5

Click here to load reader

A constituição do sujeito em Michel Foucault - práticas de sujeição e práticas de subjetivação

Embed Size (px)

Citation preview

  • A constituio do sujeito em Michel Foucault:

    prticas de sujeio e prticas de subjetivao

    Marcela Alves de Arajo Frana CASTANHEIRA

    Adriano CORREIA

    Programa de Ps-Graduao da Faculdade de Filosofia UFG

    [email protected]

    Bolsista REUNI/ CAPES

    Palavras- chave: sujeito, objetivao, subjetivao, governo

    INTRODUO

    O trabalho que est sendo desenvolvido e que aqui ser exposto

    parcialmente pretende investigar a constituio do sujeito a partir do pensamento de

    Michel Foucault. Por um lado, o sujeito constitudo a partir de imposies que lhe

    so exteriores, sendo compreendido como um produto das relaes de saber e de

    poder; por outro, o sujeito constitudo a partir de relaes intersubjetivas em que

    h espao para a manifestao da liberdade que possibilita a criao de si mesmo

    como um sujeito livre e autnomo. Em linhas gerais, buscaremos apresentar e

    discutir essa tenso entre a constituio de um sujeito passivo e de um sujeito ativo.

    MATERIAL E MTODOS

    Foi utilizado o mtodo bibliogrfico qualitativo, tendo como material a literatura

    primria e secundria disposio para a compreenso do pensamento de Michel

    Foucault, especialmente as obras do final da vida do autor, que concernem

    especificamente ao tema da relao entre governo verdade subjetividade.

    RESULTADOS E DISCUSSES

    Os escritos inicias de Michel Foucault buscam compreender os discursos em

    que o prprio sujeito colocado como objeto de saber possvel, compreender quais

    so, diz Foucault, os processos de subjetivao e de objetivao que fazem com

    que o sujeito possa se tornar, na qualidade de sujeito, objeto de conhecimento.

  • (FOUCAULT, 2004, p. 236) Os chamados processos de subjetivao1, nesse caso,

    referem-se ao modo como o prprio homem se compreende como sujeito legtimo

    de determinado tipo de conhecimento, ou melhor, como o sujeito percebe a si

    mesmo na relao sujeito-objeto. Os processos de objetivao, por sua vez, dizem

    respeito ao modo como o sujeito pde se tornar um objeto para o conhecimento. A

    objetivao e a subjetivao so, portanto, processos complementares que se

    relacionam por meio do que Foucault resolveu chamar de jogos de verdade.

    Por jogos de verdade o autor compreende no a descoberta das coisas

    verdadeiras, mas as regras segundo as quais, a respeito de certas coisas, aquilo

    que um sujeito pode dizer decorre da questo do verdadeiro e do falso.

    (FOUCAULT, 2004, p.235) Isso significa dizer que os jogos de verdade so os

    modos pelo quais os discursos podem ou no se tornar verdadeiros de acordo com

    as circunstncias em que so ditos; a maneira pela qual um determinado tipo de

    objeto se relaciona com o sujeito. No caso do aparecimento das cincias humanas

    deparamo-nos com prticas discursivas em que o sujeito torna-se o objeto

    privilegiado de investigao e de discursos que podem ser verdadeiros ou falsos.

    Temos, deste modo, o sujeito compreendido como objeto de conhecimento e, ao

    mesmo tempo, sujeito detentor deste conhecimento.

    Todavia, parece que Foucault, ao examinar a relao entre os jogos de

    verdade e a objetivao do sujeito nas cincias humanas, foi conduzido s relaes

    de poder, j que na sociedade os discursos das cincias humanas funcionam no

    apenas como prticas discursivas, mas, sobretudo, como prticas coercitivas.

    Perceber essa relao entre poder e saber levou Foucault a reformular a pergunta

    inicial de suas pesquisas: no mais examinar como os discursos das cincias

    humanas galgaram ao estatuto de verdade, mas refletir sobre as condies

    histricas, polticas e econmicas que possibilitaram seu surgimento. O que lhe

    interessa complementar a anlise do saber a partir da articulao entre os

    discursos de verdade e as prticas sociais e institucionais, isto , compreender como

    os saberes se tornam dispositivos polticos que auxiliam os mecanismos de poder. A

    preocupao de Foucault volta-se, ento, para os efeitos coercitivos das prticas

    discursivas e das prticas institucionais, que funcionam em uma dinmica circular

    em que a mecnica do poder reclama os efeitos de verdades.

    1 De forma geral, os processos de subjetivao referem-se s relaes que so definidas de si consigo.

  • A genealogia do poder , ento, requisitada para complementar as pesquisas

    precedentes sobre as cincias dos homens, uma vez que examina as prticas no-

    discursivas que no so tratadas na arqueologia e, ao mesmo tempo, fixa a

    circularidade entre os regimes de poder e os regimes de saber. Nesse contexto, a

    ideia fundamental de Foucault que o sujeito da genealogia o sujeito dos

    mecanismos de poder na medida em que ele constitudo pelas tcnicas de

    sujeio.

    Todavia, para Foucault, afirmar que o sujeito um efeito das relaes de

    poder e das relaes de saber no significa que ele est submetido a uma fora

    incontornvel que predispe os acontecimentos. Poder-se-ia pensar que falar em

    sujeitos livres seria uma contradio em termos, j que sujeito aquele que est

    sendo sujeitado, contudo, para Foucault, mesmo sendo sujeitados os indivduos

    possuem um campo de possibilidade para vrias condutas e diversos

    comportamentos.

    Desse modo, o sujeito livre, pois se h relaes de poder em todo o campo

    social, porque h liberdade em todo lugar. (FOUCAULT apud MAGALHES,

    2008, p.13) Para Foucault, o poder s pode se exercer sobre sujeitos livres e na

    medida em que so livres. Sendo o poder compreendido como uma relao de

    foras, ele s pode se exercer sobre algo que livre, pois, se no houvesse

    possibilidade de resistncia e de reao no seria necessrio o exerccio do poder,

    j que nada poderia ser diferente do que j . Se em uma relao de poder um dos

    lados estiver completamente merc do outro, no h possibilidade de exerccio do

    poder, pois haveria apenas violncia e domnio completo. Devemos compreender a

    relao entre poder e liberdade no em termos de excluso mtua, mas como um

    par que se provoca a cada instante.

    Mesmo assim, a liberdade reduzida resistncia na medida em que se

    apresenta como uma possibilidade de reagir s foras que lhe so impostas. E,

    nesse sentido, configura-se como uma no-liberdade ou uma liberdade negativa j

    que no significa a possibilidade de agir como lhe aprouver, mas refere-se antes s

    possibilidade de reagir, de responder s relaes de poder qual se est sujeito. A

    liberdade dos indivduos pode ser entendida assim: diante da mesma situao as

    pessoas podem reagir de maneiras muito diferentes.

    Temos, portanto, um sujeito constitudo pela objetivao do sujeito nas

    cincias humanas e pela subjugao a procedimentos do poder. Contudo, nos

  • ltimos escritos de Foucault ocorre um deslocamento: no mais o caso de se falar

    de tcnicas de individuao ou de tcnicas de sujeio, mas da constituio de um

    sujeito ativo e autnomo. A relao do sujeito com os jogos de verdade no est

    sendo mais pensada a partir de uma prtica coercitiva, mas a partir de uma prtica

    de autoformao desse sujeito.

    Foucault ocupa-se com as relaes intersubjetivas voltadas para um exerccio

    sobre si mesmo por meio do qual se busca o seu modo de ser e pelo qual se exerce

    a liberdade. Isso quer dizer que a partir de um exerccio sobre si mesmo, do governo

    de si, do controle de apetites e de domesticao de afetos, o sujeito escolhe seu

    modo de ser e a maneira como pretende se portar. uma maneira ativa do indivduo

    constituir a parte mais secreta de sua subjetividade, compreendendo por

    subjetividade a maneira pela qual o sujeito faz a experincia de si mesmo em um

    jogo de verdade, no qual ele se relaciona consigo mesmo. (FOUCAULT, 2004,p.

    236)

    Temos, assim, de forma geral, o movimento do sujeito no interior da obra de

    Foucault: primeiramente, temos o sujeito objetivado nas cincias humanas, depois

    temos o sujeito como produto das relaes de poder e, por fim, encontramos o

    sujeito livre e capaz de constituir a si mesmo. No entanto, algumas coisas devem

    ainda ser esclarecidas nesse movimento de pensamento realizado pelo filsofo, uma

    vez que no evidente a articulao entre esses trs modos de pensar o sujeito.

    Como o sujeito constitudo a partir de prticas que lhe so exteriores e que

    lhe subordina e ao mesmo tempo por prticas de si que so relaes interiores e

    autnomas? As maneiras de constituio do sujeito e da subjetividade so fundadas

    em instncias exteriores ou no interior do prprio sujeito? Essas so algumas

    questes que pretendemos discutir.

    CONCLUSES

    A discusso do problema acima exposto deve ser realizada

    fundamentalmente a partir de um deslocamento operado por Foucault em seus

    escritos do final da dcada de 1970, qual seja, da noo de saber-poder para a

    noo de governo dos homens pela verdade. Se antes a noo de saber-poder

    funcionava como uma chave de anlise das tcnicas, procedimentos e tecnologias

    de sujeio e dominao que constituem o sujeito (como a figura do sujeitado, do

    produto das relaes que lhe so exteriores), a ideia de governo, entendida como

  • mecanismo e procedimento destinado a conduzir as condutas dos homens, permitiu

    a elaborao de uma nova chave de interpretao do modo como o poder atua e

    como possvel limitar essa atuao. a partir do desenvolvimento dessa noo

    que Foucault percebe que o exerccio do poder est sempre ligado a dois

    elementos: subjetividade e verdade. No entanto, resta ainda investigar como o

    poder no pode se exercer sem que a verdade se manifeste, e se manifeste na

    forma da subjetividade.

    REFERNCIAS

    FOUCAULT, Michel. A tica do cuidado de si como prtica da liberdade. In: tica,

    sexualidade e poltica , por Michel FOUCAULT, 264-287. Rio de Janeiro: Forense

    Universitria, 2004a.

    _____.A Hermenutica do sujeito. So Paulo: Martins Fontes, 2006.

    _____.Do Governo dos Vivos. So Paulo/ Rio de Janeiro:CCS-SP/ Achiam, 2010.

    _____. Histria da Sexualidade 2: O Uso dos Prazeres. Rio de Janeiro: Graal, 1984.

    _____. Histria da Sexualidade 3: O Cuidado de Si. Rio de Janeiro: Graal, 1985

    _____. Poltica e tica: uma entrevista. In: tica, Sexualidade e Poltica, por Michel

    FOUCAULT, 218-224. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2004

    GROS, Frdric. O cuidado de si em Michel Foucault. In: Figuras de Foucault, por

    RAGO, Margareth e VEIGA-NETO, Alfredo (org). So Paulo: Autntica, 2006.

    MAGALHES, Theresa Calvet de. Violncia e/ou poder. In: Poder, normalizao e

    violncia.Incurses foucaultianas para a atualidade, por Org. Izabel C. Friche

    Passos. Belo Horizonte: Autntica, 2008.