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XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO JEPEX 2011 UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro. A INFLUÊNCIA DA CULTURA AFRICANA NO BRASIL ATRAVÉS DA ESCRAVIDÃO NEGRA. Kalhil Gibran Melo de Lucena 1 ________________ 1. Primeiro Autor é graduando do Curso de Licenciatura em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. E-mail: [email protected] Introdução Ao pensarmos em escravidão, é difícil não nos remeter aos portugueses, espanhóis e ingleses que superlotavam os porões de seus navios de negros africanos, colocando-os a venda de forma desumana e cruel por toda a região da América. Esse tipo de escravidão se caracterizou a partir da relação de forças entre europeus e africanos, com os primeiros impondo- se aos segundos. Nesse ínterim, povos inteiros eram submetidos à escravidão. No Brasil - como nos demais países do continente americano - havia os indígenas, formados por populações autóctones que, de início, foram utilizadas para o trabalho, tanto escravo quanto remunerado, por meio de transações de escambo. Porém, após o fortalecimento do lucrativo tráfico negreiro - que garantia grande acumulação de recursos à Metrópole, a mão-de-obra indígena foi sendo substituída pela africana. Os principais portos de embarque na África dos escravos se localizavam no Golfo do Benim, Angola, São Thomé, Senegal e Moçambique. Nesse contexto, através de várias rotas, o Brasil foi recebendo várias nações africanas: os Cabindas do Congo, os Benguelas de Angola, os Macuas e Angicos de Moçambique, os Minas da Costa da Guiné, os Gêge do Dahomé, os Yorubas ou Nagôs dos reinos Yoió e Ketu. O tráfico de escravos da África para o Brasil durou mais de 300 anos. Artur Ramos (1979), autor do livro As Culturas Negras no Novo Mundo, nos diz que: (...) O número de escravos introduzidos no Novo Mundo se conta por milhões. Os escravos aqui chegados eram distribuídos aos seus destinos nas várias cidades do litoral, onde havia entrepostos ou mercados de escravos. No Brasil, negros escravos foram introduzidos logo depois da descoberta. Mas só mais tarde eram organizadas as companhias regulares que abasteciam os portos da Bahia, do Rio de Janeiro, do Recife. (...) A procedência desta grande massa de escravos é ainda objeto de estudos. Parece que os negros escravos tinham provindo de todas as regiões africanas, não só da Costa Ocidental como da Oriental e Madagascar, não excluindo a África do Norte. Todavia, não há como precisar uma informação, pois, não há documentos exatos sobre os focos de captura de escravos na África. Essa página da história que trata da escravidão negra é, portanto, a de um longo desastre, um tempo de horrores na qual os negros experimentaram todas as formas concebíveis de exploração, humilhação e sofrimento nas mãos de seus opressores brancos. O negro teria sido despojado culturalmente de suas raízes africanas, e forçado a se aculturar ao modo de vida e pensamento de seu opressor europeu. Nesse ínterim, Katia M. de Queirós Mattoso, autora do livro Ser Escravo no Brasil, argumenta que: Há diferenças significativas entre a escravidão praticada pelos africanos e a que teve lugar no Brasil. Lá, o escravo não é necessariamente ligado à produção. Aqui, o escravo africano era vendido e comprado para um novo trabalho. Ele precisará passar por uma repersonalização, pois cativeiro e venda fizeram dele, em primeiro lugar, uma mercadoria, objeto despossuído de qualquer vontade própria. Além de tudo, não tem personalidade jurídica, não responde por si mesmo. (MATTOSO, Katia 1988). Contudo, vale destacar que o negro reagiu à escravidão, buscando uma vida digna. Foram comuns as revoltas nas fazendas em que grupos de escravos fugiam, formando nas florestas os famosos quilombos. Estes eram comunidades bem organizadas, onde os integrantes viviam em liberdade, através de uma organização comunitária aos moldes do que existia na África. Nos quilombos, podiam praticar sua cultura, falar sua língua e exercer seus rituais religiosos. Material e métodos O presente trabalho foi elaborado a partir de um levantamento bibliográfico acerca do tema em questão. A pesquisa foi feita com leituras de livros e artigos científicos, além de dissertações e teses coletados em bibliotecas e pela internet. Assim, objetivou-se investigar acerca da influência negra/Africana no Brasil, levando-se em consideração o longo e cruel período de escravidão em nosso país. Vale à pena destacar que um ponto bem pertinente dentro do contexto da escravidão no Brasil fica por conta do processo de hibridização entre colonos europeus (portugueses), indígenas e africanos. A cultura brasileira, por sua vez, apresenta-se com fortes traços da cultura portuguesa, da cultura indígena e da cultura africana. Em relação a essa última, observa-se um exemplo bem relevante na culinária, com o prato mais brasileiro de todos: a feijoada. Ao aproveitar as partes menos nobres do porco, que eram dispensadas pelos senhores aos escravos, os negros foram responsáveis pela criação de uma das iguarias mais saborosas de nosso país.

A INFLUÊNCIA DA CULTURA AFRICANA NO BRASIL · PDF filemaior parte das macumbas do Rio de Janeiro e algumas ... Observa-se que a cultura bantu entrou largamente no Brasil com as religiões,

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XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2011 – UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro.

A INFLUÊNCIA DA CULTURA AFRICANA NO BRASIL ATRAVÉS

DA ESCRAVIDÃO NEGRA.

Kalhil Gibran Melo de Lucena1

________________

1. Primeiro Autor é graduando do Curso de Licenciatura em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. E-mail:

[email protected]

Introdução

Ao pensarmos em escravidão, é difícil não nos

remeter aos portugueses, espanhóis e ingleses que

superlotavam os porões de seus navios de negros

africanos, colocando-os a venda de forma desumana

e cruel por toda a região da América. Esse tipo de

escravidão se caracterizou a partir da relação de forças

entre europeus e africanos, com os primeiros impondo-

se aos segundos. Nesse ínterim, povos inteiros eram

submetidos à escravidão.

No Brasil - como nos demais países do continente

americano - havia os indígenas, formados por

populações autóctones que, de início, foram utilizadas

para o trabalho, tanto escravo quanto remunerado, por

meio de transações de escambo. Porém, após o

fortalecimento do lucrativo tráfico negreiro - que

garantia grande acumulação de recursos à Metrópole, a

mão-de-obra indígena foi sendo substituída pela

africana.

Os principais portos de embarque na África dos

escravos se localizavam no Golfo do Benim, Angola,

São Thomé, Senegal e Moçambique. Nesse contexto,

através de várias rotas, o Brasil foi recebendo várias

nações africanas: os Cabindas do Congo, os Benguelas

de Angola, os Macuas e Angicos de Moçambique, os

Minas da Costa da Guiné, os Gêge do Dahomé, os

Yorubas ou Nagôs dos reinos Yoió e Ketu. O tráfico de

escravos da África para o Brasil durou mais de 300

anos. Artur Ramos (1979), autor do livro As Culturas

Negras no Novo Mundo, nos diz que: (...) O número

de escravos introduzidos no Novo Mundo se conta por

milhões. Os escravos aqui chegados eram distribuídos

aos seus destinos nas várias cidades do litoral, onde

havia entrepostos ou mercados de escravos. No Brasil,

negros escravos foram introduzidos logo depois da

descoberta. Mas só mais tarde eram organizadas as

companhias regulares que abasteciam os portos da

Bahia, do Rio de Janeiro, do Recife. (...) A procedência

desta grande massa de escravos é ainda objeto de

estudos. Parece que os negros escravos tinham

provindo de todas as regiões africanas, não só da Costa

Ocidental como da Oriental e Madagascar, não

excluindo a África do Norte. Todavia, não há como

precisar uma informação, pois, não há documentos

exatos sobre os focos de captura de escravos na África.

Essa página da história que trata da escravidão negra

é, portanto, a de um longo desastre, um tempo de

horrores na qual os negros experimentaram todas as

formas concebíveis de exploração, humilhação e

sofrimento nas mãos de seus opressores brancos. O

negro teria sido despojado culturalmente de suas raízes

africanas, e forçado a se aculturar ao modo de vida e

pensamento de seu opressor europeu. Nesse ínterim,

Katia M. de Queirós Mattoso, autora do livro Ser

Escravo no Brasil, argumenta que: Há diferenças

significativas entre a escravidão praticada pelos

africanos e a que teve lugar no Brasil. Lá, o escravo

não é necessariamente ligado à produção. Aqui, o

escravo africano era vendido e comprado para um novo

trabalho. Ele precisará passar por uma

repersonalização, pois cativeiro e venda fizeram dele,

em primeiro lugar, uma mercadoria, objeto despossuído

de qualquer vontade própria. Além de tudo, não tem

personalidade jurídica, não responde por si mesmo.

(MATTOSO, Katia – 1988).

Contudo, vale destacar que o negro reagiu à

escravidão, buscando uma vida digna. Foram comuns

as revoltas nas fazendas em que grupos de escravos

fugiam, formando nas florestas os famosos quilombos.

Estes eram comunidades bem organizadas, onde os

integrantes viviam em liberdade, através de uma

organização comunitária aos moldes do que existia na

África. Nos quilombos, podiam praticar sua cultura,

falar sua língua e exercer seus rituais religiosos.

Material e métodos

O presente trabalho foi elaborado a partir de um

levantamento bibliográfico acerca do tema em questão.

A pesquisa foi feita com leituras de livros e artigos

científicos, além de dissertações e teses coletados em

bibliotecas e pela internet. Assim, objetivou-se

investigar acerca da influência negra/Africana no

Brasil, levando-se em consideração o longo e cruel

período de escravidão em nosso país.

Vale à pena destacar que um ponto bem pertinente

dentro do contexto da escravidão no Brasil fica por

conta do processo de hibridização entre colonos

europeus (portugueses), indígenas e africanos. A

cultura brasileira, por sua vez, apresenta-se com fortes

traços da cultura portuguesa, da cultura indígena e da

cultura africana.

Em relação a essa última, observa-se um exemplo

bem relevante na culinária, com o prato mais brasileiro

de todos: a feijoada. Ao aproveitar as partes menos

nobres do porco, que eram dispensadas pelos senhores

aos escravos, os negros foram responsáveis pela

criação de uma das iguarias mais saborosas de nosso

país.

XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2011 – UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro.

Deve-se lembrar que a construção do país hoje

conhecido como Brasil foi possível devido à força de

trabalho dos povos negros africanos e de seus

descendentes durante os períodos Colonial e Imperial.

Sem estes trabalhadores, a Metrópole portuguesa

dificilmente teria condições de povoar e explorar os

ricos recursos encontrados em nosso território,

principalmente em razão da restrita população de

Portugal à época.

Resultados

A partir da realização desse presente trabalho foi

possível compreender-se e observar-se que a África se

mostra presente no Brasil em diversas dimensões da

sociedade, como na religiosidade, no gestual, na

musicalidade, no gosto pelas cores, na alimentação, na

alegria, na dança e na forma como falamos o português

no Brasil. Assim, o brasileiro sente-se muito atraído

pela força da tradição africana. E nesse sentido, o autor

Alberto da Costa e Silva, autor do livro Um rio

chamado Atlântico: a África no Brasil e o Brasil na

África, explica-nos que: Preocupados com nós

próprios, com o que fomos e somos, deixamos de

confrontar o que temos de herança da África coma a

África que ficou no outro lado do Oceano, tão

diversificada na geografia e no tempo. No entanto a

história da África – ou, melhor, das várias Áfricas -,

antes e durante o período do tráfico negreiro, faz parte

da história do Brasil. A África ajuda a explicar nosso

passado e nosso presente, e assim, os três séculos de

comércio de escravos ligam dois lugares irmãos, a

África e o Brasil (SILVA, Alberto da Costa e – 2003).

Um grande exemplo da África no Brasil fica por

conta do Benim e da Nigéria, lugares onde estão as

principais raízes dos cultos religiosos afro-brasileiros,

como exemplo, pode-se citar o culto aos orixás

(yoruba) e o culto aos voduns (gêge), todos dois

ligados aos elementos da natureza, possuindo muitas

semelhanças entre si, além de um certo sincretismo

religioso entre ambas. E diante desse contexto de

hibridizações religiosas, o autor Artur Ramos

identificou a procedência angola-congolesa para a

maior parte das macumbas do Rio de Janeiro e algumas

da Bahia. Seus estudos sobre a etnografia negra

abordam, exemplos como: (...) Dança e música de

influência angola-congolense saíram das macumbas e

se estenderam pelas festas profanas do Brasil, como o

carnaval. Dos instrumentos musicais negro-brasileiros,

que reconhecem a procedência da África bantu, temos

em primeiro lugar os tambores. Esses são um pouco

diferentes dos atabaques yorubas, pois, os tambores de

origem angola-congolense não têm o couro distendido

por cordas e cunhas. A sua fabricação é mais simples.

(...) Entre os tambores de origem bantu, temos ainda o

Ingono de Pernambucano e outros Estados do Norte.

Além do ingono, há ainda o zambê, que é um ingono

menor, e que deu origem à dança do côco de zambê,

usada em alguns Estados do Nordeste. (...) A cuíca, já

tão conhecida hoje em quase todo o Brasil, entrando

mesmo na constituição de nossos conjuntos orquestrais

típicos, é a mesma puíta angola-congolense, que toma

outros nomes como roncador, fungador e socador, no

Maranhão e Pará (...). (RAMOS, Artur - 1979)

Outra característica cultural africana ao Brasil pode

ser exemplificada na organização clânica, que

sobrevive ainda em certas formas de trabalho coletivo,

como, por exemplo, o putirão ou mutirão, que tem

muita semelhança com as Sociedades Congo do Haiti.

O mutirão é um grupo de trabalho, em que muitas

pessoas, negros e brancos, homens e mulheres, dão ou

vendem um dia de trabalho ao fazendeiro ou outro

colono, terminando a sua tarefa num festival que

avança pela noite adentro.

Em mais uma herança cultural da África ao Brasil

podemos citar o folclore afro-brasileiro de procedência

bantu, que é bem rico. Em primeiro lugar, temos as

festas populares do ciclo dos Congos ou Cucumbis.

Essas são sobrevivências históricas de antigas epopéias

angola-congolenses, com suas cerimônias de coroação

de monarcas, lutas dessas monarquias umas com as

outras e contra o português invasor, e episódios vários.

Entre os contos populares afro-brasileiros de

influência bantu, podemos arrolar inicialmente os do

ciclo do Kibungo, de origem angola-congolense. Os

negros bantus transportaram diretamente da sua terra,

para cá, os seus contos, as suas adivinhas, os seus

provérbios. A influência da linguagem, como elemento

principal da cultura bantu, foi enorme no Brasil. A

sobrevivência totêmica, dos povos bantus, vamos

encontrar em certos autos e festas populares negro-

brasileiros, como cordões, ranchos e clubes

carnavalescos, confrarias negras, maracatus do

Nordeste brasileiro, além de elementos do Bumba-meu-

boi.

A autora Katia Mattoso (1988) nos diz que a

sociedade brasileira recebeu uma forte influência na

pronúncia e no vocabulário, por parte dos negros

africanos, principalmente no Nordeste do Brasil: A

adaptação do escravo deveria se dar através de um

triplo aprendizado, de três obrigações impostas pelos

senhores: o idioma (aprender a língua do senhor), a

oração (catolicismo: rezar ao deus dos cristãos) e o

trabalho (que deverá ser executado com humildade,

obediência e fidelidade). Todavia, em relação ao

idioma os senhores não eram tão exigentes: um

conhecimento precário da língua, que permita ao

escravo compreender as suas ordens, era considerado

suficiente na maioria dos casos. Na realidade, somente

os escravos em contato constante com seus senhores,

especialmente os domésticos, tornam-se de fato

bilíngues, e seus filhos, criados com os do senhor,

aprendem um vocabulário cada vez mais distante ao da

sua nação africana. Contudo, diante desse contexto

haverá uma troca cultural no que se refere à linguagem,

e assim, o escravo africano irá influenciar e enriquecer

o vocabulário brasileiro com palavras novas que se

difundiram rapidamente, como molambo, moleque,

mucama, tanga, mandinga, caçulo, etc (MATTOSO,

Katia – 1988)

Observa-se que a cultura bantu entrou largamente no

Brasil com as religiões, folclore, línguas, cultura

material. Aqui se amalgamaram com outras culturas,

XI JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2011 – UFRPE: Recife, 17 a 21 de outubro.

porém até hoje conservam certas características de

origem. Todavia, Artur Ramos argumenta para que não

se deve cair num exclusivismo bantu, é preciso também

analisar o contexto sudanês: (...) Os negros islamizados

(Bahia) não se misturavam com os outros. Isolados,

altivos, insubmissos, reagiram à escravidão.

Promoveram revoltas freqüentes e odiavam os seus

próprios companheiros de infortúnio, não-maometanos,

a quem consideravam inferiores. Contudo, é preciso

assinalar que as sobrevivências culturais não existem

em estado puro, nem são facilmente identificáveis. As

culturas sudanesas misturam-se intimamente entre si,

com forte predominância da cultura yoruba. As

culturas negro-maometanas se polarizaram em torno

dos negros malês, do Sudão Ocidental. Nem as culturas

bantus nem as sudanesas puderam ser exatamente

exclusivas entre nós (RAMOS, Artur - 1979).

Pode-se concluir, portanto, que seja a cultura bantu,

sudanesa ou outras, não há como negarmos enquanto

brasileiros que fomos fruto de uma cultura negra que se

faz presente até hoje em nosso cotidiano.

Discussão

Sendo essa, uma experiência histórica que marcou o

desenvolvimento de toda a sociedade brasileira, a

escravidão ainda reverbera com bastante força na

contemporaneidade. A questão do preconceito racial

ainda se reflete, e isso fica evidente, por exemplo, na

posição subalterna reservada aos negros atualmente no

Brasil, encontrando-se à margem da sociedade. Chega-

se assim no paradoxo da situação atual em que a

cultura afro-brasileira predomina no âmbito popular,

mas a participação de afro-brasileiros é pequena na

política, na literatura, nas ciências nas produções

acadêmicas e na produção artística mais erudita das

elites nacionais.

Luiz Felipe de Alencastro (2000), em seu livro O

Trato dos Viventes - Formação do Brasil no

Atlântico Sul, demonstra um paradoxo histórico - o de

que o Brasil se formou fora do Brasil. A idéia exposta

em seu livro é a de que a colonização portuguesa,

baseada no escravismo, deu lugar a um espaço

econômico e social bipolar, englobando uma zona de

produção escravista situada no litoral da América do

Sul e uma zona de reprodução de escravos centrada em

Angola. Desde o final do século XVI, surge um espaço

aterritorial, composto dos enclaves da América

portuguesa e das feitorias de Angola. É daí que emerge

o Brasil do século XVIII. O autor mostra como essas

duas partes unidas pelo oceano se completam num só

sistema de exploração colonial, imposto pela

Metrópole portuguesa, cuja singularidade ainda marca

profundamente o Brasil contemporâneo.

O Brasil tem hoje a maior população de origem

africana fora da África. Contudo, passados mais de 120

anos desde a abolição da escravatura, a dívida social de

nosso país com as populações descendentes dos antigos

escravos africanos é ainda enorme. Indicadores sociais

mostram que grande parte dos negros e pardos do

Brasil vivem em condições precárias. O acesso a

benefícios básicos, como educação, saúde, trabalho,

saneamento e alimentação suficiente para uma correta

nutrição, é bastante restrito a estas parcelas da

população. O estigma da escravidão hoje é transferido

em forma de preconceito contra minorias menos

assistidas, que são condenadas a viver em condições de

miséria e, muitas vezes, à mercê de ambientes violentos

e insalubres.

Constatou-se que muitas civilizações usaram e

dependeram do trabalho escravo para a execução de

tarefas mais pesadas e rudimentares. Porém, a

escravidão do negro africano parece ter sido a mais

rude e inconsebível da História da humanidade.

Agradecimentos

Agradeço a todos os meus amigos e familiares que

de forma direta ou indiretamente me ajudaram na

execução desse trabalho. Agradeço em especial a

minha esposa Renata e ao meu filho Emanuel por tudo

que representam em minha vida, e que com o amor e o

carinho vêm colaborando para o meu crescimento

cognitivo e incentivando-me na caminhada acadêmica.

Referências

[1] ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O Trato dos Viventes -

Formação do Brasil no Atlântico Sul - São Paulo:

Companhia das Letras, 2000.

[2] DEL PRIORE, Mary. Ritos da Vida Privada. In HISTÓRIA DA

VIDA PRIVADA NO BRASIL: cotidiano e vida privada na

América portuguesa. Organização Laura de Mello e Souza.

Volume 1. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

[3] ERIKSEN, Thomas Hylland. NIELSEN, Finn Sivert. História

da Antropologia. Petrópolis, Rio de Janeiro: Editora Vozes,

2007.

[4] FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala: formação da

família brasileira sob o regime da economia patriarcal. Rio

de Janeiro: José Olympio Editora, 1987.

[5] LARAIA, Roque de Barros. Cultura: Um Conceito

Antropológico. 11ª edição. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,

1997.

[6] MATTOSO, Katia. Ser escravo no Brasil. 2ª edição. São

Paulo: Editora Brasiliense, 1988.

[7] RAMOS, Artur. As Culturas Negras no Novo Mundo. 3ª

edição. São Paulo: Ed. Nacional, 1979.

[8] SILVA, Alberto da Costa e. Um rio chamado Atlântico: a

África no Brasil e o Brasil na África. Rio de Janeiro: Nova

Fronteira – Ed. UFRJ, 2003.

[9] SOARES, Mariza de Carvalho. Devotos da cor: Identidade

Étnica, Religiosidade e Escravidão no Rio de Janeiro, século

XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

[10] LOPES, Gustavo Acioli. As mãos e os pés do senhor. Revista

Desvendando a História, ano 2, n° 10. São Paulo: Escala

Educacional, 2007.