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A FAMLIA DO IDOSO DEPENDENTE
Anlise das necessidades/dificuldades no
cuidar no domiclio
Orlanda Sofia Parente Martins
ESCOLA SUPERIOR DE SADE
Orlanda Sofia Parente Martins
A FAMLIA DO IDOSO DEPENDENTE Anlise das necessidades/dificuldades no
cuidar no domiclio
II Mestrado
em Enfermagem de Sade Comunitria
Trabalho efetuado sob a orientao da Professora Doutora Maria Manuela Amorim Cerqueira
Trabalho efetuado sob a co orientao da
Professora Mestre Maria Cndida Cracel Viana
outubro de 2014
iii
RESUMO
Em Portugal, a famlia continua a ser a principal fonte de apoio ao idoso dependente.
Deste modo, perspetivando a famlia como um sistema em que existe uma correlao
entre os seus membros, quando a doena atinge um deles, esta confronta-se com a
necessidade de definir e redefinir as relaes familiares. Neste sentido, importante que
se compreenda e avalie as necessidades e dificuldades sentidas pelo familiar cuidador,
uma vez que estas so interpretadas como fatores que limitam a qualidade do cuidado
prestado.
Partindo deste pressuposto surgiu a questo de investigao: Quais as
necessidades/dificuldades dos familiares cuidadores no cuidar do idoso dependente no
domiclio? com o objetivo de perceber as necessidades/dificuldades dos familiares
cuidadores no cuidar do idoso dependente no domiclio, tendo como finalidade contribuir
para a melhoria dos cuidados ao idoso dependente no domiclio, minimizando o
sofrimento da famlia que cuida, de forma a potencializar o seu bem-estar.
Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, um estudo de caso. Recorreu-se
entrevista semi-estruturada para a recolha de dados, realizada a onze familiares
cuidadores de pessoas idosas dependentes inscritas numa Unidade de Cuidados de
Sade Personalizados do Alto Minho. Os dados foram analisados atravs de anlise de
contedo segundo Bardin (2011).
Resultados: Os familiares cuidadores do idoso dependente no domiclio evidenciam que
so de diversa ordem as necessidades com que se deparam no seu quotidiano, tais
como: possuir formao, mais ajudas tcnicas, maior disponibilidade de tempo para si,
maior disponibilidade econmica e sobretudo, maior apoio e acompanhamento.
Consideram que as dificuldades se focalizam sobretudo a nvel do autocuidado e no
enfrentar o sofrimento do seu ente querido. Revelam que cuidar do idoso dependente
acarreta repercusses a nvel do desgaste fsico e psicolgico, sentindo-se aprisionados
e com isolamento social. A maioria perceciona que os apoios/acompanhamento so
insuficientes e centram-se dentro da prpria famlia e em alguns casos a nvel da
vizinhana. Adotam vrias estratgias no cuidar, que passam por estabelecer
comunicao, aceitar a doena, preservar a autonomia e adaptar o espao arquitetnico
da habitao. Tambm apresentam expectativas relativamente s intervenes dos
enfermeiros, centrando-as a nvel do apoio/ajuda e essencialmente a nvel de adquirir
formao para o desenvolvimento de habilidades e competncias para cuidar do idoso
dependente. Ficou evidente que no processo de cuidar, os familiares cuidadores
iv
manifestam sentimentos e emoes como o desnimo, tristeza, medo, revolta,
impotncia e preocupao, aceitao e tambm felicidade.
Vrios aspetos da sua vida ficaram alterados aps a responsabilidade de cuidar, tais
como a perda laboral e a ausncia de atividades de lazer. No entanto, para alguns
familiares cuidadores no existiram alteraes nos seus aspetos de vida. Como forma
das famlias preservarem o seu bem-estar, sugerem mais apoio e unio familiar,
aceitao da situao de dependncia do familiar, cuidar com maior dedicao e afeto,
mais ajudas tcnicas, mais assistncia mdica e visitas domicilirias da equipa de
enfermagem mais frequentes.
Concluso: Ficou demonstrado pelo estudo que os familiares cuidadores defendem a
presena em casa do idoso dependente, s assim conseguem preservar a sua dignidade
e lhe proporcionar qualidade de vida.
Palavras-chave: Famlia Cuidadora; Idoso Dependente; Necessidades; Dificuldades;
Cuidar.
outubro de 2014
v
ABSTRACT
In Portugal, family still is the main support source for the elderly in some sort of
dependency. In this way, looking at the family as a system in which the members interact,
when one of them is ill, family faces the need to re-evaluate those ties. Therefore, its
important to understand and evaluate the needs and difficulties felt by families, as they
may impair the quality of the support given.
The question therefore arose: what are the needs/difficulties of the caretakers when at
home? aiming to identify those causes and, in the end, improve the care given to the
chronic-dependent patient at home, minimizing the family suffering and improve the
overall wellbeing.
Its a quality case study. To collect data, semi-structured interviews where applied to
eleven caretakers of different families registered in a Unidade de Cuidados de Sade
Personalizados do Alto Minho (primary health care unit). The data was processed by
content analysis according to Bardin (2011).
Results: caretakers of elderly patients at home show that they face different needs such
as: having more instruction, more technical support, more time for themselves, more
economic support and, above all, more attention and support for them. They feel that the
main difficulties are focused in their self-care and the ability to face their families suffering.
They show social isolation, physical and psychological burnout when given care. Most of
them feel that the support is insufficient, and comes mainly from within the family or
neighbourhood. They adopt several strategies to care, such as creating communication
links, accepting the disease, autonomy preservation and house space adaptation.
Expectations towards the nurses interventions are also show, mainly in the capacity to
acquire tools and competences do help care the elderly. Its also evident that in the
process of caring, caretakers show feelings and emotions as despair, sadness, fear,
revolt, powerless and concern, acceptance and also happiness.
Several life aspects are altered after the responsibility of providing care, namely loss of
job or reduced productivity and the lack of leisure activities. However, for some caretakers
theres no changing at all. As a way to preserve their wellbeing, families facing a patient
with dependency agree in more union and family support, more dedication and affection,
acceptance of the disease, more technical means, more medical support and more
frequent nurses home visits.
vi
Conclusion: It was shown by the study that the caretakers want the dependent elderly at
their homes, because its the only way to preserve their dignities and providing quality of
life.
Keywords: Caring Family; Dependent Elderly; Needs; Difficulties; Caring.
october 2014
vii
AGRADECIMENTOS
Professora Doutora Manuela Cerqueira, que me incentivou e orientou na elaborao
desta dissertao de mestrado. O seu apoio, disponibilidade e dedicao foram
essenciais para a concluso deste trabalho.
Professora Mestre Cndida Viana pelo rigor na co orientao, pela exigncia e
disponibilidade.
A todos os familiares cuidadores e suas famlias que ao longo do meu percurso enquanto
estudante e profissional me deram a conhecer a sua realidade e partilharam comigo as
suas necessidades e dificuldades.
Aos colegas da Unidade de Cuidados de Sade Personalizados de Santa Marta de
Portuzelo pelas sugestes e compreenso.
Ao meu marido, Pedro, pela sua compreenso, presena e partilha em todos os
momentos presentes e ausentes.
A toda a minha famlia que de certa forma se deparou com muitas ausncias, mas
sempre me apoiou.
Aos meus colegas e amigos pela amizade, carinho e apoio.
A todos os que me acompanharam nesta longa jornada e que sempre ouviram os meus
receios e expectativas.
A fora de todos tornou este percurso possvel
Obrigada pelo crescimento que me proporcionaram!
ix
SUMRIO
RESUMO .......................................................................................................................... iii
ABSTRACT ....................................................................................................................... v
AGRADECIMENTOS .................................................................................................... ..vii
INDICE DE DIAGRAMAS......xi
INDICE DE QUADROS....xiii
SIGLAS.......xv
INTRODUO ................................................................................................................17
PARTE I ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL ...........................................21
1- A FAMLIA: CONCEITO E FUNO .......................................................................23
2- O IDOSO DEPENDENTE: CONCEITO DE DEPENDNCIA E AUTONOMIA
FUNCIONAL ................................................................................................................27
2.1 Os Aspetos Espirituais e Religiosos na Promoo da Sade do Idoso .......29
3-A FAMLIA E O CUIDAR DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO.....................31
3.1 Consequncias do Cuidar do Idoso Dependente no Domiclio .....................34
3.2 As Necessidades e Dificuldades da Famlia no Cuidar ..................................37
3.3 Promoo do Bem - Estar da Famlia do Idoso Dependente .........................41
4- O ENFERMEIRO ESPECIALISTA EM SADE COMUNITRIA:
RESPONSABILIDADE NO CUIDAR DA FAMLIA ......................................................45
5- RESPOSTAS SOCIAIS DE APOIO AO IDOSO DEPENDENTE..............................49
PARTE II DA PROBLEMTICA METODOLOGIA ....................................................53
1. PROBLEMTICA E OBJETIVOS DO ESTUDO: QUESTES ORIENTADORAS ...55
2. OPES METODOLGICAS .................................................................................59
2.1 Metodologia Qualitativa ....................................................................................59
2.2 Tcnica e Instrumento de Recolha de Dados .................................................60
2.3 Terreno de Pesquisa: Caracterizao .............................................................62
2.4 Populao do Estudo .......................................................................................62
2.5 Aspetos ticos ..................................................................................................64
2.6 Tratamento e Anlise de Dados .......................................................................65
PARTE III APRESENTAO, INTERPRETAO E DISCUSSO DOS RESULTADOS
........................................................................................................................................67
x
1.NECESSIDADES EXPRESSAS PELOS FAMILIARES CUIDADORES AO CUIDAR
DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO ................................................................ 75
2.DIFICULDADES EXPRESSAS PELOS FAMILIARES CUIDADORES AO CUIDAR
DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO ................................................................ 81
3.REPERCURSSES NOS FAMILIARES CUIDADORES POR CUIDAREM DO
IDOSO DEPENDENTE NO DOMICILIO ...................................................................... 87
4.APOIOS MOBILIZADOS PELOS FAMILIARES CUIDADORES PARA CUIDAR DO
IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO ...................................................................... 91
5.CUIDADOS PRESTADOS PELOS CUIDADORES AO IDOSO DEPENDENTE NO
DOMICLIO .................................................................................................................. 97
6.ESTRATGIAS UTILIZADAS PELOS FAMILIARES CUIDADORES NO CUIDAR
DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO .............................................................. 103
7.EXPECTATIVAS DOS FAMILIARES CUIDADORES ACERCA DAS
INTERVENES DOS ENFERMEIROS DOS CSP NO CUIDAR DO IDOSO
DEPENDENTE NO DOMICLIO ................................................................................ 109
8.EMOES/SENTIMENTOS EXPERIENCIADOS PELOS FAMILIARES
CUIDADORES NO CUIDAR DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO ................ 113
9.ASPETOS DE VIDA DOS FAMILIARES CUIDADORES ALTERADOS PELO
CUIDAR DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO ............................................... 119
10.SUGESTES REFERIDAS PELOS FAMILIARES CUIDADORES PARA QUE AS
FAMLIAS POSSAM CUIDAR DO SEU FAMILIAR DE MODO A PRESERVAREM O
SEU BEM-ESTAR ..................................................................................................... 123
11.VONTADES EXPRESSAS PELOS FAMILIARES CUIDADORES ....................... 129
CONCLUSES, IMPLICAES, LIMITAES E SUGESTES DO ESTUDO ........... 133
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................ 137
APNDICES ................................................................................................................. 147
APNDICE 1 GUIO DA ENTREVISTA ................................................................ 149
APNDICE 2 PEDIDO DE AUTORIZAO PARA A REALIZAO DO ESTUDO
DIREO DO ACES ................................................................................................. 153
APNDICE 3 PEDIDO DE AUTORIZAO AO PRESIDENTE DO CONSELHO DE
ADMINISTRAO DA ULSAM ................................................................................. 157
APNDICE 4 TERMO CONSENTIMENTO INFORMADO ...................................... 161
APNDICE 5 MATRIZ DE DADOS FINAL ............................................................. 165
ANEXOS ....................................................................................................................... 181
ANEXO 1 PARECER COMISSO TICA ............................................................... 183
xi
NDICE DE DIAGRAMAS
Diagrama 1- Necessidades expressas pelos familiares cuidadores ao cuidar do idoso
dependente no domiclio ..................................................................................................75
Diagrama 2 - Dificuldades expressas pelos familiares cuidadores ao cuidar do idoso
dependente no domiclio ..................................................................................................81
Diagrama 3 Repercusses nos familiares cuidadores por cuidarem do idoso
dependente no domiclio ..................................................................................................87
Diagrama 4 Apoios mobilizados pelos familiares cuidadores para cuidar do idoso
dependente no domiclio ..................................................................................................95
Diagrama 5 Cuidados prestados pelos familiares cuidadores ao idoso dependente no
domiclio ..........................................................................................................................97
Diagrama 6 Estratgias utilizadas pelos familiares cuidadores no cuidar do idoso
dependente no domiclio ................................................................................................ 103
Diagrama 7 Expectativas dos familiares cuidadores acerca das intervenes dos
enfermeiros dos CSP para cuidar do idoso dependente no domiclio ............................ 109
Diagrama 8 Emoes/sentimentos experienciados pelos familiares cuidadores no
cuidar do idoso dependente no domiclio ....................................................................... 113
Diagrama 9 Aspetos de vida dos familiares cuidadores alterados pelo cuidar do idoso
dependente no domiclio ................................................................................................ 119
Diagrama 10 Sugestes referidas pelos familiares cuidadores para que as famlias
possam cuidar do seu familiar de modo a preservar o seu bem-estar ........................... 123
Diagrama 11 Vontades expressas pelos familiares cuidadores .................................. 129
xiii
NDICE DE QUADROS
Quadro 1 - Caracterizao do familiar cuidador ..............................................................63
Quadro 2 - Tema, Categorias e Subcategorias emergentes das entrevistas realizadas
aos familiares cuidadores ................................................................................................69
Quadro 3 Categorias e subcategorias das Necessidades expressas pelos familiares
cuidadores ao cuidar do idoso dependente no domiclio .................................................77
Quadro 4 Categorias e subcategorias das Dificuldades expressas pelos familiares
cuidadores ao cuidar do idoso dependente no domiclio .................................................83
Quadro 5 - Categorias e subcategorias das Repercusses nos familiares cuidadores por
cuidarem do idoso dependente no domiclio ...................................................................89
Quadro 6 Categorias dos Apoios mobilizados pelos familiares cuidadores para cuidar
do idoso dependente no domiclio ..................................................................................93
Quadro 7 Categorias dos Cuidados prestados pelos familiares cuidadores ao idoso
dependente no domiclio ............................................................................................... 100
Quadro 8 Categorias das Estratgias utilizadas pelos familiares cuidadores no cuidar
do idoso dependente no domiclio ................................................................................ 105
Quadro 9 Categorias das Expectativas dos familiares cuidadores acerca das
intervenes dos enfermeiros dos CSP para cuidar do idoso dependente no domiclio 110
Quadro 10 Categorias das Emoes/sentimentos experienciados pelos familiares
cuidadores no cuidar do idoso dependente no domiclio ............................................... 115
Quadro11 Categorias dos Aspetos de vida dos familiares cuidadores alterados pelo
cuidar do idoso dependente no domiclio ...................................................................... 120
Quadro 12 Categorias das Sugestes referidas pelos familiares cuidadores para que
as famlias possam cuidar do seu familiar de modo a preservarem o seu bem-estar .... 125
Quadro 13 - Categorias das Vontades expressas pelos familiares cuidadores....130
xv
SIGLAS
ACES Agrupamento de Centros de Sade
ACSS Administrao Central do Sistema de Sade
AVD Atividades de Vida Dirias
CSP Cuidados de Sade Primrios
DGS Direo-Geral da Sade
DGSS Direo-Geral Segurana Social
EESC Enfermeiro Especialista em Sade Comunitria
ECCI Equipa de Cuidados Continuados Integrados
INE Instituto Nacional de Estatstica
PNS Plano Nacional de Sade
RNCCI Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados
UCC Unidade de Cuidados na Comunidade
UCSP Unidade de Cuidados de Sade Personalizados
ULSAM Unidade Local de Sade do Alto Minho
USF Unidade de Sade Familiar
17
INTRODUO
Atualmente confrontamo-nos com o envelhecimento das comunidades como
consequncia do declnio da taxa da natalidade e do aumento da esperana mdia de
vida (Portugal, Instituto Nacional de Estatstica (INE), 2012). Para o envelhecimento da
populao tambm contribui a melhoria das oportunidades de acesso sade (World
Health Organization, 2002). Este aumento de longevidade traz consigo uma maior
prevalncia das doenas crnicas e de dependncia para as atividades da vida diria
(AVD), ao mesmo tempo que trouxe aos governos, s famlias e sociedade em geral,
desafios para os quais no estavam preparados (Portugal, Direo Geral de Sade
(DGS), 2006).
Segundo Carneiro (2012, p. 14) Portugal apresenta mutaes demogrficas de ampla
escala e com importantes repercusses sociais, econmicas e culturais. () Esta
dinmica populacional aponta para uma transio demogrfica sem precedentes na
histria. Segundo dados do INE (2012), verifica-se um quadro de envelhecimento
demogrfico bastante acentuado, com uma proporo de idosos 7% superior de jovens
com 14 e menos anos, e uma esperana mdia de vida nascena de 79,2 anos. Isto
traduz-se num ndice de envelhecimento da populao de 131. O aumento da
percentagem de idosos foi de 11% em 2001, para cerca de 19% em 2011.
As polticas sociais e de sade sugerem a manuteno dos idosos no seu domiclio,
exigindo s famlias um assumir de papis para os quais nem sempre est preparada,
uma vez que cuidar do idoso dependente complexo e implica diversas adaptaes
fsicas, sociais, cognitivas e emocionais, podendo revelar-se um processo difcil,
desgastante e at mesmo vir a comprometer o bem-estar da famlia que cuida. O
processo de cuidar interativo entre o cuidador e a pessoa cuidada (Waldow, 2006),
assumindo o cuidador um papel ativo, na medida em que desenvolve aes e
comportamentos de cuidar. O familiar cuidador efetivamente o suporte emocional e
social, com um papel importante na satisfao das necessidades da pessoa cuidada.
Em Portugal, a famlia continua a ser a principal fonte de apoio nos cuidados diretos, no
apoio psicolgico e nos contactos sociais pessoa idosa dependente (Pal, 1997,
Pimentel, 2000 e Pego, 2013). A famlia assume assim o papel central nos cuidados ao
idoso dependente no domiclio. Conforme refere Martins (2002), ela a primeira unidade
social onde a pessoa se insere, contribuindo tambm, para o seu desenvolvimento e
socializao. O envolvimento da famlia nos cuidados de sade constituiu desde sempre
18
um acto de vida (Moreira, 2006, p. 43). Esta apresenta-se como um sistema aberto, de
inter-relaes recursivas, constituda por um grupo coeso de pessoas relacionadas entre
si, com valores, conhecimentos e prticas prprias onde qualquer mudana surgida num
determinado membro implica alteraes nos restantes elementos (Figueiredo, 2012).
Assumir a responsabilidade da prestao de cuidados ao idoso dependente requer
frequentemente uma adaptao por parte do cuidador, muitas vezes familiar, para
satisfazer as suas necessidades humanas bsicas. Neste sentido, cuidar de idosos
dependentes pode gerar angstia, tenso, alteraes no bem-estar do cuidador a nvel
da sade, da vida social, da rotina familiar, entre outros aspetos, levando isto ao
despoletar de inmeras necessidades/dificuldades (Pal, 1997; Palma, 1999; Pacheco,
2004: Verssimo e Moreira, 2004; Santos, 2008; Andrade, 2009; Ricarte, 2009; Sequeira,
2010; Mata e Rodrguez, 2012; Ramos, 2012).
Neste sentido, evidencia-se o papel promissor do enfermeiro a exercer funes em
Cuidados de Sade Primrios (CSP), num contexto de proximidade de cuidados a um
nmero limitado de famlias integradas numa comunidade especfica. Cabe ao enfermeiro
responder s necessidades das famlias que cuidam de idosos dependentes no domiclio,
exigindo que se efetuem visitas domicilirias frequentes e constantes, constituindo
formas privilegiadas de interveno a nvel individual, familiar e social, contribuindo para
o desenvolvimento comunicacional e conhecimento dos contextos vivenciados pelas
famlias dos idosos dependentes, que experienciam muitas vezes uma variabilidade de
sentimentos, necessidades e dificuldades, que afetam a sua qualidade de vida.
Prestar cuidados de enfermagem no domiclio promove um cuidado centrado na famlia e
no idoso que se encontra em estado de dependncia, potenciando relaes assertivas e
facilitadoras da expresso de sentimentos. O enfermeiro ao invadir a privacidade do lar,
passa a fazer parte integrante dele. Rice (2004) preconiza que ao entrarmos no mundo
do utente, decidimos conjuntamente com ele o qu e como ensinar (p. 129). Mas, para
que a famlia seja foco de ateno dos enfermeiros necessrio que o enfermeiro
identifique e analise as necessidades e dificuldades que vo surgindo ao familiar cuidador
para que este possa sentir que algum cuida dele.
Tendo em conta estes pressupostos e considerando que cuidar do idoso dependente
pode ser perturbador para as famlias, alterando drasticamente a sua rotina familiar,
colocamos a seguinte questo de investigao: Quais as necessidades/dificuldades dos
familiares cuidadores no cuidar do idoso dependente no domiclio?
19
A finalidade deste estudo de investigao prende-se com o contribuir para a melhoria dos
cuidados ao idoso dependente no domiclio, minimizando o sofrimento da famlia que
cuida, de forma a potencializar o seu bem-estar.
assim objetivo geral deste estudo perceber as necessidades/dificuldades dos familiares
cuidadores no cuidar do idoso dependente no domiclio. Como objetivos especficos,
pretendemos:
- Identificar as necessidades dos familiares cuidadores ao cuidar do idoso dependente no
domiclio;
- Identificar as dificuldades dos familiares cuidadores ao cuidar do idoso dependente no
domiclio;
- Identificar os cuidados prestados pelos familiares cuidadores ao idoso dependente no
domiclio;
- Identificar as estratgias utilizadas pelos familiares cuidadores no cuidar do idoso
dependente no domiclio;
- Analisar as expectativas dos familiares cuidadores acerca das intervenes dos
enfermeiros dos CSP no cuidar do idoso dependente no domiclio;
- Identificar os apoios que os familiares cuidadores mobilizam no cuidar do idoso
dependente no domiclio;
- Identificar as emoes/sentimentos experienciados pelos familiares cuidadores no
cuidar do idoso dependente no domiclio;
- Analisar os aspetos de vida dos familiares cuidadores alterados pelo cuidar do idoso
dependente no domiclio.
O presente estudo tem como base uma anlise qualitativa das necessidades/dificuldades
dos familiares cuidadores, atravs da aplicao da entrevista semi-estruturada para a
recolha de dados.
Encontra-se estruturado em quatro partes principais. Na primeira parte consta a reviso
sistemtica de literatura sobre famlia, idoso dependente e famlia a cuidar do idoso
dependente no domiclio, bem como a responsabilidade do Enfermeiro Especialista em
Sade Comunitria (EESC) no cuidar da famlia e respostas sociais de apoio ao idoso.
Na segunda parte so apresentados os mtodos e procedimentos adotados para a
operacionalizao do estudo. A terceira parte descreve a apresentao, interpretao e
discusso dos resultados obtidos. Finalmente, procedemos exposio das concluses,
implicaes, limitaes e sugestes do estudo.
PARTE I ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL
23
Este captulo prev o enquadramento terico do problema de pesquisa atravs de uma
identificao dos temas mais relevantes para a compreenso da temtica em estudo:
Famlia do Idoso Dependente: Anlise das necessidades/dificuldades no cuidar no
domiclio.
Dedicamos o primeiro captulo conceptualizao de famlia e o segundo
conceptualizao de idoso dependente. No terceiro captulo abordada a problemtica
do cuidar referente famlia com idoso dependente, onde se enfatiza as consequncias
do cuidar, necessidades e dificuldades com que as famlias se deparam e promoo do
bem-estar dessas famlias. No quarto captulo abordada a responsabilidade do EESC
no cuidar da famlia e no quinto captulo feita referncia s respostas sociais de apoio
ao idoso.
1- A FAMLIA: CONCEITO E FUNO
A presena de um idoso com uma situao de doena crnica e dependente no meio
familiar, se por um lado proporciona a este estabilidade e proteo, por outro, confronta a
famlia com a necessidade de (re)definir as relaes familiares.
Nesta lgica, parece-nos importante abordar o conceito de famlia e sua funo, uma vez
que, sem sombra de dvida, sofreu ao longo do tempo as mais profundas adaptaes e
modificaes.
A famlia o grupo social mais antigo presente na sociedade e aquele que mais
influencia a vida das pessoas, apresentando uma organizao complexa que se encontra
em constante interao com o contexto social onde est inserida. As transformaes na
sociedade implicaram mudanas significativas na organizao e estrutura familiar, dando
origem a novas estruturas familiares. Neste sentido, focando a era romana verificamos
que a famlia era constituda por um conjunto de pessoas lideradas por um chefe: o
pater famlias, classificada como uma famlia patriarcal que reunia todos os seus
membros em funo do culto religioso, para fins polticos e econmicos (Leite, 1991).
As transformaes a nvel poltico, econmico e social, ocorridas na segunda metade do
sculo XX, alteraram a estrutura e a dinmica da famlia, o que conduziu a profundas
mudanas no comportamento das pessoas e redefinio de papis no seio familiar.
A famlia sofre fortes influncias polticas, econmicas, sociais e culturais, originando
mudanas nos papis e nas relaes, alterando a sua estrutura nomeadamente a nvel
da composio familiar. Singly (2000) salienta que a famlia contempornea ao mesmo
tempo e paradoxalmente, relacional e individualista. nesta tenso que existe entre
24
estas duas dimenses que se constroem e se desfazem os laos familiares
contemporneos.
Atualmente no existe uma configurao singular de famlia, pois esta tem vindo a sofrer
alteraes, passando a existir cada vez mais famlias nucleares, monoparentais.
Salientamos que a famlia no sculo XXI designada como a famlia ps-moderna ou
pluralista. No entanto, vrias so as definies de famlia, de acordo com diferentes
autores.
Para Minuchin (1990) a famlia um conjunto invisvel de exigncias funcionais que
organiza a interao dos membros da mesma, considerando-a igualmente como um
sistema que opera atravs de padres transacionais. Assim, no interior da famlia, os
indivduos podem construir subsistemas, podendo estes ser formados por grupos de
diferentes geraes, sexo, interesses e/ou funo, havendo diferentes nveis de poder, e
onde os comportamentos de um membro afetam e influenciam os outros membros.
J Silva (2001) salienta que a famlia uma construo social, na medida que representa
um modo de agir e de pensar coletivo, que evoluiu ao longo do tempo em relao
organizao e funcionamento da sociedade.
A famlia de hoje, j no representa a construo mental que faz parte de cada um de
ns - pai, me e filhos. Mas cada vez mais encontramos famlias classificadas como
normais, luz dos novos paradigmas, em que os membros nem sempre partilham a
mesma residncia, nem sempre os descendentes so filhos dos adultos da famlia e nem
sempre os adultos so de sexos diferentes (Alarco e Relvas, 2002).
A famlia pode ser considerada a principal entidade de desenvolvimento pessoal, que
possibilita o crescimento e autonomizao dos seus membros e, simultaneamente, a
criao de um sentimento de pertena. Representa um grupo de pessoas unidas com um
objetivo comum de crescimento e desenvolvimento dos seus membros (Alarco, 2006).
Vrios autores, entre eles Minhuchin (1990) e Figueiredo (2012), tm definido o conceito
de famlia como um sistema em que se verificam mltiplas interaes entre todos os seus
membros. Segundo Figueiredo a famlia apresenta-se como um sistema aberto, de inter-
relaes recursivas, () inserido e articulado em diversos contextos, agrega um sistema
de valores, conhecimentos e prticas, num espao relevante de socializao e
humanizao (2012, p. 68).
Esta viso dinmica da famlia revela a sua complexidade e permite-nos compreender
melhor a importncia das relaes estabelecidas entre os seus membros, como
determinantes no processo evolutivo do grupo familiar. A famlia enquanto grupo, evoluiu
de acordo com as suas finalidades, face s quais desenvolve determinadas funes que
25
se transformam ao longo do seu ciclo de vida, sujeito s transies normativas e
acidentais (Ibidem).
Parece-nos que definir a famlia de modo absoluto, preciso e universal difcil, pois cada
famlia nica. Em todas as famlias existem necessidades e dificuldades que tm de se
enfrentar, mas a forma como as enfrenta especfica de cada uma. Quando a famlia
suporta os perodos de tenso, de forma a preservar a identidade do sistema e a
respeitar as diferenas individuais dos membros, considera-se uma famlia funcional. Nas
famlias funcionais, os papis esto muito bem definidos, isto , quando surgem
problemas so discutidos e resolvidos no momento exato (Relvas, 2003).
Quando os especialistas querem perceber como se comporta a famlia em termos de
funcionalidade, tentam perceber a existncia de alianas e/ou coligaes entre os seus
membros. Uma famlia estruturada, por norma, exprime uma liderana democrtica em
que inclui as crianas, com harmonia nos papis e nas regras familiares. O mesmo j no
se verifica nas famlias rgidas em que um dos membros controla a dinmica familiar,
impondo rigidez de papis e inflexibilidade nas regras. Nas famlias caticas, os papis
no esto definidos, h troca frequente de papis entre os seus membros e o uso de
alguma impulsividade nas tomadas de deciso (Idem).
O conceito de famlia, bem como as relaes estabelecidas entre os seus membros
modificou-se ao longo do tempo a par da evoluo da sociedade. A mudana de uma
sociedade rural para uma sociedade industrial, acompanhada pela dispora para as
grandes cidades, contribuiu para a nuclearizao da famlia e consequente eroso das
tradicionais normas de obrigao familiar. O incio da industrializao e a expanso da
economia obrigou a que a produo ocorrida em espao domstico passasse para o
mercado do trabalho. Esta nova famlia conserva alguns aspetos da famlia tradicional
nomeadamente, a preservao das relaes afetivas entre os seus membros.
A famlia, em Portugal, est em profunda mudana. No passado recente, a organizao
familiar reconfigurou-se devido s transformaes societrias relacionadas com o
aumento da taxa de participao das mulheres portuguesas no mercado de trabalho, a
atomizao dos agregados familiares e a maior volatilidade das relaes conjugais (Wall,
Cunha e Vasconcelos, 2001). Os ltimos dados dos Censos (Portugal, INE, 2012)
mostram uma tendncia de reduo da dimenso mdia das famlias e diminuio da
natalidade. Analisando as alteraes nas ltimas dcadas da estrutura, composio e
dimenso das famlias portuguesas, observa-se o aumento das famlias unipessoais e o
surgimento de novas formas familiares e conjugais, as quais, embora de forma ainda
muito restrita, tm vindo a ser incorporadas no conceito de ncleo familiar. Estas
26
mudanas podero reduzir o papel das famlias na proviso de servios para os
familiares mais idosos.
A alterao da estrutura familiar um dos fatores proeminentes de mudana na
sociedade contempornea, colocando novos desafios em termos de necessidades
sociais e organizao das respostas pblicas e privadas, com vista promoo do
bem-estar individual e coletivo no contexto do processo de envelhecimento. Em geral, a
famlia desempenha um papel importante na proviso dum vasto conjunto de servios
para fazer face s necessidades dos seus membros, acomodando os efeitos da incerteza
em domnios importantes da vida, como so os casos do mercado de trabalho ou dos
cuidados pessoais, entre outros (Carneiro, 2012).
As mudanas demogrficas e da estrutura social das famlias trouxeram consigo uma
nova dinmica na vida das pessoas pois, se h algumas dcadas eram as mulheres que
assumiam o papel de cuidadoras dos idosos, com a sua entrada no mercado laboral e o
envelhecimento simultneo da populao, o cuidado dos mais velhos ficou, de certa
forma, comprometido (Pego, 2013).
Concluindo, verificam-se mltiplas alteraes sociais e alteraes na estrutura familiar. A
reduo do agregado familiar, a maior volatilidade das relaes conjugais, a diminuio
da natalidade, o aumento da participao das mulheres no mercado de trabalho e as
alteraes das redes de solidariedade e vizinhana, tm vindo tambm a condicionar as
possibilidades de apoio das famlias que prestam cuidados aos seus elementos idosos
dependentes. Todavia, apesar das limitaes da famlia ela continua a assumir-se como
o centro da solidariedade interpessoal assegurando o bem-estar e os cuidados
necessrios dos seus familiares idosos dependentes. A famlia , por excelncia, um
suporte da realizao afetiva do indivduo e, deste modo, no se pode descurar a
importncia indiscutvel dos cuidados informais prestados em contexto domicilirio.
27
2- O IDOSO DEPENDENTE: CONCEITO DE DEPENDNCIA E AUTONOMIA
FUNCIONAL
Grande parte das pessoas idosas desfruta de uma sade que lhes permite viver de uma
forma independente, com capacidades para a concretizao de mltiplas tarefas e
atividades sem a necessidade de auxlio de outros. Porm, o envelhecimento ocorre de
forma diferente de pessoa para pessoa e, se a maioria das pessoas idosas consegue
viver muitos anos saudvel e livre de limitaes, a realidade mostra-nos uma estreita
relao entre a idade e a dependncia.
De acordo com a Organizao Mundial de Sade e a Organizao das Naes Unidas,
nos pases desenvolvidos, considera-se que uma pessoa idosa quando tem 65 e mais
anos, enquanto nos pases em desenvolvimento, considerada idosa a pessoa com 60 e
mais anos (Oliveira, 2005; Neri, 2001;Paschoal, 2000).
Imaginrio (2004) refere que a velhice surge pela deteriorao e declnio da
funcionalidade do indivduo, levando-o incapacidade funcional e desenvolvimento de
um auto-conceito negativo e que o grau de dependncia tanto maior quanto mais
elevado for o grupo etrio. O aumento da dependncia no idoso est muitas vezes
relacionado com a prpria deteriorao do processo de envelhecimento, em que as
perdas de coordenao motora se associam a medos crescentes.
Segundo a DGS (2006, p. 11), as doenas no transmissveis e de evoluo prolongada,
tornam-se as principais causas de morbilidade e mortalidade das pessoas idosas, com
enormes custos individuais, familiares e sociais. Os problemas crnicos e as suas
consequncias obrigam mais tarde ou mais cedo, a modificar o ritmo de vida e a aceitar a
baixa da capacidade funcional. A doena crnica, quer seja de carter fsico ou mental,
uma das maiores causas de incapacidade e perda de independncia e autonomia
funcional. A dependncia pode ser o reflexo de uma perda geral das funes fisiolgicas
derivadas do prprio processo de senescncia, ou de uma ou vrias doenas crnicas.
Poder-se- dizer que o conceito de dependncia e o conceito de autonomia so de certa
forma conceitos opostos. A dependncia est relacionada com uma certa necessidade de
outro para a realizao de tarefas, sejam elas inerentes ao autocuidado, ou
necessidade de se relacionar com o meio, enquanto que a autonomia diz respeito
capacidade de decidir e comandar-se pelas prprias ideias. Porm, o estado de
dependncia, independncia e autonomia do idoso no dependem apenas da sade
funcional do organismo, mas tambm de sanidade psicolgica e scio ambiental.
28
A dependncia assume contornos particulares, uma vez que resulta de fatores como a
reduo das capacidades fsicas ou psicolgicas, insegurana econmica, isolamento,
solido, dependncia de familiares e/ou de outro tipo de suporte social (Fernandes,
2000).
De acordo com a Classificao Internacional para a Prtica de Enfermagem, a
dependncia significa estar dependente de algum ou alguma coisa para ajuda e apoio
(Conselho Internacional de Enfermeiros, 2006, p. 107). dependncia est
frequentemente associada uma limitao fsica, psquica ou intelectual que compromete
determinadas capacidades, levando incapacidade para realizar, por si, as AVD e
necessidade de assistncia ou cuidados por parte de terceiros (Amaral e Vicente, 2000;
Figueiredo, 2007). Consideram-se em situao de dependncia os indivduos que no
possam praticar com autonomia os atos indispensveis satisfao das necessidades
bsicas de vida quotidiana, carecendo da assistncia de outrem (Nogueira, 2009, p. 8),
ou seja, a pessoa por si s no consegue realizar as suas AVD.
Existem estudos, tal como o de Amaral e Vicente (2000) que salientam que o grau de
dependncia tanto maior quanto mais elevado o grupo etrio, sendo o sexo feminino
mais dependente que o masculino.
Tambm Caldas (2003) verifica que a dependncia causa grande impacto a nvel da
sade pblica, pelo facto de provocar nas famlias alteraes na sua dinmica familiar.
Estas situaes de alterao da dinmica familiar provocadas pela perda de autonomia
tambm conduzem a situaes de fragilidade no seio da famlia.
De acordo com Paschoal (2007) a perda da funo o principal indicador de
dependncia, referindo que se deve fazer uma avaliao da autonomia funcional do
idoso, com base nas atividades bsicas da vida diria como a alimentao, higiene
pessoal e movimento; nas atividades instrumentais de vida diria que apresentam maior
complexidade; como usar o telefone, cuidar da casa, preparar a comida, fazer compras,
tratar dos assuntos econmicos e usar os meios de transporte, e ainda nas atividades
avanadas de vida diria, mais complexas mas no to essenciais para a independncia
da pessoa idosa, que interferem com a sua auto realizao, tal como a capacidade de
conduzir, fazer desporto, ir ao cinema, entre outras.
A autonomia funcional de um indivduo constata-se pela independncia de interveno de
terceiros para a realizao das AVDs.
A autonomia compreendida como uma componente essencial de bem-estar do
indivduo, que se deve realizao e satisfao da sua vontade. A pessoa escolhe o
caminho a seguir, facto que lhe transmite segurana e satisfao com a vida. Neste
29
sentido a autonomia est associada em grande parte ao nvel psicolgico dos indivduos
(Santos, 2000).
Hernndez e Gimnez (2000) citado por Imaginrio (2004) classificam a autonomia em
trs grupos: a) idosos com baixa autonomia: apresentam alta dependncia na realizao
das atividades de vida diria; b) idosos com mdia autonomia: apresentam um dfice na
atividade intelectual e sensorial, mas conseguem resolver a maior parte dos problemas
que ocorrem na sua vida; c) idosos com elevada autonomia: apresentam uma boa
qualidade de vida e atitudes positivas face vida.
Dadas as perdas que acontecem com o envelhecimento e com a dependncia, tanto a
famlia como o idoso necessitam passar por um perodo de adaptao e compensao
das perdas ocorridas, com o objetivo de promover a autonomia do idoso (Sequeira,
2010). Esta autonomia no conceito mais global engloba a dimenso espiritual e religiosa
que exige s famlias um debruar atento e um respeito por estas dimenses.
2.1 Os Aspetos Espirituais e Religiosos na Promoo da Sade do Idoso
A dimenso religiosa faz parte da estrutura ontolgica da pessoa e desenvolve-se atravs
da religio. Ela exerce um papel significativo na existncia humana, proporcionando um
apoio para lidar com os desafios dirios do processo de envelhecimento. De acordo com
Matthews e Clark (1998), a palavra religio deriva do latim religare e no seu sentido
originrio o que liga e religa todas as coisas, o consciente com o inconsciente, a mente
com o corpo e a pessoa com o cosmo (Pessini, 2004, p. 55).
Sempre carregada por um cunho emocional profundo, a religiosidade tem garantido s
pessoas idosas a esperana de um mundo melhor e sem sofrimento, proporcionando um
suporte necessrio para que se possa envelhecer condignamente, vivenciando um
envelhecimento bem sucedido, a fim de lidar melhor com o sofrimento, os desafios e as
transies ao longo da vida.
A existncia de uma elevada espiritualidade e religiosidade facilita a diminuio dos
nveis de ansiedade, uma grande adaptao doena e uma melhor sade mental
(Koenig, 1995). Levin, Larson e Puchalski (1997) demonstram que a espiritualidade
influencia positivamente a capacidade pessoal para participar na promoo da sade e
na sensao de bem-estar.
30
Atravs da religiosidade, o idoso pode atribuir significados aos factos, compreendendo-os
e aceitando-os de melhor forma, mediante a crena de que nada ocorre ao acaso e de
que acontecimentos da vida so determinados por uma fora superior.
O estado da arte evidencia que o envolvimento espiritual e religioso no s promove a
sade fsica e mental e a longevidade, como tambm diminui a procura dos cuidados de
sade. Renaud (2008, p. 160) destaca que o ser Humano () est permanentemente no
caminho da sua realizao espiritual.
A espiritualidade evidenciada por Breitbart (2003, p. 59) como favorecedora de um
sentido transcendente na vida e envolve conceitos de f e/ou sentido. A f est
frequentemente associada religio e s crenas religiosas; o sentido um conceito
mais universal, porque pode existir em pessoas com ou sem religio.
Nos ltimos anos, tm sido desenvolvidas diversos mecanismos para avaliar a
religiosidade e a espiritualidade, sendo algumas especficas para a sade (Hall, Meador,
Koenig, 2008; Hill, 2005). Deste modo, a dimenso espiritual e religiosa tem implicaes
na promoo da sade dos idosos, tal como refere Koenig (1995) quando salienta que a
elevada espiritualidade e religiosidade est associada a baixos nveis de ansiedade, a
uma grande adaptao doena e a uma melhor sade mental. Tambm Koenig e
Cohen (2002) e Benson (1996) referem que as crenas ajudam a transcender as perdas
(bio-psico-sociais), nomeadamente o declnio no funcionamento fsico e mobilizam efeitos
placebo de tolerncia dor.
31
3- A FAMLIA E O CUIDAR DO IDOSO DEPENDENTE NO DOMICLIO
O envelhecimento traz consigo um aumento da probabilidade de limitaes ao nvel
biolgico, psicolgico e social, dado que viver mais anos significa um aumento da
prevalncia de determinadas patologias que levam a situaes de dependncia, perda de
autonomia, isolamento social e depresso. Tudo isto se traduz em sofrimento para os
idosos e para as suas famlias que lhes prestam cuidados.
Prestar cuidados sempre foi visto como uma funo bsica da vida das famlias. Fala-se
de cuidar das crianas, cuidar da famlia, cuidar dos membros em desvantagem, cuidar
de idosos.
Hanson (2005) refora que envelhecimento assunto de famlia, e que as pessoas
idosas so parte integrante da rede familiar at morte. O apoio intergeracional de
cuidados prolonga-se ao longo do ciclo vital da famlia. Neste sentido, advm
consequncias sociais, sobretudo a nvel das incapacidades para realizar as AVDs e das
repercusses scio familiares que a situao acarreta.
Portugal um pas onde predomina a cultura familiarista, ou seja, o cuidado prestado aos
idosos assumido, primeiramente, pelas famlias. Tal como refere Pego (2013, p. 16),
mantem-se tradicionalmente a famlia como primeira linha de cuidados aos idosos
dependentes, sobretudo em zonas rurais. Isto deve-se a uma questo cultural mas
tambm reduzida disponibilidade de recursos formais apesar de, nos ltimos anos, se
ter verificado um aumento da oferta destes a nvel comunitrio e domicilirio.
A mesma autora refere que, embora esta oferta sirva de estmulo para um reforo da
solidariedade familiar e uma maior participao da famlia nos cuidados de longa durao
aos seus idosos, o aumento da disponibilidade de recursos formais no afasta a famlia
dos seus idosos, mas torna-os parceiros dos cuidados formais (Idem, p. 15).
Com a reestruturao dos cuidados de sade e implementao das Unidades de
Cuidados na Comunidade (UCC), o tempo de internamento diminuiu e os cuidados foram
mais direcionados para a comunidade, passando a ser centrados no domiclio. Compete
UCC prestar cuidados de sade e apoio psicolgico e social, de mbito domicilirio e
comunitrio, s pessoas, famlias e grupos mais vulnerveis em situao de maior risco
ou dependncia fsica e funcional () (Decreto-Lei n. 28/2008, de 22 de fevereiro, p.
1184).
Esta nova conceo de cuidar exigiu ao profissional de sade que se focasse nas
relaes familiares e nos seus processos de sade e doena. No acompanhamento de
32
uma situao de doena e dependncia funcional, o doente e a equipa de sade no so
os nicos elementos que interferem no processo, o cuidador familiar, ou o cuidador
informal, sem dvida um elemento determinante no conjunto da prestao de cuidados
a idosos dependentes.
Deste modo, medida que os cuidados de sade prestados em meios hospitalares se
foram transferindo para a comunidade, a famlia como entidade prestadora de cuidados,
foi sendo cada vez mais valorizada. O apoio prestado pela famlia assume um papel
primordial. A famlia a clula base, fundamental para a prestao de cuidados ao idoso
dependente no domiclio. Para o idoso, a famlia ainda a principal fonte de ajuda e
apoio, tanto nas actividades domsticas como nas de vida diria: companhia, cuidados
em caso de doena, entre outras (Imaginrio, 2008, p. 16).
importante que a famlia assuma funes muito particulares nas diversas etapas da
vida humana, desde a infncia at velhice, entre elas o cuidar. Na velhice, este papel
mais assistencialista, j que o sentido de prestar algum suporte ao idoso est em
procurar manter o seu equilbrio afetivo, emocional e fsico, o qual preciso cuidar com
dedicao.
Cuidar faz parte da histria, da experincia e dos valores da famlia, estando esta funo
intimamente relacionada com o contexto familiar, apesar das constantes alteraes a que
vamos assistindo na sociedade (Lage, 2005).
Segundo Cerqueira cuidar no domiclio permite famlia organizar os cuidados e prest-
los em tempo oportuno e adequado s necessidades do doente, () uma vez que a
famlia toma parte activa e interveniente em todo o processo de cuidar (2005, p. 63). A
prestao de cuidados no domiclio aparece, hoje, como a forma mais humanizada de
resposta, exigindo o estabelecimento de redes sociais de apoio integrado que garantam a
efetiva continuidade desses cuidados (Idem).
A rede social formal e informal importante no que se refere prestao de cuidados,
mas famlia que cabe a responsabilidade de cuidar diria e ininterruptamente do
idoso. No entanto, embora esteja a cargo da famlia a funo de cuidar do idoso
dependente, a prestao de cuidados no se reparte dentro da famlia equitativamente,
uma vez que existe um cuidador principal, denominado por cuidador informal.
Os cuidadores informais so elementos da rede social do idoso (familiares, amigos,
vizinhos colegas...) que lhe prestam cuidados regulares, no remunerados, na ausncia
de um vnculo formal ou estatutrio (Sousa, Figueiredo e Cerqueira, 2006, p. 53).
Sequeira (2007) refere que o cuidador principal aquele sob quem depositada a
responsabilidade integral de cuidar, supervisionar, orientar e acompanhar a pessoa idosa
33
que necessita de cuidados, e o cuidador secundrio algum que ajuda na prestao de
cuidados em colaborao com o cuidador principal. Esta colaborao pode passar pela
prestao direta de cuidados ou por apoio econmico, em atividades de lazer e
atividades de mbito social.
Identicamente, Rolo (2009) menciona que o cuidador informal principal a pessoa que
proporciona a maior parte dos cuidados, que no remunerada e sobre quem recai mais
de metade da responsabilidade dos cuidados ao idoso dependente. Este pode ser
auxiliado por outros familiares, amigos, voluntrios ou profissionais, e neste caso, h um
cuidador principal e todos os que servem de suporte ou de apoio so cuidadores
secundrios, podendo identificar-se vrios cuidadores secundrios para a mesma
pessoa.
Assim, o cuidador informal ou prestador de cuidados a pessoa que tem a funo de
cuidar de algum com algum grau de dependncia fsica ou mental e que necessite de
ajuda (total ou parcial) para a realizao de atividades da vida cotidiana (Brondani [et
al.], 2010, p. 505).
A prestao de cuidados a uma pessoa em situao de dependncia representa um ato
de carinho. Imaginrio (2004) refere que os cuidados prestados podem ser divididos em
cuidados instrumentais e cuidados expressivos. Deste modo, como cuidados
instrumentais a autora classificou todo o tipo de cuidados fsicos, tais como cuidados de
higiene, alimentao e mobilizao do doente e denominou cuidados tcnicos a
administrao de medicao e cuidados de vigilncia, como o acompanhamento a
consultas mdicas. Como cuidados expressivos a autora identificou o que diz respeito a
cuidados afetivos de conforto, carinho e companhia e cuidados sociais que se reportam
para cuidados de distrao e comunicao.
Como j referimos, cada vez mais se procura que a prestao de cuidados se realize no
seio da famlia, no entanto, vive-se em contextos mais desfavorveis para a sua
efetivao. Emergem cada vez mais famlias envelhecidas, reduziu o nmero de famlias
disponveis e com condies de exercer a tarefa de cuidadora, em oposio ao aumento
do nmero de idosos a necessitar de cuidados. Pode-se inferir, portanto, que o
envelhecimento com dependncia e a figura da famlia como cuidador esto a exigir
novas formas de assistncia e novos enfoques por parte das polticas de sade.
O fenmeno do envelhecimento exige cada vez mais ao nvel dos apoios formais, a
necessidade de equacionar medidas que permitam s famlias continuar a cuidar dos
seus idosos. No entanto, como se vivencia um momento de crise econmica e financeira,
em que h uma retrao da despesa no setor pblico da sade, principal prestador de
34
cuidados formais, necessrio compreender a capacidade que as famlias portuguesas
tm de assegurar a prestao de cuidados aos seus membros dependentes,
reconhecendo quais as consequncias que o cuidar acarreta.
3.1 Consequncias do Cuidar do Idoso Dependente no Domiclio
O cuidado informal a pessoas idosas dependentes traz consequncias, em vrias e
importantes reas da vida do cuidador, levando as famlias a definir e redefinir as
relaes, obrigaes e capacidades. No momento de assumir o papel de cuidador, a
pessoa, por norma, ainda no est consciente das exigncias associadas a este papel e,
cuidar de uma pessoa com dependncia obriga a grande dispndio de tempo pessoal e
energia.
Cuidar do idoso dependente bastante exigente do ponto de vista fsico, particularmente
os cuidados de higiene e as mobilizaes, pelo que esta tarefa pode tornar-se uma rotina
esgotante, que apenas pode ser aliviada se houver apoio de terceiros (Marques, 2007). O
facto de os cuidadores poderem contar com a ajuda de algum, como por exemplo do
cuidador secundrio, alivia-os das exigncias dos cuidados, melhorando a sua perceo
de sade e a sua qualidade de vida (Brito, 2002), atenuando as consequncias das
alteraes no seu estilo de vida e contribuindo naturalmente para a perceo de maior
vigor psquico e maior energia (Lage, 2005).
No entanto, constata-se que muitas vezes isto no acontece e, segundo alguns estudos
(Brito, 2002; Sequeira, 2010), para alm de todos os problemas fsicos que podem advir
do ato de cuidar, a dimenso emocional da sobrecarga, aquela que mais impacto tem
sobre o cuidador. Martins (2006) refere que a sobrecarga resultante do papel de
cuidador e que tem repercusses a nvel fsico, emocional, social e financeiro.
Segundo Imaginrio
a tarefa de cuidar do idoso dependente pode produzir uma sobrecarga intensa que acaba por comprometer a sade, a vida social, a relao com outros membros da famlia, o lazer, a disponibilidade financeira, a rotina domstica, o desempenho profissional e inmeros outros aspectos
da vida familiar e pessoal (2008, p. 17).
Assim, verifica-se que o desempenho do papel de prestador de cuidados interfere com
aspetos da vida pessoal, familiar e social dos familiares cuidadores o que pode
manifestar-se em tenso, constrangimento, fadiga, frustrao, reduo de convvio,
alterao da autoestima, entre outros (Sarmento, Pinto e Monteiro, 2010, p. 46).
35
A sobrecarga pode ser caraterizada pelo facto de o familiar cuidador se ver sem apoio e
permanentemente diante de situaes de enfrentamento, ocasionando queixas de ordem
objetiva e subjetiva, associadas ao cuidado realizado (Marques [et al.], 2011, p. 949).
Um cuidador mal preparado ou submetido ao desafio de cuidar durante vrios anos, pode
atingir elevados nveis de stress resultantes da sobrecarga fsica e/ou emocional. A
sobrecarga fsica deve-se a um excesso de atividades a desenvolver, ao esforo fsico
pela complexidade das tarefas, ao abandono de tratamentos para dedicar o seu tempo ao
doente e diminuio das horas de sono e o consequente cansao (Verssimo e Moreira,
2004). So vrios os sinais que podem indicar sobrecarga fsica, nomeadamente queixas
somticas, como indigesto, alteraes do apetite, dores de cabea, fadiga, perda ou
ganho de peso, dificuldade de concentrao, entre outros.
A sobrecarga emocional engloba problemas como a ansiedade ou mesmo quadros de
depresso, manifestando-se esta um ano aps o incio da prestao de cuidados, sendo
por isso na rea da sade mental que os efeitos da prestao de cuidados mais se
fazem notar (Brito, 2002, p. 35).
Loureiro (2009) salienta que frequente a existncia de sentimentos de raiva, hostilidade,
culpa, revolta, medo, solido e pessimismo em familiares cuidadores, bem como o
desenvolvimento de sintomatologia psiquitrica pela prestao continuada de cuidados.
Tambm Gallant e Connell (1998) citado por Sarmento, Pinto e Monteiro (2010 p. 48),
referiram que, os problemas mais relatados pelos familiares cuidadores foram: a
depresso, a fadiga, a raiva, o conflito familiar, a culpa, a tenso emocional, a sobrecarga
financeira e as alteraes psicossomticas.
Marques [et al.] (2011, p. 945), num estudo realizado com cuidadores informais,
observaram o comprometimento da sade quer a nvel fsico quer psicolgico,
principalmente quando se verificou quebra das redes sociais e da escassez de apoio,
levando a pessoa a rejeitar a condio de cuidador. Esta rejeio deve-se ao facto de o
cuidador no conseguir dar resposta s necessidades afetivas de quem cuida. Os
mesmos autores referem que o cuidador sem suporte pode ser um futuro paciente, isto
porque, por imposio ou escolha, geralmente, to pressionado por necessidades
imediatas do doente que se esquece de si (Idem, p. 947).
A vida social do cuidador tambm afetada pela prestao de cuidados conduzindo a
sobrecarga social, a qual igualmente considerada uma dimenso importante, uma vez
que ao cuidador exigido um aumento de tarefas a exercer no seu quotidiano, muitas
vezes sem apoio de outros, levando a que perca o tempo outrora dedicado a atividades
de lazer e convvio social. Isto faz com que surja frequentemente o desejo de se libertar
36
da responsabilidade a que est sujeito, acompanhado por inevitveis sentimentos de
raiva e culpa por pensar que no pode fazer tudo o que pode.
Segundo Marques (2007) todo este conjunto de emoes negativas se refletem nos
diversos domnios da vida do prestador de cuidados, afetando para alm da sua relao
com os restantes familiares, a sua atividade profissional. Para aqueles que exercem uma
profisso, o tempo despendido no trabalho pode ter efeitos positivos ou negativos
(Sousa, Figueiredo e Cerqueira, 2006). Por um lado, a atividade profissional possibilita
um refgio s lidas de cuidar e um convvio com amigos e colegas, por outro, a
necessidade de conciliar o emprego com a funo de prestador de cuidados, pode
implicar alteraes do horrio de trabalho, sensao de desempenho afetado, atrasos,
recusa de promoes, e at a possibilidade de desistir da profisso. Segundo os mesmos
autores, a inexistncia de estruturas de apoio ou ajudas informais representam uma
razo suficiente para levar cessao da atividade laboral. No entanto, como a situao
de prestao de cuidados exigente a nvel financeiro, se o cuidador abandonar a
profisso que exerce, a situao de prestao de cuidados torna-se mais dificultada pelas
despesas que esta acarreta, levando deste modo a uma sobrecarga financeira. Marques
(2007) constatou que os cuidadores com menor nvel socioeconmico apresentam maior
sobrecarga financeira, tm menos mecanismos de controlo e eficcia apresentando maior
sobrecarga global.
A sobrecarga fsica, emocional e social est diretamente relacionada com as
caratersticas do cuidador, como seja a idade, sexo, escolaridade, processos simultneos
de doena, dificuldades econmicas, falta de apoio dos servios de sade e vinculao
ao cuidar (Martins, 2006).
Relativamente idade, Figueiredo (2007) menciona que a maioria dos cuidadores so
indivduos entre os 45 e os 60 anos, sendo que quanto mais velha for a pessoa
dependente, mais velho ser o cuidador. Marques (2007) e Sequeira (2010) referem que
a idade tambm tida em conta como varivel com associao direta na perceo da
sobrecarga, sendo esta maior nos cuidadores mais velhos.
As mulheres tendem a sofrer maior sobrecarga que os homens, pelo facto de j terem
mltiplos papis, deveres e obrigaes na sua vida quotidiana, como o cuidar dos filhos,
as atividades domsticas e o desempenho da sua atividade laboral (Barnes [et al.], 2006).
Brito (2002) constata que as mulheres tendem a estar mais envolvidas emocionalmente,
manifestando nveis mais elevados de tenso e mais dificuldade em aceitar apoio
externo. Sequeira (2010) salienta que as mulheres cuidadoras com baixa escolaridade e
casadas apresentam nveis mais elevados de sobrecarga. Martins (2006), no entanto,
37
defende no existir diferenas significativas entre homens e mulheres cuidadores no que
respeita perceo dos nveis de sobrecarga.
Quanto ao grau de parentesco, os conjugues parecem estar expostos a maiores nveis de
sobrecarga comparativamente a outros parentes, pois habitualmente so mais velhos e
tm de assumir um conjunto de tarefas que estavam a cargo do doente (Figueiredo,
2007; Martins, 2006; Sequeira, 2010).
O nvel de escolaridade outro aspeto associado ao nvel de sobrecarga percecionado
pelos cuidadores. Cuidadores com maior nvel de escolaridade habitualmente
apresentam menor sobrecarga, uma vez que tm mais facilidade em manifestar as suas
dificuldades. Sequeira (2010) declara que os cuidadores de classes sociais mais
desfavorecidas (menor escolaridade, menores rendimentos e piores condies
habitacionais) atingem maiores nveis de sobrecarga.
Porm, apesar da maior parte da literatura relativamente s consequncias que advm
da prestao de cuidados se focar principalmente nas consequncias negativas, cuidar
de uma pessoa idosa tambm acarreta aspetos gratificantes.
A solidariedade, a intimidade que se gera em muitas destas situaes, compensando, por
vezes, anos passados de falta de proximidade, a felicidade que advm de tornar mais
doce o fim da vida de quem nos querido, so razes de sobra para tornar positiva a
eventual sobrecarga e desgaste fsico que a prestao de cuidados a uma pessoa idosa
acarreta.
fundamental pensar na qualidade de vida dos idosos que sofrem as fragilidades
prprias da doena e idade avanada mas, no deixa de ser menos importante identificar
quais as necessidades e dificuldades que os cuidadores manifestam, para que dessa
forma tambm se possa cuidar destes.
3.2 As Necessidades e Dificuldades da Famlia no Cuidar
Prestar cuidados no domiclio exige aos familiares uma (re)adaptao do seu quotidiano,
uma vez que o desempenho deste papel interfere com os aspetos da vida familiar, social
e laboral. Constituindo o cuidador e a pessoa idosa dependente uma unidade que se
influencia mutuamente, importante que se identifique e compreenda as necessidades e
dificuldades sentidas pelo cuidador.
38
Verssimo e Moreira (2004), referem que enquanto muitos cuidadores assumem ao longo
da vida uma carreira de cuidadores, cuidando dos filhos, netos, pais ou sogros, outros
cuidam de uma pessoa dependente pela primeira vez. Para estes ltimos, esta uma
experincia inteiramente nova, que se traduz em diferentes necessidades e dificuldades.
O conceito de necessidades em linguagem corrente reporta-nos para a noo de valor,
pois cada pessoa atribui um significado diferente, seu, ao que desejvel, pretenso.
Da, que as necessidades no possam ser vistas como absolutas, so sempre relativas
s pessoas, com os seus valores e crenas e aos contextos onde esto inseridas.
A necessidade consiste na condio no satisfeita e imprescindvel que permite pessoa
viver ou funcionar em condies normais, atingindo objetivos. S conhecendo as
necessidades dos familiares, possvel promover cuidados individualizados e
humanizados inseridos no contexto familiar (Martins, 2000).
Os cuidadores apresentam necessidades que dependem da sua condio individual,
variando consoante diversos fatores, tais como: o grau de dependncia do idoso, a sua
situao financeira e tambm, os meios de apoio existentes na comunidade.
fundamental identificar as necessidades que os familiares cuidadores enfrentam no
domiclio uma vez que estas afetam a qualidade de vida do idoso dependente e, a no
satisfao destas, um fator precipitante da no aceitao do doente em casa por parte
do cuidador (Cerqueira, 2005).
De acordo com Brito (2002), o familiar cuidador tem necessidade de apoio psicolgico,
educao/informao e sistemas sociais de apoio, da que as intervenes teraputicas
junto destes prestadores de cuidados devero ser direcionadas relativamente a estes trs
aspetos principais.
No entanto, Figueiredo refere que identificar as necessidades dos cuidadores um
processo complexo, devido sua variabilidade individual, fase da prestao de
cuidados e ao contexto em que ocorrem. Aponta alguns tipos de necessidades que
podem ser agrupadas em: ajudas prticas e tcnicas, apoio financeiro, apoio
psicossocial, tempo livre, informao e de formao (2007, p. 139).
Segundo a mesma autora, as ajudas prticas e tcnicas dizem respeito aos cuidados
domicilirios que englobam, cuidados de enfermagem, apoio nas tarefas domsticas e na
preparao de refeies, e tambm a possibilidade de alugar ou adquirir material tcnico
adequado, como cadeiras de rodas, camas articuladas, arrastadeiras, etc., que podem
facilitar muito as tarefas dos cuidadores.
As necessidades de apoio financeiro resultam da escassez de rendimentos, fruto dos
baixos valores das penses e/ou reformas, a par com as elevadas despesas com a
39
assistncia mdica, medicamentos e equipamentos. Estes encargos poderiam ser mais
leves se existisse um maior apoio financeiro na doena e na dependncia (Idem).
Relativamente ao apoio psicossocial, uma das necessidades mais sentidas pelos
cuidadores a de ter algum com quem falar acerca das experincias, dificuldades,
preocupaes e satisfaes inerentes prestao de cuidados, e em simultneo, a
necessidade de reconhecimento pelo seu sacrifcio, para se sentir valorizada e apreciada
(Idem).
Um outro tipo de necessidade prende-se com a informao acerca dos servios
disponveis, subsdios e direitos, pois tal informao encontra-se frequentemente
dispersa e exige muito tempo do cuidador para lhe ter acesso. Alm desta, o cuidador
tem necessidade de formao com vista obteno de conhecimentos prticos (como
levantar a pessoa, cuidar da sua higiene, vesti-la, etc.) e conhecimentos sobre a prpria
doena, evoluo e tratamentos.
Com o decorrer do tempo, o familiar cuidador manifesta tambm necessidade de dedicar
algum tempo a si, de ser temporariamente dispensado das suas tarefas para poder ter
algum tempo livre. Este aspeto poderia ser colmatado por instituies (atravs de
servios de apoio domicilirio, centros de dia, internamento temporrio), ou ainda por
outros cuidadores informais que se responsabilizassem pela substituio do cuidador
principal por algumas horas, dias ou at vrias semanas (Idem).
Para alm de necessidades, os familiares cuidadores tambm manifestam inmeras
dificuldades na prestao de cuidados. No entanto, muitos cuidadores tm dificuldade em
formular e imaginar as suas dificuldades, sobretudo quando desconhecem as respostas
formais existentes (Figueiredo, 2007).
Sit [et al] (2004), num estudo sobre as dificuldades dos cuidadores evidenciaram as de
maior repercusso: a continuidade de cuidados mdicos e de enfermagem; a
monitorizao das condies do estado de sade do familiar; a assistncia na
mobilidade; o lidar com as tarefas domsticas; o apoio emocional; o providenciar
transporte; em estruturar as atividades para o familiar; em lidar com as emoes do
familiar e em gerir a parte econmica e burocrtica.
Para diminuir estas dificuldades, o processo de cuidar de algum necessita de esforo
fsico, mental, psicolgico e econmico, da a necessidade do cuidador se reorganizar e
ser capaz de encontrar alternativas atravs dos recursos existentes. Neri e Carvalho
(2002) referem que a eficincia do cuidado depende dos conhecimentos, das
experincias, das estratgias utilizadas, do significado que atribudo ao cuidado, da
capacidade de lidar com situaes de stress, do apoio emocional, da cultura, do tipo de
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relacionamento com o idoso, da personalidade, da intensidade e do tipo de cuidado que
necessrio.
As dificuldades surgidas aos cuidadores, em consequncia da prestao de cuidados s
pessoas idosas dependem, entre outras razes, da falta de conhecimentos, de recursos e
de acompanhamento dos servios comunitrios. A este respeito, Pal (1997) refere como
dificuldade, para alm da falta de conhecimento sobre as tcnicas cuidativas e os
recursos comunitrios, a falta de conhecimento dos cuidadores para lidar com o stress
que advm da prestao de cuidados. Tambm outros autores (Palma, 1999; Verssimo e
Moreira, 2004) salientam que as necessidades de formao/informao invocadas pelos
prestadores de cuidados se relacionavam com a situao de sade da pessoa idosa e as
tcnicas de cuidar, que lhes permitissem diminuir o esforo fsico na prestao de
cuidados e o risco de acidentes para a pessoa idosa.
A prestao de cuidados despoleta assim necessidades e dificuldades por parte do
cuidador e, segundo Roger e Bonet (2000), citado por Pal e Fonseca (2005), as
consequncias do cuidar so mais acentuadas se o cuidador no tem conhecimentos,
habilidades ou o apoio suficientes para prestar efetivamente esses cuidados.
Para Lin [et al.] (2006) o prestador de cuidados precisa de desenvolver novas habilidades
para lidar com as necessidades do idoso dependente. As necessidades reconhecidas por
estes autores, assentam essencialmente a nvel da assistncia por parte da visita
domiciliria, da vigilncia contnua para assegurar a segurana do doente, de assistncia
na lida de higiene e limpeza das acomodaes, a necessidade de assistncia para gerir
situaes de emergncia e a necessidade de assistncia para realizar compras ou
transmitir recados.
Gomes e Mata (2012) salientam que ser cuidador de idosos dependentes no domiclio
requer uma constante aprendizagem. importante adquirir conhecimentos e habilidades
pois o sucesso do cuidado no domiclio depende do cuidador, da sua capacidade de lidar
com as situaes. O cuidador deve confiar nas suas capacidades, ter confiana e vencer
as dificuldades que ocorrem durante a prestao de cuidados, procurando apoio e auxilio
para o desempenho das suas atividades, de forma a garantir o seu bem-estar fsico,
psicolgico e social.
A falta de ajuda de outras pessoas para a prestao de cuidados pessoa idosa outra
das dificuldades apontadas pelos prestadores de cuidados do estudo desenvolvido por
Palma (1999). A autora concluiu que apesar dos cuidadores j receberem ajuda de outros
nos cuidados que prestam pessoa idosa, essa era uma ajuda pontual e insuficiente.
41
Somente atravs da identificao e clarificao das dificuldades e necessidades dos
cuidadores que os profissionais de sade e da ao social estaro aptos a focar a
ateno e a conceber medidas que contribuam para o xito a longo prazo dos cuidados
no domiclio (Figueiredo, 2007). Apesar da existncia de alguns apoios, os cuidadores
nem sempre recorrem a esses servios, e os que recorrem no tendem a utiliz-los em
grande escala, quer por desconhecimento e custo dos mesmos, quer por medo de
crticas de terceiros pelo facto de aceitarem ajuda formal, ou pelo receio de ir contra a
vontade do idoso que cuidam (Idem).
Os profissionais de sade devem ajudar os familiares cuidadores a descobrir formas mais
eficazes de lidar com os problemas que advm da prestao de cuidados de forma a que
a famlia atinja o seu bem-estar e por conseguinte, para que a prestao de cuidados se
desenvolva da melhor forma.
3.3 Promoo do Bem - Estar da Famlia do Idoso Dependente
Durante o ciclo de vida de uma famlia ocorrem mudanas e transies, que mesmo
consensualmente reconhecidas como fazendo parte do seu ciclo de vida, tais como
casamento, nascimento de um filho, entre outras, so geradoras de algum stress e
fazem-se acompanhar, por vezes, de alguma desordem e risco para a famlia. Contudo,
por norma, esta consegue organizar-se com alguma previsibilidade, no sentido de
ultrapassar tais situaes (Martins, 2002).
Em cada famlia, uma vez considerada como um sistema, a personalidade e o
comportamento de cada familiar vai ter repercusses no todo, assim como o bem-estar
da prpria famlia vai provocar impacto a nvel de cada um dos seus membros. Assim,
quando um familiar fica dependente, toda a famlia fica ansiosa, em stress, mais
vulnervel, insegura e deprimida, preocupando-se com a gravidade da doena e a
possvel perda de um dos seus elementos. Ao lidar com alguma situao de limitao
permanente, como seja uma doena incapacitante num dos membros da famlia, este
considerada um momento de crise no qual surge um desequilbrio entre o perodo da
crise e o de ajuste, onde preciso ter em conta os recursos disponveis para lidar com a
situao. Neste sentido, indispensvel identificar estratgias que possam responder s
necessidades e dificuldades dos familiares cuidadores e suas famlias e
consequentemente melhorar a qualidade de vida de todos os intervenientes, com o
objetivo do alcance do mximo bem-estar. A famlia, para restabelecer o equilbrio e
atingir o seu bem-estar, precisa superar esse momento crtico, o que depende do modo
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como cada famlia reage situao e de como se organiza para adquirir de novo o
equilbrio (Pereira e Bellizzoti, 2004).
A transio para o papel de cuidador uma situao complexa da qual urge a
necessidade no s de munir o cuidador de conhecimentos suficientes para lidar com a
situao do doente, mas tambm ajud-lo a preservar o seu bem-estar. Para isso
imprescindvel que o cuidador se encontre bem com ele prprio pois, o seu bem-estar e
satisfao repercutem-se na pessoa que depende de si (Martins, 2006).
O que se verifica maioritariamente que em paralelo com o cuidar, muitos familiares
cuidadores executam atividades domsticas, deixando as atividades que promovem o
seu bem-estar para ltimo plano (Gonalves, 2002).
O desafio atual da promoo do bem-estar da famlia do idoso dependente, fundamenta-
se em dois pressupostos: os comportamentos que a pessoa adota e as circunstncias em
que vive, as quais tm impacto sobre a sua sade. Deste modo, alteraes adequadas
no domnio dos comportamentos e das circunstncias podem melhorar o bem-estar da
famlia que cuida do seu familiar idoso dependente.
Porm, o conceito de bem-estar subjetivo, relativo, alicerado na diferente forma que
cada ser humano define o seu bem-estar e, efmero porque est em constante
adaptao, ou seja, depende de cada um, do momento e do meio envolvente. Assim,
apostar na promoo do bem-estar da famlia com idosos dependentes a cargo, exige
olhar para os determinantes psicolgicos e psicossociais que a envolvem.
Para obter o bem-estar da famlia, preciso considerar o seu projeto de sade, o que cria
oportunidades aos profissionais de sade, mais concretamente aos enfermeiros,
profissionais relevantes que integram programas de promoo da sade.
A abordagem centrada na famlia implica que o enfermeiro desenvolva determinadas
atitudes que cooperam na potenciao dos objetivos propostos. Uma das atitudes a
adotar passa por estabelecer com o utente/famlia uma comunicao/escuta emptica,
que se traduz segundo Chalifour (1993, p. 215) por uma capacidade de verdadeiramente
se colocar no lugar do outro, de ver o mundo como ele o v ou seja, importante para o
enfermeiro compreender as experincias pessoais do utente/famlia atravs dos cdigos
de referncia dos mesmos e no em funo dos seus.
A otimizao dos cuidados de enfermagem no idoso e sua famlia, passa pela criao e
implementao de projetos que visem a promoo da sade, o tratamento da doena, a
reabilitao/estimulao do idoso e a reduo de danos no que diz respeito co
morbilidade dos familiares cuidadores, enfatizando os cuidados no domiclio e ainda a
rentabilizao dos recursos.
43
Como forma de assegurar o bem-estar do idoso dependente e do seu familiar cuidador,
foi criada a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) enquadrada
juridicamente pelo Decreto-Lei n. 101/2006, de 06 de junho, que assenta num modelo de
interveno integrado e/ou articulado da Sade e da Segurana Social, de natureza
preventiva, recuperadora e paliativa, envolvendo a colaborao de diversos parceiros
sociais. formada por um conjunto de instituies pblicas e privadas, que prestam
cuidados continuados de sade e de apoio social e promovem a continuidade de
cuidados de forma integrada a pessoas em situao de dependncia e com perda de
autonomia (Decreto- lei n. 101/2006, de 06 de junho).
A RNCCI foi criada porque [] verificam-se carncias ao nvel dos cuidados de longa
durao e paliativos, decorrentes do aumento da prevalncia de pessoas com doenas
crnicas incapacitantes (Idem, p. 3856). A esta cabe responder a novas necessidades
de sade e sociais, de forma a satisfazer o incremento esperado da procura por parte de
pessoas idosas com dependncia funcional, de doentes com patologia crnica mltipla e
de pessoas com doena incurvel em estado avanado e em fase final de vida (Idem).
extremamente importante providenciar o bem-estar do familiar cuidador do idoso
dependente uma vez que a qualidade de vida do idoso dependente est re lacionada
com o bem-estar daqueles que tm a responsabilidade de satisfazer as suas
necessidades (Palma, 1999, p. 28). Brito (2002, p. 24) refora esta questo quando
refere que o bem-estar dos prestadores de cuidados se ir refletir, necessariamente, no
bem-estar dos que deles recebem cuidados. Assim sendo, a famlia e todo o seu
contexto envolvente tm de ser valorizados pois ainda no existem servios especficos
de apoio s famlias prestadoras de cuidados aos idosos. Algumas medidas e
equipamentos existentes constituem apenas, formas de apoio, na medida em que tentam
criar condies conducentes manuteno do idoso no seu seio familiar (Figueiredo e
Sousa, 2001).
Os recursos existentes para cuidar do idoso dependente, apesar de terem aumentado,
continuam a ser escassos, assumindo a famlia um papel fundamental na proteo dos
seus membros dependentes. Deste modo, os familiares cuidadores devem continuar a
ser encarados no s como recursos bsicos, quando olhamos as pessoas dependentes,
mas como foco de ateno para os enfermeiros. Face ao exposto, parece pertinente o
desenvolvimento de intervenes que dotem o familiar cuidador de conhecimentos e
capacidades para o exerccio do seu papel, no sentido de manter a integridade fsica e
emocional, para o seu bem-estar e manter a qualidade de cuidados que presta.
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4- O ENFERMEIRO ESPECIALISTA EM SADE COMUNITRIA:
RESPONSABILIDADE NO CUIDAR DA FAMLIA
A atual reforma dos CSP, iniciada em 2006 com a Misso dos Cuidados Sade
Primrios, apostou na implementao de uma nova filosofia de trabalho, centrada em
equipas motivadas com objetivos a cumprir e no apoio dado por sistemas de informao
adaptados sistematizao da informao dos cuidados prestados aos cidados e suas
famlias. Os respetivos ganhos em sade representam uma mais valia resultante desta
nova filosofia de cuidados de sade.
Esta reforma abrange a reorganizao local dos cuidados, com especial nfase nas
recentemente criadas Unidades de Sade Familiar (USF) e na reorganizao dos
Centros de Sade em Agrupamentos de Centros de Sade (ACES). A estrutura dos
ACES incluem alm dos rgos especficos dirigidos gesto e deciso, vrias
estruturas funcionais: USF, Unidade de Cuidados de Sade Personalizados (UCSP),
Unidade de Sade Pblica, UCC e Unidade de Recursos Assistenciais Partilhados.
Nos CSP as intervenes de enfermagem do prioridade proteo e promoo de
sade, atravs de intervenes multidisciplinares e inter setoriais, garantia da qualidade
e envolvimento do cidado, evidenciando o papel preponderante das USFs e das
UCSPs nos cuidados dirigidos ao indivduo/famlia.
No que se refere ao apoio ao familiar cuidador do idoso dependente, as intervenes
transversais ao contedo funcional de cada unidade variam, de forma a proporcionar
respostas adequadas s necessidades de sade detetadas.
USF e UCSP, compete a identificao do idoso em situao de dependncia e
vigilncia do seu estado de sade, com avaliao das necessidades respetivas, atravs
da realizao de visita domiciliria.
UCC, compete a prestao de cuidados de sade e apoio psicolgico e social, de
mbito domicilirio e comunitrio, ao idoso dependente e sua famlia. Esta Unidade
constituda por uma equipa multidisciplinar, coordenada por um enfermeiro, com o ttulo
de especialista, e atua na educao para a sade, na integrao em redes de apoio
famlia e na implementao de unidades mveis de interveno, necessitando de uma
boa articulao com os profissionais da USF e/ou da UCSP do respetivo Centro de
Sade. Esta articulao ser fundamental para a continuidade de cuidados ao cidado e
suas famlias, contextualizada na comunidade onde se inserem.
Com o aumento de famlias com elementos dependentes no seu domiclio surge a
necessidade dos profissionais de sade no se focarem s no doente, mas tambm na
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famlia. Cuidar no domiclio evidencia a importncia do envolvimento da famlia uma vez
que, como elo de ligao entre o enfermeiro e o utente, ela parceira no processo de
cuidar e, ao mesmo tempo, alvo dos cuidados.
No cuidar do idoso dependente, a famlia sofre vrias (re)adaptaes, () no a
mesma antes, durante e depois da doena (Marques, 2007, p. 58), enfrentando
situaes de crise e mesmo de rutura. A nica forma de aliviar esta sobrecarga pessoal e
familiar conhecer e intervir junto desta populao, evitando que surjam situaes de
descompensao que, alm de prejudiciais ao prprio, precipitam muitas vezes a
institucionalizao do idoso dependente, o que se pretende evitar. Neste sentido, h
necessidade dos profissionais de sade darem ateno a todos os seus membros. Torna-
se importante reconhecer as necessidades e dificuldades da famlia no cuidar no
domiclio para que os profissionais de sade, nomeadamente os enfermeiros, possam
estabelecer estratgias de interveno no seu processo de cuidar, criando condies que
ajudem a famlia e o idoso dependente na adaptao a estados de equilbrio, orientando
os seus cuidados no sentido da satisfao das necessidades fundamentais do doente e
famlia na comunidade em que esto inseridos.
Segundo a Ordem dos Enfermeiros (2014) fundamental a incluso da famlia como alvo
dos cuidados de Enfermagem, com o objetivo de a capacitar para o desenvolvimento de
competncias que permitam uma vivncia saudvel nos seus constantes processos de
mudana. A recente reconfigurao dos CSP orientada para a obteno de ganhos em
sade e melhoria da equidade e acessibilidade aos cuidados de sade, permite prestar
cuidados centrados na famlia. Novos desafios foram colocados aos enfermeiros dos
CSP pelo reconhecimento da sua contribuio na promoo da sade familiar e coletiva e
pelo seu papel de gestor e organizador de recursos potencializadores da famlia,
enquanto sistema transformativo. Estamos perante um modelo de cuidados de
proximidade emergindo o contexto para direcionar o foco da prtica dos enfermeiros para
a