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A ordem do discurso – Foucault - A conceito de interdição (proibição) no discurso surge como um procedimento comum no discurso, nascido como um princípio de exclusão ; não se pode dizer tudo em qualquer circunstância, não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa. - As áreas da sexualidade e política aparecem como as de mais extensa grade de interdições. É nelas que o discurso exerce de modo mais privilegiado, os seus poderes. Estas interdições revelam rapidamente a ligação do discurso com o desejo e com o poder. - Foucault diz que o discurso não é apenas o canal pelo qual se manifesta ou se oculta o desejo, é também ele próprio objeto do desejo; assim como o discurso não somente traduz o sistema de dominação político, mas é aquilo pelo que se luta; a prerrogativa do poder de que queremos nos apoderar. - Há outro princípio de exclusão em nossa sociedade: separação e rejeição. Foucault exemplifica com razão e loucura, retomando a Idade Média como início do tempo em que o louco passou a ser aquele cujo discurso não pode circular como o dos outros: a palavra do louco ou era absolutamente destituída de significação ritual e institucional, ou assumia valores de poder – como se fosse o louco capaz de enxergar com ingenuidade uma verdade que a sabedoria dos outros não alcançaria. Ou não se escutava o louco, ou dava-se a ele uma palavra de verdade. Caía-se no nada, ou nela se decifrava uma razão astuciosa. - Era nas palavras do louco que se reconhecia sua loucura e onde se exercia a separação - Hoje é possível que digam que, pela atenção que pode ser dispensada às palavras do louco, essa separação já não é aplicável; mas cai nisto um equívoco claro: é justamente este aparato todo, institucional e moral, que permite que o louco diga ou retenha sua palavra, que atesta a existência separação que, longe de apagada, se exerce de outro modo, segundo linhas distintas e com efeitos que não são os mesmos.

A Ordem Do Discurso - Foucault

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resumo conceitual de A Ordem do Discurso - Foucault

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A ordem do discurso – Foucault

- A conceito de interdição (proibição) no discurso surge como um procedimento comum no discurso, nascido como um princípio de exclusão ; não se pode dizer tudo em qualquer circunstância, não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa.

- As áreas da sexualidade e política aparecem como as de mais extensa grade de interdições. É nelas que o discurso exerce de modo mais privilegiado, os seus poderes. Estas interdições revelam rapidamente a ligação do discurso com o desejo e com o poder.

- Foucault diz que o discurso não é apenas o canal pelo qual se manifesta ou se oculta o desejo, é também ele próprio objeto do desejo; assim como o discurso não somente traduz o sistema de dominação político, mas é aquilo pelo que se luta; a prerrogativa do poder de que queremos nos apoderar.

- Há outro princípio de exclusão em nossa sociedade: separação e rejeição. Foucault exemplifica com razão e loucura, retomando a Idade Média como início do tempo em que o louco passou a ser aquele cujo discurso não pode circular como o dos outros: a palavra do louco ou era absolutamente destituída de significação ritual e institucional, ou assumia valores de poder – como se fosse o louco capaz de enxergar com ingenuidade uma verdade que a sabedoria dos outros não alcançaria. Ou não se escutava o louco, ou dava-se a ele uma palavra de verdade. Caía-se no nada, ou nela se decifrava uma razão astuciosa.

- Era nas palavras do louco que se reconhecia sua loucura e onde se exercia a separação

- Hoje é possível que digam que, pela atenção que pode ser dispensada às palavras do louco, essa separação já não é aplicável; mas cai nisto um equívoco claro: é justamente este aparato todo, institucional e moral, que permite que o louco diga ou retenha sua palavra, que atesta a existência separação que, longe de apagada, se exerce de outro modo, segundo linhas distintas e com efeitos que não são os mesmos.

- Mesmo em seu papel de dar ouvidos à palavra livre do louco, é na manutenção do corte incisivo do médico que é feita a escuta. Se é necessário o silêncio da razão para curar o monstro, basta que o silêncio esteja alerta, e eis que a separação permanece.

- Foucault insinua incluir a oposição entre verdadeiro e falso como um terceiro princípio de exclusão, mas admite dificuldade em equipara-lo aos outros dois princípios, de grande arbitrariedade e construção histórica, princípios em perpétuo deslocamento, sustentados por um sistema de instituições que impõem e reconduzem; que não se exercem sem pressão, nem sem ao menos uma parte de violência. A separação entre verdadeiro e falso não é arbitrária, nem modificável, nem institucional, nem violenta.

- Porém, analisando sob uma perspectiva histórica, e alterando o eixo verdadeiro-falso para o eixo da vontade de saber e o tipo de separação que a rege, temos um sistema de exclusão (histórico e institucional) se desenhar.

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- Foucault traça uma breve genealogia do discurso: remontando a Grécia antiga, o discurso verdadeiro (discurso homogeneizante, de terror e supremo) era aquele da lei, dos sacerdotes, dos profetas, era o discurso que anunciava o que aconteceria e assim fazendo contribuía para a realização – se tramava com o destino e gerava adesão dos homens. Um século mais tarde a verdade do discurso residia não mais no que era ou no que fazia o discurso, e sim no que dizia: um dia a verdade saiu do ritual e alocou-se no próprio enunciado: seu sentido, forma, objeto, relação e referência. O discurso verdadeiro não é mais o discurso ligado ao exercício do poder.

- A partir desta vontade de verdade platônica, Foucault traça o surgimento da vontade de saber que se dividiu na criação de planos de objetos observáveis; a vontade de verdade passa a ter sua própria história: história dos planos de objetos, das funções e posições do sujeito conhecedor, dos investimentos técnicos, materiais e instrumentais do conhecimento.

- Esta vontade de saber, como os outros sistemas de exclusão, se apoia sobre um sistema institucional: é reforçada e reconduzida por um compacto conjunto de práticas (como a pedagogia, como o sistema de livros). Mas também é reconduzida pela forma como este saber é aplicado em uma sociedade, como é valorizado e distribuído, repartido e atribuído.

- Foucault afirma que esta vontade de verdade, apoiada sobre um suporte institucional de distribuição, tende a exercer pressão e um poder de coerção sobre outros discursos. Ele exemplifica o apoio buscado pela literatura no conhecimento da ciência como um exemplo; a ciência aqui assume papel de ‘discurso verdadeiro’. Também como exemplo, fala-se do caminho jurídico, que busca apoio nos saberes sociológico, psicológico, médico e psiquiátrico: como se a lei não pudesse ser mais autorizada na sociedade senão por um discurso de verdade.

- 3 sistemas de exclusão que atingem o discurso: a palavra proibida, a segregação da loucura e a vontade de verdade.

- Foucault coloca a vontade de verdade como o mais forte dos três sistemas; enquanto os dois primeiros perde sua força e se guiam em direção à força de verdade, esta busca retoma-los para modifica-los e fundamenta-los por sua própria conta. A vontade de verdade se reforça cada vez mais, tornando-se mais profunda e incontornável.

- A vontade da verdade muitas vezes não é vista como uma forma de exceção, embora se demonstre que é a mais forte e atuante das três. Por que será isso? O discurso verdadeiro não é mais aquele que responde ao desejo ou aquele que exerce o poder. O que está em jogo, senão desejo e poder? O discurso verdadeiro não pode reconhecer a vontade de verdade que o atravessa; e a vontade de verdade é tal que a verdade que ela quer não pode deixar de mascará-la.

- Assim, a verdade se aparece aos nossos olhos, olhos que ignoram a maquinaria que exclui todos aqueles que procuraram contornar essa vontade de verdade e recoloca-la em questão contra a verdade, justamente no ponto que justifica a interdição e definição da loucura.

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- Os pontos elaborados acima podem ser considerados como relativos aos procedimentos externos de delimitação e controle, que funcionam como sistemas de exclusão e põem em jogo o poder e o desejo.

- Pode-se também isolar um grupo de procedimentos internos, visto que são os discursos mesmo que exercem seu próprio controle; procedimentos que funcionam a título de classificação, ordenação, distribuição. Como se se tratasse de submeter outra dimensão do discurso: a do acontecimento e do acaso.

- Foucault exprime um desnivelamento entre os discursos: há os discursos que “se dizem” no correr dos dias, e que desaparecem com o ato da pronúncia; e os discursos centrais em atos novos de fala, que os retomam, transformam e falam deles, ou seja, os discursos que são ditos, permanecem ditos a estão ainda por dizer.

- Este segundo tipo seriam os discursos de textos religiosos e jurídicos, textos literários, científicos etc.

- Foucault passa então a falar sobre o comentário e sobre o desnível de um primeiro e segundo texto. O comentário, enquanto texto segundo, permite a construção indefinida de novos discursos, mas, por outro lado, o comentário não tem outro papel senão o de dizem o que já estava articulado silenciosamente no texto primeiro. O comentário deve dizer pela primeira vez aquilo que já havia sido dito e repetir aquilo que, no entanto, jamais havia sido dito.

- O comentário permite que o texto diga algo além de si mesmo, com a condição de que o texto mesmo seja dito e realizado.

- Há outro princípio de rarefação de um discurso que é complementar ao primeiro, até certo ponto: trata-se do autor. Autor aqui é o princípio de agrupamento do discurso, como unidade e origem de suas significações, como foco de coerência. Este princípio não é dominante e não reina todos os discursos.

- Nos domínios em que a atribuição a um autor é regra (literatura, ciência e filosofia), nem sempre esta função desempenha o mesmo papel. O autor na literatura, por exemplo, passa cada vez mais, a partir da Idade Média, a se reforçar, enquanto no discurso científico ele se enfraqueceu.

- O comentário limitava o acaso do discurso pelo jogo de identidade que teria a forma da repetição e do mesmo. Já o princípio do autor limita esse mesmo acaso pelo jogo de uma identidade que tem a forma da individualidade e do eu.

- As “disciplinas” seriam outro princípio de limitação. Também relativo e móvel, este princípio permite construir, mas de acordo com um jogo restrito. A organização das disciplinas se opõe ao princípio do comentário e do autor.

- Ao do autor, visto que a disciplina se define por um domínio de objetos, um conjunto de métodos, um corpus de proposições – tudo isto constitui um sistema anônimo à disposição de

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quem quer ou pode servir-se dele, sem que seu sentido ou validade estejam ligados a foi seu inventor.

- Ao do comentário pois em uma disciplina, diferentemente do comentário, o que se supõe na partida não é um sentido que precisa ser redescoberto, nem uma identidade que precisa ser repetida; é aquilo que é requerido para a construção de novos enunciados.

- Para que haja disciplina é preciso que haja possibilidade de formular, indefinidamente, proposições novas.

- A disciplina não é tudo o que possa ser dito de verdadeiro sobre alguma coisa; não é nem mesmo um conjunto de tudo o que pode ser aceito, a propósito de um mesmo dado, em virtude de um princípio de coerência ou sistematicidade. A medicina não é constituída de tudo o que se pode dizer de verdadeiro sobre a doença. Há para isso duas razões: primeira, a medicina, como qualquer outra disciplina, é feita tanto de erro quanto de verdades, erros que tem funções positivas, eficácia histórica. Além disso, é preciso que uma proposição responda a condições, em um sentido mais estrito e complexo, do que a pura e simples verdade: em todo caso, a condições diferentes. Ela precisa dirigir-se a um plano de objetos determinado.

- Para pertencer a uma disciplina uma proposição deve poder inscrever-se em certo horizonte teórico. Uma proposição deve preencher exigências complexas e pesadas para poder pertencer ao conjunto de uma disciplina; antes de poder ser declarada verdadeira ou falsa, deve encontrar-se “no verdadeiro”.

- Mendel, por exemplo, não foi reconhecido pelos botânicos de sua época, pois empregava métodos e se situava em um horizonte teórico estranho à biologia da época. Era um novo objeto que pedia novos instrumentos conceituais e novos fundamentos teóricos. Mendel dizia a verdade, mas não estava no “verdadeiro” do discurso biológico de sua época

- É possível dizer o verdadeiro no exterior selvagem, mas jamais nos encontraremos no verdadeiro senão seguindo as regras de uma “polícia” discursiva que devemos reativar em cada um de nossos discursos.

- A disciplina é um princípio de controle de produção do discurso. Ela fixa os limites pelo jogo de um identidade que tema forma de reatualização permanente das regras.

- Vê-se na fecundidade de um autor, na multiplicidade dos comentários, no desenvolvimento de uma disciplina, como que recursos infinitos para a criação dos discursos. Pode ser que sejam, mas não deixam de ser também princípios de coerção; e é possível que não se possa explicar seu papel positivo e multiplicador se não levarmos em consideração sua função restritiva e coercitiva.

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- Foucault passa afalar de um terceiro grupo de procedimentos que permitem o controle dos discursos, mas este procedimento não domina os poderes que eles têm, nem conjura os acasos de sua aparição: ele determina as condições de seu funcionamento, impões regras. É o ritual.

- O ritual precisa que exigências sejam satisfeitas; há pessoas qualificadas para o discurso. A rarefação aqui é dos sujeitos que falam.

- Discursos religiosos, judiciários, terapêuticos não podem ser dissociados dessa prática de ritual que determina aos sujeitos que falam propriedades singulares e papéis preestabelecidos.

- Houve também as “sociedades de discurso”, cuja função é conservar ou produzir discursos, mas para fazê-los circular em um espaço fechado, segundo regras estritas. As sociedade de discurso em seu sentido clássico já não existem mais, mas Foucault enuncia alguns exemplos (pgs.40-41) em que a não-permutabilidade do discurso e o segredo se fazem presentes em estruturas modernas – seja institucionalizado no livro, no sistema de edição, ou no segredo técnico e científico, da forma de circulação do discurso médico etc.

- à primeira vista alguns rituais podem ser associados a doutrinas, que carregam consigo, na verdade, a ideia de multiplicação e difusão de um mesmo discurso, e não da proibição deste, mas, em análise detalhada, Foucault afirma que a doutrina realiza uma dupla sujeição: dos sujeitos que falam aos discursos e dos discursos ao grupo, ao menos virtual dos indivíduos que falam. A doutrina liga os indivíduos a certos enunciados e lhes proíbe rodos os outros.

- Foucault coloca o sistema de educação como uma maneira política de manter ou modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e poderes que eles trazem consigo. O sistema de ensino aparece também como uma ritualização da palavra; qualificação e fixação de papéis aos sujeitos que falam; constituição de um grupo doutrinário ao menos difuso; senão uma distribuição e uma apropriação do discurso com seus poderes e seus saberes?

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- E o que a filosofia disse para responder e, talvez, reforçar esses jogos de limitações e de exclusões?

- Respondeu, em primeiro lugar, propondo uma verdade ideal como lei do discurso e uma racionalidade imanente como princípio de seu desenvolvimento, reconduzindo também uma ética do conhecimento que só promete a verdade ao próprio desejo da verdade e somente ao poder de pensa-la. [???]

- Reforçá-los por uma negação que recai desta vez sobre a realidade específica do discurso em geral.

- Desde o ‘fim’ dos sofistas, parece que o Ocidente se preocupou em garantir o menor espaço possível ao discurso, colocando-o como aporte entre o pensar e falar: um pensamento revestido de seus signos e tornado visível pelas palavras.

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- Se o discurso existe, o que pode ele ser senão uma leitura discreta do sentido que as coisas murmura? O logos que permite a elevação de singularidades ao conceito e permite que a consciência imediata desenvolva a racionalidade do mundo, é o próprio discurso que se encontra no centro da especulação.

- O discurso nada mais é do que a reverberação de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos e, quando tudo pode enfim tomar a forma de discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso pode ser dito a propósito de tudo, isso se dá porque as coisas podem voltar à interioridade silenciosa da consciência de si.

- Seja na filosofia do sujeito fundante, da experiência originária ou na filosofia da mediação universal, o discurso nada mais é do que um jogo de escritura (no primeiro caso), de leitura (no segundo caso) ou de troca (no terceiro caso). E essas troca, leitura e escritura jamais põem em jogo nada senão os signos. O discurso assim se anula na sua realidade, inscrevendo-se na ordem do significante.

- Esconde-se sob esta aparente veneração do discurso um temor, e daí os processos de interdições, supressões, fronteiras e limites começaram a se impor, dispostos de modo a dominar a grande proliferação do discurso. Para que a riqueza fosse aliviada de a sua parte mais perigosa e que sua desordem fosse organizada. Há um temor de tudo que possa haver de violento, descontínuo, combativo, de desordem, e de perigoso, no zumbido desordenado do discurso.

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- Foucault sublima algumas ‘exigências de método’ a reger o trabalho dele acerca do discurso: inversão, descontinuidade, especificidade, exterioridade.

- inversão: enxergar os princípios de expansão e continuidade do discurso (autor, disciplina, vontade de verdade) como o jogo negativo de rarefação do discurso. Deixar de considerá-los como instância fundamental e criadora.

- descontinuidade: o princípio de rarefação não implica em um grande discurso ininterrupto, ilimitado e contínuo a que devemos, enfim, restituir a palavra. Os discursos devem ser tratados como práticas descontínuas, que se cruzam por vezes, mas também de ignoram ou se excluem.

- especificidade: não transformar o discurso em um jogo de significações prévias; não imaginar que o mundo nos apresenta uma face legível que teríamos de decifrar apenas. Deve-se conceber o discurso como uma violência que fazemos às coisas, como uma prática que lhes impomos em todo o caso; e é nesta prática que os acontecimentos do discurso encontram o princípio de sua regularidade.

- exterioridade: não partir do discurso para seu núcleo interior e escondido, para um pensamento ou significação que se manifestam nele; mas, a partir do discurso, sua aparição e regularidade, passar às suas condições externas de possibilidade.

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- Quatro noções devem servir de princípio regulador de análise: acontecimento, série, regularidade, e condição de possibilidade. Termos se opõem às noções de criação, unidade, originalidade, e significação.

- De modo geral estes conceitos a que os princípios e opõem dominaram a história tradicional das ideias (pg.54)

(páginas 57-60 -> não anotei nada)

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- Seguindo estes princípios e referindo-se a este horizonte, a análise de Foucault se dispõe em dois conjuntos. De um lado o conjunto “crítico”, que põe em prática o princípio da inversão: cercar as formas da exclusão, limitação, apropriação; mostrar como se formaram, como se modificaram e se deslocaram, que força exerceu, e em que medidas foram contornadas. Do outro lado, o conjunto “genealógico”, que põe em prática os outros três princípios: como se formaram, através, apesar, ou com o apoio desses sistemas de coerção, séries de discursos; qual foi a norma específica de cada uma e quais suas condições de aparição, crescimento e variação.

- Conjunto crítico. Um primeiro grupo de análises poderia versar sobre o que designei como funções de exclusão (loucura e razão na época clássica, como exemplo). (pg.61)

- Foucault afirma que de imediato gostaria de se ater ao terceiro sistema de exclusão. Gostaria de tentar perceber como se realizou e como se repetiu, se reconduziu e se deslocou a escolha da verdade no interior da qual nos encontramos, mas que sempre renovamos.

- Medir o efeito de um discurso com pretensão científica sobre o conjunto de práticas e de discursos prescritivos que o sistema penal constitui.

- Ainda na perspectiva crítica fazer a análise dos procedimentos de limitação dos discursos (princípio do autor, do comentário e da disciplina). Análise da história da medicina do século XVI ao XIX como modelo. Detectar os princípios na construção própria do discurso médico.

- Conjunto genealógico. Formação efetiva dos discursos, seja no interior dos limites do controle, quer no exterior.

- Processos de rarefação, mas também de reagrupamento e de unificação dos discursos; a genealogia estuda sua formação ao mesmo tempo dispersa, descontínua e regular.

- Não existe, de fato, separação nestas duas tarefas. A formação regular do discurso pode integrar, sob certas condições e até certo ponto, os procedimentos de controle; e, inversamente, as figuras do controle podem tomar corpo no interior de uma formação discursiva: de modo que toda tarefa crítica deve analisar ao mesmo tempo as regularidades discursivas através das quais elas se formas; e toda descrição genealógica deve levar em conta os limites que interferem nas formações reais.

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- A diferença aqui é de ponto de ataque, de perspectiva e de delimitação, mais do que uma diferença de objeto ou de domínio.

- A parte crítica da análise liga-se aos sistemas de recobrimento do discurso, destacando os princípios de ordenamento, exclusão, rarefação do discurso. A parte genealógica se detém nas séries de formação efetiva do discurso: busca apreendê-lo em seu poder de afirmação, um poder que não se oporia ao poder de negar, mas o poder de constituir domínios de objetos, a propósito dos quais se poderia afirmar ou negar proposições verdadeiras ou falsas.

- A análise do discurso não desvenda a universalidade de um sentido; ela mostra à luz do dia o jogo da rarefação imposta, com um poder fundamental de afirmação. Rarefação e afirmação, rarefação, enfim, da afirmação e não generosidade contínua do sentido, e não monarquia do significante.