A dialética entre a celeridade e a pacificação social

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  • UnB Universidade de Braslia Faculdade de Direito

    Disciplina: Monografia Orientador: Valcir Gassen

    DAVID AMARAL SANTOS MAT 05/80198

    A DIALTICA ENTRE A CELERIDADE E A PACIFICAO SOCIAL NA PRESTAO JURISDICIONAL BRASILEIRA

    Braslia 2011

  • DAVID AMARAL SANTOS

    A DIALTICA ENTRE A CELERIDADE E A PACIFICAO SOCIAL NA PRESTAO JURISDICIONAL BRASILEIRA

    Monografia apresentada como requisito para concluso do curso de bacharelado em Direito da UnB Universidade de Braslia

    Orientador: Prof. Valcir Gassen

    Braslia 2011

  • DAVID AMARAL SANTOS

    A DIALTICA ENTRE A CELERIDADE E A PACIFICAO SOCIAL NA PRESTAO JURISDICIONAL BRASILEIRA

    Monografia apresentada como requisito para concluso do curso de bacharelado em Direito da UnB Universidade de Braslia

    Orientador: Prof. Valcir Gassen

    Braslia, 1 de julho de 2011.

    Aprovada por:

    ______________________________________

    Valcir Gassen (orientador) Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina

    ______________________________________

    Alex Lobato Potiguar Mestre em Direito, Estado e Constituio pela Universidade de Braslia

    ______________________________________

    Nicolao Dino de Castro e Costa Neto Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco

  • SANTOS, David Amaral. A Dialtica entre a Celeridade e a Pacificao Social na Prestao Jurisdicional Brasileira/ David Amaral Santos Braslia, 2011.

    Monografia apresentada como requisito para concluso do curso de bacharelado em Direito da UnB Universidade de Braslia

    Orientador: Valcir Gassen Banca Examinadora: Alex Lobato Potiguar e Nicolao Dino de Castro e Costa Neto

  • RESUMO

    O presente trabalho configura-se em uma anlise crtica acerca da poltica de celeridade que vem sendo adotada no mbito do poder Judicirio brasileiro. A pesquisa mostrou que essa poltica no vem atendendo, adequadamente, os ideais de pacificao social.

    Dessa forma, apresenta-se os conceitos de pacificao social, acesso Justia e jurisdio, buscando-se signific-los luz de um ideal de justia, que traga maior efetividade das decises judiciais.

    Em seguida, comenta-se sobre as principais mudanas ocorridas, tanto na esfera legislativa, quanto na esfera administrativa da Justia brasileira, com o intuito de comprovar a prevalncia da celeridade em detrimento da pacificao social.

    Por fim, prope-se uma soluo, qual seja, o frum de mltiplas portas, como um modelo que possibilita a convivncia entre a celeridade e a pacificao social.

  • If I have seen farther than others, it is because I stood on the shoulders of giants.

    SIR ISAAC NEWTON

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    SUMRIO

    INTRODUO.................................................................................................2

    1 O PAPEL DO JUDICIRIO: A AMPLIAO DO CONCEITO DE JURISDIO PARA O ATENDIMENTO DOS IDEAIS DE ACESSO JUSTIA E PACIFICAO SOCIAL.............................................................................................................4

    1.1 As vrias facetas do acesso Justia.......................................4 1.2 O objetivo do Direito: A busca da pacificao

    social..........................................................................................6 1.3 A crise do modelo clssico de jurisdio: a proposta de uma

    resignificao de seu conceito...................................................7 2 UMA ANLISE CRTICA ACERCA DAS PRINCIPAIS MUDANAS

    IMPLEMENTADAS PELA POLTICA DE CELERIDADE DO JUDICIRIO BRASILEIRO...................................................................................................10

    2.1 As smulas vinculantes e seus aspectos negativos ao acesso Justia......................................................................................12

    2.2 Apontamentos sobre a repercusso geral e seu efeito inibidor ao acesso Justia..................................................................15

    2.3 Os recursos repetitivos como um falso argumento para desafogar o Judicirio................................................................17

    2.4 A exigncia de depsito recursal para a interposio de agravo de instrumento no mbito da Justia do Trabalho.....................19

    3 A NECESSIDADE DE ADEQUAO DA CONTROVRSIA AO MTODO DE RESOLUO DE CONFLITOS......................................................................24

    3.1 Conceitos, vantagens e desvantagens dos principais meios de resoluo de conflitos................................................................24 3.1.1 A mediao como a tcnica mais adequada em

    detrimento da conciliao judicial...................................27 3.2 O frum de mltiplas portas como o modelo que poderia

    adequar o conflito ao melhor meio de pacificao social..........30

    CONCLUSO..................................................................................................33

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................35

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    INTRODUO

    No demais reconhecer que a sociedade brasileira est em crise. Vizinhos que brigaram no passado e nunca mais se falaram, conflitos entre familiares, que muitas vezes chegam a um destino fatal, a intolerncia no trnsito, o aumento do nmero de homicdios, bulling nas escolas, tudo isso reflete a necessidade de pacificao social.

    Essa realidade poderia ser atenuada se o Judicirio brasileiro se portasse de forma mais efetiva. Efetividade essa traduzida na possibilidade de maior acesso Justia, aumento da celeridade processual e, principalmente, o alcance do fim precpuo do Judicirio, que a busca da pacificao social.

    Primeiramente preciso perceber que o processo tradicional no mais adequado para a maioria das situaes, como se depreende das seguintes palavras:

    O processo civil moderno encontra-se em crise. Fatores como a morosidade da prestao jurisdicional, a sobrecarga dos tribunais, a burocratizao da Justia, a complicao procedimental, as deficincias no acesso justia, a insuficincia da defensoria jurdica e a falta de orientao dos cidados levam a um distanciamento entre a populao, que necessita da Justia para garantir os seus interesses e o Judicirio. (GRINOVER apud BARBOSA, 2003, p. 244).

    Somando-se a isso, as custas judiciais, muitas vezes, acabam afastando o jurisdicionado da Justia. (BARBOSA, 2003, p. 244). O excessivo culto verdade, tambm, poderia ser remodelado para uma idia mais voltada a uma adequada prestao jurisdicional. (BARBOSA, 2003, p. 244).

    Dessa forma, no procurando o Judicirio, por desacreditar nele ou por no ter tido o acesso necessrio para o reconhecimento de seu direito, o cidado acaba recorrendo autotutela, o que pode desencadear no aumento da violncia e, logo, na diminuio da pacificao social.

    Esse panorama acaba se agravando quando se verifica a poltica que vem conduzindo o Judicirio ultimamente. Ocorre que vem se priorizando a celeridade processual, com a utilizao de diversos meios que acabam no trazendo a pacificao social adequada. O conflito acaba no solucionado e, de alguma forma, ir afetar negativamente a sociedade futuramente, seja com novas demandas na Justia, seja com solues tomadas pelos prprios envolvidos, muitas das vezes, com o emprego da violncia.

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    Essa poltica pode ser vista nas diversas alteraes legislativas, que culminaram com a criao das smulas vinculantes e da repercusso geral no mbito do Supremo Tribunal Federal, da lei acerca dos recursos repetitivos aplicada ao Superior Tribunal de Justia, da instituio do depsito recursal em Agravo de Instrumento na Justia do Trabalho, dentre outras medidas.

    Alm disso, a criao do Conselho Nacional de Justia, benfica em diversos aspectos, acabou desencadeando uma onda de celeridade, o que se percebe com as semanas da conciliao, programa de metas, o procedimento que averigua o excesso de prazo em processos, dentre outros.

    Partindo dessa realidade, a presente pesquisa buscar mostrar as principais medidas institudas no Judicirio para trazer celeridade ao processo, ao mesmo tempo em que se preocupar em expor deficincias dessa sistemtica.

    Atenta-se que no objetivo desse trabalho negar a celeridade, pois ela se configura como um dos requisitos de um amplo acesso Justia, mas propor um modelo que busque conciliar uma rpida soluo do processo com o alcance da pacificao social.

    Assim, o primeiro captulo apresentar os conceitos e particularidades dos termos acesso Justia, pacificao social e jurisdio para adequ-los ao ideal que esse trabalho se prope.

    Em seguida, o segundo pargrafo apresentar as principais reformas realizadas no Judicirio, muitas trazidas pela Emenda Constitucional n 45, tais como, a criao do Conselho Nacional de Justia, das smulas vinculantes, da repercusso geral, da lei sobre os recursos repetitivos, do depsito recursal em agravo de instrumento na Justia do Trabalho, buscando mostrar incongruncias que ocorrem quando se prioriza a celeridade, a qualquer custo.

    Por fim, o ltimo captulo apresentar os principais mtodos de resoluo de conflitos, sendo o convencional (judicial) e os alternativos, alm de introduzir o frum de mltiplas portas, como uma potencial soluo para essa dialtica entre a celeridade e a pacificao social, o que vislumbrado por BARBOSA, in verbis:

    Esse tipo de frum possui a grande vantagem de diversificar os procedimentos utilizados para a composio das controvrsias, ajudando a solucion-las de forma mais rpida e menos dispendiosa, ao mesmo tempo em que alivia o congestionamento e o atraso do judicirio e logra manter a tutela dos juzes nas causas que realmente precisam ser julgadas pelas cortes. (BARBOSA, 2003, p. 248).

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    1 O PAPEL DO JUDICIRIO: A AMPLIAO DO CONCEITO DE JURISDIO PARA O ATENDIMENTO DOS IDEAIS DE ACESSO JUSTIA E PACIFICAO SOCIAL

    1.1 As vrias facetas do acesso Justia

    Inicialmente, apresento o conceito de acesso Justia adotado por SOUZA, que entende haver um sentido formal, que o de ter a possibilidade de ingressar em juzo para defender um direito de que se titular (MARINONI apud SOUZA, 2009, p. 58) e um sentido material, que o acesso a um processo e a uma deciso justas. (MARINONI apud SOUZA, 2009, p. 59).

    No mesmo sentido, JUNIOR, em outras palavras, diz que o processo, seja por meio das vias tradicionais ou pelas vias alternativas, deve ser construdo de forma a ser efetivo, permitindo a composio entre as partes no menor tempo possvel com o mximo de qualidade tcnica de modo a garantir os resultados prticos almejados. (JUNIOR apud GUERRERO , 2009, p. 269).

    Numa outra abordagem, o mesmo autor introduz uma classificao que separa os efeitos do processo em intrnsecos e extrnsecos, ao mesmo tempo em que critica o alto formalismo do processo, in verbis:

    O valor do sistema processual deve ser pautado no pela sua cientificidade, mas pela capacidade deste propiciar ao titular dos direitos, uma situao melhor daquela que tinha antes do processo. Da a importncia conferida atualmente necessidade de garantia a uma tutela jurisdicional com tempestividade e qualidade, efeito extrnseco do processo, em detrimento do conceito de ao, efeito intrnseco do processo. (DINAMARCO apud JUNIOR, 2009, p. 264).

    Partindo dessa conceituao, GUERRERO, seguindo as idias desenvolvidas por Cappelletti e Garth, enuncia trs ondas de acesso Justia, nos seguintes termos:

    A primeira liga-se criao de assistncia judiciria para os pobres, com a existncia de um grande nmero de advogados para atender os indivduos impossibilitados de pagar pelos servios jurdicos. A segunda diz respeitos representao dos interesses difusos por advogado com enfoque especfico na defesa destes direitos, sempre de acordo com o interesse pblico. Por fim, a terceira trata de uma concepo mais ampla de acesso justia, centrando-se nas instituies, mecanismos, pessoas e procedimentos

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    utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas.

    Dessas ondas citadas, SOUZA aponta quatro obstculos ao acesso Justia, aproveitando-se, tambm, dos conhecimentos de Cappelletti e Garth , que seriam: obstculos de natureza financeira; obstculos temporais; obstculos psicolgicos e culturais; e obstculos institucionais. (SOUZA, 2009, pp. 59-60).

    Dessa forma, os obstculos financeiros estariam relacionados cobrana de custas e honorrios, os obstculos temporais morosidade do Poder Judicirio e os obstculos institucionais aos direitos de natureza coletiva, em que o cidado estaria desmotivado a intentar uma demanda, por ser antieconmica frente leso, efetivamente, sofrida por ele. (SOUZA, 2009, p. 60).

    Quanto aos obstculos psicolgicos e culturais seriam aqueles consistentes na desconfiana e descrena que as pessoas tm no Judicirio e nos advogados. (SOUZA, 2009, p. 60).

    Decorrente desse panorama apresentado, mais precisamente, do sentido material de acesso Justia, percebe-se que imprescindvel a busca da pacificao social e da efetividade do processo para que esse ideal seja alcanado.

    Nesse diapaso, GUERRERO discorre nas seguintes palavras:

    Para garantir a concesso da tutela jurisdicional a quem de direito, se fala na efetividade do processo, e na sua capacidade de pacificar, tornando as pessoas mais felizes ou menos infelizes, mediante decises justas. A pacificao social mediante critrios de justia decorre, tambm, portanto, da efetividade do processo, com a observncia racional de princpios e garantias do sistema processual. (DINAMARCO apud GUERRERO, 2009, p. 264).

    Diante dessa fundamentao e verificando-se a poltica adotada, atualmente, pelo Judicirio, que tem dado total prioridade celeridade, em detrimento de uma deciso de qualidade, como ser mostrado adiante, no difcil perceber como o acesso Justia vem sendo negado.

    A Justia acaba pensando mais em solucionar seus problemas internos e se esquece que foi criada para pacificar a sociedade, ou seja, resolver os conflitos da sociedade.

    Como se ver, o acesso Justia bloqueado, quando so criadas medidas, tais como as smulas vinculantes, a repercusso geral, os recursos repetitivos, que possuem explicao na celeridade, mas, que, muitas vezes, nem isso conseguem alcanar.

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    Alm disso, quando se tratar dos mtodos alternativos de resoluo de conflitos, ao se comparar a mediao com a conciliao, ser possvel se verificar que essa ltima acaba indo de encontro ao acesso Justia, quando entendido em seu sentido material.

    1.2 O objetivo do Direito: a busca da pacificao social

    Como ser demonstrado durante esse trabalho, alm de a prestao jurisdicional ser clere, ela precisa buscar pacificao social, pois essa ltima acaba trazendo a primeira, medida que as partes, alm de solucionar o conflito, constroem meios para continuarem tendo uma convivncia pacfica.

    Nesse diapaso, nessa perspectiva que o Direito deve ser tomado, tendo como objetivo precpuo, nos dizeres de Marcos Andr Couto Santos em O Direito como meio de pacificao social: em busca do equilbrio das relaes sociais, a garantia da paz e do equilbrio das relaes sociais, evitando conflitos com fins de promover o desenvolvimento do grupo social (sociedade) com reduo das desigualdades existentes. (SANTOS, 2001, p. 86).

    No mesmo sentido, Jos Herval Sampaio Jnior, em O papel do juiz na tentativa de pacificao social: a importncia das tcnicas de conciliao e mediao, ergue a pacificao social principal funo da atividade jurisdicional, propondo como meio de se efetivar essa funo, a utilizao de meios alternativos de resoluo de conflitos. (JNIOR, 2009, p. 613).

    Introduzindo a importncia de novos meios de resoluo de conflitos, Andr Gomma de Azevedo em Fatores de efetividade de processos de resoluo de disputas: uma anlise sob a perspectiva construtivista, faz o seguinte comentrio:

    Refletindo caracterstica de um moderno ordenamento jurdico, o direito processual brasileiro, na sua vocao preponderante de servir como instrumento para a efetiva realizao de direitos materiais e a pacificao social, tem gradativamente se aproximado de novos instrumentos de composio de disputas (...). (AZEVEDO, 2009, p. 17).

    AZEVEDO, com o intuito de mostrar outra perspectiva acerca do conflito, citando Morton Deutsch, apresenta as distines entre processos construtivos e destrutivos de resoluo de conflitos. (AZEVEDO, 2009, p. 28).

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    Perceber-se- que os primeiros so aqueles mais de acordo com um Direito, segundo o objetivo proposto nesse tpico.

    Para fins de caracterizao, AZEVEDO afirma que nos processos destrutivos as partes concluem tal relao processual com esmaecimento da relao processual preexistente disputa e acentuao da animosidade decorrente da ineficiente forma de conduzir o conflito. (AZEVEDO, 2009, p. 19).

    J, quanto aos processos construtivos, AZEVEDO explica que so concludos com fortalecimento da relao processual preexistente disputa e, em regra, robustecimento do conhecimento mtuo e empatia. (AZEVEDO, 2009, p. 20).

    Essa pacificao social acaba necessitando de uma reformulao da noo de Jurisdio, que ser objeto do prximo tpico, em que seja possvel a utilizao de outros meios, alm do processo judicial, de acordo com cada situao concreta e suas particularidades.

    Acerca disso, AZEVEDO faz a seguinte observao, que considera tanto a ampliao da noo de Jurisdio, a utilizao de processos construtivos e o ideal de pacificao do Direito, in verbis:

    Por outro lado, a adequada sistematizao e desenvolvimento de mecanismos voltados a aumentar a eficincia desses processos e o estmulo para que estes se tornem processos construtivos marcante tendncia do direito processual, na medida em que vai ganhando corpo a conscincia de que, se o que importa pacificar, torna-se irrelevante que a pacificao venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficientes. (CINTRA; DINAMARCO; GRINOVER apud AZEVEDO, 2009, p. 31).

    Assim, o poder pblico no pode, como se ver, instituir polticas e criar institutos que restrinjam o acesso Justia e, dessa forma, a pacificao social, para tornar o Judicirio mais clere. Isso no soluciona o problema, pelo contrrio, pode gerar outras demandas, decorrentes de conflitos mal resolvidos.

    1.3 A crise do modelo clssico de jurisdio: a proposta de uma resignificao de seu conceito

    A respeito desse tema, cabe tecer comentrios acerca do conceito de jurisdio, dominante, ainda, na atividade judicial e no entendimento dos operadores de Direito.

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    Nessa tica, remeto-me ao conceito de jurisdio adotado por Humberto Theodoro Jnior, em Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento, segundo o qual, jurisdio a funo do Estado de declarar e realizar, de forma prtica, a vontade da lei diante de uma situao jurdica controvertida. (JNIOR, 2008, p. 42).

    No mesmo sentido, Genacia da Silva Alberton, em Repensando a Jurisdio Conflitual, apresentou um conceito de Jurisdio, que, posteriormente vir refutar, em que se v a noo de jurisdio centrada no Estado, no interesse de preservao do prprio Estado no qual o direito deve se realizar. (MORTARA apud ALBERTON, 2009, 294).

    Aproveitando as lies da autora supracitada, em exposio realizada na mesma obra, ser mostrada, em seguida, uma noo de jurisdio mais adequada aos anseios de pacificao social e acesso Justia, em seu sentido mais amplo.

    Num primeiro momento, importante destacar a percepo de ALBERTON, quando entende estar a jurisdio em crise, ultrapassada e, dessa forma, explicando o tema segundo a noo de racionalidade, faz a seguinte observao:

    A transformao do Estado nacional com a superao do modelo liberal racionalista centrado no indivduo est gerando tambm a necessidade de superao do paradigma racionalista kantiano da certeza decorrente da relao sujeito-objeto, da busca de elementos a se encaixarem no ordenamento jurdico, considerado como um sistema pronto a oferecer as respostas a todos os litgios. A fora do poder do Estado, atravs da jurisdio contenciosa, est ou deve ser superada. certo que a litigiosidade decorrente do conflito de interesses e a necessidade de sancionamento decorrente da prtica de ilcitos no pode ser negada. O que se pretende buscar o sentido de uma jurisdio de menor embate. Busca-se uma racionalidade do consenso capaz de validar de forma mais efetiva o que for decidido. Isso porque toda tutela implica em poder do tutor sobre o tutelado, o que conduz a uma situao de subordinao incompatvel com o exerccio democrtico de cidadania. (ALBERTON, 2009, p. 317).

    Em outras palavras, no se pretende abolir a jurisdio existente, mas ampliar seu significado, aumentando a participao das partes com vistas a alcanar uma deciso mais consensual e, ao mesmo tempo, encontrar meios mais efetivos e adequados para solucionar cada caso concreto especfico.

    No que se refere participao, segundo ALBERTON, essa precisa trazer incluso, no somente do ponto de vista formal, mas considerando aspectos,

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    no exclusivamente econmicos e, tambm, dando ao juiz uma posio afastada da neutralidade formal para assumir seu papel social e responsvel. (ALBERTON, 2009, p. 317)

    Reforando sua argumentao, ALBERTON se vale da filosofia de Habermas, em que trata da liberdade comunicativa e mostra a legitimao que uma deciso ter, quando se ampliar a comunicao e a participao das partes no processo, in verbis:

    A liberdade comunicativa apontada por Habermas abre canais de atuao e deve influir na esfera de poder, pois resulta em soluo legitimada pelo entendimento, no coativa, mas de carter emancipatrio, com a utilizao do espao democrtico, que no mais puramente privado, pois refoge ao mbito do mero contrato, mas se publiciza. A informalidade no afasta a formalizao do decidido para que possa repercutir no mundo da vida como produtor de direito. (HABERMAS apud ALBERTON, 2009, p. 318).

    Concluindo seu raciocnio, Genacia da Silva Alberton, d nfase necessidade de ampliao do conceito de jurisdio, propondo, dessa forma, ao defender o uso da mediao, uma maior utilizao de mtodos alternativos de resoluo de conflitos, sem abolir o processo judicial, o que propiciaria a efetiva participao das partes no atendimento do conflito como possibilidade de dilogo reflexivo. (ALBERTON, 2009, p. 318).

    Em suma, como foi acentuado, e aproveitando-se do entendimento dessa autora, para que seja possvel o modelo que ser proposto ao final desse trabalho, que considera as peculiaridades de cada caso concreto para, ento, definir-se o mtodo de resoluo de conflito, ser necessria a ampliao da noo de jurisdio, que dever ser aquela que traga maior participao ou acesso Justia, o que propiciar maior pacificao social e efetividade s decises judiciais.

    Somente dessa forma ser possvel uma agradvel convivncia entre os ideais de celeridade e pacificao social, ambos necessrios para uma deciso judicial adequada.

    Aps essas consideraes iniciais, que traam as principais concepes que sero utilizadas nessa obra, a seguir sero apresentadas as mudanas ocorridas na Justia brasileira nos ltimos anos, mormente, a reforma do Judicirio e suas consequncias, buscando-se apontar algumas incoerncias sistemticas, ao mesmo tempo em que se mostra a priorizao da celeridade no mbito desse poder.

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    2 UMA ANLISE CRTICA ACERCA DAS PRINCIPAIS MUDANAS IMPLEMENTADAS PELA POLTICA DE CELERIDADE DO JUDICIRIO BRASILEIRO

    Primeiramente, faz-se necessrio a exposio de um breve panorama das reformas operadas no poder Judicirio, nos ltimos anos.

    Essas mudanas vieram, sobretudo, atravs da emenda constitucional n 45, responsvel pela reforma do Judicirio, que trouxe significativas mudanas Justia, no que diz respeito ao campo terico, sendo que na perspectiva prtica, aos poucos, vem se verificando as mudanas desejadas para o alcance de uma Justia mais democrtica.

    Dentre essas mudanas, pode-se destacar o inciso LXXVIII do artigo 5 da Constituio, que considerou um direito fundamental a razovel durao do processo, nos seguintes termos:

    Art. 5 - LXXVIII a todos, no mbito judicial e administrativo, so assegurados a razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao.

    Seguindo essa lgica, diversas alteraes constitucionais e, posteriormente, legislativas vieram no mbito do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores, com o intuito de diminuir a quantidade de processos, tornando a tutela jurisdicional mais clere.

    Alm disso, a reforma do Judicirio criou o Conselho Nacional de Justia (CNJ), rgo que viria para trazer maior transparncia e controle s atividades judiciais. Apesar disso, no difcil perceber que esse rgo tem priorizado, bastante, a celeridade processual, com seu programa de metas e campanhas, como a semana da conciliao, que buscam agilizar a prestao jurisdicional, com o sacrifcio, muitas vezes da pacificao social, que necessita de tempo, em muitos casos, para ser alcanada.

    O Judicirio acaba pecando pela pressa, que nunca foi a melhor forma de solucionar seus problemas estruturais. Pode-se dizer que o ditado popular, consubstanciado nas seguintes palavras, tem sido uma realidade da Justia brasileira: A pressa inimiga da perfeio. Isso no significa que no se deva

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    buscar a celeridade. Pelo contrrio, deve-se busc-la, mas, ao mesmo tempo, no se pode esquecer que o papel do Judicirio pacificar.

    Dessa forma, podem-se mencionar como principais alteraes as smulas vinculantes, o instituto da repercusso geral, os recursos repetitivos, a exigncia de depsito recursal para a interposio de Agravo de Instrumento, relativamente Justia do Trabalho e a criao do CNJ. Especificamente, sobre isso que esse captulo tratar, buscando demonstrar algumas impropriedades desses institutos.

    Num primeiro momento, cabe citar BAHIA, em Litigiosidade em massa e repercusso geral no recurso extraordinrio, que mostra um problema geral de todos esses institutos mencionados, qual seja, o de no considerar as particularidades do caso concreto. Segue o trecho que trata do assunto:

    So delineadas tcnicas altamente discutveis, como a do julgamento liminar das aes repetitivas (...), das smulas vinculantes (...), entre outras, que se preocupam mais com uma padronizao superficial das decises do que com a sua soluo legtima e constitucional, uma vez que, para uma soluo adequada, se exigiria uma percepo dos aspectos peculiares de cada caso, alm dos aspectos idnticos que as pretenses isomrficas implementam. (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 11).

    Remetendo ao problema central, o qual se preocupa esse trabalho, BAHIA faz a seguinte observao, quanto a esses meios utilizados pelo Judicirio brasileiro para aumentar a celeridade:

    A defesa da limitao desses meios de impugnao das decises se torna uma constante, lastreada na preocupao e busca de um acesso justia quantitativo, que longe de se adequar s diretrizes tpicas do movimento de socializao processual, tpico do sculo XX, do qual se alega derivar, mais se aproximam de uma Justia de alta produtividade que pouco se preocupa com o impacto decisrio (jurdico, social e econmico) nos discursos de aplicao normativa. (NUNES apud BAHIA, 2009, p. 12).

    Para quem busca aplicar a experincia do Direito Comparado, em que apenas as questes mais relevantes da sociedade chegam s cortes superiores, BAHIA entende que no se pode aplicar aquela realidade brasileira, primeiro porque, em se tratando das Cortes de Cassao europias, h o chamado mecanismo de reenvio, em que h uma oportunidade de se adequar o entendimento da corte s particularidades do caso concreto (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 44), o que no Brasil, como foi mostrado, ainda est numa fase, pode-se dizer, embrionria.

    Um segundo motivo, conforme esse mesmo autor, que o Supremo Tribunal Federal e os tribunais superiores brasileiros no so Cortes de Cassao

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    (como os europeus, mas sim, que eles mesmos rejulgam causas, oferecendo (como regra), decises definitiva de mrito. (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 45).

    Nesse sentido, sero analisadas as principais alteraes legislativas que acabaram por limitar o acesso Justia, com o argumento de se dar maior celeridade, o que, porm, por no trazerem, muitas vezes, um conhecimento pleno do processo, acabam, tambm, no possibilitando a pacificao social, o que, por via reflexa, podem acabar aumentando, novamente, a demanda de processos ou criar um sentimento de descrdito em relao ao Judicirio.

    2.1 As smulas vinculantes e seus aspectos negativos ao acesso Justia

    As smulas vinculantes, como j foi comentado, foram introduzidas no ordenamento jurdico brasileiro pela Emenda Constitucional n 45, tendo sido disciplinada no art. 103-A, in verbis:

    Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poder, de ofcio ou por provocao, mediante deciso de dois teros dos seus membros, aps reiteradas decises sobre matria constitucional, aprovar smula que, a partir de sua publicao na imprensa oficial, ter efeito vinculante em relao aos demais rgos do Poder Judicirio e administrao pblica direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder sua reviso ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Includo pela Emenda Constitucional n 45, de 2004) (Vide Lei n 11.417, de 2006). 1 A smula ter por objetivo a validade, a interpretao e a eficcia de normas determinadas, acerca das quais haja controvrsia atual entre rgos judicirios ou entre esses e a administrao pblica que acarrete grave insegurana jurdica e relevante multiplicao de processos sobre questo idntica. 2 Sem prejuzo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovao, reviso ou cancelamento de smula poder ser provocada por aqueles que podem propor a ao direta de inconstitucionalidade. 3 Do ato administrativo ou deciso judicial que contrariar a smula aplicvel ou que indevidamente a aplicar, caber reclamao ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anular o ato administrativo ou cassar a deciso judicial reclamada, e determinar que outra seja proferida com ou sem a aplicao da smula, conforme o caso."

    Inicialmente, cabe caracterizar as smulas vinculantes, para depois tratar de eventuais problemas. Nesse sentido, SANTOS, dando um significado terminolgico ao instituto, diz:

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    O vocbulo smula advm do latim e significa sumrio ou restrito, podendo ser utilizado como o resumo de um julgado quanto uma tendncia jurisprudencial (...). O efeito vinculante consiste na vinculao de todos os rgos do Judicirio e da Administrao Pblica de todas as esferas da Federao aos enunciados das referidas smulas vinculantes editadas unilateralmente pelo Supremo Tribunal Federal. (VELOSO apud SANTOS, 2010, p. 330).

    Assim, as smulas vinculantes teriam como principal escopo o de impedir que demandas que tenham como objeto a matria sumulada cheguem ao Supremo Tribunal Federal, cabendo reclamao contra a deciso que desrespeitar o teor dessas smulas.

    Apesar disso, percebe-se, ao analisar o instituto em questo, que esse atenta contra o princpio do acesso Jurisdio, da ampla defesa, da separao dos poderes e do juiz natural.

    Os princpios do acesso Jurisdio e da ampla defesa sero analisados conjuntamente. E, nessa tica, SANTOS discorre no sentido de que, ao se concentrar a criao das smulas vinculantes no STF, sem a participao popular, necessria para se dar efetividade, diferentemente do que ocorre no processo legislativo e nas decises em que se verifica o devido processo legal, estar-se-a suprimindo o princpio da inafastabilidade do poder Judicirio, assim como, os princpios do contraditrio e da ampla defesa. Esse autor resume seu raciocnio, nos seguintes termos:

    As smulas vinculantes so criadas, revistas e canceladas unilateralmente pelo Supremo Tribunal Federal no mbito de mero procedimento (seqncia ordenada de atos previstos em lei sem a observncia dos princpios institutivos) e antes da instaurao do processo (procedimento necessariamente regido pelos princpios da isonomia, do contraditrio e da ampla defesa) mediante o exerccio do direito-de-ao (irrestrito e incondicionado), suprimindo o princpio do acesso jurisdio e da ampla defesa, j que impedem que os destinatrios dos efeitos das referidas smulas participem isonomicamente de sua criao, reviso ou cancelamento. (SANTOS, 2010, p. 332).

    Acerca da possvel violao do princpio da separao dos poderes, discorre o professor Alessandro Marques de Siqueira, em Estado Democrtico de Direito. Separao de Poderes e Smula Vinculante, que as funes tpicas de cada poder devem ser respeitadas, apesar de em alguns casos haverem excees, mas que no podem se tornar regras1, como ocorre nas smulas vinculantes, em que o

    1 SIQUEIRA, Alessandro Marques. Estado Democrtico de Direito. Separao de Poderes e Smula

    Vinculante. Em: http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/1861690 Acesso em 28 de abril de 2011.

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    Judicirio, no ocasionalmente, como na elaborao dos regimentos internos, mas permanentemente passa a dotar de funes legislativas.

    Acrescente-se a esse argumento, as consideraes do citado professor, ao considerar que as smulas vinculantes tambm estariam violando o sistema de freios e contrapesos, inerente ao princpio da separao dos poderes, nas seguintes palavras:

    Alm disso, conferir s sumulas vinculantes o poder de lei emprestar ao Supremo Tribunal Federal competncia legislativa, o que no deve prosperar, ainda mais se considerarmos que a Lei produzida pelo Poder Judicirio no ficaria passvel de controle, representando notrio quebrantamento do sistema de freios e contrapesos.2

    No que concerne ao princpio do juiz natural, estaria sendo desrespeitado, levando-se em considerao que o juiz competente para processar e julgar determinada matria, objeto de smula vinculante, no teria opo, no poderia fundamentar, segundo o livre convencimento motivado, devendo se adequar ao que foi determinado pelo Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, SIQUEIRA, entendendo que, para a afirmao da democracia, seria necessrio o respeito desse princpio, pois possibilitaria a ampliao da discusso e participao acerca do tema e respeitaria as particularidades do caso concreto, trata da questo, in verbis:

    O juiz singular deve atuar conforme sua conscincia, que constituda de valores mltiplos: ideologia, religio, cultura etc. Esta multiplicidade, prpria da democracia, no compatvel com a uniformizao de decises a partir da supresso de instncias, ainda mais quando a supresso ocorre pela atuao anmala de um poder.3

    Por fim, trago tona a percepo de SIQUEIRA acerca dos problemas que assolam o poder Judicirio, em que se percebe como se tem dado prioridade celeridade em contraposio a um julgamento justo e adequado, o que acaba no dando o acesso Justia pleno, como foi concebido alhures nessa obra, nos seguintes termos:

    Do que se coloca, percebe-se que no sem motivo que a comunidade jurdica se inquieta. Sem dvida, a morosidade dos processos judiciais acarreta prejuzos, mas, sem qualquer equvoco, a justia deve ter por fim a ordem e a paz social como suposto do regime republicano (CRFB, art.1). Apenas celeridade no bastante para que se diga ter havido prestao jurisdicional. Por isso, mostra-se insuficiente pegar um texto sumular, torn-

    2 SIQUEIRA, Alessandro Marques. Estado Democrtico de Direito. Separao de Poderes e Smula

    Vinculante. Em: http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/1861690 Acesso em 28 de abril de 2011. 3 SIQUEIRA, Alessandro Marques. Estado Democrtico de Direito. Separao de Poderes e Smula

    Vinculante. Em: http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/1861690 Acesso em 28 de abril de 2011.

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    lo complacente a ponto de comportar uma diversidade de hipteses, para dizer que, com base neste, houve prestao da tutela jurisdicional.4

    Em suma, foi possvel se verificar que as smulas vinculantes acabam, para alcanar a celeridade, violando os princpios do acesso Jurisdio, da ampla defesa, do juiz natural e da separao de poderes. Isso tudo acaba contribuindo para decises inadequadas, no geradoras de pacificao social. A seguir, ainda no mbito do Supremo Tribunal Federal, ser analisada a repercusso geral, quanto aos seus aspectos prejudiciais efetividade das decises judiciais.

    2.2 Apontamentos sobre a repercusso geral e seu efeito inibidor ao acesso Justia

    No que concerne a esse assunto, cabe, primeiramente, situar o tema constitucionalmente e legalmente, para depois traar uma conceituao e, ento, apontar os aspectos problemticos da questo.

    A repercusso geral foi disciplinada na Constituio Federal, no art 102, 3, in verbis:

    Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituio, cabendo-lhe: 3 No recurso extraordinrio o recorrente dever demonstrar a repercusso geral das questes constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admisso do recurso, somente podendo recus-lo pela manifestao de dois teros de seus membros. (Includa pela Emenda Constitucional n 45, de 2004)

    O Cdigo de Processo Civil disciplinou a matria, nos seguintes termos:

    Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em deciso irrecorrvel, no conhecer do recurso extraordinrio, quando a questo constitucional nele versada no oferecer repercusso geral, nos termos deste artigo. (Includo pela Lei n 11.418, de 2006).

    Destaca-se, no citado procedimento, o fato de haver um pinamento, em que se escolhem determinados recursos, para, aps a fixao de um

    4 SIQUEIRA, Alessandro Marques. Estado Democrtico de Direito. Separao de Poderes e Smula

    Vinculante. Em: http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/1861690 Acesso em 28 de abril de 2011.

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    entendimento sobre o tema, aplic-lo a todos os casos semelhantes. E nesse momento que se encontra a principal incongruncia desse instituto, percebida por BAHIA no trecho a seguir:

    Ademais, tal litigiosidade no ser resolvida to-somente com a filtragem dos recursos extraordinrios, eis que tais medidas resolvem, em nosso pas, apenas os problemas da profuso numrica de feitos nos tribunais superiores, mas sem permitir uma resoluo adequada do problema para os cidados, que h muito deixaram, em numerosas situaes, de ser vistos como sujeitos de direitos que clamam por uma aplicao adequada da normatividade e passaram a ser percebidos, de preferncia, como dados numricos nas pesquisas estatsticas de produtividade do sistema judicial. (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 19).

    Disso, vislumbra-se que o Judicirio, como foi proposto nesse trabalho, tem se preocupado mais com a quantidade em detrimento da qualidade (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 22), ou seja, o sistema no tem se preocupado, como deveria, em trazer a pacificao social.

    Outro problema, indicado por BAHIA, est no fato de, ao se escolher determinados processos como processos teste, para se verificando a repercusso geral aplicar o entendimento a casos semelhantes, est-se diminuindo a participao, sem qualquer garantia de que todos os argumentos relevantes para o deslinde da causa, suscitados por todos os interessados, sejam levados em conta no momento da deciso. (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 23).

    Sugere o supracitado autor, que no procedimento de verificao da repercusso geral, o STF no julgar mais (todos) os recursos que lhe forem dirigidos (no julgar mais as causas), mas, sim, o tema (tese) que estiver sendo abordado (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 39), o que se far mediante um pinamento, sem qualquer garantia de que os recursos selecionados sero os mais completos para abarcarem toda a temtica e sem a participao desejada.

    Para quem busca aplicar a experincia do Direito Comparado, em que apenas as questes mais relevantes da sociedade chegam s cortes superiores, BAHIA entende que no se pode aplicar aquela realidade brasileira, primeiro porque, em se tratando das Cortes de Cassao europias, h o chamado mecanismo de reenvio, em que h uma oportunidade de se adequar o entendimento da corte s particularidades do caso concreto, o que no Brasil, como foi mostrado, ainda est numa fase, pode-se dizer, embrionria.

    Um segundo motivo, segundo esse mesmo autor, seria que o Supremo Tribunal Federal e os tribunais superiores brasileiros no so Cortes de

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    Cassao (como os europeus, mas sim, que eles mesmos rejulgam causas, oferecendo (como regra), decises definitivas de mrito.

    Prope o referido autor uma soluo para a situao, sem que o instituto em anlise seja abolido, consistente em, no momento da escolha dos processos que sero objeto da repercusso geral, dar oportunidade aos interessados de participar ativamente dessa escolha e, alm disso, a deciso acerca do reconhecimento ou no da repercusso geral no ser aplicada cegamente pelo tribunal de origem, devendo fazer um conhecimento minucioso de cada caso concreto. (BAHIA; JNIOR; NUNES, 2009, p. 39).

    Entende-se, ento, que da forma com que se vem processando a repercusso geral, conforme foi constatado, no se est buscando a qualidade dos julgamentos, quando no se considera as inerncias de cada caso concreto, quando se diminui a participao na tomada de decises (diminuindo a legitimidade das decises), tudo isso, com o intuito de diminuir a quantidade de processos no Supremo Tribunal Federal, o que no, necessariamente, verificar-se- no Judicirio, como um todo, pois muitos conflitos continuaro sem soluo, o que poder gerar mais demandas para a Justia.

    Aps a anlise dos principais institutos criados, recentemente, no Supremo Tribunal Federal, continuando essa apresentao da poltica de celeridade do Judicirio, ser explanado, a seguir, o instituto dos recursos repetitivos e toda sua repercusso, para os fins a que esse trabalho se destina.

    2.3 Os recursos repetitivos como um falso argumento para desafogar o Judicirio

    Os recursos repetitivos foram disciplinados no Cdigo de Processo Civil, como se verifica a seguir:

    Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idntica questo de direito, o recurso especial ser processado nos termos deste artigo. (Includo pela Lei n 11.672, de 2008).

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    Disso, primeiramente, extrai-se que h dois principais requisitos para que esse procedimento seja adotado: multiplicidade de recursos e fundamento em idntica questo de direito.

    Sobre a primeira condio supracitada, valho-me dos ensinamentos de Ana Helena Machado Costa, em Aspectos Prticos e Polmicos do Julgamento por Amostragem dos Recursos Especiais Repetitivos, entendendo ser a expresso multiplicidade de recursos carente de critrios objetivos que permitam definir quantos recursos sero necessrios para configurar a multiplicidade (COSTA, 2010, p. 71-72), devendo ser aferida pelo intrprete com razoabilidade. (COSTA, 2010, p. 72).

    Quanto ao segundo requisito, COSTA afirma que consiste na anlise da causa de pedir recursal, que deve em todos eles argir a mesma tese jurdica, tal como a ocorrncia de violao a um mesmo dispositivo de lei federal. (COSTA, 2010, p. 72).

    Em se tratando do procedimento, cabe destacar o inciso I, do 7, descrito nos seguintes termos:

    7o Publicado o acrdo do Superior Tribunal de Justia, os recursos especiais sobrestados na origem: (Includo pela Lei n 11.672, de 2008). I - tero seguimento denegado na hiptese de o acrdo recorrido coincidir com a orientao do Superior Tribunal de Justia; ou (Includo pela Lei n 11.672, de 2008).

    Disso pode-se destacar uma incoerncia, que traz tona um problema de competncia, o que COSTA relatou, nos seguintes termos:

    De fato, ao negar seguimento ao recurso especial por se voltar contra deciso que est no mesmo sentido do entendimento proclamado pelo Superior Tribunal de Justia, no est a presidncia do tribunal de origem a reconhecer a ausncia de requisito formal subida do recurso, como ordinariamente lhe compete. (COSTA, 2010, p. 74).

    Continuando sua explanao, COSTA expe que atribuir ao tribunal de origem a incumbncia de, mediante anlise puramente meritria, decidir por fim ao recurso, nos parece implicar em usurpao da referida competncia constitucional. (COSTA, 2010, p. 74).

    Nesse diapaso, perceptvel que, o procedimento supracitado apresenta vcio de competncia, o que deveria acarretar a inconstitucionalidade dessa lei nesse ponto. (COSTA, 2010, p. 76).

    importante ressaltar, segundo COSTA, que a lei que trata do tema enfocado, apesar das estatsticas divulgadas pelo Superior Tribunal de Justia, no

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    trar necessariamente maior celeridade ao Judicirio como um todo, talvez, apenas para essa corte superior (COSTA, 2010, p. 76-77). E, percebendo isso, faz a seguinte observao, in verbis:

    De mais a mais, o retorno dos autos para reapreciao de recurso que j havia sido julgado pelo tribunal de origem, implica em evidente aumento de seu volume de trabalho, alm de representar um retrocesso no andamento do feito, valendo lembrar que, embora a medida possa evitar o processamento do recurso especial interposto, a prolao de uma nova deciso sempre abre caminho interposio de novos recursos, podendo estar sujeita at mesmo a um novo recurso especial. (COSTA, 2010, p. 77).

    Acrescente-se a isso, o fato de tal instituto tambm atentar contra a autoridade das decises proferidas pelos tribunais de origem. (COSTA, 2010, p. 79).

    Dessa abordagem, atentou-se que, apesar de o procedimento dos recursos repetitivos representar uma reduo de processos no mbito do STJ, isso no se verificaria nos tribunais de origem. Alm disso, verificou-se flagrante inconstitucionalidade no procedimento, por vcio de competncia.

    Logo, conclui-se, nesse aspecto, que, alm de diminuir o acesso Justia, no que diz respeito ao Judicirio no conhecer cada processo individualizado, considerando suas particularidades, no significou o instituto em questo, o aumento da celeridade, que foi o argumento utilizado para sua criao, no contribuindo, ento, para o aumento da pacificao social, que o fim que a Justia deveria buscar.

    Passa-se a seguir ao estudo do depsito recursal em Agravo de Instrumento na Justia do Trabalho, buscando-se descobrir o motivo de sua criao, alm de algumas impropriedades.

    2.4 A exigncia de depsito recursal para a interposio de agravo de instrumento no mbito da Justia do Trabalho

    A lei 12275 de 29 de junho de 2010 trouxe para a Justia do Trabalho algumas alteraes, mudando o procedimento de interposio de Agravo de Instrumento. A esse respeito, cabe destacar, para fins desse trabalho, o art. 899,

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    7 da Consolidao das Leis do Trabalho, alterao trazida pelo citado artigo, transcrita, in verbis:

    Art. 899 - 7o No ato de interposio do agravo de instrumento, o depsito recursal corresponder a 50% (cinquenta por cento) do valor do depsito do recurso ao qual se pretende destrancar.

    A despeito de o Tribunal Superior do Trabalho j ter se pronunciado a respeito da natureza jurdica do depsito recursal, no o considerando como uma taxa, algumas consideraes merecem ser apontadas.

    Primeiramente, descrevo abaixo o entendimento do TST acerca desse instituto, mormente, o trecho que abarca o entendimento dessa corte sobre a natureza jurdica desse depsito, in verbis:

    INSTRUO NORMATIVA N. 3 de 1993 Publicada no Dirio de Justia de 10, 12 e 15/03/1993 Interpreta o art. 8 da Lei n. 8542, de 23 . 12 . 92 (DOU de 24 . 12 . 92), que trata do depsito para recurso nas aes na Justia do Trabalho. I - Os depsitos de que trata o art. 40, e seus pargrafos, da Lei n. 8177/91, com a redao dada pelo art. 8 da Lei n. 8542/92, no tm natureza jurdica de taxa de recurso, mas de garantia do juzo recursal, que pressupe deciso condenatria ou executria de obrigao de pagamento em pecnia, com valor lquido ou arbitrado.

    Destaca-se o pargrafo primeiro dessa instruo, que acentua no ser o depsito recursal uma taxa, servindo como uma garantia do juzo, tendo como limites valores estabelecidos pelo Tribunal Superior do Trabalho, no podendo exceder o valor da condenao, o que, no necessariamente, descaracteriza uma limitao ao acesso justia, como se ver.

    O principal argumento, se no o nico, para a exigncia desse depsito para a interposio de Agravo de Instrumento, est na celeridade, como se percebe, nas palavras de Jomara Cad Bessa em Depsito Recursal na Interposio de Agravo de Instrumento na Justia do Trabalho, segundo dados cedidos pelo ento Ministro presidente Milton Moura Frana, a desproporo entre o nmero de Recursos de Revista e de Agravos de Instrumento:

    Segundo dados do Presidente do TST, Ministro Milton de Moura Frana, dos recursos interpostos naquele Tribunal: cerca de 75% so agravos de Instrumento, sendo que, em 2008, houve um aumento desse recurso em 208% - desses, 95% foram julgados desprovidos por no terem apresentado condies mnimas de prosseguimento. (BESSA 2010, p. 14).

    Com a alterao legislativa, foi notria a mudana verificada na Justia do Trabalho, conforme se depreende de notcia, divulgada em 26 de janeiro de 2011, descrita a seguir:

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    Agravos de instrumento: reduo de recursos aps exigncia de depsito Os nmeros so inequvocos: tanto no Tribunal Superior do Trabalho quanto nos Tribunais Regionais do Trabalho, verifica-se uma expressiva reduo na quantidade de agravos de instrumento, desde que passou a ser exigido o recolhimento de depsito para esse tipo de recurso. A movimentao da Justia do Trabalho (TST e TRTs) indica uma reduo de 33.836 processos no segundo semestre de 2010, comparativamente ao primeiro semestre. Apenas no TST, foram 15.570 recursos a menos, enquanto que nos Regionais, a reduo atinge o total de 18.266. Para o presidente do TST, ministro Milton de Moura Frana, os nmeros expressam o acerto da iniciativa em alterar o dispositivo da CLT, para exigir o depsito recursal, em agravo de instrumento na Justia do Trabalho, como pressuposto de sua admissibilidade. O depsito, a cargo do empregador condenado em parcela de natureza pecuniria, corresponde a 50% do valor do recurso que teve denegado seu prosseguimento (Veja os valores). Aprovada em 29 de junho de 2010, a Lei 12.275 entrou em vigor no dia 13 de agosto, e, desde ento, o Tribunal comeou a verificar a tendncia de decrscimo: o nmero de agravos caiu, inicialmente, de 13.290 em julho para 7.938 em agosto e da para frente, a reduo se manteve, at chegar aos 5.348 registrados em dezembro de 2010. O objetivo da lei, aprovada a partir de proposio do TST, impedir o uso abusivo do agravo de instrumento, pois se verificou a utilizao frequente desse recurso com intuitos meramente protelatrios, gerando efeitos perversos tais como o adiamento do pagamento de direitos trabalhistas e a indesejvel sobrecarga dos Tribunais Regionais do Trabalho e, em especial, do TST, na medida em que prejudica o mais rpido julgamento de outros processos. Um dos indicadores desse carter protelatrio o fato de que apenas 5% dos agravos de instrumento so acolhidos.5

    Embora tenha trazido melhorias no que concerne celeridade, que tambm necessria para um amplo acesso justia, a nova medida acabou inibindo, aquele empregador de boa-f, principalmente quando se trata de pequenas e microempresas, que por no disporem de recursos suficientes, podem, muitas vezes, no interpor esse recurso, no tendo a oportunidade de destrancar o recurso outrora interposto.

    Nesse sentido, discorre BESSA, nos seguintes termos:

    Por outro lado, no se deve ignorar que, em nome da maior celeridade soluo dos conflitos laborais e do melhor uso da mquina judiciria, a exigncia de novo depsito recursal pode cercear a defesa do empregador de boa-f que no dispe de recursos para assegurar seu direito de obter novo posicionamento sobre deciso que lhe foi desfavorvel. (BESSA, 2010, p. 14).

    Continuando sua argumentao, o mesmo autor tambm vislumbra um aumento das desigualdades entre empregador e empregado, medida que, alm de o empregador ser o nico obrigado a fazer o depsito, ser agora obrigado a efetuar esse novo depsito para ver reconhecido seu direito. (BESSA 2010, p. 14).

    5 (Disponvel

    em: Acesso em 26 de janeiro de 2011).

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    Refora o argumento, de que apenas o empregador ter o acesso Justia limitado, as palavras de Jos Eduardo Parlato Fonseca Vaz em Comentrios Lei n 12.275/10: Do princpio da Ampla Defesa e da Exigncia do Depsito para a Interposio do Agravo de Instrumento na Justia do Trabalho, em seguida:

    Certamente, a alterao legal no trar prejuzo aos trabalhadores, pois a interposio do agravo de instrumento surge quando o recurso que pretende alterar deciso condenatria nos ttulos trabalhistas em julgamento tem seu seguimento negado, logo, apenas o empregador ter que efetuar o recolhimento de 50% do valor do depsito recursal, pois a exigncia ocorre apenas quando houver condenao em parcela de natureza pecuniria. (BESSA, 201, p. 14).

    Sob outro enfoque, VAZ entende que a nova exigncia no desestimular a interposio de recursos protelatrios pelas grandes empresas, in verbis:

    Certamente, a pretenso do legislador de desestimular a interposio de recursos protelatrios no alcanar as empresas de mdio e grande porte, que detm condies financeiras favorveis, podendo dispor do valor para realizao do depsito de 50% do valor recursal. (VAZ, 2010, p. 15).

    Alm disso, a nova medida representaria uma afronta aos princpios constitucionais da ampla defesa e do acesso Justia, conforme se depreende da argumentao de VAZ, transcrita abaixo:

    Ademais, a nova regra do art. 897 e 899 da CLT tambm far com que as empresas com recursos escassos no tenham condies de amplamente se defenderem, pois, por no disporem da quantia para o recolhimento de 50% do valor do depsito recursal, ficaro impedidas de utilizar o recurso de agravo de instrumento. A alterao legislativa conflita tambm com a garantia constitucional de acesso Justia (art. 5, inciso XXXV, da CF), que determina que a lei no excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa a direito, fato que ocorrer com a obrigao do recolhimento de valores para interposio do agravo de instrumento no processo do trabalho, pois, (...), 44% das contrataes formais efetivada por pequenas ou microempresas, que no mais podero interpor o recurso de agravo em face da onerosidade da prtica do ato. (VAZ, 2010, p. 15).

    No mesmo sentido, Kiyoshi Harada, em Agravo de Instrumento Nova Lei do Agravo na Justia do Trabalho Agrava a Inscontitucionalidade, in verbis:

    No h dvida que esse novo empecilho ao exerccio do direito de recorrer, a pretexto de destravar o recurso indeferido, agrava a inconstitucionalidade existente, pois fere profundamente os princpios constitucionais do devido processo legal e do contraditrio e ampla defesa previstos, respectivamente nos incisos LIV e LV do art. 5 da CF. (HARADA, 2010 p. 44).

    Como soluo, para amenizar um pouco essa nova situao criada, VAZ prope, apesar de no solucionar os verdadeiros problemas estruturais do Judicirio, ser deferido o benefcio da gratuidade judicial pessoa jurdica, desde

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    que demonstrada a insuficincia de recursos para o pagamento dos encargos do processo (VAZ, 2010, p. 16), o que acaba possibilitando um acesso Justia mais igualitrio aos empregadores em geral.

    Pelo que foi exposto, foi possvel perceber que o Judicirio, dessa vez na Justia do Trabalho, se valeu de mais uma medida para dar maior celeridade ao processo, mas que trouxe consigo uma limitao ao acesso Justia, quando acaba inibindo o empregador de boa-f e com insuficincia de recursos a usar a medida para destrancar seu recurso, cujo seguimento foi negado.

    No podendo ter sua pretenso apreciada plenamente, o Judicirio no exerce sua funo adequadamente, qual seja, pacificar os conflitos. Certamente, novas demandas sero geradas em decorrncia de um conflito mal solucionado, por cerceamento de defesa.

    Entende-se que, com essa breve explanao, foi possvel trazer tona a realidade que a Justia brasileira tem passado. No difcil se verificar a priorizao da celeridade, tanto no campo legislativo, com a criao dos institutos abordados, quanto na esfera administrativa, tendo o Conselho Nacional de Justia como principal agente modificador.

    Aps a exposio do problema feita nesse captulo, qual seja, busca desenfreada pela celeridade processual e a conceituao realizada no primeiro captulo, que viabiliza as mudanas necessrias ao Judicirio, em seguida ser proposta uma soluo, que, ao mesmo tempo considere tanto a celeridade, quanto a pacificao social.

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    3 A NECESSIDADE DE ADEQUAO DA CONTROVRSIA AO MTODO DE RESOLUO DE CONFLITOS

    3.1 Conceitos, vantagens e desvantagens dos principais meios de resoluo de conflitos

    O processo judicial, historicamente, baseando-se em uma idia fechada de jurisdio, deu ao Estado o monoplio, no que concerne resoluo de conflitos. Os anos foram passando, as relaes sociais tornaram-se mais complexas e, rapidamente, percebeu-se que esse modelo tradicional no conseguiria mais dar respostas adequadas para toda a gama de conflitos que surgiriam.

    Como alternativa a essa crise que o Judicirio estava vivenciando, mtodos alternativos foram surgindo para dar melhores solues para os diversos problemas que apareciam. Nesse sentido, podem-se destacar os seguintes mtodos, sem, no entanto, excluir o procedimento jurdico-tradicional: arbitragem, negociao, mediao, conciliao e avaliao preliminar neutra.

    Comparando a arbitragem, o processo judicial e a conciliao, Ivan Machado Barbosa em Frum de Mltiplas Portas: Uma Proposta de Aprimoramento Processual, faz a seguinte considerao inicial:

    Assim, do mesmo modo que o mtodo jurdico-tradicional extremamente eficaz para responder questes que se refiram aos direitos indisponveis ou em que haja desequilbrio de poder entre as partes, a conciliao capaz de trabalhar eficazmente matrias emocionais e a arbitragem de um especialista solucionaria questes tcnicas corretamente. (BARBOSA, 2003, p. 249).

    O procedimento jurdico tradicional bem definido pelo supracitado autor, segundo o qual, um representante do Estado, aps oferecer s partes a possibilidade de se manifestarem de acordo com o devido processo legal e segundo regras do contraditrio, decide a causa de maneira imperativa (...). (BARBOSA, 2003, p. 251).

    Sobre esse aspecto, BARBOSA entende que esse procedimento seria vantajoso nos conflitos que tivessem a necessidade da imputao de uma sano, quando as partes no conseguem negociar de forma eficaz ou uma das

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    partes recusa a negociao, quando h questes que envolvem polticas pblicas, dentre outros. (BARBOSA, 2003, p. 251).

    Quanto s desvantagens, BARBOSA acentua que o processo judicial no capaz de conhecer de questes emocionais, alm disso, o juiz no conhece todos os ramos do conhecimento e, muitas vezes, no oferece proteo adequada aos juridicamente mais fracos. (BARBOSA, 2003, p. 249).

    Outros pontos negativos do processo judicial so relatados por Fbio Portela Lopes de Almeida em A Teoria do Jogos: Uma Fundamentao Terica dos Mtodos de Resoluo de Disputa, ao dizer que no de se surpreender o fato de que, no mnimo, uma das partes a derrotada se decepcione com o poder judicirio, podendo ocorrer essa decepo, tambm, com a parte vitoriosa, em decorrncia da morosidade processual ou pela insatisfao com o resultado. (ALMEIDA, 2003, p. 190).

    Acrescenta LOPES que o processo judicial no leva em considerao eventuais conflitos que possam surgir aps o trnsito em julgado da sentena, que, normalmente, no resolve o conflito pacificando os envolvidos, mas apenas solidifica uma soluo judicial. (ALMEIDA, 2003, p. 190).

    Numa reflexo inicial, j possvel perceber que o mtodo jurdico-tradicional no adequado para diversas situaes e, para isso, surgem meios alternativos, que conseguiro trazer maior pacificao social de acordo com o caso concreto apresentado, conforme se ver a seguir.

    O primeiro mtodo alternativo a ser analisado ser a arbitragem. Segundo conceituao apresentada por Ivan Machado Barbosa, a arbitragem o meio extrajudicial de resoluo de controvrsias no qual as partes outorgam a um terceiro, neutro e imparcial, o poder de decidir de maneira coercitiva problemas j surgidos ou que possam surgir de uma determinada relao jurdica. (GOERDT apud BARBOSA 2003, p. 253).

    Como aspecto positivo, ALMEIDA, visualiza na arbitragem a possibilidade de uma maior cooperao entre as partes, primeiramente, porque so elas que custeiam todo o procedimento, sendo na maioria das vezes valores altos. Alm disso, so as partes que se comprometem a submeter a causa a um terceiro, escolhido por elas. (ALMEIDA, 2003, p. 191) Dessa forma, h uma maior legitimidade desse processo, por aumentar a participao, o que poder propiciar solues mais adequadas, quando bem utilizado.

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    Outra caracterstica que torna esse procedimento vantajoso o fato de que ele possibilita uma deciso em que ambas as partes podem sair ganhando, o que, como j foi salientado, no ocorre no processo judicial.

    Outros pontos que podem ser destacados so as partes poderem escolher um especialista para apreciar a questo (BARBOSA, 2003, p. 253), a celeridade do processo em relao ao jurdico-tradicional, a informalidade e flexibilizao dos procedimentos, o maior controle das partes sobre o processo, a confidencialidade do processo, etc. (BARBOSA, 2003, p. 254).

    Por fim, um ltimo ponto positivo pode ser destacado, pois a arbitragem bastante interessante para tratar de questes comerciais, quando as partes pretendem continuar negociando, aps a resoluo do conflito, o que mostra ser esse procedimento mais adequado para possibilitar a manuteno das relaes.

    Como nica desvantagem desse mtodo seria seu alto custo, possibilitando sua utilizao, apenas, para partes hipersuficientes (ALMEIDA, 2003, p. 191), o que, quando comparado com a lentido do processo judicial, pode representar at uma vantagem.

    Quanto mediao e a conciliao, o prximo tpico abarcar o assunto, expondo uma diferenciao entre ambos os mtodos e apontando a mediao como o mais adequado, na maioria das vezes.

    No que diz respeito negociao, ALMEIDA define ela como a forma mais comum de resoluo de controvrsias, j que a mais informal e faz parte do cotidiano (ALMEIDA, 2003, p. 194), alm disso, afirma que nela as partes propem alternativas e solues, defendendo, sem a interveno de terceiros (mediador, rbitro ou juiz), seus interesses pessoais. (ALMEIDA, 2003, p. 194).

    Como j foi dito, a informalidade trao caracterstico desse mtodo, o que observado no total controle que as partes possuem do resultado, na liberdade de escolha do procedimento e no embasamento das decises, que no se submete a nenhuma legislao ou regra. (ALMEIDA, 2003, p. 194).

    ALMEIDA aponta algumas vantagens, fazendo isso nas seguintes palavras:

    A negociao tem vrias vantagens: possui baixo custo operacional, j que normalmente no se contrata nenhum profissional para conduzir o processo (...) e h a possibilidade de solues criativas e desnecessidade de pautar as ofertas em parmetros legais. Alm disso, o relacionamento entre as partes aps uma negociao bem feita tende a melhorar. (ALMEIDA, 2003, p. 195).

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    A negociao adequada at o momento em que as partes conseguem, por elas mesmas, chegar a um acordo construtivo. A partir do momento que isso no se torna possvel, pode-se valer de um terceiro para facilitar a resoluo do conflito, o que pode ser feito por meio da mediao, da conciliao e da arbitragem e, em casos excepcionais, o procedimento jurdico-tradicional tambm ganha destaque.

    Por fim, apresenta-se a avaliao preliminar neutra, que pode ser empregada, tambm, em associao com outros mtodos, sendo bastante vantajosa, conforme BARBOSA, (...) em causas de pequeno valor em que no h advogados e em que haja divergncia quanto matria de direito. (BARBOSA, 2003, p. 255).

    importante destacar o trecho abaixo, retirado da obra de BARBOSA, que define bem esse instituto, alm de destacar sua utilidade:

    Em outras palavras, oferece-se s partes uma avaliao do caso mediante uma opinio fundamentada, oral e no-obrigatria (no sentido que no so compelidas a segui-la) de um avaliador neutro e experiente. Aps esta informao, as partes retornam negociao, orientadas agora por uma opinio especializada. Se a controvrsia no solucionada, a avaliao mantida em confidencialidade e o avaliador pode auxiliar as partes a lograr o procedimento mais simples e rpido no tribunal. (BARBOSA, 2003, p. 255).

    Ser percebido, quando se fizer a comparao entre a mediao e a conciliao, que, essa avaliao preliminar neutra, aproxima-se mais da conciliao, medida que, o terceiro facilitador, acaba emitindo opinio, no se preocupando somente com os aspectos formais do procedimento, como se ver a seguir.

    3.1.1 A mediao como a tcnica mais adequada em detrimento da conciliao judicial

    Em se tratando desse tema, apresento as consideraes relatadas pela autora Tania Almeida em Mediao e conciliao: dois paradigmas distintos, duas prticas diversas, em que aponta as principais diferenas entre os dois institutos, mostrando ser a mediao mais adequada aos ideais de pacificao social e acesso Justia, quando comparada conciliao.

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    Para tanto, so enumeradas dez distines, que sero citadas e explicadas a seguir.

    Primeiramente, a autora relata o fato de na conciliao ser visada a construo de acordos, enquanto que na mediao privilegia-se a desconstruo de conflitos. (ALMEIDA, 2009, p. 94).

    Sobre isso, ALMEIDA afirma que a base da pacificao social reside no restauro da relao social e na desconstruo do conflito entre litigantes (ALMEIDA, 2009, p. 94) e, em sentido contrrio, a permanncia do conflito possibilita a construo de novos desentendimentos ou de novos litgios (ALMEIDA, 2009, p. 94), o que acaba gerando novas demandas ao Judicirio.

    Nesse sentido, a mediao seria ideal para desavenas, em que a relao ser duradoura, o que ocorre, principalmente entre familiares e vizinhos (ALMEIDA, 2009, p. 95), o que no significa que ela tambm no possa ser usada para outros vnculos.

    A segunda distino, listada por ALMEIDA, decorre da situao em que na conciliao se busca mais a satisfao individual, quando na mediao buscada a satisfao mtua. (ALMEIDA, 2009, p. 95).

    Nessa tica, ao tratar da conciliao, a autora supracitada discorre:

    A conciliao guarda ainda uma sintonia com o paradigma adversarial que rege toda disputa, recebendo partes voltadas a encontrar uma soluo que melhor as atenda, sem se importar ou, ao menos, considerar o nvel de satisfao que o outro lado venha a ter. (ALMEIDA, 2009, p. 95).

    Percebe-se, ento, que a mediao ideal para trazer a efetiva soluo do conflito, pois levar em considerao todos os interesses envolvidos na controvrsia.

    Uma terceira distino, explanada por Tania Almeida, consiste em a repercusso das solues se d sobre si mesmos na conciliao e, na mediao, haver uma preocupao com terceiros. Nesse aspecto, a autora destaca a importncia de se considerar as redes sociais, pois, muitas vezes so atingidas pela soluo do conflito, o que, se no for devidamente vislumbrado, pode ocasionar insatisfaes, que refletem a inadequao do desfecho do conflito. (ALMEIDA, 2009, p. 96).

    Outra diferena entre os dois institutos est no fato de na mediao haver a tentativa de as partes buscarem a soluo entre elas, sem a co-participao

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    do mediador, o que ocorre, frequentemente na conciliao, em que o conciliador, muitas vezes, oferece sugestes e propostas de acordo. (ALMEIDA, 2009, p. 96).

    Em outras palavras a mediao distancia-se do modelo paternalista(...) e procura restaurar a capacidade de autoria das partes na soluo de seus conflitos (ALMEIDA, 2009, p. 96-97), ampliando o acesso Justia, ao trazer maior incluso e participao das partes na deciso.

    Um quinto trao diferenciador decorre de na conciliao ser utilizado um atendimento monodisciplinar, ao passo que na mediao h a proposta de uma abordagem multidisciplinar, em que se convida os mediadores a atuarem regidos por uma lente multifocal que viabilize reconhecer e articular os diversos fatores sociais, emocionais, legais, financeiros, entre outros que componham as desavenas. (ALMEIDA, 2009, p. 97).

    Isso no se verifica na conciliao, em que, na maioria das vezes, o conciliador possui formao na rea de Direito, fazendo a anlise do conflito ser monodisciplinar. (ALMEIDA, 2009, p. 97).

    O sexto aspecto foi apresentado por ALMEIDA, nos seguintes termos: O presente e a culpa focados na conciliao; o futuro e a responsabilidade social objetivados pela mediao. (ALMEIDA, 2009, p. 98).

    Nesse diapaso, a mediao traz tona uma idia que busca eliminar as concepes de correto e incorreto, autor e ru, centradas na punio e na adversariedade, alm de ter uma soluo voltada para o futuro, o que fomenta a pacificao social. (ALMEIDA, 2009, p 98).

    A stima diferena ocorre quando se vislumbra que, na conciliao, se privilegia a pauta objetiva a matria, a substncia que o conflito entre elas produziu. (ALMEIDA, 2009, p. 98). J a mediao se preocupa em cuidar da substncia e do cenrio que motivou o desentendimento, da matria e da relao entre as partes (...). (ALMEIDA, 2009. p. 98).

    Outra distino est em ser a conciliao, por estar inclusa no processo judicial, caracterizada pela publicidade e a mediao pela confidencialidade. (ALMEIDA, 2009, p. 99).

    A confidencialidade, nas palavras utilizadas por ALMEIDA, no s favorece o desnudamento necessrio s negociaes e s conversas pautadas pela boa-f como permite que pessoa fsicas e jurdicas sejam preservadas em razo do sigilo. (ALMEIDA, 2009, p. 99). A publicidade, muitas vezes, acaba sendo

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    prejudicial para a manuteno das relaes sociais e empresariais entre as partes (ALMEIDA, 2009, p. 99), o que traz a necessidade de se remodelar o princpio constitucional da publicidade.

    A penltima diferena relativa aos pareceres tcnicos. Decorrente do papel ativo das partes na soluo da controvrsia, verificada na mediao, a interlocuo com os tcnicos de qualquer natureza advogados, contadores e demais especialistas feita pelas partes e no pelo mediador. (ALMEIDA, 2009, p. 100). Dessa forma, pautando-se nesse ideal da soluo ser realizada pelas partes, o mediador nem poderia emitir opinio tcnica, por mais que fosse da rea de sua especialidade (ALMEIDA, 2009, p. 99).

    Por fim, a conciliao difere da mediao no que diz respeito ao papel dos advogados. Para que todas as caractersticas definidoras da mediao sejam possveis necessrio que o advogado tenha uma atuao diferente. Assim, cita-se o seguinte trecho, que mostra o novo atuar do advogado:

    Para manter coerncia com essa proposta, os advogados passam de defensores a assessores legais de seus clientes, oferecendo os parmetros jurdicos para aquilo que est sendo negociado. Eles tambm atuam como assessores tcnicos no auxlio da escolha do mediador no mbito privado; e como consultores, na identificao dos interesses e necessidades da outra parte, visando propor solues de benefcio e satisfao mtuos. (ALMEIDA, 2009, p. 99).

    Em suma, a mediao, diante de tudo que foi exposto, mostra-se como um instituto mais adequado ao iderio de pacificao social, devendo ser incentivada para, aos poucos, substituir a conciliao.

    3.2 O frum de mltiplas portas como o modelo que consegue adequar o conflito ao melhor meio de pacificao social

    O frum de mltiplas portas pode ser considerado um mtodo de adequao, pois consegue considerar as particularidades do caso concreto para buscar uma soluo que traga mais pacificao social.

    A base terica para a institucionalizao desse modelo foi apresentada no decorrer do trabalho, quando se percebeu a necessidade de uma resignificao da jurisdio, a delineao do objetivo do Direito como a busca da pacificao social e o esforo para se ampliar cada vez mais o acesso Justia.

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    Como no poderia ser diferente, apenas nesse cenrio o frum de mltiplas portas seria possvel, como se ver. Alm disso, a crise do Judicirio acaba tornando imprescindvel a busca de alternativas e esse frum mostra-se bastante adequado para o alcance da legitimidade das decises judiciais.

    Em poucas palavras Ivan Machado Barbosa, define e caracteriza o instituto em questo, in verbis:

    O frum de mltiplas portas ser descrito como um mecanismo que busca selecionar e encaminhar as disputas para diversos mtodos de resoluo de conflitos e que possui a importante vantagem de poder adaptar amplamente o procedimento ao tipo de controvrsia. Essa adaptao permite utilizar o procedimento mais adequado para a resoluo das controvrsias, evitando assim que as desvantagens de meios resolutrios menos adequados, ao mesmo tempo em que aproveita totalmente as qualidades do mtodo apropriado. (BARBOSA, 2003, p. 244).

    Em outros termos, o mesmo autor afirma que o frum de mltiplas portas trata-se de um mecanismo no qual os conflitos que chegam ao Judicirio so encaminhados para o mtodo de disputa mais indicado para solucionar a lide (GODBERG apud BARBOSA, 2003, p. 248), tendo como caracterstica fundamental a sua fase inicial, no qual cada disputa analisada de acordo com diversos critrios e encaminhada para o procedimento mais adequado (BARBOSA, 2003, p. 248), para ento, ser tratado conforme o processo indicado. (BARBOSA, 2003, p. 248).

    O pressuposto desse modelo, conforme BARBOSA, est na percepo de haver vantagens e desvantagens em cada mtodo de resoluo de disputas e, de que o mtodo jurdico-tradicional no consegue solucionar todos os conflitos da melhor forma possvel. (GOLDBERG apud BARBOSA, 2003, p. 249). Logo, o frum busca maximizar as qualidades positivas de cada mtodo, pois possibilita, em muitos casos, at a reunio de vrios meios para se alcanar uma soluo mais efetiva.

    Cabe salientar a definio de soluo adequada, para que a presente abordagem se torne mais precisa, o que feito por BARBOSA (apud URY, 1993, pp. 11-13), nos seguintes termos:

    A soluo mais adequada para controvrsias aquela que combina menores custos financeiros e emocionais, efeitos positivos para o relacionamento no qual surgiu a controvrsia, maior satisfao das partes com os resultados (incluindo aqui a satisfao dos interesses e a percepo de justia na composio da lide) e ademais impede o reaparecimento da questo, isto , assegura a durabilidade da soluo e a capacidade de evitar que a mesma controvrsia surja entre outras pessoas do mesmo meio. (BARBOSA, 2003, p. 249).

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    Quanto aos procedimentos a serem utilizados, BARBOSA acentua que no h uma determinao de quais poderiam ser usados, podendo outros mtodos ser criados e utilizados com ligeiras adaptaes (BARBOSA, 2003, p. 250), alm dos j apresentados em abordagem anterior.

    Ademais, o mesmo autor acentua que a deciso de quais mtodos devem ser utilizados em um frum de mltiplas portas depende da cultura, do direito local e da disponibilidade material. (BARBOSA, 2003, p. 255).

    Quanto ao funcionamento, BARBOSA sintetiza as diversas formas que esse instituto pode se apresentar, o que no significa que outras maneiras no possam ser aceitas, nas seguintes palavras:

    Salientamos sua flexibilidade, que permite a sua aplicao de diferentes maneiras, seja de modo compulsrio ou voluntrio, com muitos ou poucos mtodos oferecidos, com encaminhamento caso-a-caso ou por categoria de controvrsia ou, ainda, com a seleo do procedimento realizada pelo juiz, pelas prprias partes ou por funcionrios do tribunal. (BARBOSA, 2003, p. 261).

    Em suma, foi apresentado o frum de mltiplas portas, como um procedimento que poderia, se fosse mais difundido, solucionar a crise do Judicirio, trazendo mais celeridade ao processo, ao mesmo tempo em que, aumentaria a possibilidade de gerar maior pacificao social na sociedade.

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    CONCLUSO

    Entende-se que a presente pesquisa conseguiu demonstrar a situao de crise, que passa o Judicirio brasileiro, ao mesmo tempo que mostrou as deficincias das principais solues que se tem dado, principalmente, o elevado tratamento que a celeridade processual tem recebido.

    Para se alcanar esse mpeto, buscou-se, num primeiro momento, definir os conceitos de pacificao social, acesso Justia e jurisdio. Nessa ocasio, em se tratando do acesso Justia, importante destacar que, para que seja completo, necessita, alm da possibilidade do ingresso em juzo, tambm, uma deciso justa, em outras palavras, que traga maior pacificao social.

    Ademais, como se verificou, deve-se buscar, como objetivo do Direito, a pacificao social e, para isso, deve-se insentivar decises pautadas em uma perspectiva constutiva do processo.

    No que diz respeito conceituao dada jurisdio, argumentou-se pela ampliao da noo clssica, centrada no Estado, para um padro que propicie o aumento da participao e do dilogo, o que, nos meios alternativos de resoluo de conflitos, tudo isso poderia ser possvel.

    Quanto s principais alteraes legislativas realizadas na Justia, percebeu-se que as smulas vinculantes, criadas para tornar o Judicirio mais clere, possuem algumas inconsistncias, tais como a violao dos princpios do acesso Jurisdio, da ampla defesa, do juiz natural e da separao de poderes.

    Quanto ao instituto da repercusso geral, constatou-se, mormente, que ele no considera as particularidades da cada caso concreto, no possibilitando, dessa forma, o aumento da participao e do dilogo, o que prejudicial para uma efetiva deciso judicial.

    J, quanto lei que disciplinou os recursos repetitivos, foi vislumbrado, assim como na repercusso geral, a no considerao das particularidades de cada caso concreto, alm de no ter representado, maior celeridade, quando se considera o Judicirio como um todo.

    Acrescenta-se, a lei que criou a exigncia de depsito recursal para a interposio de Agravo de Instrumento. Quanto a isso, notou-se que aquele

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    empregador de boa-f, com insuficincia de recursos, acabar saindo prejudicado com essa medida, enquanto que, grandes empresas continuaro interpondo recursos com carter protelatrio, pois no servir essa mudana para inibir essa atitude.

    Indicando-se uma possvel soluo, foram apresentados os principais mtodos de resoluo de conflitos, atentando-se para suas particularidades e destacando-se as vantagens e desvantagens de cada um em relao aos diferentes tipos de controvrsias.

    Alm disso, dedicou-se ateno para a diferenciao entre os institutos da mediao e conciliao, indicando-se, dez diferenciaes, aproveitando-se os ensinamentos de Tania Almeida. Ao final dessa comparao, entendeu-se que a mediao mais adequada para o alcance dos ideais de pacificao social e acesso Justia.

    Por fim, foi introduzido o frum de mltiplas portas, como o modelo que conseguiria conciliar a celeridade da prestao jurisdicional e o ideal de pacificao social, pois, como foi demonstrado, esse frum propicia uma ampla variedade de mtodos, escolhendo-se aquele mais apropriado ao conflito apresentado.

    Nesse diapaso, a celeridade alcanada medida que a sociedade passa a ser mais pacificada, pois os conflitos passam a ser solucionados em uma perspectiva construtiva, voltada para o futuro, no se limitando mais o Judicirio a dar apenas uma deciso, que se cristaliza com a coisa julgada, mas que no considera outros aspectos do conflito.

    Assim, o Judicirio no ser mais demandado por situaes em que o conflito foi mal resolvido, podendo se ater a novos casos, que, por sua medida, sero tambm solucionados mais adequadamente, quando se pautar nessa lgica traada nesse trabalho.

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