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A Implantação da Usina Hidrelétrica Presidente Juscelino Kubistchek (Irapé) e seus impactos ambientais, sociais e culturais1.
DIAS, Rogério Oliveira2
Universidade Estadual de Montes Claros. UNIMONTES
PEREIRA, Maria Lucimara3
Universidade Estadual de Montes Claros. UNIMONTES
INTRODUÇÃO
O Brasil possui um alto volume de recursos hídricos, sendo um dos maiores
reservatórios de água potável do planeta. A grande quantidade de rios aliada à
configuração do relevo brasileiro tem propiciado a geração de energia elétrica a partir
da construção de diversas usinas hidrelétricas. Segundo dados da ANEEL- Agência
Nacional de Energia Elétrica, em março de 2013 as usinas hidrelétricas em operação
respondiam por 68,9% da matriz de energia elétrica brasileira, restando 29,4% para as
termelétricas, 1.6% para energia nuclear e a eólica correspondendo a 1,7%. Diante
destes dados podemos perceber a forte dependência do país em relação à energia gerada
pelas hidrelétricas tornando de extrema importância o SIN – Sistema Interligado
Nacional, pois visa sanar os déficits de energia em regiões que estão passando por
problemas, um bom exemplo pode ser a falta de recursos hídricos. O presente trabalho é
resultado de uma pesquisa bibliográfica acerca do tema e de uma análise de campo
realizada na Usina Presidente Juscelino Kubistchek (Irapé) que está situada entre os
municípios de Grão Mogol e Berilo, ambos em Minas Gerais. Os objetivos deste
trabalho foram analisar os aspectos históricos da construção da usina, o seu processo de
funcionamento onde foi observada in loco a geração de energia em todas as suas etapas.
Outro ponto bastante importante foi a análise do impacto ambiental e cultural gerado
pela construção da usina na região na qual está inserida.
___________________
¹Trabalho proveniente de análise de campo realizada na Usina Hidrelétrica Presidente Juscelino Kubistchek (Irapé); 2 Acadêmico do curso de Geografia, UNIMONTES, Departamento de Geociências, Montes Claros, Minas Gerais; 3Acadêmica bolsista do Subprojeto PIBID Geografia, UNIMONTES, Departamento de Geociências,
Montes Claros, Minas Gerais.
COMPOSIÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS HIDRELÉTRICAS
Para iniciarmos nosso trabalho iremos trazer aqui o conceito definido pela
Eletrobrás (Centrais Elétricas Brasileiras S.A) que define uma usina hidroelétrica como:
“um conjunto de obras e equipamentos cuja finalidade é a geração de energia elétrica,
através de aproveitamento do potencial hidráulico existente em um rio”. As usinas
podem se dá de forma natural onde o desnível se encontra concentrado em uma
cachoeira, esse potencial energético pode ser aproveitado sem a necessidade de
construção de grandes obras, pode também ser feito através de uma barragem onde os
desníveis são concentrados na altura da barragem ou pode ser feito também através do
desvio dos rios do seu curso natural onde serão criados pequenos desníveis ao longo do
desvio. A geração de energia através das hidroelétricas ocorre quando a água captada
pelo lago e conduzida até a casa de força onde passa pelas turbinas hidráulicas e depois
é novamente lançada ao leito do rio, através desse processo a energia mecânica é
transformada em energia elétrica. Posteriormente a energia gerada e levada até o
transformador onde terá sua tensão elevada para uma adequada condução onde passará
pelas linhas de transmissão e chegará até o consumidor final. A (figura-1) ilustra melhor
todas as etapas do processo de geração de energia até o seu consumidor final.
Figura 1. Fonte: Eletrobrás S.A.
É muito importante analisarmos os benefícios e os malefícios que podem
ocorrer através da construção destas usinas, essa geração de energia que tem como
100% de sua matéria prima a água e é considerada uma fonte limpa de energia, pois de
forma direta não polui o meio ambiente, porém pode trazer vários transtornos. Os
impactos causados pelas usinas hidrelétricas podem ser divididos em impactos sociais e
ambientais.
Se tratando das questões sociais o grande problema que podemos verificar é o
alagamento de grandes extensões de terras ou até mesmo de comunidades que antes
eram o local de moradia de uma série de famílias que se vêem obrigado a deixarem suas
terras e suas casas passando a viver em locais distintos dos anteriores, o sentimento de
lugar dessas populações é fortemente alterado, e muitas vezes se trata de populações
tradicionais. Já do ponto de vista ambiental, as áreas alagadas também se tornam um
grande problema, pois grandes áreas florestais ficaram submersas devastando a flora e
causando a morte de inúmeras espécies da fauna desse local. Na construção das
barragens é feito todo um estudo de impactos ambientais com intuito de criar medidas
mitigadoras para esses impactos, entretanto essas medidas não conseguem compensar
de fato os impactos negativos gerados pela construção.
USINA HIDRELÉTRICA JUSCELINO KUBITSCHEK (IRAPÉ)
A usina Hidrelétrica Presidente Juscelino Kubitschek (Irapé) está localizada no
Rio Jequitinhonha, entre os municípios de Berilo e Grão Mogol.
Em 1998, a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) venceu a licitação
promovida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e tornou responsável
pela construção e exploração da hidrelétrica por cerca de 30 anos. A construção foi
iniciada no ano de 2002, em abril de 2003 foi feito o desvio do Rio Jequitinhonha para
dois túneis com mais de 1,2 km de extensão, possibilitando a construção da barragem e
das demais obras, em junho de 2006 a usina foi concluída e inaugurada
Atualmente a usina tem uma potência instalada de 390 MW, é a barragem mais
alta do Brasil, sendo a segunda da América Latina e a terceira do mundo, possui 208
metros de altura. A barragem inundou cerca de 134000 ha atingindo sete municípios,
são eles: Grão Mogol, Berilo, Botumirim, Cristália, Turmalina, Leme do Prado e José
Gonçalves de Minas (Figura 02).
Figura 2-Municípios atingidos. Fonte: CEMIG
É importante ressaltar que a usina de Irapé possui “tecnologia de ponta” na
geração de energia, sendo uma das mais modernas do país, porém muitas vezes sua
geração de energia fica abaixo da nominal devido a usina está na região do Vale do
Jequitinhonha com clima semi-árido e com ocorrência de longas estiagens
comprometendo o nível de captação de água da represa.
A QUESTÃO CULTURAL DE IRAPÉ
A construção da Usina Hidrelétrica de Irapé no rio Jequitinhonha provocou o
deslocamento de aproximadamente 1.200 famílias de 40 comunidades de lavradores e
garimpeiros, totalizando aproximadamente cinco mil pessoas atingidas. Essas famílias
foram deslocadas de suas terras e reassentadas em diversos lugares até mesmo em
outros municípios, escolhendo locais de mais fácil adaptação, porém o sentimento de
pertencimento do antigo lugar permanece muito forte, principalmente para a população
que vivia as margens do rio.
O Movimento de Atingidos por Barragem (MAB) de Irapé foi um movimento
muito presente, com participação da população fazendo que as comunidades atingidas
pela construção da Usina de Irapé obtivessem sucesso em suas negociações com a
CEMIG. A Comissão formada por moradores atingidos estava sempre na frente para
tomar as iniciativas cabíveis, estava sempre preparada para discussão e defesa dos
interesses dos atingidos pela barragem, fazendo que a CEMIG tivesse respeito com a
organização das comunidades que souberam negociar, para que cumprisse todos os
termos do acordo. (FONSECA, 2010).
Com a MAB eles conseguiram muitos benefícios que talvez sozinhos não
conseguissem, como as comunidades de Peixe Cru e Novo Porto Corís que foram
realocados em agrovilas mantendo a mesma configuração anterior. Todas as casas
foram construídas com um mesmo padrão. Também foram escolhidos os locais
conhecidos como grotas-beira dos rios onde a terra é mais fértil para construir suas
casas e desenvolver a agricultura e as “chapadas” para criação de gado por ser menos
fértil.
Entretanto nem todas as famílias foram beneficiadas da mesma forma, algumas
comunidades foram transferidas para regiões de “chapada” onde a terra é de baixa
fertilidade e a água, recurso básico, é de difícil obtenção. As terras para plantar exigem
investimentos muito maiores que os disponíveis. O costume tradicional de plantio em
terras na beira do rio é incompatível com o trabalho agrícola exigido nas chapadas.
Provocando uma ruptura entre atividades que se organizam em áreas anteriormente
interligadas ao domínio mais amplo da casa e a nova realidade encontrada.
(BECHELANY. 2008). Para (RISCHBIETER, 2006) a cultura refere- se a tudo aquilo
que é produzido pelo homem e transmitido de geração para geração no processo de
adaptação e transformação da sociedade e dos indivíduos. Para compreender a dinâmica
cultural é fundamental conhecer o passado, as tradições e as transformações que
construíram a cultura de uma comunidade ou sociedade. Ao sair das comunidades de
origem a população perde vínculos de amizade entre os vizinhos perdendo também bens
materiais e imateriais, por esse motivo as comunidades atingidas pela barragem tiveram
perdas imensuráveis de sua cultura.
CENTRO DE REFERÊNCIA E MEMÓRIA DE IRAPÉ
Com o intuito de resgatar e manter a cultura das comunidades atingidas foi
construído o Centro de Referência e Memória de Irapé para guardar objetos (bens
materiais) pertencentes às comunidades atingidas como referência da cultura local. Os
objetos ficam expostos para os visitantes, pois a usina recebe visitantes do Brasil e de
várias partes do mundo. Entre os objetos expostos estão instrumentos que eram usados
nas folias de reis, fogão de lenha, forno de assar biscoito e fazer farinha, panelas de
barros, ferro a brasa, engenho, roda de fazer farinha, roda de fiar algodão, e vários
outros objetos que eram utilizados no dia-a-dia das comunidades tornando símbolo de
sua cultura (bens imateriais). Na figura-3 podemos observar alguns desses objetos.
Figura 3. Fonte: PEREIRA.
No centro de referência também são expostos trabalhos elaborados nas
comunidades durante Programa de Educação Ambiental, além de ossadas humanas de
antigos moradores que vivia as margens do rio Jequitinhonha. Outro ponto observado é
que parte da parede do Centro de Referências foi construída de bambu e adobe
deixando-os expostos para mostrar a arquitetura das casas que ali se encontravam como
nos mostra a figura-4.
Figura 4. Fonte: PEREIRA.
Na tentativa de manter a memória e cultura mais presente, foram feitas
maquetes das principais fazendas, igrejas e dos povoados que foram inundados.
A Fazenda Carqueja (figura-5) ficava situada às margens do rio Jequitinhonha,
no município de Botumirim, vizinha a ela ficavam as fazendas: Desejada, Boa Sorte e
Cotovelo, e na margem direita, ficava a fazenda Boa Vista e o Povoado Cori.
Figura 5. Fonte: PEREIRA.
A comunidade de Peixe Cru (figura-6) situava-se no município de Turmalina,
cerca de 70 km da sede, e possuía 23 famílias, era localizado em um vale ás margens do
rio Jequitinhonha. O povoado possuía características rurais e as fontes de renda eram
associadas à agricultura familiar, por esse motivo a comunidade foi realocada em
agrovilas.
Figura 6. Fonte: PEREIRA.
A capela do Senhor do Bom Jesus do Peixe Cru (figura-7) situava- se em
posição dominante, isolada sobre a elevação ao fundo do largo que constituía o antigo
povoado de Peixe Cru. Possuía um modelo arquitetônico, datado do século XIX, a
igreja foi desmontada e reconstruída na área do assentamento da nova comunidade.
Figura 7. Fonte: PEREIRA.
A Fazenda Desejada (figura-8) situava em uma elevação de onde tinha uma
vista abrangente do rio com praias de areia branca. Distante apenas 36 km da sede do
município de Botumirim, era de difícil acesso por o relevo ser muito íngreme. A
arquitetura da fazenda apresentava estruturas que indicavam diferentes épocas de
ocupação, a mais antiga provavelmente a princípios do século XIX.
Figura 8. Fonte: PEREIRA.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, através deste trabalho foi possível observar o processo de geração de
energia pelas hidrelétricas bem como entender a sua importância para desenvolvimento
do país. Contudo, essas usinas causam enormes impactos ambientais visto que para a
construção da mesma é necessário alagar grandes áreas atingindo populações ribeirinhas
e afetando a fauna e a flora da região. É importante enfatizar que apesar da empresa
responsável pela usina desenvolver projetos de produção de peixes para minimizar os
impactos da reprodução perdida na piracema afetada pela barragem, a educação
ambiental nas comunidades vizinhas, a construção do Centro de Referência e Memória
de Irapé, o assentamento das famílias atingidas, entre outros. Os impactos sociais,
ambientais e, sobretudo culturais são imensuráveis visto que a cultura das populações
tradicionais atingidas pela barragem sofreu um grande impacto devido a perca de bens
materiais e imateriais de grande valor sentimental.
REFERÊNCIAS:
BECHELANY, Fabiano Campelo. Da Terra ao Concreto: etnografia do espaço de
um reassentamento. Associação Brasileira de Antropologia Prêmio claudelévi-strauss
– modalidade b. 2008.
FONSECA, Vanessa. et al. Colóquio: Barragem de Irapé um balanço das
consequências sociais. III Encontro Latinoamericano Ciências Sociais e Barragens 30
de novembro a 03 de dezembro de 2010-Belém (PA).
NETO, Walfrido Martins; DIAS, Reinaldo. Patrimônio Cultural e Turismo: a Festa
do catopé em Montes Claros-MG.Qualit@Revista Eletrônica ISSN 1677 4280 Vol. 9.
No 2 (2010).
ROCHA,A.M. OLIVEIRA, G.H.G. FERNANDES, M.D. LEITE M.E. Sensoriamento
Remoto aplicado à análise da dinâmica da paisagem na represa de Irapé/MG.
Anais XVI. Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Foz do Iguaçu, PR,
Brasil, 13 a 18 de abril de 2013, INPE.
Disponível em: http:www.cemig.com.br/ Acesso em 18/11/2013
Disponível em: http:www.brasil.gov.br/ Acesso em 22/11/2013
Disponível em: http:www.eletrobras.com.br / Acesso em 24/11/2013
Disponível em: http:www.mabnacional.org.br/ Acesso em 25/11/2013