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A INCLUSÃO NO MERCADO DE TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA COMO MEIO DE INSERÇAO SÓCIOECONÔMICA E SEUS REFLEXOS PARA O DESENVOLVIMENTO SOCIAL
LABOR MARKET INCLUSION FOR PERSON WITH DISABILITY AS A WAY FOR
SOCIOECONOMIC INSERTION AND ITS IMPLICATIONS FOR SOCIAL
DEVELOPMENT
CARVALHO, Anivaldo José de.1
Eixo Temático: - Desenvolvimento humano, relações de trabalho e políticas públicas.
RESUMO
Trata-se o presente estudo de uma revisão bibliográfica acerca da importância do
trabalho como meio de inserção social e valorização pessoal do portador de deficiência. O
trabalho tem uma função muito importante na vida do ser humano. Sentir-se útil e perceber
que aquilo a que nos dedicamos, na vida, tem importância e é extremamente relevante para o
homem enquanto ser social. Isso não seria diferente para a pessoa com deficiência. A falta de
ocupação não é, simplesmente, uma questão econômica. Não ter um cargo ou um trabalho
representa, em boa parte dos casos, um sinal de fracasso para a pessoa com necessidade
especial. As cobranças da família ou das demais pessoas do convívio social podem ser
extremamente danosas, causando reflexos psicológicos, além dos econômicos que são tão
importantes para esse segmento da sociedade, normalmente inserido em uma condição de
vulnerabilidade social. A possibilidade de um trabalho formal, além de interferir
positivamente na vida da pessoa com deficiência, gera reflexos econômicos benéficos a essas
pessoas e possibilita a melhoria sua condição social. Percebe-se, então, que o incentivo do
Poder Público com políticas públicas de geração de emprego e renda para os portadores de
deficiência tem a possiblidade de interferir de forma decisiva no desenvolvimento social desse
grupo de pessoas e, por consequência, no desenvolvimento econômico do país.
Palavras-Chave: Pessoas com deficiência; Trabalho; Desenvolvimento Social; Poder
Público.
ABSTRACT
This study consists in a bibliographical review about the importance of the work as a
way for social inclusion and personal valuation of the person with disabilities. The work has a 1 Universidade Estadual Paulista – Unesp - Franca. Mestrando em Planejamento e Análise de Políticas Públicas.
E-mail: [email protected]
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very important function in the human being´s life. Feel useful and realize that what we
dedicate for, in life, has an importance and it is extremely relevant for human being as a social
being. This would not be different for person with disabilities. The lack of occupation is not,
simply, an economic issue. Do not have a position or a job represents, in the most part of the
cases, a sign of failure for the person with special needs. The demands of the family or other
people from social coexistence could be extremely damaging, causing psychological
reactions, beyond economical reflections that are so important for this segment of society,
normally inserted in a social vulnerability condition. The opportunity of a formal labor,
besides positively interfere in the person´s with disabilities life, generates beneficial economic
reactions to those people, it enables the improvement of their social condition. It is noticed,
then, that the Public Power´s encouragement with the generation of the employment´s and
income´s public policies to people with special needs can possibly decisively interfere in the
social development of this group of people and, therefore, in the economic development of the
country.
Key words: People with disabilities; Labor; Social Development; Public Power
1. INTRODUÇÃO
O trabalho é um valioso meio de inserção social. Obviamente, é possível que
desempenhemos uma atividade de forma solitária. Contudo, tais formas de atuação são
notadamente muito raras. O trabalho desempenha um meio de o homem se relacionar. Ele,
obviamente, também tem uma função econômica vital. Sem a remuneração decorrente dele,
não há como pensarmos uma vida “normal”. O raciocínio do homem capitalista indica que sua
vida deve ser direcionada para a busca incessante de dinheiro e, isso, faz com que o trabalho
seja visto, em boa parte das vezes, como um meio de busca de recursos, deixando de lado a
questão da satisfação pessoal que se tinha em um momento histórico anterior. “[ ...]. O desmantelado “modo tradicional de vida” de que o trabalho era parte antes de sua emancipação estava para ser substituído por uma nova ordem; desta vez, porém, uma ordem pré-projetada, uma ordem “construída”, não mais o sedimento do vagar sem objetivo do destino e dos azares da história, mas produto de pensamento e ações racionais. Ao descobrir que o trabalho era a fonte da riqueza, a razão tinha que buscar, utilizar e explorar essa fonte de modo mais eficiente que nunca”(BAUMAN, 2001, p. 164).
O autor traz a questão do “vagar sem objetivo”. A referência é que, em algum
momento, o trabalho teve um viés lúdico, de satisfação pessoal ou, mesmo, de talento.
Obviamente, o trabalho foi, também, condição para que o homem se alimentasse. O labor na
agricultura e na pecuária rudimentares foi o que garantiu a sobrevivência humana por muitos
séculos. Sem o desempenho de suas tarefas diárias, não haveria como o homem se manter
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vivo. Porém, não podemos mais pensar em um sistema laboral no qual a remuneração não seja
a matriz principal. Por melhores que sejam as condições de trabalho, as relações interpessoais
do emprego ou mesmo a satisfação com a tarefa que se faz, se o salário for baixo ou não
condizente com a função desempenhada, acaba-se por se buscar outras oportunidades. Então,
a remuneração do trabalho é condição essencial na definição do emprego escolhido. Contudo,
é possível enxergar um modelo de trabalho mais flexível hoje em dia. Não se pode pensar em
um trabalho apenas nos moldes fordistas. O momento atual, no qual a tecnologia detém uma
boa parcela da força laboral, oferece condições de alargar as relações de emprego e a
segurança da carteira assinada, o seguro-desemprego ou qualquer outro direito previsto na
Consolidação das Leis Trabalhistas passam a ter um peso menor. “Nesse sentido, fatores como segurança do emprego e compromisso com a empresa, mantinham as pessoas em seus lugares. Os trabalhadores hoje tendem a não ficarem presos ao lugar. Ocorre uma apreensão cotidiana com emprego, essa apreensão aumenta quando as experiências passadas parecem não servir de guia para o presente” (MENDES, 2001, p. 3).
O autor traz a questão da possibilidade de que as relações de trabalho possam se dar de
maneira mais relativizada. Se por um lado os trabalhadores perdem parte de seus direitos há
tempos garantidos, por outro, possibilita que se tenha uma melhor escolha de horários, possa
ser contratado por mais de um empregador ou, mesmo, possa decidir quando não trabalhar.
Isso é ainda mais emblemático quando pensamos na nossa atual conjuntura legal que
possibilita a terceirização da mão de obra para as empresas e desconfigura o modelo fabril de
trabalho. A economia e a sociedade, com essa nova realidade laboral, passam a cobrar do
individuo uma maior qualificação e inovação de sua força de trabalho. Os cargos e tarefas são
voláteis e dependem da demanda que se tem por eles em determinado tempo e espaço. Uma
empresa americana, por questões de custos, pode entender ser mais barato contratar serviços
de call centers indianos do que contratar trabalhadores americanos. Não se deve pensar em
estabilidade trabalhista da forma como a víamos antes. O trabalho estará em determinado
local enquanto as condições, ali, forem favoráveis. [...] que impuseram, como regra, a abertura total das fronteiras ao comércio mundial, a competitividade deixada ao sabor do mercado etc., envolvendo tudo isso na conhecida retórica neoliberal, que prometia um mundo de oportunidades para os mais competentes e uma “nova economia” capaz de assegurar o bem-estar, senão de todos, pelo menos daqueles – países, economias e indivíduos – que decidissem guiar-se pela aposta nas qualificações, na inovação e na competição (ESTANQUE, 2009, p.313).
Esta nova realidade das relações de trabalho possibilita a inserção no mercado de um
recorte social que se apresentava à margem da discussão quando se pensava em renda e
emprego: as pessoas com deficiência. As pessoas que se encontram nessa condição precisam,
em boa parte das vezes, que o trabalho tenha uma maior flexibilização já que as dificuldades
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por elas enfrentadas podem impedir as relações trabalhistas ditas normais. Horários mais
condizentes com as condições individuais são importantes quando pensamos em pessoas que
podem enfrentar dificuldades de transporte, acessibilidade, mobilidade urbana ou, mesmo, de
condições estruturais. Porém, é necessário reconhecer que há, atualmente, dispositivos legais
e políticas públicas que visam uma maior integração da pessoa com deficiência ao mercado de
trabalho. Essas ações possibilitam que estas pessoas possam conseguir se manter,
financeiramente falando, prover suas famílias, consumir e, gerando, inclusive, uma melhora
na autoestima, por vezes baixa devido às condições econômicas desfavoráveis às quais elas
estão submetidas. Este trabalho tem essa intenção: discutir a inserção da pessoa com
deficiência no mercado de trabalho e que reflexos isso pode gerar para esse segmento social e
para o desenvolvimento social do país, através de determinadas ações governamentais.
2. DESENVOLVIMENTO
Nas primeiras décadas do século XXI, a questão da deficiência física era tratada com
uma abordagem com viés assistencialista. A ação da sociedade, e o que mais no interessa,
nesse caso, a da Administração Pública se dava muito mais em caráter de subsistência do que
em oferecer condições de inclusão que possibilitassem à pessoa com deficiência ser integrada
à sociedade de forma plena. “As pessoas com deficiência foram por muitos anos tratadas com desprezo e desrespeito quanto aos seus direitos, o que as motivou a se organizarem em grupos e promoverem um forte movimento de participação política no âmbito do processo de redemocratização do Brasil. Esse espaço foi sendo construído com muita luta, embates políticos, mas também, com conquistas importantes, embora, em muitos momentos sob a omissão do governo e com total invisibilidade por parte da sociedade”(LANNA JÚNIOR E LOUREIRO MAIOR,2010, p.11).
Os autores falam da situação do deficiente sob o enfoque da invisibilidade. Quando se
usa esse termo, a referência é no sentido de que a pessoa que se encontra nessa condição foi
sujeita, até bem pouco tempo, a um verdadeiro esquecimento do Poder Público e, eram raras
as políticas públicas que contemplavam direitos efetivos para esse recorte social. As que
existiam possuíam um caráter mais local e sem a necessária continuidade que se espera de
programas desse tipo. Assim, o Poder Público agiu e expediu normas que visavam garantir o
princípio constitucional da isonomia: homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações.
Entretanto, a garantia de igualdade não seria suficiente, se levarmos em conta a
vulnerabilidade em que sempre esteve imerso o segmento social da pessoa com deficiência.
Desse modo, era necessário de, além de garantir a igualdade na lei, buscar-se a oferecer
condições para que todos alcançassem as mais diversas garantias constitucionais. Oferecer
possibilidades diferenciadas às pessoas com deficiência não é dar benefício. É concordar que
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as cidades não possuem condições de acessibilidade capazes de garantir que as pessoas com
deficiência consigam ir e vir. É assumir que não há transportes públicos de qualidade para que
a pessoa nessa condição consiga estudar todos os dias. É aceitar que os prédios públicos (ou
privados de acesso coletivo) não estão aptos a receber pessoas com essa característica sem
necessitar de ajuda de terceiros. Enfim, ao se reconhecer tudo isso, é ser justo na melhor
concepção da palavra. O mercado da sociedade globalizada exige profissionais capacitados, hábeis, criativos e flexíveis o que, por outro lado, gera um batalhão de excluídos. Considerando que o mundo capitalista exige um exército de reserva de mão-de-obra, aqueles que não possuem os requisitos solicitados são marginalizados. Nesse aspecto, os portadores de necessidades especiais têm mais dificuldade de entrar e permanecer no mercado do que outros trabalhadores, não pela questão da competência, mas pelo preconceito e falta de oportunidades (DARCANCHY, 2006, p.3).
Nas importantes palavras da autora conseguimos perceber que, caso a contratação da
pessoa com deficiência dependesse apenas da boa vontade dos empregadores, as admissões de
pessoas nessa situação dificilmente aconteceriam. Muito mais simples seria contratar pessoas
“normais” e que não trouxessem para a empresa tantos problemas. É nesse sentido que
“nascem” as cotas para pessoas com deficiência. Elas surgiram para garantir a entrada do
profissional com deficiência tanto no setor privado quanto no público, e, principalmente no
primeiro, veio a aumentar, consideravelmente, a participação destas pessoas no mercado de
trabalho. Os dispositivos legais que trouxeram esta melhoria não foram publicados, senão,
com muita luta deste grupo social, seja individualmente, seja por intermédio de associações
que defendem a causa. A Lei 8.213/91 traz a obrigação legal de as empresas contratarem
pessoas com deficiência. Indica a norma que empresas com mais de cem empregados devem
contratar dois por cento (2%) de pessoas com deficiência e, subindo em uma escala, contratar
cinco por cento quando tiverem acima de mil funcionários. Entretanto, ela não traz nenhuma
vinculação de que cargos devem ser oferecidos a este grupo. O que acaba ocorrendo é que o
trabalho destinado aos portadores de deficiência é apenas aquele de caráter mais operacional,
na maioria das vezes, na parte produtiva da empresa. “A presença do preconceito e a discriminação são fatores recorrentes para esses trabalhadores. Através das visitas aos locais de trabalho e das entrevistas realizadas, foi possível perceber que, mesmo tendo avanços com relação à contratação de pessoas com deficiência física, como a “lei de cotas” e a obrigatoriedade das empresas de contratarem um percentual de pessoas com alguma deficiência, ainda é reservado a essa força de trabalho aquele emprego precário, repetitivo, mecanizado e os salários ficam entorno de até um salário mínimo e meio” (LARA e ALTHAUS, 2010, p.5).
Percebe-se, assim, que no que se refere à questão das cotas temos duas situações que
se apresentam: a primeira é a extrema relevância da lei no sentido de se obrigar as empresas a
contratarem as pessoas com essas condições. Pode-se dizer, com uma chance alta de acerto,
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que eram raras as contratações de pessoas com deficiência enquanto não havia a obrigação
legal. Portanto, essa “boa-vontade” do empresariado se fez presente, basicamente, ao
expediente da lei. Obviamente, o mundo mudou desde a implantação da lei até hoje. As
pessoas são mais receptivas à causa da pessoa com deficiência. Só que isso não impede de se
separar a questão capitalista da humanitária quando se trata de ganho econômico. De toda
forma, a Lei de cotas para cargos em empresas privadas conseguiu melhorar a participação da
pessoa com deficiência no mercado de trabalho. O outro ponto é o fato de serem direcionadas
às pessoas com deficiência as funções de caráter operacional (manejo de máquinas, tarefas de
cunho repetitivo, etc.). Encontra-se aí, certo preconceito já que são raros os casos de pessoas
com deficiência em cargos diretivos ou naqueles em que o intelecto prevaleça. Mesmo assim,
é possível dizer que essa norma possibilitou que as pessoas portadoras de deficiência
conseguissem a necessária entrada no mercado de trabalho. Até por que as promoções
internas ou as capacitações profissionais tem a prerrogativa de melhorar a condição laboral
desse trabalhador.
No que tange ao serviço público, este, também, foi objeto de regulamentação no
sentido de se fazer valer o principio da isonomia. A questão da reserva de vagas para
portadores de necessidades especiais é tratada no artigo 37 da Constituição Federal de 1988:
Art. 37, inciso VIII – “a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as
pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão”. Portanto, a Carta
Magna apresentou a obrigatoriedade de reserva de vagas para portadores de necessidades
especiais em concursos públicos de qualquer esfera governamental e, deu competência à lei
para regulamentar a situação em termos específicos. Estes aspectos, tanto na seara privada
quanto na pública, servem para ilustrar que a Lei de cotas do mercado de trabalho para
pessoas com deficiência conseguiu alterar a realidade das pessoas contempladas com estas
novas vagas. São pessoas que, dificilmente, se dependesse apenas do seu esforço ou
competência teriam oportunidades de acesso ao trabalho. A Lei de cotas conseguiu, em parte,
corrigir esse desvio. Com isto, trouxe as pessoas com deficiência que ingressaram no mercado
de trabalho a uma condição mais favorável. Possibilitou que elas pudessem melhorar sua
condição social e tivesse acesso ao mercado de consumo, os quais, em situação normal,
estariam à margem.
O trabalho tem um importante papel integrativo. A inserção no mercado de trabalho
consegue fazer com que as pessoas com deficiência possam se sentir parte do sistema social
como um todo. Quando pensamos nos benefícios trazidos pelo trabalho temos: maior
autonomia, possibilidade de acesso a serviços de melhor qualidade (educação, saúde, lazer,
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etc.), menor dependência de benefícios assistenciais e uma participação mais efetiva em
relação ao consumo. O trabalho, o desempenho de uma função e o fato de ser sentir útil geram
a concepção da ideia de valor que cada um de nós traz consigo mesmo. “Para a maioria de nós, o trabalho ocupa um espaço maior da vida do que qualquer outro tipo de atividade. É comum associarmos a noção de trabalho a uma atividade maçante – a um conjunto de tarefas que queremos minimizar e do qual se possível, procuramos escapar. No entanto, há mais implicações no trabalho do que nessa atividade maçante; não fosse assim, as pessoas não se sentiriam tão perdidas ao ficarem desempregadas. Como você se sentiria se imaginasse que nunca mais arranjaria um emprego? Nas sociedades modernas, ter um emprego é importante para manter a autoestima. Mesmo nos lugares em que as condições de trabalho são relativamente desagradáveis, as tarefas monótonas, o trabalho tende a representar um elemento estruturador na composição psicológica das pessoas e no ciclo de suas atividades diárias” (GIDDENS, 2005, p.305).
O trabalho, independentemente da função que se desempenhe, consegue fazer com a
pessoa nessa condição possa se planejar e almejar uma melhoria continuada de sua qualidade
de vida. É um elemento que compõe a estrutura diária de ações de um ser humano. Apenas
por esse motivo já conseguimos identificar a sua importância para a vida de cada indivíduo.
Só que não é apenas nesse enfoque que o trabalho tem importância. Ele, como gerador de
recursos para o trabalhador, possibilita um reflexo na sua capacidade de consumo, na
movimentação da economia (local, nacional ou global) e gera, por consequência, ganhos no
que se refere ao desenvolvimento social do país. Assim, podemos dizer que a inserção
profissional da pessoa com deficiência representa uma melhoria no nível nacional de
empregos. Podemos, a partir desse ângulo de análise, entender que a Lei de Cotas pode
representar, em que se pese o seu reflexo ainda limitado, uma política de fomento ao
desenvolvimento econômico do país. São mais pessoas formalmente trabalhando, gerando
tributos, recebendo salários, consumindo e sendo parte integrante do mercado. Sob o aspecto
econômico, temos, então, a questão de remuneração e inserção no mercado de consumo.
Contudo, onde está a melhoria no que se refere ao desenvolvimento social? Que tipo de ganho
gera a empregabilidade da pessoa com deficiência? Não é uma análise simplista de se fazer.
Há que se entender o contexto da realidade atual. O trabalho tem uma natureza, conforme já
foi observado nesse texto, de melhoria na condição financeira do segmento social em análise.
Com ele, passa-se a depender menos das políticas públicas governamentais que são, por
vezes, efêmeras e descontinuadas. Isso foi abordado por Cohn (1995, p.2), quando ela indica
que as políticas sociais são, quase sempre, não constantes e ineficientes quanto à medição de
seus resultados: Dessa forma, ao se discutir as políticas sociais na atual conjuntura brasileira, a questão da lógica do seu financiamento e da prestação de benefícios e serviços, e, neste caso, da sua produção, ocupa lugar central no debate atual, e que se desdobra em termos da compatibilidade entre os objetivos propostos por cada política setorial
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— e dos respectivos programas aí presentes — da área social; da disponibilidade, origem e constância dos recursos disponíveis e previstos para sua efetivação; e da sua eficiência quanto a atingir os objetivos e o público-alvo previamente definidos. E se não é novidade que as políticas e programas sociais no Brasil não preenchem esses quesitos, entender sua lógica e buscar elementos que permitam imprimir- lhes outra racionalidade torna-se tarefa das mais urgentes para a construção de uma sociedade mais igualitária, vale dizer, mais democrática.
Importante destacar que, exatamente pelo fato de não serem “confiáveis” no sentido da
continuidade, a dependência por parte de qualquer recorte social destas políticas acaba sendo
desastrosa. Isso é maximizado quando se trata de um segmento social ainda mais vulnerável
como os portadores de deficiência. Assim, há uma melhoria significativa na qualidade de vida
de uma pessoa, nessa condição, quando ela se vê empregada. Uma menor dependência das
politicas assistenciais acaba, também, possibilitando que o orçamento público destinado a este
segmento social possa ser usado para outras ações públicas, tais como saúde e educação. Há,
com isso, a possibilidade de melhora no oferecimento de serviços à população como um todo.
Quando se faz, nesse texto, referência ao fato de que há desenvolvimento social no
país se houver mais pessoas com deficiência formalmente trabalhando, estamos trazendo à
pauta que esse grupo terá uma maior tendência a aliviar o orçamento público no segmento da
assistência social e outros grupos sociais, também vulneráveis, ou outras áreas, poderão fazer
uso desses recursos. Isso é extremamente relevante quando pensamos que, como não são
gastos orçamentários de caráter obrigatório, esses recursos podem ser maiores ou menores a
depender de fatores ou pressões políticas. É nesse contexto, em que há uma maior
participação da pessoa com deficiência no mercado de trabalho e gerando reflexos positivos
no consumo, no desenvolvimento econômico nacional e na melhoria das condições sociais da
população em tela, com reflexos na população como um todo, que vemos a importância das
políticas públicas de fomento à inserção do portador de deficiência no mercado de trabalho.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho, considerando a sua importância dentro do contexto social atual, é objeto de
diversas análises. É possível identificar sempre a sua relevância já que o tempo dedicado à
atividade laboral é muito grande na vida de cada um de nós. Portanto, discutir e entender o
trabalho em seus mais diversos aspectos é de interesse difuso nos mais variados campos das
ciências. As ciências sociais, também, têm especial interesse sobre o tema. As relações
trabalhistas, o trabalho como meio de inserção social, o seu viés político já foram objeto de
inúmeras obras e, quase sempre, acabam destacando que as suas relações econômicas, com
suas políticas remuneratórias e financeiras não conseguem se desvencilhar dos aspectos
sociais, tão importantes quanto os demais.
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Quando pensamos no trabalho para a pessoa com deficiência, isso é ainda mais
representativo. Por diversas vezes, este grupo social vê a atividade laboral como meio de se se
tornar “visto” pelo restante da sociedade. O trabalho possibilita que as pessoas com
deficiência consigam ser entendidas como “parte do todo” e, não, como um recorte social
passível apenas de ajuda e benevolência. A participação da pessoa com algum tipo de
deficiência em relação à população brasileira é relevante. Essas pessoas representam cerca de
24% da do total de brasileiros(IBGE, 2010). É um número considerável e que, conforme já
observamos nesse trabalho, não recebia, dos poderes constituídos, políticas públicas
específicas, que pudessem responder às suas efetivas necessidades. Fazia-se necessário que o
gestor público ou, mesmo, o legislador nas mais diversas esferas governamentais,
observassem as reais demandas desse grupo populacional. A formulação das alternativas é um dos mais importantes momentos do processo decisório, porque é quando se colocam claramente as preferências dos atores, manifestam-se os seus interesses e é então que os diversos atores entram em confronto. Cada um deles possui recursos de poder: influência, capacidade de afetar o funcionamento do sistema, meios de persuasão, votos, organização, etc. E cada um deles possui preferências. Uma preferência é a alternativa de solução para um problema que mais beneficia um determinado ator. Assim, dependendo da sua posição, os atores podem ter preferências muito diversas uns dos outros quanto à melhor solução para um problema político (RUA, 1998, p. 238).
Considerando toda essa situação, temos que a Lei de cotas se tornou o mais
representativo dispositivo legal para a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de
trabalho. Em que se pese a obrigação legal de se contratar as pessoas com deficiência, esta lei
possibilitou o aumento do número de vagas criadas para esses trabalhadores e, isso, conseguiu
gerar um “mercado de vagas”, o que é salutar considerando a omissão do empresariado em
agir quando, ainda, não era obrigado a fazê-lo. Estas vagas incluíram a pessoa com deficiência
no trabalho, gerando renda para elas e suas famílias e trouxeram-nas à possibilidade de
consumo, elevando a atividade da economia e reduzindo a dependência do assistencialismo,
desonerando, em parte, o orçamento público nesse sentido. Assim, é possível dizer que as
políticas públicas quando se voltam a tentar corrigir algumas injustiças históricas podem
trazer enormes benefícios tanto para o segmento social envolvido diretamente quanto para
outros com que tenham uma relação indireta. Não se pode, porém, entender que isso resolveu
todo o problema. Ainda há discriminação nos processos de contratação e, as pessoas com
deficiência ainda são preteridas para cargos de mais alto escalão, mesmo tendo capacidades
semelhantes. Contudo, já houve avanços. Cabe a cada um de nós continuar a cobrar ações
nesse sentido. Omissões dos agentes públicos não devem representar omissões da sociedade
civil como um todo.
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4. REFERÊNCIAS
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