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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE HUMANIDADES, ARTES E CIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS Disciplina: Estudos Críticos da Globalização Docente: Daniel Aragão e Paulo Balanco ANA EMÍLIA MAGRINELLI LISBOA ATAÍDE A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização: estado da arte da ecologia política sob a perspectiva das contradições intrínsecas do capitalismo. SALVADOR 2016

A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

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Page 1: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE HUMANIDADES, ARTES E CIÊNCIAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Disciplina: Estudos Críticos da Globalização

Docente: Daniel Aragão e Paulo Balanco

ANA EMÍLIA MAGRINELLI LISBOA ATAÍDE

A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização:

estado da arte da ecologia política sob a perspectiva das contradições

intrínsecas do capitalismo.

SALVADOR

2016

Page 2: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

RESUMO

Este artigo visa compreender a relação entre a globalização e o meio ambiente, com foco nos estudos

realizados no campo da ecologia política, em que se analisa as políticas, instituições e processos da

ecologia global contemporânea. Procura explanar as relações internacionais denotando o papel dos

diversos atores políticos e econômicos (Estados, Organizações Internacionais e atores privados) para a

construção de uma nova arquitetura financeira por meio de uma ordem ambiental global. As questões

levantadas ao longo do trabalho pretende esclarecer perguntas, tais como: Se a globalização é um

processo político, quem está na tomada de decisão para representar, participar, torná-la política, como

e para quem? A literatura chama a atenção para o compartilhamento das normas e princípios entre a

ordem econômica liberal e a ordem ambiental global, percebido no ―compromisso do ambientalismo

liberal‖ pela diplomacia ambiental internacional. Nesse sentido, a Ecologia Política vai trabalhar com

três dimensões de análise, ressalvando: i. o papel do Estado como caricatura (narrativa de que ―não há

alternativa‖); ii. a tentativa de ―naturalizar‖ a Globalização (máquina sem condutor); e, o conceito do

desenvolvimento sustentável não sendo compatível com o contexto atual da ordem econômica global

(paradoxo da Globalização). Para tanto, busca-se realizar o estado da arte da ecologia política sob o

imperativo de que é necessário delinear as contradições e dilemas estratégicos dos fluxos do

capitalismo se quisermos avançar significativamente em um projeto de desenvolvimento sustentável

socialmente justo em um contexto de globalização. O conceito de globalização será entendido sob a

luz da Teoria do Sistema-Mundo e Capitalismo Global, defendido por notáveis autores, como um

projeto ideológico e material com uma infraestrutura institucional correspondente, e destacando sua

influência sobre a natureza da politica ambiental. Desse modo, ressalta a relação reciproca na forma

pela qual os problemas ecológicos mudam a ―natureza da globalização‖ e ela, por sua vez, acelera os

padrões de mudanças climáticas já existentes. Finalmente, esse trabalho representa um esforço para a

compreensão da governança ambiental na política mundial contemporânea e, em certa medida, visa

compreender como e para quem a globalização funciona, e quais as reais perspectivas da ação efetiva

para promoção do desenvolvimento sustentável.

PALAVRAS-CHAVE: Ordem Ambiental Global; Globalização; Ecologia Global; Desenvolvimento

Sustentável.

Page 3: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

INTRODUÇÃO

A racionalização do problema ambiental no século XX alcançou seu cume com a realização da

Conferência de Estocolmo, em 1972, onde foi elaborado o Relatório do Clube de Roma (The Limits to

growth), e um novo enfoque passou a nortear a análise da crise ambiental dando ênfase à influência do

crescimento econômico para o esgotamento dos recursos naturais. Todavia, quanto à proteção do meio

ambiente, desde o século XIX, eram levantadas medidas para defender os animais (o caso da extração

de peles das Focas no mar Berhing), e já estabelecidas a Convenção de Paris (1902), sobre a proteção

das aves úteis à agricultura, e a Convenção Internacional para a Proteção dos Pássaros (1950). No

entanto, a ideia para a construção de um Direito Internacional Ambiental só veio à tona na década de

60/70, e uma matéria especifica a se manifestar no plano internacional.

O fenômeno da globalização, concomitantemente, ganhava maior visibilidade a partir dos anos 1970

(NEWELL, 2012:4), quando combinava as transformações propiciadas com o desenvolvimento das

tecnologias e dos meios de comunicações, e ―as empresas se capacitavam para internacionalizar suas

operações‖. Coincidentemente, com a intensificação dos acordos ambientais multilaterais ocorreu ―a

globalização dos regulamentos ambientais de estados líderes a partir do momento da Conferência de

Internacionais sobre o Ambiente Humano‖. Segundo Sidney Guerra (2010),

[...] a realização das referidas conferências internacionais, evidenciou-se também a

inter-relação dos estudos do ambiente com os direitos humanos na medida em que

ficou consagrada a ideia do ambiente humano e a necessidade de compatibilizar o

desenvolvimento econômico com o ambiente equilibrado (GUERRA, 2010, p.19).

Para Steven Berstein1 (2001 apud NEWELL, 2012:5), o compartilhamento de normas e princípios

entre a ordem econômica e ambiental é deflagrada no "compromisso do ambientalismo liberal", por

onde os predicados de proteção ambiental se apresentam sob ―a promoção e manutenção de uma

ordem econômica liberal‖. O conceito de globalização é entendido através dessa interface com a

ecologia política, observada sob os aspectos do ―comércio, produção e financiamento‖ e os ―padrões

de uso dos recursos naturais‖ na dimensão global das trocas e práticas transnacionais (teoria do

Capitalismo Global) entre o Norte Global e o Sul Global (teoria do Sistema-Mundo). A alocação de

recursos em determinadas localidades do planeta, denotando certo padrão de investimento e construção

de infraestrutura e transportes, e mesmo a governança ambiental, através da política de

desenvolvimento sustentável, representa uma lógica incoerente, devido ao fato de que ―os responsáveis

pela luta contra os problemas ambientais e a promoção do desenvolvimento sustentável são os mesmos

atores que criam as condições para a expansão do comércio, produção e financiamento, o que gera

danos ambientais no local primeiro‖ (NEWELL, 2012:7). Para Newell (2012:8), ―a globalização pode

ser melhor pensada como um projeto político‖ e, portanto, ―projeto ideológico e material com uma

infraestrutura institucional correspondente‖ e ―produto de uma determinação política‖ e ―insustentável

de desenvolvimento‖.

1 Bernstein, S. (2001) The Compromise of Liberal Environmentalism. New York: Columbia University Press.

Page 4: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Na analise de Elmar Altvater (1998), ao mesmo tempo em que se criava uma nova ordem econômica

mundial após o fim da Guerra Fria, e a queda do muro de Berlim, em 1989, a expansão do capitalismo

pelo mundo gerou consigo a problemática ambiental em uma escala global, e as regras elaboradas que

deveriam conduzir a regulação também em uma dimensão global, contudo, não obteve o mesmo

resultado diante dessa racionalidade (do ―fim da historia‖) ainda em xeque. Nesse sentido, a relação do

social com a natureza ainda acontece sem ressonância entre o plano local com o global. Embora as

ações sejam estimuladas por meio de acordos multilaterais entre estados poderosos e em

desenvolvimento, os problemas ambientais identificados são transnacionais e, portanto, exigem

ordenamentos jurídicos que sejam supranacionais. Nesse sentido, Altvater (1998) busca encontrar

respostas para compreender de que forma essa racionalidade, apesar de se aperfeiçoar em termos da

dominação econômica mundial consegue, por outro lado, colocar em risco o equilíbrio do ecossistema

global, e implicar para a atual configuração de desastres ambientais e mudanças climáticas na ecologia

global.

A forma como as teorias tradicionais da Economia Política Internacional não destacavam as

‗externalidades negativas‘ da produção capitalista ou os ambientalistas impunham um

‗preservacionismo‘ exacerbado nas décadas de 70 e 80, mostrava que o que estava sendo produzido

cientificamente era uma abordagem que não conseguia conciliar o bem estar individual com a

necessidade da conservação do ambiente. Somente no relatório de Brundtland, na década de 90, o

termo desenvolvimento sustentável foi cunhado politicamente, em consonância com o documento

lançado pela União Internacional de Cientistas Preocupados (International Union of Concerned

Scientists-IUCS) intitulado Estratégia de Conservação Mundial: Conservação dos Recursos Vivos para

o Desenvolvimento Sustentável (World Conservation Strategy: Living Resource Conservation for

Sustainable Development), dissociando a noção de desenvolvimento ao que dizia respeito somente às

noções de economia.

Todavia, os conceitos elaborados pelos especialistas sobre a realidade que nos cerca, segundo Flávia

Barros-Platiau et.al. (2004:102), deve ser considerado a partir da ‗superposição de duas esferas‘

incongruentes, sendo uma representada pelo ‗Mundo‘ e as interações abarcadas no espaço (políticas,

sociais, culturais e econômicas) e a outra representada pela ‗Terra‘ apreendendo o ‗conjunto de coisas

físicas e naturais‘. Se nessa perspectiva, as condições ‗antípodas‘ seriam melhor explanadas na teoria

antropocêntrica de Thomas Malthus e da Bíblia, e/ou na teoria de Gaia - geocêntrica de James

Lovelock, de todo modo, precisava notar que o Mundo englobaria a Terra, ou a Terra englobaria o

Mundo, e no debate da ecologia política se percebeu que os princípios da ‗conservação e preservação‘

estão presentes, porém, emergem um terceiro enfoque: a conciliação da abordagem antropocêntrica e

geocêntrica.

Page 5: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Nesse sentido, a ecologia política, segundo Robbins2 (2004 apud NEWELL, 2012) pretende

compreender a sociedade humana em sua dimensão sócio natural, de modo a analisar a relação entre as

estruturas de poder e os discursos políticos sobre meio ambiente. Peter Newell (2012), em seu estudo,

busca encontrar a ponte entre as teorias tradicionais da Economia Política Internacional e da Ecologia

Política (nos debates entre Peet, Robbins e Watts3) onde adota ―uma visão ecológica conceituada da

política‖ para explicar de que maneira o desenvolvimento capitalista impacta sobre o equilíbrio do

ambiente. Segundo Newell (2012), com Castree4 (2003), Budds

5 (2004), Mansfield

6 (2004) e Bakker

7

(2005), encontraremos algumas abordagens mais direcionadas para analisar praticas mercantilistas de

natureza liberal - ou teorias clássicas da Ecologia Política, enquanto, com Peluso8 (1992), Bryant e

Bailey9 (1997), Paulson et.al.

10 (2003), Zimmerer e Bassett

11 (2003) deparamos com uma abordagem

sobre justiça ambiental e resistência.

A literatura levantada produz diferentes noções com relação ao conceito que define o aparato

normativo que concebe a gestão coletiva ambiental, contribuindo para o campo das relações

internacionais a partir de três perspectivas teóricas distintas: a de ‗governança global‘, ‗regimes

internacionais‘ e ‗abordagens organizacionais‘. Segundo Marie-Claude Smouts12

(1998 apud

BARROS-PLATIAU, 2004), essas perspectivas teóricas caracterizam a tendência da cooperação

internacional contemporânea rumo à governança mundial, porém, para Barros-Platiau (2004:105), não

conseguem ser traduzidas sob o viés de um ‗refinamento teórico‘. A problemática da governança

mundial é levantada a partir da questão de haver uma ‗ordem‘ a nível mundial que, no entanto, se

assenta sob a ausência de um governo central, visto que os Estados-nação formulam a política interna

sob seus territórios geográficos, mas não se estende além das suas dimensões espaciais.

Kratochwil e Ruggie13

(1986 apud BARROS-PLATIAU, 2004) vão considerar como elemento

‗substancial‘ das abordagens teóricas a questão da ‗governança internacional‘. Destarte, as noções de

2 Robbins, P. (2004) Political Ecology: A Critical Introduction. Oxford: Blackwell.

3 Peet, R., P. Robbins and M. Watts (eds.) (2011) Global Political Ecology. London: Routledge. 4 Castree, N. (2003) Commodifying what nature? Progress in Human Geography 27(3): 273–297. 5 Budds, J. (2004) Power, nature and neoliberalism: the political ecology of water in Chile. Singapore Journal of Tropical

Geography 25(3): 322–342. 6 Mansfi eld, B. (2004) Neoliberalism in the oceans: ‘rationalization’, property rights, and the commons question. Geoforum 35(3): 313–

326. 7 Bakker, K. (2005) Neoliberalizing nature? Market environmentalism in water supply in England and Wales. Annals of the Association

of American Geographers 95(3): 542–565. 8 Peluso, N. (1992) The political ecology of extraction and extractive reserves in East Kalimantan, Indonesia. Development and Change

23(4): 49–74. 9 Bryant, R. and S. Bailey (1997) Third World Political Ecology. London: Routledge. 10 Paulson, S., L. Gezon and M. Watts (2003) Locating the political in political ecology: an introduction. Human Organisation 62(3): 205–

217. 11 Zimmerer, K. and T. Bassett (2003) Political Ecology: An Integrative Approach to Geography and Environment-Development Studies.

London: Guilford Press. 12

SMOUTS, Marie-Claude. “La coopération internationale: de la coexistence à la gouvernance mondiale”. In: SMOUTS, Marie-Claude

(Ed.) Les nouvelles relations internationales: pratiques et théories. Paris: Sciences Po, 1998. p, 135-159. 13

KRATOCHWIL, Friedrich & RUGGIE, John G. “International Organization: a state of art on an art of the state”. In: International Organization 40, 4. Cambridge: MIT press 1986, 754 p.

Page 6: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

governança global e regimes internacionais se confundem, e para alguns autores como Krasner14

e

Olav Stokke15

, essa diferença se encontra justamente na abrangência que cada conceito traz

intrinsecamente. Para James Rosenau e Ernst-Otto Czempiel16

(2000 apud BARROS-PLATIAU,

2004:106), “[...] o conceito de governança implícito na análise de regimes é mais estreito do que

aquele pretendido pela governança global”. O conceito de ‗governança‘ e de ‗ordem‘ também em

algum momento vão dialogar, porém, carregam em si conotações distintas e mesmo complementares.

Segundo Rosenau e Czempiel (2000) e Hedley Bull17

(2002 apud BARROS-PLATIAU, 2004) apesar

de serem ―fenômenos claramente interativos‖, “ordem é ao mesmo tempo uma precondição e uma

consequência do governo” e ordem mundial engloba ―os padrões ou disposições da atividade humana

que sustentam os objetivos elementares ou primários da vida social‖, sendo a governança ―um

mecanismo de ordem‖, ou “a ordem estabelecida por meio da governança”.

Para definir o conceito de governança global, Barros-Platiau (2004) a priore, traz uma discussão sobre

a condição parcial do globalismo, e a necessidade de distinguir o significado de globalismo e

globalização, tal como ressalvado por Ulrich Beck18

e o liberal Robert Keohane19

. Para Beck (1999

apud BARROS-PLATIAU, 2004:113), a globalização ―significa os processos‖ pelos quais os atores

transnacionais exercem influência, enquanto para Keohane (2001 apud BARROS-PLATIAU,

2004:113), vai representar o ―aprofundamento da distância em escala mundial‖ nessa estreita rede de

conexões político-econômicas no mundo. Globalismo, segundo Barros-Platiau (2004:113), significa o

―estado pleno da globalização econômica”. Aqui, o conceito de governança global recebe um sentido

mais normativo do termo. Para Craig Murphy20

(2000) representa a ―expansão do projeto liberal em

escala global”, e finalmente, o ―Novo Multilateralismo‖ de Robert Cox (apud BARROS-PLATIAU,

2004:113).

Noutro enfoque, Saskia Sassen (2010), em seu estudo da esfera do subnacional, desloca o olhar para a

dimensão local – as cidades globais – ao invés de centrar o papel do Estado para apreensão do modelo

de ―hierarquias escalares‖, acreditando que assim contribui para evidenciar as redes transfronteiriças

materializadas (descrita como ―fluxos entre nós‖) e adotar arquiteturas conceituais melhor

direcionadas para o estudo da globalização. Paul Singer (1997), em sua analise numa perspectiva

histórica do capitalismo, vai considerar a globalização como o fenômeno da abertura e fechamento de

14

Citado por ROSENAU, James & CZEMPIEL, Ernst-Otto. Governança sem governo: ordem e transformação na política mundial. Brasília: UnB, 2000, 21 p. 15

STOKKE, Olav. “Regimes as governance systems”. In: YOUNG, Oran (Ed.) Global governance: drawing insights from the environmental

experience. Cambridge: MIT press, 1997, 30 p. 16

ROSENAU, James & CZEMPIEL, Ernst-Otto. Governança sem governo: ordem e transformação na política mundial. Brasília: UnB, 2000,

21 p. 17

BULL, Hedley. A sociedade anárquica. Brasília: UnB, IPRI, 2002, p. 26. 18

BECK, Ulrich. O que é Globalização? Equívocos do Globalismo e respostas a Globalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999, 27-30 p. 19

KEOHANE, Robert. Governance in a partially globalized world: presidential address, American Political Science Association, 2000. In:

American Political Science Review (APSR) v.1, n.95, March, 2001, p. 1. 20

MURPHY, Craig. Global governance: poorly done and poorly understood. In: International Affairs v.4, n.76, 2000, p. 789-803.

Page 7: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

mercados (sejam mundiais, regionais, nacionais ou locais), manifestando a tendência para

proeminência ora do monopólio do produto sobre o mercado, ora por maior competitividade.

Para abordar a teoria tradicional da ecologia política, Newell revisa a literatura eclética incluindo

autores como Blaikie21

(1985), Rocheleau et al22

(1996), Stott e Sullivan23

(2000), Forsyth24

(2003), e

abarca as instituições de governança ambiental nos estudos de Carmin e Agyeman25

(2011) e Peet et

al26

(2011). Nos estudos sobre a globalização, o autor (2012) aborda o fenômeno com base nos estudos

de Cox27

(1994) e Harvey28

(2005), onde leva em consideração o contexto da ordem neoliberal

(enquanto disciplina monetária e integração global) durante o período de 1980 a 1990. Para Newell

(2012:19), algumas características são evidenciadas no modelo da economia global existente, e são

relevantes para compreender o potencial e limites da governança ambiental global, sendo estas

segundo Newell e Paterson29

(2010 apud NEWELL, 2012): a mobilidade do capital para financiar

serviços ambientais nacionalizados; a regulação publica do Estado através da re-regulação por meios

privados dos diferentes setores da economia (o ―coração Lockeano‖ de Van der Pijl30

, 1998 apud

NEWELL, 2012); e segundo Harvey31

(2010 apud NEWELL, 2012), a criação de novos locais de

acumulação para enfrentamento das crises de produção excessiva e/ou o subconsumo.

Num outro ângulo de visão, como explica Barros-Platiau (2004:114), o conceito de governança sempre

estará atribuído à ideia de democracia e/ou legitimação da comunicação aberta, e ainda, mesmo que

em uma conceptualização ideal do termo, traz intrinsecamente o que Keohane (2001) acredita ser a

―analise do papel do processo de institucionalização na expansão dos ideais democráticos e no

fortalecimento das capacidades dos indivíduos em nível global‖. A discussão levantada por estes

autores, dessa maneira, introduz uma problemática acerca da redefinição da soberania estatal em um

contexto onde emerge a organização sociopolítica de uma governança ambiental consolidada em um

sistema internacional (sistema-mundo) por novos atores mundiais a partir de três pontos-de-vista da

governança ambiental: ao nível global, local e regional32. Além disso, abrange a dimensão

transnacional na qual concebe a ideia dos recursos naturais como ‗bens comuns globais e patrimônio

comum da humanidade33‘, compreendendo a relação entre os espaços físico e natural de forma ainda

21

Blaikie, P. (1985) The Political Economy of Soil Erosion in Developing Countries. London: Longman. 22

Rocheleau, D., B. Thomas-Slayter and E. Wangari (1996) Feminist Political Ecology: Global Issues and Local

Experiences. London: Routledge. 23

Stott, P. and S. Sullivan (2000) Political Ecology: Science, Myth and Power. Oxford: Oxford University Press. 24

Forsyth, T. (2003) Critical Political Ecology: The Politics of Environmental Science. London: Routledge 25

Carmin, J. and J. Agyeman (eds.) (2011) Environmental Justice Beyond Borders: Local Perspectives on Global Inequities.

Cambridge, MA: MIT Press. 26

Peet, R., P. Robbins and M. Watts (eds.) (2011) Global Political Ecology. London: Routledge. 27

Cox, R. (1994) Global restructuring: Making sense of the changing international political economy. In R. Stubbs and G.

Underhill (eds.) Political Economy and the Changing Global Order. Basingstoke: Macmillan, 45–60. 28

Harvey, D. (2005) A Brief History of Neoliberalism. Oxford: Oxford University Press. 29 Newell, P. and M. Paterson (2010) Climate Capitalism: Global Warming and the Transformation of the Global Economy.

Cambridge: Cambridge UniversityPress. 30 Van der Pijl, K. (1998) Transnational Classes and International Relations. London: Routledge 31

Harvey, D. (2010) Enigma of Capital and the Crises of Capitalism. London: Profile Books. 32

PORTER, Gareth & BROWN, Janet. Global environmental politics. Boulder: Westview, 1991, 208 p. 33

ELLIOTT, Lorraine. The global politics of the environment. New York: New York University Press, 1998.

Page 8: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

desencontrada. Neste sentido, os autores trazem para o debate uma ‗nova ontologia‘ desconsiderando

as abordagens que se encerram somente na discussão teórica divergente entre racionalistas e

construtivistas.

A abordagem da ecologia política segue justamente neste sentido de enfatizar o padrão de políticas

econômicas e uso dos recursos ambientais globais para ―compreensão da sociedade humana ou

relações sócio-naturais‖ [Paulson et al (2003) e Robbins (2004)] e ―examinar as inter-relações políticas

e de poder, as estruturas e os discursos com o meio Ambiente‖ [Bryant e Bailey (1997); Stott e

Sullivan34

2000; Forsyth35

2003; Peet e Watts36

2004; Robbins 2004]. Para dar conta desta

problemática, a ecologia política busca analisar o ―papel do Estado como caricatura‖ e ressaltar ―as

narrativas em torno do poder e da incapacidade do Estado‖ para controlar o ―efeito corrosivo‖ da

globalização (naturalizada) sob o ambiente, impactando na sua ―soberania e territorialidade‖, e ainda

criticando o conceito de desenvolvimento sustentável como incoerente para a realidade cíclica das

crises do sistema-mundo. Após a tentativa de construção da noção de ordem ambiental global,

seguiremos discutindo o estado da arte da Ecologia Politica, e as transformações ocorridas durante as

transições históricas, provocadas pelas crises ambientais mundiais e do capitalismo, no contexto

paradoxo da globalização.

O conceito de Ordem Ambiental Global e suas contradições

O contexto histórico da globalização, datado em diferentes épocas, incita o debate acerca da existência

de uma ordem a nível global. Segundo Altvater (1998), só podemos nos referir a uma ordem global a

partir do final do século XX e começo do XXI, sobretudo, devido à emergência de uma nova fase

histórica (conquista do espaço local e aceleração temporal) em consonância com a intensificação das

relações internacionais políticas, econômicas e culturais entre os Estados-nação e o advento das

corporações multi e/ou transnacionais superando a autonomia reguladora dos Estados no que diz

respeito à formação de mercados mundiais altamente integrados. Todavia, outro elemento crucial deste

contexto de ordem global, nos remete à competição internacional entre as corporações em que acarreta

na ―equalização de produção e normas de consumo‖, além de contribuir para determinar taxas de juros

e de cambio entre Estados, e segundo Scharpf37

(1987), com isto, enfraquecer o poder soberano

político, devido às forças do mercado de livre comercio corroer a dimensão das fronteiras territoriais.

Para Porter38

(1990), em contrapartida, os Estados também serão impulsionados para adotarem

medidas a fim de alavancar sua economia por meio de ―um programa politico para impulsionar o

sistema de competitividade em territórios particulares‖ (apud ALTVATER, 1998:20). Desse modo,

34 Stott, P. and S. Sullivan (2000) Political Ecology: Science, Myth and Power. Oxford: Oxford University Press. 35 Forsyth, T. (2003) Critical Political Ecology: The Politics of Environmental Science. London: Routledge. 36 Peet, R. and M. Watts (eds.) (2004) Liberation Ecologies: Environment,Development, Social Movements, 2nd

edn. London: Routledge. 37 Scharpf, Fritz W. (1987) Sozialdemokratische Krisenpolitik in Europa, Frankfurt and New York: Campus. 38

Porter, Michael E. (1990) The Competitive Advantages of Nations, London: Macmillan.

Page 9: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

como coloca Hirsch39

(1997), este estado nacional se transforma em um estado competitivo, devendo

assumir uma política de estímulo à produção interna contra a concorrência dos outros estados

existentes, acarretando, contundo, num cenário caótico e de desintegração. Como explica Cox40

(1993)

e Altvater (1998), isso ocorre principalmente devido,

[...] a competição politica se tornar uma corrida ruim para a racionalização (que

desloca os trabalhos e aumenta os desempregos) e uma estratégia perigosa de

externalização social e custo ecológico. Nesta situação podemos observar tendências

em relação à ―macro-regionalismo‖, que quer dizer a formação de espaços econômicos

regionalmente integrados e ‗micro-regionalismo', abaixo do nível dos estados

nacionais (ALTVATER, 1998:21).

A primeira discussão no cerne desta problemática diz respeito à ―abordagem organizacional‖. Nasce

desta discussão a busca da legitimação dos organismos internacionais sendo compostos pelas relações

interestatais e fundamenta a ideia da ―ordem mundial‖ para estabelecer a centralização de poder ou

governo mundial. Katzenstein et al.41

(1998 apud BARROS-PLATIAU, 2004:108) em seus estudos de

1947 a 1967, analisa as organizações mais formais, como o caso da ONU-Organização das Nações

Unidas e a partir daí traz três categorizações para refletir esse fenômeno, sendo estes: as‖ instituições

formais‖ (governança internacional como o produto dessas instituições); os ―processos institucionais‖

(como se constitui a OI e como funciona); e por fim, o ―papel organizacional‖ (a gestão de bens

comuns e consolidação do governo mundial – sob a ótica dos funcionalistas e neo-funcionalistas).

Todavia, com o aprofundamento das mudanças sociais e políticas no sistema internacional (Ordem

Econômica Mundial e Terceira Revolução Industrial) a partir da década de 70, houve a necessidade de

se formular nova compreensão acerca da abordagem organizacional. Segundo Suhr42

(1997 apud

BARROS-PLATIAU, 2004:108), o papel exagerado operado pelas OIs nas Relações Internacionais

propiciou o surgimento do conceito de ―regime‖, proposto por Jonh Gerard Ruggie43

, como uma forma

de mudança de foco para analisar os “padrões mais amplos e informais de comportamento estatal”.

Segundo Barros-Platiau (2004:110), com as tentativas frustradas das OIs, em especial da ONU, em

tratar dos ―problemas de executabilidade‖ na esfera ambiental, nas décadas seguintes após 1990, e à

―Crise do Multilateralismo‖, houve a necessidade em se buscar ―novos conceitos operacionais‖.

Entretanto, o conceito de ―regime‖ trata de uma noção mais ampla para analisar o comportamento dos

Estados, onde notadamente as ―regras implícitas e explícitas‖ modificam a condução das interações

nesse ―sistema internacional‖, e como explicou o Keohane (2001), representa a variável da

interferência no poder do Estado (BARROS-PLATIAU, 2004:110). Sobretudo, com o paradigma neo-

39 Hirsch, Joachim (1997) ‗Globalization of capital, nation-states and democracy‘, Studies in Political Economy 54, Fall: 39–58. 40

Cox, Robert (1993) ‗Global perestroika‘, Socialist Register 30:26–43. 41

KATZENSTEIN, Peter; KEOHANE, Robert & KRASNER, Stephen. International Organization and the study of world politics. In: International Organization 52, 4. 659-660 p. Cambridge: MIT press, 1998. 42

SUHR, Michael. “Robert Keohane: A contemporary classic”. In: NEUMANN, Iver & Wæver, Ole. The future of international relations.

London; New York: Routledge, 1997, 95-96 p. 43

RUGGIE, John G. International responses to technology: concepts and trends. In: International Organization 29, 3, Summer 1975.

Page 10: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

realista de Kenneth Waltz44

(1979 apud BARROS-PLATIAU, 2004:110), trazendo uma outra

perspectiva das relações internacionais, ressalta-se a ausência de uma abordagem mais coerente por

parte das teorias realistas de Stephen Krasner45

e Robert Gilpin46

.

A teoria de regimes internacionais, então, recebe uma série de definições, tanto pela corrente realista

que vai considerar “como princípios, normas, regras e procedimentos da tomada de decisão” como, a

partir de uma divisão proposta por Stephan Haggard e Beth Simmons (apud BARROS-PLATIAU,

2004:110) em quatro correntes, sendo estas: a i.estrutural; ii.estratégica ou teoria dos jogos;

iii.funcional; e, iv.cognitiva. Segundo Barros-Platiau (2004), mais uma corrente será adotada na

conceptualização, a dos (v.) neoliberais-realistas-cognitivistas de Andreas Hasenclaver47

, Peter Mayer

e Volker Rittberger48

. A abordagem neoliberal se baseia na teoria microeconômica e funcional para

definição do conceito de regime internacional. Keohane (2001) apresenta a abordagem da teoria dos

jogos junto à teoria funcional, de modo a reduzir as incertezas dos agentes internacionais. As

abordagens estruturais, ou realistas, utilizam o poder como variável central da analise, principalmente

na Teoria da Estabilidade Hegemônica de Krasner e Gilpin. As abordagens cognitivas estão

fundamentadas na filosofia da ciência e crítica ao racionalismo, dando maior ênfase às identidades da

sociedade internacional, por exemplo, as críticas de Kratochwil e Ruggie à abordagem realista de

Krasner.

O conceito de globalização adotado pelos autores da ecologia política abrange a noção marxista (do

materialismo histórico) debatida pelos teóricos do Capitalismo Global (e a formação de uma Classe

Capitalista Transnacional), segundo Sklair49

(2012a,b) ou Van der Pijl (1998), como também dentro da

noção proposta por neo-gramscianos, introduzindo o conceito de Hegemonia para apreensão do

fenômeno devido à constatação do controle da produção, das instituições e das ideias por uma classe

dominante no poder, conforme a teoria de Cox (1981) e Morton50

(2007) sobre a releitura do conceito

de Gramsci51

(1971) e, consequentemente, a formação de blocos históricos. Enfim, segundo Harvey52

(2003), essa capacidade de acumulação com a criação de novos ―espaços‖ de produção por estas

corporações transnacionais, ultrapassa os limites do ―tempo‖, e tende a absorver tanto o excedente do

capital quanto do trabalho. Outro conceito cunhado por ambientalistas marxistas, da ―troca ecológica

44

WALTZ, Kenneth. Theory of international politics. 2 ed. New York: Mcgraw-Hill, 1979. 271 p. 45

KRASNER, Stephen. State Power and the structure of international trade. In: World Politics 28, 1976, 317-346 p. 46

GILPIN, Robert. War and change in world politics. Cambridge: Cambridge University Press, 1981 & GILPIN, Robert. Economia política

das relações internacionais. Brasília:EdUnB, 2002. 47

HASENCLAVER, A. Et alii. Integrating theories of international regimes. In Review of International Studies (2000), 26, 3-33. 48

HASENCLEVER, Andreas; MAYER, Peter & RITTBERGER, Volker. Theories of international regimes. Cambridge: Cambridge University

Press, 2001, 248 p. 49 Sklair, L. (2002a) The transnational capitalist class and global politics: deconstructing the corporate-state connection.

International Political Science Review 23(2): 159–174. Sklair, L. (2002b) Globalization: Capitalism and its Alternatives. Oxford: Oxford University Press. 50 Morton, A. (2007) Unravelling Gramsci: Hegemony and the Passive Revolution in the Global Political Economy. London:

Pluto Press. 51 Gramsci, A. (1971) Selections from the Prison Notebooks, edited and translated by Q. Hoare and G. Nowell Smith. New

York: International Publishers. 52

Harvey, D. (2003) The New Imperialism. Oxford: Oxford University Press.

Page 11: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

desigual‖, concerne essa condição de exploração desigual dos recursos naturais dentro desse cenário

onde a lógica que se segue é perpetuada pelos fluxos da economia global, e segundo Newell (2012),

este conceito está relacionado ao de ―dívida ecológica‖, que segundo Clark e Foster53

(2009), Roberts

e Parks54

(2008) e Martínez-Alier55

(2007) representa a relação onde os países ricos se tornam

devedores dos países menos desenvolvidos (e/ou mais pobres) devido ao ―uso de bens comuns

globais‖ dos seus territórios.

Como explica a teoria dos ciclos hegemônicos de Modelski56

(1987), a ascensão e queda dos impérios

hegemônicos estão sujeitos à capacidade bélica do Estado em se manter vitorioso nos conflitos entre as

potências político-econômicas, e como se sabe, do século XVI ao XIX, a Europa possuía as duas

maiores potências hegemônicas do mundo – a França e Inglaterra – e somente a partir da segunda

metade do século XX (e fim da Segunda Guerra Mundial) foram perdendo poder para os Estados

Unidos. Assim, para Alvater (1998:25), o que vai distinguir o novo sistema mundial (a nova ordem

política neliberal) dos antigos impérios mundiais é justamente ―a ordem da globalização‖, a

―submissão do trabalho sob o capital‖ e ―a disponibilidade de combustível fóssil para alimentar os

sistemas de energia e provocar verdadeira transformação na produção, sustentação das atividades

domésticas diárias, e revolução dos sistemas de comunicação‖. Portanto, para Altvater57

(1992),

[...] A forma social de produção, utilização e distribuição tem sido decisiva para a

dinâmica social das formações sociais. Os efeitos ecológicos em ecologias locais,

regionais e globais diferem de acordo com o alcance econômico e ecológico das

atividades em questão. Cada formação social em última análise atinge limites em sua

capacidade de expansão da produção de excedentes. A adoção de modos de regulação

dentro de uma formação social abre um novo leque de opções, que vai encolher

novamente em algum momento, no entanto, a menos que os sistemas de energia e da

formação social sejam transformados também (ALTVATER, 1998:25).

No que diz respeito às contradições intrínsecas do capitalismo para a ordem ambiental, podemos

observar desde na Teoria da falha metabólica de Karl Marx58

(1981), definida como o ―processo de

interdependência que liga a sociedade humana à natureza‖, o estudo pelo qual o autor enfatiza a

privação dos recursos naturais em algumas regiões do planeta devido às práticas agrícolas abusivas

provocando a infertilidade dos solos, como também nos estudos contemporâneos debatidos por Clark e

York59

(2005), Clausen e Clark60

(2005), Foster e Clark61

(2009), observando a geração dos problemas

53 Clark, B. and J.B. Foster (2009) Ecological imperialism and the global metabolic rift: unequal exchange and the

guano/nitrates trade. International Journal of Comparative Sociology 50(3–4): 311–334. 54 Roberts, J.T. and B.C. Parks (2008) Fuelling injustice: globalization, ecologically unequal exchange and climate change.

In J. Ooshthoek and B. Gills (eds.) The Globalization of Environmental Crises. London: Routledge, 169–187. 55 Martínez-Alier, J. (2007) Marxism, social metabolism and international trade. In A. Hornburg, J.R. McNeill and J. Martínez-

Alier (eds.) Rethinking Environmental History: World Systems History and Global Environmental Change. Lanham, MD: Altamira, 221–239. 56

Modelski, George (1987) Long Cycles in World Politics, London: Macmillan. 57 ——(1992) Der Preis des Wohlstands. Umweltplünderung in der neuen Welt(un)ordnung, Münister: Westfälisches Dampfboot. 58

Marx, K. (1981) Capital, Volume 3. Harmondsworth: Penguin. 59 Clark, B. and R. York (2005) Carbon metabolism: global capitalism, climate change and the biospheric rift. Theory and

Society 34(4): 391–428. 60 Clausen, R. and B. Clark (2005) The metabolic rift and marine ecology: na analysis of the oceanic crisis within capitalist

production. Organization & Environment 18(4): 422–444.

Page 12: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

ambientais com o uso de fertilizantes tóxicos, a acidificação dos oceanos e as alterações climáticas.

Moore62

(2011a,b) ainda projeta a partir da teoria marxista a ―teoria unificada do desenvolvimento

capitalista‖ analisando separadamente os elementos desta relação entre natureza e capitalismo

(acumulação de capital, poder e natureza). Noutro momento, O‘Connor63

(1994, 1998) vai considerar

como uma segunda contradição interna do capitalismo o esgotamento dos recursos naturais existentes,

onde além de contribuir para a crise do capitalismo, torna rentável a exploração dos recursos não-

renováveis para a produção de capital. Em suma, conforme a visão de Moore (2011b), não temos como

―discernir uma fronteira entre capitalismo, sistema social e meio ambiente‖, sobretudo, porque ―o

capitalismo tem de revolucionar continuamente seus processos de acumulação dentro da teia da vida

sócio ecológica‖ (apud NEWELL, 2012:28) e como definiu Marx em seu conceito de ―acumulação

primitiva‖, esse modo de produção é fruto das relações humanas conflituosas na conquista de novos

territórios e domínios para sua perpetuação.

Estado da Arte da Ecologia Política

Podemos encontrar uma relação mais direta dos estudos da Ecologia Política com as Relações

Internacionais nas obras de Wolfgang Sachs e Nicolas Hildyard64

, e Vandana Shiva65

(apud NEWELL,

2012), cujo enfoque é direcionado para analise de instituições de governança global sob o viés

ambiental, abordando os atores corporativos e as crises ecológicas. Todavia, a ecologia política possui

também outras linhas de pesquisa que podem ser encontradas com enfoque nas análises sobre: ecologia

política (EP) ―crítica‖ (Fairhead e Leach 1998; Robbins 2000; Stott e Sullivan 2000; Forsyth 2003);

EP feminista‖ (Rocheleau et al. 1996; Rocheleau e Edmunds 1997; Shiva 1998; Schroeder 1999); EP

―primeiro/terceiro mundo‖ (Bryant e Bailey 1997; Bryant 1999; Martínez Alier 2002; McCarthy

2002); EP ―neo-marxista‖ (Blaikie 1985; Blaikie e Brookfi eld 1987; O'Connor 1998; Peet et ai. 2011);

EP ―urbana‖ (Swyngedouw e Merrifi eld 1996; Swyngedouw 2004; Heynen et ai. 2006; Swyngedouw

et ai. 2006). Como explica Newell (2012), as abordagens não necessariamente tomam como unidade

de análise somente o Estado e as instituições internacionais, contudo, para ele, o foco desta disciplina é

orientado para a questão da ―troca ecológica desigual‖, observando as causas das mudanças ambientais

globais provocadas pela aceleração do capitalismo.

61 Clark, B. and J.B. Foster (2009) Ecological imperialism and the global metabolic rift: unequal exchange and the

guano/nitrates trade. International Journal of Comparative Sociology 50(3–4): 311–334. 62 Moore, J.W. (2011a) Transcending the metabolic rift: a theory of crises in the capitalist world ecology. The Journal of

Peasant Studies 38(1): 1–46. Moore, J.W. (2011b) Ecology, capital, and the nature of our times: accumulation and crisis in the capitalist world ecology. Journal of World-Systems Research 17(1): 108–147. 63 O’Connor, M. (1998) Natural Causes: Essays in Ecological Marxism. London: Guildford Press. 64 Sachs, W. (ed.) (1993) Global Ecology: A New Arena of Political Confl ict. London: Zed Books. Chapter - Hildyard (1993) Foxes in charge of the chickens. 65 Shiva, V. (1998) Staying Alive: Women, Ecology and Development. London: Zed Books.

Page 13: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Goldman66

(1998), por exemplo, nota na resistência local de certos grupos marginalizados a

oportunidade para exploração dos recursos minerais por grupos privados globais. Através da ecologia

política, o autor visa compreender a questão do acesso aos recursos naturais, do direito à propriedade e

dos meios pelos quais o neoliberalismo atua através dos mecanismos de governança global, para

reproduzir o poder do Estado, e ter maior alcance globalizado sobre os recursos disponíveis

(Revolução Verde), mesmo através da compra da quota de carbono. Ou, como coloca Newell e

Bumpus67

(2012), o neoliberalismo influi na criação de mercadorias em áreas menos desenvolvidas e

comunidades resistentes ao capitalismo, e na abordagem neo-gramsciana de Levy e Newell68

(2002),

através de arranjos de governança, tende a ―globalizar conjuntos específicos de interesses materiais e

políticos‖, e legitimar os projetos hegemônicos. Desse modo,

[...] O alcance globalizado de regimes internacionais e seu papel na criação de

mercados, e determinar o acesso a recursos tão crucial como água, energia e sementes

significa que as considerações críticas da governança ambiental global têm que

ampliar sua análise para além do nível "internacional" e além dos focos teóricos

convencionais para compreender como as estruturas de poder que formam e

circunscrevem a governança ambiental "global" pode também gerar conflitos locais da

governança de recursos em outras escalas (NEWELL, 2012:32).

Embora, dentro da mesma área de estudo é possível ressalvar algumas contribuições menos

convencionais, exemplo de Bebbington69

(2003), em que considera as estratégias locais como

―oportunidades de desenvolvimento‖ podendo constranger as agencias internacionais através de

manobras que consigam encontrar outra forma simultânea de impulsionar a economia global do

carbono. Em um olhar mais direcionado para compreender a economia política da governança

ambiental global, Newell (2012:34) pretende abarcar os dilemas ambientais no contexto da

globalização, sob o ponto de vista da análise dos ―elementos políticos da (re) constituição e evolução

histórica e material‖ do fenômeno. Parte de algumas perguntas-chaves para abarcar o tema da

globalização, tais como: o que se governa? quem e como governa? quem é governado? em nome do

que? e quais suas implicações?.

Com base nas perspectivas convencionais, as abordagens somente abarcam o conceito de regimes

internacionais, focando na forma caricaturada do Estado, e apenas refletindo as legislações ambientais

globais sem observar a multiplicidade de atores não-estatais na arena da tomada de decisão. Segundo

Newell (2012), estas abordagens centradas no Estado refletem somente ao nível dos ―regimes‖, como

mostra Vloger 70

(1995), buscando encontrar no estudo das políticas ambientais globais a base analítica

para conceituação dos problemas ambientais, sem enfatizar a questão do gerenciamento e da falta de

66

Goldman, M. (ed.) (1998) Privatising Nature: Political Strugg les for the Global Commons. London: Pluto Press. 67 Newell, P. and A. Bumpus (2012) The global political ecology of the CDM. Global Environmental Politics 12(4). 68 Levy, D. and P. Newell (2002) Business strategy and international environmental governance: toward a neo-Gramscian

synthesis. Global Environmental Politics 3(4): 84–101 69 Bebbington, A. (2003) Global networks and local developments: agendas for development geography. Tijdschrift voor

Economische en Sociale Geografi e 94(3): 297–309. 70 Vogler, J. (1995) The Global Commons: A Regime Analysis. Chichester: John Wiley & Sons.

Page 14: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

um governo global para fazer valer sanções mais rigorosas, ou seja, a relação de poder existente no

jogo entre Estados e instituições internacionais, para além das teorias tradicionais das Relações

Internacionais.

Alguns autores, como Keohane & Nye71

(1972) e O‘Brien et.al72

(2000), introduzem uma abordagem

mais critica onde propõem a concepção de um ―multilateralismo complexo‖ abrindo o debate para o

conceito de ―transnacionalismo‖ ao denotar a presença dos atores não estatais nesse contexto da

política ambiental, ou mesmo com a contribuição foucaultiana de Keeley73

(1990) a priore, e de Gale74

(1998), a posteriore, debatendo a influencia das organizações internacionais para gerir estruturas

normativas em áreas especificas. Como ressalta Levy & Newell75

(2005); Lipschultz & Rowe (2005) e

Pattberg76

(2007), é notório a ―crescente evidência de atores privados assumindo funções públicas de

regulação e gestão no que diz respeito aos recursos naturais‖ (apud NEWELL, 2012:38), embora haja

estudiosos, como Saurin77

(2001), defendendo que apesar do envolvimento de atores privados na

regulação ambiental a formulação dos arranjos institucionais não deixa de ser orientado por

organizações públicas e, portanto, não se deve recair no erro de enfatizar a ―impotência do Estado‖.

Destarte,

[...] da mesma forma, estudando as decisões de investimento das empresas, bancos e

outros agentes financeiros e o papel político desses atores na governança ambiental irá

fornecer a base para a compreensão do que é possível e praticável na economia global

neoliberal contemporânea em suas formas de ação. Tanto em termos de sua influência

financeira e politica, bem como na sua pegada ecológica, evidenciando o papel das

agências estatais do meio ambiente que permanecem o ponto de referência para a

maioria dos especialistas em RI (NEWELL, 2012:38).

Com esta constatação, ao explorar a relação entre o Estado e o capital, a delegação de poder e

autoridade transferida para atores financeiros e corporativos se torna a prerrogativa para

funcionalidade da lógica de mercado, e como revela Görg e Brand78 (2006), visa ―enfraquecer e

transformar a hierarquia do governo em novos processos de governança‖ (apud NEWELL, 2012: 38).

Embora a Economia Política Internacional negligencie os estudos vinculados à problemática

ambiental, alguns autores segundo Newell (2012), tais como, Helleiner (1996) e Laferrière & Stoett

(1999), conseguem abordar esse tema introduzindo uma teoria política verde, para ampliar o

entendimento sobre o papel do Estado e da cooperação internacional, e/ou as teorias menos

71 Keohane, R. and J. Nye (1972) Transnational Relations and World Politics. Cambridge, MA: Harvard University Press. 72 O‟Brien, R., A.M. Goetz, J.A. Scholte and M. Williams (2000) Contesting Global Governance. Cambridge: Cambridge University Press. 73 Keeley, J. (1990) Toward a Foucauldian analysis of international regimes. International organisation 44(1): 83–105. 74 Gale, F. (1998) Cave! Hic dragones: a neo-Gramscian deconstruction and reconstruction of international regime theory. Review of International Political Economy 5(2): 252–283. 75 Levy, D. and P. Newell (eds.) (2005) The Business of Global Environmental Governance. Cambridge, MA: MIT Press 76 Pattberg, P. (2007) Private Institutions and Global Governance: The New Politics of Environmental Sustainability.

Cheltenham: Edward Elgar. 77 Saurin, J. (2001) Global environmental crisis as „disaster triumphant‟: the private capture of public goods. Environmental

Politics 10(4): 63–84. 78 Görg, C. and U. Brand (2006) Contested regimes in the international political economy: global regulation of genetic

resources and the internationalisation of the state. Global Environmental Politics 6(4): 101–123.

Page 15: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

convencionais sobre o papel das instituições internacionais na natureza do sistema internacional, e da

organização política global. Em certa medida, o modelo de exploração dos recursos naturais advém

dos ―padrões de produção e investimentos‖, e é reflexo da ―natureza do estabelecimento de normas e

autoridade institucional‖, envolvendo atores estatais e não-estatais, e sociedade civil organizada

(NEWELL, 2012:39). Ou seja, a ordem ambiental acarreta em formas ―transnacionais de governança

global‖ resultantes das mudanças na relação entre estados e mercados e entre os organismos

internacionais públicos e privados, cuja autoridade domina o ambiente e requer, portanto, uma

consideração teórica capaz de captar adequadamente essas dinâmicas.

O Papel do Estado Caricaturado – “Sem Alternativas”

Segundo autores como Ohmae79

(2004 apud NEWELL, 2012:8), Hirst et al80

(2009 apud NEWELL,

2012:8), além das narrativas descreverem um Estado ―impotente‖ verificado nos ―precedentes

históricos‖ e em perspectivas comparadas, cujo discurso oficial se apoia na ideia de que ―não há

alternativa‖, Weiss81

(1998 apud NEWELL, 2012:8) e Evans (1995 apud NEWELL, 2012:8), reitera a

capacidade do mesmo para realizar ―atos de intervenção ou abstenção estratégicas‖ e adotar um

discurso inconsistente negligenciando sua real responsabilidade em prol da construção de bases para

uma globalização neoliberal. Como mostra Görg e Brand82

(2006 apud NEWELL, 2012:8), existem

diferentes graus de inserção entre os Estados a tal ―disciplina de mercados globais‖ e a adoção ao

modelo neoliberal, evidenciando certa resistência a essas estratégias políticas e econômicas no plano

interno. Newell (2008b)83

mostra que, de todo modo, fortes pressões são feitas pelos Estados

neoliberais quando se faz necessário para que outros Estados estabeleçam uma relação internacional

através do comercio e redes de financiamento, aderindo assim às reformas políticas para

―domesticação‖ do modelo econômico neoliberal.

Segundo Newell (2012), devido aos Estados aderirem aos ―acordos globais tais como o Acordo Geral

sobre Comércio de Serviços (GATS), sujeitando-os a disciplina do mercado (Movimento de

Desenvolvimento Mundial, 2002), acabam colocando em risco a garantia de certos direitos (inclusive

de seus recursos ambientais) que são cruciais para o desenvolvimento destes países, e comprometem

sua autonomia e o meio ambiente. Assim, conforme Wade84

(2003 apud NEWELL, 2012:9) e

79 Ohmae, K. (2004) The end of the nation state. In F. Lechner and J. Boli (eds.)The Globalization Reader. Malden, MA: Blackwell Publishers, 214–218. 80 Hirst, P., G. Thompson and S. Bromley (2009) Globalization in Question, 3rd edn. Cambridge: Polity Press. 81

Weiss, L. (1998) The Myth of the Powerless State. Cambridge: Polity Press.

82 Görg, C. and U. Brand (2006) Contested regimes in the international political economy: global regulation of genetic resources and the internationalisation of the state. Global Environmental Politics 6(4): 101–123. 83 Newell, P. (2008b) Lost in translation? Domesticating global policy on GMOs: comparing India and China. Global Society 22(1): 117–138. 84 Wade, R. (2003) What strategies are viable for developing countries today? The WTO and the shrinking of

development space. In J. Timmons Roberts and A. Bellone Hite (eds.) (2007) The Globalization and Development Reader. Oxford: Wiley-Blackwell.

Page 16: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Gallagher85

(2005 apud NEWELL, 2012:9), os modelos de desenvolvimento adotados nestes Estados,

disciplinados pelo neoliberalismo, acaba por limitar sua capacidade destes para alavancar a economia

devido a esta dependência criada com os investimentos estrangeiros e, consequentemente, enfraquece a

soberania nacional. Desse modo, ―as alegações genéricas‖ sobre a ―impotência do Estado‖ de não

suportar a pressão dos Estados poderosos e aderir ao modelo neoliberal, deflagra programas políticos

nacionais fracos, sabotados pelas ―elites políticas transnacionais‖ (NEWELL, 2012). Segundo Joyeeta

Gupta (2007:462), no discurso dos oito países mais poderosos do mundo (G8), o objetivo da

globalização é fazer funcionar as estratégias de redução da pobreza e manter a economia global forte,

dinâmica, aberta e crescente, porém, os G77 argumentam que os países do sul não compartilham dos

benefícios da globalização, e mesmo, que são excluídos deste processo provocando assimetrias e

desequilíbrios no eixo Norte-Sul, e ―a cooperação internacional para o desenvolvimento tem sido

subestimada na agenda da comunidade internacional‖.

A globalização, neste contexto, remete à capacidade das forças do capital para moldarem os Estados

que possuem legislações ambientais mais rigorosas, ou instalar as plantas de produção em Estados com

legislação ambientais mais flexíveis - deslocadas diante desta facilidade – a depender da autonomia e

―desenvolvimento‖ destes países, segundo Vogel86

(1997) e Neumayer87

(2001a,b), ou como explicou

Gallagher88

(2005), das condições propostas pelos políticos para investidores mais poderosos. Newell

(2001a apud NEWELL, 2012:20) ressalta o ―poder‖ das corporações para subordinar os Estados mais

rigorosos a adotarem novas medidas e impor ―menos custos aos negócios que superam a

concorrência‖, inclusive ―conter as iniciativas dos ativistas‖ que deflagram empresas transnacionais

operando no exterior somente com o objetivo da ―fuga do carbono‖, não aderindo aos ―custos devido

ao controle de emissões de carbono‖ em seus países. Estas forças sociais que impulsionam ―o poder

estrutural do capital‖ (termo cunhado por Gill e Law89

, 1989) para moldar as decisões dos Estados

menos poderosos, segundo Newell (2012), abrange uma dimensão transnacional, e para Cox90

(1981,

1987 apud NEWELL, 2012), essa força é determinante em seu equilíbrio ao impor qual será a ―forma

de ordem política global‖ ambiental existente.

Outro aspecto relevante, observado por Newell (2012:25), diz respeito à produção dos resíduos tóxicos

e contaminação de locais através das estratégias globais de acumulação onde a produção é deslocada

85

Gallagher, K. (ed.) (2005) Putting Development First: The Importance of Policy Space in the WTO and

International Financial Institutions. London: Zed Books. 86 Vogel, D. (1997) Trading Up: Consumer and Environmental Regulation in the Global Economy, 2nd edn. Cambridge, MA:

Harvard University Press. 87 Neumayer, E. (2001a) Do countries fail to raise environmental standards? An evaluation of policy options addressing

‘regulatory chill’. International Journal of Sustainable Development 4(3): 231–244. Neumayer, E. (2001b) Pollution havens: an analysis of policy options for dealing with an elusive phenomenon. Journal of Environment Development 10(2): 147–177. 88 Gallagher, K. (ed.) (2005) Putting Development First: The Importance of Policy Space in the WTO and International

Financial Institutions. London: Zed Books. 89

Gill, S. and D. Law (1989) Global hegemony and the structural power of capital. International Studies Quarterly 33: 475–

499 90

Cox, R. (1981) Social forces, states and world orders: beyond International Relations theory. Millennium 10(2): 126–155.

Cox, R. (1987) Production, Power and World Order. New York: Columbia University Press.

Page 17: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

para países com legislação mais flexível ou fraca, de modo a não interromper a produção, e se

distanciar dos locais de consumo. Nesse contexto, como explica Harvey91

(1981) e Okereke92

(2010), a

constituição dos espaços fixos, através do deslocamento de plantas de produção ou mesmo em acordos

de ―fuga do carbono‖, revela ―o patrimônio como principio organizador fundamental na governança

ambiental neo-liberal‖. Sklair93

(2002a) observa na internacionalização de alguns Estados, a adesão à

classe capitalista transnacional, decorrente do modo como as instituições públicas responsáveis pelo

comércio e/ou finanças, concedem às corporações certos poderes e privilégios com os investimentos

nos acordos comerciais em detrimento de outras políticas voltadas para o trabalho, o social e o

ambiental. Dessa forma, é notável o modo como as forças sociais (as burocracias estatais

globalizantes) vão influenciar de forma estrutural a composição da globalização, e Gill94

(1995b)

descreve esse fenômeno como a manifestação de um ―novo constitucionalismo‖, ou seja, de ―um

quadro político-jurídico para a reconstituição do capital em escala mundial‖ (apud NEWELL,

2012:25).

A Globalização Naturalizada

O caráter aparentemente descontrolado da globalização é descrito tanto na literatura que o considera

―natural‖, devido à evolução do ―expansionismo do capitalismo‖, desde seu surgimento no século XIII

(do capitalismo comercial-industrial-financeiro), enfatizado tanto por Harvey95

(2010 apud NEWELL,

2012:9) quanto por Marx e Engels96

(1848 apud NEWELL, 2012:9), como também enquanto um

fenômeno contemporâneo ‗indomável‗ defendido por Lewis97

(1996 apud NEWELL, 2012:9) e

Rosenburg98

(2000 apud NEWELL, 2012:9). Conforme a literatura analisada por Newell (2012), as

tendências políticas que se valem da ideologia de uma globalização naturalizada e ―inevitável‖

adaptando os Estados-nação à ―máquina sem condutor‖, por exemplo, a de Kaplinsky (2001 apud

NEWELL, 2012:9), representa para Newell (2012) e Mittelmann (2000 apud NEWELL, 2012:10),

uma abstenção teórica ao não tratar da intervenção do ator político de modo a apresentar a

globalização como um fenômeno ―apolítico e benigno‖, e com isto, impedir a realização de um projeto

promissor de desenvolvimento sustentável. Destarte,

[...] Enfatizar a inevitabilidade e linearidade do processo de globalização serve para

consolidar a visão de que os Estados têm de se adaptar, ao invés de direcionar, as

mudanças que ocorrem na economia global. Por isso, ele executa uma função

91 Harvey, D. (1981) The spatial fi x: Hegel, von Thünen and Marx. Antipode 13(3): 1–12. 92 Okereke, C. (2010) Global Justice and Neoliberal Environmental Governance: Sustainable Development, Ethics and

International Co-operation. London: Routledge. 93 Sklair, L. (2002a) The transnational capitalist class and global politics: deconstructing the corporate-state connection.

International Political Science Review 23(2): 159–174. 94 Gill, S. (1995b) Theorising the interregnum: the double movement and global politics in the 1990s. In B. Hettne (ed.)

International Political Economy. London: Zed Books, 65–99 95

Harvey, D. (2010) Enigma of Capital and the Crises of Capitalism. London: Profile Books. 96

Marx, K. and F. Engels (1998) [1848]. The Communist Manifesto. London: Verso. 97

Lewis, N. (1996) Introduction. In V.I Lenin, Imperialism: the Highest Stage of Capitalism. London: Pluto Press. 98

Rosenburg, J. (2000) The Follies of Globalization Theory. London: Verso.

Page 18: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

ideológica importante: a de legitimação de algumas opções de política, alegando que

estas não são mais sustentáveis, e a promoção de outras como inevitáveis e desejáveis.

Os discursos de inevitabilidade absorvem os governos da culpa pelas consequências

de alegar que eles não têm controle (NEWELL, 2012:10).

Desse modo, como a literatura abarca a globalização como um fenômeno sem controle, propiciado

pelo capital volátil e flexibilização das corporações transnacionais, não se sustenta teoricamente.

Sobretudo, como o Newell (2012) mesmo afirma, esse fenômeno tem ―sempre sido, e continua a ser

impulsionado por ações deliberadas‖, principalmente no modo evidente como ―os governos tem se

submetido às Organizações Mundiais‖, desenvolvendo ―acordos jurídicos para promover e proteger

direitos de investimento das empresas transnacionais‖ e apesar da retórica ambientalista, a ―nova

arquitetura financeira‖ ou criação de um Novo Acordo (Green New Deal) não se aplica rigorosamente

no controle do equilíbrio ambiental assegurado pelo Estado. Portanto, para o autor, ―a relação entre

globalização e o ambiente é mediada por políticas, instituições e processos desde o nível local até

global e no setor público e privado e não, em sua maior parte, anônimas e por forças econômicas

incontroláveis como convém a caricatura popular‖ (NEWELL, 2012:4).

Todavia, essa mesma retórica infundada é justificada com a alegação de perdas e prejuízos para o

Estado, tanto em relação à exploração dos recursos naturais e/ou a perda de competitividade e de

capital no mercado internacional, refletindo institucionalmente no próprio tratamento com o qual a

regulamentação ambiental -nacional e supranacional- conferem a aplicabilidade da legislação

internacional em âmbito local. Portanto, para Newell (2012:10), observar nas ―restrições que a

globalização na verdade impõe aos governos‖ a permissividade para ―desmistificar o mercado e

revelar as relações de poder por trás dessas abstrações‖. Segundo Newell (2012), o autor Polanyi99

(1980) quem melhor explicita o ―mito do mercado auto-regulado‖, em sua obra - a grande

transformação-, quando mostra que o mercado desenfreado é na verdade mantido pelo Estado através

de ideologias de governança econômica e gestão ambiental, legitimadoras do fenômeno da

globalização contemporânea enquanto o ―ponto final da evolução econômica‖, teorizado por

Fukuyama100

(1993 apud NEWELL, 2012:11) como ―o fim da história (the end of history and the last

man)‖.

Segundo Hoogvelt101

(1997 apud NEWELL, 2012:11) e Payne102

(2005 apud NEWELL, 2012:11), as

elites políticas do Norte Global influenciam a economia mundial no mundo pós-colonial através dos

mecanismos de condicionalidades e salvaguardas, reconhecendo o papel do Estado, porém,

pressionando-o para promover a globalização por meio de ações de retaliação e deslocamento dos

investimentos. Esses mecanismos são deflagrados nos Programas de Ajustamento Estrutural (PAE) e

Organizações Internacionais, nas ponderações dos relatórios do Banco Mundial, enrijecendo a

99

Polanyi, K. (1980) [1944] The Great Transformation. Boston, MA: Beacon Press.

100 Fukuyama, F. (1993) The End of History and the Last Man. New York: Avon Books. 101

Hoogvelt, A. (1997) Globalization and the Postcolonial World. Basingstoke: Macmillan. 102

Payne, A. (2005) The Global Politics of Unequal Development. Basingstoke: Palgrave.

Page 19: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

capacidade de resistência e autonomia dos Estados-nação menos poderosos no cenário internacional.

De todo modo, o discurso que considera ineficiente as instituições públicas responsáveis por gerir bens

básicos para a sobrevivência humana, como o abastecimento de água, tem tido respaldo nas bases

ideológicas encabeçadas pelo Banco Mundial, e segundo Bakker103

(2010), essa tentativa de

privatização da água tem demonstrado ser a solução mais óbvia para a política neoliberal. Conforme o

relatório apresentado pelo Banco Mundial104

(2003), a proposta é deixar que os mercados

coordenassem os serviços nos quais o Estado não consegue atender a demanda, acolhendo mais atores

privados através de ―uma evolução suave dos direitos de propriedade do coletivo para o privado‖

(apud NEWELL, 2012:27).

As Crises Cíclicas do Sistema e o Desenvolvimento Insustentável

A evolução das praticas agrícolas desde o neolítico e a divisão social do trabalho geraram por

consequência a produção de excedente e contribuíram para a expansão do comércio nas sociedades

produtoras de mercadorias que passaram a recorrer ao principio da equivalência como norma social e à

moeda como bem de troca (ALTVATER, 1998). Aquelas sociedades que conseguiam obter o

monopólio do sistema monetário atribuíam maior valor a sua moeda em detrimento de outras em

circulação. Do mesmo modo, a população capaz de acumular e produzir o excedente enriquecia e se

tornava a elite econômica nas cidades, adquiria privilégios, e mantinha seu status quo por meio da

constituição de projetos de dominação sob as classes menos favorecidas. Até então, nestas sociedades,

apesar da emergência dos problemas ambientais, somente a partir do contexto da globalização, os

limites dos desastres ambientais ganharam proporções globais. Como mostra Elmar Altvater (1998:22)

[...] a acumulação do excedente constituiu um projeto de dominação que nem a

Mesopotâmia nem a América Central, Leste Asiático e/ou Europa diminuíram a sobre-

exploração do ser humano (super-exploração) e da natureza (degradação ambiental). A

salinização (em Sumer), erosão do solo (na China e Mesoamérica), desflorestamento

(no Vale Indu e no Mediterrâneo) destruíram impérios mundiais que continuamos a

admirar por causa de seus vestígios culturais (escrituras, monumentos, descobertas na

astronomia, etc.) (ALTVATER, 1998:22).

No entanto, apesar de pouco enfatizado, o fato é que as sociedades humanas apresentaram em sua

dimensão espacial problemas ecológicos derivados dos impactos causados pelo alcance dos sistemas

energéticos adotados ao longo das eras históricas. A transição do uso de tecnologias rudimentares para

tecnologias energéticas mais complexas propiciou uma ―revolução‖ no alcance da produtividade das

atividades humanas, desde a acumulação do excedente para atender a demanda local e/ou global até

alcançar no século XVIII, o uso de fontes de energia fóssil, ou o que Lokta105

(1925) e Smil106

(1993)

103 Bakker, K. (2010) Privatising Water: Governance Failure and the World’s Urban Water Crisis. Ithaca: Cornell University

Press. 104 World Bank (2003) Dynamic Development in a Sustainable World: Transformation in the Quality of Life, Growth, and

Institutions. World Development Report. New York: Oxford University Press. 105 Lotka, A.J. (1925) Elements of Mathematical Biology, Baltimore, MD: Williams and Wilkins 106 Smil, Vaclav (1993) Global Ecology: Environmental Change and Social Flexibility, London: Routledge.

Page 20: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

denominam de ―forças exosomáticas‖, ou seja, aquelas cuja função é produzir energia externa, que está

fora do corpo humano.

Ancorado no paradigma da teoria Sistema-mundo (principalmente a ideia das sucessivas e

intermináveis ―crises do sistema político-econômico‖) e na teoria do materialismo histórico, Sing

Chew (2006) considera as crises ambientais como fundamentais para explicar as dinâmicas da

evolução e transformações dentro da própria configuração sistêmica de poder, observando na

reprodução do sistema natural o ponto de partida para conduzir o sistema social dentro da lógica de

consumo, e definir as regiões onde são alocadas as linhas de produção capitalista. Embora definido

como contraditório, o capitalismo, analisado sob a ótica da teoria do materialismo histórico, fornece

alguns elementos para identificar estas mudanças, principalmente se partirmos da assertiva de que o

consumo insaciável dos recursos naturais leva inevitavelmente à condição de crise. Nesse sentido,

Chew (2006) pretende ―reintroduzir à Natureza de volta para a análise social, e talvez seja a ecologia

no comando (“ecology in command”) em última instância, que induz as condições de crise do sistema‖

(CHEW, 2006:254).

Partindo desse pressuposto, com base numa ―visão nomotética‖ das crises cíclicas do sistema, Sing

Chew (2006) observa determinados fatores e condições encontrados nos indicadores de crises nos

sistemas naturais (desmatamento, salinização, etc.) ou contingencias da natureza - para além das

condições da estagnação econômica, tendências sócio-políticas, ou fatores antropogênicos sociais–

para estabelecer um período de duração de um ciclo, que pode variar de 50 a mil anos, entre momentos

de estagnação e as longas ondas de Kondratieff (de expansão), ou de 200 a 300 anos, sendo para Frank

e Gills107

(1993) crises recorrentes desde cinco mil anos atrás (apud CHEW, 2006:255). Para Chew

(2006), o enfoque da ―visão ideográfica‖ de Immanuel Wallerstein108

(1974; 1980), Modelski e

Thompson109

(1999) foca na analise do sistema mundo apoiada na concepção de elementos

contingenciais (escrita, inovação tecnológica, ideias culturais) e conjunturais (desurbanização,

invasões bárbaras, lutas pela hegemonia), levantando características específicas de cada período que

induz e condiciona à fase de desaceleração. A matriz analítica de crises sistêmicas adotadas para

circunscrever a crise do sistema e da transição, para Chew (2006:256), representam notavelmente ―os

pontos de transição, adaptação e evolução do sistema mundo‖.

Conforme Nicolas Georgescu-Roegen110

(1971), podemos nos remeter a diferentes revoluções

propiciadas pelo crescimento da produtividade. Para este autor, na transição da prática agrícola para a

produção industrial temos a ―Revolução Neolítica‖ e com a transição do uso da energia de carvão

107 Frank, Andre Gunder and B. K. Gills. 1993. “Bronze Age World System Cycles.” Current Anthropology 34(4):383–429. 108 Wallerstein, I. 1974–1980 The Modern World-System. Vols 1–3. New York: Academic Press. 109 Modelski, George and William Thompson. 1999. “The Evolutionary Pulse of the World System: Hinterland Incursion and Migrations 4000 B.C. to A.D. 1500.” Pp. 241–274 in World System Theory in Practice, edited by Kardulias, Nick. Lanham, MD: Rowman and Littlefield. 110 Georgescu-Roegen, Nicholas (1971) „The entropy law and the economic process in retrospect‟, Eastern Economic Journal 12, 1:3–25.

Page 21: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

vegetal para o combustível fóssil temos a ―Revolução de Prometeu‖, no qual se transformou os modos

de produção e a organização social e política da humanidade. Todavia, esse movimento revolucionário

partiu da Europa em direção as outras partes do mundo, intensificando a produtividade ao longo da

evolução do capitalismo e, consequentemente, ampliando a concorrência nos mercados internacionais

entre as corporações existentes. Singer (1997) explica que a evolução da hierarquia gerencial,

propiciado pela ―Revolução gerencial‖, contribuiu para monopolizar cada vez mais o capital por meio

do estabelecimento de ―tecnoestruturas‖ de descentralização administrativa – observando no fenômeno

da transição da firma empresarial familiar para a o controle gerencial das corporações no decorrer do

século XX.

Embora a Europa seja o berço da civilização, encabeçando grandes revoluções para fomentar o

desenvolvimento tecnológico no mundo, desde o século XVI, segundo Braudel111

(1977), Frank &

Gills112

(1993) e Ponting113

(1991), a negligencia destes governantes pode explicar as tendências de

desintegração dentro dos antigos impérios, e como enfatizou Crosby114

(1986), levou ao

expansionismo às terras no Atlântico e no hemisfério Leste, monopolizando a exploração de metais

preciosos e matérias-primas, culminando no enriquecimento dos Estados colonizadores europeus

(apud ALTVATER, 1998). Segundo Altvater (1998), as colônias beneficiaram os Estados europeus

tanto com o fornecimento de riquezas naturais, como por meio das emigrações da população excedente

(cerca de 50 milhões de indivíduos embarcam rumo ao novo mundo), onde além de diminuir o inchaço

dos centros urbanos europeus, contribuiu para a formação de novos mercados espalhados pelo mundo

(Américas, Austrália, Nova Zelândia, e África), e ainda como acrescenta Kindleberger115

(1985):

[...] Semelhante à prata Lauriana no caso de Atenas, a prata Latino-americana se

tornou um fator significante na acumulação capitalista primitiva na Europa Ocidental.

A importância da prata pode ser jugada pelo fato que no século XIX o império

Otomano, os estados Latino-americanos, os EUA e a Rússia czarista foram todos

endividados pelas potencias coloniais europeias - e algumas vezes foram para a

falência (KINDLEBERGER, 1985, p.213 apud ALTVATER, 1998, p.24).

Para tanto, Chew (2006:256) elabora o levantamento de dados históricos ―concretos‖ para elucidar as

inúmeras crises do sistema, abordando os ―fatores antropogênicos organizacionais que assola os

sistemas naturais‖ e desencadeia a transformação do sistema mundial (social), além de buscar os

limites das mudanças ecológicas e climáticas que afetam a reprodução desse sistema de forma

independente. Embora haja controvérsias quanto as fases de crises do sistema, algumas abordagens

vão considerar apenas dois ciclos – da Idade do Bronze (3300 a.C.) e da Idade das Trevas (2200 a.C.)

– normalmente, envolvendo a análise dos aspectos do contexto político, social, econômico e ambiental

111 Braudel, Fernand (1977) Afterthoughts on Material Culture and Capitalism, trans. Patricia M.Ranum, Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press. 112 Frank, André Gunder and Gills, Barry K. (1993) „World system economic cycles and hegemonial shift to Europe 100 BC-AD 1500‟ The Journal of European Economic History 22, 1:155–83. 113 Ponting, Clive (1991) A Green History of the World: The Environment and the Collapse of Great Civilizations, Harmondsworth: Penguin. 114 Crosby, Alfred (1986) Ecological Imperialism: The Biological Expansion of Europe, 900–1900, Cambridge: Cambridge University Press (Deutsch: Die Früchte des weissen Mannes, Darmstadt). 115 Kindleberger, Charles (1985) A Financial History of Western Europe, London: Allen and Unwin.

Page 22: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

de um determinado povo e período. Contudo, como explica Chew (2006), esse impacto pode ser maior

no centro do sistema-mundo, e se expandir paulatinamente para a periferia, sobretudo, por que:

[...] a degradação ecológica em escala mundial, dependeu da extensão (geográfica)

atingida pelo sistema mundial. No entanto, os impactos socioeconômicos e ecológicos

da Idade das Trevas não se estendem necessariamente e uniformemente através das

fronteiras geo-espacial do sistema mundial. Dependendo das conexões sistêmicas da

economia mundial em um determinado ponto no tempo, e o nível de intensidade do

sistema social e as conexões naturais do sistema experimentadas por uma determinada

região, a extensão do impacto é desigual (CHEW, 2006:258).

Desse modo, para apreender os impactos ambientais diretos na periferia, é necessário observar os

vários processos econômicos e políticos que incorporam e conectam o centro do sistema com o resto

do mundo. Segundo Weiss116

(1993; 2000) e Weiss & Bradley117

(2001), as mudanças climáticas e

desastres naturais que ocorreram durante a Idade das Trevas geraram muitos desafios para a

reprodução do sistema social, que levaram a migrações nômades e causaram turbulências nos centros

políticos devido a novas pressões advindas com o deslocamento populacional e alteração das

exportações no comércio exterior (apud CHEW, 2006). Como Chew (2006:258) enfatiza, essas

mudanças se observadas como ―oportunidades para resolução das contradições‖, além de inibir a

reprodução do sistema mundial, provoca uma reorganização do mesmo, senão acarretaria no próprio

colapso do sistema. Assim, os limites ecológicos se tornam divisores de água na definição dos novos

rumos do sistema-mundo e, portanto, ―a redução da escala dos processos socioeconômicos durante a

Idade Média ofereceu a oportunidade para a Natureza se recuperar‖ numa escala de tempo entre 500 a

900 anos. Nesse sentido,

[...] para a periferia, as crises do sistema na Idade Média, permitiu que algumas áreas

periféricas voltassem a articular-se dentro da matriz hierárquica dos processos de

produção sazonal do sistema mundial. Esta oportunidade está aberta apenas durante

períodos de crise do sistema e tem sido explorada por alguns através do curso da

história do mundo desde 3000 a.C. (CHEW, 2006:259).

A necessidade da humanidade em se expandir geograficamente e buscar sempre novas fontes de

recursos naturais (minerais e matéria-prima) propicia a formação de novas organizações sociais e

produção tecnológica. Notoriamente, as fases de transição da Idade da Pedra, para a Idade do Ferro e

do Bronze, denotam estes processos sociais, políticos e econômicos, que ―variam de convulsões sociais

(revoltas, guerras, etc.) e luxações (tais como migrações), a mudanças cultural/ideológicas (surgimento

de visões de mundo religiosas), juntamente com reorganizações sociais e políticas‖ (CHEW,

2006:259) e ―mudanças sociais evolutivas‖. Tanto no mundo antigo, como no medieval, as tendências

históricas são caracterizadas por um ―sistema de sobreposição de regiões centrais‖ sobre áreas

periféricas, abrangendo vastos territórios, e através do controle politico-militar são formados

poderosos impérios e novas conexões sistêmicas de comércio, e novas crises reverberam ―em todo o

116 Weiss, H. et al. 1993 “The Genesis and Collapse of Third Millennium Northern Mesopotamian Civilization.” Science 261:995–1004. Weiss, H. et al. 2000. “Beyond the Younger Drayas.” Pp. 75–98 in Environmental Disaster and the Archaeology of Human Response, edited by G. Bawden and R. Reycraft. Albuquerque, NM: University of New Mexico Press. 117 Weiss, H. and Bradley, R. 2001. “Archaeology: What Drives Societal Collapse.” Science 291(5504):609–610.

Page 23: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

sistema fornecendo oportunidades e constrangimentos, dependendo das circunstâncias‖ (CHEW,

2006:300). Em suma, os principais condutores destes processos do sistema social (mundial), onde

deflagra a interação entre o social e o natural, são: a acumulação de excedentes, urbanização e

crescimento populacional, e as crises, que por sua vez, são exatamente o colapso atribuído aos

excessos desses fatores na dinâmica do mundo social. Portanto,

´[...] visto da perspectiva da natureza, tais processos históricos mundiais (urbanização

e acumulação), induziu uma contínua e degradante transformação da paisagem. Ás

árvores foram removidas pela agricultura e para satisfazer as necessidades de energia e

materiais das comunidades urbanizadas. Os vales foram escavados por canais para

fornecer irrigação para as culturas e para o transporte de pessoas e bens. Outras terras

foram desenterradas por seus recursos naturais e materiais de construção. Tais

atividades humanas em larga escala, tais como o desmatamento levou a erosão do solo

nas montanhas e colinas, e o impacto contínuo das atividades humanas agravaram

ainda mais o processo. Os Rios foram represados. Ao todo, atividades

socioeconômicas, juntamente com as guerras foram transformando a paisagem com

cicatrizes revelando a escala de tais atos (CHEW, 2006:261).

Com isto, Chew (2006:261) procura explanar historicamente a degradação ecológica mundial

observando o nível e a escala de exploração dos recursos naturais pelo centro e nas regiões onde se

perpetuou o domínio do ambiente espacial. Todavia, essas mesmas mudanças climáticas e os processos

de erupções naturais provocadas pela ação antropogênica ―afetaram as paisagens sociais, políticas e

econômicas‖ incitando agitações populacionais e crises sistêmicas no sistema-mundo. Childe118

(1942), Bell119

(1971) e Chew120

(2001) mostram que antigamente:

[...] uma tal crise sistémica ou Idade das Trevas começou por volta de 2200 a. C.,

atingindo inicialmente noroeste da Índia, o Golfo, Mesopotâmia, Egito e Ásia

Ocidental, e teve repercussões para as principais áreas urbanizadas, como a

Mesopotâmia, Indo, e o Egito. Após esta fase da crise que terminou por volta de 1700

a. C., novos centros de poder surgiram no Oriente Médio, norte da Mesopotâmia e do

Mediterrâneo oriental. Esta crise sistémica ressurgiu por volta de 1200 a. C. no nível

do sistema social e continuou até 700 a.C., com impacto sobre as principais áreas da

Ásia Ocidental, Egito, Mediterrâneo Oriental e Europa Central (de 800 a.C. em diante)

(CHEW, 2006:262).

Embora não pareça evidente, e como ressalta Stanislawski121

(1973), Snodgrass (1971) e Chew (2006),

o período de escuridão – a Idade das Trevas, dessa forma, deve ser na verdade considerada como um

momento de iluminação, sobretudo, devido à escassez ecológica de recursos naturais gerar resultados

positivos e, sem isto, de outro modo, não beneficiaria o sistema natural para sua restauração,

propiciando no caso da Grécia antiga, o surgimento das polis e cidades-estados e o fim dos palácios no

Mediterrâneo oriental, apresentando uma nova configuração de urbanização e formação das

comunidades isoladas, propiciando o florescimento de um novo estilo de vida política e econômica.

118 Childe, Gordon. 1942. What Happened in History. Harmondsworth: Penguin. 119 Bell, Barbara. 1971. “The Dark Ages in Ancient History I: The First Dark Age in Egypt.” American Journal of Archaeology 75:1–20. 120120 Chew, Sing C. 2001. World Ecological Degradation: Accumulation, Urbanization, and Deforestation 3000 B.C.–A.D. 2000. Walnut Creek, CA: Alta Mira. 121 Stanislawski, D. 1973. “Dark Age Contributions to the Mediterranean Way of Life.” Annals of the Association of American Geographers 63(4):397–410.

Page 24: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Portanto, a transformação e crises do sistema, na Idade do Bronze, contribuíram para a recuperação

ecológica, realinhamento político e econômico, e a transição para a Idade do Ferro, consequentemente,

levando à evolução dos conjuntos de padrões culturais e sociais. Com as transformações na chegada da

Idade do Ferro, enfatiza Gordon Childe122

(1942), trouxeram novas oportunidades de crescimento a

nível local para o desenvolvimento da agricultura, da indústria, e mesmo das guerras, devido à ampla

disponibilidade de ferro nas localidades por um preço muito barato e/ou acessível. Como explica

Polanyi123

(1977) e Chew (2006):

[...] Por toda a Europa, Mediterrâneo e Oriente Próximo, o cultivo foi feito mais fácil

com arados de ferro em solos argilosos pesados. Isso permitiu que as comunidades

rurais participassem mais ativamente da economia além da subsistência e manteriam

uma classe de mineiros, fundições, e ferreiros de metal [...] e tem ligado a adoção de

ferro para os níveis de produtividade nas comunidades rurais no sul da Rússia, Itália,

África do Norte, Espanha, Gália, Alemanha, e da Eurásia. O aumento da produção

pode ser visto pelas flutuações nos preços dos grãos. A consequência dessas

transformações é que as elites urbanas no Oriente Próximo, que no passado

controlavam o comércio de grãos e outras mercadorias (commodities), sofreram perdas

como consequência de variações de preços e da queda da demanda do cobre, estanho,

e do comércio de bronze que eles também controlavam (CHEW, 2006:287).

O que a literatura pretende explanar sobre a globalização, remete ao modo como o capitalismo

moderno foi construído sobre bases insustentáveis, tanto do ponto de vista ambiental quanto

socioeconômico, e principalmente nos tempos atuais onde as crises do sistema estão em maior

evidência devido às alterações climáticas, e a pressão popular para controlar a regulação de empresas

privadas sobre as legislações nacionais, ou na proposta de Alexandre Faria (2002) por uma política

ambiental de ―etnoconservação‖. Para Lipschultz e Rowe (2005), esse ―poder e autoridade‖ das

empresas transnacionais estabelecerem ―regras de condutas‖ e receber certificações demonstra de certo

modo a capacidade destas instituições privadas para tomar decisões e definir a economia global.

Segundo Peet et.al124

(2011), a partir da década de 70, com a intensificação e/ou aceleração da

globalização, houve um aumento também da quantidade de carbono liberado na atmosfera, acarretando

numa série de medidas para que os empreendimentos imperiais se dispusessem de outras fontes

energéticas, senão aquelas que vinham apresentando certa vulnerabilidade no mercado, como era o

caso do petróleo. Dessa maneira, como explica Houtart125

(2009) e Smith126

(2010), outros países

adotaram o uso de biocombustíveis, porém, isso implicou no aumento de preço de produtos da

alimentação básica – exemplo, o milho – gerando até revoltas domésticas (revolta das Tortilhas no

México) e, conforme Borras et.al127

(2011), o esgotamento de recursos necessários para a

sobrevivência da população local/nacional em detrimento da exportação rentável (exemplo da Etiópia

122 Childe, Gordon. 1942. What Happened in History. Harmondsworth: Penguin. 123 Polanyi, Karl. 1977. The Lifelihood of Man. Edited by Harry Pearson. New York: Academic Press. 124 Peet, R., P. Robbins and M. Watts (eds.) (2011) Global Political Ecology. London: Routledge. 125 Houtart, F. (2009) Agro-fuels: Big Profi ts, Ruined Lives and Ecological Destruction. London: Pluto Press. 126 Smith, J. (2010) Biofuels and the Globalization of Risk: The Bigg est Change in North-South Relationships Since Colonialism? London: Zed Books. 127 Borras, J., R. Hall, I. Scoones, B. White and W. Wolford (2011) Towards a better understanding of land grabbing. The Journal of Peasant Studies 38(2): 209–217.

Page 25: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

e Sudão exportando para a China). Segundo Newell (2012), a disputa por combustíveis fósseis sempre

representou uma necessidade dos países mais ricos de ampliar a produção e fornecimento ao se

lançarem na corrida por novas fontes energéticas em outros territórios (no caso do Oriente Médio

principalmente), sendo para Freese128

(2003), Kaldor et.al129

(2007) e Rupert130

(1995), essa a principal

estratégia dos EUA e Inglaterra para promover sua revolução industrial. Todavia, o que estes autores

argumentam é se as crises do petróleo levaram à necessidade de mudanças para a adoção de novas

fontes energéticas ―limpas‖, como observou Newell e Paterson (2010 apud NEWELL, 2012), e as

mudanças climáticas refletem a crise do capitalismo, conforme argumenta Brunnengräber131

(2006), ou

como coloca Huber132

(2008) a verdade é que a relação histórica entre o uso de combustível fóssil e o

capitalismo estão imbrincadas.

A ideia de um capitalismo resiliente também está presente na obra de Altvater133

(2006), onde revela o

modo como o capitalismo existente representa senão a revolução das formas de produção

estimuladoras das ―oportunidades de crescimento‖, como afirmou Marx e Engels (1848), que a classe

burguesa somente pode existir se revolucionar ininterruptamente os meios de produção. Nessa

perspectiva, as tecnologias adotadas (atualmente o petróleo) representam essa ―oportunidade de

crescimento‖ e podem com o tempo ser substituídas por outras tecnologias sendo, portanto, esse

―dinamismo tecnológico‖ central para o capitalismo, embora sua adoção também possa se permanecer

ininterruptas no decorrer do tempo.

Segundo Newell (2012:24), o capitalismo ―só se preocupa com sua própria auto-expansão e

valorização‖. Esse impulso para procura de ―oportunidades de crescimento‖ tem levado algumas

ONGs a pressionar os detentores do capital financeiro para investir em outros tipos de produções,

embora como enfatizou Newell (2012), investir em combustíveis fosseis seja ainda a oportunidade

mais lucrativa apesar das mudanças ambientais que este provoca, o que continua atraindo o

investimento de recursos e fornecendo produtos altamente especializados desse recurso. Como coloca

Karem Mingst e James Muldoon (2015) para essa governança global ser legítima, não pode ser

enquadrada como um projeto econômico americano, ocidental, ou liberal só sendo compatível com o

poder e as preferências dos Estados Unidos, das multinacionais, ONGs do Norte, ou especialistas

ocidentais, pelo contrário, o imperativo para entregar bens públicos "globais" é moldar a visão das

pessoas sobre a legitimidade das instituições de governança global sob a interface do ambientalismo.

128

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Cambridge University Press. 131 Brunnengräber, A. (2006) The political economy of the Kyoto Protocol. In L. Panitch and C. Leys (eds.) Coming to Terms

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Terms with Nature: Socialist Register 2007. London: Merlin Press, 37–60.

Page 26: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Outro aspecto relevante levantado por Newell (2012:25), diz respeito à produção dos resíduos tóxicos

e contaminação de locais através das estratégias globais de acumulação onde a produção é deslocada

para países com legislação mais flexível ou fraca, de modo a não interromper a produção, e se

distanciar dos locais de consumo. Nesse contexto, como explica Harvey134

(1981) e Okereke135

(2010),

a constituição dos espaços fixos, através do deslocamento de plantas de produção ou mesmo em

acordos de ―fuga do carbono‖, revela ―o patrimônio como principio organizador fundamental na

governança ambiental neo-liberal‖. Sklair136

(2002a) observa na internacionalização de alguns Estados,

a adesão à classe capitalista transnacional, decorrente do modo como as instituições públicas

responsáveis pelo comércio e/ou finanças, concedem às corporações certos poderes e privilégios dos

investidores nos acordos comerciais em detrimento de outras políticas voltadas para o trabalho e o

social. Isso é notável no modo como as forças sociais (as burocracias estatais globalizantes) vão

influenciar de forma estrutural a composição da globalização, e Gill137

(1995b) descreve esse

fenômeno como a manifestação de um ―novo constitucionalismo‖, ou seja, de ―um quadro político-

jurídico para a reconstituição do capital em escala mundial‖ (apud NEWELL, 2012:25).

Como mostra Bernstein138

(2001), esse ―compromisso do ambientalismo liberal‖ sustenta os pilares

normativos da governança ambiental global de modo a criar estratégias que consigam fazer frente às

crises ambientais cíclicas e se alinhar aos ―imperativos da acumulação do capital‖ (NEWELL,

2012:25). Ou seja, a ordem liberal conduz a ordem ambiental através da mercantilização dos serviços

ambientais, por exemplo, da proteção e conservação de recursos naturais por meio de compensações

financeiras para comunidades afetadas, privatização da água em áreas inóspitas e de venda da quota de

carbono para países desenvolvidos que queiram comprar e ―manter a estrutura de produção existente e

o consumo intacto‖. De todo modo, o discurso que considera ineficiente as instituições públicas

responsáveis por gerir bens básicos para a sobrevivência humana, como a água (o bem mais precioso

no futuro), tem tido respaldo nas bases ideológicas encabeçadas pelo Banco Mundial, e segundo

Bakker139

(2010), essa tentativa de privatização da água tem demonstrado ser a solução mais obvia

para a política neoliberal. Conforme o relatório apresentado pelo Banco Mundial140

(2003), a proposta

é deixar que o mercado coordenasse os serviços nos quais o Estado não consegue suprir a demanda,

acolhendo mais atores privados através de ―uma evolução suave dos direitos de propriedade do

coletivo para o privado‖ (apud NEWELL, 2012:27).

134 Harvey, D. (1981) The spatial fi x: Hegel, von Thünen and Marx. Antipode 13(3): 1–12. 135 Okereke, C. (2010) Global Justice and Neoliberal Environmental Governance: Sustainable Development, Ethics and

International Co-operation. London: Routledge. 136 Sklair, L. (2002a) The transnational capitalist class and global politics: deconstructing the corporate-state connection.

International Political Science Review 23(2): 159–174. 137 Gill, S. (1995b) Theorising the interregnum: the double movement and global politics in the 1990s. In B. Hettne (ed.)

International Political Economy. London: Zed Books, 65–99 138 Bernstein, S. (2001) The Compromise of Liberal Environmentalism. New York: Columbia University Press. 139 Bakker, K. (2010) Privatising Water: Governance Failure and the World’s Urban Water Crisis. Ithaca: Cornell University

Press. 140 World Bank (2003) Dynamic Development in a Sustainable World: Transformation in the Quality of Life, Growth, and

Institutions. World Development Report. New York: Oxford University Press.

Page 27: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

Nesse sentido, para Chew (2006), os colapsos do sistema natural – e idade das Trevas - podem ser

percebidos como oportunidades para ascensão de novos sistemas sociais, e evidenciar a evolução do

sistema mundial demarcando os limites sistêmicos da reprodução do sistema, e as contradições da

estrutura econômica baseada na acumulação e produção de excedentes. E como o autor enfatiza,

[...] ao longo da história do mundo, esta recalibração foi principalmente focada em

encontrar novas áreas virgens para a extração de recursos naturais e também o

desenvolvimento de novas tecnologias para substituir os que não foram tão eficientes.

Em alguns casos, novas ideias surgem como orientação operacional para a vida

humana. Esse tem sido o curso da história mundial (CHEW, 2006:289).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O debate presente visa explorar a questão sobre se realmente o rumo da economia global

contemporânea consegue ser compatível com a ideia de desenvolvimento sustentável introduzido

como o principal ponto de partida das respostas institucionais. O caráter paradoxal do panorama

econômico global em contraste com a proposta da sustentabilidade ambiental é o cerne desse artigo.

Parafraseando Newell (2012:3), ―o destino da economia e do planeta estão intimamente entrelaçados‖

e, portanto, ―a história e evolução da globalização tem tido uma influência profunda sobre a natureza

da política ambiental, assim como os problemas ecológicos trazem mudanças na natureza da

globalização". A obra o ―Capital‖, de Karl Marx, também descreve essa relação entre a produção de

riqueza e a exploração da matéria-prima. Ou seja, as contradições intrínsecas do capitalismo são

evidentes nas crises dos sistemas ecológico e social, de modo que a globalização não se sustenta sem

as condições materiais para tal expansão. O modo capitalista contemporâneo em acumular, produzir e

consumir numa escala global deflagra um cenário cujos beneficiados representam uma parcela ínfima

da população mundial, enquanto os efeitos causadores das alterações climáticas afetam em nível local

partes do mundo até mesmo onde a economia global não alcançou uma base sólida. Como Guerra

(2010) afirma, os problemas ambientais são evidentemente transnacionais e, portanto, as respostas

institucionais devem ser conduzidas pelos atores no plano global, ou por meio de uma Organização

Internacional do Meio Ambiente, na qual submeta a soberania dos Estados a uma regulamentação

internacional, a fim de proteger o gênero humano nessa ‗era‘ consumista, ou protegermos de um

desenvolvimento desmoralizado, conforme a noção cunhada por Vanessa Pupavac (2005), que

repercute na perpetuação de um desenvolvimento insustentável.

Page 28: A Ordem Ambiental Global no contexto paradoxo da Globalização

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