A Profecia de Hedhen

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    A Profecia de Hedhen

    A Profecia de HedhenPor Cristina Aguiar

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    Fortaleza/2011

    Apresentao

    A Terra de Hedhen, aps uma primeira era abenoada, vive agora emum mundo infestado pelas trevas. Vive-se a realidade dos sacrifcios humanos eda subservincia forada. A nica esperana de todos est no cumprimento deuma Profecia. Esta fala de uma mulher, a Herdeira, que deveria surgir e unir os

    povos na luta para expulsar o mal e trazer de volta a luz que existia antes daqueda dos Primeiros Tronos. O livro ambientado em um fictcio mundo matriarcal, onde homens emulheres vivem de forma igualitria, exercendo as mesmas funes. A histria

    procura ser dinmica, intercalando rom ance, magia, drama, humor e aventurana medida certa.

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    PRLOGOFuga na Noite

    Quando ela nasceu, Hulda a segurou nos braos. Uma menina de

    pulmes fortes, ela pensou. Um gem ido que vinha do leito,a fez voltar atenopara a rainha que agonizava aps o difcil parto. Hulda... ela sussurrou com dificuldade. Deixe-me ver o meufilho... Hulda abaixou a criana at os braos sem foras da me. uma menina, senhora - ela disse. Uma futura rainha. Cirene, a rainha de Salema, cidade principal da terra de Hedhen, beijoua filha e ps a m o sobre a cabecinha, ainda desprovida de cabelos. Ela ser uma rainha, sim... Uma rainha mais justa do que fui.

    A criana comeou a chorar e Hulda a passou para os braos da parteiraque a levou para um quarto adjacente. Cirene pegou a mo de Hulda. Preciso lhe falar antes que a vida me deixe... Hulda sentou-se. Estou pronta para ouvir e a obedecer, minha rainha. No deixe que minha filha seja criada por Atalia. Minha irm cultuauma deusa cruel e quer reviver antigas conquistas de tempos que no devemvoltar mais. Deborah deve ser uma esperana de novos tempos. H muitos anos,

    no nasce uma rainha de linhagem pura. No sei como fazer isso aqui no palcio, senhora. Atalia no suporta aminha presena e ela ser a regente at que sua filha se torne adulta. Ento, voc deve tirar Deborah daqui.

    Hulda no respondeu,por estar surpresa demais,diante da proposta darainha. Hulda, os dias antigos no podem voltar e permanecer. Seria o fim detudo. A escurido vir enquanto minha filha cresce e se torna uma mulher. Estarno seu sangue o zelo pela luz. Minha rainha, a senhora foi ao Altar de Shilloh? Sim, eu fui. Ela tem uma misso a cumprir, Hulda. O equilbrio deHedhen, que havia no incio, ser restaurado atravs da unio dos dois grandesTronos. A Era dos Luminares estar de volta e haver paz e justia novamente. A rainha apertou mais forte a mo de Hulda. Prometa que cuidar dela. Com minha vida se for preciso, senhora. Partirei ainda essa noite, esua filha um dia retornar e se sentar no trono que lhe est destinado. Eu

    prometo. Que o Pai-Criador esteja com voc, minha am iga e conselheira...

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    Hulda sentiu que a fora da mo da rainha ia se esvaindo. Quando osolhos dela se fecharam ,e o peso da morte se fez sentir no lugar, Hulda permitiu-se chorar pela amiga. Ela deveria sair antes que a notcia da morte da rainha se espalhasse. Anoite seria o seu escudo de proteo. A parteira, que era fiel rainha, contariaque a criana morrera de algum mal terrvel e, por estar desfigurada, ela achou

    por bem , enrol-la em uma mortalha. Os medos e supersties no deixariamningum se atrever a desembrulhar o corpo da criana. Hulda tomou o caminho da montanha. Ela foi a p, seguindo o rio. Sabia

    bem para onde ir. A menina em seus braos era leve e dormia tranquilam ente. Durma, pequena. Sua vida no ser fcil. Durma enquanto pode. Perto do amanhecer, ela encontrou a trilha que levava as grutas. O matohavia subido o suficiente para cobri-la e escond-la dos viajantes. Era umasubida difcil, mas Hulda tinha os ps de cora,e no se cansava com facilidade.

    Antes do amanhecer, ela chegou a entrada de uma gruta enorme.Dentro dela, o caminho prosseguia pelo interior da montanha. Antes de alcanaro cam inho, havia um grande lago de gua transparente e fresca. Hulda sentou-senas margens do lago com a respirao ofegante. Agora podem os descansar, minha princesa. Ela retirou o manto e o estendeu dobrado em dois, sobre um espao nocho, onde a areia era macia, e depositou a criana que ainda dormia. Huldasorriu. Aquela menina era um dos Luminares profetizados no incio dos tempos.

    A mulher pousou a mo suavemente sobre a superfcie das guas e estas seagitaram. Como se tivesse ouvido o som de uma campainha, um vulto surgiuvindo de dentro da montanha. Era uma mulher e se vestia igual a Hulda. Irm , o que a traz aqui? E quem essa criana? Hulda contou toda a histria a Miriam. Esta olhou para os cus eagradeceu ao Pai-Criador. A Profecia real e vai se cumprir. Duvidava disso? - perguntou Hulda. No posso negar que houve momentos em que achei que no havia

    mais esperanas para Hedhen. Miriam olhou para a menina com ternura. O que far com ela? Ela deve crescer longe daqui. Vou lev-la para o norte,e deix-la asalvo com um amigo. O norte - repetiu Miriam com um tom sombrio na voz. O que foi? Uma fumaa negra tem subido de Hazorah. Dizem que suas forjas

    esto criando novas carruagens de ferro. Um exrcito est sendo preparado. O poder de Hazorah est renascendo? Desde quando?

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    Miriam olhou para a menina ali deitada. Faz nove meses.

    Atalia observou o rosto plido da rainha e o cobriu com um vu. Ao lado

    desta, um pequeno corpo todo embrulhado em panos de linho. Ela deveria estarcontente. A rainha morreu e seu herdeiro tambm. Este, no caso no seria

    problem a, pois segundo lhe disseram, havia nascido homem. Os homens noherdavam os ttulos das mes. Ela agora era a rainha, mas ainda no se sentiatranquila. Algum segredo parecia mover-se pelo ar. Ela o podia sentir. Senhora, est tudo pronto para o funeral - a notcia lhe foi dada pelasacerdotisa-chefe de Salema. Que seja rpido! ela falou rispidamente. O ritual foi feito com todas as pompas que a rainha Cirene merecia,e o

    povo chorou sua morte.

    Atalia passou uma vista pelas pessoas ali presentes em frente aomausolu. Viu a Ordem Branca do Templo prestando-lhe homenagens com asespadas douradas e refulgentes para o ar, e fez uma careta. As coisas mudariam.Os tempos mudariam. Atalia era rainha. O que far enquanto a menina cresce? Miriam havia acabado de alimentar a pequena com leite fresco e a psnos braos de Hulda. Procurarei o menino. Ele tambm precisar ser achado. No cabe a voc, fazer isso. Hulda a encarou. O que quer dizer? Faz parte da misso dela, Hulda. um dos sinais, se lembra? Hulda respirou fundo. Nunca me atentei para tal fato. E o que eu farei durante esse tempo? Miriam sorriu e ps a mo de Hulda sobre a cabecinha de Deborah. Ela sua misso. Precisa instru-la e trein-la. Ela deve saber quem, e o que deve fazer. No algo que lhe vai ser oculto. Hulda, voc precisa criar

    uma guerreira. Nunca! Ela veio para dar um fim a essa raa de guerreiras, como

    poderia ser uma? Sendo a melhor, mais justa, mais corajosa e a mais verdadeira dasamazonas. Ser tambm a ltima delas, pois ao sentar no trono, ela mudar aordem das coisas. O que deve cair a violncia, o orgulho, a cobia e a sede desangue que Atalia quer restaurar.

    E como tornarei Deborah,uma guerreira diferente das outras?

    Ensinando-a sobre o Pai-Criador. Hulda olhou ternamente para a criana e sorriu no seu ntimo.

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    Tem razo, Miriam . Ela pode ser diferente. O semblante de Miriam ficou carregado como se uma nuvem de

    preocupao pousasse sobre ela. Oua, voc precisa se certificar de todos os fatos referentes Profecia antes de tomar qualquer deciso. Para isso, eu precisaria ir a Ilha dos Profetas. No posso me separar

    dela. Pelo menos, no agora! Deixe-a em um local seguro e v! No espere muito, Hulda. H maisfatos nessa histria que desconhecemos.

    O funeral estava pronto para ocorrer. A cerimnia j havia seguido todos

    os rituais e o povo comeava a se cansar embaixo do sol causticante. Atalia, todavestida de negro, olhava fixamente o pequeno corpo da criana. Subitamente, elaergueu o brao antes que os sacerdotes tocassem-no.

    Esperem! Antes que o encerrem na cm ara funerria, eu desejo vero meu sobrinho. No posso viver com isso pesando em meu peito. O sacerdote olhou para a sacerdotisa-chefe e recebeu sua aprovao.Respeitosamente, ele foi desatando as faixas que encobriam a criana. Derepente, um murmrio perpassou a multido. O sacerdote, de mos trmulas,olhou para a rainha. Atalia no esboou nenhum gesto de surpresa. Apenas

    podia-se ver o brilho frio e glido em seus olhos negros como a noite. No lugar do

    corpo da criana,havia um boneco de loua e pano. Ela virou-se para Kyara, acapit de suas tropas e sua mais fiel confidente. Tragam-me a parteira - ela sussurrou por entre os dentes. Queimem esse embrulho! - ordenou aos sacerdotes. Ao final daquela cerimnia, vrios sentimentos agitavam os coraes:Alguns aguardavam com ansiedade e angstia o que resultaria da ira da rainha;outros voltaram para casa com uma alegre esperana no corao.

    A parteira foi jogada diante do trono de Atalia. A mulher tremia e arainha sorriu. No seria difcil retirar dela o que queria.

    Voc fez o parto de minha irm e ela no teve um boneco! O que foique nasceu dela e que destino lhe foi dado? A mulher guardou silncio. Voc tem famlia. Um marido e duas criancinhas, no ? O que vocacharia de v-los arder na fogueira como sacrifcio grande deusa da terra? No! - a mulher atirou-se aos ps da rainha. Ento, diga-me o que eu quero saber. A mulher respirou fundo.

    A criana nasceu desfigurada e morta! Ela foi queimada. O ltimopedido da rainha antes de m orrer. Eu juro!

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    Atalia fez um sinal para Kyara e duas crianas, um menino e umamenina, ambos gmeos, foram arrastados para dentro por duas guerreiras. Meus filhos! - a parteira tentou correr para eles, mas foi impedida porKyara. Seus filhos morrero aqui mesmo, sua frente, se no contar averdade - a voz da guerreira era to fria quanto a da rainha.

    Uma menina! - exclamou a mulher. A rainha teve uma menina!Forte, saudvel, perfeita! Atalia ficou em p com o rosto sem cor. E onde ela est? Isso eu no sei, eu juro! - a mulher falava entre soluos. Hulda, a

    profetisa, a levou. Ela disse que a menina deveria ser protegida para que o povotivesse uma esperana, mas no me disse para onde a levaria. Kyara lanou um olhar para a rainha. Atalia desceu os degraus e passou

    pela mulher em pranto sem nada dizer. Parecia em estado de choque. Majestade, o que devo fazer com eles? Tire-os de minha frente e de minha terra. Que sejam banidos parasempre! Ky ara preferia ter matado a todos e se surpreendeu com a atitude darainha, mas cumpriu as ordens sem questionar.

    O velho Hber levantou os olhos e viu a carruagem que trazia uma visitainesperada. Hulda, minha amiga,o que a traz aqui? Hulda desceu com a pequena Deborah nos braos e se aproximou dohomem grisalho e obeso. Preciso de sua aj uda, meu velho amigo. Hber levou Hulda para uma das tendas coloridas do acampamento eouviu a sua histria. No foi muito prudente ter vindo para c. Hazorah est se erguendo.O rei Jabim amante das artes mgicas dos velhos feiticeiros e colocou o poo

    da viso para funcionar novamente. Se, Atalia se unir a ele, encontrar a m eninarapidamente. Hulda ficou calada e pensativa por um tem po. O velho Hber observou a

    pequena m arca na cintura da m enina. Uma m eia lua. A marca do destino. Uma Luminar autntica! Ele suspirou e levantou-se. Pode me acompanhar? Preciso lhe mostrar algo. Hulda deixou a menina dormindo e acompanhou Hber at uma tenda

    menos colorida e com toques mais graciosos. L dentro, uma jovem mulheramamentava uma m enininha da idade de Deborah.

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    Esta Jael, minha neta. Tam bm nasceu recentem ente. Hulda o olhou, estarrecida. Ela tambm tem uma marca Hber falou solenemente. Umaestrela. Voc no veio aqui por acaso, minha amiga. Hulda aproximou-se e viu a pequena estrela no lado direito da menina.Era uma menina de apetite. Tinha uma cabeleira de cachos castanhos e pele

    branca e translcida. Outra Luminar! Elas no podem ficar aqui, Hulda. Suas vidas correm perigo. Para onde eu poderia ir? Antes tinha que proteger uma, agora soduas! O velho mordeu os lbios. Existe um lugar - disse a me da menina. Atravessando o GrandeRio, existe uma terra em que o povo aparentado conosco. As mulheres so

    guerreiras, mas adoram o Pai-Criador, como ns. Elas se tornaram guerreiraspara defender suas cidades enquanto os homens iam para a guerra. um lugaronde a harmonia ainda reina. Gades! - lem brou-se Hulda. Tem razo. Elas estaro seguras l. Naquela noite,ficou decidido que Hber levaria as meninas para Gades,enquanto Hulda iria para o Litoral e embarcaria para a Ilha dos Profetas , a fimde pesquisar tudo sobre a Profecia e depois voltaria. Antes de ir, ela disse aHber que as meninas deveriam ser treinadas nas armas. Era uma prerrogativa ,

    para o que elas iriam passar quando chegasse a hora. Assim ficou acertado.

    PRIMEIRA PARTE

    CAPTULO 1Deborah e Jael

    O tempo foi passando e as meninas foram crescendo junto smontanhas, intercaladas por verdes vales e muitas cachoeiras. Hulda sempre asvisitava. Do outro lado do rio, a terra jazia em um vu de desesperana. Asconquistas ordenadas por Atalia eram sempre um verdadeiro massacre. Quasetodos os reinos de Hedhen, eram-lhe tributrios e Jabim, o rei feiticeiro de

    Hazorah, criou um exrcito poderoso e indestrutvel que portava armaduras deferro. Cidades eram saqueadas, os homens eram mortos e mulheres jovens eramlevadas para se incorporarem ao exrcito de guerreiras de Atalia. Hulda viu as meninas crescerem longe dessa realidade e se sentiaaliviada. Atalia continuava sua busca pela sobrinha e, acada ano que se passava,

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    sentia-se mais ameaada. Suas conquistas eram apenas um pano de fundomacabro para realizar essas buscas. Vinte e trs anos! Hulda suspirou ao ver as duas moas lutando nacampina verde do vale. J eram duas mulheres feitas. Deborah era mais alta.Tinha uma expresso sempre atenta nos olhos grandes e negros que combinavamcom os cabelos, uma pele bronzeada e uma autoridade natural que emanava

    dela. Jael era um pouco mais baixa, de cabelos castanhos, olhos cor de mel, euma agilidade muito peculiar. O corpo era bem proporcionado e atltico. Ambaseram conscientes da misso que tinham pela frente e treinavam para estarem

    prontas, quando o momento chegasse. Hulda sentou-se sobre a relva e ficouobservando a luta equilibrada.

    As espadas se tocaram no ar com firmeza. Deborah deu um giro e Jael

    pulou para trs com uma cambalhota, conseguindo amparar um segundo golpe

    que vinha por cima. Devido posio, ela caiu e Deborah aproveitou paraprender-lhe as pernas com os joelhos enquanto empurrava a espada de Jael parabaixo. No pode vencer sua rainha, Jael - Deborah falou. Aceite isso. Com um esforo supremo, Jael juntou os joelhos e empurrou Deborah,que caiu de costas e se viu na mesma situao em que havia deixado irm decriao. S que voc ainda no a rainha - Jael rebateu. Deborah a empurrou, e ambas se levantaram. Aps uma srie de golpes,as espadas se chocaram com tal fora que acabaram caindo ambas no cho. Consideraria isso um em pate - disse Hulda ao se levantar. As moas esqueceram o treinamento e correram para ela. Fazia mais deum ano que Hulda no aparecia. Os abraos foram efusivos.

    Elas sentaram-se sobre tapetes no terrao da casa onde as moas

    viviam. Era uma casa armada na encosta da montanha e de l se podiadescortinar uma bela vista da cachoeira que caia formando um lago lmpido e

    convidativo. Enquanto comiam, a conversa girou em torno das muitas viagens deHulda e no que ela tinha visto pelo caminho. A situao do outro lado do rio est cada vez pior. Saques, sacrifcioshumanos so oferecidos deusa da terra, meninas so convocadas para oexrcito de amazonas e sujeitadas a um treinamento cruel e sdico, a fim de queo seu lado selvagem seja trabalhado. Deborah ouvia o relato com uma grande sombra no olhar. Podia-se ver

    que ela sofria com a situao. Quando chegar o tempo? - ela perguntou. O reinado de Atalia

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    tem que acabar antes que ela acabe com o mundo que conhecem os. Creio que o tempo vir mais rpido do que imaginamos. Voc sesente pronta? Como saberei se estou pronta? Aqui no h muito que se fazer almde treinar. Se a pergunta sobre a agilidade com as armas, a resposta sim,embora eu ache que no s isso. Estou errada no que digo?

    Hulda sorriu. No, voc est certa. O problem a que voc ter que passar por uma

    prova muito pessoal, antes de comear a sua misso. E essa prova, Deborah, eudesconheo como ser. No difcil imaginar que est prximo, pelas notcias que trouxecom voc - disse Jael que escutava tudo em silncio. Deborah ficou sria e se fechou em pensam entos. Jael j estavaacostumada a esses momentos e no se surpreendeu quando a irm levantou-se e

    foi caminhar pela parede do terrao com os olhos cheios de preocupao, fitandoo horizonte. A moa fez uma pausa antes de fazer uma nova pergunta. Hulda, tem notcias de meu av?J so quase dois anos, desde que o vi

    pela ltima vez. Por que ele no retornou mais para c? Ele est... No, ele no est morto, Jael. Ento, o que est acontecendo? Hber um velho teimoso. Ele insiste em morar na fronteira deHazorah. Jabim ficou sabendo da habilidade que o seu povo tem em trabalhar

    com o ferro e deu a Hber a responsabilidade de forjar as armas e armaduras deseu exrcito. Jael encarou Hulda com a expresso de perplexidade estampada norosto. Meu av tem trabalhado para Jabim? Contra a sua vontade. Isso deve estar acabando com ele. Hulda pegou a bolsa que trazia sempre consigo e procurou algo l dentro.

    Foi bom perguntar por ele. Seu av no lhe esqueceu, menina. Ela retirou de dentro da bolsa, uma adaga feita de ferro e bronze. Ele fez especialmente para voc. Jael pegou a adaga e a observou atentam ente sem conter a admirao.O material no se parecia com nada daquele mundo. O presente perfeito para voc - comentou Deborah ao voltar. J viu algo assim? - Jael passou-lhe a adaga. Deborah deslizou lentamente os dedos pela superfcie da arm a. Ferro - ela olhou para Hulda. verdade que esse mineral caiu docu?

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    o que dizem . Deborah devolveu-a a irm. Use-a com sabedoria. Jael prestou ateno no tom de advertncia usado por Deborah. Vou me lembrar disso - ela respondeu pegando a adaga de volta.

    Hber ignorava o encantamento que havia no ferro que vinha damontanha. Jabim, usando antigos ritos que aprendera em Babilos, criou ummineral propcio para os seus fins de conquista. O ferro de seu exrcito tornavaos guerreiros quase indestrutveis e as armas traziam em si, um veneno mortal.Era um veneno que no matava de imediato, mas que mantinha o corpo vivo e

    aprisionado em um mundo etreo, at que sua utilizao no fosse maisnecessria. Atravs do poo das vises, ele conseguia saber de cada movimentode seus homens.

    Naquele momento, ele sorria ao contemplar a viso das terras,alm doGrande Rio. Foi para l que a profetiza Hulda havia levado um exemplar feitocom o ferro de sua montanha, enviado pelo velho e tolo, Hber. H muito tempoque os passos de Hulda eram vigiados, mas ela sempre conseguia despistar osseus rastreadores. At aquele momento, devido a um deslize de um grandeamigo.

    Atalia entrou na torre do palcio de Salema e olhou para o tanque que

    continha gua do poo das vises. Era sua maneira de ficar em contato comJabim. Naquele momento, ele estava dando a notcia que ela esperava ouvir hmais de vinte anos. O outro lado do Grande Rio - ela repetiu. S pode ser l. Juntoaqueles renegados. Posso agir? - Jabim perguntou. Seu filho espera ansioso por ordensminhas. Ssera, o filho de Atalia, era o comandante das tropas de Jabim. Sei como meu filho age. Diga-lhe para se conter ou pode por tudo a

    perder. Ele saber como agir. Darei notcias em breve.

    Na fortaleza-priso de Haros, Ssera recebeu as ordens do rei. O seu

    exrcito j estava pronto. Ele preparou-se com esmero. Cada pea da armaduraque e le vestia era como parte de um ritual. Para ele, cada cam panha engendradaera um sacrifcio grande deusa, sedenta de sangue. Ele era um homem defeies desfiguradas devido s cicatrizes que trazia no rosto, e isso aumentava seu

    dio e sua amargura. Aconselhado por Jabim, ele levou o arco e uma aljavacheia de flechas com pontas de ferro, cheias de encantamento. Eram flechas que

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    tinham um destino certo: Hulda. A profetisa dessa vez no escaparia. E,finalmente, para o descanso dos senhores daquelas terras, o paradeiro daHerdeira indesejada seria revelado.

    Hulda conseguiu se descontrair durante o tempo que passou em Gades.

    As pessoas eram felizes e despreocupadas no lado oriental de Hedhen, e no

    pareciam preocupadas ou assustadas com o que acontecia do outro lado do rio.a terceira noite que estava l, houve uma festa para comemorar o aniversrio

    da construo da ponte. Esta era o orgulho da cidade, pois marcava um trabalhode esforo conjunto. Ela batia palmas e sorria, vendo os casais danando ao som de umaquadrilha festiva. Deborah aproximou-se com uma caneca nas mos. Trouxe para voc - ela passou a caneca para Hulda. Est sedivertindo?

    Muito - ela deu um gole no lquido morno. O que isso? saboroso! Ch de menta. Uma especialidade das mulheres a qual nenhumhomem resiste. Muitos casamentos acontecem avaliando-se o gosto desse ch. Hulda olhou-a incrdula. Est brincando, no est? Claro que estou! - disse Deborah, sorrindo. Hulda passou os olhos pelo povo. Onde est Jael?

    L atrs, contando histria para as crianas. As pequenas adoramisso. Ela parece ter muitas histrias para contar. Jael caadora e tem um acervo muito bom para entreter uma

    plateia pequena e exigente. E voc, no beber? Deborah sentou-se sobre a relva e cruzou as pernas. J bebi demais.

    Hulda sentou-se ao seu lado. Quer conversar? Sinto o ar pesado - os olhos dela estavam fixos na ponte. como sealgo estivesse pronto a ca ir sobre ns. Hulda olhou em direo a ponte e aguou os olhos profticos. Ao fecharos olhos, a imagem ficou bem clara. Tochas. Muitas tochas se aproximavam dorio e logo estariam na ponte. Tem razo - ela soltou a caneca. Esto muito prximos! Deborah levantou-se em alerta. O que voc viu?

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    Um exrcito - Hulda tambm se levantou. Vou avisar Jael. Hulda a segurou pelo brao. Vocs devem sair daqui. Agora! Deborah lhe lanou um olhar decidido. Cresci aqui, Hulda. Esse povo o meu povo. H muito tempo que eles

    deixaram as guerras de lado. Eu no permitirei que sejam massacrados, sem queeu esteja aqui para ajud-los. Sua vida preciosa, Deborah! A deles tam bm ! J pensou que o momento pode ter chegado? Hulda suspirou e lhe soltou o brao. Espero que Jael seja mais sensata que voc. No conte com isso! - Jael respondeu. Elas se viraram e viram a moa em p atrs delas. Ela se aproximou e

    se colocou ao lado de Deborah. Vou ficar e defender a minha fam lia. Hulda respirou fundo. No adiantaria retrucar com aquelas duas. Muito bem, vamos avisar o povo para se prepararem. Vou mandar as crianas e os mais velhos para o abrigo das cavernas -disse Jael. A fogueira! preciso apag-la - Deborah saiu para resolver isso.

    Ssera j podia ver a ponte. Ele ergueu a mo e o exrcito parou. Ele

    chamou dois homens. Seus corpos eram quase completamente cobertos pelaarmadura. Vo frente, e verifiquem se a ponte segura. Eles se foram e Ssera mandou que um acam pamento fosse montado ali.Enquanto isso, erguia-se um poste sagrado, smbolo da deusa da terra. Osacerdote se aproximou seguido por dois homens com vestes cerimoniais, seusajudantes. Eles traziam um homem, escolhido entre os guerreiros, e este estavasobre o efeito de alguma droga, quase inconsciente. Os ajudantes o fizeram se

    ajoelhar diante do poste sagrado, e o sacerdote, aps proferir palavras em umalngua sinistra, pegou uma faca e cortou a garganta do guerreiro. O sacrifcioestava feito. Ssera ergueu a espada e deu um grande brado na hora em que oshomens voltavam da inspeo. A ponte segura! - eles disseram. Montem! - foi a ordem de Ssera. Matem todos, menos a profetisa!Ela minha!

    H muito tempo eles no lutavam . As habilidades guerreiras, no entanto,estavam latentes e eram passadas de pai para filho e de me para filha - era

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    parte de sua cultura. Aps as crianas e os velhos estarem em segurana, eles seabrigaram e ficaram espera Jael, em torno da colina, liderava um grupo de jovens arqueiros.Deborah posicionou os homens e as mulheres em torno do permetro da aldeia.Espadas, machados, lanas e qualquer outro instrumento que pudessem usarcomo arma, era aceito entre eles. Hulda ficou com os guerreiros mais

    experientes, escondidos pelas casas. Os momentos de espera eram cruis. Quando o exrcito de Ssera se aproximou com o brilho das tochas,Deborah sentiu que seu tempo havia chegado e a tenso a fez apertar o cabo daespada ainda mais. O exrcito parou no meio do terreiro. Ssera olhou em volta,

    preocupado. Eles se prepararam - ele sussurrou para si mesmo. Adiantando o cavalo para o centro, ele gritou: Entreguem -me Hulda, a profetisa, e nada lhes acontecer! Caso

    contrrio, poremos fogo em suas casas e mataremos a todos. Sua histria deixarde existir, pois ningum sobreviver! Um dos homens de Ssera, nervoso pelo silncio, atirou uma flecha no ar.Esta caiu sobre um rapaz que estava no topo da colina e ele soltou um grito. Jaelviu que era chegada a hora. Preparem -se - ela disse. Os arcos estavam prontos. Atirem na direo das tochas. Agora! Uma chuva de flechas caiu sobre o exrcito de Ssera, muitas delas

    penetrando os pontos vulnerveis da armadura. O povo de Gades tinha ahabilidade de enxergar no escuro. Vrios homens caram. Ele soltou um berroensandecido e o exrcito invadiu. Deborah ergueu a mo e o grupo que elacomandava deu o sinal que os outros precisavam, ao ir de encontro aos invasores,correndo. O exrcito de Ssera viu-se cercado de guerreiros habilidosos eflecheiros que pareciam enxergar na escurido.

    As espadas se chocavam umas com as outras por toda a parte. Ssera

    ainda no vira sinal da profetisa profetiza. Hulda lutava contra aqueles quetentavam queimar as casas. Ela usava com habilidade, um basto de bronze, masa sua preocupao estava com as duas vidas que precisava defender. Pela janela,ela viu Deborah, que desferia golpes com agilidade. A moa ia abrindo caminho

    por onde passava,e Jael dava o seu apoio com as flechas que vinham l de cima.

    Deborah o viu sua frente. Ficaram cara a cara no meio da batalha.Ssera era alto, forte e assustador. O brilho dos olhos cruis gelava a alma de

    qualquer um. Ele lanou-se sobre ela, que amparou o golpe com firmeza. Ohomem a olhou surpreso. Eles se afastaram e deram alguns passos em crculo.

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    Um estudando ao outro. Ssera atacou novamente. Deborah defendia-se eatacava ao mesmo tempo. Os golpes desferidos por ela o fizeram tropear equase cair. Furioso, ele desferiu um golpe rasteiro. Deborah pulou na hora evirando-se, acertou-lhe o pulso com a ponta da espada. Ele gritou e soltou a suaarma no cho. O homem a encarou perplexo. Eu sou o filho da rainha de Salema, soberana de toda a terra de

    Hedhen. Voc no poderia ter m e desarmado, a no ser que fosse... Antes que ele completasse a frase, dois homens vieram em seu auxlio.Deborah virou-se e passou a lutar com os dois. A agilidade dela eraimpressionante. Ssera correu at a espada, mas parou e olhou para trs.Lembrou-se das flechas de ferro e pegou o arco que trazia nas costas.

    Jael observava a cena com olhos de guia. Ssera estava preparando

    uma flecha para Deborah. Ela viu que a irm estava dando toda a sua ateno

    aos homens que a cercavam, que agora eram trs. Ela ordenou que atirassemneles para ajudar Deborah. Sua ateno, no entanto, estava voltada para Ssera.Ela correu at a borda da colina e preparou o arco. As flechas foram disparadasquase na mesma hora.

    Deborah ainda viu os homens carem ao seu redor pelas flechas dos

    arqueiros de Jael, quando uma voz interior a fez voltar-se a tempo de erguer aespada em defesa prpria, e desviar a perigosa flecha para o lado. Ela viu Sseraser atingido na altura da rtula, um local desprotegido pela invencvel armadura,

    por uma flecha do arco de Jael. Olhando para cima em direo a arqueira , ohomem parecia no acreditar na prpria derrota, mas a dor no joelho e a raiva ofizeram soltar um berro que chamou a ateno dos seus homens. Recuem! Para a ponte! Bater em retirada! Animados pela quase impossvel vitria, o povo os perseguiu at quenenhum deles restasse daquele lado do rio. Um grito de vitria ecoou ao som datrombeta e deu nimo a um antigo povo guerreiro que, afinal, no haviaesquecido suas razes.

    Jael e Hulda aproximaram-se de Deborah, que descansava aj oelhada ao

    lado da espada. Hulda ps a mo em seu ombro. Serei sincera a voz da profetiza estava trmula. No pensei quefssemos conseguir. Jael sentou-se ao lado de Deborah e jogou o arco de lado. Achei que ele fosse te matar ela disse com os olhos fixos na ponte. Ele no pode me matar a voz de Deborah era arrastada. Masagora ele sabe quem eu sou. Ela olhou para cima e encarou Hulda.

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    Acho que o tempo chegou. Hulda suspirou. Sim, ele chegou. Vocs esto prontas. Jael ergueu-se silenciosamente e caminhou at a ponte. Ela retirou docinto a adaga de ferro que lhe fora dada por seu av e a ficou admirando por umtempo.

    O que ela est fazendo? - perguntou Hulda. Agindo com sabedoria - respondeu Deborah com um olhar desatisfao. Jael jogou a adaga no rio e voltou com o passo firme. O seu olhar cruzoucom o de Deborah, que se erguia apoiada na espada. Usei-a da forma certa? - ela perguntou ao pegar o arco no cho. O que diz o seu corao? O meu corao est leve agora Jael sorriu e passou por elas em

    direo a aldeia. Hulda olhou para o rio e meneou a cabea. Tenho viso proftica, mas algo me escapa. Pode me esclarecer? Aquilo era ferro de Hazorah. O encantam ento maligno de Jabim estna fonte daquele mineral. De que outra forma eles poderiam ter seguido o seurastro? Hber... Ele agiu por amor, mas desconhecia o alcance da magia de Jabim. Hulda encarou Deborah, perplexa.

    Deborah, voc est desenvolvendo um dom muito raro. A sua intuio quase proftica. E isso lhe espanta? Eu desconhecia que esse dom pudesse lhe acompanhar. Deborah olhou novamente para a ponte e viu o povo ainda seregozijando com a vitria e uma sombra caiu sobre os seus olhos. O que foi? - perguntou Hulda. No gosto desse dom, Hulda.

    Hulda ps o brao ao redor de sua cintura e a puxou. Vamos, anime-se! Na vida h vitrias e derrotas. Hoje um dia devitria. Vivamos esse momento sublime e inesperado, e regozijemos com esse

    povo maravilhoso. Hoje, voc e Jael se tornaram motivo de futuras canes. Deborah sorriu e deixou-se levar.

    CAPTULO 2Na Estrada

    Atalia, na torre, recebia a mensagem de Jabim atravs das guas do

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    poo das vises. Ssera falhou - ele disse com gravidade. Conheo o meu filho e voc tambm o conhece. um valorosoguerreiro. Algo aconteceu para ter provocado sua derrota. O que est meescondendo? Ele disse que foi derrotado em pleno campo de batalha por uma

    mulher. Atalia respirou fundo em expectativa. Uma mulher derrotou o meu filho? Nenhum homem seria capaz dederrotar o herdeiro do trono de Salema, a no ser... A Herdeira natural de toda a terra de Hedhen - o rei completou. Aquela a quem voc tanto teme. Ele pensa assim? Ssera est confuso, porque havia duas mulheres e am bas o

    venceram. Ele no saberia dizer qual das duas a Herdeira. Atalia ficou em silncio, meditando profundamente sobre aquilo. Minha rainha? Preciso conhecer a Profecia, Jabim. Algo me escapa e no gosto deme sentir impotente. Vou agora e peo-lhe que cuide do meu filho. O seu filho como se fosse meu filho. Logo estar forte novamente

    para liderar meu exrcito forjado no ferro. Ocupe-se com esse mistrio. E assim terminou a breve comunicao entre eles.

    Elas saram no cair da noite. No havia necessidade de despedidas, poisa idia de que Deborah e Jael iam apenas viajar com Hulda por um tempo, foi

    bem recebida pelo povo e no despertaria suspeitas. Apenas os mais velhossabiam da verdade. Os trs cavalos foram guiados pela trilha que seguia o rio atravs dasmontanhas. Elas cobriram uma boa distncia sem serem vistas por ningum emuma viagem silenciosa. Com um espao de trs horas para o amanhecer, Huldaergueu a mo e parou.

    Acho que merecem os um descanso. Onde estamos? - perguntou Jael. A poucos metros do fim da trilha. Amanh, cruzarem os o rio eficaremos expostas. Expostas a qu? - Deborah perguntou ao descer do cavalo. Hulda tambm desceu com um gemido. Sentia o corpo dolorido. Acho que a idade est me pegando - ela disse com a mo nas costas.

    Qual foi mesmo a sua pergunta? Ah... m e lembrei! A cobertura que havia naterra de Gades termina com a trilha. At alcanarmos a cobertura das Cavernasde Sal, estaremos viajando por uma rea sem proteo e cheia de espies a

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    servio de Atalia. Ento, vamos aproveitar essas poucas horas para comer alguma coisae descansar - sugeriu Jael. Algo me diz que no vamos poder fazer issoamanh. Na manh seguinte, Deborah foi a primeira a se levantar. Preparou umavasilha com ch de ervas, aps se banhar no rio. Estava bem disposta e mais

    presente do que na noite anterior. Jael, ao contrrio, teve um sono agitado e poresse motivo, Hulda deixou que ela dormisse mais um pouco. A profetisa provou och e suspirou. To bom quanto o de menta! H muitas ervas saborosas para fazer ch por aqui Deborah psmais um pouco de gua para ferver e um punhado de folhas maceradas. Issodeve dar para encher um dos odres. Ch de viagem ?

    Restaura as foras e mata a fome ela respondeu com um gestoafirmativo de cabea. Hulda levantou-se e despertou Jael. A moa acordou com olheiras

    profundas e Deborah, preocupada, aconselhou-a se banhar no rio. Quando Jaelvoltou, sentiu o esprito renovado com o ch de ervas. Agora, sinto-me capaz de prosseguir. Ento, vamos - Hulda montou. Precisamos cruzar aquele rio antesdo anoitecer. A marcha foi longa e sem paradas. Ainda havia sol quando alcanaramo vau do rio, que tinham que cruzar. Hulda respirou fundo. Lembrem-se que quando atravessarmos esse rio, a cobertura nosdeixar. Jael olhou para trs e imaginou qual seria o seu papel nessa histria?Deborah tinha um trono pelo qual lutar, mas e ela? Pelo que lutaria? No seriamelhor desistir de cumprir o seu destino e voltar? Nesse momento, ela sentiu umamo no seu ombro e se voltou. Deborah lhe olhava com ateno. Os olhos negros

    pareciam ler o que se passava na sua alma.

    No tenha medo de seguir em frente - Deborah falou. Tenho medo de pisar na escurido, Deborah. No sou como voc.

    o consigo sentir o que est l na frente e nem mesmo sei se l o meu lugar.o enxergo nada!

    Deborah sorriu. Um sorriso franco, aberto como um raio de sol. No tenha medo. Eu mostro o caminho para voc. Jael sentiu que sua confiana voltava e teve a certeza de que seguiria aHerdeira para onde quer que ela fosse. Hulda gritou por elas l na frente, onde o

    vau era mais fcil de atravessar.

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    Era uma pousada simples. Elas desceram dos cavalos e se aproximaramdevagar. Algumas carroas carregadas de mantimentos estavam paradas nafrente. L dentro, uma dezena de pessoas conversava, bebia, fumava e, jogandoconversa fora. Elas amarraram os cavalos na estaca e entraram. Em uma dasmesas havia um grupo de guerreiras de Salema. As amazonas jogavam dados eapostavam moedas. Estavam to distradas que no ergueram o olhar para a

    porta. Hulda ps as duas mos sobre o balco e o homem que estava atrs deleolhou-a admirado. Conhecia uma profetisa quando via uma e as respeitava. Senhora? Desej a um quarto? Um quarto, no. Gostaria de sua permisso para passarmos a noite noceleiro. Jael e Deborah prestavam ateno ao grupo de guerreiras. Vai ser uma noite fria - o homem disse. Estam os preparadas para isso.

    H bastante palha no andar de cima. Hulda sorriu agradecida e pediu leite, po e uma poro de queijo frescopara levar.

    O celeiro era espaoso e tinha vrias baias vazias que podiam abrigar

    seus cavalos. Elas subiram a estreita escada de madeira e deram com um grandeespao cheio de palha estocada. Jael jogou-se em cima do colcho natural. Quente e macio! No vai ser uma noite to ruim. Hulda foi at a janela que se abria para os fundos da pousada, e

    observava o movimento. Viu quando o grupo de guerreiras se foi. Ela respiroualiviada. , acho que vai ser uma noite tranquila. Deborah sentou-se e descalou as botas, dando um descanso aos ps. Quanto tem po at chegarmos as Cavernas? Essa e mais uma noite. Hulda abriu o saco e jogou po e queijo para cada uma. O leite teria queser compartilhado da mesma garrafa.

    Por que voc estava inquieta? - perguntou Jael As guerreiras deSalema constituam ameaa para ns? No momento, no. Elas nada sabem sobre vocs, portanto, no h oque temer. O meu receio foi que, ao ver vocs, elas resolvessem inclu-las noexrcito. Esse alistamento relmpago uma das tticas de Atalia para aumentarsua fora. Patrulhas como essa, andam a procura de novas recrutas em cadaaldeia e pousada da regio. Talvez fosse bom colocarmos umas barrigas de mentira - brincouJael. Ou fingirmos alguma doena - completou Deborah com um sorriso.

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    Pensarem os nisso depois. O que importa que o perigo j passou,felizmente.

    Choveu naquela noite. Os pingos da chuva entravam pela janela e pelos

    buracos do teto do celeiro molhando as trs viajantes exaustas. A certa altura,Hulda abriu os olhos e observou a escurido em volta, tentando ouvir no silncio

    pesado da noite. Um barulho diferente dos pingos que caam lhe chamou aateno. Pareciam sussurros e o rastejar de alguma coisa. Ela estendeu o brao afim de acordar Deborah, que dormia ao seu lado. Eu ouvi respondeu a moa com a mo pousada no cabo da espada. Jael, que se encontrava prxima a janela, tambm estava acordada ealerta com o arco j preparado em cima do corpo. Foi muito rpido. Pareciam sombras que se confundiam com a noite.Trs pularam pela janela e trs subiram a escada. Formas sem rosto que se

    escondiam por trs de capas negras. Deborah forou o corpo para frente e sentou-se com a espada esticada.Esta atravessou uma das sombras que se desfez em p. A moa ficou em p semcompreender o que era aquilo. Jael, de joelhos, atravessou duas com uma s flecha, enquanto Huldaagitava o basto no ar em movimentos circulares e abatia mais duas do outrolado do aposento. Deborah virou-se a tempo de ver a ltima sombra preparando-se para cair sobre Jael e, imediatam ente, jogou a espada que cortou o ar como sefosse uma lana. Esta fez a sombra desaparecer numa fumaa negra. Jael

    observou a fumaa que foi sumindo aos poucos. Ela assustou-se quando a irmps a mo no seu ombro. Tudo bem? Deborah perguntou. O que eram essas coisas? Jael falou com a voz trmula. Deborah olhou para Hulda a espera da resposta. Espies de Atalia. Criaturas repulsivas criadas atravs de sua magia. Curiosa, Deborah aproximou-se de um monte de poeira negra espalhadano cho e chutou levemente com o p. A poeira se espalhou como cinza.

    E de que so feitos? Hulda apoiou-se no basto. No tenho certeza. Talvez s existissem em nossas mentes. A moa a encarou com o olhar duvidoso. Jael apanhou uma de suasflechas que foram usadas e viu a cinza grudada na ponta triangular. No acredito nisso. Para mim eram bem reais. Deborah embainhou a espada. Vam os em bora! No seguro ficarmos aqui. Ficou louca? protestou Jael. Vam os morrer congeladas l fora. Hulda suspirou.

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    Jael est certa. No vamos sobreviver uma noite l fora. Deborah suspirou resignada. Certo, mas vamos dobrar a guarda. Vocs dormem, eu vigio. Tudo bem, eu rendo voc daqui a duas horas disse Jael. Dessa forma, elas se acomodaram novamente para dormir. Deborahsentou-se ao lado da j anela com a espada descansando sobre o colo. Ela viu o dia

    clarear, pois o sono a havia deixado e ela no viu necessidade de acordar Jael.Hulda mexeu-se, mas no acordou. L embaixo, os empregados comeavam oseu dia de trabalho. Jael acordou e foi ficar ao seu lado, ainda sonolenta. Por que no me acordou? Perdi o sono respondeu com um sorriso. Jael sentou, olhando-a com preocupao. O que est acontecendo com voc? Est escondendo algo de mim?

    unca tivemos segredos antes.

    Deborah lhe lanou um olhar terno e respirou fundo. Sinto como se um grande peso fosse cair sobre mim a qualquermomento. Quando tento ver o meu futuro, s vejo escurido. Voc disse que o futuro no estava escrito. Deborah sorriu. Tem que acreditar em tudo o que eu digo? Jael sorriu de volta. Aprendi a confiar em voc.

    O resto do dia foi calmo e sem contratem pos. Finalmente, ao entardecer,alcanaram as margens de outro rio. Do outro lado descortinavam-se asmontanhas nuas de rochas amareladas que brilhavam ao sol. Hulda suspiroualiviada. Quando atravessarmos este rio, estaremos sob a cobertura dosAncios. Esta ser a nossa ltima noite mal dormida. A voz de Hulda no passava muita confiana. Jael no deixou queDeborah tomasse a frente daquela vez.

    Eu fico de vigia essa noite, Deborah. Voc precisa descansar. Notem feito isso com muita freqncia. A irm olhou para e la agradecida e sorriu. Tem razo, no vou discutir com voc. Hulda fez companhia a Jael at tarde naquela noite. A profetisa contouhistrias sobre os lugares que visitou e tornou o momento mais alegre. Deborahdormia profundamente do outro lado da fogueira. Acho que vou me deitar agora disse Hulda. Obrigada por me fazer companhia. Hulda deu um beijo carinhoso na testa da moa. Chame-me se no aguentar passar a noite. Deixe sua irm descansar.

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    Ela vai ter uma jornada muito longa para comear em pouco tempo. Todomomento de descanso bem-vindo. Est bem.

    Jael passou a noite em claro, em decorrncia da ansiedade. Pela manh ,

    estavam todas bem dispostas para atravessar o rio. Os cavalos, j descansados,

    no ofereceram dificuldades. Alm disso, o rio no era profundo e suas guasestavam calmas. Logo pisaram o solo do Deserto de Sal. Hulda abriu um sorriso. Estamos seguras agora! ela apontou para um aglomerado demontanhas rochosas. As Cavernas ficam aps aquelas rochas. As moas olhavam em volta com o corao angustiado. O deserto eraassustador com o seu aspecto seco, sem plantas e debaixo daquele sol escaldante.To diferente de Gades! Hulda, por que esse lugar parece to triste? perguntou Jael.

    A mulher sorriu. Vocs vo aprender a encontrar a beleza desse lugar. Beleza? Nesse lugar? Deborah balanou a cabea sem estarconvencida. O que esse lugar tem para oferecer, afinal? Hulda encarou a moa com a expresso grave. Acredite-me, voc vai descobrir isso muito em breve. Deborah tinha muitas perguntas a fazer, mas j havia aprendido avirtude da pacincia quando se tratava de Hulda.

    CAPTULO 3As Cavernas do Sal

    Entre as montanhas havia uma trilha encoberta. Hulda ia frente

    servindo de guia, e as outras, acompanhavam em silncio. Elas admiravam adisposio das Cavernas do Sal, que lembravam uma cidade escavada na rocha.Hulda entrou por um caminho que levava at a mais alta das cavernas. Esta era

    cercada por um parapeito que formava um espaoso terrao ao ar livre, o qualeles chamavam de praa. L, trs homens de tnicas da cor de areia asesperavam. Um deles, de cabelo e bigode preto, aproximou-se com um sorriso

    para Hulda. Estou feliz em v-las chegar em segurana. Ele aj udou a profetiza a desmontar. Tivemos apenas um pequeno contratempo no caminho ela dissedeixando-se ajudar. Coisa fcil de resolver.

    Hulda virou-se para as moas que j haviam desmontado. Deborah, Jael... Este Salum, um dos principais sacerdotes das

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    Cavernas do Sal. Ele olhou para elas com interesse. A aparncia de Deborah o deixouimpressionado. Tinha a elegncia e autoridade de uma rainha, alm da expressograve e desconfiada, mas o olhar da moa era muito mais profundo do que eleesperava, Estava diante de uma profetiza! Ele fez uma breve reverncia parasurpresa dela.

    A Herdeira! Ao virar-se para Jael, sorriu ao ver o corpo jovem e atltico,acompanhado por um ar de impacincia prprio da juventude. O olhar dela

    passava coragem e determinao, alem de um a enorme lealdade no corao. A Guardi! Jael olhou confusa para Hulda. Era a primeira vez que algum achamava por esse ttulo.

    O homem bateu palmas e dois jovens surgiram para cuidar dos cavalos.

    Vam os entrar disse Salum. Existe uma ceia nos esperando ldentro. Vam os deixar os assuntos srios para depois. Jael aproximou-se de Deborah. O que eu devo guardar? Deborah sorriu. A pacincia realmente no a sua virtude.

    A ceia foi simples e saborosa. Comeram em silncio. Quando

    terminaram, eles foram para outro espao. Este era mais escuro e rodeado de

    bancos. Apenas a luz de algumas tochas nas paredes clareava o ambiente quecheirava a incenso de mirra. Nos bancos havia outros ancios e algumas pessoasque se traj avam de forma diferente. Deborah e Jael foram levadas a um banco que ficava no centro. Huldasentou-se entre Salum e um rapaz alto, loiro, de olhos brilhantes e profundos. Ohomem, que parecia ser o mais velho de todos, caminhou para trs de umagrande mesa. Deborah notou que o rapaz loiro a olhava com vivo interesse esustentou o olhar de volta. Eles pareciam estar ligados por algum destino em

    comum. A voz do ancio a fez voltar o olhar para a mesa. Este um grande dia para a Comunidade. A Profecia est secumprindo. Temos aqui conosco aquela que vai restaurar a ordem na terra deHedhen. O equilbrio que foi quebrado em tempos antigos ser ligado novamente.E aqui tambm est aquela que dever assegurar o cumprimento integral daProfecia. Jael escutava sem piscar os olhos. J fora cham ada de Guardi, e aquelanova funo vinha mostrar que o seu papel era bem maior do que imaginava.Deborah, ao seu lado, olhava para baixo. Estava tensa e preocupada com aresponsabilidade que lhe era imposta: restaurar a ordem na terra!

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    Aquela era uma cerimnia que tinha o propsito de apresent-las comocumpridoras da Profecia. Aps um discurso cansativo, Salum as conduziu paraum salo ao lado onde havia apenas mais trs homens vestidos como ele, e orapaz loiro. Eles aguardavam sentados no cho sobre tapetes de l. Elas seacomodaram nos lugares que lhes foram reservados. Salum falou com a vozclara e firme:

    H vinte e trs anos, Hulda fugiu do palcio de Salem a carregandonos braos uma criana ele olhou Deborah nos olhos. Era uma menina. Filhalegtima da rainha Cirene, de Salema, e que trazia no seu corpo a marca daProfecia. Pode nos mostrar a marca, Deborah? A moa olhou para Hulda e sentiu a sua aprovao. Ento, ela levantou-se e ergueu a tnica, que usava solta sobre a cala de tecido grosseiro, virando-sede costas e expondo a cintura. Todos murmuraram ao ver a marca do LuminarMenor: a meia-lua. Sentindo-se constrangida ao ser observada por todos, no

    esperou nenhum consentimento para baixar a tnica e virar-se de frente. Olhoucom firmeza para Salum. Ele sorriu e disse: Pode sentar-se, Deborah. Ela obedeceu, sem desviar os olhos dos dele. Como podem ver, uma marca nica e legtima. Ao fugir, Hulda

    buscou abrigo com alguns nmades amigos. L chegando, quis o destino que elaencontrasse outra criana, que havia nascido na mesma hora que Deborah, e quetrazia o smbolo da estrela. Jael... Eu no vou mostrar, senhor! a resposta brusca de Jael surpreendeu

    a todos. No passamos vinte e trs anos de nossas vidas escondidas do mundo,para chegarm os aqui e serm os analisadas como produtos de uma caravana. Todos a olhavam com surpresa e espanto, inclusive Deborah e Hulda. Airm agarrou o seu brao com firmeza e a forou a encar-la. Jael, oua bem, minha irm, o que vou lhe dizer o olhar dela erasevero. Se ns vivemos todos esses anos em segurana, foi porque eles nos

    protegeram! No acha certo que exijam uma prova de ns? H muito em jogoaqui, lem bra?

    Jael hesitou, mas acabou cedendo diante da atitude de Deborah. Foi acontragosto que ela se levantou e fez o mesmo que a irm para mostrar a marcada pequena estrela nas costas. Salum sorriu para Deborah em agradecimento. Obrigado, Jael ele disse com a voz paterna. Pode sentar-se agorae nos perdoe pela exigncia das provas, mas para isso que as marcas esto a.Para serem mostradas no devido tempo - hoje. Ela sentou-se, envergonhada pela prpria atitude. No, eu que devo me desculpar, senhor. Acho que tenho queaprender a controlar meus impulsos. Salum sorriu divertido, e o homem que estava ao seu lado tomou a

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    palavra: Eu sou Otoniel ele disse. Estudei a Profecia durante toda a minhavida e apenas conheo parte dela. Digam-me, o que vocs sabem? Muito pouco, senhor respondeu Deborah. Foi nos dito queacharamos as respostas aqui. O homem levantou-se e caminhou pelo aposento. Ele era um pouco

    mais alto que Salum e tinha menos cabelo que este. De repente, ele parou portrs das moas. Os seus caminhos tomaro rumos diferentes, de agora em diante. Senhor Jael respirou fundo. Qual o meu papel na profecia? Otoniel sorriu. Precisa aprender a esperar, minha jovem. Ela virou-se para ele. Eu fui cham ada de Guardi. O que eu devo guardar? Eu sempre

    soube qual era o papel de Deborah, mas nunca soube qual era o meu. Otoniel ergueu a mo e ela se calou. Ter a sua resposta daqui a pouco. S peo-lhe um pouco de

    pacincia. Ele virou-se para Deborah. Levante-se, Deborah, Mulher de Lapidote!. Ela obedeceu, tentando compreender aquele novo ttulo. Otoniel ps asmos sobre seus ombros. Saber o que isso significa por si mesma. Voc dever penetrar no

    reino de Atalia. No em Salema, pois ainda no est pronta para isso. O povo lheaguarda, e a ele que voc deve buscar primeiro. Ele virou-se para o rapaz loiro e lhe fez um sinal. Este se ergueu e deuum passo para dentro do crculo. Eu sou Barak, filho de Abinoo, lder do povo da Floresta de Quedes.Temos lutado contra as foras de Ssera no norte, mas somos poucos em face doexrcito de Jabim. Tudo o que conseguimos at agora foi iniciar algumasguerrilhas. Os cls precisam se unir e eles s faro isso quando a Herdeira se

    revelar. Eles aguardam o cumprimento da Profecia e nunca perderam asesperanas. Deborah estava assustada com o tam anho de sua misso. E como eu devo me apresentar para o povo? Devo apenas mostrar amarca como fiz aqui? Otoniel a soltou e cruzou os braos atrs das costas, dando um suspirosolene. No. Descobrir isso quando souber o significado de Mulher deLapidote. Durante esse tempo, misture-se ao povo. Conhea-o, ame-o. Quandodescobrir o significado, v para o Deserto do Sul. L haver uma ltima prova

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    para voc. Jael ergueu a mo pedindo permisso para falar e Otoniel sorriu. Senhor, e quanto ao Luminar do Sol? Onde est ele? Otoniel deu um novo suspiro e baixou a cabea. Ele est no mundo, mas ainda no sabe disso. Pode explicar melhor? pediu Deborah.

    Ele no como vocs. A marca do Rei no deve ser visvel para asua prpria segurana. Ele saber quem , por meio de vocs. Deborah estava ficando impaciente com tantos mistrios. Peo-lhe que nos diga logo o que temos que fazer! J vi que a nossaresponsabilidade muito maior do que nos foi passada. Se temos a esperana detoda Hedhen em nossas mos, por favor, sej a claro e nos diga o que fazer! Ele ergueu a mo e ela aguardou a resposta. A verdade que uma parte da Profecia est oculta e nunca foi lida.

    ela que vai revelar o desenrolar da histria. Ele olhou para Jael, que tambm havia se levantado. Ela deve ser encontrada, guardada e movida de seu lugar, no tempocerto, pela Guardi ele virou-se para Deborah. Nesse tempo, ela deverchegar as mos da Herdeira, que a ler e ratificar na presena de pelo menosduas testemunhas. Neste momento, o Rei conhecer a si prprio, pois sua marcase tornar visvel. Estas palavras tinham um significado que ia alm da capacidade

    proftica de Hulda e Deborah. Otoniel suavizou o rosto e sorriu.

    Isso tudo. Sintam-se livres para fazerem aquilo que quiserem.Aproveitem o tempo de calmaria que a inda est em seu alcance.

    Otoniel barrou o caminho de Jael. Venha comigo, filha de Hber. Tenho algo para lhe mostrar. Ela o seguiu em silncio. Eles passaram por uma ponte de madeira queligava a gruta em que estavam, outra um pouco maior, e que se abria emvrias passagens. Otoniel pegou a passagem que se abria direita e Jael o seguiu.

    Ao chegarem a um vo iluminado, ela percebeu a presena de algumas pessoasque andavam de um lado para o outro. Ali havia muitas camas, mas poucasestavam ocupadas. A maioria, por idosos. Ela julgou que estivessem em umaenfermaria. Otoniel ps a mo no seu ombro e a guiou at a ltima cama. Ela notouque o homem que nela estava era jovem, de pele clara e bronzeada e cabelosnegros e espessos. Parecia dormir tranquilamente, apesar do ferimento que tinhano lado da cabea. H dois dias esse rapaz chegou aqui explicou Otoniel. Ele foiatacado perto da fronteira, antes de atravessar o rio.

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    Quem ele? E por que me trouxe para v-lo? Otoniel respirou fundo. O nome dele Hber. Jael olhou para Otoniel com incredulidade e surpresa. Como... ela comeou. O seu av foi morto por Ssera.

    A moa sentiu as pernas fraquejarem e Otoniel a guiou at uma dascamas vazias e sentou-se ao lado dela. Este rapaz filho do filho mais novo de Hber, e herdou o nome doav. Meu primo! ela atentou para o belo rosto do rapaz. Sim. Ele trouxe notcias do norte. Uma faco da tribo juntou-se aSsera e tomou a liderana do povo Quenita. Jael apertou o cabo da espada com a respirao tensa. Um pensamento,

    claro como a gua de uma fonte, lhe sobreveio. Eu sou a filha da filha mais velha, no isso? O homem sorriu. Sim, e voc deve voltar e lutar pela liderana de sua tribo. E quanto misso? Ele ps a mo no ombro dela. Aquilo dava conforto. Quando voc voltar e pegar de volta o que seu, ela ter comeado. Ela virou-se para o belo rosto de Hber. Ento, esse o meu caminho?

    Deborah e Barak caminhavam pelo parapeito que dava para o Mar de

    Sal. Alm - mar , que no passava de um grande lago, podia-se ver o verde dasmontanhas. Ele apoiou-se na pequena murada que rodeava uma grande

    plataform a natural a que chamavam de praa . Voc um sonho que se torna realidade a voz dele era profunda esincera. Para mim e para muitos que tero a sua esperana de volta. Ela sorriu sem graa e olhou em direo ao Mar de Sal.

    Suas palavras me confortam, Barak ela fez uma pausa antes decontinuar. Minha viso tem um limite, para mim mesma. Quando tento olhar

    pra frente, vejo apenas escurido e sinto medo. Ele tocou na mo dela tomado por um impulso. Queria poder confort-lae livr-la do medo e do peso da responsabilidade, mas no podia. Ela fechou osolhos como se estivesse absorvendo a fora que ele lhe passava. Voc no pode ver o seu futuro porque tem que viver para escrev-lo. Ela abriu os olhos e o encarou fixamente. Voc confia em mim? A pergunta o surpreendeu.

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    Por que pergunta isso? Voc tem sido o comandante desse povo, preciso saber se confia emmim. Ele a olhou nos olhos e pde ver o que ela no via. Eu seguiria voc at a morte. Deborah ficou sem respostas. Foi assim que Hulda os encontrou.

    Barak ela chamou. O rapaz virou-se como se estivesse despertando de um sonho. Deborahvoltou-se para a vista do mar. Salum quer falar com voc sobre a organizao do exrcito do norte

    Hulda disse ao se aproximar. timo! Eu preciso muito da aj uda que ele me prometeu. Onde possoencontr-lo? Na biblioteca.

    Barak agradeceu e passou por ela de cabea baixa. A mulher virou-separa Deborah. Barak um bom homem. Leal e honrado. A moa suspirou. Quero partir. Partir. E ser mais cedo do que pensa. Deborah virou-se para Hulda e de repente, uma viso, rpida como umraio e ntida como a mulher que estava sua frente, passou diante de seus olhos. Preciso ver Jael! ela disse com urgncia. Onde ela est?

    O que voc viu? Deborah no respondeu e passou por Hulda apressadam ente. Esta aseguiu.

    Jael levantou-se da cama ao ver Hulda e Deborah entrarem na

    enfermaria. A irm parou diante do rapaz moreno deitado na cama e deu a voltapara exam in-lo de perto. Jael foi ficar ao lado dela. Esse Hber, meu primo ela explicou.

    Deborah viu que o ferimento do rapaz era um corte profundo. Precisa esperar por ele Ela falou suavem ente. No pode voltarsozinha. Jael contou-lhes toda a histria que foi passada por Otoniel. Quando elaterminou de fa lar houve alguns minutos de silncio. Foi Hulda quem o quebrou: incrvel como a histria vai tomando o rumo segundo a vontade doPai-Criador. Esse o seu cham ado, Jael, mas Deborah est certa. Voc no podeir sozinha. E o que devo fazer, Hulda? a moa parecia atormentada peladvida. O meu av foi morto! O meu povo foi trado!

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    Deborah ps a mo no ombro da irm de criao. Espere seu primo acordar e se recuperar. Com certeza, ele ter muitoa lhe dizer. No queira passar na frente do tempo. A minha misso e o sucessodela depende da sua, lembra, Guardi? Jael baixou a cabea e suspirou. Nunca pensei em voltar para o meu povo dessa maneira.

    Hulda ps a mo sobre a cabea dela. Jael, filha de Hber, lder da tribo dos quenitas ela falou comsolenidade. Aquela que conhecer o segredo do Leviat. Deborah olhou curiosa para a profetisa. Leviat? Hulda sorriu. Jael saber de que falo, quando assumir o seu lugar. Hulda voltou-se para Deborah.

    Jael ter que esperar, mas voc no. Deborah assentiu resignada. Sei que o momento chegou. Quando devo partir? Procure descansar essa noite, e esteja pronta para partir amanh. Jael olhou incrdula para Hulda. Partir? Ns mal chegam os! Por que ela ter que ir to cedo? Hulda respirou fundo e fechou os olhos. O nosso tempo encurta a cada dia. s vezes, o relgio nos surpreendee precisamos correr contra ele.

    CAPTULO 4

    A Mulher de Lapidote

    No dia seguinte, noite, Deborah, vestida com uma roupa com um deviagem, ou seja, uma tnica folgada sem cinto e de cor vermelha, calas pretase botas de pele, desceu sozinha a trilha que levava at seu novo cavalo, que jestava preparado lhe esperando. J havia se despedido de Hulda e Salum,

    recebido instrues e as oraes de bnos. L embaixo, Jael a esperavasegurando o cavalo pelas rdeas. Era um bonito corcel negro de pelo brilhante,cham ado Bruma. Deborah parou diante dela. Acho que no nos veremos por muito tem po, minha irm Jael faloucom lgrimas nos olhos. Deborah pegou a rdea que ela lhe estendia. A verdade que estarem os sempre juntas, no importa a distncia avoz da Herdeira estava trmula. Sei que vou sentir voc ao meu lado e me

    alegrarei com isso. Jael pareceu surpreendida.

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    Deborah, voc tem medo? A moa mordeu o lbio e baixou a cabea. S queria saber por que no consigo ver o meu futuro como vejo o deoutros. Como viu o meu? Um sorriso tmido surgiu nos lbios de Deborah.

    Sim, isso. Exatamente como vi o seu. Jael era mais baixa que Deborah, mas mesmo assim, colocou ambas asmos sobre os ombros dela. Deborah, o seu futuro est encoberto pela Profecia. Voc faz partedireta dela e ter isso revelado no seu devido tempo. Deborah se surpreendeu com Jael. Quem fala a Guardi? Jael sorriu.

    Eu sou a Guardi e voc a Herdeira. Para isso nascem os e vivemos. hora de assumirmos, o nosso destino. Elas se abraaram demoradamente. Quando se separaram, Deborah subiu em Bruma. Jael admirou aautoridade e dignidade que emanavam dela. Deborah aprumou-se e olhou paraJael nos olhos. Deixarei de pensar no futuro e cumprirei o meu papel. Faa isso e lembre-se de que somos a esperana dessa gente. At breve, minha irm disse Deborah.

    Jael ficou vendo-a sumir na escurido da noite e elevou uma prece parao Pai.

    Deborah iniciou sua viagem pela terra. Observou cada povoado e cada

    pessoa que encontrou no caminho. Eram pessoas simples e acolhedoras, mastambm eram oprimidas e assustadas. De vez em quando, ela encontrava uma

    patrulha de am azonas no caminho, mas tentou manter-se afastada de contatosdesse tipo. Ela estava viajando pelas terras de Atalia j por uma semana e

    passava as noites dormindo ao relento, sob a luz da fogueira. Mas aquela noiteseria fria e o seu corpo pedia o conforto de algum lugar quente. Aps uma curvada estrada, ela viu a luz tnue de uma lamparina que brilhava por entre duasrvores. Aproximou-se da casa, que era pequena, mas estava provida de um

    pequeno celeiro ao lado. Uma mocinha de cabelos vermelhos pegava gua deum poo com um balde amarrado a uma corda. Ela ergueu os olhos e se assustouao ver Deborah no cavalo. Posso ajud-la, minha senhora? ela gaguejou. Procuro um lugar para passar a noite Deborah falou comsuavidade. Vai ficar muito frio para dormir ao relento.

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    A mocinha hesitou. Parecia assustada. No temos quartos sobrando. Nossa casa pequena. Deborah sorriu. Posso ficar no celeiro ela apontou. S quero me abrigar do frio. A menina percebeu que estaria em segurana na presena daquelamulher de aspecto to nobre. Ela soltou o balde no cho.

    Espere enquanto vou chamar a minha me. Enquanto a menina corria para dentro da casa, Deborah desceu docavalo a fim de descansar o corpo. Ela aproveitou a gua do balde e deu um

    pouco a Bruma. Em seguida, m eteu novamente o balde no poo e o retirou cheio.Quando a menina voltou estava acompanhada de uma m ulher alta e corpulenta. Minha filha me disse que est a procura de um lugar para dormir. - amulher perguntou com desconfiana. Sim, senhora. Como eu disse a sua filha, essa noite vai ser muito fria e

    eu no gostaria de dormir ao relento. A mulher compreendia e observou Deborah com muita ateno. Venha comigo. Deborah a seguiu at o celeiro. O lugar era bem mais espaoso do queaparentava. Era tambm quente e confortvel. Havia muita palha espalhada pelocho. Tem os duas baias desocupadas. Pode colocar o seu cavalo em umadelas. Deborah concordou em silncio enquanto analisava o lugar. No centro,

    uma escada estreita levava a outro andar. Voc... est com fome? a mulher perguntou. Estou, sim. A mulher suspirou. Muito bem, eu mandarei Rute trazer algo para voc comer. Ela saiu do celeiro sem olhar para trs. Deborah sabia que a mulherestava com medo. Ela tinha o mesmo medo que vira nos olhos de outras pessoasque encontrou pelo caminho. Depois que ela acomodou e alimentou Bruma, Rute

    entrou com uma bandeja. Eu trouxe po e leite fresco. Obrigada, Rute ela agradeceu passando a mo nos cabelos damenina. Em seguida, pegou a bandeja e sentou-se sobre a palha. No quer me fazer companhia? Os olhos da menina brilharam. Posso? Claro! Sente-se e me ajude a devorar esse po. grande demais parauma s pessoa. Rute pegou o pedao que Deborah lhe oferecia.

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    Est indo para Salema? ela teve a coragem de perguntar. No. O meu caminho no passa por l. Achei que estivesse indo se alistar no exrcito de am azonas Rute

    parecia surpresa. Deborah franziu as sobrancelhas. Por que achou isso?

    Voc parece uma guerreira o comentrio saiu de forma natural. Deborah deu de ombros. Uma mulher precisa ser uma guerreira para viver nesse mundo. Masisso no a torna uma amazona. Ela percebeu certo alvio nos olhos da menina. Nesse momento, o somde patas de cavalos se aproximando da casa chegou at elas. Rute correu at a

    porta. Um grupo de dez amazonas havia parado em frente sua casa e discutiamcom sua me.

    Desculpe, eu tenho que ir! ela saiu correndo do celeiro. Deborah no teve tem po de perguntar o que estava acontecendo, maspodia sentir que no era algo bom. Ela levantou-se e pegou a espada porprecauo. Saiu e foi caminhando lentam ente para frente da casa. O grupo deamazonas cercava me e filha, enquanto a primeira apelava: Por favor, toda a comida que tem os! A mulher alta e magra, que parecia ser a lder, falou com voz arrogante: Tudo? Um msero saco de cereal o que voc cham a de tudo?Deveria me agradecer por eu no mandar tocar fogo em sua casa.

    Rute abraou-se com a me enquanto a mulher ordenava que o sacofosse colocado na montaria do cavalo. Deborah resolveu intervir ao ver o estadode suas anfitris. Desculpe, mas o saco meu por direito ela falou cham ando aateno das mulheres. Cheguei aqui primeiro. A lder desceu do cavalo e deu dois passos em sua direo. A mulher erato alta quanto Deborah. Esta permanecia parada com as mos descansandosobre a espada e com os olhos e sentidos atentos. Rute apertou a mo da me.

    E quem voc? a lder perguntou, perscrutando o rosto de Deborah,encoberto pela escurido da noite. Apenas uma hspede foi a resposta simples. A mulher riu alto. E acha que tem prioridade sobre o exrcito da rainha? Deborah deu dois passos firmes adiante e seu rosto ficou exposto luz dalua. Os olhos estavam fixos nos olhos da lder. O direito que me cabe vem da Tradio, e nem sua rainha podeanul-lo. A mulher parou de rir e hesitou. Ela conhecia a Lei da Tradio, uma

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    das mais antigas leis de Hedhen. Ser que no percebeu que est em desvantagem? O semblante de Deborah no se alterou e nem o seu olhar deixou defixar o alvo. Estou disposta a lutar pelo que me pertence. A mulher, ento, puxou a espada e a apontou para a Herdeira.

    Ento, ter que lutar com todas! Deborah ergueu a espada e segurou-a com firmeza na frente docorpo.

    Miriam, a me de Rute, puxou a filha para um canto seguro. De l elaspuderam assistir toda a luta. Deborah lutava com a agilidade de uma leoa. Empoucos minutos, todas as espadas das adversrias estavam no cho, inclusive a dalder. Esta ergueu os braos, espantada. No sei como isso aconteceu, mas reconheo a sua vitria.

    Deborah guardou a espada em silncio. A lder olhava as espadas nocho a sua volta. Como fez isso sem derramar sangue? Deborah sorriu. Focalize o seu alvo nas arm as. A derrota no precisa vir com a morte. A lder, agora mais am istosa, aproximou-se dela. Por que no vem conosco para Salema? O exrcito precisa deguerreiras como voc. Obrigada, mas o meu caminho outro.

    A mulher voltou para o cavalo, resignada. Montou, mas antes de irembora, dirigiu-se a Deborah mais uma vez. Eu me chamo Eunice. Se mudar de idia, me procure. Farei isso. Quando as mulheres se foram, Rute correu para pegar o saco, masDeborah barrou-lhe o caminho. Espere, pequena! o olhar dela era severo. Voc tem queentender uma coisa: eu tenho a posse desse saco perante a Lei da Tradio, e isso

    deve ser respeitado. Rute pareceu surpresa e decepcionada, mas Deborah manteve aexpresso grave. Aprenda a respeitar o direito dos outros, e estar agindo para mudareste mundo para melhor. Ento, ela voltou-se para Miriam e sorriu. Como eu no vou poder carregar esse saco pesado no meu cavalo,resolvi d-lo a vocs. Miriam aproximou-se dela admirada. Suas atitudes me espantam, minha senhora!

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    Deborah ps a mo acolhedora sobre o ombro da mulher. Vam os, eu aj udo a carregar o saco ela disse ainda sorridente.

    Miriam a convidou para compartilhar de um delicioso ch de ervas.

    Quando se levantou para voltar ao celeiro e dormir, Rute perguntou se podia lhefazer companhia. Deborah aceitou com um sorriso.

    Eu entendi a lio a menina disse enquanto caminhavam. Achei que entenderia. Voc uma menina inteligente e de grandevalor para sua m e. Tem mesmo que ir embora amanh? ela perguntou com a voz triste. Receio que sim. De repente, Deborah parou com os olhos fixos na montanha. Haviamuitas luzes de tochas acesas como se marcassem um caminho para o alto. O que aquilo? ela perguntou.

    a semana das tochas respondeu Rute. O Ritual de Lapidote. Deborah olhou espantada para a menina ao ouvir o nome. Lapidote? Sim, o ritual da Ordem de Zelofeade, que vive naquela montanha eaguarda o cumprimento da Profecia. Todos os anos, na mesma poca, elasacendem as tochas. Para qu? A menina deu de ombros. Dizem que a Herdeira vai voltar, e que apenas ela ser capaz de

    acender a Tocha de Lapidote. Muitas candidatas surgem, mas a semana semprepassa sem que a Tocha sej a acesa. Deborah respirou fundo. Estava to perto de cumprir o seu destino! Elasentia o corao acelerado. Rute, se eu concordasse em ficar mais um dia, voc me levaria at lamanh? Rute a olhou surpresa. Claro! Vai tentar acender a Tocha?

    Antes que Deborah respondesse, Miriam cham ou a filha. Antes de sedespedir, Rute pegou a mo da moa com firmeza. Eu gostaria que voc fosse a Herdeira. Ela saiu correndo, deixando Deborah entre encantada e espantada.

    Maal olhava desanimada para a Tocha apagada em um nicho

    encravado na rocha. Todos se foram naquele primeiro dia e a Tocha no foraacesa. Um dia se foi e nossa esperana com ele ela murmurou. Canseide esperar. Estou envelhecendo e vejo tudo se esvair como um sonho.

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    Hogla olhou preocupada para a amiga. No diga isso, Maal. Poucas candidatas apareceram hoje e amanhteremos mais uma chance. Tenha f! Noa entendia os sentimentos de Maal. Elas partilhavam da mesmaesperana e sabiam que aquele era o ano decisivo para o cumprimento daProfecia. Ela caminhou at a mesa onde descansava um enorme arco de ferro,

    pegouo nas mos sentindo o seu peso e suspirou. A cada ano as candidatas diminuem ela comentou. Hogla lanou um olhar silencioso para Tirza, que permanecia encostadaa uma rvore de braos cruzados. Esta identificou o pedido de socorro naqueleolhar e sorriu. verdade, Noa. Sabe por que elas diminuem? Porque nenhuma delas a Herdeira. A verdade que tm algumas que ficamos torcendo para que noconsigam erguer o arco.

    Noa teve que sorrir. Milca, sentada em um dos bancos, espreguiou-sesonolenta. Vamos dormir. Amanh ser um novo dia e nossa esperana estarrenovada. Sinto a necessidade de descansar. Maal sentou-se ao seu lado com um suspiro cansado. Podem ir. Eu quero ficar mais um pouco aqui, pensando. Ela sentiu uma mo em seu ombro. Era Noa. Eu lhe farei companhia. Maal sorriu agradecida para a jovem e fiel amiga. As outras se

    despediram e se foram para o Retiro da Ordem. Sabe, Noa disse Maal, temo que tudo isso em que acreditam osseja uma grande m entira, que a Profecia falsa e que nada vai mudar. Noa apertou a mo da mulher mais velha. No perca as esperanas, minha amiga! Nunca! A semana ainda noterminou, muito pelo contrrio! Temos quatro dias a mais pela frente. Maal sorriu amargamente. Lembra-se do incio? Jovens guerreiras faziam filas a fim de usar o

    arco e tentar acender a Tocha. A maioria, hoje, est no exrcito de Atalia. Nisso voc tem razo. O nmero tem diminudo assustadoram ente acada ano. Maal levantou-se. Bem, aguardarem os como sempre! O que pretende fazer quando asemana acabar? Noa sorriu e ficou em p. Quer mesmo saber? Espero estar fazendo uma reverncia para aHerdeira, e me preparando para uma longa, longa batalha. Maal sorriu e bateu no ombro da am iga.

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    Que seja, Noa! Vamos, quero partilhar mais um pouco dessa f quevoc tem, enquanto cam inhamos para o Retiro.

    Deborah passou o dia ajudando Miriam e Rute a cuidar do stio. A noite,

    ela estava pronta para seguir com Rute at as tochas. No caminho, encontraramalgumas pessoas que subiam com a esperana de ver a Profecia se cumprir.

    Deborah deixou Bruma amarrado em uma rvore e seguiu Rute at umaclareira. L em cima havia uma pequena multido que se acotovelava para ver oresultado daquela noite. No centro, uma fila com cinco moas caminhava emdireo a uma mesa onde descansava um grande arco. A primeira moacaminhou at a mesa e pegou o pesado arco nas mos com um suspiro. Parecia

    bem pesado. um arco de ferro murmurou Deborah. No me admira queningum tenha conseguido acender a Tocha.

    A Herdeira far isso! falou Rute. o que a Profecia diz. Rute falava com paixo e convico. Vai tentar? a pergunta surpreendeu Deborah. No! a moa respondeu com um sorriso. Rute olhou para ela e cruzou os braos. E por que no? Deborah lhe sustentou o olhar e fez um ar de mistrio. Ainda no a hora foi tudo o que disse. Rute no entendeu e Deborah permaneceu calada, observando.

    enhuma das candidatas cumpriu a Profecia e as cinco mulheres de branco, quedeveriam compor a Ordem de Zelofeade, tinham as feies derrotadas pelodesnimo. Vam os em bora disse Deborah. Vai voltar am anh? Rute no ia desistir. Eu vou em bora am anh, pequena.

    Pela manh, a pequena Rute entrou correndo no celeiro e o encontrou

    vazio. Voltou correndo para a casa e esbarrou com a me ao entrar. Rute, o que houve? O mundo vai se acabar? A menina apontou o celeiro, ofegante. Ela se foi, me... a menina parecia desconsolada. Por que no sedespediu de m im? Miriam aj oelhou-se e abraou a filha. Ela deixou um recado pra voc. Disse que ia precisar sair muito cedo

    para tratar de um negcio particular, mas que antes de seguir viagem passarianovamente por aqui para se despedir. Rute no se sentiu reconfortada com a notcia.

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    Ela no podia sair agora . Por que no? Ela tinha que tentar acender a Tocha! Miriam passou a mo no cabelo da filha e sorriu. Esquea a Profecia, Rute. Precisa parar de sonhar com coisas queno existem.

    A menina olhou sria para a me. A senhora que est errada em ter deixado de acreditar. A me ia retrucar, mas como sempre, Rute a deixou, correndo antes queconseguisse dizer qualquer coisa.

    Deborah acampou em um ponto do monte, um pouco mais alto e

    isolado. De l ela podia ver as tochas acesas. Precisava saber o momento certode agir. E assim, ela passou o seu tempo ali, se alimentando apenas de gua. Era

    preciso manter o corpo limpo. Assim, chegou o fim daquela sem ana e, duranteum sonho, ela teve a resposta. Era chegado o momento, no ltimo dia! Elalevantou-se, e caminhou at uma bolsa de pele de carneiro e a abriu. Tirou de luma veste branca e limpa. Preparada para aquele momento. Aps se lavar nocrrego do rio que passava por ali, ela se vestiu e ps a espada dentro da bainha

    presa s suas costas. Estava pronta.

    Na clareira, o desnimo marcava o ltimo dia de tentativas. Poucoscontinuaram a ir, na esperana de ver o milagre acontecer. Por insistncia de

    Rute, Miriam a levou at a montanha. Elas se misturaram as poucas pessoas queestavam assistindo. Apenas duas candidatas haviam se apresentado, e a primeiradelas acabava de falhar. Noa, vamos encerrar logo isso! implorou Maal. No h maisesperana, no consegue ver isso? Noa estava com os olhos fixos em algum que chegava. Maal voltou-see tambm a viu. Era uma mulher alta e jovem, de cabelos e olhos negros, tinha ocorpo bem proporcionado e uma postura nobre. Ela se aproximou de Noa e

    sorriu. Posso tentar? Claro... a moa indicou a mesa e o arco. A segunda candidata tambm havia desistido e, assim como as pessoasali reunidas, tinha o olhar fixo na estranha que acabara de chegar. Rute apertou amo de Miriam. ela, me! Ela veio! Deborah caminhou at a mesa e analisou o pesado arco. Ao toc-lo, elese tornou leve em suas mos. Ela olhou para cima e viu a distncia da Tocha quedeveria acender. Recebeu a flecha incandescente das mos de Hogla, e a

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    preparou no arco com facilidade. Ao aprum-lo e mirar no alvo, ela sabia queestava pronta a selar seu destino de uma vez por todas, e sentiu medo. Isso a fezhesitar e baixar o arco com indeciso. Mas isso foi perceptvel apenas para ela,que logo se recomps e, decidida, mirou e atirou a flecha com preciso. A Tochafoi acesa instantaneamente com o roar da pequena flecha. Houve gritos e urrosde exaltao e alegria. Deborah olhou para trs e viu as cinco mulheres de

    branco ajoelhadas. A mais velha chorava, sacudindo os ombros devido aossoluos. Deborah dirigiu-se ao povo ali reunido. Esse o dia pelo qual tanto esperaram . A Profecia comeou a sercumprida, e um novo tempo comea a partir de hoje. Temos inimigos poderososa combater, por isso precisamos ficar unidos. Famlias, cls e tribos. Sem divisesou dissenses. Somos um povo que clama com a mesma dor, e apenas juntosseremos fortes. Pensem nisso quando forem dormir em suas camas essa noite.

    Precisamos aprender a dar glrias ao Pai, criador de todas as coisas, e Aqueleque inspirou a Profecia. A me, que o povo dessa terra adora, tem sede desangue e poder. Ela no passa de uma criao do Pai, j que seus adoradores achamam de natureza. E para glorificar o nome do Pai e dar incio aoestabelecimento de sua ordem que eu estou aqui. Quem est comigo? Todas as mos foram erguidas entre gritos e palmas. Depois o povo foise afastando com a chama da esperana renovada em seus coraes. Deborahsentiu dois braos se enlaarem em sua cintura, e viu Rute. Ela deu um beijoterno na cabea da menina.

    Voc viu em mim aquilo que eu era, Rute. No vou me esquecerdisso. Eu sabia que voc ia voltar. Deborah sorriu. Eu nunca fui embora. Maal ficou intrigada. Ento, por que esperou tanto tempo? Eu precisava esperar pelo momento certo. No podia ser antes e nem

    depois. Noa respirou aliviada. E agora que est aqui, sabe o que fazer? Deborah ficou sria e olhou em volta para as cinco mulheres. Preciso fazer uma viagem longa e cansativa, mas estarei aqui atem po de falar com os chefes do povo. Ela percebeu os rostos preocupados e sorriu. Eu cheguei, minhas amigas. Se me afasto agora para termos muitotempo juntas pela frente. Olhem para aquela chama que arde, e creiam que euvim para ficar.

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    Milca apanhou o arco de ferro no cho e sentiu a dificuldade paralevant-lo. Com as duas mos o entregou a Deborah que o pegou com a mesmafacilidade com a qual pegaria um arco normal. Eu acredito disse Milca, espantada. Por causa do arco? perguntou Deborah. Ele leve para mim

    porque faz parte do meu destino. Foi feito para minhas mos, e designado a mim

    pela Profecia. No tenho superpoderes, mas posso me apropriar daquilo que estescrito e decretado pelo Pai ao meu respeito. Noa ps a mo no ombro dela e sorriu. Ento, v! Mas volte logo. No nos prive de sua presena por maistempo do que j ficam os. Eu voltarei o mais rpido que puder. Prometo.

    CAPTULO 5

    A Rainha dos Q ueneus

    Jael encontrou Hulda na estrebaria. Mandou me cham ar? a moa perguntou. Chegou a sua hora, Jael. Sente-se pronta? Jael hesitou antes de dar a resposta. Eu no sei se estou pronta, Hulda. Entretanto, eu tenho que estar, e sterei certeza disso se eu partir. Hulda sorriu e cham ou a moa para ver algo na ltima baia. Era umcavalo de um tom quase dourado. O pelo brilhava e a crina, um pouco maisclara, era abundante. Este ser seu fiel companheiro. Jael admirou o cavalo e passou a mo sobre o pelo brilhante. lindo! Como se cham a? Deram-lhe o nome de Solaris, por causa do plo quase dourado. Solaris repetiu Jael. Gostei do seu nome, companheiro.

    A Guardi merece uma montaria veloz. Jael respirou fundo. Quando devo partir? Essa noite. Hber est pronto para ir com voc? Sim, ele j est recuperado e se sente bem. Hulda tinha algo mais a dizer, mas no sabia como abordar. Hulda, diga logo o que est pensando, por favor! A mulher suspirou.

    A sua misso inicial no ser fcil, Jael. Enfrentar a rebelio de umatribo guerreira uma grande tarefa. Talvez voc tenha uma grande prova pela

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    frente. Concluindo? Tente conter seus impulsos, menina! Voc ser uma lder comgrandes responsabilidades. Jael sorriu. Aprendi muito nesse tempo que passei aqui, acredite. Otoniel foi um

    professor paciente. Se eu no me sinto pronta, pelo peso que a tarefa exige. Eusei quem sou, Hulda. Sei tambm que Deborah precisa de mim na liderana dosQueneus. Confie em mim. Hulda a abraou. Eu vou confiar, filha! Vou confiar.

    Jael e Hber tornaram-se bons amigos. O primo era inteligente e

    divertido. Isso fez com que a jornada fosse leve e tranquila. Paravam para

    dormir ao relento e caavam o prprio alimento. Treinavam espadas um com ooutro, e exercitavam a mira com o arco, em meio as rvores da floresta. Namedida, em que chegavam perto da regio norte, territrio das tribos Quenitas,Jael foi ficando tensa e preocupada. Aps cortarem o caminho em direo smontanhas, Hber guiou Jael para dentro de uma trilha estreita em meio a umdesfiladeiro comprido e profundo. Ele podia ouvir a respirao tensa da m oa. Teme alguma coisa? J sentiu que cada passo seu era esperado e observado por algum ? Ele riu.

    No, eu nunca fui casado! Voc no me escuta, Hber ela lamentou. Estou partilhando um

    pedao srio da m inha vida com voc, sabia? Eu sei, desculpe. que eu achei que um pouco de humor aliviaria atenso. Tudo bem. Estam os perto ou passarem os a noite nesse lugar? Chegaremos antes do anoitecer, eu garanto. Quando a trilha chegou ao fim, Jael surpreendeu-se ao ver um grande e

    verdej ante vale. Era um cenrio muito bonito. Chegava a ser inebriante. Vej o fumaa por trs daqueles morros ela apontou. para l que estam os indo. Os rem anescentes da sua tribo. Aquelesque no perderam a esperana. Ele ps a mo dentro do saco que levava ao lado da sela e retirou umshofar pequeno, coberto com l de ovelha. Ele o exam inou solenem ente antes de

    passlo para ela. Isso era de Hber, nosso av e nosso lder. Uma marca de suaautoridade que no caiu nas mos dos rebeldes. seu agora, e voc deveanunciar sua chegada.

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    Ela sentiu o peso do shofar. Era leve e slido. Jael, no entanto, hesitoudiante do que ia fazer. Esses remanescentes... sabem quem eu sou? Hber sorriu. Toque o shofar, e eles sabero. Ela olhou para ele com incredulidade, mas algo no olhar do rapaz a fez

    confiar em seu julgamento. Ela levou o shofar at os lbios e soprou. O som saiualto e claro, enchendo o ar, e envolvendo as montanhas em volta. Era mgico,inebriante. Vej a! apontou Hber. Duas flechas de fogo se cruzaram no ar acima do local da tribo. Eles reconheceram voc. Ela guardou o shofar e desceu a colina atrs de Hber.

    Deborah fitou o deserto que se estendia sua frente e as montanhas depedra, desprovidas de vegetao. Apesar da sem elhana, ela sabia que asCavernas do Sal estavam longe. Carregava com ela um suprimento de quatroodres cheios de gua. Era s isso que ela se permitiria ingerir durante o tempoque passasse ali. O sol implacvel fazia sua cabea girar. A paisagem sempreigual a fazia pensar que estava perdida. Como posso estar perdida, se nem ao menos sei para onde ir? elafalou com um riso amargo. Durante a noite, o frio e os animais eram um tormento. Ela acendia a

    fogueira e ficava fitando o danar do fogo. Assim foi durante dois dias seguidos.ada aconteceu. Na manh do terceiro dia, uma tempestade de areia a

    surpreendeu e o camelo sumiu, deixando-a s no meio do nada. Com apenasmeio odre de gua pendurado no ombro, ela se ps a caminhar em qualquerdireo. A nica coisa que a impulsionava era a certeza de ser a Herdeira, e deque sua morte no viria naquele deserto. Com o sol a pino, essa certeza se desfezem dvidas. Exausta, ela caiu de joelhos e soltou um brado de raiva e desespero.O brado tornou-se um grito de dor ao sentir a mordida de uma cobra, que estava

    camuflada na areia, e enfiou as presas cheias de veneno em sua panturrilha. Elatentou tirar o veneno com uma faca, mas o mundo comeou a girar em suavolta. Ela ps um gole de gua na boca e se forou a ficar em p. A perna pesavauma tonelada e uma nusea repentina a fez cair de costas.

    Jael foi recebida com gritos de alegria dos mais jovens, e com olhares

    desconfiados dos mais velhos. Ela sabia ser necessrio conquistar a confianadaquela pobre gente to sofrida, e to cheia de esperana. Sua primeira atitudefoi pedir que Hber a levasse at sua tenda e reunisse o Conselho dos Ancios. Conselho dos Ancios? No temos isso aqui.

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    Ento, vamos criar um ela replicou. Rena os homens e asmulheres mais velhos. Busque-os por suas cs, pois elas so sinal de sabedoria. Hber a levou at a tenda do lder que era ocupada por Abiatar, irmomais novo de Hber, o velho. Este cedeu o espao com uma expressoenigmtica no olhar. Jael olhou em volta, e pousou os olhos no tio. Obrigada por cuidar de minha tenda, meu tio.

    O homem fez uma mesura com a cabea, e saiu sem nada dizer. Jaelencontrou o olhar divertido de Hber. Isso diverte voc? No sabe o quanto difcil para esses homens aceitar ordens demulheres. Eles vo ter que se acostumar com isso ela disse, sentando-se numaalmofada. Muitas coisas vo mudar daqui pra frente. No se aplana o caminhosem cortar rvores e derrubar montanhas.

    Hber sorriu. Eles vo gostar de que fez. E o que eu fiz? Os ancios. Eles vo gostar de ser ouvidos. Jael sorriu de volta para o primo que saiu para cumprir as primeirasordens.

    Longe dali, Deborah sofria com o calor externo e com o frio interno que

    chegou com a febre. Imagens desconexas, rostos desconhecidos e deformados

    surgiam em sua mente. Ela sentiu um lquido ser derramado em seus lbiossecos. Era viscoso e amargo e a fez tossir. Precisa beber tudo disse uma voz distante. Seu corpo precisacombater o veneno. Ela foi obediente voz e tomou o terrvel lquido. Ao tentar abrir osolhos, sentiu dor ao ver a luz. O frio aumentou e ela gemeu entre tremoresviolentos. Quando Deborah voltou a tentar abrir os olhos, era noite. Os tremoreshaviam passado, e ela aproveitou para observar o ambiente em que estava. Era

    uma caverna diferente das Cavernas do Sal. Essa possua desenhos estranhos nasparedes, e um pequeno lago se formara em seu interior. Ela estava deitada emcima de um cobertor de pele de camelo. Sua perna foi imobilizada e envolvida

    por faixas no local da m ordida da cobra. Ao sentar, a cabea rodou e doeu com ose um martelo a tivesse atingido. Ela soltou um gemido enquanto cobria o rostocom as mos. Voc mais forte do que pensei disse a mesma vo