüência disso, a repulsão elétrica entre dois núcleos de hélio é mais forte do que a repulsão entre dois prótons. É necessária uma temperatura de 120 milhões de graus para produzir colisões suficientemente violentas para atravessar a barreira elétrica entre dois núcleos de hélio.

Contudo, à medida que a estrela se contrai, é libertado calor e a sua temperatura eleva-se. Conseqüentemente, a temperatura no centro atinge o valor crítico de 120 milhões degraus centígrados. Nesta altura, os núcleos de hélio começam a unir-se em grupos de três para formar núcleos de carbono, libertando energia nuclear no processo e reacendendo o fogo nocentro da estrela. O desprendimento suplementar de energia detém o colapso gravitacional da estrela. Ardendo núcleos de hélio para produzir carbono, ela obteve um recomeço de vida.

Em estrelas do tamanho do Sol, a fase em que o hélio vai ardendo dura cerca de cem milhões de anos. No fim deste tempo, as reservas de combustível, compostas agora por mais

hélio do que hidrogênio, estão de novo extintas e o centro da estrela está ocupado por um resíduo de núcleos de carbono. Estes núcleos, possuindo seis cargas elétricas positivas, encontram-se separados por uma barreira ainda mais forte do que a dos núcleos de hélio, e são necessárias colisões de violência ainda maior para penetrar nela. A temperatura de 120 milhões de graus que funde os núcleos de hélio não é suficiente para a fusão de núcleos de carbono; são necessários nada menos do que 30omilhões de graus.

Visto que as temperaturas existentes no interior da gigante vermelha não chegam a 30omilhões de graus, os fogos nucleares cessam à medida que o carbono se vai acumulando e a estrela, carecendo mais uma vez dos recursos necessários para se defender do peso das camadas exteriores, começa a contrair-se pela segunda vez sob a força da gravidade.

Todas as estrelas têm uma vida semelhante até este ponto, mas a sua evolução subseqüente e a maneira como morrem dependem do seu tamanho e massa As estrelas pequenas tornam-se enrugadas e ressequidas e extinguem-se, enquanto as maiores desaparecem numa explosão gigantesca. O Sol, por acaso, está mesmo por baixo da linha divisória; não temos a certeza do que lhe sucederá no fim da sua vida, mas suspeitamos que seextinguirá.

Os caminhos seguidos pelas estrelas pequenas e pelas grandes divergem em virtude de diferenças na quantidade de calor produzido durante o segundo colapso, no final da fase de gigante vermelha. Numa estrela pequena o colapso produz uma quantidade modesta de calor e a temperatura no centro não consegue atingir os 30omilhões de graus requeridos para a ignição de núcleos de carbono. Assim, o fogo nuclear nunca chega a ser reacendido. Em contrapartida, a estrela continua a aluir até que, por fim, a matéria dentro dela está tão comprimida que impede qualquer outra redução de tamanho. A estrela permanece, então, neste estado altamente comprimido, para sempre. Aproximadamente do tamanho da Terra, ela foi comprimida pela força do seu próprio peso, ocupando agora um espaço que é apenas um milionésimo do volume que inicialmente ocupava. Uma colher de chá de matéria do centro deste corpo compacto pesaria 10 toneladas. Se alguma vez encontrássemos uma estrela assim, mesmo que a sua temperatura de superfície tivesse baixado para um nível confortável, ser-nos-ia impossível aterrar neste mundo estranho, porque a sua gravidade atrairia, e esmagaria, um visitante com uma força de 50.000 toneladas.

Apesar de o centro da estrela nunca chegar a ficar bastante quente para arder o carbono, a temperatura da superfície eleva-se o suficiente para a estrela parecer branca em virtude do calor. Estas estrelas contraídas e brancas devido ao calor são chamadas anãs brancas A anã branca irradia lentamente o resto do seu calor para o Espaço. No fim a temperatura baixa e a estrela extingue-se, tornando-se um corpo morto enegrecido.

Um destino muito diferente espera uma estrela grande e maciça. Porque o peso da estrela é tão grande, o seu colapso produz uma enorme quantidade de calor, maior do que o calor produzido na criação da anã branca. Depressa a temperatura atinge o nível crítico de 30omilhões de graus, à qual os núcleos de carbono se fundem. A fusão dos núcleos de carbonoforma elementos ainda mais pesados, indo desde o oxigênio até ao sódio.

Conseqüentemente, as reservas do combustível de carbono também se extinguem; a sua extinção é seguida, uma vez mais, de fases subseqüentes de contração, de elevação de temperatura e de nova ignição nuclear, conduzindo ainda à produção de outros elementos.

Neste processo, devido à alternância de contração e ignição nuclear, uma estrela maciça produz sucessivamente todos os elementos até ao ferro. Mas o ferro é um elemento muito especial. Este metal, que se situa a meia distância entre os elementos mais leves e os mais pesados, tem um núcleo excepcionalmente compacto, cujos nêutrons e prótons estão unidos tão firmemente que nenhuma energia pode ser obtida dele, qualquer que seja a reação nuclear De fato, as reações nucleares do ferro absorvem energia; têm o mesmo efeito que a água lançada sobre carvão em brasa. Quando uma grande quantidade de ferro se acumula no centro da estrela, o fogo não pode ser reacendido; apaga-se pela última vez e a estrela inicia uma contração final sob a força do próprio peso.

A contração final é um acontecimento catastrófico. Os núcleos de ferro no centro absorvem a energia da estrela ao mesmo tempo que ela vai sendo produzida, e as matérias que se vão contraindo, não encontrando quase nenhuma resistência, desabam para o centro a velocidades enormes, cobrem um milhão de quilômetros em menos de um minuto e acumulam-se no centro, num amontoado denso, criando pressões elevadíssimas. Quando a pressão no centro é suficientemente grande, a contração pára. A estrela, contraída e apertada como uma mola, acalma momentaneamente - depois ressalta com uma explosão violenta.

Temperaturas que oscilam até milhares de milhões de graus são geradas durante a contração e a explosão subseqüente. A estas temperaturas, alguns dos núcleos na estrela em explosão são desintegrados e muitos nêutrons libertados. Os nêutrons são capturados por outros núcleos, constituindo os elementos mais pesados, tais como a prata, o ouro e o urânio. Desta maneira, os elementos restantes da tabela periódica de Mendeleiev que se estendem para além do ferro são produzidos nos momentos finais da vida da estrela.

A explosão lança para o Espaço todos os elementos que a estrela tem vindo a produzir durante a sua vida, retendo apenas o pequeno centro a arder debilmente. O episódio completo dura alguns minutos, desde o início da contração até à explosão final. é um intervalo curto para a morte de um corpo que pode ter vivido durante um milhão de anos. A estrela que explode chamamos uma supernova. As supernovas irrompem em chamas com um brilho muitos milhares de milhões de vezes maior do que o brilho do Sol; se, por acaso, a supernova estiver perto, na nossa Galáxia, ela aparece subitamente como uma estrela nova no céu, mais brilhante do que qualquer outra, e facilmente visível a olho nu durante o dia. A última supernova observada na Europa explodiu em 1572 e causou sensação. Uma das primeiras supernovas de que temos noticia foi uma explosão brilhante registada por astrônomos chineses no ano de 1054 No lugar desta supernova existe hoje uma grande nuvem de gás, conhecida como nebulosa do Caranguejo, que se expande a uma velocidade de 150oquilômetros por segundo, e que contém os restos da estrela que explodiu há nove séculos.

Que é que acontece ao núcleo comprimido, depois de as camadas exteriores terem explodido para o Espaço?

Desconheceu-se a resposta a esta pergunta até 1967. Nesse ano descobriram-se os pulsares - os corpos mais interessantes descobertos no céu num largo período de anos.

A descoberta surgiu por mero acaso. Foi atribuída a Jocelyn Bell, uma estudante de Astronomia da Universidade de Cambridge, a tarefa de investigar flutuações no comprimento de ondas de rádio de galáxias distantes. Inesperadamente, descobriu que certos lugares nos céus emitiam ondas de rádio, curtas e rápidas, a intervalos regulares. Cada emissão não durava mais do que um centésimo de segundo. A rápida sucessão de emissões assemelhava-se a um acelerado código Morse celestial.

O intervalo entre emissões sucessivas era extremamente constante. De fato, não se alterava em mais do que uma fração em 1omilhões. Um relógio com esta precisão não se atrasaria nem se adiantaria mais do que um segundo por ano.

Nunca até ali se tinha tido conhecimento de uma estrela ou galáxia que emitisse sinais tão bizarros como estes. A princípio, alguns astrônomos pensaram que seres inteligentes pudessem estar a emitir uma mensagem de outras estrelas para a Terra e referiam-se às estrelas donde provinha o código Morse como as estrelas dos L.G.M., iniciais que significavamPequenos Homens Verdes (Little Green Men). Mas em breve se tornou evidente que as ondas de rádio tinham uma origem natural e não artificial. Uma das razões principais para esta conclusão foi o facto de os sinais serem difundidos numa banda larga de freqüências. Se uma comunidade extraterrestre estivesse a tentar transmitir uma mensagem para outros sistemas solares, os seus transmissores interestelares necessitariam de um poder enorme para que os sinais atravessassem os bilhões de quilômetros que separam cada estrela das que lhe estão mais próximas. A única maneira possível de conseguir isto seria concentrar toda a energia disponível numa freqüência, como nós fazemos quando radio difundimos programas de rádio

e de televisão. Seria um desperdício, além de pouco inteligente, difundir a energia do transmissor numa banda larga de freqüências.

Este raciocínio frio destruiu as esperanças de românticos que acreditaram, por um curto espaço de tempo, que o Homem pudesse estar a receber a sua primeira mensagem do Espaço exterior. "As estrelas dos L.G.M." desapareceram da gíria científica, tomando o nome de "pulsares" o seu lugar, e os cientistas começaram a procurar uma explicação natural paraaqueles sinais estranhos.

A primeira pista para uma resposta foi a exatidão das ondas. Partindo do fato de que cada onda durava um centésimo de segundo ou menos, os astrônomos concluíram que um "pulsar" era uma estrela incrivelmente pequena, muito mais pequena do que uma anã branca. Esta conclusão baseava-se no fato de que quando um objeto emite ondas de rádio, as ondas provenientes de diferentes partes do objeto chegam à Terra em momentos diferentes, tornando imprecisa a exatidão da onda original. Quanto mais pequeno é o objeto, mais exata é a onda. Seguindo esta linha de raciocínio, os astrônomos calcularam que os objetos não tinham mais do que 15 quilômetros de raio.

Esta conclusão é sensacional. Até então a anã branca – com cerca de 15.000 quilômetros de raio - era tida como a estrela mais pequena e mais densa do Universo. Como é que uma estrela podia ser mil vezes mais pequena do que uma anã branca? A matéria de tal estrela seria mil milhões de vezes mais densa do que a matéria de uma anã branca. Se a Terra inteira fosse comprimida na mesma proporção de um "pulsar", caberia dentro do Pentágono. Se o Pentágono fosse comprimido ao mesmo ponto, seria do tamanho da cabeça de um alfinete.

A resposta remonta a uma conjectura feita há algumas décadas atrás. Nessa altura, vários astrônomos teóricos chamaram a atenção para o fato de que quando uma estrela grande se contrai no fim da sua vida, imediatamente antes de explodir na qualidade de supernova, as matérias da estrela em desmoronamento acumulam-se no centro e produzem pressões enormes, ainda maiores do que a pressão interior gerada pelo próprio peso da estrela. Sob este fardo aniquilador, os elétrons e prótons que se encontram separados no interior da estrela são obrigados a fundirem-se em nêutrons. Uma autêntica bola de nêutrons forma-se, assim, no centro da estrela, com apenas 15 quilômetros de raio, mas com a maior parte da massa original da estrela amontoada nela. A hipotética bola de nêutrons foi apelidada de "estrela de nêutrons".

A partir de 1965, os astrônomos procuraram assiduamente estrelas de nêutrons, investigando com cuidado especial a região do centro da nebulosa do Caranguejo, onde o núcleo comprimido da explosão da supernova de 1054 se deveria ter localizado Mas não foram descobertas quaisquer estrelas de nêutrons e o interesse por elas diminuiu.

Em 1968, uma onda de entusiasmo espalhou-se pela comunidade astronômica quando foi descoberto um "pulsar" no centro da nebulosa do Caranguejo, precisamente no lugar onde se tinha procurado anteriormente uma estrela de nêutrons. De súbito, várias evidências se adaptaram umas às outras como as peças de um jogo de paciência: tinha-se vaticinado que uma estrela de nêutrons devia existir no centro da nebulosa do Caranguejo; foi descoberto um "pulsar" no centro daquela nebulosa; e a estrela e o "pulsar" são os únicos corpos conhecidos que têm a massa de uma estrela aglomerada numa esfera com 15 quilômetros de raio. Sem sombra de dúvida, estrela de nêutrons e "pulsar" eram dois nomes para a mesma coisa: uma bola de matéria, extremamente comprimida e densa, criada quando uma estrela maciça se contrai no fim da sua vida.

Restava ainda um mistério para ser explicado. Que é que produz as emissões de radiação, exacta e regularmente repetidas, donde provém o nome "pulsar"? Pensa-se que a resposta seja que um "pulsar", tal como o Sol e a maior parte das outras estrelas, está sujeito a tempestades violentas que se podem prolongar durante anos, emitindo partículas e radiação para o Espaço. Cada uma das tempestades surge numa determinada área da superfície do "pulsar" e emite a radiação para o Espaço numa direção rigorosamente definida. Quando a

Terra se encontra no trajeto de um destes fluxos de radiação, os nossos radiotelescópios captam os sinais, que nos revelam a presença do "pulsar".

Mas, se o fluxo de radiação é emitido do "pulsar" constantemente, porque é que o captamos como uma sucessão de emissões exatas e isoladas? A razão é provavelmente porque os "pulsares", como a maior parte das estrelas, giram sobre os seus eixos. Na verdade, sendo mais pequenos do que as estrelas normais, os "pulsares" podem girar muito rapidamente, completando várias rotações por segundo. à medida que o "pulsar" gira, o fluxo de radiação proveniente da sua superfície atravessa velozmente o Espaço, como a luz de um farol giratório. Se, por acaso, a Terra se encontra na trajetória do raio rotativo, ela será alvo de uma emissãoexata de radiação uma vez em cada volta do "pulsar".

Esta teoria pode ser comprovada, porque todos os objetos que giram diminuem constantemente de velocidade com o decorrer do tempo, devido ao atrito Assim, o espaço de tempo entre emissões sucessivas de radiação de um "pulsar" tem de aumentar. Em 1969 esta previsão foi confirmada com a descoberta de que o tempo entre ondas sucessivas emitidas do "pulsar" da nebulosa do Caranguejo estava a aumentar ao ritmo, diminuto mas mensurável, de um milimilhonésimo de segundo por dia.

Conscientes da relação que existe entre estrelas de nêutrons, "pulsares" e supernovas, muitos astrônomos têm a impressão de que as últimas páginas da história da vida das estrelas já podem estar concluídas. No entanto, há outros que suspeitam que ainda, pelo menos, uma surpresa nos aguarda, visto haver razões para crer que a estrela de nêutrons, ou "pulsar", não é o estádio derradeiro de compressão da matéria estelar. Sob certas condições, uma estrela pode continuar a diminuir de volume para além do limite de 30 quilômetros da estrela de nêutrons desabando sobre si mesma cada vez mais depressa, até se ter contraído para um raio de 3 quilômetros. Nesta situação, a teoria da relatividade prevê a ocorrência de um fenômeno extraordinário.

De acordo com a teoria de Einstein, a energia e a massa são equivalentes. A equivalência é expressa na famosa equação

E = mcâ2

em que E representa a energia, m, a massa, e c, a velocidade de propagação da luz. É freqüente recorrer-se a esta equação para calcular a energia E produzida pela aniquilação de uma quantidade m de urânio na explosão de uma bomba nuclear. Que é que isto tem a ver com a estrela em contração? Se a energia é equivalente à massa, um raio de luz que possua energia eletromagnética tem de possuir, de igual modo, uma massa, precisamente como se fosse uma partícula de matéria. Por conseguinte, um raio de luz emitido de uma estrela será atraído para trás pela força de gravidade da estrela, tal como uma bola atirada para o ar é atraída para baixo pela força de gravidade da Terra. Quando a estrela tem um tamanho normal - com um diâmetro da ordem do milhão de quilômetros - a força de gravidade na sua superfície não é suficientemente potente, para impedir os raios de luz de se libertarem, e elesabandonam a estrela, embora com um pouco menos de energia. Mas, à medida que a estrela se contrai, a força de gravidade aumenta rapidamente e, quando o diâmetro da estrela já diminuiu para 6 quilômetros, a gravidade à sua superfície é milhares de milhões de vezes mais forte do que a força de gravidade à superfície do Sol. A potência desta força enorme impede os raios de luz de abandonarem a superfície da estrela: tal como a bola lançada para o ar, eles são atraídos no sentido contrário e não podem libertar-se para o Espaço. A partir deste momento a estrela é invisível. É um buraco negro no espaço.

No interior do buraco negro, a contração prossegue, acumulando matéria no centro, numa aglomeração pequeníssima mas incrivelmente densa. De acordo com o conhecimento geral da Física teórica, isto é o fim da vida da estrela. O volume da estrela vai-se tornando cada vez mais pequeno; de uma esfera com 3 quilômetros de raio, ela contrai-se para o tamanho de

uma cabeça de alfinete, depois para o tamanho de um micróbio e, continuando sempre a contrair-se, passa para o domínio das distâncias menores do que o que já alguma vez foi dado ao Homem examinar. Por outro lado, a massa de mil bilhões de bilhões de toneladas de uma estrela permanece sempre acumulada no volume contraído. Mas a intuição diz-nos que tal objeto não pode existir. O aluamento deve cessar em alguma altura. Contudo, de acordo com as leis da Física do século vinte, nenhuma força, por mais potente que seja, pode deter a contração. O que está implícito é que as leis da física têm de ser modificadas, quando se trata de distâncias extremamente pequenas, de maneira que impeçam as partículas de se aproximarem infinitamente umas das outras. Eis a sugestão da descoberta iminente de uma lei nova ou de um agente novo na natureza, algo que possa levar, algum dia, à libertação de energias ainda maiores do que a energia do núcleo. Uma tal descoberta transformaria o mundo do futuro, como a descoberta da força nuclear transformou o mundo do século vinte. O estudo das estrelas pode ainda dominar as preocupações dos homens.

A história da vida das estrelas tem um epilogo. Quando se dá a explosão de uma supernova e as camadas exteriores das estrelas são pulverizadas para o Espaço, elas ligam-se com novo hidrogênio para formar uma mistura gasosa, que contém todos os 92 elementos. Mais tarde, na história da galáxia, outras estrelas são formadas a partir de nuvens de hidrogênio que veio sendo enriquecido com os produtos destas explosões. O Sol é uma destas estrelas; contém os detritos de inúmeras explosões de supernovas que remontam aos primeiros anos da Galáxia. Os planetas também contêm detritos; e a Terra, em especial, é composta, quase inteiramente, por eles. Devemos a nossa existência corporal a acontecimentos que tiveram lugar, há milhares de milhões de anos atrás, nas estrelas que viveram e morreram muito antes de o sistema solar se ter formado.

\\\(1) Doze milhões de graus e uma temperatura muito alta. Comparemo-la com a

temperatura da chama do bico de gás do fogão de cozinha, que é de 50ograus, e com a temperatura da fornalha de aço mais quente, que é da ordem dos 600ograus.

(2) A transmutação de hidrogênio pesado para hélio e elementos mais pesados foi reproduzida na Terra, por breves momentos, na explosão da bomba de hidrogênio. No entanto, ainda não conseguimos fundir núcleos de hidrogênio sob condições controladas de tal maneira que a energia libertada possa ser aproveitada para fins construtivos. Os Estados Unidos, a União Soviética e outros países têm investido somas prodigiosas de dinheiro e energia para esse efeito, em virtude de serem elevados os lucros que daí poderiam advir, mas a Física ainda não está à altura de tal empresa. A dificuldade reside no fato de que ainda não se construiu nenhuma fornalha na Terra que possa conter uma chama à temperatura dos milhões de graus necessários para produzir a fusão nuclear. A única fornalha capaz para o efeito é fornecida pela Natureza, no centro de uma estrela.

iiiii

uma nuvem congregada pela força da GRAVIDADE. Supõe-se que as estrelas nascem no seio das nuvens rodopiantes de hidrogênio que enchem a totalidade do Espaço. Se os átomos situados numa dada região duma destas nuvens se congregam acidentalmente ou sob a pressão das nuvens circundantes, a força da gravidade leva-os a juntarem-se ainda mais, formando uma bolsa de gás sob pressão (em baixo, à esquerda). Pela prolongada ação da força da gravidade, a bolsa de gás fica sujeita a uma pressão ainda maior (em baixo, à direita). Em conseqüência desta compressão, a temperatura do centro da bolsa aumenta; quando, ao fim de aproximadamente 10 milhões de anos, a temperatura tiver atingido o valor crítico de 12 milhões de graus centígrados, desencadeiam-se reações nucleares, durante as quais se libertam enormes quantidades de energia. O inicio destas reações assinala o nascimento de

uma estrela. A libertação de energia nuclear detém o processo de decomposição das estrelas. A energia propaga-se até à superfície e irradia para o Espaço sob a forma de luz e calor.

A fotografia da página seguinte representa uma densa nuvem de gás e poeira no seio da qual se estão a formar estrelas situada a cerca de 400oanos-luz do Sol, na constelação de Sagitário. As regiões luminosas correspondem a nuvens de hidrogênio, visíveis graças às radiações ultravioletas emitidas por estrelas próximas. As áreas escuras correspondem a nuvens de poeira opacas.

fabricação de elementos no seio das estrelas. Durante a maior parte da vida de uma estrela, a sua energia resulta da fusão de

núcleos de hidrogênio, ou prótons, em núcleos de hélio. Nesta reação, quatro prótons fundem-se para formar um núcleo de hélio, libertando ao mesmo tempo duas unidades de carga elétrica positiva sob a forma de positrões acompanhados de neutrinos (abaixo ).

A transformação do hidrogênio em hélio continua durante 99% da vida de uma estrela. Quando o hidrogênio se encontra quase esgotado, a estrela volta a deteriorar-se até que o seucentro atinge uma temperatura de 120 milhões de graus centígrados. A tal temperatura, produz-se a fusão dos núcleos de hélio, que se transformam em núcleos de carbono (em baixo). A formação do oxigênio e de elementos ainda mais pesados dá-se após a do carbono. Assim se processa, gradualmente, a síntese dos elementos do Universo, a partir desse material fundamental que é o hidrogênio.

morte de uma estrela. Após haver consumido, no fim da sua vida, toda a sua energia nuclear, a estrela abate-

se sob o próprio peso. Quando se trata de uma estrela de pequena envergadura, esse declínio continua a processar-se até que toda a sua massa fica reduzida ao tamanho da Terra. Estas estrelas extremamente comprimidas, denominadas anãs brancas, têm uma densidade de dez toneladas por polegada cúbica (16,39 cm³). A anã branca irradia lentamente o resto do seu calor para o Espaço e acaba ,por mergulhar na escuridão.

Uma estrela de grande envergadura tem um destino diferente. A sua destruição final constitui uma catástrofe durante a qual se produzem temperaturas de vários milhões de graus e se consomem os últimos resíduos de carburante espalhados pela estrela, libertando um tal surto de energia que faz desagregar a estrela. A esta estrela que sofre uma autêntica explosão dá-se o nome de supernova. O brilho das supernovas pode ser dez mil milhões de vezes mais intenão do que o do Sol. Se a supernova se situa num ponto próximo de nós e dentro da nossagaláxia, torna-se subitamente visível como um astro de brilho fulgurante, mesmo durante o dia.

Uma das primeiras supernovas detectadas foi observada por astrônomos chineses em 1054 d.C. Atualmente, a posição desta supernova é ocupada por uma vasta nuvem de gás, conhecida pelo nome de nebulosa do Caranguejo. Esta nebulosa, visível na fotografia acima, expande-se a uma velocidade de 1600 quilômetros por segundo.

A explosão de uma supernova projeta fragmentos estelares para o Espaço, onde se fundem com hidrogênio para dar origem a uma mistura que contém todos os 92 elementos. Numa fase posterior da história da galáxia, novas estrelas surgem a partir de nuvens de hidrogênio enriquecidas com os fragmentos provenientes daquelas explosões. O Sol, a Terra e todos os seres que povoam a sua superfície formaram-se a partir de nuvens que contêm os restos provenientes de explosões de supernovas que se deram milhões de anos antes do começo da Galáxia.

astrônomos discutindo problemas por SOLUCIONAR. Não obstante os progressos conseguidos no estudo da evolução das estrelas durante

os dez últimos anos, subsistem ainda algumas incertezas. Realizou-se em Janeiro de 1965 uma

conferência sobre a evolução estelar no Goddard Institute for Space Studies, durante a qual Chushiro Hayashi, da Universidade de Tóquio, fez uma exposição dos resultados de cálculos relativos ao primeiro estádio da vida das estrelas. Durante este período, a estrela contrai-se sob a força da gravidade sem ainda ter atingido aquela temperatura em que o hidrogênio se inflama. O Dr. Hayashi descobriu que a estrela embrionária, contrariamente a hipóteses precedentes, tem um brilho centenas de vezes mais intenso durante o seu período de contração do que após o inicio da reação nuclear. A fonte desta vasta produção de energia encontra-se nas próprias forças gravitacionais da estrela. Os cálculos do Dr. Hayashi, posteriormente confirmados por outros astrofísicos, revestem-se de importantes conseqüências para certas teorias sobre os primórdios do Sistema Solar. Na fotografia abaixo, à direita do Dr. Hayashi, encontra-se Geoffrey Burbidge, presidente desta sessão da conferência. À direita deste, sentado, vemos Bengt Stromgren, laureado com a Gold Medal da Royal Astronomical Society, pelas suas investigações no campo da evolução estelar e da natureza do gás e poeiras interestelares.

5. O princípio e o fim

Uma estrela nasce da condensação de nuvens de hidrogênio gasoso no Espaço exterior. à medida que a gravidade atrai os átomos da nuvem uns para outros, a temperatura eleva-se até que os núcleos de hidrogênio no seu interior se começam a fundir e a arder numa série de reações, formando primeiro hélio, e depois todas as restantes substâncias do Universo. Os elementos dos quais os nossos corpos se compõem foram produzidos desta maneira, no interior de estrelas presentemente mortas, e depois espalhados pelo Espaço quando estas estrelas explodiram. Subseqüentemente, estes elementos reuniram-se de novo na nuvem de gás da qual o Sol e a Terra se condensaram. Se o Sol explodir no termo da sua vida, os planetas serão consumidos, e a sua matéria uma vez mais espalhada pelo Espaço, para ser "reencarnada" em outro sistema solar ainda por nascer.

Esta magnífica teoria permitiria ao Universo continuar num ciclo eterno de morte e renascimento, para sempre, se não fosse a existência de um fato perturbador. O hidrogênio puro é o ingrediente essencial no plano, mas, com o passar do tempo, a reserva de hidrogênio puro diminui; à medida que as estrelas velhas se extinguem, uma por uma, vão-se formando cada vez menos estrelas para as substituir. As estrelas são a fonte da energia pela qual todos os seres vivem. Quando a luz da última estrela se extinguir, a vida tem de acabar por todo o Universo.

Outra evidência sugere que o Universo se está a transformar de maneira irreversível. Todas as galáxias parecem estar a afastar-se umas das outras a grandes velocidades. As que estão mais distantes de nós afastam-se à extraordinária velocidade de 230.000 quilômetros por segundo, que é quase a velocidade da luz. O Universo parece estar a espalhar-se ante os nossos olhos, como se estivéssemos a presenciar o resultado de uma explosão gigantesca. Ao mesmo tempo que as galáxias se afastam e as distâncias entre elas aumentam, o Espaço vai-se esvaziando, e a densidade da matéria diminuindo até chegar a nada. Parece que, embora lentamente, o Universo se aproxima do fim.

Há alguns anos, Thomas Gold, então assistente na Universidade de Cambridge, fez uma proposta que invalida estas previsões mórbidas, sugerindo que o hidrogênio puro é criadoconstantemente por todo o Espaço a partir do nada. O hidrogênio criado de novo forneceria os ingredientes para a formação de novas estrelas que substituiriam as velhas. Preencheria, ao mesmo tempo, os espaços abandonados pelo movimento das galáxias ao afastarem-se umas das outras. Deste modo, a criação de matéria a partir do nada, tal como foi proposta por Gold, poderia restituir o Universo a um estado perpétuo de equilíbrio, sem princípio e sem fim.

Gold mencionou a sua idéia a Herman Bondi e a Fred Hoyle, dois astrônomos ingleses, que se lhe juntaram para estudar as conseqüências daquela. Perguntaram a si próprios que quantidade de hidrogênio teria de ser criada por ano para manter a densidade da matéria

constante em toda a parte, à medida que o universo se expande. De acordo com os seus cálculos, o Universo em expansão permanece num estado fixo, com uma densidade constante de matéria, se um átomo de hidrogênio for criado por ano num volume igual ao do Empire State Building.

Isto é um ritmo de criação muito modesto, mas viola, mesmo assim, um conceito muito estimado na Ciência - o princípio da conservação da matéria -, que determina que a matéria não pode ser nem criada, nem destruída. Parece difícil aceitar uma teoria que não reconhece um fato de experiência terrestre tão firmemente estabelecido. No entanto a proposta da criação de matéria a partir do nada possui uma atração forte, pois permite-nos contemplar um Universo que se estende sem limite para o passado e para o futuro, um Universo que se renova por si próprio in perpetuum.

Uma outra cosmologia, que oferece forte competição à teoria do estado fixo, não faz qualquer tentativa de iludir as implicações do Universo em expansão. Tal cosmologia, apropriadamente chamada teoria do "big-bang", sugere que a expansão é, de fato, a conseqüência de uma verdadeira explosão que teve lugar há muito tempo. O padre Lemaître, um padre jesuíta e astrônomo belga, e George Gamow, um físico nascido na Rússia que emigrou para os Estados Unidos em 1936, são os cientistas mais preeminente mente associados a esta teoria. Em 1931 Lemaître propôs a hipótese de o Universo ter iniciado a sua existência numa gotinha de matéria condensada, a uma densidade e temperatura extremamente altas. Mais tarde Gamow pôs a este ovo original o nome de "ylem" - a denominação que Aristóteles deu à substância básica, a partir da qual os antigos acreditavam ter derivado toda a matéria. Pressões internas dentro desta gotinha quente e densa, contendo toda a matéria e radiação do Universo, fizeram com que ela se expandisse rapidamente. à medida que se expandia, a temperatura e a pressão foram diminuindo. Nos primeiros minutos de existência, a temperatura era de muitos milhões de graus, e toda a matéria no interior da gotinha era constituída pelas partículas fundamentais - elétrons, nêutrons e prótons. Qualquer combinação destas partículas para formar núcleos ou átomos seria rapidamente desintegrada, em virtude do impacte enorme das violentas colisões que ocorrem a tão altas temperaturas. No entanto, ao mesmo tempo que o Universo continuava a sua expansão. e a temperatura do "ylem" continuava a descer, os prótons e os nêutrons começaram a fundir-se. Formando núcleos, e permaneceram fundidos por períodos de tempo sempre maiores. Formaram, em primeiro lugar, deutério, depois hélio, e depois elementos ainda mais pesados. De acordo com a teoria de "big-bang" de Lemaître e Gamow, todos os 92 elementos foram formados desta maneira, na primeira meia hora de existência do Universo.

Com o decorrer do tempo, a matéria do Universo foi arrefecendo e condensando-se formando assim galáxias e, dentro das galáxias, estrelas. Depois de alguns milhares de milhõesde anos de expansão contínua, o Universo atingiu o estado atual. Sabendo a distância que separa agora as galáxias e a rapidez a que se afastam umas das outras, podemos calcular quanto teremos de recuar no tempo até ao momento em que a expansão se iniciou. Deste modo, os defensores da cosmologia do "big-bang" chegaram à conclusão de que o Universo começou a existir há 1omil milhões de anos. No momento presente, nas palavras de Lemaître, "a evolução do Mundo pode ser comparada a um espetáculo de fogo de artifício ao terminar: algumas canas vermelhas, cinzas e fumo. Colocados sobre uma cinza fria, observamos a lenta extinção dos sóis, e tentamos recordar o brilho desaparecido da origem dos mundos".

Qual das cosmologias está correta? Houve um princípio? Haverá um fim? Em 1965 fez-se uma descoberta que lançou alguma luz sobre o assunto. Nesse ano o Professor Robert Dicke salientou um aspecto da teoria que parecia ter escapado à atenção. Segundo a teoria do "big-bang", o Universo começou na forma de uma gotinha de matéria densa e quente. Este Universo primitivo deve ter sido uma bola de fogo cheia de radiação intensa e brilhante. A medida que o Universo se expandiu, a intensidade da radiação diminuiu. Mas os cálculos de Dicke indicam que devia existir hoje um resto da radiação da bola de fogo, e que esta devia poder ser captada por uma antena de rádio sensível (1).

Dicke tratou de construir um aparelho para procurar o resto da radiação da bola de fogo primitiva, desconhecendo que dois cientistas do laboratório Bell - os Drs. Arno Penzias e Robert Wilson - já o tinham encontrado. Também eles não sabiam que haviam feito a descoberta, pois não estavam à procura de radiação de bolas de fogo; estavam, sim, a medir a intensidade de ruído de rádio recebido numa grande antena, que tinha sido posta, havia algum tempo, em ligação com as comunicações do programa de satélites. As suas medições revelaram uma radiação confusa, que chegava àquela antena de todas as partes do céu. Penzias e Wilson não conseguiram encontrar uma explicação para a fonte desta radiação, até que um amigo lhes falou do trabalho de Dicke. O resto é história científica.

Subseqüentemente, outros físicos e astrônomos confirmaram a existência da radiação primitiva da bola de fogo. As suas medições constituem um testemunho forte a favor da cosmologia do "big-bang" Nenhuma outra explicação desta radiação foi apresentada até aqui pelos cosmologistas do "estado fixo".

Deste modo, os fatos parecem favorecer a cosmologia do "big-bang". Se esta teoria estiver correta, o Universo teve subitamente início há perto de 10mil milhões de anos. Mas que conclusão devemos nós tirar de tal teoria? O Universo é a totalidade da matéria; se houve um princípio, que é que havia antes? Quando todas as estrelas se extinguirem, que haverá depois? Num esforço desesperado para assegurar um tempo de vida infinito para o Universo, alguns cosmologistas dizem que nós podemos estar a oscilar para trás e para a frente, para sempre, entre o nosso estado condensado e o de expansão. Contudo, há uma prova contra esta teoria da oscilação.

Por agora, o assunto fica neste ponto. Os cientistas revelaram aspectos muito interessantes do Grande Plano – o nascimento das estrelas, a formação dos elementos dentro das estrelas a partir das três partículas fundamentais, e a sua dispersão para o espaço em explosões de supernovas; mas a Ciência não oferece qualquer resposta satisfatória a uma das questões mais profundas que jamais ocuparam o espírito do Homem - a questão do princípio e do fim.

\\\(1) A mesma idéia ocorreu a Gamow dez anos antes, e este apresentou-a num artigo publicado no ano de 1956, mas a sua sugestão não provocou qualquer reação naquela altura.

iiiii

O universo em expansão. As observações astronômicas revelam que todas as galáxias do Universo se afastam

umas das outras a velocidades muito elevadas, como se situassem na superfície de um balão que aumentasse rapidamente de volume (acima). É mais difícil conceber a natureza de tal expansão no nosso mundo tridimensional do que na superfície bidimensional de um balão, mas o princípio continua a ser o mesmo.

A cosmologia "big-bang". A fim de tentar dar uma explicação para a aparente expansão do Universo George

Gamow adiantou a seguinte hipótese: há dez mil milhões de anos o Universo consistiria numa nuvem escaldante e densa no seio da qual as partículas básicas da matéria - elétrons, nêutrons e prótons - se encontravam comprimidas umas contra as outras e a uma temperatura muito elevada. Este Universo extremamente comprimido dilatou-se com violência explosiva. A primeira figura mostra-nos o Universo poucos minutos após a explosão inicial, quando a temperatura era da ordem dos milhões de graus. Na segunda gravura, uma hora mais tarde, o Universo continua a dilatar-se, mas a temperatura baixou, permitindo que se formassem núcleos a partir da combinação de nêutrons e prótons. Na terceira imagem, dez milhões de anos mais tarde, a temperatura desceu para 55ograus e formaram-se átomos que começaram

a condensar-se em galáxias, e em estrelas no seio das galáxias. Na última imagem vemos uma dessas galáxias, que dá a impressão de se situar no centro da irradiação, dado que todas as galáxias vizinhas se afastam dela.

os cosmólogos que defendem uma teoria de Perenidade. Os cosmólogos ingleses Herman Bondi, Tom Gold e Fred Hoyle tentaram encontrar

uma nova explicação para a dilatação do Universo. Com a sua teoria, denominada cosmologia "steady-state", procuram tornear as objeções de ordem filosófica que se levantam a uma teoria segundo a qual o Universo teve um ponto de partida num dado momento, adiantando que se cria ininterruptamente, em todo o Universo, hidrogênio a partir do nada. Segundo eles, o hidrogênio que assim se vai formando vem ocupar o espaço vazio deixado pela dilatação do Universo e, simultaneamente, fornecer matéria-prima para a formação de estrelas. Deste modo, o Universo renova-se indefinidamente, sem começo nem fim.

Vemos, na fotografia de cima, Hoyle (à esquerda) e Gold (ao centro) em conversa com Freeman Dyson, do Institute for Advanced Study, de Princeton, durante uma conferência realizada no Goddard Institute for Space Studies em 1961.

a bola de fogo original.A cosmologia "big-bang" foi substancialmente corroborada em 1965, ano em que

Robert Dicke, da universidade de Princeton, pôs em evidência o fato de que, segundo esta teoria cosmológica, o Universo terá começado por ser uma bola de fogo, densa e incandescente, que emitia uma intensa radiação. Em sua opinião, deveria ser hoje possível detectar um resíduo dessa radiação por meio de antenas de rádio muito sensíveis. Numa altura em que R. Dicke havia já iniciado a construção de um aparelho destinado a essa detecção, dois físicos do Bell Laboratory, Arno Penzias e Robert Wilson, descobriram por puro acaso vestígios dessa radiação quando procediam à medição de sinais rádio captados por uma grande antena erigida por A.T. ç T. com vista ao programa de comunicações por satélite.

6. a origem do sistema solar

A origem do sistema solar não está envolvida num mistério tão grande como o da origem do Universo, mas ainda nãoconstitui um acontecimento compreendido com clareza. Quando euandava no liceu ensinaram-me a teoria de que os planetassurgiram como derivados de um acontecimento catastrófico, noqual o Sol colidiu com uma estrela que por ele passava. Aforça da gravidade rasgou enormes flâmulas de gás chamejantedos corpos das duas estrelas durante o encontro. Enquanto aestrela que tinha provocado o choque se perdia na distância,algumas destas flâmulas de material gasoso foram atraídas pelagravidade do Sol e forçadas a girar em órbita ao seu redor. ATerra condensou-se a partir de uma destas flâmulas de gásquente, formando uma massa em fusão, sobre cuja superfícienasceu uma crosta que foi endurecendo gradualmente com odecorrer do tempo. É fácil calcular a probabilidade de o sistema solar se teroriginado desta maneira. A possibilidade de uma colisão entreo Sol e uma outra estrela depende do tamanho do Sol, e dadistância entre ele e as estrelas vizinhas. As estrelas,apesar de serem grandes, são bastante pequenas em comparaçãocom as distâncias médias que as separam. O Sol, por exemplo,tem um milhão e meio de quilômetros de diâmetro, e está a

3obilhões de quilômetros da sua vizinha mais próxima. Por estarazão, a probabilidade de colisão entre duas estrelas é muitopequena; de facto, um cálculo mostra que uma ou, no máximo,algumas colisões podem ter ocorrido durante a história danossa galáxia. Na verdade, os planetas do nosso sistema solarpodem ser os únicos existentes, de acordo com a teoria dacolisão. É quase impossível que dois destes raros corpos - osplanetas - estivessem localizados muito perto uns dos outrosem estrelas vizinhas. No entanto, alguns anos atrás foi descoberto um planetagirando em órbita à volta de uma das nossas vizinhas maispróximas no céu, chamada a estrela de Barnard (1). O planetarecentemente descoberto foi detectado pela sua influência nomovimento da estrela-mãe. Ao mesmo tempo que um planeta gira àvolta de uma estrela, a atracção da gravidade faz com que aestrela siga até certo ponto o movimento do planeta na suaórbita. Quando a estrela é observada da Terra através de umtelescópio, podemos vê-la a mover-se para trás e para afrente, à medida que o planeta gira em seu redor. Como oplaneta é muito mais leve que a estrela, a sua atracção sobreela é bastante fraca, e a alteração da posição da estrela écorrespondentemente ligeira, podendo porém, ser detectada se aestrela estiver suficientemente perto de nós. No caso daestrela de Barnard, a alteração era excessivamente pequena,sendo equivalente a uma deslocação da largura de um cabeloobservada de uma distância de uns quilômetros, e serianecessária uma observação durante vinte e cinco anos paraconfirmar a sua existência. A estrela de Barnard encontra-se apenas a seis anos-luz doSol, o que é muito pouco na escala das distâncias estelares.A descoberta do planeta girando à volta da estrela de Barnardcria dúvidas na validade da teoria da colisão, vistocontradizer a previsão da teoria de que as estrelas complanetas circulando ao seu redor deviam ser um fenómeno raro,e situadas a grandes distâncias entre elas na Galáxia. A teoria da colisão sofre de um outro ponto fraco. Não podedar uma explicação para o facto de as órbitas da maior partedos planetas serem círculos quase perfeitos. A órbita daTerra, por exemplo, afasta-se de um círculo perfeito em apenas2 por cento, e a órbita de Vénus, em apenas sete décimos porcento. De acordo com a teoria da colisão, as órbitas dosplanetas deviam ser alongadas e estreitas, em virtude de osplanetas terem sido formados de filamentos de gás longos eestreitos estendendo-se em direção à estrela que se afastava.É possível que as órbitas estreitas previstas pela teoria dacolisão pudessem ter sido alteradas ou transformadas emcírculos perfeitos através do decurso de milhões de anos, masninguém ainda conseguiu pensar num processo natural em queesta alteração se pudesse ter dado. Tais discrepâncias obrigam-nos a procurar outra teoria paraa origem do sistema solar. Felizmente, existe uma teoria rivalao nosso alcance. Os proponentes da segunda teoria sugerem que

os planetas se formaram de maneira semelhante à do próprioSol, em pequenas condensações na nuvem de gás parcialmentecomprimido que rodeava o Sol por altura do seu nascimento. àmedida que a nuvem de gás do futuro Sol se contrai sob a forçainterna da sua própria gravidade, ela abandona na sua orlaexterior todos aqueles átomos de gás que se movemsuficientemente depressa de modo a que o seu movimento paradiante, combinado com o movimento para o interior na direçãodo centro da nuvem, em virtude da atracção da gravidade, curveas trajectórias em órbitas circulares ou quase. Cada um destesátomos está ligado à nuvem de gás central pela gravidade egira a volta dela como um planeta em miniatura. A nuvemcentral continua a contrair-se até que a sua temperaturaatinge o nível crítico de 12 milhões de graus necessários para o desencadear de reacções termonucleares. Este ponto dacontracção assinala o nascimento do Sol. Ao mesmo tempo, osátomos de gás circundantes, girando em órbita à volta do Sol,condensam-se sob a influência da gravidade para formar osplanetas. Provavelmente a Lua e os outros satélites naturaisdos planetas foram formados da mesma maneira, em condensaçõesainda mais pequenas à volta dos seus planetas-pais. Se as estrelas e os planetas são ambos formados pelacondensação de uma nuvem de gás sob a influência da gravidade,qual é a diferença entre eles? A resposta está relacionada comas suas massas. à medida que a nuvem "estelar", ou a nuvem "planetária", se contrai, a sua temperatura eleva-se. Se anuvem é muito maciça, a temperatura atinge o valor de 12milhões de graus, temperatura a que a ignição nuclear seinicia, e nasce uma estrela. Se a nuvem é pequena, atemperatura não chega a atingir o nível crítico e a nuvemcondensada permanece um corpo inerte sem fontes internas deenergia nuclear; isto é, torna-se um planeta. A nuvem de gás mais pequena que criará uma estrela temaproximadamente um décimo da massa do nosso Sol. Júpiter é umplaneta muito grande, com 318 vezes mais massa do que a Terra,mas está muito aquém, por um factor de cerca de 100, depossuir a massa necessária para formar uma segunda estrela nonosso sistema solar. É possível que algumas das nuvens de gás que se condensamno espaço exterior sejam demasiado pequenas para produzir astemperaturas necessárias para a ignição nuclear e, portanto,não podem vir a ser estrelas; contudo, não podem ser chamadaspropriamente planetas, visto que um planeta é um corpo ligadoa uma estrela pela força da gravidade e circula em órbita emtorno dela. Tais corpos relativamente frios, do tamanho deplanetas, livres da influência da gravidade de qualquerestrela, podem existir à nossa volta em número considerável.Uma vez que eles não brilham com luz própria, e estãodemasiado afastados de qualquer estrela para serem visíveisaos nossos olhos à luz reflectida daquela, não possuímos demomento qualquer processo para detectar estes "planetaslivres". Podemos encontrar um deles por acaso quando

começarmos a explorar com veículos espaciais as regiões queestão para além dos limites do sistema solar. Estas considerações provêm da teoria da condensação daorigem do sistema solar, a favor da qual ainda não foifornecida qualquer prova definida. Contudo, existem boasrazões para acreditarmos nesta teoria. Primeiro, ela adapta-senaturalmente às idéia s mais recentes sobre o nascimento dasestrelas. Segundo, prediz que os planetas são um acessórionatural do nascimento das estrelas, e a conjectura partiu dadetecção de planetas girando em redor de estrelas nasproximidades do Sol. Terceiro, oferece uma explicação naturalpara as órbitas circulares dos planetas no nosso sistemasolar. Todavia, a teoria apresenta algumas dificuldades. Entreestas está em primeiro lugar o problema da rotação do Sol. OSol gira sobre o seu próprio eixo uma vez em cada 27 dias,precisamente como a Terra completa uma rotação em cada 24horas. É fácil compreender porque é que o Sol deve girar destemodo se nos lembrarmos de que ele foi formado originalmente apartir de massas em redemoinho de hidrogênio interestelar. Umaparte desse movimento em redemoinho deve ter-se conservado nanuvem a partir da qual o Sol se formou. Quando a nuvem "solar"estava formada havia pouco tempo, e as suas dimensões eramgrandes, ela girava provavelmente muito devagar. Mas, à medidaque se contraía, deve ter girado cada vez mais depressa, talcomo um patinador rodopia com mais velocidade quando junta osbraços ao corpo e aproxima os patins, na contracção de umavolta larga para um círculo pequeno. Em consequência desteefeito, o Sol devia estar presentemente a girar sobre o seueixo à razão de uma vez em poucas horas. Na realidade, gira auma velocidade muito menor, 10ovezes mais devagar. Que é quediminuiu a velocidade do Sol? Nunca foi apresentada umaresposta perfeitamente satisfatória. Um outro problema se levanta do facto de os planetasdeverem conter, de acordo com a teoria, uma larga fracção damassa da nuvem "solar" de gás original. Um cálculo efectuadopor James Jeans leva à conclusão de que um terço da massa doSol deveria ter sido posta de parte para a formação dosplanetas. Na verdade, os planetas possuem pouco mais de ummilésimo da massa do Sol. Que aconteceu à matéria que falta?Talvez que correntes de partículas da superfície do Sol avarressem, ou se pudesse ter evaporada das regiões exterioresdo sistema solar. Não se conhece a resposta. Estas dificuldades da teoria da condensação não sãofacilmente resolvidas. Pode apenas dizer-se que temos umasuspeita de que a Terra foi formada por condensação,juntamente com o Sol, há 4,5 mil milhões de anos, mas ninguémtem ainda uma compreensão clara do emaranhado complexo deacontecimentos que envolveram a génese dos planetas. Épossível que estejamos para ter uma grande surpresa quandolevarmos a cabo as nossas primeiras explorações in situ da Luae dos planetas, nas próximas décadas.

\\\ (1) Muito recentemente, em relação à mesma estrela, umgrupo de investigadores revelou que acredita que este sistemapossua pelo menos dois planetas. (N. T.)

a formação do sol e dos planetas. Julga-se que o SistemaSolar terá tido inicialmente a forma de uma difusa nuvem degás cuja coesão se devia à sua própria força gravitacional(1). O raio original dessa nuvem era aproximadamente de 16bilhões de quilômetros. Com o decorrer do tempo, a atracção da gravidade fezaproximar os átomos uns dos outros, pelo que a nuvem secontraiu (2). Durante um período difícil de estimar mas que terácorrespondido provavelmente a um total entre dez e vintemilhões de anos, o denso núcleo da nuvem foi-se reduzindogradualmente até atingir aproximadamente a envergadura doactual Sol (3). Neste estádio, a temperatura dessa regiãocentral atingiu valores suficientemente elevados paradesencadear reacções nucleares, no decurso das quais se deu apassagem do hidrogênio a hélio e a libertação de energia, oque assinala o nascimento do Sol. Nas regiões menos quentes e menos densas em torno doprimitivo Sol, produziram-se condensações de menor importânciasob a influência da gravidade, as quais deram origem aosplanetas (4).

Os meteorolitos e a origem do sistema solar. A teoria queexplica a origem do Sistema Solar por uma condensação, se bemque largamente aceite, não deixa por isso de apresentardiversas inconsistências graves. Realizou-se em 1961 umaconferência no Goddard Institute for Space Studies, em NovaIorque, na qual se reuniram diversos astrônomos, físicos egeodésicos a fim de debateram as dificuldades apresentadaspela teoria. Vemos, na gravura de cima, John Wood, daUniversidade de Chicago, quando proferia uma exposição peranteos participantes da conferência, na qual debatia a naturezados meteoritos e a sua importância para a compreensão daorigem dos planetas. Os meteoritos são fragmentos de rochasextraterrestres que, à semelhança de planetas em miniatura,cruzam o Sistema82

Solar a velocidades muito elevadas, colidindo por vezes com aTerra. A rápida passagem de um meteorito pela atmosferaterrestre faz que a temperatura da sua superfície atinja aincandescência; o rasto de um meteorito incandescente é

facilmente visível à noite, razão por que se designacomummente por "estrela cadente". A maior pane dos meteoritossão de pequena envergadura e consomem-se durante a suapassagem pela atmosfera. Um reduzido número consegue, pelassuas dimensões, atingir o solo; de longe em longe, quando sedescobre um destes meteoritos, procede-se ao seu estudolaboratorial. Os meteoritos revestem-se de um interesseexcepcional, uma vez que representam provavelmente o estadooriginal da matéria de que se formaram os planetas; por estarazão, são sempre incluídos nos debates sobre a origem doSistema Solar.

7. a lua: a pedra da roseta dos planetas

Calculamos que a Terra e a Lua, juntamente com o resto dosistema solar, foram formadas há 4 mil e 500 milhões de anos.Em dada altura no primeiro milhar de milhões de anos, a vidasurgiu sobre a superfície da Terra. Lentamente, como nosindica o testemunho de fosseis, os organismos vivos subiram naescala, de formas simples para mais avançadas, até que - hátalvez um milhão de anos - o limiar da inteligência foiatravessado. Os seres terrestres nunca ficarão a saber como issoaconteceu, ou que condições levaram ao aparecimento de vida,pois o registo dos primeiros anos da Terra foi destruído. O are a água, que tornam o nosso planeta habitável, desgastaram asrochas mais velhas e arrastaram os seus resíduos para osoceanos, enquanto a actividade de formação de montanhas e aserupções vulcânicas têm vindo a agitar e a inundar repetidasvezes a superfície com lava nova, fazendo desaparecer asrestantes provas. Estas forças naturais removeramcompletamente as matérias primitivas que existiam sobre asuperfície da Terra logo quando ela foi formada. Nunca foramencontradas rochas sobre a Terra que tivessem mais de 3 mil e500 milhões de anos. Não sabemos nada do que aconteceu nonosso planeta desde a altura da sua formação, até estas rochasmais antigas terem sido depositadas. O primeiro períodocrítico, durante o qual a vida começou, constitui uma páginaem branco na história da Terra. Mas na Lua não existem oceanos, nem atmosfera que destrua asuperfície, e há relativamente pouca actividade de formação demontanhas, que transforma rapidamente a face da Terra. Asmatérias da superfície da Lua estão, em grandes áreas, em tãobom estado de conservação como se tivessem permanecidoguardadas em frigoríficos. A Lua oferece a melhorpossibilidade de recapturar o registo do passado da Terra. Um exame fortuito de fotografias da Lua confirmaimediatamente que este pequeno planeta reteve o registo dosprimeiros acontecimentos da sua história com excepcional

fidelidade. As fotografias revelam inúmeras crateras. tendosido a maior parte delas produzida pelo impacte de meteoritosciados em profusão sobre a Lua durante milhões de anos. Muitascrateras encontram-se rodeadas por formações alcantiladas quechegam a alcançar 300ometros de altura. Algumas destasformações devem ter mil milhões de anos ou mais de idade, noentanto, fotografias obtidas com um telescópio indicamclaramente que se conservaram quase inalteráveis, com pouca damatéria original desgastada. Com a Terra, através da suahistória, colidiram meteoritos, da mesma forma que colidiramcom a Lua, e produziram crateras semelhantes; porém, todos osvestígios das crateras mais velhas desapareceram, uma vez quena Terra os vários agentes de erosão, dos quais o maisimportante é a água corrente, deslocam os materiais de um ladopara outro, nivelando as paredes da cratera e preenchendo ascovas e buracos. Apenas as marcas das mais recentes colisões,como é o caso das crateras do Arizona provocadas pormeteoritos, são ainda visíveis sobre a Terra. Fotografias da Lua tiradas pelas primeiras naves espaciaisda NASA fornecem a prova de que a erosão na Lua tem sido, naverdade, muito pequena. Mostravam formações lunares com apenasalgumas dezenas de centímetros de diâmetro. A clareza dasfotografias conseguidas pelas naves espaciais causou júbiloentre os astrônomos, que se tinham esforçado por perscrutar aatmosfera da Terra como automobilistas examinando a estradaatravés de um pára-brisas salpicado de chuva. Muitas craterasque não tinham sido vistas até então em fotografias ti radasatravés de telescópios da Terra eram visíveis, com diâmetrososcilando entre algumas dezenas de centímetros e algunsmetros. Estas pequenas crateras devem também ter existido naTerra, mas foram destruídas quase imediatamente pelo efeitoerosivo de ventos e água corrente; mesmo uma cratera desessenta metros dura no nosso planeta apenas um milhão deanos, ou coisa assim, que é um piscar de olhos na escala detempo geológico. Na Lua uma tal cratera dura mil milhões deanos, e mesmo as pegadas pouco fundas dos astronautas daApolo, com apenas 6 a 8 centímetros de profundidade,persistirão por um milhão de anos, ou mais. Por que é que a Lua não possui uma atmosfera? A respostaestá relacionada com a pequenez deste satélite e com a suafraca gravitação A atmosfera de qualquer lua ou planeta érapidamente arrastada para o Espaço se não for mantida nasuperfície pela gravidade. Mesmo com a gravidade, há umconstante escape de gás da atmosfera para o Espaço. Quantomenor o planeta for, tanto menor é a forca de gravidade emaior a proporção do escape. A Lua é tão pequena que todos osgases que originalmente entravam na constituição da suaatmosfera se libertaram rapidamente quando ela era ainda muitojovem. Porque é que a Lua não possui água, que é tão abundante naTerra? A explicação está de novo relacionada com a fracagravitação da Lua. As matérias da Lua, tal como as matérias da

Terra, continham provavelmente alguma água quando estesastros se condensaram a partir dos gases da nebulosa solar. Asmoléculas de água, retidas inicialmente no interior da Lua,dever-se-iam ter difundido do interior para a superfície com odecorrer do tempo. Quando chegaram à superfície deveriam terdesaparecido, em virtude de a gravitação da Lua ser demasiadofraca para as reter. Mil milhões de anos, ou talvez menos,bastaram para que as camadas exteriores da Lua sedesidratassem completamente. Quando Galileu, o primeiro homem a observar a Lua atravésde um telescópio. voltou o seu primitivo aparelho para aqueleastro em 1609, viu grandes áreas negras semelhantes a oceanos,a que chamou maria, ou mares. A designação permaneceu, massabemos que a semelhança com extensões de água é ilusória. Osmares lunares não contêm água; não há tempestades assolando asplanícies; não existem rios que corram das terras altas. A Luaé um planeta seco. A aridez da Lua leva-nos a fazer uma predição segura: nãoexistem quaisquer percevejos escondidos em fendas ou debaixode rochas, aguardando ser descobertos por futuros grupos quedesçam naquele planeta. De facto, é pouco provável que existaqualquer forma de vida sobre a Lua. A água é essencial para odesenvolvimento das formas de vida que conhecemos, poisfornece um ambiente fluido, onde as complexas moléculas dacélula se podem movimentar livremente. Este movimento livreconduz a colisões freqüêntes entre moléculas vizinhas e, comoconsequência destas colisões, a reacções químicas queasseguram o processo continuo de vida. Mesmo que todos os produtos químicos básicos da célula vivaexistissem em abundância na Lua e fossem espalhados pela suasuperfície árida, eles nunca se uniriam para formar oorganismo vivo mais simples, pois seriam incapazes de se movimentar. A água pode não ser o único líquido com possibilidades paraeste efeito. Amoníaco, por exemplo, podia ser suficiente.Contudo, este alargamento das possibilidades dedesenvolvimento de vida não leva a um optimismo maior no querespeita às probabilidades de encontrar vida na Lua. Se oamoníaco entrasse na constituição da Lua, libertar-se-ia tãorapidamente como a água, porque os raios ultravioleta do Soldecompõem as moléculas de amoníaco nos seus átomos componentesde hidrogênio e nitrogênio, e os átomos leves de hidrogênioescapam-se para o Espaço. Isto é autêntico para qualquerlíquido que possamos imaginar que existisse em abundância naLua. É quase certo, assim, que a superfície lunar se encontrahoje desprovida de todas as formas de vida. No entanto, a Lua árida e sem vida pode revelar pistas paraa origem da vida sobre a Terra. A explicação deste paradoxoestá no facto de que, embora a Lua seja seca actualmente, elapode ter possuído alguma humidade na sua superfície por umcurto espaço de tempo na sua juventude. Temos a certeza de quetodas as moléculas de água que atingiram a superfície da Lua

provenientes do seu interior se escaparam para o Espaço comrelativa rapidez, mas é possível que tenham permanecido apenaso tempo suficiente para que se formassem pequenos lagos deágua. No breve intervalo durante o qual existiu humidade naLua, pode também ter existido, tal como na Terra, uma grandequantidade das unidades moleculares constituintes fundamentaisa partir das quais se constroem todas as formas de vidaconhecidas. Estas moléculas - aminoácidos e nucleótidos -, imersas em lagos dispersos com poucaprofundidade, teriam colidido incessantemente; de vez emquando as colisões tê-las-iam unido, formando as moléculasgrandes - proteínas, ADN e NAR - que são a essência dosorganismos vivos. A união de moléculas pequenas para formarmoléculas grandes teria marcado o primeiro passo ao longo docaminho que vai da não existência de vida a vida. A evolução química podia ter começado nessa altura, numbreve período de água no inicio da existência da Lua, e tersido cortada a meio caminho quando atravessava o limiar, àmedida que a água desaparecia. Se tal aconteceu, algumasdaquelas moléculas complexas serão eventualmente encontradasem amostras de rocha lunar. A descoberta destas moléculas - ameio caminho entre a não existência de vida e a vida - seriaquase tão importante como a descoberta da própria vidaextraterrestre, porque revelariam uma das maneiras como a vidapode aparecer num planeta recentemente criado. Qual é o melhor lugar para procurar estas moléculaspreciosas? Não nos mares lunares, pois nós sabemos agora, daanálise das amostras recolhidas nas aterragens da Apolo, queos mares lunares são lagos de lava congelada - rochas queoutrora foram fundidas e elevadas à temperatura de 1200 grauscentígrados pelo menos. A temperaturas tão altas, as frágeismoléculas de vida ter-se-iam desintegrado completamente. Se setem de encontrar vestígios dos princípios da vida em qualquerlugar da Lua, eles não serão encontrados nos mares. As terras altas lunares, uma região agreste e com inúmerascrateras que confina com o Mar da Tranquilidade, constituem umlugar mais prometedor para a sua procura. As terras altas nãose assemelham a grandes lagos planos de lava congelada.Parecem-se com a superfície original da Lua logo após ternascido - um ermo de blocos amontoados em desordem e deburacos provocados por explosões, nunca derretidos desde essaaltura. Se alguma vez existiram moléculas interessantes doponto de vista biológico nas terras altas, elas podemprovavelmente ser ainda lá encontradas. Para as obter teremosde cavar, uma vez que uma molécula frágil que se encontrassena superfície seria destruída em pouco tempo pela radiaçãoultravioleta solar e por raios cósmicos, mas a algumas dezenasde centímetros abaixo da superfície tais moléculas podem aindaestar conservadas.As terras altas são mais interessantes do que os mares, poroutra razão ainda. Por muito velhos que sejam os mares, asterras altas parecem ser ainda mais velhas, em virtude de as

fotografias mostrarem claramente que as matérias de cada umdos mares lunares ocupam uma bacia no terreno rochoso apartir da qual se formam as terras altas. Portanto, as terrasaltas devem ter existido antes dos mares. Além disso, os mareslunares têm menos crateras do que as terras altas, o quesugere que surgiram depois do intenso bombardeamento ocorridono princípio da vida da Lua. Apenas as terras altas oferecemaos exploradores lunares a possibilidade de recuar mesmo aosprimeiros anos da existência do nosso satélite.As terras altas lunares não estavam no cimo da lista de alvospara as aterragens da Apolo porque são um terreno rochosotraiçoeiro no qual o radar de aterragem do LEM pode serconfundido por múltiplos ecos, ou pode acontecer que a navefique numa posição perigosamente inclinada. Teria sidoinsensato tentar uma descida nas terras altas no inicio doprograma de exploração lunar, antes de se ter adquirido vastaexperiência em matéria de capacidade técnica de aterragem. Contudo, um sitio de terras altas foi o alvo da Apolo 14, eestão previstas mais aterragens nas terras altas para voosApolo posteriores. Se as terras altas forem ricas emingredientes moleculares de vida, estes aparecerão nasamostras recolhidas num desses voos. Se tais moléculas foremraras, podemos não as encontrar durante anos, mas a buscacontinuará, pois não pode haver recompensa maior na exploraçãolunar do que a descoberta de precursores moleculares deevolução. Estes resultados ilustram o valor científico da exploraçãolunar. As rochas que juncam a superfície da Lua certamente quenão contêm quaisquer organismos vivos; sabemos que contêmmuito pouco ouro ou prata; mas, no entanto, são de valorcientificamente inestimável em virtude das revelações quepodem oferecer no que respeita aos primeiros anos do sistemasolar. De maneira alguma todos os cientistas têm sido optimistasacerca das possibilidades de descobrir tais tesouroscientíficos na Lua. A escola da "Lua quente" orientada por umnúmero de cientistas eminentes, acredita que a Lua ésemelhante à Terra, com um interior em fusão ou parcialmentefundido, e que a sua superfície tem sido marcada pelas mesmaserupções vulcânicas e repetida, inundações de lava quecobriram a superfície original da Terra (1). Os cientistas da"Lua quente" apontam para cumes vulcânicos no Oceano dasTempestades semelhantes a ilhas vulcânicas, como as Havai.Sublinham os resultados de uma análise química controlada adistancia e executada em 1968 pela nave espacial Surveyor, queindicaram que as rochas lunares são feitas das mesmasmatérias, e aproximadamente nas mesmas percentagens, quecertas rochas da Terra que se sabe serem de origem vulcânica. Os cientistas da "Lua quente" esperariam que a maior partedas rochas da superfície da Lua, tal como as da superfície daTerra, tivessem menos de mil milhões de anos de idade (2).Ficariam surpreendidos por encontrar na Lua indicações para o

princípio da vida ou para o princípio do sistema solar. Elesargumentam que o registo do primeiro milhar de milhões deanos do sistema solar, se é que existe na Lua, estaráenterrado a grande profundidade e será difícil de ler. A escola da "Lua fria", orientada por Harold Urey, possuiuma opinião completamente diferente. Os cientistas da "Luafria" consideram a Lua um planeta de um tipo muito diferentedo da Terra, não contendo nem um centro em fusão, nem poços derocha derretida no seu interior. Afirmam que a Lua foi formadaa frio, ou arrefecida depois do seu nas cimento, e que deentão para cá é rocha sólida até ao centro. Como suporte doseu ponto de vista, evidenciam a face devastada da Lua,apresentando ainda as marcas de colisões de meteoritos quedevem ter ocorrido há milhões de anos. Se a superfície da Luafosse continuamente renovada com lava recente do interior,estas crateras teriam desaparecido há muito. Os cientistas da "Lua fria" realçam a importância doaspecto deformado da Lua. Se a Lua fosse quente, ou mesmotépida, as rochas do interior seriam relativamente moldáveis emoles. Consequentemente a Lua teria assumido uma forma muitopróxima da de uma esfera perfeita, visto que a força degravidade teria atraído todas as partes do corpo moldável doplaneta para o centro. Observações revelam, porém, que a formada Lua está muito longe de ser uma esfera perfeita. Tem umaconvexidade equatorial - uma espécie de pneu sobresselente -com dois ou três quilômetros de altura, e uma elevaçãoapontada para a Terra - uma espécie de nariz lunar - tambémcom um ou dois quilômetros de altura. Os cientistas da "Lua fria" apontam para o significado dasbolsadas recentemente descobertas - enormes concentrações, degrande densidade de massa, de origem inexplicável, localizadasno centro de vários dos grandes mares lunares. Estassaliências e concentrações de massa não poderiam existir nasuperfície se o interior da Lua fosse quente e moldável: ointerior da Lua teria então cedido ao seu peso extra, e elasteriam mergulhado no interior e desaparecido. O facto de istonão ter acontecido sugere que o interior da Lua é forte,rígido e frio. De acordo com a escola da "Lua fria", a superfície da Luanão foi inundada por lava desde os primeiros anos da suaexistência. As matérias da superfície foram alteradas porbombardeamentos de meteoritos, mas fora disso são as mesmasque foram formadas no princípio: bocados de rocha primitiva,com os segredos do sistema solar encerrados neles Oscientistas da "Lua fria" esperariam encontrar na Lua muitasrochas que fossem mais antigas que as rochas mais velhas daTerra, e esperariam mesmo encontrar alguns fragmentos de rochaque remontassem, 4 mil e 500 milhões de anos atrás, aoprincípio do sistema solar. Anteriormente à descida da Apolo 11, as evidências eramfortes de ambos os lados, e contraditórias. Os cientistas da"Lua quente" viam muitos vulcões - tanto extintos como activos

- em fotografias da Lua. Os cientistas da "Lua fria" viampoucos indícios de actividade vulcânica nas mesmasfotografias. Os cientistas da "Lua quente" apresentavam aprova de que os mares lunares - as grandes regiões escuras daLua - são camadas de lava relativamente recente, com menos de500 milhões de anos de idade; os cientistas da "Lua fria"apresentavam a prova de que os mares lunares são antigos,possivelmente com 4,5 milhares de milhões de anos. As atitudes firmaram-se à medida que a descida lunar seaproximava, mas os partidários de ambos os pontos de vistaacreditavam que a Apolo 11 decidiria a controvérsia. Umasensação de intensa excitação apoderou-se de todos nós, àmedida que aguardávamos o regresso das rochas de valorincalculável. Finalmente chegou o dia em que estava previstoser aberta a primeira caixa de rochas. A tensão subiu na salade exame do Laboratório de Recolha Lunar à medida quecientistas e repórteres observavam o pessoal do laboratório adirigir um elaborado ritual imaginado por terrestresdesconfiados para se protegerem a si próprios e ao seuambiente do primeiro contacto com um planeta alheio. Haviaapenas uma probabilidade diminuta de que as rochas lunarescontivessem um microrganismo mortal contra o qual a vida nãoteria qualquer defesa, mas o perigo latente era grande; poresse motivo foram tomadas cuidadosas precauções. Estavampresentes cientistas da "Lua quente" e da "Lua fria". Sabíamosque se passariam semanas ou meses antes que as experiênciasque determinariam as idades das rochas pudessem estarconcluídas, mas sabíamos também que o momento da verdadeestava perto. Os resultados dos cálculos da idade foram revelados numaconferência única de cientistas lunares em Houston em 1970.Cento e quarenta e duas equipas de investigação apresentaramos seus relatórios a mais de mil colegas e jornalistas quetinham vindo a Houston de todas as partes do mundo.Trabalhando com pequenas quantidades do precioso material,contendo em média não mais do que o conteúdo de um dedal, elestinham submetido as rochas às mais variadas investigaçõespossíveis, indo desde operações disparatada mente simples -equivalentes a dar um pontapé num pneu -a análises delaboratório complexas e delicadas; tinham comprimido as rochasa alta pressão, tinham-nas aquecido até ao ponto de fusão,tinham-nas examinado a microscópios com luz polarizada,bombardeado com raios X, e finalmente tinham-nas separado,átomo por átomo.

As sessões da conferência foram enfadonhas, como asreuniões científicas excessivamente grandes geralmente são. Centenas de pessoas sentadas no salão escurecido, entorpecidaspela exposição de uma rápida sucessão de gráficos e mapas. Agrande quantidade de fatos e números paralisava o espírito;no entanto um fundo de excitação tomava posse de nós, poiséramos testemunhas de uma ocasião histórica - a primeira

discussão realizada por terrestres sobre os materiais denatureza diferente trazidos de um outro planeta. O ponto culminante da conferência chegou durante a sessãode abertura: descobriu-se que todas as rochas da Base daTranquilidade tinham muitos milhões de anos, e alguns bocadosde pó lunar tinham 4,5 milhares de milhões de anos - a mesmaidade que o sistema solar. O significado daquele resultado único não pode serexagerado. Isso queria dizer que alguns dos fragmentos de póda Base da Tranquilidade tinham permanecido na Lua desde osanos mais remotos do sistema solar, e que através delespodíamos recuar no tempo até ao momento em que os planetastinham acabado de se condensar a partir das nuvens emredemoinho da nebulosa solar. Quais os elementos que entraramna Terra quando no princípio ela se criou? A que temperaturaestava a sua superfície? Que densidade tinha a sua primitivaatmosfera? Havia moléculas da espécie que poderia levar aodesenvolvimento de vida? Nem um único fragmento da Terraprimitiva se pode encontrar hoje para responder a estasperguntas; contudo, existem bocados de Lua antiga disponíveise, de facto, a julgar pelas amostras da Apolo 11, emabundância. Isto causou alegria entre os cientistas partidários dateoria da "Lua fria". Estavam dispostos a procurar longa epacientemente tais objectos raros, as rochas mais antigas dosistema solar, e agora encontravam estas preciosasantiguidades espalhadas pela Lua, à espera de ser apanhadasprecisamente na primeira recolha feita ao acaso. Sentiam-secomo garimpeiros que, esperando encontrar algum pó de ouro,tivessem topado com um campo atapetado de pepitas. Porém, a confiança dos cientistas da "Lua fria" foi abaladapor uma outra revelação feita no mesmo encontro. osexperimentadores da Apolo 11 tinham dividido as amostras daLua em duas categorias: grãos finos de rocha e partículas depoeira de rocha, pulverizada por bombardeamento de meteoritos,e grandes pedaços de matéria rochosa que aparentemente setinham solidificado a partir de rocha fundida a dada altura dopassado da Lua. Quando as idades das diversas amostras foramcalculadas, descobriu-se que os grãos finos de rocha tinham 4mil e quinhentos milhões de anos, como já observámos, mas ospedaços grandes de lava tinham todos por igual 3 mil equinhentos milhões de anos - mil milhões de anos mais novos(3). Houve muito coçar de cabeça em relação a este resultadosingular, e ainda hoje há. Por que é que as partículas derocha finamente divididas haveriam de ter uma idade, enquantoas rochas sólidas tinham outra? Há quase tantas opiniões sobre a causa da diferença deidades quantos os cientistas lunares, mas regista-se um acordogeral sobre o seu significado amplo. Os grãos finos de rochada Base da Tranquilidade devem ser restos fragmentados dasuperfície lunar original, constituída quando a Lua foi

formada. Estes grãos de rocha, embora fragmentados porcontínuos bombardeamentos de meteoritos, aparentemente nãoforam fundidos ou alterados quimicamente de qualquer formadesde essa altura. São bocados da Lua original. As rochas com 3,5 milhares de milhões de anos, por outrolado, devem ser um produto de um acontecimento violentoocorrido nessa ocasião. Talvez a Lua fosse suficientementequente nesse tempo para originar uma grande erupção vulcânicaque espalhou rocha derretida pela superfície. Por outro lado,se a Lua fosse fria por essa altura, e sólida por dentro, asrochas podiam ter sido derretidas por uma força externa, comoa colisão de um meteorito gigante com a superfície da Lua. Qualquer que fosse a causa da fusão, depois de a camadaderretida ter solidificado, a mesma foi quebrada por colisõessubsequentes com meteoritos mais pequenos, e espalharam-sebocados por uma grande área. Os pedaços grandes de lavaespalhados sobre a superfície da Base da Tranquilidade seriamentão destes bocados. Os cientistas da "Lua fria" insistem em que a segundateoria - fusão devido à colisão de um meteorito - é a únicaexplicação para a rocha derretida que se adapta a todas asevidências. Se eles têm razão, e as rochas de 3 mil e 500milhões de anos foram fundidas por um meteorito, então estasrochas têm algo importante para nos dizer no que respeita àhistória da Terra. Por uma coincidência impressionante, asrochas mais antigas da Terra têm a mesma idade das rochasencontradas na Base da Tranquilidade. Aparentemente, tambémelas foram fundidas na mesma época. é possível que a mesmacatástrofe atingisse a Terra e a Lua ao mesmo tempo? Se a Luaesbarrou com uma saraivada de meteoritos gigantes quederreteram partes dela, então a Terra deve ter sidobombardeada ainda com mais violência, porque a sua potenteforça de gravitação atrairia estes meteoritos para ela maisdepressa e estes atingiriam a Terra a uma velocidade aindamaior do que atingiram a Lua. é provável que toda a vida tenhadesaparecido da Terra em consequência do pesadobombardeamento, para surgir de novo, semelhante a uma fénix,do ingrediente molecular original quando a superfície do nossoplaneta tivesse arrefecido suficientemente.Duas géneses num planeta? Isso seria na verdade um tributonotável à força do processo evolucionário. Além disso, vistoque os fósseis mais antigos encontrados na Terra tambémremontam quase a 3 mil e 500 milhões de anos, a segundagénese, se se deu, forçar-nos-ia a uma revisão drástica donosso cálculo do período de tempo requerido para a evolução davida a partir de produtos químicos sem vida. Estas idéia s, sugeridas pelos resultados das primeirasdescidas lunares, ilustram como a história da Terra pode seresclarecida através do estudo da Lua. Descidas posteriorespodem invalidar as conclusões tiradas dos primeiros vooslunares, ou conduzir a possibilidades ainda maisinteressantes. O que quer que nos esteja reservado na futura

exploração da Lua, as amostras trazidas pela Apolo forneceramjá o resultado mais extraordinário que se podia esperar. Temosagora a certeza que alguns materiais da Lua permaneceram ládesde á época em que a Lua e a Terra tinham sido condensadashavia pouco a partir da nuvem-mãe do sistema solar. Já não háqualquer dúvida de que o registo do passado, não se podendoencontrar na Terra, pode ser decifrado na Lua, que não possuinem água, nem ar. A Lua é a pedra da Roseta dos planetas.\\\ (1) A Terra possui um centro de rocha e ferro em fusão auma temperatura da ordem dos 6.000 graus centígrados e muitospoços mais pequenos de rocha fundida espalhados por todos osseus estratos exteriores sólidos. Quando um destes poços estáligado à superfície da Terra por uma fenda na crosta sólida,têm lugar erupções vulcânicas, acompanhadas por grandesinundações de rocha líquida e quente. Através de toda ahistória da Terra, a sua superfície tem sido refeita por estasconvulsões internas, que continuamente lançam para o exteriornovos materiais que se espalham pela superfície como lava e secongelam para formar nova rocha. Por conseguinte, a idademédia das rochas na superfície da Terra é de menos de milmilhões de anos. Encontram-se rochas mais velhas aqui e ali na Terra, masconstituem mais a exceção do que a regra. As rochas maisvelhas - depositadas como lava recentemente congelada há 3 mile 500 milhões de anos - encontram-se apenas em dois ou trêslocais muito espalhados e são achados muito raros Não são tipias da pouca idade da superfície da Terra. (2) Isto é, há menos de mil milhões de anos elas vieram àsuperfície como lava e congelaram em rochas sólidas. E claroque os átomos individuais nessas rochas são muito mais velhos.Existiam como gases no Espaço muito antes de se condensarempara formar as matérias do sistema solar. (3) Com uma exceção, um aberrante fragmento com 4 mil e400 milhões de anos, alcunhado Rocha Luny pelosexperimentadores da Apolo 11.

iiiii a antiga superfície da lua. A corroída paisagem lunar, queostenta as marcas de dezenas de milhares de colisões commeteoritos, testemunha o excelente estado de conservação dasuperfície da Lua. Na fotografia da esquerda, composta apartir da justaposição de duas fotografias das duas metades daLua, podem ver-se as maiores crateras da superfície lunar. Aárea demarcada a branco encontra-se ampliada na fotografia dadireita, obtida por meio do telescópio de 100 polegadas (2,54m) de Mount Wilson. Também ao longo da história da Terra a colisão demeteoritos com a sua superfície produziu crateras idênticas,as quais foram, na sua maioria, desfeitas pela acção erosivado vento e das águas correntes. Apenas encontramos crateras deformação muito recente, tais como a Arizona Meteorite Crater

(em baixo). Esta cratera, com um diâmetro aproximado de mil eseiscentos metros, assemelha-se às crateras lunares das mesmasdimensões. Trata-se de uma cratera de formação recente, comaproximadamente trinta mil anos, que terá desaparecido dentrode dez milhões de anos. As crateras lunares resultantes dacolisão de meteoritos têm uma duração de muitos milhões deanos, uma vez que na Lua não existem água nem ar, e a erosão éportanto ínfima.

grande plano da lua: crateras lunares antigas e recentes. Afotografia da página seguinte, obtida graças ao "Ranger 9",reproduz uma área de cerca de 13 quilômetros quadrados dasuperfície lunar, na qual podemos ver um grande número decrateras pequenas mas de contornos bem delineados, formadasnuma fase relativamente recente da história da Lua. A fotografia revela ainda outras crateras do mesmo diâmetro, mas que se encontram parcial ou quase inteiramente atulhadase apresentam rebordos arredondados. Estas craterasparcialmente desfeitas formaram-se numa fase recuada dahistória da Lua. Os seus rebordos têm sido desfeitos peloincessante bombardeamento de pequenos meteoritos ao longo deum período de mil milhões de anos. Cálculos efectuados com base em fotografias revelaram queos materiais que compõem a superfície lunar até umaprofundidade de cerca de dezasseis metros, sofreram umaredistribuição em consequência dos bombardeamentos demeteoritos durante a história da Lua. Esta taxa de erosão édez mil vezes menor do que a da erosão produzida na Terra pelovento e pela água corrente, e com isto se reforça a tesesegundo a qual a superfície da Lua se modifica muitolentamente. A área demarcada pelo rectângulo branco aparece ampliadamais abaixo (página seguinte). A cratera que se vê na parteinferior esquerda do pormenor tem uma largura de 46 metros euma profundidade de 9 metros. Esta fotografia foi tirada umsegundo e meio antes de o engenho espacial Ranger se haveresmagado contra o solo lunar. A seta assinala o ponto onde sedeu a colisão. A segunda fase da exploração lunar iniciou-se com os voosda Surveyor, a qual, ao contrário do engenho Ranger, estavaequipada com retrofoguetões destinados a afrouxar a suadescida para a Lua. Deste modo, puderam depositar-se no sololunar câmaras e outros instrumentos, que começaram a operarsob controlo rádio. As ulteriores sondas Surveyortransportaram instrumentos destinados a efectuar uma análisequímica do solo lunar, assim como a análise da sua resistênciae composição, como parte dos preparativos para a alunagem denaves tripuladas.

A rocha lunar que vemos em baixo foi fotografada de muitoperto por uma câmara instalada numa sonda Surveyor. A rocha,

que tem 38 centímetros de comprimento, encontra-separcialmente encoberta por uma fina camada de escombrospulverizados resultantes das colisões de meteoritos ocorridosao longo de milhões de anos.

a primeira alunagem. O "Eagle" pousou no mar daTranquilidade às 21 h 18 m do dia 20 de Julho de 1969. Asfotografias da página anterior, tiradas por Armstrong, mostramAldrin saindo da nave espacial trinta minutos após a alunagem.Aldrin parece descer a escada planando, dado que a força dagravidade na Lua é seis vezes menor do que na Terra. A reduzida força da gravidade lunar explica igualmente asurpreendente inclinação dos astronautas quando se deslocam nosolo lunar. O seu reduzido peso faz que seja menor a fricçãoentre as suas botas e o solo. A fim de conseguirem a fricçãonecessária a uma mudança de direção, vêem-se obrigados ainclinar-se na direção em que pretendem avançar e a fincar asbotas no solo num ângulo exagerado.

"A Superfície apresenta-se coberta de um pó fino", observouArmstrong. "Posso apanhá-la sem esforço com a ponta da bota.Adere em finas camadas à sola e aos bordos das minhas botas,como pó de carvão. As marcas das minhas botas terão apenas umou dois centímetros de profundidade, mas posso perfeitamentever as minhas pegadas como se as imprimisse em areia fina." Asbotas de Armstrong penetraram no solo lunar até profundidadesde dezoito centímetros em alguns pontos. A pegada deixada porArmstrong (fotografia de baixo) manter-se-á perfeitamentevisível durante um milhão de anos.

A POEIRA LUNAR. Uma das surpresas da alunagem proveio daanálise microscópica da poeira lunar. Parte substancial daspartículas de poeira consistia em minúsculas esferas de vidro,cuja formação, segundo se presume, resultou do impacte demeteoritos que provocaram a fusão de uma parte do solo lunar edisseminaram um cachão de pequenas gotas fundidas. Dado o seuminúsculo tamanho - o diâmetro não vai além de algumasmilésimas de centímetro -, essas partículas arrefeceramrapidamente e tomaram a forma de esferas vitrificadas. Afotografia de uma amostra de poeira lunar (em baixo), ampliadacem vezes, revela diversas esferas de vidro misturadas comfragmentos irregulares da rocha lunar. A existência destes "berlindes" justifica o comentário deArmstrong, recebido da base da Tranquilidade: "Estas rochassão bastante escorregadias." Sem o saber, Armstrong patinavasobre rolamentos de esferas.

MINICRATERAS. A maior parte das rochas que compõem a baseda Tranquilidade encontram-se crivadas de pequenas crateras,

cujo diâmetro varia entre 2 milímetros e 2 decimilímetros. Nafotografia acima vemos uma destas crateras ampliada mil vezes;estas crateras resultam da colisão de minúsculos meteoritos,mais pequenos do que cabeças de alfinetes. Estas partículascolidem com a superfície da Lua a velocidades que atingem os160.000 quilômetros por hora, libertando mais energia do queuma explosão da mesma massa de TNT. São bilhões as partículasdesta envergadura que penetram diariamente na atmosfera daTerra; no entanto, consomem-se devido 3 fricção antes deatingirem o solo. Quando se desintegram na atmosfera, deixamatrás de si rastos incandescentes de rocha vaporizadaconhecidos pelo nome de "estrelas cadentes".

102 uma paisagem típica dos mares lunares.a maior parte da superfície lunar apresenta o mesmo aspectoque esta extensão monótona, crivada de pequenas crateras epejada de fragmentos de rochas. a fina camada de pó que cobreo solo lunar apresenta os efeitos de duas horas deexplorações. a paisagem lunar é acrómica: os astronautascomentaram de uma maneira geral que o tom uniforme era umcinzento-escuro, vagamente aligeirado por uma tonalidade maisquente. mas os astronautas ficaram fascinados com oscontrastes de luz e sombra que a ausência de atmosfera permiteadmirar em toda a sua crueza. "tudo tem uma beleza agreste,muito própria. faz-nos lembrar as regiões desérticas dosestados unidos", comentou armstrong. aldrin, que vemos na fotografia, ocupa-se da instalação dodispositivo destinado a captar partículas do vento solar: afolha de alumínio que está a instalar destina-se a reterpartículas que, em deslocação muito rápida, são emitidas dasuperfície solar. devido à sua grande velocidade, penetram nascamadas superficiais da folha e aí ficam retidas. a folha édepois enrolada como um estore, transportada para a terra eaquecida num laboratório, a fim de se libertarem aspartículas alojadas. esta experiência forneceu informaçõesdirectas acerca dos elementos químicos do sol.

104 provas a favor de uma lua quente. Os resultados obtidos coma exploração da Apollo 11 vieram, segundo tudo leva a crer,confirmar os indícios de actividade vulcânica observados emfotografias da superfície lunar. Verificou-se que certasrochas lunares se assemelham, pela sua estrutura porosa ecomposição química, à lava terrestre. A fotografia de baixoexibe uma dessas rochas lunares, porosas e semelhantes à lava,recolhidas na base da Tranquilidade.

Estas provas de actividade vulcânica na Lua vieramcorroborar os cientistas que defendem a teoria de uma "Luaquente", segundo a qual o estado de fusão em que se encontravao interior da Lua num dado momento passado desencadeou vastaserupções vulcânicas que inundaram a superfície lunar comsucessivas camadas de lava fresca, apagando deste modo osvestígios do seu passado.

a existência de vulcanismo lunar é igualmente sugerida pelafalha de Hyginus, gigantesca fenda cavada na superfície lunar(à direita), com a largura aproximada de 3 quilômetros e ocomprimento de cerca de 160 quilômetros. A área demarcada abranco, reproduzida (em baixo, à direita) numa perspectivafrontal, revela a existência de uma série de crateras nointerior da fenda, distribuídas por quase todo o seucomprimento. Estas crateras não podem ser resultantes decolisões de meteoritos, os quais teriam originado umadistribuição irregular de crateras por toda a área. Ascrateras da falha de Hyginus deverão ser de origem vulcânica eé possível que toda esta fenda seja a manifestação superficialde uma ruptura verificada no interior do corpo da Lua.

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provas a favor de uma lua fria. os astronautas da apollo 12instalaram uma estação científica que funcionou, comandada adistância, durante mais de um ano. desta estação lunar faziaparte um sismógrafo destinado a medir a actividade sísmica dalua e que revelou que os sismos que aí se verificam são emfrequência muito menor do que na terra. conclui-se deste factoque a maior parte da lua se encontra actualmente fria eestável. Um segundo instrumento, destinado a medir o magnetismolunar, veio igualmente corroborar a teoria da "lua fria".Observaram-se variações magnéticas quando a superfície lunarera varrida por partículas provenientes do Sol. Estasvariações dependem da resistência elétrica das rochaslunares, a qual depende, por sua vez, da temperatura que reinano interior da Lua. Os dados denotam uma resistência elétricaelevada e, por conseguinte, uma Lua fria. Deste modo, acontradição com os dados em favor de uma Lua quente não foiainda resolvida. Adianta-se, entretanto, a explicação de que aLua foi quente durante um breve lapso na sua juventude, vindodepois a arrefecer rapidamente, o que fez que se transformassea partir de então num planeta geologicamente inerte.

108 as terras altas lunares, que constituem uma regiãoirregular e abundantemente cravejada de crateras (em cima),são mais antigas do que os mares lunares. Apresentam o aspectoda superfície original da Lua logo após a sua formação - uma

"terra de ninguém" pejada de blocos rochosos e de crateras,que nunca entrou em fusão desde o começo do tempo no Sistemasolar. Estas elevações, que constituíram o objectivo dasApollo 15 e 16, não foram incluídas nos locais de alunagem dasprimeiras explorações, dado que constituem um terreno muitoacidentado. A fotografia da "linha da costa" do oceano das Tempestades(à direita) põe em evidência uma das razões por que seconsideram mais antigas as terras altas. A superfície niveladado oceano das Tempestades bordeja as montanhas adjacentes e dáa impressão de encher uma bacia situada no terreno rochoso deque se formaram as montanhas. Segundo se presume, estas jáexistiam quando o impacte provocado pela queda de um meteoritogigante deu origem à bacia. Posteriormente, acumulou-se lavana bacia, exactamente como as águas ocuparam as baciasnaturais da crosta terrestre. esta conclusão é reforçada pelofacto de as terras altas terem uma maior densidade de crateras do que os mares, o que indica terem sido bombardeadaspor meteorólitos durante um período mais longo.

8. Vénus, Marte e Júpiter

Nove planetas giram à volta do Sol. Seis destes - Mercúrio,Vénus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno - eram conhecidos pelosAntigos, enquanto três - Urano, Neptuno e Plutão - foramdescobertos nos tempos modernos. Dos nove planetas, Mercúrio éo que se encontra mais próximo do Sol. É um planeta pequeno,menos de metade do tamanho da Terra e ligeiramente maior doque a Lua. A superfície rochosa e estéril, alternadamentequeimada no lado virado para o Sol e gelada no lado distantedeste, é extremamente inóspita para a criação de vida (1). Éum planeta difícil de ser alcançado por um foguetão lançado daTerra devido à sua proximidade do Sol, e nos muitos anos quese seguirão é pouco provável que aprendamos mais sobre ele doque aquilo que sabemos. Afastando-nos do Sol, para além de Mercúrio, chegamos aVénus. Vénus é o vizinho planetário mais próximo da Terra. Étambém o nosso planeta-irmão extremamente semelhante à Terraquanto ao tamanho e ao peso, e a distância a que se encontrado Sol não é muito diferente A superfície de Vénus estácompletamente coberta de nuvens, e as condições neste planetatêm constituído sempre um enigma, se bem que tivesse brilhadouma esperança romântica de que sob estas nuvens existissem

abundantes manifestações de flora e fauna. Em 1686 DeFontenelle, no seu livro Debate sobre a Pluralidade dosMundos, descreveu as características que esperava encontrarnos habitantes de Vénus: "Posso dizer daqui... como são os habitantes de Vénus:assemelham-se aos Mouros de Granada, pequeno povo negro,queimado pelo sol, cheio de ardor e vivacidade de espírito,sempre apaixonado, dedicado à poesia, amante de música,preparando todos os dias festas, danças e competições." Na verdade, Vénus deveria proporcionar um clima ainda maisagradável para os seres vivos do que a Terra. O planeta está a108 milhões de quilômetros do Sol, enquanto a distância daTerra é de 149 milhões de quilômetros. Como está mais perto,Vénus, em relação à Terra, recebe o dobro da intensidade daluz solar; e, embora o manto carregado de nuvens afaste algumadesta energia solar, podemos fazer ainda a estimativa de queem Vénus a temperatura média, à latitude de Londres, seria deuns agradáveis 26,7 graus centígrados, ou aproximadamente omesmo que as temperaturas amenas das ilhas do mar dasCaraíbas. Mas há doze anos atrás descobriu-se que de maneira nenhumaisto é assim. O clima de Vénus, longe de ser ameno, parece sermuito desagradável e de uma maneira tal que desanima qualquerpossível esperança de encontrar vida na superfície do planeta.A partir de medições da intensidade da radiação emitida porVénus deduziu-se que a temperatura da superfície é deautêntica fornalha: 425 graus centígrados, muito acima doponto de fusão do chumbo. É certo que nenhum ser, ainda queremotamente com características semelhantes às da vidaterrestre, poderia sobreviver a tal calor. Contudo, ainda se alimentou a esperança de descobrir ummundo verdejante em Vénus. Alguns astrônomos argumentaram quea intensa radiação poderia provir da atmosfera de Vénus e nãoda sua superfície. Outros sugeriram que a vida poderia vingarnos pólos norte e sul, os quais deveriam ser mais frios. Em 1967, naves espaciais russa e americana chegaram aoplaneta e procederam a medições que desvaneceram o últimorasto de dúvida em relação à elevada temperatura dasuperfície. Lançadas em Junho de 1967, com dois dias deintervalo uma da outra, a nave espacial russa Vénus 4 e a naveespacial americana Mariner 5 fizeram órbitas elípticas decerca de 300 milhões de quilômetros e chegaram às proximidadesdo planeta quatro meses depois. As histórias das navesespaciais divergiam à medida que se aproximavam de Vénus. A sonda Mariner 5, nas proximidades de Vénus, devido àgravitação do planeta, descreveu uma trajectória curvilínea,sobrevoando parte do hemisfério obscuro, passando depois aparte iluminada, e afastando-se em seguida para o Espaço.Vénus 4, dirigindo-se directamente para o planeta num rumo decolisão, ejectou uma cápsula que desceu em pára-quedas pertodo equador, radiocomunicando informações à medida que descia,numa proeza extraordinária de exploração planetária.

As duas naves espaciais mediram a temperatura segundodiferentes processos, mas os dados conduziram à mesmaconclusão. Dois voos seguintes realizados em 1969 por navessemelhantes - Venera 5 e 6 - forneceram confirmação adicional.Vénus é, na verdade, suficientemente quente para derreterchumbo, e não há qualquer probabilidade racional de encontrarvida na sua superfície. Por que razão é Vénus tão quente? As naves espaciais russae americana procederam a outras medições que revelaram aresposta à pergunta. De acordo com as informaçõesradiotransmitidas das naves para a Terra, a atmosfera de Vénusé constituída essencialmente por uma camada pesada de gáscarbónico, cerca de 10.000 vezes superior à quantidade existente na atmosfera terrestre. A atmosfera densa de gáscarbónico actua como um revestimento isolador que veda o calordo planeta, evitando que aquele se escape para o Espaço. Ocalor encerrado nesta armadilha provoca na superfície umaelevação de temperatura muitíssimo grande que, de outro modo,não existiria. Cálculos baseados nas propriedades isoladorasdo gás carbónico mostram que a temperatura de Vénus poderiafacilmente atingir os 425 graus, como resultado deste efeito(2). Para além dos aparelhos para medir a temperatura, a naveespacial Vénus 4 transportava também instrumentos concebidospara detectar água. Estes indicaram a presença de uma razoávelquantidade de vapor de água na atmosfera - suficiente, seliquefeito, para cobrir a superfície de Vénus com umaespessura de 30 centímetros. Constitui um grande quebra-cabeças para os estudiosos dosplanetas o facto de não se ter encontrado mais água. De acordocom opiniões correntes sobre a origem dos planetas, Vénus e aTerra foram condensados a partir das mesmas matérias, contendoquantidades semelhantes de água. Durante a condensação ficouencerrada água, como que numa armadilha, no interior da Terra.Mais tarde, esta água encerrada veio à superfície, escapou-sepelas fendas da crosta e foi encher os oceanos. A água dosoceanos da Terra, se se espalhasse uniformemente pelasuperfície do planeta, formaria uma camada de cerca de 2500metros de profundidade Uma camada de água com aproximadamentea mesma altura deveria também existir em Vénus. Devido àelevada temperatura na superfície de Vénus, a água deveriaexistir na atmosfera, não sob a forma liquida mas sob a formade vapor. Vénus 4 mostrou que a maior parte desta água nãoexiste. Deste modo, segundo padrões terrestres, Vénus é um planetaseco, quente e com um meio ambiente não muito adequado aodesenvolvimento de vida. Por que razão dois planetas, provavelmente formados apartir de matérias semelhantes, situados relativamente à mesmadistância do Sol, evoluíram por caminhos diferentes? Por querazão é a superfície de Vénus queimada por um calor cáustico,enquanto a Terra viceja com um clima favorável a todas as

formas conhecidas de vida? A elevada temperatura de Vénus é explicada pela abundânciade dióxido de carbono na sua atmosfera, mas este gás deveriaser igualmente abundante na atmosfera terrestre. Quandocompreendermos por que existe menos gás carbónico na Terra doque em Vénus, também compreenderemos as diferenças de clima.Até certo ponto, a explicação deve estar relacionada com apresença de vida na Terra. Presentemente, muito do gáscarbónico da atmosfera terrestre é removido por animaismarinhos que o absorvem na água do mar e cujos organismos otransformam em substâncias sólidas conhecidas por carbonatos.As conchas do mar, por exemplo, são carbonato de cálcio quasepuro. Hoje as zonas superiores da crusta terrestre contêm umaespessa camada de carbonato, formada por conchas comprimidasde um sem-número de moluscos e crustáceos que morreram hámuito tempo; e encerrado nestes carbonatos encontra-se umagrande parte do dióxido de carbono que, de outro modo,tornaria abrasadora a nossa atmosfera, como cresta a atmosferado nosso planeta vizinho menos afortunado. Quando a Terra era nova, a vida ou não existia, ouescasseava, e o gás carbónico não pôde ter sido removido poreste processo. Mas o gás, todavia, poderia Ter sido absorvidoda atmosfera da jovem Terra por outras transformações químicasque não envolvessem seres vivos. Nestas reacções, o gáscarbónico atmosférico combina-se com rochas, formandocarbonatos, um tanto à semelhança do oxigênio da atmosfera,que, combinado com o ferro, forma ferrugem. Contudo, taisreacções não se efectuam a um ritmo apreciável se as rochas àsuperfície do planeta estiverem quentes e secas. Portantoestas não podem ocorrer em Vénus. Por outras palavras, o gás carbónico é removido daatmosfera terrestre segundo vários processos, mas não pode serremovido, de modo algum, da atmosfera de Vénus. Écompreensível que agora Vénus tenha uma grande abundânciadeste gás na atmosfera. A actual concentração de gás carbónico em Vénus deve ter-seprocessado lentamente na atmosfera durante centenas de milhõesde anos. Porque é que a vida não se desenvolveu neste períodoinicial, antes de se ter acumulado demasiado gás nocivo eisolador térmico? Se alguma vez a vida se tivesse espalhado emVénus, a sua capacidade para absorver gás carbónico permitiriadepois manter este planeta confortável para sempre. A respostadeve estar relacionada com o facto de Vénus se encontrar maisperto do Sol e de ter sido mais quente do que a Terra noprincípio. Devido às temperaturas mais elevadas na superfície,as rochas em Vénus não absorveram tão rapidamente como asrochas da Terra o gás carbónico que se acumulava lentamente. Aconcentração de gás aumentou, retendo o calor do planeta etornando a superfície ainda mais quente, até que finalmente ascondições necessárias para o desenvolvimento da vida foramdefinitivamente destruídas. Com a ausência de vida, necessáriapara o absorver, o gás continuou a acumular-se

irreprimivelmente na atmosfera. Assim foi iniciada uma cadeiade acontecimentos que conduziu às actuais condiçõessemelhantes a uma fornalha. A que distância do Sol deve estar um planeta a fim demanter uma temperatura agradável? Por enquanto, ainda nãosabemos; os resultados das naves espaciais somente nos dizemque Vénus se encontrava demasiado perto, e isso foi a suadesgraça. Só que, se estivesse uns quantos milhões dequilômetros mais longe, a temperatura da superfície poderiater subido lentamente, o suficiente para permitir um pequenoponto de apoio à vida; e, desde que a vida começasse, estateria evitado a abundância de gás carbónico e,Subseqüentemente, impedido a temperatura de subir sem freio.Tendo perdido a oportunidade de albergar a vida na altura emque o sistema solar se formou, Vénus nunca mais pôdereencontrá-la. Para além de Vénus e da Terra situa-se o planeta Marte.Marte gira à volta do Sol a uma distância média de 228 milhõesde quilômetros, uma vez e meia mais distante do que a Terra. Adensidade de Marte, como a de Vénus, é aproximadamente a mesmada densidade das rochas que estão na superfície da Terra; poresta razão crê-se que Marte é composto de matérias rochosassemelhantes às do nosso planeta. A atmosfera de Marte ébastante rarefeita, talvez um centésimo da densidade daatmosfera da Terra. Em Marte, ao contrário de Vénus, sóexistem vestígios de nuvens, e os caracteres da superfíciemarciana não são consideravelmente obscurecidos por estas.Notam-se, ocasionalmente, tempestades de poeira e nevoeiro,mas a maior parte do tempo a superfície do planeta permite aobservação fotográfica. Apesar da rarefacção do ar de Marte, é impossível obterboas fotografias deste planeta tiradas da Terra comtelescópios devido à agitação constante que a atmosferaterrestre provoca nos raios de luz que chegam até nós. Os maispequenos pormenores visíveis à superfície de Marte através dosmelhores telescópios têm ainda dimensões da ordem dos 80quilômetros de diâmetro (3). é impossível sabermos da Terra seMarte tem montanhas, fundos oceânicos ou quaisquercaracterísticas que possam indicar a presença de vida. Mariner 6 e 7 tiraram muito melhores fotografias de Marte,em 1969, quando estas naves espaciais passaram velozmente peloplaneta a uma distância de alguns milhares de quilômetros. Asfotografias mais nítidas das Mariner revelaram pequenospormenores de 30 metros de largura. Mostram-nos que asuperfície de Marte é assinalada por um grande número decrateras, provavelmente formadas por colisões de meteoritos.Há relativamente menos crateras do que na Lua, mas muitas maisdo que na Terra. As fotografias das Mariner sugerem que Marte, como corpoplanetário, se situa num ponto intermediário entre a Lua e aTerra, sendo a superfície mais velha e mais bem preservada doque a superfície da Terra, mas não tão bem preservada como a

superfície da Lua. Os factores que tornam Marte maisprometedor do que a Lua como habitat para a vida e para oHomem - a atmosfera pouco densa mas apreciável e vestígios dehumidade - diminuíram de valor como uma fonte de indícios paraa história primitiva do sistema solar (4). Encontrar-se-á vida em Marte? É possível. Experiênciaslaboratoriais mostraram-nos que as plantas podem existir noclima seco, frio e escasso em oxigênio de Marte. Nestasexperiências, algumas plantas expostas a um clima marcianosimulado definharam depois de um mês, mas em seu lugarnasceram novos rebentos. Outras plantas foram lesadas massobreviveram. Uma vez que as plantas da Terra sobrevivem mal num ambientemarciano mas não florescem lá, parece que o povoamento vegetalem Marte, se por acaso existir, deve ser atrofiado einsuficiente. Contudo, temos de contar com o facto de que, seexiste vida em Marte, esta deve ter evoluído durante um tempoem que houve uma abundância de água na superfície (5). Osseres vivos podem evoluir de partículas moleculares sem vidasó no caso em que tais partículas sejam dissolvidas numfornecimento vasto de água, no qual se possam mover livrementee colidir muitas vezes umas com as outras. As colisõesrepetidas entre moléculas vizinhas são essenciais para areunião de grandes moléculas de vida - proteínas e ADN - apartir de outras mais pequenas. Marte pode ser inanimado; masse a vida existir lá é provável que provenha de uma idade deouro do planeta em que o seu clima rivalizou com o da Terra. Se a transição para o clima seco actual tivesse ocorridolentamente, durante um período de milhões de anos e de igualnúmero de gerações, a vida em Marte poder-se-ia ter adaptadoprogressivamente ao gradual começo de condições severas.Durante este extenso período, os seres mais fracos em cadageração seriam eliminados e os mais fortes permaneceriam,propagando as qualidades de força aos descendentes. Parece nãohaver qualquer razão para duvidar de que hoje poderiam existirem Marte formas variadas e interessantes como um resultadodeste longo e continuado processo de selecção natural, se noplaneta já alguma vez tivesse existido água. Os organismos marcianos, altamente adaptados parasobreviverem num planeta quase desprovido de água e de ar,apresentariam sem dúvida uma aparência invulgar; as suasformas, disposições interiores e métodos de reproduçãopoderiam parecer bizarros; as diferenças fundamentais entreplantas e animais, como nós os conhecemos, podiam serconfusas. Porém, esta vida extraterrestre ensinar-nos-ia muitoquanto à natureza da vida na Terra, pois a química básica davida marciana - produto de uma linha diferente de evolução, eadaptada a condições marcadamente diferentes - não seria,provavelmente, idêntica à química da vida terrestre. Dacomparação entre as duas estruturas de vida, paralelas masdistintas, adquiriríamos conhecimentos quanto ao metabolismode todos os seres vivos, inclusive do Homem, que seriam

impossíveis de adquirir durante décadas de investigaçãolaboratorial na Terra. Nos campos da Medicina e da Biologiaesta perspectiva sobressai como a maior contribuição potencialda exploração planetária. Há um significado mais vasto no que se relaciona com aprocura de vida em Marte. O Sol é uma dos 100 mil milhões deestrelas pertencentes ao aglomerado a que chamamos a nossaGaláxia. De acordo com a melhor prova, muitas senão quase atotalidade destas estrelas estão rodeadas por famílias deplanetas. Estão hoje ao alcance de grandes telescópios dez milmilhões de outras galáxias, cada uma com cem mil milhões deestrelas - e provavelmente de planetas. Talvez somente umapequena fracção destes sejam planetas semelhantes à Terra, masisto poderia significar, só na nossa Galáxia, milhões deplanetas semelhantes à Terra. É possível que todos osplanetas semelhantes à Terra, excepto a própria Terra, sejamcorpos de rocha estéreis. Contudo, se a vida surgiuespontaneamente na Terra, ela poderia aparecer noutra parte.Qual é a probabilidade deste acontecimento? Se for tão baixacomo uma num bilião nós estamos sozinhos neste canto douniverso. Se for tão elevada como uma em dez, ou uma em cem,os planetas habitados devem existir em toda a parte, e asexperiências mais extraordinárias do Homo sapiens ainda seencontram distantes. Marte oferece a melhor esperança de responder a estapergunta. No sistema solar ele é um dos dois planetassemelhantes à Terra que podem, de maneira concebível, manter avida. Sabemos que num destes - na Terra - a vida, de facto, sedesenvolveu. Talvez seja um acidente único, mas é improvávelque dois acidentes deste género tenham ocorrido num sistemasolar. Se a vida - ou restos de vida -forem descobertos emMarte, seremos forçados a concluir que o desenvolvimento davida a partir do inanimado é um acidente não raro mas umacontecimento relativamente provável. Não se pode imaginar umadescoberta cientifica mais significativa para a Humanidade. A procura de vida em Marte já começou. Os seres vivos traema sua existência devido a transformações químicas que produzemno ambiente, que podem ser detectadas por meio de aparelhoscomandados à distância. Em 1969 as duas naves espaciaisMariner voaram a uma distância de alguns milhares dequilômetros do planeta, munidas de aparelhos capazes dedetectar alguns dos produtos químicos associados com a vida.Um destes instrumentos mediu a radiação infravermelha numazona de comprimento de ondas onde o gás metano tem faixas deabsorção que o caracterizam. O metano liberta-se de vegetaçãoem decomposição, mas, sendo relativamente instável, nãopermanece muito tempo na atmosfera a não ser que existamplantas para renovarem continuamente o seu fornecimento. Não foi detectado metano, resultado negativo que pareceapagar as esperanças de encontrarmos vida em Marte. Porém,esta conclusão seria prematura, uma vez que os aparelhos, nãose aproximando mais da superfície de Marte do que 2800

quilômetros, não poderiam detectar estes gases caso existissemem quantidades extremamente pequenas. O limite dasensibilidade dos aparelhos correspondeu à concentração de umafracção por milhão de metano, que é aproximadamente a mesmaque a concentração do metano na atmosfera da Terra. Destemodo, poderia existir uma flora em Marte e ser quase tãoabundante como a vegetação na superfície da Terra, e ter,mesmo assim, escapado à detecção nesta experiência. Um outro aparelho da Mariner, concebido para a detecção donitrogênio, forneceu um segundo teste para a vida em Marte. Onitrogênio, tal como o metano, é um produto do ciclo decrescimento e decomposição dos organismos vivos. O aparelhonão conseguiu indicar a presença do gás em causa. Contudo, amenor quantidade de nitrogênio que os aparelhos da Marinerconseguiram detectar é aproximadamente igual à quantidade denitrogênio de origem biológica da atmosfera terrestre (6).Como no caso da experiência do metano, também esta não excluia presença de vida em Marte. Simplesmente indica que a vidanão pode ser tão abundante como, ou mais abundante do que, avida na Terra. Para além de Marte, há uma grande lacuna na distribuiçãodos planetas. Podíamos esperar encontrar um corpo planetáriolocalizado fora da órbita de Marte, a uma distância três vezesmaior do que a distância da Terra ao Sol; mas em seu lugarencontramos apenas um grande número de corpos pequenos -planetóides - girando em anel. São os chamados asteróides.Ocasionalmente, as colisões entre estes corpos, ou talvez agravitação de Júpiter, o planeta a seguir a Marte, atrairá umdeles para fora da sua órbita e para um rumo que conduzirá àcolisão com a Terra. Crê-se que muitos, senão todos, osmeteoritos que atingem a Terra têm esta origem. Observaçõesfeitas em meteoritos que sobreviveram à passagem abrasadoraatravés da atmosfera terrestre revelam que são bocados derocha e ferro com uma história química e física bastantecomplexa. Muitos deles parece terem sido desintegrados numacerta altura da sua história primitiva e novamente tornadoscompactos na sua actual forma. Todos estes testemunhos sugeremque poderia ter existido em tempos um grupo de planetóides detamanho considerável em órbita entre Marte e Júpiter. Porqualquer razão, estes planetóides não alcançaram a fasedefinitiva de acumulação para formar um corpo planetário, comofizeram os outros corpos no sistema solar; ou, se o fizeram,foram novamente desintegrados numa catástrofe posterior. Cinco planetas situam-se fora da órbita dos asteróides. Sãoos planetas gigantes - Júpiter, Saturno, Urano e Neptuno - e oplaneta pequeno - Plutão. Plutão foi descoberto em 1930, o nono e último planeta dosistema solar a ser descoberto. A órbita está mais afastada doSol do que a de qualquer outro planeta e provavelmente marca afronteira externa do sistema solar. Devido à grande distânciaa que se encontra Plutão, pouco sabemos dele, a não ser queparece ser um corpo semelhante à Terra em tamanho e

composição. Deve ser um mundo gelado e silencioso, demasiadofrio para favorecer qualquer forma de vida. Sabemos mais sobre os planetas gigantes, Sãoaproximadamente dez vezes maiores do que a Terra e de massacem vezes maior, mas de densidade consideravelmente maisbaixa. Em geral, a sua densidade é mais ou menos a mesma que ada água; de facto, Saturno é menos denso do que a água;flutuaria numa banheira se o pudéssemos introduzir nela. Os planetas gigantes são menos densos do que a Terra e doque os planetas vizinhos, pois em grande parte são formadospor elementos mais leves, hidrogênio e hélio. Estes elementosperfazem a maior parte da matéria do Universo; tambémconstituem a maior parte da matéria do Sol e dos planetasgigantes; mas, por qualquer razão que não se compreende bem,estes elementos não se encontram na Terra nem nos planetasinteriores. Talvez as partículas e a radiação emitidas do Solnos anos primitivos tenham expelido o hidrogênio e o hélio daszonas internas do sistema solar, a partir das quais a Terrafoi formada, enquanto as regiões externas, das quais seformaram os planetas gigantes, estavam demasiadamente longepara serem afectadas por esta acção explosiva. Júpiter é o maior dos planetas gigantes e o de maior massado sistema solar. É 11 vezes maior do que a Terra e 318 vezesmais pesado. Num planeta tão grande (7) como Júpiter, a forçada gravidade é tal que a maioria dos gases da atmosferaprimitiva do planeta permanecerão nela durante a sua vida. Nemsequer os gases mais leves, hidrogênio e hélio, podem escapar.A atmosfera de Júpiter contém destes gases em abundância, etambém contém os gases que são compostos vulgares dehidrogênio. Estes compostos - amoníaco, metano e vapor de água- existiam em grande quantidade na primitiva atmosfera daTerra, e crê-se que desempenharam um papel primordial nosacontecimentos que levaram ao desenvolvimento da vida no nossoplaneta. A sua importância na evolução da Terra terminou, e hámuito que se escoaram, mas a sua presença constante em Júpiterleva-nos a sentir curiosidade de saber se não teriam ocorridopelo menos os primeiros passos do caminho para a vida naqueleplaneta. A princípio isto parece pouco provável, porqueJúpiter está a cerca de 780 milhões de quilômetros do Sol e 5vezes tão distante como a Terra, e recebe muito pouco calorsolar. A temperatura devia ser bastante baixa, provavelmentedemasiado baixa para permitir as reacções químicas necessáriasà vida. Há, porém, um raio de esperança nesta situação. Atemperatura de Júpiter é de uns frígidos - 140 grauscentígrados, mas esta é a temperatura ao nível das nuvens quecobrem a superfície do planeta. As condições abaixo das nuvensestão ocultas à nossa vista. Mas por baixo das nuvens, eaproximando-se da superfície do planeta, a temperatura deveser consideravelmente mais elevada. Isto acontece na Terra,onde a temperatura do ar junto ao solo foi elevada por meio daabsorção da energia proveniente do Sol. Por exemplo, a

temperatura mínima à altitude de um jacto voando acima dasnuvens, a 10.000 metros, é normalmente de - 50 grauscentígrados. Não sabemos se Júpiter tem uma superfície bemdefinida ou uma atmosfera que se torna constantemente maisdensa até que passa imperceptivelmente ao estado líquido; comou sem superfície, porém, com certeza que Júpiter tem umaregião, a alguma profundidade abaixo das nuvens, na qual atemperatura passe por uma variação agradável própria para odesenvolvimento e manutenção da vida. Nesta região existirãogases a partir dos quais se acredita que a vida, nos seusprimeiros anos, tenha evoluído na Terra. Talvez se tenhatambém desenvolvido um género de vida em Júpiter. Não poderiaser a vida em que se respira oxigênio a que estamosacostumados: supomos que seria muito diferente; só teremosconhecimento quando - talvez ao virar do século - navesespaciais, complexamente aparelhadas, fizerem a viageminaugural ao planeta gigante e completarem a longa viagem deregresso à Terra.

\\ (1) Parece que se torna evidente que é impossível, a quemquer que seja, fazer previsões mesmo a médio prazo, emqualquer campo de ciência. Que pensará o autor observando as maravilhosas fotografiasde Mercúrio tiradas este ano pela Mariner 10? As imagenstransmitidas para a Terra mostram a superfície de Mercúriocrivada de crateras, à semelhança da nossa Lua; os maispequenos pormenores dessas imagens representam no terrenosomente algumas centenas de metros. Por outro lado, a descrição do texto já não corresponde aoque na realidade acontece. Mercúrio não apresenta sempre amesma face virada ao Sol, o seu período de rotação é de cercade 59 dias, ou seja 2/3 do período de translação, todavia astemperaturas não deixam de ser muito elevadas pela vizinhançaem que se encontra do Sol. (N.T.) (2) A temperatura da Terra também seria insuportável seeste planeta fosse coberto por um revestimento de gáscarbónico tão denso como o existente em Vénus. (3) Uma nova série de sondas russas e americanas chegaram aVénus nos últimos tempos, pelo que estes dados já estãoincompletos. (N.T.) (4) Os resultados obtidos pela Mariner 9 alteraram estesprimeiros conhecimentos. (N.T.) (5) Não há nenhuma prova que exclua a possibilidade deMarte ter tido dias mais húmidos em tempos passados. Asfotografias das Mariner tiradas em 1969 não sãosuficientemente pormenorizadas ao ponto de revelarem vestígiossubtis de um período anterior de vasta erosão motivada pelachuva e pela água corrente. (6) Só uma pequena parte do nitrogênio da atmosferaterrestre se encontra associado com a vida; 99,99 por centoprovem do interior do planeta sob a forma de gases vulcânicos,

e existiria na atmosfera ainda que a Terra fosse inanimada. (7) Um homem de tamanho médio pesaria cerca de 200 kg emJúpiter.

iiiii o sol e os planetas: tamanhos comparados.O sol e os planetas, dispostos segundo as respectivasdistâncias em relação ao centro do sistema solar, estão aquirepresentados em proporção aos seus tamanhos reais. o sol, comum diâmetro aproximado de um milhão e meio de quilômetros, é13 vezes maior do que júpiter, o planeta de maior envergadurado sistema solar. na escala deste desenho, somente uma pequenaparte da orla do sol se pode representar. os planetasinteriores -- mercúrio, vénus, terra e marte - são denominadosplanetas terrestres, porquanto se crê que são formados damesma mistura de materiais rochosos e metálicos (níquel eferro) que compõem o corpo da terra. a lua, pouco mais pequenado que o planeta mercúrio, é muitas vezes agrupada com osplanetas terrestres. júpiter, saturno, urano e neptuno recebem a designação deplanetas gigantes, dado que a sua massa é aproximadamente 100a 300 vezes maior e o seu diâmetro 5 a 10 vezes maior do que odos planetas terrestres. na constituição dos planetas gigantespredominam os elementos mais leves: hidrogênio e hélio, comuma escassa percentagem dos materiais rochosos e ferrosos quecompõem a maior parte da massa da terra e dos restantesplanetas terrestres. plutão, o planeta mais afastado do centro do sistema solar,tem provavelmente uma envergadura e composição semelhantes àsdos planetas terrestres. trata-se de um mundo gelado,certamente inerte, que gira em volta do sol a uma distância decerca de 6 mil e 500 milhões de quilômetros.

vénus, planeta-irmão da terra. Vénus quase se equipara à Terraem tamanho e peso. Descreve a sua órbita em torno do Sol nointerior da órbita da Terra (esquerda), completando umarevolução em 226 dias terrestres. Até há pouco tempopensava-se que Vénus oferecia um clima ameno e agradável àvida. à medida que Vénus gira em torno do Sol, passa por fasesidênticas às da Lua, como podemos ver na fotografia de cima,tirada com o telescópio de 36 polegadas (91,44 cm) do LowellObservatory. Na fase da "Vénus cheia" (1), o planetaencontra-se em relação à Terra no lado oposto do Sistema Solare apresenta-se ao nosso planeta perfeitamente iluminado peloSol. Na fase da "meia Vénus" (2), o planeta completou um

quarto da sua órbita em direção à Terra. A "Vénus nova" (3)encontra-se do mesmo lado do Sol que a Terra; dado que sesitua directamente entre esta e o Sol, torna-se quaseinvisível, se bem que seja este o momento em que se encontra àmenor distância da Terra e o seu diâmetro aparente atinge ovalor máximo. Vénus encontra-se permanentemente envolta por uma densacamada de nuvens. Ainda que se possam verificar brechas nesteinvólucro, os nossos telescópios não conseguem avistá-las emconsequência da atmosfera terrestre, que turva e obscurecetodos os objectos ou áreas que tenham uma largura inferior a80 quilômetros. Os pormenores da superfície de Vénuscontinuarão envoltos em mistério enquanto o planeta não forfotografado por um engenho espacial que passe perto dele.

exploração de vénus por meio de naves espaciais. A naveespacial russa Vénus 4 (em baixo) e o engenho americanoMariner 5 (à direita) foram lançados em direção a Vénus, comum intervalo de dois dias, em Junho de 1967, tendo chegado àsproximidades do planeta quatro meses mais tarde, após viagensde cerca de 350 milhões de quilômetros. A Mariner 5 descreveuvárias órbitas em volta de Vénus antes de prosseguir a suarota em torno do Sol. Precisamente nos momentos queantecederam o desaparecimento da Mariner 5 por detrás de Vénuse logo após a sua saída da sombra projectada pelo planeta, ossinais rádio emitidos pela nave espacial exploraram aatmosfera de Vénus, antes de atingirem a Terra. Os cientistaspuderam então, a partir da Terra, determinar a pressãoatmosférica e a temperatura junto da superfície do planeta. A Vénus 4, por sua vez, dirigiu-se para o lado nãoiluminado do planeta e esmagou-se contra a sua superfície, numponto perto do equador. Quando a Vénus 4 penetrou naatmosfera, uma sonda separou-se da nave principal e pousousuavemente na superfície de Vénus depois de uma descida empára-quedas, durante a qual emitiu informações sobre ascondições atmosféricas do planeta. A fotografia do fundo dapágina mostra-nos esta sonda, algures no território da URRS,depois de um ensaio dos seus pára-quedas. Desconhecem-se os pormenores de construção da nave espacialrussa; em contrapartida, podemos observar a nave Mariner nafotografia da direita. Os instrumentos científicosencontram-se alojados em oito compartimentos que constituem ocorpo da nave espacial (1). Uma antena em forma de calota (2)envia para a Terra o principal sinal rádio. A calota, que égiratória, pode ser orientada na direção da Terra por meio deum comando rádio. As quatro pás (3), que conferem à nave umaspecto de moinho de vento, constituem painéis solaresprovidos de células fotoelétricas, as quais transformam a luzsolar em electricidade, fornecendo uma potência de 550 watts.A nave tem 2,50 m de comprimento.Os resultados obtidos tanto pelos cientistas russos como pelos

americanos confirmam que a temperatura da superfície de Vénusatinge os 426 graus centígrados. A esta temperatura, o chumbofunde-se e tornam-se impossíveis todas as formas de vida quepodemos conceber. Estes resultados indicam ainda que aatmosfera de Vénus consiste sobretudo de dióxido de carbono,gás que é responsável pela fornalha que envolve o planeta, umavez que retém o calor junto ao solo de Vénus. A Terra possuíauma quantidade idêntica de dióxido de carbono, mas este gásfoi entretanto absorvido quimicamente pelas rochas eorganismos vivos. Se a Terra tivesse estado alguns milhões dequilômetros mais perto do Sol e, por conseguinte, submetida atemperaturas mais elevadas nos primórdios da sua existência,estas reacções químicas não teriam tido a mesma eficácia e onosso planeta ter-se-ia talvez transformado, à semelhança deVénus, num inferno inerte. As experiências conduzidas sobreVénus levam-nos a crer que os planetas com condiçõessemelhantes às da Terra e dotados de um clima favorável à vidasão mais raros do que se supunha.

fotografias de marte tiradas da terra e a mudança deestações. As fotografias da página seguinte revelam mudançasflagrantes, ocorridas durante o ano marciano, que seassemelham às estações do ano da Terra. As fotografias foramtiradas com um intervalo de quatro meses, em momentoscorrespondentes ao Outono (em cima, à direita) e ao Inverno(em baixo, à direita), no hemisfério meridional de Marte. Oque mais nos Prende a atenção nestas fotografias é aexistência de uma a calota polar", que se assemelha à camadade gelo e neve que recobre os pólos terrestres. O diâmetrodaquela calota polar oscila entre os 300 quilômetros(fotografia de cima) e os 3000 quilômetros (fotografia debaixo). Em consequência das medidas obtidas através da sondaMariner, admite-se de um modo geral que estas calotas polaressão constituídas mais por dióxido de carbono gelado, isto é,gelo seco, do que por água gelada. Certas áreas da superfície do planeta sofrem, segundo asestações, mudanças de cor - desde um castanho-amarelado a umverde-azulado -, fenómeno este que sugere a florescência de umrevestimento vegetal durante a Primavera marciana. As manchasescuras, por sua vez, desvanecem-se durante o Verão marciano.Estas variações, claramente visíveis nas fotografias da páginaseguinte, suscitam no entanto controvérsias quanto ao seusignificado. Alguns observadores pensam que essas variaçõesprovam a existência de vida vegetal em Marte, enquanto outrosafirmam que se trata de um cicio inanimado de reacçõesquímicas.

canais em marte. O astrónomo italiano Giovanni Schiaparellideclarou, em 1877, haver avistado uma rede de canais em Marte,o que foi posteriormente confirmado por outros astrônomos.Percival Lowell referiu-se a estes canais como se visse "fios

estendidos por mares alaranjados". Todavia, nem todos osastrônomos viram esses canais. O desenho que se encontra embaixo à esquerda foi feito por Schiaparelli a partir deobservações telescópicas e representa com grande nitidez umelevado número de canais. O desenho da direita representa amesma região de Marte, tal como foi observada por E. M.Antoniadi; no entanto, apesar de certas semelhanças, nãocontém qualquer vestígio de canais. Mesmo que esses canais tenham sido vistos através detelescópios, nunca foram fotografados da Terra. Do mesmo modo,as fotografias obtidas recentemente a partir das naves que seaproximaram do planeta não revelaram qualquer vestígio dessescanais. Tudo leva a crer hoje em dia que foram fruto daimaginação prodigiosa de astrônomos que procuraram ultrapassaros limites da sua capacidade visual.

as fotografias de marte tiradas das naves espaciais marinerrevelaram uma superfície relativamente bem conservada. Asfotografias de Marte tiradas pelas naves espaciais Marinerquando sobrevoavam o planeta a uma distância de cerca de 3000quilômetros revelaram uma superfície crivada de craterasresultantes de meteoritos e semelhantes às crateras lunares.Na montagem de fotografias da superfície do planeta (em cima)podemos ver centenas de crateras distribuídas por uma área deaproximadamente 600 por 2000 quilômetros. A maior destas.crateras tem um diâmetro de aproximadamente 250 quilômetros. As crateras lunares que se assemelham às que figuram nasfotografias são rodeadas de paredes circulares que podematingir 4500 metros de altura; por outro lado, no interior dascrateras projectam-se picos que se elevam a milhares de metrosacima do fundo das crateras. Estas paredes e picos centraisnão existem, no entanto, em muitas das crateras de Marte, oque significa que actuem neste planeta forças erosivas maisintensas do que na Lua. Uma vez que é um planeta mais sujeitoà influência dos agentes erosivos do que a Lua, Marterevela-se, como fonte de indicações sobre os primórdios doSistema Solar, menos prometedor do que o nosso satélite.Todavia, reúne mais condições para que nele exista vida.Plantas simples e robustas poderiam sobreviver em Marteactualmente e poderão ter existido já neste planeta muitosorganismos vivos se em algum momento da sua existência teveágua em abundância. A busca de vida, ou de vestígios de vida, em Marte, queconstituirá o principal objectivo da exploração planetáriadeste século, tem o seu início em forma previsto para o anocorrente com a colocação no planeta de um. pequeno laboratórioautomático, destinado a detectar a presença de micróbios e dosconstituintes químicos fundamentais da matéria viva.

o mistério de hellas. Em 1969 as fotografias obtidas por

meio das naves espaciais Mariner revelaram algo deextraordinário na região de Marte denominada Hellas, regiãocircular de aproximadamente dois milhões e meio de quilômetrosquadrados, situada no hemisfério Sul, conforme se assinala noglobo de Marte (página anterior). Ao contrário de todas asoutras regiões deste planeta que foram fotografadas, Hellasapresenta-se desprovida de crateras. A montagem das duasfotografias de baixo, que cobrem uma extensão com cerca de1200 quilômetros de comprimento, mostra-nos a transição doterreno habitual de Marte para Hellas. A primeira fotografiarepresenta uma região denominada Noachis, crivada de craterasem número que podemos considerar normal; a segunda representaHellespontus, na fronteira entre Noachis e Hellas. Em baixo àdireita, apresentamos um pormenor ampliado de uma pequena áreadesta zona fronteiriça, cujas dimensões são 70 por 100quilômetros. Neste pormenor apenas são visíveis algumascrateras, no canto inferior esquerdo. A região que se estendepara a direita, para lá de Hellespontus, no interior deHellas, não apresenta qualquer cratera. Dado que Hellas foi certamente bombardeada por meteoritoscom a mesma intensidade que outras partes da superfíciemarciana, a ausência de crateras resulta da acção, nesta áreado planeta, de uma insólita força niveladora, força esta quepoderá estar ligada a uma invulgar concentração de calor ehumidade nessa área, condições que são favoráveis à evoluçãoda vida. Hellas distingue-se igualmente por um outro aspecto, pois éuma das áreas que passam por mudanças de cor conforme asestações, escurecendo por altura da Primavera marciana etornando-se de novo mais clara no Outono. Estará esteescurecimento relacionado com a referida força niveladora ? Oupoderemos supor que as duas circunstâncias sugerem antes umsurto periódico de vegetação em Hellas? Estas interrogaçõesconstituirão objecto de especulações enquanto decorrerem asulteriores viagens de reconhecimento não tripuladas. Continua,de resto, a ser perfeitamente possível que o mistério deHellas só venha a desvendar-se quando o homem desembarcar emMarte.

Júpiter, o planeta gigante. Júpiter, o maior planeta doSistema Solar, completa uma translação à volta do Sol em cincoanos. Júpiter encontra-se a uma distância de aproximadamente720 milhões de quilômetros do Sol, o que o situa muito paraalém das órbitas da Terra e de Marte, e faz que incidam sobreele apenas 4 por cento da luz recebida pela Terra. Tal como Vénus, Júpiter encontra-se envolto por uma finacamada de nuvens (à direita). As nuvens dividem-se em faixasde diversas cores e brilhos, paralelas ao equador.Desconhecem-se as causas desta policromia. A temperatura quereina no topo da camada de nuvens é da ordem dos 130 grauscentígrados negativos. A temperatura deverá ser mais elevadasob as nuvens, atingindo sem dúvida, a determinada altitude

intermédia, valores favoráveis ao aparecimento da vida. A região escura, de forma oval, que se vê na fotografiaconstitui a misteriosa Mancha Vermelha, cujo comprimento orçaos 60.000 quilômetros e para a qual não existe qualquerexplicação satisfatória. A Mancha Vermelha desloca-se emrelação à superfície do planeta, o que prova não se tratar dequalquer particularidade da área em que se situa. Podemos ver uma das luas de Júpiter perto do planeta (àdireita, por cima do planeta), assim como a sua sombra,projectada como um círculo escuro acima da Mancha Vermelha. A atmosfera de Júpiter compõe-se de amoníaco, metano,hidrogênio e hélio, bem como provavelmente de uma grandequantidade de vapor de água. Certas experiências conduzidas emlaboratório demonstraram já que os componentes molecularesfundamentais da vida - os aminoácidos e os nucleótidos - seformam facilmente nesta mistura de gases. É provável que estesgases existissem abundantemente na atmosfera da Terra quandoesta era ainda um planeta jovem, constituindo então o ponto departida da evolução da vida no nosso planeta. É portantopossível que se tenham também desenvolvido organismos vivos emJúpiter.

A GRANDE VOLTA. A disposição dos planetas em 1977 seráfavorável a uma "grande volta" pela parte exterior do SistemaSolar. Uma nave espacial enviada da Terra para Júpitersofrerá, graças à enorme atracção gravitacional exercida peloPlaneta Gigante, um aumento de velocidade tal que seráimpulsionada na direção de Saturno e, depois de tornear esteplaneta, de Plutão. Esta volta demorará treze anos. Umaoportunidade como esta, que permita explorar por baixo custoas regiões mais rematas do Sistema Solar, só ocorre de 179 em179 anos.

9. a idade da terra

Em 1648 James Ussher, arcebispo de Armagh, afirmou que acriação da Terra ocorrera em 4004 a. C. Até ao início doséculo XIX foi aceite por quase toda a gente um espaço detempo de cerca de 6000 anos para a idade da Terra, baseado nagenealogia bíblica: nessa altura geólogos e naturalistascomeçaram a suspeitar de que a Terra devia existir havia muitomais tempo. No decurso do século XIX, os geólogos observaram que aterra dos continentes se desgasta devido à erosão da água; osregatos e os rios desgastam as margens, transportando todos osanos uma pequena quantidade de terra dos pontos altos para osmares. Embora só uma fracção mínima de terra seja removida por

ano por tal processo, aparentemente esta acção tem vindo aefectuar-se há já muito tempo, pois há lugares em que se podever que uma completa cadeia de montanhas foi reduzida até aossopés. Normalmente é difícil detectar estas alterações, mas emalguns locais especiais pode observar-se muitíssimo bem o seuefeito. O Grand Canyon é o exemplo mais flagrante. Aqui, o rioColorado cortou pela crosta terrestre como um escalpelorasgando tecido, tendo exposto um nítido registo do passado. Ahistória daquela parte da Terra foi desnudada para todos aobservarem. Os penhascos do Grand Canyon mostram que, em pelo menostrês ocasiões sucessivas, as montanhas foram elevadas agrandes alturas pela deslocação de terras e acção deformadorada crosta terrestre, corroídas pela água corrente, e formadasnovamente por altura de posteriores modificações da crostaterrestre. Noutros lugares, tais como na Sheep Mountain, nabacia hidrográfica do Big Horn situada em Wyoming, a base deuma montanha isolada encontra-se exposta de maneira muitonítida. Os sinais de erosão podem ser observados por toda asuperfície da Terra. A água corrente é o agente mais eficaz,mas os glaciares e a acção de rajadas de areia e de ventoscarregados de poeira também contribuem para o desgaste. Asensação de um nunca acabar de transformações na Terra foiintensamente apercebida por James Hutton, o pai da Geologiamoderna, que escreveu em 1795: "... desde o cimo da montanha até à costa marítima... tudose encontra em estado de transformação; as rochas e osestratos sólidos desfazem-se, quebram-se e decompõem-se... aterra deslocando-se pela superfície terrestre em direção àcosta; e a própria costa é desgastada e assolada pela agitaçãodo mar." Há quanto tempo tem estado a Terra a desgastar-se por esteprocesso? Podemos medir a quantidade de matérias que éremovida todos os anos do continente americano, por exemplo,pelos rios maiores, tais como o Mississipi. Está calculado quesão varridos pela água 800 milhões de toneladas de terra porano, da parte continental dos Estados Unidos para o mar. Aeste ritmo, o nível da terra baixa cerca de 30 centímetros emcada 10.000 anos. Um planalto com 3500 metros de altura éremovido em 100 milhões de anos. Devido a esta quantidade dematéria ter sido desgastada e colocada de novo, por váriasvezes, em algumas partes do Globo, segue-se que a Terra deveter, pelo menos, várias centenas de milhões de anos. Alémdisso, o ciclo de erosão e o levantamento de terrenos, tantoquanto podemos saber, quer recuemos o mais possível naHistória ou penetremos o mais profundamente possível na crostaterrestre, têm continuado a efectuar-se. Não há nenhuma pistaque nos diga onde e quando devemos parar. Tanto quanto osgeólogos podem dizer, a Terra deve ter existido desde sempre.Hutton disse: "Não encontramos nenhum vestígio de umprincípio." Algumas gerações mais tarde, Charles Darwin empreendeu um

estudo sobre os seres vivos e a sua relação com os fósseis deanimais antigos conservados em rochas. Presentemente, háaproximadamente um milhão de espécies de animais na Terra.Darwin observou que as formas de vida existentes hoje na Terraevoluíram gradualmente de seres a princípio mais primitivos emais simples, que sofreram uma sucessão de transformaçõesmuito pequenas. Da observação de grande número de esqueletosfósseis pode ver-se que, durante um período de mais de 60milhões de anos, o cavalo moderno, por exemplo, evoluiu de umanimal pequeno e com cinco dedos do tamanho de um fox-terrier,como resultado de longa série de mutações mínimas. Darwinnotou que em animais modernos as modificações de uma geraçãopara outra são imperceptivelmente mínimas, demasiado pequenaspara permitirem ser detectadas dentro do espaço de tempo devida de uma pessoa, ou mesmo pela memória da raça humana.Concluiu que uma mutação substancial na forma de um animaldeve ter levado milhares, senão milhões, de gerações, e quedeve ter decorrido uma enorme quantidade de tempo desde ocomeço do registo de fósseis até aos nossos dias. Sugeriuainda que deve ter decorrido um grande intervalo antes doaparecimento de fósseis, durante o qual animais de corposmaleáveis povoaram os mares primitivos sem terem deixadoqualquer vestígio da sua existência. Há exactamente quantotempo se têm vindo a dar transformações nas formas dos seresvivos? Darwin não pôde responder a esta pergunta; contudotambém ele sentiu intuitivamente que a terra deve existir hámuitas centenas de milhões de anos. os pontos de vista de Darwin quanto à idade da Terraestavam em desacordo com as opiniões de Lord Kelvin, físico ematemático britânico. Medições geofísicas revelaram que sedimana constantemente uma pequena quantidade de calor dointerior da Terra para a superfície. de acordo com Kelvin,este fluxo de calor resulta do facto de a Terra ter sidouma massa fundida logo quando se formou. No decurso de milhõesde anos, à medida que ia perdendo o calor da superfície, iaarrefecendo e petrificando-se gradualmente. Kelvin calculouquanto tempo levaria a Terra a arrefecer até à temperaturaactual, supondo que o calor, durantea história passada, se libertava do interior do planeta aomesmo ritmo que se liberta hoje. Os cálculos indicaram que aTerra tinha vindo a arrefecer havia 40 milhões de anos. Kelvinanunciou que esta era a idade da Terra. Pensava que 40 milhõesde anos era uma estimativa generosa, pois quandoplaneta mais novo e mais quente, a Terra perdia provavelmenteo calor à superfície mais rapidamente do que hoje. De acordo com Darwin, porém, era necessário um espaço detempo de longe muito mais extenso do que 40 milhões de anospara que as espécies de vida vegetal e animal se tivessemdesenvolvido segundo o processo lento de selecção natural. Seos cálculos de Kelvin estivessem correctos, a teoria daevolução de Darwin tinha de estar errada. Darwin ficou muito transtornado com esta revelação. Em

1869, escreveu o seguinte: "... Estou muito preocupado com a curta duração da Terra deacordo com a superfície porque, por razões teóricas, precisode um período muito longo antes da formação câmbrica." A tensão deve ter sido penosa, pois parece que tomou umaantipatia pessoal por Kelvin, referindo-se a este, numa cartaa Alfred Wallace, como "o espectro abominável". Mas Kelvinestava confiante; afirmou em 1873: "Em cada momento encontramos alguma coisa para mostrar... acompleta futilidade da filosofia (de Darwin)." Por volta de 1893 reduziu a estimativa da idade da Terrapara 24 milhões de anos, oprimindo implacavelmente Darwin. No conflito entre a intuição de Darwin e a Físicamatemática de Kelvin, triunfou a intuição, uma vez que Kelvinomitira dos seus cálculos, nos anos 70, um factor assazimportante. O factor omisso não foi descoberto até 1904, vintee cinco anos depois do falecimento de Darwin. Nesse ano,Rutherford descobriu que a radioactividade liberta quantidadesapreciáveis de calor. A Terra contém substâncias radioactivas- tório, urânio e potássio - no interior. Kelvin não tinhaconhecimento da existência destas substâncias. De acordo comas medições de Rutherford, estas libertaram calor suficientepara prolongar o espaço de tempo de arrefecimento da Terramuito para além do que Kelvin previa. Rutherford discutiu as implicações desta experiência numaconferência realizada em 1904, a que Kelvin também assistiu.Rutherford disse depois: "Entrei na sala, que se encontrava pouco iluminada,localizei imediatamente Lord Kelvin na audiência e compreendique me encontrava em apuros com a última parte do meu trabalhoque se relacionava com a idade da Terra, em que as minhasopiniões colidiam com as dele. Para meu alívio, Kelvinadormeceu, mas, quando cheguei à parte importante, vi que ovelho pássaro se endireitou, abriu um olho e me fitousinistramente! Então tive uma inspiração súbita, e disse queLord Kelvin determinara a idade da Terra caso não sedescobrisse nenhuma nova fonte de calor. Aquela afirmaçãoprofética refere-se ao que estamos a considerar esta noite, orádio! O velho sorriu-se para mim." A descoberta da radioactividade libertou os naturalistasdos cálculos estreitos de Kelvin e deu-lhes o tempo de queprecisavam. É curioso que a mesma descoberta também concedeu aprimeira indicação da verdadeira idade da Terra. A medição foiconcebida, mais uma vez, por Lord Rutherford, e realizada empormenor por B.B. Boltwood, da Universidade de Yale. Boltwooddecidira repetir o trabalho de Pierre e Marie Curie sobre aseparação do rádio e do urânio. Num trabalho sobre as rochascontendo urânio, isolou e mediu sem demora a concentração deurânio em qualquer substancia analisável, nas suas rochas deensaio. Descobriu que, sempre que existia urânio nas rochas, ochumbo também aparecia e, ainda mais, que a proporção dechumbo para urânio se mantinha quase sempre constante.

Os Curie mostraram que, quando o urânio enfraquece,liberta-se uma série de partículas, até que finalmente ochumbo surge, como resultado final. à medida que os átomos deurânio enfraquecem um por um, a concentração de chumbo narocha tem de aumentar constantemente. A quantidade de chumboexistente, concluiu Rutherford, revelará o tempo durante oqual ocorreu a transformação de urânio em chumbo. Medições laboratoriais mostram que 50 % do urânio numarocha se transformará em chumbo no decorrer de A mil e 500milhões de anos. Este período é conhecido como metade da vidado urânio. Boltwood encontrou uma grande quantidade de chumbonas rochas que estudou, indicando que estas existiram duranteuma fracção apreciável do período de vida do urânio, talvezdurante um milhar de milhões de anos. Em anos posteriores asrochas mais velhas ainda foram datadas deste modo, atingindoidades que iam até aos 3 mil e 300 milhões de anos.

Os meteoritos, que são fragmentos de rochas extraterrestresque colidem de vez em quando com a Terra, também têm sidoestudados segundo a mesma técnica. Os resultados mostram que amaioria dos meteoritos têm cerca de 4 mil e 500 milhões deanos. Os meteoritos não foram submetidos à erosão nem a umasérie de transformações químicas e físicas, como acontece comas rochas à superfície da Terra. Por esta razão, crê-se queestes dão uma indicação melhor do estado primitivo da matériano sistema solar do que as rochas terrestres. Por isso,supõe-se que 4 mil e 500 milhões de anos, a idade dosmeteoritos, é a idade do sistema solar e a da Terra.

iiiii

o grand canyon: uma incisão na crosta terrestre.as grandes escarpas do grand canyon ostentam os vestígios detrês cadeias de montanhas que foram elevadas e,posteriormente, submetidas à contínua acção erosiva das águascorrentes. o rio colorado (correndo, na imagem, do meio dapágina da esquerda para o fundo da página seguinte) tem vindoa cavar na crosta terrestre um vale estreito de cerca de doismil metros de profundidade, ao longo do qual se podemobservar estas modificações geológicas. o rio deixou adescoberto camadas da crosta terrestre formadas háaproximadamente mil milhões de anos.

charles Darwin (1809-1882), defensor de uma terra vetusta.Esta fotografia foi tirada em 1854, quando Darwin tinhaquarenta e cinco anos. Por essa altura, Darwin já vinha adebruçar-se durante quase duas décadas sobre os fósseis e assuas relações com os animais vivos. Havia entretanto chegado àconclusão que as formas de vida que existem modernamente naTerra provinham de espécies desaparecidas através de umasucessão de mutações inumeráveis e graduais. Estas mutações,

imperceptíveis de uma geração para a seguinte, deverão ter-seproduzido durante um período extremamente longo. Darwin estavaconvencido de que a terra era um planeta de formação muitoantiga.

lord Kelvin (1824-1907), defensor de uma terra jovem. LordKelvin, um dos mais eminentes físicos britânicos, pôs em causaas idéia s de Darwin sobre a idade da Terra. Segundo os seuscálculos, o nosso planeta teria constituído um inabitávelcorpo rochoso em liquefacção, cuja idade não excederia os 40milhões de anos. Este lapso de tempo era, por conseguinte,insuficiente para que a vida tivesse evoluído até ao seuactual estádio de variedade e complexidade através de umasucessão de mutações quase imperceptíveis, como Darwinsustentava na sua teoria da evolução. Darwin morreu em 1882,profundamente perturbado pelas criticas que Kelvin Ihedirigira. Em 1907, vinte e cinco anos após o falecimento deDarwin, Rutherford descobriu que as substâncias radioactivasenterradas no interior da Terra libertavam uma quantidade decalor suficiente para invalidar os cálculos de Kelvin.

10. os primeiros anos

Os primeiros anos da história da Terra estão envolvidos nummistério. A erosão provocada pelo vento e pela água corrente,e as elevações da crosta terrestre que acompanham a formaçãode grandes continentes e de cadeias montanhosas - tudo istocontribuiu para destruir os vestígios do passado da Terra.Sabe-se menos da história do nosso planeta do que da históriada vida das estrelas, uma vez que os céus contêm estrelas demuitas e variadas idades - umas a formar-se, outras numa faseintermediária, e outras no estádio final de desagregação eextinção. Todas estas estrelas - novas e velhas - podem serexaminadas pelos telescópios. Por meio destes tomámosconhecimento da história das gigantes vermelhas e das anãsbrancas. Mas os planetas de várias idades não podem serobservados. A exploração da Lua e de Marte será realizada embreve, e esta observação acrescentará informações quanto àhistória dos planetas; mas, possivelmente, a Lua e Marte sãoda mesma idade da Terra e a partir daqueles nunca chegaremos auma história completa do nosso planeta; nunca poderemos sabertanto como saberíamos se assistíssemos à formação de umplaneta semelhante à Terra, ou se observássemos um nos seusprimeiros anos de vida. Talvez um dia se descubra um planeta mais novo do que aTerra, se porventura formos capazes de sair deste sistemasolar e viajar até outras estrelas; tais viagens, porém, nãoestão à vista num futuro previsível. Presentemente estamos

condenados à ignorância das condições que existiram na Terradurante os primeiros anos. Desconhecemos a temperatura dasuperfície da Terra quando esta era nova, os gases queflutuavam na atmosfera e os produtos químicos que sedissolveram nos oceanos primitivos. Desconhecemos estes fatosque talvez nunca possamos conhecer, e contudo são do maiorinteresse, em virtude de estarem relacionados com o problemada origem da vida. Os vestígios mais remotos de organismos comvida descobertos até agora-resíduos de bactérias e plantas simples - encontram-se em rochas com cerca de 3 mil milhões deanos de idade. Na altura em que estes organismos viveram, já aTerra tinha mais de mil milhões de anos. Durante este períodode anos a vida desenvolveu-se aqui. Em que condições é que elasurgiu? Pensamos que no princípio havia só uma nuvem de hidrogênio,misturada com pequenas porções de outras substâncias. Destanuvem nasceram o Sol, os planetas e as criaturas que andam àsuperfície da Terra. Tratava-se da nuvem-mãe donde todos nósprovimos. No centro dela existia um núcleo denso e quente queformou mais tarde o Sol. As regiões mais à superfície - maisfrias e menos densas -deram origem aos planetas. A partir de que matérias se formaram os planetas? A massada nuvem-mãe deve ter sido composta de gases leves, hidrogênioe hélio, pois estes são os elementos mais abundantes noUniverso. Outros elementos relativamente abundantes noUniverso, embora não tanto com o hidrogênio e o hélio, são ocarbono, o nitrogênio e o oxigênio, metais como o ferro, omagnésio e o alumínio, e o silício. Estas substâncias devemter entrado na composição da nuvem-mãe que deu origem aosplanetas em relativa abundância. Sem dúvida que os restantesoitenta e tal elementos estavam também representados, mas emquantidades mais pequenas.Todos os compostos químicos vulgares destas substânciaster-se-iam formado na nuvem, em relativamente pouco tempo. Ohidrogênio combina-se facilmente com o oxigênio para formarmoléculas de vapor de água; o hidrogênio também se combina como nitrogênio para formar moléculas de amoníaco e combina-seainda com o carbono formando metano, também chamado gás dospântanos, que é hoje muito usado para cozinhar. O carbono e ooxigênio combinam-se formando o dióxido de carbono. Devemter-se formado quantidades consideráveis de cada um destescompostos na nuvem-mãe, mas possivelmente não sob a forma degases, devido à baixa temperatura - cerca de 40 grauscentígrados abaixo de zero -que prevalecia na região da nuvemda qual a Terra se formou. A esta temperatura, congelam numamistura lamacenta de água, amoníaco e metano gelado, em estadolíquido e sólido, mais dióxido de carbono sólido - gelo seco.Os outros elementos contidos em abundância - silício,alumínio, magnésio e ferro-combinam-se com o oxigênio formandogrãos de matérias rochosas e óxidos metálicos.Estas são, pois, as substâncias das quais os planetas seformaram um sorvete napolitano de água gelada, amoníaco e

metano, e ainda vá rias espécies de matérias rochosas - tudoimerso numa nuvem gasosa de hidrogênio e hélio. Quando, no princípio, os planetas se formaram a partirdesta mistura de gases e matérias sólidas, o volume da suamassa devia ter consistido em hidrogênio e hélio. Os planetasgigantes - Júpiter, Saturno, Urano e Neptuno - são de factocompostos, na sua maior parte, por estes gases leves, mas,por qualquer razão, a Terra e os seus planetas vizinhos maispróximos carecem deles. Porque é que eles são mais escassos naTerra do que em Júpiter, é um mistério. Alguns estudiosos doassunto dizem que foram varridos pelos raios do Sol, que erammuito mais brilhante do que hoje. Outros dizem o contrário:que todos os gases leves das regiões interiores foram atraídospara o corpo do Sol primitivo, à medida que se contraía, e aTerra formou-se das matérias rochosas que sobraram. Seja qual for a causa do afastamento do hidrogênio e dohélio, é evidente que, a partir da escassez destes gases naTerra, desapareceram das proximidades da órbita terrestre parauma vasta extensão na altura em que o nosso planeta se começoua condensar. Aí só ficaram partículas rochosas e pequenasquantidades de gelo, que giravam em órbita em torno do Sol,sendo cada uma delas um planeta em miniatura. De vez em quando ocorriam colisões entre as partículasvizinhas no curso dos seus movimentos rotatórios. Algumascolisões eram suaves, e as partículas ficavam coladas umas àsoutras. Com o decorrer de milhões de anos, pequenos grãosrochosos aumentaram gradualmente para formações maiores, poreste processo. Alguns fragmentos de rochas atingiram umtamanho suficiente para exercerem uma atracção gravitacionalsobre os que lhes eram vizinhos. Estes foram os núcleos dosplanetas modernos. A partir do momento em que atingiram umtamanho suficiente para atrair outras partículas pela acção dagravidade, rapidamente reuniram todas as matérias do espaço emseu redor, e em pouco tempo evoluíram para planetas de tamanhopleno. O processo completo da formação planetária continuou talvezpor um período superior a 50 milhões de anos, prosseguindoextremamente devagar a princípio, e depois com uma energia queaumentou rapidamente nas fases finais. Por fim, toda a matériado sistema solar se encontrava reunida nestes planetasexistentes, tendo só ficado alguns átomos de gás no espaçointermédio. É esta a situação no sistema solar de hoje. à medida que a Terra aumentava para o tamanho definitivonas fases finais deste processo, a gravidade atraía para oplaneta, com força crescente, todos os fragmentos de rocha queainda giravam à volta do Sol em órbitas vizinhas. Estesúltimos restos da nuvem-mãe precipitaram-se para a Tema avelocidade superior a 40.000 quilômetros por hora, libertandograndes quantidades de energia quando atingiam a superfície, eelevando a temperatura das camadas mais superficiais da Terra. É possível que toda a Terra se tivesse fundido comoresultado do bombardeamento sofrido durante as fases finais da

sua formação. Ou pode ter-se derretido mais tarde comoresultado da energia nuclear libertada no interior devido àcarência de urânio e de outras substâncias radioactivas. Háuma disputa entre estudiosos da história da Terra quanto aeste ponto, mas há um facto de que estamos certos: grandesregiões da Terra derreteram-se, ou aproximaram-se de umestado de quase fusão, em dada altura da sua história.Temos a certeza deste facto porque actualmente existe umaenorme quantidade de ferro fundido no centra da Terra. O ferroé um elemento abundante, e não nos surpreende que exista emquantidade considerável no interior da Terra; contudo, quandoa Terra se acumulou a partir de pequenos fragmentos de rocha,este ferro deve ter-se espalhado irregularmente por todo ointerior, como passas de uva num bolo de frutas. Só se vastasregiões da Terra se tivessem fundido, é que teria sidopossível a este ferro correr para o centro e formar um núcleofundido. A questão é: quando se fundiu a Terra? O grupo pertencenteà escola "planeta jovem e frio" que estuda a história da Terraargumenta que a Terra era inicialmente um corpo frio, formadode rocha sólida, que se fundiu posteriormente, talvez milmilhões de anos mais tarde, devido ao calor libertado porsubstâncias radioactivas distribuídas por todo o seu interior.O grupo pertencente à escola "planeta jovem e quente" afirmaque a Terra estava fundida no princípio da sua existência, enão formou uma crosta sólida a não ser muito tempo depois. Quer de uma maneira quer de outra, é certo que se fundiramgrandes regiões da Terra numa dada altura, mais ou menosdurante o primeiro milhar de milhões de anos. Gradualmente,acumularam-se rochas leves na superfície, formando oscontinentes. As áreas entre os continentes eram baciasnaturais nas quais a água, chegando à superfície, vinda dointerior do planeta através de vulcões e fendas na crosta, sejuntou formando os oceanos. Lentamente a Terra foi adquirindoo seu aspecto actual.

11. o despontar da vida

A Terra começou a sua existência há 4 mil e 500 milhões deanos, gravitando à volta do Sol, recentemente formado.Constituído a partir de átomos inertes de gás e de grãos depoeira, o nosso planeta no princípio era, sem dúvida, um corpoestéril rochoso. As águas dos oceanos primitivos eramdesprovidas de vida; as ondas batiam em costas áridas, sem omanto da vegetação. Hoje, porém, desenvolvem-se plantas portoda a parte; os continentes estão cheios de um milhão devariedades da vida animal; 20.000 espécies de peixes habitamos mares. Como e quando surgiu esta variedade rica em seresvivos no nosso planeta?

O progresso científico das últimas décadas desvendou fatossobre a natureza dos organismos vivos que conduziram, pelaprimeira vez, a uma explicação científica da origem da vida.Parece provável agora que as primeiras criaturas vivas daTerra tivessem evoluído espontaneamente de produtos químicosinertes que enchiam a atmosfera e os oceanos do planeta nosseus primeiros anos de existência. Três descobertaslevaram-nos a esta conclusão. Primeira, os biólogos mostraram-nos que todos os organismosvivos existentes à face da Terra dependem de dois tipos demoléculas - aminoácidos e nucleótidos, que são as unidadesconstituintes fundamentais da vida , precisamente como osfísicos tinham esclarecido que toda a matéria do Universo éformada de três unidades constituintes - o neutrons, o prótons eo elétron. Segunda, os químicos fabricaram estas unidades molecularesconstituintes de vida no laboratório a partir de produtosquímicos simples, sob condições semelhantes às que existiramna Terra quando esta era um planeta novo. Terceira, descobriu-se um objecto que faz a ligação entreos núcleos, átomos e moléculas do universo físico e osorganismos complexos do mundo vivo. Este corpo, chamado vírus,fica na fronteira entre a matéria inanimada e a vida. A sua existência dá crédito ànoção de que a vida evoluiu de produtos químicos não vivos. As unidades constituintes fundamentais da vida são maiscomplicadas do que as unidades de construção do mundo físico.Vinte espécies diferentes de aminoácidos desempenham um papelimportante nas criaturas vivas, bem como cinco espéciesdiferentes de nucleótidos (1). Além disso, cada aminoácido ounucleótido é, em si mesmo, uma molécula bastante complexaformada de cerca de trinta átomos de hidrogênio, nitrogênio,oxigênio e carbono, 1igados por forças elétricas de atracção.São dados exemplos da estrutura de um aminoácido e de umnucleótido típicos nas gravuras da página 147. O aminoácido e o nucleótido têm funções muito diferentes naquímica da vida. Dentro da célula os aminoácidos reúnem-se emmoléculas muito grandes denominadas proteínas. Uma classe deproteínas, chamadas proteínas estruturais, constituem oselementos indispensáveis ao organismo vivo - as paredescelulares, o cabelo, os músculos e os ossos. As proteínasestruturais são como as armações de ferro e as paredes de umedifício. A outra classe de proteínas são as chamadas enzimas.Existem muitas espécies de enzimas; cada espécie controla umadas muitas reacções químicas necessárias para manter a vida deum organismo. Todas as proteínas sob todas as formas de vida, vegetal eanimal, são constituídas a partir do mesmo grupo básico devinte aminoácidos. Uma proteína só difere da outra no modocomo se ligam os aminoácidos constituintes. Contudo, estasdiferenças são bem importantes. A distinção entre um homem eum rato, quer em aparência, quer em personalidade depende

inteiramente das diferenças entre as proteínas contidas nascélulas dos seus corpos. As proteínas encontram-se unidas num segundo grupo deunidades constituintes - os nucleótidos. Os nucleótidos estãoreunidos dentro da célula, formando cadeias muito compridas,chamadas ácidos nucleicos. O tipo de ácido nucleico maisimportante chama-se ácido desoxiribonucleico, ou ADN (2). ADNé a maior molécula que se conhece, contendo, em organismosnuma fase mais adiantada, como o do homem, 10 mil milhões deátomos separados. O tamanho da molécula ADN é compreensível setivermos em conta a complexidade e a importância das suasfunções na célula viva. A molécula ADN é a molécula maisimportante em todos os organismos vivos, ainda mais importantedo que a proteína, porque determina as proteínas que irão serreunidas; a molécula ADN possui o plano principal para oorganismo. Como é que o ADN controla a reunião de proteínas na célula?As características gerais do processo começaram a surgirdurante a década dos anos 50, embora muitos dos pormenores nãoestejam ainda definidos de maneira clara. Parece que osaminoácidos e os nucleótidos isolados flutuam livremente nofluido da célula. As moléculas ADN que orientam a reunião deproteínas localizam-se no centro da célula. Na primeira fase,os nucleótidos não combinados são atraídos para um segmento de uma das moléculas ADN no centro. Alinham-se ao longo dosegmento ADN formando uma réplica deste. Numa segunda fase, aréplica desliga-se da cadeia principal ADN, e afasta-se poucoa pouco para dentro da célula; e um mensageiro que transmiteinstruções do ADN ao corpo da célula para a reunião de um tipoespecial de proteínas. Na terceira fase, surge uma outramolécula. Esta molécula serve de traço de união, trazendo osaminoácidos existentes no fluido da célula para os lugaresapropriados dispostos ao longo do mensageiro. Lá existem vintetipos de traços de união, um por cada tipo de aminoácido. Cadatraço de união atrai um e só um dos vinte aminoácidos. Aderefirmemente quando, no decorrer de colisões fortuitas,determinado tipo de aminoácido entra em contacto com aextremidade do traço de união destinada para aquele aminoácidoespecífico. Na outra extremidade do traço de união existeoutro grupo de moléculas, constituindo uma superfície derecantos e fendas construídas de tal modo que só se ajusta aoslugares apropriados ao longo do mensageiro. Quando o traço deunião ocupa o seu lugar ao longo do mensageiro, adiciona oaminoácido à cadeia de aminoácidos que já tinha sidoconstituída. Quando esta cadeia estiver agrupada ao longo docomprimento total do mensageiro, a reunião de aminoácidos numaproteína estará completa. Depois, a cadeia desliga-se domensageiro e afasta-se pouco a pouco para o fluido da célula. As proteínas essenciais são constituídas no interior de umanimal por meio deste processo bastante complicado de acordocom a ordem dos nucleótidos nas moléculas ADn. Os segmentosda molécula ADN são "lidos" como as palavras de um livro. Cada

segmento ADN, controlando a reunião de uma proteína, é umapalavra; cada nucleótido dentro de um segmento é uma letra; aordem das letras fornece o significado da palavra - ou seja, aproteína que vai ser reunida. O grupo completo de moléculasADN contido no interior da célula é a biblioteca de informaçãogenética para o organismo. As moléculas ADN nas células de umser humano orientam a reunião de aminoácidos no corpo humanopara formar proteínas humanas; as moléculas ADN nas células deum rato orientam a reunião dos aminoácidos que formam asproteínas do rato. Como é que o plano da espécie para a correta reunião deproteínas passa de uma geração para a seguinte? Como é que adescendência adquire por hereditariedade as característicasdos seus pais? A resposta encontra-se na propriedade maisextraordinária da molécula ADN - a capacidade de seautoduplicar. O mecanismo pelo qual o ADN se autoduplica foidescoberto em 1953 por uma equipa anglo-americana, James D.Watson da Universidade de Harvard e Frances Crick daUniversidade de Cambridge. Esta descoberta é um dos maisimportantes acontecimentos científicos isolados dignos deregisto do século vinte. Descrevi a molécula ADN como umacadeia de nucleótidos; mas Watson e Crick acharam que não setratava de uma única cadeia de nucleótidos; consiste, antes,em duas cadeias, reunidas com intervalos regulares pormoléculas dispostas como degraus de um escadote. No meio decada degrau do escadote existe uma zona fraca que se quebrafacilmente. Durante a história dos primeiros tempos de umacélula, os dois filamentos permanecem ligados, mas quando acélula atinge o tamanho definitivo, e a divisão em duascélulas-filhas está prestes a começar, as ligações fracas nomeio do escadote quebram-se, e o filamento duplo divide-se emdois filamentos simples. Então, cada um dos filamentos simplesreúne em si novos nucleótidos a partir de um mar denucleótidos flutuando na célula, e reúne-os formando uma novamolécula de filamentos bipartidos. Agora existem duasmoléculas ADN idênticas, onde primeiramente só existia uma. Asduas moléculas ADN dividem-se, e deslocam-se para asextremidades opostas da célula; a célula, depois, divide-se emduas células-filhas, contendo cada uma um grupo completo demoléculas ADN. Deste modo, cada célula-filha contém uma cópiado volume de informação genética que havia na célula-mãe. Esteé o processo pelo qual a forma e as características de umaplanta ou de um animal se transmitem de geração em geração. Em resumo, a molécula ADN controla a reunião de proteínas,e as proteínas determinam a natureza da organismo. Cadaorganismo vivo tem o seu grupo especial de moléculas ADN; nãohá dois organismos que possuam o mesmo grupo, a não ser quesejam gémeos perfeitos. Contudo, os nucleótidos e osaminoácidos básicos são os mesmos em todos os seres vivos àface da Terra, quer sejam bactérias, moluscos ou o homem. Tendo em mente esta propriedade fundamental dos seresvivos, pode apreciar-se a importância de uma experiência

crítica efectuada em 1952 por Stanley Miller que,presentemente professor de Bioquímica na Universidade daCalifórnia, era então um recém-formado trabalhando na tese dedoutoramento em Física sob a orientação de Harold Urey Porsugestão de Urey, Miller juntou numa mistura os gases -amoníaco; metano, vapor de água e hidrogênio - que eramabundantes na nuvem-mãe da Terra, e que, provavelmente, eramabundantes na atmosfera primitiva da Terra. Pela mistura fezpassar uma descarga elétrica. Ao fim de uma semana, Millerdescobriu que a água continha vários tipos de aminoácidos.Subseqüentemente, em 1962, criaram-se nucleótidos nolaboratório sob condições semelhantes. Fabricaram-seaminoácidos e nucleótidos em experiências semelhantes a partirde diversas misturas de gás, utilizando várias fontes deenergia - bombardeamento por partículas alfa, irradiação comluz ultravioleta e simples aquecimento dos ingredientes. Osresultados de todas estas experiências, consideradosconjuntamente, demonstram que as unidades molecularesconstituintes da vida podiam ter sido criadas por um dos muitovariados processos, durante a história primitiva da Terra. Os aminoácidos e os nucleótidos podiam ter-se formado naTerra por este processo há 4 mil e 500 milhões de anos, peladescarga de um raio durante as primeiras trovoadas, ou pelaacção dos raios ultravioleta provenientes do Sol. Podemoscalcular o que aconteceu também em sequência. Gradualmente, asmoléculas criticas escoadas da atmosfera para os oceanosformaram um caldo nutritivo cuja concentração aumentavacontinuamente. A concentração de aminoácidos e nucleótidosaumentou durante um longo período de tempo, até que,eventualmente, uma combinação fortuita de unidadesconstituintes produziu moléculas ainda mais complexas - asprimeiras proteínas e ácidos nucleicos. Com a continuação dotempo as células desenvolveram-se; surgiram organismosmulticelulares; e os organismos vivos iniciaram um longopercurso em direção à complexidade das criaturas tal comoexiste actualmente. Esta é a história atraente que emergiu da união daAstronomia, da Biologia e da Química. Custa a acreditar,porém, que as formas de vida existentes, em toda a suavariedade e complexidade, possam ter tido origem em produtosquímicos não combinados. Existe alguma prova directa para odesenvolvimento de vida a partir de moléculas não vivas? A resposta é: sim, há uma entidade, muito vulgar no mundode hoje, que possui, simultaneamente, os atributos de umamolécula não viva e os atributos de um organismo vivo. Estaentidade é o vírus - o objecto mais pequeno e simples ao qualse pode atribuir vida. A existência de vírus foi verificada pela primeira vez nofinal do século dezanove, durante uma série de experiênciasconcebidas para revelar a causa de uma doença que afectava asplantas do tabaco. Descobriu-se que o suco adquirido porcompressão das folhas de plantas infectadas podia contaminar

outras plantas. Aparentemente, a infecção era transmitida nofluido. Mas quando eram comprimidas através de um filtro fino,que filtrava todas as bactérias visíveis, o fluido retinhaainda o poder de contaminação. em 1898 um botânico holandês,Beijerinck, sugeriu que a doença não era causada por um germe,mas por um produto químico venenoso. Beijerinck denominou esteproduto químico virus, que é a palavra latina para veneno. Investigações posteriores revelaram que os vírus são acausa de muitas doenças, incluindo a varíola, gripe, paralisiainfantil e constipações vulgares. O interesse dos médicos ebiólogos pelos vírus intensificou-se durante as primeirasdécadas do século vinte. Gradualmente, foi aumentando asuspeita de que o vírus não era nenhum produto químico vulgar.Várias experiências sugeriram que o vírus, embora demasiadopequeno para poder ser observado ao microscópio, possuía acaracterística básica dos organismos vivos - a capacidade dese reproduzir. A demonstração para o vírus vivo era, porém, indirecta:ninguém tinha ainda observado nenhum vírus no acto dareprodução. Mas nos anos a seguir à Segunda Guerra Mundialaperfeiçoou-se um instrumento novo que forneceu aos biólogosum utensílio eficiente para o estudo de organismos pequenos.Este instrumento foi o microscópio electrónico. Osmicroscópios vulgares, nos quais o objecto a estudar éiluminado por raios de luz, estão limitados a um poder deamplificação de cerca de 2000 vezes. As bactérias maispequenas, cujo tamanho é algumas décimas de mícron, mal podemser observadas nestes microscópios. Mas o microscópioelectrónico, que dirige para o objecto um feixe de elétronsem vez de um feixe de luz, pode produzir ampliações tãoelevadas como várias centenas de milhares de vezes. é possível fotografar uma únicamolécula proteica com estes instrumentos; se se conseguir ummelhoramento posterior na amplificação da ordem de 50 vezes, omicroscópio electrónico estará apto a fotografar aminoácidos enucleótidos individuais. Com o microscópio electrónico, o vírus tornou-se finalmentevisível, e todos os pormenores importantes da sua estruturaforam revelados Descobriu-se que os vírus existem com váriasformas - arredondada, cilíndrica, poliédrica e com caudas.Também surgem com muitos tamanhos. O maior é do tamanho de umabactéria pequena; o menor, que tem de diâmetro um milionésimode centímetro, é mais pequeno do que muitas moléculasinanimadas. Os vírus preenchem a lacuna entre o mundoinanimado e o mundo animado. Contudo, estas partículas minúsculas estãoindiscutivelmente vivas. Estudos químicos mostram que contêmADN - para além de as moléculas estarem vivas, pois ficamcoradas de azul, também se caracterizam pelos processosatravés dos quais toda a criatura viva se reproduz. Contêmigualmente uma quantidade substancial de proteína, sob a formade uma película protectora que envolve os filamentos preciosos

e delicados do ADN. Mas contêm muito pouco mais. Em especial,não contêm nem glícidos nem lípidos que forneçam energia paraas reacções químicas noutros seres vivos. Nelas também estãoausentes nucleótidos não combinados e aminoácidos, a partirdos quais todos os outros organismos fabricam proteínas eformam autoduplicacões. Como é que, então, vivem os vírus sem uma fonte de energiae sem as matérias essenciais ao crescimento e à reprodução?A resposta é claramente revelada por meio do microscópioelectrónico. Um vírus, em si próprio, não tem vida. Se umasolução de partículas de vírus for cuidadosamente seca, osvírus aderem conjuntamente num padrão simétrico, formando umcristal tão geométrico - e tão inanimado - como um cristal desal ou um diamante; se não for perturbado, o cristal ficaráinerte durante anos. Mas, se for novamente dissolvido na água,e colocado em contacto com células vivas, as moléculas docristal irromperão para a vida. Fixam-se nas paredescelulares, abrem um pequeno orifício na parede da célula,através do qual injectam ADN para o interior da célula. Umavez no interior da célula, o vírus ADN toma o comando,afastando o ADN primitivo da célula, e proclama-se chefe detoda a actividade química posterior. A totalidade de recursosmoleculares da célula invadida - os lípidos e os glícidosprodutores de energia, os aminoácidos e os nucleótidos-érecrutada e utilizada na união, não das proteínas necessáriasà célula invadida, mas das proteínas necessárias ao vírus. Aomesmo tempo, o vírus reúne os nucleótidos não combinados queflutuam no fluido celular e une-os, não formando duplicaçõesdo ADN da célula invadida, mas sim autoduplicacões. O vírussegrega ainda uma enzima que separa o ADN existente nointerior da célula e a divide nos seus nucleótidoscomponentes, a fim de possuir maior número destas unidadespreciosas prontas para se autoduplicarem. Quando várias centenas de membranas proteicas e de vírusestiverem unidos, a célula fica seca e cor de leite. Asmembranas envolvem as moléculas de vírus ADN, formando víruscompletos, enquanto o vírus original segrega uma enzimaadicional que dissolve as paredes celulares. Um exército departículas de vírus avança, cada qual procurando células novaspara invadir, deixando uma película vazia e fragmentada do quetinha sido, uma hora antes, uma célula viva saudável. Aoperação é simples, implacável e eficaz. É executada por umorganismo que tem, nos vírus mais pequenos, apenas 200 átomosde espessura. O vírus é, na verdade, a ligação entre a vida ea não-vida - a ponte entre a matéria orgânica e a inorgânica.

\\\\ (1) É mais correcto dizer-se que são cinco basesnucleótidas. (2) Apenas quatro dos cinco nucleótidos importantes entramna estrutura do ADN. O quinto nucleótido pertence a outro tipode ácido nucleico.

iiiii

os constituintes moleculares fundamentais da vida. Existemvinte espécies diferentes de aminoácidos e cinco espécies denucleótidos indispensáveis a todas as formas de vida na Terra.São os constituintes moleculares da matéria viva.Os aminoácidos congregam-se, no interior da célula, paraformar moléculas maiores denominadas proteínas, cada uma dasquais contém várias centenas de aminoácidos. A fotografia detopo (página seguinte) representa um modelo constituído portrês aminoácidos que formam um curto segmento de uma proteínatípica. A cada uma das bolas do modelo corresponde um átomo. As proteínas dividem-se em duas categorias. Uma destasabrange as proteínas estruturais, que compõem os elementosestruturais dos organismos vivos, tais como as paredes dascélulas, os cabelos e os músculos. A outra categoriacompreende as enzimas, que aceleram os processos vitaisaumentando a velocidade com que se realizam, no seio dacélula, as uniões de moléculas pequenas para darem origem amoléculas maiores. Os nucleótidos, que se encontram igualmente congregados nointerior da célula, formam os longos filamentos de umamolécula gigante designada ácido desoxiribonucleico econhecida pelo sigla ADN. (A ADN é composta por quatronucleótidos; o quinto aparece numa molécula conexa.) Afotografia de baixo representa um modelo de dois pares denucleótidos, formando um curto segmento da molécula ADN A ADNconstitui o reservatório molecular da informação genética: aordem segundo a qual os diferentes nucleótidos se dispõem aolongo da molécula ADN determina a espécie de proteínas queresultarão da fusão dos aminoácidos fundamentais; deste modo,a ADN controla a produção de proteínas, as quais, por sua vez,controlam a natureza do organismo. A ADN é, por conseguinte, amolécula mais importante da célula. A ADN e as proteínas assumem aspectos diferentes deorganismo para organismo, mas os aminoácidos e os nucleótidosbásicos são idênticos em todas as formas de vida existentes naTerra.

A ESTRUTURA DA ADN. Watson e Crick descobriram a estruturada molécula ADN em 1952. Esta molécula assemelha-se a umaescada (em cima, à esquerda); cada um dos degraus da escada écomposto por um par de nucleótidos ligados entre si,representados pelos símbolos:

|:o |:õ |:ç |::

Na realidade, a escada tem a forma de uma espiral dupla (emcima, à direita). O modelo representado à direita revela como se formou aespiral dupla da ADN a partir de átomos individuais,representados, no modelo, por bolas de plástico. Este curtosegmento da ADN contém aproximadamente mil átomos; nos animaissuperiores, a molécula completa pode conter 10 mil milhões deátomos. Na fotografia, o autor (à direita) interroga dr.Gordon M. Tomkins, director da Divisão de Biologia Moleculardo National Institute of Health, acerca da estrutura da ADN.

a molécula adn autoduplica-se. Quando Watson e Crickdescobriram a estrutura em forma de "escada espiral" da ADN,compreendeu-se o processo segundo o qual as características deum indivíduo se transmitem de geração em geração. O repertório de tais características encontra-se armazenadonas moléculas ADN (1), que fazem parte das células de todos osorganismos. Em todos os organismos mais evoluídos do que omodesto vírus os processos de crescimento e de reproduçãoimplicam a divisão destas células. No momento em que umacélula está prestes a dividir-se, as suas moléculas ADNcomeçam a desagregar-se, a "escada" desenrola-se, os "degraus"desta partem-se pelo meio e a ADN separa-se em dois filamentosparalelos (2). Enquanto decorre este processo, flutuam à sua volta, noseio do fluido celular, nucleótidos livres. Na fase seguinte,cada um dos filamentos da molécula ADN desagregada capta novosnucleótidos das moléculas que a rodeiam no interior da célula,formando assim uma nova "escada" completa (3). Resultam daí duas "escadas", que constituem duplicações daADN original (4). Cada uma destas réplicas dirige-se para umadas células-filhas formadas durante o processo de divisãocelular. deste modo que o plano director do organismo setransmite de célula em célula e de geração em geração.

uma experiência crucial: a criação em laboratório dosconstituintes fundamentais da vida. Os constituintesmoleculares da vida foram já manufacturados por bioquímicos apartir de ingredientes simples. A primeira experiência destetipo foi realizada por Stanley Miller em 1952. Miller misturoudiversos gases - amoníaco, metano, vapor de água e hidrogênio-, os quais entraram provavelmente na constituição daatmosfera primitiva da Terra, e fê-los circular através de umrecipiente de vidro, atravessado por uma descarga elétrica.Uma semana mais tarde, o dr. Miller verificou que a águacontinha várias espécies de aminoácidos. Experiênciasulteriores permitiram igualmente criar em laboratório outrosconstituintes moleculares vitais a partir de diversassubstâncias químicas e em condições muito diferentes. A vidapoderá ter surgido na Terra a partir de tais moléculas há três

ou quatro mil milhões de anos. O desenho esquemático do aparelho do Dr. Miller (em baixo)mostra o balão de vidro no qual se criaram aminoácidos quandose produziam descargas entre os dois eléctrodos. Vemos o Dr.Miller à direita, junto do aparelho original com que realizoua sua crucial experiência.

o vírus: elo entre a vida e a não-vida. a existência dosvírus torna mais verosímil a noção de que a vida evoluiu apartir de substâncias químicas inanimadas: o vírus situa-se nafronteira entre a matéria viva e as moléculas inanimadas;constitui a mais elementar e a mais pequena das partículasvivas. Certos vírus têm um diâmetro correspondente a menos deum milionésimo do centímetro. Vemos na fotografia da esquerda, obtida com um microscópioelectrónico, partículas do vírus da gripe, ampliadas cem milvezes. Em baixo, uma solução de partículas de vírus cuidadosamentedesidratada apresenta-se sob a forma de cristais completamenteinertes. Dissolvidos em água e postos em contacto com célulasvivas, os vírus que compõem estes "cristais" animam-se eatacam as células a que se juntaram. Na página oposta, um grande número de vírus ataca umabactéria em forma de salsicha. Observemos a pequenez dos vírusem relação à bactéria. No angulo inferior esquerdo podemos veros restos de uma bactéria atacada pelos vírus uma hora ardes.Os vírus penetraram nesta bactéria e devoraram as suassubstâncias químicas, ao mesmo tempo que davam origem aduplicações de si próprios, abandonando o invólucro ressequidodo que fora uma célula sã.

12. UMA MENSAGEM

A imaginação do cientista agarrou nestes fragmentos deinvestigação acumulados em vários campos diferentes daciência, e a partir deles moldou uma visão da origem da vidana Terra. Não existiu nenhuma forma de vida no nosso planetana sua infância; a atmosfera estava cheia de uma misturatóxica de amoníaco, metano, água e hidrogênio, trovõesribombavam pelo céu; relâmpagos iluminavam de vez em quando a

superfície mas ninguém podia observá-los; formavam-sequantidades mínimas de aminoácidos e nucleótidos em cadarelâmpago, e estas moléculas críticas foram-se acumulandogradualmente nos oceanos da Terra; entre estas ocorreramocasionalmente colisões, unindo pequenas moléculas e formandooutras maiores. No decorrer de mil milhões de anos aconcentração de moléculas complexas aumentou; surgiueventualmente uma cadeia completa ADN. Foi deste modo que seatravessou o limiar da matéria inorgânica para o organismovivo. Do acordo com esta história, a vida pode surgirespontaneamente em qualquer ambiente planetário favorável, eevoluir para seres complexos, desde que seja possível disporde grandes quantidades de tempo. De quanto tempo se precisa? Os estudos dos fósseis sugeremque a vida surgiu numa altura indefinida durante os primeirosmil milhões de anos da história da Terra. Aparentemente, aextensão de tempo necessária é aproximadamente de um ou doismilhares de milhões de anos. O nosso conhecimento do ciclo de vida de uma estrela indicaque o período necessário estará à disposição para a evoluçãoquímica da vida em qualquer planeta que gire à volta de umaestrela semelhante ao Sol. As estrelas maiores do que o Solconsomem-se demasiado rapidamente para poderem fornecer otempo necessário. As estrelas mais pequenas do que o Sol sãofavoráveis, desde que tenham planetas suficientemente próximospara elevar as temperaturas a um nível agradável. Todas asestrelas do tamanho do Sol, rodeadas por um ou mais planetasque estão aproximadamente à mesma distância delas que a Terrao está da sua estrela deviam, sem dúvida, fornecer condiçõesfavoráveis para o desenvolvimento de organismos vivos. No grande número de planetas junto destas estrelas devemexistir alguns que se assemelhem intimamente à Terra. Sejamtais planetas relativamente poucos em número, sejam tão raroscomo um num milhão não importa, o número de planetassemelhantes à Terra será ainda 100.000 só na nossa galáxia. Em face destes números, poderemos manter a nossa convicçãode que a Terra é o único planeta com vida? Só o podemosbaseados na evidência astronómica, pois todos os planetassemelhantes à Terra, excepto o nosso, podiam ser corposrochosos mortos; mas as descobertas biológicas descritas noultimo capítulo sugerem que não é este o caso. Primeiro, todaa vida na Terra depende de umas quantas moléculas básicas, eestas moléculas foram criadas no laboratório a partir deátomos simples; segundo, os átomos que constituem as moléculasbásicas da vida são iguais aos átomos que existem em qualqueroutra estrela e planeta do Universo; terceiro, há razões paraacreditar que as mesmas leis físicas e químicas se aplicam emtodas as partes do Cosmos. Por isso, a cadeia de reacçõesfísicas e químicas que levaram ao surgir da vida na Terra podetambém ter ocorrido noutros planetas.

Esta corrente de pensamento leva-nos a concluir que formasde vida semelhantes à nossa se podem ter desenvolvido na nossagaláxia, noutros planetas semelhantes à Terra, bem como emplanetas de outras galáxias. Se houver vida, qual é aprobabilidade de ser vida inteligente? Existe umapossibilidade de que seres extraterrestres tenham adquirido umnível de inteligência igual ou superior ao nosso? Considerando esta questão, temos de pensar que se crê que anossa galáxia tenha cerca de 10 mil milhões de anos. A Terratem aproximadamente 5 mil milhões de anos e, por isso, foiformada quando a galáxia já existia havia 5 mil milhões deanos. Deste modo, devem existir muitas estrelas na Galáxia quesão milhares de milhões de anos mais velhas do que o Sol. Emtorno de algumas destas estrelas mais velhas giram planetassemelhantes à Terra nos quais se pode ter desenvolvido vida.Se for assim, esta vida é mais velha muitos milhões de anos doque a vida na Terra. Quando reflectimos sobre o progressocientífico do último vinténio, compreendemos que o progressoque se realizará em milhões de anos está para além da nossaimaginação. Consideremos a história do Homem: existimos comoespécie humana há apenas dois milhões de anos; a ciênciamoderna tem só 300 anos; a nossa capacidade pararadiocomunicar a grandes distancias data somente de há 60 anosatrás; passou-se uma mera década desde que adquirimos os meiosde viajar no Espaço. O período durante o qual o nossoconhecimento científico se desenvolveu é uma parcela de tempoextremamente pequena, inserida entre os milhões de anos deevolução que precederam o aparecimento do Homem e os milhõesde anos que estão à nossa frente no período de vida do sistemasolar. É muitissimo pouco provável que qualquer sociedade noutroplaneta se tenha constituído precisamente na mesma altura, ese tenha desenvolvido ao mesmo ritmo, bem como que tenhachegado precisamente ao mesmo nível tecnológico queactualmente usufruímos na Terra. Uma diferença de 100 anos,que no período de vida de uma estrela ou de um planetasignifica um piscar de olhos, produziu transformações enormesno conhecimento científico da nossa sociedade. Algumas destassociedades extraterrestres devem ser primitivas em relação ànossa; outras, tendo começado anteriormente, devem terultrapassado há muito os nossos empreendimentos. É para este último grupo - as sociedades mais adiantadas -que deviamos dirigir a nossa atenção, pois esperamos quetenham dominado a técnica da radiocomunicação e aproveitado opoder necessário para transmitir sinais a grandes distancias,com uma perícia superior à que nós podemos esperar adquirirneste século. Pode bem suceder que estas sociedades maisvelhas e mais adiantadas venham até nós antes de asdescobrirmos. Onde estão todas estas pessoas? Porque é que nãoapareceram? infelizmente, o contacto físico e directo com associedades de planetas que giram em torno de outras estrelas

parece uma perspectiva pouco provável num futuro previsível,porque as estrelas estão muito escassamente dispersas no céu,sendo a distância média entre elas de 45 bilhões dequilômetros. Uma nave espacial, viajando à velocidade de umfoguetão da ordem dos 8 quilômetros por segundo, levaria 100.000 anos para cobrir esta distancia. Actualmente nãopossuímos nenhum meio de acelerar a nave espacial até àvelocidade requerida para viagens interestelares. Contudo, a comunidade interestelar está dentro do reino dapossibilidade. O limiar da radiocomunicação, que ultrapassámoshá apenas 60 anos, foi, com certeza, atravessado noutrosplanetas há milénios senão milhões, de anos atrás. Esperamosque outros, que têm possibilidades para radiocomunicação delonge mais adiantados do que nós, nos estejam já a ouvir ouque nos ouçam primeiro. Só começamos a emitir rádio e ruido detelevisão suficientes para atrair a atenção deles nas últimasdécadas. Em qualquer altura, talvez dentro em breve, podemosesperar uma mensagem.

13. milhões de gerações

Muitos planetas giram à volta de outras estrelas; podem sermilhões na nossa Galáxia, e talvez um número infinito noUniverso. Sem dúvida, a maior parte são corpos de rochas semvida, banhados por mares estéreis. Mas em alguns, situados adistancias favoráveis dos seus sóis, o ambiente é adequado àformação de nucleótidos e de aminoácidos - as unidadesconstituintes da vida. Nestes planetas, a sucessão deprocessos inanimados dá lugar a um padrão de evolução química,complexa e auto-reprodutora. A vida surgiu na Terra como o produto desta sequência deacontecimentos, a dada altura durante o primeiro milhar demilhões de anos da sua existência. Os organismos primitivoseram muito simples, pouco mais do que moléculas gigantesimersas nas primevas águas do planeta. Durante os milhões deanos que se seguiram, aquelas moléculas orgânicasdesenvolveram-se, formando uma variedade rica de plantas eanimais que habitam actualmente a Terra. Que é que guiou ocurso evolutivo neste planeta desde os organismos primitivosaté às criaturas complexas de hoje? Se a vida surgiu emqualquer outra parte, que é que orienta o curso evolutivo nosoutros planetas. Existirá na Natureza uma lei que controla asformas de vida? O registo dado pelos fósseis contém pistas para a soluçãodesta questão. Milhares de esqueletos e de restos fósseisindicam o caminho por onde a vida escalou desde os seuscomeços imperfeitos. Os passos iniciais ao longo do caminhosão desconhecidos; essas formas primeiras devem ter sido

frágeis, porque não temos qualquer vestígio delas. Osprimeiros sinais de vida que aparecem neste registo, numa fasemais adiantada do que a molécula "viva", são os vestígios deplantas unicelulares simples chamadas algas, e as conchas deorganismos em forma de vara semelhantes às bactérias.Encontram-se em rochas formadas há 3 mil milhões de anos,quando a Terra tinha já mais de mil milhões de anos. Depois disso, muito pouco aconteceu durante alguns milharesde milhões de anos; pelo menos, muito pouco que tenha sidoconservado no registo das rochas. Mas, de repente, há 600milhões de anos, o passo da evolução acelerou-se. Nas rochasdeste período surgem em grande número os primeiros animais decorpo rijo - corais, estrelas-do-mar, caracóis e trilobites.Durante os 200 milhões de anos que se seguiram a vidaexplodiu, constituindo uma profusão de formas variadas. Porvolta de 400 milhões de anos atrás tinham-se desenvolvidotodos os ramos principais do reino animal. Naquela altura, as formas mais adiantadas da vida animalestavam ainda limitadas às águas do planeta, e a terra erarelativamente estéril Mas há 350 milhões de anos atrás umaclasse de animais aquáticos - os peixes - desenvolveu meios derespiração aérea; alguns desses peixes, evoluíram paraanfíbios - os primeiros animais vertebrados (1) que seaventuraram em terra - e a partir dos anfíbios, 50 milhões deanos mais tarde, surgiram os répteis. Os répteis foram osprimeiros vertebrados a ser completamente emancipados da água.Ramos dos répteis deram origem à cobra, lagarto,tartaruga-marinha e pássaro; outros ramos produziram osdinossauros e seus descendentes, o crocodilo e o aligátor;ainda outros ramos originaram os mamíferos. Os dinossauros dominaram a Terra durante 100 milhões deanos, e durante o reinado destes répteis extremamenteprósperos os mamíferos foram reprimidos e tiveram poucoprogresso evolutivo. Mas, subitamente, há 70 milhões de anosatrás, os dinossauros desapareceram. Com o seu desaparecimentoa geração dos mamíferos floresceu sob variadas formas, atéque, por volta de 10 milhões de anos atrás, se tinhamdesenvolvido os antepassados da maior parte dos animais quehabitam a Terra de hoje, desde o lagarto até às zebras. Hádois ou três milhões de anos, tardiamente nesta evolução,entrou em cena um animal que se reconhece ser semelhante aoHomem. O registo destas mutações contém muitas lacunas, mas ossegmentos que conhecemos transmitem uma mensagem clara: oHomem evoluiu lentamente, durante milhões de anos, a partir deorganismos inferiores e mais simples. E, embora falte aprimeira parte do registo, é provável que estes organismosinferiores, por sua vez, proviessem de moléculas sem vidaformadas nas águas da Terra primitiva. Ao longo deste livro tenho mostrado como as forças básicasda Natureza - gravidade, electromagnetismo e energia nuclear--, actuando sobre as unidades constituintes fundamentais da

matéria, levaram, primeiramente, à síntese dos elementos nointerior das estrelas; mais tarde, à formação do Sol e dosplanetas a partir desses elementos; e, finalmente, nasuperfície de um destes planetas, conduziram à formação demoléculas orgânicas que se situam no limiar da vida. Mostreicomo esse limiar pode ter sido atravessado nos primeiros anosda existência da Terra. Durante esta longa historia, o meuponto de vista tem sido o do físico procurando compreender aessência do mundo à sua volta em termos de alguns princípiossimples. Poder-se-lhes-ia chamar leis da Física. Estas leissão a síntese de todas as observações em relação ao mundo físico queforam adquiridas durante milhares de anos de experiênciahumana. Agora chegámos à explicação do curso subsequente dosacontecimentos na história da vida, que procede dos primeirosorganismos simples até ao Homem. Aqui, pela primeira vez, osprincípios da Física já não são úteis. As estrelas e osplanetas revelaram os segredos da sua história aos físicos; osfundamentos moleculares dos organismos vivos começam a sercompreendidos; mas o organismo completo - mesmo da espéciemais simples e primitiva - é incalculavelmente mais complexodo que qualquer estrela, planeta ou molécula gigante. Sãonecessários novos conhecimentos para a compreensão da suaestrutura e evolução. Tem de ser encontrada uma nova lei. A nova lei foi descoberta por Charles Darwin há mais de umséculo Darwin mostrou que a evolução é o resultado de ummecanismo ou "força" na Natureza, que se exerce vagarosamentesobre as plantas e os animais, no decurso de muitas gerações,provocando mutações nas suas formas. Esta "força" não temqualquer descrição matemática; não se pode encontrar em nenhumcompêndio de Física, catalogada nas forças básicas quecontrolam o mundo da matéria inorgânica. Não obstante, elaguia o curso da evolução e modela as formas das criaturasvivas - neste planeta e em todos os planetas onde tenhasurgido vida - tão firme e seguramente como a gravidadecontrola as estrelas e os planetas. Darwin chegou à sua descoberta através de observações davida vegetal e animal efectuadas entre 1832 e 1836, duranteuma viagem à volta do Mundo no Beagle, um navio de guerrabritanico cedido para vigilancia e com uma missão decartografia no hemisfério Sul. Viajou no Beagle comonaturalista, trabalhando sem remuneracao e coleccionandoespécimes durante a viagem que o levou a circundar a maiorparte do continente da América do Sul, até à Austrália, NovaZelândia. África e muitas ilhas do Atlântico e do Pacífico. Darwin sofreu de enjoo durante os cinco anos de viagem,desde o dia que pôs o pé a bordo do Beagle até ao dia em queabandonou o convés. Pouco antes do fim da viagem, escreveu doBrasil: "Detesto... o mar e todos os navios que o navegam." Eassim que chegou a Inglaterra não voltou a embarcar, nem aabandonar o país natal. Mas, durante o resto da vida, Darwin

serviu-se da abundancia de experiências acumuladas nesta únicaviagem. Já quase no fim da vida escreveu: "A viagem no Beaglefoi, indiscutivelmente, o acontecimento mais importante daminha vida..." De 1832 a 1835 o navio navegou para Norte e para Sul nacosta da América do Sul, e, por várias vezes. durante aqueletempo, Darwin desembarcou para longas viagens de exploraçãopor via terrestre. Durante estas viagens em terra, Darwintrouxe à luz a prova que, pela primeira vez, dirigiu os seuspensamentos para a evolução. Encontrou por acaso camadas defósseis contendo os esqueletos de animais que outroravaguearam nas pampas argentinas mas que estavam extintoshavia dezenas de milhares de anos. Um deles era um toxodonte, "um dos animais mais estranhosque se descobriu", do tamanho de um rinoceronte, mas com osdentes da frente semelhantes aos de um roedor; um outro era um"animal gigantesco semelhante ao tatu", parecido com o tatumoderno da América do Sul, mas dez vezes maior. Nenhuma destas criaturas extintas era igual a qualqueranimal que viva actualmente na América do Sul; e, contudo,alguns destes oferecem uma semelhança surpreendente com asespécies existentes. Darwin meditou sobre esta "afinidademaravilhosa... entre os mortos e os vivos"; seria possível quetodos os animais que vivem na Terra descendessem directamentede espécies desaparecidas? Seria que a passagem de um vastoperíodo de tempo tivesse, em alguma medida, provocado asalterações entre esses animais antigos e os seus descendentesmodernos? Mais tarde, na viagem, outros fatos exerceram influênciaem Darwin. O Beagle parou por um mês nas ilhas do arquipélagodos Galápagos, situado no equador a 800 quilômetros a Oeste dacosta da América do Sul. Durante a visita, Darwin notou um"traço muito notável" nestas ilhas: embora estivessem muitoperto umas das outras, e o clima e o solo fosse o mesmo emtodas, nelas viviam plantas e animais de espécies diferentes.Algumas ilhas até possuíam plantas ou animais que só se podiamencontrar naquelas ilhas. Na ilha Jaime, por exemplo, Darwinencontrou trinta espécies de plantas que estavamexclusivamente limitadas àquela ilha, e que não se encontravamem mais nenhuma parte do Arquipélago. Escreveu: "Nunca penseique ilhas, distanciadas de 75 a 80 quilômetros... formadasprecisamente das mesmas rochas, colocadas num clima bastantesemelhante... pudessem ser habitadas por locatáriosdiferentes..." Darwin meditou profundamente sobre a natureza"eminentemente curiosa" destas variações de espécies; se todasas formas de vida na Terra tivessem sido aqui colocadas pormeio de actos separados de criação, por que razão era a forçacriadora tão pródiga em colocar espécies distintas em cadailha dos Galápagos? Uma outra observação levou Darwin à resposta. Observouigualmente que a maior parte dos animais das ilhas eram

semelhantes a animais caracteristicos das proximidades docontinente da América do Sul, e que não podiam ser encontradosem mais nenhuma parte do mundo. O significado deste facto nãoocorreu a Darwin até voltar da viagem do Beagle, em 1836.Depois formulou uma explicação: há muito tempo as plantas,insectos, aves, répteis e mamíferos, levados pelas correntesde ar e pelo vento, ou boiando em madeiras flutuantes, devemter chegado ao arquipélago vindos da costa adjacente. Isoladosdo continente, evoluíram atingindo formas que vieram a diferircada vez mais, com o correr do tempo, das dos seus primos docontinente. Além disso, quando as plantas e os animaismigradores chegaram pela primeira vez ao arquipélago e seestabeleceram, eram idênticos em todas as ilhas; mas foram-sedesenvolvendo gradualmente linhas distintas de evolução emcada uma, devido a estarem as ilhas isoladas e raramenteocorrerem cruzamentos de raças entre as ilhas. Deste modo asilhas separadas adquiriram a sua flora e a sua faunacaracterísticas. O raciocínio de Darwin implicava que as formas de vidapodiam mudar e evoluir com o decorrer de muitas gerações. Em1838 estava convencido de que "fatos como estes... só podiamser explicados com base na suposição de que as espécies semodificam gradualmente". Estava convencido da veracidade daevolução. Estes pontos de vista eram contrários às opiniões de muitoscientistase de quase todos os leigos, sendo a opinião geral que todas asformas de vida tinham sido criadas especial eindependentemente. Eram também contrários às opiniões mantidaspelo próprio Darwin quando entrou a bordo do Beagle em 1832.Seis anos mais tarde, porém, Darwin entendeu que não podiaignorar as provas que se lhe haviam deparado nas pampas, aodesenterrar com as próprias mãos esqueletos fósseis, algunsprofundamente semelhantes a formas vivas, do solo daArgentina; nos Galápagos vira com os próprios olhos asemelhança básica da vida animal da ilha com a vida docontinente da América do Sul; e observara as diferenças entreespécies correspondentes em várias ilhas do Arquipélago. Mas como podia Darwin convencer um mundo céptico de quedevia aceitar uma teoria que violava as convicções básicas?Escreveu posteriormente na sua Autobiografia em relação à suacrença na evolução: "O assunto obcecou-me... Parecia-me quaseinútil tentar provar por demonstração indirecta..." Assim, procurou uma prova directa: procurou uma causa daevolução - um princípio da Natureza que tornasse a evolução umaspecto necessário e inevitável da vida e, simultaneamente,explicasse as diferentes formas que as plantas e os animaistinham adquirido. Durante os anos que se seguiram à viagem no Beagle, opensamento de Darwin virou-se para o problema de procurar umacausa para a evolução. As linhas gerais de uma teoria novaforam surgindo gradualmente. É difícil de precisar quando é

que Darwin viu a luz pela primeira vez; sem duvida, começou acompreender a verdade aos poucos; mas por volta do final de1838 a nova lei da Natureza foi claramente formulada nos seuslivros de apontamentos. Não a anunciou, porém, imediatamenteao mundo; sabia que a crença na evolução podia torná-lo umafigura impopular. "É como confessar um assassínio", escreveuele mais tarde. De modo a consolidar a sua causa, coleccionou,primeiramente, todos os fragmentos de testemunhos que podiamapoiar a questão; em 1844 escreveu: "Li montes de... livros, enunca parei de coleccionar fatos"; e em 1858: "Sou comoCreso, soterrado em riquezas e fatos,". Finalmente, emNovembro de 1859 a teoria de Darwin surgiu impressa (2) com otítulo de

a origem das espéciespor meio de selecção naturaloua preservação de raças favorecidasna base da luta pela vida

Os receios de Darwin em relação à aceitação da sua teoriaforam imediatamente confirmados ao publicá-la. A primeiraedição da Origem despertou muito interesse; esgotou-se toda atiragem no dia em que surgiu, e o seu autor foi saudado comuma onda de vitupério e ridículo como nunca tinha acontecidocom qualquer outra obra na história da Ciência. Depois delê-la, o seu professor de Geologia de Cambridge escreveu-lhe:"Ri... a bandeiras despregadas... completamente falso eatrozmente pernicioso... profundamente atolado na loucura."Outros críticos foram menos gentis; um crítico anónimoescreveu na Edinburgh Quarterly Review sobre a "miserávelconjectura e especulação" de Darwin "...desonrosa para asciências naturais". Mas o argumento apresentado em A Origem das Espécies eramaravilhosamente simples e claro; a sua validade devia tersido evidente a qualquer pessoa. Darwin começou com umconjunto de observações, quase evidente por si mesmas, sobre anatureza da vida: todos os seres vivos se reproduzem; areprodução é a essência da vida; mas o processo de reproduçãonunca é perfeito. A descendência em cada geração não é umacópia exacta dos pais; os irmãos e as irmãs diferem uns dosoutros; não existem dois indivíduos no mundo exactamenteiguais, a não ser os gémeos idênticos no momento donascimento. Normalmente, as variações são pequenas; os irmãos e asirmãs assemelham-se uns aos outros, todos os seres humanos separecem mais ou menos uns com os outros, e todos os elefantesse parecem mais ou menos com os outros elefantes. Darwin, porém, declarou que estas diferenças sãoimportantes criticamente; pois, na luta pela existência, acriatura que se distingue dos irmãos por alguma característicaespecial que lhe dê uma vantagem na competição pelo alimento,

ou na luta contra os rigores do clima, ou na luta contra osinimigos naturais da sua espécie - essa criatura é a maissusceptível de sobreviver, de atingir a maturidade, e dereproduzir a sua espécie. Alguns descendentes do indivíduofavorecido adquirirão por hereditariedade a característicavantajosa; alguns irão possuí-la em maior grau do que os pais.Estes indivíduos são ainda mais susceptíveis de sobreviver ede gerar descendência. Deste modo, ao longo de gerações sucessivas, acaracterística vantajosa surge nos descendentes do indivíduocom uma intensidade cada vez maior do que a que ele possuía aprincípio. Com o decorrer de gerações sucessivas, não só acaracterística se torna mais declarada, mas também aumenta onúmero de indivíduos que a possui. Assim, estes indivíduosfavorecidos possuem uma família ligeiramente maior do que amédia, porque eles e a sua descendência têm uma probabilidademaior de sobrevivência; em todas as gerações deixam um númeromais elevado de descendentes do que os seus semelhantes menosfavorecidos; os descendentes multiplicam-se mais rapidamentedo que o resto da população, e, com o decurso de muitasgerações, a sua progenitura substitui a progenitura dos seresem que esta característica, que seriadesejável, estava ausente. Em A Origem das Espécies, Darwin deu a este processo o nomepor que é hoje conhecido: "A este princípio de preservação oude sobrevivência do mais preparado resolvi dar o nome deselecção natural." Por meio da acção da selecção natural, uma característicafavorável, que primeiramente surgiu como uma variaçãoacidental num único individuo, com o decorrer de temposuficiente tornar-se-á uma característica declarada de toda aespécie. Assim, o veado adquiriu pés ligeiros, uma vez que emcada geração, o veado que corresse mais velozmente escaparia,normalmente, ao perseguidor e sobreviveria, oferecendo àgeração seguinte uma progenitura mais numerosa. Deste modo, oHomem tornou-se mais inteligente, pois a inteligência superiorera de valor recompensador: o caçador inteligente edesembaraçado era o que tinha mais probabilidades de obteralimento. Foi deste modo que se desenvolveu o cérebro humano;e foi também deste modo que, em resposta a outras pressões eoportunidades existentes no ambiente, se desenvolveu a trombado elefante e o pescoço da girafa. é claro que a incorporação de uma nova característica nãocria um animal completamente novo. Mas, se contarmos todos osnascimentos que ocorrem numa só espécie por toda a superfíciedo Globo no prazo de um ano, surgirá um número enorme devariações nesta multidão de criaturas novas. Em todas estasvariações funciona constantemente o mesmo processo deselecção, preservando para gerações futuras as novascaracterísticas que fortalecem as espécies, e eliminando asque revelam fraqueza. As modificações podem ser imperceptíveis

de uma geração para a outra, mas com o decorrer de muitasgerações a acumulação de muitas variações favoráveis, cadaqual pequena em si própria, transformará completamente oanimal. De acordo com Darwin, "a Selecção Natural verifica-sediariamente e a toda a hora por todo o mundo, com variaçõesmínimas, rejeitando os que são deficientes, preservando eaumentando os que são positivos; trabalhando silenciosa eimperceptivelmente no melhoramento de cada ser orgânico emrelação às... condições de vida". A selecção natural molda as formas de vida. Sob esta acçaocontínua, as formas dos animais mudam com o tempo; as espéciesantigas desaparecem em resposta a condições mutáveis e surgemoutras novas Algumas espécies de animais que vaguearam pelasuperfície da Terra há 10 milhões de anos ainda existem hoje,e algumas das que existem actualmente sobreviverão 10 milhõesde anos a partir desta altura. Fazendo mais uma vez umacitação de A Origem das Espécies: "...Nenhuma das espéciesvivas transmitirá a sua semelhança sem alterações a umafuturidade distante." Mas a selecção natural opera subtilmenteos seus efeitos. A influência não é sentida num indivíduo ounos seus descendentes imediatos. Pode passar um milhar degerações sem que se torne visível qualquer alteração; noHomem, isso equivale a 20.000 anos. Contudo, desde queRutherford mediu a idade da Terra, sabemos que existe temposuficiente para isso. O nosso planeta existe há milhões deanos; esta é a força secreta da teoria de Darwin. "Temos umtempo quase ilimitado", escreveu ele em 1858, ao explicar comoé que podem aumentar as variações mínimas na forma de umanimal, por meio do seu efeito na probabilidade de gerarprogenitura, até que, depois de "milhões sobre milhões degerações", se realizaram grandes modificações. E na Origem: "O espírito humano não pode captar o pleno significado doprazo de um milhão de anos; não pode adicionar e compreenderos efeitos completos de muitas variações minimas, acumuladasdurante um número quase infinito de gerações... Não vemosnenhuma destas modificações em curso, até que o tempo tenhadecorrido, e então... só vemos que as formas de vida são agoradiferentes do que eram anteriormente." Os críticos de Darwin não estavam habituados a pensar emtermos de milhões de gerações e em dezenas de milhões de anos;acusaram-no de propor que a selecção natural podia converter"uma ostra num orangotango" ou "girinos em filósofos";censuraram-no pela incapacidade de fornecer um tipo hipotéticointermediário entre duas espécies-o animal apanhado num pontointermédio da transição de uma espécie para outra. Uma revistabritanica escrevia em 1861: "Desafiamos qualquer um, desdeDarwin até aos nossos dias, a mostrar-nos o elo de ligaçãoentre o peixe e o homem. Eles que apanhem uma sereia..." O infortunado naturalista não podia obrigá-los. Durante alonga batalha para a aceitação dos seus pontos de vista,Darwin foi constantemente importunado pela incapacidade decomprimir a escala de tempo da Natureza e de demonstrar aos

críticos a transformação das espécies. Se ele soubesse quehavia um exemplo à mão que lhe podia ter fornecido a prova deque precisava... O caso era um dos extremamente raros em que amaior alteração evolutiva se deu num breve intervalo decinquenta anos. O animal que sofreu a transformação era um membro do mundodos insectos, a humilde Peppered Moth, que existia emabundancia por toda a Inglaterra. No século dezanoveconheciam-se duas variedades desta borboleta. Uma possuía umacoloração matizada, confundindo-se perfeitamente no ambientede troncos de árvores cobertos de líquenes que lhesproporcionavam o lugar de descanso habitual. A outra variedadeera escura, de tonalidade quase preta, e sobressaíamanifestamente do ambiente claro de líquenes e de cascas deárvores. A variedade matizada, conhecida por Peppered Moth,era a forma mais vulgar; a variedade escura era facilmenteescolhida e devorada pelos pássaros, e relativamente rara. Durante o século dezanove, a fuligem foi escurecendoprogressivamente os troncos das árvores dos condados centraisde Inglaterra Cerca de duas toneladas de fuligem caíam todosos dias em cada quilómetro quadrado de algumas cidades industriais naquelaárea. A coloração matizada da Peppered Moth, queoriginariamente devia ter surgido como uma mutação ocasional,tinha-se desenvolvido e aperfeiçoado pela acção da selecçãonatural durante muitas gerações, devido aos seus efeitosfavoráveis na luta pela sobrevivência. Esta mesmacaracterística, devido a uma alteração no ambiente, neste casomotivada pelo homem, colocava, agora, o seu possuidor numadesvantagem: a Peppered Moth sobressaía com clareza doambiente de troncos de arvores cobertos de fuligem, e erafacilmente detectada pelos pássaros da região. A borboletapreta, por outro lado, confundia-se bem no novo ambiente; acaracterística que primeiramente fora desvantajosa era agoravantajosa, elevando as possibilidades de sobrevivência até àmaturidade e à geração de descendência. A borboleta escura, em tempos uma variedaderara, multiplicou-se em número, ate que se tornou uma formadominante. A alteração foi dramática e rápida; a primeiracaptura registada de uma borboleta escura efectuou-se emManchester, em 1848, e em 1900 a borboleta escura excedeu emnúmero a variedade matizada na proporção de 99 para 1. Mesmo se Darwin tivesse sido capaz de apresentar o exemploda Peppered Moth, duvida-se que tivesse podido calar as vozesda crítica pois as objecções à teoria da evolução não foram sólevantadas com base na razão. Houve também uma reação emotivaàs implicações da teoria da ascendência do Homem. Na Origem,Darwin evitara deliberadamente a discussão da ascendência doHomem; durante a elaboração do livro escreveu a um amigo:"Perguntas-me se discutirei sobre o Homem. Penso que evitareitodo o problema..." Os críticos de Darwin foram rápidos afornecer a discussão que faltava: Darwin afirmava que as

forças da Natureza, actuando por meio da luta pelasobrevivência, funcionam continuamente para o melhoramento detodas as formas de vida; seguia-se que todos os animaisexistentes actualmente na superfície da Terra devem terdescendido de um antepassado aparentado, mas mais primitivo.Quais os animais que forneciam uma pista para a ascendência doHomem primitivo? Os macacos e gorilas estavam numa fase menosavançada do que o Homem, contudo mais próximos dele em forma eem inteligência do que qualquer outra criatura; representavamformas primitivas do ser humano. O macaco grotesco e o gorila,animal bruto, eram semelhantes aos antepassados do Homem. Muitos defensores que se pronunciaram a favor da nobrehereditariedade do Homem colocaram-se contra o cientistairreflectido e blasfemo. Um dos anti-Darwinistas mais notávele eloquente foi Samuel Wilberforce, bispo de Oxford. Em 29 deJunho de 1860, seis meses depois da publicação da Origem, 700pessoas reuniram-se num átrio, na Universidade de Oxford, paraouvir o bispo Wilberforce discutir os méritos da teoria deDarwin com o biólogo Thomas Huxley, que se tornara o adeptomais ardente de Darwin. Quase no fim do debate, o bispoWilberforce virou-se para Huxley e perguntou: "Foi pela avó oupelo avô que ele se reclamou descendente de macaco?" A resposta de Huxley é uma das réplicas mais famosas nahistória da Ciência. Segredando para quem estava ao lado "Deusentregou-mo às minhas mãos", ergueu-se e disse: "Se meperguntarem se escolheria ter descendido de um pobre animal,dotado de inteligência de nível baixo, de porte inclinado paraa frente, que guincha e faz barulho quando passamos por ele -ou de um homem, dotado de grande capacidade e com uma posiçãoesplêndida, que utilizasse esses dons para desacreditar eesmagar humildes investigadores da verdade, hesito qual aresposta a dar". Os argumentos contra os pontos de vista de Darwin amainaramgradualmente durante a década de 1860. Levantaram-se novamentequando a Ascendência do Homem foi publicada, em 1871. Nestelivro, Darwin apresentava os seus pontos de vista sobre aorigem e a história do Homem, confirmando as suspeitas maissecretas dos criticos ao expor uma demonstração unindo o Homeme os macacos a um antepassado comum. Mas por volta do ano emque Darwin morreu, em 1882, as suas teorias foram largamenteaceites no mundo científico, e provocaram um impactoconsiderável na maneira de pensar de todos os homens. Hoje, osconceitos básicos da teoria darwiniana da evolução contampoucos adversários. \\\ (1) Um vertebrado é um animal que possui uma espinha dorsale um esqueleto interno, distinto dos invertebrados, como, porexemplo, o insecto, cujo esqueleto é externo e circunda ocorpo. (2) Darwin podia ter adiado a publicação e coleccionadodados até ao fim da vida se um acidente histórico o não

tivesse incitado à acção. Durante anos, os colegasinstigaram-no à publicação; avisaram-no de que seriaultrapassado se a adiasse. Em Junho de 1858, as antevisõestornaram-se realidade; Darwin recebeu uma carta do naturalistaAlfred Russel Wallace, propondo a teoria da evolução formuladamuito claramente e idêntica à de Darwin, mas por caminhosindependentes. Amigos planearam a apresentação de umacomunicação à Royal Society com os nomes de Darwin e Wallaceassociados. Então, Darwin lançou-se ao trabalho a sério. Em1859, depois de 13 meses e 10 dias de trabalho árduo, A Origemdas Espécies apareceu, e tornou-se evidente que Darwin tiveramuito mais trabalho a coleccionar provas para a defesa da suateoria do que Wallace. Na Origem, foi a acumulação depormenores, e a análise meticulosa de Darwin das provas, queeventualmente venceu a oposição feroz à teoria e assegurou asua aceitação.

iiiii

um exemplo de selecção natural. Em A Origem das Espécies,Darwin sustenta que é a luta pela sobrevivência que modela asformas das criaturas vivas. Os individuos dotados, à nascença,de características especiais que lhes permitem competir peloalimento, resistir aos rigores climatéricos e escapar adepredadores são aqueles que têm mais probabilidades deatingir a maturidade e de se reproduzir. Transmitem igualmenteas suas características favoráveis aos descendentes ao longode muitas gerações. Estas mutações evolutivas processam-se normalmente de umamaneira demasiado lenta para que possam ser observadas duranteo lapso de uma vida; no entanto, no caso da Peppered Moth(variedade de traça existente em Inglaterra), deu-se umaimportante mutação evolutiva no periodo de meio século. Na suaforma original, este insecto possuia uma coloração matizada debranco e cinzento, a qual Ihe permitia contundir-seperfeitamente com os troncos de árvores cobertos de líquenes eproteger-se das aves perseguidoras. Vemos na fotografia 1A umespécime matizado, que quase se confunde com o tronco daárvore (canto inferior direito da fotografia). Na mesmafotografia aparece uma segunda variedade, de cor muito escura,resultante de uma excessiva produção de melanina. Em épocasanteriores os espécimes de cor escura eram raros, uma vez quesobressaíam nitidamente sobre os troncos das árvores, onde ospássaros os detectavam facilmente (1B). Em consequência das transformações ambientais decorrentesda Revolução Industrial, a fuligem foi escurecendo os troncosdas árvores de extensas áreas da Inglaterra, contra os quais aPeppered Moth se tornou presa fácil das aves, ao passo que avariedade escura, visivel na parte inferior da fotografia 2A,passou a contundir-se com as árvores cobertas de fuligem. Estamodificação do meio ambiente teve como consequência a rápidadizimação da Peppered Moth (2B); segundo um censo efectuado em

1900, a variedade escura converteu-se em pouco tempo naespécie predominante, excedendo a forma original desta traçana proporção de 100 para 1. Muitas espécies de traças e borboletas estão a tomar, emInglaterra, uma coloração mais escura como consequência demodificações ambientais decorrentes da industrialização,modificações essas que transformaram uma mutação anteriormentedesfavorável, o excesso de melanina, numa mutação favorável nolapso de apenas cinquenta anos.

14. ADN E DARWIN

Durante os anos em que as idéia s de Darwin foram ganhando aceitação cada vez maior, houve um ponto que ficou obscuro.Qual era a origem das variações de um indivíduo para outro queforneciam a matéria-prima para a selecção natural? No que dizrespeito a estas variações, que desempenharam um papel tãoessencial na sua teoria, Darwin só podia dizer impotentemente:"Ignoramos por completo a causa de cada variação mínima oudiferença individual... (Elas) parecem-nos, na nossaignorancia, surgir espontaneamente." A ignorancia não foicompletamente dissipada até 1953, cerca de um século depois dapublicação da Origem, quando se tornou claro o processo peloqual as características básicas do indivíduo se transmitem degeração para geração. Estas características residem namolécula denominada ADN, que se encontra nas células de todosos organismos vivos da Terra. A molécula ADN é uma longacadeia de moléculas mais pequenas chamadas nucleótidos, queestão dispostas numa sequência especial em cada organismo.Como já mencionámos, não há dois indivíduos no Mundo, exceptogémeos idênticos, que possuam a mesma sequência de nucleótidosno ADN. Esta sequência determina quais as proteínas que sereunirão nas células do corpo; e as proteínas, por sua vez,controlam a química do corpo e todas as características doindivíduo. Deste modo, em cada criatura, o ADN contém um planoprincipal para essa criatura.Sabemos hoje em dia que, ocasionalmente, alguns destesnucleótidos da molécula ADN se encontram deteriorados,alterados ou completamente ausentes da molécula, de modo que oplano principal é alterado. A deterioração ou alteração podeafectar só um nucleótido na longa cadeia - uma cadeia quepode, nas células humanas, estender-se para além de milmilhões de nucleótidos. Contudo, a alteração num úniconucleótido pode ser criticamente importante, pois as proteínasna célula são reunidas a partir de aminoácidos numa sequência

que segue a ordem dos nucleótidos no ADN. A deterioração deum destes nucleótidos, ou a substituição de um nucleótido poroutro de tipo diferente, levará à união de uma proteínadiferente, na qual, em dado ponto ao longo da cadeia deaminoácidos que constituem a proteína, está localizada aespécie errada de aminoácido. Por vezes a proteína alterada é capaz de desempenhar o seupapel normal na química da célula. Outras vezes, quando oaminoácido impropriamente colocado está instalado num lugarcrítico, a eficácia da proteína é destruída. Quando um ADN modificado e a proteína modificada produzidapor ele estão situados numa célula comum do corpo, a célulaanormal é logo substituída pelo crescimento de células novas e0 efeito da alteração na molécula ADN desaparece rapidamente.Contudo, num tipo de células existente no corpo, umamodificação na sequência de nucleótidos na molécula podetrazer consequências sérias e permanentes. É o caso dacélula-gérmen - espermatozóide no macho e óvulo na fêmea Comotodas as outras células, a célula-gérmen contém o seu conjuntode moléculas ADN com o plano principal para o desenvolvimentodo indivíduo Quando o espermatozóide e o óvulo se unem,formando um ovo fertilizado, cada órgão no corpo do indivíduoem estado de maturidade desenvolve-se Subseqüentemente apartir do ovo por meio da divisão celular repetida, seguindoum novo plano principal resultante da combinação das moléculasADN provenientes do espermatozóide e do óvulo participantes naunião. Se o ADN, numa destas duas células-gérmen, tiver sidodeteriorado ou alterado, o efeito da modificação surgirá emtodas as células do corpo do novo indivíduo. Além disso, serátransmitido à descendência deste indivíduo na geraçãoseguinte, e consequentemente em todas as gerações seguintes.Todos os descendentes desse indivíduo, através dos tempos,manterão o traço da alteração na sequência de nucleótidos noADN hereditário. Uma modificação dos nucleótidos no ADN da célula-gérmenchama-se mutação. As mutações são alterações na química docorpo do indivíduo "que se transmitem à sua progenitura". Sãoas variações hereditárias que formem a base da teoria daevolução de Darwin. Algumas mutações transformam a química do corpo, de modoquemelhoram as possibilidades de sobrevivência do indivíduo; sãochama das mutações "favoráveis". Os indivíduos que possuem umamutação favorável são os que, mais provavelmente, propagam asespécies; de geração para geração o seu número aumentafirmemente, e com o decurso de muitas gerações a mutaçãofavorável estende-se por toda a população. As mutações tambémpodem ser "desfavoráveis", diminuindo a possibilidade desobrevivência até à maturidade e, por isso, a possibilidade degerar descendência. Estas mutações são gradualmente eliminadasda população. Este é o processo segundo o qual a evoluçãoactua: podando as mutações desfavoráveis ao mesmo tempo que se

reforçam as favoráveis. Qual é a causa das mutações? Que é que pode deteriorar oumodificar a sequência de nucleótidos nas células-gérmen de umorganismo? Quando soubermos a resposta a esta pergunta,estaremos perto da compreensão da causa da evolução. Uma causa das mutações reside no próprio organismo. De vezem quando, ocorre um erro - uma imperfeição - no processo deduplicação pelo qual a molécula ADN se reproduz. No princípiodo processo de reprodução, precisamente antes da divisão deuma célula em duas células-filhas, na célula-mãe o ADN defilamentos bipartidos desprende-se e divide-se em doisfilamentos simples. Cada filamento reúne novos nucleótidos apartir do mar de nucleótidos que flutuam na célula, formandoum novo ADN de filamentos bipartidos, duplicando o original. Énesta altura que pode surgir o erro na reprodução. Um dosnucleótidos recentemente adicionados pode ser de uma espécieimprópria; isto é, não consegue assemelhar-se ao duplicado dofilamento existente. Como resultado, quando a reunião das duasmoléculas ADN estiver completa, a sequência de nucleótidos numdos ADN-filhos difere da sequência de nucleótidos existente noADN-original. Aquele ADN-filho sofreu uma mutação. Os erros na reprodução não são a única origem das mutações.A molécula ADN pode ser também alterada por produtos químicos,caso estes entrem no fluxo sanguíneo. o gás-mostarda, o gásvenenoso da Primeira Guerra Mundial, é eficaz por esteprocesso. O LSD parece que provoca um sério dano à moléculaADN. O ADN pode também ser alterado por partículas ouradiações que sejam suficientemente energéticas para penetrarno corpo. o aparelho de raios X utilizado na medicina é umafonte de penetração da radiação. As explosões de bombasnucleares são outra. Para além destas fontes provocadas peloHomem, existem ainda os raios cósmicos - partículas produzidaspor forças desconhecidas em regiões afastadas do Universo -que bombardeiam a Terra de todas as direcções. Por vezes, querum raio cósmico, quer uma radiação produzida por uma fonteartificial, atravessarão a célula-gérmen, mesmo se esta célulaestiver profundamente introduzida no corpo, e quebrarão asequência normal de nucleótidos no seu ADN, produzindo umamutação. Qual destas fontes é a causa primeira das mutações? O gás-mostarda, os aparelhos de raios X e as bombas nuclearessão produtos recentes da invenção do Homem; não existem hátempo suficiente para terem provocado uma influênciaapreciável no curso da evolução. Mas os erros na reproduçãotêm ocorrido desde o princípio da vida na Terra; eprovavelmente os raios cósmicos existem desde o começo dostempos. Podemos supor que estas duas fontes desempenharampapéis de comparável importância na história do passado doprocesso evolutivo. Se o ritmo da mutação ou o futuro ritmo datransformação evolutiva será consideravelmente aumentado pelasoutras fontes de mutação provocadas pelo homem, e se o aumentomelhorará ou enfraquecerá a espécie humana - estas são

questões em suspenso.

15. A ascendência do homem

No decurso de 3 mil milhões de anos, a vida na Terraevoluiu de um caldo de moléculas orgânicas para o cortejo deanimais que actualmente se move na superfície do planeta.Entre estes animais encontra-se o Homem Por meio de quesequência de acontecimentos surgiu ele de um caldo de ADN e deproteínas? Que circunstancias guiaram o curso da evoluçãodesde os organismos primitivos até à expressão mais alta davida sob a forma do ser humano? A história destes acontecimentos começou provavelmente como aparecimento das primeiras moléculas autoduplicadoras naságuas da Terra. Estas moléculas eram semelhantes ao ADN, epodiam ter sido idênticas a ele. As águas também continhamaminoácidos. Por um processo qualquer, que não fomos aindacapazes de reconstruir no laboratório, essas moléculasautoduplicadoras desenvolveram a capacidade de servirem deguias à união de aminoácidos que formaram proteínas Aprincípio, as moléculas ADN eram filamentos pequenos contendosomente alguns nucleótidos, e apenas podiam unir proteínassimples. Com o decorrer do tempo evoluíram, formando cadeiasmais compridas capazes de reunir proteínas complexas de váriasespécies. Algumas destas proteínas eram as enzimas primitivas;activaram as reacções químicas quelevaram ao crescimento e reprodução do ADN. Outras proteínaseram estruturais: pertenciam à mesma espécie que formava asparedes celulares. Com o aparecimento das proteínas estruturais, tornou-sepossível um novo avanço na organização da matéria viva. Amolécula ADN passou a residir no centro da célula, cuja paredeera uma membrana porosa que permitia a passagem de pequenasmoléculas, tais como os aminoácidos e os nucleótidos, dofluido circundante para o interior, mas não permitia que asmoléculas maiores, tais como o ADN e as proteínas unidas sob oseu controlo, saíssem outra vez na direção contrária. O desenvolvimento primitivo da célula, concentrando nasproximidades do ADN todos os produtos químicos necessários aocrescimento e reprodução, marcou o maior passo individualjamais dado no curso evolutivo. Devem ter sido precisas muitascentenas de milhões de anos para a evolução da célula; mas,uma vez aparecida, esta eficiente forma de vida deve ter-sedisseminado com rapidez pelas águas da Terra submergindo esubstituindo todas as moléculas sem células que a precederam. Podemos supor que num período relativamente pequeno -talvez no espaço de 100 milhões de anos - o organismounicelular evoluiu, formando uma colónia de células. Com acontinuação do tempo, os grupos de células no interior dessascolónias assumiram funções especializadas de obtenção de

alimento, assimilação, as características estruturais de umapele exterior, etc.; começou deste modo a fase da evolução quedeu origem às criaturas complexas e multicelulares que dominama vida de hoje. O registo de fósseis não contém qualquer vestígio destasfases preliminares no desenvolvimento de organismosmulticelulares. As primeiras pistas para a existência deformas de vida relativamente avançadas consistem em poucosvestígios dificilmente discerníveis, provavelmente deixados nalama primeva por animais moles e que se deslocavamcontorcendo-se como vermes. Podem encontrar-se estes vestígiosem rochas com cerca de mil milhões de anos. Um pouco maistarde, surgem registadas luras de vermes bem definidas. Estesescassos vestígios são os traços mais primitivos da vidaanimal multicelular no planeta. Pouco mais surge no registo fóssil durante aqueles vários eprimeiros milhares de milhões de anos. Um dos mistérios noestudo da vida é o facto de que subitamente, em rochas com 600milhões de anos, o registo expande-se numa profusão de formasvivas. No registo daquele período surge uma grande variedadede animais. Talvez as formas de vida tivessem sido,precisamente antes desta data mágica, quase tão numerosas etão populosas, mas não deixaram qualquer vestígio da suaexistência porque eram desprovidas da protecção dura para ocorpo, que é o mais fácil de ser preservado. Há pouco mais de 400 milhões de anos atrás ocorreu umacontecimento que é de grande consequência para odesenvolvimento do Homem Apareceu então, pela primeira vez,uma nova espécie de criatura - com um esqueleto interno e umaespinha dorsal. Este animal - o vertebrado - evoluiu a partirde um antepassado parecido com o verme, assemelhando-se aoanfioxo moderno, uma criatura pequena e translúcida,desprovida de barbatanas e de maxilares, mas possuindo guelrase, ainda mais importante, uma versão primitiva da espinhadorsal. Entre os descendentes dos primeiros vertebrados estavam ospeixes. Alguns destes peixes primitivos possuíam pulmõesrudimentares, com que engoliam ar à superfície da água, bemcomo guelras. Estes pulmões desapareceram ou foramtransformados, na maior parte dos casos, para outrasutilizações, mas em algumas formas de peixes, talvez nos queviviam em quantidades reduzidas de água, como pequenos lagos elagoas, os pulmões vieram a ter uma utilização freqüênte.Sempre que se verificava uma seca e o nível da água descia noslagos, os peixes com maior capacidade pulmonar sobreviviam, aopasso que os outros pereciam. Viviam para gerar umaprogenitura que adquiria por hereditariedade a capacidadesuperior de respirar ar. Deste modo, desenvolveram-segradualmente pulmões eficientes entre os peixes que habitavamquantidades de água com pouca profundidade. Alguns dos peixes de respiração pulmonar estavam duplamentefavorecidos por possuírem vigorosas barbatanas que lhes

permitiam moverem-se, com andar gingado, na terra, de um lagopara outro em busca de água. Por meio de uma acumulação lentade mutações favoráveis, os músculos e os ossos das barbatanastransformaram-se gradualmente numa forma própria para alocomoção em terra. Deste modo, a barbatana deu origem àperna. A metamorfose deu-se durante um período de uns 50milhões de anos, e durante igual número de gerações. Oresultado foi um animal de quatro patas, de respiraçãopulmonar, conhecido por anfíbio. O anfíbio estava ainda ligado à água, porque a pelerequeria uma humidificação freqüênte; além de os ovos, taiscomo os do peixe, serem desprovidos de um invólucro duro: casofossem depositados na terra, secavam e o embrião morria. Porisso, os ovos do anfíbio tinham de ser postos na água ou emlocais húmidos. Os anfíbios nasciam na água, viviam a maior parte da suavida adulta nas proximidades da água, e quase sempre voltavamà água para porem os ovos. Desenvolveram-se durante cinquentamilhões de anos nas praias e nas margens dos rios. Algunstornaram-se carnívoros grandes e agressivos, com cerca de trêsmetros de comprimento, não receando quaisquer outros animaisdo seu tempo. Os anfíbios atingiram o ponto máximo do seutamanho há 250 milhões de anos atrás, e a partir de entãoentraram em declínio. Hoje, os seus descendentes comuns são adiminuta rã, o sapo e a salamandra. Com o decorrer do tempo, alguns dos anfíbios antigos, maisuma vez devido a um acontecimento fortuito na sucessão demutações favoráveis, desenvolveram a capacidade de pôr ovos emterra. Estes ovos estavam encerrados numa casca dura, queretinha a humidade e proporcionava ao embrião o seu marprivativo de fluido. Outras mutações originaram uma pele rijaque preservava a água no corpo sem necessidade de uma imersãocontínua. Tais criaturas estavam completamente emancipadas daágua. Eram os primeiros répteis Os répteis marcaram um passo triunfante na evolução, poistinham acesso a recursos alimentares ricos que antes eramnegados aos peixes e aos anfíbios. Os répteisdesenvolveram-se, atingindo uma grande variedade de formas,incluindo os antepassados de todos os animais terrestres comespinha dorsal actualmente existentes na Terra. Alcançaram ozénite evolutivo com os dinossauros, animais que dominaram aTerra durante 100 milhões de anos. Ostentavam um vigorextraordinário, evoluindo para formas extremas, como o gigantevegetariano habitante dos pântanos, Brontossauro, com 20metros de comprimento e 30 toneladas de peso; e o carnívoro,Tyrannosaurus rex, com 12 metros de altura, com uma caixacraniana de 1 metro e vinte, munido de dentes afiados como alamina de um punhal -indiscutivelmente o depredador terrestremais feroz que o mundo jamais viu. Há duas centenas de milhões de anos, um pouco antes doaparecimento dos primeiros dinossauros, um outro ramo daclasse dos répteis virou para um rumo completamente diferente.

Este grupo específico pode ter vivido na orla da zonatemperada, onde o tempo atmosférico era relativamente severo.Através da acção da selecção natural em variações fortuitas, onovo ramo de répteis adquiriu um conjunto de característicasque os adaptou, de modo único, para a sobrevivência num climarigoroso. Desenvolveram as características rudimentares de umanimal de sangue quente. A pele nua e escamosa do réptil foisubstituída, nestes animais, por casacos isoladores de pêlos ede peles que os mantinham quentes sob temperaturas baixas,enquanto as glândulas sudoríparas debaixo da pele, controladaspor um termóstato interno, refrescavam o corpo por meio daevaporação quando a temperatura se elevava demasiado. Estas características desenvolveram-se lentamente duranteum período de dezenas de milhões de anos. Outras modificaçõesse efectuaram simultaneamente. Muitos répteis de quatro patastinham uma posição de corpo pesada e desajeitada com as pernassaindo do tronco: o movimento rápido era impossível com umesqueleto construído deste modo. Na nova linha de evolução, aspernas puxadas para debaixo do corpo, elevando-o do chão,permitiram o andar rápido e a corrida. Surgiram modificaçõesimportantes nos dentes: perto da parte da frente da bocaexistiam dois caninos grandes, apropriados para rasgar bocadosde presa; por detrás destes, existiam dentes pontiagudossemelhantes aos molares, para cortar e triturar o alimento,dividindo-o em porções mais pequenas. Com tais dentes, épossível um reabastecimento rápido de energia e um nível deactividade contrastante com o entorpecimento pós-prandial doréptil que engolia a sua presa por inteiro. Estes animais, lembrando um cruzamento entre o lagarto e ocão, constituíram o tronco ancestral dos mamíferos. Os mamíferos de hoje possuem outras características, paraalém de terem sangue quente, que os distinguem dos seusantepassados répteis; destas, a mais importante é um processoexcepcionalmente eficiente de cuidarem das suas crias. Osrépteis põem os ovos e normalmente não revelam mais nenhuminteresse no destino da progenitura. Os pássaros são melhorespais; cuidam dos ovos, mas o embrião não incubado e indefesoé, contudo, muitas vezes vítima de criaturas esfomeadas deovos; e, além disso, o passarinho recentemente incubado quecomeçou a voar tem de ser deixado à mercê de depredadoresenquanto os pais andam à procura de alimento. a mãe-mamíferoalimenta o embrião da cria vindoura em desenvolvimento nointerior do seu corpo, onde se encontra bem protegida doselementos hostis existentes no ambiente; depois do nascimento,alimenta a cria com o seu leite, segregado pelas glândulas quederam o nome aos mamíferos; e continua a cuidar da criadurante bastante tempo, até que esta seja capaz de cuidar desi própria. Os mamíferos asseguram mais eficazmente asobrevivência das suas crias do que quaisquer outros animais,garantindo, assim, uma vantagem enorme na competição para apropagação da sua espécie. Apesar destes talentos especiais os mamíferos ficaram

subordinados aos dinossauros por mais de 100 milhões de anos -pequenos animais com peles, que davam pouco nas vistas e semantinham afastados dos répteis rapaces, vivendo nas árvoresou entre as ervas. No entanto, há setenta milhões de anos os dinossaurosextinguiram-se. As razões do seu desaparecimento são aindaobscuras. É provável que fosse consequência de uma alteraçãomundial no clima, perante a qual se encontrassem mal equipadospara sobreviver. Os dinossauros, como todos os répteis, eramanimais de sangue frio; isto é, não possuíam o controlo deaquecimento interno que pode manter a temperatura do corpo aum nível constante, independentemente dos rigores do clima.Sabemos que o período em que desapareceram foi marcado porrepetidas elevações da crosta terrestre, com a formação demuitas cordilheiras novas, como as Montanhas Rochosas. Éprovável que o impulso ascensional de enormes massas de rochaquebrasse o fluxo de correntes de ar à volta do Globo; talvezo clima da zona temperada fosse alterado desta maneira,passando de calor e de humidade uniformes, agradáveis a umanimal de sangue frio, para um clima caracterizado por maioresalterações de temperatura de uma estação para a outra. à medida que a população de dinossauros diminuiu, osmamíferos desceram das árvores, subiram dos seus esconderijosno chão e ocuparam a Terra. Espalharam-se rapidamente portodos os continentes. Dentro de 20 milhões de anos, a raçamamífera básica transformou-se nos antepassados da maior partedos mamíferos com que estamos hoje familiarizados morcegos,elefantes, cavalos, baleias e muitos outros. Mas um grupo de mamíferos permaneceu nas arvores. Estesmamíferos -- os primatas -- foram escolhidos para serem osantepassados do Homem, em virtude de levarem uma existênciaarborícola. Eram animais pequenos, insectívoros, do tamanho deum esquilo e, no aspecto, semelhantes ao actual musaranhoarborícola de Bornéu. O Homem deve o seu cérebro notável aofacto de estes animais precisarem de dois atributos físicospara sobreviverem no seu habitat arbóreo: primeiro, precisavamde mãos e de um polegar oponível para se agarrarem firmementeaos ramos; e, segundo, precisavam de uma visão binocularpenetrante para calcular as distancias até aos ramos próximos.Na competição para a sobrevivência entre os mamíferosarborícolas primitivos, há 100 milhões de anos atrás, aquelesque possuíam estas características em grau mais elevado eramfavorecidos. Eram os indivíduos que estavam em melhorescondições de sobreviverem e de gerarem descendência. Atravésde gerações sucessivas, as características desejáveis de umamão bem desenvolvida e de uma visão apurada, propagadas depais para filhos, foram constantemente aperfeiçoadas econsolidadas. Por volta de 50 milhões de anos atrás surgiramjá sob a forma adiantada nos animais dos quais descendem oactual musaranho arborícola, o lémure e o tarseiro.Tornaram-se ainda mais bem desenvolvidas, em alguns dosdescendentes imediatos destes animais, sob a pressão contínua

da luta pela sobrevivência nas arvores. Gradualmente, astendências evolucionárias, estabelecidas pelas exigências davida nas arvores, transformaram alguns destes primatasprimitivos em animais semelhantes ao macaco. Os animais com mãos também tinham capacidade em potênciapara exercer habilidades manuais rudimentares; quando estepotencial era combinado com o desenvolvimento de centroscerebrais associados, tais animais possuíam, quase poracidente, capacidade para utilizar ferramentas. Naqueles quetinham esta capacidade, veio a dar-se grande valor acapacidade mental para a memória da utilização de ferramentasno passado, e para o plano da sua utilização no futuro; destemodo, pela acção da selecção natural numa sucessão de mutaçõesfortuitas, aqueles centros cerebrais, nos quais se armazenavamexperiências passadas e se planeavam acções futuras,desenvolveram-se e aumentaram. Estas qualidades mentaisprovaram ser de grande valor para a satisfação dos problemasgerais da sobrevivência. Como resultado, o cérebro evoluiu eaumentou sob a pressão contínua da luta pela existência. Esteduplicou o seu tamanho em 10 milhões de anos, e quase duplicououtra vez no milhão de anos seguinte. Assim, foi firmementeestabelecida a linha de ascendência que conduziu ao Homem. Por meio desta cadeia de demonstração e de teoria, acaracterística distintiva da condição humana - inteligência -pode remontar à circunstancia acidental de uma ascendênciaarborícola. O caminho evolutivo retrocede mais no tempo - desde osantepassados arborícolas do Homem até ao primeiro mamífero;depois, até um réptil semelhante ao cão, uma espécie que jánão existe; até ao primeiro vertebrado; desde os vertebrados auma sucessão de animais de corpo mole perdido nas areias daHistória; depois, através do limiar da vida, para o mundo damatéria inorgânica; e, finalmente, há muitos e muitos milhõesde anos, muito antes da existência do sistema solar, para anuvem-mãe de hidrogênio.

"Há grandiosidade nesta concepção de uma vida com os seusmúltiplos poderes, insuflada pelo Criador em algumas formasoriginais, ou numa única, assim como no facto de, enquantoeste planeta continua a girar segundo as leis imutáveis dagravidade, se terem criado e continuarem a criar-seinfindáveis formas, extraordinariamente belas e admiráveis, apartir de um começo tão simples."

Charles Darwin,A Origem das Espécies.

iiiii

FORMAS DE VIDA PRIMITIVAS: Os estromatólitos, que se contamentre os mais antigos vestígios de organismos vivos,constituem depósitos deixados por algas primitivas háaproximadamente três mil milhões de anos. A fotografia de cimarepresenta um estromatólito descoberto entre as rochaspré-cambrianas das Medicine Bow Mountains, no Wyoming. Napágina seguinte figuram outros vestígios de vida primitiva. Osresíduos e fósseis simples aqui representados constituemexemplos típicos das mais antigas formas de vida descobertasaté hoje.

l Restos fossilizados de bactérias l com cerca de dois mil milhões l de anos (à esquerda).

l Sulcos cavados por vermes l que viveram há aproximadamentel um milhar de milhões de anos (em baixo).

Mamíferos

AvesRépteis anfíbiospeixes

a evolução dos vertebrados. Há quatrocentos milhões de anosfez a sua aparição na Terra o primeiro animal dotado de colunavertebral - um peixe primitivo. Alguns destes peixesprimitivos adquiriram a faculdade de respirar fora de água ede rastejar sobre O solo. Foi a partir destas criaturas queevoluíram os anfíbios e, posteriormente, os répteis. Estes,que constituíram os primeiros vertebrados totalmenteemancipados do meio marinho, disseminaram-se pela terra firme

e ai se multiplicaram durante 150 milhões de anos. Algunsdeles foram os antepassados da serpente, do lagarto e datartaruga actuais; outros evoluíram para dar os dinossauros.Um ramo conduziu aos antepassados das aves modernas e, háaproximadamente 200 milhões de anos, outros ramos conduziramaos mamíferos. Tanto as aves como os mamíferos distinguiram-sedos répteis por uma característica decisiva: eram animais desangue quente. Esta característica permitiu-lhes resistir àsgrandes amplitudes térmicas do seu meio ambiente. Há 60milhões de anos, altura em que se deu o súbito desaparecimentodos dinossauros da face da Terra, provavelmente devido arigorosas variações climatéricas, os mamíferos herdaram aTerra, multiplicaram-se em miríades de formas. um dos ramosdos mamíferos - os primates -constituíram os antepassados doHomem.

UM PARENTE DO HOMEM. O tarseiro (em cima) assemelha-se aospequenos mamíferos arboricolas que constituiram osantepassados do Homem. Para sobreviverem nas árvores, estesanimais tinham necessidade de mãos preênseis e visãobinocular. A posse destas características estimulou odesenvolvimento dos centros cerebrais coordenadores da vista edo tacto. Na sua luta pela existência, há 50 milhões de anos,foram seleccionadas para sobreviver as criaturas nas quaisaquelas características haviam atingido um grau dedesenvolvimento mais elevado. Os animais análogos ao tarseiroforam paulatinamente evoluindo para darem os antepassados domacaco e, posteriormente, criaturas simiescas que constituiramos predecessores do Homem. A destreza manual e odesenvolvimento dos correspondentes centros cerebrais -características exigidas por uma existência arboricola -proporcionaram quase por acidente aos seus possuidores afaculdade potencial de usar utensilios e de recordar o seuanterior uso. Assim se desenvolveram as partes do cérebro nasquais se armazenavam as experiências passadas e projectavamacções futuras. O Homem deve a sua característica distintiva -a sua inteligência - às circunstancias decorrentes do facto deos seus antepassados terem vivido nas árvores.