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10 Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola N° 3 – Maio 2001 A interação dos vegetais com o meio ambiente O s vegetais respondem a estímulos ambientais bas- tante variáveis, de natureza física, química ou biológica. Fatores tais como fertilidade e tipo do solo, umidade, radiação solar, vento, tempe- ratura e poluição atmosférica, dentre outros, podem influenciar e alterar a composição química dos vegetais. Além desses, há interações e adapta- ções coevolutivas complexas, que se produzem entre planta-planta, planta- animal e planta-microorganismos de um dado ecossistema. Como exemplo temos a interação inseto-planta que depende da presença, no tempo certo e na quantidade apropriada, de deter- minados compostos voláteis, respon- sáveis por aromas característicos. Es- sas substâncias voláteis, difundidas com facilidade a partir da evaporação, constituem verdadeiro elo de comuni- cação entre a fonte produtora e o meio ambiente. Tudo indica que os insetos reagem às substâncias voláteis através de mecanismo olfativo semelhante ao nosso, sentindo-se, portanto, atraídos ou repelidos pelos odores produzidos pelas plantas. Os estudos de tais inte- rações poderão resultar em benefícios para a humanidade, uma vez que, através do aprendizado da linguagem da natureza, será possível entender, participar e interferir em seu funciona- mento. Como vere- mos neste artigo, essa linguagem passa mui- tas vezes pelo conhe- cimento da composi- ção química das plantas. Além do me- tabolismo primário, responsável pela pro- dução de celulose, lig- nina, proteínas, lipí- dios, açúcares e outras substâncias que realizam suas principais funções vitais, as plantas também apresentam o chamado metabolismo secundário, do qual resultam substâncias de baixo peso molecular, às vezes produzidas em pequenas quantidades. Considera- se que uma das principais funções do metabolismo secundário nas plantas seja a biossíntese de estruturas com- plexas como alcalóides, terpenóides e derivados de fenilpropanóides. Tais estruturas funcionariam como agentes defensivos na luta contra predadores, a exemplo de microorganismos pato- gênicos, insetos e animais herbívoros. Além disso, em diversas situações de estresses bióticos e abióticos, novas rotas biossintéticas são iniciadas a partir de metabólitos primários, desen- cadeando a produção de substâncias quí- micas com grande va- riabilidade estrutural. A riqueza de metabólitos secundários nas plan- tas é também explica- da pelo fato delas es- tarem enraizadas no solo, não podendo se deslocar e, portanto, utilizar como resposta ao meio ambi- ente as respostas possíveis dos animais. Os metabólitos secundários produ- zidos pelos vegetais são formados por vários caminhos biossintéticos que produzem moléculas dotadas de gran- de diversidade de esqueletos e grupa- mentos funcionais, como, entre outros, ácidos graxos (gorduras) e seus éste- res, hidrocarbonetos, álcoois, aldeídos e cetonas, compostos acetilênicos, alcalóides, compostos fenólicos e cu- marinas. Os fenilpropanóides e, espe- cialmente, os terpenóides são os Hélio de Mattos Alves Os vegetais são fontes importantes de substâncias biologicamente ativas. A diversidade, em termos de estruturas e propriedades químicas, na qual essas substâncias ocorrem na natureza podem servir, para o desenvolvimento de um grande número de fitofármacos. Este artigo tem como objetivo mostrar como a química dos produtos naturais pode contribuir para a produção de compostos vegetais biologicamente ativos, com ênfase, especial, naqueles que apresentam propriedades farmacológicas . farmacognosia, metabolismo secundário, produtos naturais, fitoalexinas Tudo indica que os insetos reagem às substâncias voláteis através de mecanismo olfativo semelhante ao nosso, sentindo-se, portanto, atraídos ou repelidos pelos odores produzidos pelas plantas Plantas como fonte de fitofármacos

A interação dos vegetais com o meio ambienteO - QNEscqnesc.sbq.org.br/online/cadernos/03/divers.pdf · Além desses, há interações e adapta-ções coevolutivas complexas, que

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Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola N° 3 – Maio 2001

A interação dos vegetais com o meioambiente

O s vegetais respondem aestímulos ambientais bas-tante variáveis, de natureza

física, química ou biológica. Fatorestais como fertilidade e tipo do solo,umidade, radiação solar, vento, tempe-ratura e poluição atmosférica, dentreoutros, podem influenciar e alterar acomposição química dos vegetais.Além desses, há interações e adapta-ções coevolutivas complexas, que seproduzem entre planta-planta, planta-animal e planta-microorganismos deum dado ecossistema. Como exemplotemos a interação inseto-planta quedepende da presença, no tempo certoe na quantidade apropriada, de deter-minados compostos voláteis, respon-sáveis por aromas característicos. Es-sas substâncias voláteis, difundidascom facilidade a partir da evaporação,constituem verdadeiro elo de comuni-cação entre a fonte produtora e o meioambiente. Tudo indica que os insetosreagem às substâncias voláteis atravésde mecanismo olfativo semelhante aonosso, sentindo-se, portanto, atraídosou repelidos pelos odores produzidospelas plantas. Os estudos de tais inte-

rações poderão resultar em benefíciospara a humanidade, uma vez que,através do aprendizado da linguagemda natureza, será possível entender,participar e interferir em seu funciona-mento. Como vere-mos neste artigo, essalinguagem passa mui-tas vezes pelo conhe-cimento da composi-ção química dasplantas. Além do me-tabolismo primário,responsável pela pro-dução de celulose, lig-nina, proteínas, lipí-dios, açúcares e outras substânciasque realizam suas principais funçõesvitais, as plantas também apresentamo chamado metabolismo secundário,do qual resultam substâncias de baixopeso molecular, às vezes produzidasem pequenas quantidades. Considera-se que uma das principais funções dometabolismo secundário nas plantasseja a biossíntese de estruturas com-plexas como alcalóides, terpenóides ederivados de fenilpropanóides. Taisestruturas funcionariam como agentesdefensivos na luta contra predadores,a exemplo de microorganismos pato-

gênicos, insetos e animais herbívoros.Além disso, em diversas situações deestresses bióticos e abióticos, novasrotas biossintéticas são iniciadas apartir de metabólitos primários, desen-

cadeando a produçãode substâncias quí-micas com grande va-riabilidade estrutural. Ariqueza de metabólitossecundários nas plan-tas é também explica-da pelo fato delas es-tarem enraizadas nosolo, não podendo sedeslocar e, portanto,

utilizar como resposta ao meio ambi-ente as respostas possíveis dosanimais.

Os metabólitos secundários produ-zidos pelos vegetais são formados porvários caminhos biossintéticos queproduzem moléculas dotadas de gran-de diversidade de esqueletos e grupa-mentos funcionais, como, entre outros,ácidos graxos (gorduras) e seus éste-res, hidrocarbonetos, álcoois, aldeídose cetonas, compostos acetilênicos,alcalóides, compostos fenólicos e cu-marinas. Os fenilpropanóides e, espe-cialmente, os terpenóides são os

Hélio de Mattos Alves

Os vegetais são fontes importantes de substâncias biologicamente ativas. A diversidade, em termos deestruturas e propriedades químicas, na qual essas substâncias ocorrem na natureza podem servir, para odesenvolvimento de um grande número de fitofármacos. Este artigo tem como objetivo mostrar como a químicados produtos naturais pode contribuir para a produção de compostos vegetais biologicamente ativos, comênfase, especial, naqueles que apresentam propriedades farmacológicas .

farmacognosia, metabolismo secundário, produtos naturais, fitoalexinas

Tudo indica que os insetosreagem às substâncias

voláteis através demecanismo olfativo

semelhante ao nosso,sentindo-se, portanto,

atraídos ou repelidos pelosodores produzidos pelas

plantas

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principais constituintes que estão en-volvidos nas interações planta-inseto.Como podemos observar na natureza,os fenilpropanóides se formam a partirdo ácido chiquímico (1), que conduzàs unidades básicas: ácido cinâmico(2) e ácido p-cumárico (3) (Figura 1).

Estes últimos, por meiode reduções enzimá-ticas produzem prope-nilbenzenos (4) e/oualilbenzenos (6) e, pormeio de oxidações de-gradativas das cadeiaslaterais, podem geraraldeídos aromáticos(5); as ciclizações enzi-máticas intramolecu-lares produzem as cu-marinas (7). Os terpe-nóides são construídospela natureza a partirdo ácido mevalônico(8), mostrado na Figura2, do qual se obtém aunidade isoprênica, ouseja, o pirofosfato deisopentenila (9). O en-cadeamento cabeça-cauda da unidade iso-prênica produz diver-sas classes de terpe-nos, entre os quais osmonoterpenos, com-

postos com dez átomos de carbono(C2), e os sesquiterpenos, com 15átomos de carbono (C3).

Plantas como fonte de produtosnaturais

Desde os tempos remotos a Huma-

nidade utiliza as plantas com finalidadeterapêutica. Enquanto buscava alimen-tação para a sua sobrevivência a hu-manidade foi descobrindo as proprie-dades tóxicas ou curativas das plantas.Esse conhecimento etnofarmacológicoacumulado ao longo de nossa evolu-ção culminou com o desenvolvimentode fármacos de grande importância naterapêutica atual, tais como o ácidosalicílico, a atropina, a pilocarpina, oquinino, a artemisinina, o taxol, a digo-xina e a morfina (Figura 3). Nos anos80, o desenvolvimento da pesquisacientífica resultou na identificação de121 compostos de origem vegetal,provenientes de 95 espécies. deplantas. Grande parte deles estão in-cluídos na atual terapêutica dos paísesocidentais. No período 1983-1994, 6%dos medicamentos aprovados foramextraídos diretamente de espéciesvegetais; outros 24% foram de produ-tos derivados e 9% foram desenvol-vidos através de modelagem molecu-lar, onde as estruturas moleculares doscompostos serviram como precursoresde processos de sínteses químicas.Atualmente, metade dos 25 medica-mentos mais vendidos no mundo temsua origem em metabólitos secun-dários de origem vegetal.

O taxol (diterpeno isolado das cas-cas de Taxus brevifolia, que possui pro-priedades anti-cancerígenas) é umexemplo. Esse composto está presen-te em pequenas quantidades na árvore(aproximadamente 100 mg/kg de cas-ca seca de Taxus brevifolia). Desta ma-neira, para a produção de um gramade taxol são necessárias três árvores.Outros fatores, como o crescimentolento, a baixa estatura e a escassa dis-tribuição das árvores acabam dificul-tando ainda mais a disponibilidade dotaxol. Há ainda o inconveniente de queo processo de remoção da casca aca-ba levando o vegetal à morte. Estraté-gias baseadas em fontes alternativasde taxol e métodos para a sua síntesetotal têm sido extensivamente desen-volvidas e estimuladas diante da ne-cessidade crescente desse compostobiologicamente ativo na terapêutica.Devido à complexidade de sua mo-lécula, a síntese total representou um

Figura 1: Reduções enzimáticas transformam os ácidos cumá-ricos em alil e propenilbenzenos, enquanto oxidações com de-gradação da cadeia lateral produzem aldeídos aromáticos. Ci-clizações aromáticas intramoleculares resultam em cumarinas.

Figura 2: Duas unidades de isopreno (C5) unidas cabeça-cauda produzem os váriosesqueletos monoterpênicos (C10), enquanto o encadernamento de três unidades resultana classe dos sesquiterpenos (C15)

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grande desafio para os químicos. Maisrecentemente, dois métodos foram pu-blicados; no entanto, a aplicação in-dustrial de ambos é inviável no mo-mento devido às inúmeras etapas dereações e ao alto custo de produção.A síntese parcial do taxol, oriunda desubstâncias análogas extraídas deoutras espécies do gênero Taxus, mos-tra-se promissora, podendo substituir,no futuro, a extração a partir das cas-cas de T. brevifolia.

Outra fonte de metabólitos secun-dários, importante do ponto de vista

atividades biológicas produzidas pelasplantas em resposta aos estímulos domeio ambiente, mas pela imensaatividade farmacológica desses com-postos. Exemplo disso é a hipericina(Figura 6), isolada de flores de Hyperi-cum perforatum L, (Figura 5) conhecidapopularmente como erva de São João.A hipericina é uma diantrona que setornou conhecida na literatura porprovocar fotossensibilidade em ani-mais desprovidos de pigmentos (albi-nos) quando se alimentavam dessaplanta. Nesses experimentos, umainjeção de hipericina era aplicada emanimais albinos e a exposição destesanimais à luz desencadeava em pou-cas horas o surgimento de dermatitesem toda a extensão do corpo, comexceção das zonas da pele pigmenta-das. Essas inflamações se estenderampara todo o corpo do animal, causandoem algumas horas a morte do animal.

O gênero Hypericum conta comaproximadamente 370 espécies nomundo inteiro. Essas espécies são en-contradas em países de clima tempe-rado e seus arbustos são empregadosem jardinagem. Hypericum pode deri-var do grego hyper, acima, e eikon,pintura. As flores eram colocadas so-

Figura 4: Vincristina (R=CHO) e vimblastina(R=CH3).

Figura 5: Partes aéreas de Hypericum perfo-ratum.

Figura 3: Exemplos de produtos naturais de grande aplicaçãona indústria farmacêutica.

econômico e farma-cológico, é a Catha-ranthus roseus (Apo-cynaceae). Essa plan-ta é capaz de produzire acumular mais de90 compostos alcaloí-dicos com destaque adois alcalóides quesão considerados demaior importância pa-ra a indústria farma-cêutica (Figura 4): osalcalóides indólicos,como a vincristina,utilizada no tratamen-to da leucemia linfo-blástica aguda infantilem diferentes esque-mas de tratamentoquimioterápicos e avimblastina, de gran-de aplicação no trata-mento de diferenteslinfomas, como o deHodgkins, o sarcomade Karposi, câncer deovário e tumores dotestículo. Seus valoresde mercado estão es-timados em U$ 6.000/g (vincristina) e U$12.000,00/g (vimblas-tina). Outras alternati-vas, como o cultivo decélulas e de tecidosvegetais, estão sendoestudadas como es-tratégia de aumentaros valores de produ-tividade desses com-

postos. Alguns experimentos são feitospela adição de intermediários da viabiossintética desses alcalóides. Cul-turas de células suplementadas comsecologanina (iridóide) mostraram ele-vações nos teores de estricrosidina(um precursor de alcalóides indólicosmonoterpenoídicos. Os mesmos resul-tados foram obtidos com a adição deL. triptofano).

A complexidade do metabolismosecundário

Os metabólitos secundários des-pertam grande interesse, não só pelas

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bre imagens religiosas para afastar omal no dia de solstício de verão do he-misfério norte (22 de junho). As prepa-rações farmacêuticas com Hypericumperforatum (Figura 8) ocupam posiçãode destaque nos tratamentos de de-pressão leve e moderada. Na Alema-nha, são feitas 3,7 milhões de prescri-ções de Hypericum perforatum ao ano,o que corresponde a 25% do total deprescrições de antidepressivos naque-le país. Alguns estudos clínicos com-provam maior eficácia dessas prepa-rações farmacêuticas, inclusive comperfil de tolerabilidade superior, quandocomparados com outros antidepres-sivos sintéticos.

Composição química e atividadefarmacológica

A maioria das preparações farma-cêuticas comercializadas é feita a partirdas partes aéreas. Das flores coletadassão preparados extratos etanólicosque possuem na composição químicaseis grupos de substâncias: diantronas(hipericina e pseudohipericina), acilflo-roglucinóis ( hiperforina, adiperforina efurohiperforina ), dentre outros, glico-sídeos flavanoídicos, biflavonóides,protoantociandinas e xantonas (Figu-ras 6 e 7). O extrato alcoólico daspartes aéreas de Hypericum perforatuminibe a recaptação sináptica dos neuro-transmissores (noradrenalina e sero-tonina). Trabalhos adicionais com esseextrato mostram redução do númerode receptores pós-sinápticos, comnecessidade de menor quantidade deneurotransmissores (monoaminas)para se obter a resposta apropriada.Esse fenômeno está baseado na teoriade que a depressão pode ser explicadapela presença de maior número dereceptores nos neurônios pós-si-nápticos e, em razão deste maiornúmero, há necessidade de maiorquantidade de neurotransmissores emação. A literatura relata vários estudosrelacionando a atividade antidepressi-va da hipericina. No entanto, os últimosestudos bioquímicos experimentais,em animais e humanos, mostram quea hipericina não é a única das subs-tâncias de Hypericum que possui essaatividade. Esses trabalhos demons-

tram uma atividade antidepressivamais relevante para a hiperforina, pro-vavelmente devido às mudanças emrelação aos teores de hipericina ehiperforina que ocorrem durante o pe-ríodo de crescimento da planta, em es-pecial na época da florescência.Conforme podemos observar na Figu-ra 9, as flores de Hypericum perforatumno início da florescência possuemmaior teor de hipericina, porém baixoconteúdo de hiperforina. Após algumas

semanas ocorre um decréscimo doconteúdo hipericina e aumento de hi-perforina. As últimas publicações cien-tíficas têm demonstrado que a ativi-dade antidepressiva é diretamenteproporcional ao conteúdo de hiperfo-rina. Portanto, o extrato preparado comflores colhidas mais tardiamente, commaior teor de hiperforina, terá maior efi-cácia antidepressiva. Sabe-se, porém,que a hiperforina é bastante instável,degradando-se facilmente quando ex-

Figura 6: Compostos biologicamente ativos, isolados de Hypericum perforatum.

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Figura 9: Variação de hipericina e hiperforina durante a época de florescência.Figura 8: Preparação farmacêutica de Hy-pericum perforatum.

Figura 7: Compostos biologicamente ativos isolados de Hypericum perforatum.

posta à luz e ao calor, ou ainda quandoestocada ou em soluções. Por isso, osextratos de Hypericum perforatum co-mercializados contêm baixo teor dehiperforina, cerca de 1%, não sendomuitas vezes mencionada a sua pre-sença. Pode-se concluir que nem to-

dos os extratos são iguais em sua com-posição, tendo, portanto, perfil de se-gurança e eficácia distintos. A instabili-dade química da hiperforina leva a dis-cussão se os compostos 2-5 (Figura6) são produtos naturais ou artefatosque são formados durante a extraçãoe nos procedimentos de isolamento.Os compostos 3-5 (Figura 6), quandotestados em cérebros de camundon-gos para verificar a inibição da reutili-zação de 5HT, foram 10 vezes menosativos do que a hiperforina, sugerindoque a oxidação que resulta no bloqueiodo equilíbrio tautomérico é prejudicialpara a atividade de preparaçõesfarmacêuticas que contenham Hyperi-cum perforatum.

A labilidade da hiperforina, cujadegradação leva a derivados oxidadose a diminuição da atividade biológicadesses compostos, coloca em desta-que novos desafios: é fundamental odesenvolvimento de novas prepara-ções farmacêuticas de Hypericumperforatum que sejam estáveis e quesejam padronizados os seus princípiosativos, considerando outros compos-tos além da hipericina.

Considerações finaisOs fatos descritos acima demons-

tram a complexidade da estratégia deutilização dos metabólitos secundáriosobtidos de plantas, na estratégia deobtenção de fitofármacos. Fatorescomo a variação desses compostosdurante o período vegetativo e a inte-

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Referências bibliográficasKINGSTON, F.G.I. Recente advances

in chemistry of taxol. Journal of NaturalProducts, v. 63, n. 5, p. 726-734, 2000.

VEROTTA, L.; APPENDINO, G.; JAKU-POVIC, J.; BOMBARDELLI, E. Hyper-forine analogues from St. John’s worth(Hypericum perforatum). Journal of Natu-ral Products, v. 63, n. 3, p. 412-415, 2000.

Para saber maisSIMÕES, C.M.O.;SCHENKEL, E.P.;

GOSMANN, G.; MELLO, J.C.P.; MENTZ,L.A. e PETROVICK, P.R. Farmacogno-sia: da planta ao medicamento. PortoAlegre/Florianópolis: Ed. Universidade/UFRGS/Ed. da UFSC, 1999.

MARGIS, M.M.; SANDRONI, M.;LUMERZHEIN, M. e OLIVEIRA, D.E. Adefesa das plantas contra as doenças.Ciência Hoje, v. 25, n. 147, p. 24-32,1999.

ração da planta com o meio ambiente,além da tecnologia farmacêutica utili-zada na obtenção dessas preparaçõesfarmacêuticas, mostram a importânciada discussão sobre a padronizaçãodos princípios ativos e da estabilidadedesses produtos para a eficácia tera-pêutica.

Os exemplos citados são algunsdos mais relevantes na terapêuticamundial, mas não podemos esquecerda imensa biodiversidade brasileiramuito pouco conhecida em relação aosestudos químicos e farmacológicos. OBrasil é o país com a maior diversidadevegetal genética do mundo, contandocom mais de 55.000 espécies catalo-gadas de um total estimado entre350.000 e 550.000. O potencial de utili-zação dessa flora está longe de se es-gotar. Um exemplo pode ser a desco-

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berta e desenvolvimento de novosfármacos, através do uso dos produtosnaturais como matéria-prima para asíntese de novas substâncias bioativas.Outro caminho imenso a ser exploradoé o conhecimento racional dessa florae a utilização da tecnologia farmacêu-tica na a obtenção de fitoterápicos commaior eficácia. Para que isso ocorra éfundamental realizarem-se estudosprévios relativos aos aspectos botâni-cos, agronômicos, fitoquímicos, farma-cológicos, toxicológicos e finalmente odesenvolvimento de metodologiasanalíticas e tecnológicas.

Hélio de Mattos Alves ([email protected]), graduado emfarmácia, mestre em ciências (fitoquímica) pela Univer-sidade Federal Rural do Rio de Janeiro e doutor emciências (biotecnologia vegetal) pela UniversidadeFederal do Rio de Janeiro, é professor adjunto da Fa-culdade de Farmácia da UFRJ.

Resenha

Química medicinalAs bases moleculares da ação dos fármacos

Autores: Eliezer J. Barreiro e Carlos Alberto Manssour Fraga, pesquisadores doLASSBio, UFRJ.

Formato: 21 x 28ISBN: 85-7307-782-4243 páginashttp://www.artmed.com.br/

Química medicinal trata dos conceitos mais relevantes desta disciplina,enfatizando ao longo dos capítulos os aspectos estruturais mais importantesrelacionados com a atividade. Com isso, o leitor tem em mãos uma obra em que ateoria está ligada ao dia-a-dia, com exemplos de fármacos de diferentes classesterapêuticas, como quimioterápicos, antiinflamatórios, antitrombóticos e anti-hipertensivos, dentre outras, detalhando o planejamento estrutural de alguns destesfármacos integrantes do arsenal terapêutico moderno. Foi adotada a abordagemmolecular, enfatizando seus aspectos químicos e qualitativos. A abordagem adotadatorna o livro útil a estudantes de graduação e professores de química interessadosem desenvolver novas estratégias de ensino e aprendizagem com base em

temáticas contextualizadas. Pode-se destacar outras ferramentas para o aprendizado:• O capítulo de exercícios, em que são simuladas situações relacionadas aos temas tratados. Dentre os exercícios

selecionados, discutem-se as soluções tutoriais de alguns deles no CD-ROM que acompanha o livro• O glossário, que visa contribuir para o correto emprego de alguns termos de Química medicinal.• O CD-ROM, com endereços da Internet que apresentam informações relevantes sobre os temas tratados no livro.

Planejado de maneira que todas as estruturas incluídas em visão estérica através do programa WebLab Viewer possam servisualizadas espacialmente, esta mídia contribui para que as razões moleculares da ação dos fármacos possam ser entendidastridimensionalmente.