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72 A pecuária de corte brasileira e o aquecimento global A pecuária de corte brasileira e o aquecimento global ISSN 1980-6841 Novembro, 2007

A pecuária de corte brasileira e o aquecimento global · A degradação de pastagens, o aquecimento global e outras alterações climáticas ... exportador de carne bovina do mundo

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72

A pecuária de corte brasileira

e o aquecimento global

A pecuária de corte brasileira

e o aquecimento global

ISSN 1980-6841Novembro, 2007

Documentos 72

Odo Primavesi

A pecuária de corte brasileirae o aquecimento global

São Carlos, SP2007

ISSN 1980-6841

Novembro, 2007

Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuáriaEmbrapa Pecuária SudesteMinistério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Embrapa Pecuária SudesteRodovia Washington Luiz, km 234Caixa Postal 339 - 13560-970 - São Carlos, SPFone: (16) 3361-5611Fax: (16) 3361-5754Home page: http:\\www.cppse.embrapa.brEndereço eletrônico: [email protected]

Comitê de Publicações da UnidadePresidente: Alberto C. de Campos BernardiSecretário-Executivo: Edison Beno PottMembros: Carlos Eduardo Silva Santos, Maria Cristina C. Brito,Odo Primavesi, Sônia Borges de Alencar

Revisor de texto: Edison Beno PottNormalização bibliográfica: Sônia Borges de AlencarFoto da capa: Odo PrimavesiEditoração eletrônica: Maria Cristina Campanelli Brito

1a edição on-line

Todos os direitos reservados.A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou emparte, constitui violação dos direitos autorais (Lei no 9.610).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIPEmbrapa Pecuária Sudeste

Primavesi, Odo A pecuária de corte brasileira e o aquecimento global [Recurso eletrônico]/ Odo Primavesi.— São Carlos: Embrapa Pecuária Sudeste, 2007.

Modo de acesso:

Título da página na Web (acesso em 27 de novembro de 2007) 43p. (Documentos / Embrapa Pecuária Sudeste,72).

ISSN: 1980-6841

1. Pecuária de Corte - Aquecimento global. I. Título. II. Série.

CDD: 636.2© Embrapa 2007

<http://www.cppse.embrapa.br/servicos/publicacaogratuita/documentos/Documentos72.pdf/view>.

Odo PrimavesiEngenheiro Agrônomo, Dr., Pesquisador da EmbrapaPecuária Sudeste, Rod. Washington Luiz, km 234,Caixa Postal 339, CEP: 13560-970, São Carlos, SP.Endereço eletrônico: [email protected]

Autor

Sumário

Resumo ..............................................................................................7

A situação .........................................................................................8

Fundamentos ambientais ........................................................... 10

Produção de gases de efeito estufa ........................................ 16

A degradação de pastagens, o aquecimento global eoutras alterações climáticas ..................................................... 20

Boas práticas de manejo para minimizar os efeitos dapecuária no aquecimento global .............................................. 22

Pecuária bovina conduzida em regime de pasto ................. 27

O componente arbóreo no ambiente pastorial ..................... 31

A pecuária na Amazônia e o aquecimento global ............... 32

O aquecimento global e a pecuária ......................................... 36

Pontos finais a destacar ............................................................. 38

Referências .................................................................................... 41

A pecuária de cortebrasileira e o aquecimentoglobal*Odo Primavesi

Resumo

Em entrevista exclusiva ao BeefPoint, em 4/4/2007,foi abordado o impacto da pecuária de corte brasileira noaquecimento global. São apontadas várias ações possíveispara a pecuária de corte conduzida em pastagens ou emconfinamento, visando à preservação ambiental e aoaumento da lucratividade. São destacadas as boas práticasde manejo do solo, das pastagens e dos animais como asaída para a produção pecuária mais eficienteambientalmente e mais produtiva.

* Nota de rodapé: Adaptado de entrevista exclusiva para Miguel da RochaCavalcanti do BeefPoint.

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A situação

Recente relatório da Food and AgriculturalOrganization (FAO), intitulado Livestock’s long shadow(Steinfeld et al., 2006), relata que a produção pecuáriamundial produz mais CO2 (ou equivalente) do que todo osistema de transporte no mundo, quando se considera odesmatamento e a queimada de florestas, a produção demetano pela fermentação ruminal e a produção de metanopela fermentação de dejetos. Segundo esse relatório, osconfinamentos em geral, mas sobretudo os de suínos,afetam direta e prioritariamente a qualidade ambiental emfunção do acúmulo de dejetos não adequadamente tratadosou do lançamento desses dejetos em corpos de água ou dasua manutenção por certo tempo em lagoas de decantaçãoou do seu acúmulo sem tratamento. Nesses dejetos existemcondições de anaerobiose, onde há transformação denitratos em óxido nitroso (N2O) e emissão de metano (CH4)em lugar de gás carbônico (CO2).

Esse relatório de levantamento da situação dapecuária mundial organizado pela FAO descreve muito beme em detalhes o impacto das criações (ruminantes e nãoruminantes) conduzidas em sistemas de produção extensivae intensiva ou industrial. Porém, os valores gerais elevadosde emissão de CO2 advém do fato de serem incluídos nomesmo pacote de conclusões os sistemas de produção detodas as espécies animais (aves, suínos, bovinos e outros),não somente dentro da porteira, mas na cadeia produtivatoda até o consumidor final, até mesmo o segmento dotransporte com seu consumo de energia fóssil.

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O título do trabalho (long shadow) reflete similaridadecom um índice aplicado ao impacto ambiental do consumohumano sobre recursos naturais, chamado “pegadaecológica” (ecological footprint). Esse índice é deaproximadamente 10 ha por pessoa que vive nos EstadosUnidos da América (pegada seis vezes maior do que acapacidade de suporte biológico da natureza, em vista doconsumismo perdulário e do uso muito pouco eficiente dosrecursos naturais e dos insumos) e de 5,6 ha por pessoa quevive na Europa, quando o mundo dispõe de 1,7 ha porpessoa para a atual população mundial e deve ser de apenas1 ha por pessoa no ano 2050, em vista do aumentopopulacional, sem considerar a redução de áreas agrícolascausada por degradação e o uso perdulário do capitalnatural. Alguém deve estar passando ou vai passar fome esede. Realmente, já são mais de dois bilhões de pessoas nomundo que sofrem sérias restrições em suas necessidadesbásicas de água e de alimento.

Já existem sistemas de produção que seguemcritérios ecológicos, incluindo biodiversidade integrada,reciclagem e uso de energia alternativa, em que se vivebem, até mesmo com educação superior, em apenas 1/4 dehectare por pessoa, ou com educação de nível secundárioem apenas 1/16 de hectare por pessoa. Este pode serconsiderado o limite mínimo de área geográfica para seviver com dignidade, se for considerado o atendimento denecessidades básicas mínimas.

A preocupação atual é sobre o rumo que nossapecuária deve tomar, especificamente a de corte.Acreditamos que seja interessante localizar o leitor no querealmente são os problemas e no que poderá ser utilizadopara limitar nossas exportações (barreiras ambientais, além

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das sociais e sanitárias), sabendo-se que na realidadealgumas práticas de manejo tradicionais devem serabandonadas, porque, por serem perdulárias, no uso derecursos naturais e de insumos, e pouco eficientes,prejudicam o ambiente, seus serviços ambientais e aprodutividade do sistema de produção. A partir dessasnovas percepções cada produtor ou cada empresário poderámontar seu conjunto de tecnologias adequadas para seulocal.

Deve-se considerar que o Brasil é hoje o maiorexportador de carne bovina do mundo. Os objetivos do setorpassam por ampliar a produção e aumentar o consumointerno e principalmente as exportações. E aí surge apergunta: é possível conciliar aumento de produção com abusca de um sistema de produção que tenha emissãonegativa de CO2, ou seja, que seqüestre CO2, ou que reduzao impacto sobre o aquecimento global e que seja menosafetado por este aquecimento?

Fundamentos ambientais

O relatório da FAO informa que a pecuária bovina decorte praticada de maneira extensiva ou muito intensivaproduz impactos ambientais negativos que necessitam serevitados. Então, vejamos alguns fundamentos, para que asituação possa ser melhor percebida e melhor avaliada. Talvez atémesmo possamos ter condições de sugerir soluções criativas.

Estudos, como os de Liebmann (1976) e Diamond (2005),mostram que muitas civilizações humanas concentradas em áreasurbanas, “confinamentos”, desapareceram por falta dealimentos (degradação de solos no entorno das cidades), por

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falta de água limpa (degradação do ciclo da água causadapor degradação de solos e de matas, ou seja, da vegetaçãopermanente diversificada) e por falta de saneamento básico(lixo e esgoto lançados nas ruas). Atualmente verifica-seintensificação dessas atividades degradadoras edepredadoras em escala global, com lançamento intenso delixo sólido (devido ao consumismo exagerado; semreciclagem ou reutilização), lixo líquido (p. ex., esgoto semtratamento), lixo gasoso (p. ex., gases de efeito estufa) elixo radiativo (p. ex., calor e luz com quebra do ciclocircadiano), uso intenso de venenos ou substâncias emconcentrações nocivas e exclusão social.Primavesi & Primavesi (2003) e Primavesi et al. (2007)identificaram um referencial com características ambientaisque deve ser evitado a todo custo no manejo dos recursosnaturais: o ambiente natural primário, ainda com rochasexpostas e que existia quando a vida saiu dos mares paracolonizar os continentes, sem solo, sem lençol freático, sem águaresidente, sem cadeia alimentar, sem biodiversidade, com grandesvariações de temperatura e de umidade relativa do ar durante odia, e que não tem capacidade de suporte biológico. Solosdegradados, compactados ou até mesmo encrostados, semcobertura vegetal, começam a ter características semelhantes aesse ambiente natural primário. O mesmo acontece quando sesubstitui as áreas verdes de um lote urbano por área cimentada,impermeável. Quando se compara esse ambiente naturalprimário com um ambiente natural clímax, por exemplo,uma área de mata, percebe-se que, para haver capacidadede suporte biológico e condições de vida e de produção,necessita-se de infra-estrutura natural e de serviçosambientais essenciais integrados e interagindo.

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A infra-estrutura natural (Primavesi et al., 2006), ohardware para rodar os sistemas produtivos, como apecuária de corte, é composta de água residente(recarregada pelas chuvas: armazenada no lençol freático,na serapilheira e na vegetação), em solo permeável,protegido e mantido permeável por vegetação permanente ediversificada (em tripla camada protetora: dossel ou copas,restos vegetais ou serapilheira, e trama radicular quemantém solo permeável). Quando se deixa a terra cansadaem pousio, verifica-se, após quatro a oito anos de descansoe de formação de capoeira, que ocorre restabelecimentodessa infra-estrutura natural essencial. O solo de umapastagem de capim-braquiária, de baixa fertilidade ecompactado, volta a ser permeável com descanso de 18meses. Quando a pastagem é estimulada com uso defertilizantes, com retorno de material orgânico na superfíciedo solo e com pastejo rotacionado, o descanso de 35 dias ésuficiente para manter o mesmo solo permeável.

Os serviços ambientais essenciais, o sistemaoperacional (o software), necessários para o funcionamentodos sistemas produtivos e que resultam dessa infra-estrutura natural conservada, são principalmente:

a) A água das chuvas armazenada no lençol freático(abastece as plantas, as nascentes e os poços; tambémos projetos de irrigação).

b) A atenuação e a manutenção de variação térmicapequena, com proteção do solo contra aquecimentoexcessivo. Nota: em temperaturas acima de 33oC noespaço ocupado pelas raízes, as plantas não absorvemnem água nem nutrientes.

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c) A manutenção da umidade relativa do ar, por meio dacobertura vegetal permanente vaporizadora ehidrotermorreguladora. A cobertura vegetal vaporiza dequatro a dez vezes mais água para umidificar o ar do queum corpo de água com a mesma superfície; por exemplo,a substituição de uma floresta por uma represa em geralaumenta os períodos de baixa umidade relativa do ar.Essa manutenção evita que as plantas de interesse(cultivos agrícolas e pastagens) sofram de transpiraçãoexcessiva e que as folhas murchem e parem de fazerfotossíntese, resultando em perdas de produção.

Vegetais que contém umidade, em especial árvorescom sistema radicular profundo e que não perdem as folhasna seca, e corpos de água funcionam como atenuadores oucomo estabilizadores térmicos (demoram a esquentar edemoram a esfriar, o que resulta em menor amplitudetérmica no solo e no ar, o que é desejável), se comparadoscom solo nu ou descoberto (como em áreas degradadas, queirradiam o calor que abastece os gases de efeito estufa e aomesmo tempo reduz a umidade relativa do ar) ou com rochaou cimentado (materiais densos e secos).

A natureza, quando dispõe de água, mantém acoloração escura das folhas (albedo baixo, absorve maisradiação solar e irradia calor) e a transpiração das plantas(neutraliza o efeito aquecedor; um grama de águavaporizado retira 590 calorias do ar). Porém, quando aescassez de água é intensa, as folhas secam e suacoloração se torna mais clara (albedo mais alto - superfíciesbrancas ou prateadas têm albedo máximo e esquentammenos -, já que refletem radiação solar). Quando se queimaessas folhas ou palhadas claras, transforma-se tudo em

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cinzas negras (corpo escuro, com albedo mínimo, ou seja,máxima absorção de radiação solar e grande irradiação decalor - infravermelho -), e fumaça, que abastece os gases deefeito estufa, além do calor liberado da matéria secadurante a queimada. Os liquens, primeiros vegetais acolonizar os ambientes naturais primários, as rochas, paraformar solo, tinham coloração clara, prateada, de modo arefletir radiação solar, evitar aquecimento exagerado dosubstrato e reduzir perdas de água por evaporação.

Essa transformação de ambiente natural primário,rochoso, inóspito para a vida, em ambiente natural clímax,altamente hospitaleiro para a vida e com grande capacidadede suporte biológico, chama-se desenvolvimento. Asárvores são estratégicas para permitir o máximo de acúmulode energia solar por unidade de área, de 120 a 360 t/ha dematéria seca, o que eqüivale ao acúmulo de gás carbônicode 240 a 720 t/ha. Se quisermos considerar também aprodução de matéria seca por unidade de tempo, não temquem possa competir com as gramíneas tropicais, como ocapim-elefante e a cana-de-açúcar (em torno de 50 a 70 t/ha por ano de matéria seca ou 100 a 140 t/ha por ano de gáscarbônico acumulado), comparado com eucalipto, árvore derápido desenvolvimento, que produz em torno de 20 t/ha porano (equivale a 40 t/ha por ano de gás carbônico).

Deve-se lembrar que as plantas são o elo fundamentalda cadeia alimentar; elas conseguem acumular muitaenergia na forma de biomassa e cumprem o seu papel dealimentar o restante dos componentes da cadeia, passandopelos herbívoros (como bovinos e outros ruminantes),carnívoros, onívoros (ser humano) e decompositores (quefazem a reciclagem na natureza). A retirada extensivadessa estrutura vaporizadora formada pelas copas de

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árvores e pelos arbustos, a queima dos restos vegetais(serapilheira) e a exposição do solo aos impactos das chuvastropicais (mais pesadas e mais erosivas do que as de climatemperado) levam à formação de crostas superficiais, àcompactação, à erosão e à aquisição de características derocha: aquecimento e esfriamento rápido (grande amplitudetérmica durante o dia) associados a baixa ou ausência decapacidade de infiltração de água das chuvas para repor olençol freático. Este é um processo chamado de regressãoecológica, que volta às origens - ambientes inóspitos à vidae à produção, sem capacidade de suporte biológico: semi-áridos, áridos e desérticos, mesmo que ocorram 2.000 mmde chuvas por ano! Devemos encontrar um meio termo demanejo ambiental! Não podemos deixar tudo virar áreadegradada, deserto.

O perigo é maior quanto mais próximo estivermos doequador. Deve ser lembrada a formação do deserto deAlegrete (atualmente controlado por reflorestamento deeucalipto), no Rio Grande do Sul, Estado em que adistribuição de chuvas ao longo do ano era e ainda éinvejável. Mas isso está mudando, assim como em RibeirãoPreto, onde já foram ensaiadas as primeiras ocorrências deumidade relativa do ar típica de deserto, de 4,8%, sinaldramático de um futuro sombrio ao potencial agropecuáriobrasileiro, se as tecnologias de manejo copiadas de climatemperado não forem adaptadas para condições tropicais,onde o controle da temperatura e o manejo da água no soloe no ar são estratégicos. Ambos os casos não têm oaquecimento global como causa, só como agravante. Acausa é o péssimo manejo ambiental, com transgressãoacintosa de princípios e de normas ecológicas. A naturezacobra as transgressões. A própria natureza necessita seguir

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normas rígidas para manter a vida e ser produtiva - manter acapacidade de suporte biológico: construir e manter a infra-estrutura natural e os serviços ambientais essenciais. O serhumano que maneja a natureza necessita enquadrar suasatividades produtivas nessas normas, para não ter prejuízoe, em caso extremo, não ser condenado à doença e à mortepor sede, fome, calor, frio, raios, enchentes, seca,soterramento, doenças transmitidas por insetos e pragas eoutras calamidades.

Produção de gases de efeito estufa

Quando a matéria seca vegetal, celulósica, édecomposta em condições de presença de ar (oxigênio),libera energia, gás carbônico, minerais e água. Mas emcondições sem ou com muito pouco oxigênio (solosencharcados ou compactados, represamentos, pântanos,aterros sanitários, lagoas de decantação de dejetos oumesmo acúmulo de dejetos, sistema digestivo de cupins,sistema digestivo de ruminantes) em lugar de CO2 essadecomposição vegetal libera CH4 (gás 25 vezes maiscalorífico do que CO2), o qual em aterros sanitários setransforma em CO2 ao ser queimado. Cada quilograma dematéria seca de origem vegetal produz em média 2 kg deCO2. Por exemplo, a queima completa de um hectare demata amazônica com 250 t de matéria seca lançará 500 t/ha de CO2 na atmosfera, além de fuligem, aerossóis e outrosgases. Posteriormente, quando se lavra o solo para cultivose se reduz o teor de matéria orgânica de 3,5% para 1,5%,lança-se mais em torno de 80 t/ha de CO2 no ar.

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Um bovino de corte com aproximadamente 350 kg depeso vivo em pastejo gera entre 40 e 70 kg de metano porano, o que equivale a 25 vezes mais em termos de CO2, ouseja, entre 1,0 e 1,7 t por animal por ano de CO2-equivalente. Um bovino de leite em lactação de altaprodução gera entre 100 e 150 kg de CH4 por ano. Pode-seperder de 2% (dieta à base de grãos) até 18% (forragem debaixa qualidade e com baixo teor de proteína bruta) daenergia bruta ingerida na forma de metano; aceita-se comonormal o valor em torno de 6%. Esse metano emitidogeralmente é impedido de ser reciclado pela naturezaquando ela estiver degradada, pois, por exemplo, o ozônioproduzido nas queimadas, a partir de NO, neutraliza osradicais OH- (hidroxila) antes que esses possam neutralizar oCH4. Além disso, a destruição da atividade biológica do solopor falta de fonte de energia (restos vegetais e palhadaqueimada, e degradação da matéria orgânica do solo) e afalta de oxigênio em solos encrostados e compactados nãopermitem a oxidação do CH4, processo que ocorre somenteem solos similares aos encontrados sob vegetação de mata,ricos em material orgânico e bem arejados e permeáveis.Em sistemas intensivos, com animais confinados,geralmente ocorre grande consumo de alimentos comgrande concentração de energia por unidade de massa, osquais podem ultrapassar 90% da composição da dieta,em termos de matéria seca ingerida. Certamente aprodução de metano nesse caso pode cair para até 2% daenergia bruta ingerida. Mas, em geral transfere-se oproblema da geração de gases de efeito estufa da áreaanimal para a área agrícola, onde são produzidos os grãos(os alimentos concentrados). Em condições de solo comproblemas de arejamento (compactados, encharcados) e de

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aporte de nitrogênio mineral, orgânico ou mesmo porfixação biológica e presença de nitrato, pode havertransformação do nitrato em óxido nitroso, gás de efeitoestufa 250 vezes mais potente do que o CO2 para retercalor. Esse N2O liberado nas lavouras de grãos foicontabilizado no impacto ambiental da pecuária. Como osbovinos são péssimos conversores de grãos em carne, deveser evitado o sistema de confinamento no estilo norte-americano. Embora ocorra depressão na produção demetano, redução da ruminação e diminuição doincremento calórico, a eficiência de utilização da energiaingerida tende a ser maior com dietas concentradas,quando comparadas a dietas volumosas, devido ao menorrequerimento líquido de mantença. Também, a utilizaçãode alimentos volumosos de melhor qualidade é maiseficiente do que a dos de pior qualidade (Veras et al.,2001). Porém, grãos são considerados alimento humano enesse caso os bovinos são competidores por alimentos.Esse tipo de enfoque está sendo considerado de formacrescente, quando se utiliza o conceito de pegadaecológica. A área necessária para produzir os alimentosque alguém consome aumenta muito quando aprodutividade ou a eficiência produtiva é baixa. Porexemplo, a pegada ecológica de alguém que consomecarne bovina oriunda de uma sistema extensivo queproduz 25 kg/ha por ano de carne resulta muito maior doque aquela de um sistema que produz 250 ou até mesmo500 kg/ha por ano de carne. Em geral, nesse sistemaextensivo os animais serão terminados em 3,5 a 4 anos,por causa dos períodos de fome e de perdas de peso e deenergia em longas caminhadas na procura de forragem e deágua, o que resulta em grande produção de metano por

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quilograma de carne e em prejuízos! Além disso, no manejodesses sistemas extensivos geralmente entra o fogo(queimada do capim seco), que leva a pastagem àdegradação, por causa do superpastejo.

O problema do acúmulo de esterco, com geração degrandes quantidades de óxido nitroso e de metano, sóocorre em confinamentos e em matadouros oufrigoríficos. Em condições de pastejo, as fezes sãodistribuídas pela área e não causam problemas defermentação anaeróbica expressiva. Os besouroscoprófagos (rola-bosta) se encarregam de decompor osbolos fecais.

Em confinamentos pequenos pode haverdistribuição das fezes em lavouras do entorno, comofertilizante. Em grandes confinamentos, o problema setorna similar ao do destino do vinhoto nas usinas deaçúcar e álcool anos atrás. A aplicação em excesso nosolo pode gerar desequilíbrios minerais e contaminaçãodo lençol freático com nitrato ou mesmo com fosfato, emespecial perto de nascentes ou quando o lençol freáticofor superficial.

Em lugar de montar sistemas de transporte e dedistribuição complexos, podem ser instaladas lagoas dedecantação cobertas, para que o metano liberado durantea fermentação anaeróbia possa ser coletado e utilizado nageração de energia. O líquido final pode ser utilizadocomo biofertilizante. Já existe possibilidade de venda decrédito de carbono quando a escala for grande (6.000bovinos de leite ou 10.000 a 12.000 bovinos de corte). Ocusto de incorporação ao processo ainda é elevado,embora existam casos exemplares na área dasuinocultura.

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A degradação de pastagens, o aquecimento global e outrasalterações climáticas

Os gases de efeito estufa são como um cobertorcomum, que não gera calor, mas somente retém o calorirradiado pelo corpo, no caso a Terra, e o irradia de volta.Quais são as superfícies da Terra que mais irradiam calor?Com base na premissa de que a radiação solar seja amesma, é a areia de praia às 15h seca ou a areia úmida? Éum gramado ou o asfalto? É uma parede ou um muro cobertopor plantas vaporizadoras ou um muro descoberto? É o solonu ou o solo coberto por plantas ou por restos vegetais? Asplantas, assim como os corpos de água, atenuam atemperatura, pois a água aquece e esfria mais lentamente.Superfícies secas esquentam mais ao sol e esfriam mais ànoite. Além disso, as plantas, quando têm água disponívelpara transpirar e vaporizar, lançam vapor de água no ar; apassagem da água da fase líquida para a fase gasosa retiracalor do ar.

Assim, lavouras e pastagens em que há solo expostoe nenhum elemento vaporizador (bosque, faixa de árvores,matas ciliares, reservas legais, quebra-vento, sombra, etc.)são como “forninhos” que irradiam grandes quantidades decalor (infravermelho); esse calor será retido pela camada degases de efeito estufa e irradiado de volta para a Terra,gerando o aquecimento global, porque o cobertor de gasesestá engrossando. Antes, quando era mais fino, deixava ocalor escapar para o espaço sideral.

As áreas desérticas tropicais e subtropicais sãograndes fornalhas irradiadoras de calor (>300 W/m2),conforme atestam imagens de satélite (INPE, 2006 ). O quepode ser feito? Recomenda-se manter o solo sempre coberto

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(mesmo com restos vegetais, palha; não queimar, manejar)e, no período seco do ano, conservar cobertura vegetalpermanente vaporizadora, que não perca folhas nesseperíodo, pois o aquecimento é seguido pela queda naumidade relativa do ar (resulta em massa de ar seco), se nãohouver estrutura vaporizadora local. As pastagens, porcausa de seu sistema radicular mais superficial, secam noperíodo seco e interrompem a vaporização de água. A áreaflorestada deve ser tanto maior quanto mais próxima estiverdo equador.

As áreas que esquentam muito durante o dia esfriammuito à noite, o que causa grande variação na umidaderelativa do ar, nociva à saúde animal, às pastagens, àslavouras e ao próprio ser humano.

Conforme o solo esquenta, são geradas térmicas(correntes de ar verticais, ascendentes), que por sua vezproduzem brisas e ventos de superfície (horizontais), quecomeçam a circular a partir das 9:30h ou 10h da manhã. Astérmicas também resultam nas contrabrisas e noscontraventos de altitude (horizontais), que podem trazernuvens, no sentido oposto ao das brisas e dos ventos desuperfície, se no local das térmicas ocorrerevapotranspiração intensa de água. Esse conhecimentosobre ventos e a atenuação de calor por vegetação e corposde água explica porque queimadas durante o dia levam cinzae fumaça para as áreas de mata (estas não esquentam tantodurante o dia) e durante a noite sopram para as cidades ouáreas muito degradadas (estas esfriam mais à noite).

As áreas que esquentam geram térmicas, quedificultam as chuvas convectivas (de verão), afetam suadistribuição (chuvas mais curtas e mais espaçadas),aumentam a intensidade das precipitações e incentivam o

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acúmulo de energia estática nas nuvens, o que podeprovocar “chuva” de raios. Se houver no ar fumaça e partículasde carvão e se essa fumaça interferir na condensação de vapor deágua para formar nuvens, as gotas pequenas e leves terão muitadificuldade para precipitar e podem ser levadas embora do localprodutor de nuvens pela célula de circulação de ar iniciadapelas térmicas.

Boas práticas de manejo para minimizar os efeitos dapecuária no aquecimento global

Pelas pistas deixadas no início da entrevista já épossível ter uma idéia do que é necessário para minimizar osefeitos no aquecimento global. É preciso:a) Reter o máximo de água das chuvas, manter o solo

permeável e arejado; isto só é possível quando o soloestiver permanentemente vegetado, com abundanteretorno de material orgânico à superfície. Assim,superpastejo e queimadas devem ser abolidos.

b) Evitar solo exposto e áreas que gerem calor, térmicas,brisas e ventos, que roubam água da área.

c) Manter ou restabelecer estruturas vaporizadoraspermanentes e que ainda podem quebrar ventos efornecer sombra. O restabelecimento de matas ciliares ede reservas legais podem ser o começo mais lógico.Quebra-ventos, sombra e bosques vaporizadoresdistribuídos estrategicamente podem complementaressa infra-estrutura natural essencial. Podem serconstituídos por árvores frutíferas (pomares) ou porplantações de árvores ou bambu que forneça celulose oumadeira de lei.

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d) Evitar o manejo que favoreça a degradação depastagens, que requeira a derrubada de matas paraplantio em novas áreas, nem que isso seja “necessáriopara ter lucro” na atividade. Esse argumento estáchegando ao fim. Haverá boicote para produtosoriginados nesse tipo de sistema de produção nãosustentável e agressivo à vida. Ao utilizar as boaspráticas de manejo, atendendo aos princípios ecológicos,com muita água das chuvas armazenada e temperaturaatenuada, o lucro é mais passível de ocorrer, pois aforragem deve ser abundante por mais tempo, já que osperíodos secos devem ser mais curtos. Já existemestudos com a finalidade de estimar quanto o produtorrural poderá receber por esse serviço ambiental, se aabrangência desse serviço impactar positivamente noentorno de sua propriedade e na área urbana.

e) Manejar as pastagens, de modo a haver forragemnutritiva; evitar a degradação e os períodos de fome norebanho. O manejo rotacionado dos animais, parapermitir descanso e condições de recuperação dasforrageiras é essencial. Deve-se aproveitar o potencialde produção de biomassa das forrageiras tropicais bemmanejadas, como Panicum, Pennisetum, Cynodon, eSaccharum ou mesmo as espécies de capim-braquiáriamais produtivas. Evitar pastagem com baixo teor deproteína bruta, por exemplo inferior a 7%, e materiaismuito fibrosos, mas a cana despalhada pode ser boaalternativa quando adequadamente corrigida. Pode-seestimular a ingestão da forragem de qualidade inferiorcom sal proteinado, com uréia, por exemplo a canapicada, ou com alimento concentrado. Isto fará com queos animais ingiram mais forragem; e então, para evitar

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degradação da pastagem, deve-se ajustar a lotaçãoanimal e não suspender o sal proteinado ou a uréia.Porém, para condições de oferta de alimento de melhorqualidade, são necessários animais com potencial deprodução maior do que o daqueles selecionados parasituações de estresse ambiental. Necessita-se sair dalotação de 0,6 unidades animais (UA)/ha para pelomenos 1,2 UA/ha, valor que se consegue facilmente coma integração lavoura-pecuária (quando o terrenopossibilitar mecanização; tais sistemas permitem chegara 2 ou mesmo 3 UA/ha), com sistemas silvipastoris oucom sistemas intensivos sobre pastagens, que toleramlotação de até 5 UA/ha sem irrigação. Em sistemassilvipastoris, a capacidade de suporte pode seraumentada apenas se o sistema for associado àprodução de forrageiras arbustivas e/ou arbóreas, masesses sistemas apresentam outras características muitodesejáveis para o sistema de produção.

f) Merece ser lembrado que estudos realizados na Flóridaapontaram para a queda na produção de culturas quedependem de florada de 11% a cada aumento de 1oCacima da temperatura ótima da planta, sem considerarondas de calor em fases críticas da cultura. As plantasque não dependem de fase reprodutiva, como árvores egramíneas (pastagens, cana), em princípio poderão tersua produtividade aumentada, desde que haja águadisponível no solo (procurar trabalhar com escoamentonulo de água das chuvas), mais ainda quando não sepratica a queimada, já que esta também produz ozôniona baixa atmosfera, o qual em concentrações maiselevadas é nocivo para plantas, animais e sereshumanos.

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Isso significa que não devemos utilizar sistemas deprodução que são dependentes de grãos (fase reprodutivada planta); devemos sim explorar mais o potencial degramíneas e de árvores, os sistemas silvipastoris, e evitarao máximo as queimadas. Com as mudanças climáticas e oaumento das áreas degradadas estão ocorrendo maioresamplitudes térmicas e ondas de calor e de frio maisfreqüentes e mais intensas.

Uma onda de calor pode destruir toda uma florada decultura agrícola e chuvas intensas fora de época durante acolheita podem destruir toda produção de grãos (parapreparar alimentos concentrados) e de frutos, e afetarmenos as plantas que não dependem da fase reprodutiva(forrageiras gramíneas, cana, árvores diversas). Deve-selembrar que o crescimento dessas plantas pode ser reduzidopor ondas de frio ou por períodos muito longos denebulosidade (mais que quatro dias seguidos), o que podeprejudicar temporariamente os sistemas intensivos depastejo rotacionado.

Com relação ao metano, a emissão desse gás pelosbovinos é um fato. Não há como escapar, com a tecnologiaatual em uso. Mas a emissão exagerada, por mau manejodeve ser evitada. Porém, o rebanho brasileiro contribuisomente com 2% do metano total global produzido poratividades humanas ou com 10% do metano global deorigem ruminal.

As boas práticas de manejo consideram que:a) Até 6% da energia bruta ingerida pelos ruminantes pode

ser perdida na forma de metano. Deve-se evitar que aperda atinja 12% a 18%. Temos condições de chegar aperdas de somente 5%, no Brasil, evitando baixos teoresde proteína bruta na dieta. A qualidade adequada da

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dieta se obtém com uso de forrageiras menos fibrosas,manejadas para serem pastejadas em estádio vegetativomais jovem, utilizando sal proteinado em pasto vedado ouusando um pouco de suplemento concentrado para corrigir aqualidade, por exemplo, da cana-de-açúcar despalhada epicada, ou leguminosas.

b) Existem alternativas de uso de forrageiras de melhor qualidade,como a inclusão de aveia em sobressemeadura (em pastagensirrigadas) ou de alfafa na dieta, em situações específicas equando se tem um sistema de produção muito bem controlado,bem conduzido, com animais (genética) que tambémrespondem a essa melhor qualidade de forragem eselecionados para ambientes com menos estresse alimentarou com animais de cruzamento industrial, mais produtivos.

c) O uso de aditivos para introduzir mais oxigênio no rúmen oupara retirar íons de hidrogênio, tais como óleos ou gordurasinsaturados, ou para alterar a composição microbiológica norúmen ainda está em estudo e ainda não traz impacto tãogrande quanto a qualidade da matéria seca ingerida. Porém,aditivos alimentares que alteram a composição microbiana,tais como ionóforos, têm efeito positivo conhecido sobre aprodutividade animal e a redução na produção de metano, epoderiam ser recomendados como parte da estratégia deredução da emissão desse gás. Em dietas com alto teor degrãos, ionóforos geralmente reduzem a ingestão de alimentoem cerca de 8% a 10% e melhoram a conversão alimentar, emantém ou aumentam o ganho de peso diário, sem afetaras características de carcaça. Bovinos confinadosalimentados com dieta que continha alto teor devolumosos melhoraram o ganho de peso e a conversãoao receberem ionóforos, enquanto a ingestão dealimento se manteve inalterada (Nicodemo, 2007).

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d) Animais que sejam mais produtivos e mais exigentestambém respondem em produtividade quando tiveremsombra à disposição.

Pecuária bovina conduzida em regime de pasto

O Brasil utiliza o sistema de produção que tem por base opasto e esse é um dos pilares de divulgação da carne brasileira noexterior. Mas sempre paira a dúvida: em relação ao efeito estufa eao aquecimento global, um sistema mais intensivo (como oconfinamento) seria melhor ou seria pior do que um sistemainteiramente baseado em pastagens? Qual seria o ponto ideal, aseu ver, entre a intensificação da produção e a adoção de umsistema de produção mais extensivo, mais “natural”?

A pecuária herbívora foi a primeira atividade agrícolahumana, após os períodos de coleta, de caça e de pesca. Foi umaatividade realizada com pastejo rotacionado (nômade), em que seevitava o superpastejo com a permanência na área de pastagempor período não maior do que três dias. A pecuária era baseada emforrageiras e não em grãos.

O “olho do dono” engordava o boi! Atualmente, as cercas ea ausência do olho do dono para ver o que está faltando napastagem é que constituem o grande problema ambiental, aindamais quando se considera as florestas como terras improdutivas ereservatório abundante ou “banco” de terras agrícolas, o queresulta em seu uso perdulário. Esse é um erro fatal decompreensão, pois não considera que deve haver a infra-estruturanatural mínima para que funcionem os serviços ambientaisessenciais (especialmente a atenuação das amplitudes térmicas ea manutenção de água no solo e de umidade no ar) para osucesso dos sistemas produtivos.

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Se degradarmos rapidamente todos os solos e asmatas ainda existentes, onde o Brasil irá cumprir a missãode celeiro do mundo? Como a maioria dos solos no Brasil sãopobres, eles também necessitam de algum reforço paraproduzir biomassa, em especial nitrogênio, fósforo e cálcio.Leguminosas arbóreas podem reter nitrogênio obtido daatmosfera e podem aumentar a disponibilidade do fósforopresente no solo. Deve-se evitar a degradação da pastageme a conseqüente degradação do solo (o solo compacta, semvegetação protetora e descompactadora, e deixa de ter afunção essencial e estratégica de armazenar a água daschuvas).

O ponto de equilíbrio deve ser descoberto,particularmente, por todo pecuarista, a partir dos princípiose das informações aqui repassados. Pastagens devem sermais bem manejadas, lançando mão da orientação de pelomenos um técnico agrícola treinado, para, se necessário,fazer o papel de “olho do dono” e, ao final, a terminaçãomais acelerada com cana e alimento concentrado. Dessaforma, evita-se que os animais fiquem naquele ciclo deperdas de peso, quando, por economia ou por falta de mão-de-obra treinada ou de tempo para manter a pastagem maisbem manejada ou de um talhão de cana ou de um banco deproteínas arbustivos ou arbóreos para o período seco doano, se alimenta os animais com suas próprias reservas.Isso é um absurdo que deve ser evitado, pois afeta oambiente e aumenta a carga de metano emitido porquilograma de carne produzida.

Assim, se a pecuária for conduzida com maisprofissionalismo, eliminando desperdícios e práticasminadoras e perdulárias do capital natural (destroem a infra-estrutura natural e inviabilizam os serviços ambientais

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essenciais para sistemas produtivos lucrativos) etrabalhando com qualidade, é possível adequar a produçãode carne bovina brasileira de forma que se torneeconomicamente viável, preserve o ambiente e contribuapara frear o aquecimento global.

Para se identificar um sistema de produção maisadequado deveriam ser consideradas as boas práticas demanejo, utilizando todas as informações e tecnologiasessenciais de maneira integrada e na seqüência correta.Isso realmente exige maior controle de manejo dos recursosnaturais e dos insumos, maior empenho em administraçãorural e em controle zootécnico e econômico, com mínimo ounenhum impacto social e ambiental. Por exemplo, de queadianta utilizar alimentos concentrados, se não há alimentovolumoso em quantidade adequada para atender asexigências dos animais. Não há segredos ocultos! Só háconhecimentos e normas ecológicas, zootécnicas eeconômicas não observadas ou utilizadas fora de ordem.

A atenção para a conservação ou para a recuperaçãodo capital natural é um investimento de grande retornofinanceiro, por conta da garantia dos serviços ambientaisessenciais, especialmente de água disponível no solo e noar. Mas o “olho do dono” ou do técnico capacitado éestratégico.

O que se deve fazer para frear o impacto da pecuáriana questão climática? Deve-se “regular o motor” do sistemade produção. É necessário cuidar melhor do rebanho, cuidarmelhor da pastagem, cuidar melhor do capital natural. Nestecapital natural está incluído o uso estratégico de estruturasvaporizadoras hidrotermorreguladoras - as árvores, naforma de matas ciliares, renques quebra-ventos, bosques,reservas legais, sombreamento.

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Os resultados da incorporação do componentearbóreo no sistema de produção são significativos e serãomaiores nesse ambiente de aquecimento global. Essasestruturas devem ser manejadas em escala, para quepossam evitar que as chuvas tenham dificuldade de cair eque as nuvens formadas com a evapotranspiração localnão sejam levadas para fora da propriedade, para outrasregiões, por ventos locais. Armazenar água de chuvas ereduzir as perdas causadas por aumentos de temperaturadecorrentes de solo não protegido e compactado, o quepode ser evitado, é o segredo do sucesso. Em resumo, ocaminho a seguir inclui: armazenar água e controlar atemperatura, bem como garantir produção e qualidade doalimento.

Se bovinos não forem criados no abandonoextensivo (a idéia de pastor, pastor tecnológico, deve serevocada) ou, no outro extremo, como se fossem suínos ouaves (monogástricos) e quando cuidarmos das pastagenstropicais adequadamente, não ultrapassando suacapacidade de suporte, poderemos aumentar a lotaçãoanimal e ainda conservar o capital natural.

Pastagens bem manejadas, não queimadas, eprotegidas por elementos florestais resultam em sistemasprodutivos que, em vez de gerar um passivo ambiental(emitem gases e calor), podem criar um ativo ambiental(seqüestram gases, acumulam água para atender àsnascentes, aos poços e às plantas em geral e reduzem ocalor).

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O componente arbóreo no ambiente pastoril

A adoção de sistemas silvipastoris pode contribuirpara tornar a produção pecuária mais “ambientalmentecorreta”?

É preciso reforçar a idéia de que os pecuaristasnecessitam “fazer as pazes” com as árvores. As árvoresainda são vistas como prejuízo, primeiro porque impedem avisão sobre a propriedade, escondem fugas e roubos. Sãovistas como indicadoras de áreas improdutivas, comoesconderijos de inimigos ao sistema produtivo, comoatratores de raios, como elementos que atraem a fúria dosguardiães da legislação ambiental.

Tudo isso é café pequeno se conhecermos epercebermos os benefícios que as árvores trazem quandocorretamente manejadas. Elas garantem estabilização daumidade relativa do ar, reduzem a amplitude prejudicial detemperatura (amortecem ondas de calor e evitam quedasintensas de temperatura), diminuem os ventos ladrões deágua, propiciam chuvas convectivas mais suaves epermitem que o solo seja mais permeável (especialmentequando a diversidade de espécies for grande e a ocupaçãodo solo for a maior possível) e que armazene mais água dechuva. Elas ainda podem ser fonte adicional de renda:árvores frutíferas, condimentares, para lenha, para madeirade lei, para celulose e outros propósitos. Vamos pensar arespeito disso? Vamos discutir mais com olhos amigos?

Podemos sugerir ao leitor que reflita sobre o relativosucesso da pecuária conduzida em pastos de ecossistemasdos Cerrados ou do Pantanal, sem eliminação da vegetaçãonativa arbórea e arbustiva, ou dos pastos arborizados no

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Acre, ou do multiuso vantajoso da terra com a criação debovinos nos antigos faxinais de erva-mate do Rio Grande doSul, comparado com aquele de sistemas de produção sobrepastagens exclusivas de capim-braquiária.

A pecuária na Amazônia e o aquecimento global

Se olharmos o mundo, a partir de imagens de satélite,aquelas disponibilizadas pelo Instituto Nacional de PesquisasEspaciais (INPE), pode-se observar as regiões irradiadoras degrande quantidade de calor, que será retido pelos gases deefeito estufa, os quais na realidade só estão agravando umproblema que vem de longa data. São as regiões tropicais ousubtropicais desérticas (a maioria delas não era desertooriginalmente, mas foi transformada em deserto por manejoambiental inadequado) e as regiões com cobertura vegetaldegradada ou, de forma mais clara, são as regiões semcobertura florestal.

As regiões florestadas nos trópicos ainda conseguemevitar o grande colapso climático global. Elas conseguemisso porque as regiões tropicais são o motor da dinâmica daatmosfera global. São as térmicas geradas nas regiõestropicais que fazem as frentes frias vir até nós; elas sãoimportantes para fazer chover. Mas essas térmicas nãopodem sair de controle, transformando inocentesredemoinhos (sinal inicial de área em degradação) emtornados assassinos.

As árvores são estruturas vaporizadoras essenciais eque podem formar escudos de nuvens no verão para evitar osuperaquecimento regional, a ponto de ocorrer o “inverno”na Amazônia, por conta disso. Mas em conseqüência daflorestadas na região tropical) em grande escala formam-se

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térmicas mais intensas, que provocam a vinda e a passagemmais rápida das frentes frias. Estas frentes, que antesduravam de cinco a sete dias, agora chegam e passam ematé dois dias. Isso representa chuvas mais pesadas e maiserosivas, que o solo não consegue armazenaradequadamente, seguidas de períodos de seca (sem chuva)maiores. Quando as frentes persistiam sete dias, elasvinham lentamente, esfriava lentamente e chuviscavadurante sete dias. Era chuva bem distribuída e mansa. Comfrentes de dois dias, a mesma quantidade de água caidurante dois dias. Observe com mais atenção os noticiáriosdo tempo. No inverno, a eliminação das estruturas arbóreasumidificadoras do ar leva ao aquecimento desse ar, àintensificação na queda da umidade relativa e, quandoocorrerem queimadas, ao impedimento da precipitação daspoucas nuvens que se formam a partir de gotas pequenas.

Assim, o pecado capital da pecuária bovina extensivabrasileira é o amadorismo inconseqüente e perdulário, comdestruição do capital natural e dos serviços ambientaisessenciais. Envolve prejuízo para o produtor, para a nação epara o mundo. Como resultado temos o abandono das áreasde pastagens degradadas e o avanço sobre o “inimigoflorestal”, que esconde solos bons para novas pastagens eque é defendido por “ecologistas que querem atravancar odesenvolvimento e o progresso”.

Será isso mesmo? Ou será que os ecologistas jáperceberam o que os políticos e os senhores pecuaristas eos lavoureiros de “mares” a perder de vista de commoditiesainda não perceberam, que existe a necessidade de seconservar uma infra-estrutura natural com seus serviçosambientais essenciais? Será que conservar os solos em uso

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e as florestas ainda de pé na região tropical não é atentativa de garantir a sustentabilidade das atividadesagrícolas correntes?

A tentativa é de garantir o potencial de celeiro domundo que o Brasil ainda possui? O leitor sabia que pelomenos 20% a 25% das chuvas das regiões Sul, Sudeste eCentro-Oeste vêm da região amazônica, em fluxoschamados de rios aéreos, do único maciço florestal nomundo com escala suficiente para sustentar o clima quepermita a produção e a vida global e para protelar o colapsoclimático mundial?

A quantidade de áreas degradadas no mundo chega aser de mais de 40%, onde pode chover até mesmo 2.000mm por ano, mas essa água não fica disponível paranascentes, plantas e animais. Alguém deseja criar camelosno deserto amazônico? Então continue o processo de nítida“regressão ecológica”, um crime hediondo contra ahumanidade, infelizmente chamado de desenvolvimentoeconômico regional. Fotos de satélite mostram imagens deestarrecer: as regiões Sudeste e Centro-Oeste jáapresentam características climáticas de semi-áridonordestino ou pré-saáricas, por causa da retirada em grandeescala das árvores, substituídas por mares de pasto e delavouras, que não dispõem de elementos vaporizadoressuficientes para estabilizar o calor e a umidade relativa do arno período da seca.

Alguns já disseram que isso é exagero. Não deixepassar mais seis anos para tomar alguma iniciativa, pois aípode ser tarde para mudanças. Lamento! Uma casa podeser derrubada em um dia, mas leva pelo menos dez mesespara ser levantada. Destruir é fácil e rápido. Construir ourecuperar leva mais tempo. Conservar seria o procedimento

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mais racional. Quem deseja criar bovinos de corte reflitalogo, procure entender, seja profissional, mude osprocedimentos correntes. O País ainda oferece todas ascondições ambientais para sermos os mais eficazes e osmais produtivos no mundo.

A genética superior não é prioritária, quando o capitalnatural estiver em ruínas; água e alimentos de qualidade,sim. Chuva não significa água disponível, se o solo estiverimpermeável. Neste caso, chuva pode significar desgraça:erosão, enchentes e depois seca. Deu para perceber? Esseproblema também se aplica a todos os monocultivosextensivos, sem nenhuma estrutura vaporizadorapermanente, que faz falta nos períodos secos ou após acolheita e deixa o solo exposto e desprotegido.

É interessante perguntar porque o Brasil necessita de190 milhões de hectares de pastagens para manter seurebanho bovino, produzindo 25 kg/ha de carne por ano,contra os 80 milhões de lavouras? A média da lotaçãonacional é de 0,6 UA/ha; se for dobrada para 1,2 UA/ha,com a integração lavoura-pecuária, por exemplo, reduz-se anecessidade de área sob pastagem para a metade, 95milhões de hectares. E tem mais: admite-se que haja 50milhões de hectares de pastagens degradadas. A soluçãonão é derrubar mais mata em um ambiente que necessita tero máximo de cobertura arbórea.

Temos tecnologia disponível para manter lotação de 5UA/ha (e até 10 UA/ha com irrigação em regiões em quenão esfria muito no inverno), de forma lucrativa, utilizandoforrageiras tropicais. Então, porque há necessidade dederrubar as florestas remanescentes que sustentam umclima ainda razoável para possibilitar o funcionamento desistemas de produção no Brasil e no mundo?

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Devemos abandonar esse modelo predominante depecuária cujo estilo é a “coleta” de animais ao final do ano num“mar” de pasto, sem uma árvore para refrescar os zebuínos(certamente mais resistentes do que os taurinos, mas que tambémagradeceriam a sombra, ainda mais tendo em vista o aquecimentoglobal), que predomina em nosso País; pode-se afirmar que é umsistema ultrapassado de ganhar dinheiro, anterior ao sistemarotacionado praticado pelos povos nômades. E tem mais,considerando a faixa de conforto térmico, que varia de 10 a 26°C,zebuínos no Brasil Central já devem sofrer estresse térmico deoutubro a março, em pastagens sem sombra.

O aquecimento global e a pecuária

No nível local e no nível regional, deve-se considerar que háum processo acelerado de degradação, em que existemobstáculos ao armazenamento de água das chuvas no lençolfreático e dificuldade para sua reposição, que produz áreasirradiadoras de calor e que ocasiona redução de umidade relativado ar e aparecimento de térmicas e de ventos que roubam água, ejá causa grande impacto negativo sobre a produtividade dossistemas de produção.

O aquecimento global − com maiores amplitudes térmicas,ondas de calor e de frio, que fazem oscilar diariamente a umidaderelativa do ar − simplesmente agrava a situação ocorrente deredução de água disponível no solo e no ar e de baixa capacidadede amortecimento ou de atenuação da amplitude diária detemperatura. Isso pode afetar a produção de forragem e o confortodos animais, que deverão ficar mais estressados, se não houverprovidências para reduzir esse problema nas pastagens. Mas esseimpacto será maior do que o previsto nas plantas que dependemda fase reprodutiva, tais como as que produzem grãos e frutas.

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Os pecuaristas que conseguirem manejar pastagenssem eliminar todas as estruturas arbóreas estratégicas ouque conseguirem restabelecer estas estruturas a partir dasmatas ciliares, utilizando espécies de desenvolvimentorelativamente rápido, como as de leguminosas fixadoras denitrogênio (e inoculadas com micorrizas quando o solo forpobre em fósforo), e que permitirem o retorno adequado dematerial orgânico (sem queimar palhadas) para a superfíciedo solo, protegendo-o contra impactos da radiação solar edas chuvas tropicais, terão mais chances de sucesso emseus sistemas produtivos.

Temos de envidar todos os esforços para armazenaras águas das chuvas (evitar sua perda), não permitir oaquecimento do solo, diminuir os fatores que favoreçam aformação de ventos, formar estruturas (árvores comsistema radicular mais profundo, não perdem as folhas naseca) que garantam a manutenção da umidade relativa doar, e não deixar todo o esforço de atender a demanda daatmosfera por água (atendida pela evapotranspiração) paraas gramíneas com raízes mais superficiais, que finalmentesecam.

Os sistemas produtivos que utilizam gramíneas eárvores, como a bovinocultura sobre pastagens tropicaisarborizadas, têm mais chance de sobreviver e de serlucrativos por mais tempo do que as atividades agrícolasdependentes da fase reprodutiva. Basta somente tomarmosa decisão de querer sobreviver e de fazer as coisas certasna seqüência correta, de forma articulada, para garantir oimpacto positivo em grande escala. Isso deve ser assimporque ações individuais e pontuais terão mais dificuldadesde prosperar, por causa do efeito de borda negativo (não

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adianta ter um sistema de produção primoroso se o grandeentorno degradado exerce pressão negativa, com mais calor, maisventos, menos umidade relativa, fogo e outros problemas), já quegrande parte de nossa atividade agrícola é realizada em matriz deárea degradada, mais desértica, do que em matriz florestal maisdesejável em regiões tropicais e subtropicais.

Os sistemas agrícolas, para produção de grãos a seremutilizados na formulação de concentrados e para silagem,conduzidos de forma similar àqueles de clima temperado, emgrandes áreas de monocultivo, devem ser reformulados, poisresultarão em prejuízo. Os sistemas agroflorestais ou silvipastorissão a grande ferramenta para recuperar áreas degradadas, paraconservar áreas produtivas e para fazer frente ao aquecimentoglobal.

Reflita, procure referências em sua vida profissional quereforce essa informação e coloque mãos à obra, porque o temponão espera. Profissionais da Escola Superior de Agricultura Luiz deQueiroz e da Embrapa (Acre, Agrobiologia, Gado de Corte, Gadode Leite, Florestas e Pecuária Sudeste, entre outras) podemfornecer mais informações. Assim, o saber está disponível, falta oquerer fazer e o poder para fazer, de forma articulada e em grandeescala.

Pontos finais a destacar

Para tornarmos nossos sistemas de produção maiseficientes e assim reduzir a pegada ecológica dosconsumidores, atenuar o impacto sobre o ambiente eaumentar o giro de capital, devemos minorar as perdas deenergia dos animais, não deixar faltar forragem dequalidade, procurar armazenar toda a água da chuva ediminuir áreas que produzam calor e ventos. Como podemosfazer isso?

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1. Produzir forragem em quantidade e qualidade, a fim deevitar perdas de energia em longas caminhadas e perdasde peso por falta de alimento. Isso envolve ajuste dalotação animal, para evitar superpastejo e degradação dapastagem, e uso de pastejo rotacionado, de forma a dardescanso e tempo de recuperação para a forrageira.Conforme a possibilidade, é conveniente o uso de adubosorgânicos ou minerais, para estimular a produção deforragem. Para complementar a forragem da pastagem,pode-se realizar o plantio de arbustos e de árvoresleguminosas e de cana-de-açúcar, especialmente para operíodo seco do ano, de modo a evitar perdas de peso. Aadubação nitrogenada no final das chuvas favorece aformação de maior quantidade de forragem para a seca.Pode ser praticada a integração lavoura−pecuária, ondea topografia permitir. Pode ser implantado sistemasilvipastoril com árvores leguminosas, cujas folhasajudam a adubar a pastagem, além de melhorar aumidade do ar e o balanço da água para a pastagem.Com relação à qualidade da forragem, deve-se evitar ofornecimento de material muito fibroso, de baixadigestibilidade e com baixo teor de proteína bruta. O usode sal proteinado (em pastos vedados) ou de uréia (casoda cana picada) podem ser exemplos de manejoadequado. Em sistemas mais sofisticados, podem serproduzidas silagens de milho, de sorgo, de milheto e decapins diversos. Pode ser introduzido o manejorotacionado em pastos adubados. Neste caso, pode-selançar mão da sobressemeadura de aveia ou de azevém,quando possível, ou mesmo a produção de leguminosas,tais como a alfafa bem conduzida, para reduzir custoscom alimento concentrado.

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2. Colocar bebedouros próximos aos locais de pastejo, paraque não haja perdas de energia em longas caminhadasem busca de água e para evitar a degradação dos corposde água.

3. Realizar todas as práticas necessárias para captar earmazenar a água da chuva. Manter o solo semprevegetado e permeável. Não utilizar queimada, queelimina palhada que protege o solo e serve de energiapara organismos que mantém o solo permeável. Em solopermeável e sempre vegetado haverá menos erosão.Evitar a formação de trilhas longas morro abaixo, que sãocanais preferenciais de escoamento de água das chuvase de formação de vossorocas, de degradação daspastagens.

4. Realizar todas as práticas que evitam as perdas de águapor evapotranspiração excessiva, por calor, por brisas epor ventos. Implantar árvores de sombra, quebra-ventose bosques umidificadores. Podem ser implantadossistemas silvipastoris com alocação estratégica dasfileiras de árvores, para cortar ventos predominantes nosperíodos mais secos do ano.

5. Cuidar da sanidade animal.

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Referências

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