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A NOÇÃO DE PAISAGEM E DE CULTURA: um ensaio de leitura da paisagem cultural urbana através das quatros escalas urbanas do Plano Piloto de Brasília. OLIVEIRA, YARA REGINA 1. UNIVERSIDADE CATOLICA DE BRASILIA. CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO Endereço: Campus I Sala 209 Bloco M, QS 07 Lote 01 EPCT, Águas Claras - CEP: 71966-700 - Taguatinga/DF. E-mail: [email protected] RESUMO Este artigo tem por objetivo refletir sobre a paisagem cultural urbana atual da cidade do Plano Piloto, sob a ótica das quatros escalas urbanas que as fundamentaram segundo o projeto de Lucio Costa. Primeiramente adota-se premissas teóricas contemporâneas sobre paisagem cultural, cujo conceito parece oferecer uma rica perspectiva, permitindo leituras que compreendem justamente as interações entre os aspectos natural e cultural, material e imaterial de conjuntos urbanos, muitas vezes tratadas separadamente. (Castriota, 2013). Como segunda premissa temos o conceito de identidade reposicionado no contexto de patrimônio moderno, onde, (Saboia, 2011) argumenta-se que a identidade é uma ação narrativa onde manifestam contradições e significados que edificam e re edificam a arquitetura por via de consequências a paisagem cultural urbana de Brasília. Nos permitimos assim realizar uma leitura critica relevando pontos que hora causam tensões, hora se harmonizam, na apropriação pelos diversos protagonistas politico, sociais e econômicos dos espaços abertos públicos. Palavras-chave: paisagem cultural, urbanismo moderno, identidade cultural.

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A NOÇÃO DE PAISAGEM E DE CULTURA: um ensaio de leitura da paisagem cultural urbana através das quatros escalas urbanas do

Plano Piloto de Brasília.

OLIVEIRA, YARA REGINA

1. UNIVERSIDADE CATOLICA DE BRASILIA. CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

Endereço: Campus I – Sala 209 Bloco M, QS 07 Lote 01 EPCT, Águas Claras - CEP: 71966-700 - Taguatinga/DF.

E-mail: [email protected]

RESUMO Este artigo tem por objetivo refletir sobre a paisagem cultural urbana atual da cidade do Plano Piloto, sob a ótica das quatros escalas urbanas que as fundamentaram segundo o projeto de Lucio Costa. Primeiramente adota-se premissas teóricas contemporâneas sobre paisagem cultural, cujo conceito parece oferecer uma rica perspectiva, permitindo leituras que compreendem justamente as interações entre os aspectos natural e cultural, material e imaterial de conjuntos urbanos, muitas vezes tratadas separadamente. (Castriota, 2013). Como segunda premissa temos o conceito de identidade reposicionado no contexto de patrimônio moderno, onde, (Saboia, 2011) argumenta-se que a identidade é uma ação narrativa onde manifestam contradições e significados que edificam e re edificam a arquitetura por via de consequências a paisagem cultural urbana de Brasília. Nos permitimos assim realizar uma leitura critica relevando pontos que hora causam tensões, hora se harmonizam, na apropriação pelos diversos protagonistas politico, sociais e econômicos dos espaços abertos públicos. Palavras-chave: paisagem cultural, urbanismo moderno, identidade cultural.

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INTRODUÇÃO

Premissas teórica

Este projeto de artigo tem o proposito de desenvolver uma leitura da capital brasileira

planejada sob os princípios do urbanismo moderno, principio estes que justificaram o seu

reconhecimento de patrimônio histórico cultural da humanidade pela Unesco. Para Yazigi

(2003) o patrimônio ambiental urbano é entendido como a associação de conjuntos

arquitetônicos com espaços e equipamentos públicos, além da associação com os elementos

naturais como a vegetação, rios, topografia. Atualmente contamos com uma ampla base

teórica formuladas, por Romero, Macedo, Tardin, Barcellos, Holanda entre outros, e por meio

de exemplos e considerações analíticas sobre o espaço que abriga Brasília, estes estudos

servem como base para a formulação do ensaio.

O homem é o resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é um herdeiro de um longo

processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquiridas pelas

numerosas gerações que o antecederam. A manipulação adequada e criativa desse

patrimônio cultural permite as inovações e as invenções. Estas não são, pois, o produto da

ação isolada de um gênio, mas o resultado do esforço de toda uma comunidade (LARAIA,

2001, 24). Numa visão sistêmica o contato de grupos diferentes proporcionam uma nova

realidade cujo equilíbrio e instável, Edgar Morin, em seu trabalho sobre o caos e a

complexidade apresenta a tese de que dentro de um caos surgem as respostas pertinentes

para a solução do problema, resultando em um equilíbrio cuja duração é instável. Pois as

respostas a uma problemática não são eternas e podem inclusive, em seguida, evoluírem de

maneira a obter soluções cada vez mais apropriadas.

Ora sem cair na dualidade sobre a identidade de Brasília que desde seu inicio as opiniões da

comunidade nacional e internacional ficam entre negação e exaltação, Saboia (2011)

estabelece um acordo partindo do principio onde, narrar o aqui e o agora de nossas vidas

representa a sínteses reflexiva do habitante que age.. Desta forma, não se trata entender

Brasília como múltiplas identidades ou como uma identidade reconhecia e ou tombada. A

partir desta perspectiva Brasília passa a ser compreendida de maneira hermenêutica. O

conjunto destas narrativas coletivas configura a trama vivida por cada um de nós ou de grupos

sociais. Trama de um conjunto heterogêneo de intenções, de atos, de causas e de acasos.

Esta trama exige uma unidade de sentido, de concordância e ao mesmo tempo admite

discordância, pois o coletivo torna-se personagem de sua própria trama” 1. A narrativa e

1

Ricoeur, Percurso do reconhecimento 2006,p 164 in Saboia,Interdisciplinaridade e experiências em

documentação e preservação do patrimônio recente de Brasília. Junho de 2001. Artigo Docomomobsb.org.

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arquitetura são ações miméticas da capacidade humana de construir sua própria identidade e

espaço.

E por fim, Castriota (2013) completa como o conceito de patrimônio abre novas perspectiva

nas últimas décadas, “algumas novas ideias têm desempenhado um papel decisivo e

inovador. Uma delas vai ser a de ‘paisagem cultural’, ...(que), combina de forma inextricável

os aspectos materiais e imateriais do conceito, muitas vezes pensados separadamente,

indicando as interações significativas entre o homem e o meio-ambiente natural. Com isso,

esse conceito parece oferecer uma rica perspectiva permitindo leituras que compreendem

justamente as interações entre os aspectos natural e cultural, material e imaterial desses

conjuntos, muitas vezes ignoradas »2

De posse deste arcabouço de referencias, o resultado deste exercício é o de permitir uma

percepção do papel e a apropriação dos espaços abertos pelos atores políticos, econômico e

sociais. Onde os protagonistas dos espaços urbanos que integram, a escala monumental, a

escala residencial, a escala gregária e a escala bucólica do Plano Piloto são múltiplos e

variados.

O termo “paisagem cultural” vai abarcar uma diversidade de manifestações dos tipo de

interações entre a humanidade e seu meio-ambiente natural: de jardins projetados a

paisagens urbanas. E vai ser justamente essa amplitude do termo com sua geometria

variável. Onde a riqueza de seu conceito é definido mais como um principio do que por um

modelo fixo, o caráter subjetivo do termo acontece pelo fato de realizar as correlações dos

elementos imateriais, intangíveis com os elementos matérias e tangíveis, abarcando assim as

identidades culturais locais.

O ensaio propõe-se ao exercício de analisar, um dos aspectos da paisagem urbana cultural

de Brasília associando à cada escala urbana o principio da unidade da paisagem.

2 Castriota, Novas perspectivas para o patrimônio; Vitruvius arquitextos ISSN 1809-6298, 162.02ano 14, nov.

2013

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Figura 1 Unidades da paisagem do Plano Piloto , realização Y. Oliveira 2014

UNIDADES DA PAISAGEM CULTURAL FUNDAMENTADAS NAS

ESCALAS URBANAS.

Paisagens culturais na escala urbana residencial.

Na escala residencial temos três tipologias residenciais urbanas presentes, as duas primeiras

para as áreas denominadas de superquadras – caracterizada pela presença de habitações

coletivas. A terceira pelas quadras, caracterizada pelas habitações unifamiliares.

1- Os blocos de superquadras, com pilotis, os que trazem em sim um dos principais

fundamentos do urbanismo moderno ; em baixo do bloco com a presença dos pilotis

implementados sob o conceito audaz da projeção onde o lote é abolido no térreo. E que

favorecem a permeabilidade do deslocamento livre do pedestre ao nível do solo. Estas

superquadras são definidas pelos cinturões verdes envelopando cada quadra, a presença de

pátios urbanos no interior das quadras equivalendo a praças residenciais, a presença de

jardins ornamentais adjacentes aos blocos, constituem um mosaico de jardins íntimos indo

N

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dos jardins de nossos avós, até os jardins ornamentais de inspiração dos norte americanos

dos anos 80.

2- Os blocos de superquadras, sem pilotis, com três andares, destinadas à habitações mais

modestas, onde o encontro das pessoas se faz sobre tudo nas áreas verdes adjacentes.

Gerando segmentos diferenciados de área aberta; jardins ornamentais próximo ao edifício e

nas entradas de cada superquadras.

A tendência dos espaços ‘verdes’ das superquadras é a ocupação pelos serviços de

proximidade e ambulantes. Fazendo parte da paisagem cultural urbana contemporânea a

presença de pontos de taxis, que se apropriam das sombras e do gramado próximo para

instalarem banquinhos para o descanso e mesas para jogos; bancas de revistas e carrinhos

de cachorro quente nas entradas da superquadras, As feirinhas de produtos orgânicos nos

finais de semana. Durante a semana as crianças estão com suas babas em baixo do bloco ou

no parques e praças da superquadra.

Quanto ao espaço vegetal, as áreas adjacentes ao blocos são jardinadas quase sempre,

pelos respectivos porteiros de blocos, onde são introduzidas espécies frutíferas, e

ornamentais próximas ao gosto da diversidade cultural presente em Brasília.

Do interior dos edifícios residenciais é assegurada a paisagem vista através das janelas dos

seis ou três andares dos moradores do Plano Piloto, desde a linha do horizonte da bacia do

Paranoá até o pé de mamão no jardim embaixo do bloco.

Nas superquadras, complementando a unidade de vizinhança, a configuração das

entre-quadras são marcadas pelos comércios locais, equipamentos públicos, religiosos ou de

lazer. Os marceneiros, sapateiros, costureiros, chaveiros. os puxadinhos nos fundos das

comerciais locais convivem, não sem tensões, o encontro de amigos nos finais de tarde, e as

moradias de pessoas sem teto, todos fazem parte de uma paisagem urbana cultural.

3 – As residências, habitações unifamiliares geminadas dispostas linearmente nas quadras

em limite oeste do Plano Piloto, onde o comercio de proximidade se faz pela W-3 – única

avenida onde foi adotada a configuração da rua tradicional. Os jardins frontais comporiam

com o espaço social das residências, para obter-se em sequência jardins e um bosque linear

urbano público. As áreas imediatamente adjacentes, jardins, anteriormente públicas e abertas

foram incorporadas às residências, delimitadas por uma grade ou cerca. Os carros acessam

as garagens pela rua de serviço na parte posterior. Os becos asseguram a conexão entre os

blocos nas linhas perpendiculares, permitindo o acesso do pedestre entre a W-3 ao serviços

da W4 e W5.

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O bosque urbano linear, espaço longitudinais entre blocos, caracterizados por espaços

gramados e arborizados onde tanto o uso quanto a gestão constitui um espaço de pouca

espessura urbana, servindo quase sempre para passagem de pedestres. Nos casos onde a

prefeitura da quadra assume a gestão, são criados jardins lineares, parques de diversões,

entradas de veículos, estacionamento, horta, compondo desta forma um mosaico de

particularidades.

Por fim, nas entre-quadras destinadas a equipamentos de saúde, educação, religioso, lazer e

esportes, existem uma diversidade de tipologias arquitetônicas cuja vegetação é ornamental e

de acompanhamento dos edifícios.

Não podemos deixar de ressaltar a existência de tensões importantes entre moradores,

usuários e os serviços públicos de gestão histórica, manutenção e de fiscalização do Governo

do Distrito Federal.

Figura Paisagens urba Unidades da paisagem

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Paisagens culturais na escala bucólica.

As extensas áreas livres, a serem densamente arborizadas ou guardando a cobertura vegetal

nativa, diretamente contígua a áreas edificadas, marcam a presença da escala bucólica3.

Inicialmente, caracterizou-se pelo espaço que corresponde à passagem entre o espaço limiar

leste do Plano Piloto e as bordas do Lago Paranoá. Em seguida, estendeu-se como

intervenção da escala bucólica aos espaços urbanos e que se faz sentir na passagem, sem

transição, do ocupado para o não-ocupado — em lugar de muralhas, a cidade se propôs

delimitada por áreas livres arborizadas.

Quatro outras categorias de unidades homogêneas a paisagem urbana foram acrescidas:

- Os parques e jardins presentes para os moradores de Brasília: Parque da Cidade Sarah

Kubitscheck, Parque Burle Marx, Parque Olhos d’Água, o Parque Nacional Agua Mineral,

Praça Portugal, Praça 21 de abril, Praça dos Cristais e os recentes parques que se situam nas

extremidades da cada asa.

- A vegetação de acompanhamento das vias, presente ao longo do Eixo Rodoviário, e a

existente nas vias W3 Norte e Sul.

- A presença da vegetação nativa do cerrado.

- As áreas de grandes desportos.

A estrutura urbana vegetal é formada pela vegetação natural do cerrado, mesclada ao espaço

vazio ornamentais ou verdes dos edifícios. A composição do vegetal passa da hortaliça às

gramíneas, para alamedas arbóreas, constituem as praças e os bosques integrando cenário

urbano, ora se retraindo e deixando lugar para o espaço mineral vazio de construção, tão

necessário a harmonia da morfologia urbana.

3 . http://www.youtube.com/watch?v=RF558wJMPAE Bucólica 2012 acessado em 14/02/2014.

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Figura 3 Escala gregária e eixo monumental e rodoviário

Além desta interação do espaço verde com as diferentes escalas urbanas, é forte a presença

de uma vegetação do cerrado contrapondo à vegetação urbana exótica e aos edifícios.

Nas bordas do lago Paranoá esta paisagem do cerrado é entremeada dos clubs, área de

expansão da administração federal, de hotéis, e restaurantes.

Com a exceção de algumas incursões de edifícios culturais tipo o Museu de Arte Moderna de

Brasília, Concha Acústica, calçadão do final da asa norte... a paisagem é marcada na sua

borda oposta a presença da mansões do lago, com os jardins privativos exuberantes.

Paisagens culturais da escala gregária.

A escala gregária é caracterizada pela presença de edifícios de escritórios, setor de diversões

sul e norte, setor comercial, de hotéis, bancos e radio e televisão. O gabarito de edifícios em

altura, compõe a paisagem com os espaços de estacionamentos quase sempre minerais, com

de ornamentação de acompanhamento de vias, tendo como forte característica os jardins de

plataformas – vegetação de acompanhamento tipo floreiras assegurando a presença vegetal.

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Algumas parcas praças existentes no interior do Setor de Autarquias assumindo o papel de

pátio urbano.

Nesta escala do ensaio aparecerem dois novos aspectos: a relação do espaço interno e

externo, presente nos projetos arquitetônicos do movimento moderno – por exemplo, o Teatro

Nacional –, integrando mais um componente na análise e que se constitui nos espaços

públicos ou semiprivados e privados.

Ao nível da percepção da escala humana o contrates entre a paisagem urbana diurna do

aglomerado de pessoas, carros e ônibus, que circulam, outros fazem shows musicais

públicos, outros compram e vendem em todos os lugares. A paisagem noturna é marcada

pela passagem reduzida de veículos e pela iluminação dos edifícios, onde os pedestres se

mesclam entre os turistas, os moradores semanais dos hotéis, e a adolescência do craque

que se protege nos subsolos durante o dia e vagam no deserto urbano à noite.

Paisagens culturais da escala monumental.

A escala monumental é composta por vistas e panoramas onde a terra faz limite com o céu.

Escala monumental, "não no sentido da ostentação, mas no sentido da expressão palpável,

por assim dizer, consciente daquilo que vale e significa"4 — conferiu à cidade nascente a

marca inelutável de efetiva capital do país, espaço vasto e com os gabaritos mais altos, onde

cada edifício exprime uma síntese da historia da arquitetura nos traços modernos.

Percorrendo o caminho de leste a oeste pela Esplanada do Eixo Monumental:

Desde a Praça dos Três Poderes, os monumentos foram dispostos em harmonia como sítio

geográfico - existindo uma relação direta entre os edifícios e o relevo, em pano de fundo,

composto pela linha de creta da bacia do Paranoá, que na vastidão do lugar, o pedestre é

abraçado por esta linha de fundo.

4 http://www.youtube.com/watch?v=hcrjuT0B93A Monumental 2012 acessado em 14/02/2014.

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Figura 3 Escala Monumental Praça dos Três Poderes. Arquivo pessoal

Quanto aos motoristas, aproveitam da paisagem de monumentos em movimento.

Os extensos gramados, presentes no eixo monumental são os tapetes da cidade e, como tal,

devem ser pisados. Quando certas áreas se apresentarem gastas, bastará isolá-las por algum

tempo, e as trilhas eventuais deverão ser mantidas, pois indicam o desejo e necessidade de

um caminho para determinado lugar ali. Assim, entre a plataforma da Rodoviária e a Praça

dos Três Poderes, o tapete verde, asseguram a simbiose e o equilíbrio entre o vazio e o

espaço construído, dimensão fundamentalmente importante para o cenário monumental do

conjunto.

Os jardins impregnados na fachada de certos monumentos, asseguram uma relação

harmônica entre o espaços internos e externos dos edifícios. Nota-se nesta configuração a

relação de complementaridade entre o Palácio do Itamaraty e o Ministério da Justiça.

Os massivos arbóreos adjacentes aos ministérios, em frente da Catedral, às vezes passam

despercebidos pelos olhos pouco atentos, mas garantem um conforto de sombra para o

pedestre, sem interferir na silhueta monumental do lugar.

Os espaços livres de construção da plataforma da Rodoviária, lugares de encontro com

característica mineral e de grande importância no cotidiano da vida urbana. Assim como a

praça do Museu da República representam um dos lugares mais democráticos de todo o

quadrilátero de Brasília.

Entre a plataforma da Rodoviária e a Torre de Televisão, cujo espaço central é composto pelo

o futuro parque-bosque em construção pelo escritório Burle Marx e pela Praça das Fontes.

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E, por fim, entre a Torre de TV até a Rodoferroviária, o inventário traz à luz do dia uma visão

dos atuais usos e conexões representados pela à feira artesanal, aos edifícios de artes,

músicas e convenções; e, nas laterais, o Parque da Cidade faz o contraponto da área de

grandes eventos esportivos, sendo o prelúdio para o conjunto de edifícios da administração do

Distrito Federal, onde a Praça do Buriti é um marco importante e assegura a ligação entre as

duas bordas do eixo. Em seguida como ultima sequencia paisagística do Eixo Monumental

onde a topográfica declina suavemente abrindo sobre um panorama paisagem do cerrado, a

Rodoferroviária represesnta uma linha no horizonte.

Os usuários cotidianos são basicamente formados pelos funcionários e representantes do

governo federal e distrital, pelos ambulantes de carrinho de picolé, pipoca, água mineral,

saladas de frutas, e souvenires que abastecem os poucos turistas. As festas, paradas e

manifestações sociais, esportivas e religiosas se servem deste local para eventos de grande

públicos.

Os finais de semana, os eixos Monumental e Rodoviário dão lugares aos pedestre

tornando-se eixos de lazeres.

A noite os edifícios monumentais servem de suporte para cenas de luzes e concertos

musicais.

Conclusões

Este exercício permite perceber que os espaços vazios urbanos são tudo menos um vazio,

eles possuem uma alma própria, bem como significados e usos urbanos diferenciados, e onde

os protagonistas são múltiplos.

Enquanto Mongin – lamenta a perda do sentido da polis grega e da república cívica do

Renascimento italiano, ou até mesmo das cidades recriadas pelos escritores – a Paris do

surrealista Raymond Queneau, por exemplo – que não se resumem a construções e

monumentos, mas sugerem cheiros, barulhos, vida pulsante, olhares sedutores, corpos que

se cruzam. Mongin tem, enfim, nostalgia da experiência urbana multidimensional das cidades

em que engenheiros-urbanistas dialogavam com artistas.

Cita, ainda, Louis Aragon, Julien Graça e Michel Buttor sempre que fala nos vínculos que os

habitantes da urbe guardam com o corpo unificado da cidade. Para ele, vivemos hoje tempos

difíceis, em que é quase impossível captar a essência da cidade como antigamente, porque a

globalização nos obriga a pensar em termos de território, e não na cidade do flâneur de

Baudelaire, aquele que podia se confundir com a multidão e mudar o espaço público. Pode-se

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entender que preservar e valorizar as paisagens culturais intrínseca ao patrimônio histórico e

cultural da humanidade, passa forçosamente pela valorização da memória e dos usos da

comunidade que ali vive e trabalha, fortalecendo os laços de identidade entre as suas várias

gerações sem perder de vista o papel social aferido a operação.

Entender a espessura urbana viva que pulsa que no vazio urbano significa adotar, primeiro

como os espaços abertos e públicos. Lhe conferir uma gestão compartilhada entre os

diferentes atore e economicamente responsável e viável .

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