32
1 A evolução recente das “taxas fora de bolsa” . O Código dos Valores Mobiliários (1999) * . 1. A ―taxa fora de bolsa‖ no Código dos Valores Mobiliários – “taxa sobre operações de transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado”. 1.1. A Lei de Autorização Legislativa Lei n.º 106/99, de 26 de Julho. 1.2. O art. 211.º do Código dos Valores Mobiliários e o art. 408.º do Código do Mercado de Valores Mobiliários. 1.3. A regulamentação da Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto). 1.4. Apreciação sobre a articulação entre a Lei de Autorização Legislativa, o Código dos Valores Mobiliários e a Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto) 2. A evolução da ―taxa fora de bolsa‖: do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, ao Código do MVM (1991). 3. Contributos para a análise da natureza jurídico-tributária da taxa prevista no art. 211.º do Código dos VM. 1. A “taxa fora de bolsa” no Código dos Valores Mobiliários (Código dos VM) – “taxa sobre operações de transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado”. O art. 211.º do Código dos VM estabelece que “pelas operações de transmissão, a qualquer título, de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado é devida à CMVM 1 uma taxa a fixar por portaria do Ministro das Finanças” (n.º 1), * À data em que foi escrito o presente artigo ainda se encontrava em vigor o Código do Mercado de Valores Mobiliários (Código do MVM), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril. Contudo, tendo em conta que o processo da sua publicação implicará a divulgação ao público em momento, concerteza, ulterior à entrada em vigor do novo Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, 1 de Março de 2000, as referências às normas do Código de 1991 são feitas no pretérito, assumindo-se a sua revogação, com vista a facilitar a leitura, adequando o texto ao momento da sua divulgação. A exposição realizada no ponto «2. A evolução da ―taxa fora de bolsa‖ do Decret o-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, ao Código do MVM (1991)», consiste num extracto, com algumas reformulações necessárias à integração no presente artigo, de um capítulo da dissertação apresentada em Outubro de 1994, no âmbito do Curso de Mestrado (1991-1994) na área das Ciências Jurídico-Empresariais da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, sob o tema ― Dos contratos de bolsa. A compra e venda de valores cotados no código do mercado de valores mobiliários‖ e cuja prova de defesa pública ocorreu em 6 de Fevereiro de 1998. A saber, o Capítulo 9.5. “Os Problemas Relativos à Aplicação das «Taxas de Corretagem» e das «Taxas de Operações de Bolsa e Fora de Bolsa» no Direito Português” (págs. 127-163 da edição policopiada).

A evolução recente das “taxas fora de bolsa”...decorrente das finalidades da sua consagração, das quais parece resultar que, assim sejam capazes de prosseguir as finalidades

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • 1

    A evolução recente das “taxas fora de bolsa” .

    O Código dos Valores Mobiliários (1999)*.

    1. A ―taxa fora de bolsa‖ no Código dos Valores Mobiliários – “taxa sobre operações

    de transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e

    realizadas fora de mercado regulamentado”.

    1.1. A Lei de Autorização Legislativa – Lei n.º 106/99, de 26 de Julho.

    1.2. O art. 211.º do Código dos Valores Mobiliários e o art. 408.º do Código do Mercado

    de Valores Mobiliários.

    1.3. A regulamentação da Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto).

    1.4. Apreciação sobre a articulação entre a Lei de Autorização Legislativa, o Código dos

    Valores Mobiliários e a Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto)

    2. A evolução da ―taxa fora de bolsa‖: do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, ao

    Código do MVM (1991).

    3. Contributos para a análise da natureza jurídico-tributária da taxa prevista no art. 211.º

    do Código dos VM.

    1. A “taxa fora de bolsa” no Código dos Valores Mobiliários (Código dos VM) –

    “taxa sobre operações de transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em

    mercado regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado”.

    O art. 211.º do Código dos VM estabelece que

    “pelas operações de transmissão, a qualquer título, de valores mobiliários admitidos à

    negociação em mercado regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado é

    devida à CMVM1 uma taxa a fixar por portaria do Ministro das Finanças” (n.º 1),

    * À data em que foi escrito o presente artigo ainda se encontrava em vigor o Código do Mercado de Valores

    Mobiliários (Código do MVM), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril. Contudo, tendo em conta que o

    processo da sua publicação implicará a divulgação ao público em momento, concerteza, ulterior à entrada em vigor do

    novo Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, 1 de Março de 2000,

    as referências às normas do Código de 1991 são feitas no pretérito, assumindo-se a sua revogação, com vista a facilitar a

    leitura, adequando o texto ao momento da sua divulgação.

    A exposição realizada no ponto «2. A evolução da ―taxa fora de bolsa‖ do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, ao

    Código do MVM (1991)», consiste num extracto, com algumas reformulações necessárias à integração no presente

    artigo, de um capítulo da dissertação apresentada em Outubro de 1994, no âmbito do Curso de Mestrado (1991-1994) na

    área das Ciências Jurídico-Empresariais da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, sob o tema ―Dos contratos

    de bolsa. A compra e venda de valores cotados no código do mercado de valores mobiliários‖ e cuja prova de defesa

    pública ocorreu em 6 de Fevereiro de 1998. A saber, o Capítulo 9.5. “Os Problemas Relativos à Aplicação das «Taxas de

    Corretagem» e das «Taxas de Operações de Bolsa e Fora de Bolsa» no Direito Português” (págs. 127-163 da edição

    policopiada).

  • 2

    podendo a portaria “isentar certas operações do pagamento da taxa” (n.º 3) 2.

    O legislador fixou nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 211.º as finalidades que presidem à

    fixação da taxa sobre a transmissão, a qualquer título, de valores mobiliários admitidos à

    negociação em mercado regulamento, quando realizadas fora desse mercado:

    a) a remuneração dos serviços prestados pela CMVM em relação aos valores

    mobiliários em causa;

    b) a criação de condições que assegurem a neutralidade da negociação dos valores

    mobiliários nesse mercado ou fora dele.

    Quanto à sua cobrança, prescreve o n.º 4 que as taxas “são cobradas pelos notários e

    pelos intermediários financeiros que intervierem na operação, ficando estes responsáveis

    pela entrega à CMVM, independentemente de terem ou não procedido à sua cobrança”.

    1.1. A Lei de Autorização Legislativa – Lei n.º 106/99, de 26 de Julho.

    A aprovação pelo Código dos Valores Mobiliários de uma ―taxa sobre operações de

    transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado

    realizadas fora de mercado regulamentado‖ foi realizada ao abrigo da autorização

    legislativa conferida ao Governo pela Lei n.º 106/99, de 26 de Julho, para efeitos, supõe-se,

    naturalmente, de legitimar a inclusão no Código dos VM (a aprovar por decreto-lei) de

    matérias de reserva de competência legislativa da Assembleia da República.

    Resulta dos termos da alínea e) do art. 1.º da Lei n.º 106/99, de 26 de Julho, que foi

    concedida ao Governo “autorização legislativa para, no âmbito dos mercados de valores

    mobiliários e de outros instrumentos financeiros”, “estabelecer o regime das taxas

    devidas pela realização de operações sobre valores mobiliários ou outros instrumentos

    financeiros e pelos serviços de supervisão”.

    Na fixação do sentido e extensão da autorização legislativa, relativamente às ―taxas

    devidas nos mercados de valores mobiliários e outros instrumentos financeiros‖, o n.º 1 do

    art. 13.º da citada lei explicitou a autorização ao Governo no sentido de este estabelecer:

    “a) taxas a cobrar pela CMVM, que incidam sobre as operações relativas a valores

    mobiliários e outros instrumentos financeiros admitidos à negociação em mercados

    regulamentados que seja realizadas fora desses mercados;

    b) taxas, a cobrar pela CMVM pelos serviços de supervisão por esta prestados aos

    investidores, às entidades emitentes, aos intermediários financeiros, às entidades gestoras

    de mercados e de sistemas de liquidação ou a quaisquer outras entidades”.

    1 A Comissão do Mercado de valores Mobiliários é uma pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia

    administrativa e financeira e de património próprio, como estabelece o art. 1.º do respectivo Estatuto, aprovado pelo

    Decreto-Lei n.º 473/99, de 8 de Novembro. É mantida a qualificação que, aquando da sua criação, lhe foi atribuída –

    cfr. o art. 9.º do Código do MVM.

    2 Cfr. o art. 200.º do Código dos VM que estabelece o que são mercados regulamentados, resultando da sua articulação

    com o disposto no art. 213.º que os mercados de bolsa são mercados regulamentados.

  • 3

    De acordo com o disposto no n.º 2 do mesmo artigo 13.º, “as taxas referidas nas

    alíneas a) e b) do n.º 1 devem ser estabelecidas por forma a criar condições que

    assegurem:

    a) a neutralidade da negociação, em mercado regulamentado ou fora dele, dos

    valores mobiliários e outros instrumentos financeiros admitidos à negociação no primeiro;

    b) a compensação pelos serviços de supervisão quer genericamente considerados quer

    em concreto.”

    1.2. O art. 211.º do Código dos Valores Mobiliários e o art. 408.º do Código do

    Mercado de Valores Mobiliários.

    São claras as semelhanças da taxa prevista no art. 211.º do Código dos VM com a

    denominada ―taxa sobre operações fora de bolsa‖ prevista no revogado Código do MVM no

    art. 408.º, podendo afirmar-se que se trata da manutenção desta com redução da base de

    incidência. Ambas abrangem operações de transmissão de valores mobiliários, qualquer que

    seja o título por que se dê essa transmissão.

    Ao nível das diferenças de percepção imediata, resulta dos pressupostos da incidência

    fixados nas duas normas que: a taxa prevista no Código dos VM incide apenas sobre certas

    transmissões de valores mobiliários, a saber, as que tenham por objecto valores mobiliários

    admitidos à negociação em mercado regulamentado, quando realizadas fora de mercado

    regulamentado; no Código do MVM os pressupostos da incidência da taxa eram indiferentes

    ao facto de os valores mobiliários se encontrarem ou não admitidos à negociação em bolsa,

    ainda que tais factos não fossem irrelevantes para efeitos do montante da taxa aplicável,

    sendo superior a taxa devida nas transmissões sobre valores admitidos à negociação em bolsa

    realizadas fora de bolsa, comparativamente com a taxa das operações sobre valores não

    admitidos à negociação em bolsa3.

    Por outro lado, no Código do MVM, os pressupostos da aplicação da taxa incluíam a

    referência a transmissões ―realizadas com a intervenção, seja para que efeito [fosse], de

    intermediário financeiro ou de notário‖, ficando a cargo destes a sua cobrança; no Código

    dos VM não se encontra essa alusão nos pressupostos da sujeição à taxa, fazendo apenas

    impender a obrigação de cobrança das taxas os notários e os intermediários financeiros que

    intervierem na operação. Não obstante, porque parece resultar como necessária a verificação

    do requisito da sua intervenção para ficarem obrigados à cobrança da taxa, a ser assim, tal

    traduzirá a manutenção do mesmo regime que vigorava anteriormente: incidência da taxa

    (apenas) no caso de intervenção de notário ou intermediário financeiro.

    Esse não foi o sentido fixado pela Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto),

    emitida em regulamentação de tais normas, como se verá mais à frente.

    Ao nível das diferenças, resulta, ainda, que são objecto da tributação ―quaisquer

    transmissões‖, assim se verifiquem os requisitos já enunciados, sendo que o Código do

    MVM precisava que se abrangiam as transmissões fora de bolsa, ―a título gratuito ou

    3 Cfr. a Portaria n.º 904/95, de 18 de Junho (revogada com a entrada em vigor do Código dos VM), com a redacção

    dada pela Portaria n.º 927/99, de 31 de Agosto, que fixou as taxas fora de bolsa, com efeitos a partir de 1 de

    Setembro de 1999, em 1,5‰ para as operações sobre valores admitidos à negociação em bolsa, e 0,25‰ para as

    operações sobre valores não admitidos à negociação em bolsa.

  • 4

    oneroso‖, enquanto o Código dos VM se refere apenas a transmissões ―a qualquer título‖.

    Sem prejuízo de análise mais cuidada, tratar-se-á de uma fórmula simplificadora que

    mantém, no mínimo, a abrangência da redacção anterior4.

    É, ainda, de realçar que as taxas sobre operações fora de bolsa previstas no art. 408.º do

    Código do MVM eram devidas em montantes ―não inferiores aos estabelecidos para as taxas

    de bolsa, enquanto que na redacção do art. 211.º do Código dos VM não se encontra

    qualquer limitação quantitativa indexada a valores de referência, mas, tão-só uma limitação

    decorrente das finalidades da sua consagração, das quais parece resultar que, assim sejam

    capazes de prosseguir as finalidades da sua criação, o valor das taxas, a fixar

    regulamentarmente, poderá ser inferior ao das taxas aplicáveis às operações realizadas nos

    mercados regulamentados.

    Sem a pretensão de esgotar a comparação, deve realçar-se o facto de o Código dos VM

    ter consagrado no n.º 4 do art. 211.º um regime de igualdade em matéria de responsabilidade

    pela cobrança da taxa, aplicando-se igualmente aos intermediários financeiros e aos notários,

    responsabilizando-os pela sua entrega à CMVM, independentemente de terem ou não

    procedido à sua cobrança. É assim ultrapassada a discriminação que resultava do n.º 4 do art.

    408.º do Código do MVM que apenas responsabilizava os intermediários financeiros pelo

    pontual pagamento à CMVM das taxas relativas às operações em que interviessem,

    independentemente de haverem ou não procedido à sua oportuna cobrança. Contudo, tal

    igualização apenas cumprirá os desígnios que o legislador terá visado se a actividade de

    supervisão abranger com igual intensidade a actividade de ambas as categorias subjectivas

    intervenientes nas operações sujeitas a tributação.

    Por último, a receita da liquidação das taxas é atribuída, em ambos os instrumentos

    legislativos, à CMVM. No âmbito do Código do MVM, tal resultava da alínea b) do n.º 1 do

    art. 40.º e do n.º 2 do art. 408.º. Com a entrada em vigência do Código dos VM, tal solução

    está agora consagrada no (novo) Estatuto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários,

    aprovado pelo Decreto-Lei n.º 473/99, de 8 de Novembro, na alínea b) do n.º 1 do seu art.

    26.º (Receitas) - e que entrará em vigor aquando daquele Código – 1 de Março de 20005.

    Diferentemente da previsão do Código do MVM, o Código dos VM não consagra

    qualquer regime de partilha mútua de receitas, seja das taxas de bolsa (de titularidade das

    associações de bolsa), seja da receita das taxas fora de bolsa (de titularidade da CMVM),

    entre as entidades gestoras dos mercados e a CMVM6. Não o prevê o Código dos VM do

    4 Neste sentido, cfr. o n.º 1 do art. 3.º (Operações fora de mercados regulamentados) da Portaria do Ministro das

    Finanças (Anteprojecto), analisada, infra, no ponto1.3., nos termos do qual a taxa é aplicável às operações

    “realizadas fora de mercado regulamentado, ainda que a título gratuito”.

    5 Cfr. o art. 3.º do Decreto-Lei n.º 473/99, de 8 de Novembro, e o art. 2.º do Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de

    Novembro.

    6 Efectivamente, decorria do n.º 2 do art. 408.º do Código do MVM o poder de ―o Ministro das Finanças estabelecer,

    mediante portaria, sob proposta da Comissão e com audiência prévia das associações das bolsas, ou a solicitação

    fundamentada destas e com o parecer da CMVM, que uma percentagem, que fixará, do produto das mesmas taxas, ou a

    totalidade ou parte das taxas respeitantes a operações fora de bolsa sobre determinados valores mobiliários,

    nomeadamente sobre valores cotados, se destine às associações de bolsa, distribuindo-se entre elas nos termos que

    igualmente definirá‖.

  • 5

    modo directo que até aqui existia. Mas prevê-o parcialmente a Portaria do Ministro das

    Finanças (Anteprojecto) que vem regulamentar as ―taxas de supervisão‖.

    1.3. A regulamentação da Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto).

    Ao abrigo do artigo 211.º do Código dos VM e o n.º 2 do artigo 26.º do Estatuto da

    Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 473/90, de 8

    de Novembro, foi aprovada a Portaria n.º (xx/2000) pelo Ministro das Finanças, com vista

    a regulamentar as normas, supra, citadas, tem por título ―Taxas de supervisão”.

    De modo sintético, ao nível da incidência subjectiva das taxas aí previstas encontram-

    se taxas incidentes sobre:

    i) as entidades gestoras de mercados de bolsa/dívida pública/outros mercados

    regulamentados (arts. 1.º e 2.º);

    ii) as entidades gestoras de mercado não regulamentados (art. 3.º, n.º 2);

    iii) as entidades gestoras de sistemas centralizados de valores mobiliários e de

    liquidação (art. 5.º);

    iv) as partes de operações realizadas fora de mercado regulamentado (art. 3.º);

    As taxas incidem, consoante os casos, sobre o valor das operações, sobre o número de

    instrumentos negociados ou sobre as comissões cobradas, a saber:

    • sobre as operações de bolsa, recai a taxa a pagar pelas entidades gestoras do mercado

    de bolsa incide “sobre cada operação de compra e sobre cada operação de venda, tanto

    em sessões normais, como em sessões especiais”, dependendo dos instrumentos objecto da

    operação, sendo a taxa mínima no valor de 0,0075‰, aplicável a operações sobre

    obrigações do Tesouro de médio e longo prazo, e a máxima, de 0,0375‰, aplicável às

    No reverso desta solução, o art. 407.º do mesmo Código, previa a ―taxa de realização de operações de bolsa‖,

    reconhecendo-a, no seu n.º 3, como receita da bolsa (em rigor, da(s) associação(ões) de bolsa), sem prejuízo de o

    Ministro das Finanças poder determinar, mediante portaria, que do produto da sua cobrança as associações de bolsa

    pagassem à CMVM uma percentagem a fixar, sob proposta da Comissão e com audiência prévia dos conselhos de

    administração das associações referidas.

    O Ministro das Finanças veio a exercer tais prerrogativas, através da Portaria nº 1001/91, de 2 de Outubro, que foi

    revogada pela Portaria nº 905/95, de 18 de Julho (com a redacção dada pela Portaria n.º 1020/98, de 9 de Dezembro).

    Assinale-se que esta “repartição” configurou, ostensivamente, uma solução de duvidosa legalidade dada a natureza

    jurídica das prestações, a qualidade das entidades titulares das prestações e o instrumento legislativo pelo qual se

    concretizava.

    Efectivamente, esta solução consagrada no Código e regulamentada nos termos referidos, sempre poderia ser apontada

    como inconstitucional, assim, se qualifique como um imposto exigido sem fundamento em lei formal esta «transferência»

    de receitas próprias de uma pessoa de direito privado (as associações de bolsa) para uma pessoa colectiva de direito

    público, sem que se vislumbre uma qualquer contrapartida directa. Ora, não se encontrava na Lei n.º 44/90, de 11 de

    Agosto, pela qual a Assembleia da República conferiu ao Governo autorização para legislar sobre matérias penais e

    fiscais (a incluir no Código do MVM), nem em qualquer outra lei em sentido formal, tal autorização legislativa.

  • 6

    operações sobre acções. Por cada contrato de futuro ou opções negociado em bolsa é

    devida uma taxa de 1 cêntimo. – cfr. art. 1.º da Portaria (Anteprojecto);

    Por esta via, mantém a referida partilha de receitas entre entidades gestoras de bolsas

    e a CMVM, só que apenas num sentido: é receita da CMVM uma parte das receitas

    daquelas entidades pela realização de operações de bolsa (e outros mercados

    regulamentados). De resto, no preâmbulo da Portaria, é assumida uma “redução [da]

    participação da CMVM nas taxas de realização de operações de bolsa que de 35% passa

    a ser de 25% se confrontadas as taxas de supervisão que agora se fixam com as taxas de

    realização de operações em vigor”;

    • sobre as operações realizadas em mercado regulamentado de dívida pública. “por

    cada membro do Mercado Especial de Dívida Pública, a respectiva entidade gestora paga

    uma taxa mensal de € 500”, não havendo lugar ao pagamento à CMVM de quaisquer

    outras taxas pela realização de operações nesse mercado; não é devida qualquer taxa à

    CMVM pelas operações realizadas no Mercado Especial de Operações por Grosso;

    • sobre as operações “realizadas fora de mercado regulamentado, ainda que a título

    gratuito”, sobre valores mobiliários admitidos nesse mercado, ―é devida pelo adquirente e

    pelo alienante uma taxa sobre cada operação de aquisição e sobre cada operação de

    alienação”, variando, conforme os instrumentos objecto da operação, entre uma a taxa de

    0,06‰, aplicável a operações sobre obrigações do Tesouro de médio e longo prazo, e de

    1,2‰, aplicável às operações sobre direitos destacados, warrants e acções – cfr. art. 3.º.

    Não está prevista qualquer taxa que, de algum modo, acautele a neutralidade de

    negociação de instrumentos derivados negociados em bolsa fora de bolsa ou, mesmo, de

    instrumentos que tenham aqueles por referência, ainda que não tenham exactamente as

    mesmas características (especificações).

    • sobre as entidades gestoras de sistemas centralizados de valores mobiliários e de

    sistemas de liquidação incide “uma taxa de 15% sobre as comissões por elas cobradas

    nessa qualidade” – cfr. art. 5.º;

    Estão excluídas da incidência das ―taxas de supervisão‖ as operações de reporte e de

    empréstimo geridos por entidade gestora de mercado ou de sistema de liquidação – cfr. art.

    6.º.

    A liquidação e o pagamento das taxas será realizado, nuns casos, pelas próprias

    entidades gestoras de mercados e de sistemas centralizados, noutros casos, pelos

    intermediários financeiros ou pelo notário e, noutros ainda, pelas partes, quando na

    operação não haja intervenção de intermediário financeiro ou notário, tudo, conforme a

    estatuição dos números 1 a 4 do artigo 4.º e do artigo 5.º.

    Como se pode constatar, o n.º 4 do artigo 4.º da Portaria, vem ultrapassar as dúvidas

    interpretativas acima enunciadas quanto ao âmbito da incidência da taxa, fixada no n.º 1

    do art. 211.º do Código dos VM, resultantes do confronto desta norma com o art. 408.º do

    Código do MVM. Como referido, este último, incluía na fixação do pressuposto da ―taxa

    fora de bolsa‖ a necessidade de se verificar a “intervenção, seja para que feito[fosse], de

  • 7

    intermediário financeiro ou notário”, diferentemente da previsão do n.º 1 do artigo 211.º

    do Código dos VM, o qual apenas alude ao notário e ao intermediário financeiro para

    efeitos da cobrança da taxa.

    O auxílio interpretativo dado pelo citado artigo 4.º - norma relativa à liquidação da

    taxa-, vai no sentido de que a nova taxa incide sobre quaisquer operações, haja ou não

    intervenção de notário ou de intermediário financeiro. Tal solução afigura-se, contudo,

    excessiva.

    O n.º 4 do art. 211.º do Código dos VM, ao estabelecer sobre os notários e os

    intermediários financeiros “que intervierem na operação” a obrigação de cobrança da

    taxa, permite sustentar que a solução ao nível da incidência da taxa é a mesma da prevista

    no revogado art. 408.º: apenas quando haja intervenção de intermediário financeiro ou

    notário. Efectivamente, o Código dos VM, estabelece que a liquidação e cobrança da taxa é

    obrigação dos notários e dos intermediários financeiros que intervierem na operação, nunca

    se referindo às próprias partes da operação como o faz o n.º 4 do art. 4.º. Se o legislador o

    tivesse querido, haveria de o referir como a propósito de outras soluções tributárias, v.g. ao

    nível (meramente) da realização de obrigações acessórias de comunicação (cfr. art. a alínea

    a) do art. 128.º do Código do IRS.

    De resto, esta solução de autoliquidação configura uma solução de marcada

    singularidade em termos de regras tributárias, uma vez que dispensa a existência de

    quaisquer qualidades especiais das partes que permitam o controlo da liquidação da taxa,

    mais fazendo recair sobre estas um encargo administrativo, por si só, perturbador da

    realização de transacções.

    Tudo, sem prejuízo de, na prática, a realização de operações sobre valores admitidos à

    negociação em bolsa vir a coincidir com operações em que se verificará a intervenção de

    um intermediário financeiro.

    1.4. Apreciação sobre a articulação entre a Lei de Autorização Legislativa, o

    Código dos Valores Mobiliários e a Portaria do Ministro das Finanças (Anteprojecto).

    É certo que no corpo do n.º 2 do citado artigo 13.º da Lei n.º 106/99, de 26 de Julho,

    não se inclui na parte final o termo ―respectivamente‖. Não obstante, de uma leitura em

    singelo das alíneas a) e b), dos números 1 e 2, será legítimo que, em face de uma tentativa

    de proceder à sua articulação, se vislumbre uma ligação, respectivamente, entre as taxas

    incidentes sobre operações relativas a valores mobiliários, referida na alínea a) do n.º 1, e a

    finalidade de neutralidade fixada na alínea a) do n.º 2, e as taxas a cobrar pelos serviços de

    supervisão, referidas na alínea b) do n.º 1, e a finalidade de compensação (remuneratória)

    fixada na alínea b) do n.º 2.

    Contudo, foi diverso o sentido com que foi utilizada tal autorização legislativa,

    conforme se retira do citado artigo 211.º do Código dos Valores Mobiliários e mais se

    confirma da leitura do terceiro parágrafo do ponto n.º 14 do preâmbulo ao Decreto-Lei n.º

    486/99, de 13 de Novembro, que aprovou o mesmo Código, ao identificar os limites das

    taxas a cobrar por operações realizadas fora de mercado regulamentado, e segundo o qual:

    “clarific[ou]-se o regime das taxas a cobrar por operações realizadas fora de mercado

    regulamentado, passando agora a incidir apenas sobre as operações que tenham por

  • 8

    objecto valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e que

    tenham sido realizadas fora desse mercado (artigo 211º). A habilitação regulamentar

    atribuída ao Ministro das Finanças está balizada por dois limites: a taxa deve respeitar

    um princípio de neutralidade entre a negociação em mercado regulamentado e fora de

    mercado regulamentado; o seu pagamento deve ter correspondência em serviços de

    supervisão prestados pela CMVM.”

    Parece claro o propósito do legislador de delimitar o exercício regulamentar em

    matéria de fixação da referida taxa, vinculando-o às finalidades declaradas para a sua

    consagração: a realização (prossecução) da neutralidade entre a negociação em mercado

    regulamentado e fora de mercado regulamentado ao nível dos custos de transacção

    (naturalmente, dos que não possam ser fixados livremente pelos agentes do mercado) e a

    remuneração dos serviços de supervisão prestados pela CMVM, estes, de acordo com o

    teor da autorização legislativa, ―quer genericamente considerados quer em concreto‖.

    Assim, ao contrário do que parecia decorrer da citada norma da lei de autorização

    legislativa, o novo Código não veio criar dois tipos de taxas, uma incidente sobre

    operações realizadas fora de mercado regulamentado e outra de compensação dos serviços

    de supervisão realizados pela CMVM. Veio consagrar apenas uma taxa: taxa sobre

    operações de transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado

    regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado, a qual cumprirá, também, uma

    função de financiamento da actividade de supervisão da CMVM7.

    Contudo, e como exposto, foi diverso o sentido plasmado na Portaria aprovada pelo

    Ministro das Finanças (Anteprojecto), a qual, retomando a filosofia da Lei de autorização

    legislativa, vem regulamentar a ―taxa sobre operações de transmissão de valores

    mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado realizadas fora de mercado

    regulamentado‖, e regulamentar (ou criar?) verdadeiras taxas de supervisão, reduzindo

    toda a regulamentação no título da portaria a ―taxas de supervisão‖, invocando quer o

    artigo 211.º do Código dos VM, quer o n.º 2 do artigo 26.º do Estatuto da CMVM.

    Ora, da articulação de tudo o que ficou anteriormente enunciado, afigura-se-ia que a

    utilização da referida autorização legislativa se teria concretizado pela consagração da

    ―taxa sobre operações de transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em

    mercado regulamentado realizadas fora de mercado regulamentado‖, nem parecendo

    apontar em sentido diverso, numa primeira análise, a própria previsão do Estatuto da

    CMVM, em especial o art. 26.º (invocado para efeitos de aprovação da portaria em

    análise).

    Efectivamente, a contribuição directa do art. 26.º do Estatuto da CMVM para a

    questão em análise traduz-se na previsão expressa de constituírem receitas da CMVM, ―as

    taxas devidas pelas transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado

    regulamentado e realizadas fora de mercado regulamentado‖ (cfr. al. b) do n.º 1 do art.

    26.º). Não faz qualquer referência directa a ―taxas de supervisão‖.

    7 Em abono desta interpretação pode invocar-se ainda a al. b) do n.º 1 do art. 26.º do Estatuto da CMVM, aprovado

    pelo Decreto-Lei n.º 473/99, de 8 de Novembro, que estabelece que constituem receita da CMVM “as taxas devidas pela

    transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e realizadas fora de mercado

    regulamentado”, não sendo incluída, no mesmo artigo, nenhuma previsão directa relativa a “taxas de supervisão”, não se

    apresentando com abrangência bastante para o efeito o teor de qualquer das demais alíneas deste artigo, não deixando tais

    alíneas, por essa mesma razão, de suscitar a dúvida sobre o tipo de prestações que aí se pretende abranger.

  • 9

    Não obstante, e dada a previsão, também como receita da CMVM, nas alíneas a) e c)

    do n.º 1 do citado art. 26.º, respectivamente, de “taxas devidas pelas entidades gestoras de

    mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários” e

    de “taxas devidas por operações sobre valores mobiliários, realizadas em mercados

    registados ou por entidades gestoras de fundos de investimento”, vem a Portaria

    regulamentar todas as taxas acima enunciadas.

    É, pois, verdade que nesse art. 26.º se prevêem taxas incidentes sobre ―entidades

    gestoras‖. Mas, concomitantemente, também parece ser verdade que essas taxas não são

    objecto de qualquer previsão no Código dos VM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de

    13 de Novembro, diploma que utilizou a autorização legislativa contida na Lei n.º 106/99,

    não existindo, por sua vez, qualquer menção de tal utilização no Decreto-Lei n.º 473/99, de

    8 de Novembro, que aprovou o Estatuto da CMVM.

    À luz da análise das finalidades enunciadas é que se há-de realizar a reflexão sobre a

    natureza jurídico-tributária destas prestações, em especial da ―taxa sobre operações de

    transmissão de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado

    realizadas fora de mercado regulamentado‖, tendo em conta que, historicamente, já a razão

    da ―neutralidade‖ terá estado na génese da criação da figura das ―taxas fora de bolsa‖

    previstas no Código do MVM, suscitando estas, desde sempre, questões legítimas sobre a

    sua natureza jurídico-tributária de imposto, e por isso, ainda na vigência da legislação ora

    revogada, legítimas dúvidas sobre a legalidade da sua criação.

    2. A evolução da “taxa fora de bolsa”: do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro,

    ao Código do MVM (1991).

    2.1. Os Problemas Relativos à Aplicação das «Taxas de Corretagem» e das

    «Taxas de Operações de Bolsa e Fora de Bolsa» no Direito Português.

    Além das taxas de corretagem fixadas a favor dos corretores, o Decreto-Lei n.º 8/74,

    de 14 de Janeiro, previa no artigo 87.º a cobrança de «taxas de operações» nas operações

    realizadas nas sessões de bolsa, ou, como resultou de alteração da redacção primitiva de tal

    disposição, «por todas as operações de bolsa», constituindo receita da bolsa8, sendo estas

    entidades, até ao Código do MVM, institutos públicos.

    No seguimento deste diploma, e em resultado de uma evolução que, a seguir, será

    referida, surgiram as designadas «taxas sobre operações fora de bolsa», aplicáveis a

    quaisquer transacções de valores mobiliários, em que tivesse havido intervenção de

    corretor, notário ou instituição de crédito.

    8 O Regulamento da Bolsa, de 1901, estabelecia taxas de admissão à cotação (artigo 29.º) e de realização de operações

    a prazo que constituíam receita da bolsa (cfr. artigo 61.º e 65.º).

  • 10

    Estas taxas vêm a ser mantidas pelos artigos 407.º (Taxa de realização de operações

    de bolsa) e 408.º (Taxa sobre operações fora de bolsa) do Código do MVM. As primeiras

    como contrapartida da «realização de transacções de bolsa», sendo devida uma «taxa de

    compra e de venda», cuja fixação cabia à CMVM. As segundas, incidiam sobre «todas as

    transmissões fora de bolsa, a título gratuito ou oneroso, de quaisquer valores mobiliários,

    realizadas com a intervenção, seja para que efeito for, de intermediário financeiro ou de

    notário», sendo devidas como taxas não inferiores às estabelecidas para as operações de

    bolsa, e cujo montante, valor sobre que incidiam e processo de liquidação e cobrança

    cabiam ao Ministro das Finanças (mediante portaria), sob proposta da CMVM.

    2.1.1. Do Decreto-Lei n.º 8/74 ao Código do MVM.

    O Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro, revogando o Decreto de 10 de Outubro de 1901,

    estatuía que por todas as operações de bolsa realizadas com intervenção de corretor seriam

    devidas taxas a fixar em portaria do Ministro das Finanças [artigo 87.º (Taxas de

    operações)]9, constituindo receitas próprias das bolsas, conforme a alínea b) do n.º 1 do

    artigo 22.º. Consagrava, também, o direito dos corretores às corretagens previstas nas

    tabelas (a fixar nos termos estabelecidos para as taxas de operações), pela prestação dos

    serviços «do seu cargo» [artigo 88.º (Corretagem)], sendo que, nos casos omissos, as

    corretagens seriam provisoriamente arbitradas pela comissão directiva da bolsa (n.º 2)10.

    As «taxas de operações» haviam de ser cobradas, não só pelas operações realizadas

    nas sessões normais e nas especiais, antes, em quaisquer operações de bolsa realizadas

    (necessariamente) com intervenção de corretor, permitindo, legitimamente, questionar

    sobre a abrangência de operações que não se efectuassem na bolsa11. Contudo, como se

    verá mais à frente, a prática corrente, fruto de uma desenfreada sucessão normativa nesta

    matéria, conduziu a soluções algo diversas.

    Em regulamentação do prescrito no artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de

    Janeiro, sucederam-se várias portarias do Ministro das Finanças, visando estabelecer as

    9 Tal redacção do artigo 87.º resultou de alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 696/75, de 12 de Dezembro, pelo

    qual parece ter sido alargado o âmbito de aplicação das taxas de operações uma vez que na sua redacção primitiva

    resultavam devidas taxas de operações «pelas operações realizadas em bolsa, tanto nas sessões normais como nas sessões

    especiais(…)». A nova redacção resultou, aparentemente, mais abrangente do que a primitiva. A concretização da

    extensão de uma e de outra das redacções implica necessariamente com o conceito de «operações de bolsa».

    10 A comissão directiva era um órgão de administração das bolsas de valores durante a vigência do Decreto-Lei n.º

    8/74, mantendo-se, ainda, em funções, transitoriamente, após a entrada em vigor do Código do MVM - cfr. artigo 9.º e ss.

    do Decreto-Lei n.º 8/74 e artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril.

    11 Face a esta interpretação, reafirmada em desenvolvimentos legislativos e regulamentares ulteriores que reiteraram e

    alargaram a aplicabilidade de taxas de operações (por corretores e, mesmo, por notários e instituições de crédito) a

    operações não realizadas nas bolsas, parece resultar natural a interrogação quanto à natureza jurídica desta prestação

    exigida independentemente de a realização das operações ter lugar na bolsa ou fora da bolsa. Se, quanto à sua cobrança

    pelo corretor, como «oficial público», tal exigibilidade poderia tentar justificar-se, dada a ligação orgânica deste à

    instituição bolsista. No sentido da qualificação do «agenti di cambio» como organo da instituição que é a bolsa, veja-se,

    MARIO ROTONDI, Studi di diritto commerciale e di diritto generale delle obbligazioni, Padova, Cedam, 1961, p. 413.

    Já quanto à sua exigibilidade por outros agentes parece assumir claramente a natureza de um imposto dada a

    inexistência de qualquer contraprestação face ao pagamento da «taxa», como se desenvolverá mais à frente.

  • 11

    taxas de corretagem a que os corretores tinham direito: Portaria n.º 265/74, de 10 de Abril,

    Portaria n.º 383/76, de 25 de Junho, Portaria n.º 200/79, de 27 de Abril, Portaria n.º 6/86,

    de 6 de Janeiro e a Portaria n.º 782/86, de 31 de Dezembro12.

    A fórmula utilizada para o estabelecimento das «taxas de corretagem», em

    regulamentação do supracitado artigo 88.º, resultou igual nas portarias de 1974, 1976 e de

    1979: «Pela prestação dos serviços a seu cargo, os corretores das bolsas de valores

    cobrarão as seguintes taxas, calculadas sobre o montante das operações que

    efectuem(…)».

    Os maiores problemas relativos às taxas de corretagem e às taxas de operações foram

    suscitados pela Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, emitida em regulamentação do

    Decreto-Lei n.º 150/77, de 13 de Abril (Registo ou depósito de acções), e pela Portaria n.º

    448/81, de 2 de Junho. A publicação de tais diplomas legais originou uma «revolução» no

    regime de taxas de corretagem e de operações aplicáveis até então, com repercussão nas

    Portarias n.ºs 6/86, de 6 de Janeiro, e 782/86, de 31 de Dezembro.

    Com efeito, pelo Decreto-Lei n.º 150/77, de 13 de Abril, foi estabelecido um regime

    de registo ou de depósito de acções representativas do capital social de sociedades

    anónimas ou em comandita por acções, com sede em Portugal, quer ao portador, quer

    nominativas, definitivamente tituladas ou representadas por cautelas, oferecendo aos

    titulares desses valores duas soluções à escolha: o registo destas na sede da sociedade

    emitente ou o seu depósito numa instituição de crédito. A mudança de uma para outra

    opção era totalmente livre, assim fossem observadas as formalidades prescritas para tal.

    Nos termos deste regime de registo ou depósito estabelecido para as acções, a

    transmissão destas passou, necessariamente, a ter intervenção do corretor (artigo 22.º)

    (como já era exigido) quando se realizasse em bolsa; do notário (artigo 26.º), nas

    transmissão fora de bolsa de acções registadas; e de instituição de crédito (artigo 27.º) nas

    transmissões fora de bolsa de acções depositadas.

    No capítulo VII (Disposições complementares) do citado decreto-lei, era estabelecido,

    no artigo 32.º, que seriam fixadas «por portaria dos Ministros da Justiça e das Finanças as

    taxas ou comissões devidas pela prática de actos referidos no presente diploma e respectiva

    forma de pagamento».

    Consequentemente, a Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, conforme o seu preâmbulo,

    «tornando-se necessário dar cumprimento ao disposto no artigo 32.º do Decreto-Lei n.º

    150/77, de 13 de Abril(…)» estabeleceu «as taxas e comissões devidas pela prática dos

    actos referidos no citado Decreto-Lei e a forma do respectivo pagamento(…)».

    Nos termos desta Portaria (cfr. os n.ºs 3.º a 5.º), seriam devidas nas transmissões de

    acções entre vivos, a título gratuito ou oneroso, a taxa de realização de operações de bolsa

    12 Da primeira para a segunda, apenas foram aumentadas as permilagens aplicáveis sobre o montante das operações,

    destas duas para a terceira, foi alterada a fórmula do mínimo de corretagem a cobrar. Aquelas estabeleciam que a

    corretagem não seria, em qualquer caso, inferior a 5 escudos. A última estabelecia que à taxa calculada acresceria sempre

    uma taxa fixa de 25 escudos.

    Estas Portarias diferenciaram as permilagens a aplicar, atendendo ao tipo de valores mobiliários objecto da operação.

    Operaram a diferenciação entre fundos públicos nacionais e títulos equiparados, fundos públicos estrangeiros e títulos

    equiparados e quaisquer obrigações e, ainda, quaisquer acções ou outros valores mobiliários. Respectivamente, foram

    fixadas as permilagens de 1,5‰, 2,5‰ e 3,5‰, pela Portaria n.º 265/74, de 10 de Abril, e 3‰, 4‰ e 5‰, pela Portaria

    n.º 383/76, de 25 de Junho (taxas mantidas pela Portaria n.º 200/79, de 27 de Abril).

  • 12

    e a taxa de corretagem, a que se referiam os artigos 87.º e 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74, de

    14 de Janeiro, nos casos em que tivesse havido intervenção de corretor; quando nas

    mesmas transmissões houvesse intervenção de notário, seriam devidas importâncias iguais

    às duas taxas atrás referidas, constituindo, aquela relativa às operações, receita própria da

    Bolsa de Valores de Lisboa, e, aquela igual à taxa de corretagem, receita do Cofre dos

    Notários, Conservadores e Funcionários de Justiça; quando essas transmissões tivessem

    por objecto valores depositados13 seriam cobrados iguais montantes: uma importância

    igual à taxa de realização de operações de bolsa, a que se refere o referido artigo 87.º, a

    qual constituía receita própria da Bolsa de Valores de Lisboa e uma comissão igual à taxa

    de corretagem fixada nos termos estabelecidos no artigo 88.º do mesmo diploma, a qual

    constituía receita da instituição de crédito depositária, que não poderia cobrar qualquer

    outra importância, excluída a de portes do correio.

    Do exposto, pela transmissão de acções, quaisquer que fossem, a título gratuito ou

    oneroso, e por força do registo ou depósito obrigatórios, resultou a necessidade de

    intervenção de um notário, de uma instituição de crédito ou de um corretor (tendo a

    intervenção deste último carácter indispensável no caso de a transmissão se realizar na

    bolsa). O pagamento dos serviços prestados por tais sujeitos corresponderia às

    importâncias do valor das corretagens e das taxas de operações, quer a transmissão se

    operasse na bolsa ou fora dela. Em qualquer das hipóteses haveria um mesmo custo.

    A Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, chamava a aplicação dos artigos 87.º e 88.º do

    Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, para as transmissões em que houvesse intervenção

    do corretor como, de resto, parece que resultaria da própria letra e âmbito dessas

    disposições legais; também, chamava essas mesmas disposições legais para efeitos de

    fixação da taxa de operações (!) e das remunerações (taxa) a cobrar pelo notário pela

    intervenção em tais transmissões e para tabelar a comissão máxima a cobrar pela

    instituições de crédito depositárias, mencionando expressamente que estas não poderão

    «cobrar qualquer outra importância, excluída a de portes do correio».

    Pode afirmar-se que o legislador se preocupou com a necessidade de uniformização

    dos custos que necessariamente se originariam pela intervenção dos vários sujeitos acima

    referidos, nivelando as suas receitas pela prestação a cobrar pelo corretor, acautelando os

    interesses dos accionistas que, para transmitirem os seus títulos, se viam forçados a

    recorrer a uma das entidades referidas.

    Na vigência do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, por sua vez, a Portaria 448/81,

    de 2 de Junho, ao abrigo do disposto no artigo 141.º14 daquele decreto-lei, veio estabelecer

    encargos a cobrar pelos notários e instituição de crédito com intervenção em transmissões

    de quaisquer valores mobiliários fora das bolsas de valores. A justificação da sua

    publicação encontrar-se-á na pretensão de resolver dúvidas suscitadas na aplicação do

    13 A expressão utilizada no n.º 5.º da Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, é «valores depositados», sendo certo que se

    deve aqui ler «acções depositadas», impedindo a extensão da sua aplicação a outros valores que não sejam acções, por

    força de o objecto do Decreto-Lei n.º 150/77, de 13 de Abril, se circunscrever a «acções».

    14 Art.º 141.º (Resolução genérica de dúvidas) do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, estabelecia: «Compete ao

    Ministro das Finanças resolver, por despacho genérico, as dúvidas que se suscitarem na aplicação do presente diploma».

  • 13

    Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, função cometida ao Ministro das Finanças pelo

    artigo 141.º desse mesmo diploma.

    Reconhecida a existência das taxas de realização de operações e da taxa de corretagem

    dos supracitados artigos 87.º e 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74, devidas nas operações de bolsa

    realizadas com intervenção de corretor e face à regulamentação do Decreto-Lei n.º 150/77,

    de 13 de Abril, por força do qual se fixaram taxas e comissões pela prática dos actos

    relativos à transmissão de acções registadas ou depositadas, foi expressa, no preâmbulo à

    regulamentação constante de tal Portaria, uma preocupação relativa à negociação de outros

    valores mobiliários diferentes de acções, com intervenção de um sujeito que não um

    corretor (partindo do princípio que, havendo intervenção de corretor, este deveria cobrar as

    taxas dos artigos 87.º e 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74).

    A preocupação manifestada apoiava-se na ideia de que: «as taxas e comissões

    estabelecidas representam, como é da sua natureza, a remuneração de serviços prestados

    e que a isenção para as transmissões entre vivos realizadas fora da Bolsa de títulos que

    não sejam acções, significa, para os que dessa isenção venham a beneficiar, a prestação

    de um serviço gratuito, o que não se justifica nas actuais condições de mercado», ao que

    acrescia a necessidade de «uniformização de encargos das operações, sejam quais forem

    os títulos nelas envolvidos e sejam as transacções efectuadas na Bolsa ou fora dela».

    Com tal propósito ficaram estabelecidas importâncias a cobrar pelas transmissões fora

    de bolsa, a título gratuito ou oneroso, de quaisquer valores mobiliários, em que houvesse

    intervenção de notário ou de instituição de crédito, neste último caso, tendo por objecto

    valores junto de si depositados ou não. O notário, à semelhança do regime estabelecido na

    Portaria n.º 430/77, deveria cobrar uma importância calculada pela aplicação da taxa de

    realização de operações mais elevada, a que se referia o artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 8/74,

    constituindo tal importância receita da bolsa, e uma taxa igual à taxa de corretagem fixada

    nos termos do artigo 88.º do mesmo diploma, constituindo receita do Cofre dos Notários,

    Conservadores e funcionários de justiça (cfr n.º 1.º da portaria em análise). As instituições

    de crédito, e em termos análogos ao referidos no primeiro caso, deveriam cobrar iguais

    importâncias, a título de taxa de realização de operações e de comissão, constituindo,

    aquela, receita da bolsa, a última, receita da instituição de crédito depositária, que não

    poder[iam] cobrar qualquer outra importância, excluída a de portes de correio.

    Saliente-se que, face à redacção da Portaria n.º 430/77 e à redacção primitiva dos n.ºs

    1.º e 2.º da Portaria 448/81, nestas situações haveria lugar ao pagamento de uma

    importância igual à taxa de operações do artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 8/7415.

    Deste modo, perante a intervenção de notário ou de instituição de crédito nas

    transmissões entre vivos de quaisquer valores mobiliários, seria aplicável o disposto na

    Portaria n.º 448/91, com prejuízo do que resultava aplicável por força da Portaria n.º

    15 Da redacção primitiva das alíneas a) dos n.ºs 1.º e 2.º Portaria n.º 448/81, relativas à cobrança, respectivamente, pelo

    notário ou pela instituição de crédito, de uma importância calculada por referência à taxa de realização de operações,

    resultava «uma importância igual à taxa de realização de operações, a que se refere o artigo 87.º do Decreto-Lei n.º

    8/74(…)». Com a alteração introduzida pela Portaria n.º 143/87, de 2 de Março, passou a ser devida «uma importância

    calculada pela aplicação da taxa de realização de operações mais elevada(…)» a que se refere o citado artigo 87.º.

  • 14

    430/77, de 16 de Julho16, traduzindo-se a diferença, essencialmente, na importância que

    constitui receita da bolsa (nos termos das alíneas a) dos n.ºs 1.º e 2.º da Portaria de 1981),

    uma vez que já não é igual àquela cobrada pelo corretor (nos termos do artigo 88.º do

    Decreto-Lei n.º 8/74) mas, antes, a taxa de realização de operações mais elevada a que se

    refere a norma do Decreto-Lei n.º 8/74 (dada a existência de diferentes taxas, consoante os

    valores mobiliários objecto da operação).

    A prática corrente, traduziu-se na aplicação pelos corretores, aquando da sua

    intervenção nas transmissões de valores mobiliários fora da bolsa, da taxa de realização de

    operações mais elevada (à semelhança dos notários e das instituições de crédito), não

    distinguindo os tipos de valores objecto da operação17.

    Diversamente, através da interpretação que se afigura como mais correcta, verificar-

    se-ia uma discriminação a favor da intervenção do corretor na transmissão de valores

    mobiliários, uma vez que intervindo em tais transmissões deveria cobrar as taxas de

    operações previstas no artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 8/7418.

    16 Pode questionar-se tal derrogação no que se refere à intervenção de notários e instituições de crédito nas

    transmissões de acções, uma vez que a Portaria n.º 448/81 foi aprovada ao abrigo do artigo 141.º do Decreto-Lei n.º 8/74

    e não em regulamentação do Decreto-Lei n.º 150/77, de 13 de Abril.

    17 A partir do estabelecido na Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho e da Portaria n.º 448/81, de 2 de Junho, gerou-se uma

    interpretação, acolhida pela prática bolsista, segundo a qual, mesmo os corretores, relativamente às operações não

    realizadas nas bolsas, deveriam aplicar as taxas de operações resultantes da Portaria n.º 448/81, isto é, a taxa mais elevada

    fixada para efeitos de taxa de operações (conforme a alteração introduzida a esta portaria pela Portaria n.º 143/87, de 2 de

    Março, e na sequência da publicação da Portaria n.º 781/86, de 31 de Dezembro). A Portaria n.º 781/86, de 31 de

    Dezembro, revogou a Portaria n.º 264/74, de 10 de Abril, que até então regulamentava o artigo 87.º do Decreto-Lei n.º

    8/74, e que fixava a taxa de realização de operações de bolsa em 0,5‰, a ser paga por cada operação de compra ou de

    venda que se efectuasse. Por força da Portaria n.º 781/86, foram estabelecidas taxas de realização de operações de fundos

    públicos e títulos negociáveis de dívida (grosso modo), no montante de 0,25‰ e para as operações sobre quaisquer

    acções ou outros valores mobiliários, foi fixada (mantida) a taxa de 0,5‰. Mais, esta portaria, erroneamente, «recuperou»

    a redacção do artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 8/74, revogada pelo Decreto-Lei n.º 696/75, de 12 de Dezembro, segundo a

    qual «pelas operações realizadas em bolsa, tanto em sessões normais como nas sessões especiais, serão devidas taxas a

    fixar em portaria do Ministro das Finanças», quando a redacção então vigente (disposição legal que a Portaria visava

    regulamentar, face à sua expressa evocação), por força do referido Decreto-Lei n.º 696/75, estabelecia que «por todas as

    operações de bolsa realizadas com intervenção de corretor serão devidas taxas a fixar em portaria do Ministro das

    Finanças».

    É certo que esta «reposição ilegítima» da redacção anterior do artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 8/74, pela via

    regulamentar, assentará na dita interpretação que incluía os corretores no âmbito da aplicabilidade do regime da Portaria

    n.º 448/81. Com ou sem tal repristinação, mantém-se o problema da inconstitucionalidade apontada à exigência de taxas

    de operações relativamente a operações que não se executaram nas sessões de bolsa, não obstante se verificar a

    intervenção do corretor. De inquestionável legalidade será a da liquidação de taxa de operações de bolsa no âmbito de

    operações realizadas em sessões normais ou especiais da bolsa, enquadrando-se esta, perfeitamente, na teoria das taxas.

    Face ao exposto, reafirma-se a importância de que se reveste o conceito de operações de bolsa. Por via deste conceito,

    parece poder-se abranger uma realidade mais vasta que as operações de compra ou de venda efectuadas em sessões

    normais ou sessões especiais de bolsa.

    18 A favor desta interpretação, destaca-se o artigo 38.º do Regulamento Interno da Bolsa de Valores do Porto, aprovado

    pela Portaria n.º 1063/80, de 12 de Dezembro, que estabelecia: «1. As transacções efectuadas pelos corretores nos

    respectivos escritórios e que não resultem do cumprimento de ordens de bolsa deverão ser comunicadas à comissão

  • 15

    Reconhecem-se como legítimas as preocupações manifestadas pelo legislador,

    contudo, terão resultado de uma articulação algo distorcida do conjunto de diplomas

    arrolados, precedentes à Portaria n.º 448/81, e, mesmo, de algumas imperfeições mais ou

    menos graves que desse conjunto resultavam.

    No seguimento desta evolução legislativa, a Portaria n.º 6/86, de 6 de Janeiro, veio

    actualizar as taxas de corretagem, ao abrigo do artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74, de 14

    de Janeiro, revogando a Portaria n.º 200/79, de 27 de Abril, até então vigente.

    Na Portaria n.º 6/86, de 6 de Janeiro, foram estabelecidas novas taxas de corretagem,

    tomando o legislador em consideração a publicação das portarias n.ºs 430/77, de 16 de

    Julho19, e 448/81, de 2 de Junho, assumindo-as como tendo vindo «fixar as normas

    directiva no dia seguinte àquele em que se realizaram, utilizando, para o efeito, impressos de modelo a aprovar. 2. Sobre

    as operações referidas no número anterior incidirão os mesmos encargos que correspondam a operações efectuadas

    directamente na bolsa». Acrescente-se que tal Portaria, datada de 1980 (isto é, apesar de ser anterior à Portaria n.º 448/81,

    à Portaria n.º 143/87- que alterou a redacção a esta última- e anterior à Portaria n.º 781/86), só foi expressamente

    revogada pelo artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril, retirando força à interpretação pela qual o dito

    artigo 38.º teria sido revogado, ao menos tacitamente, pela Portaria n.º 448/81. Contra tal interpretação pode aduzir-se,

    ainda, o facto de a Portaria n.º 448/81, bem como a n.º 781/86, se referirem a dois tipos de intervenientes perfeitamente

    identificados: os notários e as instituições depositárias, expressamente assumidas como as «instituições de crédito».

    Esta discriminação a favor da intervenção dos corretores nas operações realizadas fora da bolsa não se verifica quando

    se parte da perspectiva da interpretação atrás rejeitada, pela qual aos corretores também seria aplicável o regime prescrito

    na Portaria n.º 448/81. Nesta perspectiva verifica-se, antes, uma discriminação a favor das operações realizadas nas

    «sessões da bolsa».

    A este propósito, veja-se RICARDO CRUZ/ÁLVARO NASCIMENTO, O Mercado de Balcão e a Estrutura dos Mercados

    Secundários de Valores Mobiliários em Portugal, Associação Portuguesa para o Desenvolvimento do Mercado de

    Capitais, 1993, p. 4.42 e ss.

    19 Aquando da publicação da Portaria n.º 6/86, de 6 de Janeiro, o Decreto-Lei n.º 150/77, de 13 de Abril, relativo ao

    registo e depósito de acções, ao abrigo do qual a Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, havia sido publicada, tinha já sido

    revogado em 1982 com a aprovação de um novo regime de registo ou de depósito de acções pelo Decreto-Lei n.º 408/82,

    de 29 de Setembro (que se manteve em vigor após a aprovação do Código das Sociedades Comerciais em 1986, tendo

    sido revogado com a aprovação do Código do VM, conforme previsão da alínea b) do n.º 1 do art. 15.º do Decreto-Lei

    n.º 486/99, 13 de Novembro).

    Coloca-se assim, a questão de saber se não se deveria considerar, desde a entrada em vigor deste Decreto-Lei n.º

    408/82, revogada a Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, que visava fixar as taxas ou comissões devidas pela prática dos

    actos referidos no Decreto-Lei n.º 150/77. Acrescente-se que, de forma análoga à disposição complementar do Decreto-

    Lei n.º 150/77 - artigo 32.º -, ao abrigo da qual foi emitida a portaria do mesmo ano, o Decreto-Lei n.º 408/82, de 29 de

    Setembro, contém uma disposição complementar - artigo 30.º - que estabelecia: «Serão fixadas por portaria do Ministro

    de Estado e das Finanças e do Plano as taxas ou comissões devidas pela prática dos actos referidos no presente diploma e

    respectiva forma de pagamento». Contudo, do regime consagrado neste novo diploma, não resulta a obrigatoriedade de

    registo ou depósito de todas as acções.

    Apesar de não ter sido estabelecido qualquer regime transitório no Decreto-Lei n.º 408/82, quanto a estas taxas e

    comissões, até à publicação da referida portaria (o que ainda não aconteceu), terá resultado a revogação da Portaria n.º

    430/77, com a revogação do decreto-lei que esta visava regulamentar.

    Conforme foi atrás equacionado, se dúvidas persistissem quanto à revogação ou, pelo menos, esvaziamento de

    conteúdo, da Portaria n.º 430/77, pela aprovação da Portaria n.º 448/81, ficariam resolvidas. Resolvida tal interrogação, o

  • 16

    relativas a taxas e comissões devidas pela transmissão de valores mobiliários realizados

    fora de bolsa» e considerando, também, «que a ausência da oferta em bolsa de valores

    mobiliários nela transaccionáveis conduz a que esta funcione como um mercado

    aparentemente enfraquecido, onde os preços e as cotações estabelecidos e os valores

    negociados não traduzem a sua real influência no mercado, na medida em que aquelas

    também são determinantes do preço das operações fora de bolsa, o que apesar de tudo não

    deixa de contribuir para a permanência das distorções e para eventual não confiança do

    público investidor».

    As taxas de corretagem aí estabelecidas, para lá de diferenciarem o tipo de valores

    mobiliários transaccionados, à semelhança das portarias precedentes, destacam-se pela

    inclusão de dois elementos novos: a diferenciação de taxas de corretagem a aplicar a

    transacções executadas em sessão nas bolsas de valores e transacções de valores

    mobiliários não executadas em sessão nas bolsas de valores, distinguindo, neste último

    caso, se o seu objecto eram valores admitidos ou não à cotação; relativamente às

    transacções executadas em sessão nas bolsas foram estabelecidos diferentes escalões,

    correspondendo a estes diferentes taxas (regressividade de taxas atendendo aos montantes

    transaccionados)20.

    Desta (nova) tabela de taxas ressalta uma maior oneração das transacções de valores

    mobiliários não executadas em sessão nas bolsas de valores sobre valores admitidos à

    cotação, para as quais foi estabelecida uma única taxa por tipo de valor mobiliário, sendo

    essa taxa mais elevada que a taxa máxima aplicável para as transacções executadas em

    sessão nas bolsas.

    A Portaria n.º 6/86 foi revogada com a publicação, a 31 de Dezembro do mesmo ano

    da Portaria n.º 782/86, tendo esta diminuído as permilagens aplicáveis nas transacções de

    fundos públicos nacionais e títulos de dívida executadas em sessão nas bolsas de valores,

    consagrando, ainda, relativamente a tais transmissões uma novidade: taxa livre

    relativamente a transacções superiores a 50 000 contos21.

    problema renasce face à falta de regulamentação do Decreto-Lei n.º 408/82, por falta de publicação da portaria aí

    prevista.

    Quanto ao regime de registo e depósito de acções estabelecido no Decreto-Lei n.º 408/82, de 29 de Setembro, veja-se

    MENEZES CORDEIRO, Da transmissão em bolsa de acções depositadas, in Banca, Bolsa e Crédito - Estudos de Direito

    comercial e de Direito da economia, I vol., Livraria Almedina, Coimbra, 1990, p. 158-161.

    20 Na Portaria n. 6/86, de 6 de Janeiro, e, ulteriormente, na Portaria n. 782/86, de 31 de Dezembro (a que será feita

    referência), foram estabelecidos escalões relativos aos montantes objecto da transmissão. Assim, da Portaria n.º 6/86,

    constam três escalões: até 5000 contos; acima de 5000 contos até 20 000 contos; acima de 20 000 contos. As taxas

    correspondentes a tais escalões eram regressivas.

    Da Portaria n.º 781/86, de 31 de Dezembro, constam quatro escalões: até 5000 contos, inclusive; acima de 5000 contos

    até 20 000 contos; Livre acima de 50 000 contos.

    21 Saliente-se que do confronto destas portarias com as supracitadas, resulta que a fórmula usada para estabelecimento

    das taxas de corretagem foi sempre idêntica: «Pela prestação dos (de) serviços a seu cargo, os corretores das bolsas de

    valores cobrarão as seguintes taxas, calculadas sobre o montante das operações que efectuem: (…)». Destaca-se o facto

    de ter passado a ser feita referência, nas Portarias n.ºs 6/86 e 782/86, ao cálculo das taxas sobre o montante das operações

    que efectuem, «em relação a cada valor mobiliário». Tal acrescento não se afigura justificado, uma vez que a

    diferenciação «em relação a cada valor mobiliário» já decorria das portarias revogadas. A única novidade assinalável, no

    que concerne às portarias emitidas em 1986, foi o facto (supra referido) de ter sido estabelecida uma diferenciação de

    taxas de corretagem para as transacções executadas em sessões nas bolsas de valores, relativamente às transacções não

  • 17

    2.1.2. Apreciação.

    Do exposto, das normas legais respeitantes às «taxas de corretagem», quer as

    constantes do Decreto de 10 de Outubro de 1901, quer as constantes do Decreto-Lei n.º

    8/74, de 14 de Janeiro, resultava que os corretores tinham o direito à corretagem, a cobrar

    obrigatoriamente.

    Quanto ao esclarecimento trazido pela Portaria 448/81, de 2 de Junho, várias reflexões

    se suscitam de imediato.

    Reconhecem-se as preocupações manifestadas nos considerandos preambulares, por

    expressarem nobres princípios de desenvolvimento do mercado, afigura-se excessiva,

    contudo, a referência a «prestações de serviço gratuito» por parte de notários e instituições

    de crédito intervenientes na transmissão de valores mobiliários diferentes de acções. Daqui

    resultou o estabelecimento de uma cobrança, pretensamente obrigatória22 pelos notários e

    instituições de crédito de dois tipos de importâncias: uma, remuneratória do serviço, outra,

    receita da bolsa.

    Não se vislumbra a justificação e/ou legitimidade para que, por via regulamentar, se

    tenha vindo impor às instituições de crédito a obrigatoriedade de cobrança da importância

    com carácter de comissão. Mais, tal solução visava o igual tratamento, em termos de

    custos, entre as acções e os demais valores mobiliários, esquecendo que a intervenção dos

    notários e instituições de crédito passou a ser condição necessária para a transmissão de

    acções fora das bolsas, dado o regime de registo e depósito estabelecido pelo Decreto-Lei

    n.º 150/77, de 13 de Abril.

    A Portaria n.º 430/77, de 16 de Julho, foi emitida em regulamentação daquele Decreto-

    Lei e, no que às instituições de crédito concerne, visava a fixação de montantes máximos a

    cobrar por estas instituições, evitando, assim, eventuais constrangimentos à transmissão de

    acções pela via dos custos de transmissão.

    Nestes termos, a Portaria n.º 448/81 subverteu a natureza dessas comissões máximas,

    ao pretender estabelecer comissões obrigatórias ainda que com clara contradição de repetir

    a redacção contida na Portaria n.º 430/77: «uma comissão igual à taxa de corretagem

    fixada nos termos estabelecidos no artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74, a qual constituirá

    receita da instituição de crédito depositária, que não poderá cobrar qualquer outra

    importância, excluída a de portes de correio». A pretendida uniformização de custos

    passaria, quando muito, pelo estabelecimento de máximos cobráveis pela sua intervenção

    na transmissão23.

    executadas em sessões das bolsas de valores (aí se distinguindo as transacções sobre valores admitidos ou não à cotação)

    e o escalonamento das taxas.

    22 Obrigatoriedade que na prática foi assumida.

    23 Não convém esquecer o facto de o Decreto-Lei n.º 408/82, de 29 de Setembro, ter revogado o Decreto-Lei n.º

    150/77, de 13 de Abril, pondo termo ao regime de registo ou depósito obrigatório, passando o regime de registo ou

    depósito a ser apenas obrigatório, como regra, para as acções nominativas.

  • 18

    Com a aprovação do Código do MVM manteve-se o regime então vigente no que

    respeita às taxas de realização de operações, por força da aplicação do regime transitório

    estabelecido no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril, pois, quer o artigo

    407.º, quer o artigo 408.º, previam a necessidade de fixação de valores para essas taxas,

    pela CMVM, para as primeiras, pelo Ministro das Finanças24, sob proposta da CMVM,

    nas segundas.

    Não tendo sido, de imediato, aprovados quaisquer novos valores para as taxas de

    operações, mantiveram-se em vigor, transitoriamente, as taxas de operações de bolsa

    estabelecidas na Portaria n.º 781/86, de 31 de Dezembro, até à publicação da Portaria n.º

    174/91, de 6 de Junho, que por sua vez foi revogada pelo Regulamento da CMVM n.º 92/3

    (Taxas de realização de operações de bolsa), onde se encontram estabelecidas as taxas de

    operações de bolsa vigentes para o mercado a contado25.

    Quanto às «taxas sobre operações fora de bolsa», em cumprimento do resultante do

    regime transitório do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril, em

    articulação com o disposto no artigo 408.º, mantiveram-se em vigor aquelas taxas já

    aplicadas na vigência do Decreto-Lei n.º 8/74, constantes da Portaria n.º 448/81, de 2 de

    Junho26.

    Se a entrada em vigor do Código do MVM, e a sua articulação com o regime

    transitório referido, não levantaram quaisquer problemas novos, mantiveram-se, contudo,

    os problemas relativos à natureza e legalidade dessas taxas. Como já foi suscitado, a

    propósito da exposição da sucessão de diplomas aprovados após o início de vigência do

    Decreto-Lei n.º 8/74, de 14 de Janeiro, muitos deles, em sua regulamentação, outros, a ele

    ligados pelas razões indicadas, em especial, no que se refere às «taxas sobre operações fora

    de bolsa», é justificada uma análise da sua natureza jurídica.

    Na vigência do Código do MVM a «taxa de realização de operações de bolsa», foi

    estabelecida pelo Regulamento da CMVM n.º 92/3, não suscitando especiais problemas,

    para lá da questão terminológica da manutenção da designação de «taxa», uma vez que o

    sujeito activo, credor dessa prestação, não eram quaisquer entes públicos, mas, antes,

    associações de direito privado sem fins lucrativos. Efectivamente, como prescreve o n.º 2

    do artigo 407.º essas taxas «constituem receita da bolsa em que a transacção se efectua».

    No que se refere à obrigatoriedade de cobrança, pelos notários e instituições de crédito

    intervenientes na transmissão de quaisquer valores mobiliários, de uma importância por

    24 No que se refere às «taxas de realização de operações fora de bolsa», não se retira do n.º 1 do artigo 408.º a

    competência da CMVM para a sua fixação, como é pressuposto no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 142-A/91, antes, do

    Ministro das Finanças que, mediante portaria, sob proposta da CMVM, fixará o montante das taxas (não inferiores às

    estabelecidas no artigo 407.º), o valor sobre que incidem e o respectivo processo de liquidação e cobrança.

    25 Quer a Portaria n.º 174/91, de 6 de Junho, quer o Regulamento da CMVM, utilizam aquela fórmula a que já foi feita

    referência, retirada da redacção primitiva do artigo 87.º do Decreto-Lei n.º 8/74, segundo a qual as taxas de operações

    sobre as operações realizadas em sessões normais e sessões especiais de bolsa, não obstante a epígrafe do artigo 407.º se

    referir à taxa de realização de operações de bolsa, sendo este conceito mais abrangente do que as meras sessões de bolsa,

    como já foi referido e melhor se verá à frente.

    26 Neste sentido, o aviso da CMVM, publicado nos Boletins de Cotações das Bolsas de Valores do Porto e de Lisboa,

    ambos do dia 16 de Julho de 1991, segundo o qual «enquanto não forem fixadas novas taxas de realização de operações

    fora de bolsa, são aplicáveis as taxas vigentes à data da publicação do Código do Mercado de Valores Mobiliários,

    conforme dispõe o artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 142-A/91, de 10 de Abril».

  • 19

    referência às taxas de realização de operações, consagrada, inicialmente pela Portaria n.º

    430/77, de 16 de Julho, agravada pela Portaria n.º 448/81, de 2 de Junho, justificando-se,

    nesta última com a necessidade que as transmissões não realizadas na bolsa ou, pelo

    menos, através da bolsa (aqui se incluindo a intervenção do corretor)27 fossem igualmente

    oneradas, pode dizer-se que a portaria de 1981 veio reiterar ou, mesmo, agravar, a questão

    da legalidade da exigência de tais prestações gerada pela Portaria n.º 430/77, de 16 de

    Julho, face à inexistência ou não visibilidade de uma qualquer contraprestação pelo

    pagamento dessa «taxa».

    A manutenção, pelo artigo 408.º do Código do MVM, da denominada «taxa sobre

    operações fora de bolsa», actualizou a necessidade de reflexão sobre a natureza jurídica

    dessa prestação.

    Atente-se que o produto da cobrança de tais «taxas», ao abrigo da Portaria n.º 448/81,

    de 2 de Junho, constituía receita da bolsa. Diferentemente, por força do estabelecido no

    artigo 408.º do Código do MVM tais taxas constituem receita da CMVM28.

    Se algumas respostas às soluções vigentes se encontram na exposição até aqui

    realizada da evolução legislativa nesta matéria, outras exigem que se busquem nas

    soluções de direito comparado elementos interpretativos ou justificativos das «taxas sobre

    operações fora de bolsa», elementos que se encontram muito visivelmente no direito

    francês e italiano.

    Em França existe, há mais de um século, um imposto do selo (droit de timbre) que

    incide sobre as transmissões de valores mobiliários.

    No artigo 978 do Code Général des Impôts (CGI)29 encontra-se estabelecido que

    todas as operações de bolsa tendo por objecto a compra ou a venda, a contado ou a termo,

    de valores de qualquer natureza, dá lugar à redacção de uma nota de registo (bordereau)

    sujeito a imposto do selo (droit du timbre)30. Trata-se de um «imposto de bolsa» («impôt

    27 Efectivamente, pode retirar-se do preâmbulo da Portaria n.º 448/81 que o objecto da preocupação do legislador

    foram as transmissões realizadas fora das sessões da bolsa em que interviessem notários ou instituições de crédito, pois

    nessas nada era cobrado, pressupondo claramente que quando fosse um corretor a intervir nessa operação realizada fora

    de bolsa, este cobraria necessariamente as importâncias referidas nos artigos 87.º e 88.º do Decreto-Lei n.º 8/74, como já

    foi referido. Assim, no preâmbulo é afirmado: «No que se refere à transmissão entre vivos dos restantes valores

    mobiliários realizada fora da bolsa, nomeadamente em que não haja intervenção do corretor, o legislador não veio definir

    explicitamente as taxas e comissões devidas pela transmissão daqueles valores, o que tem originado diversas opiniões».

    O legislador não veio definir essas taxas e comissões, nem tinha de vir, uma vez que a sua fixação na Portaria n.º 430/77,

    relativamente às acções, tinha um fito regulamentar próprio, resultante do Decreto-Lei n.º 150/77.

    28 O n.º 2 do artigo 408.º previa que fosse estabelecido que uma percentagem do produto das taxas sobre operações

    fora de bolsa, ou a totalidade ou parte das taxas respeitantes a operações fora de bolsa sobre determinados valores

    mobiliários, nomeadamente sobre valores cotados, se destine às associações de bolsa. Tal veio a acontecer por via da

    Portaria n.º 1001/91, de 2 de Outubro, que estabeleceu essa percentagem em 65%, para o ano de 1991, e 75%, a partir de

    1 de Janeiro de 1992, cabendo, do montante daí resultante, 60% à Associação da Bolsa de Valores de Lisboa e 40% à

    Associação da Bolsa de Valores do Porto.

    29 Aprovado pelo Decreto n.º 50.478, de 6 de Abril de 1950.

    30 Cfr. o artigo 980 bis do Code Général des Impôts que prevê a não sujeição a este imposto do selo das operações de

    compra e de venda sobre obrigações cotadas, que não sejam convertíveis em acções ou associados aos resultados da

    sociedade emitente; estão isentas, também, as operações de contrapartida realizadas pelos intermediários registadas como

  • 20

    de bourse» ou «impôt sur les opérations de bourse»), exigível nas transacções sobre

    valores mobiliários cotados ou não, desde que efectuados por intermédio de profissionais

    habilitados a receber ordens de compra e venda de valores mobiliários. Tal imposto foi

    criado pela Lei de 28 de Abril de 189331.

    Segundo GUILMARD, uma vez que a venda seja feita entre particulares, a venda não

    reveste qualquer carácter comercial. Contrariamente, toda a operação directa (venda

    directa), quando feita por um ou por sujeitos do imposto, torna-se tributável, sujeita ao

    imposto de bolsa. Tal distinção baseada na qualidade das partes contratantes é explicada

    pela impossibilidade legal de obrigar simples particulares a tornarem-se preceptores

    responsáveis do imposto32.

    Em Itália, tradicionalmente, os contratos de bolsa gozavam de liberdade de forma, não

    requerendo a forma escrita para a sua validade. Contudo, existe um documento que cumpre

    finalidade também em matéria de imposto do selo que é rodeado de todas as atenções dada

    a sua vital importância em sede das operações de bolsa: o «foglietto bollato». Trata-se de

    um documento utilizado, essencialmente, por razões fiscais, através do qual o Estado se

    assegura da liquidação do imposto que incide sobre estas operações (sobre os contratti di

    tais junto da société de bourse; as operações de investimento em reporte; as operações sobre valores mobiliários inscritos

    na cotação oficial de uma bolsa regional, na cotação do segundo mercado ou constantes do «relevé quotidien» dos valores

    não admitidos à cotação oficial duma dessas bolsas; as ofertas públicas de venda e as operações relacionadas com a

    introdução de valores na cotação oficial ou no segundo mercado, entre outras situações - cfr. Mémento Pratique Francis

    Lefébvre - Fiscal, 1993.

    Recentemente, demarcam-se algumas interpretações segundo as quais apenas as operações sobre valores admitidos à

    cotação oficial e ao segundo mercado (monopólio das sociétés de bourse) estariam sujeitas ao imposto.

    Pelo artigo 9 da Lei de 31 de Dezembro de 1993 foi estabelecida uma isenção a favor das operações de compra ou de

    venda de valores de qualquer natureza efectuadas por uma pessoa física ou colectiva domiciliada ou estabelecida fora de

    França - cfr. Impôt sur les opérations de bourse, BQ n.ºs 538 (Juin, 1993) e 549 (Juin, 1994), respectivamente, p. 95 e 89.

    31 Na redacção do artigo 28 de Lei de 1893: «Toda a operação de bolsa tendo por objecto a compra ou venda, a

    contado ou a termo, de valores mobiliários dá lugar à redacção de uma nota de registo (bordereau) sujeito a direito de

    selo (droit de timbre)…». Cfr. E. GUILMARD, De la vente directe des valeurs de bourse sans intermédiaire (Traité à

    l´usage des Banquiers, des Agents de change et des Coulissiers), Paris, Guillaumin et Cie, Éditeurs du Journal des

    Économistes, 1904, p. 31.

    Este autor refere-se a um imposto especial que onera as operações de bolsa. Este imposto nasce da necessidade de criar

    novas receitas para o Tesouro, centrando a sua incidência, não sobre a execução das ordens, mas sobre a sua recepção,

    estabelecendo-a relativamente àqueles que fizessem comércio de recolha de ordens de compra e de venda, abrangendo,

    assim, os «agents de change», os «coulissiers» e os bancos - cit., p. 66. A venda directa de títulos por parte, maxime, dos

    bancos (da sua carteira própria), dada a importância que assumiram tais operações, veio, também, a ser abrangida quando

    uma das partes fosse sujeito do imposto (receptor de ordens), isto é, mantinham-se excluídos da sujeição as situações em

    que as partes fossem dois particulares. GUILMARD afirma que, nos casos em que a venda directa é sujeita ao imposto, não

    implica a sua qualificação como operação de bolsa, pois a venda directa diferencia-se completamente da negociação em

    bolsa, sendo qualificada como operação de bolsa por via de uma ficção fiscal (cit., p. 71 e 229).

    32 Cit., p. 229. Contrariamente, todos os intermediários de bolsa que realizem a actividade de recolha de ordens de

    compra e de venda de valores de bolsa devem registar-se para efeitos de se tornarem sujeitos de tal imposto.

    GUILMARD, alerta para o facto de se dever excepcionar os notários que se intrometem acidentalmente, quer entre as

    partes, quer entre os intermediários financeiros, não devendo ser sujeito do imposto - cit., p. 230.

  • 21

    borsa), a «tassa di borsa»33 34. Este documento é obrigatoriamente utilizado em todas as

    operações de bolsa35. O montante das taxas deste imposto varia, dependendo da qualidade

    dos intervenientes na operação36, e do tipo de operações. São mais elevadas para os

    contratos a termo do que para os contratos a contado. São mais elevadas nos contratos

    entre particulares, relativamente às aplicáveis a contratos concluídos directamente entre

    bancos e privados ou com a intervenção de «agenti di cambio» (ou «società di

    intermediazione mobiliare») ou banco inscrito num registo especial (ao abrigo do R.D.L.

    de 20 de Dezembro de 1932, n. 1607), sendo as mais baixas aplicáveis nos contratos

    concluídos entre os «agenti di cambio» (ou «società di intermediazione mobiliare»)37.

    33 Cfr. o conceito fiscal de «contratos de bolsa» consagrado na lei italiana, na qual o artigo 1. do R.D.L. n. 3278 de

    1923 (precisando o artigo 34 da Lei n.º 272 de 28-III-1913), na denominação dos contratos de bolsa, inclui os contratos

    estipulados em bolsa ou fora de bolsa, tanto a contado, quanto a termo, firme, a prémio ou de reporte e qualquer outro

    contrato conforme aos usos comerciais, cujo objecto sejam títulos de crédito do Estado, da Província, das Comunidades e

    dos entes morais, as acções e obrigações das sociedades, incluindo os títulos dos institutos de crédito fundiário e, em

    geral, quaisquer outros títulos de natureza análoga, nacionais ou estrangeiros, cotados em bolsa ou não.

    Não obstante a utilização do termo «tassa» a sua natureza fiscal é plenamente assumida, não sendo tal fenómeno, de

    todo, estranho em sede tributária, verificando-se frequentemente tal imprecisão terminológica (bem como a situação

    inversa).

    A «tassa di borsa» é considerado um «tributo especial». O montante é fixado numa quantidade por cada mil liras ou

    fracção do valor efectivo e as alíquotas variam segundo o tipo do contrato (a contado, a termo, reporte) e da qualidade

    dos contraentes (privados, bancos, agenti di cambio) (in, Dizionario dei termini economici - il Mondo, nuova edizione

    aggiornata e integrata, Dizionari Rizzoli, 1992, p. 663). A sua consagração resulta do R. D. de 30 de Dezembro de 1923,

    n. 3278, tendo sofrido algumas alterações recentes, no sentido de abranger as transmissões de quotas sociais, pelo D.L. de

    30 de Dezembro de 1991, n. 417. A este propósito, veja-se, Profili fiscali della cessione di quote sociali, Scuola di

    notariato di Bologna, Il fisco, n.º 32/94, p. 7537-7544.

    Conforme afirma COLTRO CAMPI, a taxa sobre os contratos de bolsa é sub-rogatória ou substitutiva do imposto do selo e

    de registo - cfr. Lineamenti di diritto di borsa e rassegna di giurisprudenza, Seconda Edizione Aggiornata, Milano, A.

    Dott. A Giuffrè Editore, 1985, p. 126. Neste sentido, cfr., também, Profili fiscali…, cit., p. 7542; AUGUSTO FANTOZZI,

    Diritto tributario, UTET, [1991], p. 722-726.

    34 Como refere a doutrina a utilização imprecisa do termo taxa para designar impostos é corrente, nomeadamente entre

    nós, comos são exemplo as extintas taxa militar e as vigentes taxa de radiodifusão (impostos denominados taxas) e o,

    anteriormente designado, imposto de justiça, agora, taxa de justiça – cfr. A. BRAZ TEIXEIRA, Princípios de direito fiscal,

    vol. I, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 1985, p. 45.

    35 Cfr. na lei italiana, o artigo 51 da Lei n. 272 de 20 de Março de 1913, e artigo 19 do R. D. n. 3278 de 30 de

    Dezembro de 1923.

    36 Sendo discriminado dentro de cada uma dessas classes de intervenientes o tipo de valores objecto da operação:

    acções, quotas e participações em sociedade de qualquer tipo; valores em moeda; títulos do Estado, obrigações.

    37 Nos contratos concluídos directamente entre privados, por cada fracção de 100 000 liras, aplica-se, lato sensu: aos

    contratos sobre acções, 140; sobre moeda, 100; sobre obrigações, 16. Naqueles em que há intervenção de «agenti di

    cambio» ou banco inscrito no dito registo: contratos sobre acções, 50; sobre moeda, 90; sobre obrigações, 9. Nos

    contratos realizados entre os «agenti di cambio»: sobre acções, 12; sobre moeda, 40; sobre obrigações, 9.

    Cfr. GIORGIO DELLI/PATRIZIA PASSERINI — Tassa sui contratti di borsa - aspetti applicativi, Il fisco, n.º 41/93; A. LANDO,

    Le operazioni di borsa: contrattazioni a contanti e a termine ferme, in «Disciplina giuridica delle operazioni di borsa»

  • 22

    A falta do «foglietto bollato» impede qualquer acção em juízo relativa à operação de

    bolsa, por falta de comprovação da satisfação da «taxa» devida.

    Em Espanha, pelo n.º 1 do artigo 108 da Ley del Mercado de Valores, foi consagrado

    que «a transmissão de valores, admitidos ou não à negociação num mercado secundário

    oficial, estará isenta do Imposto sobre as Transmissões Patrimoniais e Actos Jurídicos

    Documentados e do Imposto sobre o Valor Acrescentado»38.

    Em Portugal, à data da aprovação do Código do MVM, o tratamento fiscal das

    transmissões de valores mobiliários era muito confuso, a saber: na Tabela Geral do

    Imposto do Selo39, o artigo 120-A, até então, com a epígrafe de «Operações bancárias»,

    depois, de «Operações Financeiras»40, referia a sujeição a imposto do selo à taxa de 9‰

    sobre o montante da venda de títulos. Por sua vez o artigo 408.º do Código do MVM (e

    antes dele os diplomas já mencionados) faziam incidir «a taxa sobre operações fora de

    bolsa» sobre «todas as transmissões fora de bolsa, a título gratuito ou oneroso, de

    quaisquer valores mobiliários realizadas com a intervenção, seja para que efeito for, de

    intermediário financeiro ou notário».

    Apesar do seu carácter pretérito, justificam, ambas as disposições, alguma reflexão de

    natureza jurídico-tributária, com base no historial realizado sobre as «taxas sobre

    operações fora de bolsa» e na evolução legislativa e interpretativa do imposto do selo então

    previsto no artigo 120-A da respectiva Tabela Geral.

    Afigura-se que a análise da questão tributária relativa à transmissão de valores

    mobiliários não pode deixar de abarcar estas duas figuras tributárias, como, a seguir,

    resumidamente, se tentará demonstrar.

    Muito preciosas são as reflexões realizadas por XAVIER DE BASTO41, no que se refere

    ao imposto do selo do artigo 120-A da Tabela Geral, e por A. LOBO XAVIER42, quanto às

    «taxas sobre opera