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WILLIAM CELSO DE REZENDE – 1051946 História A IGREJA CATÓLICA COMO COMUNIDADE DISTINTA DE CRISTÃOS, A HIERARQUIA EPISCOPAL E O PRIMADO DO BISPO DE ROMA NO CRISTIANISMO PRÉ-NICÊNICO Orientador: Prof. Ms. Reginaldo de Oliveira Pereira Centro Universitário Claretiano.

A Igreja Primitiva

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WILLIAM CELSO DE REZENDE – 1051946

História

A IGREJA CATÓLICA COMO COMUNIDADE DISTINTA DE CRISTÃOS, A HIERARQUIA EPISCOPAL E O PRIMADO DO

BISPO DE ROMA NO CRISTIANISMO PRÉ-NICÊNICO

Orientador: Prof. Ms. Reginaldo de Oliveira Pereira

Centro Universitário Claretiano.

SÃO PAULO

2012

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A IGREJA CATÓLICA COMO COMUNIDADE DISTINTA DE CRISTÃOS, A HIERARQUIA EPISCOPAL E O PRIMADO DO BISPO DE ROMA NO CRISTIANISMO PRÉ-NICÊNICO

Resumo – O presente trabalho pretende, através de uma extensa análise bibliográfica de textos contemporâneos ao período estudado e de especialistas posteriores, mostrar que os cristãos primitivos não se confundiam em uma massa homogênea de fiéis, mas que havia já nos dois primeiros séculos grupos heterogêneos de cristãos e que um desses grupos, que mais tarde será identificado com a Igreja Católica, possuía doutrinas e características bastante distintas dos demais, sendo as mais relevantes para o nosso artigo a manutenção de uma hierarquia episcopal, que teria sua razão de ser na origem apostólica, e o reconhecimento tácito ou explícito da autoridade suprema do bispo de Roma no comando da Igreja.

Palavras-chave: Igreja, cristãos, Roma, bispo, hierarquia.

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O ecumenismo tem sido uma das grandes temáticas da Igreja Católica neste período

posterior ao Concílio Vaticano II. Desde então, a Igreja tem procurado dialogar com as outras

comunidades cristãs, buscando aprofundar, através de um enriquecimento mútuo de tradições

distintas, os elementos que são comuns entre a Igreja romana e as outras denominações

cristãs. No entanto, o diálogo ecumênico não pode ser dissimulado e ignorar as profundas

diferenças que separam os cristãos entre si desde o cisma do Oriente, em 1054, e da revolução

protestante, já no século XVI. É preciso buscar no passado o momento exato as causas e

consequências do florescimento das divergências.

É verdade que a Sé romana tem buscado não apenas dialogar com as igrejas cristãs

separadas, mas também com as religiões não cristãs, o que se denomina de diálogo inter-

religioso, e até mesmo com os ateus, através da recente criação do "Átrio dos gentios".

Entretanto, o foco da Igreja tem sido o diálogo com as outras igrejas cristãs, a fim de que se

estabeleça aquela unidade desejada por Cristo e que, desde os primeiros séculos, tem sido

perturbada por causa da incompreensão dos homens sobre determinados pontos da Reveleção.

Os frutos do diálogo ecumênico podem ser claramente observados no retorno à

comunhão com Roma de grande número de anglicanos, luteranos e outros. 

O acúmulo de bens ao longo dos séculos por parte da Igreja Católica, a sua

proximidade com os poderes temporais e a rígida hierarquia eclesiástica sempre fizeram

levantar muitas vozes de protesto. Estas vozes, na verdade, objetivavam recuperar a pureza da

igreja primitiva, onde vigorava a pobreza absoluta, a total separação da igreja em relação ao

Estado e uma espécie de "comunismo religioso", onde todos os crentes eram chamados a fazer

parte do grande "sacerdócio universal dos fiéis", não havendo nenhuma estrutura hierárquica

para elevar uns, e submeter outros. 

Foi esta igreja primitiva que muitos reformadores buscavam; não a igreja primitiva

real, com seus problemas muito similares aos contemporâneos, mas uma igreja primitiva

idealizada que poderia servir como arma histórica para solucionar os problemas

contemporâneos pelos quais passava (passa, e passará) a cristandade. Se outrora podíamos

alegar que os pais da Reforma tomaram as posições que tomaram devido à falta de

informações precisas e o desconhecimento de documentos e fatos que apenas seriam

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revelados séculos mais tarde, atualmente seus herdeiros possuem meios privilegiados para

alcançar aquilo que no passado era inatingível. 

O resgate de documentos importantes dos três primeiros séculos de cristianismo

somado às descobertas arqueológicas vêm mostrar-nos que a igreja que sucedeu

imediatamente aos apóstolos não era uma comunidade perfeita. Pelo contrário, tinha seus

problemas e também ela teve de assistir dolorosamente a terríveis deserções. Também ela

sentia dúvidas, mesmo em relação à doutrina, e também ela teve de se reunir diversas vezes

para tratar de resolver os pontos polêmicos. 

Mas, afinal quem eram estes "cristãos primitivos" e como se organizavam? Mostrar

que a Igreja primitiva era uma igreja que buscava, antes de qualquer coisa, a unidade, que

estava sustentada por uma hierarquia tão rígida quanto a atual, e que atendia pelo nome de

"católica", de modo algum dificulta o diálogo; mas pode abrir caminhos importantes para o

diálogo ecumênico e para o possível retorno à unidade (que nunca na história do cristianismo

fora perfeita) daqueles que se dizem seguidores do Crucificado, pois a compreensão de que

todos os cristãos são oriundos de uma mesma tradição que remonta aos tempos apostólicos,

mas que por diversas razões se perdeu em algumas comunidades, devolverá a todos os

cristãos uma identidade comum, que será uma ferramenta valiosíssima para que os cristãos

possam, unidos, continuar contribuindo, como já têm feito por dois mil anos, para o

desenvolvimento humano e social.

Destarte, conforme pudemos observar, se há algo que serve de fermento para que haja

o surgimento de um número cada vez maior de comunidades cristãs, este é, sem dúvida, o

ideal de “igreja primitiva”. Desde o século dezesseis, os protestantes buscam fundamentar a

sua doutrina (seja ela luterana, calvinista, batista, pentecostal e outras) no cristianismo

praticado pelos apóstolos e pelos primeiros convertidos. É da negação da catolicidade, da

hierarquia e da primazia do bispo de Roma na igreja primitiva que as comunidades

reformadas vão cunhar novos nomes para si mesmas, bem como novas formas de governo

para se autogerirem.

Quando se fala de cristianismo primitivo, tem-se a sensação de se observar uma massa

homogênea que vivia, pregava e cria de uma mesma maneira. Uma massa que seria anônima e

não hierarquizada. Baseados nestes “pré-conceitos”, que não passam de meras idealizações

fantasiosas, muitos tentam empurrar o nascimento da Igreja Católica para um longínquo

século IV, tornando-a, não raras vezes, um mero instrumento de poder e controle criado pelo

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imperador Constantino. Aliás, a própria criação de uma igreja hierarquizada, aliada ao Estado

e supostamente amalgamando em sua doutrina elementos do paganismo, seria, na realidade,

uma forte deturpação do verdadeiro espírito cristão. Destarte, a noção de um episcopado

monárquico sustentado na sucessão apostólica e o primado do bispo de Roma seriam tão

somente elaborações tardias de algumas autoridades políticas e religiosas. Para a sustentação

desta tese, levanta-se a hipótese de que nos séculos que antecedem o Concílio de Nicéia,

ocorrido em 325, não se encontram elementos suficientemente claros para se comprovar: a

existência da “Igreja Católica” no período pré-nicênico; que o apóstolo Pedro esteve em

Roma; que ele exerceu alguma função de comando entre os primitivos cristãos; que havia na

igreja primitiva uma sucessão episcopal hierárquica; e, por fim, que o bispo de Roma gozava

de prerrogativas especiais em relação aos bispos de outras comunidades. Contudo, estes

posicionamentos não se sustentam ao serem confrontados com a pesquisa histórica recente,

com relatos, bíblicos ou não, legados pelos cristãos dos três primeiros séculos, e com as

descobertas arqueológicas.

É verdade que Constantino exerceu um papel importante para a história do

cristianismo, mas quando o imperador, no ano 313, concedeu liberdade de culto aos cristãos

através do Edito de Milão (FUNARI, 2007, p. 131), de modo algum criava ele uma religião

novel e menos ainda tratava de hierarquizar um cristianismo tricentenário, tornando-o, assim,

inflexível e extinguindo, por longos séculos, uma fictícia religião que guardava em si, como

traço original, uma espécie de comunismo em estado embrionário. Na verdade, os cristãos já

estavam organizados antes de Constantino, “com uma estrutura hierárquica bem definida”

(FUNARI, 2007, p. 131).

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Seria também interessante salientar que o cristianismo já estava bastante difundido

naquele mundo conhecido nos três primeiros séculos, conforme podemos ver no mapa a

seguir:

(ROPS, 1988, p. 318)

Esta vasta dispersão não nos deve criar a ilusão de que as comunidades cristãs

espalhadas pelo orbe agissem de maneira completamente independente umas em relação às

outras, pois se há uma hierarquia em cada comunidade, o que nos permite entrever uma

relativa autonomia, há também um forte senso de identidade que faz com que todos os

cristãos do mundo inteiro se sintam membros de um mesmo grupo de fiéis que possuem

essencialmente a mesma fé e estão regidos pelos mesmos princípios.

Cada uma [das comunidades] tem a sua cabeça, o seu clero, os seus

membros, a sua organização econômica, as suas obras sociais e até,

em grande medida, os seus costumes e a sua liturgia próprios. Mas

esta autonomia tem a seu lado um elemento que a equilibra e lhe dá o

seu verdadeiro sentido: acima das igrejas, há a Igreja. (ROPS, 1988,

p.227. Itálicos do autor)

A estrutura hierárquica de que nos fala Funari (2007, p. 131), e que pode ser deduzida

do texto bíblico de Atos 15, encontra sua razão de ser apenas sob os auspícios de uma

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sucessão apostólica. Afinal, se retrocedermos até o primeiro século, perceberemos que

homens que usufruíam de grande carisma diante das comunidades cristãs, como Paulo de

Tarso, buscavam basear a doutrina que ensinavam naquilo que era predicado dos que haviam

exaurido o seu conhecimento acerca da religião nascente da boca do próprio Jesus (cf. Gálatas

2, 7 – 9). Isso acontecia porque

(...) ela [a Igreja] precisava ter sua própria hierarquia, realizando e

supervisionando os ofícios religiosos, orientando quanto às questões

de dogma, executando obras sociais, combatendo o paganismo. A

concentração de todas essas atividades nas mãos de apenas alguns

cristãos era aceita com naturalidade pelo conjunto dos fiéis, já que tal

poder lhes fora atribuído pela própria Divindade: segundo o texto

bíblico, Cristo dera autoridade aos apóstolos para expelir demônios,

curar doenças e difundir sua doutrina. Os apóstolos, por sua vez,

transmitiram esse poder aos bispos, isto é, os anciãos da comunidade,

que fizeram o mesmo com seus auxiliares. (JÚNIOR, 2006, p.68)

Também o historiador eclesiástico Daniel-Rops afirma existir uma sólida hierarquia no

cristianismo primitivo que conta em seus quadros com diáconos e presbíteros, mas salienta

que

Acima de todos, dominando toda a comunidade e rodeado de uma

veneração imensa, o bispo exerce um poder muito grande. À medida

que a Igreja se desenvolve e se organiza, as dioceses decalcam a

largas traços o sistema imperial das “cidades”, e em cada sede fixa-se

uma dinastia episcopal cuja lista a comunidade guardará

piedosamente. Designado, segundo parece, de comum acordo por

todos os membros da Igreja local (...), o bispo é sagrado com uma

solenidade sem igual. Investido de um caráter que o coloca acima de

qualquer outro fiel, torna-se o verdadeiro líder, a encarnação do

princípio de autoridade, o pastor. (1988, p. 231. Itálico do autor)

Rops afirma ainda que já no fim do século II a organização eclesiástica está concluída

(1988, p. 233). Com estas citações, vemos que se pode, desde o primeiro século do

cristianismo, falar de hierarquia e de Igreja.

Mas seria possível que os cristãos destes primeiros séculos acrescentassem algum

adjetivo ao vago substantivo “igreja” sob o qual se escondiam inúmeras doutrinas tão

distantes entre si? Inácio de Antioquia, bispo da cidade de Antioquia que viveu entre o fim do

primeiro século e início do segundo, ao escrever uma carta aos cristãos de Esmirna, declara

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que: "Onde comparecer o Bispo, aí esteja a multidão, do mesmo modo que, onde estiver

Cristo Jesus, aí está a Igreja Católica" (ROBERTS e DONALDSON, 1867, p. 249). Vale

destacar, contudo, que a palavra católica, de origem grega, significa universal ou tendendo

para o todo. Os membros da primitiva comunidade cristã presente em várias partes do mundo

denominavam-se católicos, pois, apesar das diferenças contingentes, reconheciam que eram

depositários de uma fé essencialmente comum.

Portanto, do fato de Inácio escrever à comunidade de Esmirna utilizando a expressão

“Igreja Católica”, podemos deduzir três coisas: em primeiro lugar, pelo contexto não parece

que o autor esteja introduzindo um conceito novo, que soasse completamente estranho aos

destinatários, o que nos leva a crer que as comunidades cristãs já se viam como católicas, isto

é, espalhadas pelo mundo (universais), mas sustentadas por uma tradição comum, o que se

depreende do fato de um bispo de uma cidade escrever aos cristãos de outra para exortar e

aconselhar; em segundo lugar, o acréscimo do adjetivo “católico” à palavra “igreja” pode ser

visto como um esforço para diferenciar as comunidades daqueles que mantinham um

posicionamento doutrinário semelhante daquelas que destoavam, a olhos vistos, daquilo que

haviam ensinado os enviados de Cristo, como já acontecia, por exemplo, com os seguidores

de Simão Mago; e finalmente, o autor, ao traçar um paralelo entre o Bispo e Cristo, coloca

aquele em uma posição privilegiada em relação aos demais fiéis, os quais, conforme

constatado acima por Hilário Franco Júnior, viam esta superioridade de forma natural (2006,

p.68).

De fato as diversas igrejas cristãs não formavam um todo homogêneo, quando falamos

de cristianismo primitivo, devemos estar cientes da existência de diversas doutrinas e

comunidades que, embora pretendessem se passar por genuinamente cristãs, haviam diluído

elementos gnósticos e esotéricos dentro da doutrina propagada pelos primeiros cristãos. Daí

Clemente de Alexandria, em fins do século II, na obra Stromata, nomear diversas correntes

heréticas presentes em seu tempo e que queriam se passar por cristãs: marcionistas,

encratistas, valentinianos, docetistas e outros (ROBERTS e DONALDSON, 1869, pp. 487-

488). Clemente chama-as de “assembléias humanas”, contrapondo-as assim à origem divina

da Igreja Católica, e afirma que todas aquelas “assembléias humanas” são posteriores à Igreja.

(ROBERTS e DONALDSON, 1869, p. 486).

Contudo, poder-se-ia ainda sugerir que o cristianismo incipiente, embora pudesse ser

designado de católico (isto é, universal) e enfaixasse as igrejas locais dentro de uma

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hierarquia que culminava na supremacia da figura do bispo, não havia tido a pretensão de que

um dos bispos se destacasse dos demais no governo da igreja, ou seja, cada bispo seria

soberano em sua comunidade. No entanto, alguns testemunhos e acontecimentos dos

primeiros séculos de fé cristã tornam difícil a defesa destes argumentos.

Irineu de Lião, em sua obra Adversus haereses, composta por volta do ano 180, além

de diferenciar as comunidades que surgiam espontaneamente, ou seja, que não possuíam

qualquer ligação com os apóstolos, daquelas outras que haviam surgido graças ao

estabelecimento de bispos pelos próprios apóstolos, destaca a primazia da Igreja presente em

Roma sobre as demais comunidades católicas,

pois com esta Igreja, por causa de sua origem mais digna, toda igreja

tem que estar em concordância, isto é, todos os fiéis, de onde quer que

procedam; nela sempre foi conservada pelos fiéis de todo o orbe a

tradição que remonta aos apóstolos (apud DROBNER, 2008, p. 127)

Ademais, as comunidades surgidas em tempos posteriores aos dos apóstolos ou de

modo independente destes, viam na Igreja presente em Roma uma forma de se legitimarem.

Neste sentido, Romag afirma que elas “procuravam, antes de mais nada, a comunhão com

Roma, convencidos, de que esta comunhão equivalia à comunhão com a Igreja universal”

(1949, p. 99).

Mas, qual seria a origem desta supremacia em relação às outras comunidades? A

resposta seria: a presença dos apóstolos Pedro e Paulo e seus martírios ocorridos na Cidade

Eterna. Que Paulo esteve em Roma, parece ter sempre sido ponto pacífico, mas a presença do

apóstolo Pedro foi objeto de controvérsias. No entanto, para Bilhmeyer e Tuechle, “a negação

desta tese, ditada no passado por preconceitos confessionais ou críticos, foi reduzida ao

silêncio, com exceção de poucas vozes isoladas” (1963, p. 63). Este silêncio fora provocado

não apenas pelos documentos fornecidos pelo período estudado que atestam, implícita ou

explicitamente, a estadia e o martírio do Príncipe dos Apóstolos na Urbe, mas também por

descobertas arqueológicas recentes e pelas difíceis condições sob as quais se construiu a

primeira Basílica de São Pedro, no Vaticano, que apenas poderiam ser justificadas pela

presença do túmulo do pescador da Galiléia (LLORCA; GARCIA-VILLOSLADA;

MONTALBAN, 1955, p.72).

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O próprio Irineu de Lião, citado alhures, após destacar a primazia da Igreja de Roma,

traça a lista dos bispos de Roma até os seus dias, e, encabeçando a lista, encontra-se o

apóstolo Pedro (DROBNER, 2008, p. 127).

Alguns acontecimentos também parecem sugerir o primado da Igreja de Roma.

Quando os bispos de Roma Clemente, Vítor, Estevão e Dionísio, em circunstâncias diversas,

respectivamente, pedem paz à comunidade de Corinto, repreendem os fiéis da Ásia acerca da

Páscoa, proíbem a repetição da administração do batismo e pedem contas ao bispo de

Alexandria acerca de possíveis declarações heterodoxas, podemos vislumbrar alguns dos

elementos que nos permitem concluir que o bispo de Roma possuía um status extraordinário

em relação aos outros membros do episcopado (BIHLMEYER e TUECHLE, 1963, pp.115-

116).

No entanto, devemos estar cientes de que o primado da Igreja de Roma e,

conseqüentemente, de seu bispo, não se manifestou imediatamente, mas de modo “orgânico e

segundo as necessidades do tempo” (BIHLMEYER e TUECHLE, 1963, p.115), embora uma

doutrina do primado tenha começado a ser estabelecida a partir do século III (BIHLMEYER e

TUECHLE, 1963, p.117).

A compreensão dessas realidades da Igreja pré-nicênica, a sua catolicidade e a

primazia do bispo de Roma, nos permite traçar uma linha ininterrupta que conduz o

catolicismo dos tempos atuais até os tempos apostólicos. Entender as características do

cristianismo primitivo nos permite avaliar mais claramente o desenvolvimento do cristianismo

nos séculos posteriores, além de abrir espaços para um diálogo ecumênico verdadeiro, que

não esteja ofuscado por desconfianças recíprocas, e que possa conduzir a todos os cristãos a

realizarem aquele desejo de Jesus de que “todos sejam um” (João 17, 21).

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CONCLUSÃO

Nosso trabalho não buscou compreender os cristãos primitivos sob todos os aspectos,

visto que ainda haveria muito a se tratar, sobretudo no que se refere às divergências

doutrinárias entre os grupos de cristãos nos três primeiros séculos. Limitamo-nos a

compreender os primitivos cristãos no que se refere à catolicidade (ou universalidade) de

doutrina de uma comunidade que já se reconhecia como “católica”, ou seja, universal; à

estruturação hierárquica que, conforme demonstramos, já existia na igreja primitiva; e, por

fim, ao papel de proeminência desempenhado pelo bispo de Roma em relação aos cristãos do

mundo inteiro.

Para aquilo que este trabalho não abordou é fundamental que se recorra às fontes das

letras do cristianismo primitivo. É na Patrística (principalmente nos padres apostólicos, nos

apócrifos e nos apologistas) que encontraremos uma série de dados que nos permitirão

compreender melhor as realidades do cristianismo primitivo.

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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