14
A legitimidade do direito na proposta da ética discursiva Marcio Giusti Trevisol * Mestre em Ética e Filosofia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc); Especialista em Metodologia do Ensino de Filosofia pela Universidade de Passo Fundo (UPF); professor da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Rua Getúlio Vargas, 2125, Bairro Flor da Serra; CEP 89600-000; Joaçaba, SC; telefone (49) 3551-2000; [email protected] Resumo No presente artigo, procura-se realizar um debate teórico sobre a legitimação do direito a partir da fi- losofia prática de Habermas. No estudo, analisa-se como Habermas fundamenta o direito à luz do agir comunicativo e, portanto, de como distancia a legi- timação do direito da moral. A perspectiva haberma- siana desenvolve-se no sentido de fundar um princí- pio moralmente neutro, capaz de conferir legalidade e legitimidade ao direito moderno. Esse princípio será chamado por Habermas de princípio da demo- cracia, o qual deriva do princípio do discurso. Para chegar a tal concepção, Habermas realiza um debate detalhado com a doutrina do direito de Kant, a fim de apontar as possíveis falhas da teoria kantiana e corrigi-las com a teoria do agir comunicativo presen- te em “Direito e Democracia.” Palavras-chave: Direito. Democracia. Moral. Discur- so. Agir comunicativo. Espaço Jurídico, Joaçaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 33

A Legitimidade Do Direito Na Proposta Da Ética Discursiva

Embed Size (px)

DESCRIPTION

artigo

Citation preview

  • A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    Marcio Giusti Trevisol*

    Mestre em tica e Filosofia Poltica pela Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc); Especialista em Metodologia do Ensino de Filosofia pela Universidade de Passo Fundo (UPF); professor da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), Rua Getlio Vargas, 2125, Bairro Flor da Serra; CEP 89600-000; Joaaba, SC; telefone (49) 3551-2000; [email protected]

    Resumo

    No presente artigo, procura-se realizar um debate terico sobre a legitimao do direito a partir da fi-losofia prtica de Habermas. No estudo, analisa-se como Habermas fundamenta o direito luz do agir comunicativo e, portanto, de como distancia a legi-timao do direito da moral. A perspectiva haberma-siana desenvolve-se no sentido de fundar um princ-pio moralmente neutro, capaz de conferir legalidade e legitimidade ao direito moderno. Esse princpio

    ser chamado por Habermas de princpio da demo-cracia, o qual deriva do princpio do discurso. Para chegar a tal concepo, Habermas realiza um debate detalhado com a doutrina do direito de Kant, a fim de apontar as possveis falhas da teoria kantiana e corrigi-las com a teoria do agir comunicativo presen-te em Direito e Democracia.Palavras-chave: Direito. Democracia. Moral. Discur-so. Agir comunicativo.

    Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 33

  • 34 Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007

    Marcio Giusti Trevisol

    1 INTRODUO

    [...] como possvel surgir uma ordem social a partir dos pressupostos de for-mao de consenso que se encontra ameaada por uma tenso explosiva entre faticidade e validade? No caso do agir comunicativo, a dupla contin-gncia, a ser absorvida por qualquer formao de interao, assume a forma especialmente precria de um risco de dissenso, sempre presente, embutido no prprio mecanismo do entendimento, ainda mais que todo dissenso acarreta elevados custos para a coordenao da ao. (HABERMAS, 1997, p. 37).

    Na obra Direito e democracia, Habermas apre-senta o princpio do discurso (princpio D) como sendo capaz de legitimar o ordenamento jurdico em uma so-ciedade pluralista e profanizada por intermdio, eviden-temente, de um procedimento jurdico. Dessa forma, analisaremos, na primeira parte do artigo, a existncia da relao do direito com a democracia, sugerida por Habermas, com a finalidade de detectar a legitimao do ordenamento jurdico pelo princpio do discurso (D).

    Na segunda parte, abordaremos a reconstruo do direito, bem como o distanciamento da moral do di-reito, utilizando-nos das contribuies kantianas. A par-tir do princpio do discurso (D), os sujeitos examinam as pretenses de validade e as normas, a fim de orientar suas aes dentro da sociedade. Desse modo, vamos analisar como o direito funciona na coero social, ou seja, na integrao social. Os sujeitos devem institucio-nalizar juridicamente os prprios pressupostos comu-nicativos e os procedimentos de um processo de for-mao da opinio e da vontade. Portanto, a legitimao do direito precisa ser conhecida pelos destinatrios do direito para que seja aceita por todos os concernidos.

    2 FUNDAMENTAO E LEGITIMAO DO DIREITO

    Na introduo da obra Direito e Democracia, Habermas afirma que pretende reconstruir algumas

    partes do direito racional clssico [...] no quadro de uma teoria do direito, apoiada numa teoria do dis-curso. (HABERMAS, 1997, p. 9). Por isso, nessa mesma obra, no terceiro captulo, Habermas susten-ta que a legitimidade do direito positivo no deriva mais de um direito moral superior. O direito pode ser legitimado a partir de um processo de formao da opinio e da vontade que presumimos que seja racional. Para Habermas, a fonte de legitimao do direito subjetivo se estabelece no processo democr-tico da legislao, o qual faz uso do princpio da so-berania do povo. Nesse sentido, Habermas discorda dos positivistas jurdicos e, ao mesmo tempo, critica as teorias da justia de Kant e Rousseau. A doutri-na kantiana no esclarece a relao entre princpio moral, direito e democracia. Isso importante para entender a crtica de Habermas, ou seja, a relao de subordinao entre o princpio da democracia e o princpio moral da teoria kantiana.

    Segundo Habermas, os ordenamentos jurdi-cos modernos so constitudos, fundamentalmente, por direitos subjetivos. Na moderna compreenso do direito, os direitos subjetivos estabelecem os limites no interior dos quais um sujeito est justificado a empregar livremente a sua vontade e definem a li-berdade de aes iguais para todos os indivduos ou sujeitos portadores de direito.

    O direito, portanto, segundo Habermas, tenta resolver o problema de [...] como integrar social-mente mundos da vida em si mesmos pluralizados e profanizados. (HABERMAS, 1997, p. 43). Esse cenrio moderno implanta um desacoplamento entre a facticidade e a legitimidade, isto , ao contrrio da forma de vida tradicional, em que havia uma fuso entre facticidade e validade, as sociedades ps-tradi-cionais acirram a tenso entre facticidade e validade (DUTRA, 2005, p. 192). O direito, por si mesmo liga-do autorizao para a coero, consegue, mediante essa coero, substituir a circunscrio da convico da sanso, porm essa sanso, por sua vez, ter que ser deduzida de uma pretenso de legitimidade, j que a sociedade se instituiu a partir do agir livre dos atores, cujos atos de fala no tm mais circunscrio alguma.

  • Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 35

    A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    Portanto, a permisso para a coero jurdica deduzida de uma expecta-tiva de legitimidade. Ora, um sistema jurdico, de si mesmo coativo, fundado na contingncia de decises arbitrrias, perde seu poder de integrao social, j que o direito extrai sua fora mais das alianas que a positividade do direito estabelece com a pretenso de legitimi-dade. A solidariedade social constitui, dessa forma, a ltima instncia de onde o direito extrai a sua fora integradora. Manifesta-se, aqui, como se pode ver, essa ligao tensa entre facticidade fun-dada e aceitabilidade. (HABERMAS, 1997, p. 120, grifo do autor).

    Para Habermas, o agir comunicativo, que considera o entendimento lingstico como mecanis-mo de coordenao da ao, faz com que as suposies contrafactuais dos atores que orientam seu agir por pretenses de validade adquiram relevncia imedia-ta para a construo e manuteno de ordens sociais, pois elas mantm-se no modo de reconhecimento de pretenses de validade normativa. Nesse sentido, sig-nifica que a tenso entre faticidade e validade, que colocada na linguagem e no uso da linguagem, retorna no modo de integrao de indivduos socializados ao menos nos indivduos socializados comunicativamen-te devendo ser trabalhada pelos participantes. Mais adiante, ser analisado que essa tenso estabilizada na integrao social pelo direito positivo.

    Habermas levanta a seguinte questo no que se refere integrao social: como possvel coorde-nar planos de ao de vrios atores, de tal modo que as aes de um partido possam ser engatadas nas do outro? (HABERMAS, 1997, p. 36). Esse confli-to existente entre interesses dos atores da sociedade pode ser resolvido pelo agir comunicativo. A funo do agir comunicativo nas sociedades modernas es-tabilizar os conflitos e possibilitar o consenso sobre as normas.

    To logo, porm, as foras ilocucion-rias das aes da fala assumem um pa-pel de coordenador na ao, a prpria linguagem passa a ser explorada como fonte primria da integrao social. nisso que consiste o agir comunicati-

    vo. Nestes casos os atores, na qualidade de falantes e ouvintes, tentam negociar interpretaes comuns de situaes e harmonizar entre si os seus respectivos planos atravs de processos de entendi-mento, portanto pelo caminho de uma busca incondicionada de fins ilocucio-nrios. (HABERMAS, 1997, p. 36).

    Portanto, o uso da linguagem orientada para o entendimento, ao qual o agir comunicativo se refe-re, une-se em torno da pretenso de validade de suas aes de fala, os quais levam em comum acordo para o mbito de sua ao. Todos os atos de fala possuem pretenses que podem ser criticveis, contudo elas devem apontar para o reconhecimento intersubjeti-vo. O agir comunicativo possibilita que os falantes cheguem em comum acordo sobre pretenses de va-lidade e coordenem suas aes na sociedade. O con-senso resultante desse processo estabiliza o conflito inerente sociedade moderna.

    Esse breve esboo suficiente para le-vantar o problema tpico de sociedades modernas: como estabilizar, na pers-pectiva dos prprios atores, a validade de uma ordem social, na qual as aes comunicativas tornam-se autnomas e claramente distintas de normas estrat-gicas? (HABERMAS, 1997, p. 45).

    As sociedades modernas organizam-se em for-ma de Estado. A ordem formulada normativamente obedecendo a um ordenamento jurdico. Essa estru-tura moderna de entender o ordenamento jurdico diferente das sociedades tradicionais, nas quais o di-reito ainda se alimenta da fora do sagrado. Ento, as sociedades modernas sofrem por se tornarem plu-ralistas e profanizadas. necessrio que o fardo da integrao social se transfira para o entendimento entre os atores para os quais a facticidade (coao de sanso exteriores) e a validade (fora de ligao das convices racionalmente motivadas) so incompa-tveis, ao menos fora dos domnios das aes regu-ladas pela tradio e pelos costumes (HABERMAS, 1997, p. 45). Para Habermas, a interao social no se estabiliza somente por intermdio da orientao

  • 36 Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007

    Marcio Giusti Trevisol

    dos atores que perseguem o sucesso, mas a socieda-de deve ser integrada, fundamentalmente, em ltima instncia pelo agir comunicativo, que possibilita o surgimento de uma integrao social mediante ener-gias aglutinantes de uma linguagem compartilhada intersubjetivamente e impe certas regras que fazem o sujeito sair do egocentrismo e se colocar sobre cri-trios pblicos da racionalidade do entendimento. Assim, a sociedade apresenta-se como um mundo da vida estruturado simbolicamente, que se reproduz por meio do agir comunicativo.

    H uma diferena crucial entre os atores que se relacionam na sociedade. Para os atores orienta-dos pelo sucesso, todos os componentes da situao transformam-se em fatos que eles valorizam a partir de suas prprias preferncias, ao passo que aqueles que agem orientados pelo entendimento dependem de uma compreenso da situao, negociada em co-mum, passando a interpretar fatos relevantes luz de pretenses de validade reconhecidas intersubjetiva-mente (HABERMAS, 1997, p. 46-47). Desse modo, normas desse tipo devem apresentar-se como uma autoridade capaz de revestir a validade com a fora do ftico; porm, dessa vez, sob a condio da pola-rizao que j se estabeleceu entre o agir orientado pelo sucesso e o agir orientado pelo entendimento e, desse modo, sob condies de uma incompatibilida-de percebida entre facticidade e validade. Partimos do fato de que as garantias metassociais do sagrado caram. Antes de prosseguirmos com a discusso, necessrio esclarecermos o conceito de legalidade, pelo qual Kant esclarece o modo complexo de va-lidade do direito em geral, tomando como ponto de partida os direitos subjetivos.

    Nesse sentido, comenta Habermas que, para Kant, a relao entre facticidade e validade, estabi-lizada na validade jurdica, apresenta-se como uma relao interna entre coero e liberdade, fundada pelo direito. Ento Kant, para formular sua teoria do direito, parte de uma noo de direitos subjetivos para construir o princpio geral do direito, segundo o qual justa a afirmao que a mxima permite a con-vivncia entre a liberdade do arbtrio de cada um e a liberdade de todos conforme a lei geral. Habermas

    se apropria desse pensamento e afirma: [...] o direi-to moderno tira dos indivduos o fardo das normas morais e as transfere para leis que garantem a com-patibilidade das liberdades de ao. (HABERMAS, 1997, p. 114). Isso implica, para Habermas, que a lei seja igual para todos, isto , o conceito de direito deve conter, na forma geral de leis, os mesmos direi-tos para todos os cidados.

    Precisamos deixar clara a relao existente en-tre Kant e Habermas, uma vez que nos servir como base para a idia habermasiana de legitimao do di-reito, a partir da emigrao da moral para o direito. Kant, na Metafsica dos Costumes, atrela o direito, bem como as leis jurdicas, moral, isto , submete o direito moral. Esse modo de fundamentar o di-reito ser questionado por Habermas. A teoria moral kantiana fornece os conceitos superiores: vontade e arbtrio, ao e moral, dever e inclinao, lei e legis-lao, que servem para determinar a ao e o com-portamento moral. Para Habermas (1997, p. 140, gri-fo do autor), na teoria kantiana:

    [...] o conceito de direito no se refere prioritariamente vontade livre, mas ao arbtrio dos destinatrios; abrange a relao externa de uma pessoa com outra; e recebe a autorizao para a coero que est autorizada a usar con-tra outro em caso de abuso.

    Percebemos, ento, que o princpio do direito limita o princpio da moral. Essa posio ser anali-sada a seguir.

    3 A RELAO ENTRE HABERMAS E KANT COM REFERNCIA LEGITIMAO DO DIREITO

    Para entender com maior clareza a posio de Habermas ante a relao de subordinao do princ-pio do direito ao princpio moral, necessitamos infe-rir alguns esclarecimentos sobre a teoria do direito de Kant. Alm de demonstrar que o princpio da de-mocracia no pode estar subordinado ao princpio da moral, a anlise da forma jurdica kantiana nos possi-

  • Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 37

    A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    bilitar a retomada da discusso sobre a relao entre direito e moral. Primeiramente, devemos, ao analisar o direito kantiano, comear pela distino entre le-galidade e moralidade. Para Kant, um sujeito dotado de razo e vontade no pode querer outra coisa seno garantir sua conservao, bem estar, resumindo, sua felicidade. Contudo, a felicidade no um fundamen-to seguro para a motivao moral, ou seja, ela pode ser uma fonte de corrupo para aqueles que no pos-suem uma boa vontade. preciso existir algum me-canismo que possa corrigir e livrar essa vontade boa de inclinaes e influncias. A razo, segundo Kant, o mecanismo que pode regular a vontade e torn-la boa, no simplesmente como um meio para alcanar algo, mas, sim, boa em si mesma. A boa vontade no boa por aquilo que promove ou realiza, pela aptido para alcanar qualquer finalidade proposta, mas to somente pelo querer, isto , em si. (KANT, 1986, p. 23). Desse modo, o dever j contm em si, para Kant, o conceito de boa vontade. ele que ir tornar a boa vontade esclarecida, visto que ela j re-side na conscincia. Dever a necessidade de uma ao por respeito lei. (KANT, 1986, p. 31).

    Para explicar essas duas formas de legislao, a saber, a moral e a jurdica, Kant utiliza duas formas de atributos: interno e externo. Nesse sentido, a ao externa aquela relacionada com o ordenamento ju-rdico, isto , com as leis e que necessita de uma ade-so exterior do indivduo. Por outro lado, a legisla-o moral aquela em que a adeso ntima, ou seja, uma convico a partir do sujeito da ao. Isso tem certos agravantes. Por exemplo, o sujeito que segue externamente lei obrigado a seguir a lei, enquanto o dever moral interno porque sou obrigado a agir moralmente com a pureza da inteno. Para Kant, no direito, a conformidade com a lei se faz por temor da sano, por receio do castigo, ou do descrdito social etc. Na moral, ao contrrio, exige-se a adeso total da ao lei moral, o seu motivo, o puro senso da obrigatoriedade.

    Outro ponto importante da distino entre di-reito e moral levantado por Kant refere-se aos impe-rativos hipotticos e imperativos categricos. Os im-perativos categricos so aqueles que expressam uma

    ao boa por si mesmo, isto , um fim em si mesmo, por exemplo: voc no deve matar. Os imperativos hipotticos so aqueles que prescrevem uma ao boa como meio para alcanar certo fim como por exem-plo: se voc no quer ser preso, no deve matar.

    Outros autores percebem outras formas de dis-tino entre direito e moral que no a kantiana. Para Bobbio (1992, p. 58), devemos considerar a diferena entre liberdade moral e liberdade jurdica. A primeira se refere faculdade de adequao s leis que a razo nos d a ns mesmos. A segunda refere-se faculda-de de agir no mundo externo, no sendo os indivduos impedidos da liberdade igual dos demais seres huma-nos, livres como eu, interna e externamente.

    Nesse sentido, Kant fundamenta a legitimida-de do direito em um nico princpio bsico, a saber, a liberdade. Como o prprio Kant (1996, p. 23) define, [...] a liberdade o nico direito inato que pertence a cada homem em virtude da sua humanidade. Esse princpio no necessita do direito positivado para existir, isto , um direito moral. Alm deste, Kant cita a igualdade e a auto-suficincia como princpios a priori do Estado civil. Segundo Habermas (1997, p. 126), o contrato social na teoria kantiana [...] serve para a institucionalizao do direito natural a iguais liberdades de ao subjetivas. Assim escreve Habermas (1997, p. 127):

    Kant v o direito humano primordial fundamentado na vontade autnoma de indivduos singulares, os quais dispe premilarmente, enquanto pessoas mo-rais, da perspectiva social de uma razo que examina as leis, a partir da qual elas podem fundamentar moralmente [...] Ao mesmo tempo, Kant percebe que o direito humano que nico precisa diferenciar-se nos termos de um sistema de direitos, atravs do qual, tanto a li-berdade de cada membro da sociedade, enquanto homem, como tambm a sua igualdade com todos os outros, enquanto sditos, assumem uma figura positiva.

    Para Habermas, a teoria kantiana acontece na forma das leis pblicas, as quais s podem pretender legitimidade como atos da vontade pblica dos cida-dos autnomos e unidos.

  • 38 Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007

    Marcio Giusti Trevisol

    Aqui, porm, no possvel nenhuma outra vontade a no ser a de que todo o povo (uma vez que todos determi-nam sobre todos e, portanto, cada um determina sobre si mesmo): pois nin-gum pode ser injusto consigo mesmo. (HABERMAS, 1997, p. 127).

    O contrato da sociedade, em Kant, faz preva-lecer o princpio do direito de forma monolgica medida que liga a formao poltica da vontade do legislador s condies de um procedimento demo-crtico, sob o qual os resultados expressam a vontade consensual ou o consenso racional de todos os par-ticipantes. Assim, para Habermas, o direito liga-se moralmente com o princpio da soberania do povo. Habermas (1997, p. 127-128) escreve que:

    Os direitos do homem, fundamentados na autonomia moral dos indivduos, s podem adquirir uma figura positiva atravs da autonomia poltica dos cida-dos. O princpio do direito parece re-alizar uma mediao entre o princpio da moral e o da democracia. Contudo, no est suficientemente claro esses dois princpios se comportam recipro-camente. O conceito de autonomia, que suporta a construo inteira, introdu-zido por Kant na perspectiva, de certo modo privada, daquele que julga mo-ralmente; porm ele explicita esse con-ceito na frmula legal do imperativo categrico, apoiando-se no modelo de Rousseau, ou seja, numa legislao pblica realizada democraticamente. Os conceitos princpio moral e prin-cpio da democracia esto interliga-dos; tal circunstncia encoberta pela arquitetnica da doutrina do direito.

    Ao identificar o direito positivo com o prprio Estado e fundamentar distintivamente o direito pri-vado do direito pblico, Kant reconhece outros di-reitos bsicos como princpios a priori do Estado, a saber, princpios de igualdade e de auto-suficincia. Alm disso, com a idia de contrato social, apresen-tada por Kant com o princpio do Estado de direito, legitima o poder pblico e garante a liberdade: com a formulao do princpio universal do direito, Kant

    pode afirmar a prioridade da justia sobre o bem, ou seja, para Kant o mais importante o universalis-mo, permitindo a coexistncia de uma pluralidade de concepes do que seria a vida boa ou a felicidade. Segundo Almeida (2006, p. 219), as leis positivas teriam de ser pensadas como necessariamente subor-dinadas a leis morais, embora no derivadas delas, e isso pela simples razo de que no pode haver um verdadeiro conflito de deveres, uma vez que as aes exigidas por regras opostas no poderiam ser igual-mente opostas. Portanto, como a noo de Estado poltico deve ser tratada na filosofia prtica, o funda-mento moral das leis positivas parece estar garanti-do, desde que, bem entendido, possa ser considerado efetivamente como leis do direito.

    Kant extrai o princpio geral do direi-to da aplicao do princpio moral a relao externa e inicia sua doutrina do direito com o direito a liberdades subje-tivas iguais, equiparadas do direito com a permisso de coero, a qual compete ao homem graas sua humanidade. (HABERMAS, 1997, p. 135).

    Podemos, ento, imprimir trs afirmaes a partir do princpio universal do direito exposto por Kant e citado anteriormente no trabalho. Temos:

    que o direito se aplica s aes externas de a) um indivduo medida que elas compro-metem as aes de outros indivduos;que o direito concerne s aes externas b) medida que se relacionam com o arbtrio de um com o arbtrio dos demais; que o direito considera unicamente a forma c) dessa relao e sua compatibilidade com leis universais.

    Ora, esse conceito das leis jurdicas como uma espcie das leis morais est baseado, para recordar, na idia que o di-reito a autorizao ou faculdade moral: 1) de realizar o que lcito e o que obri-gatrio e de no fazer o que proibido; e 2) de coagir pela fora quem nos impe-de de faz-lo. Se isso concedido, creio que as trs afirmaes sobre a extenso

  • Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 39

    A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    do conceito de Direito resultam de uma considerao sobre os limites da coao legtima, isto , daquilo a que se pode le-gitimamente coagir as pessoas que no realizam os seus deveres para com os demais. (ALMEIDA, 2006, p. 220).

    Habermas entende que, na perspectiva dos desti-

    natrios, a relao jurdica no leva em conta a capaci-dade das pessoas em ligar sua vontade por intermdio de idias normativas; ela atribui apenas a capacidade de tomar decises teolgicas. Nesse sentido, os direi-tos subjetivos consistem em desligar, inicialmente, os sujeitos de direito de mandamentos morais, abrindo, aos atores, espao de arbtrio legtimo (HABERMAS, 1997, p. 121), ou seja, desligar os agentes da forma de obedincia prpria dos mandamentos morais.

    Kant parte da lei moral para derivar os deveres jurdicos. Habermas (1997, p. 140-141) caracteriza tal caminho percorrido por Kant, da moral ao direito, como reduo e abstrao. A moral estabelece alguns conceitos como forma de caracterizar a sua especi-ficidade, tais como [...] vontade e arbtrio, ao e moral impulsionadora, dever e inclinao, lei e le-gislao. O caminho percorrido da moral ao direito vai da considerao do sujeito como autor da lei ao sujeito como destinatrio de deveres.

    Adentrando na discusso sobre o princpio do discurso estabelecido por Habermas em Direito e Democracia, ele sustenta que devem pleitar legiti-midade exatamente aquelas regulamentaes com as quais todos os eventuais implicados poderiam con-cordar como participantes de discursos racionais. exatamente isso que garante o carter democrtico da legitimao sustentada por Habermas, pois os dis-cursos, os participantes pretendem chegar a pontos de vista comuns, tentando convencerem-se mutua-mente de algo por meio de argumentos.

    Para Habermas (1997, p. 141), as questes morais e jurdicas referem-se aos mesmos temas e problemas; contudo com essenciais diferenas. Mesmo com pontos em comum, [...] a moral e o di-reito distinguem-se prima facie porque a moral ps-tradicional representa uma forma de saber cultural, ao passo que o direito adquire obrigatoriedade tam-

    bm no nvel institucional. Nesse sentido, o direito acompanhado por um sistema de coao institucio-nal. Habermas (1997, p. 141) defende a tese de que:

    [...] no podemos interpretar os direitos fundamentais, que aparecem na figu-ra positiva de normas constitucionais, como simples cpias de direitos morais e nem a autonomia poltica como sim-ples cpia da moral.

    Nesse sentido, normas gerais de ao rami-ficam-se em regras morais e jurdicas, o que, sob o ponto de vista normativo, significa que a autono-mia moral e poltica so co-originrias, podendo ser analisadas com o princpio do discurso (princpio D), o qual coloca em relevo o sentido das exign-cias de uma fundamentao ps-convencional. Pelo princpio do discurso, [...] so vlidas as normas de ao s quais todos os possveis atingidos poderiam dar o assentimento, na qualidade de participantes do discurso racionais. (HABERMAS, 1997, p. 142). Por isso, ainda segundo o autor, esse princ-pio [...] tem, certamente, um contedo normativo, uma vez que explica o sentido da imparcialidade de juzos prticos [...]; porm um princpio que [...] se encontra em um nvel de abstrao, o qual, ape-sar desse contedo moral, ainda neutro em relao ao direito e moral [...], pois se refere s normas de ao em geral.

    Pois o princpio moral resulta de uma especificao do princpio geral do dis-curso para normas de ao que s podem ser justificadas sob o ponto de vista da considerao simtrica dos interesses. O princpio da democracia resulta de uma especificao correspondente para tais normas de ao que surgem na forma do direito e que podem ser justificadas com o auxlio de argumentos pragmticos, tico-poltcos e morais e no apenas com o auxlio de argumentos morais. (HABERMAS, 1997, p. 143).

    A posio de Habermas em relao neutrali-dade do princpio da democracia no aceita por al-guns comentadores. Para Michelman, o princpio da

  • 40 Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007

    Marcio Giusti Trevisol

    universalizao e o princpio do discurso caracteri-zam uma justificao poltica nos termos de um acor-do universal hipottico. um consenso hipottico, baseado em raciocnio correto, um teste substanti-vo, no apenas procedimental, na justificao de um conjunto de leis fundamentais [...] (MICHELMAN, 1998, p. 88), por exemplo, em uma constituio.

    Para compreendermos melhor a relao entre direito e moral, vamos utilizar a distino que Klaus Gnther realizou nesses dois mbitos. Gnther pre-ocupou-se com a relao entre a tica discursiva e o direito. Ele ocupa-se com a questo de juridificao, de aplicao do direito e, aqui, tambm com questo dos direitos humanos.

    A preocupao de Gnther entender como a tica discursiva diferencia direito e moral. Pelo Princpio de Universalizao (PU), exposto ante-riormente, as normas s podem encontrar assenti-mento entre os participantes de um discurso prti-co, se as conseqncias e os efeitos colaterais, que previsivelmente resultam de uma obedincia geral da regra controversa para a satisfao dos interes-ses de cada indivduo, forem aceitos sem coao por todos.

    A justificao moral ocorre pelo Princpio da Universalizao (PU). As normas s tero valida-de se todos os concernidos por essa norma puderem aceit-la sem coao e conseqncias colaterais. No existe um procedimento emprico para garantir a ob-servncia da norma. Caso uma norma estabelecida, consensualmente, no seja cumprida, viola-se o prin-cpio de reciprocidade.

    O direito, por outro lado, justifica-se pelo Princpio da Democracia (PD), isto :

    [...] s podem pretender validade legti-ma as leis jurdicas capazes de encontrar o assentimento de todos os parceiros de direito, um processo jurdico de nor-matizao discursiva. (HABERMAS, 1997, p. 145).

    A aplicao do direto impede que o princpio da reciprocidade seja quebrado via punio legal (coao).

    Assim, o Princpio da Democracia explica o sentido performativo da prtica de autodeterminao dos sujeitos do direito que se reconhecem mutuamen-te como membros iguais e livres de uma associao estabelecida livremente. Como Habermas (1997, p. 145) define, [...] o princpio da democracia no se encontra no mesmo nvel que o princpio da moral.

    Enquanto o princpio moral funciona como re-gra de argumentao para resolver questes morais, o Princpio da Democracia pressupe a possibilidade das questes prticas, mais precisamente nas funda-mentaes realizadas em discursos e que dependem da legitimao das leis. Assim, escreve Habermas (1997, p. 146, grifo do autor):

    Partindo do pressuposto de que uma formao poltica racional da opinio e da vontade possvel, o princpio da democracia simplesmente afirma como esta pode ser institucionalizada atravs de um sistema de direitos que garanta a cada um igual participao num processo de normatizaco jurdi-ca, j garantida em seus pressupostos comunicativos. Enquanto o princpio moral opera no nvel da constituio interna de um determinado jogo de argumentao, o princpio da democra-cia refere-se ao nvel da institucionali-zao externa e eficaz da participao simtrica numa formao discursiva da opinio e da vontade, a qual se realiza em formas de comunicao garantidas pelo direito.

    Outro aspecto a ser salientado que o princ-pio da democracia no deve apenas estabelecer um processo legtimo de normatizao, mas tambm orientar a produo do prprio mdium do direito. O princpio do discurso estabelece as condies s quais os direitos em geral devem satisfazer para se adequarem constituio de uma comunidade de di-reito e possam servir como mdium da auto-organi-zao dessa comunidade. Por isso, necessrio no somente criar um sistema de direitos, mas tambm a linguagem que permite comunidade entender-se como associao voluntria de membros do direito iguais e livres. Como escreve Dutra (2005, p. 214):

  • Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 41

    A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    [...] essa caracterizao do direito a partir da moral parece colocar o direito numa posio inferior, normativamente, quela da moral, j que haveria, na for-mulao de Heck, uma primazia norma-tiva da moral sobre o direito. Isso leva Habermas a ver na posio Kantiana com relao ao direito um certo platonismo. Habermas prope uma relao de com-plementaridade [Ergnzungsverhltnis] entre moral e direito.

    Desse modo, como complemento da legiti-midade do direito, a moral necessria, [...] pois uma ordem jurdica s pode ser legtima, quando no contrariar princpios morais. (HABERMAS, 1997, p. 140-141). Contudo, para Habermas, a legi-timidade do direito no se esgota apenas na moral. Percebemos que Habermas se distancia de Kant, isto , para Kant, toda a legitimidade jurdica, como j analisamos anteriormente, advm da possibilidade de converter qualquer dever jurdico em dever mo-ral. Assim, a legitimidade jurdica fica devedora, completamente, de uma legitimidade que a precede e que lhe anterior.

    Seguindo o pensamento de Dutra, Habermas considera que a validade jurdica comporta uma gama maior de razes do que aquelas permitidas no mbito moral. Alm de no ferir regras morais,

    [...] a complexa pretenso de validade de normas jurdicas pode ser entendida como a pretenso de levar em conta, em primeiro lugar, os interesses parciais afirmados estrategicamente, de modo que estes se combinem com o bem co-mum; em segundo lugar, de recuperar os princpios universalistas de justi-a no horizonte de uma fora de vida cunhada por constelaes particulares de valores. (DUTRA, 2005, p. 219).

    Prossegue Dutra (2005, p. 220) que:

    Por ser um sistema de ao, o direito no pode adiar, indefinidamente, o re-gramento de comportamento da ao, tendo que estabelecer normas sobre matrias a respeito das quais ainda no h consenso moral, tais como, o aborto,

    a eutansia, a doao de rgos, o uso de embries humanos, a pena de morte, etc. Assim, no Cdigo Penal Brasileiro, atualmente em vigor, o adultrio con-siderado crime; j, no atual projeto do atual Cdigo Penal que tramita no congresso, tal crime no existe mais. As duas regulamentaes da matria podem ser consideradas legtimas, pois expressam consensos parciais da socie-dade naquele momento. Da mesma for-ma, podem ser consideradas legtimas a proibio constitucional da pena de morte no Brasil e sua permisso em al-guns Estados americanos, pois no h, at o presente momento, um consenso moral sobre a matria.

    Por isso, para Habermas, so muitas as razes que compem a legitimidade do direito, a saber, ra-zes morais, tico-polticas e pragmticas. As ques-tes morais devem ser tratadas de um ponto de vista estritamente normativo, em que devemos considerar o interesse simtrico de todos os envolvidos:

    [...] uma norma s justa, quando to-dos podem querer que ela seja seguida por qualquer pessoa em situao seme-lhante. Mandamentos morais tm a for-a semntica de imperativos categri-cos ou incondicionais. (HABERMAS, 1997, p. 200).

    Nesse aspecto, analisamos os interesses gene-ralizveis, que abrangem uma comunidade de comu-nicao no circunscrita por determinados valores ou costumes. preciso que seja possvel o entendimento e o consenso a respeito das regras morais.

    As questes tico-polticas buscam a clareza sobre uma forma de vida e seus ideais orientadores. Trata-se do modo como uma sociedade quer compor sua identidade, ou seja, como essa sociedade preten-de se caracterizar.

    As questes pragmticas colocam-se quando os fins do agente se tornam problemticos ou quan-do o agente no consegue encontrar os meios ade-quados para executar suas referncias. Acontece, ento, a formulao de reconstruo hipottica, sob a forma de imperativos condicionais. No entan-

  • 42 Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007

    Marcio Giusti Trevisol

    to, o questionamento sobre os valores aponta para questes tico-polticas (DUTRA, 2005, p. 221). Portanto, o direito, para Habermas, visa resolver o problema das sociedades modernas de como inte-grar socialmente o mundo da vida em si pluraliza-dos e profanizados. O direito na modernidade ganha fora jurdica para a sano, porm esta sano deve ser reconhecida pelos atores que agem livremente na sociedade. A integrao social garantida pelo direito fruto das alianas e do consenso alcanado por in-termdio do agir comunicativo. A fora integradora do direito extrada da manifestao democrtica dos seus atores.

    4 CONCLUSO

    No presente artigo, procuramos apontar a legi-timidade do direito para Habermas. O autor defende a neutralidade do princpio do discurso em relao ao direito e a moral; contudo assegura uma relao de complementaridade entre eles. As sociedades mo-dernas organizam-se em forma de Estados. A ordem formulada normativamente obedecendo a um orde-namento jurdico. Essa estrutura moderna de enten-der e legitimar o ordenamento jurdico difere-se das sociedades tradicionais, nas quais o direito estava relacionado autoridade sagrada. A legitimidade do direito nas sociedades tradicionais estava ligada fi-

    gura do sagrado, porm, nas sociedades modernas, o ordenamento jurdico deixou de ser legitimado pela ordem sagrada, o que ocasionou um pluralismo de opinies e diferentes formas de conceber a integra-o social.

    Por isso, na modernidade, surge a necessida-de de que o fardo da integrao social se transfira da autoridade religiosa para a fundamentao por meio do agir comunicativo, isto , o entendimento dos atores a respeito das normas e leis vlidas para a integrao social. O direito passa a ser garantido pelo Princpio da Democracia, isto , s devem pre-tender validade legtima as leis jurdicas capazes de encontrar o assentimento de todos os parceiros do direito em um processo jurdico de normatizaco discursiva.

    O direito, nessa medida, no deve derivar de um direito moral superior, mas deve emanar da auto-nomia dos cidados. A estabilidade do ordenamento jurdico garantida pelo procedimento democrti-co. Poderamos concluir este artigo dizendo que a proposta habermasiana procura legitimar o direito a partir de um processo democrtico, no qual os desti-natrios do direto se sintam, tambm, como formu-ladores e participantes do processo de elaborao do direito. Isso garante legalidade e legitimidade ao di-reito, pois os destinatrios do direito o reconhecem como fora jurdica capaz de implantar sanes so-bre a sociedade.

    The legitimacy of the proposal in direct discurse of ethics

    Abstract

    The present article looks for to carry out a theoretical debate about the legitimation of right from the practice philosophy of Habermas. The study concentrates in analize like Habermas fundamentes the right from to communicative act, and so, of like distance the legitimation of right of moral. The habermasiana perspective develops in direction of found a principle morally neutral that may give legalized and legitimated to modern right. This principle will be called by Habermas of principle of the democracy which stem from principle of the speech. To arrive in this conception, Habermas carries out a detailed debate with a doctrine of right of Kant, in order to point out the possible flaws of kantiana theory and correct them with the theory of communicative act, present in Right and Democracy.Keywords: Right. Democracy. Moral. Speech. Communicative act.

  • Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 43

    A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    REFERNCIAS

    ALMEIDA, Guido Antnio de. Sobre o princpio e a lei universal do direito em Kant. Kriterion, 2006.

    APEL, K. O. La transformacin de la filosofia. Madrid: Taurus, 1985.

    BOBBIO, N. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

    ______. Teoria geral da poltica: a filosofia poltica e as lies dos clssicos. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

    DUTRA, D. J. V. Da fundamentalidade dos direitos sociais e ecolgicos na filosofia de Habermas. In: MLLER, Maria C.; CENCI, Elve M. (Org.). tica, poltica, e linguagem: confluncias. Londrina: Edies Cefil, 2004.

    ______. Kant e Habermas. A reformulao discursiva da moral kantiana. Porto Alegre: Edipucrs, 2002.

    ______. Razo e consenso. Uma introduo ao pensamento de Habermas. Pelotas: Ed. Ufpel, 1993.

    ______. Razo e consenso em Habermas. A teoria discursiva da verdade, da moral, do direito e da biotecnologia. Florianpolis: Ed. Ufsc, 2005.

    DWORKIN, R. Levando os direitos a srio. So Paulo: Martins Fontes, 2002.

    ______. O imprio do direito. So Paulo: Martins Fontes, 1999.

    GUDDENS, A. Poltica, sociologia e a teoria social. So Paulo: Ed. Unesp, 1998.

    GNTHER, K. The Sense of Appropriateness: application discourses in morally and law. EUA: Suny, University of New York Press, 1993.

    HABERMAS, J. A incluso do outro: estudos de teoria poltica. So Paulo: Loyola, 2002.

    ______. Conhecimento e interesse. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

  • 44 Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007

    Marcio Giusti Trevisol

    ______. Conscincia moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.

    ______. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. 2 v.

    ______. Sobre a legitimao pelos direitos humanos. In: MERLE, J.; MOREIRA, L. Direito e legitimidade. So Paulo: Landy, 2003. p. 67-82.

    ______. Era das transies. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003.

    ______. Mudana estrutural da esfera pblica. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003.

    ______. O discurso filosfico da modernidade. So Paulo: Martins Fontes, 2000.

    ______. Para a reconstruo do materialismo histrico. So Paulo: Brasiliense, 1990.

    ______. Teora de la accin comunicativa: Racionalidad de la accin y racionalizacin social. Madrid: Taurus Humanidades, 1992.

    KANT, I. Paz Perptua. So Paulo: L&MP, 1989.

    ______. Doutrina do direito. So Paulo: cone, 1993.

    ______. Fundamentao da metafsica dos costumes. Lisboa: Edies 70, 1986.

    ______. Teoria y prctica. Madrid: Tecnos, 1986.

    ______. The Metaphysisc of Morals. Cambridge: University Press, 1996.

    MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia Alem. So Paulo: Hucitec, 1984.

    MICHELMAN, F. Constitutional Authorship. In: ALEXANDER. Cititutionalism Philosophical foundations. Cambridge, 1998.

  • Espao Jurdico, Joaaba, v. 8, n. 1, p. 33-46, jan./jun. 2007 45

    A legitimidade do direito na proposta da tica discursiva

    MOREIRA, L. Com Habermas, contra Habermas: direito, discurso e democracia. So Paulo: Landy, 2004.

    SIEBENEICHLER, F. B. Jrgen Habermas: razo comunicativa e emancipao. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.

    TUGENDHAT, E. Lies sobre tica. Petrpolis: Vozes, 1996.

    VELASCO, M. tica do discurso: Apel ou Habermas? Rio de Janeiro: Faper/Mauad, 2001.

    WEBER, M. Economia e sociedade. Braslia: Ed. Universidade de Braslia, 1999.

    Recebido em 9 de dezembro de 2007Aceito em 7 de abril de 2008