A Arte Dos Slogans Luiz Carlos Assis Iasbeck

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Criação de slogans

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LUIZ CARLOS ASSIS IASBECKA ARTE DOS SLOGANSAs tcnicas de construo das frases de efeito do texto publicitrioANNADLUAAEFaculdades Integradas Brasil ia-DFServio de Biblioteca e Documentao da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da Universidade de So Paulo.111Iasbeck, Luiz Carlos AssisA arte dos slogans: as tcnicas de construo das frases de efeito no texto publicitrio / Luiz Carlos Assis Iasbeck. - So Paulo : Annablume : Braslia : Upis,2002.198 p. ; 14x21 cm.ISBN 85-7419-268-61. Propaganda 2 Linguagem Publicitria 3. Slogan I. TtuloCDD 659.1Coordenao editorial Joaquim Antnio PereiraPreparao de originais Cleusa Conte\ ;... , Capa''" Ray e JocaCONSELHO EDITORIALEduardo Permeia CaflizalNorval Baitello JniorMaria Odila Leite da Silva DiasGilberto Mendona TelesMaria de Lourdes SekeffCeclia de Almeida SallesPedro JacobiGilberto Pinheiro PassosEduardo Alcntara de Vasconcellos1." edio: maio de 2002D Luiz Carlos Assis IasbeckANNABLUME EDITORA . COMUNICAORua Padre Carvalho, 275 . Pinheiros05427-100 . So Paulo . SP . BrasilTel. e Fax. (011) 3812-6764 - Televendas 3031-9727http://www.annablume.com.brA simplicidade uma virtude somente possvel aoignorante e ao sbio.Ao ignorante, porque desconhece a complexidadedo mundo;ao sbio, porque superou toda a complexidadeIAos meus pais e irmos, Flavinha e ao Daniel,pelo estmulo e pela compreensodas tantas ausncias.SumrioAPRESENTAO - As palavras e as no-coisas(Norval Baitello Jnior) 11A CULTURA DOS SLOGANS . " 13CAPTULO I - O LUGAR DO SLOGAN ' 17 Publicidade - Algumas Crticas e Algumas Teorias , 22O Publicitrio - Arteso e Artfice 28A Publicidade no Brasil - A Prtica e o Laboratrio 31Discurso e Texto . , 35Texto e Imagem 39O Texto Escrito na Publicidade 43O Slogan 47Os Slogans na Publicidade dos Bancos 52CAPTULO II - A PRODUO DE SENTIDO NQ .SLOGAN PUBLICITRIO . 55In Hoc Signo Vinces! . 57Parentescos e Afinidades 59Os Provrbios - , . :/.. , .;, 60As Mximas 65As Palavras de Ordem 69Frases de Efeito - Temas de Campanha - Slogans 70De que so Feitos os Slogans 72Clichs e Chaves 72Recursos Estilsticos das Frases 76Figuras de Estilo 78A Relao Retrica/Funcionalidade nos Slogans 105O Slogan e as Funes da Linguagem 107Funo Ftica: o canal 110Funo Referencial: a que nos referimos? 110Funo Conativa: grito de guerra 112Funo Emotiva: cumplicidade e solidariedade 113A Funo Potica e a Funo Metalingstica 114Potica do Slogan: Uma potica de Consumo? 118CAPTULO III - OS SLOGANS NAS EMPRESASFINANCEIRAS 121Slogan e Cultura 123O Conceito de Cultura 126A Cultura do Dinheiro 127O Dinheiro e a Produo de Textos Culturais 135A Publicidade do Dinheiro e a Segunda Realidade 138Os Universais da Cultura 139O Dinheiro e a Lgica das Trocas 147Tempo Dinheiro 150Os Tempos dos Bancos Segundo seus Slogans 153Dinheiro Segurana e Tranqilidade 158Dinheiro Fora e Proteo 160O Slogan e o Sonho 163Deslocamento e Condensao 167CAPTULO IV - SLOGAN E IDENTIDADE 173Traos Individualizantes 175Poltica de Uso 178Slogan: Discurso, Identidade e Imagem 180CONSIDERAES FINAIS 185REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 193As palavras e as no-coisasToda palavra, por mais elementar e trivial que possa parecer, possui camadas e camadas de histria e de histrias. o resultado de um caminho, uma estrada de milnios. Assim, quando a usamos como uma ferramenta do dia-a-dia, estamos nos valendo no apenas de sua materialidade fnica ou de sua visualidade grfica acompanhadas de um sentido presente. Muito mais que isso, estamos evocando os espritos milenares que a povoaram para contarem suas histrias, seus valores e desvalores, seus feitos e seus desfeitos, suas aventuras e desventuras, seu peso e sua leveza, sua densidade e sua fluidez, sua luminosidade e sua obscuridade. Para estudar as artes (puras ou aplicadas) que utilizam a palavra como uma de suas ferramentas necessrio tentar ao menos entrever este mundo de histrias e contrahistrias. Pois o que faz Luiz Carlos Iasbeck no livro que ora se apresenta ao pblico: propor uma abordagem cultural e semitica para compreender os promissores slogans da arte publicitria utilizada pelos bancos. Baseado nos trabalhos de Semitica da Cultura do (injustamente) pouco conhecido mestre tcheco Ivan Bystrina, ancorado nos notveis escritos sobre a comunicao e seus smbolos, do jornalista e pensador alemo Harry Pross, o presente trabalho aponta para a densidade opaca da palavra de persuaso dos senhores do nosso tempo, em sua construo de verticais simblicas que abrangem campos e redes cada vez mais amplos. E compreende este fenmeno da construo de verticais por meio de materiais de grande condensao de valores e histria, por meio de grandes palavras. As grandes palavras so justamente grandes porque so carregadas de histrias, porque so saturadas de narrativas e textos culturais, porque no se desvinculam de seu passado, de sua memria cultural, porque possuem um lastro de informaes que vinculam ao12A ARTE DOS SLOGANStempo, o bem mais precioso e a principal referncia que o homem possui. E, justamente por estarem lastreadas em valores e cultura, possuem uma grande capacidade de se projetarem para longe no tempo que ainda vem, no por-vir. Isto quer dizer, elas possuem uma inata vocao futurolgica, transformando-se facilmente em participantes de nossos projetos, focados que estamos todos no futuro. Assim, todo slogan mobiliza no seu receptor uma nsia pelo futuro, sua natureza projetiva. E somente a leitura de sua natureza cultural poder dar conta dessa complexidade. Iasbeck empreende, com grande sensibilidade, essa anlise, revelando-nos a operatividade da Semitica da Cultura para os estudos da comunicao persuasiva do mundo da publicidade. E, sobretudo, contribuindo para uma maior conscincia, tanto dos criadores (e financiadores) quanto dos usurios das mensagens que hoje invadem nossas vidas e se apropriam de nosso tempo de vida. Mas, se o conceito de "mdia como apropriao do tempo de vida dos homens" foi desenvolvido por Harry Pross - e as frases analisadas no presente trabalho apontam os caminhos dessa apropriao -, foi o amigo de Pross, Vilm Flusser, quem falou de nossa existncia crescentemente ocupada por "no-coisas" ("Undinge", em alemo) que, por sua vez, roubam o valor e a importncia das coisas concretas ("Dinge"). Flusser, filsofo judeutcheco-brasileiro e notvel futurlogo da mdia, confirmaria inteiramente, com suas reflexes de seus ltimos anos de vida, as instigantes anlises do presente livro: o caminho das palavras at as "no-coisas".Norval Baitello JniorDoutor pela Universidade Livre de BerlimProfessor do Programa de Ps-Graduao emComunicao e Semitica da PUC/SPA cultura dos slogans0O interesse em abordar semioticamente a produo de slogans publicitrios surgiu espontaneamente ao cursar disciplinas do Programa de Ps-Graduao em Comunicao e Semitica da PUC de So Paulo, onde realizava meu mestrado.O slogan, na verdade, j me despertara a curiosidade e um aguado interesse h algum tempo, quando lecionava comunicao administrativa. Era por demais evidente que os alunos possuam uma irresistvel tendncia a pensar por slogans, o que, na poca, era considerado prejudicial ao desenvolvimento pleno do raciocnio.O curso que ajudei a desenvolver partia do princpio, defendido por Othon Garcia, de que para escrever bem era preciso pensar bem. Pensar bem significava, ento, ter idias prprias, costuradas coerentemente entre si e atreladas a intenes pr-definidas. Por isso, o curso era iniciado pelo mdulo de "raciocnio lgico", ao qual se seguiam "processo da comunicao", "estrutura lgica do texto" e "texto administrativo".Hoje, antes de condenar a prtica de pensar por slogans preciso entender que a linguagem publicitria extrapolou os limites que formalmente instituiu, os dos meios de comunicao. Ela j faz parte integrante dos diversos discursos da modernidade. Emigrou dos jornais, das revistas, dos cartazes, dos computadores, das telas dos televisores e dos cinemas para as conversas rotineiras do dia-a-dia, freqentando o repertrio dos profissionais das mais diversas reas do saber e do fazer, pontuando o discurso dos burocratas e dos polticos e, ultimamente, infestando as conversas e as correpondncias eletrnicas pela Internet.Ao estudar o slogan, para alm das estruturas lxicas e sintticas que o constituem, cuidamos para dar um destaque especial aos14A ARTE DOS SLOGANSelementos semiticos que o integram, contribuindo sensivelmente para que ele se torne to atraente e to impregnante na cultura. As teorias da semitica da cultura, desenvolvidas quando no mestrado na PUC, proporcionaram o instrumental adequado para penetrar, sem preconceitos, alguns segredos capazes de tornar os slogans - essas frases breves e compactas - to sedutores e significativos a ponto de perturbarem no s a produo de sentido de outras formas de pensar e dizer, mas tambm - e at - a percepo daquilo que convencionamos denominar realidade.De aproximadamente dois mil slogans que conseguimos colecionar desde o incio da pesquisa - a maioria pertencente publicidade das instituies financeiras -, detectamos conceitos que invariavelmente se repetiam, ainda que travestidos em idias afins. Observamos tambm que as estruturas retricas que possibilitavam a produo de sentido desses signos verbais giravam em torno de algumas - e no muitas - frmulas, exploradas exausto.A partir dessas primeiras constataes, procuramos descrever os processos de construo dos slogans para, posteriormente - e, em muitos casos, simultaneamente - tentar entend-los luz de diversos outros signos que os interpretam.A natureza do nosso objeto de estudo foi ditando aos poucos o melhor caminho a seguir na investigao. Por esse motivo, a linha terica que elegemos no ortodoxa. No esforo de interpretao dos processos produtivos, buscamos em Charles Sanders Peirce, Roman Jakobson e nos estudiosos da Semitica da Cultura - Yuri Lotman, V. Ivanov e demais tericos das escolas de Tartu e Moscou, alm do tcheco Ivan Bystrina e do comunicador alemo Harry Pross- fundamentaes consistentes para o desenvolvimento de nossas hipteses iniciais de trabalho, que aparecem diludas em diversas situaes, no decorrer do trabalho. Foram nossos pontos de partida para este ensaio as seguintes "sensaes de verdade":a) os slogans mais eficazes desprendem-se do carter meramente referencial que os liga aos seus objetos, em vantagem das conotaes simblicas;b) os slogans publicitrios criam, provocam e/ou sedimentam relaes funcionais com os demais modos de pensar e agir que esto presentes nos demais sistemas culturais;LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK15c) os slogans necessitam alimentar-se de elementos perifricos da no-cultural sob pena de se tornarem excessivamente redundantes e, conseqentemente, obsoletos.Como estamos tratando de semitica, no poderamos deixar de buscar em outras reas do saber os elementos de que necessitamos para compor a rede multidisciplinar de que necessitamos para entender a proliferao de sentido na cultura. Por isso, no hesitamos em buscar em Karl Marx e em Sigmund Freud os ingredientes tericos que nos levariam, posteriormente, a compreender, por exemplo, as metforas de dinheiro e capital veiculadas nos slogans das instituies financeiras e os processos de compactao e deslocamento utilizados na produo dos slogans, desvios e simulaes muito prximas queles dos sonhos.Assim, estruturamos a pesquisa de uma forma que consideramos orgnica e pertinente aos nossos objetivos. Na primeira parte, localizamos nosso objeto nas sries que lhe so mais prximas; na segunda, identificamos parentescos e afinidades dos slogans com outras frmulas histricas, estudamos os artifcios retricos utilizados na sua produo e tratamos de suas funes, com destaque especial para a dimenso potica; na terceira parte, introduzimos o estudo especfico dos slogans das instituies financeiras em sua relao com os fatos da cultura, ressaltando as metforas do dinheiro que emergem em maior quantidade desses signos; a quarta e ltima parte, de carter conclusivo, trata das peculiaridades que tornam o slogan signo emblemtico de um produto, de uma idia, de um servio ou de uma empresa.Os exemplares de que nos servimos neste estudo foram obtidos no perodo de 1990-1993 e correspondem, portanto, ao que se veiculava nos anncios daquela poca. Propositalmente no atualizamos os exemplos. Sabemos que os slogans possuem prazo1. Essa expresso, muito utilizada nas teses eslavas da Semitica da Cultura (como veremos adiante), de autoria dos semioticistas das escolas de Tartu e Moscou, liderados por Yuri Lotman. Refere-se a todos os acontecimentos, idias e objetos que no participam de uma determinada cultura. Assim, tudo o que no participa dessa dada cultura , para ela, sua correpondente no-cultura. preciso ressaltar que ao nos referirmos a algum dado "estranho" como no-cultura no estamos afirmando que aqueles elementos no so culturais ou no possuem caractersticas culturais. Toda no-cultura cultura no sistema que a contm.16A ARTE DOS SLOGANSmuito curto de validade, tornando-se "datados" aps poucos meses de uso. Somente em algumas poucas situaes eles permanecem ativos por um perodo maior de tempo. Portanto, caso os "atualizssemos" para esta publicao correramos o mesmo risco que resolvemos correr de imediato: o de ficarmos datados, desatualizados.Nesse aspecto particular da cultura, o tempo no apenas no pra como tambm anda muito rpido. E no podemos det-lo, nem simbolicamente, para entender as conseqncias que essa dinmica imprime no momento mesmo da produo de frases to adequadas e inspiradas. Esse olhar para o passado, a que os exemplos nos conduzem, propicia - por acrscimo - o distanciamento de que todo pensamento crtico necessita para montar o panorama contextual que contm o objeto da ateno.Pensamos, assim, oferecer, s pessoas que se interessam pelo estudo da publicidade, novas perspectivas e novas inquietaes que, esperamos, sejam enriquecedoras no tratamento das questes semiticas que esto no cerne das produes culturais.Captulo0 Lugar do Slogano\J slogan vai aparecer num abiente que tem como vizinhos alguns "saberes" j constitudos h algum tempo: a propaganda e o marketing.A idia de marketing est intimamente ligada ao modo de produo capitalista. O prprio termo, de origem norte-americana, nos diz do ato de vender e comprar toda espcie de mercadoria ou produtos - gneros ou especialidades2 - em algum ponto de comercializao. No se trata aqui de um mercado de trocas qualquer- o que nos remeteria aos primrdios da histria do homem - mas de um espao historicamente delineado no Ocidente, a partir do sculo XVI.3O conceito de marketing que ainda vige e em torno do qual pssvel reunir um certo consenso assim explicitado pela American Marketing Association:a execuo das atividades de negcios que encaminham o fluxo de mercadorias e servios do produtor aos consumidores finais, industriais e comerciais. (Rabaa, 1978: 299)"os produtos naturais (arroz, feijo, minrio, etc) so gneros. Os produtos industriais so especialidades" (Sanfanna, 1982: 28)."Se bem que os primeiros esboos da produo capitalista tenham sido feitos muito cedo em algumas cidades do Mediterrneo, a era propriamente capitalista no data seno do sculo XVI" (Marx, 1964:17). importante notar que para MARX, esse no um mero marco factual, determinado por algum acontecimento de relevo, mas um lapso de tempo quando se d a "separao radical entre o produtor e os meios de produo arrancados sem discusso aos produtores"; isto acontece "nas entranhas da ordem econmica feudal" (Marx,1964: 19).20A ARTE DOS SLOGANSAs atividades de marketing constituem um conjunto de aes que tem por finalidade fazer com que um determinado servio ou produto (no importa sua natureza) seja consumido. Surgiram para facilitar a comercializao e tm nela o seu objetivo maior. Com o tempo, os esforos de venda passaram a apontar para a necessidade de estender essas ocupaes at mesmo anteriormente existncia do produto, ou seja, a sua concepo.Por isso, os estudos de marketing indicam ser imprencindvel conhecer os consumidores e suas necessidades, no s para provlas, como tambm para criar outras expectativas, que possam ser satisfeitas com novos bens de produo, realimentando, dessa forma, o sistema produtivo.As estratgias do marketing tm por finalidade assegurar, no seu cerne, o funcionamento do sistema capitalista, no qual o dinheiro converte-se em capital, o capital em fonte de mais valia 4 e a maisvalia transforma-se em capital adicional. Sant'anna as distribui em seis fases ou reas que podem ser assim sucintamente explicadas:a) Pesquisa de Mercado - onde e quando se obtm as informaes sobre as tendncias de mercado para subsidiar decises que interfiram direta ou indiretamente na concepo e/ou na produo de bens;b) Planejamento do Produto - fase de elaborao do produto, quando se levam em conta os recursos produtivos e o atendimento s necessidades evidenciadas pela pesquisa de mercado;c) Determinao de Preos - momento em que os custos e os fatores de mercado (presena de concorrentes, canais de distribuio, poder aquisitivo dos provveis consumidores) so ponderados para fixao do preo, com margem de lucro.d) Propaganda - cuida das estratgias de divulgao, atravs de campanhas na mdia institucional, para que o produto seja conhecido e faa parte do rol das preferncias do pblico;iLUIZ CARLOS ASSIS IASBECK21e) Promoo de Vendas - desenvolvimento de aes localizadas nos pontos de venda (comrcio) para que o produto exera atrao no provvel consumidor5;f) Distribuio - estudo dos meios capazes de levar o produto ao consumidor final, facilitando o trnsito e a comercializao.No objetivo de nosso estudo detalhar as tcnicas desenvolvidas pelo denominado marketing moderno para cumprir suas finalidades. Torna-se, entretanto, indispensvel, mostrar como, no contexto das atividades produtivas, a propaganda se insere e com quais finalidades.6 Mas ser a publicidade7 apenas uma coleo de artifcios utilizados para tornar os produtos conhecidos?Nosso interesse - deve-se adiantar - no est centrado exclusivamente no estudo das tcnicas que a publicidade desenvolveu com o passar dos tempos para cumprir sua funo de divulgar produtos. Sem abandonar, evidentemente, essas importantes conquistas - que nos ajudaro a entend-la como linguagem diferenciada - interessa-nos, sobretudo, verificar que sua importncia na sociedade moderna ultrapassa em muito a mera funo de divulgao. Coexistindo s demais estratgias mercadolgicas, contaminando-as - e sendo por elas contaminada -, assume carter de discurso que "joga para manter os mecanismos de hegemonia poltica do capitalismo mundial" (Zayas, 1991: 1) e se singulariza no s ideologicamente como tambm esteticamente, a ponto de ser considerada por Gillian Dyer "a arte oficial das naes altamente industrializadas" (apud Zayas, 1191: 2)." 1 ',4. "Deduzindo-se o custo das matrias-primas, das mquinas e do salrio, o restante do valor i sda mercadoria constitui a mais-valia, na qual esto contidos todos os lucros" j(MARX,1964:11) j j5. Difere da propaganda, pois esta "leva o consumidor ao produto", enquanto "a promoo de vendas traz o produto at o consumidor" (Sanfanna, 1982-29)6. Referimo-nos quelas finalidades imputadas propaganda nos manuais de administrao de empresas e que, geralmente, fazem parte do conhecimento corriqueiro das pessoas.7. O uso dos termos propaganda e publicidade tem sido motivo de muitas controvrsias por parte de diversos autores. Alguns entendem propaganda como a divulgao de idias, de modo persuasivo, com ntidas intenes ideolgicas (poltico-partidrias, religiosas, etc.) diferenciando-o de publicidade, palavra mais associada divulgao de produtos por anncios comerciais. E neste sentido que, em lngua inglesa, temos advertising para publicidade, anncio e publicity para propaganda. Porm, o Dicionrio de Comunicao, de Rabaa e Barbosa, esclarece que "no Brasil e em alguns pases de lngua latina, as palavras propaganda e publicidade so geralmente usadas com o mesmo sentido, e esta tendncia parece ser definitiva, independentemente das tentativas de definio que possam ser elaboradas em dicionrios ou em livros acadmicos."(Rabaa, 1978:378).22A ARTE DOS SLOGANSLUIZ CARLOS ASSIS IASBECK23PUBLICIDADE Algumas Crticas e Algumas TeoriasA publicidade , hoje, algo que nos envolve por completo. Engana-se quem pensa que ela s existe na televiso, nos jornais, nas revistas e nas rdios. Ela est nos muros das cidades, nas paredes das casas, nas embalagens, nos cartazes, folhetos, adesivos, nos livros, nos rtulos, nas roupas, nos utenslios domsticos, em quase tudo o que consumido pelo homem moderno. E se nos ocuparmos em estudar a lngua da publicidade com maior interesse, verificaremos facilmente como sua maneira de falar, seu linguajar, seu discurso, extrapolam em muito o espao que ocupa formalmente, o dos meios de comunicao de massa. Ela j faz parte integrante da conversa rotineira das pessoas, infesta o discurso do burocrata, est na boca dos oradores, dos polticos, dos homens de negcio, dos intelectuais e, irremediavelmente, fixada em nossos pensamentos. Os apelos publicitrios que nos assolam a todo momento e em todos os lugares penetraram as entranhas do homem moderno, transformando sua subjetividade, promovendo profundas alteraes em seu modo de ver, pensar e se comportar no dia-a-dia.Essa "intromisso" na vida das pessoas foi objeto de muitas crticas nos anos 60-70 por parte de estudiosos da modernidade preocupados, entre outras coisas, com o fenmeno do consumismo. Em 1962 surgiu na Frana a revista especializada Cahiers de Ia Publicit, que circulou apenas at 1968. Nela, muitos questionamentos impulsionaram o desenvolvimento do saber e do fazer publicitrios. Nessa publicao, como nos diz Louis Quesnel, muitas das preocupaes ainda atuais j eram enfrentadas:... publicitrios se interrogaro sobre este ou aquele aspecto moral, jurdico ou deontolgico de sua profisso: no a publicidade novo suplcio de Tntalo, criadora de falsas necessidades e de desperdcio? Somos comerciantes de angstias? Como moralizar a publicidade na televiso. A publicidade apodrece a Lngua Francesa? A publicidade julgada pelo pblico. a publicidade anticultural? a sociedade de consumo um progresso? A publicidade ertica: alienao ou libertao? (Quesnel, 1974: 79-93)Os intelectuais Toynbee, Marcuse, Valry, Sauvy, Galbraith, Henri Lefbvre, Serge Tchakhotine, Vance Packard, entre outros - filsofos, economistas, historiadores, professores e jornalistas - no pouparam denncias publicidade, "mquina de lavagem cerebral, empresa de imbecilizao e de embrutecimento das massas " (Quesnel, 1974: 80).Tida como criao de vertente capitalista norte-americana, a publicidade sofreu ataques macios na Europa, especialmente na Frana e na Alemanha. O socilogo francs, Jean Baudrillard dedicouse, em grande parte de sua obra, La Socit de Consommation, a explicar aqueles mecanismos de que a publicidade se utiliza para exercer to eficazmente a manipulao8 das massas. Theodor W. Adorno nos fala que "a publicidade faz parte das indstrias culturais que distribuem uma cultura de massa de baixa qualidade". (1964:12-18) . E Henri Lefbvre, citado por Quesnel, afirma que "a publicidade uma instituio da sociedade burocrtica de consumo dirigida (...) s fala a linguagem ideolgica da mercadoria e da alienao pela cotidianidade" (apud Quesnel, 1974: 82).Deslocado o interesse inicialmente localizado na crtica produo publicitria e sua repercusso scio-cultural, j se entende que o seu discurso "tem reorientado a experincia semitica dos indivduos durante as ltimas dcadas" (Zayas, 1991: 13). Hoje, no soa to estranho quanto antes afirmar que a publicidade das mais contundentes manifestaes de qualquer cultura. E o prprio Baudrillard quem afirma:Se resistimos cada vez mais ao imperativo publicitrio, tornamonos, ao contrrio, cada vez mais sensveis ao indicativo daSe bem que o termo manipulao no seja expressamente utilizado por Baudrillard nesta obra, nesse sentido que podemos entender muitas de suas incurses crticas publicidade, muito embora o autor no entre no mrito do julgamento de valor moral. Entretanto, suas anlises crticas bem permitem tais interpretaes, como se pode verificar na introduo da edio portuguesa de 1974, escrita por J.P.Mayer, da Universidade de Reading, cujo pargrafo final aqui transcrevemos:" A Sociedade de Consumo, escrito em estilo denso, deveria constituir objeto de cuidadoso estudo para a gerao mais jovem, que tomou, provavelmente como tarefa, a destruio do mundo monstruoso, se que no obsceno, da abundncia dos objetos, com tanta energia e fora apoiado pelos mass media e, sobretudo, pela televiso; mundo que a todos nos ameaa. " (Baudrillard,!972: 10-11)24A ARTE DOS SLOGANS: ti publicidade, isto , a sua existncia enquanto segundo produto.;,! de consumo e manifestao de uma cultura (Baudrillard, ,.;." 1989:175).Tais reconhecimentos, entretanto, resultam demasiado tardios se nos dermos conta de que desde 1913 as universidades norteamericanas j encaravam a publicidade no s como forma de vender- atividade esta fartamente utilizada no sculo XIX, atravs dos jornais - mas tambm, e sobretudo, como saber cultural.Em fevereiro de 1908, abriu-se em New York o "The First Annual Exibition of Advertising Art", evento que reuniu publicitrios e intelectuais de todas as partes do mundo e fez multiplicar uma infindvel srie de artigos em jornais e revistas cientficas reconhecendo a necessidade de se legitimar esta nova prtica cultural. Os editores da revista Printers Ink, especializada em assuntos publicitrios, chegaram a publicar, em 1911, estatutos sobre a tica da publicidade que, com algumas modificaes, continuam em vigor at hoje nos EUA, servindo de base para as regulamentaes do gnero em diversos pases do mundo.Em meados de 1914, a Universidade de New York comeou a desenvolver um centro de estudos publicitrios, reunindo professores de psicologia, ingls comercial, artes aplicadas (design) e representantes da comunidade empresarial. Esse tipo de atividade proliferou-se em muitas outras universidades, abrindo o meio acadmico para uma nova modalidade de conhecimento. Tal fato nos demonstra que, desde os seus primrdios, a publicidade se moldou como saber fragmentado, reunindo prticas que at ento se desenvolviam isoladamente.Os primeiros textos referindo-se a uma certa Teoria da Publicidade datam do incio do sculo. Em 1903, Walter Dill Scott publicou Theory of Advertising, um tratado sobre as relaes da psicologia com a publicidade dita exitosa. Em 1905, com Modern Advertising, lans Cal Kins e Ralph Holden destacaram a "cincia dos anncios" como o novo saber cultural.Coln Zayas, na arqueolgica pesquisa que empreendeu para identificar os primeiros marcos tericos da publicidade, localizou trs textos de fundamental importncia para entendermos como a publicidade se tornou "discurso hegemnico" no moderno mundo capitalista. So eles:LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK25- "Advertising: The Social and Economic Problem ", de George French, publicado em 1915 pela Roland Press Company de N. York;- "Advertising and Its Mental Laws", de Henry FosterAdams, publicado em 1916 pela Editora Macmillan, de N. York;- "Advertising Its Principies and Pratice ", de Tipper, Hollingworth, Hotchkiss e Parsons, publicado em 1915 pela Roland Press Company de N.York.Zayas nos mostra "como o conceito atual de publicidade se liga ao desenvolvimento da teoria dos sentidos e da percepo (...) e ao repertrio de signos que se perfilaram a partir do sculo XVII com o desenvolvimento da industrializao" (1991: 15). Esses signos, diz o autor, "correspondem a uma ideologia, constituem forma de falar e forma de representao especfica " (Zayas, 1991: 14).Os estudos semiticos da publicidade comearam muito mais tarde - em meados da dcada de 60, mais precisamente em 1964 quando Barthes escreveu um artigo, segundo Perez Tornero, "a todas luces inaugural" intitulado Rhetrique de l 'Image.Apesar de, neste artigo, Barthes deixar a publicidade num segundo plano para tratar de outro problema - a percepo da imagem -, o objeto de estudo era a pea publicitria. Ele estudou, mais especificamente, a imagem fotogrfica que ilustrava anncios. Barthes supe que a imagem depende inteiramente da inteno do emissor e aplica nesse estudo os princpios da denotao/conotao, utilizados na lingstica; mostra que o processo conotativo sobrepe-se s faculdades da interpretao e aquilo que denominamos retrica (o conjunto dos significantes conotadores) no nada mais que o significante da ideologia que, em ltima anlise, sobra da leitura dos anncios publicitrios.A publicao do texto na revista Communications, foi decisiva para romper a resistncia do meio semitico quanto aos estudos da publicidade, at ento relegados a segundo plano. Perez Tornero afirma que, nessa poca, o ambiente era adverso: "Existe ambientalmente una espcie de prejuicio cultural que hace ver en ella un objeto poo digno de una preocupacin acadmico-intelectual" (1982:13)26A ARTE DOS SLOGANSAberto o caminho, surgiram no rastro de Barthes outros estudiosos9 preocupados em desenvolver e ampliar os novos espaos. Porm, logo abandonaram as discusses sobre retrica e ideologia, concentrando-se no estudo das relaes semiticas entre texto e imagem. Jacques Durand parte tambm da anlise da imagem, mas detm-se especificamente em justificar o projeto cultural da publicidade assim como se esta fosse uma fico e no um documento da sociedade; tenta classificar as figuras de estilo e faz inventrios dos adornos retricos presentes nas peas publicitrias. Gillo Dorfles, em 1978, reclamou o estudo da publicidade como condio para entender o sculo XX e realou os problemas que as tenses da arte e da esttica evidenciavam nessa nova e emergente linguagem. Umberto Eco retomou o caminho barthiano, enfatizando o aspecto retrico e ideolgico. ele quem vai nos dizer que a esttica tem lugar na publicidade enquanto mecanismo retrico-persuasivo.10Barthes retomou o assunto em 1972, analisando a publicidade como um todo harmnico, afirmando que ela supera sua origem comercial e seu fim imediato (o anncio do produto), introduzindo "nos rgidos limites do contrato comercial algo essencialmente humano" (Barthes, 1974: 19).Georges Peninou escreveu em 1976 um artigo intitulado Semitica da Publicidade onde props um estudo sistemtico com objeto preciso e pertinente, segundo critrios estruturais e funcionais. Ele nos diz de uma mensagem material, de um elemento comunicativo que s pode caracterizar a sua natureza pela funo que exerce. Afirmou que a mensagem publicitria no somente anuncia, sendo essa apenas uma de sua funes" e distinguiu a mensagem icnica (da imagem) da mensagem escriturai (o texto escrito). Retoma a a9. Pode-se incluir aqui Jean Baraduc (A Denotao nos Anncios Publicitrios,WIT) que estabeleceu uma espcie de gramtica da imagem e Chbat e Hnaudlt (L 'Efficacit de L'Image Publicitaire in Communications et Language n.22) que introduzem a questo da ordem de leitura como fator condicionador do sentido.10. Ver "A Estrutura Ausente" (1987), pp 51 a 78.11. A classificao mais conhecida de Peninou a das trs funes da publicidade: a) a denominao, quando o produto recebe seu nome, o nome prprio; b) a predicao ou o.. carter, a imagem, a personalidade do produto e c) a exaltao, quando se enumeram as virtudes que tornam o produto anunciado superior aos demais, objeto do desejo manifesto ou latente do consumidor.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK27discusso levantada por Barthes sobre a conjuno texto/imagem12, mas no chegou a trat-la como um todo significativo, pois considerou que suas partes possuem finalidades diversas, se bem que recheadas de funes significantes muito parecidas. Esta segmentao, segundo a crtica de Perez Tornero, reavivou as distines entre expresso e contedo (correspondentes aqui a funo e valor), o que acabou por desautorizar uma anlise semitica:Una semitica es una relacin entre un sistema de Ia expresin y un sistema dei contenido pero cabe perguntarse si ei cuadro que presenta Peninou logra, en realdad, sistematizar estos dos planos. La resposta (...) nos parece que debe ser negativa (Perez Tornero,1982: 85).Perez Tornero tenta tambm arquitetar um modelo de anlise, uma metodologia diferenciada para o estudo semitico da publicidade, mas acaba por esbarrar em srias dificuldades por no considerar o modelo publicitrio como algo dinmico, algo muito mais prximo de um no-modelo.Vemos assim, nesse rpido esboo, que existiram e existem intelectuais e crticos interessados no estudo do desenvolvimento da publicidade. So estudiosos que procuram ver esse fenmeno como nica e autntica manifestao de uma poca, de uma cultura, de um modo de viver. Porm, sabemos que quem faz a publicidade no o crtico, no o intelectual, no o semioticista, embora nada impea que venham a produzi-la. o profissional publicitrio que se especializa no fazer criativo, pelo saber e pela operatividade.12. Barthes vai levantar a necessidade de estudar o conjunto texto/imagem quando afirma que uma das operaes mais importantes da mensagem publicitria se d nessa confluncia. Assim, o texto escrito ou fornece a chave do sentido - conduzindo a leitura da imagem - ou a destaca em relevo, explicando-a, guiando a interpretao. Isto possvel porque, segundo Barthes, a imagem , por essncia, polissmica, ao passo que o texto escrito tem carter mais unvoco; da ser este o caminho para privilegiar um sentido possvel, ou o sentido desejado, intencional.28A ARTE DOS SLOGANSO PUBLICITRIO ARTESO E ARTFICEAssim como o arteso nem sempre tem conscincia de que em sua produo esto inscritos os signos de uma comunidade, de uma cultura, de uma identidade social, assim tambm o publicitrio no capaz, muitas vezes, de se dar conta da dimenso scio-cultural das concepes criativas presentes no anncio que elabora. O homem de propaganda est constantemente sintonizado em necessidades prementes e imediatas que devem ser satisfeitas para agradar ao cliente, ao anunciante e motivar o consumidor, propiciando o to desejado retorno comercial. Para tanto, empenha-se em produzir uma comunicao publicitria com a qual seu pblico-alvo se identifique, e que seja capaz de corresponder s expectativas desse pblico. Pode tambm ousar aquilo que o meio publicitrio tanto celebra como genialidade nos festivais e concursos patrocinados no mundo inteiro por emissoras de televiso e renomados peridicos. Evidentemente, nesse meio, a publicidade tratada de forma diversa, envolvendo polticas e decises administrativas, polticas e negociais, questes bem distantes daquelas que ocupam a maioria dos tericos.A originalidade dos apelos, o que comumente se denomina criatividade em propaganda, resulta quase sempre de transgresses hierarquia dos cdigos, organizao standard a linguagem (seja ela escrita, sonora ou visual), aos esteretipos consagrados. Porm, grande parte dessas novidades se institucionalizam na linguagem, incorporando-se ao acervo das modernas tcnicas de publicidade como eficazes mecanismos retrico-persuasivos. Umberto Eco assim se manifesta sobre a funo da originalidade nos anncios publicitrios:... um publicitrio responsvel (e dotado de ambies estticas) sempre tentar realizar o seu apelo atravs de solues originais e que se imponham pela originalidade, de modo que a resposta do usurio no consista apenas numa reao do tipo inconsciente ao estmulo ertico, gustativo ou ttil desencadeado pelo anncio, mas tambm num reconhecimento da genialidade, reconhecimento que reverbera sobre o produto, impelindo a um consenso que se baseie no s na resposta do tipo este produtoLUIZ CARLOS ASSIS IASBECK29me agrada, mas tambm este produto me fala de modo singular e, por conseguinte, este um produto inteligente e de prestgio (Eco, 1987: 157).Mas ser a genialidade apenas resultado de transgresses originais?O dado novo e surpreendente, que tanto valoriza os anncios fazendo com que o prestgio advindo do discurso recaia sobre o produto anunciado - constitui apelo to enftico que at poderamos dizer que, em ltima anlise, o consumidor no compra o produto, mas leva para sua casa o discurso do produto. Esta idia ser desenvolvida posteriormente quando estudarmos - atravs da anlise dos slogans - os invariantes culturais presentes no texto publicitrio dos bancos (ver item 4.1 do cap. 3).Por ora, interessa-nos chamar a ateno para o fato mais geral que guia tais criaes e que podem estar naquilo que Wittgenstein denomina "jogos de linguagem" (apud Lyotard, 1990: 17-18). Isto quer dizer quecada uma das categorias de enunciados pode ser determinada por regras que especifiquem suas propriedades e o uso que delas se pode fazer, exatamente como o jogo de xadrez se define como um conjunto de regras que determinam as propriedades das peas, ou o modo conveniente de desloc-las (Lyotard, 1990: 17).Lyotard chama, ainda, nossa ateno para o fato de que tais regras:a) no se legitimam por si mesmas, mas por contrato explcito ou no entre os jogadores;b) so condies essenciais para que o jogo seja realizado, e quec) "todo enunciado deve ser considerado como um lance feito num jogo" (Lyotard, 1990:19)Sob tal tica, no h linguagem possvel sem o prvio estabelecimento de um acordo - que supe regras - com o destinatrio, com o meio social, com os modos culturais de uma comunidade. Um novo "lance" pode ser inventado, renovando e revitalizando, por assim dizer, a linguagem. Porm, para que se estabelea vnculo social, 30A ARTE DOS SLOGANSimprescindvel que essa novidade seja suportada, assimilvel e esteja, enfim, j prevista como acontecimento:O uso destas linguagens, contudo, no qualquer um. Ele est ' ' submetido a uma condio que se pode dizer pragmtica, a deformular suas prprias regras e perguntar ao destinatrio se ele as ;' aceita. Satisfazendo esta condio, define-se uma axiomtica, aqual compreende a definio dos smbolos que sero empregadosna linguagem proposta, a forma que devero respeitar as expresses desta linguagem para poderem ser aceitas (...) e as operaes quesero permitidas sobre estas expresses, e que definem os axiomaspropriamente ditos (Lyotard, 1990-77).Vemos, portanto, que o publicitrio, articulando novidades e inventando o inusitado, est, na realidade, fabricando - como um operrio - a tecitura da trama social que revitaliza o universo das linguagens e enriquece os repertrios da cultura. Reduzir sua funo a um hbil anunciador de mercadorias desconhecer o contexto semitico do qual ele recolhe os signos, estimulando novas semioses.13Em ltima anlise, porm, cabe ao publicitrio produzir anncio. esta sua funo profissiona dela que ele, como simples arteso ou artfice, sobrevive. Mas oportuno ressaltar aqui o que diz Robert H. Srour:... a prtica no exclusiva das atividades voltadas para a . < sobrevivncia: pensar um modo particular de intervir narealidade. (...) A prtica cognitiva integra um conjunto articulado de prticas que se poderia denominar prtica social. (...) Ao lado da prtica ideolgica, que gera evidncias retricas no susceptveis de demonstrao, podemos localizar, no mesmo mbito cultural, a prtica cognitiva, cujos produtos so conhecimento. (apud Santaella Braga, 1980: 34)13. Entendemos por SEMIOSE (do grego SEMIOSIS) a ao do signo no processo de significao: "There is widespread agreement in the literature concerning the linkage of the broad, general sense of semiosis with the signification process...For Peirce, semiotic is the view that "the doctrine of the essential nature and fundamental varieties of possible semiosis (C.Papers 1931-66:5.488)" apud Maryann Ayim, Encyclopedic Dictionary of Semiotics, 1986-888) ..:.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK31A quase ausncia de brasileiros interessados em aprofundar-se na rea do saber publicitrio nos leva a inferir que ainda, no Brasil, a atividade tem sido caracterizada eminentemente pela prtica. E esta primazia do modus operandi, do fazer material sobre o pensamento que pode ser verificada numa breve abordagem histrica da publicidade brasileira.A Publicidade no Brasil A Prtica e o LaboratrioA histria nos mostra que uma evoluo significativa nos modos de se fazer publicidade tornou esta atividade altamente complexa e diversificada. A incorporao de modernas tecnologias acompanha a sofisticao das exigncias dos anunciantes e do pblico, sempre sedento de novidades, numa sociedade que, cada vez com mais acelerado dinamismo, recebe e responde a estmulos comunicativos. O motor que propulsiona essas mudanas pode ser localizado, primeira vista, nos processos econmicos ou, mais especificamente, na necessidade cada vez maior de girar mercadorias.Por isso, ao comentar aqui, ainda que rapidamente, alguns aspectos que julgamos significativos na evoluo da publicidade, teremos forosamente de nos reportar s transformaes ocorridas no capitalismo mundial por volta de 1870, perodo que marca a dominao da economia pelo capitalismo industrial, coincidindo com o final da dominao britnica e o incio das rivalidades entre pases imperialistas. Por volta desse perodo, a publicidade comeou a se desenvolver.No Brasil, ela seguiu timidamente a tendncia mundial, com alguns traos de pioneirismo, muito embora nos encontrssemos, ainda, muito distantes do desenvolvimento industrial. Segundo Hermam Lima, "foi aqui que surgiram os primeiros anncios ilustrados (...) publicados nos pasquins Mequetrefe e Mosquito, editados no Rio de Janeiro" (apud Ges Jorge, 1977: 23) Este ltimo, dedicado exclusivamente publicidade comercial, publicou, j em1898, o primeiro anncio ilustrado em duas cores. Os anncios classificados, por sua vez, eram publicados desde 1806 pelo jornal A32A ARTE DOS SLOGANSGazeta do Rio de Janeiro. A linguagem desses anncios era bem simples, aproximando-se do coloquial. A preocupao maior dos anunciantes consistia em "descrever e enumerar os produtos, sem qualificar ou valorizar as ofertas. (...) A maioria dos anncios no possua ttulo." (Ges Jorge, 1977: 24). Porm, se a tcnica dos classificados conseguiu se perpetuar no texto "substantivo",14 o mesmo no vai acontecer com os reclames publicados nos pasquins "que refletiam toda a linha da imprensa brasileira (...) e a linguagem do dia, glosavam tipos e temas, contribuindo fatalmente para a evoluo de nossa publicidade" (Ramos, 1976).A tendncia dos anncios em seguir a linguagem dos meios de veiculao vai se acentuar no Brasil no incio do sculo, quando surgem as primeiras revistas semanais ilustradas.15 Junto com elas aparece em evidncia a outrora tmida figura do Agenciador de Anncios, que reunia as funes de contato comercial, criador e diagramador de publicidade. Olavo Bilac, Baslio da Gama e outros poetas da poca assinaram anncios em verso e, com o crescimento da propaganda poltica, os polticos mais populares foram tambm motivo de ilustrao nos reclames de vrios peridicos.A cultura do caf, em franca expanso, possibilitou acmulo significativo de capital, principalmente em So Paulo, onde proliferaram as instituies de crdito e financiamento. Os contatos mais estreitos com o velho mundo e o aumento da imigrao atiaram o interesse dos governos republicanos para o desenvolvimento da indstria. Os bancos foram ento utilizados para incentivar o crdito e o fomento s importaes de produtos industrializados. A primeira agncia de publicidade brasileira surgiu nesta poca, mais precisamente em 1914, para atender a conta da FORD norteamericana, que iniciava aqui a comercializao de seus veculos. Em1926 chega ao Brasil a General Motors, que trouxe consigo a agncia norte-americana J. W. Thompson para anunciar seus produtos.16 "Com14. "Substantivo", aqui refere-se categoria morfolgica dos vocbulos que predominam nos classificados de jornal.15. De 1900 a 1910 foram lanadas as seguintes revistas: Revista da Semana, Malho, FonFon, Careta, Vida Paulistana, a maioria editada em So Paulo e Rio de Janeiro e mantidas por anunciantes locais. A maioria dos anncios era de produtos farmacuticos, lojas e hotis (GES Jorge, 1977: 24)16. A J.W.Thompson era constituda, nesta poca, pelo Departamento de publicidade da G.M. Seguindo o modelo, a N.W. Ayer & Son, agncia que detinha a conta da FORD nos EUA, abre filial no Brasil.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK33ela vem a influncia da publicidade americana, que nos acompanha at hoje" (Ges Jorge, 1977: 26).Aps a revoluo de 1930 e durante o longo perodo de intervencionismo do Estado no nascente projeto industrial brasileiro, a publicidade comercial arrefeceu-se, dando lugar s campanhas polticas, principalmente no perodo do Estado Novo de Getlio Vargas. Ricardo Ramos afirma que:as agncias brasileiras anteciparam-se s necessidades do mercado, antes do perodo em que eclodiram as tcnicas segundo padres internacionais e a industrializao. (...) Afirmar que um produto era nacional, nesta poca, era tremendamente pejorativo. No entanto, os ecos do modernismo vinham trabalhando o pblico na valorizao dos artigos nacionais e, com o aparecimento de uma indstria nacional, a publicidade se desenvolveu mais rapidamente. (Ramos, 1976)No final da dcada de 30, surge a primeira revista brasileira especializada - "Propaganda " -, coincidindo com a instalao, no pas, da poderosa McCann-Erickson americana.Eclode a Segunda Guerra e o Brasil, sob regime da ditadura de Vargas, no esconde certa simpatia pelas potncias do Eixo. Um dos anncios populares dessa poca apresentava a figura de Mussolini fazendo a saudao fascista, com o texto:se avano, sigam-me! se recuo, matem-me! Se tombo, vinguemme! Se o sangue tornar-se impuro, GALENOGAL! (Ramos,1976)O fim da guerra marcou o incio do processo de industrializao nacional, que teve como conseqncia a maior disseminao dos anncios publicitrios. Anunciava-se imveis, credirios, eletrodomsticos livros e roupas. Alm da indstria automobilstica, entraram no mercado, com macias campanhas publicitrias, as fbricas de pneumticos (Pirelli, Firestone, Goodrich, Goodyear e Dunlop). A proibio da importao de veculos montados, em 1951, vai trazer para o Brasil a Volkswagen, a Mercedes Benz e a Willys Overland. Uma srie de outras indstrias comearam a ganhar fora, a maioria delas relacionadas com a produo de peas e acessrios34A ARTE DOS SLOGANSpara automveis. E esse conglomerado ocupava quase a metade dos anncios publicitrios na mdia da poca.O ano de 1956 foi o marco da grande arrancada para a publicidade brasileira. Surgem as grandes contas - nacionais e multinacionais - os grandes salrios e a introduo da garotapropaganda, "um dos mitos criados pela propaganda, entretanto, com uma glria efmera" (Ges Jorge, 1977: 31). Os programas de rdio, em grande ascenso, coincidindo com o tmido incio da televiso, fizeram com que o mercado publicitrio, principalmente em So Paulo, atingisse nveis elevadssimos de crescimento.Nos anos 60 e 70, os publicitrios comearam a se dar conta de que era preciso inovar. As novas estratgias do marketing tomaram corpo e a criao dos anncios passou a merecer maior ateno e capricho. As agncias foram deixando, gradativamente, de agenciar para se tornarem empresas complexas, com Conselho Diretor, Comit de Planejamento, Departamentos de Atendimento e Marketing, Criao e de Servios de Mdia. Foi nesse perodo que se deu incio profissionalizao do publicitrio. Essa poca marcada "por uma mudana na forma e no contedo dos anncios, como a libertao das cerimnias na linguagem e o afastamento paulatino da argumentao racional, dando maior apelo s emoes" (Ramos,1976: 3). Fundou-se a Associao Brasileira de Anunciantes (ABA), entidade dedicada avaliao dos resultados da publicidade no pas, promovendo pesquisas e levantamento de concorrncias. As pequenas agncias comeam a se fundir; as estrangeiras iniciam investimentos acionrios em agncias nacionais. Os clubes de criao, significativamente incrementados, despertavam, motivavam e estimulavam uma linguagem autenticamente brasileira na publicidade. tambm em meados dos anos 70 que a publicidade vai ganhar espao nas Universidades brasileiras. Integrando, primeiramente, o currculo dos cursos de Comunicao Social - que at ento apenas formavam jornalistas - a nova disciplina vai se pautar por uma srie de dados histricos e estatsticos, abordando retrospectivas da propaganda mundial e brasileira. Como a carreira publicitria parecia promissora, principalmente em termos salariais, a preocupao maior consistiu em formar profissionais capazes de desempenhar funes de criao nas agncias. A profisso foi regulamentada por leis federais, que cuidaram tambm de proteger a atividade daquelesLUIZ CARLOS ASSIS IASBECK35"profissionais intuitivos", sem formao acadmica. Surgiram as primeiras publicaes nacionais do gnero, quase todas abordando aspectos puramente tcnicos, detalhando o modo de se fazer campanhas e criar anncios. Muitas delas espelhavam-se em modelos norte-americanos, principalmente na obra de Walther Dill Scott, cuja primeira edio se deu no incio do sculo, mais precisamente em1903.No incio dos anos 70, comeam a ganhar o mercado os cursos especializados da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) de So Paulo. Fundada em 1951, funcionou quase vinte anos como uma escola que oferecia um modesto curso livre de propaganda (o primeiro do seu tipo no Brasil). Seu corpo docente foi inicialmente formado pelos seus scios, profissionais da "publicidade intuitiva", vinculados antiga e tmida Escola de Propaganda de So Paulo. Voltados para a produo tcnica, viram nesta iniciativa uma grande possibilidade de sucesso, uma vez que aumentava sensivelmente a demanda por cursos que suportassem especializao em curto prazo. Buscando teorizar sobre tcnicas aprendidas na prtica publicitria, seus professores acabaram por montar uma estrutura disciplinar que hoje inclui Ps-Graduao lato-sensu nas reas de Varejo, Marketing, Propaganda e Comunicao Empresarial. A ESPM tem hoje ramificaes em mais seis capitais brasileirasDirecionado para o ensino das tcnicas de planejamento, criao e produo, os cursos da ESPM atraem tambm jovens executivos de empresas nacionais interessadas em otimizar suas atividades mercadolgicas e publicitrias. Muitas dessas empresas possuam seus prprios departamentos de marketing e propaganda, quando foram disseminandas pelo pas as denominadas houses ll. Com o advento da onda da terceirizao, na segunda metade da dcada de90, essas prticas quase sumiram do mercado e novamente as agncias especializadas voltaram a dominar o espao que estavam perdendo para as houses. Porm, alguns resqucios do fazer publicitrio continuaram nas empresas e passaram a fazer parte de suas prticas habituais. Territrio frtil para assimilar rotinas e regularidades, as17- Termo em ingls com o qual denomina-se, no Brasil, a agncia de publicidade criada e mantida pela mesma empresa que anuncia.36A ARTE DOS SLOGANSfinstituies pblicas assumiram algumas tarefas tpicas da rea publicitria, como, por exemplo, preparar o briefing.A tcnica de se elaborar o briefingli - tamanha a complexidade e importncia que tomou nos ltimos tempos -, tem demandado presena estratgica de profissionais qualificados com conhecimentos abrangentes, no s em relao aos produtos a serem oferecidos pelas suas empresas, mas tambm com informaes complexas sobre as tendncias de mercado e o pblico-alvo. O brifador de empresa considerado, hoje, um quase-publicitrio.Entretanto, se a prtica publicitria encontra-se bem desenvolvida e arraigada, inclusive no que diz respeito incorporao de modernas tecnologias,19 pouco ou quase nenhum progresso tem sido feito nas reflexes sobre o discurso publicitrio - materializado em tantas e tantas linguagens - seus efeitos, as transformaes que opera e assimila para rrianter-se atual e operativo numa sociedade com desempenho de terceiro mundo.O publicitrio brasileiro tem-se mostrado, em geral, avesso s incurses tericas e s reflexes sobre a linguagem, priorizando o modus operandi, cujo sucesso ou fracasso medido exclusivamente em funo da maior ou menor aceitao do produto anunciado, em termos de venda e retorno ao anunciante ou, antes disso, atravs de pesquisa de opinio pblica.Como j tivemos a oportunidade de ressaltar, apenas recentemente os estudos sobre a publicidade e seu discurso, de forma mais ampla e profunda, vm ganhando fora nos meios acadmicos de todo o mundo. O Brasil sente essa tendncia, mas no tem procurado desenvolv-la, haja vista o reduzido nmero de estudiosos que aqui se dedicam a aprofundar suas pesquisas em publicidade; entende-se que mais Vantajoso importar as solues e as reflexes de autores estrangeiros. Aqui, a despreocupao com a atividade metalingstica, a ausncia de reflexo sobre caminhos, impasses e18. "Instrues e diretrizes transmitidas, de forma resumida, pela chefia de uma agncia de propaganda aos responsveis pela execuo de um determinado trabalho" (Rabaa,1978:51). O termo serve tambm para identificar as instrues que o anunciante passa agncia.19. A computao grfica, que chegou ao Brasil no incio dos anos 80, hoje de uso comum e largamente utilizada nas produes publicitrias, tanto nas animaes para TV, Cinema, Internet, como para produ o de anncios impressos.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK37solues, estagnou quase por completo alguns setores da criao publicitria. A produo nacional vem repetindo, exausto, antigas frmulas bem sucedidas (nacionais e internacionais) e no tem ousado inovar, mesmo instigada pelas novas tecnologias e novas mdias. Apenas recentemente - a partir de 1989 - os publicitrios brasileiros se deram conta da necessidade de se aprofundarem nas questes tericas, que envolvem o estudo do consumidor, as necessidades do anunciante e a personalidade esttica do anncio tupiniquim. O alastramento dos cursos de Ps-Graduao da ESPM ensejou uma srie de similares em todo o territrio nacional e possivelmente em breve surgiro outras novidades nessa rea, contaminando as tradicionais graduaes do gnero.O presente trabalho pretende - no desconhecendo o que j foi pensado - reunir questes que nos levem a pensar a publicidade brasileira nas suas peculiaridades e naqueles aspectos que a individualizam em termos de produo e consumo. Tentaremos, posteriormente, identificar essas particularidades utilizando-nos da anlise dos slogans, principalmente daqueles veiculados nos anncios de empresas que atuam nos meios financeiros. Por enquanto, nosso interesse esteve centrado em delinear, ainda que de forma resumida, a evoluo dessa atividade, tanto no aspecto tcnico quanto no terico.Cumpre agora, para levar adiante nosso propsito, tecer algumas consideraes sobre terminologias de que j nos servimos e que sero largamente utilizadas nos prximos captulos. :> DISCURSO E TEXTOTemos utilizado, de forma aparentemente indistinta, os termostexto" e "discurso " quando nos referimos linguagem publicitria.Cabe-nos, nesse momento inicial, precisar alguns interpretantes detais signos, no apenas por um interesse meramente formal, massobretudo porque um e outro sero muito utilizados nos prximoscaptulos, trazendo em seu bojo conceitos fundamentalmente distintos.Falamos de discurso, latu-sensu, enquanto processo semitico,gar onde acontece a ao sgnica que resulta na produo de sentido. discurso , como diz Cereda (apud Perez Tornero, 1982:26-28),a mdalidade privilegiada e especfica de aplicao de linguagens38A ARTE DOS SLOGANSdiferentes; est ligado a enunciados concretos e processos de produo social culturalmente determinados. uma entidade abstrata que s se materializa nas produes que realiza, ou seja, na matria significante que lhe d sustentao e afirmao. Assim, ao nos referirmos a discurso publicitrio no estaremos falando necessariamente de uma ou outra produo tomada isoladamente, do uso de determinada linguagem ou de outra, considerada cada uma na sua individualidade. Estaremos nos referindo quelas caractersticas comuns a esses produtos, quelas linguagens que permanecem coerentemente unidas, seja no aspecto semntico ou sinttico, seja no sentido pragmtico.O discurso poderia, dessa forma, ser identificado como uma ideologia. Mas no constitui apenas uma idealizao, um modelo, um acervo de onde o produtor retira material para sua obra. O discurso no se estabelece somente por possuir uma gramtica ou formas ideais- embora possa t-las como elementos caracterizadores.O discurso s se d a conhecer pelos textos que produz. E o conjunto desses textos que, ao mesmo tempo, estabelece a fisionomia do discurso, lhe d fronteiras e identidade sociais. a prtica produtiva que gera o discurso. Assim, a atividade publicitria produz o seu discurso especfico, tal como podemos dizer que outras produzem o discurso cientfico, filosfico, literrio, etc.O publicitrio trabalha articulando linguagens diversas, coordenando-as segundo funes e objetivos especficos, alojandoas em sistemas textuais diferentes. O texto ser ento o resultado dessas articulaes, cada uma das mensagens construdas e particularizadas onde jogam semioticamente as linguagens. Este conceito de texto foi minuciosamente tratado por Yuri Lotman em sua obra A Estrutura do Texto Artstico (1978). Segundo Lotman, um texto caracterizado por possuir:a) carter estrutural - uma organizao interna que o transforma, ao nvel sintagmtico, num todo estruturalb) delimitao - opondo-se, criando fronteiras com outros textos cujos signos no entram no seu conjunto;c) expresso - atravs da qual realiza um sistema, tornase sua encarnao material.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK39Alm de nos dizer da existncia objetiva e concreta dos textos, Lotman ainda afirma que eles constituem sistemas invariantes de relaes, mesmo quando possuem alta complexidade. Porm, admite que todo texto, apesar de fechado, possui relaes extratextuais. Somente quando as levamos em conta que o texto passa a portar significao:As ligaes extratextuais de uma obra podem ser descritas como a relao do conjunto dos elementos fixados no texto com o conjunto dos elementos a partir do qual foi realizada a escolha do elemento utilizado que dado. (Lotman, 1978: 102)Assim, podemos falar de um discurso publicitrio como a coleo dos elementos (textos) que o caracterizam, identificvel em produes singulares, seja qual for seu carter apresentativo (escrito, imagtico, diagramacional, animado, etc). Ampliada, a noo de texto se prestar a caracterizar o prprio discurso publicitrio, desde que ns o analisemos atravs de textos significativos, relacionando-os a outros discursos representados por outros textos. a materialidade do texto que torna o discurso conhecido. Como todo texto s faz sentido no conjunto de suas ligaes extratextuais, defrontamo-nos aqui com a impossibilidade de anlis-los isoladamente, sob pena de nos desviarmos dos propsitos de uma investigao verdadeiramente semitica.Tais conceitos compreendem, pois, complexas redes relacionais que nos levam, forosamente, a ter de examinar todo o contexto no qual age e interage o objeto de nosso estudo - o slogan publicitrio dos bancos -, seja na relao com os demais elementos da publicidade, seja na articulao com elementos culturais de uma sociedade na qual pretende interferir, compelindo, motivando ou informando seus objetivos.Curiosamente, Umberto Eco diz que "em muitssimos casos, a comunicao publicitria fala uma linguagem j falada, e exatamente por isso se torna compreensvel" (Eco, 1987: 183). E ainda: "certas comunicaes publicitrias funcionam mais do que outras, mas seria lcito perguntar qual o papel desempenhado pela persuasividade da argumentao, e qual o desempenhado por outros fatores extracomunicacionais que escapam anlise de quem se detm apenas na eficcia da mensagem. " (Eco, 1987: 184). Embora os efeitos da40A ARTE DOS SLOGANSpublicidade no decorram necessariamente de textos particulares, nas ligaes extratextuais, ou seja, na conexo com outras linguagens, na interao com outros sistemas comunicativos e no aproveitamento da matria cultural da sociedade, que eles se afirmaro como idnticos a si mesmos e, ao mesmo tempo, como operadores de um discurso reconhecvel pelo carter dos textos que porta.Cumpre, entretanto, esclarecer que essa afirmao no constitui imposio cultural, como quiseram crer alguns dos acirrados crticos da publicidade na dcada de 60. Ela advm, talvez, da seduo que o texto publicitrio se mostrou capaz de proporcionar, na competncia de ser "reconstrudo por cada uno de sus lectores de acuerdo a aquellos conjuntos de signos que ambos compartem (...) na medida en que Ia narrativa dei texto le proponga unos espacios posibles, pero que cobren sentido, dentro de Ia formacin ideolgica dei propio lector" (Zayas,1991:8)Eco localiza a eficcia da publicidade no em textos particulares, mas no seu conjunto, ou seja, no discurso. E assim explica o fato de seus resultados, em muitos casos, contrariarem os prprios produtores. Ele entende que, na maioria das vezes, os publicitrios no se do conta de que:a) o produto apenas um pretexto para recordar fatos, situaes ou idias;b) no se promove um produto, mas o consumo e o consumismo;c) no obstante as novidades de cada texto particular, para o pblico tudo acontece como uma mesma retrica, uma mesma estrutura, em que sempre possvel reconhecer algo j falado.Podemos entender, pois, que na globalidade dos textos (includas a as relaes extratextuais), na totalidade do discurso, que se produz o efeito scio-cultural da publicidade. Esse discurso, entidade abstrata, funciona como matriz de todos os textos, permanecendo, de alguma forma, em todos eles.E possvel ver que a distino entre texto e discurso, principalmente no estudo da publicidade, antes de constituir uma veleidade acadmica, de importncia primordial para que possamos entend-la alm do meramente constatvel pelos efeitos que produz.Usa-se, tambm e comumente, o termo texto para designar a parte escrita, falada ou lida das lnguas denominadas "naturais". UmaLUIZ CARLOS ASSIS IASBECK41pea publicitria pode ser lida como um texto no seu conjunto, na articulao imagem-disposio grfica-mensagem escrita. Porm, pela caracterstica eminentemente verbal de nosso objeto de estudo, necessrio estabelecer - ainda que com finalidade didtica - as distines entre texto, tal como aqui o abordamos, e texto escrito, para que possamos entender a funo deste ltimo no conjunto da publicidade.TEXTO E IMAGEMAs peas publicitrias, sejam elas concebidas para a mdia impressa (jornais, revistas, panfletos, outdoors, folders, rtulos, etiquetas, embalagens), sejam para a mdia eletrnica (rdio, televiso, cinema, vdeo), so hoje, basicamente, constitudas de texto escrito (ou falado) e imagens (estticas ou animadas).Embora os primeiros anncios fossem exclusivamente escritos,20 foi com o advento da tcnica de reproduo de imagens que a publicidade ganhou maior espao na mdia e assumiu maior eficcia em suas funes.A polmica envolvendo texto/imagem ou, antes, entre poesia e pintura remonta antigidade. Eustquio Barjau, analisando o fragmento 361 da Epstola aos Pises, de Horcio, nos diz que ele foi interpretado da seguinte maneira: "toda obra potica bela na medida em que dela se possam extrair quadros ". Tambm em sua Potica, Aristteles fala que "os pintores podem, assim como os poetas, imitar os homens, suas caractersticas, tais como so ou melhores do que so. "2120 Os primeiros anncios publicitrios de que se tem notcia se assemelhavam quele gnero que hoje denominamos anncios classificados, nas pginas dos jornais: La historia de Ia publicidad fija ei origen de su forma actual de representacin en los clasificados a partir de finales dei siglo XVII, cuando en Inglaterra se comenz a publicar -LuS-Advg_rtiser. Es durante esta poca que Ia palabra inglesa advertisement pas de ser Pnmeiro un colofn, luego un mdio para los tipgrafos anunciaran sus servicios y los escritores ei mrito de su obra, hasta convertirse finalmente en un gnero periodstico" (Zayas, 1991:6)'tado por Eustquio Barjau, na introduo a Laocoonte, de G. Ephrain Lessing, ed. espanhola (Ed. Nacional) 1977, p.24.42A ARTE DOS SLOGANSSobre o "embate" pintura versus poesia dissertaram os renascentistas Leonardo daVinci, Ludovico Dolce e Benedetto Varchi; mais tarde, Shaftesbury, Diderot e Moses Mendelssohn. Em 1766, o iluminista alemo Gotthold Ephrain Lessing publicou "Laocoonte sobre as fronteiras da poesia e da pintura" onde, no rastro da esttica da mimesis de Aristteles, afirmava que o que distingue a condio das artes a natureza dos signos que utilizam: as artes plsticas se definem pela espacialidade e dispem de signos naturais, ao passo que a poesia tem como condio a temporalidade, expressando-se por signos arbitrrios. Dessa forma, caberia s artes plsticas representar os corpos fsicos e poesia, as aes, os comportamentos desses corpos. Porm, Lessing no se mostrou to interessado em delimitar as fronteiras entre as duas modalidades de arte. O que ele pretendia era demonstrar a interpenetrao desses discursos, fato capaz de explicar contaminaes recprocas e frutferas a ambos:Zeuxis pintou uma Helena e teve o mrito de colocar abaixo de sua obra aqueles famosos versos de Homero em que os velhos, fascinados pela beleza dessa mulher, confessavam seus sentimentos. Jamais a poesia e a pintura foram levadas a competir em condies de maior igualdade. Nenhuma das duas obteve a vitria e ambas mereceram ser coroadas. (Lessing, 1977: 219)Lessing relido por Zayas como "ei primero a cuestionar Ias fronteras entre Ias diversas formas de representacin, a Ia vez que ressalta Ia porosidad de todos los discursos, de todos los gneros discursivos" (1991: 8).Se esta porosidade parece ser ponto pacfico, quase inquestionvel, quando estudamos a publicidade, o mesmo no parece ter-se dado quando das primeiras pesquisas ditas "semiticas" sobre o assunto.Ressaltamos, anteriormente, que o primeiro estudo semitico da publicidade, o artigo "Rethrique de Ulmage", de Roland Barthes, datado de 1964, acabou mesmo por ser um tratado sobre a percepo da imagem, deixando a publicidade num segundo plano. Ao contrrio de Lessing, Barthes entendeu que o duplo registro - verbal e visual tinha por objetivo complementar-se, mas no reciprocamente em dosagens iguais. Para ele, a imagem, ao proporcionar uma exploso dos sentidos, gera inmeras possibilidades de conotao, razo pela qual o texto verbal deveria funcionar como ancoragem, ou seja, como filtro, elemento estabilizador e direcionador da significao pretendidaLUIZ CARLOS ASSIS IASBECK43pelo emissor. Barthes referia-se, evidentemente, a um texto de carter fortemente referencial, que funciona de forma afuniladora de sentido, maneira de uma legenda. Sabemos, porm, que grande parte dos textos escritos da publicidade utilizam-se de vrios mecanismos retricos. E se a retrica da imagem tem a sua fora, tambm desejvel que o registro verbal seja analisado e investigado nos possveis cruzamentos com a retrica da imagem, que a ele se justape em contigidade espacial. justamente a que se d um terceiro elemento gerador de significao para todo o conjunto:O contato entre texto e imagem constitui um hbrido especial. A parte textual tende a fazer funcionar a mensagem na rbita dos "jogos de linguagem "- no sentido wittgensteniano do termo. A composio icnica, por seu lado, polariza a mensagem numa vertente "representativa". O resultado no uma coisa nem outra seno um composto especial que conserva algumas virtudes do representativo e outras prprias da esfera da linguagem verbal (Perez Tornero, 1982: 76). importante notar tambm que o registro visual no pode ser entendido apenas como a imagem fotogrfica, desenhada ou encenada. A anlise de Barthes tem como endereo a fotografia. Porm, os demais aspectos visuais, como o design grfico, o layout ou a diagramao dos elementos da pea, o posicionamento do anncio na pgina impressa, a concepo e a composio da pea como um todo, a assinatura do anunciante e, eventualmente, sua marca no constituem aspectos perifricos na visualidade, mas elementos de capital importncia no processo de significao.No se trata, pois, de precisar qual dos dois registros o mais importante ou o determinante da significao. Nossa investigao no se deter no estudo da visualidade, pois o objeto do presente trabalho de natureza predominantemente verbal. Entendemos, porm, que nenhuma anlise semitica - e toda leitura de textos culturais - poder desconhecer ou isolar o texto escrito do conjunto serial onde se localiza. Negligenciando a viso conjuntural, em muitos dos casos os slogans sequer fariam sentido para a finalidade a que se propem. tambm por isso que afirmamos anteriormente nosso Propsito em analisar os slogans enquanto textos de um discurso maior, mais geral. Teremos, inclusive, oportunidade de verificar nos44A ARTE DOS SLOGANSprximos captulos que, por diversas vezes, essa contaminao se d justamente por iniciativa do registro verbal, que necessita ser representado - seja por analogia, seja por dessemelhana - para atingir seus objetivos comunicacionais, persuasivos ou no.W. J. T. Mitchell22 classifica a famlia das imagens em cinco ramos, entendendo-se aqui imagem como representao icnica que guarda do seu objeto certa semelhana, certa similitude:1) as imagens grficas, como pinturas, esttuas, desenhos;2) as imagens ticas, aquelas geradas pelo espelhamento e pela projeo;3) as imagens perceptuais, as que nos vm pelos dados dos sentidos ou perceptos e pela identificao de sua aparncia:4) as imagens mentais, aquelas dos sonhos, da memria, da lembrana, a imagem das idias;5) as imagens verbais, aquelas descritas pelas palavras, sugeridas pelas metforas.Tal classificao tem o mrito de nos alargar a compreenso da iconicidade, mas, de certa forma, nos faz repensar o conceito de texto escrito, uma vez que estende tambm s imagens verbais critrios de anlise comuns aos aplicados s imagens grficas, enquanto imagens, mas diferenciados, enquanto de naturezas diversas.Sabemos que o registro visual possui a competncia de merecer prioridade na ateno e leitura. Um slogan em destaque no anncio, desenhado em tipos grficos de grosso calibre pode, pelo destaque visual (imagem grfica), trazer para si a prioridade da leitura, antes mesmo que a ilustrao seja percebida. Nesses casos, possvel que a mensagem ali contida, por ser a primeira a ser recebida, venha a condicionar o entendimento de toda a pea, guiando e direcionando a interpretao. Mas independentemente dessa possibilidade de antecedncia na percepo, o texto escrito, tal como a imagem, pode ser polissmico: pode conotar, despertando relaes simblicas que se configuram em imagens. O slogan, que por natureza precisa ser entendido de imediato, nem sempre prima pela denotao. Em muitos22. W.J.T. Mitchell autor de Iconology: image, text, ideology. Ele nos mostra um amplo conceito de imagem e apresenta pgina 10 da referida obra, a diviso dos ramos de imagem, que sucintamente aqui esboamos.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK45dos casos, adquire carter altamente conotativo, pois, atuando diretamente no lxico dos indivduos, comumente provoca associaes imprevistas, inusitadas, de acordo com as experincias colaterais que o leitor possua. Neste sentido - e considerado no todo da pea publicitria -, o slogan no s pode guiar a interpretao como tambm proporcionar chaves para sua decifrao (produo de sentido).A conjuno imagem/texto na publicidade ganha novo contorno quando entendemos, ainda, que o texto escrito no s capaz de veicular imagens por metforas ou descries (como diz Mitchell), mas tambm possui a competncia de deflagar imagens mentais, imagens estas que podem ser correspondidas ou no, em diversos graus de intensidade e identidade, por aquelas que nos so sugeridas. Nessa gradao de afinidade e diferenas, a leitura pode proporcionar satisfao ou ansiedade, acomodao ou instigamento; pode confirmar nossas expectativas (confirmao esta que ser estendida ao produto anunciado) ou frustr-las (frustrao que poder ser amenizada pela adeso ao produto anunciado) gerando surpresa e novidade. Tambm a verificamos a interdependncia, a interao produtiva da relao texto/imagem aos propsitos da publicidade.Assim, se primeira vista texto e imagem nos parecem linguagens radicalmente opostas, analisando-as semioticamente, principalmente na publicidade, veremos que essa conjuno produtiva capaz de amparar-se mutuamente na consecuo de objetivos comunicacionais. ;; ; ,, -. ' >. : ;r0 TEXTO ESCRITO DA PUBLICIDADEHoje j no podemos dizer com tanta convico que o texto escrito imprescindvel a uma pea publicitria. Muitos so os anncios nos quais apenas a imagem suficiente para dizer do Produto, com a eficcia desejada. Mas no constituiro esses casos fenmenos isolados, envolvendo um ou outro produto j conhecido, e que por isso mesmo tem a competncia de trazer em si, na sua imagem, o seu discurso? No ser o caso de uma publicidade que Pretende apenas refrescar a memria do pblico, levando-o a reconhecer algo que j o tinha anteriormente sensibilizado? E ser46A ARTE DOS SLOGANSque essa imagem no contm, em nenhum momento, sob nenhuma perspectiva, um rtulo, uma etiqueta, um nome, uma voz, uma palavra?Aqueles que fazem apologia da imagem, que a entendem como exploso dos sentidos, ou como mais percuciente e mais assimilvel que o texto23 tendem a ver este ltimo quase como um apndice, resqucio de uma era verbal ultrapassada pela civilizao das imagens ou, no mximo, como elemento condutor da leitura. Como argumento capaz de comprovar que as imagens podem produzir sentido independentemente do auxlio dos registros verbais, podemos lembrar o fato de que Melis e Griffith, nos primrdios do cinema, desenvolveram um sistema de cdigos e uma peculiar sintaxe narrativa na qual as imagens produziam sentido prescindindo das palavras.24 O advento da tcnica de gravao de trilhas sonoras em sincronismo com a imagem em quase nada alterou essa linguagem, j consolidada como autenticamente cinematogrfica. O aficionado de cinema no incio do sculo sabia ler aqueles movimentos, as seqncias de imagens, sem sentir falta de um fio condutor verbal.A publicidade comercial, ao contrrio do cinema, teve seu incio em cartazes e jornais que no possuam ainda a tcnica de reproduo de ilustraes (desenho ou fotografia). Os primeiros anncios publicitrios eram totalmente escritos, assim como os denominados anncios classificados dos jornais de hoje. A caracterstica marcante desse tipo de texto est na quase ausncia de retrica persuasiva, uma vez que sua espinha dorsal o substantivo. O substantivo, segundo Ricardo Ramos,25 possui a "pretenso" de ser sempre exato e objetivo, passando-nos a iluso de solidez, de concretude e de23. a primeira expresso (exploso dos sentidos) atribuda a Roland Barthes em "A Retrica da Imagem"; a segunda, a A. Moles em "O Cartaz".24. O ano de 1895 considerado o ano inicial do cinema, quando Lumire promove a primeira sesso de cinema no Gran Caf de Paris. De 1895 a 1906, G. Melis produz uma srie de filmes, conquistando grande pblico. A partir de 1906, David Griffith inaugura os cdigos daquilo que hoje conhecemos como linguagem cinematogrfica. Apenas em 1928 aparece o cinema falado. Segundo Arlindo Machado, os primeiros aficionados pelo cinema j entendiam a linguagem das imagens em movimento na tela, mas os novos adeptos necessitavam ouvir as prelees do conferencista educativo, pessoa que comentava o enredo do filme para a platia e evidenciava as mensagens morais ali contidas.25. a afirmao que se segue foi pronunciada em aula da disciplina "Texto Publicitrio" na ESPM, 2o Semestre de 1991.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK47imparcialidade, fazendo-nos acreditar que o produto anunciado prescinde de qualquer discusso.Mas o classificado no chegava a ser apropriado para anunciar toda a sorte de produtos. Alguns, como os produtos de beleza e os farmacuticos,26 pela prpria natureza de seus fins, demandavam textos mais adjetivados, capazes de levar o leitor a, por exemplo, sentir a fragncia de um perfume ou decidir-se de imediato pelo alvio estomacal proporcionado por aquele propalado medicamento. A ausncia das imagens impressas gera textos prolixos, em que a verborragia na exaltao das qualidades do produto acabava por se fazer necessria para criar junto ao pblico o clima propcio ao consumo, a motivao para a compra. Se no anncio classificado o leitor no se animaria a imaginar o que quisesse sobre o bem anunciado, entende-se, aqui, que ele deveria ser guiado, atravs de habilidosa argumentao e primorosa descrio, a concluir favoravelmente pela aquisio.A ausncia ou precariedade da imagem nos primeiros reclames21 forou o desenvolvimento de uma retrica persuasiva que ser reconhecida, posteriormente, como a marca registrada do texto publicitrio.Mas possvel observar que, em muitos casos, apenas o texto escrito pode ser suficiente para produzir um bom anncio, dispensando a presena de ilustraes ou fotografias. O que vai determinar esta deciso ser a prpria especificidade do assunto enfocado: alguns conceitos ou idias revelam-se incapazes de se restringirem a uma ou outra situao ilustrvel, sem perderem parte considervel de sua complexidade semitica.No podemos, entretanto, negar que, com o advento da tcnica de se reproduzirem imagens em cartazes e jornais, o texto escrito da publicidade ganhou outras dimenses, ampliando ou encolhendo, subdividindo-se ou multiplicando-se pelos espaos da pgina, de26. os anncios de produtos farmacuticos ocuparam grande parte dos espaos da imprensa e do rdio no incio do sculo XX. Os maiores anunciantes do gnero forarn Polvilho Granado (1903), Pomada Minncora (1914), Emulso Scott (1907), Plulas de Vida do Dr. Ross (1898) e Biotnico Fontoura (1915). Fonte:Breve Histria da Farmcia Brasileira- Philippe Gudon -196527. o termo reclame era utilizado nos primrdios da publicidade comercial para "designar qualquer tipo de propaganda comercial: anncio, cartaz, prospecto, fingle, etc " (Rabaa,1978:396)48A ARTE DOS SLOGANSforma a compor, com o todo, um conjunto plasticamente agradvel e funcionalmente eficaz. dessa fuso que vai surgir aquilo que Perez Tornero denomina um "discurso diferente", um terceiro texto.De modo geral, o registro verbal na publicidade impressa (ou fixa) se d no ttulo (que pode ser tambm o tema da campanha ou o slogan), no corpo do anncio (o argumento), na assinatura do anunciante (incluem-se a a logomarca, o emblema e, s vezes, o slogan) e, em alguns casos, no contexto da prpria imagem (casos dos rtulos, griffes, bales, etc). Na publicidade radiofnica, o verbal tem presena quase absoluta, compartilhando o espao do anncio apenas com a msica ou com rudos ambientais. O rdio o lugar onde o slogan encontrar maior efetividade, contribuindo de forma decisiva para fixao e memorizao de marcas de produtos e servios. A publicidade veiculada pela televiso conseguir associar a importncia do verbal no rdio preeminncia da imagem na publicidade impressa, resultando da um hbrido altamente atraente e de grande fora persuasiva. Os recursos tecnolgicos da gerao de imagens digitais conferem hoje aos registros verbais o dinamismo das imagens, fazendo com que, por exemplo, as letras se transmutem em objetos e vice-versa, que dancem no vdeo ou se fundam em malabarismos grficos altamente sedutores e visualmente atrativos.No obstante as restries tcnicas de um trabalho acadmico eminentemente verbal, tentaremos estudar os registros verbais da publicidade nas diversas mdias sem isol-los do conjunto das peas s quais pertencem, mas teremos de nos limitar a narrar sua contextualizao apenas naquelas situaes julgadas absolutamente indispensveis. Verificaremos como funcionam na produo de sentido dos slogans algumas figuras de retrica e/ou de estilstica. Porm, nosso enfoque no se restringir quele que era o preferido nos anos 60-70 por lingistas e gramticos ortodoxos: estamos convictos de que tais abordagens s nos levariam a reviver velhas polmicas ou trazer luz antigas evidncias, dificultando novas empreitadas e desencorajando nossos propsitos de investigao mais ampla. Tentaremos imprimir aos nossos estudos um tratamento semitico, ainda que tenhamos de nos embrenhar por consideraes de ordem lingstica; porm, estas ltimas s nos sero teis na medida em que contriburem para o entendimento da estrutura do discurso presente naqueles motes especficos denominados slogans, para compreendermos sua funo na pea publicitria como um todoLUIZ CARLOS ASSIS IASBECKe sua importncia cultural na sociedade em que so criados e consumidos.0 SLOGANO termo slogan tal como nos chegou, de origem francesa. No entanto, ele remonta, segundo Olivier Reboul, expresso escocesa "sluagh-ghairm ", que quer dizer "grito de guerra de um cl" (Reboul,1986:7-8). Na Frana, comeou a ser usado com sentido pejorativo, designando doutrinamento, propaganda, reclame. No sculo XVI, a Inglaterra o transformou em "catchword\ ou seja, "palavra-engodo". Mas o termo francs acabou por predominar na Inglaterra, j no sculo XIX, para especificamente designar a divisa de um partido poltico, de uma ideologia ou de uma linha filosfica. Coube aos Estados Unidos tornar o francesismo slogan conhecido em todo o mundo na acepo de divisa comercial, tal como hoje o entendemos.Estas informaes lingsticas e histricas so importantes porquanto nos remetem gnese verl do slogan e, mais precisamente, a sua origem oral. Normalmente, quando localizamos o desenvolvimento massivo da publicidade no final do sculo XIX e no incio do sculo XX (com o aparecimento dos cartazes e dos jornais), esquecemo-nos de considerar que algumas estruturas que viriam a colaborar na composio desse novo apelo comunicativo j estavam consolidadas, h sculos, na tradio oral. certo que a publicidade vai revitalizar os slogans e dar-lhes destaque especial no contexto da sua to eficiente e peculiar retrica persuasiva. Mas tambm inegvel que o moderno slogan publicitrio herdou tradies milenares das frases feitas e dos ditos populares - como veremos no prximo captulo - a um custo relativamente baixo, incorporando-os em seus formatos, adequando-os aos seus propsitos, com grande ganho de escala, como diz Lisa Block de Behar:La elaboracin publicitria encuentra en Ias frases hechas y outros dichos populares material especialmente conveniente para alcanzar sus propsitos. Aunque parezca paradjico - dada Ia popularidad que Ias caracteriza - Ias expresiones hechas, Ias ms difundidas, Ias ms arraigadas, administradas con iniciativa y50 : A ARTE DOS SLOGANShabilidad tambin se prestan para producir esa sorprendente imprevisibilidad que persigue toda accin en propaganda (Behar1973:167).Com o desenvolvimento das tcnicas de se fazer publicidade, o grito de guerra no mais depender de um vitorioso combate para ser lembrado por um grande nmero de pessoas. Ele se banalizar em frmulas capazes de vender sabo em p e margarina e se consagrar identificando ou simbolizando sofisticadas ideologias. J nos anos 30, o slogan havia sido reconhecido publicamente como artifcio-chave de marketing poltico: Adolph Hitler (em sua obra "Mein Kampf) fornece-nos uma quase-receita de sucesso para a propaganda poltica, destacando a funo dos slogans:Toda propaganda eficiente deve limitar-se a muito poucos pontos, fazendo-os valer fora de frmulas estereotipadas, marteladas pelo tempo necessrio para que o ltimo dos ouvintes esteja em condies de reter a idia (apud Reboul, 1986: 8).Grandes estadistas e lderes polticos, coincidentemente ou no, foram estigmatizados e lembrados pela histria no s pelos seus feitos, mas tambm (e, s vezes, principalmente) pelos brilhantes slogans que utilizaram em suas campanhas polticas ou em discursos para multides, sejam em praas pblicas, sejam atravs do rdio, do cinema ou da televiso .28Como elemento integrante das peas publicitrias comerciais, o slogan tem sempre lugar de realce. Visualmente, numa pgina impressa, ele costuma vir destacado em tipos de calibre mais expressivo, encimando a ilustrao ou o texto argumentativo, ou ambos. Pode acontecer tambm - e no raramente - que ele aparea junto assinatura, logomarca ou ao emblema do anunciante. No primeiro caso, o slogan assume o carter de ttulo ou de manchete de forte apelo comunicativo - e tende a direcionar a leitura de toda a pea; no segundo caso, integra a marca da empresa, formando com28. Hitler, Mussolini, Churchil, Eisenhower e Charles de Gaulle, lderes polticos de grande expressividade, tiveram suas linhas polticas fomentadas por macios apelos slogusticos, como reconhecem estudiosos e crticos da publicidade, tais como Jean Baudrillard, U. Eco, R. Barthes, G. Peninou, O. Reboul, entres outros.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK51ela um conjunto identificador. Na publicidade de imagens dinmicas- como as da televiso e as do cinema - o slogan geralmente aparece no incio ou no final da apresentao, com a finalidade de ser justificado logo em seguida (atravs de provas ou demonstraes de confirmao) ou de consolidar um juzo, marcar uma proposio acerca do produto anunciado.Porm, no a localizao o melhor critrio para identificar um slogan. Ele se torna mais facilmente reconhecvel por algumas peculiaridades de sua estrutura: uma "frase concisa, marcante, geralmente incisiva, atraente, de fcil percepo e memorizao, que apregoa as qualidades e a superioridade de um produto, servio ou idia", conforme registrado no Dicionrio de Comunicao de Carlos Rabaa e Gustavo Barbosa (1978: 435). importante ressaltar que as qualidades destacadas pelos autores como essenciais ao conceito de slogan so passveis de estarem presentes na sua prpria conformao, independentemente de o slogan fazer parte do conjunto de uma pea publicitria. Ou seja, para que um slogan funcione como slogan, no preciso que venha acompanhado de ilustrao, de um texto maior que o explique ou da assinatura do cliente. Isto nos leva a admitir a possibilidade de, em muitos casos, o slogan existir e funcionar publicitariamente de forma autnoma, prescindindo da interao com os demais elementos que constituem um anncio. Em ltima anlise, tal concluso implica no reconhecimento de que ele constitui, em si mesmo, um texto, naquele sentido evidenciado por Yuri Lotman (1978:101 -112), com expresso, delimitao e estrutura prprias.Estudar o slogan como texto autnomo e, ao mesmo tempo, como elemento bsico nos registros verbais da pea publicitria ser, pois, tarefa de grande complexidade. Tanto a pesquisa quanto a anlise demandaro, pois, metodologias suficientemente flexveis (e complementares), capazes de contemplar um amplo espectro de manifestaes desse mesmo objeto. Considerando, porm, que nosso propsito maior no to-somente investigar os meios tcnicos de elaborao e veiculao de slogans, mas principalmente estud-los em funo da importncia cultural que os reveste, cremos que apenas abordagens semitica - e mais especificamente aquelas que nos propiciam a denominada Semitica da Cultura - sero capazes de nos trazer resultados satisfatrios. Isto no significa que teremos respostas objetivas ou solues categricas para os problemas que52A ARTE DOS SLOGANSsurgiro, mas, com certeza, estaremos trabalhando a complexidade dos problemas de linguagem em meio ao igualmente complexo universo das realidades culturais nas quais essas linguagens surgem e so exigidas como condio inequvoca de sobrevivncia sciocultural.' OS SLOGANS NA PUBLICIDADE DOS BANCOSSe, por um lado, a abordagem do nosso objeto de trabalho como afirmamos - capaz de nos permitir maior mobilidade de investigao, por outro, tende a criar uma demanda - em nvel de pesquisa - por um universo de ao especfico onde esse objeto atue como texto cultural. Um paradoxo compreensvel quando entendemos que a Semitica da Cultura tem como pressuposto bsico o fato de que "nenhum sistema sgnico possui um mecanismo que lhe permita funcionar isoladamente" {apua Prevignano, 1979-194) e que, por isso mesmo, os textos culturais so resultantes de relaes que envolvem diferentes sistemas em uma unidade informacional "fechada em si, relativamente delimitada, com comeo, meio e fim, fronteiras externas e internas e uma mensagem significativa" (Lotman,1978:101-112). Um texto , pois, um conjunto organizado de signos; porm, esses signos, tomados individualmente, no lhe so exclusivos e no significam coisa alguma seno no contato, na relao com os demais signos. a qualidade desse contato e o resultado das conseqentes contaminaes sgnicas que vo produzir sentido e dar corpo ao texto. Por esse motivo, todo texto , ao mesmo tempo, nico e universal, particular e coletivo, individual e familiar a todos os demais textos.Assim, estudar o slogan, na sua materialidade, no significa isol-lo do meio no qual age, mas consider-lo como um texto (j que possui sentido) dentro de um texto maior que lhe amplia o sentido e objetiva a finalidade comunicativa. Estud-lo como texto cultural, entretanto, significa investig-lo em ao, em atuao num universo cultural de caractersticas especficas onde venha a ganhar peculiaridades que lhe delimitem territrio e fronteiras.LUIZ CARLOS ASSIS IASBECK53.Nosso campo de pesquisas estar centrado na publicidade praticada para e pelos bancos, instituies financeiras que administram a moeda, o meio que possibilita a aquisio de bens de consumo e o pagamento de servios numa sociedade de caractersticas capitalistas. Como toda empresa, os bancos tm interesse no lucro; precisam, pois, vender seus produtos e servios financeiros de forma a assegurarem margem de ganho para novas aplicaes e investimentos.O que os bancos vendem o prprio meio de compra: o dinheiro. Este metacomrcio, altamente competitivo, no pode prescindir da publicidade. E mais: necessita atuar num tipo muito especial de comunicao, capaz de sensibilizar e mobilizar favoravelmente seus potenciais usurios, de forma no s a atra-los como tambm a mantlos em constante reciprocidade. A publicidade dos bancos intenta, pois, em seu proveito, solidificar a dependncia ao dinheiro, num fluxo contnuo de mensagens comunicativas. Analisando os slogans dos bancos estaremos, tambm, estudando a importncia do dinheiro na vida moderna e como este signo se prolifera em metforas, confundindo-se com os mais profundos anseios do homem.Evidentemente, o slogan apenas um dos elementos da publicidade bancria. Mas tentaremos mostrar como ele possui a competncia de representar e apresentar constantemente realidades culturais numa rea especfica da atuao humana, fomentando e solidificando, estratificando e estereotipando linguagens, contribuindo sobremaneira para o enriquecimento do repertrio daqueles sistemas que l