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A estratégia emergente de Falcão Negro em perigo A atual teoria de negócios demonstra que, freqüentemente, a estratégia elaborada por uma empresa para determinada situação precisa ser substituída por um novo direcionamento, seja em função de mudanças no ambiente competitivo, ou por contingências ou oportunidades não previstas inicialmente. Planos criteriosamente elaborados raramente conseguem vislumbrar todas as alternativas que a vida real apresenta. Falcão Negro em perigo baseia-se exatamente uma situação dessas, ocorrida durante a intervenção militar americana na Somália. No início da década de 1990 uma guerra civíl assolava o país. Mohamed Farrah Aidid era o líder da facção tribal que assumiu o controle do país após um golpe de estado. Depois de destituir o ditador Mohamed Barre numa sangrenta guerra civil, Aidid iniciou seu próprio período de terror. Enquanto 300.000 civis morriam de fome, sua milícia confiscava os alimentos enviados pela comunidade internacional. Vinte mil marines são enviados, então, para tentar garantir a segurança do país, enquanto buscava-se o restabelecimento de um governo mais sólido. Mas quando os fuzileiros navais se retiram em seguida, Aidid declara guerra às forças de paz da ONU, reiniciando o massacre à população. Em agosto 1993, tropas de elite americanas são enviados à capital Mogadíscio para derrubar o novo ditador e restaurar a ordem. Prevista para durar três semanas, a operação tem seu mais trágico desfecho seis semanas depois, nos dramáticos acontecimentos brilhantemente narrados por Ridley Scott . O filme foi um pouco subavaliado pelo público, depois dos estrondosos sucessos de Hannibal e do multipremiado Gladiador , do mesmo diretor. Foi premiado com os Orcars de Melhor Edição e Melhor Som - aliás, beeem melhor e se você tiver um bom som Surround, você e seus vizinhos vão sentir-se no front apreciando a nervosa trilha sonora encabeçada por Faith No More. Falcão Negro em perigo é um filme de macho - não tem uma mulher sequer no elenco - mas tem um apelo feminino no seu elenco de jovens galãs. Josh Hartnett faz o Sargento Eversmann, um jovem recém-saído dos treinamentos pego numa situação extraordinária, tendo que agir como líder de um pelotão de meninos que jamais dispararam uma arma contra um alvo vivo. Ewan McGregor é o covarde datilografista que entra de gaiato quando o operador da metralhadora machuca sua mão. O sempre psicopata Tom Sizemore comanda as forças em terra, a bordo dos

A estratégia emergente de Falcão Negro em perigo

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A estratégia emergente de Falcão Negro em perigoA atual teoria de negócios demonstra que, freqüentemente, a estratégia elaborada por uma empresa para determinada situação precisa ser substituída por um novo direcionamento, seja em função de mudanças no ambiente competitivo, ou por contingências ou oportunidades não previstas inicialmente. Planos criteriosamente elaborados raramente conseguem vislumbrar todas as alternativas que a vida real apresenta.

Falcão Negro em perigo baseia-se exatamente uma situação dessas, ocorrida durante a intervenção militar americana na Somália. No início da década de 1990 uma guerra civíl assolava o país. Mohamed Farrah Aidid era o líder da facção tribal que assumiu o controle do país após um golpe de estado. Depois de destituir o ditador Mohamed Barre numa sangrenta guerra civil, Aidid iniciou seu próprio período de terror. Enquanto 300.000 civis morriam de fome, sua milícia confiscava os alimentos enviados pela comunidade internacional.

Vinte mil marines são enviados, então, para tentar garantir a segurança do país, enquanto buscava-se o restabelecimento de um governo mais sólido. Mas quando os fuzileiros navais se retiram em seguida, Aidid declara guerra às forças de paz da ONU, reiniciando o massacre à população. Em agosto 1993, tropas de elite americanas são enviados à capital Mogadíscio para derrubar o novo ditador e restaurar a ordem. Prevista para durar três semanas, a operação tem seu mais trágico desfecho seis semanas depois, nos dramáticos acontecimentos brilhantemente narrados por Ridley Scott.

O filme foi um pouco subavaliado pelo público, depois dos estrondosos sucessos de Hannibal e do multipremiado Gladiador, do mesmo diretor. Foi premiado com os Orcars de Melhor Edição e Melhor Som - aliás, beeem melhor e se você tiver um bom som Surround, você e seus vizinhos vão sentir-se no front apreciando a nervosa trilha sonora encabeçada por Faith No More.

Falcão Negro em perigo é um filme de macho - não tem uma mulher sequer no elenco - mas tem um apelo feminino no seu elenco de jovens galãs. Josh Hartnett faz o Sargento Eversmann, um jovem recém-saído dos treinamentos pego numa situação extraordinária, tendo que agir como líder de um pelotão de meninos que jamais dispararam uma arma contra um alvo vivo.

Ewan McGregor é o covarde datilografista que entra de gaiato quando o operador da metralhadora machuca sua mão. O sempre psicopata Tom Sizemore comanda as forças em terra, a bordo dos imponentes jipes Hummer, juntamente com o insondável William Fichtner.

Em 3 de outubro de 1993, numa operação autorizada pelo próprio ex-presidente Bill Clinton, as tropas são enviadas para prender dois militares somalis que comandavam os exércitos de Aidid. A belíssima cena dos helicópteros indo para o combate é a calmaria que antecede a tempestade.

São aeronaves reais usadas no combate original e os próprios pilotos da 160a SOAR, (Special Operations Aviation Regiment - Regimento Aéreo de Operações Especiais) que estiveram na Guerra da Somália e que dão mais realismo ainda a este filme baseado em fatos reais.

O planejamento da ação militar é milimetricamente cronometrado e, claro, tudo dá errado. Orlando Bloom, sem seus poderes voadores de elfo, é o juvenil que despenca do

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helicóptero logo no início da operação (os demais soldados que fazem a cena de rapel, descendo da aeronave, são combatentes verdadeiros de um pelotão de Rangers), causando a queda do aparelho logo depois e dando início à uma luta desesperada para resgatar sua tripulação.

Nesta segunda e inesperada operação - a estratégia emergente - outro helicóptero é abatido e a trama concentra-se nos pilotos, sobreviventes encurralados por uma multidão selvagem e enfurecida. As cenas da guerrilha somali cercando os soldados são apavorantes.

Toda a operação é coordenada via satélite (algumas das cenas do filme são reais, da verdadeira guerra da Somália filmadas pelos satélites), mas nem toda a tecnologia do mundo ajuda contra fanáticos armados até os dentes com poderosos rifles AK-47, dispostos a morrer - e de fato eles morrem feito moscas. Mas há muitas moscas numa guerra de miseráveis.

No saldo final de uma operação - que não deveria durar mais do que trinta minutos mas estende-se por dezoito violentas horas de ininterrupto combate - dezenove soldados americanos são mortos, além de mais de mil somalis.

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Após feroz batalha seqüência da queda do helicóptero, o piloto sobrevivente, Mike Durant, é feito refém e levado como troféu de guerra. Um helicóptero sobrevoa a cidade bradando pelos alto-falantes: "Mike Durant, você não será deixado para trás!", levando ânimo e esperança ao companheiro capturado. Ele seria libertado onze dias depois.

Quanto tudo termina e eles estão retornando à base, não havia lugar para todos nos jipes e muitos tiveram que voltar a pé (desastrosa alocação de recursos), no que ficou conhecido como Mogadiscio Mile.

Fazendo juz a seu Hulk, Eric Bana é a verdadeira máquina de guerra (num papel que deveria ter sido de Russel Crowe, que declinou do convite por estar ocupado com as gravações de "Uma mente brilhante". John Nash agradece). Sem respeito à hierarquia ou a seus colegas, é a quem se recorre quando a coisa aperta. E em Black Hawk Down a coisa aperta de verdade. Sua última fala lembra a Eversmann que é segunda-feira e uma nova semana está começando. De que importam os dias da semana numa guerra?

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Muito de acordo com as teorias de Christensen, percebemos como os líderes de pelotão - tal como os integrantes da média gerência de uma empresa - precisam se readaptar às novas condições de batalha. E como suas reações a um ambiente imprevisível redesenham o curso da operação num ambiente de mudança.

É interessante notar como se busca o objetivo pretendido - radicalmente alterado de prender oficiais somalis para resgatar os companheiros capturados - através da distribuição de recursos (soldados, equipamentos e munição), obedecendo aos processos da corporação (protocolos militares, hierarquia, planos de combate, leis e tratados de guerra) em consonância com seus valores ("no one is left behind", "respect the rules of engagement: no one fires, unless fired upon"*, proteger os civis) espelhando o funcionamento de uma empresa moderna. Ou será o contrário, a empresa espelhando o exército?

* "Ninguém é deixado para trás; Respeitem as leis de combate: ninguém atira sem que eles tenham disparado antes."