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“A presença feminina na sociedade paranaense através de fotografias: uma possibilidade de estudo em sala de aula – (1940- 1960)”. Lucélia Aparecida Pereira 1 Resumo O presente trabalho nasceu das inquietações referentes à questão das minorias e a conseqüente necessidade de uma reflexão dentro da sala de aula. A construção do mesmo começa com o ensino de história e a conseqüente necessidade de debate de como ele se processa dentro da sala de aula. O tema é desenvolvido por meio de três percursos interligados. O primeiro, caracterizando o recorte histórico (1940-1960) da História do Paraná para assim situar o momento histórico, foco do estudo. O segundo, buscando a atenção para o mundo contemporâneo mergulhado em imagens e sons, fazendo uso de fotografias, instrumento que serve no registro documental e na construção do conhecimento e que, nesta situação, não deve ser ignorada pelo professor e sim desafiadoramente utilizada. Por último, considerando que a questão feminina permeou os dois primeiros caminhos, propõe-se a análise e discussão da presença feminina na sociedade local e paranaense. O projeto foi implementado com turmas de oitavas séries do Ensino Fundamental e possibilitou a construção de conhecimento conjuntamente com os alunos. Palavras-chave: ensino de História – mulheres – fotografia – Paraná. Abstract The present work was born of the referring fidgets to the question of the minorities and the consequent necessity of a reflection inside of the classroom. The construction of the same starts with the education of history and the consequent necessity of debate of as it processes itself inside of the classroom. The subject is developed by means of three linked passages. The first, characterizing the historical clipping (1940-1960) of the History of the Paraná thus to point out the historical moment, focus of the study. As, searching the attention for the world contemporary dived in images and sounds, making photograph use, instrument that serves in the documentary register and the construction of the knowledge and that in this situation, do not have to be ignored by the teacher and yes challengingly used. Finally, considering that the feminine question permeou the two first ways, it is considered analysis and quarrel of the feminine presence in the local and paranaense society. The project was implemented with groups of eighth series of Basic Ensino and jointly made possible the construction of knowledge with the pupils. 1 Professora da rede estadual de ensino do Estado do Paraná, município de Assai. Participante do Programa de Desenvolvimento da Educação do Paraná, de 2007.

“A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

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“A presença feminina na sociedade paranaense através de

fotografias: uma possibilidade de estudo em sala de aula – (1940-

1960)”.

Lucélia Aparecida Pereira1

Resumo

O presente trabalho nasceu das inquietações referentes à questão das minorias e a conseqüente necessidade de uma reflexão dentro da sala de aula. A construção do mesmo começa com o ensino de história e a conseqüente necessidade de debate de como ele se processa dentro da sala de aula. O tema é desenvolvido por meio de três percursos interligados. O primeiro, caracterizando o recorte histórico (1940-1960) da História do Paraná para assim situar o momento histórico, foco do estudo. O segundo, buscando a atenção para o mundo contemporâneo mergulhado em imagens e sons, fazendo uso de fotografias, instrumento que serve no registro documental e na construção do conhecimento e que, nesta situação, não deve ser ignorada pelo professor e sim desafiadoramente utilizada. Por último, considerando que a questão feminina permeou os dois primeiros caminhos, propõe-se a análise e discussão da presença feminina na sociedade local e paranaense. O projeto foi implementado com turmas de oitavas séries do Ensino Fundamental e possibilitou a construção de conhecimento conjuntamente com os alunos.

Palavras-chave: ensino de História – mulheres – fotografia – Paraná.

Abstract

The present work was born of the referring fidgets to the question of the minorities and the consequent necessity of a reflection inside of the classroom. The construction of the same starts with the education of history and the consequent necessity of debate of as it processes itself inside of the classroom. The subject is developed by means of three linked passages. The first, characterizing the historical clipping (1940-1960) of the History of the Paraná thus to point out the historical moment, focus of the study. As, searching the attention for the world contemporary dived in images and sounds, making photograph use, instrument that serves in the documentary register and the construction of the knowledge and that in this situation, do not have to be ignored by the teacher and yes challengingly used. Finally, considering that the feminine question permeou the two first ways, it is considered analysis and quarrel of the feminine presence in the local and paranaense society. The project was implemented with groups of eighth series of Basic Ensino and jointly made possible the construction of knowledge with the pupils.

1 Professora da rede estadual de ensino do Estado do Paraná, município de Assai. Participante do Programa de Desenvolvimento da Educação do Paraná, de 2007.

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Introdução: Conhecimento histórico

As discussões acerca da produção do conhecimento histórico mostram

a necessidade de retomada de estudo da década de 1970 e 1980 quando o

ensino de História passa a ser questionado. Naquele momento uma

pergunta movia as discussões em torno do ensino de história: é possível

produzir conhecimento em sala de aula? A dúvida é passível de ser

entendida, pois a época era de crença na idéia de que a produção do

conhecimento só era possível na academia e que a escola era apenas

espaço para a reprodução.

Mesmo neste período, alguns historiadores como Marcos Silva e

Dea Fenelon, já teciam críticas a este tipo de pensamento afirmando que

era possível produzir conhecimento no 1º e 2º graus. Segundo Kátia Abud,

André Chervel, na década de 1980, reforça essa idéia, alegando que a sala

de aula poderia ser produtora de conhecimento, diferente daquele

produzido na academia, um saber muito importante: o saber escolar.

(ABUD, 1995: 149)

Para Kátia Maria Abud em seu artigo “Conhecimento Histórico e

Ensino de História: a produção de conhecimento histórico escolar”,

devemos levar em consideração algumas idéias impressas no currículo.

Uma delas diz respeito a sabermos que ele é produzido por um grupo com

interesses e num tempo histórico específico; ele determina regras, dita uma

linha de pensamento.

A autora ainda chama atenção para o fato de que o currículo pode

aparecer envolto numa aura de naturalidade. Porém, é preciso tomar

cuidado, pois este se mostra como agregador de interesses, de intenções,

ou seja, não é neutro.

Segundo Lana Mara C. Siman, para entender a lógica do

desenvolvimento do conhecimento histórico é preciso entender a categoria

essencial desse conhecimento: o tempo. Para autora, também não se pode

desligar memória e imaginação, uma vez que não é possível restaurarmos o

real vivido em sua integridade, pois o processo passa necessariamente pelo

imaginário.

Para Siman, também é essencial estabelecer a função dialógica

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proporcionando um diálogo com o outro, ou seja, levar o aluno a pensar a

partir do outro. Assim, ao aluno é oportunizado se colocar, imaginar-se no

lugar do outro, sendo potencializado suas capacidades, incentivando-o a

pensar, questionar, perceber conceitos, presenças de temporalidade,

permanências e resistências.

Neste sentido, professor e alunos dialogam, usam da memória e

produzem conhecimento novo. Portanto, o aluno é capaz de abstração, de

perceber tempos históricos co-existindo e com outros significados. Segundo

a autora, tal estratégia confirma as idéias presentes no pensamento de

Vygotsky que acreditava na construção e aquisição do conhecimento

mediado pela cultura e pela linguagem, transformando os fenômenos

sociais em fenômenos psicológicos.

Em suma, para Siman, nas mediações para a construção do

conhecimento além do professor, outros mediadores culturais são

necessários como os objetos da cultura material, visual ou simbólica,

tornando possível reconstruir o não-vivido diretamente.

Marlene Cainelli em seu artigo “Educação Histórica: perspectivas

de aprendizagem da História no Ensino Fundamental”, centrado na

discussão da iniciação das crianças na construção do conhecimento

histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que

não se apresenta como um problema, já que ele é uma criação do homem,

uma construção humana. Na perspectiva de Cainelli, ensinar História para

crianças pressupõe despertar interesses por fatos do presente através do

passado. Deve-se proporcionar a possibilidade de diálogo com o passado

através dos vestígios existentes do mesmo, levando o aluno a perceber que

o importante em se conhecer o passado está no fato de poder relacioná-lo

com o presente.

Para Circe Bittencourt, Vygotsky, diferentemente de Piaget,

acreditava ser possível a aquisição de conceitos desde muito cedo, dando

ênfase sobre a distinção entre conceitos do senso comum e os conceitos

científicos. A crítica que se faz sobre a teoria piagetiana é sobre a extrema

importância que Piaget dá à maturação e não importando a história deste

indivíduo e sua influência no espaço a que pertence. Assim, Vygotsky

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apresenta seus estudos mostrando que a criança aprende por outros meios,

sendo, portanto, importante, aproximar aquilo que ele já sabe (senso

comum) com o senso científico.

Circe também ressalta os estudos de Paulo Freire, na década de

1970, que já utilizava desta idéia na alfabetização de jovens e adultos:

considerar o que este jovem já sabe, buscar um ponto de interesse e dele

partir para levar este aluno à aquisição dos conceitos desejados. Assim, a

autora ressalta que o pesquisador deve contextualizar os conceitos que

acredita necessário para a aprendizagem efetiva.

Ainda em se tratando de Circe, quando o assunto é o ensino de

História dois conceitos são de suma importância: tempo histórico e espaço.

Sabe-se que o conceito de temporalidade possui diferentes interpretações

principalmente quando pensada na lógica infantil, o que não descaracteriza

o conceito tempo. Cada sociedade tem seu tempo pensado e interpretado

de acordo com sua concepção de mundo. É importante utilizar do tempo

cronológico, tendo o cuidado com um trabalho por demais rígido que não

permita um trânsito livre entre outras temporalidades, como construção

social. Há um tempo vivido, um tempo biológico, marcado por anos de vida,

por marcas ritualísticas importantes que são incorporadas de diferentes

formas pelos grupos sociais. Também há o tempo concebido, que varia de

acordo com as culturas e gera relações diferentes com o tempo vivido. Todo

historiador se utiliza de várias categorias temporais, concentrando-se no

tempo métrico (cronologia e periodização) e tempo qualitativo (duração,

sucessão, simultaneidade, mudanças e permanências).

Além do tempo, outro conceito fundamental discutido por Circe

Bittencourt é o espaço, uma vez que todo acontecimento deve ser situado

num espaço específico. O historiador trabalha e percebe o espaço

diferentemente de outros cientistas, pois pensa o mesmo não apenas como

espaço geográfico, mas como espaço social, podendo ser delimitado de

outra forma. O espaço é mais que apreensão do espaço, mas por situações

que possibilitem o conhecimento de pessoas, de lugares; as diferenças

culturais, o espaço político, são formas diferentes de delimitar espaços que

não necessariamente por medições geográficas.

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Não basta delimitar o espaço é fundamental conhecer o que torna

aquele espaço como algo vivido e percebido pelos diferentes grupos sociais.

Segundo Circe “o sentimento de pertença a determinados espaços

nacionais, regionais ou locais faz parte de uma história”. (BITTENCOURT,

2004: 187)

Ernesta Zamboni trabalha com a temática da multiplicidade de

linguagens e categorias: tempo, cultura, documento, ideologia,

representação e diferentes formas de registro. Para ela novas abordagens

exigem que o historiador recorra a variadas formas de representação,

buscando assim ampliar e aprofundar o objeto de investigação.

Para a autora, sabe-se que não é possível restaurar o real já vivido

em sua integridade, uma vez que o imaginário, as emoções, as

contradições, fazem parte desta reconstrução, anulando qualquer pretensão

de uma ciência livre das paixões, completamente neutra, pois as

representações históricas estão carregadas de valores, traços culturais,

ideologias.

Em seu artigo “Leitura e escrita na História”, Fernando Seffner

ocupa-se em discutir a questão da memória que necessariamente precisa

do recurso da leitura e escrita; para que esta memória se eternize é

imprescindível exercitar a arte de pensar, reter os pensamentos e

comunicar.

O desejo de todo professor é formar um aluno capaz de realizar

uma leitura histórica, percebendo a realidade como construção histórica da

humanidade, fazer uma leitura complexa do mundo. Seffner alega que a

leitura e a escrita possibilitam um meio de retirar os indivíduos da exclusão

a que muito estão relegados: se apoderar da linguagem como instrumento

de pensamento, teorizar uma outra experiência social a partir de suas

próprias raízes, trabalhando a memória como forma de impedir o

esquecimento, de perceber-se pertencente a um grupo, a um espaço, a uma

história.

Seffner coloca que espera-se que um aluno leia em História,

diferentes documentos históricos, que o professor proporcione momentos

de leitura individual e silenciosa, que essa vá além dos livros didáticos, que

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passe pela narração, bem como pela prática da contação de histórias.

E o que se espera que um aluno escreva em História? Seffner nos

coloca esta questão e argumenta que “ler é compreender o mundo e

escrever é buscar intervir na sua modificação”. O ato de escrever deve ser

exercitado de diferentes maneiras, partindo, por exemplo, da descrição de

situações e cenários históricos, reflexões de cenas cotidianas, organização

de linhas do tempo, discutir e solicitar uma produção escrita; para que o

trabalho não seja esquecido, consumido pelo tempo, é preciso registrar

nossas conclusões, nossas idéias, até mesmo para que possamos retornar,

retificar, reconhecer conquistas, reconhecer retrocessos, perceber

mudanças, permanências, resistências, ou seja, ampliar nosso

conhecimento do mundo.

Marcos Napolitano chama a atenção para o mundo contemporâneo

mergulhado em imagens e sons, situação esta, que não deve ser ignorada

pelos historiadores e sim desafiadoramente utilizada. Estas fontes devem

ser analisadas em suas estruturas internas de linguagem a partir de seus

códigos internos, atentando-se à impressão de uma adesão imediata da

realidade e o registro em si, que não é neutro, ela é uma construção social.

Esta tensão entre subjetividade e objetividade no registro documental

marca as fontes históricas de natureza audiovisual e musical.

DEFINIÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

A disciplina de História deve buscar possibilidades de novos

questionamentos sobre o passado, valorizando a trajetória de luta e

transformação social. Valorizando os conteúdos estruturantes como uma

organização, jamais pretensamente neutra; como saberes historicamente

construídos e considerados fundamentais para a compreensão de uma

disciplina escolar, é que se coloca a importância da discussão referente à

questão da mulher, vista como parte de experiências cotidianas comuns,

que leva a representações de comportamentos, valores, condutas,

costumes que irão constituir nossa concepção histórica da realidade que

nos cerca. (DIRETRIZES CURRICULARES, 2006: 32)

Analisando a questão feminina pelo enfoque das dimensões

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econômico-social e cultura, o recorte feito, não é fechado em si, mas

articulado a movimentos de inter-relações, rompendo com o ensino

centrado nos “grandes homens”. Ressalta-se a necessidade de inserir o

sujeito comum, buscando um novo olhar sobre o presente.

Dos conteúdos estruturantes derivam os conteúdos específicos que

formam o trabalho pedagógico e a relação ensino-aprendizagem no

cotidiano escolar, e o tema sobre a presença feminina tem pleno campo de

intervenção em todas as séries do ensino fundamental, mas neste projeto

de trabalho, privilegiou-se a 8ª. Série: “Repensando a nacionalidade: do

século XX ao século XXI – elementos constitutivos da contemporaneidade”,

sublinhando a importância de discorrer acerca de problemas

contemporâneos, daqueles que representam demandas sociais e que

merecem ser desconstruídos atribuindo significado ao que se aprende,

constituindo numa aprendizagem significativa. (DIRETRIZES CURRICULARES,

2006: 39)

Alicerçando os estudos na concepção de uma história das

experiências ligadas ao cotidiano e ao (in) visível a ser debatido “os direitos

de cidadania das mulheres e as condições para o exercício são questões

centrais da democracia, e não apenas questões das mulheres”

(www.mulheresnobrasil.org.br acesso em 26/06/207); verifica-se aqui que a

história das minorias é a possibilidade de introduzir no ambiente escolar os

preceitos legais e humanos que ainda hoje permanecem no papel ou no

discurso vago daqueles que pretensamente consideram-se além dos

preconceitos existentes nos espaços públicos e privados.

Assim, nas últimas décadas, o mundo passou a discutir a cidadania

feminina e as relações de gênero como uma concepção dos direitos

humanos.

As desigualdades de gênero e os preconceitos são muitos e para uma

sociedade que pretenda levar em consideração um conceito plural de

sujeitos de direitos, vê-se a extrema importância do conteúdo especificado

neste trabalho. Ao aluno em sala de aula projeta-se a desconstrução e o

diálogo sobre algo latente, sobre idéias e conceitos preconceituosos e

discriminatórios, onde as mulheres partem para a luta política pelos direitos

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e transformação de realidades como estas, as péssimas condições de vida e

de acesso a políticas públicas; a violência, geradora de insegurança e medo;

a dupla jornada de trabalho; o mercado de trabalho; a ótica sexista e

discriminatória. (www.mulheresnobrasil.org.br acesso em 26/06/2007)

Situar historicamente o aluno é uma necessidade quando se pretende

fazer uma intervenção em sala se aula, portanto, o questionamento repousa

em conhecer o cotidiano feminino num período específico da história do

Paraná, num recorte temporal necessário que se faz entre os anos de 1940

e 1960, uma vez que os documentos históricos (as fotografias) utilizadas

neste trabalho nos permitem utilizar este período de estudo, ou seja, dão

conta de discutir a temática feminina através de imagens.

O Paraná e o recorte temporal de 1940 a 1960:

Para melhor compreensão do recorte temporal do projeto faz-se

necessário situar historicamente o Paraná dentro do período de 1940 a

1960, para isso foi realizado um estudo panorâmico da Coleção Histórica do

Paraná, elaborada por professores doutores da Universidade Federal do

Paraná, em específico os volumes 4 e 5 elaborados, respectivamente, por

Marion Brephol de Magalhães e Dennison de Oliveira.

Segundo Magalhães, a conjuntura que se apresenta no Paraná nas

décadas de 1950 e 1960 subordina-se ao modelo político adotado pelo

governo central, conhecido como “era desenvolvimentista”, uma

experiência de prosperidade aliada à democracia e ampliação da

participação popular.

O período que se estende de 1946 a 1960 foi uma longa experiência

democrática da República Brasileira, onde os partidos tendiam a preparar

quadros para o Executivo e não a de organizar as vontades coletivas e o

Paraná neste período não apresentou profundas mudanças no quadro da

administração pública. (MAGALHÃES, 2001:55)

Moysés Lupion (1947 - primeiro governador eleito), portador de um

discurso popular, representava a renovação, contudo mostrou-se um político

inescrupuloso, acusado de estar cercado de corruptos.

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Em 1950 é eleito Bento Munhoz da Rocha Neto, que implanta uma

época de produção de idéias, conferindo ao Paraná sua primeira identidade

e inserindo-o no contexto nacional, porém foi considerado elitista devido a

sua dedicação excessiva à capital – Curitiba.

O surto de progresso dos anos de 1940 e 1950 é definido por Bento

como um “espetáculo de prosperidade”, oportunidade de o Paraná sair de

seu confinamento provinciano. A participação paranaense na economia

brasileira era assegurada pela condição de grande produtor de café.

(MAGALHÃES, 2001:57)

Embora o Estado passasse por momentos de agitações sociais, os

políticos procuravam veicular uma imagem de tranqüilidade e progresso,

buscando assim atrair capital e mão-de-obra. O ritmo de produção leva à

necessidade de mão-de-obra, o que leva à estruturação do processo de

imigração.

Ainda citando Magalhães, outras preocupações se colocam como

imperativo para a modernização do Estado: a saúde pública, a segurança

pública (moralização dos costumes), malha viária, espaço de poder (Centro

Cívico de Curitiba). Essas medidas se apóiam na noção de um governo

científico e racional, governo que se pretende moderno e democrático.

Segundo Dennison de Oliveira, por volta de 1860, fazendeiros

paulistas e mineiros começam a ocupar a região do Norte pioneiro, que

acabou tendo o escoamento de sua produção e abastecimento vinculado a

São Paulo até 1924, quando o Porto de Paranaguá começa a funcionar.

A colonização da região do Norte Novo esteve a cargo da Companhia

de Terras do Norte do Paraná (inglesa) com venda de lotes a pequenos e

médios fazendeiros interessados no cultivo do café. Esta iniciativa fez a

população paranaense quase dobrar de tamanho entre 1940 e 1950 e entre

1950 e 1960 dobra de novo. Em 1960, estimulado pela cafeicultura, a

região do Norte Novíssimo é ocupado. (OLIVEIRA, 2001:34)

O auge do ciclo cafeeiro acontece em 1952 e diversas atividades de

suporte a cafeicultura se ampliam.

O projeto de democratização do acesso a terra (pequenas e médias

propriedades) deixa de existir entre as décadas de 1970 e 1980 com a

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concentração fundiária.

Entre 1950 e 1990, Dennison coloca que o número de núcleo que

foram alçados à condição de municípios no Paraná cresce espantosamente.

Claro que estas novas municipalidades estão ligadas a interesses políticos

em geral e eleitorais em particular.

No início da década de 1960 o ciclo cafeeiro começa a dar sinais de

esgotamento, motivado pelo excesso de oferta do produto, o confisco

cambial dos lucros dos cafeicultores (governo de J.K), as geadas. Como

alternativa ao café, a maioria dos grandes proprietários rurais adotou a

cultura da soja, o que irá marcar a década de 1970. (OLIVEIRA, 2001:36)

Documento histórico: a fotografia.

O trabalho de documentação histórica é de suma importância quando

este pretende dar visualidade a uma categoria que foi excluída da história

local e esquecida pela memória hegemônica, pois a mulher foi excluída,

primeiramente, ao nível do relato, que privilegiou os acontecimentos

políticos e econômicos, a partir da tematização da ação transformadora e

dos poderes masculinos e depois esta “memória feminina é sempre

reconstituída como flashes e lembradas como mãe, esposas, filhas e netas”

(CASTRO, 1994: 50), objetivando este estudo a fotografia é uma (re)

construção da realidade que se projeta sobre o passado e também sobre o

futuro.

A fotografia carrega em si uma intencionalidade, aquilo que se

pretende mostrar, o que deseja esconder, é um tempo de exposição, mas

também tempo social onde o indivíduo representa o seu papel num

determinado cenário, onde a composição desse espaço, desse momento,

são atributos do fotógrafo que muitas vezes escolhe o que quer que seja

visto (TURAZZI,1995: 309). Jamais se pode, portanto, acreditar que a

fotografia é cópia fiel da realidade, pois sendo uma construção, a imagem

segue uma orientação, uma ideologia. Hoje nos obrigamos a olhar para o

que não queremos ver, pois o ato fotográfico é antes de tudo um ato de

interpretação, são escolhas e olhares.

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Em seus trabalhos, Maria Ciavatta indica que a renovação na visão

dos fatos proporcionou a História se utilizar de fontes alternativas ao

documento escrito, como é o caso da fotografia, esta fonte que detém uma

fração mínima do continuum do tempo e altera a percepção do movimento

no ato de sua produção.

A autora trabalha em seu texto “O mundo do trabalho em imagens”

fazendo seus escritos através dos diferentes olhares sob a imagem

fotográfica como representação, como construção da memória.

Maria Ciavatta, em seu propósito de trabalho com a fotografia e o

mundo do trabalho, propõe um estudo das fotografias que atenda a quatro

aspectos importantes: a) fotografia enquanto produção de determinado

grupo de sujeitos sociais; b) fotografia enquanto prática sociocultural

decorrente de transformações tecnológicas e ideológicas de um período

histórico; c) fotografia enquanto representação sujeita a certa ordem de

uso, funções, multiplicação e circulação; d) fotografia enquanto prática de

construção de memória e identidade.

Segundo Ciavatta, a fotografia também pode servir como canal de

legitimação do poder, sendo preciso então, conceitos fundamentais para a

análise: cultura, ideologia, hegemonia e poder.

Quando o estudo se volta para a questão da memória Ciavatta

reconhece o significado da memória fotográfica enquanto forma de

transmissão e manutenção da memória de uma família ou de uma

coletividade. Na memória coletiva, principalmente dos marginalizados, a

fotografia serve ao princípio de consolidação de uma história, na

preservação ou no esquecimento.

Falando sobre as mulheres.

Em seu artigo “Por que pesquisar-ensino História sob a perspectiva

das relações de gênero”, Andréa F. Delgado coloca a problemática feminina

confinada na esfera do privado e busca em seu trabalho delinear questões

como gênero e poder, gênero e cotidiano.

Segundo Delgado, o conteúdo do que é “ser homem”, “ser mulher” é

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resultado de conflitos e confrontos que atingem todos os domínios da vida

em sociedade, o que irá determinar práticas diferenciadas entre os gêneros

e relações de poder baseadas nas diferenças entre os sexos.

Na experiência com alunos do Ensino Médio (Goiás) as relações de

gênero serviram de pano de fundo para as discussões em sala de aula e

Andréa Delgado não pôde escapar da percepção dos preconceitos e

estereótipos, algumas vezes, verbalizados e outras percebidas nos “sorrisos

e caras marotas” (DELGADO, 1997:43) e agradavelmente nos

questionamentos das permanências e mudanças observadas na construção

do gênero que os alunos vivem ou observam no presente.

Outra historiadora, Maria de Fátima da Cunha, também dá sua

contribuição na questão do estudo do gênero quando em seu artigo “Mulher

e historiografia: da visibilidade à diferença” a autora trata do resgate do

feminino preso à representação do ser despossuído de identidade, reflexo

do homem.

Segundo Cunha, a tradição narrativa sempre mostrou a mulher como

tentadora, ser ligado à carne, ao prazer, à luxúria, demônio, força do mal,

pecadora e sempre relegada a segundo plano na História. E isto começa a

se modificar, especialmente com a História das Mentalidades, com

preocupações voltadas para o popular o que permitiu uma abertura para a

história da mulher, tomando o devido cuidado em não fazer uma história

que faz da mulher uma vítima.

Assim, Maria de Fátima da Cunha, atenta para uma narrativa que

geralmente privilegia a política e a guerra, que são historicamente locais

masculinos. Quando a narrativa feminina aparece é principalmente nos

arquivos privados (correspondências e diários), já que os arquivos públicos,

organizados por homens, acabam realizando uma seleção que exclui o

feminino. Quando as mulheres ultrapassam o espaço privado são para

aparecerem pelo sucesso de suas profissões, casamento ou pelo caminho

da prostituição, criminalidade ou loucura.

Para Cunha, na visão marxista (de esquerda) havia uma expectativa

de que as mulheres “se libertariam da opressão quando, juntas com os

homens, na condição de trabalhadoras assalariadas rompessem suas

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amarras ao se incorporarem ao mercado de trabalho” (CUNHA, 2000: 148) o

que não ocorreu e a mulher acabou sendo duplamente útil ao capital:

trabalhadora e mãe/esposa.

É importante colocar a idéia de Hobsbawm e Hill, citado por Cunha,

onde os historiadores propõem a História vista de baixo que rompe a idéia

de se estudar a historiografia apenas pelo pólo opressor-oprimido e passar a

pensar os sujeitos da história enquanto sujeitos políticos. A História das

mulheres apreciou esta vertente de estudo.

No final do século XX toda uma gama de assuntos sobre o universo

feminino permite uma abrangência maior no estudo da História da mulher.

Esta colocação feita por Beatriz Nader em seu artigo “Reclusão biológica e

transgressão feminina: a mulher entre dois destinos”, apresenta um

contexto que procura situar o papel da mulher na sociedade patriarcal e na

sociedade contemporânea.

Pensando assim, os estudos de Nader, apresentados no artigo

dividem-se em dois tempos. Primeiramente a mulher na sociedade

patriarcal, considerada como um ser dependente do homem, o que acaba

acarretando a restrição de seu papel e a prática de subordinação ideológica

ao poder masculino. Em segundo, o destino transgredido, ou seja, mulheres

pobres que são obrigadas a trabalhar recebendo menores salários e menos

chances de trabalho, principalmente graças aos preconceitos por parte dos

homens.

O espaço público para as mulheres passa a ser visto como amoral,

mas por força da necessidade econômica, as mulheres permanecem no

mercado de trabalho e começam a se unir em grupos e associações e a

reivindicar seus direitos, dando início aos movimentos feministas.

As grandes guerras mundiais ocorridas no século XX mobilizaram

milhões de mulheres para o trabalho e após as guerras muitas questões

femininas defendidas se ampliam, agora as reivindicações são sexistas e

raciais. Até mesmo as relações de marido e esposa também se modificam.

A leitura do trabalho de Maurício Roberto da Silva sobre as meninas-

mulheres e mulheres-meninas da zona da mata canavieira pernambucana é

de grande valia, pois busca dar visibilidade às suas trajetórias de vida no

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trabalho e no lúdico. O autor coloca que são mulheres trabalhadoras, pobres

e analfabetas que não constam nos inventários ou livros de memórias, não

havendo registro que testemunhe sua relevância social, suas histórias de

luta pela sobrevivência.

Ao finalizar seus estudos, o autor coloca uma construção importante:

“(...) pensar políticas públicas que tenham como epicentro o tecido familiar,

as superações das opressões de classe e gênero, visando a revisão e

construção de outros caminhos e trajetórias (...)” (SILVA, 2002: 46)

OS ALUNOS E O ENSINO DE HISTÓRIA

Peter Lee apresenta em seus escritos sobre a “progressão da

compreensão dos alunos em História” na Inglaterra e no Reino Unido, um

receio surgido nos anos sessenta quanto aos alunos deixarem de estudar

História, o que acabou ocorrendo.

Buscando reverter esta situação, procura-se então ensinar História em

termos históricos, o que acarretou mudanças na disciplina e novas idéias

sobre o ensino de História.

Foi preciso falar de situações específicas do passado e sua devida

interpretação, não apenas fornecer informação, mas investigar diferentes

fatos e considerações até chegarem a algumas conclusões, compreendendo

que a “História” não pára nos testemunhos (LEE, 2001: p)

O Projeto Chata (Concepts of History and Teaching Aprroaches) serviu

como estudo investigativo em cognição histórica onde foram apresentadas

diferentes histórias sobre um mesmo acontecimento sobre o estudo

proposto. As respostas obtidas permitiram perceber que há alunos que já

sabem que as histórias são construções, fruto de seleção, separando-se da

postura de relativismo global.

Em um outro artigo intitulado “Em direção a um conceito de literacia

história”, Peter Lee expressa duas preocupações referentes a educação

histórica: como desenvolver a compreensão dos alunos no ensino de

História e o que os alunos deveriam saber sobre o passado. De acordo com

Peter Lee o conhecimento histórico não é um acumulado de eventos

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Page 15: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

descontínuos, portanto, para se ter uma idéia dos tipos de idéia sobre

história que os alunos conseguem reter é necessário termos uma noção de

literacia histórica. Para tanto, o mesmo autor se volta para as noção de

Riisen e a consciência histórica, marcadamente ressaltando que a “tarefa da

história é nos fornecer um senso da nossa própria identidade”. Esta

consideração de Riisen sugere a construção de um conceito de literacia

histórica, (que se constituiria na habilidade de compreensão do passado

pelo aluno) considerando que o aluno deva entender que a história deve ser

sempre uma indagação, entendendo que o conhecimento histórico é

possível, que a explicação de ações requer a reconstrução das crenças e por

fim, que as considerações históricas não são cópias do passado.

Numa história como contra-intuitiva é preciso conhecer quais as

idéias, pré-noções, pré-conceitos que nossos alunos já trazem sobre como

funciona o mundo. Para tanto, Lee realiza uma pesquisa com alunos de 10 a

14 anos da Inglaterra e algumas idéias básicas foram possíveis serem

demarcadas. Primeiramente, que muitos alunos vêem o passado como

permanente, a segunda idéia é de que só poderíamos saber sobre o

passado se estivéssemos lá quando aconteceu, ou seja, conhecimento pela

experiência. Em terceiro, está a idéia de que os fatos são constituídos de

evento ou ações localizadas no tempo e no espaço. E finalmente, os alunos

apresentaram a idéia de que aquilo que os historiadores dizem é “testável”.

Segundo Peter Lee, este conjunto de idéias tornam a história

impossível, embora funcionem na vida diária. Portanto, estas idéias levam

os alunos a tratarem a história como cópia de um passado fixo, não

percebendo que o passado muda com a ocorrência de novos eventos e

processos.

Novamente, o autor se volta para a pesquisa com alunos e agora as

respostas oferecem alguns apontamentos para discussão: os entrevistados

acreditam que a história ajuda-os a tomar decisões no presente, por

acreditar que compreender direções e tempo estendido são necessárias

para ajudar nas decisões atuais, e outros, que a história não ajudaria na

tomada de decisões diárias, pois, as coisas mudam.

Para o autor, os alunos podem e devem fazer suas próprias perguntas,

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o que leva a fazer conexões mais complexas, gerando um trabalho com

novas indagações.

Percorrendo o caminho de Peter Lee, Izabel Barca analisa o caráter

provisório do conhecimento histórico em seu artigo “Concepções de

adolescentes sobre múltiplas explicações em História”. Visões diferentes

apresentadas por teóricos possibilitam algumas considerações: as

conclusões históricas são apenas interpretações, não sendo possível serem

confirmadas ou rejeitadas; as explicações históricas são sempre

construções a partir de um ponto de vista particular, ou seja, revelam juízos

de valor; no realismo crítico as explicações históricas são provisórias porque

estão em constante mudança; no realismo céptico os teóricos negam a

possibilidade de conhecimento do real para lá do discurso, sendo a História

apenas uma narrativa.

A referida autora realizou uma pesquisa para responder à seguinte

pergunta de investigação: “Que idéias apresentam os alunos adolescentes

sobre a existência de diversas respostas históricas a uma questão concreta

sobre o passado?”

Neste estudo foram apresentadas quatro versões históricas sobre

uma questão e o que se pôde concluir é que alguns alunos raciocinaram

dentro de um modo descritivo mais ou menos coerente ou dentro de um

modo explicativo restrito. Nas idéias mais elaboradas a multiplicidade de

perspectivas é visto como meio de enriquecimento do saber.

Na construção de um modelo de idéias dos alunos sobre a

provisoriedade da explicação histórica percebe-se que nas séries iniciais a

preocupação está centrada na quantidade de fatores, sendo que alguns

alunos das séries finais demonstraram idéias de aceitação da perspectiva

em História.

Izabel Barca expõe em suas conclusões, a necessidade de

argumentação em torno de versões e fontes históricas diversificadas, uma

que “a História dá respostas provisórias porque pode haver pontos de vistas

diferentes, utilizando as mesmas fontes, e porque vamos descobrindo novas

relações sobre o passado, novas perspectivas”. (BARCA, 2001: 39). É uma

excelente forma de estimular o raciocínio, de desenvolver competências de

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Page 17: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

seleção e organização da informação.

No artigo proposto por Maria do Céu de Melo, a mesma, faz uma

investigação sobre o conhecimento tácito dos alunos que funciona como

uma fonte de hipóteses explicativas para compreender o passado. A autora

discute em seus escritos algumas características do conhecimento tácito

como sendo baseadas nas experiências e vivências pessoais; muitas destas

idéias estão no campo das crenças, enraizadas e de permanência de longa

duração, o que explica a dificuldade de mudança de auto-crítica; são idéias

de fácil recordação e possuidoras de mecanismo de auto-alimentação e

legitimação/reprodução.

Maria do Céu de Melo discute o conhecimento tácito dos alunos sobre

escravatura utilizando alguns instrumentos: entrevista sobre o

Conhecimento Tácito Substantivo Histórico, exercícios de empatia e

entrevista pós-exercício empático. Isto irá permitir a construção de um

padrão de idéias substantivas sobre a escravatura, como a mesma ser vista

como uma situação individual, marcada pela ausência de liberdade de

expressão e ação; também estabelecem relações entre a escravatura e as

necessidades econômicas de desenvolvimento das sociedades

escravagistas; foram também detectadas idéias em que a escravatura é

definida em termos econômicos na base da discussão trabalho x salário e

na ausência de direitos humanos.

Rüsen apresenta em seu artigo “El desarrollo de la competencia

narrativa en el aprendizaje histórico. Uma hipótesis ontogenética relativa a

la conciencia moral” uma discussão, em que o mesmo, coloca que o curso

das ações depende dos valores morais que o indivíduo possui como

princípios determinantes, sendo a consciência histórica considerada um pré-

requisito necessário, pois serve como orientação e ajuda-nos a

compreender a realidade presente.

A referência que temos do tempo futuro está imbuída de nossa

interpretação histórica do presente, o que nos leva a ações baseadas nestas

referências.

De acordo com Rüsen, a consciência histórica tem uma função na vida

prática: ela serve como elemento orientativo, dando a vida uma matriz

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Page 18: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

temporal, uma concepção do curso do tempo que flui na vida cotidiana,

dando a esta um curso de ações. A história seria um espelho da realidade

passada, na qual o presente se volta para aprender algo, criando

expectativas de acontecimentos futuros.

Segundo o mesmo autor, a consciência histórica é marcada pela

competência da experiência, quando o indivíduo aprende a olhar o passado

e resgatar sua qualidade temporal, caracterizada também pela competência

da interpretação, onde o indivíduo percebe diferenças de tempo entre o

passado, presente e futuro através de um todo temporal significante; e

finalmente a competência para a orientação histórica, onde se supõe que o

indivíduo seja capaz de utilizar este todo temporal, seu conteúdo histórico

para orientar sua vida.

Rüsen explicita que o desenvolvimento da consciência histórica

apresenta quatro tipos: a) tradicional: as tradições são indispensáveis

dentro da vida prática, uma vez que apresente uma totalidade temporal,

uma continuidade dos modelos de vida e modelos culturais, definindo a

moral como uma estabilidade inquestionada; b) exemplar: implica na

aplicação de regras prováveis que advém do passado a situações atuais,

revelando um sistema de valores culturalmente materializados na vida

social; c) crítico: desacreditar da realidade passada e apresentar uma nova

interpretação usando da razão histórica, oferecendo uma contra-narração

que desacredite a anterior, sendo desses pontos de vista históricos que se

pode orientar temporalmente as ações, constituindo a identidade do

indivíduo; d) genético: não há negação da história, porém, é preciso

interpretar os acontecimentos de uma forma moderna de moral,

percebendo que as formas de vida e cultura evoluem.

Na tipologia proposta por Rüsen o autor expõe que é possível

perceber que os modos exemplar e tradicional ocorrem com mais

freqüência, ou seja, estamos mais dispostos a basear nossas ações na

continuidade de modelos culturais já existentes ou em valores que se

cristalizaram na vida social. Isto acontece devido ao grau de conhecimento

que pode determinar a vigência de um tipo de consciência história.

As formas tradicionais de pensamento são mais fáceis de aprender, as

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Page 19: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

de forma exemplar dominam o currículo de ensino de história, já que as

formas críticas e genéticas requerem esforço maior.

A aprendizagem histórica, na concepção de Rüsen seria um processo

de digestão de experiências do tempo em forma de competências

narrativas, ou seja, a habilidade de narrar uma história da vida real que

segue uma orientação temporal.

As competências, segundo o autor, se adquirem progressivamente

passando das formas tradicionais ao pensamento genético.

Em um outro texto de Rüsen “Didática da História: passado, presente

e perspectivas a partir do caso alemão”, o autor expõe a trajetória histórica

da didática da história na Alemanha, iniciando sua escrita com a idéia

errônea que se tem da didática da história, onde se acredita que a mesma é

uma abordagem formalizada para ensinar história em escolas primárias e

secundárias, acreditando-se que ela faz uma mediação entre o que é

pesquisado nas academias e o que é ensinado nas escolas.

Rüsen destaca que até os anos 1950, a didática na Alemanha

Ocidental era considerada uma disciplina independente, constituída por

forças mentais que o historiador pode repensar ou apropriar. Sendo que, “a

história formal não se dirigia à essência do saber histórico escolar,

diretamente”, (RÜSEN, 2006: 7) havendo, portanto, uma recusa em aceitar

que a história possuía um uso prático, servir como meio de identidade

coletiva.

Os currículos primários, nos estudos de Rüsen, passaram a ser

resumos simplificados dos estudos em História, uma reprodução do que a

academia produzia. Porém, a partir dos anos 1960 e 1970 muitas idéias se

modificam e a história passa a ser concebida como uma ciência que possui

muita proximidade com outras.

Nos anos 1970, Rüsen percebe que floresceu na Alemanha uma

didática da história que acabou se aproximando a pedagogia. Se

contrapondo a essa idéia surge uma nova concepção que busca transformar

a história numa ciência social histórica, que anseia todas as formas e

funções do raciocínio e conhecimento histórico na vida cotidiana.

Na década de 1980, Rüsen aborda quatro pontos que permeiam as

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discussões na Alemanha: primeiro na metodologia de instrução, segundo

nas funções e os usos da história na vida pública, terceiro, no

estabelecimento de metas para a educação histórica nas escolas e a

verificação se estas têm sido atingidas, e o quarto ponto seria a análise

geral da natureza, função e importância da consciência história.

No primeiro ponto percebe-se que o próprio professor não tem

consciência do que está realmente realizando em todo o processo, o que

ocorre é um distanciamento no treinamento formal que este professor

recebe na prática do ensino de história.

Ao final de seu texto o autor propõe uma definição clara e concisa do

objeto de pesquisa da didática da história que é investigar o aprendizado

histórico, pressupondo que o ensino de história está intimamente ligado ao

aprendizado e que este é meio para que o indivíduo se oriente na vida e

forma sua identidade histórica, sendo importantíssimo que a disciplina de

história busque a experiência e a interpretação com conexões com a vida

cotidiana.

CONHECIMENTO PRÉVIO... CONHECENDO

É importante destacar neste momento a discussão feita por Marco

Antônio Moreira em seu artigo “Aprendizagem significativa crítica” que

expressa a relevância de aprender levando em consideração aquilo que o

aluno já sabe, argumentando que a educação deva objetivar um novo tipo

de pessoa: flexível, criativa, inovadora, tolerante.

Segundo o autor, deve haver uma interação entre o novo

conhecimento e o conhecimento prévio, já que este influencia na

aprendizagem. O aluno identifica semelhanças e diferenças e reorganiza

seu conhecimento na medida em que alguns princípios como a

diferenciação progressiva, a organização seqüencial, a reconciliação

integradora, a consolidação e os organizadores prévios servem como

facilitadores da aprendizagem significativa.

Tomando o conhecimento como uma criação humana que facilita a

aprendizagem significativa crítica, segundo Moreira, quando: a) professor e

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aluno compartilham significados e aprendem a fazer perguntas, a

questionar “verdades”; b) o ensino se apóia em outros materiais e não

apenas e unicamente no livro; c) o aluno é visto como um perceptor que

decide como representar em sua mente o que lhe foi ensinado e toma essa

decisão baseado em seu conhecimento prévio; d) a chave da compreensão

de um conhecimento é conhecer sua linguagem, uma nova maneira de

perceber o mundo; e) tomar consciência de que o significado está nas

pessoas que dão às palavras significados que se relacionam com suas

experiências; f) o conhecimento individual é construído superando erros,

percebendo que o conhecimento é provisório; g) o novo conhecimento

interage com o conhecimento prévio; h) a visão de mundo é construída

principalmente com as definições que criamos, com as perguntas que

formulamos e com as metáforas que utilizamos; i) diversidade de

estratégias instrucionais que impliquem participação ativa do estudante.

Moreira conclui reafirmando que o fator mais importante para a

aprendizagem significativa é o conhecimento prévio e foi seguindo este

pensamento que o trabalho de implementação em sala de aula do projeto

“A presença feminina na sociedade paranaense” buscou argumento para a

construção do conhecimento a partir do que o aluno já trazia de visão de

mundo, de conhecimento prévio e que desta maneira poderia interagir com

o novo conhecimento.

A intervenção deu-se no Colégio Estadual Conselheiro Carrão na

cidade de Assai, norte do Paraná, com três turmas da oitava série do ensino

fundamental, sendo duas do período matutino e uma do período vespertino,

num total de 81 alunos.

Com relação ao perfil destes alunos, alguns dados se fazem

necessário serem colocados: a maioria são meninas, na faixa etária entre 13

a 15 anos, moradores de diversas áreas da cidade, incluindo a zona rural,

sendo esta última numa porcentagem de 23%.

No questionamento sobre o entendimento sobre História, os alunos

(72,5%) acreditam que a mesma estuda o passado, havendo alguns alunos

que fizeram a conexão com o presente e perspectivas para o futuro.

Quando foram questionados sobre gostarem ou não de História os

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mesmos deixaram claro que gostam (33,3%), justificando novamente

porque ela fala do passado, pessoas, conhecimentos, sendo interessante.

Consequentemente acham a disciplina de história fácil, com várias

justificativas, sendo a mais alegada a de que a professora as faz gostar da

disciplina, ensinando com competência e de modo divertido.

No item “Dê uma sugestão de como a História poderia ser mais

interessante”, 21,62% acreditam que aulas práticas com visitas a museus,

observatórios e outros locais onde também se aprende história, além dos

livros e sala de aula. Alguns alunos deixaram claro, sua dificuldade com

“palavras difíceis”.

O interesse maior dos alunos em questão de conteúdo, 28,20% está

na escravidão, 23,07% nas guerras e 15,38% na Revolução Industrial.

A aquisição de conhecimento está entre a maioria das justificativas da

importância de se estudar história. Uma porcentagem considerável

(54,76%) acredita que a história afeta o cotidiano dos mesmos e que

gostam de entender os por quês do hoje, que só podem ser entendidos a

partir da compreensão do passado.

Ainda neste bloco, os estudantes foram questionados no seu

conhecimento sobre história do Paraná e a constatação de que nossos

alunos apresentam uma grande deficiência no que se refere a história de

seu estado. Como o conteúdo fica a critério do professor fazer sua

introdução integrada, evidencia-se uma lacuna no que se refere a história

do Paraná.

A importância de se estudar a história do Paraná é expressa na

necessidade de se obter conhecimento e por morar aqui (82,92%).

A maioria dos alunos apresentou uma preocupação em conhecer todo

o processo de formação da Paraná e consequentemente sua colonização

inicial.

Quando estimulados a escreverem conteúdos considerados

importantes, uma porcentagem razoável (35,89%) não conseguiu listar, o

restante elencou conteúdos como: imigração, escravidão, história local,

tropeirismo, rios, localização geográfica, entre outros. E muitos desses

conteúdos foram repetidos na última questão “Liste 5 acontecimentos da

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história do Paraná que você acha mais importante” , sendo que alguns não

conseguiram listar nada, outros listaram palavras soltas, sem nexo. Entre os

cinco mais listados temos: História local (17,18%), ciclos econômicos

(10,93%), fundações (10,15%), escravidão (8,96%) e índios (8,96%)

No segundo bloco de conhecimento prévio, o assunto abordado foi a

fotografia. O questionamento iniciou-se com a seguinte pergunta: “Você

acha possível aprender história através da fotografia? Como?”, a maioria

dos alunos acredita ser possível sim, alegando que ela pode explicar,

mostrar muitas coisas, acontecimentos. Interessante mostrar que houve

alunos que não vêem na fotografia um instrumento para aprender história,

os mesmos vêem apenas a escrita como forma de estudar história. Ao

mesmo tempo, na pergunta seguinte os alunos colocam que a fotografia

conta histórias de suas vidas, lembranças, momentos e acontecimentos.

Devido a aulas de Artes que tiveram recentemente, os alunos tinham

um conhecimento mais ou menos preciso sobre o período de surgimento da

fotografia.

Todos têm noção da mudança que a fotografia apresenta no aspecto

tecnológico (cor, tipo de máquina, tamanho), porém não citaram outras

modificações a não ser as óbvias.

Ao pedir que listassem cinco fotos da história de sua vida, os

estudantes citaram fotos de formatura, com os pais, melhor amigo,

aniversário, passeio, infância. Neste item foi possível conhecer melhor as

turmas, uma vez que os mesmos não apenas citaram as fotos, mas

justificaram, podendo assim, ser possível perceber dramas pessoais como a

morte, saudades, prisões, alunas casadas, famílias extensas, alguns já

viveram fora do país (interessantes para uma cidade pequena como Assaí),

seus passeios. Dois alunos fizeram referência à foto da carteira de

Identidade, o RG, como meio de independência, autonomia, maioridade,

sentir-ser “dono do próprio nariz”.

No terceiro bloco de questionamentos de conhecimento prévio o alvo

foi o conteúdo sobre as mulheres e assim algumas considerações foram

percebidas. Interessante foi perceber que os estudantes, embora tivessem

consciência da discriminação que as mulheres sofreram e sofrem, a grande

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maioria alegou que as mulheres, nos bastidores, fizeram história,

participando dos eventos, principalmente locais e em períodos em que os

homens são obrigados a sair de cena e às mulheres coube tomar uma

atitude, como nas guerras, revoluções, pioneiras.

A discriminação é principalmente percebida pelos alunos no mercado

de trabalho (51,42%), fazendo também referência ao agravante da cor,

etnia, classe social.

Quando o assunto são os livros didáticos, 30,30% dos entrevistados

acreditam que os mesmos fazem referência às mulheres. Numa memória

muito recente, a primeira guerra mundial serviu como referência, sabendo

que o professor tem um papel importante no trabalho com as minorias

daqueles que estão à margem da História.

A indagação “quais mulheres você conhece e acha que deveriam

entrar na história e por quê”, a pesquisa mostrou que as mulheres do seu

cotidiano (mães, avós, professoras) deveriam entrar para a história devido à

suas batalhas diárias e por não serem valorizadas.

Os nomes de Maria Bonita (esposa do cangaceiro Lampião), Princesa

Izabel e Duvinha (também do cangaço), foram as mais citadas,

respectivamente 57,89%, 44,73% e 42,18%, quando lhes foi pedido que

listassem cinco nomes de mulheres importantes na História. Novamente,

fazendo referência a uma memória recente, percebe-se que o estudo sobre

a Primeira República, especificamente a questão do cangaço na história

brasileira os alunos citaram Maria Bonita e Duvinha.

Encerrando a etapa de investigação sobre o conhecimento prévio

sobre as mulheres, a última questão foi sobre a importância de se estudar a

história das mulheres, 98% afirmaram ser importante, porque as mesmas

fazem parte da história e merecem ser estudadas. A porcentagem restante,

numericamente 2 alunos (L . S, 14 anos e J. M. O, 16 anos) não acham

importante, por um motivo hoje tão desafiadoramente imposto a todo

professor: não gostar de ler. A fotografia poderá servir de instrumento de

leitura que foge da forma tradicional.

A implementação

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Conhecer o passado nos permite compreender melhor a realidade,

descobrir os limites, as potencialidades e as conseqüências dos atos

humanos. Pensando assim e tendo a sala como um espaço privilegiado de

transmissão, de discutir certezas e preocupações, os desafios cotidianos, é

que o trabalho de intervenção intitulado “A presença feminina na sociedade

paranaense através de fotografias (1940-1960)” se desenvolveu nas turmas

de 8ª. séries do Colégio Estadual Conselheiro Carrão, na cidade de Assaí,

norte do Paraná.

Foram aproximadamente 64 horas onde o trabalho foi didaticamente

dividido em três blocos: História do Paraná, fotografia e presença feminina.

É importante salientar que o saber que o aluno já possui sobre o conteúdo é

passo essencial para todo o trabalho e foi pensando assim, que os alunos

inicialmente preencheram em duplas um questionário de conhecimento

prévio.

Para início sobre História do Paraná foi utilizado as lâminas de

projeção confeccionados no período de comemoração do Sesquicentenário

de Emancipação Política do Paraná, juntamente com outras que retratavam

momentos marcantes da História do Paraná, desde sua formação até a

década de 1960. O debate sobre os principais acontecimentos ocorreu

paralelo à atividade com a linha do tempo. Percebe-se que o conteúdo

caminhou com a fonte documental imagética.

Neste bloco foi possível perceber um interesse em conhecer a história

que lhe é mais próxima, pois a todo momento, era realizado um ir e vir, um

transitar entre a história do estado e a local. Nesta oportunidade os alunos

já foram capazes de perceber que a fotografia é apenas um olhar sobre o

fato, que a mesma é uma construção.

Quando o conteúdo sobre fotografia foi inserido os alunos já tinham

um arcabouço de dúvidas e questionamentos que puderam ser melhor

trabalhados com a introdução de um roteiro de análise de fotografia:

Roteiro Básico para leitura de uma imagem:

1. Localizar:

- Onde se passa a imagem?

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Page 26: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

- Quem aparece na foto escolhida?

- Por quê? Qual teria sido a intenção da fotografia?

- Como? Quem é o autor?

- De quem? (Propriedade)

- Quando?

- Qual espaço está sendo mostrado?

- Quais aspectos de hoje aparecem na fotografia?

2. Apreciação da fotografia:

Conduzir a conversa ou propor escrita em grupo sobre:

- O que você está vendo?

- O que mais chama sua atenção?

- Como são as pessoas? Que idade parecem ter? Como se vestem?

- Existe algum personagem que se destaque? Há alguma pessoa escondida?

- O que os personagens estão fazendo?

- Que profissão é essa?

- Que habilidades demonstram ter? Parece ser um trabalho cansativo?

- Como é o lugar?

- Há detalhes na fotografia? Quais?

- Quais personagens estão em primeiro plano na imagem?

(Os questionamentos feitos devem ser adaptados à fotografia em análise).

Como forma de expansão e discussão um breve histórico sobre a

história da fotografia foi apresentado e trabalhado com o intuito de alcançar

referenciais históricos para uma melhor compreensão do trabalho.

Inicialmente foi utilizado uma fotografia dos anos 1950 e questionamentos

foram feitos a seu respeito: semelhanças, diferenças, permanências,

mudanças e inúmeras dúvidas suscitadas a partir da fotografia.

Tanto no trabalho com a história do Paraná, e agora com a fonte

documental fotografia, o foco sempre foi a presença feminina, portanto,

voltando ao assunto “mulheres” mas, as imagens passaram a ser

analisadas mediante o roteiro já apresentado,. Partindo da história local, as

fotografias retratam um casal de trabalhadores capinando e a outra uma

mulher com vestimenta do trabalho na roça realizando tarefas domésticas.

Também aqui as lâminas de projeção comemorativas do Sesquicentenário

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Page 27: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

de Emancipação Política do Paraná foram usadas, porém com um olhar mais

apurado.

Deve-se salientar neste momento que a fotografia possui uma

intencionalidade, sendo uma construção humana e que os alunos foram

levados a repensar suas idéias cristalizadas sobre a fotografia ser uma

cópia fiel da realidade.

O Colégio Estadual Conselheiro Carrão está presente no município

desde a década de 1940 e o mesmo possui em seus empoeirados armários

antigas lembranças de formatura com fotografias, com um formato estético

bastante incomum para a época atual, confeccionados no período de 1940 a

1970. Este material foi também explorado, o que despertou a curiosidade

dos alunos, percepções e questionamentos: maior número de homens em

cursos considerados masculinos para a época; maior número de mulheres

nos cursos de magistério; poucos alunos formandos; maioria de origem

japonesa, pessoas conhecidas; motivo para se fazer aquele tipo de

lembrança...

O último bloco de estudos e trabalho passou a ser a questão feminina,

que a todo o momento permeou o trabalho. Como forma de provocação, foi

distribuído no corredor de acesso de todos os alunos frases retiradas de

revistas femininas das décadas de 1940 e 1960, tais como: “Não se deve

irritar o homem com ciúmes e dúvidas". (Jornal das Moças, 1957), "Se

desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu carinho e

provas de afeto, sem questioná-lo". (Revista Claudia, 1962) e "O lugar de

mulher é no lar. O trabalho fora de casa masculiniza". (Revista Querida,

1955).

Então, o trabalho antes restrito às três salas destinadas à

implementação do projeto, passou a ser também alvo de debate em toda a

escola e estes questionamentos foram transportados para as salas de aula

de 8ª. séries através de lâminas de projeção que serviram de meio para a

desconstrução de algumas idéias, para a exposição de conhecimentos

prévios, para levantar permanências e mudanças e produções escritas.

Novamente foi utilizada a linha do tempo para a discussão das

conquistas femininas percebidas no recorte temporal; análise de fotografia

27

Page 28: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

tendo como base o roteiro já visto anteriormente; estudos de casos como as

guerrilheiras do regime militar (Iara Iavelberg, Áurea Pereira Valadão, Aurora

Maria nascimento Furtado); das mulheres pobres e obrigadas a entrarem no

mercado de trabalho; a educação feminina. Um dos objetivos essenciais foi

desnaturalizar idéias, conceitos, que de tão repetidos parecem ser

verdadeiros, mas que precisam ser questionados, analisados como

construções humanas e que, portanto, servem aos interesses de alguém.

O mesmo questionário aplicado no início da implementação foi

novamente apresentado aos alunos para desta forma, possibilitar a

observância de mudanças, percepções, permanências, ou seja, se

realmente o trabalho desenvolvido surtiu o efeito desejado.

Pós- implementação: discutindo resultados

Sabe-se que estudar história, interpretá-la, ensiná-la não é uma tarefa

fácil e o trabalho de intervenção em sala de aula partiu do pressuposto de

que o passado deve ser interrogado a partir de questões que nos inquietam

no presente, portanto, a história das mulheres é um compromisso com o

hoje, em se colocar no lugar do outro, perceber rupturas e permanências,

diferenças e semelhanças, temporalidades.

Após o trabalho em sala de aula, espaço privilegiado de transmissão

de idéias, de discussão, novo questionário agora pós-intervenção foi

aplicado com os mesmos alunos, objetivando perceber, analisar, mesmo de

forma limitada e primária, o que os alunos puderam apreender e construir,

se modificações ocorreram ou não.

Com base comparativa nos questionários de conhecimento prévio, os

questionários pós-implementação em sala de aula, os alunos apresentaram

algumas mudanças significativas e outras permaneceram.

No tocante, a história do Paraná, houve uma grande abertura e

diversidade de conteúdos que os alunos gostariam de aprender mais. Bem

diferente da constatação antes da implementação, os estudantes citaram

mais de vinte conteúdos, sendo o tropeirismo (19,35%), atuação feminina

(11,82%) e o cultivo do café (9,67%). Como o trabalho com imagens

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permeou todo o trabalho pode-se constatar que os conteúdos onde a

fotografia foi trabalhada como um olhar, um dos fragmentos do que se

poderia estudar, os alunos demonstraram interesse em aprender mais,

despertando-se para questionamentos e dúvidas.

A maioria vê no conhecimento e no sentimento de pertencimento a

importância de se aprender a história do Paraná. Um dos alunos alegou que

sendo paranaense, seria “uma vergonha não conhecer a história do meu

estado” (M. I , 13 anos). Interessante ressaltar que alguns alunos citaram

que a importância estaria no conhecer a evolução histórica, analisando

permanências, mudanças, usando uma linguagem mais elaborada.

Comparativamente e agradavelmente foi a constatação de que

horizontes foram ampliados quando do questionamento a respeito do que

os alunos aprenderam sobre história do Paraná, pois, o que anteriormente

no questionário de conhecimento prévio alguns alunos nada citaram ou

muito pouco, neste fim de implementação chega-se a conclusão de que no

mínimo o projeto serviu para levantar algumas abordagens interessantes,

sendo agora citados vinte e dois conteúdos, com maior índice (17,57%)

para o tropeirismo. A mesma constatação foi possível ao pedir que os

mesmos citassem cinco acontecimentos da história do Paraná, salientando

que a presença feminina foi agora citada como parte essencial desta

história.

Ao analisar as respostas apresentadas no questionário pós-

implementação sobre o trabalho sobre fotografia, todos os alunos foram

unânimes em afirmar positivamente a possibilidade de se aprender história

através de fotografia num total de 37,83% dos mesmos acreditam que esta

possibilidade repousa na forma de como analisamos os detalhes de

mobiliário, vestimenta, período, poses e comparando-as com situações

atuais. É importante salientar que alguns alunos colocaram que através da

fotografia podemos levantar “suspeitas” (palavras deles) sobre os

acontecimentos.

A pergunta “A fotografia conta histórias? Quais?” foi unânime em

afirmar que a fotografia conta histórias das mais diversas, da história local

ao âmbito mundial e suas conseqüentes ligações. Com histórias das cidades

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(12,5%), das mulheres (10,71%), do cotidiano (10,71%) e história das

famílias (10,71%)

Com uma percepção maior, os alunos conseguiram datar com maior

precisão (século XIX) o surgimento da fotografia e que a mesma sofreu

modificações no decorrer do tempo seja em tamanho, forma, cores

(46,66%) já que as fotos analisadas eram em preto e branco, poses,

manipulação.

No bloco que investigou sobre a questão feminina foi fácil a percepção

numérica da tarefa de desnaturalizar antigas afirmações, uma vez que após

a intervenção a porcentagem de 36,36% que afirma que as mulheres

aparecem, (quando aparecem) são sempre discriminadas, porém lutando

por seus direitos, seja na surdina, nos bastidores da história oficial, seja na

luta armada, seja em pequenas batalhas diárias. E estes alunos também

expuseram questões como a dupla jornada de trabalho e a discriminação

acrescida à condição étnico-racial.

Um item abordado por um grupo foi a problemática da submissão

feminina presente não só num passado remoto, mas forma corriqueira

observada em dias atuais.

Mais do que antes, os alunos são categóricos em afirmar que os livros

têm privilegiado a história dos homens em detrimento da história feminina,

que na sua maioria aparece com caráter ilustrativo, como curiosidade.

Sobre a importância de se estudar a história das mulheres todos estão

seguros em afirmar esta necessidade, justificando (62,88%) que se deve

aprender mais sobre as mulheres, pois só o conhecimento, só retirando-as

da obscuridade histórica a que foram lançadas, será possível reconhecer

sua atuação, “driblar” a discriminação.

É importante destacar que foi realizado com o questionário um

trabalho de categorização, ou seja, um a um os mesmo foram lidos,

quantificados e em seguida foram organizados em categorias o que facilitou

a escrita, além disso, durante as atividades de implementação em sala o

professor sempre fez ao final de algumas atividades relatórios e anotações

à respeito de percepções, comentários e insights .

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Page 31: “A presença feminina na sociedade paranaense através de ... · histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que não se apresenta como um problema,

Conclusão:

Atuar em sala de aula numa sociedade como a atual, onde as

informações vêem como tsunâmes, onde tudo é muito rápido, não é uma

tarefa fácil. Discutir temáticas relacionadas às minorias tão em moda

parece simples, porém, um trabalho sério deixa transparecer que a batalha

diária de fazer da disciplina de História, uma área necessária e de suma

importância para a atitude de parar e repensar antigas convicções é tarefa

que todo professor deve encarar desafiadoramente.

O projeto PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional – Paraná)

foi um meio eficaz de capacitação dos professores e que repercutiu no chão

da escola, quando alunos foram beneficiados com professores mais

atualizados, embasados teoricamente, com novas formas de ver seu

trabalho e transportando para a sala de aula esta discussão peculiar a um

conteúdo.

“A presença feminina na sociedade paranaense, através de fotografias

(1940-1960)” nos remete a questionar, deixando claro que não há respostas

prontas, acabadas, com afirmações ditas como verdades inquestionáveis,

mas possibilidade de debate para temas carentes na disciplina de História

do Paraná: valorizar e conhecer a história local e de seu estado; ter na

fotografia uma interessante fonte documental de trabalho e as mulheres

como foco na produção histórica.

A leitura dos questionários de conhecimento prévio, pós-

implementação e análise de conteúdo passou pelo cuidado de realizar a

categorização dos dados, o que possibilitou um estudo mais dinâmico das

informações adquiridas.

A semente que se planta hoje precisa ser regada diariamente para

que cresça e frutifique, portanto, o trabalho iniciado com este projeto

continua sendo ampliado cotidianamente em sala de aula.

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