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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
A CATEGORIA DAS PARTEIRAS TRADICIONAIS INDÍGENAS:
GÊNERO EM AÇÃO?
Maria Christina Barra 1
Resumo: A proposta deste trabalho é pensar a trajetória de construção da categoria das parteiras tradicionais indígenas a
partir das transformações decorrentes das ações das políticas públicas de saúde. Mais especificamente, o presente
trabalho busca abordar os deslocamentos possíveis no modo de viver das populações indígenas ao enquadrar as diversas
ações sobre corpo e as diferentes formas de transformação corporal na categoria do “conhecimento tradicional
indígena”. As relações de gênero perpassam esta trajetória desde a fluidez de um modo de viver às formas de produção
deste conhecimento. O conhecimento tradicional é das parteiras que nem sempre são mulheres, mas é também do
rezador e do pajé que são em sua maioria homens, mas são também mulheres. Abarca as ações de plantas, animais e
diversos seres que habitam os diferentes mundos indígenas, além de uma série de condutas e práticas que tomam a
forma de texto escrito e de desenhos no registro do saber das parteiras tradicionais indígenas. São elas, nem sempre
mulheres, mas agrupadas como tal, as fazedoras e produtoras de um conhecimento cabível aos olhos das políticas
públicas de saúde. Fica a questão de como se dá então, a transformação de um saber sensível construído nas ações
cotidianas de diferentes agentes sociais e reinventado a partir de diferentes modos de criatividade, na homogeneização
não só do conhecimento tradicional, mas também de uma categoria de gênero em ação.
Palavras-chave: parteira tradicional indígena, conhecimento tradicional, relações de gênero.
Muitos dos relatos das mulheres indígenas que se dizem parteiras referem-se ao cuidado das
mulheres mais velhas que acompanham as mais jovens no momento do parto. Contam que
aprenderam com as mães, tias ou avós, as mulheres mais velhas da comunidade e os primeiros
partos que acompanharam foram de suas filhas, noras, sobrinhas e netas. “Fiquei curiando. Minha
mãe me chamou quando uma mulher ganhou nenê”, ou “o primeiro parto que fiz foi aos 20 anos.
Foi da minha sobrinha. Aprendi acompanhando minha mãe e minha tia”. São essas mesmas
mulheres que apresentam reflexões sobre a categoria da parteira tradicional indígena: “eu tenho
dúvida deste negócio de parteira, como eu disse, eu tinha uma colega, a gente mesmo é que fazia os
partos”, ao mesmo tempo em que falam com muita clareza das transformações que vem com as
ações de saúde:
“Não existia o sofrimento, aquela dificuldade. O homem mesmo ajudava. Então não
acontecia nada. O parto era tudo normal. Então as enfermeiras passavam a ensinar que tem
perigo, que ninguém sabe o que vai acontecer”.
Assim, o que me pergunto e me proponho a conhecer um pouco mais é o que é “esse
negócio de parteira”. Como se dá este saber sobre o próprio corpo que se mostra na forma do ato de
partejar por vezes oculto numa cadência cotidiana de um modo de viver e por vezes destacado como
“conhecimento tradicional indígena”, um saber legítimo pertencente a um grupo de mulheres
1 Doutoranda em Antropologia Social na Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
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específico, “as parteiras”? “As parteiras” nem sempre são mulheres, são também homens, os pais,
os avôs, os maridos. O que é então, o “conhecimento tradicional das parteiras indígenas” que nem
sempre são mulheres, e que é também o conhecimento do rezador e do pajé? “Sozinha mesma, eu já
fiz uns 10 partos. O pai da criança ajuda. Quando a passagem da criança tá ruim, o pajé ou rezador
reza e quando a passagem abre, a criança nasce”. Como se dá então a transformação desse saber
sensível construído nas ações de diferentes agentes sociais em ”conhecimento tradicional
indígena”?
Não há dúvida que esse “negócio” de parteira tradicional indígena é um movimento
necessário frente às ações de saúde. São elas, nem sempre mulheres, mas agrupadas como tal, as
fazedoras e produtoras de um conhecimento cabível aos olhos das políticas públicas de saúde na
atenção ao parto e nascimento. As parteiras parecem ser então, a possibilidade política do
conhecimento tradicional indígena, das práticas próprias de cuidado e de um modo específico de
viver. Em outras palavras, passam a ser uma agência política de suas “culturas” 2 como é possível
perceber na fala de uma delas:
“Querendo que os não-índios reconheçam que nós temos uma raiz, um saber, um
conhecimento. Tem muita remoção das mulheres indígenas e quando chega uma indígena
no hospital, os profissionais logo perguntam: “será que não tem parteira? Ou “vocês não
tem mais cultura 3?
Assim, para os olhos da saúde, quando estão lá na terra indígena, a “cultura” não importa, é
melhor remover. Mas quando estão na cidade, cadê sua “cultura”, era melhor ter ficado por lá. A
proposta deste trabalho é ver então, quais são as ações e os caminhos percorridos pelas populações
indígenas para “terem cultura” aos olhos das ações de saúde. Mais especificamente, ver como os
indígenas, sejam eles homens ou mulheres, se afetam nestes caminhos a partir de “esquemas
interiorizados que organizam a percepção e a ação das pessoas” (Cunha, 2009, p.313). Da cultura à
“cultura”. A categoria da parteira tradicional indígena parece ser então, uma forma de ter “cultura”
aos olhos das ações de saúde. Assim, proponho pensar “esse negócio de parteira” como um
2 Refiro-me à distinção do uso da palavra cultura sem aspas e com aspas proposto por Manuela Carneiro da Cunha
(2009) a partir de uma categoria analítica da antropologia e seu aspecto fluido e dinâmico que passou a ser usada “pelos
outros” de forma objetificada ou essencializada (SOUZA, 2010, p.97). 3 As falas apresentadas até então são falas das mulheres parteiras no curso de capacitação de parteiras em Boa Vista,
pelo Projeto Parteiras Tradicionais nos SUS: Ações para promoção e o fortalecimento da articulação entre o trabalho
das parteiras tradicionais e a atenção ao parto e nascimento domiciliar em Roraima. Este curso intitulado Encontro de
Parteiras Tradicionais Indígenas foi realizado pelo Grupo Curumim em parceria com a Secretaria Estadual de Saúde do
estado de Roraima, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Leste de
Roraima com o apoio da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAN), Organização Mundial de Saúde (OMS) e a
Rede Cegonha do Ministério da Saúde. O DSEI Leste de Roraima é responsável pela atenção à saúde dos povos
indígenas Wapixana, Ingarikó, Wai-wai, Macuxi, Patamona, Sapará e Taurepang.
(http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/principal/secretarias/secretaria-sesai/mais-sobre-sesai/9540-
destaques, Acesso em 25/09/2014).
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movimento mais do que necessário na luta das mulheres indígenas4. Mas pensar também, como
“esse negócio de parteira”, ao enquadrar diversas ações de diferentes agentes sociais e várias formas
de transformação corporal na categoria do conhecimento tradicional indígena, vai moldando, ao
longo do tempo, novas formas de percepção e de ação.
Para tal apresentarei experiências que falam na forma da escrita e da imagem sobre o
conhecimento tradicional indígena voltado para as questões da saúde. São relatos indígenas
retirados de referências bibliográficas, filmes e outras fontes afins à temática apresentada até então.
Assim como no “negócio das parteiras”, não há dúvida do quão necessário é esse movimento de
produção escrita e de registro de imagens do que se diz hoje conhecimento tradicional indígena.
São várias as vozes indígenas que têm tomado a forma da “pele de imagem” 5 do “conhecimento
tradicional indígena”. Para muitos, essas “peles de imagem” ou “peles de papel” (Kopenawa,
Albert, 2010, p.76) são para os brancos. Para que eles possam conhecer as imagens dos indígenas.
Mas para tantos outros, essas “peles de imagem e de papel” não são só para os brancos, são também
para os jovens indígenas. Para que eles possam conhecer o saber dos antigos. Para que eles possam
entender “como é que a gente vivia antes do contato e como a gente vem vivendo depois do
contato” (Mateus, 2012, introdução), e para “ver realizado o desejo de que seus filhos observem,
contem, escrevam, aprendam; e do passado não se esqueçam” (Huni Kuimbu, 2013, p.17 e p.29).
Um misto de “tradição e resistência” (Flória e Fernandes, 2008, p.10) em formas de permanência e
de fixação dessas vozes como documento: “quando a palavra se fixa, ela toma uma força política
diferente” (ibidem).
O livro Una Hiwea, o Livro Vivo, dos Huni Kuin, organizado por Agostinho Manduca
Mateus Ika Muru (2012), é na voz do próprio autor, um “documento da identidade e do
conhecimento do nosso povo antepassado”. O livro foi escrito porque “o povo ia perdendo tudo”,
“porque muito dos nossos parentes do Brasil não estão conhecendo a realidade que é nossa cultura”.
O livro precisou ser escrito para falar “de onde vieram as doenças, por que nasceu a morte e por que
os antigos se transformaram em ervas”. Por isso o livro é um Livro Vivo, porque “a natureza está
viva, porque as ervas que se transformaram estão vivas e os pesquisadores estão vivos”. Além das
4 Ver Carta das Mulheres reunidas na 1º Conferência Livre de Saúde das Mulheres Indígenas realizada no
Acampamento Terra Livre (ATL) em Brasília no mês de abril de 2017. http://www12.senado.leg.br/institucional/procuradoria/pesquisa/carta-das-mulheres-reunidas-na-1o-conferencia-livre-
de-saude-das-mulheres-indigenas. Acesso em 14/05/2017. 5 5 Davi Kopenawa usa as expressões “peles de imagens” e “peles de papel” para falar da diferença entre o pensamento
Yanomami e o pensamento do branco: “Porém, não precisamos como os brancos de peles de imagens para impedi-las
de fugir da nossa mente. Não temos que desenhá-las como fazem com as suas.” (KOPENAWA, ALBERT, 2014, p.75)
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palavras desenhadas, o Livro Vivo é composto também de um filme para “apresentação não só da
história escrita, mas também da imagem, para ver” (Mateus, 2012, introdução).
As palavras de um xamã yanomami, Davi Kopenawa, no livro A queda do céu, escrito por
ele e Bruce Albert (2015), são também antigas e muitas, pois vêm de seus antepassados. Foram
desenhadas em traçados de escritas apenas para falar aos brancos, pois são gravadas em seus
corpos, guardadas bem no fundo e por isso não se distanciam deles. “Por isso nossa memória é
longa e forte” (ibidem, p.75) E tem também as antigas palavras dos espíritos xapiri, “que voltam a
ser novas sempre que eles vêm de novo dançar para um jovem xamã”. As palavras são assim
aprendidas e apreendidas por uma experiência corporal, “não fixando os olhos em peles de papel”,
mas vendo
“as coisas da floresta de verdade, bebendo o sopro da vida dos meus antigos com o pó de
yâkoana que me deram. Foi desse modo que me transmitiram também o sopro dos espíritos
que agora multiplicam minhas palavras e estendem meu pensamento em todas as direções”
(KOPENAWA, 2015, p.76).
Mas para falar da saúde, outras palavras yanomami precisaram ser fixadas em “peles de
papel” como forma de fortalecer os conhecimentos tradicionais e dialogar com outros
conhecimentos indígenas e não indígenas. O conhecimento sobre os remédios tradicionais foi
apontado pelas lideranças yanomami como tema prioritário a ser pesquisado e fortalecido. Daí
surgiu a proposta de retomada do levantamento sobre as plantas medicinais yanomami realizado
entre 1992 e 1994, a pedido do projeto de saúde da Comissão Pró-Yanomami (CCPY)6 para o
aprimorar o atendimento à saúde por meio da valorização da medicina tradicional. Ao longo dos
anos de 2012 e 2013, jovens pesquisadores indígenas7 entrevistaram três homens de idade e grandes
conhecedores da floresta8, e o conjunto de dados desta pesquisa foi organizado e publicado na
forma de um manual voltado para o uso cotidiano dos Yanomami (2014). O cuidado das mulheres
mais velhas aparece novamente nesta “pele de papel” sobre as plantas medicinais Yanomami. As
palavras do ancião Justino ao falar sobre os remédios da floresta remetem às “mulheres velhas dos
nossos antigos”:
“Quando as mulheres velhas dos nossos antigos eram numerosas, elas nos tratavam com
estes remédios, quando os Omoari, seres maléficos da seca, não paravam de nos comer.
6 Entre 1994 a 1999, a CCPY desenvolveu um programa de atendimento à saúde do povo yanomami através de um
convênio com a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) (HWËRIMAMOTIMATHËPË Â ONI, Manual dos remédios
tradicionais yanomami, 2014). 7 Nove jovens pesquisadores formados pelo projeto de educação interculturalparticiparam das oficinas de pesquisa na
comunidade Watoriki, sob a coordenação de Morzaniel Iramari Yanomami da Hutukara Associação Yanomami (HAY)
(HWËRIMAMOTIMATHËPË Â ONI, Manual dos remédios tradicionais yanomami, 2014). 8 Justino, Lucas e Antônio (HWËRIMAMOTIMATHËPË Â ONI, Manual dos remédios tradicionais yanomami, 2014).
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Elas nos davam banhos, elas tratavam as mãos quentes dos espíritos” (YANOMAMI, 2014,
p.15).
As palavras do ancião Justino vão dizendo também e de diversas formas ao longo do texto
como “isso acabou” ou foi acabando cada vez mais no decorrer dos diferentes momentos de contato
com o mundo do branco. “Agora ficamos empobrecidos” é uma fala repetida a cada “feitiçaria de
epidemia” relatada por ele, quando morriam as mulheres mais idosas ou as mulheres mais jovens
que tinham visto suas mães curarem. “As pessoas viam suas mães – as crianças, as filhas imitam do
mesmo jeito, não é? - viam coletar folhas para curar” e “curavam por sua vez seguindo seus passos”
(ibidem, p.19). Mas as pessoas agora não foram criadas assim, por isso não sabem.
Outra “pele de papel” inventada para falar da saúde é o livro Hitupmã’ax: Curar (2008) dos
Maxakali. Esta “pele de papel” é um dos modos como os Maxakali pensaram e realizaram um
fazer-se visível aos olhos dos agentes de saúde brancos, para mostrar aos brancos que eles têm
“cultura”: “este livro foi feito para mostrar a cultura Maxakali e para que toda equipe que trabalha
com saúde indígena conheça nossa tradição” (2008, p 12). O livro da saúde dos Maxacali começa
pelo parto: “Comecemos pelo começo: o parto.” (Índios Maxakali, 2008, p.57). Falar do parto
indígena hoje é falar de tudo o que o circunda. É falar da menina, da mulher, do menino, do homem,
do pai, da mãe, da avó, das parteiras, do rezador, do pajé, das plantas, dos bichos, dos antigos, dos
antepassados, dos espíritos, ou seja, dos diversos seres que habitam os diferentes mundos indígenas.
Mas é falar também do homem branco, da relação com a saúde do branco e dos deslocamentos
possíveis no modo de viver indígena a partir desta relação. O momento do parto, além de ser o
começo proposto por eles, é também hoje a imagem concreta de um “saber” não só sobre o próprio
corpo, mas sobre um coletivo de ações que constroem diariamente um modo de viver distinto. Em
alguns casos específicos, como na fala de Suely Maxakali “as mulheres iam para o hospital, e
tinham dificuldade, porque não entendiam, né?”, “o hospital nunca entendeu a nossa saúde
diferenciada” 9 este modo de viver vem sendo desmanchado pelas ações de saúde. Situações
corriqueiras e repetitivas traduzem de uma maneira muito simples e triste, a dificuldade dos agentes
de saúde brancos em entender e trabalhar com as populações indígenas:
“Quando ganha neném também não coça com a mão, tem que ser um pedaço de madeira
pequenininho para poder coçar e no hospital não tinha, né? Aí, a gente precisou que uma
pessoa lá da CASAI (Casa de Saúde do Índio), a Cìntia, desse uma entrevista. Ela falou
um pouco porque teve uma vez que levaram uma índia em Governador Valadares que
9 Fala proferida no seminário: Curas, Cuidados e Políticas de Saúde Indígena realizado em maio de 2016 na linha de
Habilitação das Ciências da Vida e da Natureza no Programa de Formação Intercultural para Formação Indígena – FIEI
da Faculdade de Educação – FAE da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
https://www.youtube.com/watch?v=Z1sL466BbLc Acesso em 20/05/2017.
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ganhou neném no hospital. A índia chorou bastante e quando foi ver, ela tava querendo
um pedacinho de madeira para coçar. Aí a Cintia deu e ela parou de chorar”.
“Aí começamos a colocar o resguardo nosso também, porque o resguardo nosso é diferente
e quando levava as mulheres para o hospital e lá no hospital ofereciam carne, nós as
mulheres não comíamos. Passava fome porque é difícil para nós”10.
Diante do número cada vez mais elevado de encaminhamento das mulheres indígenas de
algumas populações para o hospital dos municípios de referência no momento do parto, situações
como estas, em sua simplicidade e repetição, vão construindo uma nova realidade do parir indígena.
A voz maxakali vem explicitar um descontentamento com essa nova realidade e ao mesmo tempo
apresentar o seu modo de viver na linguagem do branco, neste caso, o livro ou “pele de papel”,
como uma forma de se reinventar neste novo contexto de relação. Coisas simples como “um pedaço
de madeira para coçar” ou “um pedaço de carne” não fazem parte do traçado do branco. Embora
simples essas coisas, em sua ausência ou presença, produzem efeitos no modo de viver indígena. O
traçado de escrita maxakali fala não só do modo de parir indígena, mas também e com muita
clareza, dos efeitos do modo de ação do branco no parir indígena:
“Então, neste livro da saúde, a gente precisa colocar tudo, aquilo que a gente não quer e não
aceita. Por isso minha mãe diz que não pode, que precisa esperar. Porque o médico recebe
outras mulheres, brancas, e a índia fica ocupando o lugar. Aí eles não tem paciência e
querem fazer cesária nas meninas. Mas, para Tikmü’ün, se for assim, pode deixar que nós
preferimos ganhar neném na nossa aldeia mesmo. Porque os Tikmü’ün não morreram
antigamente, quando ganhavam neném na aldeia mesmo, então não morrem mais não”
(MAXAKALI, 2008, p.88).
Esses pequenos trechos das vozes maxakali, huni kuin e yanomami apresentados até então
são exemplos de como coisas, condutas e práticas do modo de viver indígena passam a serem
chamadas também de “conhecimento” (Leach, Davis, 2012, p.209). A categoria conhecimento faz
com que coisas distintas pareçam diferentes tipos da mesma coisa, “conhecimento indígena” e
“conhecimento do branco”, ou diferentes maneiras de se fazer uma mesma coisa (Leach, 2012,
p.266), no caso em questão, a ação das parteiras indígenas, dos agentes indígenas de saúde e dos
agentes de saúde brancos. Institui-se assim, uma equivalência de base medida e avaliada a partir de
efeitos de eficácia independentes das condições que os produzem (ibidem) sobre o mundo “natural”
de um corpo “humano”. O problema é que sob a base comum de equivalência “conhecimento”, o do
branco se mostra sempre mais eficaz aos olhos das políticas públicas de saúde. E “o pensamento
dos brancos é outro” (Kopenawa, Albert, 2015, p.75). Nas ações de saúde, esse pensamento do
branco não passa pela experiência sensível, não passa pelo “choque com o outro” (Krenak, 2015, p.
193). Ele se constrói na “contemplação sem descanso das peles de papel em que desenharam suas
10 Falas de Suely Maxakali no mesmo seminário citado acima.
7
Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
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próprias palavras” (Kopenawa, Albert, 2015, p.76). É preciso, pois “sentar em roda” 11 para saber o
que a fala maxakali “Porque os Tikmü’ün não morreram antigamente, quando ganhavam neném na
aldeia mesmo, então não morrem mais não” (2008, p.88) quer dizer. Ou o que a voz de Aílton
Krenak diz com “choque com a terra”, “choque com o outro” e já nos adianta a diferença dos
modos de viver e de aprender:
“Então a terra dá um imenso manual de vida para os meninos ainda mais no comecinho da
vida. Esse choque com a terra, com a natureza é de alguma maneira uma antecipação desses
adultos, dessas futuras gerações de adultos, que eu fico pensando que serão diferentes dos
antigos seres humanos que nós aprendemos a amar, que aprendemos a escutar as histórias.
Eles corriam mais riscos, morriam mais. Eles não eram tão garantidos. Você não tinha
certeza nenhuma se o seu pai ficaria vivo até ver você grande. Se o seu avó estaria lá,
velhinho. Agora nós estamos vivendo o mundo das certezas. Todo mundo põe tudo no
seguro e fica essa perspectiva totalmente neutra, sem choque com a vida, com a terra”
(KRENAK, 2015, p.193).
O modo de viver indígena precisa então se transformar na categoria do conhecimento
tradicional para se fazer visível não só aos brancos, mas também aos mais jovens frente às
transformações no contexto de relação com o mundo do branco. Ele toma a forma, em parte, do
traçado de escrita das “peles de papel”. Mas, mesmo que a escrita seja “uma experiência de
transformação metamórfica” e que dá “às forças transformadoras um modo particular de existência”
(Stengers, 2012, p.10), ela por si só parece não bastar. O saber sensível não cabe apenas nos
“traçados de palavras”. Assim como o Livro Vivo dos Huni Kuin, que além da história escrita,
apresenta também a imagem “para ver”, os Maxakali produziram, além do livro Hitupmã’ax:
Curar (2008), a “pele de imagem” YiaxKaax – Fim do Resguardo, um filme de Isael Maxakali.
As próprias “peles de papel” não são feitas apenas de “traçados de palavras”, elas são tatuadas com
imagens, em desenhos feitos por eles, Maxakali, Huni Kuin e Yanomami e em fotos das plantas no
Manual dos remédios tradicionais Yanomami. A fala pela imagem, nos desenhos tatuados nas
“peles de papel” ou nos filmes produzidos por eles, permite uma maior aproximação desta forma
de saber, deste modo de conhecer. Um tanto do que não cabe nos “traçados de palavras” pode ser
comunicado então, através das imagens.
A imagem filmada é também, segundo o realizador indígena Alberto Alvares Guarani, uma
forma de reforçar “não apenas a oralidade, mas a personalidade e de mostrar como a história é
11 Expressão utilizada na apresentação do livro do evento Tradição e Resistência: encontro de povos indígenas realizado
pelo Sesc São Paulo entre junho e julho de 2004, em São Paulo integrando o Fórum de Cultura Mundial (FLÓRIA E
FERNANDES, 2008). A expressão “sentar em roda” refere-se a um espaço de escuta e de novas relações de troca entre
as diversas culturas indígenas e entre elas e a cultura do branco.
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contada” 12. Para ele, a imagem é um “documento vivo” que “vale como um documento escrito, só
que na verdade é apenas gravado” e quando gravada, “ela fica guardada na memória, fica registrada
assim na memória para fortalecer a nossa própria identidade mesmo”. E completa:
“O registro, a imagem, hoje ela é fundamental para nós guarani porque nem todo mundo
hoje em dia, os mais jovens sentam na beira de uma fogueira, ou na hora de tomar
chimarrão para escutar uma história. Então através do filme, os professores vêm
trabalhando de novo dentro da sala de aula, usam para refletir mesmo como ouvir de novo
sem estar presente assim na casa de rezas”.
Essas palavras são sobre o filme Para Reté de Patrícia Ferreira, realizadora indígena mbya-
guarani13. Destaco aqui este filme por ele trazer questões, que a princípio podem não parecer
pertinentes à temática deste trabalho, mas que permeiam em grande parte, as falas dos indígenas nas
referências citadas acima e um tanto as minhas próprias impressões e percepções sobre as ações das
parteiras. O filme fala do conflito de gerações de mulheres mbya-guarani e vem sendo usado por
eles mesmos para refletir “como ouvir de novo na sala de aula” uma história, um conselho “sem
estar presente na casa de rezas”. Nas palavras da realizadora indígena de cinema:
“Eu queria entender melhor como mulher, e o foco era entender um pouco a mulher guarani
e mostrar para os de fora como é a vivência e mostrar um pouco como que gera um conflito
entre mãe e filha, avó e neta. E eu ouvia muito assim: vocês jovens não fazem mais essas
coisas que a gente fazia! Então isso é uma coisa que sempre acaba se entrelaçando e chega
na discussão, eu com meu ponto de vista como jovem e ela com seu ponto vista como uma
pessoa mais velha.”
São esses pontos de vista destacados acima que proponho para pensar a ação das parteiras
indígenas: “como mulher”, “como uma pessoa mais velha” e “como jovem”. O ponto de vista
“como mulher” é destacado para falar das parteiras tradicionais indígenas como uma categoria de
gênero, apesar de parecer não haver uma delimitação tão precisa na atuação de parteiras ou
parteiros, mesmo sendo mulheres, a maioria. Pode ser então, que essa categoria de gênero,
“parteiras”, venha um tanto emprestada do mundo do branco, mas pode ser também que,
emprestada assim do mundo do branco, se encaixe com precisão na força que a mulher tem na
comunidade e no cuidado das mulheres mais velhas repetidas vezes mencionado nas falas dos
12 Fala de Alberto Alvares Guarani no Seminário Mulheres Indígenas: Luta, Resistência e Cultura realizado em maio de
2017 pelo Programa de Formação Intercultural para Formação Indígena – FIEI da Faculdade de Educação – FAE da
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG https://www.youube.com/watch?v=Ma8khw6GUe8 Acesso em
25/05/2017. 13 Filme (em processo de finalização) exibido Seminário Mulheres Indígenas: Luta, Resistência e Cultura realizado em
maio de 2017 pelo Programa de Formação Intercultural para Formação Indígena – FIEI da Faculdade de Educação –
FAE da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG https://www.youube.com/watch?v=Ma8khw6GUe8 Acesso
em 25/05/2017.
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indígenas. O filme, ao apresentar as mulheres guarani em diferentes gerações, traz uma reflexão
neste sentido que é ampliada pela fala da realizadora sobre a diferença por ser mulher:
“Para a gente não existe a diferença por ser mulher e eu não sou mais alguém por ser
homem ou por ser mulher. Eu acho que eu sinto isso quando estou dentro da minha aldeia e
geralmente as mulheres guarani não falam muito, acho que isso para mim é cultural. A
gente gosta muito de ouvir, a gente deixa alguém falar e a gente ouve e quando é para a
gente falar, a gente fala, mas tipo a gente não fica interrompendo o tempo todo para poder
falar o que a gente acha que tem que falar. Eu queria mostrar essas coisas que estão
escondidas dentro da aldeia pelas mulheres porque antes deste filme eu ouvia muito as
perguntas, por que as mulheres não vem aqui, por que as mulheres não fazem filme, por
que as mulheres não são caciques, mas em todas as decisões importantes na aldeia, todas as
mulheres participam”14.
Talvez seja dessa força da mulher e dessas coisas que ficam ou ficavam “escondidas dentro
da aldeia” que brota a imagem das parteiras, mulheres que precisam se mostrar para cuidar, não
necessariamente de outras mulheres, mas sim, de modos específicos de viver. E tem esse modo
específico da escuta de um corpo e de uma observação silenciosa que constrói uma relação
diferenciada com o tempo claramente visível na ação das parteiras e nas imagens deste filme.
Segundo Patrícia, ela buscou mostrar “como que a gente vive com o tempo”, “para gente plantar
certas coisas, tem a época certa” e “que até para a gente falar, tem o tempo certo” e como tudo isso
parece “errado na visão dos não indígenas porque tudo tem que ser apressado para poder produzir
alguma coisa”. A meu ver, o saber das parteiras indígenas parece ser tecido neste tempo, em corpos
que se afetam num tempo outro, de escuta e de silêncio e que é construído no “choque com o
outro”, no “choque com a terra” e com a participação de muitos. O saber das parteiras se faz então,
do ponto de vista “como mulher” desta observação para “coletar folhas para curar” e “para curar
seguindo os passos” de uma pessoa mais velha e deste silêncio necessário para “saber o que vai
dizer”. Por outro lado, é feito também de palavras. Do ponto de vista “como uma pessoa mais
velha”, que conhece e que sabe, esse saber passa a reunir em sua imagem, o conhecimento
tradicional a ser repassado para os mais jovens: “os conselhos, a educação”. Os conselhos parecem
agir no corpo através de imagens, das imagens que surgem das histórias contadas. A história
contada “internaliza, fica na mente, e os conselhos através dessa história ficam muito internalizado
na cabeça da criança”. No caso do filme em questão, era a história do menino mimado que virava
onça e que a avó ao educar sua neta, contava para ela: “então fica que a história que envolve essa
criança que vira onça é uma forma de dar conselho, educar a criança nesse momento, contando essa
história”. A realizadora do filme enfatiza o fato dessas transformações serem reais para eles:
“quando se fala da transformação, para gente isso é real, muito real”. Mas ao mesmo tempo,
14 https://www.youube.com/watch?v=Ma8khw6GUe8
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reconhece que: “até nós os mais jovens, duvidamos, mas isso é real para as pessoas que viram isso”.
O ponto de vista mais jovem apresenta então, uma questão: “os mais jovens, hoje em dia, não
acreditam mais, então isso tem a função de levar de novo essa informação para os mais jovens no
cinema”.
As “peles de papel” e as “peles de imagem” vêm então, chamar os mais jovens que não
acreditam mais e comunicar aos brancos, que também não acreditam na medicina tradicional
indígena. O chamado é para que os mais jovens escutem as histórias, mesmo que não seja “na casa
de rezas”, mas ainda assim “na sala de aula”. Falam ao mesmo tempo em que pedem uma escuta.
Buscam uma força política ao reivindicar outro olhar da saúde sobre seus corpos, sobre os
diferentes modos de viver. Chamam os mais jovens para perpetuar esses diferentes modos de viver.
Mas o que acontece então, com esses corpos que já não acreditam mais e com o coletivo de um
povo quando o todo contínuo e fluido de relações e ações passa a se fixar nas categorias do
conhecimento tradicional indígena e das parteiras tradicionais indígenas? Quando a fala e a
memória perdem lugar para as “peles de papel” ou para “as peles de imagem”? Quando o
aprendizado pelas palavras dos antigos e pela observação se transforma em escrita ou em imagem?
Quando a fluidez de um modo sensível e vivido passa a se fixar em imagens e palavras? Quando o
silêncio e a curiosidade da observação se preenchem de palavras explicativas? Quando um corpo
que se afeta pela confiança passa a se afetar pelo medo?
Fica fácil para nós, “herdeiros da caça às bruxas” 15 (Stengers, 2012, p.6), falar de tudo isso
como se bastasse apenas o olhar para os diferentes modos de se reinventar. São sem dúvida alguma
cheios de criatividade. Mas não basta dizê-los criativos se não aprendemos a sentir em nossas
próprias narinas o cheiro da fumaça e a reconhecer “o orgulho branco e moderno do nosso poder
crítico” de sempre “saber mais”, e o “poder que este meio tem de contaminar” (Stengers, 2012, p.6).
Prefiro então entender “esse negócio de parteira” e tudo mais que o acompanha como um
movimento de “reclaim” 16 as práticas de si, as práticas sociais, as práticas políticas de luta”
(Stengers, 2017). São corpos diferentes, vestidos embora nus porque abertos a vários tipos de forças
15 Expressão utilizada por Isabelle Stengers ao falar do “orgulho moderno da capacidade de interpretar tanto a bruxaria
como a caça às bruxas em termos de construções, crenças sociais, lingüísticas, culturais ou políticas” e que “deixa
passar despercebido que somos herdeiros de uma operação de erradicação cultural e social – precursora do que foi
cometido em nome da razão e da civilização” (STENGERS, 2012, tradução Jamile Pinheiro Dias, caderno de leituras
nº 62, Chão da Feira, 2017). 16 Optei por deixar a palavra em inglês “reclaim” por ser um termo difícil de traduzir, que pode ser ao mesmo tempo
curar, se reapropriar, tornar novamente habitável (STENGERS, 2017, tradução Raquel Camargo
revistamaquiavel.com.br). O aspecto polissêmico do verbo é também destacado pela tradutora do texto Reclaim
Anismism (STENGERS, 2012), Jamile Pinheiro Dias, que optou pelo termo reativar “a fim de abarcar o potencial
terapêutico e político” da proposta do texto (NT, STENGERS, 2017).
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e relações e que buscam então, habitar novos espaços, a princípio, emprestados, mas reinventados
cotidianamente diante da “necessidade de lutar e da necessidade de curar, de modo a evitar que nos
assemelhemos àqueles contra os quais temos de lutar” (Stengers, 2012, p.8).
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Seminário: Curas, Cuidados e Políticas de Saúde Indígena realizado em maio de 2016 na linha de
Habilitação das Ciências da Vida e da Natureza no Programa de Formação Intercultural para
Formação Indígena – FIEI da Faculdade de Educação – FAE da Universidade Federal de Minas
Gerais – UFMG https://www.youtube.com/watch?v=Z1sL466BbLc Acesso em 20/05/2017.
Title: The category of Indigenous traditional midwives: gender in action?
Astract: The proposal of this work is to think about the indigenous traditional midwives category
construction in face of the actions of health public politics. Specifically, this work aims to address
possible displacements in the indigenous people way of living since different actions and body
transformations are seen as the category of “indigenous traditional knowledge”. The gender
relations go through this trajectory from a flowing way of living to the production of this
knowledge. The traditional knowledge is related to indigenous midwives who, not always, are
women, but it is also related to prayers and shamans who are in the most men, but sometimes are
also women. The traditional Knowledge says about different actions of plants, animals, and other
beings of the indigenous world, besides a vast array of practices, process and techniques that take
form in text and drawing registers of the indigenous midwives knowledge. The indigenous
midwives are the makers and the producers of a knowledge which could be considered by the
healthy public politics. Thinking all this through, the question is how a sensible knowing
constructed by the daily actions of different social agents and reinvented from different modes of
creativity is transformed, not only in a homogeneous traditional knowledge, but also in a gender
category in action.
Keywords: indigenous traditional midwives, traditional knowledge, gender relation