11
r. í CLÁSSICOS INQUÉRITO -re~-ro 12 HORÁCIO ARTE POÉTICA Introdufão, Trlldufão e Comentán'o de R. M. ROllldo' Fer.nllndeI . tllI FlI&uldllde de Letrlls de Lisboll I \. I ) j - )," .., ~~. li] EDITORIAL INQUÉRITO LIMITADA LISBOA

A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

r. í CLÁSSICOS INQUÉRITO

-re~-ro 12

HORÁCIO

ARTE POÉTICAIntrodufão, Trlldufão e Comentán'o de

R. M. ROllldo' Fer.nllndeI .tllI

FlI&uldlldede Letrlls de Lisboll

I

\. I )

j - ),"..,

~~.

li]EDITORIAL INQUÉRITO LIMITADA

LISBOA

Page 2: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

NOTA À PRESENTEEDIÇÃO

Esteve unJa antenor edição portuguesa da ArtePoética horaciana esgotadfl durante vádos anos. Porserpeça indispensávelpara a.compreensão dajeitu-ra da obra literána, por ter influencIado até ao sé-culo XVIIIa literatura ocidental, foi essaediçãopro-curada. Por ser procurada, tomou-se rara e, I!mavez quase desaparecida, tem sido submetida ii tor-tura de fotocópIas sem número. Não se sabe comose sentem os livros, mas alegramo-nos com a pre-sente edição da Inquén'to, que aparece quase inal-terada, excepto no que respeita a indicações biblIo-gráficas, que foram actualizadas, e a dois ou trêscasos do texto português, que foram melhorados.

.' ),.~. ,:~ ~

f '!

À MEMÓRIA DO MEU"QUERIDO MESTREPROF.. SCARLAT LAMBRINO

E EM LEMBRANÇA

DA SUA GRANDE BONDADB

B VASTA ERUDIÇÃO.

II

. ~

Page 3: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

rII

~,

PREFÁCIO

:.:~:~

\ ~~

n,:.::

:i!J:'""

t

'.

A presente edição tem como único fim proporcionar "/~~;~mais um instrumento de trabalho aos estudiosos portu-' ;~;

gueses interessados no conhecimento da teoria literária ,fi:

antiga e da sua influência nas literaturas modernas. Fal- '".I

tava-lhes, com, efeito, desde há 'muito fempo, uma tra- , "',

dução portuguesa da Arte Poética horaciana e faltava-',;-lhes, sobretudo, a edição desta, acompanhada por wn ",:':

comentário actualizado. Este lhes permitirá averiguar ::~;

em que medida progrediu, neste nosso século, a ciênCia, ~~,t~filológicaocupada em' esclarecer este texto fundamental ',~~de Horácio. ",

Tal carência foi a razão mais preponderante, sem' "fatar do meu gosto por Horácio, que me levou a abordaro assunto e a levá-Io a cabo, muito embora não igno-rasse as dificuldades e as contingências de tat empreen- o"~.~'"dimento. ~:;-~

Não deve o leitor procurar, no que se lhe apresenta . ,.'Ano comentário, originalidade de métodos e de matérias. ',:ii.;..1

Não é possível, sem ser a tongo prazo, fazer investiga- ".:~!~çõesoriginaissobre o texto da Arte Poética,pois a bi- " . ~';~

bliografia'fundamental sobre o assunto amontoa-se desde ~",I{~, '..t,>

há séculos e, ainda que de qualidade desigual, a verdade '::',1

é que o seu conhecimentose torna indispensável. Ora ele

~

~/

.

', ,"~"..'1.,9

;,'1!;..

Page 4: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

"o

só é materialmente possível, pela leitura aturada devários anos.

No entanto, para suprir essa lenta posse de conheci-mentos e ideias, decidi tomar como fontes orientadoras

da minha infonnação os estudos mais modernos sobreHorácio e a sua Arte Poética, entre os quais se salientamos de Rostagni, Perret e, muito especialmente, o deBrink. A estes utilizei-os profusamente.

Quanto ao plano, é este livro, por assim dizer, canó-nico. Na introdução, situei a Arte Poética no meio am-biente em que foi criada e assim também no lugar quelhe compete no brilhante processo e evolução da obrahoraciana. Não descurei igualmente a problemática que

subsiste, no que respeita a estrutura do poema, as suasfontes e a sua finalidade. Por fim, tomei em considera-

ção as edições portuguesas da Arte Poética, para que oleitor possa fazer uma ideia segura do interesse desper-

tado, no nosso país, por este texto.

Na tradução, que confronta o texto latino, procureiobservar com fidelidade o texto original, fazendo o pos-

sível para que o lei~or o sinta em todas as suas caracte-rísticas de documento literário, feito por um espíritoperspicaz c crítico.

No tocante ao comentário, é ele o mais completo pos-

sível, sem que esteja demasiado sobrecarregado por mi-nudências inúteis, que em nada facilitam a compreensão

do texto e que não intcre~sam senão ao especialista.Atendi sobretudo às dificuldades levantadas pelo con-teúdo, mas esclareci também os aspectos mais insólitos

10

"

. \~;';1j

da .fonna, ou seja, da língua e da estrutura do discurso ;;~:~:horadano. ;U

O rrexto !Latinofundanrenta-se printipalme:DJte nos :!:!textos estabelecidos por Villeneuve e Klingner, cujaS"'"

edições estão citadas na bibliografia. Só se introduziram algu': "

mas Jigeiras alterações no tooante à ortogtra'M, como, r'

p. ex., na SIUIbstimiçãode uolt poc uult (v. 348), a timde Ifadlâtar a lCompreensão dos versos horaJCianosao 1citocmmos wrsado na leitum do !la:tim.ÜX'aJá1Cstaedição Jhe

sirva de algum 3JUXÍ1io.Cumpre-me recordar agora a contribuição dada a

este trabalho pelo Prof. Scarlat Lambrino que a morteacahOlU'de ro1.1lbac,tão bru.scam'enite, à nossa convivên-

cia. Ele leu e melhorou o original com várias sugestões

ditadas pelo espírito crítico, severo e justo, que todoslhe conhecíamos. Também ele deveria ter escrito o pre-

fácio para esta edição, se a morte o não tivesse sur-preendido no meio dos seus trabalhos. Todas as palavrassão poucas para descrever a sua acção benéfica de di-dacta e investigador, mas estou certo de que a obra dosseus discípulos a comprovará largamente, pois, atravésdeles, a sua figrura c<mt:inuará a viver.

Rcsta-me agradclCcr 'ao Prof. Prado Coelho o interesse ':'f'

que demonstrofll na pu,blicação d€5te traJba:1hoe ao meu :11

Amigo António Coimbra Martins a paciência com que',~'leu o origmaJ e as sugestões com que enriqueceiU este),Hwo. Dese10 finalmente ~embraTa colaJbOlraçãodada pelo.Dr. Vidolf Buesou na COITelCçãodas pro:vas tipo:gráficas .

e no melliocamento de vários pornlenores.

,'o,.

Page 5: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

INTRODUÇÃO

HORÁCIO E A SUA ARTE ,POÉTICA

Foi na Apúlia e mais precisamente Vidaem Venúsia que QUi1Z.tusHoratius Nasc. 65 a.C.Flaecus nasceu, em 8 de Dezembrode 65 a.C. Ele próprio o diz nas Odes., lI, 17, 1'7 ese.gs., referindo-se aos signos astrais que presidiram ao '

seu nascimento. Filho de um libertus (escravo forro)que, .entretanto, grangeara uma 'posição e uma pequenaquinta, foi enviado poT seu pai a estudar .em Romacom o retor Orbilius, sentando-se nos mesmos bancos

que os filhos de senadores e cavaleiros, seus condis-cfpwos. .

Continuará os estudos em Atenas e, aos vinte anos

(44 a.C. ), alistar-se-á ([10exéocito de Bru.to como tri-bunus militum. voltan,do a Roma em 42, depois dodesastre d~ FiIiJpos,que levara Bruto ao suicídio.

No retomo a Roma espera-o a adversidade: o pai 'morrera, e a pequena quinta, que possuía, fora confis-cada. A pobreza espe:rava-o, pois, e s6 com o trabalhoquotidiano a poderia Horácio enfrentar. Emprega-seentão como seriba quastorius. ou seja, qualquer coisa

""o

"O,.:". .1:, ::~,.,Il~.

13 -'.:1

Page 6: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

.,

só é materialmente possível, pela leitura aturada devários anos.

No entanto, para suprir essa lenta posse de conheci-mentos e ideias, decidi tomar como fontes orientadoras

da minha infonnação os estudos mais modernos sobreHorácio e a sua Arte Poética, entre os quais se salientamos de Rostagni, Perret e, muito especialmente, o deBrink. A estes utilizei-os profusamente.

Quanto ao plano, é este livro, por assim dizer, canó-nico. Na introdução, situei a Arte Poética no meio am-biente em que foi criada e assim também no lugar quelhe compete no brilhante processo e evolução da obrahoraciana. Não descurei igualmente a problemática quesubsiste, no que respeita a estrutura do poema, as suasfontes e a sua finalidade. Por fim, tomei em considera-

ção as edições portuguesas da Arte Poética, para que oleitor possa fazer uma ideia segura do interesse desper-tado, no nosso país, por este texto.

Na tradução, que confronta o texto latino, procureiobservar com fidelidade o texto original, fazendo o pos-

sível para que o lei~or o sinta em todas as suas caracte-rísticas de documento literário, feito por um espíritoperspicaz e crítico.

No tocante ao comentário, é ele o mais completo pos-

sível, sem que esteja demasiado sobrecarregado por mi-nudências inúteis, que em nada facilitam a compreensãodo texto e que não interessam senão ao especialista.Atendi sobretudo às dificuldades levantadas pelo con-teúdo, mas esclareci também os aspectos mais insólitos

ln

.:.,

. :.:;~;';~j

da .fonna, ou seja, da língua e da estrutura do discurso ;;~:~:horadano. ;U

O texto !1atinofundanrenta-se printipralme:rute nos ;~!textos estabelecidos por Villeneuve e Klingner, cujaS.'.

edições estão citadas na bibliografia. Só se introduziram algu~mas ligeiras alterações no tooante à OItoglra1oo,como, f.

p. ex., na S'Ulbstimiçãode uolt poc uult (v. 348), a ~imde:!faciLitara compreensão dos v.ersos horadanos ao 1Jeitocmenos wl"Sado na leitum do ~a:tim.ÚX'aJáesta edição lhe

siTva de algum aJUXiJio.Cumpre-me recordar agora a contribuição dada a

este trabalho pelo Prof. Scarlat Lambrino que a morteaca.boiU'de roubar, tão bruscamenite, à nossa convivên-

cia. Ele leu e melhorou o original com várias sugestões

ditadas pelo espírito crítico, severo e justo, que todoslhe conhecíamos. Também ele deveria ter escrito o pre-

fácio para esta edição, se a morte o não tivesse sur-preendido no meio dos seus trabalhos. Todas as palavrassão poucas para descrever a sua acção benéfica de di-dacta e investigador, mas estou certo de que a obra dosseus discípulos a comprovará largamente, pois, atravésdeles, a sua figrura cOOJtinuaa-áa viver.

Resta-me agradecer ao Prof. Prado Coelho o interesse .:~fI

que demOtIlstroiU.na pUlblicação deste traJbalho ~ ao mro :1i

Amigo António Coimbm Martins a !paciência com que .'j.leu o origmal e as sugestões com que ~nriqUJeceiUeste.]:Hv:ro. D~se1ofinalmente aembliaTa colélJbomçãodada pelo.DI'. VidolI"Bueoou na correcção das provas tipo.gráfic'élS.e no meilhorameniode vários pormenores. .

,',

;";

::!~;;~\i;.._,H~~..'.

Page 7: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

corno amanuense do. Mhustério.das Finanças, sem qu.e,todavia, deixasse -aocupação que lhe era mais agradáveJ,a pu'blicação de versos, que o ajudava a aumentar opecúlio mensal.

Foi exactamente nesta fase difícil que travou conhe-cimento com Vário e Virgílio que o.apresentaram a Me-cenas, proporcionando-Ihe, por volta de 38 a.C., u.mlugar no círculo de literatos que se reünia na casa dogrande benfeitor das letras. Com est-a entrada paraaquela sociedade .de artistas e escritores, começa.rá!paraRorácio uma nova era de sucesso literário, de melhoriafinanceira e uma 10nga amizade com Mecenas e algunsdos poetas ,protegidos !por este. Também, como conse-quência nélJturaldo meio qruepassara a frequentar, assuas relações sociais eSltenderam-seàs peTSOnalLdadesdo-minantes da Roma de então e chelga!fammesmo ao pró-prio imperador que iguaI.menJte.passoo a protegê-'lo. M-guns anos depois, já Roráeio estava definitivamenJt:e

Hberto das preocupações fiinanceil1'~e na jpOSSe reconf01"-

tante de .uma propriedade na região sa:bina, que, com asua casa de Roma, fOTmavaum dos dois poWsque deli-mitavam a sua existência de: homem e de a.rtista. Em

Roma, desejava 1er :a.rtran.quilidade,a simpliddade queo espeTavamna sua quinsta.Uma vez nesta, :porém, logolli.evoLtavao sPleen da vida tUJr.buJlentame:niteintelectualdo meio artístico de Roma..

A obra poética que nos deixou é oreflexo da sua persOinalida.deequili-brada, sem seTdemasiado satisfeita, do seu carácter am-bicioso, sem que por isso fosse possuído por eterno des-contentamento. Combinava um bom-gosto muito seu,uma ironia prazenteira e um labor incansável, com osresultados da sua experiência poética, com a leitum da .

poesia ~rega e romana e com.os conhecimentos teóricosque aprendera na escolade Orbnio, nas escolas de Atenas.e nos estudos qruefez pela vida fora.

Desta some, a sua obra-em que a dx."'l\ (ars)grega se combina a:dmiràve1mentecom o Italum facetume com a ironia que ao poeta. era peculiar -, ainda que. "~

apreSentecerta diversid3lde,não deixa de estar /Unida<' .../t

interiormente pelo seu equilíbrio e \bom senso !estético. ':' '."i!

: p~';~.Im~j\:',~'

a ~esia, comprazendo-se em pu.blicar poemas que, aind~?,:w.~';'na Juventude, o tomam célebre. "'!:IU~.,.'

~'~','I.;. 'J''nf.'.. '''t!''

Obra poética. {~il~:i.llj':;1

.,

Até à sua morte, em 27 de Novem-bro de 8 a.C., nunca mais rubandonou

Morte 8 a.C.

Rorácio inicia-se e dá-se a conhecer Epodosao grande público com os Epodos(iambi) !emnúmero Idedezassete, compostos entre 41!e311a.C. e publicados em 30. Embora :ainda incipientee imaturo, o poeta já aqui nos traz inovações importan-tes, como ele pt'óprio diz, ao dar a conhecer ao Ládo ,

os jambos de ATquílocode Paros (EPíst., I, 19, 23-5). ":,:!

Neles se ocUlpada crítica socioa1e !política'- não tão... -~":'i.

:

I

I

.mordaz e pessoal como a de Arqufloco -, do amox e da.. ':!tranquilid~de que a vida do campo proporciona. ,;.'

.;

~

~"

15 li:r.~"

14

Page 8: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

I,

~ti;: :~os Epodos seguem-se as Sdtiras Sátirasl~:~i4'<Satul'tBou Sermones) constituídas por

~~~~dC>islivros (o primeiro, puhlica:do cerca de 35 a.C., con.~;~\~:aémdez poem~s, e o segundo, que.vem a lume cerca .deJ:{;~30, contém OItO), em que HorácIOapresenta temáhcaF., ,variada que percorre todas as gamas da vida rontempo-t, rânea e da sua pr6pria vida. Tomando Lucílio, o velho

poeta satírico, como seu modelo romano, Horácio vaidar um novo rumo.à sátira tornanda-a ~ais dúctil, maisbem humarada: tem a arte de a Ifazer tão contun-

" dente como a do .seu modelo, mas menos directa e me-r.~,nos grosseira. Os temas vão ,desdea .gastronomia, litera~h .:; tura e abservaçãa de tipos sociais, à .descriçãodos plais

Ü',;:,Iin~~ifican~s. incidentes da vida quotidiana, e. nelesr ,.:.semeIa HoraclO, a cada passo, pormenores autoblOgrá-~",' ficos, ideias literárias, morais e filosóficas, :nas quais

sQbressai notável tendência e-picurista, a que apregoa omeio termo.e o prazer modera:da.

lembra:r os pequenos {ugau:-es(fonJtede Bandúsia) , qJ\.tJe,dequa:lquer modo, lhe tinham agradado e excitélldoa ima-ginação. A sede de perfeição que nas Odes se' revela,já não escapara ao juizo da antigui.da.de que diz, pelaboca de Quintirliano, que «dos líricos é o mesmo Horácio

quase o único digno de ser lido, pois se inspira por vezese está. cheio de aJe.gria e ;bele~a, é múltiplo nas figuras,audaz, cam extremo ,bom gosto na escala das pala-vras» (1). Este juízo da antiguida:de define com exacti-

dão, julgamas nós, tudo qu.a.:ntose possa. pensaã acercado poeta.

1,

"

",

É, no entanto, nas Odes (quatro li- Odesvros e cento e três poemas) que Horáciomais se evidencia pela veia poética, pela técnica aJPuradade versifica:do're pela linguagem tersa e sempre apro-pria;da aos temas de que se ocupa. Estão compostas nosmais variados metros gregos, desde as antigas estrofesalcaicas e sáficas, à estro,feasclepiadeia da época hele.-nÍstica. Nelas trata Horácio dos temas que mais lhe inte-ressam, comprazendo-se em cantar os feÍ1tosde homenspoliticas, em louvar os deuses e os seus amigos, em

Já no fim da vida encamenda..-llie CarmenAugusto um hino.à maneim sáfica dedi- Saecularecado a ApoIo e Diana. Compõe Horácioentão. o chamado Carmen Sceculare,que foi cantado nosJogos Seculares de 17 a.C. f:>Orum cora .de 27 raJPazese 27 raparigas. Nele se celebram, em hábil combinaçãode misticismoe patriotismo, a glória de Roma e os bene-fícios qtie a ddade colheu da genial a:dministração deAugusto.

Finalmente restam os dois livros das EpístolasEpístolas. O primeiro, com 19 canas, foi

('I) Inst. O,.., X, I, og6: <At lyricorum idem Horatius foce60ius legi dignos: nam et insurgit aliquando et plenus estiucund-itatis et gratiée et ua.rius figuris et uerbis felic:ssimeaudax.>

16 INQ11- 2 17

Page 9: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

, ..,".

.1

."...

prublicadoem 20 a.C. Nele se encontra uma verdadeirafilosofia da vida, em que o poeta, já amadurecido pelosanos e na posse de larga experiência, só foca o ess~nciccle despreza o acessório. Basta lembraT a Epíst. I, 11',

. escrita para combater a angústia de um amigo, a quemHorácio diz que, por mais que procure, só nele próprioencontrará a paz: «os que COITemos :mares, mudam de

céu, mas não de espírito» (2).Vemos que começa a;gora, no dedínio da 'Vida, a acal-

mar-se, tendendo para uma filosofia, em que entram

elementos do epicurismo, de que se considera fiel adepto(diz pertencer ao rebanho de Epicuro, Epíst., I, 4, 16)e do estoicismo. Resta saber se este estoieismo foi él!pren-dido nos livros .de filosofia ou na sua experiência da vida.

No livro segundo das EPístolas (neste só se contamduas), entre.ga-se Horádo inteiramente à crítica literária.É neste capítulo que vai integrar-se a Arte Poética.

J:'..

A Arte Poética, contudo, não surge Sátirassem fUmaprévia evolução, que 1entare- Literáriasmos csboçar. Já quando das Sátiras,Horáeio procura teorizar os seus conhecimentos de poé-:tica. Em três sátiras compostas por volta de 30 a.C.,I, 4; I, 10; n, I, tenta responder a certas questões teó-ricas de poesia. I, 4: - O que constitui um bom poemae como pode averiguar-se a sua qualidade; I, 10:-

(2) V. 2]: cCCElum, non animum mutant, qui trans marecurrunb.

18

'-if'

N.,Ú.. Horácio marca a .na posição lirerária, colocandO-<;eentre~~

os modemizantes da escola :deCatwo e Calvo e os aTcai-

zantes admiradores .deLucílio. Começa já a defender umprincípio que veremos aparecer na Arte Poética: os escri-tores .latinos devem formar o seu .gosto na leitura dasletras gregas; lI, 1':- Horário defen.de-sedos seus crí-ticos, fazendo a sua apologia por 'meio de um. diálogoseu com o jurisconsulto Trebácio.

'I~,"

Nas EPístolas, veremos mais patente Epístolas3Jveia crítica de Horácio. A Epíst., I, Literárias19, dedicél!daa Mecenas, procura servirde defesa contra os críticos, que o acusa- Epístola aVIamde imitação. É Horácio, porém, que Mecenasdisso os acusa dizendo: «Ú imitadores, 6gél!doservil!», pondo neles os defeitos de que o arguiam.Defende-se, depois, mostrando em que medida fora ino-vél!dore original dentro da poesia de Roma, ao introduzirnovos temas e novos metros, ao dar aoconhecer ATquí-loco, Safo e Alceu.

Mais importante do que a anterioré a epístola a Floro (lI, 2), na qua:l opoeta explica as i"azões'que o levaram anão publicar mais no ,domínioda Unca. É que ele agoranão escrevia, porque tinha o suficiente, porque estavavelho e porque, enfim, Roma estcl:Vademasiél!dobam.lhenta. Além disso, todos devem, no fim da vi.da, voJtarà meditação e à filosofia. Entretanto, critica o baixo

Epístolaa Floro

19

Page 10: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

~~:t::",:~ .'".'...: ~

.~~'),, 11t

nivcl da poesia: ramana, pela fatta de cuidada que ospoetas denotam na língua poé.tica que usam. HOTáciadisserta sobre as razões de caráCter retórico-poética quepresidem à escolha de palavras e à composição .da frase,tal cama !fará postexiormente na Arte Po~tica. Como

.;' nesta, já começ.aa defender a prindpio de que a poeta

I,:"':,deve ser um técnico da língua e não simples _amador.i): 'H?rácio aparece-nos, II1eStepoema, como fteorizador daI'. . literatura e coma ;gran.deesmista, esses mesmos aspectos

com que se revestirá e se afirmará definitivamente lIlaArtJePoética.

EmooJ1anumerada, nas edições deHorácio, antes da epístola a Floro, aepístola dedkada a Augusto Pertence adata posterior. Cam ela vem o poeta responder ao impe-rador que demanstrara deseja de possuir uma cma sua,tanta mais que Horácio já enviara epístolas a outros seusamigos, menos importéllIltes.Nesta :altura, porém, estavaHõrá~io ocupa.docom a pu.blicação do quarta livro das

i.. Oàes e não podia pretexta:r, como 'fizera na; carta a

I.:;:~"~~.flõro,a3Jbandono da poesia, além de que, nesse mesmot~ti)liyro das Otks, havia cinCo.!poemasdedicados ao própria

W'j;f\:ugusto.Assim, vai agora escrever, na epístola ao impe-~~:('!l#dor,sobre um tema que a ambos interessava: a posição.,;~!~tp~poeta e da poesia lIlaRoma cantemporânea. Natural-I~H~iDenteque a opinião do poeta devia diferir da que o

1;~:;(.,po1íticoperlilhav.a, mas Hor~cio s3!bedefender-se hàbFI-~i(,~<ij~mente de qualquer campromIsso.

Epístolaa Augusto

......Só :trêsgéneros poéticos serão.apreciados: a dramá- '.-

tica (vv. 139-213), o épico (vv. 214-270) e o lírico(vv. 132-138). que ocupaxá um lu.gar modesto. Travadiscussão. sobretudo, acerca .dos tópicos Jiterários quelhe eram caros: o antigo e o moderno; o grego e o ro-mano; a poeta e a sociedade. Es~e último tinha muitaimportância, vista 'que anuitos poetas (coma Virgílio),abandonando a poesia subjeotiva, se tinham dedicado. àcaitsa; de Rama et da Estado, carutando a grandeza deambos.

Mas Horácia não. toma partido por qualquer poS'içãoextremista: não é arcaizatnte, mas tão-pouco é modemi-zante em toda o sentido. Se é he1enizante,é porque julgaque. a cultura refinada dos Helenos poderá traze'r a:1gum.

I" ~;I

bem ao talento agreste dos Romanos. Quanto à função ~.:jfdo poeta na socieda"de,acha que este Ilhepode ser útil, ",:',

sem que, contudo, perca todo o seu individualismo.

Tudo. o que apregoa, já Horácio pusera em prática napoesia até então publicada e isto era a garantia de queos princípios que teorizava levavam, de facto, a uma

poesia euidada .e ,de excelente IIlfv,el,qualida;des 'que eletanta prezava.

.-':.

Incluída na ;grupo das epístolas (3)encontra-se a mais extensa e importantecomposição, a EPístola ad Pisones, es-crita em hexâmetr03 daotilicos,sobre teo-

.~...~"

:~~~f;,.:..

..;~. ;.;":'1

j:!:!d. "'~.'."~

~~

J

~~'

.

'

..

. :1\

.. :...':::'

1

'

.. "

.

. t.,I !.1t., "

. ..~~.

: ,:....

ARTEPOÉTICA

Título..

(3) Algu.ns autores consideram a A. P. como a. rerceira. epís-

;1';21

Page 11: A Arte Poetica de HORACIO - Parte I

. .

tola do ilivro II. Outros, porém, falam da. A. P. comosendo um poema independente. Vid. Horatius, Opera,00. F. Klingner, :Upsia,I959, ip. 294. Quintiliano, Inst.Or., vm, 3'. 60. refet'e-se à A. P., como se um poemaà parte constituísse:. <...Horatius in prima parte 1ibri dearte poetica...~ Cremos ser esta segunda Mpótese a quemais se a!,«"oximada veTda.de.

(4) Inst. Or., Epíst. dedicatória a Trífon, 2.: <...usus deindeHorati consiJio, qui ,in arte poetica 6uadet...~

(5) Vid. n. 3.(6) Será.este o titulo escolhidona nossa.tradução.

por si, uma tradição mi,lenária e, afinal, são mais qu.e/i~suficientes paTa servirem de epígraJe a um poema. ' ,

:\1

O poema de Horácio é de,dicado aos Dedicatória' \Písones, peTsonalidades romanas, rujaidentificação nos interessa sobremaneira para determinardois pontos tundamentais: a ,data aproximada do poemae o seu escopo. Efectivamente, contribuiria para o conhe-cimento da rfinalidadecom q.ue Horácio escreve a A. P.o simples facto de se ,determinarem as adividades lite-rárias .dos Pisões, e, Ibemassim, a data da composiçãodo poema ressaltaria com mais clareza, desdeo momentoem que soUlbéssemosquando eJesviveram.

Mas a tarefa não é fácil. No entanto, Porfirião, ocomentador de Horácio, e 'que, segundo toda a verosi-milhança, devia estar em melhor posição ,do que nós .

para identificar os Pisões, diz-nos que a A. P. doi dedi..;."'"cada a Lúcio Pisão e a seus filhos, ao Pisão que poste- ."dormente foi custos urbis e que em poeta epatrono dasartes Ii:berais~ (7). · .

ifia 1iterária. Quintiliano chamar-Ihe-á (4), aa,g.umasgera-ções mais tarde, «ars poetioa» ou ~de arte poeticaHber» (5), títulos que se tornaram os mais conhecidose que possivelmente já caracterizavam a epístola antesde aparecerem citados na obra ,do grande retor. Houvetambém qu.em desejoassecombinar os ,dois ,títulos possí-

veis e ,assim aparece a carta. poétic~ designada comoEpístolas ad Písones de arte poetica. Este título deve ter

sido motivado igualmente pelo facto ,de não estarmosdiante de um ;tréLtado,como daria a entender o Ars poe-

tica ou De arte poetíca, mas de uma simples cart-a aosPisões, onde se formulavam alguns princípios que, por-ventura, também poderiam aparecer num compêndio ,deretórica.

Cremos, no entanto, ser preferível utiliZiar os títulosArs poetíca (6) ou Epístola ad Pisones, os quais, muitoembora não dêem a enrendex tudo o que se encontra nopoema, e possam mesmo 1evar a certa ambiguidade, têm,

Se admitirmos esta identificação Dataque é, sem :dúvida, a mais provável"

I somos forçados a aceitar concomitantementJeuma data.ti

(7) Comentário à A. P. I': chunc librum... ad Lucium ~i~rnem, qui postea urbis custos fuit, eiusque l1beros mi~'nam 'et ipse Pie<>poeta. fuit et studiorum liberali'"a:ntistes:..

1.,-,..

22