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A IMPORTÂNCIA DA DESCOBERTA DE LOBATO NA EXPLORAÇÃO PETROLÍFERA DO BRASIL
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A IMPORTNCIA DA DESCOBERTA DE LOBATO NA EXPLORAO
PETROLFERA DO BRASIL
Em 28/08/2010, por Acyr vila da Luz
Em recente entrevista, perguntaram-me qual era minha opinio sobre o significado e
repercusso da descoberta do petrleo em Lobato, para o desenvolvimento da indstria
petrolfera em nosso Pas.
Farei antes, um breve relato sobre os acontecimentos relacionados pergunta que me foi
dirigida.
Como sabido, Manuel Igncio Bastos, um curioso colecionador de amostras de minerais, em
suas andanas pelos arredores da cidade de Salvador, chegou certo dia em Plataforma, uma
estao da estrada de ferro Leste Brasileiro e em uma localidade prxima, Lobato, indagou do
pessoal da terra, de onde obtinham o "gs" usado para alimentar seus fifs, ou seja, suas
lamparinas.
Informaram-no que colhiam uma lama oleosa existente nas tocas dos caranguejos, nos
manguezais da regio.
Curioso em assunto de minrios, voltou vrias vezes quela localidade, decidindo, por fim,
abrir uma escavao de 3 a 4 metros de seo e uns 5 metros de profundidade, na qual viu
exsudar o lquido de que lhe haviam falado os moradores de Lobato.
Com sua prpria comprovao da presena de petrleo, Igncio Bastos procurou vrias
pessoas para se associarem a ele, com vista a explorar a "mina" que descobrira. Mas ningum
lhe dava crdito, consideravam-no um manaco.
Persistindo em sua ideia de explorar a "mina", resolveu procurar o Presidente da Bolsa de
Mercadorias-da Bahia, Oscar Cordeiro. Este tambm po lhe deu crdito. De tanto Manuel
Igncio insistir, Oscar Cordeiro acabou concordando em visitar a escavao, para, com seus
prprios olhos, verificar se era verdadeira a presena do leo relatado por Bastos.
Ao constatar que, de fato, o leo exsudava na cisterna, encheu-se de entusiasmo, tomando-se
um ferrenho "marqueteiro" da descoberta de petrleo em Lobato. Provocou, ento, uma
estrondosa campanha em toda mdia.
Em 1932, Manuel Igncio Bastos chegou a ir ao Rio de Janeiro para, pessoalmente, angariar
apoio do Presidente Getlio Vargas, ao seu projeto de explorar o petrleo de Lobato.
Enquanto isso, a campanha de divulgao da auspiciosa notcia foi se polemizando, acabando,
maldosamente a atingir o corpo tcnico oficial, que, cautelosamente se pronunciava a respeito
da real presena de petrleo, prxima escarpa gnissica, que bordeja, oeste, a cidade de
Salvador.
Dentro dessa turbulncia de opinies, em que os gelogos do Servio Geolgico do Brasil
eram duramente difamados, o DNPM, j ento criado, resolveu contratar o gelogo
especialista em pesquisa de petrleo, o lituano Victor Oppenheim, para que emitisse um
parecer decisivo sobre o petrleo de Lobato.
Tomo aqui a liberdade de transcrever o que o eminente gelogo pioneiro Pedro de Moura,
coloca em seu valioso livro - que me serve como fonte bibliogrfica - "EM BUSCA DO
PETRLEO BRASILEIRO" (1976): "O parecer de Oppenheim, dois ou trs meses aps j
contratado pelo DNP M, cantava outra cantiga: - Lobato, sob o ponto de vista da geologia de
petrleo positivamente desfavorvel presena de hidrocarbonetos. O petrleo de Lobato
seria elemento estranho sua formao geolgica, bem como o local onde encontrado".
Alm de rechaar toda a possibilidade geolgica, Oppenheim, aferrado sua interpretao,
deblaterava que algum tivesse injetado o leo na formao (terreno salgado, em linguagem
mineira) ou que a exsudao defluisse de antigos depsitos ali operados pela Cia. do Porto da
Bahia."Ele nunca se rendeu s provas de origem natural, posteriormente evidenciadas por
outros tcnicos, at que, em 1936, o Ministro Odilon Braga autorizou o DNPM a rescindir o
contrato do joo-teimoso."
Sobre o julgamento da atuao de Oppenheim no "imbrglio" do leo de Lobato, tive a
oportunidade, quando ainda seu aluno na Escola de Minas de Ouro Preto, de indagar ao
Professor Odorico de Albuquerque, que foi um dos componentes da comisso que julgou
Oppenheim, qual a sua opinio quanto idoneidade moral do to polmico gelogo lituano.
O Prof. Odorico. em seu jeito espontneo e, at mesmo ingnuo, respondeu-me: "Diante das
evidncias, atravs das anlises qumicas de que o leo era natural e no um derivado
industrial, perguntamos se ele mantinha sua opinio de que o leo descoberto era de uma
falsaexsudao e no autntica. O moo, com seu orgulho, manteve-se irredutvel em sua
interpretao; no quis se retratar".
Ento eu disse, levantando as minhas mos: - assim no, moo!, e proferi meu voto para que o
DNPM rescindisse o contrato. Voltando ao livro do gelogo Pedro de Moura, transcrevo a
concluso sinttica sobre a polmica questo de Lobato:
"Toda a histria do leo de Lobato oscila entre um buraquinho ridculo de aratu (espcie de
caranguejo) de onde, depois de muito escarafunchar, o curioso Manuel Igncio Bastos, em
1930, viu verter um lquido oleoso, com aparncia de petrleo - e o poo n 163, que o
DNPM perfurou no local, em 1938/39, para 'extirpar um tumor'. Esta expresso reflete a
deciso de A velino Igncio de Oliveira, conforme escreve Moura: "Eis que em 1937,
violentando o bom senso, Avelino Igncio de Oliveira, em exerccio na Diretoria-Geral do
DNPM, levanta a luva, arrisca o passo ao encontro de Cordeiro: "Vou tentar extirpar esse
tumor".
Passo agora a tratar do tema que me trouxe a escrever este artigo: a pergunta a mim feita
quanto ao significado da descoberta do leo de Lobato. A acirrada contenda originada pela
notcia da ocorrncia de petrleo, travada pelas vozes da rua e leigos metidos a entender de
explorao do petrleo, contra os tcnicos do Servio Geolgico/DNPM, at certo ponto tinha
sua razo de ser, embora, lamentavelmente. Tenha descambado para injustos ataques
honorabilidade daqueles que tinham a responsabilidade de decidir sobre a correta ao do
Governo.
Se no vejamos: A concepo reinante da Geologia do Recncavo Baiano, alicerada na
opinio de grandes gelogos de reputao internacional, como Derby e Branner, tinha um
verdadeiro "status" de dogma.
Segundo Derby, a espessura da coluna sedimentar era da ordem de apenas uns 200 metros.
Portanto uma "casquinha sedimentar", definitivamente incompatvel para geologia de
petrleo. Vem outro famoso gelogo, Branner, e concebe (em 1915) o arcabouo estrutural
como sendo um simples sinclinal, desenvolvido entre a falha de Salvador, a leste e, num
contato normal com o cristalino a 48 quilmetros a oeste da Capital baiana. Sinclinal este
imperturbado, sem nenhum acidente tectnico, a no ser a mencionada falha que o limita a
leste.
No bastassem essas condies geolgicas negativas presena depetrleo, a paleontologia,
atravs dos fsseis, relatava ambiente degua doce para os escassos sedimentos, o que naquela
poca, seconsiderava um ambiente imprprio gerao de petrleo.
Ainda por cima, agravando essas contrariedades geolgicas, estava a incmoda localizao
das ocorrncias, junto escarpa gnssica de Salvador.Era dose para leo!Mas apesar de tudo
isso, l estava o petrleo desafiador!
Confirmada sua natureza de hidrocarboneto natural pelas analises qumicas providenciadas
por gentes reconhecidamente idneas, como o qumico Fres de Abreu e o Professor Sousa
Carneiro, da Escola Politcnica da Bahia e, depois, com a descoberta efetiva pela deciso
corajosa de Avelino Igncio de Oliveira, atravs do poo n 163, locado pelo engenheiro
Eugnio Bourdot Dutra, do qual jorrou pela primeira vez na Bahia, petrleo em 21 de Janeiro
de 1939, concluiu-se que os conhecimentos geolgicos de ento, no correspondiam com a
realidade e que tinham de ser revistos, pois no se ajustavam com a intrigante presena do
leo em Lobato.
Aps a descoberta do poo n 163 pelo DNPM, os servios de explorao na regio de Lobato
passaram para a responsabilidade do Conselho Nacional do Petrleo, em setembro de 1939,
sendo seu primeiro Presidente o General Horta Barbosa, foram perfurados mais 17 poos, dos
quais 7 apresentaram uma produo sub-comercial e 10 secos.Com esse insucesso quanto
produo comercial dos poos, o CNP decidiu afastar-se de Lobato e executar um extenso
mapeamento com critrios tcnico-cientficos, visando obter um melhor conhecimento da
geologia, j que a descoberta de Lobato desacreditara completamente as concepes
geolgicas que vigoravam na ocasio em que Manuel Igncio Bastos abriu sua anunciadora
cisterna.
Foi este, a meu ver, a principal consequncia da presena, embora no econmica, do petrleo
em Lobato: Rompeu praticamente um tabu, da incompatibilidade da geologia da bacia
Sedimentar do Recncavo, como provncia petrolfera.
Foi essa constatao do petrleo em Lobato que levou o CNP a designar o experiente gelogo
Pedro de Moura, j com a aura de desbravador da geologia da Amaznia, no ano de 1940 para
proceder a um amplo mapeamento no Recncavo, para que as futuras locaes tivessem
suporte tcnico-cientfico.
Moura, tendo a colaborao efetiva do Diretor-Tcnico do CNP, o tambm experiente
gelogo Avelino Igncio de Oliveira, delineou os seus 5 grandes eixos de dobramentos: o que
passa por Aratu; o de Pasto de Fora; de D. Joo; o do vale do Sergi e o eixo de dobramento
Candeias/Itaparica, onde, em Candeias, sobre uma dobra anticlinal fez sua feliz locao, que
se tomou o primeiro poo comercialmente produtor do Brasil, descobrindo, em 1941, o
lendrio Campo de Candeias, que at hoje, aps 69 anos de descoberto, ainda est
produzindo!
Alm da determinao desses 5 eixos, Moura mapeou as ilhas da baa de Todos os Santos,
sendo o autor da designao "Formao das Ilhas" - e limitou o "graben" do Recncavo, com
o mapeamento da falha de Maragogipe, a 48 quilmetros a oeste da falha de Salvador.
Mas como toda cincia, a geologia no esttica. Ela evoluiu, no s pelos seus erros, como
pela aquisio de novos conhecimentos e pelos avanos tecnolgicos.
Assim a justificativa da locao do pioneiro de Candeias, que fora estar sobre uma dobra
anticlinal, com o desenvolvimento das perfuraes, viu-se que a valiosa acumulao de
petrleo estava em jazida de natureza estratigrfica e no estrutural.
Com o passar do tempo, nem mesmo os 5 eixos de dobramentos anteriormente mapeados por
Moura e A velino, se mantiveram.
O gelogo Ben Barnes, contratado pelo CNP, traz em 1949, para o Recncavo, a concepo
de que se trata de uma Bacia Sedimentar do estilo tectnico de "Rift-Valley" e no de
dobramento.
Os supostos tais eixos, tem relacionamento com faixas de falhamentos -normais e no resultado de esforos de compresso. A prpria Estratigrafia foi modificada com a introduo
de novos conceitos. O conceito dual na Estratigrafia, distinguindo "unidade de rocha" de
"unidade de rocha/tempo" veio aclarar muitos problemas, principalmente os das sees
geolgicas das regies de Restinga-Ilha da Mar e do Alto Regional Mata-Cat.
At o incrvel aparecimento de "dipiros" de folhelhos veio nos surpreender, como o da
fazenda Cinzento, onde a formao Candeias, aflora rodeada, anormalmente, pela formao
So Sebastio.
E a atual carta Estratigrfica, da Bacia do Recncavo, que tenho em mos, quo diferente da
"Srie Bahia" de meus tempos de gelogo de campo, com a introduo dos conceitos de
rocha, tempo, ambiente e evoluo tectnica.
E a "casquinha" de 200 metros do grande gelogo Derby, espessou-separa mais de 6.000
metros, nas profundezas de Camaari, onde nos primrdios da geofsica, por mtodos
magnticos, em 1936/37 se estimava estar o embasamento cerca de 1500 metros.
Para mim, a grande importncia da descoberta de Lobato foi ter sido a ponta do fio da meada
embaraada da explorao de uma provncia petrolfera na Bahia.
Acyr vila da Luz gelogo, foi Diretor Geral do DNPM - Departamento Nacional de
Produo Mineral e chefe de produo e explorao da Petrobrs, na Bahia.
Florianpolis, 13/06/2010
Fonte: Jornal da AEPET de 27/08/10