A Função Da Religião Na Construção

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    Revista da Abordagem Gestltica:

    Phenomenological Studies

    ISSN: 1809-6867

    [email protected]

    Instituto de Treinamento e Pesquisa em

    Gestalt Terapia de Goinia

    Brasil

    Ecco, Clvis

    A Funo da Religio na Construo Social da Masculinidade

    Revista da Abordagem Gestltica: Phenomenological Studies, vol. XIV, nm. 1, junio, 2008, pp. 93-97

    Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goinia

    Goinia, Brasil

    Disponvel em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=357735510013

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    A Importncia da Religio na Formao Social daIdentidade de Gnero

    Creio no ser necessrio discutir a importncia dasidias religiosas na formao da masculinidade na es-trutura social e cultural do Ocidente. Somente a ttu-lo de exemplo, gostaria de mencionar que, em pesqui-sa1 realizada em 2006, para o Mestrado em Cinciasda Religio pela Universidade Catlica de Gois, naRegio Leste de Goinia, mesmo o tema no sendo a

    construo social da masculinidade entre 49 pessoasdo sexo masculino, 46 deles apontaram a doutrina dareligio catlica como estruturadora e mantenedora dasupremacia da identidade masculina. Afirmava-se quea imagem consagrada e alicerada em nossa tradio de uma figura masculina de Deus, e por isso, segundoos entrevistados, assumiam-se mais prximos e preferi-dos. No entanto, ser homem em to grande estima, doa eles a prerrogativa da supremacia na relao com ouniverso feminino.

    Um exemplo da supremacia da masculinidade quan-

    do nas relaes cotidianas apresentarem problemas, logo1 A pesquisa foi realizada na regio Leste de Goinia, tendo sido

    aprovada no CEP em 04 de maio de 2006, com o Cdigo 86854.

    evidenciado pela pesquisa que o masculino tem a legi-timidade moral de respaldar o conflito, devido maioridentificao com a divindade, j que Deus homem.

    Os entrevistados foram pessoas do sexo masculino queestavam vinculadas Igreja Catlica, devido ao fato deterem recebidos toda a formao bsica da doutrina can-nica da Instituio, onde o homem exerce a supremaciana conduo ministerial e doutrinal. Foi observada tam-bm a faixa etria acima de trinta anos de idade, solteiroou casado, cuja idade lhe proporciona uma leitura sobre

    a compreenso de si e da masculinidade.No seio de nossa cultura, as idias religiosas perma-necem com grande peso, e em todas as expresses reli-giosas oriundas da tradio crist h muita nfase na ma-nuteno da supremacia masculina. Tais consideraeslevaram-nos a elaborar a pergunta que nortear toda apesquisa, que : como se gesta e se mantm a supremaciasocial na construo da identidade de gnero masculinoe qual a sua caracterstica predominante?

    Para atingir este objetivo, procuraremos compreenderquais so os valores sociais e religiosos que propiciam ainstituio da supremacia hierrquica masculina, a par-

    tir da concepo cultural e da tradio que Deus um sermasculino, uma vez que falar de masculinidade pressupefalar de objetividade, responsabilidade, tradio, potncia,

    A FUNO DA RELIGIO NA CONSTRUOSOCIAL DA MASCULINIDADE

    The Role of Religion in Social Construction of Masculinity

    El Rol de la Religin en la Construccin Social de la Masculinidad

    CLVISECCO

    Resumo: Este artigo versa sobre a funo da religio na construo social da masculinidade. Visa compreender a influncia dasidias religiosas na construo social da identidade masculina. Para atingir este objetivo, procura-se compreender a influnciada religio na construo social da masculinidade e, tambm, compreender os motivos sociais e religiosos que propiciam a ins-tituio da supremacia hierrquica masculina.Palavras-chave: Gnero; Religio; Masculinidade; Identidade.

    Abstract: This article is about the role of religion in the social construction of masculinity. The main objective is to understandthe influence of religious ideas in the social construction of male identity. To achieve this goal, seeks to understand the influ-ence of religion in the social construction of masculinity and also understand the social and religious reasons that provide theinstitution of hierarchical male supremacy.Keywords: Gender; Religion; Masculinity; Identity.

    Resumen: Este artculo versa sobre el rol de la religin en la construccin social de la masculinidad. Visa comprender la in-Este artculo versa sobre el rol de la religin en la construccin social de la masculinidad. Visa comprender la in-fluencia de las ideas religiosas en la construccin social de la identidad masculina. Para lograr este objetivo, trata de compren-der la influencia de la religin en la construccin social de la masculinidad y tambin entender los motivos sociales y los moti-vos religiosos que favorecen la institucin jerrquica de la supremaca masculina.Palabras-clave: Gnero; Religin; Masculinidad; Identidad.

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    providncia, virilidade, palavras que significam poder nainter-relao social de gnero.

    Com toda certeza, sabemos que a problemtica levan-tada no ser esgotada neste artigo, mas, tentar-se- lan-la com intuito de que propicie uma maior reflexo e pro-duo do conhecimento para alm deste artigo.

    Parte-se da perspectiva de que mais instituies so-ciais contribuem para a construo social do masculinoem nossa realidade. Quando ns nascemos, o Estado responsvel por assegurar os direitos de cada indivduoe dos sujeitos sociais, claro, desde que o indivduo cum-pra com a sua funo, que o desempenho social espe-rado. Da mesma forma, a famlia, que uma instituioprofundamente importante para a manuteno do poder;e a Escola, que uma das primeiras instituies que tema responsabilidade de socializao, e o compromisso daassimilao dos direitos e deveres do cidado, simulta-neamente com a orientao. Logo, so inmeras a partir

    dos exemplos dados acima as instituies responsveispela construo social dos sujeitos, todas com caracters-ticas diferentes, porm com o mesmo objetivo: integrare socializar ao meio social em que as pessoas vivem. Anossa inteno observar como se d esta construo so-cial da supremacia da masculinidade na realidade social,a ponto de uma sociedade ser constituda de indivduoscom caractersticas fsicas, psicolgicas e espirituais par-ticulares, porm, com aes sociais esperadas, o quechamaria Bourdieu de habitus2.

    Entende-se que enquanto a realidade para o sujeitoreligioso desempenha papel ativo na elaborao e na ma-nuteno desseshabitus, ela existe, verdadeira, expe-riencial, e, algumas vezes, o tudo da vida do indivduo(Geertz, 1989), pois seu referencial primeiro de significa-do. Apresenta-se como experincia permanente e profun-da das mais diversas formas de manifestaes do sagrado.Paden (2001, p. 117), afirma que os deuses esto vivos,afinal dentro da psique. Afirmao essa que contrariaas afirmaes de Freud que considerava a religio comopura iluso e apia a teoria de Jung, que considera aexperincia religiosa como uma iluso muito real. Nocompreendemos a religio como algo ilusrio, desprezvel;consideramos a religio uma esfera importante e marcan-te na construo social do indivduo. Concordamos comGeertz (1989, p. 103) ao afirmar que:

    (...) os smbolos sagrados funcionam, para sintetizar o ethosde um povo o tom, o carter e a qualidade da sua vida,seu estilo e disposies morais e estticos e sua viso demundo o quadro que fazem do que so as coisas na suasimples atualidade, suas idias mais abrangentes sobre aordem.

    2 Sistema de disposies inconscientes que constituem o produto dainteriorizao das estruturas objetivas e que, enquanto lugar geom-

    trico dos determinismos objetivos e de uma determinao, do futuroobjetivo e das esperanas subjetivas, tende a produzir prticas e, poresta via, carrei ras objetivamente ajustadas s estruturas objetivas(Bourdieu, 1998, pp. 201-202).

    Ainda, segundo Geertz, os smbolos sagrados tm acapacidade de estabelecer padres morais, sociais e es-tticos, que so assumidos pelo indivduo enquanto rea-lidade. Este estabelecimento d a idia de realidade eter-na para o grupo, a tal ponto que essas realidades depoisde objetivadas, passam a fazer parte da cosmoviso dos

    sujeitos sociais. Esse processo estabelecido na dinmi-ca do tempo e na capacidade que a religio tem em esta-belecer suas realidades sobre o corpo dos sujeitos re-ligiosos Ele se d desde a chegada ao mundo. o queconsideramos como processo de socializao. De acordocom Geertz (1989, p. 136):

    A religio sociologicamente interessante no porque, comoo positivismo vulgar o colocaria, ela descreve a ordem social(e se o faz de forma no s muito oblqua, mas tambmmuito incompleta), mas porque ela a religio a modela, talcomo o fazem o ambiente, o poder poltico, a riqueza, a obri-

    gao jurdica, a afeio pessoal e um sentido de beleza.

    Na afirmao do referido autor, a religio tem a ca-pacidade, assim como o meio ambiente, de modelar ossujeitos, tamanha sua influncia social. Por isso, consi-deramos o campo simblico, desde os mecanismos maissutis de influncia religiosa na vida dos sujeitos, como umespao privilegiado para entender a construo social dasupremacia cultural da masculinidade. Entendemos quea constituio da subjetividade se d por meios comodiria Geertz modelatrios, ou seja, sob a influncia deuma gama de formas de religiosidade.

    Fuller (2001) j apresenta o processo de construo daidentidade nos diferentes momentos da vida e, que notermina com as primeiras assimilaes da infncia. umprocesso que prossegue durante toda a vida. Cada vez quea pessoa ingressa num novo cenrio institucional, incor-pora um novo processo de socializao secundria. ParaBourdieu (2005, p. 118), o mundo social funciona comoum mercado de bens simblicos dominado pela visomasculina. Ser, quando se trata de mulheres, ser per-cebido pelo olhar masculino, ou por um olhar marcadopelas categorias masculinas. Segue o autor afirmando que

    quando se elogia uma obra de mulher por ser feminina, essencialmente uma forma de evitar todas as proprieda-des e prticas que podem funcionar como sinais de viri-lidade. Dizer de uma mulher de poder que ela muitofeminina no mais que um modo particularmente sutilde negar-lhe qualquer direito a este atributo caracteristi-camente masculino que o poder.

    Nesse sentido, afirma tambm Fuller (2001) que, a di-ferena anatmica entre o corpo masculino e o corpo fe-minino tem servido como justificativa natural para a di-ferena social entre os gneros. Na anlise dessa perspec-tiva da cultura patriarcal, na qual vem se desenvolvendo,

    se percebe que toda verso da masculinidade que nocorresponda dominao seria equivalente a uma manei-ra precria de ser masculino, que pode ser submetido ao

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    domnio por aqueles que ostentam a qualidade plena dehomem (Fuller, 2001, p. 24).

    Apesar de ser uma caracterstica cultural-patriarcal deidentidade de gnero, h uma definio, a priori, das ca-ractersticas da masculinidade. Afirma ainda a autora queos homens no tm opo de escolher suas preferncias

    sexuais ou os papis que cabe desempenhar ao longo desuas vidas (Fuller, 2001, p. 25). O masculino assumiruma identidade de gnero instituda culturalmente, quesupe ocupar posies sociais determinadas, isto , terfilhos legtimos, ser heterossexual, ser provedor da casa.Quem no assume estes mandatos cair num vazio so-cial. Ou seja, carecer de uma identidade de gnero re-conhecida ou formar parte da galeria da masculinidademarginalizada e sofrer as sanes sociais corresponden-tes (Fuller, 2001, p. 25).

    Ainda na perspectiva de ocupar posies sociais de-terminadas, quem no assume cair no vazio para Fuller

    (2001). Confirma-se esta compreenso da postura mascu-lina, no fato ocorrido na madrugada do dia 04 de julhode 2008, quando um sargento do Exrcito foi detido pelaPolcia da mesma Instituio, aps ser entrevistado porum programa de TV, em So Paulo e, foi preso ao sair dosestdios da emissora. O motivo da priso foi que o Militarreafirmou a sua homossexualidade em entrevista. No fla-grante, alegou-se que o crime foi praticado pela deser-o, no por ele ter negado a sua heterossexualidade. Ouseja, o Militar estava pondo em dvida a identidade degnero reconhecida pela sociedade como ocupar posieslegitimas e determinadas (Fuller, 2001, p. 25).

    Seguindo a mesma perspectiva, percebe-se que huma cultura social da masculinidade com caractersti-cas prprias na construo da relao social da identida-de de gnero com aspectos bem globais. Compreende-sepela prpria identidade histrico-cultural, que o homemseja bem relacionado em sua vida social e estabilizado fi-nanceiramente. Compreende-se ainda que os homens se-jam poderosos, racionais, viris, no emotivos e agressivos(quando necessrio). Para Fuller (2001) preciso mostrarque a prpria masculinidade refm dessas exignciashistricas e culturais. E quem no consegue representara masculinidade nos parmetros esperados, cai no ostra-

    cismo e passa a ser considerado o outro, o excludo, ouento se usa o pretexto para se afirmar que o crime foipraticado pela desero.

    As Concepes da Divindade

    A masculinidade, compreendida nesta circunstncia,segundo Cechetto (2004), estaria em crise:

    A crise da masculinidade tem suas origens nas transforma-es globais econmicas e geopolticas que se abateram sobre

    os EUA, desde o incio do sculo XX. Tais reestruturaespromoveram uma reformulao nas definies tradicionaisda masculinidade (pp. 61-62).

    A construo da representao masculina trouxe umconflito que gerou a crise da masculinidade, ou seja, acrise consistia no confronto direto entre o que se espera-va que o homem fosse, e o que de fato ele era. No caso dasociedade brasileira, em um determinado momento, oshomens comearam a perder seu campo de trabalho, por

    falta de especializao, quando o mercado buscava mode obra especializada. Homens que at ento eram con-siderados ativos, com quarenta anos no servem maispara o mercado global. E como viver em uma sociedadeem que o homem no consegue se representar enquan-to homem?

    A necessidade de respostas s questes postas pelacrise de masculinidade nos leva a centrar nossa atenona anlise sobre a forma como a instituio da religio,assim como a instituio da famlia, contriburam parasignificar e justificar as representaes masculinas e aconstruo do tornar-se homem.

    Entendemos que a religio seria uma parceira da ins-tituio familiar e social na ao de legitimar a suprema-cia da masculinidade, e ao mesmo tempo, daria legitimi-dade por meio do discurso religioso. Segundo Geertz, asconstrues religiosas so penetrantes e duradouras.Histrias mticas do tipo Deus formou o homem do pda terra e tirou de sua costela a mulher. Ou, como essaleitura de So Paulo aos Efsios (5,23-25) que ouvamosno domingo, dia 31 de agosto de 2006: mulheres sejamsubmissas aos seus maridos como o senhor. Pois o mari-do a cabea da mulher, do mesmo modo que Cristo acabea da Igreja,do representao masculina a prima-zia sobre todas as coisas, principalmente sobre a mulher,criada em segundo lugar.

    No intuito de verificar como essa concepo de mas-culinidade faz-se presente no cotidiano das relaes so-ciais, apresentamos alguns dados da pesquisa de cam-po realizada em 2006, para o Mestrado em Cincias daReligio pela Universidade Catlica de Gois, na RegioLeste de Goinia.

    Foi elaborado um questionrio de apoio para o entre-vistador com oito questes sobre o tema em foco. Umadas perguntas se referia sobre o que ser um homem(pessoas do sexo masculino)? Mais de 90% dos entre-vistados afirmaram que o homem o chefe e a cabeada famlia.

    o homem o chefe e a cabea da famlia, por isso, na casaele deve ser respeitado (M.S.L., 48 anos).O homem o chefe da famlia e precisa ter responsabilidadede trabalhar de educar e de conduzir a famlia (B.R.M.,42 anos).O homem foi colocado por Deus no mundo para gerenciara famlia, para juntar-se com uma mulher e formar umafamlia. o homem que vai ser a pessoa responsvel porela (mulher) e criar os filhos. (C.C, 51 anos)

    Na mesma perspectiva, afirma outro entrevistadoque:

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    para ser pessoa do sexo masculino obrigao exercer umaliderana. s vezes at sobre as mulheres, mas em prol de-las, as elevando, jamais as diminuindo. Ento ser homem assumir obrigaes, alm das obrigaes femininas, seja nosentido de prover o lar ou no sentido material, assistenciale, sobretudo, espiritual. Ento o homem por apalpar sua

    vida pela razo em relao mulher, ele deve servir parao bem.

    Podemos entender essas afirmaes luz do mitocristo da queda humana, que afirma que logo aps aqueda do homem, no momento em que fora lanado forado paraso, Deus determina que o homem trabalhe parasustentar a instituio familiar, enquanto que a mulherservir para gerar vida. Apesar de a contemporaneidadeser portadora de novos mitos, como o da supremacia dacincia, essas idias religiosas no perderam sua influ-ncia cultural no processo de sacralizao das represen-

    taes sociais sobre a masculinidade.No podemos ignorar o fato de que a literatura de nos-sa lngua est intimamente ligada com a histria particu-lar de um Deus masculino (monotesmo).

    Essa concepo de que a divindade masculina sefaz presente nas falas das seguintes pessoas entrevista-das, quando perguntados se na compreenso deles Deus masculino ou feminino.

    Para mim Deus homem porque foi criado pelo pai. Foienviado para a terra para salvar a todos ns. Por isso, euacho que Deus homem (L.S.A., 67 anos).Deus! Pelo que tratado eu no sei se pelo fato da socie-dade ser machista d-nos a impresso que ele homem(L.J.B, 30 anos).Na minha opinio, Deus masculino. Porque eu acho queele todo poderoso e manda em tudo, por isso, eu acho queele homem (A.R.F., 60 anos).

    Podemos entender essas afirmaes a partir da reflexode Croatto (2001), quando afirma que a linguagem que fa-zemos das coisas sempre simblica e representativa. Nacomunicao com o transcendente, temos compreensesde Deus a partir de analogias que fazemos de pessoas. Naleitura da corporeidade e da sexualidade, o discernimento

    ocorre a partir do ethos3e da viso de mundo, que j foisistematizado e acumulado na identidade de gnero.

    Nossa linguagem sobre Deus sexuada, no trans-sexual (...).Por isso, o trgico est no predomnio absoluto, exagerado,do Deus masculino. Palavras femininas neste ou naqueleidioma, para falar de deus, de modo algum o tornam fe-minino. Pensa-se em Jav como sujeito sempre masculino(Croatto, 2001, p. 20).

    3 O ethosde um povo o tom, o carter e a qualidade de sua vida, seuestilo moral e esttico, e sua disposio a atitude subjacente em

    relao a ele mesmo e ao seu mundo que a vida reflete. A viso demundo que esse povo tem o quadro que elabora das coisas comoelas so na simples realidade, seu conceito da natureza, de si mesmo,da sociedade (Geertz, 1989, p. 92).

    De fato, a constituio da identidade de gnero umaconstruo de representaes sociais que se legitima a par-tir de concepes estabelecidas socialmente. As pessoaspensam e agem por meio de modelos construdos ao lon-go do tempo. Diz-nos Croatto (2001, p. 21) que falar dofeminino a partir de modelos e paradigmas pr-estabele-

    cidos culturalmente, refora ainda mais a legitimao dadivindade masculina e patriarcal.

    Consideraes finais

    Em nossa cultura religiosa do Centro-Oeste, se fazbem presente a idia da preferncia de Deus pelo mas-culino. muito comum a leitura tradicional do texto b-blico de Gnesis, 3, quando se trata da criao. Segundoessa leitura, a mulher precisou de parte do homem paraexistir. Por outro lado, a mesma no foi confivel. Ela

    levou o homem ao caminho do mal. A construo his-trica literria do paraso relacionou a mulher serpen-te. Todos os atributos negativos da serpente foram-lheatribudos. Ou seja, a mesma maldio que foi atri-buda serpente tambm atingiu a mulher. Essa mes-ma idia pode ser visualizada em diferentes espaosculturais, como o que ocorreu no filme de Mel Gibson,

    Paixo de Cristo, que reproduziu a cena do diabo. Nareferida cena, viu-se nada mais nada menos que umamulher como figurante. No entanto a mesma concepofoi percebida ao assistir as encenaes da Sexta-Feirada Paixo, na encenao da Parquia Divino EspritoSanto, em Goinia, em 2003. Na maior parte da encena-o, se imitava o filme. A reproduo da cena foi quasefiel ao filme e, novamente, viram-se mulheres figuran-do o diabo, sendo que a maioria dos figurantes na cenaeram homens.

    Portanto, por representao, a masculinidade sesente co-participante da criao. Os atributos da di-vindade, como a honra, a honestidade, a justeza, a res-ponsabilidade, so percebidos tambm nos dados ob-tidos na pesquisa de campo como valores inerentes enecessrios para a ordem social. Para evidenciar isso,conclumos com a afirmao da pesquisa que diz:ser

    homem uma coisa dada de Deus, eu sinto muito hon-rado por ser homem, eu trago isso do bero, eu achotimo ser homem e acho uma palavra bonita. pos-svel afirmar, a partir da anlise dos entrevistados daRegio Leste de Goinia, que h uma forte tendnciado homem nas relaes sociais, ser pensado a partir daherana Bblica cultural de Deus Pai todo poderoso. Aimagem de toda a masculinidade reside nos arqutiposde um Deus que homem e todo Poderoso, de quemderiva toda a paternidade, tanto no cu como na terra.A famlia e a paternidade reforam a hierarquia social

    da masculinidade.

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    Clvis Ecco- Graduado em Filosofia e Teologia, tem Especializao emPsicopedagogia e Ensino Religioso e Mestre em Cincias da Religiopela Universidade Catlica de Gois. Atua como Professor e autor dolivro Um retrato de homem contemporneo (Editora Descubra). E-mail:

    Recebido em 23.05.08Primeira Deciso Editorial em 06.08.08

    Aceito em 16.09.08