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A ARTE CONTEMPORÂNEA COMO RECURSO INTERDISCIPLINAR
PAULO SIMÕES NUNES
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AÇÃO DE FORMAÇÃO
A ARTE CONTEMPORÂNEA COMO RECURSO INTERDISCIPLINAR
SESSÕES: 12 OUT 2013 | 08 FEV 2014 | 05 ABR 2014 | 17 MAI 2014
CULTURGEST – LISBOA
PAULO MANUEL SIMÕES NUNES
Professor de Artes Visuais (Grupo de Recrutamento 620)
Agrupamento de Escolas de Casquilhos – Barreiro
RELATÓRIO
1. (EM SÍNTESE) A MINHA HISTÓRIA DE ARTE
O meu nome é Paulo Simões Nunes, nascido em 1958 sob o signo de Gémeos, e sou
professor de Artes Visuais na Escola Secundária de Casquilhos, escola-sede do
Agrupamento de Escolas homónimo, no Barreiro.
Licenciei-me em Arquitetura em 1982 na, então designada, Escola Superior de
Belas-Artes de Lisboa – Departamento de Arquitetura, tendo começado a lecionar
em 1985 na escola à qual ainda me encontro vinculado.
Fiz a Profissionalização para a Docência na Escola Superior de Educação de Setúbal
no biénio 1988-1990 e, mais tarde, fiz o Mestrado em Teorias da Arte na Faculdade
de Belas Artes da Universidade de Lisboa, no biénio 1998-2000.
Em 2003-2004 fui Assistente Convidado na Faculdade de Belas Artes da
Universidade de Lisboa no Mestrado em Teorias da Arte, coordenado pelo Prof.
Doutor José Fernandes Pereira, onde ministrei a cadeira de “Teorias da Arte”
regida pelo Prof. Doutor Fernando António Baptista Pereira.
Ao longo da minha carreira docente tenho lecionado, em particular, as disciplinas
relacionadas com a História da Arte, cujas designações têm passado por História
das Artes Visuais (anos 1980), História da Arte (anos 1990), História das Artes
(início dos anos 2000) e História da Cultura e das Artes (desde 2005).
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Desde 1999 tenho sido autor de manuais para o Ensino Secundário das disciplinas
de História da Arte, História das Artes e, atualmente, de História da Cultura e das
Artes, editados na Lisboa Editora e na Raiz Editora.
Paralelamente tenho desenvolvido atividade no domínio da investigação e crítica
de arte, assinando artigos em diversas publicações e proferindo conferências em
seminários e sessões comemorativas.
Neste campo, destaco a edição da obra História das Artes Visuais (no Ocidente e em
Portugal) (Lisboa Editora, 2004) e a colaboração no Dicionário de Escultura
Portuguesa (Editorial Caminho, 2005), uma obra de investigação dirigida e
coordenada pelo Prof. Doutor José Fernandes Pereira, onde fui responsável pela
elaboração de trinta entradas respeitantes a autores do século XX.
Em síntese, devo admitir que os meus interesses se enquadram neste equilíbrio,
por vezes impossível, entre, por um lado, a educação e o ensino artístico, e, por
outro lado, a investigação e produção de materiais de análise e crítica de arte.
2. PORQUE ME INSCREVI NO CURSO
As motivações que me levaram a frequentar este curso enquadram-se no meu
permanente interesse, e necessidade intelectual, em adquirir novos conhecimentos
e competências na área da educação artística.
Neste sentido, o título do curso “A arte contemporânea como recurso
interdisciplinar” foi suficientemente sugestivo para atrair o meu interesse e
expetativa em contactar com outros saberes, experiências e práticas numa área tão
estimulante como é a da educação artística.
A informação a que acedi referente a este curso, bem como os intervenientes e
dinamizadores a ele associados, deram-me garantias da sua qualidade e criaram-
me suficientes expetativas de vir a concretizar aqueles meus interesses.
Por outro lado, não desprezei o facto de uma “ação” desta natureza constituir uma
oportunidade privilegiada para a interação entre os diversos participantes,
proporcionando a troca de experiências e o debate entre protagonistas
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provenientes, naturalmente, de formações diferenciadas e de realidades
diversificadas.
3. A MINHA EXPERIÊNCIA NO CURSO
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O início do curso, a 12 de outubro de 2013, aconteceu de forma muito sui generis, já
que Stela Barbieri, a convidada para a abertura da primeira sessão, tinha
condicionamentos que implicaram a antecipação da sua intervenção para as 8h30
de (um) sábado. Eu diria que madrugámos e, ainda sentíamos o sabor do café da
manhã, já a coordenadora do projeto educativo da Bienal de São Paulo nos
despertava com o seu estimulante discurso acerca de uma “cartografia
sentimental” e discorria sobre as “transformações contemporâneas do desejo”.
Que a “arte remete para problemas de
ordem formal, conceptual, relacional ou
utópica” nem era de todo
surpreendente para os presentes, mas a
“palestra” de Stela Barbieri haveria de
distinguir-se pela clareza, brilho e por
uma certa cristalinidade das ideias que
nos fixaram às suas palavras quentes e
sedutoras.
A “ferramenta do educador é a ativação
do outro”, exige “uma relação, um
profundo conhecimento da matéria
que está trabalhando”, o que nos remete para o entendimento da “matéria-arte,
matéria-política, matéria-educação”. Assim foram lançadas questões, problemas,
reflexões acerca da “ideia mobilizadora”, do “artista libertador, mobilizador,
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potenciadores de energias” à imagem de Joseph Beuys, esse mago missionário,
visionário da palavra, da ideia, do conceito.
“Ser professor é a minha maior obra de arte, a minha missão é divulgar ideias”, eis
a expressão que podia resumir, por defeito, a intervenção de Stela Barbieri
fundada na “educação para a arte, para a obra mobilizadora para a transgressão,
para a desestabilização, para a intranquilidade”. Como referiu, “devemos encorajar
as pessoas a acreditar nas suas próprias perceções”, e afirmando a cumplicidade
intrínseca entre “arte e política, impossível de separar”, deixaria incontornáveis
perguntas no ar: “como a arte pode mudar a vida?”; “por quê calar?”; “quando não
há nada, o que vemos?”; “uma coisa significa outra quando muda de lugar?”; “o que
acontece cada vez que você festeja?”. E assim terminou, sem dúvida, deixando-nos
todos muito mais disponíveis para o acaso, para o devir, para a vida.
Raquel Ribeiro dos Santos e Teresa Eça, respetivamente coordenadora do serviço
educativo da Culturgeste e Presidente da APECV, apresentaram-nos os conteúdos e
as condições de acreditação do curso, dando seguidamente lugar ao artista plástico
João Queiroz.
No que restava da manhã, o pintor desenvolveu basicamente as suas teses sobre o
desenho: o desenho enquanto ato primordial da perceção, da sensibilidade, da
relação entre o ver e o representar; o desenho enquanto ato inaugural da criação.
Segundo senti, pelo envolvimento que suscitou nos participantes, esta foi uma
intervenção tão vigorosa, pelo fulgor comunicativo do palestrante, quanto inédita,
sobretudo pelo apelo ao “pensamento divergente” reiterado por João Queiroz.
E tudo partiu de uma preocupante estatística a dar que pensar: no estado adulto,
não mais do que 0,6 % das pessoas desenham melhor do que na sua infância.
O desenho é perceção, é imaginação, é invenção. Através do desenho nós vemos o
mundo de um modo artístico. Pelo desenho submetemos a realidade à nossa
sensibilidade, aos nossos sentidos e emoções; pelo desenho refletimos sobre o que
vemos, reorganizamos o mundo e as coisas através de um olhar estético. Em
síntese, estas foram as ideias fortes, mas não únicas, de uma intervenção muito
participada e partilhada pelos presentes.
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Após uma refeição frugal, pois a tarde adivinhava-se ativa, foram-nos apresentados
dois tipos de atividades por Ana Teresa Magalhães e Nuno Bernardo, artistas
responsáveis pela conceção das atividades educativas da Culturgest. Optei pela
proposta deste último, pois incidia concretamente sobre o exercício do desenho e o
ensaio de práticas pedagógicas fundadas na sua prática, um tema sobre o qual me
tenho debruçado ultimamente por via da disciplina de Desenho do Curso de Artes
Visuais do Ensino Secundário que tenho lecionado, também, nos últimos anos.
Móbil da ação: a exposição patente na galeria Sentido em Deriva – obras da coleção
da Caixa Geral de Depósitos que começámos por visitar.
Primeiro momento: visita rápida com observação fugaz das obras, sem nos
determos em nenhuma em particular, para, num momento seguinte
apresentarmos ao grupo, sob a forma de desenho memorizado e uma breve
descrição analítica, uma obra que nos tivesse interessado particularmente. Um
exercício cujo interesse motivou uma dinâmica interação entre os participantes no
grupo, confrontando os seus apontamentos ou as suas interpretações das obras
cujas ideias não passavam de linhas esquemáticas, de perceções efémeras, de
sensações subjetivas. A obra que escolhi foi Township Wall (Portas e Janelas), de
António Olé (2004), pela escala, espaço e impacto visual que aquela combinação de
formas e materiais proporcionava.
Num segundo momento, cada um de nós teve que se dirigir rapidamente à obra
selecionada para, agora num tempo determinado (mas curto), captar os elementos
mais característicos da “sua” obra in locum, pretendendo compreendê-la através
do desenho.
As conclusões foram apresentadas numa sala onde o grupo se reuniu e partiu para
um segundo exercício de desenho: a partir dos autorretratos de Gaëtan (A Última
Morada, 1994), e posicionados frente-a-frente com um/a parceiro/a, havia que
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desenhar o interlocutor numa
expressão refletida de nós próprios. O
resultado foi o contacto dinâmico com
o desenho enquanto modo expressivo
e interpretativo do olhar ou, pelo
menos, enquanto experiência de uma
perceção crítica do nosso olhar.
A “ação” terminou com a reunião geral
dos participantes e com a
apresentação-síntese dos resultados
de ambos os grupos.
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A segunda sessão decorreu a 8 de fevereiro de 2014, desta vez com os trabalhos a
terem início pelas 10h00, e com um inusitado acréscimo de população presente,
provavelmente a dobrar o número de participantes no primeiro evento, facto que
admito dever-se à excelência do primeiro encontro e à natural propagação das
suas qualidades na comunidade.
Após a apresentação dos conteúdos desta sessão por Raquel Arada, coordenadora
do serviço educativo da Culturgest, e os esclarecimentos acerca do processo de
acreditação da ação de formação por Isabel Trindade, Vice-Presidente da APECV,
coube a Maria Jesús Agra Pardiñas, professora de Didática da Expressão Plástica na
Faculdade de Ciências da Educação da Universidade de Santiago de Compostela,
apresentar a sua comunicação subordinada ao tema “Projetos como espaços
fluidos de experimentação em educação artística”.
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Esta foi uma comunicação tão complexa quanto substantiva que eu traduziria por
uma “experiência de comunicação de arte” ou, de outro modo, uma “incursão
estilística” ao universo da educação artística. Maria Jesús Pardiñas começou por
nos aproximar à ideia da “pedagogia coletiva” como um “rizoma”, no sentido em
que estes nunca são estáticos, antes estabelecem uma constante comunicação em
vetores diferenciados. Assim deverá ser a relação educador/educando,
professor/aluno, mestre/aprendiz, numa negociação constante, admitindo vários
métodos de trabalho, abrindo permanentemente múltiplos caminhos em várias
direções.
Num outro domínio, salientou “o quotidiano, a vida diária ou a aventura do real”
como matéria-prima da arte. Isto é, sublinhou a importância de se “criar situações
de aprendizagem” cujo conteúdo é a experiência do real, os costumes, os espaços
urbanos ou naturais, a ação humana, a cultura que geramos no dia-a-dia. Como
referiu, “a matéria da educação é a experiência artística e criativa” decorrente de
“ambientes coletivos de aprendizagem”.
Defendeu a “metodologia do compromisso”, definindo esse compromisso entre
artista/educador/investigador como o horizonte de toda a educação artística, e o
educador como “uma pessoa comprometida socialmente”, uma pessoa que
intervém, que pensa, que age. Daqui chegamos à ”arte como experiência
quotidiana”, à necessidade de “unir a educação à vida”, ao desafio das “práticas
artísticas fora dos espaços convencionais”. Premissas que, segundo Maria Jesús
Pardiñas, devem potenciar a criatividade, a participação coletiva na melhoria do
mundo, o estabelecimento de um compromisso cívico com o contexto social e
cultural em que nos movemos. Em suma: “converter os jovens em agentes ativos”.
Falou-se de Christian Boltanski, de On Kawara e de Gillian Wearing: a arte
enquanto processo; a arte-ideia; a arte-forma de expressão. E também de Eva Koch
e da sua instalação I Am the River: “somos um rio que flui para o mar, juntando-nos
a outros rios”.
No ar, a deixar-nos sem resposta, ficou a pairar a eterna interrogação: porque é
que os sentimentos e as emoções na se consideram na educação? Sem mais.
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Voltámos de um curto intervalo para um outro momento de pensamentos
“rasgados” numa intervenção protagonizada por Ruy Otero, artista multifacetado,
de encenador a realizador, de argumentista a artista plástico, de ator a humorista.
Também ele sustentando que “a arte
deve estar próxima da vida”, todavia
subordinada à problemática da
comunicação, ou do processo de
comunicação, concluindo que,
atualmente, com o fenómeno da
globalização, vivemos sob o jugo
manipulador dos media. E que “o perigo
não está na rua, mas sim em casa, na
internet”. Assim decorreu a sua
comunicação, muito participada e
livremente interrompida pelos
presentes, atentos e reativos ao muito
salutar estilo provocatório e crítico de Ruy Otero.
Crítico ao sistema educativo, crítico aos media que condicionam os nossos
comportamentos, crítico a uma sociedade que considerou demasiado passiva face
à violência do poder político e económico, crítico à apatia, à indolência e à
indiferença que caracteriza a “sociedade da troika”, o artista sublinhou a
importância do sentido inventivo, criativo e imaginativo que urge fazer despertar
nas novas gerações.
Após o almoço, cautelosamente frugal, foram-nos apresentadas novas propostas
pelos mesmos “artistas residentes” Ana Teresa Magalhães e Nuno Bernardo, agora
subordinadas às “práticas pedagógicas relacionadas com o cinema”. Desta vez
interessei-me pela proposta da primeira, já que se referia ao “cinema-projeto
artístico”, atravessando também o processo criativo da vídeo-art.
O grupo que escolheu esta vertente começou por assistir ao documentário Com
quase nada, rodado em Cabo Verde por Carlos Barroco e Margarida Cardoso. Uma
obra que registava de modo naturalista o quotidiano de uma criança na ilha,
captando os seus movimentos, os seus sonhos, as suas rotinas e, sobretudo, as
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ideias com que preenchia o seu tempo e espaço. Uma obra sujeita a debate, com os
presentes a concordarem nas expressões que a caracterizavam: sonho,
metamorfose, identidade, cultura, afetos, sustentabilidade, adaptação aos recursos,
manuseamento das tecnologias, etc.
Seguiu-se a obra de vídeo-art Ancient
Days de Bill Viola. Absolutamente de
ordem conceptual, tão experimental
quanto híbrida, esta obra viria a sugerir
interrogações tais como: o que distingue
um “documentário” de uma obra
cinematográfica, que entendimento para
imagens desprovidas de qualquer
sentido, como interpretar a relação
espaço-tempo num espaço e num tempo
que não é o do observador mas sim o da
obra…
e por aí fora, compreendendo que aqui residiam, precisamente, as grandes
questões deste processo criativo, a vídeo-art.
Como epílogo da sessão, foi proposto a execução de um storyboard a partir de seis
imagens-tipo características de um parceiro/a com quem partilhássemos o
exercício. Exercício a ser complementado com o registo fotográfico dessas imagens
mas que, devido ao número de participantes nesta ação (e neste grupo) e ao
adiantado da hora, se tornou inviável concluir. Mas, como exercício conceptual que
era, ficaram as ideias.
A “ação” terminou com a reunião geral dos participantes e com a apresentação-
síntese dos resultados de ambos os grupos.
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A ação que decorreu a 5 de abril teve início com Teresa Eça a fazer o ponto da
situação em relação aos procedimentos a ter face ao processo de acreditação do
curso de formação.
Seguidamente tivemos a prestação de Sara Torres, investigadora em Educação
Artística na Faculdade de Belas Artes da Universidade Complutense de Madrid, na
circunstância em representação de Maria Acaso, professora e investigadora
espanhola naquela mesma universidade. Especializada na área da educação
artística, o seu trabalho incide no estudo do ensino e da aprendizagem das artes
visuais através de formatos e conteúdos disruptivos, tendo como pano de fundo a
fusão entre a pedagogia e a educação artística.
Temas e conteúdos que se avizinhavam, desde logo, aliciantes.
Procurando desenvolver metodologias
que relacionem a prática educativa com
a sociedade pós-moderna, Sara Torres
veio apresentar “casos práticos” que, ao
limite, suportam a arte contemporânea
como veículo de aprendizagem num
processo educativo. Um tal processo
integra “o espaço da aula como
discurso” pois esse é o espaço onde se
gera conhecimento, onde se
desencadeiam processos e onde se
desenvolve a “criação educativa”,
segundo as suas palavras.
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Este é o âmbito das, chamadas, “pedagogias invisíveis” desenvolvidas no contexto
das disruptive methodologies in art education. Estava apresentado o fundamento da
sua comunicação: as “metodologias disruptivas” como base da educação artística.
Como afirmou, “arte e educação evoluem por vias paralelas sem nunca
coincidirem”.
E, assim, questionou a relação entre “arte” que funciona em micro narrativas, e a
“educação” que se desenvolve segundo macro narrativas. Particularmente, a arte
contemporânea que se desenvolve num território de análise e crítica social, e
procura explorar “significados críticos” nos seus processos criativos, constitui um
campo fértil de recursos para os processos educativos. Nesta corrente de
pensamento, Sara Tores definiu a proximidade/cumplicidade entre arte e
educação como uma estratégia de “dar significado às coisas”, mais do que “criar
coisas novas”. Enquanto o artista seria um ativista permanente, o professor
deveria ser um “vigarista ou um mentiroso profissional”, no sentido em que deve
levar os alunos a suspeitar, a duvidar do que veem e a dar novos significados ao
que veem.
Num tal ambiente, Sara Torres salientou o poder que o professor detém para
conduzir processos relacionais, críticos e criativos, e para levar os alunos a
“habitar a sala de aula”. Sendo que, em síntese, esta relação de poder deve ser
diluída de modo a permitir aos alunos desenvolverem as suas capacidades e
adquirirem competências.
Após uma interessante troca de ideias entre a
assistência e a conferencista acerca das questões
enunciadas, interveio Tiago Batista, artista
plástico com diversa produção sobretudo no
domínio da pintura e cofundador do grupo
Autores em Movimento. Suportado pela
apresentação de alguns dos seus trabalhos, tais
como “War/Work” ou “Homeless Place”, o
artista defendeu a arte contemporânea como
recurso fundamental do processo educativo pois
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explora o “aleatório, o acaso, a possibilidade do caótico”.
Considerando que a arte contemporânea eliminou todas as barreiras ou fronteiras
entre conceitos e conteúdos, como afirmou, “ao limite tudo pode ser arte”, relevou
as questões éticas, ou “a liberdade como responsabilidade” no ato artístico. Nas
suas intervenções os artistas devem respeitar a natureza, as questões éticas,
devem questionar a relação entre a ciência e a tecnologia, entre a arte e a política.
Na parte da tarde o grupo foi dividido por duas salas para apresentação de
trabalhos desenvolvidos em escolas. Fiquei na sala em que foram apresentados
dois trabalhos: “A Grande Lição” e “Pelo Mundo de Amadeo de Souza Cardoso”. O
primeiro consistiu num filme produzido na Escola Básica São João de Deus com
alunos dos 3º e 4º anos, coordenado por Gina Flor. A exibição do filme serviu para
explicar o desenvolvimento do processo criativo que teve o envolvimento da
Associação de Pais e de monitores de expressão plástica da CML.
O segundo trabalho, coordenado por Andreia Dinis, foi desenvolvido igualmente
por alunos do 1º ciclo e teve como móbil a exploração da obra de Amadeo de Souza
Cardoso. Explicando o processo criativo aplicado, referiu que após visita de estudo
efetuada à obra do pintor modernista, os alunos foram estimulados a recriar o seu
trabalho, apresentando novos modos de formar, explorando novas técnicas,
simplificando a imagem e encontrando novos significados.
Na componente prática desta sessão, coube a Susana Gaudêncio, artista plástica,
apresentar o tema “Desenhar o processo criativo” como mobilização para a
atividade prática a propor. Apresentou as diversas dinâmicas, funções e linguagens
do desenho, partindo do princípio de que “o desenho constitui uma ferramenta
essencial no processo criativo” encontrando-se associado a várias práticas
artísticas, do design à arquitetura, da pintura à escultura.
A artista sintetizou uma breve história do desenho, das origens às práticas
contemporâneas, das suas técnicas às suas funções, salientou o desenho como um
“meio operativo, um meio criativo, um meio de comunicação de ideais”, e
apresentou exemplos de como, através do desenho, os artistas “conceptualizam,
representam, criam”.
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Na atividade prática foi-nos
apresentado um objeto – um copo –
que deveríamos representar
exprimindo sentimentos tão
diversos como raiva, dor, alegria,
etc., de acordo com os nomes
sorteados por cada um de nós.
Num outro exercício, desta vez
coletivo, deveríamos transformar
/ redesenhar um objeto vulgar que
nos era distribuído.
Na circunstância coube-nos
“transformar” um banco, e
transmitir a nossa ideia através do
desenho.
No final, partilhámos os nossos trabalhos e refletimos em conjunto sobre os
resultados.
4
Por fim, a sessão de 17 de maio constituiu um momento de reflexão, análise e
avaliação dos assuntos que foram tratados ao longo da ação “A arte
contemporânea como recurso interdisciplinar”.
Assim, foi-nos proposto que distinguíssemos cinco palavras que definissem“o que
trazíamos” (antes do curso) e“o que levamos” (após o curso).
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Foram citadas palavras como “expetativa,
curiosidade, desejo, quebrar rotinas,
criatividade, inovação, isolamento, partilha
de experiências, disponibilidade, motivação,
desalento, cansaço, desafio”, etc.
O meu documento.
E com isto se gerou um animado e profícuo debate.
Refletiu-se sobre o trabalho do
professor, do artista e do investigador,
sobre o lugar da escola e a criação do
conhecimento, sobre a “pedagogia
colaborativa ou a investigação
participativa”, sobre as dinâmicas do
trabalho em grupo, e sobre a
importância de se criar conhecimento
a partir de uma comunidade.
Documento recolhido de uma colega.
Também, e a propósito, se questionou
a interferência das novas tecnologias
na “castração da imaginação, da
invenção e da criação”, enquanto
ferramentas facilitadoras do esforço e
da procura de soluções para
problemas. Por contraponto, foi
salientada a importância de se
estimular a “estética relacional, a
curiosidade, a sensibilidade e a
procura de novos sentidos e
significados para o quotidiano”.
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Teresa Eça apresentou-nos diversos trabalhos de investigação sobre esta temática,
e conduziu-nos a refletir sobre a importância de metodologias de trabalho em que
o desenho e a arte contemporânea são o ponto de partida para processos de
educação. Salientou a necessidade de se desenvolver uma “pedagogia relacional”, a
arte e a relação com as expressões, e de fomentar a “arte com a comunidade”, isto
é, a “arte socialmente comprometida”.
Para a hora do almoço o “piquenique” foi introduzido como uma estratégia de
partilha, de comunhão e de troca de experiências, tendo como pano de fundo a
exploração do lúdico, do convívio e do prazer do contacto com a natureza.
A tarde decorreu sob o mote da troca de ideias, a partir das expressões
encontradas por cada um de nós para definir o curso, e da troca de imagens
também, fixando os últimos instantes desta experiência. E, assim nos despedimos
já saudosos dos felizes momentos aqui vividos.
4. MAIS-VALIAS
Sem dúvida, a possibilidade de confrontar ideias artísticas, de trocar experiências
pedagógicas e de contactar com outras realidades educativas é a mais-valia que
levo do curso.
Assim, não posso descurar as substantivas e sugestivas intervenções por parte dos
artistas convidados, cujas ideias criativas, inovadoras e empreendedoras têm
enriquecido o meu património cultural e educativo no domínio das artes.
Relembrando Maria Jesús Pardiñas, “criar é pensar, fluir, transformar”.
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5. CONCLUSÕES
Sendo a primeira vez que frequentei o curso, pretendo voltar a inscrever-me,
certamente, não só para novas e estimulantes experiências artísticas, como
também para interagir com outras realidades, outras práticas, outros fenómenos.
Devo, desde logo, relevar a organização da ação, quer da parte da APECV, quer da
parte da monitorização da Culturgest, pela competência, distinção e entusiasmo
que entregaram a todo o evento e que, de resto, tanto prestigia as partes
envolvidas.
Todavia, devo considerar que o excessivo número de participantes, em particular
nas sessões de 8 de fevereiro e de 5 de abril, impediu os intervenientes (formandos
e formadores) de concretizar os objetivos estabelecidos na sua plenitude.
Sobretudo, o aspeto que considero mais importante destes “encontros”, ou seja, a
possibilidade de gerar debate, de confrontar ideias ou de construir crítica, não
pode ser inviabilizado por um número de participantes inadequado a tal
experiência. Na verdade, nunca entendi este “curso” como uma simples
apresentação de projetos por parte de “ilustres convidados” – cujo valor e
interesse é inquestionável – mas sim como uma oportunidade para ampliar
recursos para a sala de aula, no caso em apreço, reconhecendo “a arte
contemporânea como recurso interdisciplinar”.
A despeito deste sentimento, tentei colaborar tanto quanto possível nas atividades
propostas, responder às solicitações que eram desencadeadas e contribuir, deste
modo, para a concretização dos objetivos estabelecidos em cada sessão.
Avaliando o meu desempenho, que penso poder encontrar-se refletido neste
relatório, assumiria um 9 (numa escala de 1 a 10).
6. SUGESTÕES
Apesar de entender, por parte da entidade organizadora, a necessidade de garantir
um “número mínimo” de inscrições para viabilizar economicamente o curso, devo
no entanto admitir que o excesso de participantes por sessão, porventura
excedendo um “número máximo” que devia igualmente ser estabelecido, retirou
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vitalidade de intervenção aos participantes afastando a concretização dos
objetivos na sua plenitude.
Num curso desta natureza, à imagem de um workshop, devia proporcionar-se a
possibilidade de se constituir grupos de trabalho de dimensão reduzida, não mais
do que cinco a seis elementos, de modo a garantir a plena participação de todos.
Barreiro, 25 de junho de 2014