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A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO NO ESPAÇO ESCOLAR: REFLEXÕES A PARTIR DE DIFERENTES CONTEXTOS O objetivo desse painel é discutir a organização do trabalho nas escolas públicas a partir da atuação específica do coordenador pedagógico e do orientador pedagógico, entendidos, obviamente, a partir da relação da escola com os aspectos mais amplos da sociedade. Neste sentido, são problematizados e discutidos aspectos da organização do trabalho em diferentes contextos escolares. Este painel aglutina três trabalhos que enfocam a coordenação pedagógica denominada de diferentes formas em função do contexto a que se relaciona em distintas redes de ensino localizadas no interior do estado de São Paulo. Os trabalhos se originam de pesquisas em andamento, sendo que estas se pautam por estudos bibliográfico-documentais e investigações empíricas, trazendo à tona elementos importantes para a interpretação e (re) significação do papel do coordenador e do orientador pedagógico nas escolas de Educação Básica. Neste sentido, objetiva-se: apresentar uma análise de algumas prescrições presentes na súmula de atribuições do trabalho do Orientador Pedagógico, numa rede municipal de ensino, entendendo-se que estas impactam (in)diretamente nos modos de agir profissional e na relação intrínseca com a dinâmica coletiva da escola; problematizar os aspectos relativos à formação continuada oferecida pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo aos coordenadores pedagógicos, compreendendo que as atividades desenvolvidas nos últimos anos levam mais à (de)formação do que à formação daqueles que deverão, nas escolas, contribuir para a formação de professores; discutir o trabalho da gestão escolar, e principalmente, do coordenador pedagógico frente à inserção dos professores iniciantes nas escolas de educação infantil e ensino fundamental, uma vez que tal atuação pode contribuir ou dificultar os processos de socialização e aprendizagem inicial da docência, considerando a escola como lócus de aprendizagem. Os três artigos apontam de maneira convergente para a importância do trabalho na organização escolar. Palavras-Chave: Coordenação Pedagógica, Orientação Pedagógica, Trabalho Pedagógico XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 477 ISSN 2177-336X

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A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO NO ESPAÇO ESCOLAR:

REFLEXÕES A PARTIR DE DIFERENTES CONTEXTOS

O objetivo desse painel é discutir a organização do trabalho nas escolas públicas a partir

da atuação específica do coordenador pedagógico e do orientador pedagógico,

entendidos, obviamente, a partir da relação da escola com os aspectos mais amplos da

sociedade. Neste sentido, são problematizados e discutidos aspectos da organização do

trabalho em diferentes contextos escolares. Este painel aglutina três trabalhos que

enfocam a coordenação pedagógica – denominada de diferentes formas em função do

contexto a que se relaciona – em distintas redes de ensino localizadas no interior do

estado de São Paulo. Os trabalhos se originam de pesquisas em andamento, sendo que

estas se pautam por estudos bibliográfico-documentais e investigações empíricas,

trazendo à tona elementos importantes para a interpretação e (re) significação do papel

do coordenador e do orientador pedagógico nas escolas de Educação Básica. Neste

sentido, objetiva-se: apresentar uma análise de algumas prescrições presentes na súmula

de atribuições do trabalho do Orientador Pedagógico, numa rede municipal de ensino,

entendendo-se que estas impactam (in)diretamente nos modos de agir profissional e na

relação intrínseca com a dinâmica coletiva da escola; problematizar os aspectos

relativos à formação continuada oferecida pela Secretaria Estadual de Educação de São

Paulo aos coordenadores pedagógicos, compreendendo que as atividades desenvolvidas

nos últimos anos levam mais à (de)formação do que à formação daqueles que deverão,

nas escolas, contribuir para a formação de professores; discutir o trabalho da gestão

escolar, e principalmente, do coordenador pedagógico frente à inserção dos professores

iniciantes nas escolas de educação infantil e ensino fundamental, uma vez que tal

atuação pode contribuir ou dificultar os processos de socialização e aprendizagem

inicial da docência, considerando a escola como lócus de aprendizagem. Os três artigos

apontam de maneira convergente para a importância do trabalho na organização escolar.

Palavras-Chave: Coordenação Pedagógica, Orientação Pedagógica, Trabalho

Pedagógico

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O PAPEL DO COORDENADOR PEDAGÓGICO NO DESENVOLVIMENTO

DO TRABALHO DO PROFESSOR EM INÍCIO DE CARREIRA: ALGUMAS

REFLEXÕES

Aline Diniz de Amorim – UNESP

Maria José da Silva Fernandes – UNESP

Resumo

O presente artigo apresenta parte dos dados coletados em um estudo mais amplo que

objetivou investigar o processo de construção da identidade docente do professor

iniciante. Assim, problematiza-se, neste trabalho, especificamente, a relação entre a

gestão escolar, com destaque para o trabalho do coordenador pedagógico, e os

professores em início de carreira. Os dados apresentados aqui são provenientes das

entrevistas semiestruturadas realizadas com seis professores iniciantes dos anos iniciais

do Ensino Fundamental e da Educação Infantil do interior do Estado de São Paulo.

Considera-se que o professor, antes de ser considerado experiente, percorre um longo

trajeto ao longo de seu tempo de docência e, neste sentido, a relação estabelecida com a

equipe gestora é fundamental nessa trajetória. Desta forma, o trabalho do coordenador

pedagógico junto a esses docentes pode tanto contribuir para a inserção na docência,

quanto ampliar os percalços encontrados pelos professores inexperientes a serem

superados durante os primeiros anos da docência. Como principais resultados constatou-

se que, para a maioria dos sujeitos entrevistados, houve desafios a serem superados, mas

também ocorreram significativas aprendizagens, conforme pontuado por eles, no que

concerne às trocas de experiências com a gestão, principalmente, no que se refere à

coordenação pedagógica. Os docentes ainda ressaltaram a importância da valorização

do seu trabalho e, também, do apoio e suporte fornecidos pelo coordenador para o

fortalecimento da sua segurança enquanto profissional. Em contrapartida, aspectos

relacionados a inexistência, em muitas situações, de um feedback e acompanhamento

por parte da equipe gestora foram destacados pelos iniciantes como dificultadores para o

desenvolvimento de seu trabalho e, consequentemente, para o seu processo de inserção

na docência. Assim, é necessário admitir a importância de o coordenador pedagógico,

em especial, estar preparado para receber o professor sem experiência assumindo o

papel fundamental de auxiliador da sua entrada na docência.

Palavras-chave: Formação de professores. Professor iniciante. Coordenação

Pedagógica.

Introdução

Este trabalho é parte de uma pesquisa mais ampla desenvolvida como

dissertação de Mestrado em um Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar, a

qual tem por objetivo investigar a relação entre a formação inicial e o processo de

constituição das identidades de professores iniciantes que se graduaram há, no máximo,

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cinco anos, no curso de Licenciatura em Pedagogia, pela Universidade Estadual Paulista

(UNESP) – campus Bauru, como docentes, enquanto pedagogos atuantes em sala de

aula dos anos iniciais do Ensino Fundamental e da Educação Infantil.

Diante do objetivo central partimos da hipótese de que a formação inicial em

Pedagogia fornece aos licenciandos os conceitos básicos do panorama da educação, no

que concerne à visão da docência e do ambiente escolar. No entanto, os conhecimentos

recebidos durante a graduação não determinam logicamente como o pedagogo atuará

em sala de aula e como constituirá sua identidade docente. Supomos que sua prática

enquanto professor tem importante papel na constituição e solidificação dessa

identidade profissional e, neste sentido, a relação que o professor iniciante estabelece no

espaço escolar é fundamental para a aprendizagem da docência e para a constituição do

seu trabalho. Neste artigo, em especial, trabalhamos com um recorte desta pesquisa

mais ampla, analisando especificamente a importância da atuação da gestão escolar no

desenvolvimento do trabalho do professor iniciante, destacando o papel desempenhado

pelos coordenadores pedagógicos no processo de aprendizagem da docência e de

socialização profissional.

Ao realizar o levantamento bibliográfico notamos que a temática formação de

professores iniciantes com foco no desenvolvimento da identidade profissional é pouco

explorada e que ainda menos são encontramos estudos sobre a relação entre este

desenvolvimento e a atuação da gestão escolar frente aos professores que as escolas

recebem. É fundamental registrar que a importância da atuação da gestão escolar, e em

especial dos coordenadores pedagógicos, apareceu como um dado relevante quando

realizamos as entrevistas com professores iniciantes, surpreendendo-nos pelos aspectos

determinantes que estes podem ter no desenvolvimento da aprendizagem da docência e

na socialização profissional.

A pesquisa que realizamos é de abordagem qualitativa, na qual, segundo Ludke

e André (1986, p. 12), “todos os dados da realidade são considerados importantes”,

enfatizando-se a preocupação com o processo diante do produto da situação pesquisada.

A investigação, de maneira geral, foi dividida em três etapas interligadas, a saber: o

inicial levantamento bibliográfico das teorias pertinentes ao estudo e a construção dos

instrumentos de coleta de dados, a aplicação desses instrumentos, e, finalmente, a

análise e interpretação dos dados.

Na coleta de dados optamos pela realização de entrevistas semiestruturadas com

seis professores considerados iniciantes na carreira docente, professores estes

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previamente selecionados após responderem questionário enviado a todos os egressos

do curso de Pedagogia da Universidade Estadual Paulista-Campus Bauru nos últimos

cinco anos. Os professores serão indicados com a inicial “P” seguido de um número

correspondente a ordem de realização da entrevista. Uma vez coletados os dados

procedeu-se a análise dos mesmos. Para a análise e categorização dos dados, foi adotada

a abordagem da análise de conteúdo, teorizada por Bardin (1977). Contudo, a fim de

ampliar a abrangência da análise e, ao mesmo tempo, atingir um nível mais detalhado

recorreu-se, também, à “análise de prosa”, estruturada por André (1983). Dessa

maneira, foi feita a divisão inicial dos dados em grandes eixos que, segundo a autora

supracitada, dizem respeito aos grandes temas da pesquisa (ANDRÉ, 1983).

Frente à temática deste painel – o trabalho da coordenação pedagógica nas

unidades escolares – optamos por apresentar e discutir neste artigo um único eixo de

análise da pesquisa realizada. Trata-se, portanto, da atuação da equipe gestora nos

processos de construção da identidade docente. É fundamental registrar que não havia

no roteiro de entrevista uma questão específica sobre essa relação. Assim, mesmo que

com um questionamento indireto, a gestão foi mencionada pelos seis professores que

participaram da pesquisa empírica, demonstrando que essa relação precisa ser

problematizada. Ao serem questionados sobre onde e por parte de quem receberam

apoio durante o exercício inicial da docência apareceu com intensidade a questão da

gestão escolar e da atuação dos coordenadores pedagógicos. Neste aspecto os

professores entrevistados indicaram tanto a importância do apoio recebido por parte da

gestão escolar, como também os riscos de sua ausência, o que nos remete e reafirma a

necessidade de pensarmos o papel que deve ser desempenhado nos processos de

constituição da docência, mesmo porque, nas escolas, todos os anos, a equipe gestora

convive com a chegada de professores iniciantes.

Discussão e resultados

Em relação especificamente às contribuições provenientes do trabalho da gestão

escolar e em especial do coordenador pedagógico para o desenvolvimento do trabalho

do professor, foram destacados, inicialmente, aspectos relacionados à existência de

apoio, auxílio e confiança frente ao trabalho desenvolvido pelo iniciante. É indiscutível

que esse suporte dado pela coordenação pedagógica facilita, e muito, a adaptação dos

professores sem experiência ao contexto de exercício da profissão, pois além de forjar

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um ambiente de acolhimento, também, garante a esses professores a segurança

necessária ao desenvolvimento de seu trabalho em sala de aula e influencia até mesmo

no relacionamento com os pais de alunos e colegas de profissão.

Sobre a importância do acompanhamento do coordenador pedagógico,

denominado, também, como PCP (Professor Coordenador Pedagógico), Franco (2012,

p. 36) salienta que o relacionamento entre esse membro da equipe gestora da escola e o

professor iniciante deve se “apoiar numa relação de colaboração e confiança, sentindo o

docente que tem no PCP uma pessoa que poderá ajudá-lo”. O suporte fornecido pela

equipe gestora é salientado na fala da professora P2:

Ela [a coordenadora] sempre fala isso nas reuniões: “Eu acredito no

trabalho de vocês, por isso que vocês estão aqui!”. Por mais que o

pai venha e reclame ou acontece alguma coisa, ela vai chamar o

professor pra ver o que aconteceu, jamais ela vai falar “Ah,

realmente...”. (P2).

A percepção de valorização do trabalho do professor é, sem dúvida, um dos

principais fatores positivos da relação estabelecida entre gestão e corpo docente, pois ao

se sentir valorizado pelo seu coordenador pedagógico o professor, principalmente, em

início de carreira, assimila que, apesar das dificuldades que vivenciadas por ele no

cotidiano escolar, seu trabalho e esforço frente à sala de aula são reconhecidos e, por

isso, considerados nos momentos coletivos. Essa valorização da gestão escolar pode ser

demonstrada de diversas maneiras e em diferentes situações que vão desde um elogio

individual, portanto, numa perspectiva mais subjetiva, até a compra de materiais

pedagógicos solicitados pelo professor, o que envolve a dimensão objetiva do trabalho.

O favorecimento de um ambiente propício às trocas de conhecimento e, por

conseguinte, ao aprendizado de todos os atores envolvidos no processo educativo

também deve fazer parte das preocupações da gestão da escola. Em relação a isso, outra

pontuação feita pelos professores entrevistados refere-se à oportunidade de aprender

com os profissionais envolvidos no trabalho da gestão escolar, conforme pode ser

observado nas falas das professoras P5 e P6:

A diretora que eu trabalho hoje ajuda muito mais, porque ela tem

uma formação não só de pedagoga, ela já tem formação em

neuropsicopedagogia, enfim, ela estuda bastante, então ela entende

muito (P5).

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Outra coordenadora, que já foi um pouco melhor, que já orientava é

que me ofereceu [apoio]. Ela me deu dicas. Então isso é importante:

ela me deu feedback, ela chegou a digitar pra mim, ela me deu textos

sobre a questão de indisciplina (P6).

As declarações mencionadas reafirmam, ainda, a importância de a coordenação

pedagógica e a direção escolar se manter atualizadas e disposta a oferecer o suporte

pedagógico que os professores necessitam, contribuindo para se efetivar a prática desses

profissionais. Para Franco (2012, p. 36), “é de fundamental importância que o PCP

proporcione momentos de aprofundamento teórico, para subsidiar a prática pedagógica

e de troca de experiências, relacionando as teorias com os problemas reais do dia-a-dia

escolar”, sendo que essa formação tem até um momento específico para se realizar: no

Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), embora, obviamente, não se limite a

ele, apenas.

Porém, se por um lado, há manifestações acerca do apoio e da valorização

recebida por parte da gestão escolar, por outro há indicativos dos professores acerca da

ausência de um trabalho específico com o professor que está chegando na escola e sem

experiência profissional, apontando-se as consequências desse abandono para a atuação

profissional. Sobre as dificuldades na relação entre o trabalho da gestão escolar e o

desenvolvimento profissional do corpo docente, principalmente, dos professores

iniciantes, destacou-se a falta de apoio e de motivação. Notou-se, na fala de alguns

professores, a inexistência de colaboração por parte das coordenadoras pedagógicas no

desenvolvimento profissional docente. A respeito disso, Santos (2012, p. 93) salienta:

[...] a importância de o coordenador pedagógico considerar e valorizar

os sentimentos e os saberes dos professores, do mesmo modo que se

recomenda a eles que valorizem os conhecimentos e sentimentos dos

alunos. Tal princípio constitui o início de uma relação reflexiva mais

efetiva porque permite aos professores reconhecerem em seus saberes

os aspectos a serem superados e os aspectos a serem aperfeiçoados e

preservados.

Também foi apontada pelos professores entrevistados a ausência de uma

avaliação formativa por parte da coordenação pedagógica em relação ao trabalho que

eles realizam em sala de aula, uma avaliação que pudesse amparar, guiar, quando

necessário, e acompanhar a atuação dos iniciantes em suas atividades em sala de aula.

Para a professora P4 especificamente, faltou um “feedback” da equipe gestora que

fundamentasse seu trabalho em sala de aula e que, dessa forma, pudesse amenizar

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algumas inseguranças próprias do docente em início de carreira como, por exemplo, o

auto-questionamento “será estou fazendo certo?”:

[...] eu não tenho, não sinto apoio, respaldo dela [da coordenadora],

ela, em nenhum momento, me perguntou se eu tava tendo alguma

dificuldade, se eu precisava de alguma coisa, nunca! Não posso dizer

que alguns problemas que eu tive que eu fui perguntar pra ela que ela

não me ouviu, ela me ouviu, mas não houve respaldo (P4).

Outro ponto levantado refere-se à falta de comunicação, no sentido de

uniformização de conceitos e procedimentos sobre o processo de ensino entre a gestão e

o corpo docente. Sobre isso, Silva (2008, p. 53) ressalta a importância de haver um

“processo de discussão coletiva, liderado pelo coordenador pedagógico, [no qual] cada

escola, apoiada nas diretrizes oficiais, pode encontrar seu caminho”. Se esse processo de

discussão coletiva ocorrer efetivamente no ambiente escolar, certamente, o

relacionamento entre equipe gestora e corpo docente será, de fato, mais eficaz e poderá,

enfim, oportunizar o desenvolvimento profissional de todos os sujeitos envolvidos, além

de favorecer a apropriação da cultura escolar por parte daqueles que estão chegando.

Também foi ressaltada pelos entrevistados a falta de preparo da equipe gestora

para receber o professor iniciante na escola. Nesse sentido, o coordenador pedagógico

deve propor algum tipo de auxílio com vistas a facilitar essa inserção do docente no

exercício da profissão, conforme salientado por Franco (2012), mas a ausência de um

acompanhamento efetivo transforma o auxílio proposto em mais um fator adicional de

dificuldade com que o professor necessita lidar ao adentrar o espaço escolar.

Adicionado ao fator supracitado encontra-se a falta de confiança que o

coordenador pedagógico deixa transparecer, muitas vezes, em relação ao novo professor

que se insere na instituição de ensino:

Você sente, principalmente, da coordenação, sabe, fica sempre ali

naquela desconfiança, parece que não confia, parece que alguma

coisa que acontecer de errado recai sobre a sua falta de experiência

ou porque você é nova. Qualquer coisa que acontecer (P6).

Desta forma, mas sem o intuito de finalizar essas necessárias reflexões sobre a

atuação da coordenação pedagógica, o fragmento da fala da docente P6 pode sintetizar a

percepção recorrente na fala dos professores entrevistados nesta investigação em relação

à figura do coordenador pedagógico:

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Eu pelo menos senti [...], o coordenador pedagógico, alguns não

estão preparados pra exercer essa função de coordenador e dar apoio

a esse professor, principalmente a esse novo que tá chegando ali,

então meio que já te jogam na boca dos leões, sabe... Sem nenhuma

orientação (P6).

Diante de todo o exposto (considerando-se os limites deste texto), é possível

concluir que a relação da gestão escolar, especialmente, dos coordenadores pedagógicos

com os professores iniciantes, pode tanto facilitar expressivamente o processo de

inserção profissional e iniciação na docência, como também representar um agravante

para as dificuldades já encontradas nesse período, o que afetará as práticas didáticas

desenvolvidas em sala de aula. É fundamental lembrar que para Gimeno Sacristán

(1995) a aprendizagem da docência envolve diferentes dimensões da prática,

envolvendo os aspectos institucionais, organizativos e didáticos. Neste sentido, a

atuação efetiva da coordenação pedagógica frente aos novos professores poderá facilitar

a apropriação da cultura escolar, ampliando a segurança frente ao trabalho docente tanto

na sala de aula como na escola como um todo.

Considerações finais

Considerando a breve discussão acima apresentada, é possível concluir que a

relação da gestão escolar, especialmente, dos coordenadores pedagógicos com os

professores iniciantes, pode tanto facilitar como agravar as dificuldades do processo de

inserção profissional e iniciação na docência, sendo necessárias, portanto, ações

específicas de formação continuada dos coordenadores pedagógicos para que estes

possam atuar de forma mais efetiva na inserção dos novos professores, apoiando-os e

facilitando o conhecimento e a apreensão das regras explícitas e implícitas que fazem

parte da cultura escolar.

Observa-se, a partir das dificuldades levantadas pelos professores entrevistados,

que as fragilidades da formação inicial, bem como as situações adversas da realidade

escolar fazem parte do grande leque de desafios que precisam ser superados pelos

docentes em início de carreira, o que poderia ser amenizado com o apoio do

coordenador pedagógico.

Portanto, é necessário que se reflita sobre o papel que o coordenador

pedagógico, ou mesmo o diretor de escola nos casos em que não um profissional

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específico para acompanhamento dos professores, exerce sobre a inserção do professor

iniciante na profissão. É fato que a intervenção respeitosa desse profissional, se feita

com vistas a auxiliar o docente, poderá ajudar o professor, sendo um importante suporte

para favorecer o processo de construção da identidade profissional, identidade esta que

se dá sempre no entrecruzamento das questões pessoais com as questões coletivas.

Além disso, é necessário admitir que o professor iniciante já possui uma gama de

dificuldades a serem superadas individualmente e a gestão pode ampliar esse desafio se

não tomar para si a responsabilidade de apoiar esse profissional em seus primeiros anos

da docência.

Referências

ANDRÉ, M. E. D. A. Texto, contexto e significado: algumas questões na análise de

dados qualitativo. In: Cadernos de pesquisa. São Paulo, n.45, pp. 66-71, maio. 1983.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1988.

FRANCO, F. C. O coordenador pedagógico e o professor iniciante. In: BRUNO, E. B.

G.; ALMEIDA, L. R. de; CHRISTOV, L. H. da S. (Orgs.). O coordenador pedagógico e

a formação docente. São Paulo: Ed. Loyola, 2012.

GIMENO SACRISTÁN, J. Consciência e acção sobre a prática como libertação

profissional dos professores. In: NÓVOA, A. Profissão Professor. Porto: Porto Editora,

1995.

LÜDKE, M.; ANDRÉ, E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São

Paulo: EPU, 1986.

SANTOS, M. I. M. Saberes e sentimentos dos professores. In: BRUNO, E. B. G.;

ALMEIDA, L. R. de; CHRISTOV, L. H. da S. (Orgs.). O coordenador pedagógico e a

formação docente. São Paulo: Ed. Loyola, 2012.

SILVA, M. da. O trabalho articulador do coordenador pedagógico: a integração

curricular. In: PLACCO, V. M. N. de S.; ALMEIDA, L. R. de. O coordenador

pedagógico e os desafios da educação. São Paulo: Ed. Loyola, 2008.

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AS PRESCRIÇÕES DA SÚMULA DE ATRIBUIÇÕES NO TRABALHO DO

ORIENTADOR PEDAGÓGICO

Ana Paula Souza Brito – UNICAMP

Michel Serigato Mansano – UFSCar

Resumo

Este texto tem por objetivo apresentar uma análise de algumas prescrições presentes na

súmula de atribuições - texto que apresenta indicações prescritivas do agir profissional -

do trabalho do Orientador Pedagógicoi, entendendo que estas impactam (in)diretamente

nos modos de agir profissional e na relação intrínseca com a dinâmica coletiva da

escola. O foco central do trabalho - Orientador Pedagógico - é o termo atribuído na

legislação da rede municipal paulista na qual foi realizada a pesquisa ao cargo

responsável pelo acompanhamento e coordenação do trabalho pedagógico da escola. A

análise inicia-se com a exposição de uma breve contextualização histórica do cargo de

Orientador Pedagógico (O.P.), posteriormente, é feita uma comparação analítica de

prescrições das súmulas de atribuiçõesii referentes ao cargo de Coordenador

Pedagógico, Orientador Educacional e Orientador Pedagógico. Isso porque, esses três

cargos se relacionam e configuram historicamente ações atribuídas ao O.P. Assim,

analisamos especificamente a súmula de atribuições deste profissional, a fim de

problematizar as atividades estabelecidas, bem como os sujeitos e segmentos que a

constituem e, por isso, influenciam no trabalho do O.P. Ao final, tentamos propor

algumas situações que podem auxiliar na construção da configuração deste profissional,

Entretanto, salientamos que não basta reorganizar a súmula e desenvolver coletivamente

reflexões sobre as atividades. Há a necessidade de discutir o trabalho desenvolvido pelo

O.P. com todos os segmentos que influenciam (in)diretamente seu agir profissional,

num processo de intersubjetividade, marcado por contradições que impactam o

desenvolvimento da atividade e dos próprios sujeitos.

Palavras-chave: Orientador Pedagógico. Súmula de Atribuições. Configurações do

Trabalho.

Prescrições da súmula no desenvolvimento do trabalho

Com o intuito de contribuir para a discussão sobre a identidade e a subjetividade

do e no trabalho do Orientador Pedagógico nas unidades educacionais, iremos, neste

texto, explorar a Súmula de atribuições deste profissional em uma cidade do interior do

estado de São Paulo, distante a 101 km da capital, com aproximadamente 600 mil

habitantes e cerca de 158 unidades escolares municipais de atendimento da Educação

Infantil ao Ensino Médio.

Decidimos analisar a súmula, pois acreditamos que ela possa oferecer

indicativos de um modo de agir profissional, podendo auxiliar na compreensão da

relação do O.P. com o seu trabalho. Para nós, as imagens conceituais que podem ser

constituídas pela súmula, apresentam dados importantes para a compreensão de

estruturas ideológicas que acabam influenciando as ações dos profissionais da educação.

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Admitimos, no entanto, que a súmula de atribuições apresenta um caráter

oficialmente prescritivo: oficialmente, porque está inserido em um contexto sob força de

lei, isto é, por meio de uma proposta que se apresenta como um pré-construído

institucionalizado (BARRICELLI, 2007) e prescritivo, porque institui um certo agir

sobre o trabalho que pode dar indícios de inclinações ideológicas, uma vez que “toda

prescrição é a imposição da opção de uma consciência a outra” (FREIRE, 1975, p. 46).

Neste sentido, entendemos que o trabalho prescrito é anterior ao trabalho

propriamente dito, são as considerações tanto formais e informais que dizem o que o

trabalhador deve ou não fazer para realizar suas tarefas (CLOT, 2010) que podem ou

não coincidir com o trabalho efetivamente concretizado. Importante salientar que, em

geral, os textos prescritivos são organizados e construídos por sujeitos outros que não

são, propriamente, os profissionais, neste caso, os Orientadores Pedagógicos. Bronckart

e Machado (2004) chamam esse tipo de texto de linguagem sobre o trabalho.

Contextualização histórica

Até o ano de 2007 os ocupantes do magistério da cidade pesquisada eram

regidos pela Lei 4.599 de 6 de setembro de 1994, que estabelecia o Quadro e o Plano

de Carreira do Magistério Público Municipal. Esta lei regulamentava o

funcionamento das instituições de ensino e afirmava que todos os cargos que, na

época eram chamados de especialistas de educaçãoiii

seriam providos mediante a

concurso de acesso (art.12), isto é, tais cargos seriam preenchidos mediante a concurso

interno no qual, os professores que tinham os requisitos mínimos, poderiam concorrer

aos respectivos cargos.

Contudo, durante os anos de 1994 e 2007 muitos especialistas de educação

foram chamados para preencher cargos na Secretaria da Educação deixando vago seus

postos nas escolas. Dessa maneira, os professores interessados em assumir os postos

vagos, e que tinham os requisitos mínimos, inscreviam-se em uma lista para atuarem

como especialistas, ocorrendo o que Collares, Moysés e Geraldi (1999) chamam de

descontinuidade de políticas públicas, situação constatada até os dias atuais.

Em 2007 passa a vigorar a Lei nº 8119, de 29 de março onde altera diretrizes

para o quadro do magistério. Dentre as várias mudanças está a substituição da

nomenclatura “especialistas de educação” para “suporte pedagógico” (art. 5º e 6º), a

instituição de concurso público de provas e títulos para provimento dos cargos de

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suporte pedagógico (art. 10) e a extinção/ junção/ criação de cargos, como podemos

observar no seguinte quadro:

Lei 4.599 de 6 de setembro de 1994 Lei nº 8119 de 29 de Março de 2007

I - Professor de Educação Infantil I, em unidades

com alunos de período integral

Professor de Educação Básica I - PEB I, em

unidades de educação infantil parcial e integral e

nos anos/séries iniciais do ensino fundamental

II - Professor de Educação Infantil II, em

unidades com alunos de período parcial

III - Professor I, polivalente de 1a à 4a séries do

ensino de 1º grau

VI – Professor de Classe Especial ou sala de

recursos em Escolas Municipais;

IV - Professor II, de componente curricular, para

o qual inexista habilitação em nível de

Licenciatura Plena, exclusivamente no ensino de

1º grau, de 5a à 8a séries

Professor de Educação Básica II - PEB II, nos

anos/séries finais do ensino fundamental e/ou

ensino médio V - Professor III, de componente curricular de 5a

à 8a séries do ensino de 1º grau e em todo o 2º

grau regular e/ou supletivo

VII - Diretor de Escola de Educação Infantil Diretor de Escola, em unidades de educação

básica VIII - Diretor de Escola de 1º e 2º graus do

ensino regular e/ou supletivo

IX - Assistente de Direção de unidade escolar de

1º e 2º graus do ensino regular e/ou supletivo Vice-Diretor, em unidades de educação básica

X - Orientador Educacional de unidade ou

conjunto de unidade de ensino de 1º e 2º graus

regular e/ou supletivo Orientador Pedagógico, em unidades de

educação básica XI - Coordenador Pedagógico de unidade ou

conjunto de unidades de ensino de 1º e 2º graus

regular e/ou supletivo

XII - Supervisor Didático Pedagógico em

conjunto de unidades de Educação Infantil

Supervisor de Ensino, em unidades de educação

básica

Comparando as duas legislações, percebe-se a extinção, a condensação e a

alteração de nomeclaturas referente a alguns cargos, inclusive conferindo

denominações genéricas para associar cargos específicos. Com isso, houve uma

reorganização não só nas nomenclaturas, mas também nas prescrições dos cargos.

Análise das prescrições: a inter-relação entre os cargos

A extinção do Orientador Educacional e do Coordenador Pedagógico será,

aqui, objeto de análise, uma vez que parece sinalizar para uma junção entre esses dois

cargos na configuração do trabalho do Orientador Pedagógico. Essas mudanças

apresentarão impactos profundos e significativos nos modos de trabalho do

Orientador Pedagógico que são apontadas pela própria súmula de atribuições, na qual

podemos perceber usando a comparação neste quadro:

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

488ISSN 2177-336X

13

Súmula 1 - CARGO:

COORDENADOR

PEDAGÓGICO

Lei 4.599/1994

Súmula 2 - CARGO:

ORIENTADOR

EDUCACIONAL

Lei 4.599/1994

Súmula 3 – CARGO:

ORIENTADOR

PEDAGÓGICO

Lei nº 8119/ 2007

I - Coordenar e orientar o

planejamento pedagógico e a

eficácia de sua execução, em

unidades educacionais.

II - Propiciar condições para a

participação efetiva de todo o

corpo docente em torno dos

objetivos educacionais da escola.

III - Participar da elaboração do

Plano Escolar, coordenando as

atividades de planejamento

quanto aos aspectos curriculares,

acompanhando e avaliando o

desenvolvimento da programação

do currículo.

IV - Prestar assistência técnica

aos professores, propondo

técnicas e procedimentos,

selecionando e fornecendo

materiais didáticos e discutindo

sistemáticas de avaliação, visando

assegurar a eficiência e eficácia

do desempenho dos mesmos.

V - Coordenar a programação e

execução das atividades de

recuperação de alunos.

VI - Avaliar os resultados do

ensino no âmbito da Escola, e

propor reformulação quando for o

caso.

VII - Assessorar a Direção da

Escola, especificamente quanto a

decisões relativas a matrículas e

transferências, agrupamento de

alunos, organização de horários

de aulas e do calendário escolar.

VIII- Acompanhar os processos

de adaptação de alunos

transferidos.

I - Prestar assistência aos

educandos em estabelecimento

de ensino de primeiro e/ou

segundo grau, ordenando e

integrando os elementos que

exercem influência em sua

formação, aconselhando e

auxiliando os alunos na solução

de seus problemas,

possibilitando-lhes o

desenvolvimento intelectual e a

formação integral e sua

orientação quanto ao

conhecimento e escolha

profissional.

II - Elaborar a programação das

atividades de sua área de

atuação, mantendo-a articulada

às demais programações do

núcleo de apoio técnico-

pedagógico da escola.

III - Colaborar na elaboração do

currículo pleno da escola,

opinando sobre suas implicações

no processo de orientação

educacional.

IV - Participar na composição,

caracterização e

acompanhamento de turmas e

grupos, bem como do processo

da avaliação e recuperação dos

alunos.

V - Coordenar o processo de

informação educacional e

profissional, com vistas à

orientação vocacional do aluno.

VI - Participar do processo de

integração escola-família-

comunidade, organizando

reuniões com pais e professores

da própria escola e de outras

comunidades.

I - Colaborar na elaboração do

Projeto Político-Pedagógico da

escola e a colocá-lo em prática.

II - Orientar pedagogicamente o

educador da instituição;

III - Responder pela formação

contínua dos professores,

coletiva e individualmente.

IV - Propiciar condições para a

participação de todos os

elementos da instituição em

torno de seus objetivos

educacionais.

V - Coordenar o planejamento

pedagógico da unidade escolar e

acompanhar sua execução.

VI - Assessorar a direção da

escola quanto à organização do

horário das aulas, à composição

do calendário escolar, à tomada

de decisões relativas as

matrículas, transferências e

agrupamento de alunos.

VII - Acompanhar os processos

de adaptação de alunos

transferidos, classificação e

reclassificação de alunos, assim

como sua promoção e retenção.

VIII- Avaliar os resultados do

ensino no âmbito da escola e

propor reformulação, quando for

o caso.

IX - Implementar programas e

projetos da Secretaria da

Educação.

X - Desenvolver seu trabalho em

estreita consonância com a

equipe de suporte pedagógico, a

fim de garantir unidade de ação

e uniforme dos preceitos

pedagógicos da Rede Municipal

de Ensino.

Olhando globalmente para as três súmulas é possível perceber que há

características gerais próprias que as diferenciam. Uma delas é em relação ao

sujeito/segmento que se tem como foco do trabalho: enquanto que na súmula do

Coordenador Pedagógico há destaques para o trabalho direcionado aos docentes

(itens I, II, III, IV e VI), a súmula do Orientador Educacional realça o trabalho

direcionado aos alunos das unidades escolares (itens I, III, IV e V). Já na súmula do

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Orientador Pedagógico há a incidência do trabalho com vários segmentos e sujeitos

como veremos mais detalhadamente a seguir.

A palavra docente ou que faz referência ao trabalho do/ com o professor

aparece cinco vezes na súmula do Coordenador Pedagógico (itens I, II, III, IV e VI),

nenhuma vez na súmula do Orientador Educacional e cinco vezes na súmula do

Orientador Pedagógico (itens I, II, III, V e VIII).

Da mesma forma, o trabalho relacionado diretamente ao aluno aparece duas

vezes na súmula do Coordenador Pedagógico (itens V e VIII), quatro vezes na

súmula do Orientador Educacional (itens I, III, IV e V) e três vezes na súmula do

Orientador Pedagógico (itens IV, VII e VIII).

Em relação a organização do trabalho com a direção escolar e com outros

segmentos como pais e comunidade em geral, podemos observar que na súmula do

Coordenador Pedagógico é indicada duas vezes (itens III e VII), na súmula do

Orientador Educacional é observada duas vezes (itens II e VI) e na prescrição do

Orientador Pedagógico é percebida, pelo menos, cinco vezes (itens I, IV, VI, IX e

X).

Essa comparação evidencia outros segmentos que trabalham diretamente e

indiretamente com o O.P. e, por isso, constitui e é constituído por estes, como nos

apontam as concepções téorico-metodológicas de Bakhtin (1997) e Vigotski (1989,

1999, 2000) ao tratar das questões referentes à intersubjetividade.

Também é perceptível, neste tipo de comparação, o processo histórico no qual

foi se configurando a mudança entre os cargos, fazendo com que o O.P. absorvesse

parte do trabalho do Orientador Educacional, revelando a nítida influência da

ideologia liberal de enxugar e diminuir cargos, fazendo com que menos pessoas

executassem o mesmo serviço, numa perspectiva de precarização do trabalho

(Saviani; Duarte (2012), Frigotto (2007), Carvalho (2014), Freitas (1995), fato

reforçado nos dias atuais.

Outra análise possível de ser realizada refere-se ao uso das palavras

“eficácia”, “efetiva”, “assistência técnica”, “técnica e procedimentos”, “eficiência”,

“escolha profissional” e “apoio técnico-pedagógico” nas súmulas 1 e 2 que denotam

evidências de uma ideologia tecnicista na medida em que parece demonstrar

preocupação em relação a um planejamento racional na tentativa de minimizar as

interferências subjetivas das relações humanas (SAVIANI, 2005, p. 34).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

490ISSN 2177-336X

15

Além disso, a súmula 3 aponta, ao menos, duas claras preocupações em

garantir que o O.P. implemente “programas e projetos da Secretaria da Educação”,

desenvolvendo “seu trabalho em estreita consonância com a equipe de suporte

pedagógico, a fim de garantir unidade de ação e uniforme dos preceitos pedagógicos

da Rede Municipal de Ensino” (itens IX e X). Essas atribuições serão discutidas

subsequentemente neste texto.

Outra observação importante é que a súmula de O.P., em relação as outras

duas, apresenta um texto menos específico com prescrições mais gerais da função. Se

por um lado, especificando demasiadamente as atribuições, corremos o risco de

determinar ações no âmbito da escola, por outro, generalizando as prescrições,

podemos perceber um sobrecarregamento de atividades.

Baseados nestas observações, iremos direcionar nosso olhar para a súmula

contida na última lei sancionada (Lei 8119/ 2007), pois é ela que, atualmente, exerce

influência na construção da imagem ideológica do cargo de O.P. no município

analisado.

A partir da súmula de O.P. foi possível organizar núcleos de ações genéricas,

identificando, além dos segmentos/sujeitos envolvidos no trabalho, algumas atividades

que parecem sugerir certo agir do Orientador Pedagógico (BRITO, 2011; 2016, no

prelo; MANSANO, 2014):

AÇÕES

GENÉRICAS E

PRESCRITIVAS

Sujeitos/

segmentos TEXTO DA SÚMULA DE ATRIBUIÇÕES

Organização do

Trabalho

Pedagógico

Alunos

Professores

Direção,

vice-direção e

supervisão escolar

Funcionários e

colaboradores

Pais e

Comunidade

Escolar

I - Colaborar na elaboração do Projeto Político-

Pedagógico da escola e a colocá-lo em prática.

V - Coordenar o planejamento pedagógico da unidade

escolar e acompanhar sua execução.

VI - Assessorar a direção da escola quanto à

organização do horário das aulas, à composição do

calendário escolar, à tomada de decisões relativas as

matrículas, transferências e agrupamento de alunos.

VII - Acompanhar os processos de adaptação de alunos

transferidos, classificação e reclassificação de alunos,

assim como sua promoção e retenção.

VIII - Avaliar os resultados do ensino no âmbito da

escola e propor reformulação, quando for o caso.

Formação

Continuada Professores

II - Orientar pedagogicamente o educador da

instituição;

III - Responder pela formação contínua dos professores,

coletiva e individualmente.

Articulação com a

comunidade

Esse item suscita

dúvidas sobre o

termo “todos

elementos da

instituição”, uma

vez que não

IV - Propiciar condições para a participação de todos os

elementos da instituição em torno de seus objetivos

educacionais.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

491ISSN 2177-336X

16

especifica os

sujeitos/segmentos

Articulação com a

Secretaria de

Educação

Direção,

vice-direção e

supervisão escolar

Secretaria da

Educação,

Unidades

Escolares e

diversos órgãos

Parceiros da

Educação

Municipal.

IX - Implementar programas e projetos da Secretaria da

Educação.

X - Desenvolver seu trabalho em estreita consonância

com a equipe de suporte pedagógico, a fim de garantir

unidade de ação e uniforme dos preceitos pedagógicos

da Rede Municipal de Ensino.

O quadro apresentado ressalta os sujeitos/segmentos com os quais o Orientador

Pedagógico necessita desenvolver seu trabalho: alunos, professores, diretor, vice-

diretor, supervisor escolar, pais, responsáveis pelos alunos, funcionários da escola

(inspetores, secretários de escola, faxineiros, monitores, auxiliares de educação,

estagiários), além da Secretaria da Educação, que é subentendida pelos sujeitos que

ocupam cargos como os chefes de divisão, diretores de área, o próprio Secretário da

Educação e todos que trabalham neste órgão público, bem como todos os sujeitos que

de alguma forma colaboram com a educação.

O texto prescritivo da súmula, ainda, pode suscitar alguns questionamentos e

algumas contradições que precisariam ser problematizados: Que características de

condições o O.P. precisaria garantir para “participação”? A quem se refere “todos

elementos da instituição”? Quais são os “objetivos educacionais” das unidades de

ensino? São os mesmos para todos (item IV)? O que se compreende por “orientar

pedagogicamente o educador” (item II)? Quais atividades estão relacionadas a

“colaborar na elaboração do Projeto Político Pedagógico” (item I)? Quais significados e

sentidos são produzidos pela palavra “responder” no item III? Quais atividades

correspondem ao significado dos termos “coordenar” (item V) e “acompanhar” (itens V

e VII)?

Nesta análise identificamos que o primeiro núcleo “Organização do Trabalho

Pedagógico” está relacionado à ação de colaboração à Equipe de Direção (diretor e vice

diretor de escola). As palavras “colaborar” (item I) e “assessorar” (item VI) nos dão

indícios dessa consideração. Segundo a súmula, ao Orientador Pedagógico cabe auxiliar

a direção na organização do trabalho (horários de aulas, composição do calendário,

tomada de decisões sobre matrículas, transferências e agrupamento de alunos) e na

elaboração do Projeto Político-Pedagógico. Não é função do Orientador Pedagógico

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

492ISSN 2177-336X

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realizar sozinho todas essas atribuições, mas colaborar com ações para que a direção

possa efetivá-las.

O segundo bloco da súmula diz respeito à formação continuada, dando indícios

da responsabilização do Orientador Pedagógico por essa ação. Os termos “orientar

pedagogicamente” e “responder pela formação continuada” (itens II e III) são utilizados

para enfatizar essa atribuição. Responsabilidades que sobrecarregam o O.P., por atribuir

a ele questões que envolvem outras instâncias, como, por exemplo, o Poder Público.

Com isso, não estamos eximindo o O.P. do compromisso de atuar no planejamento e

organização de ações formativas com os docentes, uma vez que defendemos que essa

seja uma das atividades deste profissional no contexto escolar. Todavia, não

compartilhamos com a concepção de atribuir ao O.P. a prerrogativa de “responder” pela

formação continuada, sendo essa uma dimensão relacionada à políticas públicas. Esse

pressuposto sinaliza a diminuição da responsabilização da Administração Pública nos

processos de formação dos docentes. Tal situação nos indica outra problemática: que

condições formativas são oportunizadas ao Orientador Pedagógico?

No terceiro núcleo, encontramos a expressão “propiciar condições para a

participação de todos os elementos da instituição” (item IV), o que coloca ao

profissional a atribuição de articular-se com toda a comunidade escolar, auxiliando

todos os sujeitos na execução de seus respectivos objetivos. Essa perspectiva

contribui com a concepção de que o O.P. tenha a obrigação de realizar atividades

para além das questões pedagógicas.

O último núcleo (articulação com a Secretaria de Educação) traz termos como

“implementar” e “desenvolver o trabalho em estreita consonância”, garantindo

“unidade de ação” (itens IX e X). São ações prescritivas que atribuem ao O.P. a

função de representar a Secretaria da Educação em sua unidade escolar, executando

as políticas educacionais e gerenciando os projetos preestabelecidos. Destacar essas

atribuições numa prescrição é evidenciar o objetivo do sistema educacional de ter um

“instrumento” direto na escola para implantação de políticas e programas.

Interessante destacar que tais itens da súmula ferem a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação (9394/96), no que se refere aos princípios de liberdade, pluralismo de

ideias e de concepções pedagógicas (Art.3º, incisos II e III), isso porque, por

exemplo, um programa comprado pela Secretaria da Educação pode não estar em

consonância com o Projeto Político Pedagógico da escola.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

493ISSN 2177-336X

18

Analisando a imensa gama de sujeitos que a súmula afirma que o O.P. tenha a

incumbência de trabalhar e considerando as ações genéricas, densas e complexas de

atuação, confirma-se o que Placco, Almeida e Souza (2011, p. 59) denominaram como

um trabalhador que “faz tudo”.

Sobre essa questão, Franco (2005, p.123), em uma pesquisa realizada com 30

Coordenadores Pedagógicos do litoral paulista, percebeu que a maioria dos profissionais

pesquisados

[...] considera que gasta seu tempo prioritariamente em tarefas burocráticas,

preenchendo planilhas, organizando relatórios, fazendo levantamentos,

respondendo às requisições da delegacia de ensino, atendendo pais. Gastam

também muito tempo organizando eventos, festas, atividades e/ou projetos

específicos solicitados pela direção e/ou delegacia.

Estão frequentemente aturdidos com as questões de indisciplina dos alunos e

a falta dos professores, problemas que se potencializam mutuamente, uma

vez que, quando o professor falta, há que se arrumar “esquemas” para a

permanência dos alunos, pois quase nunca estão nas escolas professores

eventuais.

Na contramão dessa perspectiva, defendemos (BRITO, 2011 e MANSANO,

2014) que as atividades substanciais do Orientador Pedagógico sejam direcionadas ao

planejamento e à organização de ações pedagógicas junto aos professores e Suporte

Pedagógico, bem como ao desenvolvimento de ações formativas no contexto do

trabalho docente.

Considerações e possibilidades

Entre as prescrições e aquilo que, de fato, se realiza na escola há uma lacuna

considerável. Lacuna essa que indica a oposição entre o trabalho prescrito e o trabalho

realizado. Como nos aponta Souza-e-Silva (2002), para a construção de saberes sobre o

trabalho é necessário utilizar como fonte e método a própria análise da atividade. E para

além do distanciamento entre o prescrito e realizado, ressalta também a distância entre o

real pensando (como imaginavamos fazer o trabalho) e o real vivido (procedimentos aos

quais recorremos no cotidiano).

Além disso, precisamos considerar que, no âmbito de cada unidade escolar, os

diferentes sujeitos produzem imagens e expectativas sobre o seu fazer profissional e dos

demais componentes da escola. Tais produções são configuradas nas relações sociais,

nas condições de trabalho, nos afetos, nas emoções, nas palavras e nos diálogos

elaborados (VIGOTSKI, 1989, 1995; BAKHTIN, 1997).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

494ISSN 2177-336X

19

A súmula de atribuições é a mesma para todos os Orientadores Pedagógicos,

entretanto, dadas as condições de trabalho em cada contexto escolar, o desenvolvimento

das atividades se difere. São as compreensões que cada sujeito elabora a partir das

vivências em outros contextos de trabalho e das relações configuradas no âmbito da

escola, que envolve outros sujeitos, com outras vivências.

As prescrições ajudam a configurar e marcar os modos de agir profissional e

cada trabalhador participa ativamente dessa configuração, a partir de suas vivências e

concepções. Sobretudo, esses modos de agir são implicados e impactados pela dinâmica

coletiva e pelas relações constituídas no âmbito de cada escola.

Isso posto, propomos a reorganização da súmula de atribuições com a

necessidade de estabelecer, coletivamente com os Orientadores Pedagógicos, as suas

especificidades, redefinindo as atividades e enfatizando o desenvolvimento de ações

formativas dos docentes em serviço. Neste sentido, ressaltamos a responsabilidade do

poder público em propiciar condições de formação, não só aos professores, como

também aos Orientadores Pedagógicos.

A interpretação de súmulas não é um processo óbvio de relação direta entre o

que prescreve e o agir do profissional. Ao contrário, pressupõe estudos, análise e a

possibilidade de reflexão sobre o próprio trabalho.

Entretanto, salientamos que não basta reorganizar a súmula e desenvolver

coletivamente reflexões sobre as atividades. Há a necessidade de discutir o trabalho

desenvolvido pelo O.P. com todos os segmentos que influenciam (in)diretamente seu

agir profissional, num processo de intersubjetividade, marcado por contradições que

impactam o desenvolvimento da atividade e dos próprios sujeitos.

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municipio-de-sorocaba. Acesso em: 11 jan. 2016.

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497ISSN 2177-336X

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A FORMAÇÃO CONTINUADA DOS OCUPANTES DA FUNÇÃO DE

COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA NA REDE ESTADUAL DE ENSINO

PAULISTA

Rebeca Franciele Vera- UNESP

Maria José da Silva Fernandes- UNESP

Resumo

O presente artigo tem como objetivo discutir a formação continuada do professor

coordenador pedagógico (PCP) na rede estadual de ensino paulista. O texto surgiu de

uma inquietação inicial que teve origem no âmbito do desenvolvimento de uma

pesquisa de mestrado ainda em desenvolvimento: de que maneira a formação

continuada oferecida pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo (SEE-SP)

auxilia os ocupantes da função de coordenação pedagógica no desempenho das

atribuições nas escolas? Os professores coordenadores pedagógicos desta referida rede

assumem a função sem a exigência de um conhecimento específico para atuar na

formação de professores e na articulação do trabalho pedagógico coletivo. Partimos da

hipótese de que a ausência de uma formação inicial específica aliada à precária

formação continuada podem ter grande influência na atuação dos professores

coordenadores pedagógicos no âmbito da escola. Desta forma, nos propomos a

investigar especificamente a formação continuada oferecida por meio de cursos aos

PCPs. Para tal, realizamos uma análise documental a partir das informações contidas no

site oficial da SEE-SP e da Escola de Formação e Aperfeiçoamento de Professores

(EFAP). Usamos para fundamentar nossas discussões autores como: Fernandes (2004,

2008,2010, 2012), Placco, Almeida e Souza (2011). De maneira geral, os resultados

obtidos até o momento nos mostram fortes indícios da fragilidade formativa dos

coordenadores pedagógicos. Os cursos de formação continuada não são exclusivos para

os ocupantes da coordenação pedagógica, sendo atividades pontuais e fragmentadas

além disso, apresentam carga horária curta e conteúdos dissociados das necessidades da

função.

Palavras-chave: Coordenação Pedagógica. Formação Continuada. Rede Estadual

Paulista.

Introdução

A coordenação pedagógica surge como importante função para efetivar as novas

formas de gerir o trabalho coletivo instituídas pela gestão democrática, no final da

década de 1980 e início dos anos 90, muito embora, em décadas anteriores, tenha se

apresentado como atividade no âmbito de projetos específicos da Secretaria Estadual de

Educação de São Paulo (SEE/SP). Essa função, normalmente, desempenhada por um

professor que se ocupa das atividades pedagógicas nas escolas, mostra-se como uma

possibilidade de contraposição às ações centralizadoras, à hierarquização das atividades

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

498ISSN 2177-336X

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e à divisão entre especialistas e executores, já que o coordenador exerce uma função

articuladora no espaço escolar.

Fernandes (2010, CD ROM) define que o coordenador pedagógico

é o responsável, nas unidades escolares, pelas ações de articulação

coletiva do projeto político pedagógico, pelo acompanhamento e

orientação do trabalho docente, pela organização de reuniões

pedagógicas e pelas atividades de formação continuada.

A coordenação pedagógica, apesar de sua reconhecida importância na

organização do trabalho escolar, teve, porém, uma trajetória profissional de

descontinuidade e de difícil reconhecimento nas políticas públicas brasileiras, o que

afetou a constituição de sua identidade. Ao tomar contato com relatos de diferentes

coordenadores pedagógicos do estado de São Paulo e mesmo do Brasil, identificamos

diversas dificuldades apresentadas ao exercício adequado da função, dificuldades estas

relacionadas muitas vezes à falta de clareza das atividades que devem ser realizadas

pelos ocupantes da função nas escolas, o que deriva de uma evidente fragilidade na

formação. Placco, Souza e Almeida (2011) elencam a partir de uma pesquisa nacional

os principais problemas da coordenação pedagógica sendo elas: motivação e disciplina

dos alunos (47%), problemas com pais e comunidade (43%), recursos e infraestrutura

(35%), preparo e motivação dos professores (31%). Dentre os coordenadores

pedagógicos envolvidos na pesquisa nacional 15% apontam como problema para o

exercício da função o excesso de atribuições e a falta de tempo, enquanto que apenas

2% indicaram a formação como um problema da coordenação.

Entendemos que a ausência de uma formação específica para atuação na função

intensifica os problemas cotidianos relacionados ao desempenho satisfatório das

atividades, como já anunciaram Fernandes (2004, 2008) e Placco e Souza (2010).

Macedo (2014), ao realizar pesquisa sobre a formação continuada dos coordenadores

pedagógicos da educação infantil do município de São Bernardo do Campo, também

relata que os coordenadores pedagógicos procuram em cursos de formação continuada

uma maior segurança para sua atuação, já que chegam à função sem uma preparação

específica para atuar com os professores na gestão escolar.

No contexto da rede estadual paulista, especificamente, nos chama a atenção a

formação exigida para os professores quando estes se candidatam à função de

coordenação pedagógica. Quando analisada a Resolução SE 88/07iv

, percebe-se que a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

499ISSN 2177-336X

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coordenação pedagógica é funçãov ocupada por professores licenciados da rede que

apresentem mais de três anos de experiência docente, sem exigência de formação em

Pedagogia, como observa-se abaixo:

I – ser portador de diploma de licenciatura plena;

II – contar, no mínimo, com 3 anos de experiência docente na rede

pública de ensino do Estado de São Paulo;

III – ser efetivo ou ocupante de função‐atividade abrangido pelo § 2º,

do artigo 2º, da Lei Complementar 1.010, de 1º.6.2007, na unidade

escolar em que pretende ser Professor Coordenador (SÃO PAULO,

2007).

A partir das leituras realizadas e das experiências enquanto discente e docente

envolvida num curso desenvolvido no âmbito do programa Núcleos de Ensinovi

, no

campus da Unesp-Bauru, surgiu um questionamento central acerca da formação dos

professores coordenadores pedagógicos: De que maneira a formação continuada

oferecida pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo (SEE-SP) os auxilia no

desempenho das suas atribuições no âmbito da escola, uma vez que são legalmente os

responsáveis pela formação de professores e pela articulação do trabalho coletivo?

Este questionamento relaciona-se com a hipótese principal de que a formação

tanto inicial como continuada tem grande influência na atuação do professor

coordenador pedagógicovii

(PCP), podendo ou não, contribuir para o exercício

satisfatório da função e para o enfrentamento das dificuldades vivenciadas. Uma

segunda hipótese derivada é que a SEE-SP, considerando que o docente não possui uma

formação inicial específica para a função, oferece cursos de formação continuada aos

professores coordenadores pedagógicos, via Escola de Formação e Aperfeiçoamento de

Professores (EFAP), porém, estes cursos não têm sido suficientes para uma atuação

satisfatória na função.

Diante desse cenário, estabelecemos como objetivo central deste artigo analisar

a formação continuada oferecida pela SEE-SP por meio da EFAP para os coordenadores

pedagógicos que atuam na rede estadual paulista, procurando verificar se a formação

proposta contribui para o trabalho realizado nas escolas, especificamente para a

formação de professores. Visando atingir tal objetivo optamos pela análise

bibliográfico-documental. Foram selecionadas resoluções relativas à função e também o

rol de cursos oferecidos pela EFAP nos últimos anos visando identificar as trajetórias

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formativas dos coordenadores pedagógicos e suas implicações para a formação de

professores no cotidiano escolar.

Alguns resultados obtidos na análise documental

A partir do objetivo estabelecido para este artigo realizamos um levantamento

documental fazendo uso de leis e regulamentos apresentados na página oficial da

Secretaria Estadual de Ensino de São Paulo. Selecionamos as resoluções publicadas nos

últimos cinco anos que se referem à função do coordenador pedagógico, já que em

artigo anterior (FERNANDES, 2012) as resoluções publicadas no período de 1996 a

2010 dessa mesma rede de ensino haviam sido apresentadas e analisadas. A análise de

tais documentos nos permitiu verificar quais aspectos formativos são contemplados nas

resoluções, inclusive com a perspectiva de haver ou não formação continuada àqueles

que ocupam a função.

Em consulta ao site da Secretaria Estadual de Ensino de São Paulo localizamos

doze resoluções relacionadas ao professor coordenador pedagógico no período de 2008

a 2015. Dentre estas existiam resoluções específicas para atuação em escolas de tempo

integral, centros de língua e centros de educação de jovens e adultos. Diante disso,

delimitamos para análise apenas as resoluções referentes ao trabalho do coordenador

pedagógico em escolas regulares de ensino fundamental I e II e ensino médio. Na

página oficial da SEE/SP também consultamos o termo „Formação continuada‟ e nesta

busca foi possível localizar sete resoluções publicadas no período de 2011 a 2013.

Dentre este conjunto, selecionamos apenas duas resoluções específicas sobre a

formação continuada.

Após selecionar as resoluções relativas à coordenação pedagógica e à formação

continuada dos ocupantes da função, chegamos à Escola de Formação e

Aperfeiçoamento dos Professores (EFAP), instituição ligada à SEE/SP criada em 2009,

como sendo a principal responsável pelas atuais ações de formação continuada dos

servidores educacionais da rede estadual paulista. Na página oficialviii

da EFAP foi

possível identificar que as ações de formação se dão basicamente por meio de “cursos”

e entre estes selecionamos quais foram ou são aqueles voltados direta ou indiretamente

aos professores aos coordenadores pedagógicos. É importante ressalvar que as

informações obtidas não se referem à totalidade dos cursos, já que em algumas situações

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o acesso às informações era restrito aos professores inscritos. Assim, analisamos apenas

os cursos cujo acesso era público.

No período em que realizamos a análiseix

foi possível obter informações na

categoria “encerrados” de 209 cursos oferecidos. Na categoria “em andamento” são

indicados sete cursos, enquanto com “inscrições abertas” eram apenas três cursos. Do

total de cursos que foram identificados – 219 - selecionamos para análise apenas os que

incluíam os professores coordenadores pedagógicos como um dos sujeitos alvo, o que

totalizou 24 cursos. Identificamos que desses 24 cursos oferecidos pela EFAP nenhum

foi exclusivamente voltado para os PCPs, mas incluíam também outros servidores da

SEE, tais como os Professores Coordenadores do Núcleo Pedagógico (PCNPs),

diretores de escola, vice-diretores, professores especialistas e professores dos Anos

Iniciais. Consideramos que tal fato traz fortes indícios de que nos últimos seis anos não

foram planejados e nem desenvolvidas formações específicas para a função de

Coordenação Pedagógica através da EFAP. Lembramos que os ocupantes da função são

professores licenciados que nem sempre tem diplomação em Pedagogia. Desta forma,

tal situação nos parece bastante problemática porque não há base formativa nem inicial

e nem mesmo continuada para aqueles que se dedicam ao trabalho de formação e

articulação pedagógica do coletivo nas escolas.

Sobre os cursos já encerrados, constatamos que os mesmos tiveram duração

entre 30 a 686 horasx, sendo em sua ampla maioria de curta duração (80% com duração

inferior a 100 horas), realizados à distância e definidos como auto instrucionais, ou seja,

sem a presença de um tutor. Cinco, dos vinte e quatro cursos analisados, contavam com

parcerias externas com outras instituições públicas ou privadas, tais como, a Fundação

Santillana, o Corpo de Bombeiros, Instituto ABCD e a Universidade Estadual Paulista

(UNESP).

Em relação aos conteúdos ministrados nos cursos encerrados, percebemos que

eles eram direcionados a diversos aspectos relacionados à atuação dos professores

coordenadores pedagógicos nas escolas quanto à organização do processo pedagógico, o

que incluía aspectos didáticos e metodológicos, tais como: mecanismos de apoio ao

processo de recuperação da aprendizagem, uso de recursos metodológicos e superação

de defasagens, inclusão social, transtorno global do desenvolvimento, discussão do

Currículo oficial e adaptação curricular, competências e tecnologias, acessibilidade e

diversidade, avaliação externa e Sarespxi

. Outros conteúdos dos cursos relacionavam-se

com a gestão tanto da matéria e da sala de aula como da gestão escolar. Neste caso,

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encontramos os seguintes temas: administração do tempo, gestão na dimensão

pedagógica, observação em sala de aula, modelo pedagógico e de gestão. Nos

documentos intitulados „Regulamentos dos cursos‟, nos quais essas informações foram

retiradas, não havia indicação do referencial bibliográfico que seria adotado nos

diferentes cursos.

Em relação aos sete cursos em andamento sob a responsabilidade da EFAP,

três foram selecionados para análise já que contavam com a participação dos

professores coordenadores pedagógicos. Neste grupo, percebemos que os cursos eram

bem abrangentes e envolviam temáticas relacionadas aos direitos humanos, educação

especial e inclusiva e aprendizagem à distância. A carga horária dos cursos variava entre

60 a 444 horasxii

e contavam com o apoio de instituições como UNESP e o Instituto

ABCD, uma organização da sociedade civil de interesse público. Verificou-se que esses

cursos também foram oferecidos na modalidade à distância.

Na listagem dos conteúdos tratados por esses três cursos, não foi possível

localizar aqueles que se relacionassem especificamente à atuação do professor

coordenador pedagógico, tratando-se, portanto, de temáticas abrangentes e voltadas ao

público escolar de maneira geral. Os objetivos traçados faziam referências genéricas ao

fato de o coordenador pedagógico auxiliar os docentes nas temáticas de cidadania e na

formação de professores capazes de identificar alunos com riscos para transtornos

funcionais de aprendizagem. Ou seja, neste bloco de cursos, os professores

coordenadores pedagógicos eram tratados como sujeitos secundários nas situações

formativas, tendo apenas o papel de transmissor no espaço escolar das determinações

apresentadas nos cursos. Registramos que consideramos válida a discussão de tais temas

– direitos humanos e educação inclusiva - entre os diferentes pares nas unidades

escolares, porém, as especificidades de cada função devem ser levadas em conta, assim

como as necessidades das escolas. Sem que se discuta qual o papel a ser desempenhado

pelos PCPs torna-se difícil destacá-los para ações nas quais não é um sujeito ativo.

Na categoria “inscrições abertas” encontramos dois cursos entre os três

disponíveis que tinham o professor coordenador como público alvo. Assim como nas

demais categorias, nenhum dos cursos era exclusivo para os ocupantes da função de

coordenação pedagógica. A modalidade dos dois cursos era à distância e a carga horária

apresentada era de um total de 30 horas. Na ementa de um dos cursos encontramos um

tópico propondo a discussão sobre o papel do PCP na articulação pedagógica frente ao

processo de recuperação da aprendizagem, porém não foram apresentados como seria

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feita essa discussão e nem mesmo quais seriam os referenciais teóricos para explorar o

tópico.

Ao fazer um balanço geral, constatamos que os cursos oferecidos pela EFAP

são rápidos (a maioria com menos de 100horas de duração), realizados de forma pontual

(não observamos articulação e continuidade nas temáticas desenvolvidas) e com

inscrição limitada e opcional dos professores coordenadores pedagógicos. Notamos

também que ao serem realizados na modalidade à distância e normalmente fora da carga

horária de trabalho semanal (uma carga horária sempre intensa e extensa), são reduzidas

as possibilidades do professor coordenador pedagógico quanto à socialização e

aprendizagem coletiva com outros colegas que desempenham a mesma função, o que

poderia, inclusive, colaborar no fortalecimento da identidade da função.

Entendemos que ações realizadas no formato adotado pela SEE/SP via EFAP

estão na contramão da formação continuada defendida por autores como Nóvoa (2002)

e Marin (1995), reforçando nossa hipótese da fragilidade formativa a que os

coordenadores pedagógicos estão submetidos na rede estadual paulista. Tal fato se

agrava pela ausência de consideração das necessidades escolares na definição dos temas

e conteúdos a serem desenvolvidos, reforçando uma visão que lutamos para ser

superada: o professor enquanto executor das determinações externas. A formação frágil

e a ausência de uma política formativa séria e qualificada acarretam sérias implicações

para o trabalho que o professor coordenador pedagógico realiza nas escolas. Sem saber

o que fazer e como fazer o seu trabalho – articulador e formativo – o PCP entrega-se,

muitas vezes, ao imediatismo das necessidades escolares, realizando um amplo rol de

tarefas que dificultam uma atuação mais efetiva na formação dos professores sob sua

responsabilidade.

Considerações finais

A situação dos professores coordenadores pedagógicos que atuam na rede

estadual paulista analisada por meio dos documentos – resoluções e propostas dos

cursos – trazem fortes indícios da fragilidade formativa dos ocupantes da função.

Sabendo das complexas atribuições que lhes cabem cotidianamente, defendemos que é

necessário uma formação continuada comprometida com a realidade das escolas de

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forma que os PCPs possam contribuir para a melhoria da prática pedagógica e para a

efetivação da gestão democrática.

De maneira geral, foi possível observar que não há por parte da SEE/SP e da

EFAP uma política de formação específica dos coordenadores pedagógicos, mesmo

estes representando um total de mais de cinco mil ocupantes da função nas diferentes

escolas paulistas. Também é visível a participação de outras instituições nos cursos

oferecidos, sejam estas públicas e privadas. Neste aspecto, notamos a presença crescente

das organizações sociais de interesse público, tendência crescente e arriscada que vem

ganhando forças na educação pública paulista.

Na ausência de uma política efetiva e continuada de formação de

coordenadores pedagógicos, transferiu-se aos sujeitos a escolha por participar ou não

dos “cursos” oferecidos, normalmente a serem realizados à distância e fora do horário

regular de trabalho. Da mesma forma, não têm sido considerados os resultados de

pesquisas já realizadas (FERNANDES, 2012; PLACCO, ALMEIDA E SOUZA, 2011)

sobre a coordenação pedagógica que indicam a fragilidade na formação dos ocupantes

da função, ou seja, os cursos organizados não têm servido para ampliar a formação

daqueles que deverão se ocupar, nos espaços escolares, da formação continuada dos

demais professores.

Os cursos de formação continuada voltados para os PCPs não são exclusivos

para os ocupantes da função, dificultando a discussão de aspectos específicos do

trabalho cotidiano. Por mais que tratem de temáticas inerentes à função, os cursos não

conseguem atender as especificidades dos sujeitos envolvidos no processo formativo, o

que se agrava pela visível falta de articulação entre as temáticas e os conteúdos

apresentados. Tal fato se agrava pela modalidade na qual os cursos são oferecidos: à

distância. Como já apontado em pesquisas realizadas (MUNDIM, 2011; MACEDO,

2014), é fundamental fomentar e criar condições para a discussão entre pares, já que

muitas vezes os coordenadores pedagógicos apresentam sentimentos de solidão e

isolamento, o que amplia as dificuldades para o fortalecimento de uma identidade do

trabalho e para uma atuação mais efetiva e satisfatória nas escolas. Por mais

heterogêneo que sejam os grupos de coordenadores pedagógicos envolvidos nos

processos formativos consideramos que os encontros presenciais são fundamentais para

a partilha de experiências e para a aprendizagem coletiva.

No que tange aos conteúdos indicados nos cursos oferecidos aos coordenadores

pedagógicos, notamos que em sua maioria estes não correspondem às discussões das

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atribuições que são conferidas pela Resolução SE nº 88/2007. Da mesma forma, os

objetivos dos cursos geralmente não fazem referência direta ao professor coordenador

pedagógico, notando-se que por fazer parte do Quadro de magistério (QM), acabam

sendo incluído no público alvo. Inferimos que nesses momentos de formação os PCPs

não conseguem sanar dúvidas referentes à sua atuação, pois o público geralmente é bem

diversificado o que impossibilita tratar das especificidades de cada grupo. Por outro

lado, podemos inferir que os cursos pontuais oferecidos com carga horária reduzida

(mesmo as pesquisas indicando há alguns anos a baixa efetividade de atividades deste

tipo) podem estar se constituindo apenas como momentos de apresentação de projetos

da rede, sem alterar efetivamente os processos de formação voltados à coordenação

pedagógica, sendo, portanto, uma (de) formação profissional.

Neste sentido, fragiliza-se não apenas a formação dos coordenadores

pedagógicos, mas coloca-se em risco a formação continuada de professores de forma

geral, já que esta é uma das principais atribuições da função. Desta forma, dada a

importância da coordenação pedagógica na organização escolar, torna-se necessário que

o professor responsável por esta função esteja preparado para formar, apoiar e orientar o

professor. Consequentemente, torna-se imprescindível que investimentos públicos

sejam realizados na formação continuada do coordenador pedagógico, um sujeito que

deve ser reconhecido frente ao trabalho que desempenha e deve desempenhar nas

escolas. O cenário que ora apresentamos nos incomoda e nos instiga a continuar

investigando a realidade da formação continuada na rede estadual paulista,

principalmente por meio de investigações empíricas. Afinal, quem forma o formador?

Referências

FERNANDES, Maria José da Silva. Problematizando o trabalho do professor

coordenador pedagógico nas escolas públicas paulistas. Araraquara, 2004. 113 p.

Dissertação (Mestrado em Educação Escolar) – Faculdade de Ciências e Letras,

Campus de Araraquara, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”

__________________________. A coordenação pedagógica em face das reformas

educacionais paulistas: o trabalho desvelado. Araraquara, 2008. 282 p. Tese

(Doutorado em Educação Escolar) – Faculdade de Ciências e Letras, UNESP – Campus

Araraquara.

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__________________________. Coordenador pedagógico. In: OLIVEIRA, D.A:

DUARTE,A.M.C.; VIEIRA, L.M.F. Dicionário: trabalho, profissão e condição

docente. Belo Horizonte: UFMG/Faculdade de Educação. 2010.CDROM.

MACEDO, S.R.B. A contribuição da formação continuada para a atuação dos

coordenadores pedagógicos da Educação Infantil de São Bernardo do Campo. São

Paulo, 2014, 194p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação.

USP.

MARIN, A. J. Educação Continuada: introdução a uma análise de termos e concepções.

Caderno CEDES. Campinas. São Paulo: Papirus, n.36, 1995.

MUNDIM, E.D.A. A constituição do sujeito coordenador pedagógico: processos e

interações. Brasília, 2011. 147p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de

Educação, UnB.

NÓVOA, A. Formação de professores e Trabalho pedagógico. Lisboa: EDUCA,

2002.

PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza; ALMEIDA, Laurinda Ramalho de.; SOUZA,

Vera Lúcia Trevisan de Souza. O coordenador pedagógico e a formação de

professores: intenções, tensões e contradições. Estudos & Pesquisas Educacionais nº. 2.

São Paulo: Fundação Victor Civita, 2011.

PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza; SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de Souza.

Diferentes aprendizagens do coordenador pedagógico. In: ALMEIDA, Laurinda

Ramalho de.; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (Org.). O coordenador

pedagógico e o atendimento a diversidade. São Paulo: Edições Loyola, 2010.

SÃO PAULO. (Estado). Resolução SE 88, de 19 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a

função gratificada de Professor Coordenador. Disponível em: <

http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/88_07.HTM> . Acesso em:15 de maio de

2015.

i Orientador Pedagógico é o termo atribuído na cidade pesquisada ao cargo responsável pelo acompanhamento e

coordenação do trabalho pedagógico da escola. Denominações diferentes são utilizadas em outros municípios e

estados, como Coordenação Pedagógica, Professor Coordenador, Coordenação Educacional, Supervisão Pedagógica. ii Súmula de atribuições é um texto que apresenta indicações prescritivas do agir profissional.

iiiEstavam circunscritos na denominação “Especialistas da educação” os seguintes cargos: Coordenador Pedagógico,

Orientador Educacional, Diretor de Escola de Educação Infantil, Assistente de Direção, e Diretor de Escola de 1º e 2º

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graus regular e/ou supletivo. O supervisor de ensino constituía-se em função gratificada, isto é, era designado para

ocupar a atividade. ivAlterada pela Resolução SE 53 de 26/06/2010, pela Resolução SE 8 de 15/02/2011, pela Resolução SE

42 de 10/04/2012 e retificada em 18/04/2012 vDiferente de cargo, a função é sempre uma ocupação temporária porque não está atrelada a realização de

um concurso público de ingresso e efetivação. O acesso a uma função se dá através de designações, ou

seja, autorizações para que um funcionário da Secretaria de Educação realize temporariamente atividades

previstas no Estatuto do Magistério (FERNANDES, p.54, 2004). viO programa Núcleos de Ensino tem por objetivo promover a parceria entre a Universidade e a escola

pública; incentivar o ensino e a pesquisa de caráter disciplinar ou interdisciplinar nas unidades de

Educação Infantil, Fundamental e Médio do Sistema Público de Ensino; contribuir com os processos de

formação inicial dos graduandos da Unesp e de formação continuada dos professores da rede pública de

ensino. O programa recebe apoio financeiro da Pró-Reitoria de Graduação – PROGRAD. vii

Desde 2007 a função é denominada apenas PC – Professor Coordenador. Por discordarmos da

denominação genérica demais, continuamos a nos referir ao Professor Coordenador Pedagógico,

considerando que o “pedagógico” carrega a essência do trabalho. viii

http://www.rededosaber.sp.gov.br/portais/efap/in%C3%ADcio.aspx ix

Esse levantamento aconteceu entre os meses de agosto e setembro de 2015. xUm curso referente à especialização realizado em parceria com a Universidade Estadual Paulista

(UNESP). xi

Sistema de avaliação do rendimento escolar do estado de São Paulo. xii

Curso de especialização, em nível de pós-graduação, em parceria com a Universidade Estadual Paulista

(UNESP).

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