A citricultura como exploração agrícola capaz de promover a melhoria das condições sócio-econômicas da agricultura familiar na região noroeste do Paraná: um estudo de caso

Joaquim Rocha Martins1; Belmiro Ruiz Marques2; Sérgio Luiz Carneiro3

Área de Trabalho: Extensão Rural

Resumo O presente estudo de caso tem por objetivo demonstrar a trajetória sócio-econômica de um agricultor familiar do município de São Jorge do Patrocínio, a partir da inclusão da citricultura no sistema de produção agropecuário. Desde 1.998, a propriedade em questão é monitorada por meio do Projeto Redes de Referências para Agricultura Familiar4. O referido projeto tem nas anotações mensais de receitas e despesas, uma das suas principais ferramentas para análise econômica e, por conseguinte, para a geração de indicadores a serem utilizados na gestão das unidades familiares de produção acompanhadas, as quais são analisadas sistemicamente. Tendo como referência temporal o ano agrícola 2.006/2.007, elaborou-se, com base nos indicadores econômicos da atividade citricultura, uma retrospectiva histórica das condições produtivas e de qualidade de vida da família objeto deste estudo de caso. Os registros fotográficos cronológicos ilustram os avanços obtidos pela família do agricultor, especialmente no que se refere à qualidade de vida. Palavras-chaves: agricultura familiar; citricultura; desenvolvimento econômico e social. INTRODUÇÃO A propriedade estudada localiza-se no município de São Jorge do Patrocínio, no noroeste do Paraná. Esta região geográfica do estado apresenta solos derivados da formação geológica Arenito Caiuá, os quais têm como características gerais: baixa reserva de nutrientes, baixos teores de matéria orgânica e alta susceptibilidade à erosão. Atualmente, estes solos estão sendo explorados preponderantemente com pastagens, as quais ocupam aproximadamente 72 % da área total da região (SEAB, 2.007), o que faz com que a mesma seja a detentora do maior rebanho bovino do estado. Ao longo das últimas décadas, a região vem apresentando, paralelamente a um baixo crescimento econômico, um acelerado processo de êxodo rural. Essa situação decorre, entre outros fatores, da profunda alteração ocorrida na matriz produtiva regional, a qual, outrora alicerçada na cafeicultura e nas lavouras temporárias, passou a ter na pecuária a sua principal exploração. Como esta é uma atividade com baixa capacidade de geração de empregos, e somando-se a isso o fato de a bovinocultura praticada na região apresentar, de um modo geral, baixos índices de produtividade e de rentabilidade, a economia regional como um todo tem sentido tais reflexos.

1 Engenheiro Agrônomo, MSc., e-mail: joaquimmartins@emater.pr.gov.br 2 Engenheiro Agrônomo, Especialista em Extensão Rural, e-mail: belmiro@emater.pr.gov.br 3 Engenheiro Agrônomo, MSc., e-mail: sergiocarneiro@emater.pr.gov.br 4 Informações sobre as Redes de Referências estão disponíveis nos sítios do Iapar: www.iapar.br e da Emater: www.emater.pr.gov.br

Neste cenário, a fruticultura – especialmente a citricultura – aparece como uma possibilidade concreta de promoção do desenvolvimento econômico e social da região, haja vista que a mesma é uma atividade com grande potencial de geração de renda e emprego; aspectos estes que são determinantes para a sustentabilidade das unidades familiares de produção. OBJETIVO O trabalho tem por objetivo demonstrar, por meio de um estudo de caso, o potencial da citricultura como exploração capaz de contribuir para o desenvolvimento econômico e social da agricultura familiar praticada na região noroeste do Paraná.

MÉTODO O trabalho foi realizado de acordo com a proposta metodológica do Projeto Redes de Referências para Agricultura Familiar, cuja execução está baseada no acompanhamento, análise e gestão dos sistemas de produção agropecuários, mediante uma atuação integrada do extensionista, do pesquisador e da família do agricultor colaborador. No presente estudo de caso, escolheu-se a propriedade rural do agricultor colaborador, Mauro Carlos Bosso, representativa dentro de um universo de estabelecimentos familiares na região administrativa de Umuarama, cujos sistemas de produção incluem a citricultura. Os dados (receitas e despesas) foram coletados mensalmente, por meio do caderno de anotações do agricultor colaborador. Ao término do ano agrícola 2.006/2.007, procedeu-se a análise econômica do sistema de produção. Também se buscou resgatar, por meio de fotografias disponíveis, a trajetória da família em termos de avanços no modo de produzir e de melhorias na sua qualidade de vida; como forma de comprovar visualmente, as mudanças positivas experimentadas pela mesma. A propriedade estudada possui uma área total de 22,37 ha e uma superfície agrícola útil (SAU) de 18,64 ha. Desta última, 10,05 ha estão destinados à bovinocultura mista e 5,95 ha à citricultura e 2,64 ha a outras atividades. Com relação à mão-de-obra, a família dispõe de dois Equivalentes/homem (600 diárias/ano), sendo que no ano agrícola estudado houve a necessidade de contratação de 63,5 diárias para uso na citricultura, especialmente durante a colheita. RESULTADOS O volume de produção e a produtividade de cada uma das espécies de citros cultivadas na propriedade estudada podem ser observados no Quadro 01. Quadro 01 – Produção e produtividade

Espécie Época Plantio

Área (ha)

Produção (kg)

Produtividade (kg/ha)

Laranja ‘Folha Murcha’ Maio/2.002 1,45 24.937 17.198 Laranja ‘Pera’ Julho/1.996 3,11 123.587 39.738 Lima Ácida ‘Tahiti’ Junho/2.002 0,44 5.537 12.584 Mexerica ‘Montenegrina’ Junho/1.999 0,95 8.975 9.447

Fonte: dados do estudo

Comparando-se a produtividade obtida nas quatro espécies exploradas pelo produtor, com a produtividade média regional (SEAB/Deral, 2.007), tem-se o seguinte quadro: a lima ácida ‘tahiti’, por questões genéticas (o material vegetativo usado por ocasião da enxertia tem baixo potencial de produção), apresentou uma produtividade de 12.584 kg/ha, a qual ficou abaixo da média regional para esta espécie (15.160 kg/ha). Do mesmo modo, a produtividade da tangerina ‘montenegrina’ (9.447 kg/ha), por problemas de comercialização (a produção não foi colhida em sua totalidade), esteve aquém da média regional, que foi de 11.331 kg/ha. Já com relação às duas variedades de laranja que são cultivadas na propriedade, a produtividade média foi de 32.571 kg/ha, valor este superior à média regional, que foi de 23.660 kg/ha. Este bom desempenho produtivo da laranja tem sido uma constante na propriedade, razão pela qual o produtor vem aumentado a área cultivada com esta espécie. Através do confronto entre receitas e despesas (custos variáveis), chegou-se aos valores de margem bruta (MB) obtida em cada uma das espécies (Quadro 02). Quadro 02 – Receitas e despesas

Despesas (R$) Espécie Receita Bruta (R$) Insumos Mão-de-Obra

Contratada Total

Margem Bruta (R$)

Margem Bruta

(R$/ha) Laranja ‘Folha Murcha’

8.065,50 2.005,45 96,25 2.101,70 5.963,80 4.112,96

Laranja ‘Pera’ 31.845,75 3.472,96 1.347,50 4.820,46 27.025,29 8.689,80 Lima Ácida ‘Tahiti’ 2.191,00 233,27 58,75 292,02 1.898,98 4.315,86 Mexerica ‘Montenegrina’

3.115,00 1.915,28 313,75 2.229,03 885,97 932,60

Total 45.217,25 7.626,96 1.816,25 9.443,21 35.774,04 Fonte: dados do estudo Tomando-se a média das duas variedades de laranja como referencial para análise (em função dos já mencionados problemas ocorridos com a lima ácida ‘tahiti’ e com a tangerina ‘montenegrina’), fica evidenciada a superioridade desta, em termos de valores de MB (R$ 6.401,38/ha), quando comparada com aqueles obtidos na safra 2.006/2.007, em explorações tradicionais na agricultura familiar da região (REDES, 2.008), como, por exemplo: café (R$ 2.737,50/ha), leite (R$ 1.839,70/ha), e mandioca (R$ 3.205,51/ha). No caso da propriedade objeto do presente estudo, este potencial também é manifestado pelas mudanças ocorridas no perfil produtivo da mesma, ou seja, a rentabilidade obtida com a citricultura tem permitido ao produtor implantar novos talhões de citros, além de aprimorar o manejo da exploração, inclusive com a implantação de um poço semi-artesiano, para servir a um sistema de fertirrigação, previsto para entrar em funcionamento na safra 2.007/2.008. Ainda quanto a mudanças verificadas na propriedade analisada, merecem destaque aquelas relacionadas com a qualidade de vida. Nesse sentido, através da Figura 02 é possível observar as melhorias alcançadas pelo agricultor e sua família.

Figura 02 – Família Bosso: uma história de sucesso com citricultura na agricultura familiar

Maio/1994 Out./1996 Ago./1998 Ago./2002

Set./1995 Jun./1999 Set./2004 Fev./2005 Jan./2008

Jan./2008 Jan./2008 Jan./2008 Jan./2008

CONCLUSÃO A citricultura, desde que tecnologicamente bem conduzida, pode desempenhar um importante papel na geração de renda e de emprego na agricultura familiar da região noroeste do Paraná, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida e, com isso, ampliando as possibilidades de permanência da família rural no seu meio de origem. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS SECRETARIA DA AGRICULTURA E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ. A Pecuária Paranaense em Foco - Outubro 2003. Disponível em: http://www.pr.gov.br/seab/aspectos/aspectosdapecuaria141003.pdf, acesso em: 26/06/07. SECRETARIA DA AGRICULTURA E DO ABASTECIMENTO DO PARANÁ . Relatório final da produção de citros na região do Núcleo Regional de Umuarama. Umuarama, 2007. 3p. (não publicado) REDES DE REFERÊNCIAS PARA AGRICULTURA FAMILIAR. Relatório de resultados da safra 2.006/07 na região de Umuarama. Cafezal do Sul, 2.008. 7p. (não publicado)

A safra de café, em 1994, foi o ponto de partida. Com o resultado obtido com a mesma, a família adquiriu a propriedade onde, em 1996, implantou o primeiro talhão de citros (laranja ‘Pera’). Daquela data até os dias atuais, muita coisa mudou.

Por exemplo, a velho pick-up, assim como a velha casa, cederam lugar a um automóvel zero km e a uma ampla e confortável residência.

A família Bosso não pensa em “estacionar”. Pelo contrário, tendo na dedicação a sua grande ferramenta, está implantando novos talhões de citros e incorporando tecnologias, sempre focada no aumento da produtividade e na melhoria da qualidade do produto, visando garantir mercado para a sua produção.