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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE DEPARTAMENTO DE ECOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA A Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro: distribuição, uso do habitat e diversidade genética. Patrícia Farias Rosas Ribeiro NATAL 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE DEPARTAMENTO DE ECOLOGIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA

A Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro:

distribuição, uso do habitat e diversidade genética.

Patrícia Farias Rosas Ribeiro

NATAL

2017

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Patrícia Farias Rosas Ribeiro

A Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro:

distribuição, uso do habitat e diversidade genética.

Orientador: Dr. Eduardo Martins Venticinque

NATAL

2017

Tese apresentada ao programa de Pós- Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Doutor em Ecologia.

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Ribeiro, Patrícia Farias Rosas. A Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordestebrasileiro: distribuição, uso do habitat e diversidade genética/ Patrícia Farias Rosas Ribeiro. - Natal, 2017. 99 f.: il.

Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande doNorte. Centro de Biociências. Programa de Pós-Graduação emEcologia. Orientador: Prof. Dr. Eduardo Martins Venticinque.

1. Mustelidae - Tese. 2. Lutrinae - Tese. 3. BaciasHidrográficas - Tese. 4. Caatinga - Tese. 5. Ocorrência - Tese.6. Detecção - Tese. I. Venticinque, Eduardo Martins. II.Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BSE-CB CDU 574

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Leopoldo Nelson - -Centro de Biociências - CB

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“No Amazonas chama-se ariranha esse quadrúpede que parece um gato,

vivendo em toca à beira de um regato, ou rio caudaloso onde se banha.

Nada com perfeição, tem certa manha,

em várias posições supera o pato, de peixe faz seu predileto prato,

solta um miado feio quando se assanha..."

(A Lontra, Antônio Carlos Barreto, Crateús, 1976)

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Ao meu pai e à minha filha, duas lindas estrelas que iluminaram esta jornada do começo ao fim.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente a todos que tornaram este projeto, um sonho antigo, possível.

À Fundação Grupo Boticário de Proteção a Natureza, Centro de Pesquisas Ambientais

do Nordeste e Mohamed Bin Zayed Species Conservation Fund, por acreditarem na

importância do projeto e fornecerem o suporte financeiro indispensável para a realização desse

trabalho.

Ao Programa de Pós Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande

do Norte pela oportunidade e estrutura oferecida, e à CAPES (Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pela bolsa concedida.

Ao meu orientador, Eduardo M. Venticinque (Dadão), por ter acreditado no projeto

desde o início, mesmo quando ainda parecia loucura "procurar lontra na Caatinga". Pela

amizade, hospitalidade, por todo o conhecimento passado e pela disponibilidade nos momentos

realmente importantes, sempre com tranquilidade e bom humor.

A Frederico Martins, Sylvain Chartier, Felipe Monteiro e Aleksander Hada Ribeiro,

amigos que me acompanharam e ajudaram durante os extensos trabalhos de campo, sem os

quais este trabalho não teria sido realizado. A Weber Silva e Felipe Monteiro pela ajuda na

obtenção de literatura rara sobre a fauna do estado do Ceará.

A Guilherme Mazzochini (Guiga) pela importante ajuda nas análises, e pela boa

vontade e disponibilidade em ajudar em todos os momentos que precisei.

Aos Drs. Eduardo Eizirik e Cristine Trinca pela parceria nas análises genéticas e pelo

apoio durante minha estadia em Porto Alegre.

Aos amigos Paulo Henrique Marinho e Eduardo von Mühlen (Duka), pelas longas

conversas sobre modelos de ocupação, troca de ideias e artigos. A Paulo também pela coleta de

amostras e informações de lontras nas suas andanças pelo Nordeste.

Aos colegas da Pós-Graduação em Ecologia e aos vários amigos da "conexão Manaus -

Natal" pela amizade, conversas, momentos de descontração e discussões ao longo desse anos.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Ecologia pelas discussões ao longo

do curso, em especial ao Dr. Gabriel Correa Costa, que acompanhou o projeto desde o início;

Dr. José Attayde (Coca), pela ajuda nas análises de qualidade da água; e Dr. Mauro Pichorim,

pelas reuniões e conversas que me ajudaram muito a compreender os modelos de ocupação.

Ao Dr. Diego Astúa, Dra. Renata Pardini, Dr. Anderson Feijó, Dr. Carlos Roberto

Fonseca e Dra. Renata Sousa-Lima por terem aceitado o convite para participar da banca,

avaliado o trabalho, e por todas as correções, comentários e sugestões.

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A Fernando Rosas, por ter me aberto as portas ao mundo dos mustelídeos aquáticos,

por todo conhecimento passado e pela ajuda na ideia inicial do projeto. A toda a família do

Laboratório de Mamíferos Aquáticos do INPA pelos muitos anos de convívio, aprendizado e

trabalhos compartilhados, que me renderam a experiência que tenho atualmente para trabalhar

com o grupo.

A Rodrigo Ranulpho, companheiro que escolhi para a minha vida, pelo apoio

fundamental em todas as etapas deste projeto, desde a escolha das áreas de estudo, logística,

formatação de mapas, às inúmeras remadas e andanças em campo, e aos cuidados comigo.

Também pela paciência e compreensão nos momentos mais difíceis, e pelos maravilhosos

momentos compartilhados em campo. Sem você tudo seria mais difícil.

A toda minha querida e grande família, em especial à minha mãe, Gerusa Farias Rosas

Ribeiro, que com todo o amor forneceu a educação, valores e princípios que constituem a base

do que sou hoje, pelo apoio em todos os momentos e por ser o meu porto seguro, para onde

sempre recorro e me sinto acolhida. Ao meu irmão, Mateus Rosas Ribeiro Filho, pelo

incentivo, apoio e por ser um exemplo de pesquisador a ser seguido. À minha irmã, Sandra

Farias Rosas Ribeiro, pela amizade e parceria durante toda a vida, e pelas inúmeras revisões

dos textos em inglês. À minha segunda mãe, Nevinha, por todo amor, cuidados e mimos que

sempre recebi.

Aos meus tios: Yara Rosas e José de Borja Peregrino, por todo apoio e incentivo no

início desta caminhada, em um momento tão difícil; Nelson Rosas, pelo interesse que sempre

teve nas minhas pesquisas e projetos, e por ser mais um grande referencial que tenho de ética e

pesquisa na academia; Clemente Rosas e Paula Baracho, pelo apoio em vários momentos, em

especial nesta fase final de tantas mudanças; Rita de Cássia, pelo apoio em todos os momentos

e por ser um exemplo de mulher a ser seguido, uma pessoa forte, de coração enorme e sempre

disposta a ajudar.

A Tânia e Joaozinho, tios queridos, pela hospitalidade sempre tão aconchegante em

Natal, e a Tânia também por ter se tornado a dentista oficial e mais querida da Ecologia.

A todas as pessoas e famílias maravilhosas que conheci ao longo dos rios nordestinos,

do Velho Chico (Rio São Francisco) ao Velho Monge (Rio Parnaíba). Pessoas simples e

sempre de portas abertas para uma conversa, abrigo, café... a todos os pescadores que me

acompanharam e forneceram importantes informações sobre as lontras.

Às lontras, animais tão misteriosos e fantásticos, que raramente se permitem serem

vistas, mas que deixaram seus rastrinhos ao longo do meu caminho, comprovando sua

existência e resistência diante das condições mais adversas.

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Por último, não só agradeço como dedico esta tese ao meu Pai, Mateus Rosas Ribeiro, o

qual nunca estará in memoriam, pois é uma presença muito viva em vários momentos da minha

vida. Foi o maior incentivador deste doutorado e, apesar de não ter presenciado a sua

concretização nesse plano, me guiou em todos os momentos. E a minha filha, Elis, que mesmo

ainda na barriga, me transmitiu uma calma e tranquilidade fundamentais nesta última etapa.

Espero poder contribuir de alguma forma para que você ainda conheça um pouco da cultura e

beleza do Nordeste, como eu conheci.

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SUMÁRIO RESUMO GERAL ........................................................................................................................9 ABSTRACT ................................................................................................................................11 CAPÍTULO I - New records and update on the geographic distribution of Lontra longicaudis (Olfers, 1818) (Carnivora: Mustelidae) in Seasonally Dry Tropical Forests of northeastern Brazil* ....................................................................................................................13 ACKNOWLEDGEMENTS ........................................................................................................25 LITERATURE CITED ...............................................................................................................25 CAPÍTULO II - Ocupação e uso do habitat pela Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro* ....................................................................................................................30 RESUMO ....................................................................................................................................31 1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................................32 2. MATERIAL E MÉTODOS ....................................................................................................34 3. RESULTADOS .......................................................................................................................48 4. DISCUSSÃO ...........................................................................................................................54 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................59 CAPÍTULO III - Diversidade genética e padrão de dispersão da Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no nordeste brasileiro* ...........................................................................................67 RESUMO ....................................................................................................................................68 1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................................69 2. MATERIAL E MÉTODOS ....................................................................................................72 3. RESULTADOS .......................................................................................................................81 4. DISCUSSÃO ...........................................................................................................................90 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................93 CONCLUSÃO GERAL ..............................................................................................................98

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RESUMO GERAL

A distribuição geográfica de uma espécie é uma informação básica essencial para

planejamentos de conservação. Esta informação, no entanto, muitas vezes é tendenciosa para

algumas regiões ou grupos taxonômicos, de acordo com as facilidades de acesso e

características da história natural. A lontra neotropical [Lontra longicaudis (Olfers,1818)] é

uma espécie pouco estudada devido ao seu comportamento discreto e a consequente baixa

detectabilidade na natureza. Essa situação é agravada na região Nordeste do Brasil, que por

muito tempo foi considerada como uma lacuna nos seus mapas de distribuição, sendo

atualmente apontada como uma região prioritária para estudos com a espécie. Este projeto teve

o objetivo de entender como a L. longicaudis está distribuída no Nordeste brasileiro e os fatores

estruturantes da sua distribuição, uso do habitat e diversidade genética. Este foi o primeiro

estudo com enfoque para a espécie na região, realizado através de uma amostragem

padronizada em 17 bacias hidrográficas do Nordeste brasileiro ao Norte do Rio São Francisco,

entre os estados de Alagoas e Piauí. Cada bacia hidrográfica foi amostrada em três trechos

(alto, médio e baixo curso), sendo em cada trecho percorridos aproximadamente 5km, repetidos

ao longo de 4 dias, em busca de indícios de presença da espécie. Isto resultou em 726 km,

percorridos em 45 trechos de rio amostrados. No primeiro capítulo discutimos a ocorrência da

L. longicaudis na Caatinga, bioma semiárido onde existia apenas um registro de ocorrência da

espécie relatado na literatura, e que por isso não tem sido considerado como parte da sua

distribuição em planejamentos e estratégias de conservação. São apresentados registros

históricos e atuais inéditos de ocorrência da L. longicaudis na Caatinga, discutidos os fatores

que podem estar influenciando sua ocorrência na região, e é proposta a atualização do mapa de

distribuição da espécie, com base na confirmação de uma real lacuna na sua distribuição atual.

No segundo capítulo nós analisamos os fatores ambientais, climáticos e antrópicos que

influenciam no padrão de ocupação, detecção e uso do habitat da L. longicaudis nas bacias

hidrográficas do Nordeste Brasileiro. A probabilidade de detecção da L. longicaudis na região

foi alta e negativamente influenciada pela ordem do rio, variável relacionada à localização do

trecho de rio na rede de drenagem. A sazonalidade da precipitação foi o principal fator

determinante da ocupação da espécie na região, que se apresenta concentrada na subregião das

bacias que drenam para o leste, onde a sazonalidade da precipitação é menor. Esta variável

climática também foi importante para a ocorrência e uso do habitat pela espécie, mais intenso

nas áreas com menor sazonalidade, relacionadas à Floresta Atlântica. A Floresta Atlântica

nordestina é a porção menos conservada deste bioma. Nesta região as lontras utilizaram mais os

rios com menor área de captação de água a montante, que correspondem a tributários menores,

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que podem oferecer melhores condições ambientais que os rios principais, funcionando como

um refúgio para a espécie. Mesmo utilizando refúgios, o uso do habitat foi negativamente

correlacionado com a porcentagem de remanescentes naturais, uma consequência indireta do

estado de degradação das áreas mais utilizadas pela espécie, o que coloca a L. longicaudis em

um estado de alerta na região. Para entender como está estruturada a população de lontras do

Nordeste brasileiro e fornecer subsídios para a sua persistência a longo prazo, no terceiro

capítulo nós analisamos a diversidade genética e fluxo gênico da espécie na região, através de

DNA mitocondrial e da análise de cinco cenários alternativos de dispersão. Para isto foram

analisadas 36 amostras não invasivas (fezes frescas, muco e tecido), provenientes de oito bacias

hidrográficas. Destas amostras, 17 amplificaram os três segmentos analisados e foram

consideradas indivíduos distintos pela localização amostral e composição genética. Estes

indivíduos são representativos de 7 haplótipos, dos quais 4 foram identificados pela primeira

vez neste estudo. A espécie apresentou alta diversidade haplotípica, mas baixa variabilidade

nucleotídica na região. A maior diferenciação genética foi observada em duas amostras do

Piauí, acima da área de Caatinga onde a ausência da espécie foi confirmada neste estudo,

corroborando a existência de uma barreira climática por onde o fluxo gênico pode estar

interrompido há mais tempo. A população de lontra do Nordeste apresentou diferença genética

significativa em relação aos grupos geográficos da Amazônia e do Leste da América do Sul, o

que indica menor fluxo gênico entre essas regiões. O cenário que atribuiu um custo elevado

para a dispersão por terra foi o que apresentou relação mais forte com a divergência genética

observada entre as amostras da região nordeste, indicando que a espécie é capaz de se dispersar

por terra, mas em situações extremas. Já a divergência genética entre as bacias costeiras

apresentou relação mais forte com as distâncias geográficas (euclidiana e trecho de bacias), o

que pode ser resultado de uma região mais homogênea, sujeita a alagamentos, onde a paisagem

impõe menos resistência à dispersão por animais semiaquáticos. Análises do caminho de menor

custo indicam o Rio São Francisco como uma importante rota de dispersão, conectando as

bacias costeiras do Nordeste com as bacias localizadas ao Norte da Caatinga, o que ressalta a

importância da sua preservação para a manutenção da diversidade genética na região. As três

questões abordadas neste estudo preenchem uma importante lacuna de conhecimento sobre a

lontra neotropical no Nordeste do Brasil, uma das regiões mais secas da sua área de

distribuição, atendendo a ações prioritárias do plano nacional de ações para a conservação da

espécie.

Palavras-chave: Mustelidae, Lutrinae, Semiaquático, Bacias hidrográficas, Caatinga,

Ocorrência, Detecção, Conservação.

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ABSTRACT

The geographic distribution of a species is an essential information for conservation

planning. This information, however, is often biased towards some regions or taxonomic

groups, according to accessibility of sampling sites and natural history of the species studied.

The neotropical otter [Lontra longicaudis (Olfers, 1818)] is a little studied species because of

its elusive behaviour, which results in low detectability in natural environments. This situation

is worse in Northeastern Brazil, which for a long time appeared as a gap in L. longicaudis

distribution maps, and is currently appointed as a priority region for studies with the species.

This project aimed to understand how L. longicaudis is distributed in Northeastern Brazil and

the structuring factors of its distribution, habitat use and genetic diversity. This was the first

dedicated otter survey in the region, conducted systematically during field campaigns to 17

river basins of Northeastern Brazil, in the area North of São Francisco River, between the states

of Alagoas and Piauí. Each river basin was sampled at three stretches (lower, middle and upper

courses), over approximately 5 km, repeatedly for four days each, looking for evidences of the

species presence. The overall sample effort was 726 km in 45 sampled river stretches. In the

first chapter we discuss L. longicaudis occurrence in Caatinga, a semi-arid biome where a

single record of the species occurrence was reported in the literature, and which has not been

considered as part of its distribution in conservation planning and strategies. We report

historical and current new occurrence records of L. longicaudis in Caatinga, discuss factors that

may be influencing its occurrence in the region, and propose updating the species distribution

map, based on the confirmation of a real gap in its current distribution. In the second chapter

we analyze environmental, climatic and anthropic factors influencing otter occupancy,

detection and habitat use on river basins of Northeastern Brazil. Detection probability of otters'

signs was high and negatively influenced by river order, a variable related to the location of the

river stretch in the drainage network. Precipitation seasonality was the main determinant of L.

longicaudis occupancy in the region, which is concentrated in the subregion of river basins

draining to the East, with lower precipitation seasonality. This climatic variable was also

important to explain occurrence and habitat use of the species, which was more intense in areas

of lower seasonality, corresponding to the Atlantic forest. Northeastern Atlantic Forest is the

least conserved portion of this biome. In this region, otters used more rivers with lower water

catchment area upstream, which corresponds to smaller tributaries, providers of better

environmental conditions to serve as refuge for the species than main rivers. Even using these

refuges, the intensity of habitat use was negatively correlated with the percentage of natural

remnants, an indirect consequence of the degradation status of the most frequently used areas

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by the species, placing L. longicaudis at risk in the region. In order to understand how the

Northeastern Brazil otter population is structured and to provide subsidies to its long-term

persistence, in the third chapter we analyze the species genetic diversity and gene flow through

mitochondrial DNA and analyzing five alternative dispersal scenarios. A total of 36

noninvasive samples (fresh faeces, mucus and tissue), from eight river basins, were analyzed.

Within these samples, 17 amplified the three mitochondrial DNA segments analyzed, and were

considered distinct individuals according to the sampling locality and the genetic composition.

These individuals are representatives of seven haplotypes, from which four were identified for

the first time in this study. Estimates of genetic variability indicate high haplotype diversity and

low nucleotide variability. The greatest genetic differentiation among samples were observed in

two samples from Piauí, north from the Caatinga area were the species absence was confirmed

in this study, confirming the climatic barrier through which gene flow might have been

interrupted for a long time. The Northeastern otter population showed a significant genetic

difference compared to Amazonia and East of South America groups. The "higher land

dispersal cost" scenario was the most correlated with the observed genetic differentiation

among sampled individuals, indicating that the species is able to disperse by land, but only in

extreme situations. Genetic divergence between coastal river basins showed a strong

relationship with geographical distances (Euclidian and watershed distances), which may be the

result of a more homogeneous region, subject to flooding, where landscape imposes lower

resistance to dispersal by semi-aquatic animals. The least cost path analyzes indicate the São

Francisco River as an important dispersal route connecting coastal river basins of Northeastern

Brazil with basins located North from the Caatinga, which highlights the importance of São

Francisco river basin conservation for the maintenance of the genetic diversity in this region.

The three objectives of this study fill an important knowledge gap on Neotropical otter in

Northeastern Brazil, one of the driest regions of its distribution, attending to priority actions of

the national action plan for the species conservation.

Keywords: Mustelidae; Lutrinae; Semiaquatic; River Basins; Caatinga; Occurrence; Detection; Conservation.

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CAPÍTULO I

New records and update on the geographic distribution of Lontra longicaudis (Olfers, 1818) (Carnivora: Mustelidae) in Seasonally Dry

Tropical Forests of northeastern Brazil*

*Rosas-Ribeiro, P. F.; Ranulpho, R.; Venticinque, E. M. 2017. New records and update on the

geographic distribution of Lontra longicaudis (Olfers, 1818) (Carnivora: Mustelidae) in

Seasonally Dry Tropical Forests of northeastern Brazil. Check List 13(3): 1-8.

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NGD 27324

Rosas-Ribeiro et al. | Lontra longicaudis occurrence on Caatinga biome

New records and update on the geographic distribution of Lontra longicaudis (Olfers, 1818)

(Carnivora: Mustelidae) in Seasonally Dry Tropical Forests of northeastern Brazil

Patrícia F. Rosas-Ribeiro1, 3, Rodrigo Ranulpho2 & Eduardo M. Venticinque1

1 Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Biociências, Departamento

de Ecologia, Caixa Postal 1524, CEP 59078-970, Natal, RN, Brazil

2 Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Geografia, Avenida Prof.

Morais Rego, Cidade Universitária, CEP 50670-901, Recife, PE, Brazil

3 Corresponding author. E-mail: [email protected]

Abstract: We confirmed occurrences of Lontra longicaudis (Olfers, 1818) in Seasonally Dry

Tropical Forests (Caatinga) of 10 river basins in northeastern Brazil, reporting the first

records of the species in five of them. The species was not found in river basins totally

inserted in Caatinga, nor where Caatinga borders Cerrado (Piauí state), indicating a gap in the

species distribution. We report the first otter occurrence in Piauí, in the Cerrado biome of the

southern part of the state. The relevance of these results for Neotropical Otter conservation is

discussed, and an update of the species distribution map is proposed.

Key words: Caatinga; semi-arid; Lutrinae; Near Threatened species; geographic distribution;

conservation; occurrence

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Neotropical Otter, Lontra longicaudis (Olfers, 1818), is one of the least studied species of the

subfamily Lutrinae (Mustelidae) because of its elusive behaviour and consequent low

detectability in natural environments (ROSAS 2004). Although the species is described as

widespread, occurring originally from Mexico to Uruguay (KRUUK 2006), its geographical

distribution is poorly known in some regions, such as in northeastern Brazil, which until

recently appeared as a gap in L. longicaudis distribution maps (EISENBERG & REDFORD 1999;

EMMONS & FEER 1999; LARIVIÈRE 1999; KRUUK 2006). Recent studies have reported the

occurrence of L. longicaudis in some localities of northeastern Brazil, including the states of

Bahia (BA) (Souto 2012), Sergipe (SE) (ASTÚA et al. 2010; DANTAS & DONATO 2011;

MENDONÇA & MENDONÇA 2012; DIAS & BOCCHIGLIERI 2016), Alagoas (AL) (FERNANDES

2003), Pernambuco (PE) (ASTÚA et al. 2010; FEIJÓ & LANGGUTH 2013), Paraíba (PB) (ASTÚA

et al. 2010; FEIJÓ & LANGGUTH 2013; TOLEDO et al. 2014), Rio Grande do Norte (RN)

(LAURENTINO & SOUSA 2014), and Maranhão (MA) (MESQUITA & MENESES 2015). These

reports indicate that the aforementioned gap was not due to the actual absence of the species,

but to a lack of studies and adequate sampling in the region.

Records of L. longicaudis in northeastern Brazil are mostly restricted to Atlantic Forest and

its associated ecosystems. No record was reported in Ceará and Piauí, which are states mostly

covered by a Seasonally Dry Tropical Forests biome, the Caatinga. This biome has not been

considered in the species geographical distribution (RODRIGUES et al. 2013). A single

occurrence of this species in Caatinga was reported in São Francisco River (SE), which was

the first official record of L. longicaudis in this biome (DIAS & BOCCHIGLIERI 2016).

However, no field inventory to verify the presence of the Neotropical Otter was conducted in

the region. All L. longicaudis occurrence data in northeastern Brazil are occasional reports or

compilations of existing occurrence data, which could be geographically biased towards more

populated or better-studied regions.

In a recent study, RHEINGANTZ et al. (2014) estimated a species distribution model for L.

longicaudis and suggested the expansion of its current distribution to new areas, covering

Brazil’s Northeast Region, including Caatinga biome. Following recommendations by

RHEINGANTZ et al. (2014), and based on existing occurrence data, the distribution map of L.

longicaudis was updated, and now the entire Brazilian territory is included within its

distribution range (IUCN 2015). Although the map is presented as a uniform polygon,

RHEINGANTZ et al. (2014) pointed the importance of gathering occurrence data in areas with

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little information, and recommended that northeastern Brazil be a priority area for future

studies; this region represents one of the driest areas within the range of the Neotropical Otter.

Confirming the current distribution of this species, with emphasis on North and Northeast

regions, is one of the actions set out in the national action plan for the conservation of otters

(ICMBio/MMA 2010). Investigating the isolation of otter populations in northeastern Brazil

is also necessary for this species’ conservation, according to a recent risk assessment of L.

longicaudis (RODRIGUES et al. 2013).

The conservation status of L. longicaudis was recently updated from Data Deficient to Near

Threatened by the International Union for the Conservation of Nature, because of increasing

anthropogenic threats to aquatic and terrestrial environments (RHEINGANTZ & TRINCA 2015).

The species is also classified as Near Threatened in Brazil, and Vulnerable in the northeastern

Atlantic Forest region because of the high level of habitat degradation (RODRIGUES et al.

2013). The species’ conservation status was not assessed for the Caatinga due to the lack of

occurrence data in this biome.

To improve the understanding of L. longicaudis distribution in northeastern Brazil, the

present study assessed this species’ occurrence in Caatinga, a seasonally dry tropical forest in

the semi-arid region of Brazil's Northeast.

Field campaigns were planned and conducted in northeastern Brazil, north of the São

Francisco River. This area is inserted in two freshwater ecoregions: Parnaíba, and

Northeastern Caatinga and Coastal Drainages (NCCD) (ABELL 2008). The Parnaíba

freshwater ecoregion consists of the Paranaíba River and its tributaries, covering the entire

Piauí state and a border region between Piauí and Maranhão, including areas of Caatinga and

Cerrado biomes; the NCCD freshwater ecoregion extends between Ceará and Alagoas states,

covering several smaller river basins and areas of Atlantic Forest and Caatinga biomes

(Figure 1). We used the biome boundaries given by the Brazilian Institute of Geography and

Statistics, the same adopted for environmental laws.

In the Caatinga biome, the main focus of our study, low annual rainfall ranges from 240 to

1500 mm, but with 50% of the Caatinga’s area receiving less than 750 mm/year (PRADO

2003). Additionally, the irregularity of rainfalls is the main characteristic of Caatinga biome,

where most of the rainfall is concentrated within a three-month period, with wide annual and

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interannual variation causing periodic severe droughts (PRADO 2003). Even with these

droughts, the biome sustains 11.8% of the Brazilian human population, and has been under

increasing anthropic pressure for years (RIBEIRO et al. 2015).

We selected 16 river basins with the goal to fill gaps in the species distribution records. Each

river basin was sampled at three stretches (lower, middle and upper courses; Figure 1). As an

exception, two rivers of Parnaíba ecoregion were sampled at only two stretches, a strategy to

maximize the number of sampled rivers in this ecoregion, where most of the records were

historical occurrences. Headwaters in Caatinga biome are often intermittent and their

surroundings stay completely dry most of the year. In these cases, because otters are semi-

aquatic animals, instead of sampling the upper stretches near headwaters, we sampled the

upper stretches where a minimal amount of water was maintained throughout the year (i.e.,

river stretches at least 2 m wide or water ponds less than 1 km apart).

Each river stretch was sampled repeatedly for four days over approximately 5 km, looking for

sights or indirect signs of otter presence (dens, tracks, faeces, and latrines). This amounted to

an overall sample effort of 725 km, of which 472.5 km were inside the Caatinga biome.

Sampled stretches were navigated using a boat with outboard engine (controlled speed ≤ 7

km/h) or kayak, or by walking, depending on navigation conditions. Camera traps were

placed near fresh dens, trails or latrines in order to obtain photographic records. Besides the

active search, semi-structured interviews were conducted with local people, to gather

information about historical and current occurrences. At least six interviews were conducted

in each sampled river stretch, totalling 445 interviews. Interview records were only

considered when supported by pictures, or by detailed report from more than one interviewee.

Occurrences were considered historical when no evidence of this species’ presence was

recorded for more than 10 years.

The extant presence of L. longicaudis in Caatinga biome was recorded in seven of the 16

sampled river basins, all of them inserted in NCCD freshwater ecoregion, as well as in an

additional stretch sampled in São Francisco River (Figure 1; Table 1). In addition, otter

presence in Caatinga was confirmed in two river basins not included in our sampling effort:

upper Jundiaí River (Macaíba, RN), where a dead specimen was found; and upper Paraíba

River (Umbuzeiro, PB), based on the interviews. These results show a total of 10 river basins

in the Caatinga of northeastern Brazil where the Neotropical otter is present (Figure 1; Table

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18

1). Considering only studies that present geographic coordinates, we report here the first

accurate records of the species for five of the 10 river basins: Pium (RN), Jundiaí (RN), Jacu

(RN), Curimatau (RN/PB), and Coruripe (AL) (Table 1). Except for São Francisco River, all

of the sampled river stretches have an intermittent hydrologic regime, maintaining some

ponds or very little volume and water flow during the dry season.

Figure 1. Study area in northeastern Brazil, north of São Francisco River (right inset); Sampled

river stretches in Parnaíba (dark blue) and Northeastern Caatinga and Coastal Drainages (light

blue) freshwater ecoregions, where current occurrence of otter was confirmed - indicated by black

squares, or not confirmed - indicated by white squares (left inset); The main map shows records of

Lontra longicaudis in Caatinga of northeastern Brazil: signs and camera trap records (black dots),

records from interviews (black triangles – current; grey triangles – historical). Black stars indicate

first records of Lontra longicaudis in Piauí state. Numbers next to the records are identification

labels (Record ID in Table 1). Small gray squares indicate records in Atlantic Forest. Datum

WGS1984.

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Table 1. Current and historical records of Lontra longicaudis in Caatinga of northeastern Brazil, and first records of the species in Piauí state (PI). Record type: S= signs, I= interviews, CT= camera trap records, C= carcass. NCCD= Northeastern Caatinga and Coastal Drainages freshwater ecoregion.

Record ID Freshwater Ecoregion River Basin River

Stretch State City Number of records

Record Type Latitudea Longitudea Year

1 - 5 São Francisco São Francisco Lower AL/SE Piranhas/Canidé do São Francisco 5 S, I, CT -9.6282 -37.7544 2015

6 - 15 NCCD Pium Upper RN Macaíba/São José de Mipibu 10 S, I -5.9734 -35.3287 2013

16 - 23 NCCD Jacu Middle RN Passagem/Santo Antônio 8 S, I -6.2813 -35.4131 2013

24 NCCD Jacu Upper RN São José do Campestre 1 I -6.3542 -35.7946 2013

25 - 41 NCCD Curimatau Middle RN Montanhas 17 S, I, CT -6.4459 -35.3052 2014

42, 43 NCCD Curimatau Upper PB Caiçara 2 S, CT -6.6258 -35.4923 2014 44 - 49 NCCD Camaratuba Upper PB Lagoa de Dentro/Curral de Cima 6 S, I, CT -6.7161 -35.3403 2014

50 - 58 NCCD Goiana Upper PE Bom Jardim, São Vicente Ferrer 9 S, I -7.7815 -35.6088 2015

59 - 67 NCCD Una Upper PE Cachoeirinha 9 S, I -8.5194 -36.2909 2015

68 - 84 NCCD Coruripe Upper AL Palmeira dos Índios 17 S, I, C -9.431 -36.6153 2015 85 NCCD Jundiaí Upper RN Macaíba 1 C -5.9896 -35.4541 2015 86 NCCD Paraíba Upper PB Umbuzeiro 1 I -7.6609 -35.836 2015

87 - 89 Parnaiba Longá Lower PI Caxingó 3 I -3.3535 -41.9092 >50 years agoc

90, 91 Parnaiba Longá Middle PI São José do Divino 2 I -3.8084 -41.8504 ≅50 years agoc

92, 93 Parnaiba Longá Upper PI Barras/Batalha, Boa Hora 2 I -4.013 -42.2641 ≅50 years agoc

94 Parnaiba Poti Lower PI Demerval Lobão 1 I -5.3426 -42.6295 >50 years agoc

95 Parnaiba Parnaíba Middle PI/MA Palmeirais/Parnarama 1 I -5.8979 -43.0976 >50 years agoc

96 Parnaiba Canindé Lower PI Amarante 2 I -6.4703 -42.7166 ≅50 years agoc

97 - 109 Parnaiba Uruçui-Pretob Upper PI Currais/Baixa Grande do Ribeiro 13 S, I -8.6798 -44.8844 2014

110 - 116 Parnaiba Uruçui-Pretob Lower PI Uruçuí 7 S, I, CT -7.3372 -44.6167 2014 117, 118 Parnaiba Parnaibab Upper PI Uruçuí 2 S, I -7.3121 -44.6321 2014

a When more than one record were found in a river stretch, we presented geographic coordinates of the record further inside Caatinga biome; b First records of Lontra longicaudis in Piauí state, Cerrado biome; c Historical records of Lontra longicaudis: no evidence of the species occurrence for more than 10 years

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Current occurrences of Lontra longicaudis were mostly confirmed in multiple occasions, by

signs (Figure 2), interviews, and sometimes also by camera trap records (Figure 3; Table 1),

indicating that otters are residents or frequent users of these river stretches. Otter signs,

especially faeces, are the best evidence of otter presence, since they are quite conspicuous,

frequently found on prominent rocks, sandbanks and trunks along riverbanks (QUADROS &

MONTEIRO-FILHO 2002; KRUUK 2006; KASPER et al. 2008). Furthermore, otter faeces are

easily identified by their content and smell, consisting mainly of fish and crustacean remains

(KRUUK 2006). A voucher specimen (skull) was collected in April 2015 in the upper stretch

of Coruripe River basin (AL), and is deposited in the mammal collection of the Departamento

de Zoologia, Universidade Federal de Pernambuco, UFPE 3332.

Figure 2. Lontra longicaudis faeces in the middle stretch of Pium River, Rio Grande do Norte state.

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Figure 3. Lontra longicaudis in the lower stretch of Uruçui-Preto River, South of Piauí state.

Our records confirm the presence of L. longicaudis in Caatinga biome. All current records of

the species, however, are located in river basins divided between both the Caatinga and

Atlantic Forest biomes, and most of them in a transition zone between the two biomes.

Although current occurrences had been recorded in intermittent river stretches, all of these

river basins have some perennial stretches at their lower course. The occurrences further

inside the Caatinga biome were recorded in São Francisco river basin, which is the largest

river of the region, with the headwaters in the Cerrado of southeastern Brazil and with a

perennial hydrologic regime. This indicates that water availability is the main factor limiting

otter occurrence in northeastern Brazil.

Neotropical Otter occurs in other seasonally dry tropical forests along its distribution, for

instance in Mexico (GALLO REYNOSO 1997), Colombia (GARCÍA-HERRERA et al. 2015), and

Bolivia (TARIFA et al. 2010). In these regions, however, tropical dry forests occur as patches

within an environmental mosaic encompassing more humid forests, where perennial rivers

arise. The mammalian community within dry forests of the upper Tuichi River (Asariamas,

La Paz, Bolivia) consists of species from adjacent humid forests (RÍOS-UZEDA et al. 2001). In

Mexico, the Neotropical Otter usually occurs in arid and semi-arid regions, but always

associated with perennial rivers or rivers that maintain permanent ponds (GALLO REYNOSO

1997; MONTERRUBIO-RICO & CHARRE-MEDELLÍN 2014). Caatinga is the only vast continuous

area of seasonally dry tropical forest in South America (SANTOS et al. 2012) and one of the

most extensive contiguous areas of tropical dry forest in the world (MILES et al. 2006). It

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encompasses many rivers that originate from and are totally inserted within this biome; they

are intermittent for their entire course.

The ability of otters to survive in semi-arid conditions has been shown for the Eurasian Otter

[Lutra lutra (Linnaeus, 1758)] in Mediterranean ecosystems (RUIZ-OLMO & JIMÉNEZ 2008a).

In this region, otters can frequently occur in almost dry rivers, provided that some ponds

exist; this is not directly related to the availability of water itself, but to the availability of

prey, which include mostly aquatic species (RUIZ-OLMO et al. 2001; RUIZ-OLMO et al 2007).

Despite the ability to adapt to scarce water conditions, long periods of drought decrease

resource availability for otters, especially prey, affecting the species in a medium-term (RUIZ-

OLMO & JIMÉNEZ 2008a). The reduction in the amount of water during these periods also

increases the risks associated with foraging, as the otters need to look for food more

frequently in shallow areas or out of water, where semi-aquatic species are weaker

competitors than terrestrial species, and become more vulnerable to predation and to

becoming roadkill (RUIZ-OLMO et al. 2001; RUIZ-OLMO & JIMÉNEZ 2008b). The reliance on

ponds also makes them more vulnerable to being harassed and killed by local fishermen

(CARRILLO-RUBIO & LAFÓN 2004). Survival in unstable and harsh climate environments

causes additional ecological stress to the animal (RUIZ-OLMO & JIMÉNEZ 2008b), which can

be worrying if compounded with normally-tolerated environmental impacts. In these

situations, otters can migrate to more stable nearby river basins (RUIZ-OLMO & JIMÉNEZ

2008A; RUIZ-OLMO & JIMÉNEZ 2008b), which may have been the cause for the absence of

otters in Parnaíba freshwater ecoregion in the last 50 years. The Parnaíba River has a

perennial hydrologic regime, and most of the sampled tributaries maintain water in many

stretches or large ponds throughout the year. Nevertheless, in this region the Caatinga borders

the Cerrado, the latter a climatically milder biome, where tributaries of the Parnaíba are

perennial and may provide less stressful conditions for the species.

River basins completely inserted in Caatinga are under greater influence of semi-arid climate.

Caatinga biome is characterized by periodic severe droughts every few years, with rare events

of floods (KROL et al. 2001; PRADO 2003). Some of river basins completely inserted in this

biome have an artificial perennial hydrologic regime because of large reservoirs that control

water flow. However, all of these rivers were originally intermittent in most of their course

and dried completely for long periods (ROSA et al. 2003). The lower frequency and

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pronounced irregularity of rainfall, associated with strong water demand from human

populations, can be the limiting factor for the occurrence of otters in river basins entirely

inserted in Caatinga. Thus, our results indicate a real gap in the current species distribution at

this biome. The existence of such gap is also corroborated by the areas of lesser suitability

values in northeastern Brazil, estimated by the previously published species distribution

model (RHEINGANTZ et al. 2014).

There is no record of occurrences of L. longicaudis in historical faunal surveys of Ceará (DIAS

DA ROCHA 1948; PAIVA 1973; MARES et al. 1981). One exception was reported by the

historian GOMES DE FREITAS (1972), who stated that the last otters were seen in Vale do

Coronzó, Jucá River, a tributary of upper Jaguaribe River. This tributary is within the same

Caatinga ecoregion as São José das Lontras district (Ipueiras, CE) where the folk story

suggests the possible existence of Neotropical Otters more than a century ago. This is a high-

altitude region having a wetter climate. In earlier times, it may have been a refuge for L.

longicaudis in the Caatinga of Ceará, but now it seems to be absent for a long time. None of

the oldest interviewees declared to have seen the species.

Studies to assess factors influencing the occurrence of L. longicaudis in northeastern Brazil

are the next step to increase knowledge and contribute to this species’ conservation in the

region. This is especially important in the Caatinga, a highly impacted biome that has been

neglected by scientific research and conservation strategies (SANTOS et al. 2011, RIBEIRO et

al. 2015). Water, an essential resource for otters, is increasingly scarce and demanded by

human population in this biome (KROL et al. 2001). We propose updating the IUCN

distribution map of L. longicaudis to remove the area of northeastern Brazil where there was

no direct or indirect evidence of the species' current presence during our sampling, and where

none exists in the literature (Figure 4). The excluded area should include river basins

completely inserted in Caatinga and those basins where the Caatinga borders the Cerrado; this

includes northwestern Rio Grande do Norte and western Paraiba, the whole of Ceará, and the

Caatinga of northern Piaui.

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24

Figure 4. Proposed updated map for Lontra longicaudis distribution, to include the gap where

no current evidence of the species occurrence was recorded in this study, nor exists in the

literature. The excluded area should include the northwestern Rio Grande do Norte and

western Paraiba, the whole of Ceará, and the Caatinga of northern Piaui. Distribution map

modified from IUCN 2015. Datum WGS1984.

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25

ACKNOWLEDGEMENTS

We are grateful to Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza and the Mohamed bin

Zayed Species Conservation Fund for the financial support of this study, and to the Centro de

Pesquisas Ambientais do Nordeste (CEPAN) for institutional support. We also thank

Frederico Martins, Sylvain Chartier, Felipe Monteiro and Aleksander Hada Ribeiro for

substantial assistance in field campaigns; Weber Silva and Felipe Monteiro for providing rare

literature about the fauna of Ceará state; Paulo H. Marinho for collecting and providing

information of a specimen found in RN; and the two anonymous reviewers and editors for

their valuable suggestions. P.R.R. was supported by a fellowship from CAPES (Coordenação

de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) and E.M.V. received a grant from CNPq

(Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; 309458/2013-7).

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Authors’ contributions: PRR and EMV designed sampling, conducted data analyses and

discussions, PRR and RR conducted field campaigns for data collection, RR contributed in

image analyses and maps, and PRR wrote the manuscript.

Received: 15 December 2016

Accepted: 29 March 2017

Academic editor: Guilherme S. T. Garbino

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CAPÍTULO II

Ocupação e uso do habitat pela Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro*

* Manuscrito em preparação

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Ocupação e uso do habitat pela Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro

Patrícia F. Rosas-Ribeiro1; Eduardo M. Venticinque1

1 Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Biociências, Departamento de Ecologia, Caixa Postal 1524, CEP 59078-970, Natal, RN, Brazil

RESUMO

Entender os fatores que influenciam a ocorrência e uso do habitat é essencial para a efetividade de estratégias de conservação que possam garantir a persistência das espécies em ambientes degradados. A lontra neotropical [Lontra longicaudis (Olfers,1818)] é um carnívoro semiaquático, recentemente classificado como quase ameaçado de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza, pela crescente degradação do ambiente aquático e terrestre onde vive. Sendo uma das espécies menos estudadas da subfamíllia Lutrinae, a lacuna de conhecimento em relação à L. longicaudis é agravada no nordeste brasileiro, que até recentemente aparecia como uma lacuna nos seus mapas de distribuição. Neste estudo nós analisamos o padrão de ocupação e uso do habitat da L. longicaudis no nordeste brasileiro ao norte do rio São Francisco. Para isto foram amostradas 45 microbacias, distribuídas em 17 bacias hidrográficas, a procura de vestígios de lontra. Foram utilizados modelos de ocupação para analisar a influência de covariáveis ambientais, climáticas e antrópicas na detecção e ocupação da espécie na região. Modelos lineares generalizados mistos foram utilizados para modelar a intensidade de uso do habitat em função das mesmas covariáveis, na subregião das bacias hidrográficas que drenam para o leste, onde houve maior concentração de registros da espécie. A probabilidade de detecção da L. longicaudis na região foi alta e negativamente influenciada pela ordem do rio. A sazonalidade da precipitação foi o principal fator determinante da ocupação da espécie na região, que se apresenta concentrada na subregião das bacias que drenam para o leste, onde a sazonalidade da precipitação é menor, corroborando a ausência previamente relatada da espécie nas bacias totalmente inseridas na Caatinga. Esta variável climática também foi importante para a ocorrência e uso do habitat pela espécie, que foi mais intenso nas áreas com menor sazonalidade, relacionadas à Floresta Atlântica. A Floresta Atlântica nordestina é a porção menos conservada deste bioma. Nesta região as lontras utilizaram mais os rios com menor área de captação de água a montante, que correspondem a tributários menores, com melhores condições ambientais que os rios principais, e que podem funcionar como um refúgio para a espécie. Mesmo utilizando refúgios, o uso do habitat foi negativamente correlacionado com a porcentagem de remanescentes naturais, uma consequência indireta do estado de degradação das áreas mais utilizadas pela espécie, o que coloca a L. longicaudis em estado de alerta na região. Ressaltamos a necessidade urgente de estudos populacionais e estratégias de conservação direcionadas à espécie no Nordeste brasileiro, para que a persistência a longo prazo de suas populações seja garantida. Palavras chave: Lutrinae, Distribuição geográfica, Detecção, Ocorrência, Conservação

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1. INTRODUÇÃO

Entender que fatores influenciam a distribuição geográfica e o uso do habitat por uma

espécie é essencial para o planejamento de estratégias efetivas de conservação (Barbosa et al.,

2003; Perinchery et al., 2011; Prakash et al., 2012), o que tem se tornado cada vez mais

importante diante da rápida expansão de paisagens modificadas pelo homem, associada à

escassa e ineficiente rede de unidades de conservação existente (Gardner et al., 2009; Gardner

et al., 2010). Menos de 10% das florestas tropicais do mundo estão inseridas em unidades de

conservação (Gardner et al, 2009), sendo este percentual ainda menor em algumas regiões,

como na porção norte da Floresta Atlântica nordestina, onde menos de 3% dos remanescentes

florestais estão inseridos em áreas protegidas (Ribeiro et al., 2009), e na Caatinga, onde as

áreas de proteção integral cobrem cerca de 1,13% do bioma (MMA, 2016).

Diante deste cenário, ações de conservação voltadas para os ecossistemas de água doce

são ainda mais escassas (Abell, 2002; Abell et al., 2007). A alta demanda por água concentra

a ocupação humana ao longo dos canais principais dos rios, expondo estes ambientes a várias

ameaças, como sobre-exploração de seus recursos, poluição, alteração dos cursos d'água,

construção de represas e destruição de habitats (Dudgeon et al., 2006; Nel et al., 2007;

Vörösmarty et al., 2010). A vulnerabilidade desses ambientes às ações antrópicas é maior que

a de ambientes terrestres, pelas suas características intrínsecas de conectividade, sendo

influenciados por toda a área da bacia à montante, pela zona ripária e ambiente terrestre

adjacente (Dudgeon et al., 2006), o que torna também mais vulnerável as populações de

espécies aquáticas e semiaquáticas.

A lontra neotropical [Lontra longicaudis (Olfers,1818)] é um carnívoro semiaquático,

que depende dos ecossistemas de água doce e ripários para sobreviver (Kruuk, 2006). Apesar

de ser uma espécie de grande tolerância ecológica, capaz de suportar modificações ambientais

e ocorrer em locais próximos a cidades e aglomerações humanas (Kruuk, 2006), devido às

crescentes ameaças que afetam o ambiente aquático e terrestre onde vivem, o seu status de

conservação foi recentemente atualizado de insuficientemente conhecida (DD – “data

deficient”) para quase ameaçada (NT – “Near Threatened") (IUCN - União Internacional para

a Conservação da Natureza, 2015). No Brasil a espécie também foi recentemente avaliada

como quase ameaçada (NT – “near threatened”), sendo considerada vulnerável (VU) no

bioma Floresta Atlântica, especialmente na Floresta Atlântica nordestina, onde existe uma

forte tendência de declínio populacional devido à degradação ambiental do bioma na região

(Rodrigues et al., 2013).

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O status de conservação da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro é ainda agravado

pela falta de conhecimento em relação à espécie na região, que até recentemente aparecia

como uma lacuna nos seus mapas de distribuição (Emmons & Feer, 1999; Eisenberg &

Redford, 1999; Larivière 1999, Kruuk 2006). Apesar de ser amplamente distribuída,

ocorrendo desde o México até o Uruguai (Kruuk, 2006), a Lontra longicaudis é uma das

espécies menos estudadas da subfamília Lutrinae, o que se deve principalmente ao seu

comportamento discreto e a consequente baixa detectabilidade em ambiente natural (Rosas,

2004). As lontras neotropicais são animais de médio porte, solitários, com vocalização

discreta e comportamento elusivo (Larivière, 1999; Rosas, 2004; Kruuk 2006). Estudos

recentes reportam a ocorrência de Lontra longicaudis em algumas localidades do nordeste

brasileiro (Astúa et al., 2010; Dantas & Donato, 2011; Mendonça & Mendonça, 2012; Souto,

2012; Feijó & Langguth, 2013; Laurentino & Sousa, 2014; Toledo et al., 2014; Mesquita &

Meneses, 2015; Dias & Bocchiglieri, 2016; Rosas-Ribeiro et al., 2017), comprovando que a

lacuna existente nunca refletiu uma ausência real da espécie, mas sim a falta de pesquisas na

região. O nordeste brasileiro tem sido apontado como uma área prioritária para estudo futuros

com Lontra longicaudis ((ICMBio/MMA, 2010; Rheingantz et al., 2014). Todos os dados de

ocorrência da espécie na região são registros ocasionais, ou compilações de dados de

ocorrência já existentes. Apenas um estudo foi realizado com enfoque específico para a

Lontra longicaudis no nordeste (Rosas-Ribeiro et al. 2017), refinando as modificações do seu

atual mapa de distribuição (Rheingantz et al., 2014; IUCN, 2015).

A amostragem de espécies crípticas, de comportamento elusivo, mesmo quando

sistemática e padronizada, está sujeita a falhas na detecção, que podem resultar em falsas

ausências. Estas falsas ausências são comuns em amostragens baseadas na identificação de

vestígios como indicadores de presença, comumente aplicadas para as lontras, e ocorrem

quando a espécie é dada como ausente em um determinado local, apesar de estar presente e

apenas não ter sido detectada (Ruiz-Olmo et al., 2001a; MacKenzie et al., 2006; Evans et al.,

2009; Jeffress et al., 2011b). Isto pode ocorrer quando o vestígio passa despercebido ao

observador, ou quando é um vestígio sujeito à deterioração natural, como as fezes (Parry et

al., 2012).

As fezes são as principais ferramentas para pesquisas com lontras (Kruuk, 2006), pois

geralmente são depositadas em locais conspícuos nas margens dos corpos d’água (Quadros &

Monteiro-Filho, 2002; Kasper et al., 2008), sendo o indício de presença da espécie mais fácil

de visualizar em ambiente natural. Além disso, a amostragem de vestígios é um método não

invasivo, fácil de implementar e de baixo custo, quando comparado com outras metodologias

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utilizadas em estudos de distribuição e preferências de hábitat das espécies. Apesar de

amplamente utilizadas como um método confiável para determinar a presença de lontras,

amostragens baseadas em vestígios precisam ser corrigidas, principalmente em relação à

detectabilidade (Ruiz-Olmo et al., 2001a).

Uma abordagem que vem sendo bastante utilizada por considerar a probabilidade de

detecção para corrigir falsas ausências, gerando estimativas mais precisas da real área de

ocorrência de uma espécie, são os modelos de ocupação (MacKenzie et al., 2002). Estes

modelos permitem estimar a probabilidade de ocupação de um local por uma espécie, em

função de características do ambiente, mesmo que esta espécie não seja detectada em alguns

momentos (detecção imperfeita) (MacKenzie et al., 2002; MacKenzie et al., 2006). A

probabilidade de detecção é estimada ao longo de múltiplas visitas aos locais de amostragem

para coletar informações de presença e ausência, permitindo assim inferências mais precisas

sobre a distribuição das espécies e seus requerimentos ambientais (MacKenzie et al., 2002;

2006). Devido a natureza elusiva das espécies semiaquáticas, as análises de ocupação têm

sido frequentemente utilizadas em estudos sobre a distribuição, requerimentos de habitat e

monitoramento de várias espécies da família Lutrinae (Jeffress et al., 2011a; Perinchery et al.,

2011; Prakash et al., 2012; Okes & O'Riain, 2017).

Neste estudo nós utilizamos modelos de ocupação para analisar a probabilidade de

detecção e o padrão de ocupação da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro ao norte do rio

São Francisco, assim como a influência de covariáveis do habitat nos padrões encontrados; e

modelos lineares generalizados mistos (GLMMs) para analisar a intensidade de uso do habitat

na escala espacial mais restrita das bacias hidrográficas desta região que drenam para o leste,

onde houve maior concentração de registros da espécie. Para isto foram analisados fatores

ambientais, climáticos e antrópicos. Esperamos que fatores ambientais e climáticos

relacionados com a disponibilidade de água tenham influencia positiva na ocupação da

espécie na região, enquanto que os fatores antrópicos, considerando a tolerância da espécie,

tenham mais influencia negativa na intensidade de uso do habitat.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Área de estudo

O estudo foi realizado no nordeste do Brasil, com enfoque para a região ao norte do

Rio São Francisco, entre os estados do Piauí e Alagoas, onde os registros de ocorrência da

espécie são mais escassos (Figura 1A). Esta região abrange duas das eco-regiões de água doce

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do mundo: a eco-região Parnaíba e a eco-região Bacias Costeiras e da Caatinga Nordestina

(Abell, 2008). A eco-região Parnaíba é constituída pelo rio Parnaíba e seus afluentes, e se

estende por todo o estado do Piauí, até a sua fronteira com o estado do Maranhão, incluindo

áreas do bioma Caatinga e uma pequena porção do Cerrado; a eco-região Bacias Costeiras e

da Caatinga Nordestina se estende entre os estados do Ceará e Alagoas, abrangendo várias

bacias hidrográficas pequenas inseridas nos biomas Floresta Atlântica e Caatinga (Figura 1B).

Figura 1: A) Área de estudo no nordeste do Brasil, ao norte do Rio São Francisco; B) Eco-regiões hidrográfica do Parnaíba (azul escuro) e das Bacias Costeiras e da Caatinga Nordestina (azul claro); C) Bacias e microbacias amostradas para registros de ocorrência de Lontra longicaudis na região Nordeste ao norte do Rio São Francisco.

Delineamento amostral

As campanhas para levantamento de registros de ocorrência de Lontra longicaudis

ocorreram entre dezembro/2013 e Junho/2015, e foram direcionadas a 16 bacias

hidrográficas, selecionadas com o objetivo de cobrir as lacunas existentes nos registros de

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ocorrência da espécie ao norte do rio São Francisco. Adicionalmente, a bacia hidrográfica do

baixo rio São Francisco também foi incluída na amostragem, já que este é um dos principais

rios que percorrem o bioma Caatinga (Figura 1C; Tabela 1). As bacias hidrográficas

amostradas foram subdivididas em microbacias espacialmente uniformes, utilizado o SRTM 4

(Shuttle Radar Topographic Mission), modelo digital de elevação (DEM - Digital Elevation

Model) com resolução aproximada de 90 m, disponível através do CIAT (Centro

Internacional de Agricultura Tropical - http://srtm.csi.cgiar.org/).

Para a derivação das microbacias, o modelo digital de elevação foi recondicionado

utilizando a hidrografia fornecida pelo IBGE (IBGE-BC 2013; Escala 1:250.000). O

recondicionamento do DEM foi realizado com uso da extensão Arc Hydro Tools do ArcGIS

10.1. Para preencher eventuais depressões restantes no DEM recondicionado que poderiam

impedir o fluxo de água, foi aplicada a ferramenta FILL, que faz o preenchimento destas

regiões possibilitando que o fluxo seja continuado. As microbacias foram derivadas utilizando

toda a área de drenagem das bacias, com um limiar de 10.000 células a montante

(UPSTREAM). Desta forma, as microbacias variaram entre 39 e 490 km2, tendo em média

206 km2 .

Cada bacia hidrográfica foi amostrada em 3 microbacias (baixo, médio e alto curso) e

cada microbacia foi amostrada por um trecho de rio que variou de 3 - 5 km. Para a definição

das microbacias amostradas, o curso principal de cada rio foi medido a partir da base vetorial

de hidrografia disponibilizada pelo IBGE (IBGE-BC 2013, escala 1:250.000), e dividido em

três seções, sendo a primeira próxima à foz, no baixo curso do rio, a segunda correspondente

ao curso médio, e a terceira, próxima às nascentes, no alto curso. As nascentes de rios

localizadas na caatinga são muitas vezes intermitentes, e as regiões próximas a elas ficam a

maior parte do ano completamente secas. Pelo fato das lontras serem animais semiaquáticos,

nesses casos, o alto curso do rio não foi considerado próximo à nascente, mas sim até onde o

rio mantinha algum volume perene de água durante todo o ano (e.g. trechos de rios com

largura de espelho d’água de aproximadamente 2 m, e trechos de rios apartados em poças com

menos 1 km de distância entre si). A seleção das microbacias e dos trechos de amostragem

em cada seção do curso do rio foi realizada com base na identificação de locais considerados

favoráveis para a detecção da espécie (e.g. trechos com presença de barrancos, tocas, fezes e

trechos com relatos de visualização da espécie em entrevistas com moradores locais). Os

trechos amostrados de uma mesma bacia hidrográfica estavam separados por > 15 km, com

exceção dos trechos baixo e médio do rio Pium, separados por apenas 5 km, pelo fato desta

ser a menor bacia hidrográfica amostrada no estudo.

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Três bacias hidrográficas da eco-região Parnaíba foram amostradas em apenas duas

microbacias, como uma estratégia para maximizar o número de bacias diferentes amostradas

nesta eco-região, onde a maioria das evidência obtidas de presença da espécie foram relatos

de ocorrência histórica por moradores locais; e uma bacia da eco-região Bacias Costeiras e da

Caatinga Nordestina não foi amostrada na microbacia do médio curso pelo risco de

contaminação dos pesquisadores por Schistosoma mansoni. Isto resultou em um total de 45

trechos de rios amostrados, correspondentes a 45 microbacias, inseridas em 17 bacias

hidrográficas (Figura 1C; Tabela 1).

Coleta de dados

Os trechos de amostragem variaram entre 3 - 5 km e foram percorridos de forma

replicada por quatro dias consecutivos, exceto em casos de problemas logísticos, totalizando

726 km percorridos (Tabela 1). As amostragens foram realizadas ao longo dos rios, utilizando

barco com motor de popa (≤ 7 km/h), caiaque ou a pé, dependendo das condições de

locomoção, inspecionando margens, pedrais e barrancos, em busca de vestígios (tocas, fezes,

pegadas e locais de descanso) ou visualizações dos animais (cf. Groenendijk et al., 2005).

Armadilhas fotográficas foram oportunisticamente colocadas em frente a tocas e latrinas

recentes de lontra, com o objetivo de validação dos vestígios com registros fotográficos.

Foram considerados como registros distintos os vestígios separados por no mínimo 50 m.

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Tabela 1: Bacias hidrográficas e trechos de rio selecionados para amostragem de registros de ocorrência de Lontra longicaudis na região nordeste do Brasil, ao norte do Rio São Francisco, sua área, localização, bioma (CA= Caatinga; CE= Cerrado; MA= Mata Atlântica), esforço em dias amostrados e km percorridos (km*dia), número de vestígios encontrados e taxa de encontro de vestígios da espécie (Vestígios/km).

Região Hidrográfica Bacia Área

(km²) Trecho Estado Bioma Dias Amostrados

km Percorridos

NO Vestígios

Vestígios/km

Bacias Costeiras e da Caatinga

Nordestina

Timonha 923 Baixo CE CA 4 20 0 0 Médio CE CA 4 16 0 0 Alto CE CA 3 15 0 0

Jaguaribe 74000 Baixo CE CA 4 20 0 0 Médio CE CA 3 12 0 0 Alto CE CA 2 6 0 0

Apodi-Mossoró 13930

Baixo RN CA 4 20 0 0 Médio RN CA 3 12 0 0 Alto RN CA 4 20 0 0

Piranhas-Assu 41420

Baixo RN CA 4 20 0 0 Médio RN CA 3 12 0 0 Alto PB CA 3 12 0 0

Ceará-Mirim 2656

Baixo RN MA 4 16 0 0 Médio RN CA 4 20 0 0 Alto RN CA 4 20 0 0

Pium 502 Baixo RN MA 4 20 16 0.8 Médio RN MA 4 20 20 1.0 Alto RN CA/MA 4 16 21 1.3

Jacu 2716 Baixo RN MA 4 20 8 0.4 Médio RN CA 4 20 5 0.3 Alto RN CA 4 20 0 0

Curimataú 4139 Baixo RN MA 4 20 13 0.7 Médio RN CA 4 20 19 1.0 Alto PB CA 4 16 3 0.2

Camaratuba 628 Baixo PB MA 4 20 10 0.5 Médio PB MA 4 16 18 1.1 Alto PB CA 4 12 10 0.8

Goiana 2870 Baixo PE/PB MA 4 20 5 0.3 Médio PE MA 4 12 10 0.8 Alto PE CA 4 12 8 0.7

Una 6605 Baixo PE MA 4 20 6 0.3 Alto PE CA 4 12 8 0.7

Coruripe 1618 Baixo AL MA 4 20 22 1.1 Médio AL MA 3 9 16 1.8 Alto AL CA 4 12 16 1.3

Panaíba Longá 24230 Baixo PI CA 3 15 0 0 Médio PI CA 3 15 0 0

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Alto PI CA 4 20 0 0

Poti 52280 Baixo PI CA 3 15 0 0 Médio PI CA 4 16 0 0

Caninde 74970 Baixo PI CA 3 9 0 0 Médio PI CA 2 8 0 0

Uruçuí-Preto 15930 Baixo PI CE 4 20 10 0.5

Médio PI CE 4 20 14 0.7

São Francisco Baixo São Francisco 29100 Baixo AL/SE CA 2 10 4 0.4

Variáveis preditoras

Com base nas informações existentes sobre a história natural da espécie (Larivière,

1999; Rosas, 2004; Kruuk, 2006) e suas preferências de hábitat (Barbosa et al., 2003;

Carrillo-Rubio & Lafón, 2004; Waldemarin, 2004; Gomez et al., 2014), foram selecionadas

15 variáveis capazes de influenciar a ocupação, uso do hábitat e detecção da Lontra

longicaudis nas bacias hidrográficas do nordeste brasileiro. Este conjunto preliminar de

variáveis foi analisado quanto à correlação (Pearson - R Development Core Team, 2013).

Quando correlacionadas (r > 0,70), as variáveis com menor sentido biológico para a espécie

foram excluídas, como as variáveis Cobertura de área urbana (Área Urbana), Temperatura

média do trimestre mais seco (Temp_trimestre seco) e Precipitação do mês mais seco

(Precip_mês seco) (Tabela 2). As variáveis: Ordem do rio (Ordem_Rio) e Fluxo de área de

captação de água acumulado (Flux_cap_água), apesar de correlacionadas, foram mantidas no

grupo por serem relacionadas a escalas diferentes da paisagem, e consideradas importantes

para os diferentes parâmetros analisados, mas nunca foram utilizadas no mesmo modelo

(Tabela 2). O conjunto final, com 12 variáveis preditoras, foi dividido em variáveis

ambientais, climáticas e antrópicas, sendo 4 relacionadas ao trecho de amostragem (escala

local) e 8 relacionadas às microbacias (escala regional) (Tabela 3). Além destas, como alguns

trechos de rio foram amostrados a barco e outros a pé, dependendo das condições de

locomoção, foi considerada a variável metodológica Condução da amostragem, analisada

apenas como covariável da probabilidade de detecção da espécie.

A maior parte das variáveis preditoras consideradas neste estudo foram extraídas na

resolução de microbacias, pelo fato das bacias hidrográficas serem apontadas como as

unidades espaciais mais apropriadas para planejamento de estratégias de conservação

direcionadas às lontras, animais semiaquáticos que se dispersam principalmente ao longo dos

cursos d'água (Ottaviani et al., 2009; Jeffress et al., 2011a).

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Os valores das variáveis preditoras na escala das microbacias foram estimados

considerando como valor da microbacia a média dos valores de todos os pixels de 1 km

englobados por ela. No caso da variável "fluxo de área de captação de água acumulada", foi

considerado como o valor da microbacia o maior valor encontrado entre os pixels, e não a

média. Todas as variáveis foram derivadas no programa ArcGis 10.1.

As variáveis "densidade da população" e "fluxo de área de captação de água" foram

logaritimizadas (Log10) por apresentarem alguns valores muito altos. Todas as variáveis

contínuas foram padronizadas e transformadas em escores z.

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Tabela 2: Correlação entre as 15 variáveis preditoras selecionadas para analisar a ocupação, uso do habitat e detecção da Lontra longicaudis nas bacias hidrográficas do nordeste brasileiro. Ver tabela 3 para mais detalhes sobre as variáveis.

* p<0,0001

Variáveis Ordem_rio

Dist_ Estrada

Dist_ ViaEstrada

Cob_ arbórea Remanescentes Complex_

relevoFlux_cap_

águaDens_

drenagem Dens_pop Dens_ Estradas

Área urbana

Temp_ trimestre seco

Precip_anual

Precip_mês seco

Sazonal_precip

Ordem_rio 1Dist_Estrada 0.05 1

Dist_ViaEstrada 0.08 0.04 1

Cob_arbórea -0.43 -0.12 0.20 1Remanescentes 0.45 -0.13 0.51 0.03 1Complex_ relevo

-0.06 -0.02 0.31 -0.11 0.13 1

Flux_cap_água 0.90* 0.01 0.06 -0.34 0.46 -0.09 1

Dens_drenagem 0.11 0.05 0.00 -0.07 0.08 -0.09 0.16 1

Dens_pop -0.45 -0.08 -0.54 0.12 -0.66 -0.14 -0.44 -0.24 1Dens_Estradas -0.04 -0.57 -0.18 -0.03 0.04 -0.18 -0.04 0.01 0.24 1Área urbana -0.44 -0.17 -0.44 0.31 -0.45 0.03 -0.40 -0.43 0.86* 0.26 1Temp_trimestre seco 0.32 0.01 0.14 -0.10 0.55 -0.25 0.36 -0.12 -0.42 0.06 -0.15 1

Precip_anual -0.19 0.09 0.06 0.59 0.14 -0.24 -0.18 -0.10 0.28 0.03 0.23 0.02 1Precip_mês seco -0.43 0.17 -0.24 0.44 -0.42 -0.13 -0.40 0.01 0.64 0.04 0.30 -0.53 0.68 1

Sazonal_precip 0.45 -0.08 0.18 -0.39 0.62 0.02 0.41 0.09 -0.58 0.01 -0.26 0.73* -0.33 -0.74* 1

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Tabela 3: Descrição das variáveis selecionadas como preditoras da ocupação, uso do habitat e detecção da Lontra longicaudis nas bacias hidrográficas

do nordeste brasileiro.

Variáveis Abreviação Escala DescriçãoAmbientais

Ordem do rio Ordem_Rio Local

Ordem do trecho de rio amostrado de acordo com a regra de hierarquia fluvial de Strahler (1964). Drenagem derivada a partir do SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission), disponível através do CIAT (http://srtm.csi.cgiar.org/), e recondicionada utilizando a base hidrográfica do IBGE (IBGE-BC 2013; Escala 1:250.000).

Cobertura arbórea ripária Cob_arborea Local Porcentagem de pixels (30x30) com 40% ou mais de cobertura arbórea de dossel (> 5 m) em um buffer de 100 mem torno do transecto (Fonte: Hansen et al. 2013).

Cobertura de remanescentes Remanescentes Regional Porcentagem de cobertura de remanescentes naturais dos três biomas presentes na área de estudo (Floresta Atlântica, Caatinga ou Cerrado), até 2009, na área da microbacia (Fonte: MMA, 2011).

Complexidade do relevo Complex_relevo Regional Medida da complexidade do relevo, calculada pelo desvio padrão da altitude na área da microbacia (Fonte: SRTM).

Densidade de drenagem Dens_drenagem Regional Soma dos kms de rios da microbacia / Área da microbacia (km2) (Fonte: IBGE 1:250.000, 2015).

Fluxo de área de captação de água acumulado Flux_cap_água Regional

Soma da área de captação de água acumulada na microbacia, considerando toda drenagem dos cursos d'água àmontante. Drenagem derivada a partir do SRTM, disponível através do CIAT (http://srtm.csi.cgiar.org/), erecondicionada utilizando a base hidrográfica do IBGE ((Fonte: IBGE 1:250.000, 2015).

Climáticas

Precipitação anual Precip_anual Regional Precipitação anual da microbacia. Variável disponível no WorldClim (www.worldclim.org), na resolução de 1km2. O valor da microbacia foi considerado como o valor médio de todos os pixels englobados por ela.

Sazonalidade da precipitação Sazonal_precip RegionalCoeficiente de variação da preciptação ao longo do ano.Variável disponível no WorldClim (www.worldclim.org), na resolução de 1 km2. O valor da microbacia foi considerado como o valor médio de todos os pixelsenglobados por ela.

Antrópicas

Distância de estrada Dist_Estrada Local Distância euclidiana (m) do techo amostrado do rio para a estrada (pavimentada ou não) mais próxima (Fonte:IBGE 1:250.000, 2015).

Distância de cidade via estrada Dist_ViaEstrada Local Distância (km) da zona urbana mais próxima ao transecto via estrada (pavimentada ou não). Fonte: IBGE 1:250.000, 2015; Setores censitários - IBGE 2010.

Densidade de estradas Dens_Estradas Regional Soma dos kms de estradas (pavimentadas e não pavimentadas) da microbacia / Área da microbacia (km2). Fonte: IBGE 1:250.000, 2015

Densidade populacional Dens_pop Regional Densidade populacional da microbacia (hab/ha). Fonte: Setores censitários - IBGE 2010.MetodologiaCondução da amostragem Amostragem Amostragem realizada com barco (1) ou a pé (0).

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Análise dos dados - Probabilidade de ocupação e detecção

Foram utilizados modelos hierárquicos de ocupação baseados em máxima

verossimilhança (Mackenzie et al., 2002; Mackenzie et al., 2006) para estimar a probabilidade

de ocupação (ψ, probabilidade da espécie ocupar um local específico) e a probabilidade de

detecção (p, probabilidade da espécie ser detectada quando presente) da Lontra longicaudis nas

bacias hidrográficas do nordeste brasileiro. Nestes modelos, históricos de detecção (1) e não

detecção (0) são construídos ao longo de múltiplas amostragens em cada unidade amostral, e

são modelados em função de covariáveis que possam afetar a ocupação e/ou detecção da

espécie (Mackenzie et al., 2002). Esta abordagem considera que a detecção pode ser imperfeita

(p < 1), situação muito frequente com espécies crípticas, principalmente em estudos baseados

em vestígios, onde a não detecção não reflete necessariamente a ausência da espécie, que pode

estar presente e apenas não ter sido detectada.

Neste estudo, para estimar a probabilidade de detecção da Lontra longicaudis, cada um

dos 45 trechos de rio amostrados foi dividido em segmentos de 1 km, considerados como

réplicas espaciais. Dessa forma, cada trecho amostrado continha 3 - 5 réplicas espaciais (Figura

2), o que permitiu a construção de um histórico de detecção com base na detecção (1) ou não

(0) de vestígios de lontra em cada segmento de 1 km, considerando os quatro dias de

amostragem.

Figura 2: Esquema do protocolo de amostragem utilizado para estimar a ocupação da Lontra longicaudis em cada um dos 45 trechos de rios amostrados nas bacias hidrográficas do nordeste brasileiro. Cada segmento de 1 km foi utilizado como uma réplica espacial para estimar a probabilidade de detecção em um trecho de rio, que possuía 3 - 5 réplicas.

Para espécies com alta capacidade de mobilidade, a utilização de réplicas espaciais

sequenciais tem resultado em estimativas de probabilidade de detecção mais eficientes que

réplicas temporais (Parry et al., 2013), pois a presença/ausência da espécie em um determinado

local pode variar temporalmente, mas, devido a alta mobilidade, a presença/ausência da espécie

em um determinado local não influencia na probabilidade do local de amostragem subsequente

estar ocupado (Kendall & White, 2009; Parry et al., 2013). As lontras geralmente possuem

grandes áreas de uso e podem percorrer vários quilômetros por dia (Ruiz-Olmo et al., 2001a),

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por isso réplicas espaciais ao longo dos rios são muito utilizadas para estimativas de

probabilidade de detecção da família Lutrinae (Jeffress et al., 2011a; Jeffress et al., 2011b;

Perinchery et al., 2011; Okes & O'Riain, 2017). Apesar da área de uso da Lontra longicaudis

não ser conhecida, indivíduos dessa espécie podem se locomover em média por 6,5 km ao

longo dos rios, com alguns registros de deslocamento cumulativo de indivíduos residentes por

18 km (Trinca et al., 2013).

O tamanho máximo de 5 km para os trechos de rios amostrados, menor que a provável

área de uso da espécie, foi definido para minimizar probabilidade de agrupamento de vestígios

e mudanças no status de ocupação entre as réplicas espaciais (Perinchery et al., 2011). Já o

tamanho da réplica espacial foi definido com base: 1) no aumento da probabilidade de

detecção, já que esta tende a aumentar linearmente com o aumento do comprimento da réplica

espacial (Jeffress et al., 2011b; Parry et al., 2013); e 2) na efetividade logística da amostragem,

já que estudos de distribuição com a espécie indicam que, em 92% dos casos, quando a espécie

está presente, o primeiro vestígio é encontrado no primeiro quilômetro de amostragem (Silva et

al., 2005). Além disso, este tamanho de segmento foi considerado por minimizar a dependência

espacial entre as réplicas adjacentes, que tende a diminuir com o aumento do tamanho do

segmento considerado, o qual deve ser grande o suficiente para maximizar a detecção da

espécie, mas de um tamanho que permita a existência de pelo menos 3 réplicas por unidade

amostral (Hines et al., 2010).

A utilização de modelos de ocupação que consideram a dependência entre réplicas

espaciais, Markovian occupancy model (Hines et al., 2010), não foi possível para o conjunto de

45 unidades amostrais desse estudo, pois estes modelos são constituídos por quatro parâmetros,

o que impossibilita a adição das covariáveis de ocupação e detecção por problemas de

sobreparametrização e convergência. Desta forma, considerando unidades amostrais compostas

por 3 - 5 réplicas espaciais de 1 km, assumimos que a probabilidade de ocupação não variou

entre as amostragens sucessivas em um mesmo trecho, e utilizamos modelos padrão de uma

única estação, single season models (Mackenzie et al., 2002). Apesar do período total do estudo

abranger época chuvosa e seca, as amostragens em um mesmo trecho foram conduzidas em 4

dias consecutivos, e em todos os trechos amostrados, independente da localidade e época, havia

água (habitat disponível para a espécie). Os históricos de detecção de cada trecho amostral, e o

conjunto de variáveis preditoras foram importados e analisados no programa PRESENCE

v.10.9 (Hines, 2006).

Foi criado um conjunto de modelos que representam hipóteses biológicas para explicar a

ocupação e detectabilidade da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro. Como uma maneira de

evitar a sobreparametrização, foram considerados apenas modelos com ≤ 5 parâmetros,

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garantindo aproximadamente 10 unidades amostrais por parâmetro estimado (Burnham &

Anderson, 2002). Por esta razão, um modelo global, com todas as variáveis, não foi produzido.

O procedimento de construção e seleção dos modelos foi realizado em duas etapas. Na

primeira etapa foi avaliado o efeito das variáveis "ordem do rio", "cobertura arbórea" e

"método de amostragem" na probabilidade de detecção das lontras. A escolha dessas variáveis

foi feita com base em evidências da sua influência na detecção da espécie. A ordem do rio é

uma variável que influencia a disponibilidade de locais para a deposição/produção de vestígios,

podendo afetar a detecção dos mesmos pelo observador (Ruiz-Olmo et al, 2001a). Além disso,

muitos rios de alta ordem apresentam vegetação aquática próxima às margens, o que dificulta a

visualização do ambiente terrestre adjacente, e rios maiores representam uma maior superfície

de procura para o observador, o que pode influenciar negativamente na sua capacidade de

detecção. A cobertura arbórea foi analisada como uma covariável da detecção pela sua

influência no tipo de substrato. Substratos de serrapilheira, comuns em regiões com alta

cobertura arbórea, tendem a encobrir fezes e pegadas, diminuindo a probabilidade de detecção

dos vestígios de lontra (Jeffress et al., 2011b). Como o tipo de locomoção durante as

amostragens variou de acordo com as condições de navegabilidade do trecho do rio, sendo

alguns trechos percorridos com barco e outros a pé, também foi testada a influência desta

variável na probabilidade de detecção. O tipo de vestígio e a experiência do observador são

variáveis que também podem afetar a probabilidade de detecção das lontras (Jeffress et al.,

2011b), mas que não foram consideradas neste estudo, pois todas as amostragens foram

realizadas pelo mesmo observador, e todos os tipos de vestígios foram considerados.

Na ausência de um modelo global, para garantir que a covariável de detecção não

estivesse absorvendo alguma variação da ocupação, o efeito de cada uma das covariáveis de

detecção foi testado em um conjunto de três modelos, sendo cada um composto por duas

covariáveis de ocupação aleatoriamente selecionadas e uma covariável de detecção "ψ(cov.

aleatória1 + cov. aleatória2), p(cov. detecção)". Os mesmo três modelos foram testados para

cada uma das três covariáveis de detecção analisadas, com a detecção mantida constante

"ψ(cov. aleatória1 + cov. aleatória2), p(.)”, e com o modelo nulo “ψ(.) p(.)”, resultando em

um total de 13 modelos.

Na segunda etapa, a probabilidade de ocupação (ψ) foi modelada em função das variáveis

preditoras consideradas (Tabela 3), enquanto a probabilidade de detecção foi mantida

invariável de acordo com o melhor modelo ranqueado na primeira etapa "ψ(covariável),

p(modelo melhor ranqueado na 1o etapa)”. O efeito das covariáveis consideradas importantes

para a probabilidade de ocupação da Lontra longicaudis foi avaliado inicialmente de forma

individual. A partir desta avaliação, foram feitas combinações de duas covariáveis,

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representando hipóteses biológicas para explicar a ocupação da espécie. Foram eliminados do

conjunto os modelos que apresentaram problemas de convergência (Long et al., 2011). O

modelo mais básico gerado foi o modelo nulo, no qual as probabilidades de ocupação e

detecção são mantidas constantes “ψ(.) p(.)”, representando a ausência de influência das

covariáveis analisadas. No total foi produzido um conjunto de 39 modelos candidatos.

Na ausência de um modelo global, nós analisamos o ajuste de todos os modelos mais

complexos (com 5 parâmetros) através do parâmetro cˆ (bootstrap, n= 10.000) (Burnham &

Anderson, 2002). A valor c^ mais baixo estimado foi 1.09 (p= 0.28), o que não indica problema

de sobre-dispersão dos dados, por isso não foi feita nenhuma correção no AIC em relação a isto

(Burnham & Anderson, 2002).

O ranqueamento dos modelos candidatos foi feito através do Critério de Informação de

Akaike corrigido para pequenas amostras (AICc) (Burnham & Anderson, 2002). Os modelos

que apresentaram valores de ΔAICc ≤ 2 foram considerados bem ajustados aos dados, sendo as

variáveis que os compõem consideradas importantes preditoras da ocorrência da espécie

(Burnham & Anderson, 2002). A importância relativa de cada modelo, assim como de suas

covariáveis, foi analisada pelo peso de Akaike (wAICc).

Como nenhum modelo absorveu mais de 90% da variação dos dados (wAIC ≥ 0,9), os

modelos ranqueados que juntos somaram wAICc ≥ 0,90 foram considerados (Burnham &

Anderson, 2002). Neste caso, para a interpretação dos efeitos das variáveis entre os modelos

ranqueados, foi calculada a média dos modelos (model averaging), gerando os coeficientes

médios das covariáveis e seus respectivos erros padrão. Para isto foi utilizada a planilha

desenvolvida por B. Mitchell (disponível em: www.uvm.edu/%7Ebmitchel/software.html;

Long et al., 2011). Para inferir sobre a significância de cada variável, foram analisados os

intervalos de confiança 95% (IC) e sua sobreposição com o zero (Burnham & Anderson 2002).

Como os modelos resultaram em probabilidades de ocupação e detecção específicas para cada

site, nós aplicamos o model averaging no programa PRESENCE v.10.9 (Hines, 2006) para

estimar as probabilidades de cada site como uma média das estimativas de ocupação e detecção

dos modelos ranqueados que juntos somaram wAICc ≥ 0,90. Uma média geral da probabilidade

de ocupação e detecção para a região foi então calculada considerando as estimativas médias

dos 45 sites.

Análise dos dados - Uso do habitat

Foi observado que a área de estudo abrange duas regiões distintas em relação à

probabilidade de ocupação. A região que abrange as bacias hidrográficas que drenam para o

norte (excluindo as duas microbacias amostradas no Cerrado), com probabilidade de ocupação

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média muito próxima a zero, e a região que abrange as bacias hidrográficas que drenam para o

leste, com probabilidade de ocupação média próxima a um. Dessa forma, com o objetivo de

entender que variáveis influenciam na utilização do habitat pela Lontra longicaudis onde a

espécie realmente ocorre, o número de vestígios de lontra por trecho de rio amostrado foi

modelado em função das mesmas variáveis selecionadas para os modelos de ocupação.

Considerando a alta probabilidade de detecção observada para a espécie neste estudo (^p=

0,68; Ep= 0,15), principalmente na região das bacias que drenam para o leste (^p= 0,76; Ep=

0,11), assumimos a contagem de vestígios de lontra em um trecho de rio como um índice

confiável de intensidade de uso do habitat (cf. Perinchery et al., 2011). Para isto foram

considerados todos os vestígios recentes e antigos encontrados no trecho de rio (5 km), ao

longo dos 4 dias de amostragem, sendo considerados registros distintos os vestígios separados

por pelo menos 50 m, e os vestígios novos, produzidos no dia da amostragem, mesmo que

localizado um ponto já marcado no dia anterior. Para esta análise foram consideradas apenas as

bacias hidrográficas que drenam para o leste, região que se estende entre os estados de Alagoas

e leste do Rio Grande do Norte. Isto corresponde a 9 das 17 bacias hidrográficas amostradas,

onde estão inseridas 24 das microbacias e trechos de rios estudados.

Foram utilizados modelos lineares generalizados mistos (Generalized Linear Mixed

Models - GLMMs) (McCulloch & Searle, 2001), com as bacias hidrográficas como variáveis

randômicas, para considerar alguma variabilidade natural existente no número de vestígio dos

trechos amostrados entre as nove bacias hidrográficas. Foram consideradas como variáveis

fixas as variáveis ambientais, climáticas e antrópicas mais relevantes para os modelos de

ocupação, todas padronizadas e transformadas em escores z. Inicialmente, pelo fato do número

de vestígios por trecho de rio representar uma contagem, assumimos que os erros seguiam a

distribuição de Poisson e utilizamos uma função de ligação logarítmica (Crawley, 2007). Os

dados, no entanto, apresentaram problemas de sobre-dispersão, com variância maior que a

média, uma violação nos pressupostos da distribuição de Poisson (Crawley, 2007; Hilbe, 2011).

A sobre-dispersão pode ser resultado de uma variação nos dados causada por covariável

que não foi considerada, ou de algum tipo de dependência nos dados, ou de uma frequência de

zeros maior do que a esperada de acordo com a média (Coxe et al., 2009; Harrison, 2014).

Modelamos a variação extra-Poisson para ajustar melhor a sobre-dispersão de duas maneiras:

1) mantemos a distribuição de Poisson, mas consideramos mais uma variável randômica ao

nível da observação, com um nível individual para cada ponto dos dados (Harrison, 2014); 2)

ajustamos o modelo com a distribuição binomial negativa (Hilbe, 2011; Atkins et al., 2012). A

distribuição binomial negativa pode ser considerada uma extensão do modelo de Poisson, com

um parâmetro a mais (θ), que permite que a média e a variância sejam diferentes, ajustando

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melhor os dados desviados da distribuição, como uma frequência de zeros relativamente maior

que a esperada (Hilbe, 2011; Atkins et al., 2012). O modelo binomial negativo foi o que melhor

ajustou os dados, sendo, portanto, o considerado neste estudo. Como houve uma pequena

variação no numero de dias e tamanho dos trechos de rios amostrados (Tabela 1), adicionamos

os quilômetros totais percorridos em cada trecho (dias*comprimento do transecto) como um

ajuste (offset) do preditor linear (log km percorridos) (Crawley, 2007).

Assim como para os modelos de ocupação, para evitar a sobreparametrização, os modelos

foram construídos por combinações de duas covariáveis, representando hipóteses biológicas

para explicar a intensidade de uso do habitat pela espécie. Foram eliminados do conjunto os

modelos que apresentaram problemas de convergência, resultando em um conjunto de 20

modelos candidatos, incluindo o modelo nulo, só com o intercepto.

O ranqueamento e análise dos modelos e variáveis preditoras, assim como o model

averaging dos parâmetros, foi realizado como descrito acima para os modelos de ocupação.

Todas as análises dos GLMMs, no entanto, foram realizadas no programa R (R Development

Core Team, 2013).

3. RESULTADOS

Ao longo do estudo foram percorridos 726 km em trechos de amostragem e registrados

262 vestígios de Lontra longicaudis (Tabela 1). A presença de lontras foi detectada em 22 dos

45 trechos de rio amostrados (Figura 1), totalizando uma ocupação bruta (naive) de 48,89%.

Na modelagem da probabilidade de detecção, primeira etapa na análise dos modelos,

foi observado que a variável "ordem do rio" tem uma influência negativa na probabilidade de

detecção da Lontra longicaudis, o que significa que quanto maior a ordem do rio, menor a

probabilidade de detecção da espécie. Dentre o conjunto de 13 modelos analisados, os modelos

contendo esta variável foram melhor ajustados quando comparados com os modelos

equivalentes com as covariáveis de detecção "cobertura arbórea" e "método de amostragem",

assim como com os modelos de detecção constante e o modelo nulo “ψ(.) p(.)” (Tabela 4).

Dessa forma, todos os modelos de ocupação construídos na segunda etapa mantiveram a

estrutura "ψ(covariável), p(Ordem_Rio)".

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Tabela 4: Avaliação da influência das variáveis "ordem do rio", "cobertura arbórea" e "método de amostragem" na probabilidade de detecção de Lontra longicaudis em um conjunto de 13 modelos, constituído por três modelos com duas covariáveis de ocupação selecionadas aleatoriamente e cada uma da covariáveis de detecção analisadas, três modelos equivalentes com a detecção mantida constante, e um modelo nulo de ocupação e detecção constantes. ΔAICc: diferença no AICc de um modelo e o melhor modelo ranqueado; wAIC: peso de Akaike; K: número de parâmetros; -2l: duas vezes a verossimilhança negativa; ψ: probabilidade de ocupação e p: probabilidade de detecção.

MODELOS ΔAICc wAIC K -2l

ψ (Cob_arborea + Sazonal_Precipitação), p(Ordem_Rio) 0 0.6852 5 112.69

ψ (Ordem_Rio + Sazonal_Precipitação), p(Ordem_Rio) 3.21 0.1377 5 115.9

ψ (Cob_arborea + Sazonal_Precipitação), p(.) 4.31 0.0794 4 119.54

ψ (Cob_arborea + Sazonal_Precipitação), p(Cob_arborea) 5.64 0.0408 5 118.33

ψ (Cob_arborea + Sazonal_Precipitação), p(Amostragem) 6.49 0.0267 5 119.18

ψ (Ordem_Rio + Sazonal_Precipitação), p(.) 7.49 0.0162 4 122.72

ψ (Ordem_Rio + Sazonal_Precipitação), p(Cob_arborea) 8.74 0.0087 5 121.43

ψ (Ordem_Rio + Sazonal_Precipitação), p(Amostragem) 9.73 0.0053 5 122.42

ψ (Dens_pop + Dist_Estradas), p(Ordem_Rio) 36.42 0.0000 5 149.11

ψ (Dens_pop + Dist_Estradas), p(.) 42.08 0.0000 4 157.31

ψ (Dens_pop + Dist_Estradas), p(Cob_arborea) 43.27 0.0000 5 155.96

ψ (Dens_pop + Dist_Estradas), p(Amostragem) 44.32 0.0000 5 157.01

ψ (.), p(.) 49.66 0.0000 2 169.6

Na análise do conjunto de 39 modelos candidatos que representaram hipóteses

biológicas para explicar a probabilidade de ocupação da Lontra longicaudis no nordeste

brasileiro, 5 apresentaram ΔAICc ≤ 2, todos apresentando a variável "sazonalidade da

precipitação" em sua composição (Tabela 5). Como nenhum modelo apresentou wAIC ≥ 0,90,

foram considerados os 5 melhores modelos ajustados, que juntos somaram wAICcum ≥ 0,90

(Tabela 5), para estimativas média dos coeficientes das variáveis que os compõe, e

interpretação do efeito de cada uma sobre a ocupação da espécie (Tabela 6). Apesar de 5

covariáveis de ocupação comporem este conjunto de modelos, apenas a variável climática

"sazonalidade da precipitação" apresentou um efeito significativamente negativo na ocupação

da espécie, com 95% do intervalo de confiança do seu coeficiente não sobrepondo o zero, o que

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significa que quanto maior o coeficiente de variação na precipitação ao longo do ano, menor a

probabilidade de ocupação da espécie (Tabela 8; Figura 3).

Tabela 5: Ranqueamento dos 39 modelos construídos para analisar a ocupação da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro. ΔAICc: diferença no AICc de um modelo e o melhor modelo ranqueado; wAIC: peso de Akaike; K: número de parâmetros; -2l: duas vezes a verossimilhança negativa; wAICcum: peso de Akaike cumulatvo.; ψ: probabilidade de ocupação e p: probabilidade de detecção.

MODELOS ΔAICc wAIC K -2l wAICcum ψ(Cob_arbórea + Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 0.00 0.25 5 112.7 0.3 ψ(Dens_Estradas + Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 0.61 0.19 5 113.3 0.4 ψ(Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 0.72 0.18 4 115.9 0.6 ψ(Dist_Estradas + Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 0.95 0.16 5 113.6 0.8 ψ(Dens_Drenagem + Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 1.51 0.12 5 114.2 0.9 ψ(Precip_anual + Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 2.91 0.06 5 115.6 1.0 ψ(Flux_cap_agua + Sazonal_precip), p(Ordem_Rio) 3.16 0.05 5 115.8 1.0 ψ(Cob_arbórea + Remanescentes), p(Ordem_Rio) 18.59 0.00* 5 131.3 1.0 ψ(Cob_arbórea + Dens_pop), p(Ordem_Rio) 25.81 0.00* 5 138.5 1.0 ψ(Remanescentes + Precip_anual), p(Ordem_Rio) 31.29 0.00* 5 144.0 1.0 ψ(Ordem_Rio + Cob_arbórea), p(Ordem_Rio) 31.40 0.00* 5 144.1 1.0 ψ(Ordem_Rio + Dens_pop), p(Ordem_Rio) 31.72 0.00* 5 144.4 1.0 ψ(Cob_arbórea + Flux_cap_agua), p(Ordem_Rio) 31.73 0.00* 5 144.4 1.0 ψ(Ordem_Rio + Remanescentes), p(Ordem_Rio) 31.98 0.00* 5 144.7 1.0 ψ(Dens_pop + Flux_cap_agua), p(Ordem_Rio) 32.74 0.00* 5 145.4 1.0 ψ(Cid_ViaEstrada + Dens_pop), p(Ordem_Rio) 32.93 0.00* 5 145.6 1.0 ψ(Ordem_Rio), p(Ordem_Rio) 33.44 0.00* 4 148.7 1.0 ψ(Remanescentes + Flux_cap_agua), p(Ordem_Rio) 33.44 0.00* 5 146.1 1.0 ψ(Dens_pop), p(Ordem_Rio) 33.92 0.00* 4 149.1 1.0 ψ(Flux_cap_agua), p(Ordem_Rio) 35.13 0.00* 4 150.4 1.0 ψ(Ordem_Rio + Dens_Estradas), p(Ordem_Rio) 35.15 0.00* 5 147.8 1.0 ψ(Cob_arbórea), p(Ordem_Rio) 35.17 0.00* 4 150.4 1.0 ψ(Dens_pop + Precip_anual), p(Ordem_Rio) 35.40 0.00* 5 148.1 1.0 ψ(Flux_cap_agua + Pecip_anual), p(Ordem_Rio) 35.42 0.00* 5 148.1 1.0 ψ(Remanescentes), p(Ordem_Rio) 35.45 0.00* 4 150.7 1.0 ψ(Remanescentes + Dens_Estradas), p(Ordem_Rio) 36.01 0.00* 5 148.7 1.0 ψ(Dens_pop + Dens_Estradas), p(Ordem_Rio) 36.19 0.00* 5 148.9 1.0 ψ(Cob_arbórea + Dens_Estradas), p(Ordem_Rio) 36.40 0.00* 5 149.1 1.0 ψ(Dist_Estradas + Dens_pop), p(Ordem_Rio) 36.42 0.00* 5 149.1 1.0 ψ(Dist_Estradas + Remanescentes), p(Ordem_Rio) 37.25 0.00* 5 149.9 1.0 ψ(Cob_arbórea + Precip_anual), p(Ordem_Rio) 37.70 0.00* 5 150.4 1.0 ψ(Precip_anual), p(Ordem_Rio) 41.07 0.00* 4 156.3 1.0 ψ(Dens_Drenagem + Precip_anual), p(Ordem_Rio) 43.40 0.00* 5 156.1 1.0 ψ(Dens_Estradas), p(Ordem_Rio) 43.76 0.00* 4 159.0 1.0 ψ(Dist_Estradas), p(Ordem_Rio) 44.76 0.00* 4 160.0 1.0 ψ(Cid_ViaEstradas), p(Ordem_Rio) 44.77 0.00* 4 160.0 1.0 ψ(Dens_Drenagem), p(Ordem_Rio) 44.80 0.00* 4 160.0 1.0 ψ(Complex_Relevo), p(Ordem_Rio) 44.87 0.00* 4 160.1 1.0 ψ(.), p(.) 49.66 0.00* 2 169.6 1.0

* wAIC < 0.001

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51

Tabela 6: Estimativas médias dos coeficientes (^β) das variáveis que compõem os cinco modelos melhor ranqueados como preditores da ocupação da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro; seus respectivos erros padrão (EP), intervalos de confiança (IC) superior e inferior, soma do peso de Akaike (wAIC ) e um ranqueamento de importância das covariáveis. Valores resultantes da média dos modelos (model averaging).

Covariável ^β (EP) IC inferior (^β) IC superior (^β) Soma wAIC Rank Ψ Intercepto -1.685 (1.35) -4.326 0.956 Sazonal_Precip * -6.215 (2.68) -11.464 -0.967 0.89 1 Cob_arborea 0.335 (0.68) -0.999 1.670 0.25 2 Dens_Estradas 0.352 (0.89) -1.389 2.094 0.19 3 Dist_Estrada -0.211 (0.59) -1.383 0.961 0.16 4 Dens_Drenagem 0.147 (0.53) -0.886 1.181 0.12 5 p Intercepto 0.831 (0.26) 0.324 1.339 Ordem_Rio * -0.728 (0.29) -1.303 -0.152 0.89 1

Figura 3: Covariáveis importantes para a ocupação da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro, de acordo com os cinco modelos melhor ajustados, que juntos somaram 90% da variação na probabilidade de ocupação da espécie. Os pontos correspondem aos coeficientes médios e as barras ao intervalo de confiança de 95%.

-12 -8 -4 0 4 Coeficientes

Cobertura arborea

Densidade da drenagem

Densidade de Estradas

Distância da Estrada

Intercepto (psi)

Sazonalidade Precipitação

Variá

veis

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A probabilidade média geral de ocupação para toda a área estudada, considerando as 45

microbacias amostradas, foi estimada em 0,49 (Ep= 0,45). Foi observado, no entanto, que a

área de estudo abrange duas regiões distintas em relação à probabilidade de ocupação. A região

que abrange as bacias hidrográficas que drenam para o norte (excluindo as duas microbacias

amostradas no Cerrado), totalmente inserida no bioma Caatinga e constituída por 19 das

microbacias amostradas, com probabilidades de ocupação entre 0 - 0,03 (^ψ= 0,006; Ep=

0,009); e a região que abrange as bacias hidrográficas que drenam para o leste, inserida nos

biomas Caatinga e Floresta Atlântica, com 24 microbacias amostradas e probabilidades de

ocupação variando entre 0,13 - 0,99 (^ψ= 0,88; Ep= 0,2). A probabilidade de detecção geral da

espécie na área de estudo foi alta 0,68 (Ep= 0,15), sendo um pouco maior nas bacias

hidrográficas que drenam para o leste (^p= 0,76; Ep= 0,11) em relação as bacias que drenam

para o norte (^p= 0,59; Ep= 0,13).

Do total de 262 vestígios de lontras encontrados, 238 foram registrados na região que

abrange as bacias hidrográficas que drenam para o leste, resultando em uma taxa média de

encontro de 1vestígio/km percorrido em trecho de amostragem. Do conjunto de 20 modelos

construídos para explicar a intensidade de uso do habitat pelas lontras nessa região, quatro

apresentaram ΔAICc ≤ 2, sendo o modelo contento as variáveis "porcentagem de

remanescentes" e "sazonalidade da precipitação" o melhor ranqueado (Tabela 7). Estes modelos

retiveram 59% da variabilidade explicada por todos os modelos (wAICcum= 0,59), portanto,

paras as estimativas médias dos coeficientes e interpretação do efeito das variáveis sobre a

intensidade de uso do habitat, foram considerados mais oito modelos, totalizando 12 modelos,

que juntos somaram wAICcum ≥ 0,90 (Tabela 7). Excluindo-se os quatro modelos melhor

ranqueados, no entanto, os oito modelos restantes apresentaram pesos entre 0,06 - 0,03, com

influência pouco significativa na intensidade de uso do habitat pela espécie. Dessa forma,

apesar de considerados para a média dos modelos (model averaging), as variáveis referentes a

esses modelos não foram apresentadas por serem pouco significativas (Tabela 8).

A sazonalidade da precipitação, além de ser uma variável importante para a ocupação

da Lontra longicaudis na região nordeste, também é uma variável importante para a intensidade

de uso do habitat pela espécie nas bacias hidrográficas que drenam para o leste, seguida pelas

variáveis "fluxo de área de captação de água" e "porcentagem de remanescentes", todas com

influência negativa, apesar de uma pequena sobreposição com o zero nas duas primeiras

(Tabela 8; Figura 4)

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Tabela 7: Ranqueamento dos 20 modelos construídos para analisar a intensidade de uso do habitat pela Lontra longicaudis no nordeste brasileiro. ΔAICc: diferença no AICc de um modelo e o melhor modelo ranqueado; wAIC: peso de Akaike; K: número de parâmetros; wAICcum: peso de Akaike cumulatvo.

MODELOS ΔAICc wAIC K wAICcum Remanescentes + Sazonal_precip 0.00 0.18 5 0.2 Flux_cap_agua + Sazonal_precip 0.46 0.14 5 0.3 Sazona_precip 0.67 0.13 4 0.5 Modelo Nulo 0.67 0.13 3 0.6 Flux_cap_agua 2.33 0.06 4 0.7 Precip_anual 2.85 0.04 4 0.7 Cob_arbórea 3.04 0.04 4 0.7 Complex_Relevo 3.41 0.03 4 0.8 Dens_Estradas 3.56 0.03 4 0.8 Dens_pop 3.57 0.03 4 0.8 Dist_Estradas 3.57 0.03 4 0.9 Cob_arbórea + Sazonal_precip 3.69 0.03 5 0.9 Complex_Relevo + Sazonal_precip 3.79 0.03 5 0.9 Dens_pop + Sazonal_precip 3.89 0.03 5 1.0 Cob_arbórea + Flux_cap_agua 4.54 0.02 5 1.0 Flux_cap_agua + Precip_anual 5.41 0.01 5 1.0 Dens_pop + Flux_cap_agua 5.55 0.01 5 1.0 Dens_pop + Precip_anual 6.08 0.01 5 1.0 Dens_pop + Dens_Estradas 6.78 0.01 5 1.0 Dist_Estradas + Dens_pop 6.79 0.01 5 1.0

Tabela 8: Estimativas médias dos coeficientes (^β) das variáveis que compõem os quatro modelos melhor ranqueados de intensidade de uso do habitat pela Lontra longicaudis no nordeste brasileiro; seus respectivos erros padrão (EP), intervalos de confiança (IC) superior e inferior, soma do peso de Akaike (wAIC ), e valores de Z e P. Valores resultantes da média dos modelos (model averaging).

Variável ^β (EP) IC inferior (^β)

IC superior (^β)

Soma wAIC Z P( >|z|)

Intercepto -0.865 (0.36) -1.571 -0.159 -2.403 0.016 Sazonal_Precip -0.534 (0.27) -1.067 0.000 0.49 -1.96 0.05 Flux_cap_agua -0.341 (0.21) -0.747 0.065 0.20 -1.644 0.1 Remanescentes -0.230 (0.11) -0.443 -0.018 0.18 -2.126 0.033

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Figura 4: Variáveis importantes para a intensidade de uso do habitat pela Lontra longicaudis no nordeste brasileiro, de acordo com os 12 modelos melhor ajustados, que juntos somaram 90% da variação na intensidade de uso do habitat. Os pontos correspondem aos coeficientes médios e as barras ao intervalo de confiança de 95%.

4. DISCUSSÃO

Neste estudo foram utilizados modelos de ocupação para analisar o efeito de variáveis

ambientais, climáticas e antrópicas na ocupação das bacias hidrográficas do nordeste brasileiro

pela Lontra longicaudis. Apesar das lontras serem animais de comportamento críptico, as suas

fezes são depositadas em locais conspícuos e possuem alta probabilidade de detecção, sendo a

principal ferramenta para estudos com a família Lutrinae (Kruuk, 2006). A probabilidade de

detecção da Lontra longicaudis obtida neste estudo foi alta, principalmente nas bacias

hidrográficas que drenam para o leste, semelhante as obtidas para as espécies Lontra

canadensis (p= 0,61; Jeffress et al., 2011b), Aonyx capensis (0.80; Okes & O'Riain, 2017) e

Aonyx cinereus (p= 0,97; Perinchery et al., 2011). Esta alta detectabilidade dos vestígios,

associada com um observador experiente, pode ter refletido na baixa influência da forma de

condução da amostragem (barco ou a pé) na probabilidade de detecção observada neste estudo.

A cobertura arbórea não foi uma variável importante para a detecção da lontra na área

de estudo. Esta variável foi testada como covariável da detecção pela sua influencia no tipo de

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substrato, considerando que a probabilidade de detectar vestígios de lontra é menor em

substratos de serrapilheira (Jeffress et al., 2011b), comuns em áreas florestais. Esta variável, no

entanto, reflete a estrutura arbórea da vegetação (> 5m; Hansen et al., 2013), o que não inclui

apenas remanescentes florestais, mas áreas de cultivo de maior porte, que podem não ter a

mesma influência na formação da serrapilheira.

A ordem dos rios foi a única variável que apresentou influência negativa significativa

na probabilidade de detecção da espécie, e que deve ser considerada em estudos futuros com

Lontra longicaudis, principalmente se forem utilizadas réplicas espaciais. Em rios menores, a

disponibilidade de locais para a deposição de fezes e construção de tocas em um trecho é

menor, por isso as lontras tendem a se deslocar mais ao longo do curso d'água, e, assim, uma

única lontra pode marcar vários quilômetros de rio, aumentando a probabilidade de ser

detectada ao longo de segmentos consecutivos de amostragem (Ruiz-Olmo et al., 2001a). A

diferença observada na probabilidade de detecção entre as bacias que drenam para o leste e

para o norte pode estar relacionada à ordem dos rios dessas regiões. A maioria dos trechos de

rios amostrados na bacias hidrográficas com drenagem norte eram de sexta ordem, enquanto

que os trechos amostrados na bacias com drenagem leste eram em sua maioria de quarta ordem.

A ocupação bruta obtida para a região foi muito próxima da ocupação geral estimada

neste estudo, o que pode ser resultado da alta detectabilidade da espécie (Prakash et al., 2012).

Quando analisamos separadamente a ocupação bruta da região que abrange as bacias

hidrográficas que drenam para o leste (0,83), onde estão concentrados os registros de

ocorrência da espécie, observamos um incremento de 6% na ocupação média estimada para

esta mesma região (0,88), o que significa que a espécie nem sempre foi detectada quando

estava presente, e ressalta a importância de se considerar a detectabilidade em estudos com

Lontra longicaudis.

A estruturação geográfica observada na probabilidade de ocupação da Lontra

longicaudis no nordeste brasileiro pode estar relacionada à variáveis ambientais que também

estejam espacialmente estruturadas (Barbosa et al., 2003). A área focal deste estudo, ao norte

do Rio São Francisco, abrange áreas dos biomas Floresta Atlântica, Caatinga e Cerrado. A

Floresta Atlântica está restrita à porção sul da região estudada, onde estão inseridas as bacias

hidrográficas que drenam para o leste. Já as bacias hidrográfica que drenam para o norte da

nossa área de estudo, com exceção dos rios localizados no Cerrado do sul do estado do Piauí,

são compostas por rios totalmente inseridos na Caatinga. Estes biomas diferem muito em

relação ao clima.

O clima foi o fator mais importante para explicar o padrão de ocupação das bacias

hidrográficas do nordeste brasileiro pela lontra. A sazonalidade da precipitação apresentou uma

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influência negativa significativa na probabilidade de ocupação da espécie, enquanto que a

precipitação média anual não foi uma variável importante na estimativa desse parâmetro. Isto

indica que a variação na disponibilidade de água ao longo do ano é mais importante para as

lontras do que a quantidade deste recurso em si.

A capacidade das lontras de ocorrer em regiões semiáridas tem sido demonstrada pela

Lutra lutra em ecossitemas mediterrâneos (Ruiz-Olmo & Jiménez, 2008). Nesta região as

lontras ocorrem frequentemente em poças de rios quase secos, e a ocorrência da espécie nesses

ambientes não está relacionada à disponibilidade de água em si, mas à disponibilidade de

presas, que em sua maioria são aquáticas (Ruiz-Olmo et al., 2001b, Ruiz-Olmo et al., 2007). A

variação na disponibilidade de água, refletida em longos períodos de seca, diminui os recursos

alimentares disponíveis para a espécie e aumenta o estresse ambiental, sendo por isso uma

variável mais importante na determinação da sua ocorrência (Ruiz-Olmo & Jiménez, 2008).

As bacias hidrográficas que drenam para o norte da nossa área de estudo, com exceção

das microbacias localizadas no Cerrado do Sul do Piauí, são compostas por rios totalmente

inseridos na Caatinga, que sofrem uma influencia mais forte do clima semiárido. Esta região é

caracterizada por eventos periódicos de secas severas, que ocorrem a intervalos de poucos anos,

com raros eventos de cheia (Krol et al., 2001, Prado, 2003), o que pode ser uma condição

limitante para a espécie. A exceção de alguns rios que possuem regime hidrológico artificial

controlado por grandes reservatórios, todos os rios desta região são originalmente intermitentes

ao longo de seu curso e secam completamente por longos períodos (Rosa et al., 2003). A baixa

probabilidade de ocupação estimada para esta região confirma a lacuna reportada por Rosas-

Ribeiro et al. (2017) na área de distribuição da Lontra longicaudis.

Além de ser um dos fatores determinantes da ocorrência da espécie na região, o clima é

também um dos fatores importantes para a intensidade de uso do habitat pelas lontras. Apesar

desta análise estar restrita a uma área menor, com menor variação climática, observa-se um

aumento na sazonalidade da precipitação em direção ao norte, a medida que a faixa de Floresta

Atlântica se torna mais estreita, e em direção aos trechos altos dos rios, localizados em áreas de

Caatinga. Nestes trechos foi registrado um número menor de vestígios, principalmente

vestígios recentes (Rosas-Ribeiro, observação pessoal), indicando um uso ocasional ou menos

frequente pelas lontras. Apesar das bacias hidrográficas dessa região apresentarem condições

climáticas menos severas que as bacias totalmente inseridas no bioma Caatinga, a maior

variabilidade na disponibilidade de água ao longo do ano afeta a disponibilidade e distribuição

dos recursos alimentares. Como resposta a essas flutuações, as lontras podem adotar um padrão

muito elástico de uso do espaço, aumentando suas áreas de vida, com grande mobilidade no

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57

tempo (Ruiz-Olmo & Jiménez, 2008). Dessa forma, apesar de ocorrerem na bacia hidrográfica,

no momento da amostragem o trecho de rio pode estar sendo utilizado com menos frequência.

A área de captação de água a montante (flux_cap_agua) é uma variável das

microbacias, muito correlacionada com a ordem dos rios (r = 0.90; p<0.0001), ambas

relacionadas ao tamanho dos cursos d'água e localização do trecho amostrado. Rios com maior

fluxo de área de captação e maior ordem, possuem maior volume de água. Apesar de não serem

variáveis importantes para a ocorrência da Lontra longicaudis, são variáveis que influenciam

negativamente a detectabilidade e o uso do habitat pela espécie. A ordem do rio foi uma

variável importante para o uso do habitat pela espécie Aonyx cinereus, que utiliza mais os rios

intermediários, de segunda ordem, que os rios muito pequenos (primeira ordem), ou rios de

grande porte (terceira ordem ou maior) (Perinchery et al., 2011). Em uma bacia hidrográfica

geralmente os impactos e ameaças se acumulam na direção montante-jusante, de forma que os

trechos de rio com maior volume de água, como os canais principais próximos à foz, são os

mais degradados (Nel et al., 2007; Vörösmarty et al., 2010). Isto é agravado pelo fato dessas

partes baixas dos rios, principalmente em regiões costeiras, serem densamente povoadas

(Vörösmarty et al., 2010). Desta forma, rios tributários, de menor porte, oferecem melhores

condições ambientais e podem funcionar como um refúgio para as espécies que dependem do

ambiente aquático (Nel et al., 2007), o que pode explicar a influência negativa do fluxo de área

de captação de água acumulado no uso do habitat pela Lontra longicaudis.

A ocorrência da lontra neotropical na área estudada está concentrada nas bacias

hidrográficas que drenam para o leste, com intensidade maior de uso do habitat em regiões com

menor sazonalidade da precipitação. Esta região corresponde à Floresta Atlântica nordestina,

porção menos conservada deste bioma, com alta densidade populacional humana, onde a

expansão de paisagens antropizadas tem restringindo os remanescentes florestais a pequenos

fragmentos com menos de 10.000 ha (Ribeiro et al., 2009; Tabarelli et al., 2010). Como uma

consequência indireta disto, mesmo procurando refúgios, a espécie utiliza habitats com poucos

remanescentes florestais, o que resultou em uma influência negativa da porcentagem de

remanescentes na intensidade de uso do habitat pela lontra nessa região.

A Lontra longicaudis é uma espécie de grande tolerância ecológica, capaz de ocorrer

em áreas alteradas por impacto antrópico, próximas a cidades e atividades humanas (Larivière,

1999; Pardini & Trajano, 1999; Alarcon & Simões-Lopes, 2003). Por serem animais que

dependem do ambiente aquático, em algumas regiões as lontras utilizam preferencialmente

habitats de planícies costeiras, bem drenadas, geralmente também muito utilizados pela

população humana (Sepúlveda et al., 2007), como observado neste estudo para a Lontra

longicaudis na Floresta Atlântica nordestina, e também para a espécie Aonyx capensis, que

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ocorre preferencialmente nos trechos baixos dos rios da Península de Cape - Africa do Sul,

apesar do alto grau de degradação e poluição (Okes & O'Riain, 2017). A ocorrência das lontras

nessas áreas, no entanto, não garante a persistência de suas populações. A exposição

prolongada à poluentes, trafego de veículos e contato com animais domésticos pode colocar as

populações de lontras em risco a longo prazo, principalmente por serem predadores de topo,

indiretamente afetados por qualquer impacto ao longo da cadeia trófica, podendo responder a

estes impactos tardiamente (Okes & O'Riain, 2017).

A ocorrência e uso de área degradadas pelas lontras também pode ser intensificada

como um reflexo da escala local de amostragem, sendo revelado um padrão diferente quando

analisada em uma escala mais ampla da paisagem (Okes & O'Riain, 2017). Quando

considerada toda a área de distribuição da Lontra longicaudis, a densidade populacional

humana teve efeito negativo na adequabilidade do habitat para a espécie, apesar de valores

altos de adequabilidade ainda serem observados em áreas densamente povoadas (Rheingantz et

al., 2014).

De acordo com Robitaille e Laurence (2002), a Lutra lutra aparenta ter um limiar de

tolerância para a densidade populacional humana, estando sempre ausente em locais com

densidade populacional superior a 183 habitantes/km2. Isto pode estar relacionado à

manutenção dos recursos críticos mínimos para a espécie, que pode ser ameaçada em condições

de alta densidade populacional. As lontras são capazes de se adaptar a ambientes alterados,

desde que os recursos críticos para a sua existência, como água, alimento e locais de abrigo e

reprodução, sejam mantidos (Prakash et al., 2012; Okes & O'Riain, 2017). Os níveis de

perturbação antrópica existentes na área de estudo podem estar dentro do limite de tolerância

da Lontra longicaudis, mas a falta de estratégias de conservação que garantam a manutenção

desses recursos na região torna a espécie suscetível à extinção regional.

A degradação ambiental e perturbações antrópicas têm causado declínios populacionais

em várias espécies da família Lutrinae, como a Lontra canadensis e Lutra lutra que sofreram

várias extinções locais ao longo das suas áreas de distribuição (Kruuk, 2006; Battisti et al.,

2011; Fei & Chan, 2017). A subespécie Lutra lutra whitelleyi, com distribuição geográfica

restrita ao Japão, foi declarada extinta na natureza pela caça e perda de habitat (Hance, 2012), e

as três espécies de lontra que ocorrem na China, Lutra lutra, Aonyx cinereus e Lutrogale

perspicillata estão em acentuado declínio populacional (Fei & Chan, 2017). A extinção local da

espécie Lutra lutra na região do Lácio, Itália central, ocorreu em um período de 5 a 6 décadas

após a destruição das áreas de planícies úmidas, antes amplamente ocupadas pelas lontras

(Battisti et al., 2011). Inicialmente a espécie ficou restrita a pequenos fragmentos florestais em

tributários de menor porte, em subpopulações sumidouro, que se extinguiram em algumas

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59

décadas (Battisti et al., 2011). O intervalo de tempo entre o impacto ambiental e a extinção da

espécie foi atribuído a um efeito de retardo (débito de extinção), que pode ocorrer

principalmente com espécies abundantes e bem adaptadas (Tilman et al., 1994). Apesar de não

existirem estudos populacionais com a Lontra longicaudis no nordeste brasileiro, alertamos

para a possibilidade da espécie estar passando pelo mesmo processo. Algumas regiões com

grande magnitude de debito de extinção para mamíferos foram estimadas para o nordeste

brasileiro (Chen & Peng, 2017) e uma recente avaliação de risco de extinção da espécie fez

uma previsão de desaparecimento local da Lontra longicaudis na Floresta Atlântica nordestina

nos próximos 50 anos, devido a perda da capacidade de suporte do ambiente por redução de

habitat, caça e atropelamentos (Rodrigues et al., 2013).

Apesar da situação de alerta, as lontras são resilientes e têm demostrado capacidade de

recuperação a partir de grandes declínios populacionais (Kruuk, 2006; Recharte Uscamaita &

Bodmer, 2009; Theng & Sivasothi, 2016). Dessa forma, ressaltamos a necessidade urgente de

estratégias efetivas para a conservação da espécie na região nordeste brasileira ao norte do rio

São Francisco. Com uma melhor compreensão da distribuição e dos principais fatores que

influenciam a ocorrência e uso do habitat pela espécie na região, recomendamos como ações

prioritárias: 1) estudos genéticos e populacionais, até então inexistentes, para que se conheça a

variabilidade genética e o estado atual da população de Lontra longicaudis na região; 2) análise

e seleção de bacias hidrográficas prioritárias para a conservação da espécie, para que sejam

definidas ações de conservação e restauração que garantam a persistência da Lontra

longicaudis no nordeste brasileiro.

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67

CAPÍTULO III

Diversidade genética e padrão de dispersão da Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no nordeste brasileiro*

* Manuscrito em preparação

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68

Diversidade genética e padrão de dispersão da Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro*

Patrícia F. Rosas-Ribeiro1; Cristine Trinca2; Eduardo Eizirik2, Eduardo M. Venticinque1

1 Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Biociências, Departamento de Ecologia, Caixa Postal 1524, CEP 59078-970, Natal, RN, Brazil 2 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Laboratório de Biologia Genômica e Molecular.

RESUMO A diversidade genética representa o potencial evolutivo para uma espécie se adaptar às mudanças ambientais. Entender os fatores que afetam a estrutura genética e fluxo gênico entre populações é essencial para definir estratégias efetivas de conservação. A Lontra longicaudis é uma das espécies menos estudadas da subfamíllia Lutrinae e foi recentemente classificada como quase ameaçada de extinção. Pouca informação existe sobre esta espécie no nordeste do Brasil, que nunca foi significativamente amostrado em estudos genéticos e taxonômicos. Para suprir esta lacuna e contribuir com a persistência a longo prazo da L. longicaudis no nordeste brasileiro, neste estudo nós analisamos a diversidade genética e o padrão de dispersão da espécie na região. Para isto foram analisados segmentos de DNA mitocondrial de 36 amostras não invasivas (fezes frescas, muco e tecido), provenientes de 8 bacias hidrográficas. Destas, 17 amplificaram os três segmentos analisados e foram consideradas indivíduos distintos pela localização amostral e composição genética. Estes indivíduos são representativos de 7 haplótipos, dos quais 4 foram identificados pela primeira vez neste estudo. A espécie apresentou alta diversidade haplotípica, mas baixa variabilidade nucleotídica, o que indica expansão recente da população. A maior diferenciação genética entre todas as amostras foi observada em duas amostras do Piauí, acima da área de Caatinga onde não há registros atuais de presença da espécie, corroborando a existência de uma barreira climática por onde o fluxo gênico pode estar interrompido há mais tempo. A população de lontra do nordeste apresentou diferença genética significativa em relação aos grupos geográficos da Amazônia e do Leste da América do Sul, maior que a diferença desses dois grupos entre si, o que indica menor fluxo gênico para essa região. O cenário que atribuiu um custo elevado para a dispersão por terra, foi o que apresentou relação mais forte com a divergência genética observada entre as amostras da região nordeste, indicando que a espécie é capaz de se dispersar por terra, mas em situações extremas. Já a divergência genética entre as bacias costeiras apresentou relação mais forte com as distâncias geográficas (euclidiana e trecho de bacias), o que pode ser resultado de uma região mais homogênea, sujeita a alagamentos, onde a paisagem impõe menos resistência à dispersão por animais semiaquáticos. Análises do caminho de menor custo indicam o Rio São Francisco como uma importante rota de dispersão, conectando as bacias costeiras do nordeste com as bacias localizadas ao norte da Caatinga, o que ressalta a importância da sua preservação para a manutenção da diversidade genética na região. Palavras chave: Lutrinae, DNA Mitocondrial, Genética da paisagem, Dispersão, Conservação

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1. INTRODUÇÃO

A diversidade genética representa o potencial evolutivo para que uma espécie possa se

adaptar às mudanças ambientais, sendo por isso considerada uma das prioridades da biologia da

conservação (Allendorf & Luikart, 2007; Frankham et al., 2009). Fatores biológicos,

ambientais e ecológicos podem influenciar na variabilidade e estrutura genética de uma

população, como o tamanho populacional, características reprodutivas e a conectividade entre

populações (Frankham et al., 2009). Quanto maior a conectividade, maior a variabilidade

genética em populações locais e menor a variabilidade entre populações, enquanto que a baixa

conectividade leva ao isolamento e diminui a variabilidade genética local, aumentando a

divergência entre populações por deriva genética e/ou seleção natural (Slatkin, 1985).

O fluxo gênico entre populações pode ser influenciado por características dos

organismos e pela estruturação dos elementos da paisagem (Baguette et al., 2012). No caso de

espécies aquáticas e semiaquáticas, a dependência dos corpos d'água ressalta a influencia da

estrutura espacial da drenagem na conectividade entre populações (Hughes et al., 2009). Para

espécies aquáticas o fluxo gênico ocorre mais frequentemente dentro do que entre bacias

hidrográficas (Meffre & Vrijenhoek, 1988), o que pode resultar em uma forte estruturação da

variabilidade genética entre as bacias, mais correlacionada à resistência a dispersão pela

paisagem, do que à distância euclidiana entre elas. Para espécies que não são obrigatoriamente

restritas ao ambiente aquático, no entanto, esta estruturação pode estar relacionada ao grau de

dependência aos corpos d'água, e ao posicionamento das populações ao longo da rede de

drenagem (Hughes et al., 2009), de forma que espécies semiaquáticas podem utilizar caminhos

de dispersão alternativos e manterem populações conectadas em uma grande escala espacial

(Baguette et al., 2012).

A influência dos elementos da paisagem no fluxo gênico e estrutura genética das

populações deu origem a abordagem da genética da paisagem (Manel et al., 2003), utilizada em

muitos estudos para inferir sobre os padrões de dispersão e fluxo gênico a partir da correlação

entre a diferenciação genética e características da paisagem (Finn et al., 2007; Byrne et al.,

2015; Guerrero et al., 2015; Pagacz, 2016). Compreender o padrão de dispersão de uma espécie

é essencial para avaliar os efeitos da fragmentação do hábitat e impactos antrópicos na

manutenção a longo prazo das populações, assim como para analisar o potencial de

recolonização da espécie e definir estratégias efetivas de conservação (Baguette et al., 2012).

A lontra neotropical [Lontra longicaudis (Olfers,1818)] é um carnívoro semiaquático,

com ampla distribuição geográfica, que ocorre originalmente desde o México até o Uruguai

(Kruuk, 2006). Apesar de ser uma espécie de grande tolerância ecológica, capaz de suportar

modificações ambientais e ocorrer em locais próximos a cidades e aglomerações humanas

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(Kruuk, 2006), devido às crescentes ameaças que afetam o ambiente aquático e terrestre onde

vivem, o seu status de conservação foi recentemente atualizado de insuficientemente conhecida

(DD – “data deficient”) para quase ameaçada (NT – “Near Threatened") (IUCN - União

Internacional para a Conservação da Natureza, 2015). A dependência da espécie aos ambientes

aquáticos e ripários está associada principalmente à obtenção de alimento, já que suas presas

mais frequentes são espécies aquáticas (Pardini, 1998; Rheingantz et al., 2012; Rheingantz et

al., 2017), e à construção das tocas e locais de descanso, normalmente próximos à agua e

associados à boa qualidade desses ambientes (Pardini & Trajano, 1999; Kasper et al., 2008).

Apesar da existência de uma rede de drenagem permanente e bem conectada ser

considerada um fator importante para o fluxo gênico entre populações de lontras (Janssens et

al., 2008; Guerrero et al., 2015), as lontras possuem boa capacidade de locomoção por terra.

Estudos com Lutra lutra comprovam que a espécie é capaz de se deslocar por vários

quilômetros terrestres entre poças ou bacias hidrográficas (Ruiz-Olmo & Jiménez, 2008),

inclusive mantendo o fluxo gênico contínuo entre bacias hidrográficas separadas por grandes

elevações (Pagacz, 2016). Em algumas regiões, no entanto, Lutra lutra e Lontra canadensis

apresentam populações espacialmente estruturadas (Latch et al., 2008; Honnen et al.. 2015;

Lehoczky et al.., 2015), o que indica que essa dispersão não ocorre de forma independente aos

elementos da paisagem.

A Lontra longicaudis apresenta grande capacidade de dispersão por água, com longos

deslocamentos e fluxo gênico frequente ao longo de bacias hidrográficas (Ortega et al, 2012).

Apesar de pouco se conhecer sobre a capacidade de dispersão terrestre da Lontra longicaudis, a

migração por terra entre bacias hidrográficas fica evidente para esta espécie pela falta de

estruturação genética encontrada em grandes regiões geográficas, como o sul e Sudeste do

Brasil (Trinca et al., 2007; Trinca et al., 2012), e a região que abrange a Amazônia, Peru e

Guianas, onde não se encontra evidência de estruturação por região ou bacia hidrográfica

(Trinca et al., 2012). Nestas regiões a similaridade genética não está relacionada à distância

geográfica, o que pode indicar a influência de características da paisagem na capacidade de

dispersão da espécie.

No México as populações de Lontra longicaudis se encontram espacialmente

estruturadas, indicando que áreas de baixa altitude e bem drenadas funcionam como corredores

facilitando a dispersão entre bacias hidrográficas, enquanto áreas mais elevadas e com escassez

de água podem funcionar como barreiras (Guerrero et al., 2015). A maior diferenciação

genética nessa região se encontra na população localizada mais ao norte do México, em uma

das regiões mais secas da área de distribuição da espécie, o que, além do maior isolamento,

também pode levar a evolução de adaptações (Guerrero et al., 2015). Diferenciações

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morfológicas no crânio e mandíbula da Lontra longicaudis também foram observadas entre

regiões geográficas, principalmente em regiões limítrofes da sua distribuição no México e

Argentina (Hernández-Romero et al., 2015), corroborando o padrão de diferenciação genética

encontrado.

A falta de estruturação encontrada entre as populações de Lontra longicaudis em

algumas regiões brasileiras pode estar relacionada a lacunas amostrais. O Nordeste brasileiro,

que abrange o bioma Caatinga, uma das regiões mais secas na área de distribuição da Lontra

longicaudis, foi por muito tempo considerado como uma lacuna nos mapas de distribuição da

espécie (Larivière 1999, Kruuk 2006) e nunca foi significativamente amostrados em estudos

genéticos e taxonômicos (Harris, 1968; van Zyll de Jong, 1972; Trinca et al., 2012; Hernández-

Romero et al., 2015). Recentemente, em um estudo com maior abrangência amostral, Trinca et

al. (2012) identificou um padrão filogeográfico consistente que sugere a existência de pelo

menos quatro linhagens evolutivas para a Lontra longicaudis, corroborando parcialmente com a

divisão intraespecífica previamente proposta para a espécie: linhagem da Colômbia (L.

longicaudis annenctes), Bolívia, Amazônia (L. longicaudis enudris) e Leste da América do Sul

(ESA - East of South America; L. longicaudis longicaudis). Este estudo considerou duas

amostras provenientes de uma mesma região do nordeste brasileiro, e aponta para uma possível

hipótese de colonização da espécie a partir do Norte da América do Sul em direção ao Sul, com

base na posição do haplótipo único encontrado nessas amostras, que é o mais basal do grupo

ESA (Trinca et al., 2012). Esta hipótese é criticada por Feijó & Langguth (2013), que

defendem a possibilidade da existência de uma espécie distinta de lontra no nordeste brasileiro,

cuja área de distribuição seria ao norte do rio São Francisco.

Estudos para avaliar a diversidade genética, o padrão de dispersão e a conectividade das

populações de Lontra longicaudis ao longo da sua distribuição são considerados prioritários

para a conservação da espécie (Rheingantz et al., 2017), principalmente em regiões limites e

pouco amostradas da sua distribuição, como o nordeste do Brasil (Rodrigues et al., 2013).

Neste estudo nós analisamos a diversidade genética da população de lontras do nordeste

brasileiro ao norte do rio São Francisco, e avaliamos hipóteses alternativas de dispersão que

possam explicar o fluxo gênico na região, com o objetivo de analisar a influência relativa da

distância geográfica, e de características da paisagem, no padrão de diversidade encontrado.

Para isto foram analisados cinco cenários de dispersão: 1) distância euclidiana, cenário que

assume que a dispersão das lontras não depende de características da paisagem, sendo

influenciada exclusivamente pela distância; 2) bacias hidrográficas, cenário que considera o

número de microbacias adjacentes, representando um custo constante de dispersão entre bacias

para a espécie; 3) cenário de alta dependência aos corpos d'água, considerando a possibilidade

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de dispersão pelo mar a um custo moderado e pela terra a um custo muito alto; 4) cenário de

dispersão preferencial ao longo dos corpos d'água, considerando possível a dispersão por terra a

um custo relativo à distância ao rio; 5) cenário de dispersão preferencial ao longo dos corpos

d'água, considerando possível a dispersão por terra a um custo relativo à declividade.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Foram coletadas 34 amostras não invasivas (fezes frescas e muco) e 2 amostras de

tecido de Lontra longicaudis da região nordeste do Brasil ao norte do Rio São Francisco, entre

os estados de Alagoas e Piauí (Figura 1; Tabela 1). Isto resultou em um total de 36 amostras,

em uma região onde apenas 2 amostras de sangue de uma mesma localidade haviam sido

geneticamente analisadas (Trinca et al., 2012; Figura 1). Esta região abrange duas das eco-

regiões de água doce do mundo: a eco-região Parnaíba e a eco-região Bacias Costeiras e da

Caatinga Nordestina (Abell, 2008). A eco-região Parnaíba é constituída pelo rio Parnaíba e seus

afluentes, e se estende por todo o estado do Piauí, até a sua fronteira com o estado do

Maranhão, incluindo áreas do bioma Caatinga e uma pequena porção do Cerrado; a eco-região

Bacias Costeiras e da Caatinga Nordestina se estende entre os estados do Ceará e Alagoas,

abrangendo várias bacias hidrográficas pequenas inseridas nos biomas Floresta Atlântica e

Caatinga (Figura 1). Das 36 amostras, 31 foram coletadas ao longo de sete bacias hidrográficas

da eco-região das Bacias Costeiras, enquanto que apenas 5 foram coletadas em uma única bacia

da eco-região Parnaíba (Figura 1; Tabela 1). As amostras foram coletadas com luvas,

armazenadas em frascos de 50 ml contendo álcool 96%, e mantidas a temperatura de -20o até a

extração do DNA.

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Figura 1: Área de estudo no nordeste do Brasil, ao norte do Rio São Francisco. No detalhe à esquerda: localidades com amostras de Lontra longicaudis geneticamente analisadas no estudo anterior de Trinca et al. (2012), com destaque para a área de estudo, onde apenas 2 amostras foram analisadas. No mapa central: amostras de fezes e tecidos de Lontra longicaudis coletadas neste estudo, com identificação dos haplótipos obtidos de acordo com o conjunto concatenado de amostras com os três segmentos amplificados (CR+ATP8+ND5). Neste conjunto foram consideradas as duas amostras da região nordeste analisadas por Trinca et al. (2012).

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Tabela 1: Amostras de Lontra longicaudis coletadas durante o estudo, com indicação dos segmentos do DNA mitocondrial amplificados em cada uma. BCCN = Bacias Costeiras e da Caatinga Nordestina.

Segmentos

sequenciados

Amostra ID Material Região Hidrográfica

Bacia Hidrográfica Estado RC ATP8 ND5

L1 Tecido BCCN Jundiaí RN x x x PIUMML02 Muco BCCN Pium RN x x x PIUMML01 Muco BCCN Pium RN x x x PIUMFL13.2 Fezes BCCN Pium RN x x x PIUMFL13.1 Fezes BCCN Pium RN x x x PIUMFL1.1* Fezes BCCN Pium RN x x x PIUMFL22.1* Fezes BCCN Pium RN x x x PIUMFL7* Fezes BCCN Pium RN x x x CURIMATAUFL7 Fezes BCCN Curimatau RN x x CURIMATAUFL21 Fezes BCCN Curimatau RN x CAMARATUBAFL13 Fezes BCCN Camaratuba PB x x x CAMARATUBAFL2.1 Fezes BCCN Camaratuba PB x CAMARATUBAFL3 Fezes BCCN Camaratuba PB x x CAMARATUBATL1* Fezes BCCN Camaratuba PB x x CAMARATUBAFL16* Fezes BCCN Camaratuba PB x x CAMARATUBAFL5* Fezes BCCN Camaratuba PB x x MTRACFL5 Fezes BCCN Goiana PE x x x ATRACFL2 Muco BCCN Goiana PE x x x GOIANAFL4 Fezes BCCN Goiana PE x x GOIANAFL3* Fezes BCCN Goiana PE x GOIANAFL1* Fezes BCCN Goiana PE x x BUNAFL1 Fezes BCCN Una PE x x x BUNATL1* Fezes BCCN Una PE x L2 Tecido BCCN Coruripe AL x x x MCORFL1 Fezes BCCN Coruripe AL x x x MCORFL12* Fezes BCCN Coruripe AL x x ACORFL13 Fezes BCCN Coruripe AL x x x ACORFL7* Fezes BCCN Coruripe AL x x BCORPL6 Fezes BCCN Coruripe AL x x x BCORFL2 Fezes BCCN Coruripe AL x x BCORFL1* Fezes BCCN Coruripe AL x AURUÇUIFL6 Fezes Parnaíba Uruçuí-Preto PI x x x URUÇUIFL3 Fezes Parnaíba Uruçuí-Preto PI x x x URUÇUIPL2* Fezes Parnaíba Uruçuí-Preto PI x x x URUÇUIFL5* Fezes Parnaíba Uruçuí-Preto PI x x URUÇUIPL1* Fezes Parnaíba Uruçuí-Preto PI x x * Amostras que apresentam sequências iguais a de outras analisadas, sem evidência de representarem indivíduos distintos.

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Extração do DNA e análises moleculares

O DNA fecal foi extraído usando o QIAamp DNA Stool Mini Kit® (Qiagen) de acordo

com as instruções do fabricante, com uma pequena modificação no tempo final de eluição de 1

para 20 min a temperatura ambiente (Trinca et al., 2013). A extração de DNA das duas

amostras de tecido, obtidas de animais encontrados mortos durante o trabalho de campo, foi

realizada através do QIAamp DNA Mini Kit® (Qiagen) de acordo com as instruções do

fabricante. Para evitar contaminação, todo o procedimento foi realizado em um laboratório

separado, dedicado exclusivamente à manipulação de amostras com baixa qualidade de DNA

(pele, pelos, fezes), em capela com luz ultravioleta e utilizando ponteiras com barreiras. Cada

lote de extração de DNA incluiu um controle negativo (apenas os reagentes) para monitorar

possíveis eventos de contaminação.

A fim de comparar as estimativas de diversidade genética da Lontra longicaudis obtidas

neste estudo com aquelas reportadas por Trinca et al. (2012) em estudo mais amplo sobre a

filogeografia da espécie, o mesmo conjunto de marcadores moleculares do DNA mitocondrial

foi selecionado, o qual inclui: 1) a porção 5’ da região controle (RC) (Tchaicka et al., 2007); 2)

um segmento incluindo o gene ATP8 e parte do gene ATP6 (Trigo et al., 2008); e 3) um

segmento do gene ND5 (Trigo et al., 2008).

Uma vez que o DNA recuperado a partir de amostras fecais tende a estar degradado,

tornando difícil a amplificação e sequenciamento de fragmentos longos, em alguns casos foram

utilizados os primers internos desenvolvidos para a RC (Trinca et al. 2007). Estes primers

subdividem o segmento-alvo em três fragmentos menores que se sobrepõem parcialmente,

aumentando o sucesso de amplificação e o rendimento do sequenciamento.

Todos os segmentos foram amplificados por PCR (Reação em Cadeia da Polimerase),

em reações de 20 μl contendo: 2 μl de DNA, Tampão de PCR 1x (Invitrogen), 2.0 – 2.5 mM

MgCl2, 200 μM dNTPs, 0.2 μM de cada primer, Triton 4%, e 0.5 unidades de Taq DNA

Polimerase Platinum (Invitrogen). As condições de PCR foram as mesmas para os três

segmentos: 94°C por 3 min, 5 ciclos (‘‘Touchdown’’) de 94°C por 45 s, 55–51°C por 45 s (-

1°C por ciclo), e 72°C por 1.5 min, os quais foram seguidos por 40 ciclos de 94°C por 45 s,

50°C por 45 s, 72°C por 1.5 min, e extensão final de 72°C por 30 min. Os produtos de PCR

foram visualizados em gel de agarose 1% com GelRed 10x (Biothium) e purificados usando-se

as enzimas Exonuclease I e FastAP. Os produtos purificados foram sequenciados em

sequenciador automático e as sequências resultantes serão depositadas no GenBank.

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Análises das sequências

As sequências foram visualizadas e corrigidas manualmente usando o programa

FinchTV 1.4 (www.geospiza.com/Products/finchtv.shtml), e alinhadas com o algoritmo

CLUSTALW implementado no programa MEGA6 (Tamura et al., 2013).

Uma vez que amostras de fezes coletadas podiam ser representantes do mesmo

indivíduo, estas só foram definidas como pertencendo a indivíduos distintos quando as

sequências de DNA apresentaram polimorfismo. Esta avaliação foi realizada com base no

alinhamento das sequências obtidas para os três segmentos analisados. Considerando que

indivíduos de Lontra longicaudis podem se locomover por mais de 18 km ao longo do rio,

(Trinca et al., 2013), exceções foram feitas e sequências de DNA idênticas foram consideradas

como indivíduos distintos apenas quando a distância entre as amostras foi maior que 30 km, ou

quando duas amostras de composição distinta e com o mesmo tempo de deposição foram

encontradas juntas na mesma latrina, como um indicativo de animais andando juntos. Isto

resultou em um total de 21 amostras pertencentes a indivíduos distintos, dentre estes 15 com os

três segmentos de DNA mitocondrial amplificados (Tabela 1).

Adicionalmente ao conjunto de dados gerado a partir das amostras coletadas neste

estudo, as sequências de duas amostras de lontras da região metropolitana de Recife

(Pernambuco), geradas no estudo de Trinca et al. (2012) e depositadas no GenBank, foram

incluídas nas análises de diversidade genética. Estimativas de diversidade nucleotídica (S) e

haplotípica (h) foram obtidas usando os programas MEGA6, DnaSP v.5 (Librado & Rozas,

2009) e ARLEQUIN v.3.5 (Excoffier et al., 2010), para cada um dos segmentos de DNA

analisados, assim como para o conjunto concatenado dos segmentos ATP8+ND5, e o conjunto

concatenado de todos os segmentos (RC+ATP8+ND5). As diversidades genéticas obtidas para

estes dois conjuntos de segmentos concatenados foram comparadas com as diversidades

obtidas por Trinca et al. (2012) nas regiões Amazônica (AMZ) e Leste da América do Sul

(ESA). Para isto a região nordeste foi desconsiderada do grupo ESA, de forma que as

diversidades obtidas por Trinca et al. (2012) para este grupo foram recalculadas, excluindo-se

as duas amostras da região nordeste que já estão sendo consideradas neste estudo.

Com o objetivo de analisar relações filogenéticas e geográficas entre as amostras

obtidas na região nordeste, foi gerada uma rede de haplótipos no programa NETWORK v.5.0

(http://www.fluxus-engineering.com) através do método de median-joining (Bandelt et al.,

1999). Para esta análise foram considerados os haplótipos resultantes do conjunto concatenado

de todos os segmentos (RC+ ATP8+ND5). Testes específicos de estruturação populacional

dentro da região nordeste não foram possíveis devido a limitações de tamanho amostral para

algumas regiões. Como uma análise preliminar, a estrutura populacional foi analisada

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assumindo-se três grandes unidades geográficas (Amazônia, Nordeste e grupo ESA). Como

medidas de diferenciação entre as populações, foi estimado o índice de fixação Fst (Wright,

1965) através da Análise de Variância Molecular (AMOVA) (Excoffier et al., 1992)

implementada no programa ARLEQUIN.

A divergência genética entre as sequencias de DNA mitocondrial das amostras

coletadas no nordeste brasileiro foi calculada pelo método Tamura Nei, no programa

ARLEQUIN v.3.5. Foi gerada uma matriz de distância genética entre todos os pares de

amostras nas quais os três segmentos do DNA foram amplificados. (N= 19; Tabela 1).

Cenários de dispersão

Para analisar a influência de características da paisagem no fluxo gênico e diversidade

genética encontrada na região, a distância genética entre cada par de amostra foi correlacionada

com os custos de dispersão derivados de cinco cenários, sendo dois cenários de distâncias

geográficas: Distância euclidiana e Custo de deslocamento entre bacias hidrográficas; e três de

resistência da paisagem: Alto custo de dispersão por terra, Custo de dispersão por terra relativo

à distância ao rio e Custo de dispersão por terra relativo à declividade (Tabela 2).

Os custos de dispersão são estimados com base na distância geográfica e em mapas de

superfícies de resistência, nos quais o valor atribuído a cada pixel corresponde à dificuldade ao

movimento (Adriaensen et al., 2003). As superfícies de resistência de três desses cenários

(água, dist_rio e decliv.) foram construídas a partir de uma imagem SRTM (Shuttle Radar

Topographic Mission), com resolução aproximada de 90 m, de todas as bacias que drenam para

o nordeste, considerando toda a área das bacias, desde suas nascentes até a foz. A partir desta

imagem a drenagem foi derivada com um limiar de 1000 células upstream, o que significa que

a drenagem só começava a ser gerada após uma área de acúmulo de fluxo de 1000 células a

montante. Após a derivação da drenagem foi realizada uma reamostragem para a resolução de

300 m cada pixel. Para garantir a conectividade ao longo de toda a drenagem, foi aplicada a

ferramenta EXPAND do ArcGis 10.1, com a expansão de uma célula sobre os cursos d'água.

O cenário "Água" representa uma situação de alta dependência ao ambiente aquático, que

considera possível a dispersão por terra, mas a um alto custo (10000), e a dispersão pelo mar a

um custo moderado (10), em relação ao baixo custo de dispersão ao longo do rio (1) (Tabela 2;

Figura 2a). O cenário "Dist_Rio" considera uma dispersão preferencial pelo rio, estando o custo

de se deslocar por terra associado à distância aos corpos d'água. Esse cenário foi gerado a partir

de uma superfície de distância euclidiana da drenagem que foi reclassificada para valores

inteiros, sendo que cada classe de distância ficou com 900 metros. À primeira classe, que

envolve o rio e seus primeiros 900 metros adjacentes, foi atribuído o valor 1, e a cada classe de

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distância subsequente os valores até 9, acima de 9 todas as distância foram classificadas como

10 (Tabela 2; Figura 2b). O cenário "Decliv." representa uma situação em que a dispersão por

áreas planas é mais fácil que por áreas íngremes. Para isto foram criadas 48 classes de

declividade. O único procedimento para criação das classes foi o truncamento dos valores

decimais para números inteiros. A superfície de declividade foi gerada no ArcGis 10.1 com a

ferramenta SLOPE (Tabela 2; Figura 2c). No cenário "Dist_Bacias" o valor de resistência foi

equivalente ao número de microbacias entre cada par de amostra, como uma medida de

distância geográfica representando um custo constate de transposição de bacias para a espécie.

Para isto as microbacias foram definidas com um limiar de 10000 células a montante

(upstream). Finalmente, a distância geográfica euclidiana foi calculada pela menor distância em

linha reta entre cada par de amostra, considerando as coordenadas geográficas de cada uma.

Tabela 2: Descrição das superfícies de resistência geradas para os cinco cenários de dispersão analisados para a Lontra longicaudis no nordeste brasileiro.

Cenários de Dispersão Abreviação Valores de Resistência Descrição

Distância euclidiana Dist_Euclid Todos os pixel = 1 Dispersão independente das características da paisagem

Custo de deslocamento entre bacias hidrográficas Dist_Bacias Cada bacia= 1

Custo relacionado à transposição entre bacias hidrográficas

Alto custo de dispersão por terra Água Rio= 1; Mar= 10; Terra= 10000

Alto custo de dispersão por terra

Custo de dispersão por terra relativo à distância ao rio Dist_Rio

Rio e 900 m adjacentes= 1; a cada classe subsequente de 900 m mais 1 até 9; acima de 8.1 km= 10

Custo de dispersão por terra relacionado à distância ao rio

Custo de dispersão por terra relativo à declividade Decliv. 1 a 48 de acordo com a

declividade

Custo de dispersão por terra relacionado à declividade

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Figura 2: Superfícies de resistência geradas para três cenários de dispersão da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro que consideram características da paisagem. A) Cenário Água; B) Cenário Declividade; C) Cenário Distância do Rio.

B

C

A

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Para cada cenário de dispersão foi gerada uma matriz de distância ponderada por

valores de resistência para cada par de amostra. A resistência efetiva entre estas amostras foi

calculada pelo programa CircuitScape v. 4.0 (McRae, Shah & Mohapatra, 2014) em sua

interface no programa ArcGis 10.1. A metodologia do CircuitScape é baseada na teoria do

circuito elétrico, e considera os valores de resistência atribuídos aos elementos da paisagem

para calcular mapas de fluxo de corrente e voltagens ao longo de toda área amostrada (McRae,

2006). Dessa forma é possível calcular a resistência cumulativa da paisagem entre duas

amostras, considerando todos os caminhos possíveis entres estas duas localidades, e não apenas

o caminho de menor custo (LCP - Least Cost Path), o que confere uma melhor performance

desta metodologia em relação a metodologias padrão que analisam a influência da paisagem na

diversidade e estrutura genética das populações (McRae, 2006; McRae & Beier, 2007).

A correlação das distâncias genéticas entre amostras e os correspondentes custos de

dispersão dos cinco cenários, tanto de distância geográfica quanto de resistência da paisagem,

foi analisada por modelos de regressão múltipla em matrizes de distância (MRM) (Manly,1986;

Lichstein, 2007). Os MRMs representam uma extensão do teste de Mantel parcial

(frequentemente utilizado para analisar a correlação entre distâncias ambientais/geográficas e

genéticas), pois permitem a análise das relações entre mais de duas matrizes de distância,

permitindo uma melhor compreensão da importância relativa de cada cenário ou variável

ambiental analisada (Manly,1986; Lichstein, 2007). A diversidade genética de uma região pode

variar em resposta a vários fatores, de forma que é importante compreender, além do quanto a

distância genética está correlacionada com variáveis ambientais, como a distância genética

responde a essas múltiplas variáveis (Wang, 2013). MRMs têm mostrado um bom desempenho,

tanto com dados empíricos quanto simulados (Wang, 2013).

Foram construídos 16 modelos de regressão múltipla em matrizes, sendo um modelo para

cada um dos cincos cenários de dispersão de forma isolada, modelos formados por todas as

combinações possíveis de dois cenários e um modelo global contendo todos os cenários. Estes

modelos foram analisados com dois conjuntos de dados, sendo um o conjunto de toda as

amostras nos quais os três segmentos de DNA foram amplificados (N= 19), e outro o conjunto

apenas das amostras coletadas na região hidrográfica das Bacias costeiras e da Caatinga

nordestina (N= 16).

A seleção dos modelos candidatos foi feito através do Critério de Informação de Akaike

corrigido para pequenas amostras (AICc) (Burnham & Anderson, 2002). Os modelos que

apresentaram valores de ΔAICc ≤ 2 foram considerados bem ajustados aos dados. A

importância relativa de cada modelo, assim como de suas covariáveis, foi analisada pelo peso

de Akaike (wAICc). Apesar da seleção de modelos em MRMs ser criticada por Franckowiak et

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al. (2017), as falhas no ranqueamento dos modelos com base no AICc observadas por estes

autores foram causadas provavelmente por grandes amostragens, e levaram à seleção

tendenciosa de modelos muito complexos (Franckowiak et al., 2017). Este não foi o caso deste

estudo, que obteve uma amostragem pequena (N=19) e onde os modelos mais complexos não

foram os melhor ranqueados. Todas as análises dos MRMs foram realizadas no programa R (R

Development Core Team, 2013).

Com o objetivo de identificar rotas menos custosas e inferir sobre as potenciais vias de

dispersão conectando bacias e regiões hidrográficas, para cada cenário de dispersão que

considerou a influência de elementos da paisagem foram calculados caminhos de menor custo

(LCPs) entre todos os pares de amostra, utilizando o programa Linkage Mapper v. 1.1.

3. RESULTADOS

Diversidade genética

Um total de 22 indivíduos de Lontra longicaudis, representativos de 7 haplótipos, foram

identificados de acordo com o segmento de 510 pb sequenciado da região controladora do

DNA (RC). O segmento ATP8 (329 pb), no entanto, foi obtido para 21 indivíduos,

representativos de apenas 2 haplótipos, apresentando a menor variabilidade haplotípica e

nucleotídica dentre todos os segmentos e conjuntos concatenados de segmentos analisados para

a região. A exceção do ATP8, todos os segmentos (isolados e concatenados) apresentaram

diversidade haplotípica de moderada a alta, e nucleotídica baixa (Tabela 3). O conjunto

concatenado dos três segmentos (CR+ATP8+ND5), utilizado para as análises filogeográficas

subsequentes, foi o que apresentou maior diversidade haplotípica, com 17 indivíduos,

representativos de 7 haplótipos (Tabela 3 e 4; Figura 1), dos quais 4 foram identificados pela

primeira vez neste estudo, sendo até o momento considerados haplótipos únicos da região

nordeste ao norte do rio São Francisco (Tabela 4).

Tabela 3: Diversidade estimada do DNA mitocondrial da Lontra longicaudis de acordo com os segmentos e conjunto de segmentos analisados. N: número de indivíduos; S: sítios polimórficos; PI: sítios informativos de parcimônia; π: diversidade nucleotídica; h: diversidade haplotípica.

Segmentos N N° de haplótipos

Tamanho (pares de

base) S PI π h

RC 22 7 510 18 8 0.008174 ± 0.004713 0.6970 ± 0.0825 ATP8 21 2 329 1 0 0.000289 ± 0.000586 0.0952 ± 0.0843 ND5 18 6 651 15 3 0.004036 ± 0.002528 0.7974 ± 0.0556 ATP8+ND5 18 6 980 16 3 0.002794 ± 0.001737 0.7974 ± 0.0556 CR+ATP8+ND5 17 7 1490 33 11 0.004984 ± 0.002743 0.8382 ± 0.0542

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Tabela 4: Indivíduos e haplótipos identificados de acordo com o conjunto concatenado dos três segmentos sequenciados (RC+ATP8+ND5), com indicação das bacias hidrográficas de ocorrência de cada haplótipo na região nordeste, e das regiões geográficas onde já foram identificados. NE: Nordeste; ESA: Leste da América do Sul.

Haplótipos Indivíduos Bacias Hidrográficas Região Geográfica**

Hap-01* PIUMML02, MTRACFL5, BUNAFL1, BLlo60a

Pium, Goiana, Una e Região metropolitana de Recife

NE

Hap-02 BLlo61a Região metropolitana de Recife NE

Hap-03* L1, ATRACFL2, PIUMFL13.1, PIUMFL13.2

Jundiaí, Goiana e Pium NE/ESA

Hap-04 L2, PIUMML01, ACORFL13, BCORPL6, CAMARATUBAFL13,

Coruripe, Pium, Camaratuba NE/ESA

Hap-05* MCORFL1 Coruripe NE

Hap-06 URUÇUIFL3 Uruçuí-preto NE Hap-07* AURUÇUIFL6 Uruçuí-preto NE

* Haplótipos identificados pela primeira vez neste estudo; ** Dados de outras regiões retirados de Trinca et al., 2012. a Amostras analisadas por Trinca et al., 2012.

Figura 3: Rede de haplótipos da Lontra longicaudis encontrados na região nordeste do Brasil com base no conjunto concatenado dos três segmentos de DNA mitocondrial analisados (RC+ATP8+ND5, 1490 pb). Cada haplótipo é representado por um círculo, cuja a área é proporcional a sua frequência.

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As pequenas barras que cortam os ramos indicam substituições nucleotídicas inferidas para cada linhagem. Hap-01, 03, 05 e 07 são haplótipos novos, registrados pela primeira vez neste estudo.

O haplótipo 4 foi o mais frequente na região, sendo encontrado tanto no limite norte

quanto no limite sul das bacias hidrográficas com amostras coletadas (Figuras 1 e 3), seguido

pelos haplótipos 1 e 3. Estes últimos, registrados pela primeira vez neste estudo, apresentam

pouca divergência em relação ao haplótipo 2 (Figura 3), encontrado em uma única amostrada

da região metropolitana de Recife (PE) analisada por Trinca et al. (2012), também restrito à

região nordeste ao norte do rio São Francisco. Os haplótipos 6 e 7, ambos encontrados em uma

bacia hidrográfica tributária do rio Parnaíba, no Piauí, foram os mais divergentes dentre os

haplótipos encontrados na região, principalmente o haplótipo 7, também registrado pela

primeira vez neste estudo. O haplótipo das bacias costeiras menos divergente em relação a este

foi o haplótipo 5, encontrado na bacia do rio Coruripe, próximo ao rio São Francisco, no limite

sul da área de estudo (Figura 3).

Em comparação com os dois grupos geográficos sugeridos por Trinca et al. (2012), a

região nordeste apresentou alta diversidade haplotípica, sendo esta mais baixa que a de região

Amazônica, mas muito similar a do grupo ESA (Tabela 5). O número de indivíduos amostrados

no grupo ESA, no entanto, foi quase o dobro do número de indivíduos do nordeste, o que indica

que uma maior amostragem na região poderia resultar em maior diversidade. Já a diversidade

nucleotídica da Lontra longicaudis foi no geral baixa, mas mais alta no nordeste do que no

grupo ESA (Tabela 5).

Tabela 5: Diversidade nucleotídica (π) e haplotípica (h) dos conjuntos concatenados de segmentos do DNA mitocondrial da Lontra longicaudis no Nordeste brasileiro (NE), em comparação com os dois grupos geográficos sugeridos por Trinca et al. (2012): Leste da América do Sul (ESA) e Amazônia.

Segmentos Grupo Geográfico

N° de indivíduos π h

ATP8/ND5 NE 18 0.002794 ± 0.001737 0.7974 ± 0.0556 ESA* 34 0.001481 ± 0.001026 0.7629 ± 0.0705 Amazonia** 15 0.00586 ± 0.00124 0.8791 ± 0.01093 Total 67 0.005667 ± 0.003056 0.9188 ± 0.0210

RC+ATP8+ND5 NE 17 0.004609 ± 0.002557 0.8088 ± 0.0547 ESA* 33 0.002719 ± 0.001551 0.9299 ± 0.0326 Amazonia** 15 0.00822 ± 0.00133 0.9890 ± 0.00439

Total 65 0.008217 ± 0.004171 0.9678 ± 0.0104 * Diversidades recalculadas a partir dos dados de Trinca et al. (2012), desconsiderando as duas amostras do NE, que neste estudo estão sendo analisadas no grupo da devida região. ** Diversidades calculadas por Trinca et al. (2012).

A análise preliminar de estrutura populacional entre estes três grupos geográficos (NE,

ESA e Amazônia) indicou uma pequena, mas significativa, diferença entre essas regiões. O

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grupo do NE apresentou maior diferença em relação aos grupos ESA (Fst= 0.1188; p= 0.000) e

da Amazônia (Fst = 0.1031; p= 0.000), do que os grupos ESA e da Amazônia entre si (Fst =

0.0422; p= 0.009).

Modelos de dispersão

Os dois modelos de dispersão que melhor se ajustaram às diferenciações genéticas

observadas entre as amostras analisadas na região nordeste incluíram o cenário Água

(coeficiente padronizado= 0.89840) e Declividade (coeficiente padronizado= -0.13989), e o

cenário Água (coeficiente padronizado= 0.90249) e Dist_Rio (coeficiente padronizado=

-0.14008) (Tabela 6; Figura 4). Os dois modelos selecionados (ΔAICc < 2) retiveram 85 % da

informação de todos modelos submetidos ao processo de seleção. O cenário Água esteve

presente entre todos os melhores modelos ranqueados.

Tabela 6: Ranqueamento dos 16 modelos construídos para analisar a diferenciação genética entre todas as amostras de Lontra longicaudis analisadas no nordeste Brasileiro, em relação a cinco cenários de dispersão. AICc: critério de informação de Akaike para amostras reduzidas; ΔAICc: diferença no AICc de um modelo e o melhor modelo ranqueado; wAIC: peso de Akaike; wAICcum: peso de Akaike cumulatvo.

Modelos R2 p AICc ΔAICc wAIC wAICcum Água+Decliv 0.67 0.0002 -1592.61 0.00 0.46 0.46 Água+Dist_Rio 0.67 0.0002 -1592.27 0.35 0.39 0.85 Água 0.66 0.0001 -1588.50 4.12 0.06 0.91 Água+Decliv+Dist_Rio+Dist_Bacias+Dist_Euclid 0.67 0.0003 -1587.46 5.15 0.04 0.94

Água+Dist_Bacias 0.66 0.0003 -1587.27 5.34 0.03 0.97 Água+Dist_Euclid 0.66 0.0002 -1586.91 5.71 0.03 1 Decliv+Dist_Euclid 0.48 0.0001 -1514.21 78.40 0.00* 1 Dist_Rio+Dist_Euclid 0.48 0.0001 -1513.06 79.56 0.00* 1 Decliv+Dist_Bacias 0.47 0.0001 -1510.05 82.57 0.00* 1 Dist_Rio+Dist_Bacias 0.46 0.0002 -1508.80 83.81 0.00* 1 Dist_Euclid 0.45 0.0001 -1507.87 84.75 0.00* 1 Dist_Bacias+Dist_Euclid 0.46 0.0003 -1507.07 85.54 0.00* 1 Dist_Bacias 0.44 0.0002 -1503.10 89.51 0.00* 1 Decliv+Dist_Rio 0.31 0.0185 -1465.76 126.85 0.00* 1 Dist_Rio 0.19 0.0002 -1441.26 151.35 0.00* 1 Decliv 0.17 0.0002 -1436.25 156.36 0.00* 1

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Figura 4: Resultados parciais dos dois melhores modelos ranqueados para explicar a diferenciação genética entre as amostras de Lontra longicaudis da região nordeste do Brasil. A) modelo Água + Declividade; B) modelo Água + Dist_Rio. Os pontos pretos indicam pares de amostras das duas regiões amostradas (bacias costeiras e Parnaíba), enquanto os brancos indicam pares de amostras de uma mesma região. Quando consideradas apenas as bacias costeiras, o modelo Água (coeficiente padronizado=

-0.38270) e Dist_Bacias (coeficiente padronizado= 0.52375) foi o mais importante (wAIC= 0.34),

seguido pelo modelo Água (coeficiente padronizado= -0.35426) e Dist_Euclid (coeficiente

padronizado= 0.48959), que reteve 18% da informação de todos modelos submetidos ao processo

de seleção (wAIC= 0.18), (Tabela 7; Figura 5).

Declividade (parcial)

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Tabela 7: Ranqueamento dos 16 modelos construídos para analisar a diferenciação genética entre as amostras de Lontra longicaudis das bacias costeiras do nordeste Brasileiro em relação a cinco cenários de dispersão. AICc: critério de informação de Akaike para amostras reduzidas; ΔAICc: diferença no AICc de um modelo e o melhor modelo ranqueado; wAIC: peso de Akaike; wAICcum: peso de Akaike cumulatvo.

Modelos R2 p AICc ΔAICc wAIC wAICcum Água+Dist_Bacias 0.08 0.0249 -1095.17 0.00 0.34 0.34 Água+Dist_Euclid 0.07 0.0380 -1093.87 1.30 0.18 0.52 Dist_Bacias 0.04 0.0341 -1092.22 2.95 0.08 0.60 Dist_Rio+Dist_Bacias 0.05 0.0537 -1091.77 3.40 0.06 0.67 Dist_Euclid 0.04 0.0434 -1091.72 3.45 0.06 0.73 Decliv+Dist_Bacias 0.05 0.0620 -1091.54 3.63 0.06 0.78 Dist_Rio+Dist_Euclid 0.05 0.0654 -1090.94 4.23 0.04 0.82 Decliv+Dist_Euclid 0.05 0.0722 -1090.80 4.37 0.04 0.86 Dist_Bacias+Dist_Euclid 0.05 0.0658 -1090.56 4.61 0.03 0.90 Água+Decliv+Dist_Rio+Dist_Bacias+Dist_Euclid 0.09 0.1000 -1089.64 5.53 0.02 0.92

Dist_Rio 0.02 0.0942 -1089.05 6.12 0.02 0.94 Decliv 0.02 0.0966 -1089.02 6.15 0.02 0.95 Água 0.01 0.3100 -1087.94 7.23 0.01 0.96 Água+Dist_Rio 0.02 0.2188 -1087.26 7.91 0.01 0.97 Água+Decliv 0.02 0.2401 -1087.19 7.98 0.01 0.97 Decliv+Dist_Rio 0.02 0.2654 -1086.92 8.25 0.01 0.98

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Figura 5: Resultados parciais dos dois melhores modelos ranqueados para explicar a diferenciação genética entre as amostras de Lontra longicaudis das bacias costeiras do nordeste brasileiro. A) modelo Água + Dist_Bacias; B) modelo Água + Dist_Euclid.

As superfícies de resistência efetiva geradas indicam alta condutância entres as bacias

hidrográficas costeiras, com um aumento da resistência em direção ao norte, e à divisão entre

as duas regiões hidrográficas amostradas (Bacias costeiras e Parnaíba) (Figura 6). O rio São

Francisco apresenta uma resistência à dispersão de baixa a moderada de acordo com os três

cenários gerados. Esta bacia hidrográfica se destaca como uma das principais vias estimadas de

conexão entre as duas regiões hidrográficas estudadas (Figura 7), sendo possível identificar a

via menos custosa de transposição entre essas regiões (Figura 7A).

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A B

C

Figura 6: Superfícies estimadas de resistência efetiva da paisagem à dispersão da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro de acordo com os cenários Água (A); Declividade (B); Distância ao rio (C).

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A

Figura 7: Caminhos de menor custo (LCPs) entre as amostras de Lontra logicaudis no nordeste brasileiro de acordo com os cenários: Água (A); Declividade (B) e Distância ao Rio (C)

B

C

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4. DISCUSSÃO

Diversidade genética

Este foi o primeiro estudo a analisar a diversidade genética da Lontra longicaudis no

nordeste brasileiro. O registro de quatro haplótipos novos, nunca anteriormente descritos,

ressalta a amostragem insuficiente dessa região em estudos prévios.

As amostras analisadas no nordeste do Brasil apresentaram diversidade genética mais

baixa na região controladora (RC) do DNA mitocondrial (h= 0.697) em relação à observada

no sul e sudeste do Brasil (h= 0.8188; Trinca et al., 2007; Trinca et al., 2012), e na Amazônia

(h= 0.9487; Trinca et al., 2012), sendo mais similar à diversidade encontrada para a espécie

no México (h= 0.7620; Guerrero et al., 2015). O México, assim como o nordeste brasileiro,

abrange regiões mais secas da área de distribuição da Lontra longicaudis, o que pode refletir

em um menor tamanho populacional ou maior isolamento de suas populações, gerando menor

diversidade. O segmento ATP8 também apresentou variabilidade mais baixa na região

estudada, com apenas 2 sequencias polimórficas em 21 indivíduos, enquanto Trinca et al.

(2012) registraram 15 sequencias polimórficas deste segmento em 52 indivíduos das regiões

Sul, Sudeste e Amazônia. Este segmento, no entanto, foi considerado o menos variável para

as regiões estudadas por Trinca et al (2012), padrão também observado em outros carnívoros

(Trigo et al., 2008; Trinca et al., 2012). Quando comparado o conjunto concatenado dos três

segmentos analisados, a diversidade haplotípica do nordeste se apresenta mais alta,

semelhante a observada nos grupos ESA e Amazônia (Tabela 5), o que indica um alto poder

informativo do segmento ND5, também observado por Trinca et al. (2012).

Apesar da alta variabilidade haplotípica apresentada pela Lontra longicaudis em várias

regiões, a espécie apresenta baixa variabilidade nucleotídica (Trinca et al., 2007; Trinca et al.,

2012; Guerrero et al., 2015). Este padrão, também observado para outras espécies do gênero,

como a Lontra provocax (Centrón et al., 2008) e Lontra felina (Viana et al., 2010), foi

observado para todos os segmentos e conjuntos concatenados de segmentos analisados neste

estudo. Apesar de baixa, a variabilidade nucleotídica observada no nordeste brasileiro foi

maior que a observada para o gruo ESA, o que pode indicar uma população mais antiga de

Lontra longicaudis na região nordeste. Isto suporta a hipótese de uma colonização recente da

espécie a partir do norte da América do Sul, em direção ao sul (Trinca et al., 2012). Não

existem evidências, no entanto, da conexão atual dessas populações pelo região nordeste,

cujas amostras analisadas apresentam diferenças genéticas significativas em relação aos

grupos ESA e Amazônia. De acordo com a análise de estruturação populacional entre os três

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grandes grupos geográficos (NE, ESA e Amazônia), as populações de lontra do grupo ESA e

Amazônia apresentam menos divergência genética entre si do que entre as amostras do

Nordeste brasileiro, o que indica um menor fluxo gênico para esta região.

A distribuição geográfica da Lontra longicaudis no nordeste brasileiro apresenta-se

interrompida na porção norte desta região, onde estão localizadas as bacias hidrográficas

totalmente inseridas no bioma Caatinga (Rosas-Ribeiro et al., 2017). Estas bacias sofrem

maior influência do clima semiárido, estando sujeitas a maior sazonalidade na disponibilidade

de água, o que influência negativamente a ocorrência da espécie (Capítulo II) e pode

representar uma barreira climática por onde o fluxo gênico está interrompido há mais tempo.

A maior diferenciação genética entre as amostras do nordeste do Brasil foi observada nas

amostras coletadas na região hidrográfica do Parnaíba, no sul do estado do Piauí,

geograficamente acima da lacuna na distribuição da espécie reportada por Rosas-Ribeiro et al.

(2017). A existência de redes de drenagem permanentes e bem conectadas tem sido

considerada como um fator importante para a manutenção do fluxo gênico entre populações

de várias espécies da família Lutrina (Janssens et al., 2008; Guerrero et al., 2015, Lehoczky et

al., 2015).

Modelos de dispersão

O cenário Água, que atribui um custo muito elevado para a dispersão por terra, foi o

que apresentou relação mais forte com a divergência genética observada entre as amostras da

região nordeste, associado aos cenários Declividade e Distância do Rio. Estes dois últimos,

embora apareçam nos melhores modelos ranqueados, contribuem muito pouco para explicar a

variação nos dados e apresentam parciais não significativos. Isto indica que as lontras do

nordeste brasileiro apresentam grande dependência aos cursos d'água, sendo capazes de se

locomover por terra, mas em situações extremas. O custo de dispersão relacionado à distância

ao rio foi o cenário mais correlacionado com a divergência genética entre indivíduos de Lutra

lutra na Polônia e Eslováquia, onde a espécie apresentou grande capacidade de locomoção

por terra, inclusive entre bacias hidrográficas separadas por grandes elevações (Pagacz, 2016).

Pouco se conhece, no entanto, sobre a frequência desse tipo de dispersão, que pode variar de

acordo com características ambientais e abundância populacional da espécie (Kruuk, 2006). A

área estudada por Pagacz (2016) possui baixa densidade populacional humana e uma densa

rede de drenagem permanente, enquanto que a maior parte do nordeste brasileiro está inserida

na Caatinga, uma das regiões semiáridas mais populosas do mundo, que abriga uma extensa

rede de rios intermitente. No sul da França a declividade das montanhas divisoras de bacias

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hidrográficas apresentou correlação positiva com a divergência genética entre os indivíduos

de Lutra lutra, indicando que áreas mais elevadas e com escassez de água podem funcionar

como barreiras à dispersão (Janssens, 2008), o que também foi observado para a Lontra

longicaudis no México (Guerrero et al., 2015).

Quando consideramos apenas as bacias costeiras da região nordeste, a divergência

genética entre as amostras de Lontra longicaudis se torna mais correlacionada às distâncias

geográficas (euclidiana e número de bacias por trecho) do que aos elementos da paisagem.

Isto pode ser resultado de uma paisagem mais homogênea, associada ao fato de que nas

regiões costeiras os cursos baixos das bacias hidrográficas são áreas com presença de

estuários, lagos e lagunas, mais suscetíveis a se tornarem alagadas, favorecendo o fluxo

gênico contínuo entre bacias. As amostras dessa região são menos divergentes entre si,

principalmente os haplótipos restritos ao nordeste, que foram encontrados em bacias entre os

estados de Pernambuco e Rio Grande do Norte, onde existem vários grupos de pequenas

drenagens de escoamento difuso entre as desembocaduras dos rios maiores (SEMARH-RN,

2017; SRHE-PE, 2017). Dessa forma, a paisagem impõe menos resistência à dispersão por

animais semiaquáticos, e observa-se uma maior correlação entre a divergência genética e

distâncias geográficas.

A maior homogeneidade da paisagem nas bacias costeiras também fica evidente pela

maior opção de caminhos de menor custo entre as amostras desta região, em relação às poucas

vias de menor custo de dispersão que conectam as bacias costeira com as amostras do rio

Parnaíba. Dentre estas poucas opções, o rio São Francisco aparece em todos os cenários,

fazendo parte da única rota apresentada no cenário Água, que, como o mais correlacionado

com a distância genética, indica o caminho menos custoso de transposição entre as duas

regiões hidrográficas. O haplótipo das bacias costeiras menos divergente em relação aos

haplótipos da região do Parnaíba é o Hap-05 encontrado na bacia hidrográfica do rio

Coruripe, adjacente à bacia do rio São Francisco, o que destaca esta bacia como a principal

via de fluxo gênico entre as bacias costeiras do nordeste e as demais regiões geográficas,

ressaltando a importância da sua conservação, para a manutenção da diversidade genética da

Lontra longicaudis no nordeste brasileiro.

Este estudo preencheu uma lacuna importante sobre o conhecimento genético da

Lontra longicaudis no nordeste brasileiro, fornecendo subsídios para análises filogeográficas

mais amplas e para a conservação da espécie na região. Estudos futuros que englobem a

região do nordeste ao sul do rio São Francisco são recomendados para uma melhor

compreensão da estruturação populacional e história demográfica desta espécie.

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CONCLUSÃO GERAL

Este foi o primeiro estudo com enfoque para a Lontra longicaudis no nordeste

brasileiro e preenche uma importante lacuna de informação em relação à espécie em uma

das regiões mais secas da sua área de distribuição.

A amostragem padronizada e sistemática na região ao norte do Rio São Francisco

revelou uma lacuna real na ocorrência da Lontra longicaudis, abrangendo as bacias

hidrográficas totalmente inseridas no bioma Caatinga e onde a Caatinga faz limite com o

Cerrado. Esta área, que corresponde ao noroeste do estado do Rio grande do Norte, oeste da

Paraíba, todo o estado do Ceará e à Caatinga do norte do Piauí, onde nenhuma evidência de

ocorrência da espécie existe na literatura ou foi registrada nas amostragens, deve ser

removida dos atuais mapas de distribuição da espécie, recomendação proposta para a IUCN-

União Internacional para a Conservação da Natureza. Apesar da ausência nesta área, a

ocorrência atual da espécie foi confirmada na Caatinga, em rios intermitentes de 10 bacias

hidrográficas onde a Caatinga faz limite com a Floresta Atlântica, comprovando que a

espécie é capaz de ocorrer em regiões semiáridas e que estas devem ser consideradas em

planejamentos e estratégias de conservação da espécie.

O principal fator determinante da ocupação e uso do habitat pela Lontra longicaudis

na região é a sazonalidade da precipitação. A ocorrência das lontras no nordeste está

concentrada nas bacias hidrográficas que drenam para o leste e com maior intensidade de

uso do habitat onde a sazonalidade da precipitação é menor. Esta região corresponde à

Floresta Atlântica nordestina, porção menos conservada deste bioma, com alta densidade

populacional humana, o que coloca a espécie em uma situação de risco.

Este foi o primeiro estudo a analisar a diversidade genética da Lontra longicaudis no

nordeste brasileiro. A alta diversidade haplotípica e o registro de quatro haplótipos novos,

nunca anteriormente descritos, ressalta a amostragem insuficiente dessa região em estudos

prévios e a necessidade de estudos futuros. A população de lontras do NE é geneticamente

diversa e difere dos grupos filogeográficos da Amazônia e Leste da América do Sul, sendo a

diversidade nucleotídica no NE maior que a do grupo Leste da América do Sul, o que sugere

uma expansão populacional no sentido norte-sul. A maior diferenciação genética encontrada

nas amostras do Piauí, acima da área de Caatinga onde não há registros atuais de presença

da espécie, corrobora a existência de uma lacuna por onde o fluxo gênico pode estar

interrompido há mais tempo.

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O cenário no qual a dispersão ocorre quase que exclusivamente pelos rios, com alto

custo de locomoção pela terra, é o que melhor explica a diversidade genética da espécie na

região, indicando que a espécie é capaz de se dispersar por terra, mas em situações extremas.

As bacias costeiras da região nordeste são geneticamente mais homogêneas e mais

conectadas, com a dispersão provavelmente facilitada pelo fato de estarem localizadas em

uma região sujeita a alagamentos, com várias bacias de escoamento difuso.

As análises de rotas de menor custo indicam o Rio São Francisco como uma

importante via de conexão entre as bacias costeiras e a bacia do Rio Parnaíba, o que ressalta

a importância da sua preservação para a manutenção da diversidade genética na região.

Estas informações atendem a ações consideradas prioritárias para a conservação da

Lontra longicaudis de acordo com a IUCN - União Internacional para a Conservação da

Natureza e com as agências nacionais de conservação da biodiversidade, aumentando o

conhecimento em relação a espécie em uma área limite da sua distribuição, e fornecendo

subsídios para futuros estudos e planejamentos de conservação.