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LÚCIA MACÊDO SALES A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A MUDANÇA NAS PRÁTICAS GERENCIAIS: O CASO DE GESTORES DO FUNDEF Dissertação apresentada à coordenação do Curso de Mestrado Profissional em Planejamento e Políticas Públicas do Centro de Estudos Sociais Aplicados da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Francisco Horácio da Silva Frota FORTALEZA - CE DEZEMBRO DE 2008

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LÚCIA MACÊDO SALES

A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A

MUDANÇA NAS PRÁTICAS GERENCIAIS: O CASO

DE GESTORES DO FUNDEF

Dissertação apresentada à coordenação do Curso de Mestrado Profissional em Planejamento e Políticas Públicas do Centro de Estudos Sociais Aplicados da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Francisco Horácio da Silva Frota

FORTALEZA - CE DEZEMBRO DE 2008

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LÚCIA MACÊDO SALES

A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A MUDANÇA NAS PRÁTICAS

GERENCIAIS: O CASO DE GESTORES DO FUNDEF

Dissertação apresentada à coordenação do Curso de Mestrado Profissional em Planejamento e Políticas Públicas do Centro de Estudos Sociais Aplicados da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Aprovada em : _____/ ______/ _________

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________ Prof. Dr. Francisco Horácio da Silva Frota

Universidade Estadual do Ceará Orientador

____________________________________________ Prof. Dr. Antônio Alberto Teixeira Universidade Estadual do Ceará

Titular

____________________________________________ Prof. Dr. Rui Aguiar

UNICEF - Oficial de Projetos Titular

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AGRADECIMENTOS

À Força Divina, que nos faz enfrentar a vida e crescer.

Aos professores da UECE/MPPPP, doutores Horácio Frota e Alberto Teixeira, pela

valiosa orientação, e em especial ao professor doutor Rui Aguiar pela atenção,

tempo dedicado e confiança demonstrada.

Aos gestores do FUNDEF, Isabel Magalhães, de Aquiraz, Marta Cordeiro, de

Eusébio e Marcelo Farias, de Maracanaú, pela grande contribuição na realização

deste estudo.

Aos meus pais, Luiz Claudino Sales e Maria Marques Macêdo, pelo dom da vida.

As minhas filhas Jardilina e Carolina, pelos valores éticos e espirituais que

construímos juntas.

A minha família, pelo apoio e compreensão nos momentos que deixamos de passar

juntos em função deste estudo.

A todos aqueles que tornaram este estudo possível.

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RESUMO

O presente estudo analisa a gestão municipal do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF), efetivada nos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú, no período compreendido entre 2005 até 2008. A análise da gestão do FUNDEF é relacionada aos quatro eixos operacionais da Lei de Responsabilidade Fiscal: planejamento, controle, transparência e responsabilização. A seleção da área de abrangência para o estudo considerou municípios situados na Região Metropolitana de Fortaleza e identificados nas categorias de pequeno, médio e grande porte. Para compor um quadro analítico do problema, esta pesquisa se desenvolve com base no método de estudo de caso, em face da sua viabilidade ante a natureza do objeto investigado, cuja análise de base qualitativa se destaca com vistas a alcançar os objetivos e hipóteses declaradas. O estudo concentra-se na discussão de categorias selecionadas, cujo referencial teórico orienta análises da realidade objetivada. Nessa lógica, o estudo da gestão acontece com base no pacto federativo mais recente quando o município adquire autonomia. Destaca-se nesse cenário a legislação vigente, com foco para a gestão do FUNDEF e sua relação com a Lei de Responsabilidade Fiscal, na qual os conceitos de planejamento, controle, transparência e responsabilização adquirem destaque. Para o desenvolvimento da pesquisa de campo, aplicou-se um questionário contendo perguntas abertas e direcionadas aos secretários municipais de Educação dos municípios integrantes da área de abrangência deste estudo. Os achados permitem confirmar a hipótese de que, apesar do aparato legal vigente, persistem incoerências na gestão da política municipal da educação, em especial, na gestão do FUNDEF. O planejamento das ações é desenvolvido no estilo tradicional, em que a participação da sociedade ainda não se efetiva. Outra hipótese que se pode confirmar é a de que o controle social por parte das instâncias representativas da sociedade ainda não se cumpre conforme previsto. A transparência na gestão do FUNDEF, também, não se verifica. A divulgação de informações burocráticas pela internet ainda não está acessível para grande parte da sociedade. Não se confirma, entretanto, a última hipótese levantada de que os impasses na gestão do FUNDEF persistem na responsabilização de gestores que fazem uso indevido de dinheiro público. Tal hipótese não foi confirmada pelos gestores participantes deste estudo. Considera-se, afinal, que a gestão municipal da educação com foco no FUNDEF, e relacionada aos quatro eixos da Lei de Responsabilidade Fiscal, apesar dos últimos avanços, ainda não alcançou a perspectiva democrática da universalização contida no determinante constitucional do direito do cidadão e dever do Estado, sendo o aprimoramento da gestão condição essencial para tal conquista. Palavras chaves: planejamento; controle; transparência; responsabilização.

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ABSTRACT

The present study analyzes the municipal management of the Fund for Maintenance and Development of Basic Education (FUNDEF), actualized in the cities of Aquiraz, Eusébio and Maracanaú, from 2005 to 2008. The analysis of the management of FUNDEF is related to the four operational axes of the Law of Fiscal Responsibility: planning, control, transparency and responsibility. The selection of the area of coverage for the study considered cities situated in the Metropolitan Region of Fortaleza and identified from the categories of small, medium and large size. In order to compose an analytical frame of the problem this research was carried out using the case study method, opposite to its feasibility concerning the nature of the studied object, whose qualitative basis is highlighted with the purpose of achieving the objectives and hypothesis stated. The study is concentrated on the discussion of selected categories in which the theoretical framework guides the analyses. In this sense, the study of management is done based on the most recent Federative pact in which the city acquires autonomy. The current legislation focused on the management of FUNDEF and its relation with the Law of Fiscal Responsibility is highlighted in this scenarium. For the development of the field research was applied a questionnaire containing open questions and directed to the Secretaries of Education of the involved cities covered in this study. The findings can confirm the hypothesis that, despite the existing legal apparatus, there remain inconsistencies in the management of municipal education policy, particularly in the management of FUNDEF. The planning of actions is developed in the traditional style in which the participation of society is not yet effective. Another hypothesis that one can confirm is that the social control by the representative bodies of the society still does not meet as planned. Transparency in the management of FUNDEF is not verified yet. The disclosures of bureaucratic information on the internet is not accessible to large part of society. It is not confirmed, however, the last hypothesis that the deadlock in the management of FUNDEF persists because the justice did not meet the accountability of managers who make improper use of public money. This hypothesis is not confirmed by the managers participating in this study. It is considered, after all, that the analyzed management of municipal education, from the perspective of managing FUNDEF and related to the four axes of the Fiscal Responsibility Law, despite recent progress, has not reached yet a democratic view of universalization contatined in the constitutional determinant of citizen's right and duty of the State, being the improvement of management and the participation in society essential for this achievement. Key-words: planning, control, transparency, responsibility.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

CF/88 - Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988

DERE - Delegacia Regional de Educação

FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

FPE - Fundo de Participação dos Estados

FPM - Fundo de Participação dos Municípios

FUNDEF - Fundo de Manutenção do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério

FUNDEB - Fundo de Manutenção do Ensino Básico e Valorização do Magistério

IBAM - Instituto Brasileiro de Administração Municipal

IDM - Índice de Desenvolvimento Municipal

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano

IDS-R - Índice de Desenvolvimento Social de Resultado

ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

IGP - Índice Geral de Preços

IPEC - Instituto de Previdência do Estado do Ceará

IPECE - Instituto de Pesquisa do Ceará

IPVA - Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores

IPLEXP - Imposto sobre Produtos Industrializados, Proporcional às Exportações

IPTU - Imposto Predial e Territorial Urbano

ISS - Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISQN)

ITBI - Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis

LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LOA - Lei Orçamentária Anual

MPE - Ministério Público dos Estados

MPU - Ministério Público da União

PIB - Produto Interno Bruto

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

RMF - Região Metropolitana de Fortaleza

PPA - Planos plurianuais

SEDUC - Secretaria de Educação Básica (Ceará)

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SEPLAG - Secretaria de Planejamento e Gestão (Ceará)

SUS - Sistema Único da Saúde

TCM - Tribunal de Contas dos Municípios

UNDIME - União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação

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LISTA DE QUADROS

1 Processo de Planejamento Segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal .. 49

2 Planejamento Situacional Sistemático ...................................................... 51

3 Indicadores de Desenvolvimento do Município – Aquiraz ......................... 56

4 Indicadores de Desenvolvimento do Município – Eusébio ........................ 58

5 Indicadores de Desenvolvimento do Município – Maracanaú ................... 59

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SUMÁRIO

1 2 2.1 2.2 2.3 3 3.1 3.2 3.3 4 4.1 4.2 4.3 5 5.1 5.2 5.3 5.4 5.5 5.6

INTRODUÇÃO ......................................................................................... O PERCURSO DA INVESTIGAÇÃO ...................................................... As Categorias Analíticas no Contexto do Novo Ordenamento Jurídico ................................................................................................... O Estudo de Casos como Recurso Metodológico .............................. Estrutura da Dissertação ....................................................................... O ESTADO BRASILEIRO SOB O ENFOQUE DA JUSTIÇA FISCAL .... Definições, Características e Funções do Estado .............................. Fundamentos da Justiça Fiscal, Orientadores da Gestão Pública Brasileira ................................................................................................. A Gestão Municipal no Brasil através do Tempo................................. NOVO ORDENAMENTO PARA A GESTÃO MUNICIPAL DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO ..................................................................... Educação no Brasil: Trajetória de Exclusão Rumo à Perspectiva Inclusiva .................................................................................................. O FUNDEF como Estratégia de Fortalecimento da Política Educacional no Brasil ............................................................................ Matriz Operacional da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF): Planejamento, Transparência, Controle e Responsabilização ..........

A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A MUDANÇA NAS PRÁTICAS GERENCIAIS DO FUNDEF: O CASO DOS MUNICÍPIOS DE AQUIRAZ, EUSÉBIO E MARACANAÚ ............................................. Indicadores Básicos Municipais: Aquiraz, Eusébio e Maracanaú ..... A Gestão Municipal do FUNDEF sob a Lógica da Responsabilidade Fiscal: Breve Perfil Profissional dos Gestores de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú ........................................................................................... O Planejamento das ações do FUNDEF e sua Correspondência às Exigências da LRF: a Compreensão dos Gestores de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú ............................................................................. O Exercício do Controle das Ações do FUNDEF como Prática Sistemática Orientada pela LRF nos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú ............................................................................. Mecanismos Empregados pela Gestão Municipal para a Transparência das Ações do FUNDEF nos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú ............................................................................. Experiências de Responsabilização de Gestores, conforme Determinantes da LRF Relacionados à Execução do FUNDEF nos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú.....................................

11 15 16 16 17 19 19 23 25 35 35 39 42 55 55 60 62 65 68 70

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CONSIDERAÇÕES FINAIS: A NECESSIDADE DE NOVO COMPORTAMENTO ............................................................................... REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................ APÊNDICE ............................................................................................... ANEXOS ..................................................................................................

73 81 86 88

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1 INTRODUÇÃO

A gestão pública municipal da política de educação, no atual contexto,

encontra no “Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do

Magistério” (FUNDEF) os mecanismos essenciais para ultrapassar os limites

históricos da exclusão e evoluir para o acesso universalizante com qualidade? A Lei

de Responsabilidade Fiscal tem determinado mudanças nas práticas gerenciais do

FUNDEF?

A insatisfação com respostas para estas perguntas, advindas de noções

formuladas pelo senso comum, animou o desenvolvimento deste estudo, no qual a

busca de fundamentos teóricos, associados aos dados da realidade, viabilizou a

consolidação deste relatório de pesquisa.

As mais recentes transformações mundiais e seus impactos na

necessidade de aprimoramento contínuo da gestão das políticas sociais, pela via do

bom uso do dinheiro público, está presente na pauta das discussões em todo o

mundo.

No caso brasileiro, a história registra episódios em que a má gestão

estatal produziu, por vez, estruturas ineficientes, gastos excessivos, desvio de

dinheiro público, arrecadação comprometida e insatisfação popular com serviços

públicos ineficazes. Tal insatisfação é acentuada mais ainda com a cobrança de

impostos de valores elevados, não correspondendo em eficiência, eficácia e

efetividade à lógica constitucional que declara o direito do cidadão e o dever do

Estado, no trato das políticas públicas de educação, saúde, assistência social, dentre

outras (DOWBOR, 2OOO).

Diante dessa conjunção de problemas, a esfera municipal assumiu

destaque, em virtude da descentralização político-administrativa, determinada pela

Constituição Federal de 1988, sendo alvo de atenção pelas responsabilidades

12

diretas que lhe foram atribuídas em face do redesenho do Estado ante o novo pacto

federativo.

As novas competências e atribuições municipais na gestão de políticas

públicas no Brasil acontecem num cenário de esgotamento da capacidade de a

União centralizar, sob sua gestão, problemas complexos e extensos, além de se

revelar determinante para a garantia da efetivação do processo democrático

constitucionalmente almejado.

No caso mais específico da gestão municipal da política de educação, os

desafios mostram-se gigantescos, a começar pela longa história de restrição ao

acesso da população a esse serviço, cujos determinantes excludentes fizeram

acumular gerações e gerações de analfabetos, destituídos das condições objetivas

de exercício da cidadania.

Mesmo depois das inovações gerenciais, postuladas pela nova Carta

Constitucional, e das leis complementares, a exemplo do Fundo Nacional de

Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF),

persistem dados de exclusão e denúncias acerca da inoperância gerencial, o que

concorre para preservar fragilidades no ensino/ aprendizagem, estando ainda

distante o alcance dos critérios de qualidade na educação pública do Brasil.

Como se não bastassem tais dificuldades, a sociedade brasileira, via de

regra, se vê perplexa diante das fraudes praticadas por gestores inescrupulosos no

trato do dinheiro público, enquanto persistem restrições de toda ordem para o

cumprimento do preceito constitucional que declara no campo da educação a

garantia do dever do Estado e o direito do cidadão.

Em face de tais dificuldades, e mesmo com um extenso aparato legal

vigente, inibidor das distorções na gestão do dinheiro público, o País edita, no ano

2000, sob a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, a Lei de

Responsabilidade Fiscal.

13

Nesse contexto, referida Lei Complementar passa a ser questionada em

vários aspectos, principalmente no que tange a sua inconstitucionalidade por ferir a

autonomia municipal na gestão do dinheiro público.

Diante desse impasse e considerando as dificuldades observadas no

campo da gestão municipal da política de educação, estruturou-se esta pesquisa,

privilegiando-se o tema “A Lei de Responsabilidade Fiscal como mecanismo de

controle gerencial do FUNDEF”

Este estudo se justifica, ainda, por suas possibilidades de provocar um

debate sobre a gestão pública na perspectiva do cumprimento dos determinantes da

Lei de Responsabilidade Fiscal. Ao definir seus eixos estruturantes (planejamento,

controle, transparência e responsabilização), a Lei de Responsabilidade Fiscal

expressa novos desafios aos gestores públicos e também para a sociedade de modo

geral. Daí a relevância desta pesquisa para a sociedade, que paga tributos e almeja

serviços públicos de qualidade.

No que diz respeito ao Estado, este estudo mostra-se relevante por

convocar a participação de gestores municipais para um diálogo que articula à

legislação (LRF e FUNDEF) as experiências vivenciadas no cotidiano da

implementação da política de educação municipal.

Para a academia, esta pesquisa assume relevância, por focalizar um tema

que, apesar de despertar uma série de questionamentos, ainda permanece nebuloso

em suas noções explicativas.

Tais considerações convergiam para a formulação da hipótese de que,

apesar de todo aparato legal vigente, as incoerências na gestão municipal da política

de educação persistem, porque o planejamento das ações do FUNDEF não

corresponde às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal, no que concerne à

participação popular.

14

Outra hipótese é a de que a sociedade ainda não evoluiu para o exercício

do controle das ações do FUNDEF, comprometendo a sistemática orientada pela Lei

de Responsabilidade Fiscal, nesse sentido.

Ainda se levanta a hipótese de que a gestão pública municipal demonstra

fragilidades na adoção de mecanismos gerenciais capazes de promover a

transparência das ações do FUNDEF.

A última hipótese levantada é a de que os impasses na gestão municipal

dos recursos do FUNDEF persistem, uma vez que os responsáveis permanecem

impunes, preservando-se, com efeito, o antigo viés cultural da apropriação do

dinheiro público ou mesmo da ineficiência gerencial.

Para desvelar tais hipóteses, esta pesquisa adota a metodologia do

estudo de caso, com a seleção de três municípios cearenses - Aquiraz, Eusébio e

Maracanaú - cujos agentes sociais na função de gestores públicos se inserem como

participantes, os quais aderiram a essa perspectiva e contribuem respondendo a um

questionário de estilo qualitativo, no qual perguntas abertas viabilizam a estruturação

de um quadro de referências facilitador da leitura e análise de seus significados.

Os resultados obtidos na pesquisa possibilitam considerar que a gestão

municipal do FUNDEF, nos três municípios participantes, ainda não atingiu a

perspectiva democrática em face dos limites inerentes à participação popular no

planejamento, da ineficácia dos mecanismos de transparência das ações e a

fragilidade dos conselhos e da própria sociedade no controle de suas ações.

15

2 O PERCURSO DA INVESTIGAÇÃO

A natureza do problema contextualizado neste estudo remete ao esforço

de análise no qual três componentes indissociáveis se articulam: a política pública

da educação, em sua trajetória excludente e nos seus mais recentes determinantes

para a lógica da inclusão; o aparato legal que norteia a gestão dessa política com

foco para o Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e

Valorização do Magistério (FUNDEF); e, por fim, sua aplicabilidade pela gestão

municipal, cujas contradições expressas em denúncias e instauração de Comissão

Parlamentar de Inquérito, dentre outros mecanismos legais, recomendam esta

análise. Para tanto, privilegia-se a fala dos gestores, correlacionando suas

experiências aos determinantes da Lei de Responsabilidade Fiscal, cujo conteúdo

norteia uma prática administrativa centrada nos procedimentos democráticos de

planejamento, transparência, controle e responsabilização.

O ideal de realizar este estudo deparou algumas restrições, cujos

impasses foram limitando avanços, de tal modo que foi necessário proceder a

ajustes ao projeto de pesquisa que originariamente o havia norteado.

Depois de muitas idas e vindas, considerando-se as dificuldades de toda

ordem, e também as possibilidades de superá-las, chegou-se a bom termo em novo

delineamento das ideias, de suas balizas e do percurso teórico e metodológico que

mais se apropriavam à sua consolidação.

Ultrapassados os impasses iniciais, e consideradas todas as

possibilidades de efetivar este estudo, seus caminhos passam a ser delineados,

descritos e analisados ao longo do trabalho.

16

2.1 As Categorias Analíticas no Contexto do Novo Ordenamento Jurídico

A primeira dificuldade enfrentada concernente ao problema que deu

margem para a formalização deste ensaio, estava centrada na definição das suas

categorias analíticas. A principio, três horizontes se expressaram como

possibilidades: o enfoque legal em que categorias de justiça e responsabilização,

formuladas no campo do Direito, se faziam pertinentes. No mesmo grau de

importância, mostravam-se também as noções de Estado, município e gestão

pública, como também era necessário destacar os componentes da gestão do

FUNDEF a partir com base nos quatro elementos gerenciais que dão visibilidade ao

exercício da responsabilidade fiscal, centrados nos conceitos de planejamento,

transparência, controle e responsabilização.

Tendo esse delineamento como norte, compreendeu-se também que não

seria possível prescindir de um debate de modo especial sobre a política pública de

educação, muito embora as considerações sobre seu desempenho no País

estivessem já contidas na discussão que norteia a criação do FUNDEF.

Uma vez apreendidas noções, delinearam-se as trilhas para balizar

caminhos rumo à consolidação do presente experimento.

2.2 O Estudo de Casos como Recurso Metodológico

Segundo Gil (1999, p. 42), a pesquisa é um “processo formal e

sistemático de desenvolvimento do método cientifico. O objetivo fundamental da

pesquisa é descobrir respostas para problemas mediante o emprego de

procedimentos científicos”.

A realização deste estudo foi possível pela escolha dos caminhos que

iriam corresponder aos objetivos pretendidos e às hipóteses formuladas. Nessa

lógica, mostrou-se imprescindível a realização de pesquisas do tipo bibliográfico,

documental e de campo.

17

A pesquisa bibliográfica centrou-se nos estudos clássicos e

contemporâneos dedicados às categorias inseridas na problemática investigada.

Sendo assim, os conceitos de Estado, Município, Justiça Fiscal, Gestão Pública e

Educação configuram temas centrais e perpassam todo o texto.

A pesquisa documental foi mais um recurso do qual se lançou mão,

mostrando-se imprescindível a perspectiva sobre a Constituição Federal de 1988, a

Lei do Fundo Nacional do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério

(FUNDEF) e acerca da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Como método facilitador para a consolidação desta pesquisa, o Estudo de

Caso configurou-se o mais apropriado por sua abordagem de estilo qualitativo.

O estudo de caso, em sua particularidade, só pode aspirar à cientificidade integrada num processo de pesquisa global onde o papel da teoria não é deformado, onde a crítica epistemológica dos problemas e dos conceitos não é negligenciada. (BRUYNE, HERNAN e SCHOUTHEETE, 1990, p. 225).

Apesar das limitações evidenciadas na aplicabilidade cientifica do estudo

de caso, por seu caráter particularizante e pelo fato de seu poder de generalizações

ser restrito, neste estudo, é possível adotá-lo num esforço de associação dos

fenômenos pela análise da relação entre o legalmente instaurado e o

gerencialmente conduzido, ou seja: é possível analisar a aplicabilidade da Lei de

Responsabilidade Fiscal, sob a gestão municipal do FUNDEF, por meio da fala dos

agentes sociais (secretários municipais de educação), em resposta às perguntas

elencadas no instrumental idealizado para dar conta dos objetivos deste estudo e

também relacionados às hipótese formuladas.

2.3 Estrutura da Dissertação

Este estudo está concebido em um conjunto de matérias sumariadas de

modo sequencial, distribuídas em capítulos complementares e interdependentes.

Nessa perspectiva, ao se concluir o primeiro enfoque onde se detalham os aspectos

18

metodológicos e técnicos essenciais, a pesquisa avança rumo a sua consolidação,

em mais três capítulos.

O aparato legal que norteia o Pacto Federativo brasileiro em seu principio

de justiça fiscal é o tema que abre o terceiro capitulo. Os itens subsequentes se

articulam em torno do tema selecionado, a começar pelas definições, características

e funções do Estado, seguindo-se para uma abordagem em torno dos fundamentos

da justiça fiscal que orientam a nova lógica da gestão pública brasileira, culminando

com a descrição e análise da história da gestão municipal no País.

O quarto seguimento parte para o enfoque legal, que norteia a gestão

municipal. Aqui, o interesse se volta para o campo da política pública de educação e,

para tanto, se apresenta breve recuperação histórica de sua trajetória excludente e

os novos rumos que a educação pública trilha após a Constituição Federal de 1988,

com sua perspectiva inclusiva. É então que esta pesquisa destaca o Fundo Nacional

de Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF), cuja iniciativa veio

normatizar processos da gestão com vistas à garantia de inclusão e qualidade do

ensino público no País. Destaca-se, por fim, o suporte legal materializado na Lei de

Responsabilidade Fiscal, que emerge no ano 2000, como esteio para a conduta dos

gestores na aplicação do dinheiro público, fazendo-se uma relação especial com a

administração educacional com base nas diretrizes do FUNDEF, originada na sua

matriz operacional.

Esta pesquisa prossegue com o quinto módulo, o qual se descreve, com

suporte no método de estudo de caso, as experiências da gestão do FUNDEF nos

Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú, com foco para a aplicabilidade da Lei

de Responsabilidade Fiscal, em seus quatro eixos operacionais (planejamento,

transparência, controle e responsabilização).

Com apoio dos elementos exposto, desenvolve-se esta dissertação.

19

3 O ESTADO BRASILEIRO SOB O ENFOQUE DA JUSTIÇA FISCAL

Para descortinar o objeto de estudo desta pesquisa, este capítulo discute

os fundamentos do Estado brasileiro, o conceito de justiça fiscal, para depois

adentrar os mecanismos da Lei de Responsabilidade Fiscal, com especial interesse

para seus eixos operacionais práticos definidos na competência estatal de

planejamento, transparência, controle e responsabilização.

3.1 Definições, Características e Funções do Estado

Ao defrontar o desafio de compreender a dinâmica organizacional sob a

qual se estruturam e operam os entes federados brasileiros, o conceito de Estado se

mostra relevante, por sua intrínseca relação com o povo e o modo como se forma,

se conforma, se organiza e interfere na vida da sociedade nacional.

Sob o enfoque das exigências sociais, o Estado pode ser compreendido

como

Um agrupamento de pessoas que vivem, num território definido, organizado de tal maneira que apenas algumas delas são designadas para controlar direta ou indiretamente uma série mais ou menos restrita de atividades desse grupo, com base em valores reais ou socialmente reconhecidos e, se necessário, na força. (SILVA, 1986, p.416).

Os estudos e interpretações acerca do Estado extrapolam a noção de

agrupamento de pessoas vivendo em determinado território de modo organizado. No

campo das Ciências Jurídicas, predomina a noção de Estado associada a aspectos

norteadores da sociedade nacional, Estado-Nação, projeto nacional, condições de

soberania, dentre outros enfoques do Direito.

20

De acordo com a Ciência Política e o Direito Constitucional, conforme

abordado por Diniz (1998, p.404), citando outros autores, o Estado pode ser definido

como:

a) Organização ou sociedade político-jurídica que resulta do fato de um povo viver em um território delimitado e governado por leis fundadas num poder soberano (Celso Bastos); b) conjunto dos serviços gerais de uma nação (Lalende); c) nação politicamente organizada por leis próprias; d) completo de poderes políticos de uma nação; e) divisão territorial de certos países, como os Estados Unidos da América do Norte, o Brasil e Outros.

Segundo Ferreira (1986, p. 214), o Estado é um organismo

político-administrativo que, como nação soberana ou divisão territorial, ocupa um

espaço físico determinado, é dirigido por um governo próprio e se constitui pessoa

jurídica de direito público, internacionalmente reconhecida.

Com base nos conceitos destacados, pode-se identificar alguns

elementos típicos do Estado, tais como: resulta de um povo ou nação organizada;

apresenta uma estrutura administrativa; possui governo próprio e tem soberania

sobre determinado território.

Meirelles (1993) considera como elementos indissociáveis do Estado o

povo, o território e um governo soberano.

[...] é a sua expressão política do comando, de iniciativa, de fixação de objetivos do Estado e de manutenção da ordem jurídica vigente. O Governo atua mediante atos de soberania ou, pelo menos, de autonomia política na condução dos negócios públicos. (p. 60).

Outra concepção destaca o Estado como instância do poder político da

comunidade, “é organizado com a finalidade de harmonizar sua atividade, de modo

a promover e satisfazer a prosperidade pública, ou seja, o bem-comum”. (KOHAMA,

1989, p.17).

As expressões “bem-estar social” e “prosperidade pública”, no entanto,

remetem ao conceito de Estado do Bem-Estar, originado do Welfare State, ou seja, o

Estado assistencial que, segundo Diniz (1998, p.409), “garante tipos mínimos de

21

renda, alimentação, saúde, habitação e educação a todos os cidadãos, como direito

político”.

O Estado do Bem-Estar é o sistema econômico baseado na livre

empresa, mas com acentuada participação do poder público na promoção de

benefícios sociais. Seu objetivo é proporcionar ao conjunto de cidadãos padrões de

vida mínimos, desenvolver a produção de bens e serviços sociais, controlar o ciclo

econômico e ajustar o total da produção, equilibrando os custos e as rendas sociais

(SANDRONI, 1994, p. 127).

Considerando-se as necessidades públicas, ao Estado são atribuídas

responsabilidades. Sob este enfoque, o Estado “deve ser estudado como um

sistema de funções que disciplinam e ordenam os meios para atingir determinados

objetivos e como um conjunto de órgãos destinados a exercer estas funções”.

(SILVA, 1996, p. 20).

Ao longo de um decurso histórico, e em diferentes sociedades, as funções

do Estado evoluíram, ultrapassando a missão de assegurar a ordem e a justiça,

passando também para assumir a condução de políticas públicas, dentre elas as de

previdências e assistência social, educação e saúde (DEODATO, 1997, p. 6).

As transformações nas funções do Estado brasileiro são explicadas por

Pereira e Spink (1999), como um reflexo das pressões sociais, políticas e

econômicas, acentuadamente após o fim da guerra fria e o conseqüente fim das

disputas dos regimes políticos socialista e capitalista. Estas mudanças “sinalizam

evidente propensão no sentido de um retorno as suas atividades clássicas,

acrescidas do papel regulador da economia e protetor dos direitos sociais”.

(PEREIRA e SPINK, 1999, p.19).

A concepção aristotélica de Estado já previa suas finalidades centradas

na missão de promover a segurança para a manutenção da ordem política,

econômica e social, como também com a finalidade de promover o desenvolvimento

capaz de garantir o bem comum (SILVA, 1996, p.20).

22

A concepção marxista de Estado concorre para destacar seu caráter de

poder instituído para a dominação de certas classes sobre as outras (SILVA, 1996,

p. 20). Tal ideia orienta o pensamento da Ciência das Finanças, segundo a qual ao

Estado compete promover defesa, justiça, diplomacia e obras públicas. Sob este

enfoque, as funções públicas são consideradas um mal necessário e orientam as

teorias mais modernas das finanças funcionais, do Estado Intervencionista, que

influencia a formação e a distribuição de riquezas (SILVA, 1996, p.21).

Assim compreendendo, as funções do Estado emergem da existência das

necessidades públicas que se diferenciam das necessidades gerais. As de teor

públicas são aquelas que por sua natureza só encontram satisfação eficaz pela ação

coordenada do grupo, sendo, portanto, satisfeitas pela prestação de serviços

públicos, isto é, quando o Estado institui ou mantém um regime jurídico e econômico

especial, capaz de garantir sua obrigatoriedade, segurança, imparcialidade,

regularidade ou continuidade, a cargo de seus agentes ou por delegação à pessoa

sob sua supervisão (BALEEIRO, 1998, p.4).

Para atender às necessidades de caráter público, o Estado se estrutura

por intermédio de organismos essenciais à prestação de serviços públicos. Segundo

Kohama (1989, p.17), serviços públicos, em sentido amplo, incluem todos aqueles

prestados pelo Estado ou delegados por concessão ou permissão sob condições

impostas e fixadas por ele, visando à satisfação de necessidades da comunidade.

Daí concluir-se que não se justifica a existência do Estado, senão como entidade

prestadora de serviços e utilidades aos indivíduos que o compõem.

23

3.2 Fundamentos da Justiça Fiscal, Orientadores da Gestão Pública no Brasil

Nas obras clássicas, encontra-se comumente a palavra “justiça” entendida

em seu sentido subjetivo, indicando uma vontade ou virtude do homem. Os romanos

concebiam a justiça como realização do bem comum, “o bem enquanto fim

intersubjetivo do agir” (REALE, 2002, p.117). Com base nessa concepção, emergem

posições distintas sobre o conceito de justiça.

Há quem sustente a ideia de que a ordem social justa resulta da

satisfação do bem do indivíduo como individuo (individualismo). O pensamento

político e econômico do individualismo defende a tese essencial de que, se cada

homem cuidar do seu interesse e de seu bem, cuidará do interesse e do bem

coletivo. Cada homem, realizando o seu bem, realiza, mediante automático equilíbrio

dos egoísmos, o bem social ou o bem comum. Daí a tese de que o Estado deve ter

uma função primordial e essencial que se esgota praticamente na tutela jurídica das

liberdades individuais.

Outra posição contesta a possibilidade da harmonia espontânea entre o

bem do individuo e o bem do todo, sustentando a noção de que, ao contrário dos

pressupostos do individualismo, o bem do todo é condição indispensável para a

felicidade de cada um, portanto, a existência humana só adquire plenitude se

amparada pelos valores coletivos, situando-se a serviço do bem comum.

A terceira corrente advoga a noção de que o pensamento supera o

individualismo e o coletivismo, mostrando que entre o individualismo e a sociedade

não existe nem a harmonia espontânea que o individualismo sugere, nem a

intelectual subordinação que os valores coletivos idealizam. Entende que não há

possibilidade em se pensar uma combinação harmônica e automática dos egoísmos

individuais, mas também reconhece que a satisfação daquele que interessa à

sociedade, tomada como um todo, nem sempre representa a satisfação de cada

indivíduo, que possui algo de irredutível ao social (REALE, 2002, p.120).

24

Há uma tensão constante entre os valores do indivíduo e os da

sociedade. Daí a necessidade de se pensar na ordem social justa fundada sob a

Filosofia do Direito, cujos conhecimentos sugerem uma ordenação progressivamente

capaz de harmonizar forças antagônicas, equilibrando-as pelo sentido de justiça.

O aprofundamento teórico do conceito de justiça não interessa aos limites

deste estudo, no entanto, considera-se importante destacar concepções que

contribuíram para a doutrina mais recente, que fundamenta a legislação brasileira e

em especial a gestão pública da educação.

Dentro da realidade jurídica contemporânea, a palavra justiça não se

reduz a uma simples técnica da igualdade, da utilidade ou da ordem social. É a

virtude da convivência humana e significa, fundamentalmente, uma atitude e, nessa

perspectiva, entra em cena sua aplicabilidade pelo Estado, que no cenário atual está

associada efetivamente ao Poder Judiciário e aos seus órgãos, incumbidos de dar

solução justa aos casos que lhe são apresentados. Sendo assim, o conceito de

justiça se estende para a legislação, porque deve assegurar o direito de cada um e

aos órgãos do poder encarregados da operação da justiça.

Aplicar a justiça, para Rawls (2002), pressupõe uma concepção geral, da

qual dois princípios são expressões específicas, traduzidas em dois valores sociais:

liberdade e oportunidade. Com tal entendimento, renda e riqueza e as bases sociais

da autoestima devem ser distribuídas igualmente, a não ser que uma distribuição

desigual de um ou de todos esses valores concorra em vantagem para todos. (p.28-

37).

No Estado de Direito, o legislador é obrigado a promulgar leis justas,

portanto, a legislação deve ser compreendida no sentido de justiça social,

correspondendo à compreensão das necessidades de cada indivíduo durante da

hierarquia de necessidades essenciais da vida em sociedade.

A consagração da justiça fiscal se justifica pela ênfase dada aos aspectos

ligados ao relacionamento entre o indivíduo (contribuinte) e Estado (arrecadador),

sem no entanto comprometer o entendimento de que toda forma de justiça é,

25

fundamentalmente, associada à noção de justiça social, na medida em que se aplica

à vida em sociedade.

O conceito de justiça fiscal se apresenta como uma combinação entre

justiça social e justiça distributiva, ou seja, refere-se tanto à distribuição, entre os

grupos e indivíduos, do bem comum em seu sentido mais amplo, como à

contribuição de cada indivíduo ou grupo para com a coletividade, com base nos

preceitos de ética, nos princípios gerais do Direito e, sobretudo, nos princípios de

igualdade.

Para a compreensão dos porquês da necessidade de o Estado brasileiro

editar uma Lei de Responsabilidade Fiscal, é necessário inicialmente que se

compreendam os objetivos e atribuições do Estado no recolhimento de tributos e nos

seus mecanismos gerenciais para a aplicação, com justiça social, do dinheiro

público. Compreende-se, a princípio, que todos os atos da Administração Pública

têm por objetivo assegurar a satisfação regular das necessidades coletivas de

segurança, assistência social, saúde, educação, dentre outras, essenciais a que se

promova a qualidade de vida dos indivíduos, arrecadando e empregando

racionalmente e com base nos princípios de justiça fiscal os recursos públicos

mantidos sob o gerencialmente estatal.

3.3 A Gestão Municipal no Brasil através do Tempo

A concepção de município tem origens no Império Romano, em razão da

necessidade imperial de manter controle sobre os territórios circundantes,

sujeitando-os ao fiel cumprimento das Leis latinas, ou seja, ao Senado. A relação de

subordinação das comunidades circunvizinhas ao Império Romano era negociada

em troca de alguns privilégios, como o direito de contrair matrimônio (Jus

connubium), de praticar o comércio (Jus commercium) e a capacidade de eleger

representantes (Jus sufragii). Ao se submeter ao Senado, as pequenas

comunidades passavam a ter autonomia contida para exercitar essas funções,

emergindo assim a noção de município, aliado ao Império Romano ou confederado

(Foedus). As comunidades que não pactuavam essa relação com o Senado,

26

também não tinham direito ao voto (“Municipia cocritas”), ou seja, municípios cujos

habitantes eram privados do voto (IBAM, 2002, p. 2).

As primeiras noções de governo descentralizado foram formuladas pelos

romanos, “pois buscaram uma certa descentralização ao outorgarem a determinadas

cidades da Itália a faculdade de autogoverno, isto é, a condição de Municípios”.

(SILVA, 1986, p. 796).

A administração de um município no Império Romano era exercida por um

colegiado, composto de dois (Duumviri juridicundo) ou quatro (Quatuorviri

juridicundo) magistrados, com plenos poderes, especialmente o de justiça; (pelos

edis), ou servidores auxiliares, encarregados do setor administrativo e de polícia;

(pelo Questor ou Exator), encarregado da arrecadação de tributos; pelo curador

(Curator), ou fiscal dos negócios público; pelo defensor da cidade (Defensor

civitatis); pelos notários (Actuaria) e pelos escribas (ou copistas) dos documentos

públicos. Todos os servidores eram auxiliares do colegiado (IBAM, 2002, p. 2).

Com declínio do Império Romano e o início do feudalismo, os municípios

foram extintos pelos feudos. Tal processo ocorreu associado à substituição da vida

urbana pela rural, com a economia fundada na agricultura.

Após esse período de extinção dos municípios, no século XII d.C.,

começaram a se desenvolver as grandes cidades dos países europeus, como na

França, Itália, Alemanha e Inglaterra (ACQUAVIVA, 2000, p. 69).

O desenvolvimento do comércio levou ao florescimento das cidades e da

instituição municipal em várias partes da Europa. Em Portugal, “as instituições

preservaram a influência romana, valendo destacar a alcaide como representante do

poder central dos Conselhos dos Homens Bons, semelhantes às cúrias romanas”.

(SILVA, 1986, p. 102).

A introdução dos municípios na América, no entanto, se deu logo após a

descoberta ou a colonização, sendo que o próprio Cristóvão Colombo fundou o

primeiro, La Isabela, na atual República Dominicana, em 1494.

27

A história destaca o papel relevante desempenhado pelos municípios no

período colonial, exercendo algumas das raras funções governamentais da época,

inclusive a distribuição da justiça, de modo que “coube ao Município desempenhar o

papel de única manifestação do governo representativo nos domínios coloniais,

ainda que essa prerrogativa fosse limitada às classes dominantes representadas

pelos chamados “homens bons”. (SILVA, 1986).

Segundo essa lógica, o município brasileiro, como unidade político-

administrativa, “tem origem no modelo da República Romana, que a impôs às

regiões conquistadas, como Península Ibérica, de onde, naturalmente, chegou ao

Brasil-Colônia.

Inspirado no modelo romano, onde exercia funções políticas, legislativas e administrativas, o Município também recebeu influência de visigodos e árabes, chegando à comuna portuguesa para, então, vir a se implantar em terras brasileiras. (IBAM, 2002, p. 2).

Na mesma linha de raciocínio, Mello (2001, p. 80) sugere que o município

foi introduzido no Brasil, no princípio colonial, com base nas Ordenações Filipinas,

que transformaram os conselhos em câmaras, compostas de vereadores, com

funções administrativas, do procurador, espécie de advogado do município, dos

almotacés, com funções executivas subalternas, e dos juízes ordinários, com

jurisdição civil e criminal.

Destaca-se que “o regime municipal brasileiro foi implantado com o

Governo Geral, em 1549, na vigência das Ordenações Manuelinas, submetendo-se,

mas tarde, às Ordenações Filipinas (início do séc. XVII)”. (ACQUAVIVA, 2000, p.

874).

As Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas regeram o Brasil desde

seu descobrimento até a Independência. Transplantaram o modelo municipal

lusitano para o País, com as mesmas atribuições políticas, administrativas e

judiciais. Desta forma, os municípios tinham um presidente, três vereadores, um

procurador, dois almotacés, um escrivão, um juiz de foro vitalício e dois juízes

comuns, eleitos com os vereadores. Assim nasceu a administração da primeira vila

brasileira, a de São Vicente, em 1532. Este período do Império é considerado como

28

de grande imobilidade para os municípios, ante a centralização do poder imperial

(IBAM, 2002, p. 3).

De acordo com Acquaviva (2000, p. 123), a primeira Constituição

brasileira, do Império, de 1824, disciplinava as câmaras municipais, em seus artigos

167 e 168, in verbis:

Art. 167. Em todas as cidades e vilas ora existentes, e nas mais que para o futuro se criarem, haverá Câmaras, as quais compete o governo econômico e municipal das cidades e vilas. Art. 168. As Câmaras serão eletivas e contrapostas do número de vereadores que a lei designar; o que obtiver maior número de votos será presidente.

Deste modo, as câmaras eram eletivas e o exercício das funções

municipais não estava definido. O trabalho das câmaras consistia na formulação de

posturas políticas, na aplicação das rendas do município e na discussão das

próprias atribuições, que seriam estabelecidas por uma lei regulamentar. Não havia

sido, porém, assegurada na Constituição, nem na legislação complementar

ordinária, a autonomia do município, no sentido que veio a ter posteriormente.

A Constituição de 1891, segunda Constituição brasileira e primeira

Constituição republicana, “preservou, sem grandes detalhes, autonomia municipal”.

Seu artigo 68 diz: “Os Estados organizar-se-ão de forma que fique assegurada a

autonomia dos Municípios em tudo que diga respeito ao seu peculiar interesse”.

(MELLO, 2001, p. 81).

A autonomia municipal relativizada constitucionalmente ao modo subjetivo

(em tudo que lhe diga respeito ao seu peculiar interesse) mostrou-se débil (MELLO,

2000, p. 81).

(...) como nem a Constituição de 1891 nem qualquer outra lei complementar definiu o conceito de peculiar interesse dos Municípios, a autonomia destes foi extremamente débil em quase todos os Estados da federação. (MELLO, 2000, p. 81).

29

Sem diretrizes definidas, o município ficou sujeito aos interesses e às

feições que lhe desse o Estado (instrumento do coronelismo), tais como: (IBAM,

2002, p. 4).

− organizar as instituições municipais;

− definir a competência destas instituições;

− definir a composição do governo;

− definir os tipos de controle que exerceria sobre o município;

− nomear o chefe do Poder Executivo (apenas em 8 estados era eleito);

− denominar o Chefe do Executivo: em alguns, era prefeito, noutros,

intendente e, ainda noutros, presidente municipal; e

− sem exceção, manipular as finanças municipais.

Posteriormente, a Constituição de 1934, no seu artigo 17, tratou, de forma

bem mais abrangente, as bases da organização municipal, bem assim a eleição de

prefeitos e das câmaras municipais, normas sobre tributos e a arrecadação

respectiva, bem como a organização dos serviços de sua competência

(ACQUAVIVA, 2000, p. 875).

Deste modo, a Constituição de 1934 fortaleceu consideravelmente os

governos municipais (MELLO, 2001, p. 456).

Os fatos políticos dos anos 1930-1934 pressionaram Getúlio Vargas a

convocar uma assembleia constituinte, cujos trabalhos culminaram na Constituição

de 16 de julho de 1934. Restabelecia-se a Federação, reduzia-se a competência dos

estados, inclusive sobre a organização municipal, cuja autonomia adquiriu nível de

importância equivalente à da União e à dos estados, explicita claramente no artigo

13. (IBAM, 2002, p. 6).

A carta Política do Estado Novo, de 1937, com a ditadura estabelecida

por Getúlio Vargas, é considerada “notoriamente autoritária e centralizadora”. Tal

constituição “praticamente eliminou a autonomia municipal, ao impor a nomeação de

prefeitos e vereadores pelo Executivo estadual (ACQUAVIVA, 2000, p. 875).

30

Além disso, “foram suprimidos os Poderes Legislativos dos três níveis de

governo, os governadores estaduais passaram a ser chamados de interventores e

eram nomeados pelo presidente da República”. (MELLO, 2001, p. 82).

Após a deposição de Getúlio Vargas, a nova Assembleia Nacional

Constituinte restabeleceu a democracia e o federalismo. A Constituição de 1946, em

seu artigo 28, restaurou a autonomia municipal.

As raízes da autonomia municipal foram garantidas “pela eleição do

prefeito e dos vereadores, pela administração própria dos assuntos de seu peculiar

interesse, decretação e arrecadação dos tributos de sua competência e organização

dos serviços públicos locais”. (ACQUAVIVA, 2000, p. 875).

Nesse contexto, o município adquiriu nova configuração: inseriu-se na

divisão político-administrativa do País, ao lado da União e dos estados; prefeitos e

vereadores passaram a ser escolhidos por voto popular, gerenciam a arrecadação e

a utilização de cinco impostos; podem cobrar taxas por serviços prestados e

contribuições de melhorias. A intervenção estatal no município, anteriormente

arbitrária, passou a corresponder aos critérios condicionantes de atraso de

pagamento de dívida fundada ou de empréstimo garantido pelo Estado (IBAM, 2002,

p. 8).

O estabelecimento do regime militar, em 1964, afetou alguns aspectos da

autonomia municipal, bem como vários determinantes do processo político brasileiro.

A Constituição de 1967 e sua reforma de 1969, embora tenham mantido as

conquistas municipais que vinham da Constituição de 1946, foram minimizadas pela

centralização dos poderes na União (MELLO, 2001, p.103).

Regrediu-se ao sistema de nomear prefeitos para capitais, estâncias

hidrominerais e de municípios considerados de interesse da segurança nacional,

incluindo-se os de fronteiras e outros, onde se instalavam indústrias críticas para a

segurança, para os “deuses da época”. Deste modo, cerca de 180 municípios

perderam prerrogativas, só restabelecidas pela Emenda Constitucional de junho de

31

1982. Neste período, impediu-se que 42% da população brasileira tivessem o direito

de escolher seus prefeitos, por voto secreto e livre (IBAM, 2002, p. 9).

A Constituição brasileira de 1988 fortaleceu, sob vários aspectos, os

municípios. Uma de suas principais inovações em relação às constituições

anteriores foi situar o município como parte integrante da Federação, embora fosse

ponto pacífico para muitos doutrinadores a noção de que a Federação brasileira

compreendia as unidades municipais (IBAM, 2002, p. 10).

A atual Carta Magna liquidou a questão em seus artigos 1º a 18, onde

esclarece a autonomia dos Municípios da seguinte forma:

A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição. (art. 18, CF).

A competência dos municípios é tratada nos artigos 29, 29-A e 30 e 31 da

Constituição Federal de 1988, in verbis:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos. I – Eleição do Prefeito e Vice – Prefeito e dos Vereadores, para mandato de quatro anos, mediante pleito direto e simultâneo realizado em todo o País; II – Eleição do Prefeito e do Vice- Prefeito realizada no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao término do mandato dos que devam suceder, aplicadas as regras do artigo 77 no caso de Municípios com mais de duzentos mil eleitores; III – Posse do Prefeito e do Vice-Prefeito no dia 1º de janeiro do ano subseqüente ao da eleição; IV – Número de vereadores proporcional à população do Município, observados os seguintes limites: a) mínimo de nove e máximo de vinte e um nos Municípios de até um Milhão de habitante; b) mínimo de trinta e três e máximo de quarenta e um nos Municípios de mais de um milhão e menos de cinco milhões de habitantes;

c) mínimo de quarenta e dois e máximo de cinqüenta e cinco nos Municípios de mais de cinco milhões de habitantes;

V – O subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que

32

dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos: a) em Municípios de até 10.000 (dez mil) habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a 20% (vinte por cento) do subsídio dos Deputados Estaduais; b) em Municípios de 10.001 (dez mil e um ) a 50.000 (cinqüenta mil) habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a 30% (trinta por cento) do subsídio dos Deputados Estaduais;

c) em Municípios de 50.001 (cinqüenta mil e um) a 100.000 (cem mil) habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a 40% (quarenta por cento) do subsídio dos Deputados Estaduais;

Destaca-se o preceito constitucional no que se refere aos limites de

despesas municipais com a remuneração de vereadores:

Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributaria e das transferências previstas no § 5° do art. 153 e nos arts. 158 e 159 efetivamente realizados no exercício anterior.

Outro destaque que interessa a este estudo está contido no Art. 29-A § 1º,

§2º e § 3º, verbis:

§ 1° A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluindo o gasto com o subsídio de seus Vereadores. § 2° Constitui crime de responsabilidade do Prefeito Municipal. I - efetuar repasse que supere os limites definidos neste artigo; II – não enviar o repasse até o dia vinte de cada mês; ou III – enviá-lo a menor em relação à proporção fixada na Lei Orçamentária. § 3° Constitui crime de responsabilidade do Presidente da Câmara Municipal o desrespeito ao § 1° deste artigo.

Com a Constituição Federal de 1988, o conceito de município adquiriu

novos elementos. Como termo do Direito Administrativo, é assim descrito:

33

Pessoa jurídica de direito público interno de administração direta dotada, constitucionalmente, de autonomia político-administrativa, com capacidade de ter governo próprio e de legislar no âmbito de sua competência, para a consecução de seus interesses peculiares e realização de suas finalidades locais. (DINIZ, 1998, p. 324).

O conceito de município nesse novo ordenamento pode ainda ser

compreendido nos seguintes termos: “é a circunscrição do território do Estado na

qual cidadãos, associados pelas relações comuns de localidade, de trabalho e de

tradições, vivem sob uma organização livre e autônoma, para fins de economia,

administração e cultura”. (IBAM, 2002, p.01).

Outra definição ilustrativa da concepção de município o situa como a

“circunscrição administrativa autônoma do Estado, governada por um prefeito e uma

câmara de vereadores”. (FERREIRA, 1986, p.111).

Outra contribuição para o entendimento do município na

contemporaneidade brasileira comporta as seguintes considerações:

O município deve ser entendido como o espaço físico onde ocorre a produção de bens e serviços, a circulação de mercadorias, e onde realmente são implementadas todas as ações, sejam de origem da esfera Federal, Estadual ou Municipal, ou ainda, de origem privada. (MATIAS e CAMPELO, 2000, p.21).

Entendido como uma subdivisão politico-administrativa de um país, para

fins de desempenhar funções próprias de governo local o município apresenta ainda

as seguintes descrições:

Circunscrição territorial administrada por um prefeito, para atender a seus interesses e executar as leis emanadas dos vereadores eleitos pelo povo Conjunto orgânico de famílias, associações naturais que, reconhecidas pelo Estado, tornam-se legais. Área, mais ou menos conveniente, fixada sob autoridade estatal, para a execução local de funções consideradas de seu interesse. Corporação territorial intercalada do Estado, com governo próprio, que se realiza por meio de órgãos escolhidos e próprios, regulando, em seu próprio nome, os assuntos da comunidade local nos limites das leis e com auto-responsabilidade. Unidade geográfica divisionária do Estado, dotada de governo próprio para a administração centralizada de serviços estaduais e para o trato de interesses locais. Unidade autônoma federativa do Estado. (SILVA, 1986, p.796).

34

Essa abordagem privilegia a concepção da autonomia municipal em

termos práticos. Essa autonomia significa que o Governo Municipal não está

subordinado a qualquer autoridade estadual ou federal no desempenho de suas

atribuições exclusivas e que as leis municipais, sobre qualquer assunto de

competência expressa e exclusiva do município, prevalecem sobre a estadual e a

federal, inclusive sobre a Constituição Estadual em caso de conflito, como tem sido

da tradição brasileira, salvo alguns curto circuitos institucionais ao longo da história

(IBAM,2002,p.10).

Os municípios brasileiros nos últimos anos aumentaram as receitas

próprias de forma significativa. Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional,

baseados nos balanços de fim de exercício fiscal de 1989 (1° ano após a atual Carta

Magna) e 1997 (ultimo ano divulgado), houve um crescimento real médio anual

nesses oito meses, nas receitas tributárias próprias – IPTU, ISS, ITBI, taxas e

Contribuições de Melhoria de – 14,9% sendo de 31,1% para o IPTU, 10,6% para o

ISS, e 22,3% para as taxas. As transferências cresceram 8,6%, sendo de 9,7% para

o ICMS e de 8,3% para o FPM. Destaca-se o fato de que o crescimento de receita

tributaria própria ocorreu para todos os tipos de município. Para os pequenos (até

50.000 habitantes), o crescimento foi de 13,8%. Já para os médios (de 50.000 até

200.000 habitantes), foi de 16,1% e os grandes (acima de 200.000 habitantes)

cresceram 14,6% (BRASIL, STN, 1998).

35

4 NOVO ORDENAMENTO PARA A GESTÃO MUNICIPAL DA

POLÍTICA DE EDUCAÇÃO

Este capítulo apresenta elementos históricos, teóricos e também legais

que permitem a compreensão da realidade educacional brasileira mais recente, que

convergiu para a implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do

Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), matéria que,

associada ao conteúdo dos capítulos anteriores, se reveste de conhecimento

indispensável para o alcance dos objetivos que orientaram o delineamento deste

ensaio.

4.1 Educação no Brasil: Trajetória de Exclusão Rumo à Perspectiva Inclusiva

O desenvolvimento desta pesquisa pressupõe a perspectiva sobre a

trajetória da educação no Brasil, dos anos de 1930, em diante, com destaque para

os fatos que determinaram sucessivas mudanças no estilo da gestão do ensino.

São de longas datas os problemas vivenciados na área educacional

brasileira, a começar pela vinculação de recursos orçamentários destinados a essa

política, que só começou em 1921, na Conferência Nacional do Ensino Primário,

quando o governo sinalizou a necessidade de destinar um percentual dos impostos

arrecadados para área da educação.

Foi somente após a Constituição Federal de 1934, porém, que se

estabeleceu a determinação de percentuais (10% de impostos da União e dos

municípios e 20% dos estados e do Distrito Federal) para o setor, delineando-se

uma política educacional voltada a satisfazer as exigências do momento, quando a

formação de capital humano se mostrava indispensável para a promoção do

desenvolvimento econômico nos padrões da época.

36

Neste cenário desenvolvimentista, a educação adquiriu amplitude no

discurso governamental, por ser considerada indispensável para romper o ciclo de

dependência e provocar a integração de indivíduos e grupos no mercado de trabalho

emergente no período. Expandiram-se por esse tempo os programas de

alfabetização de adultos, formação de mão-de-obra, formação social e

desenvolvimento comunitário.

Entre o final da década de 1950 e início da década de 1960, a história

brasileira é marcada por um movimento de contra dependência e denúncia dos

modelos e programas importados.

Já sob a égide do regime militar instalado com o golpe de 1964, o País

viveu o desenvolvimento do sonho nacionalista. Desde então, substituiu-se a

concepção nacional desenvolvimentista pela internacionalização e modernização,

atendendo-se às exigências impostas pelas condições do capital estrangeiro.

Os fundamentos da educação brasileira nesse período da ditadura, mais

uma vez, associava a educação à formação de mão-de-obra para o desenvolvimento

econômico do País

A educação passou a ser concebida como instrumento capaz de promover, sem contradições o desenvolvimento econômico pela qualificação da força de trabalho, do que decorrera a modernização da produção e a redistribuição de renda. (KUENZER, 1992, p.42).

Os avanços do desenvolvimento capitalista pós-64 encontra sustentação

nos ideais de Taylor, Fayol e Ford, cujas teorias administrativas defendiam a

necessidade de maior produtividade para o alcance da maximização dos lucros,

objetivo maior da produção capitalista. A filosofia do modelo taylorista foi também

incorporada pela educação brasileira via Lei Nº. 5540/68, da Reforma Universitária,

e Lei Nº. 5692/71, da Reforma do ensino de primeiro e segundo graus. O artigo 59

da referida Lei manteve a obrigatoriedade de aplicação, na educação pública, das

receitas tributárias municipais, com a novidade de que estas receitas deveriam ser

destinadas com exclusividade para o ensino de primeiro grau. O mesmo artigo

37

determinava que 20% das transferências do Fundo de Participação deveriam ser

aplicadas no primeiro grau (IBID, 1992).

O ensino profissionalizante passou a ser obrigatório com a Lei 5.692/71,

para atender a uma política educacional compatível com os interesses políticos e

econômicos da época. Enfatizava o tecnicismo como resposta para as demandas

reprimidas da educação secundária e superior. Na análise de Saviani (1978), essa

política educacional foi um fracasso sob todos os aspectos, quer pedagógicos, quer

político-econômicos, ensejando, como consequência, a Lei Nº. 7044/82, que

extinguiu definitivamente a obrigatoriedade da formação profissional pelas escolas

de ensino regular, sinalizando para uma indefinida “preparação para o trabalho”.

As frequentes transformações legais até aqui destacadas, no que

concerne aos determinantes educacionais no Brasil, deixam pistas para a

compreensão de que toda conjunção de problemas verificada nos dias atuais no

campo da educação resulta de uma inconstância na legislação que sempre se

transformou com a finalidade de satisfazer a determinantes do capital em detrimento

de um projeto educativo que garantisse aos estudantes uma escola que lhes

permitisse dominar conteúdos básicos do conhecimento universal, condição mínima

para o exercício da cidadania.

Com origem nos anos de 1980, quando evoluíram os movimentos em

torno da redemocratização do País, esforços convergiram para a Constituição

Federal de 1988, a qual, no campo da educação, manteve a vinculação obrigatória

de recursos, ampliando de 13% para 18% a alíquota da União e mantendo os 25%

para os outros entes federados.

Em 1989, tomando por base os determinantes da Constituição Federal de

1988, os entes federados passaram a reformular suas constituições estaduais e

distrital e as leis orgânicas municipais, votadas desde 1990, e mantiveram o

percentual mínimo de 25% destinados aos gastos com a educação.

38

Um questionamento relevante que norteou as discussões sobre o

financiamento da educação brasileira, conforme os determinantes da Constituição de

1988, teve como foco a aplicação dos recursos da União mais direcionados ao

ensino superior do que ao ensino fundamental.

A Constituição Federal (1988) e a Lei de Diretrizes e Bases (1996), ao

estabelecerem regras para vinculação e aplicação de recursos públicos na

educação, ensejaram um permanente debate, no âmbito do qual, posições

antagônicas foram abertamente defendidas. De um lado, os que apresentam

argumentos críticos veementes contra a vinculação orçamentária para o setor, sob a

alegação de que essa prática engessa a estrutura orçamentária, impedindo o

Executivo de exercitar a liberdade para o investimento. Do outro lado, emergiram

pronunciamentos daqueles que defendiam a vinculação de percentuais

orçamentários, destinados à educação e à saúde como forma de o Estado garantir

minimamente as condições de investimento nessas políticas, independentemente

das crises econômicas que, via de regra, orientaram historicamente a redução de

percentuais orçamentários nessas áreas para fortalecer a economia, com destino de

verbas para a indústria (incentivos fiscais) ou mesmo para os banqueiros, por

diferentes motivos e mecanismos.

Como resultante de anos das discussões e embates no âmbito do

Legislativo, do Executivo e da sociedade civil, formou-se uma correlação de forças

que fez emergir a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei

Nº. 9.394, de 20/12/1996.

As alterações introduzidas pela Nova LDB geraram interpretações

diversas, balizadas, de um lado, pelo pensamento otimista exagerado dos que

acreditavam na força do aparato legal para transformar atitudes no campo da

educação nacional e, de outra parte, por manifestantes do ceticismo indignado, pelo

descrédito total das possibilidades de transformações efetivas nessa área, pelos

próprios determinantes históricos da cultura nacional, no contexto dos quais a classe

política se utiliza da consciência ingênua das massas em processos eleitorais, não

sendo, portanto, interesse formar massas educadas e esclarecidas (CASTRO,

2001).

39

Um entrave no período que precede à criação do FUNDEF, e que afetou

consideravelmente a área educacional, foi a Lei Kandir (Lei Complementar

Nº. 87/96), cujo propósito consistiu em desonerar o imposto sobre a circulação de

mercadorias, incidindo sobre a exportação de vários produtos. O objetivo da Lei

Kandir era fortalecer a competitividade para o setor exportador. Essa medida reduziu

ainda mais os recursos destinados à educação porque o prejuízo dos estados

exportadores chegou à ordem de R$ 3,6 bilhões, o que consequentemente reduziu o

valor dos 25% destinados à educação, concorrendo para um prejuízo de R$ 900

milhões, dinheiro que deixou de ser aplicado nas redes estaduais de educação no

período em destaque (CASTRO, 2001).

Em linhas gerais, os fatos aqui representados, com possíveis retoques e

acréscimos, expressa a trajetória da educação brasileira mais recente, o que permite

adentrar a seguir as discussões sobre o FUNDEF.

4.2 O FUNDEF como Estratégia de Fortalecimento da Política Educacional no

Brasil

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

Valorização do Magistério (FUNDEF) surgiu como fórmula ideal, prática e

engenhosa de revolucionar o ensino fundamental de modo consensual, a envolver

os quatro entes federados União, Distrito Federal, estados e municípios. Foi

instituído visando a garantir a destinação de recursos para a manutenção e

desenvolvimento do ensino fundamental, de forma a assegurar a universalização de

seu atendimento e a remuneração condigna do magistério, conforme as disposições

da Emenda Constitucional Nº. 14/96, regulamentada pela Lei Nº. 264/97, sendo o

montante total de recursos formadores do Fundo originário das seguintes fontes:

− 15% do Fundo de Participação dos Municípios – FPM;

− 15% do Fundo de Participação dos Estados – FPE;

− 15% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS;

− 15% do Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às

Exportações – IPLexp; e

40

− 15% do ressarcimento da União pela Desoneração de Exportações

(LC Nº. 87/96) e Complementação da União.

O montante da complementação da União ao FUNDEF é calculado com

base no valor mínimo nacional por aluno/ano, de maneira que os governos

estaduais, distrital e municipais localizados nos Estados onde o valor per capita

anual não alcançar esse limite mínimo, o Governo federal, por intermédio do Fundo

Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, assegura a diferença

correspondente, mediante crédito de parcelas mensais na conta específica do

FUNDEF, em favor de cada Estado, do Distrito Federal e de cada município

beneficiário, sendo tais valores transferidos de forma automática, como ocorre com

todos os repasses realizados ao FUNDEF.

Para os analistas (DAVIES, 2004), (MONLEVADE, 2003), o FUNDEF

constitui-se na principal ação governamental realizada pelo governo Fernando

Henrique Cardoso no campo educacional. Trata-se de instrumento da gestão

compartilhada entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, no

campo do financiamento da Educação, tendo sido criado para o alcance dos

seguintes objetivos:

− promover a justiça social ao beneficiar os municípios e estados mais

pobres do País;

− repartir com equidade os recursos da ordem orçamentária destinados

à educação, repartição esta feita com arrimo no censo escolar,

contabilizando alunos efetivamente matriculados no ensino

fundamental da rede pública;

− estimular a efetiva descentralização de responsabilidades e recursos

para a área educacional; e

− dar qualidade aos sistemas e subsistema de educação e, ao mesmo

tempo, promover uma real valorização do magistério, com garantias

para uma melhor remuneração e qualificação de professores

(AQUINO, 2001, p.17).

41

Na avaliação realizada pelo ex-ministro Paulo Renato de Souza, o

FUNDEF é assim percebido:

Antes do FUNDEF havia um desequilíbrio entre responsabilidades e recursos. Na distribuição de tarefas e recursos entre Estados e Municípios, a regra geral decorrente dessa falta de definição anterior era a de que onde estavam os alunos não estavam os recursos e onde estavam os recursos não estavam os alunos. (SOUZA, 2001, p. 20).

Dados mais recentes produzidos pelo Ministério da Educação confirmam

a importância do FUNDEF para o setor por seu potencial de expansão no

quantitativo de matrículas no ensino fundamental. Em 1995, as redes municipais

contavam com aproximadamente 12 milhões de alunos matriculados e os Estados

tinham por volta de 18 milhões de matrículas efetivamente contabilizadas. Depois de

dois anos da implantação do FUNDEF, foi possível observar um equilíbrio em torno

de 16 milhões de matrículas entre as redes estaduais e municipais. Logo depois,

entre os anos de 1994 e 2000, o percentual de alunos regularmente matriculados no

ensino fundamental foi consideravelmente ampliado de 89% para 97% num

demonstrativo da tendência ao alcance dos objetivos no sentido da universalização

do acesso de todos a educação no nível do ensino fundamental. (ib id, 2001).

No entender de Paulo Renato de Souza o acesso promovido pelo

FUNDEF decorre do processo de municipalização, o que declara nos seguintes

termos:

Nossa avaliação qualitativa demonstra, claramente que os Municípios estão passando por uma evolução no seu desempenho em nível superior ao dos Estados, mostrando que a política de descentralização, de municipalização, tem efeitos positivos sobre a qualidade da educação. (SOUZA, 2001).

A aplicação dos recursos do FUNDEF é realizada considerando a

diferenciação de valores de forma compatível com os custos praticados de 1ª a 4ª

séries e de 5ª a 8ª séries em Educação Especial e nas escolas rurais (artigo 2º) e

pelo repasse automático dos recursos para as contas únicas e específicas dos

governos estaduais, do Distrito Federal e dos municípios vinculados ao Fundo. Os

valores creditados oscilam, dependendo dos impostos arrecadados, correspondendo

ao comportamento das receitas (Artigo 3º da Lei do FUNDEF).

42

A Lei do FUNDEF, em seu Artigo 4º, define que o acompanhamento e o

controle social dos recursos por ele repassados são da responsabilidade dos

conselhos de acompanhamento e controle social (CACSS), constituído nos quatro

níveis de governo: União, Distrito Federal, estados e municípios.

A Lei do FUNDEF estabelece ainda em seu Artigo 6º que, quando a

receita estadual originária da arrecadação dos recursos próprios não for suficiente

para cobrir os gastos necessários ao seu pleno desenvolvimento, a União aportará

recursos federais para garantir o valor mínimo como indicativo de previsão da receita

total para o Fundo e o quantitativo de alunos do ano anterior.

A distribuição dos recursos do FUNDEF está definida em seu Artigo 7º, o

qual determina que pelo menos 60% de seu valor total deve cobrir despesas com a

remuneração dos professores, em atividade exclusiva do ensino fundamental público

e 40 % com outros gastos relativos às necessidades de manutenção das escolas

públicas de ensino fundamental.

Tomando na devida conta os elementos expostos, esta pesquisa

direciona seu foco de análise sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal, pelo suporte

legal que disponibiliza no sentido de orientar a gestão municipal deste Fundo, por se

tratar de matéria indispensável à elucidação do problema investigado nos limites

desta investigação.

4.3 Matriz Operacional da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF): Planejamento,

Transparência, Controle e Responsabilização

A criação da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n°. 101,

de 04/05/2000) se efetivou como resposta do Estado brasileiro às imposições,

internas e externas, que reivindicaram mudanças significativas na gestão pública,

para que o País correspondesse aos padrões exigidos para a moralidade do gasto

público como um dos condicionantes à entrada do Brasil no processo de abertura

comercial no contexto da globalização da economia, colocando-se em similaridade

de condições aos demais componentes dos grandes grupos econômicos mundiais.

43

Então, o tema “responsabilidade fiscal” passou a despertar os interesses

de movimentos e redes sociais envolvidas com a perspectiva do controle fiscal sobre

a gestão orçamentária das políticas públicas nacionais.

A abrangência da LRF está descrita em seus parágrafos 2º e 3º do seu

Artigo 1º. Aqui se estabelecem os responsáveis pela observância aos seus

comandos legais.

§ 2º As disposições desta Lei Complementar obrigam a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. § 3º Nas referências: I – à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, estão compreendidos: a) o Poder Executivo, o Poder Legislativo, neste abrangidos os Tribunais de Contas, o Poder Judiciário e o Ministério Público; b) as respectivas administrações diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes; II – à Estados entende-se considerado o Distrito Federal; III – à Tribunais de Contas estão incluídos: Tribunal de Contas da União, Tribunal de Contas do Estado e, quando houver, Tribunal de Contas dos Municípios e Tribunais de Contas do Município.

Por se tratar de lei complementar nacional, a obrigatoriedade de seu

cumprimento atinge toda a sociedade e não somente os entes indicados no artigo

primeiro da referida lei.

A LRF destaca a ligação dos tribunais de contas dos estados (TCE) e da

União (TCU) ao respectivo Poder Legislativo. Deste modo, essas entidades

fiscalizadoras estão também sujeitas ao seu cumprimento. Nos casos de estados

que possuem tribunais de contas separados, um para o Estado e outro para os

municípios, a validade é a mesma, bem como para os municípios que possuem

tribunal de contas próprios, como São Paulo e Rio de Janeiro.

No caso dos ministérios públicos (MPU e MPE) da União e dos estados,

vinculados ao Poder Executivo, houve uma separação quanto à dependência ao

Poder, em razão do caráter de tais entidades, no processo de investigação e sua

necessária isenção política.

44

Sobre o alcance da LRF, destaca-se:

A LRF é um verdadeiro código de boas condutas aplicável a todos os entes da federação – União, Estados, Distrito Federal e Municípios -, em todos os Poderes, no conceito mais abrangente da administração pública. Aplica-se à administração direta, indireta, fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes, ali definidas como as que recebem recursos fiscais para custeio ou investimento. (NUNES, 2002, p. 13).

Deste modo, devem cumpri-la todos os que exercem cargos, emprego ou

função pública, independentemente do nível hierárquico que ocupem.

A finalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal é “disciplinar a gestão dos

recursos públicos atribuindo mais responsabilidade aos seus gestores”. Destaca-se,

ainda, que a palavra fiscal é um “termo que congrega todas as ações que se

relacionam com a arrecadação e a aplicação dos recursos públicos”. (NEVES, 2000,

p. 15).

Ao objetivar o equilíbrio permanente das finanças públicas, a LRF impõe

aos gestores observância aos limites do gasto público conforme o poder arrecadador

o que deverá concorrer para que se previna o indesejável “deficit público” de modo

reiterado, tal como ficou evidenciado em antigas práticas gerenciais.

Cruz et alii (2000, p.16) identificam os seguintes pontos componentes do

conceito da gestão fiscal responsável, com base no § 1º da Lei de Responsabilidade

Fiscal:

a) ação planejada e transparente;

b) prevenção de riscos e correção de desvios;

c) equilíbrio das contas públicas;

d) cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas;

e) obediências a limites, visando ao equilíbrio das contas públicas;

f) condições no que tange a renúncia de receita;

g) condições no que tange a geração de despesas com pessoal;

h) condições no que tange a geração de despesas com a seguridade

social;

45

i) condições no que tange a geração de despesas com as dívidas

consolidadas e mobiliária;

j) condições no que tange as operações de crédito, inclusive por

antecipação de receitas;

k) condições no que tange a concessão de garantias; e

l) condições no que tange a inscrição em restos a pagar.

Especialistas no assunto são incisivos em afirmar que a Lei de

Responsabilidade Fiscal “vai mudar a história da administração pública no Brasil.

Através dela, todos os governantes passarão a obedecer a normas e limites para

administrar as finanças, prestando contas sobre quanto e como gastam os recursos

da sociedade”.

Acrescentam, ainda, que o objetivo da referida lei é sem dúvidas

“melhorar a administração das contas públicas no Brasil. Com ela, todos os

governantes passarão a ter compromisso com orçamento e com metas, que devem

ser apresentadas e aprovadas pelo respectivo Poder Legislativo”. (CASTRO, 2001).

De acordo com Cruz et alii (2000), o surgimento da referida lei para

regulamentar a ação dos gestores públicos não é uma novidade no Brasil. Na

verdade, outros mecanismos, como a Lei de Improbidade Administrativa (Lei Nº.

8.429/92) e o Decreto-Lei Nº. 201/67, são bastante conhecidos e se dedicam a este

tema.

A novidade da Lei de Responsabilidade Fiscal “reside no fato de

responsabilizar especificamente a gestão financeira a partir de um acompanhamento

sistemático do desempenho mensal, trimestral, anual e plurianual”. Neste sentido, o

referencial de avaliação do desempenho gerencial é feito através de “controles

localizados nos gastos com pessoal, nos limites de endividamento, organização do

sistema próprio de previdência, transferências de recursos constitucionais e

voluntários e déficit primário”. (CRUZ et alii, 2000, p. 4).

46

A crise de legitimidade das instituições públicas brasileiras encontra na

Lei de Responsabilidade Fiscal um estatuto legal que representa a vontade política

de reverter tal situação com base em um novo mecanismo de normatização para o

equacionamento e controle do gasto público.

A análise de Castro (2001) sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal e suas

repercussões para a gestão do gasto publico no País apresenta alguns enfoques

que interessam, no domínio desta pesquisa, destacar:

A Lei de Responsabilidade Fiscal é lei de finanças publicas, de natureza financeira, orçamentária contábil e, por isso, tradutora de normas e condições de controle extremamente necessárias à implantação de um novo código de conduta para os gestores públicos. (CASTRO, 2001, p.15).

A compreensão de Castro (2001) sobre a missão da Lei de

Responsabilidade Fiscal não encontra unanimidade entre os operadores do Direito e

alguns políticos e gestores públicos no Brasil. A irresponsabilidade fiscal, cultuada

no País há mais de cinco séculos, passa a ser, não só questionada, mas se depara

com as condições objetivas para impedir sua disseminação.

Visões antagônicas em torno da Lei de Responsabilidade Fiscal passam a

ser debatidas, situando de um lado os posicionamentos desfavoráveis amparados

nos argumentos contrários às imposições internacionais relativas às necessidades

de o Brasil apresentar, por exemplo, superávit primário do orçamento público federal

como garantia de potencial econômico para pagamento da divida externa. Por outro

lado, as posições favoráveis ao cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal

passaram a ser declaradas nos argumentos em defesa da quebra dos velhos

paradigmas do clientelismo, favoritismo e corrupção para os avanços da governança

com suporte em uma nova engenharia da gestão das políticas públicas em geral e

da Administração Pública em particular.

O conceito de governança, tal como formulado por Dowbor (2000),

adquire o sentido de “processo decisório rumo à nacionalidade”. Esse conceito

pressupõe o exercício da participação e do controle social das políticas públicas,

47

numa reciprocidade de responsabilidades a serem assumidas tanto pelo Estado

quanto pela sociedade.

Os argumentos contrários a Lei de Responsabilidade Fiscal, no entanto,

principalmente aqueles fundamentados na conformação das leis ao sistema

constitucional positivo, advogam que a LRF agride o pacto federativo, violando a

autonomia dos estados, Distrito Federal e municípios porque, a organização política

do Estado brasileiro, tal como descreve a Constituição Federal de 1988 (art. 18), os

declara todos autônomos (MIRANDA, 1991, p.226).

A Constituição Federal de 1988 estatui, como principio federativo, a

intangibilidade absoluta da forma federativa do Estado (art. 60, § 4°, I). Assim, o

Congresso Nacional não pode agredir a soberania contida na Federação. Ademais,

a competência legislativa estadual e municipal é semelhante à federal, muito embora

a autonomia municipal seja menos ampla do que a dos estados e da União (art. 18,

caput, CF 88) dentro dos limites constitucionais impostos (CASTRO, 2001, p.20).

Entenda-se, portanto, que o Poder Executivo, o Poder Legislativo e nestes

os tribunais de contas, o Poder Judiciário e o Ministério Público são destinatários da

Lei de Responsabilidade Fiscal, como também suas respectivas administrações

diretas, os fundos, sejam contábeis, sejam dotados de personalidade jurídica, as

autarquias, as fundações e empresas estatais dependentes conforme estabelece o

art. 1°, § 2° da Lei de Responsabilidade Fiscal. Portanto, sendo o Poder Público e a

Administração Pública destinatários dessa Lei, seus gestores passam a assumir

importante papel na sua implementação. Quem exerce ato administrativo deve

exercê-lo sob a forma da Lei, assumindo, portanto, responsabilidade administrativa,

fiscal, política, civil e penal (CASTRO, 2001).

As discussões e antagonismos produzidos em torno da Lei de

Responsabilidade Fiscal, no plano da literatura constitucional e da analise teórica,

ainda não foram totalmente elucidados. Persistem dúvidas, principalmente quanto a

sua aplicabilidade, prática porque “toda matéria nela tratada deverá dispor sobre

normas gerais, mas não o faz , usurpando competências legislativas das autonomias

federais”. (CASTRO, 2001, p.27).

48

Independentemente de tais questionamentos, a Lei de Responsabilidade

Fiscal permanece em vigor, na íntegra, como código de conduta pública,

determinante do compromisso dos gestores com o planejamento, o orçamento, a

execução orçamentária, os limites para a dívida, o endividamento e a fixação de

limites para despesas de pessoal, metas e objetivos para controle de receitas e

despesas, com mecanismos adicionais previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias

(LOA), todos ancorados na Constituição Federal de 1988.

O fundamento da Lei de Responsabilidade Fiscal, manifesta-se por quatro

eixos nucleares, com origem nos quais é possível, para a sociedade, compreender a

dinâmica da gestão pública: planejamento, transparência, controle e

responsabilização.

Antes mesmo de adentrar a discussão sobre o planejamento, tal como

concebido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, vale destacar que essa atribuição

estatal foi inaugurada oficialmente no Brasil pela Lei N°. 4.320, de 17 de março de

1964, tendo inaugurado o orçamento-programa e o plurianual de investimentos na

Administração Pública. Depois dessa iniciativa, o Decreto-Lei N°. 200, de 25 de

fevereiro de 1967, em seu artigo 6°, introduziu o planejamento como um dos

princípios fundamentais da Administração Pública (CASTRO, 2001).

O planejamento, conforme descrito na Lei de Responsabilidade Fiscal,

pode ser compreendido nos termos descritos a seguir:

49

QUADRO I

PROCESSO DE PLANEJAMENTO SEGUNDO A LEI DE

RESPONSABILIDADE FISCAL

ELEMENTOS SIGNIFICADO Diretrizes Conjunto de critérios de ação e decisão a disciplinar e orientar os

diversos aspectos desenvolvidos no planejamento.

Objetivos Indicam os resultados que a administração pretende alcançar com a realização das ações.

Metas Representam especificações e quantificações físicas dos objetivos estabelecidos.

Padrões Referem-se aos indicadores de desempenho esperados para cada meta estabelecida.

Estatística É a demonstração comparativa dos dados apurados na realização das metas em relação aos padrões de desempenho estabelecidos.

Fonte: Lei de Responsabilidade Fiscal Quadro idealizado pela autora.

O artigo 1°, § 1° da Lei N°. 101/ 2000/ define que a responsabilidade na

gestão fiscal pressupõe ação planejada.

A Constituição Federal de 1988 descreve, no seu artigo 165, que lei de

iniciativa do Poder Executivo estabelecerá o “plano plurianual”, o qual deve

estabelecer, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da

Administração Pública federal para as despesas de capital e outras dela

decorrentes, e para as relativas aos programas de ação continuada. Tais

determinantes se aplicam compulsoriamente a estados, Distrito Federal e

municípios, abrangendo todos os poderes. O caráter plurianual concorre para a

validade de quatro anos.

A analise de Teixeira (1997) sobre o planejamento no Brasil concorre para

a compreensão dos impasses históricos que perpassaram a concepção e a prática

desta ação gerencial no País. Seu caráter de estilo tradicional, adotado por

sucessivos governos, restringiu o planejamento aos paradigmas da economia, da

50

racionalidade econômica e as exigências dos agentes econômicos. Diante desse

entendimento, Teixeira sugere:

No caso específico da economia (e do planejamento) há uma crise de teoria e de paradigmas, pois os que existem não são capazes de explicar as velozes e profundas mudanças que estão acontecendo. No entanto, estão sendo feitas várias tentativas para superar esta crise e recuperar a prática do planejamento. (p. 16).

Segundo Cruz et alii (2001, p. 16), o principal objetivo do planejamento

para a administração é identificar o objetivos e gerar o processo capaz de garantir,

no tempo adequado, a disponibilidade da estrutura decisória considerada relevante

que possibilite um controle imediato.

O planejamento é condição prévia para a execução de ações

governamentais. Com ele é possível saber antecipadamente o custo, a duração, os

riscos, as implicações, a dimensão, dentre outros aspectos relativos às ações

governamentais. O gestor deve agir com base no planejamento, sob pena de estar

infringir este princípio.

Para Matus (1996), o objetivo do planejamento está sempre em

movimento e este não se aparta das pessoas que agem e circulam como produtores

sociais. Entendendo que planejar é conduzir a ação consciente, não resta alternativa

ao gestor público: ou planeja sua ação ou passa a se escravizar às circunstâncias,

ao imprevisto, aceitando com passividade a lógica do acaso. Tal atitude, tão comum

no passado, não se harmoniza à gestão contemporânea.

Chamamos planejamento o cálculo situacional sistemático que relaciona o presente com o futuro e o conhecimento com a ação. A reflexão imediatista, tecnocrática e parcial não é planejamento e tampouco é planejamento a reflexão que se isola da ação e torna-se uma mera pesquisa sobre o futuro. (p. 19).

A partir dessa concepção, Matus elabora referências para a compreensão

do planejamento governamental. Defende o argumento de que os fatos políticos e

sociais são produzidos por muitos agentes em função das visões e propósitos

particulares e, sendo assim, nada garante coerência aos resultados das dimensões

sociais globais.

51

Para efeito metodológico da descrição de Matus sobre os fundamentos do

planejamento, elaborou-se um quadro-síntese cuja compreensão se mostra

relevante para esta pesquisa. Há que se compreender a necessidade da

participação popular consciente. Muito embora a legislação, de certa forma, seja um

indutora à participação, sem compromisso e responsabilidade, os ideais do

planejamento perdem seu significado.

QUADRO II

PLANEJAMENTO SITUACIONAL SISTEMÁTICO

ARGUMENTOS FUNDAMENTOS

1. É necessária uma mediação entre o futuro e o presente.

2. É necessário prever

quando a produção é impossível.

3. Reação veloz e

planejamento ante as surpresas.

4. É necessária mediação

entre passado e futuro. 5. São necessárias

mediações entre o conhecimento e a ação.

6. É necessária a

coerência global ante as ações parciais dos agentes sociais.

O critério para decidir o que se deve fazer hoje consiste em saber se esta ação será eficaz amanhã. É preciso prever possibilidades para prever ações e, consequentemente, agir oportunamente e de modo eficaz na ação. É necessário estar preparado para reagir de forma veloz e eficaz ante a surpresa. É necessário aprender na prática com mediações entre o passado e o futuro. Entre a ação e o conhecimento da realidade é preciso planejar ainda que como mera análise do presente e para o presente. É necessária uma ação central que busque a coerência global ante as ações parciais dos agentes sociais quando de fato se pretende conduzir o sistema social a objetivos decididos democraticamente pelos homens.

Fonte: MATUS, Carlos, 1996. Quadro idealizado pela autora.

Apoiado nessas referências, Matus (1996) formula sua compreensão

sobre o significado da capacidade de governar atrelada a um projeto de governo

52

para a governabilidade do sistema e identifica a principal deficiência da gestão

pública, como originada, geralmente, nas falhas de planejamento (p. 70).

Feitas essas considerações teóricas e sem a pretensão de evoluir na

discussão sobre as mais diferentes formulações em torno do conceito de

planejamento, destaca-se sua relevância para a gestão pública. Sua lógica

democrática é convergente para o estilo participativo, sem o qual os avanços

possíveis pela via da transparência, do controle e da responsabilização se perdem

em meio ao aparato legal restrito ao papel, que não se consolida na prática.

Não se pode dissociar planejamento e transparência. Assim

compreendendo, a LRF, em seu art. 48, determina:

São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o relatório resumido da execução orçamentária e o relatório de gestão fiscal; e as versões simplificadas destes documentos.

Os instrumentos da transparência, portanto, são:

− os planos, os orçamentos e a lei de diretrizes orçamentárias;

− as prestações de contas e o respectivo parecer prévio;

− o relatório resumido da execução orçamentária e sua versão

simplificada; e

− o relatório da gestão fiscal e sua versão simplificada.

Ligada à transparência está a participação popular nas decisões públicas,

que também é considerada um princípio. O parágrafo único do artigo 48 da Lei de

Responsabilidade Fiscal, que trata da participação popular, estabelece que a

“transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e

realização de audiência pública, durante os processos de elaboração e discussão

dos planos, leis de diretrizes orçamentárias e orçamentos”. (LRF, Art. 48).

53

Enfim, a gênese da Lei de Responsabilidade Fiscal, além do

planejamento, declara a “transparência” como responsabilidade dos gestores em

demonstrar, tornar públicos, os resultados alcançados pela implementação de

políticas com dinheiro público. O princípio da publicidade da ação governamental

está contido no artigo 37, da Constituição Federal de 1988. Seguindo esse principio,

a Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu artigo 1°, § 1°, prenuncia a “ação

transparente”.

O controle, tal como concebido pela Lei de Responsabilidade Fiscal,

pressupõe um sistema que abrange intervenções em três momentos: antes, durante

e depois, portanto, o controle deve se dar desde a etapa de planejamento, no estudo

das viabilidades, impasses, restrições e potencialidades, de modo que se garantam

resultados objetivados do gasto público. Durante a execução das políticas públicas,

o controle se revela em sua capacidade de redirecionamento das ações que se

manifestam inoperantes em face de qualquer mudança no ambiente ou falha no

planejamento. O controle em sua etapa posterior tem caráter avaliativo determinante

do êxito ou falha na gestão financeira do gasto público.

Conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, o controle deve se

dar internamente com incisiva participação do Tribunal de Contas, tanto nas

atividades de sua competência constitucional quanto naquelas novas, de

advertência e de alerta aos limites legais das despesas. O controle, nessa

perspectiva, tem também repercussão ativa no Ministério Publico. Pressupõe ainda a

participação popular, confirmando-se, por essa via, o alcance democrático da gestão

pública.

A responsabilização está contida na gênese da Lei de Responsabilidade

Fiscal e se destina a administradores públicos em casos de descumprimento de

suas normas. A responsabilização pode se destinar também a entidades públicas e

a administradores públicos com suspensão de transferências voluntárias, garantia de

contratação de operações de crédito, inclusive punições pessoais (administrativas,

criminais, civis, públicas e político-administrativas), sem prejuízo de outras

penalidades previstas em leis especificas.

54

Resta considerar que os governantes e gestores públicos em geral

ocupam cargos políticos transitórios e que suas atitudes à frente do Poder Público

vão repercutir nas condições de acesso da sociedade aos bens e serviços públicos.

Por outro lado, o Estado, em seus quatro níveis de governo, tem função continua de

caráter permanente a cumprir. Dentro desse quadro, o papel dos tribunais de contas

na ação de controle e fiscalização das contas públicas é determinante no sentido de

sua capacidade formal de responsabilizar e punir gestores inescrupulosos. Assim

também a sociedade como um todo, principalmente os usuários das políticas

pública, em sua missão de buscar a garantia de seus direitos, também devem estar

atentos às responsabilidade do Estado em assumi-las como “dever”, tal como define

a Constituição Federal de 1988.

Ao encerrar a discussão sobre os conceitos e práticas históricas inerentes

à gestão das políticas públicas no Brasil, é possível adentrar o capítulo que se

segue, onde experiências na gestão do FUNDEF passam a ser analisadas,

considerando-se a aplicabilidade dos eixos fundantes da Lei de Responsabilidade

Fiscal no que concerne aos mecanismos de planejamento, transparência, controle e

responsabilização.

55

5 A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A MUDANÇA NAS

PRÁTICAS GERENCIAIS DO FUNDEF: O CASO DOS MUNICÍPIOS

DE AQUIRAZ, EUSÉBIO E MARACANAÚ

Os caminhos percorridos na perspectiva de consolidação desta pesquisa

convergem doravante, para o delineamento do estudo de caso, efetivado nos

Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú. Para tanto, particulariza-se a

realidade observada em cada município, com ênfase nos seguintes aspectos:

− a realidade local é delineada com base nos estudos da SEPLAG/

IPECE (2005) cujos indicadores permitem apresentar aspectos

relevantes aos achados deste estudo;

− o perfil dos gestores municipais participantes desta pesquisa; e

− as respostas destes gestores às questões que lhes foram

apresentadas com a finalidade do alcance dos objetivos deste estudo.

Nessa lógica sequencial, apresentam-se, em seguida, os achados mais

relevantes em cada município.

5.1 Indicadores Básicos Municipais: Aquiraz, Eusébio e Maracanaú

O Município de Aquiraz foi criado em 1699 e tem o nome derivado do tupi,

que significa “gentio da terra”. Ocupa uma área de 480.976 km², com sete distritos

(Camará; Caponga da Bernada; Jacaúna; João de Castro; Justiniano de Serpa;

Patacas e Tapera).

Situado na Região Metropolitana de Fortaleza, Aquiraz abriga uma

população de 60.469 habitantes, segundo dados do IBGE, 2000, com estimativas de

crescimento populacional para 2005, o que lhe confere o cálculo de 69.343

56

habitantes. Destes, 12.979 estão domiciliados na zona urbana e 1.035 na zona rural

sendo considerado, na classificação do Estado, município de médio porte.

No campo da saúde, o Município conta com 21 unidades públicas ligadas

ao Sistema Único da Saúde (SUS), não se registrando no local nenhuma unidade

para prestação de serviços de saúde pelo setor privado (IPECE, 2005).

Os indicadores de educação do Município revelam o seguinte quadro:

existem 94 escolas públicas equipadas e dez escolas criadas pela iniciativa privada,

o que permite ao Município concentrar 944 docentes e 27.255 alunos, distribuídos

em 583 salas de aulas. No que se refere ao desempenho do setor, dados mais

recentes disponíveis dão conta de que em 2004, no ensino fundamental, 10.933

alunos foram aprovados; 2.587 reprovados; houve 2.146 repetências e 1.039

evasões. Para o mesmo ano, no ensino médio, 1.895 alunos foram aprovados; 246

reprovados, houve 165 repetências e 524 abandonaram os estudos.

A aplicação instrumental de metodologias diferentes para identificar o

nível de desenvolvimento do Município em relação aos demais inseridos na

totalidade do Estado do Ceará conferem a Aquiraz os seguintes indicadores.

QUADRO III

INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO - AQUIRAZ

ÍNDICES VALOR POSIÇÃO NO RANKING

Índice de Desenvolvimento Municipal (IDM) 40,40 11º Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 0,670 27º Índice de Desenvolvimento Social de Resultado (IDS-R)

0,4407 67º

Fonte: IPECE/PNUD – 2003.

Em 2004, o desempenho da economia de Aquiraz totalizou uma receita

de R$ 35.154 milhões, nela incluídas receitas correntes, receita tributária, patrimonial

de serviços, transferências correntes, receitas de capital e transferência de capital.

57

Descrevem-se, a seguir, os indicadores relativos ao Município de Eusébio,

obedecendo-se a mesma sequencia com que se destacaram aqueles referentes a

Aquiraz.

Em 1987, Eusébio foi emancipado do Município de Aquiraz, pela

Lei Nº. 11.333 e teve seu nome definido em homenagem ao abolicionista Eusébio de

Queiroz Coutinho Matoso da Câmara.

Situado na Região Metropolitana de Fortaleza, Eusébio ocupa uma área

absoluta de 76,56 km². Até o ano 2000, o Município registrava uma população de

31.500 habitantes, totalmente concentrada na zona urbana. Estimativas do

crescimento populacional para 2004 demonstram significativo aumento, ficando o

Município com 45.844 habitantes residentes em 7.258 domicílios no seu centro

urbano, sendo, portanto, considerado de pequeno porte.

No campo da saúde, o Município conta com 18 unidades, sendo 16

ligadas ao Sistema Único de Saúde, (SUS) e duas particulares, e um total de 301

profissionais da área lotados em tais unidades.

Dados mais recentes disponíveis sobre o quadro educacional do

Município destacam, para o ano de 2003, o quantitativo de 490 docentes, 16.163

alunos matriculados e distribuídos em 32 escolas públicas e oito particulares, com

um total de 305 salas de aulas disponíveis para o ensino fundamental e médio.

No que se refere ao desempenho do setor educacional no Município,

observa-se que em 2003 o ensino fundamental registrou 8.399 alunos matriculados.

Dentre eles, 1.065 foram reprovados; 732 abandonaram os estudos e 839 alunos

ficaram na lista da repetência.

Para o ensino médio, os indicadores relativos ao mesmo período (2003)

conferem 1.209 alunos matriculados; 155 reprovados; 407 abandonaram os estudos

e 142 repetências.

58

QUADRO IV

INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO - EUSÉBIO

ÍNDICES VALOR POSIÇÃO NO RANKING

Índice de Desenvolvimento Municipal (IDM) 66,59 2º Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 0,684 16º Índice de Desenvolvimento Social de Resultado (IDS-R)

0,447 9º

Fonte: IPECE/PNUD – 2003.

O PIB total do Município é de R$ 528.289 milhões para o ano de 2002,

sendo mais expressiva a participação do setor industrial (78,1%) seguido dos

serviços (20,6%) e da inexpressiva participação da agropecuária, que se limita a

1,3%.

A receita total do Município em 2003 foi de 29.811 milhões, aqui incluídas

receitas correntes, tributária, patrimonial, de serviços, transferência corrente e de

capital.

O último município integrante da amostra selecionada para este estudo de

caso foi Maracanaú. Seus indicadores mais expressivos passam a ser descritos.

Em 1983, o antigo Distrito de Maracanaú foi emancipado de Maranguape

pela Lei Nº. 10.811. A palavra Maracanaú é originária do tupi, que significa “lugar

onde bebem as maracanãs”.

Situado na RMF, Maracanaú ocupa uma área total de 105,70 km²,

abrigando uma população total de 196.422 mil habitantes, com densidade

demográfica de 1.832,13 habitantes por km², com razão de dependência calculada

em 62,54%, o que indica uma população de menores de 15 anos e com 65 anos ou

mais de idade dependendo de sua população ativa, constituída de pessoas com

idade entre 15 e 64 anos. O município corresponde à classificação estadual de

grande porte.

59

Maracanaú conta com 42.263 domicílios, com média de moradores de

4,24 pessoas por habitação.

A população de Maracanaú conta com 30 unidades de saúde ligadas ao

Sistema Único de Saúde, (SUS), sendo 25 públicas e cinco do setor privado, onde

trabalham 1.098 profissionais da área.

No que se refere à educação, em 2005, o Município de Maracanaú

registra 2.821 docentes para um quantitativo de 84.883 alunos matriculados e

distribuídos em 91 escolas e 1.590 salas de aulas (SEDUC, 2005).

Os indicadores de desempenho do ensino fundamental e médio em

Maracanaú, conforme descritos em documentos oficial produzido pelo IPECE (2005)

concorrem para o seguinte quadro: 75.674 alunos aprovados no ensino fundamental,

o que corresponde a 83,5% do total. Destes, 7.930 (8,8%) foram reprovados; 6.994

(7,7%) alunos abandonaram os estudos e 3.217 (7,1%) alunos ficaram na situação

de repetência. No ensino médio, a realidade não difere muito, embora o quantitativo

de matrículas seja muito inferior ao do ensino fundamental. 18. 436 alunos (68,44%)

do ensino médio foram aprovados. 3.052 alunos (11,3%) foram reprovados; 5.478

alunos (20,3%) abandonaram a sala de aula e 988 (7,3%) alunos ficaram na

situação de repetência no período em foco.

Diferentes metodologias aplicadas para identificar o desempenho da

gestão em promover o desenvolvimento municipal foram elencados pela SEPLAG no

Perfil Básico do Município (2007) tendo produzido o seguinte quadro.

QUADRO V

INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO - MARACANAÚ

ÍNDICES VALOR POSIÇÃO NO RANKING

Índice de Desenvolvimento Municipal (IDM) - 2004 55,88 4º Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) - 2000 0,736 2º Índice de Desenvolvimento Social de Resultado (IDS-R) - 2003

0,5609 5º

Fonte: IPECE/PNUD – 2003

60

No que se refere às finanças públicas, a receita total de Maracanaú em

2005 foi de R$ 146.847 milhões, incluídas receitas correntes, tributárias, patrimonial,

de serviços e outras receitas.

Essas breves descrições sobre o perfil do Município são destaques neste

estudo e servem de referências para a compreensão do foco de análise que se

passa a desenvolver.

5.2 A Gestão Municipal do FUNDEF sob a Lógica da Responsabilidade Fiscal:

Breve Perfil Profissional dos Gestores de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú

A análise da execução do FUNDEF em Aquiraz, relativa ao período

compreendido de 2005 até 2008, contou com a colaboração da gestora Isabel Maria

Magalhães Freitas, pedagoga, com habilitação em Supervisão Pedagógica,

Administração Escolar, e especialização em Planejamento Educacional. Seu

currículo agrega docência na rede pública de ensino e na Universalidade Estadual

Vale do Acaraú. Atuou com avaliadora do “Selo Unicef” – Edição 2000 e como

avaliadora do Selo Itaú Unicef – edições 2006 e 2008. Acumula também experiência

na Primeira Delegacia Regional de Educação, onde exerceu o cargo de delegada,

dando cobertura ao trabalho de 37 municípios. Foi ainda secretária de Educação do

Município de Chorozinho, de 1997 até o ano 2000, e Secretária de Educação do

Município de Aquiraz, de 2001 até 2008. Atualmente faz parte da equipe de

planejamento educacional da Secretaria de Educação de Aquiraz.

A Secretária de Educação do Município de Eusébio, Marta Cordeiro

Fernandes Vieira, participou deste estudo, analisando o cenário local com base nas

questões que lhe foram requeridas. Destaca-se que esta gestora acumula outras

experiências, tendo participado do Primeiro Plano de Educação dos Municípios do

Ceará. Foi também secretária de Educação do Município de Maranguape, durante

32 anos, cujo desempenho se mostrou determinante para configurar o Município

como o primeiro do Estado do Ceará a criar os conselhos escolares e também o

pioneiro a realizar concurso para a escolha dos diretores de escolas públicas

municipais.

61

Para compor um quadro de referências analíticas da relação entre o

aparato legal vigente descrito nas matérias que normatizam a execução do FUNDEF

e as perspectivas da gestão públicas contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal,

contou-se, no caso do Município de Maracanaú, com a participação do secretário

municipal de Educação, José Marcelo Farias Lima.

Marcelo Farias é pedagogo, com habilitação em Administração Escolar.

Funcionário público estadual, com experiência acumulada na execução de vários

programas. Exerceu durante dez anos a Coordenação do PRORURAL, programa

com a missão de preparar os municípios para a descentralização e para assumir a

gestão da política educacional. Foi também delegado da primeira Delegacia

Regional do Ensino (DERE), quando passou a conviver com maior proximidade com

os problemas da comunidade. Nessa função, articulava-se com gestores

educacionais de 27 (vinte e sete) dos 184 (cento e oitenta e quatro) municípios

cearenses, inclusive com Fortaleza. Entre 1964 até 1993, acumulou vasta

experiência na gestão de programas da Secretaria da Educação do Estado. Foi

também professor universitário de 1964 até 2003, como também lecionou em

escolas da rede particular de ensino. Implantou o sistema de planejamento do

Instituto de Previdência do Estado do Ceará (IPEC); chefiou o gabinete da Imprensa

Oficial e foi Secretário Municipal de Educação no Município de Maracanaú no

período de 1993 até 2004, retornando ao mesmo cargo em 2007.

Os três gestores aqui identificados aceitaram participar deste estudo e

suas contribuições acerca da aplicabilidade da LRF, com foco para o planejamento,

controle, transparência e responsabilização aplicados à gestão do FUNDEF nos

respectivo municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú, passam a ser

apresentadas.

62

5.3 O Planejamento das ações do FUNDEF e sua Correspondência às

Exigências da LRF: a Compreensão dos Gestores de Aquiraz, Eusébio e

Maracanaú

A gestora educacional do Município de Aquiraz reconhece a importância

legal do planejamento: “está na Lei e deve ser cumprido”. Percebe, no entanto,

restrita participação popular no planejamento da política pública educacional em

Aquiraz, quando declara:

(...) resta à necessidade de se formar uma consciência popular. Isso é processual. O povo vai aprendendo no fazer, no cotidiano. A participação não acontece tão rapidamente, mas é um entendimento. O povo precisa reconhecer o direito de participar e assumir a responsabilidade social com essa prática. O orçamento deve ser definido de forma participativa... resta ao povo ir ao encontro, buscar essa participação, usar o espaço de poder e da justiça. A Lei está posta. Há uma intenção, um processo acontecendo e é preciso que a participação popular no planejamento público se consolide cada vez mais.

Evidencia-se nas considerações da entrevistada que a participação

popular na dinâmica do planejamento educacional ainda não é uma prática

exercitada pela população de Aquiraz.

As posições tradicionais não foram ainda rompidas na relação Estado/

Sociedade. Muito embora todo o aparato legal em vigor, convergente para a gestão

democrática, ainda não foi possível superar o estágio de dependência que

secularmente introjetado na cultura popular. Na verdade, os munícipes permanecem

distantes da participação política decisória e, quando enfrentam situação de

pobreza, expressiva maioria das famílias matriculam os filhos nas escolas públicas,

muito mais para satisfazer exigências dos programas de transferência de renda, a

exemplo do “Bolsa Família”, do que mesmo por compreenderem o valor e a

importância da educação.

Por outra via, é importante destacar que o orçamento da política municipal

de educação em Aquiraz é disponibilizado pela gestão através da internet. Este

acesso porém, ainda é muito restrito às populações empobrecidas, e, mesmo

aquelas de melhor poder aquisitivo, em cidades médias ainda são grandes os

63

entraves que minimizam as possibilidades de participação e controle social por essa

via.

Destaca-se, no entanto, o trabalho do Tribunal de Contas dos Municípios

(TCM), referido pela entrevistada, como uma instância que, em Aquiraz, não só

controla mas vai além, acompanhando os trabalhos, capacitando gestores e

técnicos, disponibilizando material para estudos e pesquisas, contribuindo, enfim,

para o aprimoramento da gestão pública municipal.

Ainda com relação ao planejamento da política educacional em Aquiraz, a

gestora entrevistada salientou a dificuldade de contemplar as demandas locais.

A gente há de convir que todo esse processo de planejamento deveria considerar as demandas locais. A população deveria opinar e estabelecer prioridades distritais conforme suas necessidades. Muitas vezes esse levantamento até é feito, são promovidas encontros com esse finalidade, mas nem sempre as demandas populares são incorporadas ao planejamento oficial. É lei, mas, ainda é preciso cumpri a lei.

Assim, pode-se garantir que o planejamento das ações do FUNDEF em

Aquiraz ainda não corresponde às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal. A

despeito do que se sustenta, no plano da leitura constitucional e da análise teórica

sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal, dúvidas persistem quando se passa do

plano formal para o prático.

Tal como legalmente prevista, a responsabilidade na gestão fiscal tem o

planejamento como um conceito invocado, como atividade estatal qualificada, um

dos princípios fundamentais da Administração Pública, consoante aos princípios

democráticos que o elegem como norma geral, conforme se encontra na

Constituição Federal de 1988, artigo 24, e seus parágrafos. Assim a norma geral

editada pela União não exclui a competência suplementar dos estados, Distrito

Federal e municípios.

A norma geral, entendida conforme o Direito Financeiro, “é a que

estabelece princípios e diretrizes de ação e se aplica a todo território nacional”.

(MEIRELLES, apud CASTRO, 2001 p. 26).

64

Com amparo nos elementos expostos, considera-se que a gestão do

FUNDEF em Aquiraz, no que concerne ao planejamento, ainda não observa os

determinantes da Lei de Responsabilidade Fiscal por não se constituir prática que

incorpore em seus determinantes e prioridades a participação popular. Muito embora

a gestora entrevistada reconheça essa necessidade, a população local parece ainda

distante de se reconhecer como corresponsável pelo desenvolvimento da política

municipal de educação.

Ao ser interrogada sobre a correspondência do planejamento das ações

do FUNDEF aos determinantes da Lei de Responsabilidade Fiscal, a gestora da

política educacional do Município de Eusébio observou contradições legais que

limitam, em sua opinião, o bom desempenho da educação.

Para obedecer algumas normas da LRF, nos temos que ferir a outras normas da LDB e também da Constituição Federal. Enquanto uma determina a universalização do ensino (isso significa admitir professores para atender a demanda de alunos) a LRF limita os gastos com pessoal, de modo que para se obedecer uma Lei descumpre-se a outra. Isso é uma incongruência que gera certo constrangimento para o gestor que se coloca ante duas leis que se contradizem. E por mera observância, então nós temos que limitar o atendimento à educação para não ferir a LRF porque ela é mais categórica que a LDB pois a LDB não tem punição e a LRF pune, penaliza bloqueando o repasse dos recursos federais caso seja desrespeitada.

Com atenção focada para as “contradições” entre a LDB e a LRF no que

concerne à perspectiva universalizante do acesso à educação, que é constitucional

e assumido pela LDB, e a imposição da LRF, com a definição de percentuais do

gasto público com a contratação de pessoal, a gestora não se posicionou sobre a

participação popular no planejamento das ações do FUNDEF.

Acerca da correspondência entre o planejamento das ações do FUNDEF

e o cumprimento dos determinantes da Lei de Responsabilidade Fiscal, Marcelo

Farias emitiu a seguinte resposta:

De certa forma há uma grande preocupação, tanto no planejamento, como na responsabilidade na elaboração do plano plurianual, dos planos anuais, e do orçamento anual. Até 1993, existia no município uma Secretaria de Planejamento que não funcionava. Atualmente com a criação de uma Coordenadoria de Planejamento e Controle na própria Secretaria de Educação do município o planejamento vem se efetivando de modo que a

65

Secretaria de Educação do Município de Maracanaú está muito mais preparada para elaborar um planejamento que as demais secretarias do município.

Diante de tais argumentos, pode-se pressupor que os trabalhos, na linha

de planejamento municipal da política educacional como um todo, seguem os

princípios constitucionais democráticos, no âmbito dos quais a participação popular é

condição essencial, muito embora não tenha ficado explicito na fala do entrevistado

se de fato a população local é convocada a participar do planejamento das ações do

FUNDEF.

5.4 O Exercício do Controle das Ações do FUNDEF como Prática Sistemática

Orientada pela LRF nos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú

O exercício do controle das ações do FUNDEF no Município de Aquiraz é

implementado pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), tal como afirmou a

gestora entrevistada.

A gênese da Lei de Responsabilidade Fiscal destaca o controle como um

sistema privilegiado ao envolvimento do Tribunal de Contas nas atividades de sua

competência constitucional e também sua repercussão no Ministério Público e

participação popular, sendo, portanto, indispensável o exercício democrático na

condução de toda política pública.

Quando a participação da sociedade por meio dos conselhos municipais

de Educação, dentre outros, cumprem apenas meras formalidades burocráticas, com

reuniões mensais sistemáticas, mas seus integrantes não se mostram ativos no

exercício do controle social, não se pode afirmar a perspectiva do controle social e

fiscal de uma política pública. É o que acentua a entrevistada:

Na realidade, os conselhos de controle funcionam bem em termos de se reunirem periodicamente, mas a maioria dos seus membros ainda não demonstra um compromisso com o controle social da política de educação no município... falta consciência e responsabilidade quanto ao papel que devem desempenhar dentro do Conselho.

66

Sem participação popular no planejamento, e diante da fragilidade da

atuação dos conselheiros no exercício do controle social, compromete-se a

perspectiva constitucional da democracia, compromete-se a descentralização

político-administrativo; restringem-se as possibilidades da responsabilidade

compartilhada entre as instâncias governamentais do Município e a sociedade local,

negando-se, enfim, o legalmente instituído.

Interrogada sobre o controle das ações do FUNDEF em observância a Lei

de Responsabilidade Fiscal, a gestora do Município do Eusébio, declarou que essa

prática se efetiva no Município independente dos determinantes da Lei de

Responsabilidade Fiscal.

(...) o exercício do controle do FUNDEF é fruto de uma prática cotidiana, usualmente adotada. É feito sem lembrar que estamos obedecendo a LRF. Se faz pelos princípios da Lei do FUNDEF. O município tem que ser transparente, tem que ser aberto a qualquer tipo de informação, tem que dar acesso a qualquer demanda da representatividade popular, mas a gente não se lembra que está agindo assim por determinação da LRF.

Com esse posicionamento, a entrevistada sugere que a gestão

democrática é efetivada no Município e que se traduz num exercício cotidiano,

assimilado e incorporado as práticas de modo natural.

Quando ao desempenho dos conselhos no cumprimento da missão de

exercitarem o controle social da política de educação no Município, a entrevistada

formulou a seguinte consideração:

Os conselhos são atuantes, mas, não tanto quanto deveriam ser. Eles seguem a rotina de se reunirem com o serviço de contabilidade e nós, gestores, até evitamos estar presentes nas reuniões para que haja mais liberdade de interação e interlocução entre o setor de contabilidade e os conselheiros. Nessas reuniões a contabilidade apresenta a esses conselheiros o balancete, a folha de pagamento, notas fiscais, dentre outros elementos imprescindíveis ao exercício do controle fiscal do FUNDEF.

Ainda a respeito do desempenho dos conselheiros no exercício do

controle dos recursos do FUNDEF, a gestora educacional do Município de Eusébio

acrescentou:

67

Acho que os conselheiros pecam por omissão, não só aqueles do Eusébio, mas do Estado todo. Eu tenho feito uma crítica junto aos conselheiros onde tenho atuado... a atribuição do conselho não se limita a verificar o fiscal, a aplicação da execução do programado nem a aplicação do recurso. O conselho do FUNDEF tem também que fazer análise do custo benefício. O que é que eu considero acompanhamento e controle social? – É verificar que tipo de serviço público esta sendo oferecido pelas escolas e pelos educadores à sociedade, a partir da utilização dos recursos do FUNDEF como principal agente financeiro da educação. Então, toda pessoa que é remunerada pelo dinheiro público tem como ‘ patrão’, o povo. O gestor público tem que dar respostas positivas à sociedade e a educação não esta dando a resposta esperada. O professor é o gestor da sala de aula. É o responsável maior pelo que acontece na sala de aula. E os conselhos não acompanham o resultado letivo.

Além dos conselhos não estarem atentos ao uso dos recursos sem a

qualidade do ensino, também não estão atentos ao que acontece em sala de aula e

as famílias dos alunos também se mostram ausentes. Não se verifica uma dinâmica

participativa do controle social da qualidade do ensino por parte da sociedade em

geral. Os fatos só vêm a tona quando se verificam denúncias em geral, “da

oposição” ou por parte da imprensa que divulga a péssima qualidade das salas de

aulas, a violência nas escolas e a precariedade do ensino público, dentre outros

fatores.

Indagado sobre o exercício do controle das ações do FUNDEF, como

prática sistemática orientada pelos determinantes da Lei de Responsabilidade Fiscal,

o entrevistado de Maracanaú respondeu:

Começa a acontecer. Ainda acho muito pouco eficiente o controle social porque não havia cultura no Brasil da participação da comunidade no controle dos recursos públicos. A partir de uma fase e dos mecanismos que foram criados acho que a LRF contribui bastante para o controle a partir dos conselhos da educação do FUNDEF, depois do FUNDEB; Conselho de Alimentação Escolar, enfim, os conselhos escolares passaram a exercer um controle social que antes inexistia. Acho que essas leis foram determinantes. No município o controle é feito baseado na cumplicidade. As indicações para a composição dos membros dos conselhos é feita de maneira responsável.

As afirmações do entrevistado levam a supor que o Município tem bases

estruturadas para iniciar um processo participativo das instâncias representativas da

sociedade local (Conselho) num trabalho de controle social da política educacional,

entretanto, nenhuma alusão foi feita com relação aos mecanismos operacionais que

68

de fato possibilitam um controle social mais amplo, no que se refere, por exemplo, à

disponibilidade de informações via internet, dentre outros.

5.5 Mecanismos Empregados pela Gestão Municipal para a Transparência das

Ações do FUNDEF nos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú

Quanto aos mecanismos utilizados pela gestão municipal do FUNDEF

para promover a transparência das suas ações, observa-se, mais uma vez a

distância entre o legalmente proposto e cotidianamente efetivado.

A gestão da Educação no Município de Aquiraz disponibiliza todas as

informações ao Conselho do FUNDEF, como também lança informativos na internet,

fixa matéria nos espaços disponibilizados na sede dos Correios e do Banco do

Brasil, entretanto,

... para o povo menos esclarecido essas informações não chegam. Estão na internet, estão em determinados locais onde o povo mais simples, que não tem acesso a internet pode ficar informado, a matéria, é também disponível aos conselhos. Então, para as pessoas mais conscientes a informações chega. Chega para todos? Ainda não.

Outra restrição observada nos limites do controle social é que, mesmo

com informações disponibilizadas em alguns canais de participação, a produção dos

dados burocráticos se dá de modo tecnicista, dificultando a compreensão das

pessoas leigas na matéria.

Sem participação popular nas etapas de planejamento, sem um efetivo

controle e sem transparência das ações, distancia-se a perspectiva democrática da

gestão pública.

Sobre os mecanismos empregados pela gestora da educação no

Município de Eusébio para promover a transparência das ações do FUNDEF,

obteve-se a seguinte resposta:

69

Todos os mecanismos possíveis. A prestação de contas vai para Câmara, para o Conselho e para o Sindicato. Temos toda a gestão, tanto a da Secretaria de Finanças do Município como a da Secretaria da Educação, todos os servidores, em todos os setores são orientadas para darem acesso às pessoas que buscarem informações. Além das reuniões sistemáticas dos conselhos temos reuniões esporádicas com o sindicato; entrevistas, interlocuções para prestação de contas, análise da folha de pagamento, etc. Tudo isso é tido como mecanismos que utilizamos. Acho que exercitamos uma abertura democrática, um acesso facilitado. É uma grande porta para a transparência e para a prestação de contas democraticamente realizada.

Compreendida nesses parâmetros, a transparência da gestão pública do

FUNDEF no Município de Eusébio parece percorrer trilhas significativas para a

democratização da informação. O que não ficou claro na fala da entrevistada foi a

percepção da população local sobre a gestão do FUNDEF. Afinal, os mecanismos

estão postos conforme determina o aparato legal vigente, entretanto, não foi

possível identificar se a sociedade local se utiliza desses mecanismos para o

exercício da participação e do controle social.

Quanto aos mecanismos empregados pela gestão municipal para a

efetiva transparência, o entrevistado de Maracanaú afirmou:

Há uma responsabilidade com a prestação de contas, com a transparência. A cada trimestre apresentamos à população e para a Câmara Municipal o balanço do trimestre. Eu acho um grande avanço, pois o que era privativo dos escritórios de contabilidade e ficava restrito ao plano dos documentos agora passou a ser de domínio público. Os resultados trimestrais são apresentados para a comunidade e sujeitos, portanto, ao crivo da comunidade.

Há de se considerar que “transparência” não se efetiva apenas na

“prestação de contas”. A transparência é um conceito mais amplo, que perpassa

toda a gestão, a começar pelo diagnóstico situacional do Município, o planejamento

participativo, o acompanhamento, monitoramento e avaliação da política educacional

como um todo.

70

5.6 Experiências de Responsabilização de Gestores, conforme Determinantes

da LRF, Relacionados à Execução do FUNDEF nos Municípios de Aquiraz,

Eusébio e Maracanaú

Indagou-se, à participante de Aquiraz, se o Município registra, até então,

responsabilização de gestores conforme determina a Lei de Responsabilidade

Fiscal, relacionada à execução do FUNDEF. Como resposta, transcreve-se a fala da

entrevistada:

Essa pergunta é excelente. Eu respondo com muita satisfação, porque eu gostaria de fazer uma apreciação que vou colocar agora: analisando na prática a tramitação de um processo; uma licitação para aquisição de um bem, por exemplo, quem responde é o gestor, o Secretário da Educação do Município, entretanto o processo passa pelo visto do Prefeito, pelo visto de outros gestores municipais e só quem responde a qualquer atecnía, qualquer deslize que possa acontecer é o Secretário de Educação. Entretanto, a necessidade de que seja revista a Lei pelo Tribunal de Contas, pelos Legisladores, na definição dos responsáveis sugiro que a responsabilidade seja solidária, com o compromisso de todos.

Não ficou explicito, na fala da entrevistada, se o Município de Aquiraz

responde a algum processo de investigação sobre o uso indevido dos recursos do

FUNDEF.

De modo geral, é possível considerar que a gestão do FUNDEF em

Aquiraz merece maior atenção por parte dos munícipes, dos conselheiros e de todos

os gestores locais, para que se efetivem a participação popular, a transparência, o

controle e a responsabilização, eixos fundantes da gestão democrática incorporados

à Constituição Federal de 1988 e adotados pelas leis complementares nacionais que

tratam da Administração Pública.

Sobre a experiência de responsabilização da gestora do Município de

Eusébio, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), relacionada à

execução do FUNDEF obteve-se a seguinte resposta:

Não houve ainda nenhum caso de necessidade de registro de responsabilização aqui em Eusébio. Não sei se depois que eu sair haverá. Sé houver será por algum engano contábil, nunca por um gesto de corrupção, ou desvio de recurso. Aqui, ao contrário, o prefeito injeta recursos próprios do município na educação. Na merenda escolar, o prefeito

71

injeta o dobro do que recebe. A merenda é boa e farta. A educação infantil tem quatro refeições por dia. Algumas escolas aonde os alunos chegam mais cedo, servem até café da manhã. Agora, tem sido muito discutido na UNDIME que é injusto só o gestor da pasta de educação responder junto aos órgãos de controle externo. Existem outros órgãos do município que têm ingerência na aplicação dos recursos do FUNDEF. Temos a comissão de licitação, secretaria de finanças, a tesouraria assessoria jurídica, a controladoria e outros envolvidos. Mas quando tem que responder por alguma coisa, somente o gestor do FUNDEF é responsabilizado. Isso é uma injustiça.

Reafirma-se, aqui, conforme esclarece Castro (2001, p. 26), que a

responsabilização está na gênese da Lei de Responsabilidade Fiscal. As punições

se endereçam à entidade pública pelo descumprimento de suas normas. Aos

administradores públicos são vinculadas penalidades severas, a exemplo da

suspensão das transferências voluntárias, garantias de contratação de operações de

crédito e punições pessoais (administrativas, criminais, políticas e político-

administrativas), sem prejuízo de outras penas previstas em leis específicas.

Ao ser indagado se o Município de Maracanaú registra experiência de

responsabilização de gestores, conforme determina a Lei de Responsabilidade

Fiscal, relacionada à execução do FUNDEF, o entrevistado emitiu a seguinte

consideração:

No município existe ainda um problema da sobrecarga de responsabilidades sobre o gestor, porque as ações são desenvolvidas por vários órgãos numa prefeitura, por exemplo, as próprias ações da Secretaria da Educação, mas a contabilidade é centralizada não é contabilidade própria. O setor de compras e licitação é uma central para o município, não é uma central para a secretaria de educação. A secretaria de recursos humanos faz a gestão dos recursos humanos do município como um todo. A secretaria de finanças é quem faz os processos de pagamentos. A procuradoria geral do município dá os pareceres que não são considerados pelos órgãos de controle externo. O que acho e isso eu já discuti nas reuniões da UNDIME e perante o tribunal é que a gente é responsável. O gestor é responsável por muitas ações que não são executadas por ele, e o gestor passa a responder por tudo. Se houver um problema num processo de licitação ele vai responder pelo ato que não há como ele fazer nem há subordinação dele, ele não subordina. Se temos dúvidas e precisamos de um parecer da procuradoria ele é apenas opinativo, não tem nenhum valor e nem o procurador é responsabilizado pelo parecer que deu, mas o ordenador é. É uma situação muito séria. Ainda mais por conta do atraso das análises das contas. As contas são analisadas à luz de uma realidade. Por isso hoje em dia há um problema. Há um recuo das pessoas para exercer cargo de gestão, porque é uma responsabilidade muito grande, quando a gente não tem todas as condições de ser auto-suficiente em termos de controle. Por exemplo: se a contabilidade faz uma classificação de despesa equivocada não é o contador que vai responder e sim o gestor da pasta. Neste aspecto ai, a gente defende que as coisas se dêem com toda clareza, transparência,

72

baseadas em todos os princípios que regem a administração pública, mas hoje está sendo muito difícil ser gestor de uma pasta principalmente da educação que administra muitos recursos e tem essa série de limitações. No município não houve problemas de contas, todas as contas do município foram aprovadas não havendo registro de malversação de recursos ou desaprovação de contas.

À vista dos elementos expostos, pode-se destacar o fato de que, até o

presente, nenhum gestor municipal do FUNDEF de Maracanaú foi responsabilizado

pelo uso indevido de seus recursos. Feitas essas considerações, este estudo

encaminha reflexões para algumas conclusões.

73

CONSIDERAÇÕES FINAIS: A NECESSIDADE DE NOVO

COMPORTAMENTO

Nunca tantos líderes e gerentes estiveram tão pressionados para mudar,

sem entender “por que” devem mudar “o que” deve ser mudado e para o beneficio

“de quem“ a mudança deve ocorrer... A maioria se satisfaz com um novo documento,

sem construir um novo comportamento a partir de uma visão de mundo inspiradora

na de novos modos de interpretação e intervenção (SILVA, 2003, p. 01).

Após a Constituição de 1988, a redemocratização do País foi marcada

pela busca de novos caminhos para a educação, parte dos quais convergiu para o

esforço da produção de leis complementares compatíveis com as novas exigências,

sendo que a descentralização política e administrativa, dentre outras mudanças,

merece atenção especial para este estudo, em virtude das novas competências

gerenciais que passaram a demandar, dos municípios, radicais transformações.

No contexto internacional, a Conferência Mundial de Educação Para

Todos, realizada em Tomtien na Tailândia, em março de 1990, reuniu pessoas de

variados países representativos da política educacional, dirigentes governamentais e

organizações não governamentais, cujo debate culminou por consagrar o conceito

de satisfação das necessidades básicas de aprendizagem nos seguintes termos:

Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos de aprendizagem (a alfabetização, a expressão oral, a aritmética e a solução de problemas) quanto o conteúdo básico da aprendizagem (conhecimentos, capacidades, valores e atitudes) de que necessitam os seres humanos para sobreviver, desenvolver plenamente suas possibilidades, viver e trabalhar dignamente, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar sua qualidade de vida, tomar decisões fundamentais e continuar aprendendo.

A orientação mundial para todos os países signatários da Conferência de

Tomtien ficou expressa em um Plano de Ação fundamentado no conceito de

necessidade de aprendizagem, oferecendo orientação importante para a formulação

de propostas educativas, com base em parâmetros de qualidade do ensino, evitando

termos vagos e marcados ideologicamente, com ênfase nos conteúdos que os

74

indivíduos precisam dominar para que consigam viver melhor, trabalhar e

principalmente continuar aprendendo.

Para o caso brasileiro, no contexto dos anos de 1990, o maior desafio da

educação ainda consistia em garantir escola para todos, ou seja, a equidade no

ponto de chegada e as leis complementares (LDB, FUNDEF, dentre outras)

determinaram, segundo preceitos constitucionais, a descentralização político-

administrativa da educação nacional, como estratégia para consolidar uma gestão

no plano local que permitisse ao País incorporar necessidades diferenciadas e

trabalhar sobre elas ao longo da escolarização. Foi então que o ensino fundamental

adquiriu relevância, por sua missão de assegurar acesso ao conhecimento básico,

em que o conceito de satisfação de necessidades educacionais deveria ser

plenamente satisfeito.

Em 1991, no lançamento do Programa Brasileiro de Qualidade e

Produtividade, o então presidente da República, Collor de Mello, afirmava a urgência

de uma ”revolução educacional” que permitisse ao País atingir patamares de

competitividade mais elevada no mercado internacional.

Imersas nessa onda, as frequentes denúncias quanto à falência do

sistema de ensino básico no País passaram a ancorar-se nos imperativos da gestão

municipal, associada às transformações no quadro educacional brasileiro. A gestão

municipal da educação começa a ser reivindicada como determinante para ampliar o

acesso ao ensino fundamental.

A vigente Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei

N°. 9.394 de 1996) introduziu significativas mudanças na gestão educacional, onde a

formação do professor passa a ser questionada e essencial para nova demarcação

da capacidade docente.

As alterações introduzidas no sistema educacional brasileiro modificam

substancialmente o modelo centralizador de poder, forjado culturalmente na lógica

do “manda-quem-pode, obedece-quem-tem-juízo”, porque a descentralização veio

norteada pela abertura à participação da sociedade, em que a criação e o

75

funcionamento de conselhos nos planos federal, distrital, estaduais e municipais

passaram, gradativamente, a evoluir e interferir no controle social dessa política. É

sob este prisma que se quebram os velhos paradigmas e ganha espaço uma nova

perspectiva da gestão descentralizada do sistema educacional.

Com esse enfoque, o perfil do gestor educacional passa a ser

determinante para o alcance dos maiores desafios: universalização do acesso e

garantia de qualidade.

A organização escolar na conjuntura atual deixa de ser essencialmente

burocrática. A hierarquia da autoridade, que no passado fluía do topo para a base

perde espaço. Em seu lugar, vai se consolidando a experiência da participação da

comunidade, das famílias, voltando-se as discussões para o enfrentamento dos

problemas vivenciados no Município. A escola reconhece sua função de compartilhar

dos desafios que extrapolam seus muros e a aproximação com a vida da sociedade

passa a determinar novas atitudes aos educadores e gestores educacionais.

Amparados legalmente por um novo código de conduta pública, esses

gestores são chamados a administrar a educação com responsabilidade, termo que

não mais se limita às responsabilidades com o planejamento pedagógico, diretrizes

educacionais ou gestão de pessoal, mas também avança para a perspectiva da

gestão fiscal cujos mecanismos de planejamento, transparência, controle e

responsabilização entram em cena na vida de cada escola, com maior rigor entre

aquelas do ensino fundamental pelos determinantes do FUNDEF, que se cruzam

com aqueles da Lei de Responsabilidade Fiscal, conferindo às famílias em particular,

e a sociedade brasileira como um todo, instrumentos favoráveis à compreensão da

realidade educacional do País.

Crianças em idade escolar fora da escola; alto índice de analfabetismo;

professores desqualificados, sem a devida habilitação para o ensino de qualidade,

inexistência de material didático e de equipamentos essenciais; ambiente físico em

péssimas condições de uso; e, mais recentemente, a violência praticada nas escolas

contra professores e alunos, pelo uso e venda de drogas nas dependências

76

escolares, são, em linhas gerais, os problemas que se mostram visíveis nas escolas

públicas brasileiras na atualidade.

Apesar de todo o aparato legal vigente, persistem velhos impasses não

resolvidos e a eles se somam outras questões, como é o caso da violência

recentemente identificada por pesquisadores, como um dos problemas que mais

comprometem o ensino.

Pode-se, enfim, afirmar que o cenário da educação no Brasil é reflexo de

uma conjuntura mais ampla, forjada por um longo período de exclusão e

desigualdades que, hoje, mesmo no contexto da democracia e da legislação

favorável à conquista de direito, ainda permanece num estágio de grandes

dificuldades.

Sem negar a importância do aparato legal vigente, há de se considerar

que editar leis não significa necessariamente sua efetividade e impacto positivo nas

transformações que determinaram.

Silva (2003) sugere que a humanidade experimenta uma mudança de

época, em que três revoluções – tecnológica econômica e sociocultural – ocorrem

simultaneamente, orientando e inspirando processos de mudança institucional. As

instituições, em maioria, enfrentam dificuldades pela fragmentação da consistência

interna dos modos de interpretação da realidade, o que vai repercutir externamente,

numa demonstração evidente de suas fragilidades, o que faz emergir verdadeira

crise de legitimidade.

No caso especifico da gestão municipal da educação, são recorrentes as

denúncias, seja pelo uso indevido do dinheiro público, seja pela questão do acesso,

da qualidade e, mais recentemente, pelos problemas da violência. O mau

desempenho das organizações educacionais no âmbito municipal conduz estudos e

pesquisas voltadas ao diagnóstico interno da gestão, e diversos são os impasses

identificados, gerando interpretações, as mais diversas, de um contexto cambiante.

A escola, porém, observada em sua dinâmica cotidiana, não pode ser vista de modo

77

isolado, como se os problemas que se manifestam a sua volta não interferissem

diretamente no seu funcionamento. Sob este prisma, a gestão municipal da

educação implica considerar não somente o aparato legal vigente, mas remete

necessariamente a que os gestores busquem coerência na interpretação dos fatos

ocorrentes na sua órbita para definir e exercitar modos de intervenção.

Tais considerações permitem destacar a compreensão dos gestores

municipais participantes deste estudo, acerca das questões que serviram de suporte

para o alcance dos objetivos desta pesquisa.

Enfim, a gestão municipal do FUNDEF compreendida pelos gestores

municipais participantes deste estudo permite considerar o que se comenta a seguir.

Com relação ao planejamento, observa-se uma fragilidade no que se

refere à participação popular. Muito embora os três munícipes assumirem exercitar o

planejamento conforme o aparato legal vigente, a participação dos municípios ainda

é tímida, o que restringe o alcance da democracia pela via do exercício da

cidadania.

Esses achados permitem ainda confirmar a hipótese de que, apesar de

todo o aparato legal vigente, as contradições na gestão municipal da política de

educação persistem, porque o planejamento das ações do FUNDEF não

corresponde às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal no que concerne à

participação popular.

Na verdade, mesmo que a ação de planejar concorra para a atenção aos

preceitos legais, com diretrizes, objetivos, metas, padrões, estatísticas, dentre outros

temas contidos na matéria da elaboração dos planos plurianuais (PPA) efetivados

conforme a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA),

como requisitos indispensáveis à administração do dinheiro público, ainda é distante

a perspectiva do envolvimento da população nesses procedimentos, quer seja por

dificuldades da própria gestão, quer seja pela incapacidade da população no

domínio da burocracia ou por outros motivos.

78

Outra hipótese que se confirma é a de que “a sociedade ainda não

evoluiu para o exercício do controle das ações do FUNDEF, comprometendo a

sistemática orientada pela Lei de Responsabilidade Fiscal nesse sentido”.

Mesmo com a criação dos conselhos para atuação nas mais diferentes

políticas públicas, e tendo expressa a missão maior do controle social, ainda não se

pode referendar essa prática. Ficou claro nas falas dos três gestores entrevistados

que os conselheiros se reúnem sistematicamente, cumprem de certa forma a

burocracia criada para referendar e formalizar sua existência, no entanto, os

conselheiros, em geral, desconhecem a legislação, desconhecem as diretrizes da

política e não exercitam o controle social.

Por sua via, a população não tem por cultura exercitar o compromisso e a

responsabilidade com o controle das políticas públicas em geral. Esse

comportamento vai na contramão da perspectiva democrática e limita o alcance da

educação de qualidade para todos.

Outra hipótese que se confirma com esta pesquisa é que “a gestão

pública municipal demonstra fragilidade na adoção de mecanismos gerenciais

capazes de promover a transparência das ações do FUNDEF”.

Nos discursos dos gestores entrevistados, um dos mecanismos oficiais

atualmente utilizados para fins de conferir transparência à gestão pública é o

lançamento dos documentos de planejamento e orçamento em “sites” da internet.

Sem negar a importância desta medida, há que se observar a realidade municipal,

onde expressiva maioria dos residentes não tem acesso à internet. Mesmo que

outras iniciativas venham sendo adotadas, a exemplo da publicação das matérias

em locais de amplo acesso público como é o caso de postos dos Correios e

agências bancárias, na verdade, o conteúdo das informações desanima a leitura dos

dados, sem falar que, nos municípios, a população permanece conformada e sem

maiores interesses de apropriação das matérias que supostamente se expressam

como de interesse público.

79

Romper com a cultura tradicional que situava a ação do Estado de um

lado e a sociedade totalmente excluída da participação e do controle do dinheiro

público é uma necessidade urgente. Ao se preservar antigos comportamentos,

sejam gerenciais, sejam afetos ao comportamento da sociedade, inibem-se, no

campo da educação, as possibilidades de rompimento com os índices de

analfabetismo que ainda hoje persistem.

Por fim, a última hipótese, que este estudo não dispõe de elementos para

confirmar, com os seus achados, é a de que “os impasses na gestão municipal dos

recursos do FUNDEF persistem, uma vez que os responsáveis permanecem

impunes, preservando-se assim o antigo viés cultural da apropriação do dinheiro

público ou mesmo da ineficiência gerencial.

Tal hipótese não pôde ser confirmada porque em nenhum dos municípios

participantes do estudo de caso (Aquiraz, Eusébio e Maracanaú) se verificou, até

então, ocorrência de denúncias sobre o uso indevido dos recursos do FUNDEF,

portanto, não cabe responsabilização de seus gestores, muito menos garantir que a

justiça não se efetiva nesses casos.

Destaca-se ainda que, muito embora esta pesquisa não confirme, nos

casos estudados, responsabilização de gestores pelo uso indevido de dinheiro

público, o fato tem sido matéria amplamente divulgada em todo o País e constatado

no Estado do Ceará por meio de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI do

FUNDEF “vitória da sociedade”, realizada pela Assembleia Legislativa do Estado em

1999).

A CPI constatou no Estado do Ceará algumas irregularidades. Instituições

privadas foram criadas, geralmente por membros das universidades públicas que

intermediaram convênios entre as prefeituras e essas universidades, com o objetivo

de habilitar e capacitar os professores. Algumas instituições criadas com esta

finalidade não eram reconhecidas pelo Conselho de Educação do Ceará.

A CPI apura ainda a inexistência de qualquer processo licitatório,

condição que fere a legislação fiscal, indo de encontro ao princípio da inexigibilidade.

80

Outro fato apurado pela CPI refere-se aos convênios efetivados entre 87

municípios com instituições não autorizadas, objetivando a realização dos cursos de

capacitação, com custos previstos nos limites de 60% definidos na Lei do FUNDEF.

Tais custos estavam muito acima da média do mercado (50 vezes o valor cobrado

pela Universidade Pública Estadual).

Quanto ao funcionamento dos conselhos, criados com a finalidade de

exercer o controle social e fiscal dos recursos do FUNDEF, a CPI constatou

irregularidades em seu funcionamento: os membros dos conselhos eram indicados

pelos prefeitos e secretários de Educação e os conselheiros não tinham acesso à

documentação contábil da Prefeitura.

Tais considerações encerram a abordagem selecionada neste estudo.

Distante da pretensão de se chegar a verdades últimas, deixa-se em aberto a

perspectiva temática estudada, esperando-se que, por sua relevância, outras

investigações sejam efetivadas, para que se possa, com apoio em novos

conhecimentos, contribuir, para a gradativa conquista da democracia na educação

brasileira, consequentemente, um novo comportamento.

81

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CORECON-IPLANCE, 1997.

86

APÊNDICE

Roteiro de Entrevista

PESQUISA: A Lei de Responsabilidade Fiscal como Mecanismo de Controle

Governamental do FUNDEF

1. Dados de Identificação do Gestor

Nome: ___________________________________ Cargo: __________________

Experiências profissionais na área de educação:

__________________________________________________________________

__________________________________________________________________

__________________________________________________________________

__________________________________________________________________

__________________________________________________________________

2 Análise da experiência operacional da gestão municipal do FUNDEF, tomando

por base os quatro eixos nucleares da Lei de Responsabilidade Fiscal.

2.1 O planejamento das ações do FUNDEF corresponde às exigências da LRF?

______________________________________________________________

______________________________________________________________

______________________________________________________________

______________________________________________________________

______________________________________________________________

______________________________________________________________

______________________________________________________________

2.2 O exercício do controle das ações do FUNDEF no Município é uma prática

sistemática orientada pelos determinantes da LRF?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

86

87

2.3 Quais os mecanismos empregados pela gestão municipal para promover a

transparência das ações do FUNDEF?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

2.4 O Município registra experiência de responsabilização de gestores, conforme

determina a LRF relacionada e execução do FUNDEF?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

88

ANEXOS

89

ANEXO I Autorização do uso das informações do município: AQUIRAZ

90

ANEXO II Autorização do uso das informações do município: EUSÉBIO

91

ANEXO III Autorização do uso das informações do município: MARACANAÚ

92

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ LÚCIA MACÊDO SALES

A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A

MUDANÇA NAS PRÁTICAS GERENCIAIS: O CASO

DE GESTORES DO FUNDEF

FORTALEZA - CEARÁ 2008

93

S163e _____Sales, Lúcia Macêdo A Lei de Responsabilidade Fiscal e a Mudança nas

Práticas Gerenciais: O Caso de Gestores do FUNDEF/ Lúcia Macedo Sales. – Fortaleza, 2009.

91p. Orientador: Prof. Dr. Francisco Horácio da Silva Frota. Dissertação (Mestrado Profissional em Planejamento e

Políticas Públicas) – Universidade Estadual do Ceará, Centro de Estudos Sociais Aplicados.

1.O Percurso da Investigação. 2.O Estado Brasileiro sob o Enfoque da Justiça Fiscal. 3.Novo Ordenamento para a Gestão Municipal da Política de Educação. 4.A Lei de Responsabilidade Fiscal e a Mudança nas Práticas Gerenciais do FUNDEF: O Caso dos Municípios de Aquiraz, Eusébio e Maracanaú. I: Universidade Estadual do Ceará, Centro de Estudos Sociais Aplicados.

CDD: 658.3

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