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A pluralidade cultural e as diversidades religiosas do ensino religioso na prefeitura do Rio
de Janeiro
Paula Helena Nacif Pereira Pimentel Ferreira1
RESUMO
Este trabalho é parte da dissertação de mestrado, As mediações culturais no ambiente escolar:
o ensino religioso no Ciep Patrice Lumumba, tendo como objetivo central analisar como ocorre
a implementação do ensino religioso nas escolas públicas, confrontando a dimensão legal com
a diversidade cultural. Isto porque, é sabido que no Brasil, a manifestação da sua pluralidade
religiosa convive com prescrições constitucionais em respeito à laicidade. A escolha
metodológica, por se tratar de uma pesquisa empírica, de observação participante de
natureza qualitativa visa responder questões singulares dentro de uma ótica pertencente ao
universo pesquisado.
Palavras Chave: Ensino religioso, Legislação, Pluralidade cultural.
1. Introdução
Este trabalho, se propõe discutir a prática do ensino religioso no Ciep Patrice
Lumumba, considerando a constituição de 1988 e a LDB 9394/96.
O Brasil foi inegavelmente marcado pela educação católica apostólica romana,
ensinada pelos jesuítas desde a colonização, que ainda cerca o cenário educacional atual.
Condição que se mantém mesmo depois das transformações políticas, econômicas e sociais
ocorridas, e do aparecimento das novas correntes educacionais religiosas.
Inicialmente habitado pelos indígenas, chegam ao Brasil, com a colonização, novos
povos como os europeus e os africanos. Esta mistura étnica é responsável pela atual formação
1 Mestranda da Universidade Unigranrio, professora regente da prefeitura de Duque de Caxias e Diretora Adjunta da prefeitura do Rio de Janeiro. Este trabalho refere-se a pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Humanidades, Cultura e Artes. Orientador: Professor Doutor Joaquim Humberto Coelho de Oliveira, bacharel em Direito da UNIFESO. Correio eletrônico: [email protected].
cultural da população brasileira, tão rica de crenças, mitos e culturas. No contexto vivido nesta
época, era possível perceber que não havia o interesse educacional como meta prioritária,
contudo, mesmo assim, quando Tomé de Souza, primeiro governador-geral, chega ao Brasil,
traz consigo os jesuítas, tendo como líder Manuel de Nóbrega, e a partir de então se dedicam
à missão de pregação da fé católica, através do trabalho educativo.
Na tentativa de melhor compreender essa realidade marcada por tão complexa
religiosidade, é necessário voltar aos seus primórdios para acompanhar seu processo
histórico, sem perder de vista a sua interligação com a atualidade. Seria inviável realizar um
trabalho sobre educação das novas gerações sem contemplar esta pesquisa de história.
A vinda dos jesuítas, na conjuntura da educação e civilização dos indígenas, e a sua
catequização pelo cristianismo, modelo praticado à época pela Companhia de Jesus, ainda
mantém raízes nos solos atuais, que podem ser observadas no ensino público, principalmente,
em datas comemorativas cristãs. Como as doutrinas e ensinamentos católicos são justificados
como únicos e verdadeiros, identifica-se de que maneira a subordinação indígena e africana
resultou no afastamento de seus costumes, crenças e religião. Ao se relacionar a questão
histórica estudada com o ensino religioso ainda hoje presente na educação pública, questiona-
se até que ponto há na realidade uma tentativa de inclusão religiosa desses povos.
Os africanos, trazidos como escravos na época da colonização, também foram
submetidos a um processo de catequização. A sua diferença em relação à pedagogia dos
indígenas, deve-se, principalmente, à imposição da escravidão como uma condição social. Esta
imposição se dava através da catequese, da religião católica, aliada ao sistema de punições,
de castigos, que definiam claramente seu lugar de escravo na sociedade.
Contudo, a catequese do escravo guardava o propósito de integrá-los desigualmente
num mundo de brancos e senhores, sendo a eles apresentada a expressão mais simples no
aprendizado dos símbolos da fé.
São esses traços que fazem perceber a catequese do indígena como intrinsecamente
diferente da do negro. Primeiramente, porque o indígena era um homem livre, natural da
terra, protegido pela igreja e pela justificação da colonização, objeto de bula papal.
Assim, o indígena era aldeado, e os aldeamentos e as missões eram reservados para a
sua catequese. Já a catequese do negro era realizada no espaço do branco, nas fazendas ou
nas cidades, na condição de escravizado.
Dentro desta perspectiva histórica, um dos interesses desta pesquisa, é destacar os
enfoques aos possíveis nexos que ainda articulam o passado com o presente. Como no caso
de detectar no ensino religioso, a sua continuação na atual educação brasileira. Conexão que
pode se valer dos estudos das ações que promovem o ensino religioso no Brasil de hoje,
responsáveis pela sua inserção no contexto educacional.
Dentro da prefeitura do Rio de Janeiro, ocorre a oferta do ensino religioso de acordo
com o interesse dos responsáveis. Todavia, a LDB9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases) define
dentro da sua regulamentação, no seu Artigo 33 que:
O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do
cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997).
§1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para definição dos conteúdos
do ensino religioso e estabelecerão as normas para habilitação e admissão dos professores.
§2º Os sistemas de ensino ouvirão a entidade civil constituída pelas diferentes
denominações religiosas, para definição dos conteúdos do ensino religioso.
Logo, este trabalho faz uma análise do ontem para entender a atualidade, entendendo
o período jesuítico instalado no Brasil, para enfim perceber o litígio cultural, através da
imposição cultural europeia e os reflexos em nossa educação, principalmente no ensino
religioso, analisando a legislação para a implementação deste ensino.
2. Problematização
A legalização do ensino religioso nas escolas públicas, no plano teórico, contraria o
princípio laico do estado brasileiro?
Como, na prática cotidiana de uma escola, o Ciep Patrice Lumumba, se realiza a
finalidade prevista legalmente de convivência entre diferentes religiosidades?
Na pesquisa, como os entrevistados percebem e atuam entre as diferentes convicções
religiosas manifestadas na sua rotina escolar?
Como aquele espaço escolar de convívio influencia na convicção religiosa dos
entrevistados?
E, quais são suas estratégias e mediações para se integrarem com sua convicção
religiosa naquele espaço escolar de convivência?
3. Almejando um caminho
Na pesquisa, alguns pontos importantes fazem parte do objetivo deste trabalho. Vale
ressaltar algumas intenções a serem alcançadas como: analisar como ocorre a implementação
do ensino religioso nas escolas públicas, confrontando a dimensão legal com a vivência prática
em ambientes de diversidade cultural; considerar se a relação entre princípio da laicidade e a
legalização do ensino religioso nas escolas públicas; observar a maneira como são assimiladas
as previsões legais na prática cotidiana do Ciep Patrice Lumumba; verificar como os
entrevistados percebem e atuam entre as diferentes convicções religiosas manifestadas
naquele ambiente escolar; compreender como aquele espaço escolar de convívio influencia
na convicção religiosa dos entrevistados; avaliar a influência da religiosidade nas estratégias
e mediações praticadas pelos entrevistados para integrarem-se naquele ambiente de
convivência.
4. Por que e para que entender a prática do ensino religioso?
O tema deste trabalho faz parte de uma pesquisa, escolhido a partir de uma situação
de conflito vivenciada em sala de aula. Nesse ambiente, uma aluna, inconformada com a
manifestação da crença religiosa de um outro aluno, identificada pela mesma como diferente
da sua e proveniente de matrizes afro, o ofende verbalmente.
Constatação que, no início desta pesquisa, já pode ser um indício para se buscar
compreender o comportamento observado nesta escola, onde nenhum aluno consta como
matriculado no ensino religioso de matrizes afro.
Dado também significativo para a pesquisa sobre a construção de espaços de
convivências entre diferenças, diz respeito ao modo como a prefeitura do Rio de Janeiro
operacionaliza a implementação das exigências da LDB. A sua postura segue a lógica de
oferecer o ensino religioso confessional de acordo com o interesse dos responsáveis, que
preenchem uma ficha dizendo qual a religião de interesse sem, contudo, disponibilizar nas
ofertas todas as opções religiosas.
São cada vez mais frequentes as manifestações de violência contra praticantes de
determinadas tendências religiosas. Essas incidências são mais frequentes contra indivíduos
identificados como praticantes de religiões provenientes de matriz afro.
As leis sobre ensino de culturas indígenas e africanas revelam preocupação com o
reconhecimento dessas culturas. No mesmo sentido, a lei sobre o ensino de religião no ensino
público mostra a mesma preocupação para com a inserção de segmentos sob forte
preconceito cultural e religioso no convívio social.
Sem contestar o mérito dessas obrigações jurídicas, a sua existência e implementação
são sempre duvidosas. Duvida-se que a sua criação venha a modificar por si só uma cultura
que, historicamente, segregou manifestações contrárias ao modelo tido como majoritário e
dominante. Na verdade, as leis, de imediato, se confessam como sintomas dessa própria
realidade.
A necessidade de se explorar este problema por caminhos não somente teóricos e
conceituais, mas principalmente empíricos, explica-se por tentar compreender como esses
mecanismos jurídicos e institucionais se refletem no ambiente concreto de convivência.
Justifica-se, assim, não só a relevância da temática, que se sinaliza pela sua importância
nas sociedades onde se manifestam cada vez mais pluralidades de formas de vida. Mas,
também, se justifica a escolha pela dimensão empírica da pesquisa, por promover um debate
mais próximo das situações concretas e seus posteriores resultados que tendem a suspender
e problematizar certezas teóricas previamente assumidas.
Com as escolhas propostas nesta pesquisa, pretende-se, portanto, poder auxiliar
educadores, estudantes e estudiosos interessados em conhecer como ocorrem as mediações
e negociações com as formações de identidades religiosas no cenário de uma escola pública
da cidade do Rio de Janeiro.
5. Observação Participante na pesquisa emprírica
A parte inicial de pesquisa teórica, já inserida neste trabalho, será reconsiderada e
ampliada a partir dos problemas revelados no andamento da pesquisa empírica.
Para Minayo (2009a, p. 62) a pesquisa de campo é: “o recorte que o pesquisador faz
em termos de espaço, representando uma realidade empírica a ser estuda a partir das
concepções teóricas que fundamentam o objeto da investigação”.
Esta, por sua vez, será realizada na instituição pública da prefeitura da cidade do Rio
de Janeiro, no CIEP Patrice Lumumba. A observação participante e as entrevistas são as
escolhas metodológicas escolhidas para investigar e compreender a oferta do ensino religioso,
como ela se estabelece na prática, como influencia as relações de troca e construções de
identidades naquele ambiente escolar.
Nessa perspectiva as concepções teóricas da pesquisa serão construídas, a partir do
estudo bibliográfico, com a finalidade de elaborar a revisão da literatura sobre a temática, que
embasará teoricamente o trabalho.
A entrevista é um método que possibilita ao pesquisador atingir uma quantidade de
informações e dados que favorecem um trabalho mais próximo à realidade na qual está sendo
realizada a pesquisa. Com essa escolha metodológica se pretende atingir resultados
qualitativos, necessários para se conhecer o pensamento singular de cada envolvido na
pesquisa.
Com relação à pesquisa qualitativa Minayo (2009b, p. 21), pontua:
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa [...] com um
nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com
o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das
atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade
social, pois o ser humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por
interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus
semelhantes. O universo da produção humana que pode ser resumida no mundo das
relações, das representações e da intencionalidade e é objeto da pesquisa qualitativa
dificilmente pode ser traduzido em números e indicadores quantitativos.
Para o desenvolver do trabalho, o instrumento de coleta de dados será a entrevista
semiestruturada, isto é, com questões abertas e fechadas, buscando a interatividade e o
diálogo entre o pesquisador e o sujeito da pesquisa. O roteiro se dividirá em blocos,
permitindo maior compreensão acerca do que será abordado: formação dos docentes,
atuação profissional, conceito de educação inclusiva, existência de políticas
públicas/legislação e práticas desenvolvidas na sala de aula.
Para a realização das entrevistas, foi selecionado um grupo de 10 alunos que
frequentam ou frequentaram o ensino religioso, seus respectivos responsáveis, a diretora,
dois professores de ensino religioso e sete responsáveis que não optaram pelo ensino
religioso.
A atuação da pesquisadora como professora há quinze anos da instituição de ensino,
e a sua inserção e participação pessoal nas suas relações sociais, são fortes indicativos para
também incluir a observação participante dentre as escolhas metodológicas. Essa inserção do
pesquisador no mundo pesquisado é tida como um elemento facilitador para entender como
as crenças religiosas dos pesquisados e suas manifestações ou inibições, estimuladas pela
presença do ensino religioso, atribuem sentido às suas relações a partir daquele ambiente
escolar de convivência.
A observação participante, um método usado na antropologia, propiciará que a
pesquisadora se torne parte desse universo, facilitando o entendimento das ações dos que
realmente ocupam o espaço e produzem culturas, perceber seus diferentes códigos de
interação, linguagens e hábitos.
O processo no qual um investigador estabelece um relacionamento multilateral e de prazo
relativamente longo com uma associação humana na sua situação natural com o propósito
de desenvolver um entendimento científico daquele grupo (MAY, 2004, p. 177).
No que diz respeito ao lugar, o pesquisador deve levar em consideração as condições
físicas e como ela pode influenciar sobre as ações. Logo, cabe registrar o espaço físico onde
acontecem as interações observadas e não apenas as próprias. Dentro da perspectiva
religiosa, o onde precisa ser levado em consideração. Segundo o historiador Robert Darnton
(1992: 203), ao analisar a história das práticas da leitura, diz que o onde pode exercer
influência sobre o leitor por estra inserido em um ambiente que lhe propicia sugestões sobre
a natureza de sua experiência. Analisando dessa forma, pode-se constatar que os templos
religiosos expõem objetos e ilustrações que testificam sua fé.
Então, analisar o ambiente aonde são ministradas as aulas do ensino religioso é de
extrema importância.
Com relação às circunstâncias da pesquisa, é importante ressaltar que, de acordo com
Clifford Geertz (2008 a, p.24) a cultura incide em um “sistema entrelaçado de signos
interpretáveis”, podendo ser expostos de maneira compreensível, ou seja, “descritos com
densidade”. Este antropólogo expõe processos essenciais para a observação participante ou
trabalho etnográfico: subsídios para acessar o espaço cultural do grupo pesquisado, mesmo
que inicialmente pareça ser complexo e estranho. Ao longo do processo, com as entrevistas,
as observações se tornarão de forma natural mais compreensível à interpretação. Ainda de
acordo com este autor, “o pesquisador não deve se tornar um nativo ou copiá-lo”. O que
precisa ser feito é conversar com o grupo investigado, “o que é algo muito mais difícil”. “Situar-
nos, eis no que consiste a pesquisa etnográfica como experiência pessoal” (GEERTZ, 2008b, p.
23). Por isso, a pesquisa etnográfica aponta como um dos seus objetivos o alargamento do
universo do discurso humano (GEERTZ, 2008c, p. 24).
Analisa-se ainda que a pesquisa por meio da observação participante inclui o
pesquisador em um tempo e ambiente comum ao seu próprio tempo existencial. Nessa
perspectiva, pesquisar sobre religião no ambiente escolar constitui para o pesquisador
adentrar num período de transformações sociais e culturais.
Segundo Bourdieu (1989.p. 39): “As rupturas epistemológicas são muitas vezes
rupturas sociais, rupturas com as crenças do corpo de profissionais, com o campo de certezas
partilhadas que fundamenta a comnunis doctorum opinio”.
Ou seja, conviver com os conflitos do campo religioso, pode possibilitar não somente
uma aproximação do objeto, como também permitir a compreensão do acontecimento com
base nas novas considerações que restabelecem demandas teóricas que não conseguem mais
atender as transformações causadas pelo processo histórico.
A fase final do desenvolvimento do trabalho constituir-se-á, segundo Minayo (2009c,
p.27) em três procedimentos: “ordenação de dados, classificação e análise propriamente
dita”. Em outras palavras, consiste em interpretar os dados empíricos, compará-los e organizá-
los com a teoria que fundamentou a pesquisa, para assim analisá-los.
6. A Pluralidade Religiosa
É notório que a discursão sobre o ensino religioso nas escolas está longe de acabar.
Alguns teóricos, professores, pesquisadores defendem o ensino religioso nas escolas e outros
são contrários a esta ideia.
Dentro da perspectiva de mediações culturais no ambiente escolar, percebe-se a
participação de todos os indivíduos na interação e na troca cultural. Cada um traz a sua
cultura, identidade e entra em contato com o outro que na troca, desarticula sua identidade
e cultura, interiorizando e vivenciando dentro das suas próprias concepções o outro.
[...] a identidade é formada na “interação” entre o “eu” e a sociedade. O sujeito ainda tem
um núcleo ou essência interior que é o “eu real”, mas esse é formado e modificado num
diálogo contínuo com os mundos culturais “exteriores” e as identidades que esses mundos
oferecem. (HALL, 2014, P.11)
Observa-se a expansão constante de novas religiões no Brasil. Essa expansão é
favorecida porque o Brasil sempre foi aberto, tolerante e fértil para quaisquer religiões, não
apenas as cristãs-evangélicas.
Em alguns países, a escolha de uma determinada religião pode ser sinônimo de
perseguição, prisão e até a pena de morte. E hoje no Brasil, reconhecer sua cultura, religião e
assumi-la pode ser motivo de discriminação, agressão e morte.
Analisando a proporção com que as igrejas neopentecostais vêm aumentando, pode-
se dizer que não existe restrição nem as velhas e principalmente as novas religiões, elas se
espalham como perfume no ar.
Esse crescimento de novas religiões fez com que o catolicismo iniciasse um declínio.
Desde o surgimento dessas novas religiões o contingente católico diminuiu e em contrapartida
o número de evangélicos aumentou, principalmente os dos pentecostais.
Segundo o Censo 2010, os adeptos do catolicismo passaram de 93% em 1960 para 65%
em 2010. Os adeptos de denominações evangélicas subiram de 4% para 22% no mesmo
período. Muitos ainda se declararam não ter religiões, 0,5% para 8% no período referido
acima, ou seja, após cinco décadas.
No estado do Rio de Janeiro, a maioria da população já não se declara católica. Ainda
na pesquisa do Censo de 2010, os católicos fluminenses somaram 46% da população e os
evangélicos, 29%. A dimensão dos declarantes sem religião foi de 16%, o dobro da média
nacional, o que não indica necessariamente a perda de fiéis da Igreja Católica seja
completamente para as igrejas evangélicas ou de alguma outra religião institucionalizada.
O campo religioso também mudou muito no espaço ocupado. Até os anos 1980, todas
as religiões ocupavam apenas seu próprio espaço: templos, centros, terreiros e sinagogas,
com exceção a Igreja Católica, que promovia procissões e romarias, além de congressos.
Atualmente, as igrejas evangélicas também passaram a ocupar os espaços públicos e meios
de comunicação como emissoras de rádio e televisão.
Infelizmente nos últimos anos, o Brasil iniciou um processo de intolerância religiosa.
Uma discriminação com as religiões de matrizes afros que acabam geram em torno de insultos
e em até agressões físicas.
Será que a intolerância não está vinculada a fragmentação dos saberes?
O homem quando iniciou o processo de fragmentação ele se especializou numa área e
esqueceu das outras.
Ao acreditar que o nosso saber é único e absoluto, não respeitamos o olhar do outro,
a experiência e saberes que o levaram a acreditar em suas concepções de uma forma
diferente.
7. A História do Ensino Religioso no Brasil
O Ensino Religioso no Brasil, já foi obrigatório, durante o império, e proibido nas
primeiras décadas da República. O Ensino Religioso é um problema antigo nas escolas
públicas.
Para entender algumas razões pelas quais a regulamentação ocorreu de forma
institucionalizada na Constituição Federal, é importante observar como aconteceram,
historicamente, os debates sobre a inclusão do Ensino Religioso no currículo nas instituições
escolares públicas.
No período colonial, entre os séculos XV e XVIII, em consequência da intrínseca relação
da monarquia portuguesa e a Igreja Católica Apostólica Romana o ensino acontecia,
principalmente, sob a ação dos jesuítas, que tinham como objetivo catequizar os índios e
gentios. (CURY, 1993a, p.21)
Existem documentos, as primeiras constituições, que apontam a determinação para os
senhores de engenho cuidarem da formação religiosa cristã dos escravos e da sua família.
Essas constituições, a partir de 1853, passaram a se referir explicitamente ao ensino religioso
nas escolas e orientaram a instituição religiosa no Brasil até 1899, quando se realizou o
Concílio Plenário da América Latina, já na vigência, portanto, da Constituição de 1891, que
institucionalizou a separação entre Igreja e Estado. (CURY, 1993b, p.25-6)
Segundo Ruedell (2005, p.35), com a proclamação da independência do país em 1822,
não houve grandes, alterações no tocante à relação entre Estado e Igreja. O período Imperial
então estabelecido, contudo, pode ser dividido em duas fases, do ponto de vista dessas
relações. Na primeira fase, ocorrida entre 1822 e 1859, o regime de Padroado persistiu
institucionalmente e o Estado passou a assumir progressivamente uma maior
responsabilidade com as questões educacionais, sobretudo a partir 1827, com a Lei de 15 de
outubro, que instituía a primeira regulação pública para a questão educacional, disciplinava o
conteúdo e metodologia de ensino e determinava a criação de escolas em todas as cidades,
vilas e lugares mais populosos do Império. Em seu art. 6º, determinava, entre os conteúdos
mínimos, o aprendizado das habilidades necessárias para ler e escrever, matemática,
gramática, e os princípios de moral cristã e da doutrina católica, denotando um profundo
compromisso com a Igreja Católica Apostólica Romana, reafirmado pelo art 5º da Constituição
Imperial, segundo o qual a religião católica era a religião oficial do país, e pelo seu art. 102,
que explicitamente determinava como competência do Imperador zelar pelo Padroado (CURY,
1993, p.22).
É importante notar que esse período produziu ampla normatização referente ao tema,
sendo relevante destacar o Decreto n. 2006/1857, que determinava a inclusão de disciplina
voltada para o ensino da doutrina cristã nos colégios públicos de instrução secundária no
Município da Corte, em seu art. 12, e o Decreto n. 2434/1859, que criou, segundo Cury (1993,
p.22) “a cadeira de ensino da doutrina cristã e da história sagrada”, no Colégio Imperial Pedro
II.
As relações entre Estado e Igreja, a partir de 1859, passaram a sofrer crescente pressão
para se tornarem capazes de lidar com um contexto de crescente pluralidade religiosa.
A Constituição de 1988 reeditou os termos gerais de suas quatro antecessoras, com a
seguinte determinação: O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos
horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional não tinha como evitar a existência do
Ensino Religioso nas escolas públicas de Ensino Fundamental, já que a Constituição
determinara sua oferta no horário escolar. O deputado Octavio Eliseo Alves de Brito, de
assumidas posições laicas, preferiu contornar o problema, não mencionando essa disciplina
em seu projeto pioneiro.
O caráter facultativo do Ensino Religioso, determinado pela Constituição, foi diluído no
texto final da LDB. O primeiro substitutivo Jorge Hage não só reconhecia a existência dos
alunos fora do Ensino Religioso como, além disso e principalmente, determinava que lhes
fossem asseguradas atividades alternativas. No texto final prevaleceu o silêncio sobre tais
atividades, o que propiciou a obrigatoriedade de fato dessa disciplina, malgrado o caráter
facultativo, de direito.
Logo após a sanção da LDB pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e suscitada
sua reforma por ele próprio, o Conselho Nacional de Educação manifestou-se sobre o artigo
33 dessa lei. O Parecer n. 5/97, do Conselho Pleno, foi incisivo contra a remuneração dos
professores do Ensino Religioso. O texto elaborado por João Antônio Cabral de Monlevade, da
Câmara de Educação Básica, e José Arthur Giannotti, da Câmara de Educação Superior,
concluiu que, mesmo sem proibição explícita na LDB, não poderia haver ônus para os cofres
públicos em decorrência do oferecimento facultativo do Ensino Religioso nas escolas públicas.
Três razões foram apresentadas pelos conselheiros para justificar essa conclusão.
Primeiro, o pagamento de professores do Ensino Religioso violaria o artigo 19 da Constituição,
que veda a subvenção a cultos religiosos e a igrejas. Segundo, se esse pagamento fosse feito,
haveria tratamento desigual do Estado com relação às diversas instituições religiosas, já que
a subvenção (a remuneração dos docentes) seria desproporcional à demanda. Os próprios
conselheiros exemplificaram: um ou dois alunos de uma religião demandariam o mesmo gasto
do Estado do que 30 ou 40, já que a lei garante a opção dos discentes e/ou seus
pais/responsáveis. Terceiro, caso o Ensino Religioso fosse ministrado a alunos de dezenas de
denominações diferentes, haveria gasto com essa disciplina mais elevado que o destinado às
disciplinas obrigatórias, com maior carga horária.
O Conselho Nacional de Educação que, na Resolução CNE/CEB n. 2/1998, promoveu o
Ensino Religioso a área de conhecimento, rebatizada de Educação Religiosa, uma nova
denominação bem significativa.
A Resolução CEB n. 7/2010, do mesmo conselho, ao fixar as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Fundamental de Nove Anos, baixou um pouco a pretensão identitária
dos promotores da presença religiosa nas escolas públicas: aquela disciplina deixou de ser
Educação para voltar a ser Ensino. Todavia, permaneceu com o mesmo status de área de
conhecimento, listada depois de Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências
Humanas. O que os grupos religiosos de pressão não conseguiram no Congresso, o conselho
lhes deu.
Dessa vez, o Conselho Nacional de Educação promoveu esse apêndice curricular, o
Ensino Religioso, a área de conhecimento, com o mesmo status do que é consensual no Ensino
Fundamental.
6. Considerações Finais
Sabe-se da importância da dimensão religiosa do sujeito social e interdisciplinar para
seu desenvolvimento. Muitas são as necessidades da implementação deste ensino e
solicitação social para que venha a contribuir na aprendizagem de vida dos discentes como
cidadãos.
Alguns teóricos enxergam, no ensino religioso – como disciplina, capaz de propiciar o
respeito dos alunos uns com os outros, desenvolvendo uma disposição favorável à
solidariedade fora da escola; respeito às autoridades escolares, induzindo sentimento análogo
no âmbito da sociedade política. Contudo essa ideia é uma utopia. O que realmente acontece,
hoje, é a sobreposição das crenças dominantes às dominadas que dividem os alunos ao invés
de unir.
Ao contrário do que acontece nas grandes democracias representativas, a religião
parece tão natural, nas escolas públicas do Brasil, que muita gente nem presta atenção nela.
Numa simples visita pode mostrar a presença de santos, crucifixos, cartazes com trechos
bíblicos, orações no início das reuniões dos professores, antes das aulas e da merenda.
Presença religiosa cristã, bem entendido. Apesar da liberdade de crença determinada pela
Constituição, valor democrático compartilhado por grande parte da população brasileira, os
favoráveis às religiões afro-brasileiras e de religiões minoritárias, os agnósticos e os ateus
parecem professores e alunos filiados aos credos dominantes como seres exóticos,
frequentemente alvo de piadas e de estigmas violentos.
A prefeitura do Rio de Janeiro, na tentativa de atender essa demanda de solicitações
da sociedade, deu um grande passo para que este ensino possa ser implementado dando
possibilidades democráticas para a demanda social.
Contudo, algumas questões precisam ser redimensionadas e refletidas para que este
ensino venha a contribuir para a libertação religiosa e não para a reprodução dos sistemas de
poder antigos de nossa sociedade.
Como a pesquisa ainda está em desenvolvimento e, como a entrevista e a observação
participante são necessárias para a conclusão deste trabalho, será necessário a continuidade
para atender as questões a qual a pesquisa se propõe.
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