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ISABEL MARIA JESUS BENTO A EVOLUÇÃO DAS TEORIAS DA ORIGEM DAS ESPÉCIES NOS MANUAIS ESCOLARES PORTUGUESES DE BIOLOGIA DO ENSINO SECUNDÁRIO ENTRE 1989-2009 Dissertação apresentada para a obtenção do Grau de Mestre em Ensino da Biologia e Geologia no Curso de Mestrado em Ensino da Biologia e Geologia no 3º Ciclo do Ensino Básico e Secundário conferido pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Orientador: Prof. Doutor Bento Cavadas Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais Lisboa 2012

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ISABEL MARIA JESUS BENTO

A EVOLUÇÃO DAS TEORIAS DA ORIGEM DAS

ESPÉCIES NOS MANUAIS ESCOLARES

PORTUGUESES DE BIOLOGIA DO ENSINO

SECUNDÁRIO ENTRE 1989-2009

Dissertação apresentada para a obtenção do Grau de Mestre em

Ensino da Biologia e Geologia no Curso de Mestrado em

Ensino da Biologia e Geologia no 3º Ciclo do Ensino Básico e

Secundário conferido pela Universidade Lusófona de

Humanidades e Tecnologias.

Orientador: Prof. Doutor Bento Cavadas

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

Lisboa

2012

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

AGRADECIMENTOS

A realização do presente trabalho não teria sido possível sem o precioso contributo de várias

pessoas, a quem quero deixar o meu muito sincero Obrigada.

Um agradecimento muito especial ao Professor Doutor Bento Cavadas, cujo conhecimento e

elevada competência me guiaram durante esta investigação, pela sua incondicional

disponibilidade, pelos seus esclarecimentos, sugestões e críticas que me deu ao longo de todo

este projeto.

À minha família a minha especial gratidão, ao meu marido pelo seu incentivo, compreensão e

apoio e à minha filha Margarida por ser o pilar da minha motivação.

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

RESUMO

A tentativa de interferência criacionista no ensino tem aumentado no século XXI, nos

EUA, na Europa e Portugal também não está afastado deste problema. Com esta investigação

pretendeu-se contribuir para defender o ensino da biologia das tentativas de introdução do

criacionismo no currículo e nos manuais escolares. Para isso, procedeu-se à análise do modo

como se realizou a transposição das teorias da origem das espécies, dos mecanismos e dos

argumentos do evolucionismo para os manuais escolares portugueses de biologia do ensino

secundário, entre 1989 e 2009. Os resultados evidenciaram que os manuais transpuseram

vários exemplos de mecanismos e de provas da evolução que comprovam o seu discurso em

prol do evolucionismo. Todavia, foi entre os manuais publicados pós-programa de 2003 que

se detetou um menor número de exemplos abordados. Os manuais apresentaram diversas

teorias explicativas da origem e evolução das espécies: fixismo/criacionismo, Lamarckismo,

Darwinismo e o neodarwinismo. No entanto, a conceção criacionista, considerada uma teoria

fixista, foi abordada nos manuais apenas na perspetiva da história da ciência e não como uma

teoria explicativa da biodiversidade e origem das espécies a par das teorias evolucionistas.

Palavras-chave: Manuais escolares, biologia, teorias da origem das espécies, evolucionismo.

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

ABSTRACT

The creationist attempt of interference on the Education has been increasing in the 21st

century, in the United States, Europe and Portugal is no exception to this problem. This

investigation intended to contribute to defending biology teaching from the attempts of

introducing creationism in academic programs and textbooks. In order to achieve this, it was

analyzed the method of how the transposition of the theories of the origin of species has been

made, as well as the transposition of the mechanisms and arguments for evolutionism into the

biology textbooks of secondary education, between 1989 and 2009. The results showed that

the manuals transposed several examples of mechanisms and proofs of evolution, confirming

its discourse in favor of the evolutionism. However, the textbooks published after the program

of 2003 were the ones showing less number of approached examples. There were presented in

textbooks several theories concerning the origin and evolution of species: fixism/creationism,

Lamarckism, Darwinism and neo-Darwinism. In spite of this, the creationist notion,

considered to be a fixist theory, was approached only on a history of science perspective, and

not as an explanatory theory about the biodiversity and origin of species, along with the

evolutionist theories.

Keywords: Textbooks, Biology, Origin of species theories, Evolutionism.

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ABREVIATURAS

APA American Psychological Association

BSCS Biological Sciences Curriculum Study

DES Departamento do Ensino Secundário

DGEBS Direção Geral dos Ensinos Básico e Secundário

DGIDC Direção Geral de Inovação Desenvolvimento Curricular

DNA Deoxyribonucleic acid

EUA Estados Unidos da América

ESF Emmanuel Schools Foundation

GCSE General Certificate in Secundary Education

ID Intelligent Design

LBSE Lei de Bases do Sistema Educativo

NCSE National Centre for Science Education

OGP Orientações de Gestão de Programas

RNA Ribonucleic acid

SNC Sistema Nervoso Central

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ÍNDICE GERAL

ÍNDICE DE QUADROS 8

ÍNDICE DE FIGURAS 9

INTRODUÇÃO 10

CAPÍTULO I

12

1. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 13

1.1. EVOLUCIONISMO VS CRIACIONISMO 13

1.2. ESTUDOS SOBRE OS MANUAIS ESCOLARES E O ENSINO DAS TEORIAS DA

ORIGEM DAS ESPÉCIES

16

CAPÍTULO II

21

2. ABORDAGEM METODOLÓGICA 22

2.1. CORPUS DE PROGRAMAS E DE MANUAIS ESCOLARES 23

2.1.1. PROGRAMA DE BIOLOGIA APROVADO EM 1991 E RESPETIVOS MANUAIS

ESCOLARES

26

2.1.2. PROGRAMA DE BIOLOGIA E GEOLOGIA HOMOLOGADO EM 2003 E

RESPETIVOS MANUAIS ESCOLARES

28

CAPÍTULO III 31

3. ANÁLISE DA TRANSPOSIÇÃO DAS TEORIAS DA ORIGEM DAS ESPÉCIES

PARA OS MANUAIS DE BIOLOGIA PORTUGUESES

32

3.1. PERSPETIVAS OU TEORIAS DA ORIGEM DAS ESPÉCIES 34

3.1.1. FIXISMO/CRIACIONISMO 34

3.1.2. EVOLUCIONISMO 36

3.1.3. LAMARCKISMO 40

3.1.4. DARWINISMO 42

3.1.5. NEODARWINISMO 45

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3.2. MECANISMOS DA EVOLUÇÃO 46

3.2.1. ADAPTAÇÃO 46

3.2.2. VARIABILIDADE 47

3.2.3. HEREDITARIEDADE 48

3.2.4. MUTAÇÕES 49

3.2.5. SELEÇÃO NATURAL 50

3.2.6. SELEÇÃO SEXUAL 53

3.2.7. ISOLAMENTO GEOGRÁFICO 53

3.3. ARGUMENTOS DO EVOLUCIONISMO 54

3.3.1. ANATOMIA COMPARADA 54

3.3.2. PALEONTOLOGIA 56

3.3.3. EMBRIOLOGIA 57

3.3.4. BIOGEOGRAFIA 58

3.3.5. CITOLOGIA 58

3.3.6. BIOQUÍMICA 58

3.3.7. CARIOLOGIA 59

CAPÍTULO IV 60

4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 61

REFLEXÕES FINAIS 67

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 70

FONTES LEGISLATIVAS 73

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro I- Corpus de programas e de manuais escolares 25

Quadro II- Programas aprovados em 1991 27

Quadro III- Programas de Biologia e Geologia do 10º e 11º anos e de Biologia 12º ano 30

Quadro IV- Perspetivas ou teorias da origem das espécies, mecanismos de evolução e

argumentos do evolucionismo apresentados em manuais de biologia do

ensino secundário

33

Quadro V- Pioneiros do pensamento evolucionista referidos nos manuais escolares 37

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1- Ilustração esquemática da origem do atual género Equus, na perspetiva fixista

e na perspetiva evolucionista

40

Figura 2- Conceções de Lamarck esquematizadas 41

Figura 3- Ilustração da evolução das borboletas da espécie Biston betularia: cor clara

(aspeto inicial) e cor escura (aspeto da forma mutante)

52

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INTRODUÇÃO

Embora os estudos investigativos anteriores sobre o ensino das teorias da origem das

espécies nos manuais escolares de ciências portugueses, no período de 1905 a 1959,

evidenciem uma argumentação em prol do evolucionismo, as tentativas de interferência

criacionista no ensino tem aumentado de ênfase no século XXI, fazendo-se sentir de forma

especial nos EUA:

Uma área gravemente afetada pela turbulência das

reações à evolução é a educação: nos Estados Unidos há

muitas décadas que recorrentemente, surgem tentativas

de reprimir o Ensino da Evolução nas Escolas.

Temporariamente conseguidas, tais decisões têm sido

objeto de revogação graças à movimentação de cidadãos,

preocupados com as consequências da omissão de uma

parte importante do conhecimento científico para o futuro

dos seus filhos e da ciência (Avelar, 2007, p. 19).

Portanto, o debate entre o criacionismo e o evolucionismo, longe de estar encerrado,

encontrou no século XXI um novo vigor, em grande parte promovido por um

fundamentalismo religioso dominante em certas regiões dos EUA. Esta vaga criacionista

continua a exercer a sua pressão e começou a introduzir-se também na Europa. Portugal não

está afastado deste problema, como mostra a implantação de um parque criacionista em

Mafra, denominado Discovery Institute. Urge, então, defender o ensino das ciências, em

especial da biologia, das tentativas da introdução de pseudociência no currículo e,

consequentemente, nos manuais escolares.

Sendo assim, pretende-se com este trabalho responder à seguinte questão-problema:

Como foi realizada a transposição didática das teorias da origem das espécies para os manuais

escolares de biologia do ensino secundário publicados entre 1989 e 2009?

Para responder à questão-problema anterior, seguiu-se uma abordagem metodológica

de natureza qualitativa que consistiu na análise dos textos e figuras que transpuseram o

discurso científico para os manuais escolares mais representativos do período considerado, e

estabeleceram-se os seguintes objetivos:

a) Analisar a evolução das teorias da origem das espécies nos manuais escolares de

biologia do ensino secundário e verificar se continuam a ser devidamente

apresentadas conforme as conceções científicas vigentes.

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b) Analisar comparativamente a abordagem dos autores aos conteúdos sobre as

teorias da origem das espécies nos manuais escolares publicados antes e depois da

reforma curricular de 2001 e averiguar se essa abordagem está em consonância com

as orientações programáticas de 1991 e 2003, respetivamente.

c) Aferir se houve alterações na expressão do evolucionismo nos manuais analisados

intraprogramas e interprogramas.

Este trabalho está organizado em quatro capítulos. No primeiro capítulo é

apresentada a revisão bibliográfica que aborda o confronto entre o evolucionismo e o

criacionismo. Também se apresenta uma resenha dos estudos existentes sobre os manuais

escolares e o ensino das teorias da origem das espécies. No capítulo 2 descreve-se a

abordagem metodológica seguida neste trabalho e apresenta-se o corpus de programas e de

manuais escolares selecionados para análise. No capítulo 3 estabelece-se a análise

comparativa da transposição didática das teorias da origem das espécies, realizada pelos

autores de cada um dos manuais do corpo de estudo. Segue-se a discussão dos resultados,

apresentada no capítulo 4. Por fim expõem-se as reflexões finais.

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CAPÍTULO I

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1. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

1.1. EVOLUCIONISMO VS. CRIACIONISMO

Darwin, no seu livro A origem das espécies, procurou essencialmente provar que as

espécies são o resultado da evolução, por ramificações, a partir de um ancestral comum. “O

evolucionismo não se deve confundir com o darwinismo, contudo, é indubitável que Darwin

foi um dos maiores promotores da perspetiva evolucionista da origem das espécies” (Cavadas,

2010, p.31). O seu maior contributo foi propor um quadro explicativo coerente para

evolucionismo, em que a seleção natural seria o motor principal da transformação das

espécies (Avelar, 2007b). A afirmação de que as espécies não foram criadas por Deus e

permaneceram inalteradas desde então, mas são o resultado de um processo natural de

transformação das espécies pré-existentes, a que se chama evolução é uma hipótese de tal

modo corroborada que pode muito legitimamente ser considerada um facto (Abreu, 2011).

A corrente criacionista nega a origem “natural” da vida e a sua evolução posterior.

Considera a criação divina da origem das espécies, incluindo o Homem (Abreu, 2007). Os

seus defensores têm-se manifestado, de modo que em 1981 teve lugar, nos EUA, o importante

debate “Evolution vs. Creation” que registou uma grande afluência de pessoas motivadas, em

parte, pelas leis criacionistas recentemente promulgadas no Arkansas e no Louisiana. A

maioria dos participantes ficaram convenientemente esclarecidos de que a “ciência do

criacionismo” não era a tendência do futuro, por terem sido rebatidos os argumentos usados

contra a evolução (Miller, 2010). Esta nova versão de criacionismo tem sido apresentado

como “científico”, com o objetivo de fazer acreditar que é, por isso, uma alternativa válida à

evolução e deve ser ensinado nas escolas (Avelar, 2007a).

Porém, o ímpeto criacionista não terminou nesse debate. Passadas mais de duas

décadas, nos EUA, o famoso julgamento relacionado com a perspetiva do “intelligent design”,

em 2005, de Kitzmiller v. Dover evidenciou a pressão exercida pelos criacionistas no sistema

educativo americano, nomeadamente, sobre o conselho de educação de Dover1, Pensilvânia

no sentido de introduzir na escola o manual criacionista Of Pandas and People, apesar da

objeção dos professores. No entanto, essa iniciativa não teve sucesso, dado que o juiz decidiu

contra o conselho de educação (Miller, 2010), determinando não poder ensinar-se a “conceção

1 Dover Area School District (O equivalente ao conselho de administração dos liceus do distrito de Dover) que

decretou “Os estudantes serão informados dos hiatos/problemas na Teoria de Darwin, e de que há outras teorias

evolutivas, incluindo, entre outras, a concepção inteligente” (Gaspar, Avelar & Mateus, 2007, p. 148).

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inteligente” porque “a evidencia apresentada no julgamento demonstra que o ID (Intelligent

Design) (…) é uma mera designação nova para o criacionismo, e não uma teoria científica.”

(Gaspar, Avelar & Mateus, 2007, p. 149). Não obstante as campanhas para inserir o

criacionismo ou o ID nos manuais escolares serem comuns, os profissionais de ciência

aconselharam que os conselhos de educação devem resistir-lhes pois “the ideias they seek to

insert into textbooks have failed as science and therefore have no place in science education”

(Miller, 2010, p. 229).

Dado que os criacionistas não conseguiram os seus intentos, a sua iniciativa mais

recente visa insistir para que se “ensine a controvérsia”, pró-evolucionista e

contraevolucionista, e não só a evolução. Nessa linha de pensamento, em Agosto de 2005,

George W. Bush propôs que se ensinassem ambas as supostas teorias, a evolução e a

conceção inteligente, para que os estudantes pudessem compreender as suas diferenças.

Porém, essa questão não se deveria colocar honestamente, dado que a Evolução e o ID não

são duas teorias equivalentes, pois uma é científica e a outra não, nem sequer é apoiada por

nenhum cientista respeitado (Dawkins, 2006, cit. por Williams, 2008).

Embora os EUA seja um país com fortes crenças criacionistas, o criacionismo tem-se

expandido a outros países. Por exemplo, na Holanda, em 2005, a Ministra da Educação,

Cultura e Ciência tentou introduzir o criacionismo nos currículos escolares através do

argumento que incitava a “mostrar todas as teorias científicas” (Brogueira, 2009). No Reino

Unido, em 2002, verificou-se o ensino do criacionismo na Emmanuel Schools Foundation

(ESF), com um carácter religioso baseado na fé cristã e nos princípios bíblicos. Essa escola,

caracterizada como independent school, possui a possibilidade de modificar o seu currículo,

pelo que admitiu o ensino do criacionismo a par da teoria da evolução nas aulas de ciências

(Williams, 2008). Alguns anos mais tarde, em Março de 2006, um programa nacional de

estudos do ensino público do exame de ciências para a General Certificate in Secundary

Education (GCSE), continha referências ao criacionismo (Paton, 2006, cit. por Williams,

2008). Essa opção colocou, uma vez mais, o destaque na questão criacionismo/evolucionismo,

dando lugar, por parte da British Humanist Association à afirmação “ ‘controvers [ies]’ that

could be taught in science lessons are scientific ones (…)” (British Humanist Association,

2006, cit. por Williams, 2008, p.91). O seu intuito era proibir o ensino do criacionismo nas

aulas de ciências, dado que, quer o criacionismo quer o ID não são apoiados por princípios e

explicações científicas e por isso não são aceites pela comunidade científica internacional. Em

consonância com esta opinião, o próprio Primeiro-Ministro do Reino Unido na época, Tony

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Blair, referiu como exageradas as reivindicações para ensinar o criacionismo nas escolas,

afirmando “if I notice creationism become the mainstream of the education system in this

country then that’s the time to start worrying.” (Webb, 2006, cit. por Williams, 2008, p. 91).

No entanto, o certo é que a política educacional do Reino Unido determinou que o currículo

destas escolas devesse conter a teoria da evolução, mas permitiu também que se ensinassem

outras perspetivas (Gaspar, Avelar & Mateus, 2007).

Por enquanto, no caso português, segundo Gaspar, Avelar & Mateus (2007) “o

criacionismo científico não tem uma expressão muito visível em Portugal, mas insidiosamente

vai estabelecendo o seu espaço” (p.155). Disso é a prova a recente abertura de um museu

criacionista em Portugal, o Parque Discovery2, em Mafra, que promove atividades orientadas

para jovens, como visitas de estudo, seminários, etc., no seu parque temático, e tem, entre

outros, o objetivo de promover o ensino do criacionismo nas escolas portuguesas: “Queremos

ajudá-lo a introduzir o Criacionismo na sala de aula”. Os impulsionadores do parque afirmam

que “um estudo que mostre uma origem não verdadeira, produzirá um carácter deformado nos

alunos, os quais carregaram essas deformidades consigo para o futuro”3. Gaspar, Avelar &

Mateus (2007) alertam para essas iniciativas, pois os movimentos criacionistas são inimigos

do avanço do progresso civilizacional que vem da ciência e “quando [o criacionismo] se

prepara para dar o salto para o ensino e limitar mentes em desenvolvimento o problema

assume uma dimensão muito real” (p.158). Outro exemplo da tentativa de inclusão da religião

nos manuais escolares, de acordo com Gaspar, Avelar & Mateus (2007), ocorreu no 2º

colóquio4 “A religião fora dos templos” (p. 159), onde foi proposta a criação de uma comissão

com poderes para rever os manuais escolares, incluindo os de biologia. Ninguém se opôs à

proposta, incluindo o deputado Vera Jardim, que concordou que se poderiam rever os manuais

de biologia.

Portanto, constata-se que a descontinuidade e os recuos no ensino da ciência e da

evolução em particular têm sido constantes. Atualmente, a pressão dos criacionistas não se

coloca em termos de proibir o ensino da evolução, como no tempo de John Scopes, nos EUA,

no estado do Tennessee e em outros estados. Hoje, o objetivo dos criacionistas é passar a ideia

que a sua versão de criacionismo é “científica” e por isso é uma alternativa válida à evolução

e deve ser ensinada nas escolas. Aliás verifica-se que a invasão do ensino pela conceção

2 Recuperado em 15 de Outubro, 2012, de http://www.discovery.pt/PDiscovery.swf

3 Recuperado em 25 de Outubro, 2012, de http://www.discovery.pt/PDiscovery.swf (Secção “educação”)

4 Organizado pela Comissão de Liberdade Religiosa, um organismo do Estado, a 16 de Março de 2007.

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inteligente não terminou com o julgamento de Dover, pois os criacionistas continuam a

insistir para que se “ensine a controvérsia”, com sucesso, por exemplo no Reino Unido, onde

o currículo inclui o ensino da teoria da evolução simultaneamente com o ensino de outras

perspetivas criacionistas. Em Portugal, também há evidências recentes da tentativa de

inclusão da religião nos manuais escolares.

1.2. ESTUDOS SOBRE OS MANUAIS ESCOLARES E O ENSINO DAS TEORIAS DA ORIGEM

DAS ESPÉCIES

A importância do manual escolar é oficialmente reconhecida na Lei nº 47/2006, de 28

de Agosto, pois “visa contribuir para o desenvolvimento das competências e das aprendizagens

definidas no currículo nacional (…) apresentando informação correspondente aos conteúdos

nucleares dos programas em vigor” (p. 6213). Este é considerado por muitos autores como a

peça fundamental no processo de ensino/aprendizagem e na transmissão do conhecimento

científico. Essas obras são desde logo uma ferramenta de trabalho importante de caráter

didático, para o professor e para o aluno. Os manuais são também vistos como “importantes

instrumentos pedagógicos, culturais e ideológicos, contribuem para a transmissão e

consolidação de saberes assumindo um papel importante na aprendizagem de conteúdos e

métodos de trabalho” (Guimarães, 2008). Sendo assim, não surpreende que tenham sido alvo

de estudo sobre o modo como se apropriaram do conhecimento científico, nomeadamente

sobre a origem das espécies.

A nível internacional existem alguns estudos sobre a problemática da abordagem às

teorias das espécies nos manuais escolares, nomeadamente do evolucionismo. Skoog (2005)

avaliou a cobertura global da evolução, bem como a da evolução humana nos manuais de

biologia do ensino secundário dos EUA, no século XX. Concluiu que persistiram esforços,

com vários graus de intensidade e sucesso, para eliminar ou neutralizar a cobertura da

evolução, nos manuais de biologia nos EUA desde 1920 e que esta registou flutuações durante

o século XX. Por exemplo, acerca da evolução humana, antes de 1960, os manuais de biologia

davam pouco ênfase à mesma. Nomeadamente, durante o período de 1900-1919, nenhum dos

manuais analisados tinha qualquer registo sobre a evolução humana. Durante o período 1920-

1950, a cobertura da evolução variou, enquanto alguns manuais tinham poucos dados sobre a

evolução humana, apesar de válidos, outros não continham qualquer alusão. Só 44 dos 83

manuais de biologia publicados entre 1900-1968 faziam referência ao registo fóssil humano e

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somente 29 manuais em 83 apresentavam linguagem que evidenciava diretamente serem os

seres humanos produto da evolução.

Segundo o estudo sobre a cobertura da evolução nos manuais de biologia do ensino

secundário dos EUA publicados entre 1900-1977, realizado também por Skoog (1979),

algumas das forças repressoras da evolução, como a pressão exercida por grupos religiosos

organizados sobre editoras e professores, foram contornadas na década de 1960, com a

publicação do Biological Sciences Curriculum Study (BSCS), como resultado da

reformulação, por biólogos profissionais, do currículo da biologia com base em novos

objetivos, novos conteúdos para os cursos, novos autores, e novos métodos de escrever

materiais curriculares. De facto, foi dado mais ênfase à evolução na década de 1960 quando o

Biological Sciences Curriculum Study (BSCS) desenvolveu três manuais de biologia

diferentes, que deram à evolução humana uma cobertura abrangente (Skoog, 2005). A

evolução emergiu desta reconstrução como um importante tema e elemento dos manuais de

biologia. Contudo, outros manuais, evidenciando um retrocesso, a partir da década de 1960

colocaram menos ênfase na evolução. Tal não foi o resultado da diminuição de poder da

evolução, mas sim, o resultado da resposta de editores, autores, educadores e políticos aos

esforços ativos dos antievolucionistas e criacionistas para suprimir e diminuir o estudo da

evolução. Às pressões antievolucionistas, acresce o problema de escolas com projeto

educativo neutral em matéria de religião, bem como a importância de unificar ideias do estudo

da disciplina, que ao não se imporem, permitiram que determinados grupos de interesse

influenciassem e ditassem os conteúdos do currículo de biologia de uma nação.

Durante a década de 70 o conteúdo dos manuais mudou, ocorreram deleções nos

capítulos relacionados com a evolução, o que enfraqueceu ainda mais a cobertura dada à

temática (Skoog, 1984), nomeadamente sobre a evolução humana (Skoog, 2005). Em

consequência da campanha promovida pelos antievolucionistas, que transmitiram a ideia de

que a sua versão de criacionismo é “científica” e, por isso, é uma alternativa válida à evolução

e deve ser ensinada nas escolas, dois estados, o Arkansas e o Louisiana, aprovaram leis

obrigando as escolas a destinarem o mesmo tempo ao ensino do criacionismo e da evolução.

Em 1981, no Arkansas, outra lei propôs “tratamento equilibrado” da “ciência criacionista” e

da “ciência evolucionista”. Contudo, estas leis, posteriormente, em 1987, foram declaradas

anticonstitucionais (Gaspar, Avelar & Mateus, 2007, p.143).

Finalmente, na década de 90, devido às mudanças nos procedimentos da adoção de

manuais escolares nos EUA e a um maior envolvimento da comunidade científica nesse

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processo criaram-se condições para que a cobertura da evolução e da evolução humana se

tornasse bastante abrangente novamente e persistisse, não obstante esforços continuados de

interesses especiais de grupos para minimizar ou neutralizar o ensino da evolução nas escolas

públicas americanas. No final do século XX, defensores da hipótese do ID, que afirmam que o

Universo é tão complexo que deve ter sido projetado e criado por um ser inteligente,

implementaram diversas iniciativas para incluir os seus princípios nos manuais de ciências e

nas salas de aula (Skoog, 2005). Por exemplo, afirmaram que existiam “erros na evolução”

nos manuais escolares, nomeadamente no manual de biologia da autoria de Kenneth Miller e

Joe Levine’s, publicado em 1990, aquando da apresentação deste para aprovação ao Texas

State Board of Education, e apelaram para que se protegessem as crianças das escolas do

Texas dessas conceções científicas pretensamente erradas. Segundo este ponto de vista, a

evolução é vista como uma especulação não fundamentada (Miller, 2010, p.227). Todavia, a

cobertura da evolução nesse manual não foi afetada devido ao empenho de organizações

como o National Centre for Science Education (NCSE) que ajudaram a fortalecer a

determinação dos autores, apesar da pressão continuada das editoras para limitar a cobertura

da evolução nesse manual de biologia. Contudo a pressão dos criacionistas continuou, de

modo que no Alabama, em 1995, os manuais de biologia adotados nas escolas do Estado eram

obrigados a incluir uma advertência contra a “inoculação” de ideias evolutivas. Alguns anos

mais tarde, em 1999, no Kansas a evolução foi retirada dos currículos escolares (Gaspar et al.,

2007).

O século XXI trouxe um aumento na intensidade do conflito

criacionista/evolucionista nos EUA. Em 2003, por exemplo, o Texas Board of Education

requeria que os manuais de biologia respeitassem os padrões do Texas. Exigiu que as secções

da evolução fossem reescritas, nuns casos, e noutros casos, que fossem incluídas etiquetas de

advertência contra a evolução nos manuais, constando que a evolução “is a theory, not a fact,”

(Miller, 2010, p. 228). Contudo, o Texas é apenas um exemplo, entre muitos outros estados,

onde os manuais de biologia foram censurados. Em 2004, nos EUA, apenas o currículo de

ciências de três estados tinha padrões relacionados com a evolução humana: Michigan,

Indiana e Illinois. Os estados de Connecticut, North Carolina, Utah e Indiana, nunca incluíram

qualquer referência direta relacionada com a evolução humana (Skoog, 2005).

Em Espanha, a apresentação das teorias da origem das espécies nos manuais foi

estudada por Puellez Benitéz e Hernández Laille (2009). Estes investigadores classificaram os

manuais em diferentes categorias, de acordo com o modo como estes transpuseram a visão

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criacionista ou a visão darwinista sobre a origem das espécies. Concluíram que a política em

geral e, mais especificamente, a política escolar dos manuais exerceu grande influência tanto

na transmissão dos novos conhecimentos sobre a evolução, como na sua transposição

didática. Estes autores aferiram que em Espanha existiu um maior controlo ideológico

criacionista sobre os manuais escolares entre 1875 e 1881. A partir da década de 1890

proliferaram os manuais escolares abertamente darwinistas. A incorporação do darwinismo

nas escolas secundárias espanholas, no período conhecido por Alta Restauração, foi rápida,

apesar de existirem muitas resistências, o que Puellez Benitéz e Hernández Laille (2009)

associaram à tradução para espanhol “de la obra capital de Darwin” (p.82).

Complementando os dados anteriores, a investigadora, Hernández Laille (2010) na

obra Darwinismo y manuales escolares en España e Inglaterra en el siglo XIX (1870-1902),

destacou que, em Inglaterra, Darwin foi considerado como revolucionário da ciência e as suas

obras foram reconhecidas e respeitadas pela comunidade científica, apesar das críticas e

controvérsias iniciais. Aferiu também que em Inglaterra os manuais escolares darwinistas

tiveram enorme implantação no final do século XIX e nos primeiros anos do século XX.

Hernández Laille (2010) focou a importância da continuação da investigação do modo como

se introduziu a teoria de evolução de Darwin nos manuais escolares, no ensino secundário e

universitário, tanto nas escolas espanholas, como inglesas e de outros países, para se aferir das

semelhanças e diferenças ocorridas desde o século XIX até à atualidade, o que valida a

presente investigação.

Num estudo conduzido por Bellini (2006) em 12 livros didáticos brasileiros, foi

analisado o conceito de evolução, focado em aspetos como: o modo como ocorreu a passagem

do conhecimento científico para os manuais didáticos; quais as relações existentes entre os

argumentos científicos e os didáticos; e quais os problemas científicos encontrados na

passagem dos conceitos evolucionistas para os conceitos escolares. A autora concluiu,

nomeadamente quanto às teorias de Lamarck e Darwin, que os manuais referem Lamarck e

Darwin como os mentores do termo evolução, embora não o tivessem usado diretamente:

Lamarck usou o termo “transformismo” e Darwin “descendência com modificação”.

Verificou, ainda, nos textos didáticos que o nome de Lamarck estava associado,

invariavelmente, ao conceito da herança dos carateres adquiridos e lembrou que esta não foi

uma ideia original de Lamarck, mas também de muitos outros naturalistas nos séculos XVIII e

XIX quando a genética ainda não havia explicado os processos de transmissão de carateres

dos seres vivos às gerações futuras. Constatou, que o exemplo do pescoço das girafas -

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periférico da história do debate evolucionista e brevemente apresentada na obra de Lamarck

Filosofia Zoológica - foi transposto pelos sucessivos autores dos manuais. Ou seja, “os

manuais descrevem uma suposta teoria, supostas leis (transmissão dos caracteres e do uso e

do desuso), a partir de um único exemplo que se transforma em modelo novamente” (p. 24).

Notou também que os manuais abandonaram a riqueza dos detalhes observados por Lamarck

e Darwin, e as suas construções metodológicas para fornecer as explicações teóricas, pela

generalização das ideias sobre evolução.

Em Portugal, os resultados da investigação, sobre o ensino das teorias da origem das

espécies nos manuais escolares portugueses de ciências naturais, publicados entre 1859-1959,

conduzida por Cavadas (2009, 2010), mostraram que a tipologia diversificada de mecanismos

e de provas da evolução que transpuseram evidencia que uma argumentação em prol do

evolucionismo dominou o discurso dos autores dos manuais desse período. Esses manuais

apresentaram diversas explicações para a evolução das espécies, como o Lamarckismo, o

neolamarckismo, o darwinismo, o neodarwinismo, a ortogénese, o mutacionismo e o

transformismo teísta.

Falta, portanto, complementar o estudo anterior com uma análise da apresentação das

teorias da origem das espécies nos manuais mais recentes. Por outro lado, os factos aduzidos

nesta revisão teórica sobre a intenção criacionista de expurgar os manuais da perspetiva

evolucionista justificam a importância deste estudo investigativo. Assim, a análise da

expressão do evolucionismo nos manuais escolares das duas décadas anteriores pretende

contribuir para evitar a redução da expressão do evolucionismo nos manuais, ao alertar para

eventuais tentativas de diminuição dessa expressão e de inclusão da argumentação criacionista

nos programas e manuais escolares de biologia.

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CAPÍTULO II

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2. ABORDAGEM METODOLÓGICA

Este trabalho segue uma abordagem de investigação de natureza qualitativa, análoga

à usada por Cavadas (2010), e assente na técnica de análise de conteúdo por se considerar a

mais adequada ao estudo exploratório desta investigação. O objetivo consiste na análise da

evolução das teorias da origem das espécies nos manuais escolares portugueses de biologia do

ensino secundário num período de duas décadas, compreendido entre 1989-2009, com base na

análise comparativa dos manuais escolares publicados antes e depois da reforma curricular de

2001. Nesse intervalo de tempo ocorreu a publicação de dois programas de biologia, um em

1991 e outro em 2003, pelo que considerou-se suficiente para expressar a tendência da

evolução da abordagem às teorias. Por outro lado, entendeu-se a análise desse período ser

compatível com as dimensões pretendidas para este trabalho de dissertação.

Esta análise comparativa dos manuais escolares foi influenciada pelo conceito de

“transposição didática”, no sentido definido por Chevallard (1991), na medida em que se

procurou mostrar como os autores transformam os conhecimentos científicos, ou seja, o

“savoir savant” (p.15), e as linhas programáticas, isto é, o “savoir à enseigner” (p.15), sobre as

teorias da origem das espécies, em discurso textual nos manuais escolares (Cavadas, 2010, p.

37). Ao ser transposto para o ambiente escolar através das orientações curriculares, o saber

científico transforma-se em outro tipo de saber – o saber a ensinar. Este saber é organizado na

forma de conteúdos, apresentados nos programas escolares, livros didáticos e outros

materiais. Após os programas estarem consolidados, inicia-se o processo que Chevallard

(1991) designou por transposição didática interna: “lorsque les programmes sont fabriqués,

signés, et prennent force de loi, un autre travail commence: celui de la transposition

didactique interne” (Chevallard, 1991, p.37). Neste trabalho apresenta-se uma pesquisa, onde

o discurso textual dos manuais escolares é entendido como um dos possíveis mediadores

nesse processo de transposição didática interna entre os programas homologados e o saber que

será efetivamente transmitido aos alunos, o “savoir enseigné” (p. 15), pelos professores na

sala de aula. Neste sentido, para se efetuar este estudo, o design metodológico dividiu-se em

quatro fases:

i. A primeira fase, heurística, consistiu na seleção, recolha e localização da legislação

do ministério da educação, programas escolares e manuais escolares a analisar no âmbito das

publicações do período considerado para este estudo. Seguiu-se um primeiro momento

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hermenêutico, no qual, essencialmente, se localizaram os conteúdos sobre a origem das

espécies nos programas e nos manuais escolares;

ii. A segunda fase consistiu na construção da grelha de análise a partir de uma lista

de tópicos apresentada num estudo sobre a evolução em manuais escolares do ensino

secundário dos EUA (Skoog, 1979) e num estudo sobre manuais escolares do ensino

secundário portugueses (Cavadas, 2010). A grelha de análise centrou-se em três categorias de

codificação (Bogdan & Biklen, 1994). A primeira consistiu na tipologia de perspetivas ou

teorias sobre a origem das espécies apresentadas nos manuais, a qual incluiu os seguintes

tópicos: fixismo/criacionismo; evolucionismo; lamarckismo; darwinismo; e neodarwinismo.

A segunda e terceira categorias foram definidas a partir dos principais mecanismos da

evolução e argumentos do evolucionismo apresentados pelos autores dos manuais. Na

categoria mecanismos da evolução, consideraram-se como parâmetros de análise as condições

ou os processos que promovem a evolução: adaptação; hereditariedade; isolamento

geográfico; mutações; seleção natural; seleção sexual; e variabilidade. Os argumentos do

evolucionismo são as provas da evolução que constituem evidências do processo evolutivo no

passado. Os parâmetros definidos na categoria argumentos evolucionistas foram: anatomia

comparada; biogeografia; bioquímica; cariologia; citologia; embriologia; e paleontologia.

iii. A terceira fase consistiu na análise comparativa do texto e da iconografia usada

pelos autores para apresentar as teorias da origem das espécies, principalmente o

evolucionismo. Os programas escolares também foram relacionados com o conteúdo dos

manuais com o objetivo de evidenciar a profundidade com que o tema deveria ser

desenvolvido.

iv. Por fim, a quarta e última fase consistiu no registo e no tratamento dos dados

obtidos.

Acresce referir que neste trabalho se adotou a norma APA para as citações e a

referenciação bibliográfica.

2.1. CORPUS DE PROGRAMAS E DE MANUAIS ESCOLARES

No período de tempo abrangido por este estudo o Governo legislou duas reformas do

ensino secundário. Na sequência da publicação, em 1986, da Lei de Bases do Sistema

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Educativo (LBSE)5, foram contempladas um conjunto de medidas que desaguaram numa

ampla reforma do ensino básico e secundário. O novo plano de estudos do ensino secundário

foi publicado em julho de 1991 e esteve em vigor até ao ano letivo 2004/05. O seguinte foi

publicado em março de 2003 e em 2012 ainda se encontra em vigor.

Na escolha dos manuais escolares a analisar, o critério recaiu sobre os manuais mais

adotados pelas escolas, no período de estudo considerado. Para os determinar, foi contactada a

Direção Geral de Inovação Desenvolvimento Curricular (DGIDC). A DGIDC informou que

apenas dispõe da listagem dos manuais escolares mais adotados nos anos letivos de 2005 a

2012, inclusive.6 A informação disponibilizada pela DGIDC permitiu concluir que os manuais

mais adotados foram os publicados pela Porto Editora e que os segundos mais adotados foram

os publicados pela Areal Editores. Posto isto, para o período em análise anterior a 2005, em

que não há dados oficiais, utilizou-se o mesmo critério, considerando-se que os manuais mais

adotados foram os das editoras anteriormente referidas. O quadro seguinte (Quadro I) reúne

os manuais analisados.

5 Lei nº 46/86, de 14 de outubro de 1986. Diário da República, I Série, nº 237, de 14 de outubro de 1986, pp.

3067-3081. 6 A listagem disponibilizada pela DGIDC está organizada por ordem decrescente de adoções, com base na

estimativa do número de alunos registados na "Base de Dados de Manuais Escolares" do Ministério da Educação

e Ciência.

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do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

Quadro I. Corpus de programas e de manuais escolares

Programa Manuais Escolares

Ano Designação Ano Título Autores Editora

1991

Programa

de Biologia

12º ano

1995

Terra, Universo de

Vida Biologia 12ºAno

1ª Parte

Amparo Dias da Silva;

Fernanda Gramaxo;

Maria Ermelinda Santos;

Almira Fernandes Mesquita;

Ludovina Baldaia.

Porto

Editora

Bio 12

Biologia 12ºAno

Volume 1

Lídia Alves Sousa;

Mª Manuela Queiroz

Machado.

Areal

Editores

1998

Terra, Universo de

Vida

Biologia 12ºAno

1ª Parte

Amparo Dias da Silva;

Fernanda Gramaxo;

Maria Ermelinda Santos;

Almira Fernandes Mesquita;

Ludovina Baldaia.

Porto

Editora

Bio 12

Biologia 12ºAno

Volume 1

Lídia Alves Sousa;

Mª Manuela Queiroz

Machado.

Areal

Editores

2003

Programa

de Biologia

e Geologia

11ºAno

2004

Terra, Universo de

Vida

Biologia 11ºAno

1ª Parte

Amparo Dias da Silva;

Fernanda Gramaxo;

Maria Ermelinda Santos;

Almira Fernandes Mesquita;

Ludovina Baldaia;

José Mário Félix.

Porto

Editora

Biologia – 11

Biologia e Geologia

11ºAno

Osório Matias;

Pedro Martins. Areal

Editores

2008

Terra, Universo de

Vida

Biologia 11ºAno

1ª Parte

Amparo Dias da Silva;

Fernanda Gramaxo;

Maria Ermelinda Santos;

Almira Fernandes Mesquita;

Ludovina Baldaia;

José Mário Félix.

Porto

Editora

Biologia – 11

Biologia e Geologia

11ºAno

Osório Matias;

Pedro Martins.

Areal

Editores

Na escolha dos manuais, selecionaram-se as obras editadas logo após a entrada em

vigor das linhas programáticas curriculares de 1991 e de 2003, ou seja, as edições de 1995 e

de 2004, respetivamente, para aferir se ocorreram mudanças significativas nos conteúdos

sobre a evolução nos manuais publicados no âmbito dessas orientações. Foram consideradas

as primeiras edições dos manuais escolares publicadas após a sua entrada em vigência.

Também se selecionaram as obras publicadas em 1998 e 2008, para aferir se ocorreram

mudanças significativas na apresentação dos conteúdos sobre a evolução nos manuais

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

publicados no enquadramento de um mesmo programa. De seguida apresenta-se uma

fundamentação mais pormenorizada das razões que conduziram à seleção destas obras.

2.1.1. PROGRAMA DE BIOLOGIA APROVADO EM 1991 E RESPETIVOS MANUAIS

ESCOLARES.

Em 1986 foi aprovada a LBSE com a finalidade de minimizar a distância, em termos

educacionais, que separava Portugal dos países mais desenvolvidos. Esta Lei estabeleceu o

quadro de referência da reforma do sistema educativo português na última década do século

XX e o ensino obrigatório de nove anos. Conforme a LBSE (1986) estipulou, os Planos

Curriculares dos Ensinos Básicos e Secundário seriam aprovados no conselho de ministros de

1 de junho de 1989, tomando em consideração o conjunto das propostas apresentadas pela

comissão de reforma do sistema educativo e o contributo resultante do debate nacional que

suscitaram, bem como o parecer que sobre elas produziu o Conselho Nacional de Educação.

O governo através do Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de agosto de 19897, estabeleceu que a

aplicação dos planos curriculares aprovados seria feita em regime de experiência pedagógica,

e cujo processo de desenvolvimento obedeceria aos limites temporais e demais condições

organizativas a estabelecer em portaria do Ministro da Educação. Nesse Decreto-Lei, foi ainda

estabelecido no artigo 14.º:

2 - A experiência [pedagógica] referida no número

anterior:

a) Iniciar-se-á pelo 1.º ano do 1.º ciclo do ensino básico,

no ano letivo de 1989-1990, e desenvolver-se-á,

gradativamente, pelos anos seguintes, de acordo com

programação que procurará compatibilizar as exigências

pedagógicas com a disponibilidade de recursos, no

sentido da sua eficácia educativa (p.3641).

Sendo assim, no ano letivo de 1990-1991 decorreu o 1º ano de aplicação

experimental dos novos planos curriculares do 2º, 5º, e 7º anos do ensino básico e do 10º ano

do ensino secundário. De acordo com o mesmo calendário, no ano letivo de 1991-1992 e

seguintes seriam experimentados, de modo faseado, sequencial e progressivo, os programas

dos restantes anos dos ensinos básico e secundário. Após esse período experimental, os novos

programas escolares estabelecidos para o 2º e 3º ciclos do ensino básico e para o ensino

7 Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de agosto de 1989. Diário da República, I Série, n.º 198, de 29 de agosto de

1989, pp. 3638-3644.

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

secundário seriam aprovados em 1991 (Quadro II), através do Despacho n.º 124/ME/91 de 31

de julho8, do Ministro da Educação Roberto Carneiro. Deste modo, a generalização dos

planos curriculares criados ao abrigo deste Despacho ocorreu no ensino secundário no ano

letivo de 1993-94 para o 10º ano, estendendo-se progressivamente aos 11º e 12º anos em

1994-95 e 1995-96, respetivamente.

Quadro II. Programas aprovados em 1991

Programas Ciências da Terra e da Vida Biologia

Geologia

Nível de

ensino

10º e 11º anos

12º ano

Autor

Direção Geral Dos Ensinos Básico e Secundário- DGEBS

Ano de

Aprovação 1991

De acordo com plano curricular aprovado em 1991, os conteúdos sobre a evolução

das espécies constavam no programa de biologia do 12º ano. O programa de biologia do 12º

ano prescreveu que a unidade de ensino: “Diversidade e Origem das Espécies – teorias

Interpretativas” fosse abordada no primeiro capítulo do tema organizador – “Evolução,

Diversidade e Ambiente”. Os conteúdos deveriam ser apresentados na seguinte sequência:

1.1. Fixismo

1.1.1. Teorias fixistas

1.2. Evolucionismo

1.2.1. Perspetiva histórica do conceito de evolução

1.2.2. Argumentos do evolucionismo

1.2.3. Mecanismo da evolução – teorias interpretativas

1.2.4. População como unidade evolutiva

1.3. Evolução das populações e formação das novas espécies9

1.3.1. Populações em equilíbrio - princípio de Hardy-Weinberg

1.3.2. Especiação

1.3.3. Ancestrais do Homem — a emergência da espécie humana.

Em conformidade com a calendarização da implementação do programa de 1991, as

primeiras edições dos manuais de biologia do 12º ano surgiram apenas em 1995. Em

consequência, o manual da Porto Editora designado Terra, Universo de Vida – Biologia 12º

8 Despacho n.º 124/ME/91, de 31 de julho. Diário da República, II Série, n.º 188, de 17 de agosto de 1991, p.

8390. 9 Segundo o programa, poder-se-ia considerar, em opção, o subtema “Evolução das Populações e Formação de

Novas Espécies” e o tema “Biologia do Ambiente”.

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

ano, elaborado por Amparo Dias da Silva, Fernanda Gramaxo, Maria Ermelinda Santos,

Almira Fernandes Mesquita e Ludovina Baldaia, foi publicado em 1995. Organizou-se em

duas partes e contemplou o estudo das teorias da origem das espécies na 1ª parte. De igual

forma, as autoras Lídia Alves Sousa e Mª Manuela Queiroz Machado, no manual Bio 12 –

Biologia 12ºano, publicado pela Areal editores no mesmo ano e constituído por dois volumes,

abordaram as teorias interpretativas da origem das espécies no volume I.

Dado que na implementação dos novos programas se evidenciaram desajustamentos

e insuficiências, designadamente quanto à extensão e à excessiva vertente “academista e

enciclopedista", e com o intuito de responder às dificuldades manifestadas pelas escolas e

professores, o Departamento do Ensino Secundário (DES) procedeu à edição das Orientações

de Gestão de Programas (OGP). Essas orientações foram distribuídas às escolas para

aplicação no ano letivo de 1996-97, e continham, para cada programa, uma seleção dos

objetivos e conteúdos considerados essenciais. De acordo com as OGP, o programa de

biologia do 12º ano prescreveu que a unidade de ensino: “Diversidade e Origem das Espécies

– teorias Interpretativas”, fosse abordada no primeiro capítulo do programa integrado no tema

organizador “Evolução, Diversidade e Ambiente”. Essa temática difere da do programa de

1991, por não incluir os seguintes temas: Populações em equilíbrio - princípio de Hardy-

Weinberg e Ancestrais do Homem — a emergência da espécie humana.

Assim, os manuais da Porto Editora e Areal Editores, editados em 1998,

apresentaram-se em edições revistas de acordo com as OGP. Sendo assim, neste trabalho de

investigação considerou-se pertinente também analisar as obras publicadas após essas

orientações, com o intuito de aferir se ocorreram mudanças significativas no seu conteúdo

sobre as teorias da origem das espécies. Não obstante essas orientações, a transposição

didática do tema “Diversidade e Origem das Espécies - Teorias Interpretativas” foi realizada

no primeiro capítulo dos manuais de Silva et al. e de Sousa e Machado tanto nas edições de

em 1995 como nas de 1998.

2.1.2. PROGRAMA DE BIOLOGIA E GEOLOGIA HOMOLOGADO EM 2003 E RESPETIVOS

MANUAIS ESCOLARES

Em dezembro de 2002, na sequência da mudança da equipa governativa, foram

divulgados e colocados à discussão pública os primeiros documentos sobre a Reforma do

Ensino Secundário, intitulados Linhas Orientadoras da Revisão Curricular, Caracterização

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

dos Percursos Educativos e Formativos de Nível Secundário – Tópicos e Elementos de

Reflexão e Regulamento de Estágio dos Cursos Tecnológicos. A versão definitiva destes

documentos, ajustada após a análise dos contributos dos diversos intervenientes na discussão

pública, foi publicada em 10 de abril de 2003 sob o título Reforma do Ensino Secundário,

dando origem ao Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março10

e respetiva regulamentação.

Os planos de estudo dos novos cursos científico-humanísticos e dos cursos

tecnológicos criaram novas disciplinas, obrigaram ao reajustamento de outras e à publicação

dos respetivos programas escolares. Neste novo plano curricular a disciplina de Biologia e

Geologia foi inserida no tronco comum da componente de formação específica do Curso

Geral de Ciências Naturais. Tornou-se uma disciplina bienal (10º e 11º anos), conforme

estabelecido nos Princípios Orientadores da Revisão Curricular do Ensino Secundário, sendo

cada uma das suas áreas científicas lecionadas em cada um dos semestres, e com igual

extensão, com o objetivo de alcançar uma situação de equilíbrio. Quanto aos programas, o

Ministério da Educação homologou, em 26 de setembro de 2001, o programa para a disciplina

de Biologia e Geologia do 10.º ou 11.º ano do Curso Científico- Humanístico de Ciências e

Tecnologias11

. Dois mais tarde, em 3 de abril de 2003, foram homologados os programas para

a disciplina de Biologia e Geologia do 11.º ou 12.º ano, do mesmo Curso. Por fim, em 11 de

outubro de 2004, deu-se a homologação do programa para a disciplina de Biologia do 12.º ano

de escolaridade do Curso Científico-Humanístico de Ciências e Tecnologia. Estes programas

apresentam-se no quadro seguinte (Quadro III).

10

Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março. Diário da República, I Série- A, n.º73, de 26 de março de 2004, pp.

1931-1942. 11

Recuperado em 25 de Outubro de http://www.dgidc.min-

edu.pt/ensinosecundario/index.php?s=directorio&pid=2&letra=B (Secção Programas e Orientações

Curriculares).

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do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

Quadro III. Programas de Biologia e Geologia do 10º e 11º anos e de Biologia 12º ano

Programas Biologia e Geologia Biologia

Nível de ensino 10º ou 11º anos 11º ou 12º anos 12º ano

Autores

Componente de Biologia

Alcina M. P. Mendes

(Coordenadora)

Dorinda Rebelo

Eduardo Pinheiro

Componente de Geologia

Filomena Amador

(Coordenadora)

Carlos Perdigão Silva

José Fernando Pires Baptista

Rui Adérito Valente

Alcina M. P. Mendes

(Coordenadora)

Dorinda H. V. Rebelo

Eduardo J. G. Pinheiro

Colaboradores

Ilda S. Sanches

Jorge M. Cunha

Data de

homologação

26/09/2001 03/04/2003 11/10/2004

A origem das espécies é abordada no programa de biologia do 11º ano, na Unidade 7

– Evolução Biológica, e pretende responder à Questão Central “Como é que a Ciência e a

Sociedade têm interpretado tão grande diversidade?”. Contempla os seguintes tópicos:

2. Mecanismos de evolução

2.1 Evolucionismo vs. Fixismo

2.2 Seleção natural, seleção artificial e variabilidade (p.11).

Para analisar a transposição do programa de 2003 para os manuais, procedeu-se ao

estudo das obras de Silva et al. - Terra, Universo de Vida, Biologia 11ºano, edições de 2004 e

2008, da Porto Editora, e das obras de Osório Matias e Pedro Martins, da Areal Editores –

Biologia 11, Biologia e Geologia 11ºano das mesmas edições, 2004 e 2008. A “Evolução

Biológica” é explorada no terceiro capítulo dos manuais. Considerou-se que um período de

quatro anos seria suficiente para ocorrerem mudanças na transposição didática das teorias da

origem das espécies entre os manuais elaborados de acordo com o mesmo programa.

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

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CAPÍTULO III

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do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

3. ANÁLISE DA TRANSPOSIÇÃO DAS TEORIAS DA ORIGEM DAS ESPÉCIES

PARA OS MANUAIS DE BIOLOGIA PORTUGUESES

Neste capítulo apresenta-se a análise comparativa da transposição didática das teorias

da origem das espécies, realizada pelos autores de cada um dos manuais do corpo de estudo.

O Quadro IV sintetiza as perspetivas ou teorias da origem das espécies, os mecanismos de

evolução e os argumentos do evolucionismo apresentados nos manuais analisados.

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

Quadro IV. Perspetivas ou teorias da origem das espécies, mecanismos de evolução e argumentos do evolucionismo apresentados em manuais de biologia do ensino

secundário

Programas 1991 2003

Manuais

Terra,

Universo de

Vida

Biologia

12ºAno

Porto Editora

Terra,

Universo de

Vida Biologia

12ºAno

Porto Editora

Bio 12

Biologia

12ºAno

Areal

Editores

Bio 12

Biologia

12ºAno

Areal

Editores

Terra,

Universo de

Vida

Biologia

11ºAno

Porto Editora

Terra,

Universo de

Vida

Biologia

11ºAno

Porto Editora

Biologia -11

Biologia

11ºAno

Areal Editores

Biologia -11

Biologia

11ºAno

Areal Editores

Autores Silva et al. Silva et al. Sousa e

Machado

Sousa e

Machado

Silva et al. Silva et al. Matias e

Martins

Matias e

Martins

Ano de publicação 1995 1998 1995 1998 2004 2008 2004 2008

3.1. Perspetivas ou Teorias da Origem

das Espécies

3.1.1. Fixismo/Criacionismo √ √ √ √ √ √ √ √ 3.1.2. Evolucionismo √ √ √ √ √ √ √ √ 3.1.3. Lamarckismo √ √ √ √ √ √ √ √ 3.1.4. Darwinismo √ √ √ √ √ √ √ √ 3.1.5. Neodarwinismo √ √ √ √ √ √ √ √ 3.2. Mecanismos de Evolução 3.2.1. Adaptação √ √ √ √ √ √ √ √ 3.2.2. Variabilidade √ √ √ √ √ √ √ √ 3.2.3. Hereditariedade √ √ √ √ √ √ √ √ 3.2.4. Mutações √ √ √ √ √ √ √ √ 3.2.5. Seleção natural √ √ √ √ √ √ √ √ 3.2.6. Seleção sexual - - √ √ - - - - 3.2.7. Isolamento geográfico √ √ √ √ - - - -

3.3. Argumentos do Evolucionismo 3.3.1. Anatomia comparada √ √ √ √ √ √ √ √ 3.3.2. Paleontologia √ √ √ √ √ √ √ √ 3.3.3. Embriologia √ √ √ √ - - √ √ 3.3.4. Biogeografia √ √ √ √ - - √ √ 3.3.5. Citologia √ √ √ √ √ √ - - 3.3.6. Bioquímica √ √ √ √ - √ √ √ 3.3.7. Cariologia - - √ √ - - - -

√ Presença - Ausência

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

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3.1. PERSPETIVAS OU TEORIAS DA ORIGEM DAS ESPÉCIES

Da análise do Quadro IV constata-se que as teorias da origem das espécies foram

transpostas por todos os manuais em estudo. O mesmo ocorreu com os mecanismos de

evolução, com exceção do isolamento geográfico que esteve presente apenas nos quatro

manuais editados sob a vigência do programa de 1991, e da seleção sexual, que somente foi

transposta apenas por Sousa e Machado (1995, 1998). Aliás, as obras destes autores foram as

que contemplaram a transposição de todos os itens analisados.

Quanto aos argumentos do evolucionismo foram transpostos em todos os manuais de

1995 e 1998, exceto a cariologia que só foi transposta por Sousa e Machado (1995, 1998). Os

autores de todos os manuais publicados pós-programa de 2003 transpuseram a anatomia

comparada e a paleontologia e nenhum apresentou a cariologia. Os argumentos embriológicos

e biogeográficos não foram transpostos por Silva et al. (2004, 2008) e os citológicos por

Matias e Martins (2004, 2008). Por fim, as evidências da bioquímica unicamente não foram

referidas por Silva et al. (2004).

De seguida, apresenta-se uma análise comparativa da transposição didática de cada

um dos itens considerados no Quadro IV.

3.1.1. FIXISMO/CRIACIONISMO

Em todos os manuais é referido que durante muitos séculos a hipótese criacionista foi

comummente aceite e a grande variedade das espécies animais e vegetais explicada como

sendo o resultado de uma criação divina. Ao considerar que as espécies são permanentes,

perfeitas e que não sofrem evolução, mantendo-se fixas e imutáveis na sua forma ao longo

dos tempos, os autores dos manuais classificaram a hipótese criacionista como fixista. Silva et

al. referiram os postulados que constituem a base da “conceção criacionista” da origem das

espécies que, sendo uma teoria fixista, considera que as espécies são imutáveis, pois assume

“como a criação inicial foi completa e perfeita, nada mais surgiu ou desapareceu” (1995, p.14;

1998, p. 16). Mencionaram que duas crenças fixistas em particular povoaram as Ciências

Naturais:

Para os Teólogos, como resultado de uma interpretação

“à letra” do livro do Génesis, “as formas animais e

vegetais foram criadas por Deus num momento único da

criação e, porque Deus era perfeito todo o Seu trabalho

tinha sido perfeito”; Para os Filósofos “perfeição

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

implicava estabilidade. Coisas perfeitas e divinas não

mudam” Ao que se associa a ideia de que depois de Deus

ter criado as primeiras espécies perfeitas elas

mantiveram-se fixas para todo o sempre” (1995, p.13;

1998, p.16).

A abordagem ao fixismo realizado por Silva et al. nos dois manuais publicados pós-

programa 2003 revelou ser coincidente. De forma geral, associaram o fixismo a princípios

religiosos e definiram-no da seguinte forma: “as espécies surgiram tal como hoje as

conhecemos e mantiveram-se imutáveis ao longo do tempo e das gerações, permanecendo

independentes quanto à sua origem” (2004, p. 123; 2008, p. 120). Todavia, no manual

publicado em 2008, Silva et al. distinguiram fixismo de criacionismo, sendo que este admite

que as espécies surgiram “de um ato único de criação divina” (p.120). Já no manual publicado

em 2004, Silva et. al. não referiram explicitamente o conceito criacionismo, indicando, no

entanto, que o pensamento científico até aos séculos XVIII e XIX foi influenciado pela

“interpretação à “letra” do livro do Génesis, onde se descreve a criação no início dos tempos”

(p. 123). Matias e Martins (2004 e 2008) também definem fixismo e criacionismo à

semelhança dos outros autores.

De forma geral, o fixismo foi apresentado como um modelo explicativo da origem

das espécies numa perspetiva da história da ciência, em consonância com o programa de

Biologia - 12º ano homologado em 1991 que propunha, como objetivo no subtema “fixismo”,

que os alunos reconhecessem a influência de filósofos da antiguidade clássica na cultura e

pensamentos das civilizações ocidentais. De acordo com essa indicação, para este conteúdo

programático - teorias fixistas, os manuais propuseram a resolução de algumas questões a

partir da análise e interpretação de figuras e/ou textos sobre: “a origem da vida e evolução”

(Sousa & Machado, 1995, 1998) e “Diversidade das espécies” e “Teoria da geração

espontânea” (Silva et al., 1995, 1998). Quer nos manuais de Silva et al. (1995, 1998) como

nos de Sousa e Machado (1995, 1998) encontram-se referências à influência de Platão e de

Aristóteles, o que mostra que a transposição didática interna está de acordo com as

orientações do programa de 1991. Aliás, de todos os manuais analisados somente os de Silva

et al. (2004, 2008) não contêm quaisquer referências a estes filósofos. O programa de 1991

ainda prescreveu que aquando do estudo do subtema “fixismo” deviam ser explorados os

termos/conceitos: “criacionismo” e “geração espontânea”. A análise dos manuais mostrou que

o conceito de geração espontânea, associado ao de fixismo para explicar a origem das

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

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espécies, foi abordado em todos os manuais publicados no âmbito do programa de 1991

(Silva et al., 1995, 1998; Sousa & Machado, 1995, 1998).

Já no programa do ensino secundário de Biologia e Geologia homologado em 2003 o

“fixismo” é referido como conceito/palavra-chave a abordar. O fixismo foi distinguido de

criacionismo e apresentados pelo seu interesse histórico, como teoria explicativa da

biodiversidade e origem das espécies nos manuais analisados, publicados em 2004 e 2008, no

enquadramento da resposta a certas questões que, como o programa sugere, devem orientar as

atividades de pesquisa e discussão a ser organizadas, como por exemplo: “Como explicar a

diversidade dos seres vivos?”; “De que modo esta diversidade variou ao longo do tempo?”;

“Que interpretações têm sido avançadas?”. Contudo, Matias e Martins ressalvaram que “ainda

hoje não existe consenso relativamente à origem da diversidade dos seres vivos. Todavia, as

teorias evolucionistas reúnem uma maior aceitação, conforme se concluirá no final do

capítulo” (2004, p. 120; 2008, p. 142). De facto, nos manuais de Silva et al. (2004, 2008) a

abordagem ao fixismo é muito breve e superficial, ou seja, o evolucionismo é dado assente, o

que está em consonância com o programa de 2003 quando prescreveu o seguinte conteúdo

procedimental: “recolher, organizar e interpretar dados de natureza diversa relativos ao

evolucionismo e aos argumentos que o sustentam, em oposição ao fixismo” (p. 11).

3.1.2. EVOLUCIONISMO

Enquanto no programa de Biologia e Geologia do 11º ano de 2003 o destaque é

colocado na abordagem do evolucionismo em oposição ao fixismo (“Evolucionismo vs

fixismo”), o programa de Biologia e Geologia - 12º ano de 1991 foca a perspetiva histórica do

conceito de evolução no subtema “evolucionismo”. Não obstante esses diferentes enfoques,

todos os autores afirmam que é no século XIX que se transita para uma visão evolucionista.

Nomeadamente, Silva et al. referem “de uma visão da natureza imutável regida por princípios

fixos vai transitar-se naturalmente ao longo do tempo para uma ideia de uma natureza variável

regida por outros princípios” (1995, p.16; 1998, p. 17), que são princípios de mudança que se

impõem nomeadamente devido ao desenvolvimento da paleontologia e da geologia,

contribuindo o estudo pormenorizado dos fósseis e, paradoxalmente, o estudo das espécies

atuais para o abandono do fixismo, como é referido em todos os manuais. Sousa e Machado

(1995, 1998), na mesma linha de pensamento, referem que nesse século é a ideia da

transformação das espécies que se começa a implantar e Silva et al. (2004, 2008) acrescentam

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

que essa transição é feita num ambiente de grande controvérsia, isto é, vai admitir-se que as

espécies se alteram de forma lenta e progressiva ao longo do tempo, originando outras

espécies.

Silva et al. (1995) iniciam a abordagem à perspetiva histórica do conceito de

evolução com uma síntese da história da ciência, intitulada “A ideia da evolução não é obra de

um só homem” (p. 13), onde é feita alusão ao contributo de diversos homens para a ideia de

evolução na época em que viveram, numa perspetiva cronológica, sendo apresentados os seus

retratos legendados com a ideia que sintetiza as suas conceções. O quadro seguinte resume os

naturalistas em que os autores dos manuais se apoiaram para fundamentar as perspetivas da

origem das espécies (Quadro V).

Quadro V. Pioneiros do pensamento evolucionista referidos nos manuais escolares

Programa 1991 2003

Manuais

Escolares

Terra,

Universo

de Vida

Biologia

12ºAno

Porto

Editora

Terra,

Universo

de Vida

Biologia

12ºAno

Porto

Editora

Bio 12

Biologia

12ºAno

Areal

Editores

Bio 12

Biologia

12ºAno

Areal

Editores

Terra,

Universo

de Vida

Biologia

11ºAno

Porto

Editora

Terra,

Universo

de Vida

Biologia

11ºAno

Porto

Editora

Biologia

– 11

Biologia

11ºAno

Areal

Editores

Biologia

– 11

Biologia

11ºAno

Areal

Editores

Autores Silva et

al.

Silva et

al.

Sousa e

Machado

Sousa e

Machado

Silva et

al.

Silva et

al.

Matias e

Martins

Matias e

Martins

Ano de

publicação

1995

1998

1995

1998

2004

2008

2004

2008

Natu

rali

stas

Buffon

√ √ √ √ - - √ √

Cuvier

√ √ √ √ - - √ √

G.de Saint-

Hilaire √ √ - - - - - -

Hutton

√ √ √ √ - - √ √

Maupertuis

√ √ √ √ - - √ √

√ Presença

O programa de 1991 para este conteúdo propunha como objetivo “Identificar o

catastrofismo de Cuvier como tentativa de reconciliação da história dinâmica traduzida pelo

registo fóssil com o princípio da imutabilidade das espécies” (p. 85). Para tal, recomendava

como sugestões metodológicas: “mencionar como pioneiros do pensamento evolucionista

Maupertuis (1698-1759), Buffon (1707-1788) e G. de Saint-Hilaire (1772-1844). De facto, da

- Ausência

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do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

análise dos manuais publicados, sob a vigência do programa de 1991, constata-se que tanto

Silva et al. (1995, 1998), como Sousa e Machado (1995, 1998) transpuseram as conceções de

Cuvier, Maupertuis, Buffon e de Hutton, sendo o pensamento de G. de Saint-Hilaire, somente

transposto por Silva et al. (1995, 1998). No caso dos manuais sob a vigência do programa de

2003, verifica-se que as conceções de Cuvier, Maupertuis, Buffon e Hutton, somente foram

transpostas por Matias e Martins (2004, 2008).

Em todos os manuais analisados, à exceção de Silva et al. (2004, 2008) que não

fizeram a transposição didática da perspetiva histórica do conceito de evolução12

, é feita ainda

alusão aos contributos de Lineu, visto que os dados recolhidos por este naturalista para apoiar

o criacionismo acabaram por constituir o embrião das ideias evolucionistas, pois “o

estabelecimento das semelhanças entre indivíduos suscita naturalmente a dúvida acerca de

uma possível origem comum” (Silva et al. 1995, p. 17; 1998, p.19). Também foi apresentada

a teoria do catastrofismo ou teoria das criações sucessivas, elaborada por George Cuvier. Esta

teoria não se opõe ao criacionismo, pois considera que “todas as formas são criadas e

estáticas” (Silva et al. 1995, p.17; 1998, p.20), mas avança uma explicação para tentar

conciliar o fixismo com as diferenças encontradas entre a fauna e a flora atuais e as

observadas nos registos fósseis. Silva et al. ainda referiram que Buffon admite uma conceção

transformista da natureza “considerando-a ativa, capaz de construir e modificar as estruturas

vivas ao longo do tempo geológico” (1995, p.17; 1998, p.20). Por seu lado, Sousa e Machado

(1995, 1998) e Matias e Martins (2004, 2008) também expressaram a crença evolucionista de

Buffon de que é a seleção provocada pelo meio o agente causador da transformação dos seres

vivos: “as espécies menos perfeitas, mais delicadas, menos activas, menos armadas, já

desapareceram ou vão desaparecer” (Sousa & Machado, 1995, p. 16; Sublinhado no

original). As suas ideias, de que as espécies derivavam umas das outras por degeneração e que

essa transformação era lenta e progressiva, existindo espécies intermédias até às formas

atuais, correspondem a uma conceção evolucionista e integra-se nas perspetivas históricas,

pois assumem um importante papel no longo processo que conduziu à implantação do

evolucionismo, como uma das primeiras explicações para o fenómeno evolutivo. Para

aprofundar esse assunto, Sousa e Machado (1995, 1998) e Matias e Martins (2004, 2008)

12

A transposição didática da “perspetiva histórica do conceito de evolução” apenas é prescrita no programa de

Biologia e Geologia - 12º ano de 1991, no subtema “evolucionismo” (p. 85). Apesar dessa perspetiva não ser

prescrita diretamente no programa de biologia para o 11.º ano de 2003, Matias e Martins (2004, 2008) tomaram-

na em consideração na elaboração dos respetivos manuais.

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

propuseram uma atividade de exploração de um excerto de um texto de Buffon intitulado

“Conceção transformista de Buffon”, orientada pela colocação de questões-problema.

Silva et al. (1995, 1998) e Sousa e Machado (1995, 1998) transpuseram a conceção

transformista de Maupertuis de modo similar, explicitando Silva et al. (1995, 1998) que

engloba o conceito atual de mutação. Sousa e Machado (1995, 1998) acrescentaram que

segundo a perspetiva de Maupertuis:

os seres vivos resultavam de uma selecção causada pelo

ambiente. Os seres vivos incapazes de se adaptarem eram

eliminados. (…) as espécies resultariam de ‘produções

fortuitas’, em relação às que lhe deram origem. ‘Cada

grau de erro teria originado nova espécie’ (Sousa &

Machado, 1995, p. 15; Sublinhado no original).

Todavia, foram Sousa e Machado (1995, 1998) quem mais desenvolveu as ideias

transformistas de Maupertuis sobre a origem das espécies, ao proporem uma atividade de

exploração de um texto13

com colocação de questões. No manual de Silva et al. (2004, 2008)

não foi feita alusão às suas ideias e Matias e Martins (2004, 2008) traduzem somente a ideia

de que Maupertuis estava convicto que os seres vivos resultavam de uma seleção provocada

pelo ambiente cabendo às variações espontâneas a “infinita variedade de animais que hoje

vemos” (2008, p. 146). Contudo, refeririam que estas ideias não tiveram aceitação na época.

Em todos os manuais, com exceção de Silva et al. (2004, 2008), encontram-se

referências à Teoria do Uniformitarismo de Hutton, nomeadamente aos princípios dessa

teoria, retomada e desenvolvida por Charles Lyell.

A nível iconográfico, apenas Silva et al. (2004, 2008) apresentam figuras com

exemplos da origem/evolução de diferentes espécies, segundo a perspetiva fixista e a

perspetiva evolucionista. Enquanto Silva et al. (2004) esquematizam a evolução em bactérias,

organismo unicelular, fungo, planta e animal, segundo a perspetiva fixista e a evolucionista,

Silva et al. (2008) apresentam um exemplo específico da origem do atual género Equus,

representado na figura1.

13

Maupertuis, 1750, “Essai de Cosmologie”, in L’evolution des espèces.

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Isabel Bento - A Evolução das Teorias da Origem das Espécies nos Manuais Escolares Portugueses de Biologia

do Ensino Secundário entre 1989-2009

40

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Faculdade de Engenharia e Ciências Naturais

Fig. 1. Ilustração esquemática da origem do atual género Equus, na perspetiva fixista e na perspetiva

evolucionista.

3.1.3. LAMARCKISMO

A transposição do Lamarckismo foi realizada de forma semelhante por todos os

autores. Entre essas semelhanças destaca-se o facto de mencionarem que Lamarck forneceu a

primeira explicação para a evolução das espécies com uma argumentação científica válida,

embora frágil, dai ser atualmente referido apenas pelo seu interesse histórico. Evidenciaram

que Lamarck reconheceu que a evolução envolve a interação entre os organismos e o seu

ambiente, ou seja, as mudanças ambientais, atuando sobre os organismos, criando nestes

novas necessidades, provocariam a sua transformação; as estruturas ou atitudes adquiridas

seriam, ao fim de algum tempo, herdadas pelos descendentes. Todos os autores expressaram

as ideias de Lamarck para explicar a existência de evolução resumidas em dois princípios

fundamentais: a Lei do uso e desuso e a Lei da herança dos caracteres adquiridos.

Silva et al., de modo consentâneo com os outros autores, abordaram as ideias

Lamarckistas referindo que as modificações no organismo que levam à adaptação são

explicadas pela lei do uso e do desuso, segundo a qual “se um órgão é muito utilizado

desenvolve-se, tornando-se mais forte, vigoroso ou de maior tamanho (…). Se, pelo contrário,

não se usa, degenera e atrofia” (1995, p.21; 1998, p.24). Afirmaram, ainda, que de acordo

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com a lei da herança dos caracteres adquiridos “as modificações que se produzem nos

indivíduos ao longo da sua vida, como consequência do uso ou do desuso dos órgãos, são

hereditárias, originando mudanças morfológicas no conjunto da população” (1995, p.21;

1998, p.24). Todavia, Matias e Martins (2004, 2008) destacaram-se por terem decidido

apresentar as conceções de Lamarck esquematizadas, como mostra a Fig. 2, de modo a

facilitar a sua compreensão pelos alunos:

Fig. 2. Conceções de Lamarck esquematizadas.

Ainda se constatou que em todos os manuais analisados, os autores optaram por

incluir uma atividade sobre o Lamarckismo, assim como exemplos concretos das leis

Lamarckistas: o alongamento do pescoço da girafa causado pelo esforço de alimentação das

folhas de ramos altos (Silva et al., 1998, 2004, 2008; Sousa & Machado, 1995, 1998), e

também Silva et al. (1995) e Matias e Martins (2004, 2008), aquando do estabelecimento do

confronto Lamarckismo/Darwinismo; o alongamento do pescoço dos flamingos causado pela

necessidade de obterem alimento (Silva et al., 1995); a formação da membrana interdigital nas

patas das aves palmípedes, em resultado da necessidade de nadar (Sousa & Machado, 1995,

1998; Matias & Martins, 2004, 2008); o alongamento do corpo e o atrofiamento dos membros

das serpentes provocado pela reptação (Silva et al., 2004, 2008); e a origem dos catos, em

resultado da necessidade de conservar água (Matias & Martins, 2004, 2008).

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Também a nível iconográfico subsistem algumas diferenças pontuais dado que em

todos os manuais são apresentados retratos de Lamarck cuja legenda indica dados biográficos

do naturalista, exceto em Matias e Martins (2004) que só inclui o seu retrato e Silva et al.

(2008) que não o apresenta.

Todos os manuais são consensuais quanto ao Lamarckismo não ter tido aceitação na

época, devido ao seu modelo explicativo conferir “à evolução uma intenção, ou objetivo,

ocorrendo alterações como resultado das espécies procurarem o «melhor» ” (Silva et al. 1998,

p. 24) e à lei dos caracteres adquiridos não ser válida, pois a atrofia ou hipertrofia de uma

estrutura adquirida durante a vida do ser vivo não é transmitida à descendência. Contudo,

Matias e Martins (2004 e 2008) acrescentaram, ainda como crítica apontada ao Lamarckismo,

o facto da lei do uso e do desuso, embora válida para alguns órgãos, como, por exemplo os

músculos, não explicar todas as modificações orgânicas. Expressam a ideia de que atualmente

é apenas recordada pelo seu interesse histórico por ter sido a primeira teoria científica, embora

com uma argumentação frágil sobre a evolução das espécies, e, também, tal como acentuam

Silva et al. (1995, 1998), por ter reconhecido que a evolução envolve interações entre os

organismos e o seu ambiente. Em suma, a força do fixismo, defendido por Cuvier, a

argumentação pouco consistente de Lamarck, e ainda, como acrescentam Matias e Martins

(2004 e 2008), a natural resistência à mudança que caracteriza o homem mantiveram as ideias

evolucionistas afastadas durante aproximadamente meio século.

3.1.4. DARWINISMO

A transposição do Darwinismo foi realizada de forma semelhante por todos os

autores, na medida em que referiram, como fundamentos do Darwinismo: a influência da

Geologia; a influência da biogeografia; o papel do Malthusianismo; e a seleção artificial.

Salientaram, ainda, a relevância da seleção artificial, que permitiu a Darwin compreender que

recorrendo a cruzamentos controlados era possível selecionar um conjunto de características

desejadas. Como as populações sujeitas à seleção artificial, ao fim de algumas gerações,

apresentavam características significativamente diferentes das presentes nas populações

originais, isso conduziu Darwin a admitir a existência da seleção natural, na natureza, por

analogia com a seleção artificial.

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Em todos os manuais é sistematizado e apresentado o conteúdo da teoria da seleção

natural, segundo o raciocínio estabelecido por Darwin, e que se resume, segundo Matias e

Martins nos seguintes princípios fundamentais:

- “Os indivíduos de uma determinada espécie apresentam variabilidade das suas

características (cor, forma, tamanho);

- As populações têm tendência a crescer segundo uma progressão geométrica,

produzindo mais descendentes do que aqueles que acabam por sobreviver;

- Entre os indivíduos de uma determinada população estabelece-se uma luta pela

sobrevivência, devido à competição pelo alimento, pelo espaço e outros fatores

ambientais. Assim, em cada geração, um número significativo de indivíduos é

eliminado;

- Ao longo de gerações, a Natureza seleciona os indivíduos mais bem adaptados às

condições ambientais, ocorrendo a sobrevivência dos mais aptos; e

- A reprodução diferencial permite, assim uma lenta acumulação de determinadas

características que, ao fim de várias gerações, conduz ao aparecimento de novas

espécies.” (2004, p. 133; 2008, p. 154; Sublinhado no original).

Todos os manuais elaborados por Silva et al. referem que apesar das lacunas

deixadas pelas explicações de Lamarck e de Darwin, a ideia de evolução estabeleceu-se na

comunidade científica. No entanto, nos manuais de 2004 e 2008 não avançaram quaisquer

exemplos concretos das lacunas apontadas, enquanto nos de 1995 e 1998 focaram o

desconhecimento de Darwin sobre os mecanismos hereditários. Matias e Martins (2004 e

2008) e Sousa e Machado (1995, 1998) referiram ainda, como crítica, que Darwin nunca

conseguiu explicar a razão para as variações entre indivíduos de uma população. Estes

últimos autores foram os únicos que, em seção própria, mais desenvolveram as críticas ao

Darwinismo, especificando “Darwin admite que o meio desempenha um determinado papel

no aparecimento dessa variabilidade. Contudo, refere que não deve ser o único fator

responsável pelas diferenças existentes nos seres vivos” (Sousa & Machado, 1998, p. 60).

Todavia a não referência a outros fatores deve-se ao facto da biologia estar pouco

desenvolvida na época. Só mais tarde, com o desenvolvimento da citologia, genética e

paleontologia, surgiram novos esclarecimentos sobre o modo de funcionamento dos

mecanismos evolucionistas e das suas provas. Isso explica também que Darwin não tenha

esclarecido, convenientemente, o modo como se processa a transmissão das características

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hereditárias aos descendentes e porque surgem características desfavoráveis ao fim de

algumas gerações.

Todos os manuais, com exceção de Sousa e Machado (1995, 1998) e Silva et al.

(2008) referem a controvérsia sociocientífica que a publicação do livro A origem das espécies

(Darwin, 2009) desencadeou na comunidade científica e na sociedade. Silva et al. (1995,

1998) apresentaram o que Huxley, a propósito das críticas dirigidas a Darwin, refere em sua

defesa:

Foi mal recebido pela geração à qual primeiro se destinou

(…) Mas provavelmente, qualquer geração comportar-se-

á tão mal como esta se aparecer outro Darwin e lhe

impuser o que a generalidade da espécie humana mais

detesta - a necessidade de rever as suas convicções.

(Silva et. al., 1995; pp. 27-28).

Conforme afirmam Avelar, Matos e Rego (2004), “o problema não estava só no facto

de Darwin apresentar uma teoria evolutiva: o seu mecanismo evolutivo era totalmente

materialista” (p. 38). A esse respeito, Silva et al. (1995, 1998, 2004) salientam que a aceitação

da teoria de Darwin associava-se a uma visão do mundo vivo puramente materialista. Por

isso, Silva et al. (1995 e 1998) mencionam que a igreja questionou as ideias de Darwin, pois

nesta perspetiva “a matéria seria o suporte de toda a existência e os fenómenos mentais e

espirituais seriam seus produtos” (Silva et al.,1998, p.35). Todavia, segundo Avelar, Matos e

Rego (2004) “uma ou duas décadas após a publicação de A Origem das Espécies deixou de

ser considerado cientificamente válido invocar explicitamente a intervenção divina” (pp. 47-

48), havendo referências a “forças vitais”, mas já não diretamente ao criador. Nessa

renovação de ideias, A Origem das Espécies teve um papel fundamental, o que tem sido muito

pouco notado explicitamente pelos historiadores.

A transposição para os manuais desta contestação na comunidade científica e na

sociedade coaduna-se com as OGP ao referirem: “desta análise [perspetiva histórica], tornar-

se-ão evidentes as dificuldades envolvidas no trabalho dos Homens da Ciência e a persistência

dos que o realizam” (p. 4), de acordo com o objetivo avançado no programa de 1991

“relacionar o impacto inicial da teoria Darwinista com o contexto histórico em que se situou”

(p.86).

Nos manuais foram propostas diversas atividades sobre o Darwinismo: “A teoria de

Darwin” (Silva et al., 1995, 1998; Matias & Martins, 2004, 2008); “Posição de Darwin, ao

longo da história, sobre evolução” e “Diversidade de seres vivos no arquipélago das ilhas

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Galápagos. Sua interpretação.” (Sousa & Machado, 1995, 1998); e “Como evoluem as

espécies por seleção natural?” (Silva et al., 2004, 2008).

Da análise dos manuais verificou-se que foram os manuais de Sousa e Machado

(1995, 1998) que mais contemplaram a sugestão do programa de 1991 de incluir o estudo das

temáticas “origem do Darwinismo”; “fundamentos da teoria Darwinista”; e “seleção natural e

evolução” e a proposta de atividades, como por exemplo, a “leitura, interpretação e discussão

de textos sobre o Darwinismo” (1998, pp. 49-56). A referência programática a “estudos de A.

Wallace que tal como Darwin, explicava a evolução dos seres vivos através da seleção

natural”, apenas não foi incluída nos manuais Silva et al. (2004, 2008). Note-se que estes

manuais de Silva et al. (2004, 2008) foram redigidos de acordo com o programa do ensino

secundário de Biologia e Geologia homologado em 2003 que recomenda, nomeadamente,

evitar: “o estudo pormenorizado das teorias evolucionistas”, e enfatizar: “as diferenças entre o

pensamento de Lamarck e de Darwin e a utilização do termo neodarwinismo” (p.11). Em

contrapartida, a “referência a autores influentes na elaboração da teoria darwinista,

nomeadamente Charles Lyell e Robert Malthus” (p. 87) sugerida no programa de 1991, foi

transposta por todos os autores.

3.1.5. NEODARWINISMO

Silva et al., em todos os manuais notam que embora a ideia de evolução biológica

fosse aceite pela comunidade científica, a explicação para essa evolução através da seleção

natural apresentava ainda alguns pontos frágeis, nomeadamente, permaneciam por explicar os

mecanismos responsáveis pelas variações verificadas nas espécies e o modo como essas

variações se transmitiam de geração em geração. Todos os manuais referem que o

desenvolvimento da genética veio colmatar as lacunas da teoria de Darwin, o que, no início do

século XX, permitiu perspetivar a teoria da evolução de um outro modo, surgindo em 1942 o

Neodarwinismo.

O Neodarwinismo, de acordo com todos os autores, reúne as conceções originais de

Darwin (variabilidade e seleção natural) e os dados revelados por diversas ciências como a

Genética, a Paleontologia, a Biogeografia, a Embriologia e a Sistemática. Estas ciências,

conforme adiantam Sousa e Machado (1995, 1998) vieram esclarecer o modo como surgem as

variações que ocorrem na descendência das espécies e como se opera a transmissão dessas

características de geração em geração. Matias e Martins (2004, 2008) e Sousa e Machado

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(1995, 1998) referiram ainda os contributos de cientistas como Dobzhansky, Ernst Mayr e

George Simpson para a compreensão do processo evolutivo. Foram apresentados os

respetivos retratos e dados biográficos por Matias e Martins (2008) e por Sousa e Machado

(1995, 1998). Os autores Sousa e Machado aprofundam essa análise com a inclusão extra de

textos intitulados “caminhos da ciência”.

Todos os manuais apresentam os princípios neodarwinistas que explicam a evolução

das espécies. De acordo com a perspetiva de Matias e Martins assentam em três pilares:

- a existência de variabilidade genética nas populações, consideradas como unidades

evolutivas;

- a seleção natural como mecanismo principal da evolução;

- a concepção gradualista que permite explicar que as grandes alterações resultam da

acumulação de pequenas modificações, que vão ocorrendo ao longo do tempo.

(2004, p. 150; 2008, pp. 170 e 171).

Em consonância com os restantes autores Silva et al. (1995, 1998, 2004, 2008)

consideram que a diversidade do mundo vivo é a base sobre a qual atua a seleção natural e

que essa diversidade tem como fonte primária as mutações e como fonte mais próxima a

recombinação génica (fecundação e meiose). Todos os manuais enfatizam que a unidade

evolutiva é a população que apresenta variabilidade sobre a qual a seleção natural atua e

definem fundo genético como o conjunto de todos os genes presentes numa população num

dado momento e evolução como sendo uma mudança no fundo genético das populações.

3.2. MECANISMOS DA EVOLUÇÃO

3.2.1. ADAPTAÇÃO

Silva et. al. (1995, 1998, 2004, 2008) referem que a adaptação, segundo Lamarck,

representa “a faculdade que os seres vivos possuem de desenvolver características estruturais

ou funcionais que lhes permitam sobreviver e reproduzir-se num determinado ambiente. As

modificações que levam à adaptação são explicadas pela lei do uso e do desuso” (2004,

p.126). Mencionam ainda que, segundo Darwin, na “luta pela sobrevivência”, sobrevivem os

indivíduos que estiverem melhor adaptados, ou seja, “os que possuírem características que lhe

conferem qualquer vantagem em relação aos restantes, que ao longo do tempo serão

eliminados progressivamente” (Silva et. al., 1995, p. 26).

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Todos os manuais notam que as modificações ou adaptações a que Lamarck se

referia são individuais, isto é, somáticas. Por isso, não são hereditárias, não podem transmitir-

se à descendência. Não são, portanto, adaptações evolutivas. Sousa e Machado (1998)

acrescentam que o ambiente seleciona os indivíduos conforme a sua adaptação ao meio.

Contudo, não é definitiva a adaptação de uma espécie ao meio, pois o significado de “mais

apto” ou “mais adaptado” é relativo e temporal. A mesma ideia é veiculada por Matias e

Martins (2004 e 2008) e Silva et. al. (2004, 2008) referindo que é o conjunto de genes de um

indivíduo que o torna mais ou menos bem adaptado a um determinado ambiente.

3.2.2. VARIABILIDADE

A “variabilidade - matéria-prima do processo evolutivo” e as “origens da

variabilidade genética” constituem conteúdos do tópico “neodarwinismo” (p. 87) do programa

de Biologia - 12º ano (manuais de 1995 e 1998), bem como do programa do 11º ano (manuais

de 2004 e 2008) onde integra o conteúdo conceptual “seleção natural, seleção artificial e

variabilidade” (p.11). É nestas secções, assim intituladas, que a temática da variabilidade é

abordada nos respetivos manuais.

A análise aos manuais permite verificar que tanto as edições de 1995 e 1998, como

as de 2004 e 2008, transpõem os respetivos objetivos dos programas: “explicitar o significado

de variabilidade genética, suas origens e importância, face ao processo de seleção natural”

(1991, p. 87); e “relacionar a capacidade adaptativa de uma população com a sua

variabilidade” (2003, p.12). Contudo essa análise é mais aprofundada, quanto às mutações,

como fonte de variabilidade, nos manuais editados de acordo com o programa de 1991, do

que nos editados com base no programa de 2003. Tal vai ao encontro das diretivas do

programa de 2003, quando destaca: “recordar e/ou enfatizar a meiose como fonte de

variabilidade e, por esse motivo, promotora de evolução” e que “a ênfase dada às teorias

evolucionistas deve ter em conta o conceito de seleção natural, implícito nessas teorias, e

promover a confrontação desse conceito com o de seleção artificial“ (p. 12).

Em consonância com essas orientações, Silva et al. (1995, 1998, 2004, 2008)

referem, de forma semelhante e muito sucintamente, variabilidade como sendo a base do

processo evolutivo: “A diversidade do mundo vivo é a base sobre a qual atua a seleção

natural. Esta diversidade tem como fonte primária a ocorrência de mutações e como fonte

mais próxima a recombinação genética” (Silva et al., 2008; p. 138). No manual publicado em

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1998, Silva et al. chegam mesmo a dedicar uma página (p. 57) com figuras que ilustram a

recombinação génica a nível da meiose. De modo similar, os restantes autores também

explicitam as origens da variabilidade e relacionam a maior diversidade de uma população

com a maior probabilidade dessa população se adaptar a mudanças que ocorram nesse meio,

podendo, surgir um conjunto génico que seja favorecido pela seleção natural. Deste modo,

reconhecem que as populações constituem unidades evolutivas.

3.2.3. HEREDITARIEDADE

A hereditariedade não é abordada em nenhum manual, em seção própria. No entanto,

é referida a Lei da herança dos caracteres adquiridos, como um marco histórico aquando da

abordagem ao Lamarckismo e quanto à Teoria da Hereditariedade desenvolvida por Mendel é

apenas indicado nos manuais que esta explica a transmissão das características de geração em

geração, que não tinham ficado esclarecidas com o darwinismo. Isto porque o conteúdo

“Transmissão das características hereditárias” foi desenvolvido, no 11º ano antes da reforma

curricular de 2001, e no 12º ano, posteriormente a essa reforma.

Expondo as ideias de Lamarck, os autores referem que segundo a Lei da herança dos

caracteres adquiridos “as modificações que se produzem nos indivíduos ao longo da vida,

como consequência do uso ou do desuso dos órgãos, são hereditárias, originando mudanças

morfológicas no conjunto da população” (Silva et al. 1995, 1998, 2004, 2008). Os autores

classificaram esta explicação de Lamarck como simples e pragmática, ao referir que os

organismos, pela necessidade de se adaptarem ao ambiente, adquirem modificações durante a

sua vida que passam aos descendentes. Porém, o facto desse fenómeno não se ter verificado

experimentalmente nos trabalhos do alemão August Weissmann que, em 1880, desenvolveu

uma experiência durante a qual cortou as caudas a um grupo de ratos, durante gerações

sucessivas, tendo obtido sempre descendentes com caudas normais, foi abordado por todos os

autores, exceto Silva et al. (2008) e Matias e Martins (2004, 2008). Sousa e Machado (1995,

1998) esclarecem que as modificações ou adaptações a que Lamarck se referia são adaptações

individuais, isto é, somáticas. Por isso não são hereditárias e não podem transmitir-se à

descendência. Hoje admitimos, como é referido em todos os manuais de Silva et al., que nos

organismos com reprodução sexuada apenas as alterações do DNA transportadas nos gâmetas

são transmitidas aos descendentes. As modificações que podem ocorrer nos órgãos de um

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indivíduo, devido à sua atividade, não passam para o material genético (Matias & Martins

2004, 2008).

3.2.4. MUTAÇÕES

Dos manuais publicados no âmbito do programa de 1991, Silva et al. referem que “a

mutação de uma forma alélica de um gene (A) para outra (a) altera a proporção dos alelos na

população” (1995, p.50; 1998, p. 63) e que o efeito das mutações na evolução varia em função

do gene mutado. Da mesma forma que os genes, também os cromossomas podem sofrer

mutações, que podem: “conduzir a indivíduos inviáveis ou que não atingem a idade de

procriar, noutras situações podem alterar significativamente a composição genética de uma

população. (…) as mutações são, sobretudo, a fonte primária de variabilidade e é esta que

torna a evolução possível” (1995, p.50; 1998, p. 63).

Nos manuais de Matias e Martins (2004 e 2008), a abordagem às mutações é muito

breve em oposição aos de Sousa e Machado (1995, 1998), que dedicaram duas páginas

intituladas “Caminhos da ciência” para aprofundar este conteúdo através de quadros e

esquemas ilustrados. Aliás, são, de entre todos os manuais, os que mais aprofundam esta

temática. Sousa e Machado (1995, 1998) abordaram os diferentes tipos de mutações,

recorrendo a esquemas. Estes autores associaram as mutações ao conceito de variabilidade

genética e classificaram-nas em mutações “espontâneas” e “induzidas”, consoante ocorram

naturalmente ou sejam provocadas por agentes mutagénicos, respetivamente. Também

distinguiram as mutações, quanto à forma de transmissão, em mutações somáticas que “não se

transmitem à descendência porque não são hereditárias. Estas mutações não têm valor

evolutivo, assim como as mutações letais e as que conferem menor capacidade de

sobrevivência, mesmo que sejam hereditárias” (p. 69). Só as mutações que ocorrem nas

“células germinais” são hereditárias: “com valor evolutivo são as que conferem aos

indivíduos melhores capacidades de sobrevivência ao meio” (p. 69). Podem ocorrer em

qualquer fase do ciclo celular, pois os cromossomas passam por diferentes etapas que

proporcionam o aparecimento de mutações. Matias e Martins (2004, 2008) também referiram

que as mutações podem ser génicas, permitindo o aparecimento de novos genes na população,

ou cromossómicas, podendo grupos de genes ser suprimidos, duplicados ou modificados.

De facto, os manuais publicados em 1995 e 1998, no âmbito do programa de 1991

transpuseram as mutações com maior detalhe, dado que constitui um objetivo do programa

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“Explicitar o significado de variabilidade genética, suas origens e importância, face ao

processo de seleção natural” (p.87). Em oposição, os manuais analisados no âmbito do

programa de 2003 abordaram as mutações muito resumidamente, dado que passaram a

integrar os conteúdos programáticos do 12 º ano, o que aparenta ser um contrassenso,

devendo o conceito de mutação e os seus fundamentos ser ministrados antes da aplicação do

conceito, ou seja, a alusão à sua importância no processo evolutivo. Tanto Silva et al., (2004,

2008) como Matias e Martins (2004, 2008) reconhecem, assim como os restantes autores, que

“as mutações são a fonte primária de variabilidade genética, introduzindo nas populações

novos genes” (Silva et al., 2004; p. 144). Silva et al. (2004, 2008) salientaram que enquanto

muitas tendem a fazer desaparecer os indivíduos portadores, outras, “têm um efeito favorável

e permitem aos seus portadores viver mais tempo e reproduzir-se mais” (2004; p. 144).

Em nenhum manual se encontram referências no âmbito da História da Ciência do

termo mutação, nomeadamente os estudos de Hugo de Vries, que, em 1901, descobriu os

trabalhos de Mendel e descreveu variações “espontâneas”, bruscas e hereditárias, na planta

Oenothera lamarckiana. (Avelar et. al., 2004), e os trabalhos de Morgan que, em 1910,

relacionou a variabilidade fenotípica com alterações nos genes e nas sequências de genes dos

cromossomas, apresentando, assim, uma explicação genética para as mutações (Cristo &

Galhardo, 1986, p. 165).

3.2.5. SELEÇÃO NATURAL

Tal como advoga Avelar (2007a) “a única ‘lei’ geral em biologia é a da seleção

natural, que se aplica a qualquer conjunto de entidades com as propriedades de multiplicação,

variação e transmissão hereditária” (p. 105). Este mecanismo é abordado nos manuais

publicados no âmbito do programa de 1991, no tópico “Seleção natural e evolução” e nos

manuais publicados no âmbito do programa de 2003, no tópico “Seleção natural, seleção

artificial e variabilidade”.

Todos os autores expressaram de forma coincidente as ideias-chave sobre a teoria da

seleção natural, reconhecendo que os indivíduos de uma determinada espécie apresentam

variações. O meio exerce uma seleção natural que favorece os indivíduos que possuem as

características mais apropriadas para um determinado ambiente, tornando-os mais aptos e

eliminando gradualmente os restantes. Deste modo, os indivíduos mais bem adaptados

transmitem essas características à descendência. Ou seja, a seleção natural consiste numa

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reprodução diferencial, que se traduz na acumulação de pequenas variações que determina a

longo prazo a transformação e o aparecimento de novas espécies.

Desenvolvendo as ideias anteriores, Silva et al. (1995, 1998) aludem que é sobre a

imensa diversidade de indivíduos de uma população que atua a seleção natural, que

corresponde a uma reprodução diferencial em resposta ao ambiente, privilegiando o conjunto

génico mais bem adaptado em detrimento de um menos adaptado. O menos adaptado origina

menos descendentes e, por isso, determinados alelos passam para a geração seguinte com uma

frequência menor da existente na população inicial. Referem que a seleção natural pode agir

em qualquer momento do ciclo de vida dos indivíduos e atua sobre; o tipo de acasalamento; a

fertilidade diferencial; e a sobrevivência até à idade de procriar (1995, p. 54; 1998, p. 67).

Silva et al. (1995) colocam, para a compreensão e consolidação do mecanismo da

seleção natural, a seguinte questão dissertativa: “Por que motivo o gene da anemia falciforme

não foi ainda eliminado por seleção natural?”, esclarecendo que “em adição aos seus efeitos

negativos estes gene determina duas características positivas: - os heterozigóticos têm uma

grande resistência à malária bem como uma maior fertilidade” (p. 55). As autoras abordaram

a teoria neutral de Kimura e Lewontin, como se tratando de um modelo derivado do

neodarwinismo que defende que “a maior parte das mutações não trazem vantagens nem

desvantagens evolutivas. Ocasionalmente, podem ocorrer mutações que alteram

profundamente o fenótipo dos indivíduos (macromutações), determinando mudanças bruscas

no percurso evolutivo da espécie” (p. 56). Todavia, Sousa e Machado (1995, 1998)

acrescentam:

A seleção natural, se por um lado conduz à adaptação das

populações, por outro lado, também é responsável pela

extinção de milhões de espécies ao longo dos tempos, o

que evidencia grandes mudanças ambientais. (1998, p.

74).

Assim, quanto maior for a variabilidade genotípica, maior é a variabilidade de

fenótipos existentes numa população e maior será a possibilidade de alguns sobreviverem

perante alterações ambientais. Desse modo as autoras foram ao encontro dos objetivos do

programa de 1991: “compreender que quanto maior for a variabilidade genética de uma

população mais elevada será a sua capacidade de resposta a eventuais alterações do meio” (p.

87). Ainda distinguiram seleção natural estabilizadora de seleção natural evolutiva, do mesmo

modo que Silva et al. (1995).

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Todavia, subsistem algumas diferenças entre os manuais quanto às atividades

propostas e aos exemplos escolhidos para explorar esse assunto. Assim, são propostas

atividades de exploração sobre a atuação de diferentes tipos de seleção natural: numa

população de borboletas, que designam e distinguem em seleção estabilizadora; seleção

direcional; e seleção disruptiva (Silva et al., 1995); e numa população de caracóis (Silva et al.,

1998). O manual de Silva et al. (1998) apresenta ainda exemplos das estratégias apresentadas

por algumas espécies para perpetuar os seus genes, que ilustra por meio de figuras.

Como exemplo de seleção natural evolutiva direcional, foi referido o caso da série

filogenética do cavalo (Sousa & Machado, 1995, 1998) e a evolução numa população de

flamingos (Silva et al., 1998). Também foi tratado o melanismo industrial, como exemplo de

uma seleção natural direcional rápida determinada por uma alteração ambiental que vai alterar

a frequência dos genes, sendo favorecido um dos fenótipos extremos (Silva et al., 1995, 2004;

Sousa & Machado, 1995, 1998; Matias & Martins, 2004, 2008). Estes autores explicaram que

em resultado de alterações ambientais, uma mutação, que inicialmente era desvantajosa,

tornou-se numa mutação adaptativa, ou seja, a borboleta escura tornou-se numa forma mais

apta ao novo ambiente. Para explicar a evolução desta espécie por seleção natural, realçando,

que devido à ação do homem ocorreu uma evolução em cerca de cinquenta anos que,

naturalmente demoraria muito mais, verificou-se que, seis dos oito manuais, transpuseram

este exemplo das borboletas da espécie Biston betularia, que é seguidamente apresentado na

figura3.

Fig. 3. Ilustração da evolução das borboletas da espécie Biston betularia: cor clara (aspeto inicial) e

cor escura (aspeto da forma mutante).

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3.2.6. SELEÇÃO SEXUAL

Somente nos manuais de Sousa e Machado (1995, 1998) se encontra explicitamente

uma secção destinada a explorar a seleção sexual que consiste num caso particular da seleção

natural e resulta da competição que se gera entre machos e fêmeas: “Há sempre determinados

machos e fêmeas que são preferidos para a reprodução, são os reprodutores eleitos, enquanto

outros são menos procurados, apresentando, por isso, mais dificuldade em deixar

descendentes” (p.79). Isso conduz a que muitas variações sejam eliminadas devido à seleção

sexual. Exemplificando, mencionaram que na época de reprodução muitos machos exibem

características atrativas que favorecem a sua escolha pelas fêmeas: “certas aves apresentam

uma plumagem vistosa, assim como certos cervídeos que ostentam enormes chifres” (p. 79),

ilustrando estes exemplos com as respetivas imagens.

Silva et al. (1995, 2004, 2008) e Matias e Martins (2004, 2008) não abordaram o

fenómeno. Por seu lado, Silva et al. (1998) não explicitaram o termo seleção sexual, contudo

apresentaram na secção “seleção natural” o caso de, nos pavões, o macho exibir uma

deslumbrante plumagem para cativar a fêmea e perpetuar os seus genes.

3.2.7. ISOLAMENTO GEOGRÁFICO

O isolamento - seu significado na especiação, constitui um conteúdo do programa de

199114

, mesmo após as OGP, mas não do programa de 2003. Dado que, segundo as

Orientações de Gestão de Programas - Biologia 12º ano, dentro do tema “Evolução das

Populações e Formação de Novas Espécies” (p. 2), apenas é considerado no núcleo

significativo de conteúdos, o subtema “Especiação”. Desse modo, suprimiu-se do programa

de 1991 todos os outros subtemas: “Populações em equilíbrio - princípio de Hardy-weinberg”;

“Ancestrais do Homem - a emergência da espécie humana”; e “História evolutiva dos

hominídeos”. Recomendando o programa de 2003 apenas: “Recordar e/ou enfatizar: As

populações como unidades evolutivas” (p. 12). Por isso, o isolamento geográfico foi apenas

transposto para os manuais de Silva et al. (1995, 1998) e de Sousa e Machado (1995, 1998)

como um coadjuvante no processo de formação de novas espécies. Os autores referiram que

conduz à separação de indivíduos da mesma população, originando novas populações, que

sob a ação de forças ambientais diferentes, podem começar a divergir geneticamente, e mais

14

Inserido no subtema “Especiação” que por sua vez se insere no tema “Evolução das populações e formação de

novas espécies” (p. 88).

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tarde ocorrer entre elas o isolamento reprodutor, formando-se novas espécies. Em todos os

manuais foi referido como exemplo o caso do carvalho inglês Quercus robur, largamente

difundido na Europa e, do Quercus lobata, da Califórnia, que podem ter resultado de um

mesmo ancestral, mas devido ao isolamento desenvolveram características diferentes. Embora

ainda não tenham desenvolvido completamente mecanismos intrínsecos de isolamento

reprodutivo (Sousa & Machado,1998, p. 111), pudendo originar descendentes férteis, a

reprodução entre ambas as espécies não é possível devido à separação geográfica.

3.3. ARGUMENTOS DO EVOLUCIONISMO

3.3.1 ANATOMIA COMPARADA

Sousa e Machado (1995, 1998) esclareceram que a anatomia comparada “baseia-se

no estudo comparado das formas e estruturas dos organismos, com o fim de esclarecer

possíveis relações de parentesco entre eles” (1998; p. 17). Acerca desse argumento, em todos

os manuais, os autores afirmaram que podem encontrar-se muitas semelhanças na morfologia

de indivíduos que à primeira vista nos parecem diferentes, o que sugere “a existência de um

ancestral comum, com um plano estrutural idêntico ao apresentado por todos os seres vivos

que dele terão derivado” (Matias & Martins, 2004, p. 138; 2008, p. 158).

Quanto às provas anatómicas, todos os autores reconheceram que os dados mais

importantes que evidenciam a relação de parentesco entre diferentes espécies de organismos

são a existência de órgãos homólogos, análogos e vestigiais. Transpuseram o conceito “órgãos

homólogos” através da proposta de exploração de uma atividade que sugere o estudo

comparativo em vertebrados sobre:

i) “Esqueleto dos membros anteriores” (Silva et al., 1995; 1998; 2004; 2008; Sousa

& Machado, 1995, 1998; Matias & Martins, 2004; 2008); e

ii) “Sistema nervoso central [SNC]” (Sousa & Machado, 1995, 1998; Matias &

Martins, 2004; 2008).

A homologia, isto é, a “semelhança de origem” (2004, p. 140; 2008, p. 133)

conforme Silva et al. acentuaram, foi interpretada pelos diferentes autores como resultado da

seleção natural exercida sobre indivíduos que conquistaram meios ambientais diferentes. Esse

fenómeno foi designado por evolução divergente - dado que se verifica a divergência de

organismos a partir de um ancestral comum que colonizou diferentes habitats e, por isso,

sofreu pressões seletivas distintas.

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Os manuais analisados, com exceção dos de Silva et al. (1995, 1998, 2004, 2008),

aludiram que a evolução das estruturas homólogas permite construir séries filogenéticas

progressivas ou regressivas. Definiram e ilustraram indicando como exemplos de uma série

filogenética progressiva: a evolução do sistema nervoso e do coração dos vertebrados; e como

exemplos de uma série filogenética regressiva: a evolução dos membros dos cavalos, a perda

dos membros das serpentes ou a atrofia dos ossos das aves corredoras.

Outra evidência da evolução transposta por todos os autores foi a existência de

órgãos ou estruturas análogas, que definiram como sendo órgãos que “têm uma estrutura e

origem embriológica diferentes, mas desempenham a mesma função” (Matias & Martins,

2004, p. 140; 2008, p. 160) e resultam de evolução convergente. Concretizando, todos os

autores apresentaram exemplos que ilustraram com figuras, sendo os mais recorrentes:

i) O caso dos Catos e das Eufórbia, plantas pertencentes a famílias diferentes, que

resultaram de uma adaptação muito semelhante, pois apresentam caules carnudos e folhas

reduzidas a espinhos, que lhes permitem viver em regiões desérticas (Silva et al., 1998, 2004;

Sousa & Machado, 1995, 1998; Matias & Martins, 2004, 2008);

ii) A asa de uma ave e a asa dos insetos, que embora anatomicamente diferentes

apresentam uma função idêntica, neste caso o voo (Silva et al., 1995, 2008; Sousa &

Machado, 1995, 1998; Matias & Martins, 2004, 2008).

Os órgãos ou estruturas vestigiais foram transpostos pelos diferentes autores,

enquanto evidência anatómica que apoia a evolução, como sendo “órgãos atrofiados que não

apresentam uma função evidente nem importância fisiológica num determinado grupo de

seres vivos. Porém, noutros grupos, estes órgãos podem apresentar-se bem desenvolvidos e

com significado fisiológico, isto é funcionais” (Matias & Martins, 2008, p. 161). Foram

apresentados alguns exemplos:

i) A cintura pélvica e o fémur presente nas baleias e nas serpentes (Matias &

Martins, 2004, 2008; Sousa & Machado, 1995, 1998; Silva et al. 2004, 2008);

ii) A membrana nictitante, os músculos para mover as orelhas e o apêndice (Silva et

al. 1995, 1998, 2004; Sousa & Machado, 1995, 1998); e

iii) As vertebras caudais (Silva et al., 1995; Sousa & Machado, 1995, 1998).

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3.3.2. PALEONTOLOGIA

Em todos os manuais, Silva el al. reconhecem que o registo fóssil é um dos dados

que melhor apoiam o evolucionismo, em consonância com os outros autores. Referiram no

manual de 2004, de forma semelhante ao de 2008:

Existem, por vezes, fósseis de seres que apresentam

características que correspondem, na actualidade, a dois

grupos diferentes de organismos, sendo denominadas por

formas intermédias ou sintéticas. As formas sintéticas,

em alguns casos também chamadas de transição porque

algumas delas terão feito a transição de um grupo para

outro de organismos (p. 142; Sublinhado no original).

Concluindo, Silva el al. (2004) mencionaram em todos os manuais que os fósseis de

transição permitem “documentar que organismos que hoje se conhecem pertencentes a grupos

diferentes não são totalmente independentes uns dos outros quanto à origem” (p. 142).

Apresentaram, em todos os seus manuais, como evidência da evolução, uma forma fóssil de

transição, como o Archaeopteryx, que possui características das aves e dos répteis,

devidamente ilustrada. Os restantes manuais, referem ainda como exemplos de outros fósseis

de transição o Ichthyostega15

e as Pteridospérmicas16

, exceto os Silva et al. (2004, 2008).

A árvore filogenética do cavalo também é apresentada como prova da evolução em diagramas

para exploração ou como proposta de atividade (Silva et al. 1995, 1998; Sousa & Machado,

1995, 1998; Matias & Martins, 2004, 2008). Esses diagramas contêm as designações das

várias formas evolutivas, desde o ancestral comum, Eohippus, ao género Equus, e a respetiva

idade geológica. A explicação da evolução do esqueleto dos animais da família dos Equídeos

é apresentada mais pormenorizadamente nos manuais de Silva et al. (1995, 1998) e de Sousa e

Machado (1995, 1998), dado que Matias e Martins (2004, 2008) apenas salientam que ao

longo da evolução da espécie “verifica-se um aumento das dimensões corporais, um

desenvolvimento da coroa dos dentes molares e uma redução do número de dedos que se

apoiam no solo” (2004, p. 142; 2008, p. 162).

15

Fóssil de transição que reúne características dos Peixes e dos Anfíbios atuais. 16

Fóssil de transição mais conhecido em relação às plantas. Morfologicamente são semelhantes às Pteridófitas

atuais (fetos), mas reproduzem-se por sementes, característica das Espermatófitas. Admite-se que as

Pteridospérmicas sejam uma forma de transição entre as Pteridófitas a as Espermatófitas, nomeadamente as

Gimnospérmicas (Matias & Martins, 2004, p. 144).

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3.3.3. EMBRIOLOGIA

Os autores analisados, com exceção de Silva et al. (2004, 2008) que não

transpuseram os dados da embriologia, salientam que as provas embriológicas sobre a

evolução baseiam-se no acompanhamento do desenvolvimento embrionário de diferentes

espécies, o que permite observar homologias e estabelecer relações de parentesco entre os

diferentes grupos de seres vivos. Todavia, Silva et al. (1995, 1998) e Sousa e Machado (1995,

1998) foram mais abrangentes ao fazerem uma abordagem histórica, na qual distinguiram

ontogenia de filogenia e referiram a lei da biogenética pelo seu valor meramente histórico.

Segundo Silva et al. (1995), a ontogenia representa a “história do desenvolvimento de um

indivíduo ao longo da sua vida (p. 37) e a filogenia “a história evolutiva de um grupo”. Sousa

e Machado (1995, 1998) referem que “a ontogenia não parece ser uma recapitulação da

filogenia” (1995, p. 33) embora “o estudo das ontogenias dos diferentes seres vivos continue a

ser usado no estabelecimento de semelhanças e diferenças entre os respetivos grupos,

permitindo avaliar o grau de afinidade entre eles” (Silva et al. 1995, p. 37; 1998, p.47). Matias

e Martins ainda avançam:

A partir de um padrão muito semelhante nos estados

iniciais, vão-se formando estruturas características dos

adultos de cada espécie. (…) Assim facilmente se

compreende que quanto mais complexo é o animal, mais

tempo demora a adquirir a forma definitiva, partindo

desse padrão comum inicial. Pelo contrário, os animais

mais simples (menos evoluídos) cedo apresentam as

características que vão prevalecer no estado definitivo

(2004, p. 146; 2008, p.166).

Todos os manuais propõem uma atividade de comparação do desenvolvimento

embrionário em vertebrados e concluem que os embriões de todos os vertebrados, desde os

peixes aos mamíferos são muito semelhantes nas primeiras etapas de desenvolvimento. Esses

dados sugerem que “os Vertebrados são descendentes de um antepassado comum, tendo-se

diferenciado as diferentes classes ao longo do tempo geológico” (Silva et al. 1995, p. 36;

1998, p. 46).

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3.3.4. BIOGEOGRAFIA

Os dados da Biogeografia baseiam-se na análise da distribuição geográfica dos seres

vivos. Todos os autores, exceto Silva et al. (2004 e 2008), afirmaram que quanto mais

afastadas se encontram duas regiões, maiores são as diferenças encontradas entre a fauna e a

flora. Reportaram-se ao exemplo das ilhas Galápagos e das ilhas de Cabo Verde que apesar de

terem a mesma origem e aproximadamente o mesmo clima, possuem populações animais e

vegetais muito diferentes. A explicação encontrada para essas diferenças resulta de os

ancestrais que povoaram estas ilhas serem provenientes de continentes diferentes, o que terá

originado as diferenças encontradas nas populações de organismos.

Outro exemplo referido que apoia a conceção evolucionista diz respeito aos

mamíferos australianos. Só se compreendem as diferenças encontradas nos mamíferos

australianos (todos são marsupiais, à exceção dos que foram introduzidos pelo homem) em

relação aos dos restantes continentes, considerando que após a separação dos continentes os

mamíferos evoluíram independentemente. Deste modo, concluem os autores, a evolução

permite compreender a distribuição geográfica das espécies.

3.3.5. CITOLOGIA

Exceto Matias e Martins (2004, 2008), os restantes autores transpõem este argumento

em favor do evolucionismo, notando que apesar das diferenças consideráveis que são

observáveis entre os seres vivos, todos, quer sejam unicelulares quer pluricelulares, são

constituídos palas mesmas unidades estruturais, as células. Além da semelhança na

constituição das células animais e vegetais, também os processos fisiológicos são idênticos.

Sousa e Machado (1995, 1998) salientam que se a unidade de formação é a mesma, todos os

seres vivos são aparentados a nível celular, logo, para Silva et al. essa “universalidade

estrutural e funcional do mundo vivo constitui um forte argumento a favor de uma origem

comum” (1995, p. 38; 1998, p. 49; 2004, p. 143, 2008, p. 135).

3.3.6. BIOQUÍMICA

Matias e Martins (2004, 2008) e Silva et al. (2008) referem que a análise da

sequência de aminoácidos das proteínas e a sequenciação de DNA têm fornecido, nos últimos

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anos, provas a favor de uma origem comum para todos os seres vivos. Matias e Martins

(2004, 2008) salientam que entre as provas bioquímicas destacam-se:

- o facto de todos os organismos serem constituídos pelos mesmos compostos

orgânicos (glícidos, lípidos, prótidos e ácidos nucleicos);

- a universalidade do código genético com a intervenção do DNA e do RNA no

mecanismo de síntese proteica.” (2004, p. 148; 2008, p. 168)

Tendo em conta que, como explicam Silva et al. (1995, 1998, 2008), a proteínas

diferentes correspondem nos indivíduos características também diferentes, prevê-se que

quanto mais próximas evolutivamente se encontrarem as espécies, mais semelhanças

apresentem a nível das proteínas. Nesse sentido, a atividade mais comum, proposta pelos

diferentes autores foi “Comparação da sequência de aminoácidos (a.a.) da insulina em

diferentes mamíferos”.

Além dos estudos bioquímicos já referidos, Silva et al. (1995, 1998) e Sousa e

Machado (1995, 1998) também mencionaram que os testes sorológicos têm fornecido dados

fundamentais para o estabelecimento de relações de parentesco entre os seres vivos. O manual

de Silva el al. (2004) foi o único que não transpôs este recente argumento evolucionista.

3.3.7. CARIOLOGIA

Este argumento apenas foi transposto por Sousa e Machado (1995, 1998), que

explicaram que os indivíduos da mesma espécie apresentam o mesmo número de

cromossomas, isto é, o mesmo cariótipo, diferindo apenas no genótipo. Como espécies mais

próximas apresentam cariótipos mais semelhantes ou mesmo iguais, a comparação dos

cariótipos permite concluir sobre o grau de parentesco entre os organismos. Para aprofundar

esse assunto, os manuais apresentaram uma atividade sobre o número de cromossomas de

algumas espécies e a comparação dos cromossomas do homem e do chimpanzé.

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CAPÍTULO IV

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4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A análise efetuada mostra que em todos os manuais a conceção criacionista é

considerada uma teoria fixista. Constatou-se também que os conceitos de

criacionismo/fixismo foram abordados apenas na perspetiva da História da Ciência, como

teorias explicativas da biodiversidade e origem das espécies, em consonância com o programa

de Biologia - 12º ano homologado em 1991 que propunha, como objetivo no subtema

“fixismo”, que os alunos reconhecessem a influência de filósofos da antiguidade clássica na

cultura e pensamentos das civilizações ocidentais. Quer nos manuais de Silva et al. (1995,

1998), quer nos de Sousa e Machado (1995, 1998) encontram-se referências à influência de

Platão e de Aristóteles, o que mostra que a transposição didática interna está de acordo com as

orientações do programa de 1991. Aliás, de todos os manuais analisados somente os de Silva

et al. (2004 e 2008) não contêm quaisquer referências a estes filósofos.

A análise mostrou que os manuais de 1995 e 1998, publicados de acordo com o

programa de 1991 abordaram o conceito de geração espontânea, associado ao de fixismo, para

explicar a origem das espécies. Para tal, propuseram a resolução de algumas questões a partir

da análise e interpretação de figuras e/ou textos sobre: “a origem da vida e evolução” (Sousa

& Machado, 1995, 1998) e “Diversidade das espécies” e “Teoria da geração espontânea”

(Silva et al., 1995, 1998).

O programa de 2003 recomendou “ a construção de opiniões fundamentadas sobre

diferentes perspetivas científicas e sociais (filosóficas, religiosas…)” (p.12), o que poderá

suscitar interpretações dúbias e, segundo Gaspar, Avelar e Mateus (2007) “uma leitura menos

atenta poderá interpretar que a recomendação é de ensinar a perspetiva científica da evolução

como uma hipótese entre muitas (filosóficas, religiosas, etc.)” (p.158). No entanto, nos

manuais analisados, publicados em 2004 e 2008, o fixismo foi distinguido do criacionismo e

apenas apresentado pelo seu interesse histórico, como ideia explicativa da biodiversidade e

origem das espécies e não como uma hipótese a par da perspetiva científica da evolução.

Contudo, Matias e Martins ressalvaram que “ainda hoje não existe consenso relativamente à

origem da diversidade dos seres vivos. Todavia, as teorias evolucionistas reúnem uma maior

aceitação, conforme concluirá no final do capítulo” (2004, p. 120; 2008, p. 142). A expressão

“não existe consenso” refere-se a mecanismos evolutivos, todavia é conveniente esclarecer

que a falta de consenso não se aplica à evolução propriamente dita. De um modo geral, nestes

manuais publicados pós-programa de 2003 a abordagem ao fixismo é muito breve e

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superficial, ou seja, o evolucionismo é dado assente, o que está em consonância com o

programa de 2003 quando prescreveu o seguinte conteúdo procedimental: “recolher, organizar

e interpretar dados de natureza diversa relativos ao evolucionismo e aos argumentos que o

sustentam, em oposição ao fixismo” (p. 11).

Nos “conteúdos atitudinais”, o programa de 2003 recomenda o “Reconhecimento de

que o avanço científico-tecnológico é condicionado por contextos (ex. sócioeconómicos,

religiosos, políticos…), geradores de controvérsias, que podem dificultar o estabelecimento de

posições consensuais” (p.11). O facto de se reconhecer que a religião pode dificultar o

estabelecimento de posições científicas constitui um aspeto educativo importante se for

devidamente explicado que a ciência se distingue de outras perspetivas pelo rigor do método

científico. Tomando uma posição em defesa da ciência, Matias e Martins nos seus dois

manuais advogaram “o criacionismo baseia-se na fé; como tal, não pode ser experimentado e,

consequentemente, não pode ser objeto de tratamento por parte da ciência” (2004, p.122;

2008, p.144).

Portanto, esta análise mostrou que o evolucionismo foi a explicação aceite para a

origem das espécies em todos os manuais porque expressam a ideia de que, apesar da força

das ideias fixistas, transitou-se no século XIX num ambiente de grande controvérsia para uma

visão evolucionista. Os manuais evidenciaram que as teorias evolucionistas admitem a

existência de antepassados comuns a todos os seres vivos e a transformação lenta das espécies

ao longo do tempo, diferindo apenas no mecanismo proposto para explicar a evolução. Ainda,

no sentido de apresentar a perspetiva histórica desse ambiente controverso que conduziu ao

estabelecimento e consolidação do evolucionismo, todos os manuais apresentaram as

conceções de diversos naturalistas como Cuvier, Maupertuis, Buffon e Hutton, que

fundamentaram o pensamento evolucionista, com exceção de Silva et al. (2004, 2008).

Embora esta análise não tenha sido efetuada neste trabalho, pela sua pertinência

refere-se que a evolução do Homem que estava contemplada no programa de 1991 foi

transposta para os manuais Silva et al. (1995) e Sousa e Machado (1995, 1998) e abordada

com alguma profundidade. Posteriormente foi retirada, aquando das OGP, em 1996/1997,

deixando de fazer parte do núcleo significativo de conteúdos, continuando assim totalmente

ausente no programa de 2003. Também nos EUA esta ausência se verificou, em 2004, o

currículo de ciências de apenas três estados: Michigan, Indiana e Illinois tinha conteúdos

sobre a evolução humana.

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Do corpo teórico evolucionista fazem parte, em todos os manuais, o Lamarckismo,

como teoria explicativa da origem das espécies. A análise comparativa desses manuais

evidenciou que os autores centraram o discurso nas modificações ou adaptações dos

organismos ao meio, explicadas pela lei do uso e do desuso, enquanto mecanismo responsável

pela transformação das espécies proposto por Lamarck. Todos os manuais referem que essas

adaptações a que Lamarck se referia são individuais ou somáticas e não sendo hereditárias

não podem transmitir-se à descendência. No entanto, o Lamarckismo foi principalmente

apresentado pelo seu interesse histórico, como a primeira teoria explicativa fundamentada dos

mecanismos de evolução dos seres vivos e pela fragilidade dos seus argumentos.

Bellini (2006) no seu estudo concluiu que os manuais “descrevem, no caso de

Lamarck, uma suposta teoria, supostas leis (transmissão dos caracteres e do uso e do desuso),

a partir de um único exemplo [do pescoço das girafas] que se transforma em modelo

novamente” (p. 24). Em contrapartida, neste estudo, apesar do alongamento do pescoço da

girafa ser também um exemplo recorrente das leis Lamarckistas em todos os manuais, foram

referidos outros exemplos nos manuais, como o alongamento do pescoço dos flamingos

causado pela necessidade de obterem alimento (Silva et al., 1995); a formação da membrana

interdigital nas patas das aves palmípedes, em resultado da necessidade de nadar (Sousa &

Machado, 1995, 1998; Matias & Martins, 2004, 2008); o alongamento do corpo e o

atrofiamento dos membros das serpentes provocado pela reptação (Silva et al., 2004, 2008); e

a origem dos catos, em resultado da necessidade de conservar água (Matias & Martins, 2004,

2008).

A Lei da herança dos caracteres adquiridos, o outro princípio fundamental do

mecanismo evolutivo de Lamarck, foi referido em todos os manuais apenas como um marco

histórico, dado que não se verifica experimentalmente, como comprovam os trabalhos do

alemão August Weissmann, apresentados por todos os autores, exceto Silva et al. (2008) e

Matias e Martins (2004, 2008). É enfatizado em todos os manuais que apenas as alterações do

material genético dos gâmetas são transmitidas aos descendentes. Estes resultados estão em

consonância com a análise de Bellini (2006) porque constatou que nos manuais escolares o

nome de Lamarck está invariavelmente ligado ao conceito de herança dos caracteres

adquiridos, ressalvando: “esta não foi uma ideia original de Lamarck; era uma ideia de muitos

nos séculos XVIII e XIX, quando a genética ainda não havia explicado os processos de

transmissão de caracteres dos seres vivos às gerações futuras” (p. 21). No entanto, esta ideia,

assim como outras da história do debate evolucionista, também não foi transposta para os

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manuais deste estudo, transmitindo aos alunos uma visão parcelar da teoria de Lamarck, por

um lado e, por outro, enfatizando a sua argumentação científica frágil, não atribuindo o mérito

devido ao naturalista. A dificuldade do Lamarckismo em obter consenso na comunidade

científica, segundo Gavroglu (2007), a par do Darwinismo, constitui um dos mais importantes

problemas de que trata a História da Ciência. De facto, o consenso na comunidade científica

foi uma questão determinante em todo o processo de abordagem do evolucionismo.

A transposição do Darwinismo e do Neodarwinismo também foi realizada em todos

os manuais. Ficou claro que a revolução paradigmática que permitiu a substituição do modelo

fixista pelo evolucionista ficou a dever-se a Charles Darwin e ao Darwinismo. O seu conteúdo

foi sistematizado e apresentado por todos os autores, compreendendo os seguintes princípios

fundamentais: existência de variabilidade; luta pela sobrevivência; existência de seleção

natural, ocorrendo a sobrevivência dos mais aptos; e a reprodução diferencial. A seleção

sexual, como caso particular da seleção natural somente foi transposta por Sousa e Machado

(1995, 1998). Por seu lado, o isolamento geográfico, enquanto elemento do meio que favorece

os restantes mecanismos evolutivos apenas foi apresentado nos quatro manuais redigidos no

âmbito do programa de 1991, dado que o isolamento geográfico se mantém nos currículos

após as OGP17

, mas já não é incluído nos conteúdos do programa de 2003. Efetivamente,

segundo o programa de 2003, “a ênfase no que respeita ao Darwinismo e ao Neodarwinismo

tem em conta o conceito de seleção natural, implícito nessas teorias” (p. 12). Em

consequência, todos os manuais, exceto os de Silva et al. (2004, 2008), propuseram uma

atividade sobre o “Mecanismo evolutivo proposto por Darwin” e todos transpuseram, como

ideias que influenciaram o Darwinismo: a influência da Geologia; a influência da

biogeografia; o papel do Malthusianismo; e a seleção artificial. Foi salientada a relevância da

seleção artificial, dado que o conceito de seleção natural de Darwin foi elaborado a partir da

analogia com a seleção artificial feita por criadores de animais e por agricultores,

contribuindo a construção desta analogia para sustentar a teoria. Os manuais de Sousa e

Machado (1995, 1998) foram aqueles que apresentaram a maior riqueza de detalhes que

fundamentam a teoria Darwinista e também os que mais desenvolveram as críticas ao

Darwinismo.

Quanto ao Neodarwinismo, todos os manuais referem que a descoberta das mutações

permitiu explicar o surgimento das variações nos indivíduos de uma determinada espécie e

17

Por constituir, de acordo com as recomendações das OGP, um tópico do subtema “Especiação”, o único

subtema do tema “Evolução das Populações e Formação de Novas Espécies” a ser prescrito.

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que são a fonte primária de variabilidade, introduzindo nas populações novos genes. São,

portanto, responsáveis pelos fenómenos evolutivos nas populações. As mutações são

transpostas com menor detalhe nos manuais publicados no âmbito do programa de 2003 dado

que passaram a integrar os conteúdos programáticos do 12 º ano, o que aparenta ser um

contrassenso, devendo o conceito de mutação ser desenvolvido antes de ser referida a sua

importância no processo evolutivo, como fonte de variabilidade genética - matéria-prima do

processo evolutivo. Os manuais que mais detalharam as mutações foram os de Sousa e

Machado (1995, 1998).

Por outro lado, a Teoria cromossómica da hereditariedade que explica a transmissão

dos caracteres de geração em geração, também foi referida como vindo colmatar as lacunas do

darwinismo. Seis dos oito manuais analisados exploraram ainda o caso do “melanismo

industrial” que evidencia a intervenção do ambiente na seleção natural, para relacionar o

modo como os novos dados da genética reafirmam a importância da seleção natural,

reconhecendo as populações como unidades evolutivas. No entanto, a abordagem do conteúdo

específico do neodarwinismo foi mais superficial nos manuais publicados no âmbito do

programa de 2003. O que dificulta a compreensão dos mecanismos evolutivos, pois nos

restantes manuais o mecanismo da seleção natural foi mais aprofundado, nomeadamente ao

designarem e distinguirem os diferentes tipos de seleção natural. O que mostra que a

homogeneidade é maior nos manuais publicados no âmbito de um mesmo programa. No

entanto, as ideias-chave sobre a teoria da seleção natural não diferem significativamente

mesmo interprogramas.

Os manuais apresentaram vários argumentos do evolucionismo: anatomia

comparada, paleontologia, embriologia, biogeografia, citologia, bioquímica e cariologia. Os

autores reconheceram que os dados de anatomia comparada mais importantes que evidenciam

a evolução foram a existência de órgãos homólogos, análogos e vestigiais. Focaram o estudo

dos órgãos homólogos no esqueleto dos membros anteriores e do sistema nervoso central de

vertebrados. Recorreram às asas dos insetos e das aves; aos caules e folhas dos catos e das

eufórbias, como exemplos de estruturas análogas e salientaram como exemplos de órgãos

vestigiais, os do ser humano, nos manuais de 1995 e 1998 e os das baleias e serpentes nos

manuais de 2004 e 2008.

As provas paleontológicas evidenciam que o registo fóssil é um dos dados que

melhor apoiam o evolucionismo, nomeadamente as formas intermédias ou sintéticas, por

vezes também chamadas formas de transição, como é o exemplo do Archaeopteryx, recorrente

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em todos os manuais. A árvore filogenética do cavalo também foi apresentada como prova da

evolução em seis dos oito manuais. Os manuais de Silva et al. (2004, 2008) foram os únicos

que não a incluíram. No entanto, a explicação da evolução do esqueleto destes animais foi

apresentada mais aprofundadamente nos manuais de 1995 e 1998, dado que Matias e Martins

(2004, 2008) apenas referem ter-se verificado ao longo da evolução dessa espécie os seguintes

fenómenos: o aumento das dimensões corporais; um desenvolvimento da coroa dos dentes

molares; e uma redução do número de dedos que se apoiam no solo. Isso sugere a influência

das orientações programáticas de 2003 na redação dos manuais de 2004 e 2008.

Todos os manuais, exceto os de Silva et al. (2004, 2008), transpuseram os supostos

dados da embriologia que comprovam a evolução ao mostrarem que os embriões de todos os

vertebrados são muito semelhantes nas primeiras etapas de desenvolvimento. Tal sugere uma

descendência comum, diferenciando-se os diferentes grupos de organismos ao longo do

tempo geológico.

Os argumentos da biogeografia não foram abordados nos manuais de Silva et al.

(2004, 2008) e os da citologia nos manuais de Matias e Martins (2004, 2008). Os primeiros

argumentos evidenciaram que quanto mais afastadas se encontram duas regiões, maiores são

as diferenças encontradas entre a fauna e a flora, como é o caso das ilhas Galápagos e das

ilhas de Cabo Verde. Os argumentos da citologia focaram que apesar das diferenças

consideráveis que são observáveis entre os seres vivos, a universalidade estrutural e funcional

do mundo vivo constitui um forte argumento a favor de uma origem comum.

As provas da bioquímica só não foram transpostas por Silva et al. (2004). Os

restantes manuais de 2004 e 2008 referem como provas bioquímicas, a favor de uma origem

comum para todos os seres vivos, a análise da sequência de aminoácidos das proteínas e a

sequenciação de DNA, dado que se duas espécies apresentam sequências de aminoácidos e de

genes muito próximas, muito provavelmente essas sequências foram copiadas a partir de um

ancestral comum. Os manuais de 1995 e 1998 também referem os testes sorológicos no

estabelecimento de relações de parentesco.

As provas da cariologia foram unicamente abordadas por Sousa e Machado (1995,

1998), os quais afirmaram que a comparação dos cariótipos permite concluir sobre o grau de

parentesco entre os organismos. Portanto, espécies afins apresentam cariótipos mais

semelhantes.

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REFLEXÕES FINAIS

Nos EUA, se bem que na década de 1990 se verificou uma maior abrangência na

cobertura da evolução e da evolução humana, no início do século XXI ocorreu um aumento

da pressão criacionista levando a que os manuais de biologia de muitos estados fossem

censurados. Apesar das fortes crenças criacionistas dos EUA, também na Europa, existem

relatos de introdução do criacionismo no ensino nomeadamente: no Reino Unido, nas aulas de

ciências na ESF em 2002, e num exame de ciências do ensino público para o GCSE, em 2006;

e nos currículos escolares, na Holanda em 2005. O certo é que, em Portugal, desde 1989 a

2009, ocorreram deleções do evolucionismo nos programas e nos manuais, no que toca à

evolução humana e à profundidade com que é apresentada a teoria evolutiva e as evidências

que a sustentam. Estas ausências, não deixam a resposta da ciência nestas temáticas, por um

lado, e podem, por outro lado, abrir caminho a que outras respostas sejam apresentadas

noutros meios, como seja o caso do criacionismo.

Ainda assim, os autores dos manuais portugueses de biologia mais representativos de

1989 a 2009 transpuseram vários exemplos de mecanismos e de provas da evolução. Todos os

manuais apresentaram diversas teorias explicativas da origem e evolução das espécies:

fixismo/criacionismo, Lamarckismo, Darwinismo e o neodarwinismo. No entanto, a conceção

criacionista, considerada uma teoria fixista, foi abordada nos manuais apenas na perspetiva da

história da ciência e não como uma teoria explicativa da biodiversidade e origem das espécies

a par das teorias evolucionistas. Isto comprova que o discurso dos autores em defesa do

evolucionismo é um facto, à semelhança do que se verificou com os manuais portugueses de

ciências naturais do ensino liceal analisados no período compreendido entre 1905 e 1959.

Por conseguinte, desta análise comparativa da transposição didática da origem das

espécies levada a cabo, conclui-se que intraprogramas, isto é, nos manuais das mesmas

editoras publicados no âmbito do mesmo programa, a estrutura de apresentação e a

abordagem dos conteúdos é muito semelhante e o seu aprofundamento muito próximo.

Destacam-se, entre todos os manuais, por um lado, os de Sousa e Machado (1995, 1998) por

serem os únicos que transpuseram todas as teorias da origem das espécies, mecanismos de

evolução e argumentos do evolucionismo analisados com uma abordagem mais exaustiva e,

por outro lado, os manuais de Silva et al. (2004, 2008) ao serem os que menos argumentos do

evolucionismo transpuseram e conterem simultaneamente uma apresentação mais sintética e

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menos rica em detalhes, exemplos e propostas de atividades. De facto, interprogramas a

transposição dos conteúdos registou algumas diferenças, dado que os manuais que não contêm

alguns dos mecanismos e das provas de evolução analisadas correspondem maioritariamente a

manuais publicados em 2004 e 2008, o que se compreende dado que os autores pretenderam

adequar estes manuais ao programa de 2003 que recomenda “evitar o estudo pormenorizado

das teorias evolucionistas” (p.11) e “evitar a abordagem exaustiva dos argumentos que

fundamentam a teoria evolucionista” (p.12). Desse modo, estes autores recorreram a menos

exemplos e/ou abordaram-nos mais superficialmente; não transpuseram, nomeadamente, as

discussões dos cientistas sobre as teorias evolucionistas, que demostram a dificuldade das

teorias científicas em obterem consenso na comunidade científica.

Considero essas recomendações do programa de limitar o ensino da evolução nas

escolas preocupantes, a este nível do ensino secundário, por afetar as bases do conhecimento

da evolução no único curso em que esta está prescrita, repercutindo-se negativamente na

formação dos alunos.

Será pois necessário refletir sobre esta abordagem e agir no sentido da revisão dos

programas no que diz respeito a este tema, de modo a corrigir a situação de retrocesso que a

última revisão curricular de 2003 desencadeou no ensino da evolução em Portugal. Essa

revisão também se justifica por forma a desmotivar os movimentos anticiência que com o

argumento “ensine-se a controvérsia”, têm vindo a pressionar para que seja ensinado o

criacionismo como uma “Teoria” alternativa ao evolucionismo, como acontece de modo

flagrante nos EUA e de modo mais incipiente na Europa.

Como limitação deste trabalho refiro o facto da DGIDC apenas dispor da listagem

dos manuais escolares mais adotados a partir de 2005, o que levou a que para o período em

análise anterior a 2005, se considerassem as mesmas editoras mais representativas do período

em que há dados oficiais.

No sentido de dar continuidade ao presente estudo sugere-se, como pistas para

trabalhos futuros na mesma linha de investigação, alargá-lo a manuais de mais editoras,

investigar os livros usados a nível universitário e ainda analisar manuais editados entre 1959 e

a década de 1990. Estudos investigativos, estes, cuja importância se reafirma pela razão que é

através dos manuais escolares que o currículo se concretiza e, os seus autores são os

principais intérpretes dos programas oficiais, ao transporem os conteúdos que estes propõem.

É, por isso inegável a importância da avaliação dos manuais escolares, importantes

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mediadores das práticas docentes, para aferir as ideologias e perspetivas que veiculam,

nomeadamente, nesta temática da evolução.

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