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INSTITUTO DE INVESTIGAO E FORMAO AVANADA
VORA, 2015
ORIENTADORA: Professora Doutora Maria do Cu Fonseca
Tese apresentada Universidade de vora
para obteno do Grau de Doutor em Lingustica
Maria da Conceio Videira Lopes
Perspetivao histrica da gramtica seguida de reflexes sobre gramtica e linguagem
A Cons-Cincia da Linguagem
ORIENTADORA: Professora Doutora Maria do Cu Fonseca
Universidade de vora
2015
Tese apresentada Universidade de vora
para obteno do Grau de Doutor em Lingustica
Maria da Conceio Videira Lopes
Perspetivao histrica da gramtica seguida de reflexes sobre gramtica e linguagem
A CONS-CINCIA DA LINGUAGEM
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RESUMO
Este trabalho encontra-se dividido em duas partes. Na Parte I, apresentamos uma
perspetivao histrica das gramticas portuguesas, desde Ferno de Oliveira at s atuais
gramticas tericas. Pretende-se estabelecer um traado evolutivo, realando as principais
caractersticas dos vrios perodos gramaticais. Equacionando os diversos contextos histrico-
culturais, damos especial ateno a algumas das mais significativas gramticas portuguesas,
incidindo o nosso estudo, sobretudo, na definio e objetivos da gramtica e na organizao
das obras. Sempre que for pertinente, destaca-se o tratamento que foi dado Sintaxe, nas
vrias pocas e autores estudados.
A Parte II trata das relaes entre gramtica e linguagem. Procuramos compreender os
fundamentos fisiolgicos da linguagem e relacion-los com a sua funo simblica. Podero
os processos lingusticos reduzir-se a anlises meramente fisicalistas, tendo como base um
complexo sistema de conexes neuronais ou eles devero ser integrados no alargado domnio
da cognio e, assim, imersos na complexidade da psique humana? Que mecanismos
suportam a interiorizao das regras bsicas de uma lngua? Tentaremos responder a estas
questes ao longo do trabalho e apresentar concluses, no final.
VORA, setembro de 2014
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THE CON-SCIENCE (CONSCIOUSNESS) OF LANGUAGE
ABSTRACT
This work is divided in two parts. Part I presents the evolution of the portuguese
grammars, since Ferno de Oliveira until the current theoretical grammars, giving emphasis to
the main characteristics of the different grammatical periods. Coming under specific historic-
cultural contexts, some relevant portuguese grammars are analised here, highlighting
definitions and goals of grammar and grammars organisation. A special focus is done to
Syntax, when it is pertinent.
Part II explores the relations between grammar and verbal language, trying to
understand the physiological foundations of language and to relate them to symbolic
functions. Can linguistic processes be simply reduced to physical analysis, based on a
complex neural system, or should they be immersed in the larger domain of cognition with all
his complexity? What kind of mechanisms supports the acquisition of the basic rules of a
given language? The current study tries to answer to these questions and presents the
conclusions later.
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PARTE I
O CAMINHO DA GRAMTICA
I. As origens da gramtica
II. As primeiras gramticas portuguesas
III. As gramticas filosficas
IV. As gramticas histricas
V. As gramticas tericas
PARTE II
LINGUAGEM E GRAMTICA
I. Bases biolgicas da linguagem
II. Linguagem, pensamento e fisiologia
III. A sintaxe como objetivo da gramtica
CONCLUSES
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Prlogo
O trabalho que ora apresentamos divide-se em duas partes: na primeira propomo-nos
traar o longo caminho das gramticas portuguesas, desde Ferno de Oliveira at s atuais
gramticas tericas; na segunda parte, refletiremos sobre as relaes entre linguagem e
gramtica, comeando por abordar as bases fisiolgicas da linguagem e os principais modelos
explicativos para as relaes entre a mente e o crebro. gramtica se tem reservado a
descrio dos usos lingusticos, com maior ou menor pendor teortico. Esta metodologia
lingustica tem, no entanto, deixado de lado aspetos cruciais da linguagem verbal enquanto
fenmeno de comunicao. Falar ou comunicar verbalmente , quase sempre, interagir com
o(s) nosso(s) interlocutor(es), o que interfere frequentemente com a fisiologia do corpo. As
palavras conduzem-nos a estados mentais muito diversos, consoante os contedos e/ou os
interlocutores envolvidos. Como dizia Freud, as palavras so o meio mais direto de agir sobre
os outros, com correlatos fsicos inegveis. Esta vertente da lingustica tem sido, ainda, muito
pouco explorada. Como relacionar processos fisiolgicos com sistemas abstratos de regras,
essenciais, tambm, para nos entendermos?
Digamos que a gramtica est para a linguagem como um mapa est para um
territrio: descreve, localiza os principais pontos de orientao, mas deixa de lado o telrico, a
vivncia do territrio em si. Gramaticalmente, as lnguas tm sido apresentadas como
sistemas abstratos de regras e de relaes sistmicas, tornando-se, assim, entidades vazias,
inertes, a duas dimenses. Mas, como escrevia Melo Bacelar, o seu fim he a communicao
(GF: 8) e como processo comunicativo que a lngua adquire a sua dimenso real,
interagindo com o psquico, fazendo despoletar tenses inconscientes ou apaziguando-as e
pondo em ao o prprio jogo da existncia humana. A lngua e o silncio no o
esqueamos j que linguagem verbal no escapa dinmica do complexio oppositorum que
vemos existir no mundo natural.
A linguagem sempre a linguagem de cada um de ns. Mas estamos em crer que os
seus fundamentos radicam em zonas da psique que ultrapassam a esfera do individual.
Reduzi-la a meros processos maquinais, tomando como modelo o funcionamento do
computador , pensamos, fazer um esboo grosseiro dos problemas e escamotear a sua
verdadeira dimenso.
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PARTE I
O CAMINHO DA GRAMTICA
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La Grammaire est en effet une vaste rgion, qui nest,
pour ainsi dire, quapperue: on nen a gures connu
jusqu prsent que ce que les anciens gographes
connoissoient de la terre.
Beauze, Grammaire gnrale, Prface, p. xxvii
E, na verdade, o primeiro principio de todos os estudos
deve ser, a Gramatica da propria lingua.
Lus Antnio Verney, Verdadeiro Metodo de Estudar,
Tomo Primeiro, p. 8
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Razo de Ordem
Apresentamos, na primeira parte deste trabalho, o longo percurso das gramticas
portuguesas, desde a primeira, escrita por Ferno de Oliveira, em 1536, at s atuais
gramticas de pendor terico-explicativo. A Lingustica, propriamente dita, tem no Cours de
linguistique gnerale de Ferdinand de Saussure (1916) a sua pedra fundadora. A partir da a
anlise das lnguas naturais passa a constituir um domnio com estatuto prprio,
institucionalizando-se e fazendo parte do tronco comum de muitos cursos universitrios, o
que tem originado uma considervel investigao e divulgao cientficas. Para trs fica o
caminho das gramticas.
certo que reflexes sobre a linguagem sempre as houve e a prpria histria da
Filosofia prdiga em exemplos de autores que, com maior ou menor desenvolvimento,
refletiram sobre a linguagem: Leibniz no livro III dos Nouveaux Essais sur lEntendement
Humain (1765) apresenta um tratamento detalhado sobre as palavras; David Hume dedica,
tambm, linguagem algumas seces do Treatise of Human Nature (1739); tienne Bonnot
de Condillac f-lo igualmente no Essai sur lorigine des connaissances humaines (1746); no
sculo XIX, Charles Sanders Peirce atribui linguagem uma focalizao centralizadora, tanto
nos seus escritos de pendor filosfico, como na prpria Semitica; j na Antiguidade, Plato,
no Crtilo e no Teeteto, e Aristteles, nas Categorias e em De Interpretatione, colocam a
linguagem no centro das suas atenes e refletem sobre o discurso (logos), a origem das
palavras, as letras, as slabas, as partes da orao, com especial destaque para nomes e verbos,
as categorias Mas digamos que, se estas reflexes acontecem de forma esparsa ao longo da
histria do pensamento ocidental como reflexes secundrias no conjunto de um determinado
sistema filosfico, sempre coube gramtica o papel de centrar o que de essencial se ia
sabendo sobre a linguagem, em geral, e sobre as vrias lnguas, em particular.
A importncia que a Lingustica tem, nos nossos dias, ao nvel universitrio e/ou de
investigao, tinha a gramtica at ao sculo XX, constituindo-se como disciplina obrigatria
do Trivium estudado nas escolas medievais (a par da retrica e da dialtica). Aconteceu,
assim, a partir de Saussure, uma mudana terminolgica: a gramtica deu lugar lingustica.
E esta mudana no aleatria. O advento das cincias naturais, que comea a dominar o
panorama intelectual da Europa a partir do sculo XVII, faz com que o estudo da linguagem
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se torne cada vez mais cientfico e menos prescritivo. Quer queiramos quer no, gramtica
sempre vem associado o sentido de regra ou de preceito pelo que este seu carter
normativo no se coadunava bem com as caractersticas requeridas a uma cincia:
co