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A droga, o tráfico e a lavagem do dinheiro Andreu Camps Em 24 de fevereiro de 1995, a imprensa espanhola publicou a notícia que o Tribunal de Justiça da União Européia decidiu que a lei sobre o controle de trocas na Espanha era contraditória com a diretriz da própria União Européia – UE, que liberalizava o movimento de capitais. Essa lei autorizava a sair da Espanha até 40 mil dólares sem autorização prévia. A diretriz européia ‘Liberaliza” o montante das somas que podem sair sem controle representa, sem dúvida, uma arma temível para facilitar a lavagem de dinheiro da droga e da fraude. Esta decisão do Tribunal de Justiça europeu foi tomada no momento em que os antigos responsáveis pela luta anti-terrorista na Espanha, responsabilizados por terem constituído os GAL 1 são acusados de terem enviado clandestinamente à Suíça cerca de 1,6 milhão de dólares para pagar seus capangas. A sentença do tribunal europeu reduz a nada as conseqüências penais da lei que eles transgrediram. Este episódio mostra de uma maneira exemplar a ligação existente entre a “liberalização” do sistema financeiro e a multiplicação de toda ordem de delitos de lavagem de dinheiro “sujo” e fraudes. Essa relação entre o funcionamento do sistema financeiro internacional, o tráfico e a lavagem de dinheiro da droga está no centro do problema da droga que se tenta apresentar como sendo uma questão entre os que defendem a legalização (em diferentes níveis ou completamente) e os que defendem sua proibição. Existe um ponto comum entre os porta-vozes desta cruzada moderna: trata-se de retirar a responsabilidade maior que o sistema financeiro internacional, e portanto os diferentes governos, têm no desenvolvimento deste tráfico que tomou proporções monstruosas. Esse tráfico está na origem de inúmeras tragédias para setores inteiros da população submetidos ao seu flagelo, enquanto os diferentes governos utilizam politicamente e tiram proveito financeiro. A Extensão do Tráfico O tráfico da droga, nas suas diversas formas, representa anualmente centenas de bilhões de dólares. Segundo um estudo da ONU, a droga movimentou 300 bilhões de dólares em 1991. Para a Interpol , esta soma poderia chegar a 500 bilhões de dólares. Em julho de 1989, a cúpula dos sete países mais ricos do mundo, o G7 2 , núcleo dirigente do FMI, sob a liderança dos EUA, decidiu pela criação do GAFI (grupo de ação financeira internacional). Este organismo foi encarregado de lutar contra a lavagem de dinheiro sujo. As orientações do GAFI destinavam-se a dotar todos os países de legislações específicas para tentar controlar a lavagem de dinheiro proveniente do tráfico. Mais de cem países modificaram sua legislação até esta data… E entretanto o tráfico não pára de crescer. Desde janeiro de 1993 uma diretriz européia obriga todos os países membros da comunidade a fazer com que seus bancos denunciem as transações suspeitas e a considerarem como um crime a lavagem do dinheiro da droga.” 3 Isso não impede a União Européia de ser, depois dos EUA, o segundo maior consumidor de drogas e na lavagem de dinheiro sujo.

A Droga o Trc3a1fico e a Lavagem Do Dinheiro

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  • A droga, o trfico e a lavagem do dinheiroAndreu Camps

    Em 24 de fevereiro de 1995, a imprensa espanhola publicou a notcia que o Tribunal deJustia da Unio Europia decidiu que a lei sobre o controle de trocas na Espanha eracontraditria com a diretriz da prpria Unio Europia UE, que liberalizava omovimento de capitais.

    Essa lei autorizava a sair da Espanha at 40 mil dlares sem autorizao prvia. A diretrizeuropia Liberaliza o montante das somas que podem sair sem controle representa,sem dvida, uma arma temvel para facilitar a lavagem de dinheiro da droga e da fraude.Esta deciso do Tribunal de Justia europeu foi tomada no momento em que os antigosresponsveis pela luta anti-terrorista na Espanha, responsabilizados por teremconstitudo os GAL1 so acusados de terem enviado clandestinamente Sua cerca de1,6 milho de dlares para pagar seus capangas. A sentena do tribunal europeu reduz anada as conseqncias penais da lei que eles transgrediram. Este episdio mostra deuma maneira exemplar a ligao existente entre a liberalizao do sistema financeiro ea multiplicao de toda ordem de delitos de lavagem de dinheiro sujo e fraudes.

    Essa relao entre o funcionamento do sistema financeiro internacional, o trfico e alavagem de dinheiro da droga est no centro do problema da droga que se tentaapresentar como sendo uma questo entre os que defendem a legalizao (emdiferentes nveis ou completamente) e os que defendem sua proibio. Existe um pontocomum entre os porta-vozes desta cruzada moderna: trata-se de retirar aresponsabilidade maior que o sistema financeiro internacional, e portanto os diferentesgovernos, tm no desenvolvimento deste trfico que tomou propores monstruosas.Esse trfico est na origem de inmeras tragdias para setores inteiros da populaosubmetidos ao seu flagelo, enquanto os diferentes governos utilizam politicamente etiram proveito financeiro.

    A Extenso do TrficoO trfico da droga, nas suas diversas formas, representa anualmente centenas debilhes de dlares. Segundo um estudo da ONU, a droga movimentou 300 bilhes dedlares em 1991. Para a Interpol, esta soma poderia chegar a 500 bilhes de dlares.

    Em julho de 1989, a cpula dos sete pases mais ricos do mundo, o G72, ncleo dirigentedo FMI, sob a liderana dos EUA, decidiu pela criao do GAFI (grupo de ao financeirainternacional). Este organismo foi encarregado de lutar contra a lavagem de dinheirosujo.

    As orientaes do GAFI destinavam-se a dotar todos os pases de legislaes especficaspara tentar controlar a lavagem de dinheiro proveniente do trfico. Mais de cem pasesmodificaram sua legislao at esta data E entretanto o trfico no pra de crescer.

    Desde janeiro de 1993 uma diretriz europia obriga todos os pases membros dacomunidade a fazer com que seus bancos denunciem as transaes suspeitas e aconsiderarem como um crime a lavagem do dinheiro da droga.3Isso no impede a UnioEuropia de ser, depois dos EUA, o segundo maior consumidor de drogas e na lavagemde dinheiro sujo.

  • Os Estados Narco-TraficantesA extenso do trfico joga por terra a idia de que esse comrcio possa ser organizadopor bandos, por mais poderosos que eles sejam. Os maiores organizadores do trfico soEstados que contam com poderosos apoios eem particular, os que contam com o apoiodos EUA.

    preciso lembrar o caso de certos pases que ocupam um lugar de destaque nessedispositivo, e em primeiro lugar o caso do Peru.

    A) Peru o exrcito, ponta de lana do trfico

    Em nome do combate guerrilha, o exrcito peruano ocupou um lugar central no pas.Depois do golpe de Estado de Fujimori em abril de 1992, este papel maior edeterminante. Isto no impede o governo de adotar leis contra o lavagem de dinheiro dadroga. Assim o jornal La Republica, de 25 de maio de 1993, afirmava: A lei jamais foiaplicada e ningum, nunca foi preso por lavagem de dinheiro da droga. Contudo, e aosolhos de todos, bilhes por ano so injetados na economia peruana, provenientes dadroga. Nas ruas de Lima se trocam diariamente alguns milhes de dlares. o ltimo elode uma cadeia que comea na regio do alto Huallaga, a grande regio de produo dadroga.

    Segundo o Despacho Internacional das Drogas n18, o exrcito havia reagrupadoquinze organizaes de traficantes para que as taxas pagas guerrilha fossem agorarecebidas pelos militares. Esta frao do exrcito implicada no trfico de drogas deusustentao a Fujimori, desde o golpe militar de abril de 1992. Assim, um antigo agenteda CIA, Vladimir Montesinos, conselheiro de Fujimori, colocou no centro deste golpemilitar, em postos da polcia e do exrcito, oficiais ligados ao narcotrfico.

    B) O bom aluno do FMI: O Mxico

    O Mxico, depois da crise da dvida em agosto de 82, foi apresentado como um pasexemplar na aplicao dos planos do FMI.

    Desde a entrada em vigor do NAFTA4 nova crise financeira do final de 1994, que levou desvalorizao de mais de 40% do peso, o Mxico viu eclodirem todas as crisespossveis para um regime velho de sessenta e cinco anos. um pas chave para os EUAque consideram sua estabilidade como um problema interno do imperialismo americano,e que fizeram do regime do partido-Estado, o PRI (partido revolucionrio institucional),um aliado de primeira ordem. Isto permitiu ao PRI fazer um acordo tcito com ostraficantes de droga que controlam a maior parte do maior mercado do mundo, o dosEUA.

    Estamos diante de uma verdadeira lio sobre a economia da droga. Em primeiro lugarpela situao geogrfica privilegiada do Mxico em relao aos EUA.

    Em segundo lugar, existe o esfacelamento das instituies polticas do Mxico,particularmente aps a fraude eleitoral de julho de 1988, quando da eleio de Salinas.Seu governo acelerou todas as medidas de privatizao e de submisso aos EstadosUnidos, facilitando a emergncia de poderosos cartis da droga (se contam 197 em1995). O mais importante desses cartis o cartel do Golfo, ou o de Matamoros.

    Recentemente, o ex-presidente Salinas admitiu que o trfico de cocana e de outrasdrogas ilegais representava uma cifra prxima de 100 bilhes de dlares anuais. O DEA(agncia de combate s drogas dos EUA) e fontes de informao locais como o jornal deoposio La Jornadaestimam que este trfico represente entre 25 e 30 bilhes de dlarespor ano (5).

  • Isso o dobro das receitas da indstria de petrleo mexicano, equivale ao custo total doservio da dvida externa do pas em 1994. Sobre a dvida externa preciso dizer que erade 80 bilhes de dlares em 1982, e hoje, depois de todos os planos de ajuste, dereescalonamento e do desembolso de 100 bilhes de dlares, o Mxico deve apenas160 bilhes de dlares.

    Mas preciso ainda explicar como o trfico de drogas alcanou esta importncia. Aps acrise de 1982, o Mxico no tinha acesso a emprstimos externos e o governo da pocapermitiu a lavagem em contas abertas nos bancos nacionalizados.

    Com o NAFTA, o trfico e todas as operaes de lavagem se desenvolveram ainda mais.Na realidade, a cocana e as outras drogas so os produtos mais competitivos diante dainvaso de mercadorias provenientes dos EUA. Ademais, o boom das drogas ia nomesmo sentido da poltica de Salinas, particularmente as privatizaes. Isto explicaria oassassinato de Lus Donaldo Colossio, candidato do PRI s eleies de 1994, apresentadocomo o candidato dos americanos, pois ele havia prometido acabar com este trfico (narealidade, acabou com o no controle, pelos EUA, deste trfico).

    No tambm por acaso que o programa apresentado pelo novo presidente Zedillo dum lugar especial ao combate ao narcotrfico. Enquanto isso, as privatizaes fornecemum canal perfeito para a lavagem de bilhes da droga diretamente pelos bancosamericanos que investem no Mxico.

    Assim, o artigo j citado de Cristopher Whaler afirma: Um dos mtodos empregadospelos traficantes durante os seis anos de presidncia de Salinas consiste em comprar asempresas pblicas privatizadas, principalmente os bancos comerciais e grandes empresascomo a Telmex, principalmente graas aos ttulos da dvida publica comprados no mercadosecundrio (os ttulos podres do plano Brady).

    C) O caso limite do Paquisto

    Segundo os economistas, as somas provenientes do narcotrfico que entram no Paquistorepresentariam de 2 a 4 bilhes de dlares anualmente. Estimativas razoveis, sobretudoquando se sabe que a agncia de Miami do BCCI geria fundos dos servios secretospaquistaneses. 6

    O apoio ao regime paquistans mudou, como conseqncia da guerra comercial entre oimperialismo americano e os imperialismo subordinados. Assim, a ditadura militar dogeneral Zia foi apoiada pelos EUA, principalmente durante a guerra do Afeganisto, e oregime paquistans ocupou um lugar central na ajuda aos opositores intervenomilitar da burocracia do Kremlin. Depois, as coisas mudaram. Em 1990, a ajuda americanafoi suspensa, e a questo da droga tornou-se um elemento de chantagem exercida sobreo Paquisto.

    Mas o governo francs tomou o lugar (quando a Frana a maior vtima da heronapaquistanesa). Em setembro de 1992, Pierre Joxe, ministro da Defesa na poca, assinouum acordo comercial no valor de 740 milhes de dlares vendendo trs submarinosAugusta Marinha paquistanesa; e, no incio de fevereiro, um acordo de cooperaonuclear para fins civis foi assinado entre a Frana e o Paquisto. Enquanto isso, a muitolivre imprensa francesa, que fala todos os dias dos cartis colombianos, esquecia ou eradiscreta sobre o principal fornecedor de herona da Europa: Estima-se que entre 70 a80% das 25 toneladas de herona consumidas por um milho de toxicmanos na Europa()vm, hoje em dia, do crescente de ouro: Ir, Afeganisto, Paquisto, ndia7.

    Outros Regimes Fieis Aliados dos EUA

  • O caso de Noriega, no Panam, tornou-se clebre, particularmente pela sorte trgica doPanam, submetido novamente, em dezembro de 1989, a uma invaso americana quecustou milhares de vidas.

    O objetivo oficial era o de capturar um narcotraficante, o ditador Noriega antigoagente ou aliado da CIA. E aps a invaso, o trfico no diminuiu mas, pelo contrrio,aumentou: calcula-se que os bancos panamenhos tenham dobrado ou triplicado aquantidade de dinheiro lavado. A nica diferena que isso agora feito sob o controledas autoridades americanas de ocupao.

    Os regimes aliados dos EUA so tambm regimes que traficam sem nenhum pudor. Oregime tailands, fiel aliado dos EUA no Sudeste asitico antes, durante e depois daguerra do Vietn, beneficia-se da no vigilncia dos EUA sobre o trfico do qualparticipam freqentemente as mais altas autoridades do pas.

    O apoio ao regime libans sob tutela da Sria, que ocupa lugar central na estratgia dosamericanos depois da Guerra do Golfo, faz com que fechem os olhos para a utilizao defundos provenientes da droga do planalto de Bekaa, que so investidos em imveis paraa reconstruo de Beirute.

    Outras potncias imperialistas mantm a mesma poltica. Apesar de mais da metade dohaxixe consumido na Frana e na Espanha vir do Marrocos, onde o trfico goza daproteo dos que deveriam combat-lo, esses pases do apoio irrestrito monarquiamarroquina diante do perigo de desestabilizao a partir da Arglia. O fato damonarquia estar diretamente envolvida no trafico relegado a segundo plano.

    preciso dizer que a presena ou interveno militar imperialista facilita ou encoraja aproduo e o trfico da droga: o que ocorreu com o exrcito francs na Indochina, queestimulou a cultura de papoula nas zonas montanhosas do Laos para escoar o produtofinal atravs dos meios mafiosos franceses (particularmente da Crsega, ao que parece).Esta poltica foi continuada e ampliada pelos americanos, contra a China e, na guerra doVietn e ainda hoje atravs do apoio ao regime birmans.

    Aps o esfacelamento da URSS, a administrao americana utiliza sua campanha oficialantidroga para organizar presses em relao a negociar os globais, seja de ordemmilitar ou econmica.

    Os Planos de Ajuste Estrutural e a Produo da DrogaNa ndia, as causas do desenvolvimento da produo so a crise da agricultura tradicionale os efeitos do plano de ajuste estrutural imposto pelo FMI e o Banco Mundial. Estesestipulam, por exemplo, que o governo pare de subvencionar os insumos compradospelos pequenos agricultores. No estado de Kerala, ao sul do pais, a alta do custo deproduo de condimentos como o cardamono, pimenta e gengibre e a queda do preo dacopra que provocam o incremento das culturas de cannabis 8.

    No Peru, sob o efeito do Fujichoque, em agosto de 1990, o programa de ajuste estrutu-ral peruano fez com que, entre outros, o salrio do trabalhador agrcola da Serra peruanadescesse a 7,50 dlares por ms. O milho, o arroz, o tabaco e outras culturas destanatureza foram duramente afetadas pela liberalizao includa no programa do FMI. Aselva peruana foi praticamente isolada devido ao aumento dos combustveis e dosinsumos agrcolas.

    O programa do FMI levou os camponeses a se restringirem cultura de coca. De outrolado, isso afundou o sistema bancrio nacional: demisso de bancrios e desintegraodos bancos do Estado. Os crditos agricultura e indstria foram suprimidos, tudo se

  • orientando para a especulao. A bolsa de Lima tornou-se em 1994 a mais rentvel domundo! Belo resultado!

    Fechando com chave de ouro, em 1991, o Peru assinou um acordo antidroga comWashington. A ajuda antidroga no seria concedida enquanto no fossem adotados osplanos do FMI. Assim, justificou-se o envio de tropas especiais, o controle militar dacpula do Estado peruano, que se tornou marionete da embaixada americana. Desdeque Fujimori controle a situao. Depois da derrota de seu referendo de 31 de outubrode 1993, os EUA aventaram a possibilidade de apoiar o candidato Perez de Cuellar, ex secretrio da ONU.

    Na Costa do Marfim o desenvolvimento da cultura da cannabis coincide com a aplicao,entre 1984 e 1988, dos primeiros planos de ajuste estrutural. Com efeito, a derrocada dacotao mundial do cacau obrigou os camponeses a procurarem culturas alternativas. apartir da que a cannabis comeou a ser produzida em massa. Com a cumplicidade dapolcia e dos altos funcionrios do Estado, so organizados um mercado local e ocomrcio com outros pases.

    A introduo da cultura da papoula e de outras plantas tem relao direta com odegradao da situao econmica dos camponeses da Amrica Latina, frica e sia.Assim, a queda das cotaes no mercado mundial de matrias primas agrcolas, como ocaf e o cacau e o peso acachapante da dvida so tambm fatores que estimularamdiretamente aquelas produes.

    As Privatizaes e o Desenvolvimento da Produo de DrogaDesde 1989, o plano Brady, imposto aos pases subdesenvolvidos para permitir o paga-mento dos servios da dvida, criou uma nova modalidade de reestruturao da dvidaexterna internacional: sua privatizao.

    De 1989a 1993, a dvida pblica s aumentou 3%, enquanto a dvida privada aumentou62%. Por que? Porque a reconverso da dvida pblica em dvida privada feita atravsde uma gigantesca estrutura financeira internacional especulativa, em particular nosmercados de ttulos podres Assim, na Amrica Latina, a partir de 1989, osinvestimentos estrangeiros especulativos se desenvolvem, e, dos 61 bilhes de dlaresque entraram nesses mercados, apenas 18 bilhes foram investidos na produo.Podemos dizer que 71% dos investimentos estrangeiros na Amrica Latina soimprodutivos.O plano Brady facilitou a entrada no circuito financeiro normal de bilhes de dlaressujos drenados para bancos americanos ou para parasos fiscais do Caribe, e reinvestidosna Amrica Latina em busca de altas taxas de juros.

    A Importncia do Trfico de Drogas na Economia de AlgunsPases e o Desenvolvimento de Conflitos ArmadosA venda de drogas equivale a 110% das importaes da Amrica Latina e a 30% de suadvida, a 230% das exportaes da frica, a 80% das da Gr-Bretanha e a 70% das daFrana.

    Em 1989, a ttulo de comparao, as despesas de armamentos representaram 950bilhes de dlares. A isso deve-se acrescentar que o trfico de drogas e o de armasdesenvolvem-se paralelamente, principalmente pela multiplicao de conflitos armadose da forma que eles tomam atualmente. Um estudo detalhado permitiria mostrar que

  • em todos ou quase todos os oitenta conflitos armados existentes, o trfico de drogasocupa um lugar essencial.

    Mesmo que isso no seja uma novidade, preciso lembrar que a guerrilha dos contraem oposio ao regime sandinista no incio dos anos 80 foi financiada pela CIA emligao direta com o trfico de drogas dos cartis colombianos e de figuras comoNoriega no Panam (Isso no impediu que os americanos acertassem suas contas com oantigo aliado no final de 1989).

    O Desmoronamento das Burocracias Stalinistas e o Trfico deDrogasA Birmnia um dos grandes produtores do Tringulo de ouro, se no for o maior. Des-de os anos 60, os grupos armados do Kuomintang (KMT) detinham um quase monopliodo trfico de drogas na Tailndia; nos anos 80, para manter seu poder sobre o mercado,o KMT fez um acordo com os stalinistas birmaneses do PCB, que controlavam o nordestedo Estado de Shan.

    Depois do esfacelamento do PCB, em maro de 1989, uma nova organizao, a UWSP,tomou seu lugar.

    O regime atual, a ditadura militar do SLORC (aliado dos EUA), controla o trfico deherona (a Birmnia, hoje, o primeiro exportador mundial) com os ex-stalinistas, sobre abase do controle do territrio do Nordeste. O acordo implica que no haver qualquerapoio s rebelies das minorias.

    Por outro lado, a burocracia de Pequim fornece armamentos ao SLORC, sempre dizendoque combate a toxicomania e o trfico na China.

    Aps 1991, o esfacelamento do PCUS e a acelerao do desmantelamento das estrutu-ras estatais, as medidas de privatizao e de introduo da economia de mercadoprovocaram uma exploso da produo e do trfico de drogas, muitas vezes ligados aosconflitos tnicos e ao financiamento das guerras. Nada h de surpreendente, porexemplo, que o conflito iugoslavo tenha feito desviar uma parte das rotas da droga para aHungria. No plano interno, os efeitos perversos das privatizaes e as necessidadesurgentes de divisas criaram um contexto favorvel produo de drogas e lavagem dedinheiro sujo 9.

    A desarticulao do sistema bancrio centralizado oferece incomparveis facilidadespara a lavagem e, de um modo geral, o crime organizado se aproveita da desorganizaodas estruturas sociais.

    Hoje, a Romnia uma plataforma para esse trfico. A corrupo paralisou as foras derepresso que foram herdadas das redes armadas no regime de Ceaucescu.

    As antigas nomenclaturas no so as nicas que participam nesses negcios. Na Bolvia,por exemplo, o antigo chefe de Estado e atual vice-presidente da InternacionalSocialista, Jaime Paz Zamora, admitiu durante uma entrevista imprensa que foramcometidos erros na luta contra o narcotrfico. As ligaes entre Paz Zamora e osprincipais traficantes de cocana do pas so mais do que conhecidas. Ele ficou clebretambm porque, em nome da utilizao tradicional pelos camponeses (que mascam afolha de coca) props o livre comrcio de cocana.

    Mas Paz Zamora no um caso isolado; o enorme desenvolvimento do trfico de drogasdepois das medidas de desregulamentao do governo Gonzlez na Espanha, nos levama considerar como uma poltica geral levada pelos partidos da Internacional Socialista

  • -IS.

    Com efeito, a IS e seus partidos esto na vanguarda dos que defendem a legalizao etambm da proposta de resolver o problema da droga com drogas substitutas, como ametadona proposta feita por Kouchner (ex-ministro socialista da Sade na Frana).

    Isso est ligado ao tratamento humanitrio da droga, com a abertura de centros porparte de associaes, ONGse outras, para ajudar os drogados. Uma rede social parapermitir a manuteno do trfico e de seus lucros.

    As Consequncias do Esfacelamento da URSS para o Cultivo e oTrficoDepois da desagregao da URSS, os meios para controlar o trfico se desintegraram.Cada repblica resolve, por si s, seus problemas. A sia Central ex-sovitica tornou-se osegundo produtor mundial de pio em 1992 (2.500 toneladas). H uma situao intestinade guerra civil em potencial rica em perspectivas para o comrcio de narcticos.

    Com uma poderosa indstria qumica, a CEI a campe na produo de drogas sintticas.S em 1992, a brigada de estupefacientes descobriu Moscou cinco novas drogas.

    As mfias sadas da nomenclatura tomaram em suas mos o comrcio de narcticos nasgrandes cidades. Mas tambm esto ligadas ao trfico de metais raros ou no ferrosos ecom malversaes bancrias de toda a espcie. A ligao entre a liquidao dapropriedade estatal e o trfico de drogas est perfeitamente estabelecida, assim como ainterpenetrao entre as mfias e os aparelhos polticos dos diferentes partidos criados.

    As privatizaes liquidaes, o investimento de dinheiro sujo so fenmenos paralelos.O Sistema financeiro internacional tem necessidade do dinheiro sujo.

    O desenvolvimento da informtica e dos sistemas integrados facilitaram os movimentosdos capitais, a lavagem e a reciclagem de dinheiro sujo.

    O FMI prope, no quadro dos planos de ajuste estrutural, a desregulamentao dosistema bancrio nacional. Isso no diz respeito apenas aos oitenta pases que aplicam osplanos de ajuste estrutural.

    As medidas de liberalizao bancria propostas pela Unio Europia vo no mesmosentido. A entrada de divisas o principal objetivo, todas as barreiras devem cair paratanto. Essas divisas, convertidas a partir do dinheiro sujo, so empregadas na aquisiode ativos imobilirios ou na compra de empresas estatais leiloadas nos programas deprivatizao, mas nunca ou raramente em investimentos produtivos.

    O Caso da Hungria e de Outros Paraisos Fiscais Enfim, o regime precedente, para facilitar sua poltica de abertura em direo ao mercadointernacional tinha criado um banco internacional oficialmente chamado off shore, oBanco Internacional da Europa Central, de que so acionistas grandes bancos estrangeirospodendo efetuar livremente operaes de divisas com o exterior. Os observadores tememque isso daria um novo estmulo s prticas duvidosas detectadas at ento.

    No que diz respeito aos bancos, um decreto com fora de lei desde 1 de janeiro de 1 992estipula que a parte do Estado deve ser reduzida a 25% no mximo em 1997. Um apelo foilanado aos bancos internacionais Barclays, de Zoete Wedd, Crdit Comercial de France,Crdit Suisse, Merill Lynch, Morgan Stanley, Salomon Brothers etc. para que eles

  • investissem na privatizao dos quatro mais importantes bancos hngaros. Isso poderiapermitir a alguns deles, j implicados em negcios de lavagem de dinheiro, terem sucursaisna Hungria, o que lhes permitiria contornar os controles em seus prprios pases (17).

    Na Sua, onde, no decorrer dos anos, foram lavados bilhes de dlares produto do tr-fico, a nova lei Contra o trfico serve para condenar os toxicmanos. Todas as pressesvo no sentido de reforar a represso contra os usurios, a criao de uma verdadeirapolicia federal mas respeitando o sistema financeiro.

    O relatrio da comisso de inqurito da Assemblia Nacional de 27 de janeiro de 1993mostra o lugar dos parasos fiscais colocados sob a autoridade francesa (Mnaco,Antibes) que lavam 2,8 bilhes de dlares anuais: e, na praa de Paris, dizem que estona origem da crise imobiliria.

    Os Principais Benificirios do Trfico e da Lavagem do DinheiroDe incio no se pode considerar apenas os lucros anuais do trfico, mas tambm suaacumulao no tempo.

    De 1980 a 1994, 80% destes 200 a 500 bilhes de dlares anuais so colocados a taxasde juros anuais de 9%, o que d um lucro acumulado de mais de 3 trilhes de dlaresanuais. Esta soma suficiente para intervir em todos os setores da economia mundial.

    De uns anos para c, as atividades de lavagem se multiplicam em novos pases,particularmente nos pases do Leste europeu. Todos os representantes dos ex-pases doLeste so obrigados a reconhecer que sua poltica de privatizao, principalmente nosetor imobilirio, facilita as operaes de lavagem.

    Uma boa parte do dinheiro investido na Alemanha do Leste tem tambm origemcriminosa. A lavagem de dinheiro na rede bancria internacional beneficia-se doempurro que representam os esforos dos credores para honrar o servio da dvidaexterna. O FMI no se interroga sobre as origens do dinheiro que reembolsa as dvidasou os juros.

    A Espanha se transformou no mercado europeu das drogas, devido ao acessorelativamente fcil a seus bancos, suas casas de cambio, a seu setor imobilirio, dacomplacncia das instituies, dos governos locais, da cumplicidade das polcias (porexemplo, em outubro de 1992, a unidade de luta antidroga da guarda civil foidesmantelada).

    A ustria, depois da abertura das fronteiras dos pases do Leste, est entrando na UnioEuropia e vai, sem dvida, ter um papel importante na lavagem de dinheiro da droga.Em 1994, este pas de menos de 8 milhes de habitantes tinha 40 milhes de contasbancrias. Durante os trs primeiros meses de 1994 (segundo o DespachoInternacional das Drogas, de maio de 1994) os bancos acusaram operaes suspeitasde mais de 2 bilhes de dlares, dos quais somente 1% pode ser incriminado.

    Onde as contas so mais claras no trfico da cocana em relao ao que fica nos pasesprodutores e os grandes consumidores.

    Os Produtores de Droga e a Lavagem do DinheiroOs grandes pases produtores como a Colmbia, o Peru, a Bolvia, o Paquisto ou aBirmnia, recuperam em suas economias menos de 10% do produto desses recursos.Assim, sobre 36 bilhes de receitas anuais com cocana, entre 1,5 e 2 bilhes de dlares

  • permaneceram no Peru, dos quais cerca de 750 milhes a 1 bilho de dlares sotrocados em moeda nacional atravs do sistema financeiro local (na rua).

    Isso representa cerca de 1,5 bilho de dlares na Bolvia e mais ou menos isso naColmbia. O que d uma taxa mxima de alguns bilhes de dlares para os pasesprodutores de cocana, que so reinvestidos nos sistemas financeiros locais. Os 80%restantes vo para os grandes bancos internacionais.

    Segundo os especialistas do GAFI, 80% das receitas do trfico so lavadas anualmenteatravs do sistema bancrio e financeiro internacional. Os 20% restantes so repatriadosnos pases produtores ou representam despesas dos diversos traficantes.

    Antes de mais nada, preciso saber que a relao entre o custo de produo e extrao dadroga e seu preo no mercado de 1 para 1000. Nenhuma mercadoria no mundo permiteuma tal rentabilidade. Mas esta uma mercadoria cujo efeito direto a destruio da forade trabalho, das foras produtivas. Isso exprime ainda melhor o carter parasitrio daeconomia imperialista. Se tomamos as cifras da Interpol de 500 bilhes de dlares, dosquais entre 350 e 400 bilhes so produzidos pela Amrica latina, podemos nos perguntarpara onde vai este dinheiro. Segundo cifras mais ou menos aproximadas, apenas 10 a 15bilhes de dlares so repatriados Colmbia, ao Peru , ao Equador ou Bolvia. portanto uma parte relativamente modesta deste enorme pacote, em dois terosproveniente do mercado americano e em um tero do mercado europeu, que repatriadopelos bares da droga, com o acordo dos governos e sob a superviso do FMI.

    Todos os acordos assinados entre os governantes destes pases e o FMI, portanto sob asuperviso dos funcionrios desta instituio, levam em conta estes reingressos monetrios.Na Colmbia, por exemplo, o produto do trfico de drogas representa 3 bilhes de dlarespor ano. O trfico se faz em diferentes formas. O Banco Nacional da Colmbia, porexemplo, tem um guich esquerda onde se pode apresentar diretamente com dlarespara troc-los por moeda colombiana. No Peru, isso se faz diretamente na rua: prximo aocentro, sete mil vendedores trocam dlares, particularmente na lavagem de dinheiro dadroga.

    a maneira pela qual o Banco Nacional recupera este dinheiro. Calcula-se que a rua, noPeru, troque entre 1 bilho e 1,5 bilho de dlares por ano.

    O FMI leva isso em conta nos acordos que assina. No Peru, o acordo com o governo AlanGarcia em 1988,foi acompanhado de um decreto-lei impedindo todo controle sobre alavagem de dinheiro sujo. Este comrcio, portanto, se desenvolve com o acordo tcito doFundo Monetrio Internacional.

    Mas para onde vai este dinheiro, quer dizer, a diferena entre estes 15 bilhes e os 400/500bilhes de dlares que representam o comrcio internacional da droga? Atravs de umsistema de parasos fiscais, como as ilhas Caiman, ele reciclado nos circuitos financeiroscontrolados pelos bancos americanos. Deste ponto de vista, os grandes bares da droga, naColmbia principalmente, so os maiores compradores de bnus do Tesouro americano(18).

    Quem Lucra com a Nova Especiaria?O grosso dos lucros do trfico de cocana provm da venda a varejo nos mercados dos EUA representando 80% do total e da Europa Ocidental. O essencial reciclado na praa ouencontra o caminho dos circuitos financeiros internacionais. Porque os pasesdesenvolvidos, as finanas mundiais tem sede de coca-dlares, () muitas centenas demilhes desses dlares so repatriados a cada ano para os exportadores de cocana dos

  • pases andinos

    De 700 a 800 milhes de dlares de receita por ano, mais que o cobre ou o petrleo: apasta-base de coca o primeiro produto de exportao do Peru. E a folha de cocarepresenta em valor cerca de 7()% da produo agrcola nacional

    Como ressaltou o antigo presidente Alan Garcia o desenvolvimento da economia dacocana no gerao espontnea. Ele est estritamente ligado ao endividamento dospases envolvidos e, em termos gerais, a uma estratgia de desenvolvimento baseado nacolonizao da produo de matrias primas.

    Em 1988, o presidente Garcia, confrontado com o fracasso de sua poltica, a ela renunciapara se alinhar s exigncias do FMI. Ele decidiu, simultaneamente, recorrer, de umaforma que no poderia ser mais aberta, aos coca-dlares (decreto presidencial de 29de julho) para fazer reintegrar ao pas as moedas estrangeiras sem especificar suaorigem.

    Na Colmbia, o narcotrfico gera cerca de 8% do produto interno bruto e 6% doemprego. A quantidade de divisas que ele proporciona ao pas permitiu a manuteno dadvida externa em nveis razoveis em relao de outros pases da Amrica Latina.

    Os EUA, Maior Receptador de Coca-DolresSem dvidas os EUA posam, desde 1988, de campees na luta contra a lavagem doslucros da droga. Do lies de moral em todo mundo, e no apenas aos parasos fiscaisdo Caribe.

    Eles no se contentam em condenar a Sua e denunciar Luxemburgo. Colocando acomunidade europia na berlinda, por suas fraquezas condenveis, s se vem a simesmos com um comportamento sem reparos.

    Mas, durante os dez anos precedentes, os EUA no haviam feito mas do que procurarmaneiras de absorver o dinheiro das drogas, por mais sujos que fossem.

    Em 1987, as reticncias para no dizer hostilidades, das autoridades financeirasamericanas a uma legislao coercitiva contra as transferncias internacionais de dlaressujos passava ainda como testemunho de ignorncia e impotncia Para justificar suacircunspeco, eles explicaro que qualquer atitude intempestiva neste domnio poderia serdanosa ao sistema bancrio, s finanas dos EUA (19).

    Em 1988, a ONU tomava ares de indignao ao assegurar que o montante anual dosnegcios mundiais com droga era de 300 bilhes de dlares, o que representava 10% docomrcio internacional. Pouco depois, a Interpol estimava este comrcio em 500 bilhes dedlares.

    O funcionamento do sistema financeiro internacional necessita de um volume lquidojamais visto. Precisa de uma super-liquidez real, isto , para simplificar, de mais dinheiro doque seria necessria a priori para assegurar as transaes normais. necessrio, a partirde agora, um multiplicador mais importante entre base monetria e base monetriamundial.

    Creio que, na dinmica deste Sistema, o dinheiro do droga preenche uma funo (19).

    A campanha contra o dinheiro da droga poderia perfeitamente servir de ngulo deataque para uma tentativa mais ambiciosa: retomar, pelo menos minimamente , o controledas finanas mundiais

    Num mundo onde os movimentos financeiros cotidianos nos mercados de drogas

  • ultrapassam 1 trilho de dlares cinqenta vezes mais do que seria justificado pelocomrcio internacional. Em minha opinio, esto merc de bruscas migraes decapitais...

    As Iniciativas Contra a Lavagem do DinheiroAs recomendaes do GAFI para perseguir o dinheiro da droga, apresentadas em 19 deabril de 1990, foram adotadas pelo G-7 e por muitos outros pases.

    Entre estas medidas encontra-se a eliminao de contas bancrias annimas ouregistradas sob nomes fictcios, assim como a quebra do sigilo bancrio.

    Dois exemplos significativos mostraram que discutvel a determinao do governoamericano em levar adiante estas recomendaes (entretanto, o governo americanoaparece publicamente como campeo da luta contra o trfico de drogas).

    Assim, o BCCI (sede em Luxemburgo) foi acusado pelo comissrio das alfndegas dosEUA de lavar 14 bilhes de dlares; aps dois anos, a sentena se limitou a uma multa de15,3 milhes de dlares. Mas no se pode esquecer que o BCCI ligado ao governopaquistans, principal aliado dos EUA na regio.

    O que se pode depreender disto que a poltica dos EUA no concebida para impedir otrfico e o consumo mas para impedir que o produto deste trfico deixe os EUA.

    Difceis de serem implantadas ou pouco eficazes, as medidas de represso e de prevenoda lavagem entram alm disso em contradio com as polticas econmicas dos pasesindustrializados tanto quanto os do terceiro mundo Desde 1 de janeiro de 1993, aconstituio de um mercado financeiro nico na Comunidade europia s facilitou asoperaes de lavagem do crime organizado (20).

    O Lugar da Suia na Lavagem do DinheiroUm enorme dispositivo econmico, legal e constitucional, permite Sua jogar um papelativo na lavagem de dinheiro da droga. Mas este lugar da Sua, produto de seu papelfinanceiro particular a nvel internacional, papel que foi reforado aps a SegundaGuerra Mundial e os acordos de Yalta e Potsdam (21), , hoje em dia, muito disputado.

    Depois do episdio que ficou conhecido como O caso Kopp, em 1988, quando o in-dustrial Hans Kopp, marido da ministra sua da Justia Elisabeth Kopp, foi denunciadocomo traficante de drogas, os rumores de uma guerra comercial e financeira nopararam mais de crescer. A afirmao de que o caso foi revelado pela CIA no deve estarlonge da verdade: o empenho com que o deputado social democrata suo Zieglerdenuncia o papel financeiro da Sua na lavagem de dinheiro da droga, praticamente es-quecendo os grandes bancos americanos, nos faz refletir.

    Uma outra razo explica a persistncia na utilizao da praa financeira da Sua pelasorganizaes criminosas, alm do segredo bancrio suo tradicional e absoluto: aligao entre as organizaes criminosas e os servios secretos de certas potncias.

    Apenas para falar de um caso conhecido, assegura-se que a sociedade de Hans Kopp foiutilizada pela CIA para ajudar a resistncia afeg. A CIA sabia tudo sobre essa sociedade.Uma vez terminada a guerra afeg, e tambm por outras razes, o lugar da Sua deviaser questionado. Revelar o caso a coisa mais fcil do mundo.

    O que no impede que a Sua seja tambm um exemplo de que os dispositivos oficiaiscontra a lavagem so apenas uma cobertura objetiva para o trfico. O controle sobre a

  • UBS (Unio dos bancos suos) publicado pela misso do grupo financeiro da OCDE(organizao para a cooperao e desenvolvimento econmico) em maro de 1993 provaisso. Eles sequer viram que o clebre traficante colombiano Julio Nasser Davout tinhadepositado na UBS nada menos que 150 milhes de dlares provenientes do trfico decocana.

    Isso fez com que a revista La Dpche Internacionale, n 33, de julho de 1994, seperguntasse: Esta falta de perspiccia no levanta, por acaso, desconfiana em algunsaltos funcionrios americanos encarregados da luta contra as drogas?

    notoriamente este o caso da guerra comercial aberta para controlar os fluxos dedinheiro produzido pelo trfico. O lugar da Sua est em disputa, e nesta disputa todosos golpes so permitidos.

    A ONU e o Trfico de Drogas Vimos que, em 1989, tinha sido constitudo o GAFI sob a gide do G-7 e do FMI. A ONUtambm constituiu uma instituio, o PNUCID, que tem como funo a proposta deorganizar culturas de substituio.

    Os efeitos perversos das culturas de substituio so demonstrveis por inmerosexemplos. Assim, os planos de desenvolvimento alternativo patrocinados com o governoperuano: 23 milhes de dlares so mobilizados e destinados a outras atividades no anode 1992 (sendo 5% desta quantia destinada ao pagamento do pessoal administrativo es ONGs).

    H, no entanto, outro aspecto da interveno da ONU que preciso sublinhar. Desde1991, h casos de tropas da ONU metidas no trfico de drogas; conhecido o exemplode Sarajevo, onde oficiais, sob a cobertura da ONU, organizavam o trfico, a prostituioe outras atividades.

    A interveno da ONU no Cambodja ainda mais escancarada neste aspecto.Imediatamente, a presena de milhares de soldados e de bilhes de dlares facilitaramtoda espcie de trfico.

    O balano, desde 1992, na confuso provocada pelas dificuldades de colocar em prticaum plano de desarmamento das diferentes faces, tem relao com o trfico de drogas.

    Esta questo, que beneficiou o novo regime, permitiu tambm aos antigos Kmers Ver-melhos de Pol Pot se utilizarem da carta anticorrupo para manter sua influncia.

    A fase final da exportao de drogas atravs das fronteiras cambodjianas foi organizadapor empresas instaladas na Tailndia, que, alm da droga operam com madeira e pedraspreciosas.

    Fontes ocidentais estimam que o Cambodja, onde operam duas dezenas de bancos pelosquais passam os 2,8 bilhes de dlares do plano de paz das Naes Unidas e centenas demilhes de dlares de fontes privadas, tornou-se tambm um importante centro delavagem de dinheiro sujo .

    Um Caso Exemplar. A Privatizao dos Bancos Impulsiona a Lavagem: PortugalNo perodo da Revoluo de abril de 197410, diante do perigo da fuga de capitais, ostrabalhadores ocuparam os bancos e impuseram o controle sobre todas as transaes.

  • Posteriormente, o governo nacionalizaria os principais bancos cujos principaisproprietrios estavam ligados ditadura salazarista.

    Depois da entrada de Portugal no Mercado Comum, as presses sobre o sistemanacionalizado se acentuaram. O governo Cavaco Silva decreta a privatizao e a vendade importantes bancos ao capital estrangeiro. Portugal tornou-se ultimamente umaimportante via alternativa para o trnsito de cocana latino-americana e de outras drogasprovenientes do Marrocos e do Paquisto.

    Segundo La Dpeche Internacionale des Drogues (Julho de 1994), numerosos indciospermitem concluir que, atravs de Seus bancos off shore e seus contatos no Sudeste dasia, Portugal encontra-se a um passo de se transformar em uma importante praa para alavagem de dinheiro Uma das consequncias da entrada de Portugal no MercadoComum o desaparecimento de um milho de pequenas propriedades rurais.

    O governo se mostra apressado em adotar medidas repressivas contra os consumidores,e promulgou uma lei contra a lavagem em janeiro de 1993, aplicando as diretrizes doMercado Comum a este respeito.

    Mas, como diz La Dpche j citada, a reprivatizao da quase totalidade do setorbancrio, nacionalizado aps a Revoluo dos Cravos (24), e a chegada de numerosassociedades estrangeiras, propiciou certamente a ocasio para a reciclagem de dinheirode origem duvidosa.

    O esquema clssico se repete. As medidas de liberalizao econmica e financeirapropostas pelo FMI, a Unio Europia ou outras instncias internacionais facilitam ouimpulsionam a lavagem, bem como toda a circulao de capitais especulativos. Osgovernos justificam o reforo dos instrumentos repressivos do Estado em nome da lutacontra a insegurana, produto do aumento do consumo, e medidas legais contra alavagem so adotadas sem que tenham qualquer efeito prtico.

    Legalizao ou Represso: O Falso Debate para Esconder o Essencial Em certos meios intelectuais, entre os quais figuram pessoas ditas de esquerda, estmuito em moda exigir a legalizao da droga, pelo menos de certas drogas, e a aberturade centros com produtos que, como a methadona, as substituem.

    Esta posio seria reforada pelo seguinte argumento: A liberalizao faria diminuir acriminalidade, e mesmo o consumo, como ocorre com o lcool e o tabaco. Estesargumentos falaciosos correspondem idias que combater o desemprego seriaimpossvel, porque ele no produto de um sistema agonizante, mas um mal inevitvel.Se h desemprego, preciso dividir o trabalho, se existe a droga, necessrio canalizarseu consumo, se h dficits na previdncia, preciso fazer com que os trabalhadorespaguem e diminuir as despesas. A realidade que estas idias so o contrapeso daquelasque apresentam a luta contra o trfico e a lavagem como uma operao de repressoque exige um reforo das leis e medidas contra os consumidores.

    As duas, em paralelo, explicam que o problema produto da cumplicidade de certospases subdesenvolvidos, com suas elites corrompidas, ao contrrio do que ocorre nospases industrializados. Evidentemente, a ecloso de fenmenos de corrupo em massanos pases industrializados desmente esta idia. Mas historicamente ela est baseada nofato de que a dominao colonial exigia a corrupo dos Estados colonizados.

    Todos os Estados europeus tm leis contra a corrupo de seus prprios funcionrios,

  • mas nenhum sanciona os cidados que compram funcionrios estrangeiros. Aintegridade moral das metrpoles permitia a corrupo nas colnias. A decomposio dosistema fez com que, hoje em dia, a corrupo tenha se generalizado.

    No se pode acusar nem o cartel de Medeln, nem os servios secretos paquistaneses,nem a monarquia marroquina de estarem ss na origem ou na causa da produo e dotrfico, mesmo que saibamos que eles tiram proveito disto. Este proveito o resultadodo lugar que lhes d o sistema financeiro internacional, portanto as relaes dedominao imperialista.

    Como foi dito em Alguns dados sobre o imperialismo senil (25): O capital financeiroencontra na economia da droga uma fonte de lucros que vem de fato da mais-valia social eno da produo de valor

    Mas, atravs do exemplo da droga, podemos perceber as caractersticas dominantes daeconomia mundial como economia mafiosa. Temos o direito de falar em economia mafiosa,como um trao dominante na economia mundial, pois o que caracteriza o conjunto dosprocedimentos pelos quais uma frao crescente do capital financeiro e dos aparelhos doestado organizam-se para obter uma parte crescente da mais-valia, por fora dos circuitoseconmicos legais, logo por fora de toda forma de controle.11

    A economia da droga alimenta-se e facilitada pelas desregulamentaes generalizadasque se operam em escala mundial.

    No se pode separar a presso existente hoje, com argumentos de toda ordem repressivos, mdicos pela legalizao da droga, das necessidades do imperialismo deter um certo controle dos capitais advindos do trfico de droga.

    Uma verdadeira guerra comercial para controlar este trfico est em curso. Oimperialismo considera que a legalizao pode lhe dar maiores meios para controlar otrfico, e sobretudo, a lavagem de dinheiro e para isto necessrio disciplinar todos osprodutores e traficantes que escapam do seu controle. No suficiente que oschefes do cartel de Medeln e Cali sejam grandes compradores de bnus do tesouronorte-americano, porque o montante dos ganhos que eles investem na Colmbia, noPeru, em seus negcios pessoais ainda demasiado importante para o imperialismo.

    As medidas contra a lavagem da droga propostas pela ONU e o GAFI no so apenas ummonumento ao cinismo, tem antes de mais nada o efeito de concentrar ainda mais oproduto do trfico nos grandes bancos.

    Vozes se levantam para suprimir ou moderar o segredo bancrio. Mas o segredobancrio a base do funcionamento do sistema financeiro internacional.

    A luta contra a lavagem da droga inseparvel de medidas em defesa dos trabalhadorese dos povos, do combate pela expropriao dos lucros especulativos e pelanacionalizao dos bancos. Lembremos que a arma mais eficaz contra a fuga de capitais,durante a revoluo de abril de 1974 em Portugal, foi a ao dos trabalhadores dosbancos, que impuseram o controle, atravs das comisses de trabalhadores, da atividadedos bancos, o que abriu a via para a sua nacionalizao.

    O imperialismo, seu sistema financeiro, no pode prescindir dos 3 trilhes de dlaresmovimentados pelo trfico de drogas. Ao mesmo tempo, esta massa financeira podetornar-se incontrolvel. O movimento de fuga de capitais no fim de dezembro noMxico, que acelerou a queda do peso, prova isso. No nos esqueamos de que uma boaparte destes capitais entram e saem e so lavados nos bancos norte-americanos ereinvestidos como dinheiro mexicano, sob a cobertura das medidas do governo Salinas,no quadro do Nafta.

  • Enfim, o falso debate, do ponto de vista dos interesses dos trabalhadores e dos povossobre a legalizao ou represso uma arma considervel nas mos dos Estados. Soeles que organizam a represso dirigida principalmente contra os consumidores e ospequenos traficantes (geralmente as mesmas pessoas) que, socialmente, so o produtodo desemprego e da misria social provocadas pelas polticas de privatizao.

    No se pode atacar o trfico de drogas e a lavagem do dinheiro da droga sem atacar ofuncionamento da economia especulativa, em particular o sistema financeiro. Todas asmedidas de liberalizao previstas pelo FMI facilitam a lavagem do dinheiro da droga etoda espcie de trficos.

    O combate pela nacionalizao dos bancos, a expropriao de capitais produto dalavagem e da especulao, so as palavras de ordem centrais para os trabalhadores ejovens para combater este flagelo, produto da decomposio capitalista.

    [ Texto publicado na Revista A Verdade N 14 de agosto de 1995 ]

    NOTAS(1) Gal Grupo Antiterrorista de Libertao. Esquadro da Morte financiado pelo estado para caar separatistas basco. Foi criado pelo ex-secretrio do Partldo Socialista Operrio Espanhol (PSOE) na provncia Basca de Viscaya, por Ricardo Garcia Damborenea, NDT.

    (2) Grupo dos Sete (G 7): formado pela Alemanha, Canad, Eua, Frana, Itlia, Japo e Inglaterra, NDT.

    (3) Labrouse Alain, em Planeta das Drogas, edio francesa, NDT.

    (4) NAFTA: Acordo Livre Comrcio entre os Eua, Mxico e Canad. Criado em 1 de janeiro de 1994, NDT.

    (5) Whaler Cristopher, em Assassinatos, Trficos e Corrupo, edio francesa, NDT.

    (6) A Droga, pesquisa de 1992/1993, OGD, NDT.

    (7) Labiousse Alain, A Droga, o Dinheiro e as Armas, edio francesa NDT.

    (8) A Droga, pesquisa de 1992/1993, OGD, NDT.

    (9) Acordo de Yalta e Potsdan: acordo contra- revolucionrio assassinado entre o imperialismo e a burocracia stalinista no final da 2 Guerra Mundial. Atravs desse acordo o mundo foi dividido em esferas de influncias. A Europa Ocidental, por exemplo, ficaria em poder dos capitalistas, com o apoio dos Partidos Comunistas. O nome vem das cidades de Yalta (Ucrnia) e Postdan (Alemanha), onde foram realizadas as reunies para assinar o acordo. O acordo foi assinado em 1944, por Stalin (URSS), Roosevelt (EUA) e Churchill (Gr-Bretanha), NDT.

    (10) Em 25 de abril de 1974, oficiais de mdia patente se rebelam e derrubam o governo de Caetano, sucessor de Salazar. A populao feteja o fim da ditadura distribuindo cravos (a flor nacional de Portugal) aos soldados rebeldes. Da o nome Revoluo Dos Cravos, NDT.

    (11) A Verdade, n 11/12, fevereiro de 1994, NDT.

    pdf: juno incandescencia.org

    A droga, o trfico e a lavagem do dinheiroAndreu Camps