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A JUVENILIZAÇÃO DA EJA NO ENSINO MÉDIO: UM ESTUDO NO MUNICÍPIO DE SÃO MARCOS/RS 1 Valessa Camassola 2 Nilda Stecanela 3 Resumo O presente artigo apresenta os resultados de uma investigação sobre o processo de juvenilização da Educação de Jovens e Adultos (EJA) numa escola de Ensino Médio da rede pública estadual, no município de São Marcos/RS. O objetivo do trabalho era identificar os motivos que determinam a busca por esta modalidade de ensino. A partir dos anos 90, a EJA tornou-se assunto cada vez mais abordado no campo da Educação. Assim a pesquisa procurou identificar os fatores endógenos e exógenos à escola, que influenciam a opção cada vez mais presente dos alunos mais jovens pela modalidade EJA e levantar os sentidos que os jovens da EJA atribuem aos seus processos de escolarização, assim como a relação que estabelecem com suas trajetórias e projetos de futuro. O interesse em analisar estes fatores é resultado da minha experiência de seis anos como professora de Matemática e Física que vive e participa deste contexto. Relatos e comentários dos professores que atuam nesta modalidade e com base na análise dos dados das matrículas fornecido pela secretaria da escola reforçaram a relevância do estudo. O trabalho de campo foi realizado no cenário da pesquisa considerando a aplicação de questionários, aplicados pelo pesquisador a 100 alunos da EJA do Ensino Médio do Colégio Estadual São Marcos, contendo perguntas abertas e fechadas. As análises realizadas dos dados empíricos apontam que setenta e sete dos cem alunos entrevistados compreendem as idades de 18 a 24 anos o que nos confirma o processo de juvenilização. A parte qualitativa da pesquisa, observando as respostas dos alunos da EJA às questões abertas, indicou que, entre os motivos mais frequentes para os jovens buscarem a EJA, estão: as exigências do mercado de trabalho, o fracasso escolar com sucessivas reprovações e dificuldades de aprendizagem ou, ainda, a não adequação à organização curricular e uso de metodologia do ensino regular. De modo complementar, os resultados confirmaram que os jovens encontram nesta modalidade o direito à educação e o respeito à diversidade. Os suportes teóricos que sustentaram a construção do projeto, a análise e a interpretação dos resultados basearam-se nos seguintes autores: Nascimento (2008), Stecanela (2010; 2013), Dayrell, entre outros. O estudo empreendido encontrou algumas respostas para o processo de juvenilização da EJA, ao mesmo tempo em que finaliza com novas indagações: que práticas e que políticas precisam ser efetivadas para dar conta do novo perfil juvenilizado da EJA? Palavras-chave: Juvenilização da EJA. Educação de Jovens e Adultos. Juventude. INTRODUÇÃO 1 Trabalho de Conclusão de Curso, realizado no curso de Especialização em EJA, vinculado ao Projeto Ler e escrever o mundo: a EJA no contexto da educação contemporânea, oportunizado através de acordo de cooperação entre Universidade de Caxias do Sul e Ministério da Educação, em parceria com a Prefeitura Municipal de Caxias do Sul. 2 Licenciada em Matemática pela Universidade de Caxias do Sul. Professora da Rede Estadual de Ensino no município de São Marcos/RS. Discente no curso de Especialização em EJA da Universidade de Caxias do Sul. 3 Doutora em Educação. Docente do Programa de Pós-graduação em Educação e do Centro de Filosofia e Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Professora da Rede Municipal de Ensino de Caxias do Sul. Coordenadora do Observatório de Educação Infâncias e Juventudes da UCS.

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A JUVENILIZAÇÃO DA EJA NO ENSINO MÉDIO: UM ESTUDO NO MUNICÍPIO DE SÃO MARCOS/RS1

Valessa Camassola2 Nilda Stecanela3

Resumo O presente artigo apresenta os resultados de uma investigação sobre o processo de juvenilização da Educação de Jovens e Adultos (EJA) numa escola de Ensino Médio da rede pública estadual, no município de São Marcos/RS. O objetivo do trabalho era identificar os motivos que determinam a busca por esta modalidade de ensino. A partir dos anos 90, a EJA tornou-se assunto cada vez mais abordado no campo da Educação. Assim a pesquisa procurou identificar os fatores endógenos e exógenos à escola, que influenciam a opção cada vez mais presente dos alunos mais jovens pela modalidade EJA e levantar os sentidos que os jovens da EJA atribuem aos seus processos de escolarização, assim como a relação que estabelecem com suas trajetórias e projetos de futuro. O interesse em analisar estes fatores é resultado da minha experiência de seis anos como professora de Matemática e Física que vive e participa deste contexto. Relatos e comentários dos professores que atuam nesta modalidade e com base na análise dos dados das matrículas fornecido pela secretaria da escola reforçaram a relevância do estudo. O trabalho de campo foi realizado no cenário da pesquisa considerando a aplicação de questionários, aplicados pelo pesquisador a 100 alunos da EJA do Ensino Médio do Colégio Estadual São Marcos, contendo perguntas abertas e fechadas. As análises realizadas dos dados empíricos apontam que setenta e sete dos cem alunos entrevistados compreendem as idades de 18 a 24 anos o que nos confirma o processo de juvenilização. A parte qualitativa da pesquisa, observando as respostas dos alunos da EJA às questões abertas, indicou que, entre os motivos mais frequentes para os jovens buscarem a EJA, estão: as exigências do mercado de trabalho, o fracasso escolar com sucessivas reprovações e dificuldades de aprendizagem ou, ainda, a não adequação à organização curricular e uso de metodologia do ensino regular. De modo complementar, os resultados confirmaram que os jovens encontram nesta modalidade o direito à educação e o respeito à diversidade. Os suportes teóricos que sustentaram a construção do projeto, a análise e a interpretação dos resultados basearam-se nos seguintes autores: Nascimento (2008), Stecanela (2010; 2013), Dayrell, entre outros. O estudo empreendido encontrou algumas respostas para o processo de juvenilização da EJA, ao mesmo tempo em que finaliza com novas indagações: que práticas e que políticas precisam ser efetivadas para dar conta do novo perfil juvenilizado da EJA?

Palavras-chave: Juvenilização da EJA. Educação de Jovens e Adultos. Juventude.

INTRODUÇÃO

1Trabalho de Conclusão de Curso, realizado no curso de Especialização em EJA, vinculado ao

Projeto Ler e escrever o mundo: a EJA no contexto da educação contemporânea, oportunizado através de acordo de cooperação entre Universidade de Caxias do Sul e Ministério da Educação, em parceria com a Prefeitura Municipal de Caxias do Sul. 2Licenciada em Matemática pela Universidade de Caxias do Sul. Professora da Rede Estadual de Ensino

no município de São Marcos/RS. Discente no curso de Especialização em EJA da Universidade de Caxias

do Sul. 3Doutora em Educação. Docente do Programa de Pós-graduação em Educação e do Centro de Filosofia e

Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Professora da Rede Municipal de Ensino de Caxias

do Sul. Coordenadora do Observatório de Educação Infâncias e Juventudes da UCS.

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Atualmente a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade

específica da Educação Básica que se propõe a atender a um público ao qual

foi negado o direito à educação durante a infância e/ou adolescência seja pela

oferta irregular de vagas, seja pelas inadequações do sistema de ensino ou

pelas condições socioeconômicas menos favorecidas.

O interesse em analisar os fatores que influenciam na juvenilização que

ocorre no Ensino Médio, na modalidade EJA, do noturno do Colégio Estadual

São Marcos, é resultado da minha experiência de seis anos como professora

de Matemática e Física que vive e participa deste contexto. Também através

de relatos e comentários dos professores que atuam nesta modalidade e com

base em um levantamento realizado e fornecido pela secretaria da escola,

percebi que a EJA sofreu uma alteração em relação à faixa etária de seu

público desde sua implantação.

Com base no exposto é que propus o projeto de pesquisa, como forma de

localizar os motivos que levam os jovens do ensino regular para a modalidade

EJA, identificando também se ao ingressarem na EJA eles encontram o que

procuravam. Pesquisa esta, realizada no período de novembro de 2012 a maio

de 2013, desde a gestação do projeto até a conclusão dos resultados.

A EJA é uma modalidade que a partir dos anos 90 tornou-se assunto

bastante abordado no campo da Educação. Como destaca Nascimento (2008,

p.19) “este fenômeno surge no panorama brasileiro a partir dos anos 90, em

uma modalidade de ensino que historicamente era dirigida mais ao público

adulto do que ao público jovem.”

A pesquisa buscou: (a) identificar os fatores endógenos e exógenos à

escola que influenciam a opção cada vez mais presente dos alunos mais

jovens pela modalidade EJA; (b) levantar os sentidos que os jovens da EJA

atribuem aos seus processos de escolarização; (c) identificar a relação que

estabelecem com suas trajetórias e projetos de futuro. Por meio de análise de

dados quantitativos e qualitativos são apresentados os resultados obtidos da

pesquisa, cujo trabalho de campo contemplou a realização de entrevistas com

o uso de um questionário contendo x perguntas abertas e x perguntas

fechadas, aplicada a cem alunos da EJA caracterizando assim um trabalho de

natureza teórico empírica.

Os resultados apontam que setenta e sete dos cem alunos entrevistados

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compreendem as idades de 18 a 24 anos o que nos confirma a investigação no

processo de juvenilização da EJA nesta instituição de ensino que serviu de

cenário ao estudo. É importante conhecer os atores da juvenilização e os

fatores que permeiam este processo de migração do ensino regular para a

EJA, que podem ser desde o fracasso escolar com sucessivas reprovações e

dificuldades de aprendizagem, ou por não se adequarem a organização

curricular e metodologias da Escola que na maioria das vezes não provocam

seu interesse. Outra hipótese relevante é a busca pela certificação visando

melhores ofertas no mercado do trabalho, também embasado no conceito da

facilidade e redução de tempo na conclusão. Muitos são os motivos para a

crescente migração de jovens para a EJA, cujas hipóteses citadas se justificam

por meio da análise e interpretação dos dados construídos no desenvolvimento

da pesquisa e apresentados neste texto.

1 Jovens e Adultos: Que público é este?

Para conceituar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é necessário

reconhecer os sujeitos envolvidos definindo-os pelas suas características,

especificidades e suas trajetórias de vida internas e externas ao ambiente

escolar. É fundamental superar a concepção de EJA dita somente como

compensatória cujos principais fundamentos são a de recuperação de um

tempo de escolaridade perdido no passado, conforme destaca Stecanela

(2013): “A Educação de Jovens e Adultos (EJA) tem se constituído numa

alternativa tanto de caráter compensatório quanto de possibilidade de

educação ao longo da vida para aqueles que não tiveram a oportunidade de

concluir a escolarização na idade pretensamente dita como adequada.”

Tal reflexão servirá de base para a elaboração de processos pedagógicos

específicos para esse público, podendo caracterizá-los como os excluídos do

sistema de ensino que apresentam, em geral, um tempo maior de escolaridade

devido a repetências acumuladas e interrupções na vida escolar. São

trabalhadores empregados e desempregados, ou em busca do primeiro

emprego; filhos, pais e mães; moradores urbanos, rurais e periferias. Vivem no

mundo, industrializado, burocratizado e escolarizado, em geral trabalhando em

ocupações não qualificadas. Jovens e adultos que quando retornam à escola,

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o fazem guiados pelo desejo de melhorar de vida ou por exigências ligadas ao

mundo do trabalho. Considerar quais seus interesses, suas preocupações,

necessidades, expectativas em relação à escola, suas habilidades, enfim, sua

vivência torna-se de suma importância para a construção de uma proposta

pedagógica que considere suas especificidades. É fundamental perceber quem

é esse sujeito com o qual lidamos para que os conteúdos a serem trabalhados

façam sentidos e tenham significado.

Na história recente da educação brasileira, encontramos um documento

que abriga enorme potencial de valorização da educação de jovens e adultos.

Trata-se do Parecer CNE/CEB 11/2000, que apresenta as Diretrizes Nacionais

Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos. Seu texto inseriu essa

modalidade de ensino no plano em que precisa ser discutida e apreendida: a

do direito. O documento apresenta três funções para a educação de jovens e

adultos:

(1) Reparadora: Todos aqueles que não tiveram acesso à escolarização

básica, na idade apropriada. O Parecer atribui à Educação de Jovens e Adultos

a função de restaurar o direito de todos à educação escolar de qualidade,

possibilitando a todos, sem discriminação, acesso a um bem real, social e

simbolicamente importante. A reparação é a oportunidade concreta de jovens e

adultos estarem na escola e uma alternativa viável em função das

especificidades socioculturais desses segmentos para os quais entende que a

EJA necessite ser pensada como um modelo pedagógico próprio, a fim de criar

situações pedagógicas e satisfazer necessidades de aprendizagem de jovens e

adultos.

(2) Equalizadora: Todos os que tiveram interrompida sua trajetória

educacional devem ser alvo de políticas que objetivem favorecê-los, para

garantia do retorno e da permanência em universo escolar que lhes seja

próprio, de forma a confirmar competências adquiridas na educação

extraescolar e na própria vida. Assim, deve o Estado assegurar àqueles a

quem foi negado o direito à educação todas as condições necessárias para que

adquiram ou complementem sua escolaridade.

(3) Qualificadora ou permanente constitui o próprio sentido da EJA. É ela

que permanecerá, quando a efetiva democratização da sociedade tornar

desnecessária a função reparadora e equalizadora. A função qualificadora tem

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a tarefa de propiciar a todos a atualização de conhecimentos por toda a vida,

assegurando-lhes as necessárias condições para que, em qualquer momento

da vida, exerçam seu direito de aprender.

Além do seu direito assegurado à educação como forma de garantir a

certificação pela concorrência no mercado de trabalho ou ascensão social, o

jovem ou adulto encontra na escola, mais precisamente na modalidade EJA,

sentidos e objetivos distintos como a realização do desejo de aprender, de

conviver, de concluir seus estudos ou de dar continuidade a eles.

As políticas públicas que embasam a educação nacional, nos últimos

anos, intensificaram o retorno de jovens e adultos ao convívio da escola e,

recentemente, a juvenilização vem mudando a realidade anterior da EJA, a

qual passa a ser cada vez mais desafiada a fazer cumprir as três funções

anteriormente acima citadas.

2 A EJA e os Jovens: um contexto em discussão

Há alguns anos, o perfil e as características dos alunos do ensino da EJA

eram estudados a partir da categoria genérica de adulto trabalhador.

Atualmente, foi identificado que a cada ano que passa, aumenta a procura

nessa modalidade de ensino, constituída cada vez mais por jovens que

poderiam frequentar o ensino regular. O estudo pioneiro realizado por Carmen

Teresinha Brunel do Nascimento (2001) no âmbito do Programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no

início dos anos 2000 já indicava cientificamente este novo perfil. Segundo sua

autora,

O rejuvenescimento da população que frequenta a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é um fato que vem progressivamente ocupando a atenção de educadores e pesquisadores na área da educação. O número de jovens e adolescentes nesta modalidade de ensino cresce a cada ano, modificando o cotidiano escolar e as relações que se estabelecem entre os sujeitos que ocupam este espaço. (BRUNEL, 2008, p.9).

Os jovens constituem uma parcela significativa em nossas turmas da

EJA, praticamente são a maioria, por isso é de extrema importância discutir a

categoria juventude. Os estudos sobre juventude têm contribuído para entender

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essa geração do ponto de vista sociológico, mostrando que ela deve ser

considerada como uma categoria heterogênea, que se torna cada vez mais

difícil defini-la. Não se pode dizer que existe uma juventude, mas várias

juventudes como pode ser percebido na citação do sociólogo mineiro Juarez

Dayrell:

(...) a juventude é uma categoria socialmente construída. Ganha contornos próprios em contexto históricos, sociais distintos, e é marcada pela diversidade nas condições sociais (...), culturais (...), de gênero e até mesmo geográficas, dentre outros aspectos. Além de ser marcada pela diversidade a juventude é uma categoria dinâmica, transformando-se de acordo com as mutações sociais que vem ocorrendo ao longo da história. Na realidade, não há tanto uma juventude e sim jovens, enquanto sujeito que a experimentam e sentem segundo determinado contexto sociocultural onde se insere. (DAYRELL, 2007, p. 4).

Complementando, Stecanela (2010, p.75) também afirma que: “A noção

de juventude é socialmente variável, determinada por fatores históricos e

culturais”. Em nossa sociedade, de forma geral, os jovens são delineados como

adultos. Jovens na idade, mas tornados adultos pelas circunstâncias e papéis

que desempenham dentro do seu contexto diário que não lhes oportunizou

viver seus direitos: direito à educação, às culturas juvenis, ao desenvolvimento

pleno e à juventude.

3 O cenário, o contexto e os resultados da pesquisa

Neste item aparentamos uma descrição do cenário e do contexto no qual

a pesquisa foi projetada e desenvolvida incluindo, também, a discussão dos

resultados a que foi possível chegarmos.

Colégio Estadual São Marcos: “42 Anos Formando Corações e Mentes”

O Colégio Estadual São Marcos no qual este trabalho foi desenvolvido no

ano de 2013, está situado na cidade de São Marcos, Rua Dr Raymundo

Pessini, 854, no Bairro Centro. Há 42 anos esta instituição de ensino vem

contribuindo para a educação deste município. Se apresentando com o slogam

“Formando Corações e Mentes”, a instituição propaga a intensão de

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compartilhar o sonho de formar cidadãos, visando para além dos aspectos

intelectuais o desenvolvimento de competências sociais.

Por ser a única Escola da cidade que oferece o ensino noturno na

modalidade EJA Ensino Médio e por estar situada na região central, recebe um

público diversificado. Segundo a pesquisa aqui apresentada, dos discentes

entrevistados um percentual de 21% reside na região central da cidade, um

percentual de 4% na zonal rural e 75% reside nos demais bairros.

O Colégio Estadual São Marcos tem os três turnos de funcionamento

(manhã, tarde e noite) com 32 turmas e aproximadamente 860 alunos,

distribuídos no Ensino Fundamental, Médio Politécnico, e EJA. Mas o turno que

nos interessa para esse trabalho é o noturno, o qual tem 12 turmas, sendo seis

do Ensino Médio Politécnico com uma média de 30 alunos e seis turmas da

EJA Ensino Médio com média de 40 alunos por turma frequentando as três

etapas (T7, T8 e T94), sendo assim o turno com a maior quantidade de alunos.

A referida escola dispõe de uma equipe diretiva formada pelo diretor e

três vice-diretores, um para cada turno. Os serviços de orientação e supervisão

escolar são mais atuantes no diurno, devido à falta de recursos humanos.

Quando surge algum problema, estes são tratados com os próprios professores

ou com a direção.

O estado de conservação da escola e a disponibilidade de prédios e

instalações são bons, com reformas acontecendo no momento. A escola

possui um ginásio de esportes, uma biblioteca, um laboratório de ciências e

informática e recursos áudio visuais. Quanto aos recursos financeiros a escola

recebe repasses periódicos do Governo Estadual, porém, a escola juntamente

com a atuação do Círculo de Pais e Mestres depende muito da sua própria

capacidade de gerar e captar recursos a fim de complementar a verba.

No que diz respeito ao quadro de docentes no noturno da escola,

verifica-se que a grande maioria possui licenciatura na área em que atua e um

grande número de professores encontra-se em contrato temporário de trabalho.

Os Planos de Estudo da escola - contendo os referenciais conceituais,

4 As Totalidades T7,T8 e T9 da Educação de Jovens e Adultos correspondem respectivamente

ao 1º, 2º e 3º anos do Ensino Médio Regular. O Colégio não oferece as totalidades iniciais do Ensino Fundamental, pois este ensino é oferecido em uma Escola Municipal, visto ser de competência de sua mantenedora ofertá-lo. 4 Contratos para regência de classe efetivados pela 4ª Coordenadoria Regional de Educação, a

fim de sanar falta de professores nomeados.

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procedimentais e atitudinais a serem trabalhados nos componentes curriculares

- são os mesmos para o diurno e o noturno, não havendo um profissional

habilitado e designado somente para orientar os docentes da EJA quanto à

organização do ensino e ao uso de metodologias diferenciadas, assim acabam

trabalhando os mesmos conteúdos, porém mais facilitados, não sendo ideal

para a modalidade. Arroyo ressalta que:

Trabalhar com Jovens e Adultos é uma prática desafiadora para o profissional da educação, visto estes serem estes sujeitos históricos concretos, ativos na sociedade onde estão inseridos e que voltam à escola muitas vezes depois de muitos anos sem estudar. Não é pertinente, portanto, que sejam tratados da mesma forma que os alunos do ensino regular. A própria organização do trabalho escolar tem de ser diferenciada. (ARROYO, 1996).

Em todas as modalidades de ensino é importante o desenvolvimento

integral do aluno, atendendo a necessidade de um processo educativo

específico para cada público, relacionando teoria e prática. Para isso se faz

presente o saber compreender diferenças e semelhanças entre as várias

etapas de ensino e do seu público. Com isso a reformulação dos planos de

estudo e da proposta pedagógica das instituições precisa contemplar

conteúdos articulados com as experiências prévias e adquiridas dos alunos,

bem como olhar para o jovem da EJA com competência ética e política.

Descrevendo caminhos, apresentando resultados Neste subitem apresentamos os resultados da pesquisa bem como a

análise e interpretação dos dados construídos no campo da investigação.

O trabalho de campo foi realizado no mês de maio de 2013, envolvendo

uma amostra de 100 alunos das três etapas da Modalidade EJA do Colégio

Estadual São Marcos. Os dados foram construídos através de um questionário

que levou em conta: características pessoais, perfil socioeconômico, inserção

no mercado de trabalho, prosseguimento dos estudos, pontos positivos e

negativos da escola como ambiente de convívio social e de busca de

conhecimento, visão dos alunos sobre os fatores que influenciam a busca pela

modalidade EJA. O instrumento continha ao todo 30 questões, sendo 18

abertas e 12 fechadas.

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Apesar do considerável número de questões, a maioria dos estudantes

mostrou-se bastante receptivos, porém se limitaram em formular respostas

diretas, demonstrando interesse em participar e, em especial, pela

oportunidade de se expressarem e de serem ouvidos.

Para a análise das questões fechadas foram computadas as frequências

percentuais por alternativa e para as questões abertas foram analisados os

conteúdos das mensagens.

(a) Perfil dos entrevistados quanto à idade:

Gráfico 01 - Faixa etária dos entrevistados. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

(b) Perfil dos entrevistados quanto ao sexo

Gráfico 02 – Sexo dos entrevistados. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

Verificando os resultados das duas primeiras questões, constatamos que

77% dos entrevistados estão dentro da faixa etária de 18 a 24 anos. O baixo

percentual de alunos com mais de 25 anos justifica os dados que foram

construídos na própria escola no início da pesquisa onde em 2000, ano de

implantação da EJA na escola, cerca de 25% dos alunos matriculados tinham

menos de 24 anos. Hoje podemos perceber que, através da pesquisa

realizada, que os resultados se inverteram. Este dado vai ao encontro com

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estudos de muitos pesquisadores e professores preocupados com o fenômeno

da crescente busca de jovens pela modalidade EJA apresentada como

juvenilização. É possível aproximar os dados aqui construídos com a pesquisa

realizada por Stecanela e Panizzon (2013) na cidade de Caxias do Sul onde

apontam que em 2012 o grupo de alunos entre 15 e 18 anos representava 62%

do total dos alunos da EJA e o grupo compreendido acima dos 18 anos

representava 38%. Embora a pesquisa citada tenha sido construída com

alunos da EJA Ensino Fundamental, é notável o processo de juvenilização em

outros contextos.

Pode-se verificar também que o percentual de alunos do sexo masculino

e feminino apresenta uma diferença de 20%. Esta diferença não é relevante,

pois conforme dados do IBGE a população masculina em nosso município

apresenta maior massa. Percebe-se que hoje a população principalmente do

sexo feminino, não precisam mais deixar de estudar para trabalhar, ao

contrário, o fato de estarem trabalhando lhes dá a possibilidade de continuar a

frequentar a escola, pois apesar de na maioria das vezes seus salários serem

baixos estas trabalhadoras podem arcar com as despesas pessoais e

familiares.

(c) Situação em relação ao trabalho

Quantidade de horas trabalhadas semanalmente

Gráfico 03 – Horas diárias de trabalho diário dos entrevistados. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

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Setor da ocupação profissional

Gráfico 04 – Ocupação profissional dos entrevistados. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

Analisando os dados dos gráficos 03 e 04 que são relacionadas com a

situação ocupacional dos alunos, percebemos que 84% deles trabalham

durante o dia, na maioria com uma carga horária de trabalho de 8 horas diárias,

porém um percentual bastante significativo de 25% possui uma jornada de

trabalho pesada com mais de 8 horas diárias.

A indústria é a principal ocupação profissional destes alunos. Os 20% de

alunos que trabalham no comércio são quase exclusivamente do sexo

feminino, onde a principal ocupação é a de balconista em lojas e

supermercados. Os outros 26% são considerados autônomos, agricultores,

babás, trabalhadores da construção civil. O maior contingente de alunos

empregados na indústria é explicado pelo número significativo de empresas

que a cidade possui, principalmente no ramo de peças automotivas, no ramo

moveleiro e vinícola. Além de que as empresas oferecem aos seus

colaboradores planos de saúde privada, cestas básicas e algumas incentivam

financeiramente os trabalhadores que desejam estudar.

O percentual de 16% de alunos que não trabalham declaram motivos de

saúde, que lhes faltam oportunidades, e que a busca pelo emprego se justifica

pelo desejo de satisfazer necessidades básicas e ajudar na renda familiar.

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(d) Situação em relação à ocupação do tempo livre

Atividades realizada regularmente para além de estudar e/ou trabalhar

Gráfico 05 – Atividades realizadas regularmente pelos entrevistados. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

Podemos perceber que a realidade dos alunos da EJA, difere da

realidade dos alunos que frequentam o ensino diurno porque, enquanto os

mesmos têm o tempo para estudar e dedicar-se a outras atividades como

dança, músicas, línguas estrangeiras, e outras, os alunos da EJA trabalham

durante o dia e estudam à noite.

Um percentual de 54% dos entrevistados não realiza nenhuma atividade

extra, os mesmos alegam que só sobra o final de semana e aí estão cansados.

Dentre os 35% que praticam regularmente algum esporte a maioria é do sexo

masculino e apontaram o futebol com os amigos como atividade esportiva,

alguns citaram também caminhadas e andar de bicicleta, tornando-se verdade

mais uma atividade de lazer e de descontração do que propriamente uma

atividade extra.

Os alunos que frequentam cursos de computação, 10%, só o fazem

porque as empresas exigem e são oferecidos aos sábados. Outro motivo da

procura deste tipo de curso é para melhorar o currículo e ajudar na vida

profissional.

Verifica-se também que atividades que exigem disciplina e também um

investimento mais significativo como curso de inglês é pouco procurado, sendo

verificada a frequência de apenas 1% entre os entrevistados.

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(e) Motivação para procurar o Ensino Médio na modalidade EJA

Gráfico 06 – Motivos para cursar a EJA Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

O resultado obtido quando os alunos foram questionados quanto aos

motivos que os levaram a cursar a EJA: 58 % acreditam nas facilidades da

modalidade e pelo fato de concluir o Ensino Médio em menos tempo. Os 17%

apresentados no gráfico destacam

trabalhadores que precisam estudar a noite por exigência do trabalho, visto que

em sua maioria trabalham na indústria e por conta dos avanços tecnológicos e

gestão buscam funcionários cada vez mais qualificados.

Percebemos que o percentual de 15% dos alunos que declaram o motivo

pelo qual cursam a EJA, ainda tem uma preocupação com o futuro, isso revela

que os alunos veem a escola como instituição promotora de melhores

condições de vida e de ascensão social, traduzindo uma valorização da

escolarização, na busca do que a maioria define como “um futuro melhor”.

(f) Grau de satisfação em relação à modalidade EJA O ensino oferecido na EJA atende as suas expectativas?

Gráfico 07 – Atendimento das expectativas oferecido na EJA. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

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Os fatores citados pelos alunos que justificam os 84% de satisfação com

o ensino oferecido na EJA do Colégio Estadual São Marcos são: ensino menos

rígido, professores dedicados e compreensivos com a condição dos alunos

trabalhadores que utilizam maneiras diversificadas de avaliação (não aplicam

só provas), mais trabalhos. Consideram o turno da noite na escola calmo e

tranquilo, não ocorrem casos de violência e isso colabora com o aprendizado,

principalmente para aqueles que já enfrentaram uma jornada de trabalho.

Quanto ao termo ensino menos rígido citado percebe-se que às vezes os

alunos interpretam a metodologia de alguns professores como práticas de

ensino “menos exigentes”.

Os alunos que não estão satisfeitos total ou parcialmente com o ensino,

que juntos somam 16% são, na grande maioria, alunos com mais de 36 anos,

estes destacam que as turmas são barulhentas, muita conversa e muitos

adolescentes, falta de interesse e respeito por parte de alguns alunos,

conforme relato de A1: “as matérias são resumidas, a turma de gurizadas de 18

anos que só vem para brincar e atrapalhar os outros”, ainda mencionam o

ensino precário, muitas palestras e filmes ao longo do ano e a falta de tempo

para realizar tarefas extraclasses solicitadas por alguns professores. É provável

que estes alunos, de mais idade, carreguem com mais intensidade os

resquícios da organização da escola regular tradicional, projetando na EJA o

desejo de reprodução do mesmo modelo.

Alguns alunos classificam o ensino como precário justificando sua

posição dizendo que as aulas são pouco produtivas, e que os conteúdos são

mal programados, pois a maior parte dos conteúdos que são ensinados não

são usados no dia-a-dia, tudo é feito de forma mecânica. Outros afirmam o

desinteresse dos professores destacando que alguns não explicam o conteúdo

e não preparam as aulas, além de não terem domínio de turma. Salientam,

porém que não são todos os professores “só alguns”.

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(g) Significados atribuídos aos estudos na modalidade EJA

Contribuição dos conteúdos e atividades desenvolvidas na escola para a

melhoria do seu desempenho profissional

Gráfico 08 – Contribuição da escola no desempenho profissional dos entrevistados. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

Como se pode perceber 32% dos alunos não estabelece relação direta

entre os conteúdos da escola e a atividade profissional, porém, 50%

relacionam as práticas escolares com uma melhora na comunicação, na

argumentação e na convivência com chefes e colegas de trabalho. Cerca de

18% veem nos conteúdos uma ferramenta que ajuda na aquisição de

conhecimentos e isso pode colaborar para uma ascensão profissional e futuros

estudos (cursos profissionalizantes, superior e técnico).

Aspectos da vida social que melhoraram com a permanência na escola

Gráfico 09 – Contribuição da escola na melhoria do convívio social do entrevistado. Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

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Pode-se perceber que aspectos relacionados à necessidade de

convivência superam os aspectos relacionados ao conhecimento que foi

apontado por 40% dos alunos como fator de melhorias na vida pessoal. Estes

dados confirmam que para os jovens e adultos a escola constitui além de um

espaço de ensino, um espaço cultural e social, onde se aprende mais do que

conteúdos e sim se pratica a solidariedade, o afeto, o respeito às diferenças,

cumprimento de regras.

(h) Fatores relevantes: permanência e desistência

Experiência com a reprovação na escola regular

Gráfico 10 - Histórico de reprovação Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

Abandono da escola regular alguma vez

Gráfico 11 - Histórico de desistência Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

Analisando os gráficos 10 e 11, percebe-se um alto índice de

reprovações e desistência na vida escolar dos entrevistados. Os anos que mais

se destacaram pelo número de reprovações foram a 5ª e 7ª séries do Ensino

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Fundamental e o 1º ano do Ensino Médio, sendo que alguns alunos repetiram

até quatro vezes.

Os alunos pesquisados apontam fatores externos e fatores internos à

escola como motivos da desistência ou repetência dos alunos da EJA Ensino

Médio.

Os alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos citaram como fatores

externos os ligados diretamente ao aluno, tais como: falta de interesse,

dedicação e esforço, dificuldades de aprendizagem, preguiça, muitas faltas e

dificuldades financeiras. E quanto aos aspectos políticos e socioeconômicos

destacam: cansaço por causa do trabalho, amizades, namoros, drogas e os

atrativos tecnológicos de fora da escola.

Quanto aos fatores internos, o professor e suas práticas pedagógicas foi

o único citado, segundo os alunos alguns professores não explicam a matéria,

muitos não se dedicam e são mal preparados, além de que as aulas são pouco

atrativas e muito repetitivas. Destacam que alguns professores chegam para

trabalhar no turno da noite cansados e só reclamam parecendo que a culpa de

tudo é dos alunos.

(i) Fatores considerados determinantes para o sucesso escolar dos

alunos?

Os pesquisados apontam como fatores determinantes do bom

desempenho dos alunos, fatores relacionados aos próprios alunos e seus

familiares e outros que estão relacionados aos professores e à escola como um

todo. Podemos associar isso aos fatores “exógenos e “endógenos” do

insucesso escolar citado por Stecanela (2009, p.103). De acordo com a autora,

estes fatores “devem ser analisados diante de um conjunto de situações que

marcam as realidades brasileiras e mundial e afetam diretamente as biografias

dos jovens das classes populares”, os quis são influenciados e influenciam

pelas trocas na socialização com os demais sujeitos que encontram dentro e

fora da escola.

Eles destacam a dedicação, o interesse, a facilidade de aprendizagem,

força de vontade, o apoio da família e fatores econômicos como os fatores

ligados diretamente ao aluno ou seus familiares. Os mesmos destacam que

muitas vezes o incentivo da família compensa o cansaço depois de um dia de

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trabalho. Salientam também a importância da turma, se esta é mais calma

ajuda no entendimento e consequentemente no bom desempenho dos alunos.

Quanto aos fatores ligados à escola os alunos destacam que a presença de um

professor dedicado, qualificado e exigente, que prepara suas aulas deixando-

as mais interessantes e com boas explicações fazem os alunos se sentirem

motivados e “importantes” e quanto à escola como um todo destacam a

importância de ter um lugar agradável e tranquilo para estudar. Lembrando

Libâneo:

O professor não apenas transmite uma informação ou faz perguntas, mas também ouve os alunos. Deve dar-lhes atenção e cuidar para que aprendam a expressar-se, expor opiniões e dar respostas. O trabalho docente nunca é unidirecional. As respostas e opiniões mostram como eles estão reagindo à atuação do professor, às dificuldades que encontram na assimilação dos conhecimentos. Servem também para diagnosticar as causas que dão origem a essa dificuldades. (LIBÂNEO, 1994, p. 250).

Fica enfatizado, portanto, que a figura do professor quando apresentada

e reconhecida positivamente pelos alunos se torna o grande diferencial para o

aluno aprender.

(j) Expectativas para o Futuro

Desejo de continuidade dos estudos após conclusão da EJA

Gráfico 12 - Histórico de desistência Fonte: Alunos da EJA do Colégio Estadual São Marcos.

A maioria dos entrevistados pretende dar continuidade aos estudos.

Ingressar no Ensino Superior, cursos técnicos e profissionalizantes e destacam

que nos dias atuais vivemos num mundo globalizado e que ampliar os

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conhecimentos gerais é importante, pois favorece a vida de qualquer cidadão.

Este dado nos remete ao gráfico 6 demonstrado acima, embora os 58% dos

alunos acreditam na facilidade da modalidade e conclusão em menor tempo,

possuem expectativas positivas e buscam ascensão e qualificação

profissional. Conforme Silva:

permanecer na escola parece significar aos jovens uma estratégia para enfrentar a competitividade no mercado de trabalho, seja por acreditarem que estão se capacitando para o atendimento às demandas do setor produtivo, seja por estarem interessados na aquisição de um diploma que os coloque num patamar diferenciado em relação a uma relevante parcela que não consegue, sequer, obter a escolaridade mínima. (SILVA, 2010, p. 248).

Confrontando os gráficos 6 e 12 é notável que a escola para os alunos da

EJA é vista como um espaço significativo em suas vidas tanto na questão

afetiva como espaço de promoção profissional.

TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados evidenciam que o processo de juvenilização da Modalidade de

Educação de Jovens e Adultos do Colégio Estadual São Marcos é um fato

notório, visto que um número maior de jovens entre 18 e 24 anos estão

matriculados hoje em comparação com as matrículas do ano de implantação

desta modalidade.

Os jovens enfrentam a realidade das instituições públicas que ofertam

conteúdos e metodologias formais, as quais são consideradas pouco

interessantes por eles, não promovendo situações que favoreçam experiências

atrativas comparadas às ofertas “mais atraentes” fora da escola. Com isso o

fracasso escolar com sucessivas reprovações e as dificuldades de

aprendizagem associadas à falta de interesse do aluno e falta de incentivo da

família e professores, mostra um fator determinante para que os jovens, cada

vez mais jovens, procurem a Educação de Jovens e Adultos no Ensino Médio.

Os números e os relatos também apontam que a Escola é uma das

instituições sociais em que os jovens têm acesso além da aprendizagem e do

conhecimento, a possibilidade de construir vínculos afetivos, sociais e culturais

fundamentais para seu cotidiano na convivência pessoal e profissional. Ao

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matricularem-se na EJA depositam expectativas relacionadas à aceleração do

tempo escolar, inserção no mercado de trabalho, pela certificação, qualificação

e promoção profissional. A grande maioria se caracteriza por trabalhadores

incentivados ou cobrados pela qualificação em seus empregos, e muitos

pretendem dar continuidade aos seus estudos, visto que o mercado de trabalho

é cada vez mais competitivo.

Nesse caso, portanto, por se tratar a juvenilização da EJA como um

fenômeno relativamente recente, necessita ser mais bem compreendido pelos

profissionais que atuam nessa modalidade de ensino, sobretudo no que se

refere ao conhecer estes sujeitos que adentram as salas de aula com idades,

perspectivas, vivências e conhecimentos distintos, com o futuro à sua espera,

mas, principalmente, com um presente desejoso de ser vivido intensamente.

Assim, garantir o direito à educação e o respeito à diversidade continua e,

possivelmente, continuará sendo um desafio às políticas públicas, à prática

docente e às instituições de formação de professores. As respostas buscadas

através do estudo realizado encontrou algumas aproximações ao que desafiou

o problema de pesquisa sobre o processo de juvenilização da EJA e, ao

mesmo tempo, finaliza com novas indagações e preocupações futuras,

similares às conclusões do estudo realizado por Stecanela e Panizzon (2013)

em outro contexto social, embora próximo geograficamente à investigação que

este texto procura apresentar os resultados: que práticas e que políticas

precisam ser efetivadas para dar conta do novo perfil juvenilizado da EJA?

REFERÊNCIAS

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