A Realidade Transcendental (Valter Da Rosa Borges)

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  • 7/25/2019 A Realidade Transcendental (Valter Da Rosa Borges)

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    VALTER DA ROSA BORGES

    A REALIDADE TRANSCENDENTAL

    (UMA INTRODUO TRANSCENDEN-TOLOGIA)

    Edies Bagao - Recife - 1999

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    Este livro apenas o marco inicial de uma nova ordem de conhecimento in-terdisciplinar que denominamos de Transcendentologia. Ele no tem a pretensode ser um tratado sobre o transcendental, mas se prope a oferecer uma viso pa-

    normica e sistematizada de fenmenos inslitos que evidenciam a existncia deum outro nvel da realidade - a realidade transcendental.

    A Transcendentologia, que tem por objeto o estudo e a investigao da fe-nomenologia transcendentolgica e das concepes a respeito da realidade trans-cendental, no uma nova cincia, uma nova filosofia, uma nova religio, mas umsistema cognitivo autnomo que no redutvel a qualquer dos trs ramos clssicosdo conhecimento. Mas, por sua natureza interdisciplinar, se vale dos subsdios decada um deles, seja no que diz respeito metodologia de pesquisa, seja no que con-cerne s reflexes e anlises comparativas dos fenmenos transcendentais.

    Enquanto a cincia procura, cada vez mais, adentrar-se no conhecimento darealidade fsica, ampliando a sua viso do mundo dito material, desde a investiga-

    o das partculas elementares at a procura de novos universos nas mais distantesgalxias, a Transcendentologia se remete investigao de outros nveis da reali-dade que, de uma forma ou de outra, interajam com o nvel da realidade onde vi-vemos. No mundo contemporneo, voltado quase que totalmente para o exterior,com os seus desafios, conquistas e sedues, a preocupao com questes classifi-cadas de metafsicas passou a ocupar um lugar secundrio e de interesse ocasional.

    A realidade transcendental, pela sua complexidade, no pode ser abordadaapenas sob uma determinada ptica cognitiva, mas por um elenco epistemolgicode saberes, cuja convergncia emprica, experimental e especulativa resulte nacompreenso, cada vez mais profunda, das dimenses do real.

    A Transcendentologia, que tivemos a ousadia de criar, no uma resposta,

    mas uma proposta s questes que transcendem a rotina dos fatos ordinrios econstitui um salutar desafio queles que se aventuram perigosamente a navegarpelo oceano do Desconhecido.

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    CAPTULO I

    A REALIDADE TRANSCENDENTAL

    Matria & realidade

    Para se postular a existncia de um universo transcendental, necessrio,preliminarmente, questionar se a matria o fundamento da realidade fsica e se so que material real.

    A cincia vem procurando, at hoje, identificar a realidade com a matria eencontrar o elemento fundamental da prpria materialidade.

    Inicialmente, concebeu a matria como tudo o que nos afeta e que podemosperceber.

    Depois, observou que poderamos tambm ser afetados pelo que no perce-bamos. Ento, a matria passou a ser entendida como tudo o que nos afeta, mesmoaquilo que no podemos perceber, tais como os raios ultravioletas, os microorga-nismos, etc.

    Graas, porm, ao crescente progresso cientfico e tecnolgico e em razodas nossas extenses artificiais, estamos aumentando, gradativamente, o alcanceda nossa materialidade.

    Teilhard de Chardin proclamava que toda vida consiste em ver e que a hist-ria do mundo vivo se reduz a criao de olhos cada vez mais perfeitos no seio de umCosmo onde possvel perceber sempre melhor. Tem razo Chardin: quanto maispercebemos, mais aumenta a materialidade do nosso universo.

    Pensamentos, emoes, idias, desejos tm tambm a sua materialidade,pois podem nos afetar, apesar de sua imaterialidade.

    Mas, afinal, o que a matria?Aitareya definiu a matria como tudo o que capaz de manifestao, afir-

    mando que entre a matria original e a matria final h inmeras gradaes.O Jainismo, por sua vez, lecionava a existncia de seis nveis da matria: a) o

    denso-denso ou fsico; b) o denso; c) o denso-sutil; d) o sutil-denso; e) o sutil; f) osutil-sutil.

    Para Leibniz, a matria, na sua essncia, fora, visto ser constituda de umconjunto infinito de centros de fora, denominados de mnadas, que so tomosvirtuais.

    Berkeley, por sua vez, afirmou que a matria no existe, pois um conjuntode qualidades sensveis. Em consonncia com a Escola Vedanta, ele asseverava queo mundo uma representao de Deus e s existir enquanto Deus pensar nele.

    Hume proclamava que a realidade so fenmenos subjetivos e que causa esubstncia, tempo e espao no passam de criaes psicolgicas.

    Bergson sustentava que a realidade "lastreada de geometria". E assinalou:"A realidade um processo de perene criao sem princpio nem fim, que

    no tem duas vezes a mesma fisionomia, mas assume a cada instante um aspectooriginal e imprevisvel". Por isso, a forma"nada mais seno um instantneo to-mado numa transio".

    Para Bergson, "no h coisas, apenas atividades".

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    Pietro Ubaldi assinalava que a matria , essencialmente, relaes e trajet-ria e que o real na vida no a forma, mas o seu tornar-se.

    Para Bertrand Russel "a matria, em seu centro, est reduzida a uma sim-

    ples fico matemtica". A matria no mais constituda por "coisas". Ela foisubstituda "por emanaes de uma localidade"e a Fsica moderna reduziu a ma-tria a "um conjunto de eventos que se deslocam para o exterior provenientes deum centro". A coisa "uma construo lgica", tem uma "realidade momentnea"e no passa de "uma determinada srie de aparncias, relacionadas entre si pelacontinuidade e por certas leis causais".

    E concluiu:"Agora, devido principalmente a dois fsicos alemes, Heisenberg e

    Schrdinger, os ltimos vestgios do velho tomo slido dissolveram-se e a mat-ria tornou-se to fantstica quanto uma viso esprita".

    Para John Gribbin, "nada real, seno enquanto vemos", tal como sucede

    no mundo quntico.Werner Heisenberg comentou ser difcil considerar a matria como "verda-deiramente real"e assegurou que, para a cincia moderna, no h mais objeto ma-terial, porm forma, simetria, matemtica.

    Heisenberg advertiu que a fsica moderna se inclinou, definitivamente, emfavor de Plato, porque as mnimas partes da matria no so, de fato, objetos fsi-cos no sentido ordinrio da palavra, mas formas, estruturas ou, na acepo platni-ca, Idias, que podem ser descritas, sem ambigidade, em linguagem matemtica.

    Teilhard de Chardin advertia:"Atingindo o extremo de suas anlises, os fsicos no sabem mais se a es-

    trutura que eles alcanaram a essncia da matria que eles estudam ou, ento,

    reflexo de seu prprio pensamento."E Arthur Koestler escreveu um rquiem final para a matria:"Todo um corpo de laureados do Prmio Nobel da Fsica ergue sua voz pa-

    ra nos anunciar a morte da matria, a morte da causalidade, a morte do deter-minismo."

    Alis, conforme observou Heinz Pagels, a matria a exceo na modernaconcepo do universo, onde quase tudo vcuo. No um vcuo como vazio, mascomo plenitude, formado de pares de partculas e antipartculas espontaneamentecriados e aniquilados. Podemos, assim, dizer que o vazio est pleno de infinitas po-tencialidade pulsantes.

    Afirma, ainda, Pagels que tudo o que pode ter existido ou vir a existir est

    potencialmente no nada do espao, o que nos faz lembrar, de certo modo, a hipte-se dos "registros akashicos" do ocultismo.James Jean declarou que a melhor maneira de descrever o universo, mesmo

    de forma imperfeita e inadequada, consiste em consider-lo como um pensamentopuro, um pensamento de quem, falta de outro conceito mais abrangente, poder-amos descrever como um pensador matemtico. Na verdade, disse ele, o universoest comeando a parecer mais um grande pensamento do que uma grande mqui-na.

    Henri Margenau vai mais alm e postula que a matria nada mais do queum constructo da mente.

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    A realidade virtual, criada por programas de computadores, so simulaesda realidade e que, um dia, podero tornar-se concretas. O computador antecipavivncias e situaes, propiciando amostragens de futuros possveis. O real fsico

    sofre, agora, a concorrncia do real virtual e passa a ser controlado, at certo ponto,por ele.

    A realidade, no entanto, para ns, sempre material, pois matria o modocomo decodificamos a realidade. A matria, portanto, no ilusria, mas, sim, anossa crena de que ela a nica forma da realidade.

    A matria um constructo perceptual de cada organismo, e cada espcie,aqui, na Terra, tem o seu universo material especfico. Logo, a realidade no se re-duz nossa materialidade humana e, conseqentemente, existem outros nveis darealidade com a sua materialidade prpria.

    Ainda no se comprovou que matria constituda de elementos irredut-veis, indivisveis, pois a cincia, at agora, no descobriu o tomo, na verdadeira

    acepo do termo. J foram identificados cinco nveis da matria molculas, -tomos, ncleos, hadres e quarks e ainda no foi encontrada a sua estrutura fun-damental. A realidade parece ser composta de infinitos nveis fenomenolgicos,com ilusrios elementos constitutivos. Por isto, afirmava Pietro Ubaldi que "cadamundo real em seu nvel e ilusrio, se visto de outros nveis".

    Onde termina a matria e comea a energia e vice-versa?Einstein sustentou que matria energia congelada. E Pietro Ubaldi adver-

    tiu que a diferena entre matria e energia consiste na diversidade do movimento:rotatrio, fechado em si mesmo, na matria; ondulatrio, de ciclo aberto e lanadono espao, na energia.

    A materialidade no est l fora, mas em ns mesmos, no nosso modo de

    perceber o mundo exterior. Matria a nossa relao com os seres e as coisas. Issono quer dizer que eles sejam produtos da nossa mente, mas, sim, que eles so ma-teriais para ns porque podemos perceb-los. A essncia da matria , portanto, apercepo. A cultura da sociedade em que vivemos que nos fornece a materialida-de das nossas percepes. Por isso, ns vemos a realidade com os olhos que a cultu-ra nos deu, porque ver no um fato apenas biolgico, mas principalmente umaexperincia culturalmente condicionada. O que chamamos defato uma percepointerpretada.

    A Escola de Copenhague afirma que a realidade quntica , em parte, criadapelo observador. Ou seja, como diz Heinz Pagels, a intencionalidade humana influ-encia a estrutura do mundo fsico. Por isso, John Wheeler asseverou que nenhum

    fenmeno fenmeno, seno quando observado. Assim, podemos argumentar quea matria s matria quando ns a percebemos.No passado, Gargyayana j afirmava que a realidade a mente. O mesmo

    dizia o Hermetismo. A Escola Yogachara enfatizava que o mundo exterior o pr-prio pensamento e que as coisas nada mais so do que representaes ou idias. E,finalmente, os fundadores da Escola da Mente, Lu Hsiang-Shan e Wang YangMing, ensinavam que o universo e a mente so idnticos e que nada existe fora damente.

    No mundo moderno, Eddington concluiu que o estofo do mundo de natu-reza mental.

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    O que chamamos de fsico, portanto, a materialidade especfica do nossouniverso e ela apenas uma das formas de "materialidade" do real.

    Existe uma realidade transcendental?

    Uma regio da realidade, alm do tempo e do espao, sempre foi intuda pormsticos e filsofos, e, atualmente, por cientistas. Plato concebeu-a como o mundodas Idias. David Bohm a denominou de ordem implcita ou implicada. E RupertSheldrake, de campos morfogenticos.

    Esta realidade, que podemos denominar de realidade transcendental ou RT a regio matriz da realidade fenomnica. Ela tida como o mundo real, o mundodas possibilidades infinitas, pois a essncia do real o possvel. Assim, o que cha-mamos de real apenas uma parte do possvel que fenomenologicamente se reali-zou.

    Wolfgang Pauli postulava a existncia, no cosmo, de uma ordem distinta domundo das aparncias e que escapa nossa capacidade de escolha.Arthur Eddington afirmou, enfaticamente, que toda realidade de natureza

    espiritual e no material, e no em parte material e em parte espiritual. E, incisi-vamente, asseverou que a explorao do mundo exterior, com os mtodos da cin-cia fsica, no nos conduz a uma realidade concreta, mas a um mundo de sombras esmbolos, para alm do qual aqueles mtodos so incapazes de penetrar. Eddingtonconcluiu que o mundo est composto de matria mental.

    A RT anterior, simultnea ou posterior realidade fsica? ela a causa ouconseqncia da nossa realidade dita material?

    Scott Rogo mencionou a seguinte hiptese:

    "Um vasto reino espiritual pode ter surgido ao mesmo tempo que a vidaevoluiu neste planeta e enquanto tomavam forma nossa concepo da existncia.Seria vo indagar se os nossos pensamentos criaram essa dimenso espiritual ouse o reino espiritual promoveu a evoluo do homem. Tudo o que se poderia pro-por que o mundo fsico e o mundo espiritual desenvolveram-se mutuamente, ca-da qual interagindo dinamicamente com o outro. A medida que o pensamento e af humana evoluram geraram um sistema de crenas que se tornaram realidadesno interior do reino espiritual. Uma vez criadas, essas realidades tornaram-seindependentes das mentes e das crenas, que lhes deram origem.

    O que essa teoria declara relativamente simples. Quando um grupo depessoas ou uma sociedade inteira partilha uma viso do mundo religioso em co-

    mum, sua ideologia acaba por se traduzir numa realidade espiritual literal. Omundo de Jesus, da Virgem Maria e dos anjos existe de fato nessa realidade, econtinuar a existir enquanto as crenas crists forem aceitas por milhes de pes-soas. O reino dos devas hindus e os muitos cus e infernos que constituem o reinoespiritual da crena budista podem igualmente existir nessa dimenso.

    Essa hiptese pode certamente ajudar a explicar alguns dos milagres quedeparamos ao estudar a vida dos msticos da Igreja. difcil ler suas biografiassem reconhecer que as vises e as aventuras espirituais que eles vivenciaram du-rante os seus xtases eram algo mais do que meras alucinaes produzidas porsuas crenas religiosas. Em seus transes, esses msticos, como Teresa de vila,Catarina Emmerich, Therese Neumann e muitos outros estavam provavelmente

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    entrando numa dimenso espiritual to real para eles como o mundo dos cincosentidos o para ns. O mesmo se poderia dizer dos mundos espirituais para on-de os xams das culturas primitivas viajam durante os seus transes e experin-

    cias fora do corpo.Esse reino espiritual pode no existir como uma realidade pessoal em bene-

    fcio unicamente desses msticos. Como um sistema de crenas ou uma concepodo mundo se converte em realidade no reino espiritual, torna-se tambm uma re-alidade para toda a cultura que o sustenta. Embora a maioria de seus membrospossa no estar em contato com ele durante suas vidas terrenas, ainda assim eleexiste no universo.

    Essa teoria geral pode tambm fornecer uma explicao para os notveispoderes "superpsquicos" de fazedores de milagres como So Jos de Cupertino,Santo Antnio de Pdua, Padre Pio e Teresa Higginson, cujas habilidades pare-cem ser muito maiores e mais consistentes do que as dos numerosos paranormais

    que vm chamando a ateno da parapsicologia durante dcadas.Os santos e msticos de todas as religies so fazedores de milagres exata-mente por causa de sua sensibilidade a esse reino espiritual. Se seus poderes ps-quicos os pem em contato com o mundo espiritual ou se o contato com o mundoespiritual os leva a tornarem-se paranormais uma questo controversa. Sejaqual for o caso, talvez esses indivduos paranormais possam lanar mo de vas-tos reservatrios de energia espiritual gerada por esse reino espiritual a fim deintensificar suas capacidades. Podem estar to sintonizados com as foras criati-vas do universo que se tornam capazes de usar essa energia criativa para modifi-car os padres da realidade".

    Certos fenmenos paranormais estudados pela Parapsicologia e outros tidos

    por milagrosos, observados em todas as religies, transgridem as leis da realidadefsica e ultrapassam, de muito, a capacidade do ser humano, permitindo-nos espe-cular sobre a existncia de um outro nvel da realidade - a realidade transcendentalou RT. Os fenmenos paranormais e os milagrosos so fenmenos inslitos, masnem todos os fenmenos inslitos so paranormais ou milagrosos, pois podemconsistir numa manifestao patolgica da mente humana ou naquilo que se chamaaberrao da natureza ou teratologia.

    H uma intencionalidade, um conhecimento e um poder por trs de certosfenmenos inslitos que no podem ser explicados pelas aptides ainda pouco co-nhecidas do inconsciente do homem.

    Parece-nos sensato admitir que os fenmenos inslitos que no possam, ra-

    zoavelmente, ser atribudos a uma pessoa humana, na condio de agente psi ouAP, devem ser considerados como indcios da interferncia de um agente transcen-dental ou AT, nome genrico para os seres transcendentais ou STs, os quais foramidentificados, pelas religies, como deuses, anjos, demnios, devas, espritos da na-tureza e espritos dos mortos.

    Este universo transcendental, tambm conhecido por mundo espiritual, ,at hoje, do domnio exclusivo das religies, as quais jamais se conciliaram parabuscar uma viso holstica e coerente do mesmo. E a competio acirrada e dogm-tica entre as diversas religies s resultou em conflitos desnecessrios e na manu-teno de concepes setorizadas e excludentes a respeito da RT.

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    Enquanto a Cincia tem procurado harmonizar todas as cincias dentro deuma concepo unificada da sua metodologia cognitiva, a Religio, pelo contrrio,se mantm fragmentada pela querela estril de religies e seitas, dando a impres-

    so de que a RT , fundamentalmente, catica e ininteligvel.Parece-nos evidente que a RT extremamente complexa, constituda de di-

    ferentes nveis fenomenolgicos, o que, por certo, esclarece a diversidade das reve-laes espirituais e das comunicaes medinicas. H, porm, uma interessanteconvergncia nestes relatos: a existncia de planos espirituais hierarquizados, me-lhor diramos, diversificados. a nossa tendncia simplificao que nos deixa a-tordoados e confusos ante a presumvel heterogeneidade da RT.

    A Parapsicologia, instituindo-se como cincia, procurou humanizar o insli-to, atribuindo a aptides humanas ainda desconhecidas a causa nica de tais fen-menos. O avano cientfico e tecnolgico, como um todo, vem favorecendo esta ta-refa da Parapsicologia, minimizando a explicao transcendental, visto que alguns

    fenmenos paranormais j podem ser voluntariamente obtidos em laboratrio.

    Definio da paranormalidade

    Ainda no existe, entre os parapsiclogos, um consenso para definir o con-ceito de paranormal, principalmente porque ainda no sabemos determinar o que normalidade e quais os seus limites. Empiricamente, porm, distinguimos um fatonormal de um acontecimento inslito, visto que normal , para ns, tudo aquiloque habitual, previsvel e at mesmo, em certos casos, controlvel. Tudo o que inslito nos assusta ou incomoda, porque perturba as nossas expectativas e nospriva, ainda que temporariamente, da segurana que nos proporciona o conhecido.

    Mas, o inslito, paradoxalmente, tambm nos fascina por descortinar novas moda-lidades do real, rompendo com a rigidez de certos determinismos.No nos basta apenas testemunhar coisas fantsticas: preciso acordar para

    perceber a sua importncia na investigao do real. O mal que nos acostumamoscom o trivial, o rotineiro e ento passamos a desconfiar do indito, talvez - quemsabe? - por tem-lo. A testemunha preconceituosa, por isso, no passa de um so-nmbulo, pois v o inslito deformado pelo seu condicionamento ptico, resultantedo vigente paradigma cientfico.

    Foram a miopia e o astigmatismo da comunidade cientfica do sculo XIX (emoderadamente da do nosso sculo) que impediram e ainda esto impedindo apercepo correta da inusitada fenomenologia paranormal. Uma pequenssima mi-

    noria que teve olhos para ver (William Crookes, Charles Richet, Friedrich Zllner,entre outros) foi hostilizada e ridicularizada por seus colegas implacveis, sob ofundamento implcito de que o que no se compreende no existe.

    luz da Parapsicologia, o homem dotado de um talento cognitivo especial(psi-gama) e de uma aptido ocasional de agir psiquicamente sobre a matria e so-bre os seres vivos (psi-kapa). O paranormal o normal incomum. Por isso, parecesituar-se nas fronteiras das potencialidades do homem. Como no sabemos e esta a magna questo quais os limites reais da capacidade humana, o que podemos estabelecer teoricamente os parmetros razoveis desta capacidade.

    O paranormal, portanto, pertence ao universo hominal, embora contrarie oparadigma cientfico da realidade.

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    A paranormalidade, psicologicamente, enseja a especulao metafsica dadivindade implcita do homem por atender necessidade mtica do heri, latenteno inconsciente da humanidade, tornando-nos capazes de prodgios que nos apro-

    ximam dos deuses, dando-nos o poder de dominar a matria e o tempo e de con-trariar as chamadas leis da natureza.

    Consciente e inconsciente

    Tido, pelos parapsiclogos, como causa da manifestao paranormal, o in-consciente se estabeleceu como ncleo do ser, desbancando o consciente para asreas de fronteira entre o homem e seu contexto sociocultural.

    Consciente e inconsciente no so entidades autnomas, mas expresses o-perativas da mente humana. O inconsciente no um gnio oculto e sim a mentehumana vista como um todo, onde o consciente constitui uma atividade seletiva em

    consonncia com o contedo cultural onde cada homem est inserido.Sob certos aspectos, o processo inconsciente o modo no-intencional quetodos ns temos de resolver, de maneira extremamente habilidosa, os nossos pro-blemas. Isto importa em reconhecer que o nosso modo consciente e intencional rotineiro e pouco criativo.

    O poder ilimitado do psiquismo inconsciente, defendido por alguns parapsi-clogos, a metafsica da Parapsicologia. Deram-lhe o nome pomposo de super-psi. Alis, a cincia, como um todo, possui uma metafsica: a crena de que, um dia,explicar todos os fenmenos da natureza.

    Mas at onde vai o poder do nosso inconsciente? Simplesmente porque noconhecemos os seus limites, deveremos habituar-nos a trat-lo como se fosse uma

    instncia humana praticamente dotada de oniscincia e onipotncia? Um inconsci-ente que sabe tudo e pode tudo , a bem da verdade, uma rplica ou sucedneo deDeus.

    A atitude de certos parapsiclogos tem sido radical: ou explicam todos os fe-nmenos inslitos pelo psiquismo inconsciente do AP ou negam a realidade daque-les que no cabem nesta hiptese, atribuindo-os fraude, s deficincias da pesqui-sa ou ao misticismo do pesquisador. evidente que todos os fenmenos paranor-mais so inslitos, mas nem todo fenmeno inslito paranormal.

    Jung j havia advertido que "se o inconsciente fosse efetivamente superior conscincia, seria simplesmente difcil ver do que consiste, afinal, a utilidade doconsciente, ou porque motivo o fenmeno da conscincia surgiu no transcurso da

    evoluo filogentica como um elemento necessrio".Apesar de todas as conquistas da investigao parapsicolgica, uma partesignificativa dos fenmenos paranormais permanece inabordvel pela metodologiacientfica, sendo manifestamente insatisfatria a sua explicao por aptides des-conhecidas do psiquismo inconsciente, principalmente porque o conceito de in-consciente extremamente vago tanto na Psicologia como na Parapsicologia.

    Paranormalidade & transcendentalidade

    A paranormalidade um conhecimento (psi-gama) e uma ao (psi-kapa)que excedem a capacidade habitual do ser humano.

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    Ressalta-se, na manifestao paranormal, um agente conhecedor e executorde conhecimentos e habilidades no aprendidos, no s em relao ao nosso uni-verso fsico, mas tambm em domnios desconhecidos pela cincia, cuja interao

    com o mundo material redunda na infringncia das leis naturais.Inicialmente, se faz necessrio estabelecer as fronteiras entre o paranormal e

    o transcendental, definindo os seus respectivos domnios fenomenolgicos. A tarefade distinguir o transcendental do paranormal ainda mais rdua do que a de dis-tinguir o paranormal do normal. Assim, a pesquisa transcendentolgica procura,preliminarmente, determinar se um dado fenmeno inslito de natureza para-normal ou transcendental. quase sempre difcil estabelecer esta distino, poisno existe um critrio confivel para determinar uma clara fronteira entre as duasordens de fenmenos. Por isso, adotamos o critrio da razoabilidade, o qual consis-te em declarar que um fenmeno inslito transcendental quando ele no pode,razoavelmente, ser atribudo a ao do inconsciente do AP.

    H, portanto, uma imperiosa necessidade de se demarcar, teoricamente, oslimites operacionais do inconsciente nas suas manifestaes paranormais. Mas,como ainda no sabemos os limites da capacidade humana, s podemos estabele-cer, teoricamente, os parmetros razoveis desta capacidade. O poder ilimitado doinconsciente, defendido por alguns parapsiclogos, no passa de uma hiptese me-tafsica e, portanto, incompatvel com a natureza cientfica da Parapsicologia.

    A Parapsicologia, por ser uma cincia, no pode lidar com hipteses metaf-sicas, e s lhe compete atribuir ao homem a causa exclusiva dos fenmenos para-normais. Assim, ela no deve apenas afirmar que o inconsciente a causa daquelesfenmenos, mas comprovar experimentalmente esta hiptese, mediante a utiliza-o de tcnicas e procedimentos estritamente cientficos. Para isso, necessrio

    que ela demonstre que o AP pode produzir voluntariamente alguns deles. Porm,so rarssimos os fenmenos paranormais que ocorrem em tais condies e, assimmesmo, a sua magnitude enormemente inferior queles que acontecem esponta-neamente e, em alguns casos, contra a vontade do AP.

    necessrio que o parapsiclogo esteja ciente desta limitao, reconhecendoque certos fenmenos no podem ser satisfatoriamente explicveis pelo inconscien-te. Nem sempre a inteligncia e a intencionalidade, que existem por trs de tais fe-nmenos, parecem ser a evidncia de uma autonomia operacional da inconscinciahumana. Na verdade, de difcil defensibilidade a hiptese de que, a nvel incons-ciente, o homem possui o conhecimento de leis que ignora em seu estado de vigliae que contraria o atual paradigma cientfico da realidade. Enquanto no soubermos

    como o inconsciente age para produzir estes fenmenos, estaremos fazendo apenasuma especulao sem qualquer respaldo experimental e at mesmo emprico. claro que certas pessoas, aps um longo treinamento, so capazes de inter-

    ferir nas atividades involuntrias do organismo, como, por exemplo, aumentar oudiminuir os batimentos cardacos e aumentar a temperatura do corpo e, em algunscasos, produzir, voluntariamente, fenmenos paranormais. O que se questiona setais poderes so inatos ou conseqncia de prvio treinamento.

    Acontece que, na maioria dos casos, esta aptido inata em algumas pesso-as. Elas a descobrem, na maioria das vezes, por acaso, e quase nunca conseguem,durante toda a sua vida, utiliz-la voluntariamente.

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    cial, a concluso que se impe que a morte do crebro no importa na morte damente.

    J dizia Lawrence LeShan:

    Aquilo que absolutamente corriqueiro em um domnio da experinciapode no existir em outro."

    E afirmou ainda:Portanto, quando afirmamos que a morte aguarda inevitavelmente o cor-

    po e indagamos se isto tambm verdadeiro no que diz respeito conscincia, aqual existe em um diferente domnio da experincia, a pergunta no to simpl-ria como poderia parecer inicialmente.

    Existe um acesso pblico ao corpo. Ele existe no domnio sensorial e pode-mos observar o corpo de outra pessoa enquanto ele se movimenta, respira, semantm e quando cessa de fazer tais coisas. Existe apenas um acesso particular conscincia e no podemos jamais observar a conscincia de outra pessoa antes

    ou aps a morte biolgica do corpo. O que observamos a morte do corpo. O queinferimos a morte da conscincia. So duas construes separadas, mas aindaassim ns as tratamos como se fossem uma s.

    LeShan argumentou ainda que no existe uma verdade emprica, analticaou cientfica que diga respeito aniquilao da conscincia aps a morte do corpo.

    Disse mais:A morte uma construo, um sistema que organizamos a fim de rela-

    cionar um grupo de fatores observveis.E, mais adiante:Os fatores observveis que a morte apresenta so a cessao do movimen-

    to, a perda da comunicao e a impossibilidade de automanuteno (ao sem

    reao da segunda lei da termodinmica). No existe um fator observvel noDomnio da Conscincia. No domnio sensorial, e unicamente nele, a construo(ou sistema) da morte bem organizada.

    Concluiu LeShan:A aniquilao da conscincia outra coisa. No uma verdade emprica

    ou analtica. No pode ser observada. No posso observar a aniquilao de mi-nha conscincia. Devido ao acesso privado conscincia, tambm no posso ob-servar a aniquilao da conscincia de outra pessoa. Nada existe na definio docorpo ou da conscincia que nos leve analiticamente a ter clareza de que a mortedo corpo deva levar morte da mente.

    Alm do mais, a aniquilao da conscincia no apresenta conseqncias

    em relao a qualquer coisa que possamos observar. A morte do corpo de outrapessoa resulta na perda de nossa capacidade em nos comunicarmos com ela e vi-venciar sua conscincia. Quer sua conscincia seja aniquilada ou no, o resultado o mesmo. A pessoa somente poder expressar a existncia de sua conscinciaatravs de seu corpo. Quando ela morre, essa capacidade desaparece. O resultado o mesmo, continue ou no sua conscincia a existir.

    Quando algum se encontra em estado de coma, presume-se que esteja in-consciente apenas pela simples inferncia de que ele no est se comunicando comas pessoas presentes ou reagindo a estmulos fsicos. Ora, a ausncia de algo noimporta necessariamente na sua extino. No h constatao direta de que o esta-do comatoso importa necessariamente em inconscincia. Ao contrrio, h casos em

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    que a pessoa, quando saiu do estado comatoso, revelou que no perdeu a sua cons-cincia e estava consciente do que acontecia ao seu redor.

    Com muita lucidez, Bozzano destacou a importncia do conhecimento prvio

    das potencialidades da mente humana como base indispensvel investigao dasobrevivncia do homem.

    Informou ainda Bozzano que os antigos magnetlogos sustentavam que to-dos os seus sonmbulos, quando em estado de sonambulismo, afirmavam a exis-tncia de Deus e a sobrevivncia da alma, embora em seu estado normal fossemmaterialistas e atestas.

    Argumentou Milan Rizl:A psicologia apresenta fortes argumentos de que existe realmente uma es-

    fera de regularidades no universo, que se estende alm da faixa de regularidadena esfera material. luz desses argumentos, completamente plausvel que apersonalidade humana exista em diferentes nveis e abranja tambm as partes

    componentes no materiais (conforme o afirmaram vrios filsofos e lderes reli-giosos da antigidade). Se essas partes componentes "mais elevadas existem re-almente, no necessrio que morram ao mesmo tempo com o corpo. Podem so-breviver. possvel tambm que tenham propriedades completamente diferentesdas que comumente atribumos aos "espritos". Entretanto, apenas podemos legi-timamente falar at ento dessa possibilidade. Procurar a prova ser o prximopasso - e indubitavelmente um passo muito difcil."

    Disse ainda:Determinar os limites da percepo extra-sensorial seria tambm impor-

    tante para a pesquisa sobre a sobrevivncia post-mortem. A menos que conhea-mos esses limites, no poderemos projetar um teste crucial para provar ou refu-

    tar a sobrevivncia post-mortem. At ento, no se encontram limites percep-o extra-sensorial e, conseqentemente, qualquer teste que se projete e quaisquerque sejam os resultados que se obtenham, a percepo extra-sensorial continuasendo uma hiptese suficientemente satisfatria que torna desnecessria a hip-tese sobre a sobrevivncia post-mortem.

    De acordo com este ponto de vista, tudo explicvel pela percepo extra-sensorial, embora no se saiba o que ela seja.

    Tal hiptese, segundo o princpio de Ockam, a mais econmica. Porm,podemos opor-lhe a seguinte objeo: se no sabemos ainda os limites da percep-o extra-sensorial, deveramos explicar todos os fenmenos psi pela percepo ex-tra-sensorial como se ela fosse ilimitada?

    J. B. Rhine foi mais otimista:Podemos dizer que a pesquisa de ESP faz diretamente surgir a questo dolugar da personalidade no sistema espao-tempo, oferecendo positiva indicao afavor da sobrevivncia. Se no tivesse havido nunca formulao anterior do pro-blema da sobrevivncia, ele teria surgido da pesquisa de ESP.

    Rupert Sheldrake, com base na sua teoria da ressonncia mrfica, concluiuque as lembranas no precisam estar armazenadas no crebro, visto que os orga-nismos sintonizam com organismos similares no passado e quanto maior for a si-militude entre eles maior ser a sua sintonia recproca. Argumentou que se as lem-branas no so armazenadas no crebro, no h motivo para que elas se deterio-rem com a decomposio do crebro. Assim, se o eu consciente no idntico ao

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    funcionamento do crebro, mas interage com ele atravs dos campos mrficos, en-to possvel que a conscincia permanea associada a esses campos mesmo de-pois da morte do crebro e conserve a capacidade de sintonizar seus prprios esta-

    dos passados. So esses "campos mrficos" que, segundo Sheldrake, organizammolculas, cristais, clulas, tecidos, organismos e sociedades de organismos. Assim,a memria de tudo o que existe se situa nestes "campos mrficos" e no em qual-quer nvel da matria.

    Observa-se existir uma tendncia para a impessoalizao do que chamamosde esprito. Estrutura informacional, energia consciente e campo substituram anoo abstrata de alma. Rupert Sheldrake anotou este fato:

    "O resultado que, agora, pensa-se que toda a natureza consiste em cam-pos e em energia. A energia, como matria aristotlica, pode existir sob muitasformas diferentes. Na fsica aristotlica, essas formas eram organizadas por al-mas; na fsica moderna, so organizadas por campos." Por isso, disse ele, mais

    adiante:"os campos da fsica moderna desempenham muitos dos mesmos papisque as almas desempenhavam nas filosofias animistas e pr-mecanicistas da na-tureza."

    Na pesquisa do transcendental, como veremos posteriormente, no se buscasaber apenas se o homem sobrevive morte, mas se o ser no qual se transformouainda guarda lembranas do ser que foi e, nesta condio, testemunha a existnciade uma realidade transcendental.

    Paul Davies argumentou:Podemos assim decidir rejeitar a crena de que a mente nada mais do que

    atividade celular do crebro, porque isso cair na armadilha reducionista. Con-tudo, parece que a existncia da mente apoiada por essa atividade, e assim sur-

    ge a questo de como podero existir mentes sem corpo. Recorremos de novo analogia: uma novela constri-se com palavras, mas a histria podia estar i-gualmente guardada oralmente em fita magntica, codificada em cartes perfu-rados, ou digitalizada num computador, por exemplo. Pode a mente sobreviver morte do crebro, sendo transferida para outro mecanismo ou sistema? Em prin-cpio, isto seria possvel.

    Poderamos igualmente questionar: tudo feito de partculas, mas de que feita uma partcula?

    Disse ainda Paul Davies:"J no podemos entender a mente referindo-nos a clulas nervosas, do

    mesmo modo que no podemos compreender clulas por simples referncia aos

    seus componentes atmicos. Seria ftil buscar a inteligncia ou a conscincia nomeio das clulas cerebrais individuais - o conceito no tem sentido neste nvel. claro, pois, que a propriedade da autoconscincia totalizante, e no pode atribu-ir-se a mecanismos eletroqumicos especficos do crebro."

    Paul Davies foi mais alm:"Apesar de algumas idias parecerem assustadoras, elas aumentam a es-

    perana de que se possa atribuir sentido cientfico imortalidade, porque real-am que o componente essencial da mente a informao. o padro interior aocrebro, e no o prprio crebro, que nos torna no que somos. Assim como aQuinta Sinfonia de Beethoven no deixa de existir quando a orquestra acaba detocar, assim tambm a mente pode suportar a transferncia da informao para

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    outro lado. Consideramos atrs que, em princpio, a mente pode ser colocadanum computador, mas se a mente basicamente "informao organizada", entoo meio de expresso desta informao pode ser qualquer coisa; pode no ser ne-

    nhum crebro em particular, pode nem mesmo ser qualquer gnero de crebro.Em vez de "espectros na mquina", assemelhamo-nos mais a "mensagens numcircuito", mensagem que transcende os meios de sua expresso."

    Como qualquer instrumento musical no causa da msica, a msica, porsua vez, no causa de qualquer instrumento musical. O instrumento musical omeio atravs do qual a msica pode manifestar-se como realidade fsica. A prpriapea musical que pode ser executada por centenas de instrumentos e de orquestras apenas a cpia da pea concebida pelo compositor. Assim como o nosso eu, re-produzido em milhares de imagens cinticas de si mesmo, no o nosso eu.

    Embora a personalidade esteja em permanente transformao, certos condi-ciona-mentos se mostram mais resistentes, prosseguindo inclumes s mudanas e

    acompanhando o indivduo at a sua morte fsica e possivelmente alm dela.Deepak Chopra apontou evidncias de que a memria do ser humano estcontida no apenas no crebro, mas tambm em todas as clulas.

    Alguns pacientes de transplante relatam uma experincia excepcional a-ps a recepo de um rim, fgado ou corao doados. Sem saber quem foi o doa-dor do rgo, comeam a participar de suas lembranas. Associaes que perten-ciam a outra pessoa comeam a ser liberadas quando os tecidos daquela pessoaso colocados dentro de um estranho. Em um caso, uma mulher acordou aps umtransplante de corao ansiando por beber cerveja e comer Chicken McNuggetsi;ela ficou muito espantada, porque jamais quisera nem uma coisa nem outra. De-pois que comeou a ter sonhos misteriosos nos quais um jovem chamado Timmy a

    procurava, ela veio a descobrir quem era o doador do seu corao, do qual s sa-bia que fora vtima de um acidente fatal de trnsito; quando entrou em contatocom a famlia dele, descobriu que se tratava de um rapaz chamado Timmy. A mu-lher ficou atnita ao descobrir que ele gostava muito de beber cerveja e fora atro-pelado quando voltava para casa vindo de um McDonald's.

    Em vez de procurar uma explicao no sobrenatural para tais fenmenos,pode-se v-los como uma confirmao de que nossos corpos so feitos de experi-ncias transformadas em expresso fsica. Tendo em vista que a experincia al-go que incorporamos (literalmente, "fazer entrar num corpo''), nossas clulas fo-ram instiladas com nossas lembranas; assim, receber as clulas de uma outrapessoa receber, ao mesmo tempo, as suas lembranas.

    Isto evidencia que a mente est inerente, em sua totalidade, em cada clulado nosso corpo. Logo, a mente no apenas crebro. Mente corpo e os fenmenosparanormais sugerem que ela est tambm alm do corpo. Todas as clulas, quemsabe tambm os tomos, esto impregnados de mente, mas no so a causa damente. Por isso, no de estranhar que as nossas clulas contenham memria denossa vida e, se transplantadas num rgo para outro organismo, passem a integrara memria de outra pessoa.

    As experincias realizadas com ratos revelaram que, no transplante de clu-las entre eles, ocorreu a transmisso de aprendizado.

    Acontece, porm, que estas clulas transplantadas em pouco tempo morreme, no entanto, transmitem essa memria s suas sucessoras. Reencarnao celular

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    ou simples questo hereditria? Alis, hereditariedade e reencarnao no seriam,a rigor, a mesma coisa: ou seja, conjunto de informaes e de tendncias que setransmitem de organismos a organismos?

    Somos, na verdade, um conjunto dinmico de informaes que se celulariza.Estamos pulverizados em todas as nossas clulas, e cada clula que nasce uma re-encarnao celular de ns mesmos. E, quando morremos e morrem todas as nossasclulas, porque no foram incorporadas, como tais, em outro organismo, este con-junto dinmico de informaes, que constitui o nosso ser, morre definitivamente.Parece-me que assim o ser se o conjunto dinmico de informaes se situar ape-nas a nvel celular, ou se esta estrutura informacional no puder subsistir por simesma.

    Se a memria do ser residir a nvel atmico, a morte celular no afetar oconjunto dinmico informacional. Mas onde estar essa memria: nos tomos ounas subpartculas?

    Se a memria humana se situar a nvel atmico, ela pode estar espalhada emtodas as partes, ou pode estar concentrada numa determinada regio do espao, oque poderia ser uma explicao para certos stios mal-assombrados.

    Larry Dossey, discutindo o problema da forma, argumentou:"O que, ento, controla as formas das coisas no-vivas, como os cristais, as

    rochas, ou a argila? Elas no possuem ADN, portanto outros fatores devem estarenvolvidos, tais como as foras atmicas intramoleculares, descritveis pela fsicamoderna. Nos cristais de quartzo, foras subatmicas internas fazem com quecertos ngulos de ligao sejam formados entre e dentro dos tomos e molculasconstituintes. Estas formas contribuem no s para as configuraes internas,mas tambm para o formato externo do cristal. Todas as molculas, dos seres vi-

    vos e no-vivos, so configuradas por essas foras."Mas, que foras sero essas seno foras no-fsicas, foras informacionais!Ou, numa linguagem analgica, campos informacionais. Assim, o que chamamosde "esprito" um campo informacional que gera a matria sobre a qual atua, desdea chamada matria bruta, ou sem vida, at a matria nobre, que o ser vivo.

    Roger Penrose, admitindo que certas idias matemticas "devem ter algumaforma de existncia intemporal, independente de nossos eus terrenos", argumen-tou que esta constatao abre "a possibilidade de um tipo etreo de existncia paraos fenmenos mentais".

    Ser a conscincia o modelo organizador de todas as formas, uma espcie dem no-fsico que congrega em torno de si as "limalhas" dos tomos, molculas e

    clulas?Uma boa observao de Penrose:"Talvez a mente inconsciente tenha realmente uma conscincia de si mes-

    ma, mas essa conscincia mantida em geral separada da parte da mente a quechamamos "ns"."

    A afirmao esotrica de que tudo mente no mais, portanto, destitudade sentido. Pelo contrrio. A mente parece ser a essncia de tudo o que existe e to-das as formas que existem so manifestaes mentais individualizadas, comuni-cando-se entre si, numa teia de informaes, onde a hereditariedade e a telepatiaso apenas alguns dos aspectos destas interaes. Por isto, Larry Dossey aduziu que"o nosso lugar no apenas onde estamos agora, mas em toda parte."

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    Logo, o que chamamos de ser um compsito dinmico de informaesformalmente expresso num campo operacional a que chamamos de corpo.

    O corpo a conscincia do ser individual no nvel da realidade onde ele se

    encontra. Sem corpo, no h conscincia, pois o corpo o ponto referencial do pro-cesso. Por isso, dizia, elegantemente, Merlau-Ponti que o corpo o nosso ancora-douro no mundo, o nosso meio geral de ter um mundo. O corpo o poder geral dehabitar todos os lugares do mundo. Assim, diz ele, ser sinnimo de estar situado.

    O corpo fsico que nos d conscincia no mundo fsico. Assim, o ST tam-bm tem seu corpo, que o veculo pelo qual ele percebe o mundo transcendental,o qual , para ele, a sua realidade. , ento, de se indagar se o ST pode tambmperceber o nosso mundo fsico, ou se somente o percebe quando interage psiqui-camente com um ser humano.

    Pietro Ubaldi argumentava que um organismo no pode ser criado a partirdas prprias clulas. Dizia ele:

    Cada uma das clulas, por mais que seja levada por hbitos e lembranasatvicas, a refazer um caminho j tantas vezes percorrido (a ontognese repete afilognese), no pode dirigir um trabalho de conjunto diferente do de cada uma,no pode possuir um conhecimento que supere as funes da prpria vida de cadauma.

    A mente no um epifenmeno do crebro. Humberto Maturana e Francis-co Varela, em acordo com o pensamento de Gregory Bateson, admitiam uma iden-tificao entre o processo do conhecer e o processo da vida. Segundo Maturana eVarela, o crebro no necessrio para que a mente exista. A bactria e a plantano tm crebro, mas possuem mente. Para eles, mente um processo de cognio,e o crebro, uma estrutura especfica onde este processo opera, embora o crebro

    no seja a nica estrutura onde a mente atua.J. B. S. Haldane argumentou que, se as nossas opinies so resultados dosprocessos qumicos do crebro, elas so determinadas pelas leis da qumica e noda lgica. Talvez um intransigente reducionista pudesse contra-argumentar, afir-mando que os processos lgicos tambm resultam das atividades bioqumicas docrebro.

    Alega-se que a mente uma "propriedade emergente" do crebro. Como ex-plicar que a essa "propriedade emergente" do crebro possa "emergir" em outro c-rebro, como ocorre na experincia teleptica?!

    Para Wilder Penfield, o mais alto mecanismo cerebral no passa de um men-sageiro entre a mente e outros mecanismos cerebrais. E exclama que uma "gran-

    de emoo descobrir que o cientista tambm pode, legitimamente, acreditar naexistncia do esprito".Alguns cientistas j admitem que a mente no tem localizao no espao e

    no tempo, no-fsica e, por isso, seu efeito no diminui com a distncia, no estconfinada ao crebro, nem produto dele, embora atue por seu intermdio.

    Steven Weinberg reconheceu a impossibilidade de trazer a conscincia parao mbito da fsica e da qumica.

    A mente o modelo organizacional da matria. Ela no o resultado dacomplexificao do crebro, mas o crebro a estrutura onde a mente melhor seexpressa.

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    Tudo, portanto, resultado de uma idia, e o que chamamos de abstrato araiz de tudo o que concreto. As coisas nada mais so do que materializaes deidias e sonhos bem sucedidos.

    Por outro lado, a mente pode tambm interagir com as prteses orgnicas.Lembra Rupert Sheldrake:

    "Del mismo modo que los fantasmas que surgen cuando se cortan oanestesian los nervios pueden separarse de un miembro de carne y hueso yfundirse con l de nuevo, los fantasmas pueden fundirse tambin con losmiembros artificiales. De hecho desempean un papel muy importante en laadaptacin de la gente a las prtesis mecnicas que sustituyen los miembros opartes de miembros perdidos."E, mais adiante:

    "En los amputados que no lhevan miembros artificiales, hay una tendenciaa que el fantasma se acorte. Pero, el uso de prtesis contrarresta eseacortamiento, y puede lograr incluso que un fantasma "encogido" vuelva a

    crecer."Coloca-se, de novo, a velha polmica: o rgo gera a funo ou a funo criao rgo? No primeiro caso, a extino do rgo redundaria na abolio da funo.No segundo caso, a extino do rgo no teria o mesmo efeito, ficando, porm, aquesto se, mngua do seu veculo de atuao, a funo, mais cedo ou mais tarde,tambm se extinguiria, a no ser que, de um modo ou de outro, gerasse um novorgo.

    O mesmo raciocnio se pode aplicar a questo mente-corpo. Se o corpo geraa mente, a imagem do corpo cria a mesma imagem da mente, ou seja, sua rplicafantasmagrica

    Se, ao contrrio, a mente o fator organizacional do corpo fsico este a i-magem do seu corpo psquico, e o estropiamento ou a morte do organismo em nada

    afetaria o organismo psquico. A experincia fora do corpo ou EFC parece ser umaevidncia da existncia deste corpo psquico, embora se possa argumentar que setrata de um corpo alucinatrio decorrente da imagem que, a nvel inconsciente,temos do nosso corpo fsico. Ora, se uma pessoa capaz de sentir seu membro fan-tasma, por que, em ocasies especiais, no poderia ver o seu corpo fantasma, desli-gado do corpo fsico?

    Se a mente um epifenmeno do crebro, o fantasma, como resqucio daimagem corporal, na ausncia definitiva deste, mais cedo ou mais tarde, se extin-guir. Mas se a mente autnoma, ou ela possui um corpo prvio ou criar a suaextenso psquica como substituto do corpo na ausncia definitiva deste.

    H os que afirmam que tudo matria e esta a causa da mente ou do esp-

    rito. E h os que apregoam que tudo mente ou esprito e a matria gerada porum deles. Por que no se optar por uma terceira posio? Mente e matria formamuma unidade indissolvel, onde a matria gera a mente e vice-versa. A mente comoinformao e a matria como expresso de tudo quanto existe. Assim, o que cha-mamos de corpo nada mais do que o campo operacional do ser. O corpo fsico apenas o espectro visvel deste campo operacional. Tudo o que existe tem forma,limite. Por isso, no podemos compreender o ilimitado, o infinito e, como conce-bemos Deus como o ilimitado, o infinito, no podemos compreend-lo.

    Se matria e mente ou esprito so aspectos operacionais complementaresdo ser, a matria uma fonte perene de informao, sustentando a mente e esta,por sua vez, gera permanentemente matria para a sustentao do campo opera-

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    cional do ser. Lembremo-nos, no entanto, que esta matria a que nos referimos no apenas a matria que conhecemos perceptualmente, mas a materialidade total doser, ou seja, o seu campo operacional.

    Sob este aspecto, o que chamamos de morte a cessao da operacionalida-de do ser num determinado espectro da matria, ou seja, da matria do nosso uni-verso fsico. Em outro nvel da materialidade, no caso no universo transcendental,o ser apresenta caractersticas operacionais diferentes das que ele apresentavaquando atuava no nosso mundo fsico. A morte no a extino do ser, mas a ces-sao de sua atividade neste universo. No h, portanto, que se falar em sobrevi-vncia, pois o ser total no o que sobreviveu da individualidade biolgica falecida,assim como, por analogia, o corpo no o que sobreviveu de um membro ou rgoque foi amputado. A nossa individualidade fsica com a sua materialidade especfi-ca apenas um aspecto do ser total com a sua plena materialidade operacional,porque, como veremos adiante, o ser processo, quando observado em seu aspecto

    fenomenolgico.A investigao parapsicolgica tem evidenciado que h, no ser humano, umelemento no-fsico capaz de agir sobre a matria, produzindo os fenmenos depsi-kapa. Este elemento no-fsico parece exercer uma ao autnoma em relaoao organismo com o qual interage, o que leva inferncia de que ele no seja afeta-do pela morte do corpo fsico. possvel, no entanto, que esta aparente ao aut-noma do elemento no-fsico seja apenas funcional, extinguindo-se, assim, com amorte do organismo.

    Em um dos nossos livros havamos observado:O nosso erro consiste em questionar o problema da sobrevivncia, referi-

    da aos parmetros de tempo e espao. O esprito no nasce quando, no veio de

    onde, no vive onde e no vai para onde, pois ele no uma entidade tempo-espacial. Logo, sob este aspecto, o esprito no sobrevive em algum lugar, quandodeixa de se relacionar com o universo tempo-espacial.

    Observamos ainda:Os espritos no existem para o nvel fsico da realidade. E, por outro lado,

    no podemos afirmar que eles existem em outro nvel da realidade, pois existir,para ns, um conceito centrado na realidade fsica. Assim, pelo fato de no exis-tirem segundo nosso modo de existir no importa na afirmao de que so irre-ais.

    Afirmamos tambm que poderamos conceber a sobrevivncia como um sin-gular processo de clonagem, o qual a estratgia dos microorganismos assexuados.

    E argumentamos, por analogia, que, se o nosso organismo continuamente se auto-replica a nvel celular, este processo pode ocorrer tambm a nvel transcendental,garantindo a sua continuidade, apesar de todas as transformaes que o ser possaexperimentar.

    Ian Wilson relata o seguinte caso que sugere a independncia da mente emrelao ao crebro:

    Este ponto ainda mais reforado pelos exemplos de pessoas que sofre-ram danos cerebrais srios e que, embora incapazes de falar ou controlar seusmovimentos, e talvez parecendo at imbecis, apresentaram poderes mentais to-tais, talvez at excepcionais, quando se pode encontrar uma forma de comunica-o com eles. Um deles foi Christopher Nola, de Dublin no Eire, cujo crtex cere-

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    bral sofrera danos to srios durante seu nascimento que no conseguia contro-lar seus movimentos, falar, andar, engolir apropriadamente, sentar sozinho ouat manter a cabea erguida durante um perodo muito longo. Durante a infn-

    cia, sua famlia achava que podia detectar sinais de inteligncia - ele s vezes erao primeiro a rir de piadas - mas foi apenas em 1977, quando Christopher tinha 11anos, que uma combinao de uma droga antiespstica e um dispositivo seme-lhante ao chifre de um "unicrnio" colocado em sua cabea permitiu que se comu-nicasse, apertando as teclas de uma mquina de escrever eltrica. Quando fez is-so, o que surgiu, aparentemente totalmente desenvolvido, foi um talento literriode uma maturidade que ia muito alm da que se esperava de uma criana normalde 11 anos. Sua autobiografia, publicada recentemente, Under the Eye of theClock, deixa clara a nitidez de sua mente, apesar de uma aparncia fsica to de-soladora.

    Para aqueles que defendem a hiptese de que a mente um epifenmeno do

    crebro, de se lhes indagar como um crebro danificado pode produzir uma men-te superior e como se explicar esta evoluo da mente em separado, dada a sua im-possibilidade de se expressar atravs de um mecanismo cerebral extremamente de-ficiente.

    Agostinho, no sculo V d.C., j havia advertido que o homem no apenasum ser biolgico, vivendo no mundo, mas possui um destino transcendental. O seudestino no se esgota no mundo, nem se explica pelo devir histrico, mas se projetaalm do mundo e da histria, numa dimenso sobrenatural.

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    CAPTULO II

    A TRANSCENDENTOLOGIA

    O que a Transcendentologia

    Se existe um paradigma cientfico para a investigao da realidade fsica, de fundamental importncia a tentativa de se elaborar um paradigma para o estu-do da realidade transcendental ou RT, utilizando subsdios das mais diversas reasdo conhecimento humano.

    Segundo David Bohm, o conhecimento sempre uma proposta. A Transcen-dentologia a proposta de um conhecimento interdisciplinar que tem por objeto ainvestigao da RT. Para isso, ela se utiliza da metodologia cientfica, da especula-o filosfica e das experincias msticas e medinicas para a investigao de fe-

    nmenos que sugerem a existncia deste outro nvel da realidade. Alis, Einstein jhouvera advertido: "A cincia sem a religio paraltica - a religio sem a cincia cega."

    A Transcendentologia tem por objeto:a) a investigao de fenmenos inslitos que possam ser atribudos a um

    AT;b) a especulao a respeito da RT com base nas informaes fornecidas pelo

    AT.Fenmeno transcendental o nome genrico de todos os tipos de interao

    entre o AT e o nosso universo fsico.A Transcendentologia postula a existncia de infinitos nveis da realidade,

    dos quais a realidade fsica apenas um deles e conceitua a RT como uma expres-so genrica para todos os nveis no-fsicos do real. Steven Weinberg, fsico teri-co e prmio Nobel, admitiu a possibilidade da existncia de um espao com mais detrs dimenses. E outro fsico, Saul-Paul Sirag, teorizou um nmero varivel de 48a 192 dimenses.

    Steven Weinberg reconheceu que talvez aquilo que hoje chamamos de leis danatureza varie de um subuniverso para outro. Hoyle tambm achava possvel queas constantes da Natureza variem de regio para regio, de modo que cada regiodo universo seria como um subuniverso. Ora, se tais leis podem variar na realidadefsica, por que no seriam diferentes na RT?

    Dividimos a Transcendentologia em duas partes: a Transcendentologia Ge-

    ral que estuda a RT como um todo e a Transcendentologia Especial que examinaquestes particulares da RT, como, por exemplo a investigao da sobrevivnciapost-mortemdo homem.

    A Transcendentologia, como estudo da experincia humana do transcenden-tal, vale-se dos subsdios experienciais de santos, msticos, gurus, mdiuns e xa-ms, sob as mais diversas formas de suas manifestaes, para elaborar especula-es e reflexes sobre as coincidncias significativas das experincias transcenden-tais. Examina, tambm, as diversas concepes religiosas sobre o mundo espiritual,destacando convergncias e analisando criteriosamente as divergncias, observan-do, ainda, as influncias dos fatores socioculturais e histricos.

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    A Transcendentologia postula que a vida no apenas um fato biolgico,mas transbiolgico e que, em ocasies especiais, existe uma interao entre os seresvivos ou biolgicos e os seres transvivos ou transbiolgicos.

    Postula, ainda, que o homem, aps a sua morte, se converte num tipo de sertranscendental, a que denomina de ser humano transcendental ou SHT e que, nestacondio, guarda resqucios do ser que j foi, revelando a conservao de um fatorsobrevivente ou FS.

    A Transcendentologia se apia nos seguintes postulados:a) A realidade transcendental, sendo no-fsica, ininteligvel pelas leis que

    governam a realidade fsica;b) A realidade transcendental povoada por seres transcendentais ou STs,

    que possuem uma natureza diferente da nossa e por seres humanostranscendentais ou SHTs, que so os espritos das pessoas falecidas.

    Denominamos de ST os seres que nunca viveram no universo fsico e, teori-

    camente, tambm os seres falecidos de outros mundos materiais.Em algumas ocasies, os STs e os SHTs entram em relao com a nossa rea-lidade fsica, utilizando-se dos mais diversos meios, como nas experincias msticase nas manifestaes medinicas.

    Denominamos de mediador biolgico ou MB o ser humano que, eventual-mente ou habitualmente, o meio interagente entre a realidade fsica e a RT. Po-rm, nem sempre o AT se vale do MB para agir sobre o nosso universo.

    Poder-se-ia argumentar que a Transcendentologia um Espiritismo refor-mado e, por isso, devemos desfazer esta aparente impresso.

    Gabriel Delanne, um dos grandes tericos do Espiritismo, assim o definiu:"O Espiritismo uma cincia cujo fim a demonstrao experimental da e-

    xistncia da alma e sua imortalidade, por meio de comunicaes com aqueles aosquais impropriamente se tm chamado mortos."E em outro trecho:"O Espiritismo no uma religio: no tem dogmas, nem mistrios, nem ri-

    tual. uma cincia de experimentao, da qual emanam conseqncias morais efilosficas."

    Embora semelhante proposta do Espiritismo, a Transcendentologia deledifere pelos seguintes motivos:

    a) A Transcendentologia no uma cincia, nem uma filosofia, nem umareligio, mas se vale dos subsdios destes tipos de conhecimento para ainvestigao da RT;

    b) A Transcendentologia se prope investigar a RT e no apenas a questoda sobrevivncia pessoal, admitindo a existncia de outros seres trans-cendentais que jamais passaram pela experincia humana, o que torna oseu objeto de estudo muito mais amplo do que o do Espiritismo;

    c) A Transcendentologia reconhece a impossibilidade de se demonstrar aimortalidade do ser individual, embora estimule a livre discusso sobre oassunto;

    d) A Transcendentologia investiga a RT, no se valendo apenas do testemu-nho de mdiuns espritas, mas de pessoas de outras religies que tam-bm tiveram experincias com ATs.

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    A rigor, as evidncias do transcendental so mais fortes do que as da sobre-vivncia do esprito humano. Por isso, algumas religies do passado concebiam ouniverso transcendental povoado de deuses e outros seres espirituais e no de esp-

    ritos de pessoas falecidas. A RT, portanto, pode existir independentemente da so-brevivnciapost-mortemdo homem.

    As mitologias e as religies mencionam encontros fantsticos entre homense seres transcendentais. E cultuam os heris, espcies de semideuses, porque filhosde um deus e de uma mulher e, por isso, dotados de poderes excepcionais. Os m-diuns e os santos milagreiros so, mutatis mutandi, sucedneos modernos dos he-ris mitolgicos.

    A RT, desde o incio, foi concebida como territrio do sagrado e morada deDeus, ou dos deuses, dos heris divinizados e, em alguns casos, de seres demona-cos.

    Algumas religies se transformaram em organizaes que administravam o

    transcendental, cuidando das relaes com a RT e instituindo, para isso, uma estru-tura burocrtica sacerdotal. Todos os negcios com o "Alm" comearam a ser ge-renciados pelos sacerdotes, tidos como representantes, na Terra, do universo trans-cendental.

    Porm, em paralelo com a organizao sacerdotal, vicejou uma casta de li-vres-atiradores do sagrado: as pitonisas, os mdiuns, os xams e os feiticeiros, ouseja, os especialistas do transe.

    Enquanto os sacerdotes tinham nas igrejas, nos templos e nas mesquitas oseu territrio do sagrado, os especialistas do transe firmavam este territrio nas su-as experincias com a RT.

    Porm, com os indcios de que os homens sobreviviam morte fsica e pas-

    savam a habitar a RT, o sagrado se profanizou. E o contato com o "Alm" no maisse resumiu a uma relao entre pessoas humanas e seres sagrados, mas entre pes-soas vivas e SHTs.

    Talvez a dessacralizao do transcendental tenha provocado uma compreen-siva reao da classe sacerdotal, negando a possibilidade da comunicao entre osseres humanos e os SHTs ou advertindo que esta comunicao estava proibida peladivindade.

    O misticismo, que a experincia do sagrado, cresceu em paralelo com ateologia, que a essncia do sacerdotal. O telogo o terico da religio e o zeladorda f organizada, enquanto o mstico o especialista do transe e o prtico da f, esua experincia nem sempre se concilia com a doutrina teologal.

    Joachim Wach afirma que a principal funo do sacerdote cultual. Ele oguardio de tradies e o protetor dos conhecimentos sagrados e da tcnica de me-ditao e orao. Ele o guarda da lei sagrada.

    Os profetas, os videntes e os mdiuns em muito se assemelham, pois todoseles passam por estados alterados de conscincia, apresentando, em alguns casos,manifestaes catalpticas. Cada qual, a seu modo, um veculo dos STs.

    O mago o tcnico do transcendental. Ele se julga competente para lidarcom as foras do sagrado e delas tirar o melhor proveito.

    Cada religio uma perspectiva da RT.So os STs mera projeo das necessidades dos homens, variando de cultura

    a cultura? Ou so seres reais?

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    O Xintosmo transformou ancestrais em deuses. A religio romana cultuavaos manes, ou seja, os ancestrais falecidos.

    Os santos catlicos so considerados como tais, no apenas por suas vidas

    exemplares, mas tambm por seus feitos miraculosos. Presume-se que eles so ve-culos da Divindade para operar prodgios no universo fsico.

    Mas os santos, quando falecem, tambm se tornam intercessores das neces-sidades dos homens. Eles so invocados por seus devotos, chegam, supostamente, aaparecer a alguns deles e, por isso, em nada diferem do papel dos espritos no aten-dimento s necessidades dos homens.

    No sculo XV d.C., Jacques de Jterborg ou de Paradis, abade cisterciensede Paradis, escreveu o Tratactus de animabus exutis a corporibus, onde afirmouque as aparies dos mortos caracterizam a cristandade, enquanto as aparies dedemnios se referem aos sarracenos e judeus.

    Moiss manteve vrios contatos com Iav e dele recebeu o Declogo.

    Al e o anjo Gabriel ditaram o Alcoro para Maom.Joseph Smith fundou a religio dos Mrmons com base nas revelaes quelhe foram feitas pelo anjo Moroni.

    A Igreja Catlica fala de seres no-fsicos anjos e demnios -, que nuncaforam humanos.

    As primeiras religies que se referiram existncia dos anjos foram o Zoro-astrismo e o Judasmo e, posteriormente, o Catolicismo e o Islamismo.

    No Conclio de Nicia, em 325 d.C., a crena nos anjos foi declarada comoum dogma da Igreja. A Patrstica reconheceu que se tratava de matria de especu-lao teolgica.

    Com Dionsio, o Areopagita, no sculo VI, a angeologia catlica assumiu a

    sua forma clssica. Ele classificou os anjos em trs hierarquias: a) a dos Serafins,Querubins e Tronos; b) a dos Domnios, Virtudes e Potestades; c) e a dos Principa-dos, Arcanjos e Anjos.

    No sculo XIII, Toms de Aquino dedicou quatorze livros de sua SummaTheologica natureza e poderes dos anjos, dando um tratamento sistemtico a an-gelologia.

    Os telogos catlicos da Patrstica e da Idade Mdia discutiam constante-mente se os anjos eram ou no seres corpreos. Orgenes e Duns Scotus sustenta-ram que os anjos possuam um corpo sutil ou etreo. E Toms de Aquino, em posi-o oposta, argumentou que os anjos eram seres espirituais e, por isso, no eramcorpreos, embora pudessem assumir um corpo, quando em contato com o mundo

    material.Tertuliano e So Baslio diziam que os anjos tm um corpo que lhes pr-prio e que eles tm o poder de transfigur-lo momentaneamente em carne humana,a fim de se fazerem visveis aos homens. Por sua vez, Santo Agostinho ensinava queos anjos devem ter um corpo ao qual no esto submetidos, podendo dar-lhe aforma que queiram.

    Santo Hilrio ensinava que nada existe na criao que no seja corporal, se-jam coisas visveis ou invisveis. Assim, as almas, estejam ou no ligadas a um cor-po tm uma substncia inerente (diramos, uma "materialidade") sua natureza.

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    E So Cirilo de Alexandria argumentava que somente Deus um ser incor-preo e, por isso, todos os seres individuais so necessariamente corpreos, aindaque seus corpos no se assemelhem ao nosso.

    Para o Islamismo, os anjos possuem formas celestiais, mas tambm podemassumir a forma humana, quando aparecem no universo fsico.

    Emanuel Swedenborg, no sculo XVIII, afirmou ter tido contato com os an-jos e escreveu sobre eles e o mundo espiritual. Afirmou que os anjos no sabem oque o tempo.

    Em nossos dias, diz-se que o Padre Pio sugeria s pessoas que, se no pudes-sem ir a ele, enviassem, em seu lugar, o seu anjo da guarda. Alm de receber os an-jos da guarda dos seus fiis, Padre Pio tambm encaminhava o seu anjo guardio spessoas que necessitassem de seu auxlio.

    Em algumas obras medinicas de Francisco Cndido Xavier, h refernciasexplcitas aos seres da natureza.

    Pietro Ubaldi sustentava a existncia de entidades que jamais viveram naTerra ou que, por serem to elevadas, habitam em dimenses conceptuais e planosde conscincia superiores. Dizia ele que as entidades elevadas jamais se definemem sentido humano, no constituindo centros individuais de pensamento, mas cor-rentes de pensamentos ou nores, nas quais elas vivem numa forma de existnciacoletiva. Este tipo ubaldiano de ST , portanto, ultra-individual, formando um cen-tro de conscincia comum, onde no faz sentido a identidade individual.

    O SHT Frederic Myers, no livro "O Caminho da Imortalidade", psicografadopor Geraldine Cummins, afirmou a existncia de uma alma-grupo, constituda denmero varivel de espritos, agindo e reagindo reciprocamente na escala ascensi-onal da evoluo psquica.

    Os STs "Lazaris", "Seth Dois", "Michael" e "Ra" afirmam que so seres gru-pais. Assim, analogicamente, eles se assemelham s "nores" de Pietro Ubaldi.Alguns MBs afirmam que tambm so intermedirios de outros seres trans-

    cendentais e no apenas de SHTs, embora as evidncias dessa assertiva ainda se-jam extremamente frgeis.

    Santos e msticos cristos relatam seus encontros com seres angelicais e suasdisputas com seres demonacos.

    A ao do SHT sobre o mundo material , portanto, admitida pelo Catoli-cismo e pelo Espiritismo, seja pela intercesso dos santos, seja pela comunicaodos espritos.

    Investigao do SHTPara se investigar se um fenmeno inslito produzido por um SHT, ne-

    cessrio que, por intermdio deste meio de comunicao com o mundo material,ele utilize o seu FS, fornecendo informaes a respeito de si mesmo e que sejampassveis de comprovao e refutao.

    Assim, s podemos constatar a continuidade do ser humano na condio deSHT, com fundamento no seu FS, ou seja, no que ele foi e no no que ele , pois oque ele , inverificvel. O SHT, na sua comunicao, ter, pois, de revivenciar oser humano que ele foi e talvez nem sempre seja feliz nesta tentativa, podendo sertrado por falhas de sua memria.

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    O que a mente depois da morte do crebro, agora que ela perdeu todos osreferenciais com o universo fsico? Esta mente, ou conscincia, guardaria as mes-mas caractersticas de sua antiga vida fsica? Em caso afirmativo, por quanto tem-

    po?Aksakof observou que a identificao do esprito s possvel mediante um

    esforo da memria para reconstituir os traos da personalidade terrestre. Esse es-foro, diz ele, torna-se cada vez mais difcil, pois a lembrana da personalidade ter-restre deve desaparecer, cada vez mais, com o tempo, o que torna rarssimos e maisou menos defeituosos os casos comprobatrios desse gnero.

    Evocar quem morreu realmente evocar quem no mais existe.O grande problema reside em saber se o ser que se ausentou operacional-

    mente do nosso universo fsico mantm e por quanto tempo memria e interesseem relao aos seres e coisas do nosso mundo material com os quais interagiu noseu aspecto de individualidade biolgica.

    difcil identificarmo-nos com o que j no somos, pois no podemos pen-sar e sentir como a pessoa que, h muitos anos, deixamos de ser. Por isso, em rela-o ao nosso mundo, o FS o ontem que no mais existe, pois o SHT outra iden-tidade que no conhecemos nem podemos conhecer, pois habita uma realidade di-ferente da nossa. Logo, o SHT no pode comunicar-nos o que ele , mas o que elefoi, o seu FS, e, mesmo assim, nem sempre com a fidelidade desejvel para o seureconhecimento. Por viver num mundo fundamentalmente diferente do nosso, elenunca nos poder fornecer uma noo satisfatria do mesmo, ainda que usando demetforas.

    Como nada imutvel na natureza, a personalidade tambm no o . Logo, oSHT, mesmo que conserve parte da personalidade que morreu, poder modificar-

    se, depois de algum tempo, radicalmente, em razo de sua permanncia em outronvel da realidade. Com a extino total do FS, o SHT passar assim a ser um novoser e, nesta condio, nada mais ter em comum com a pessoa que faleceu.

    J afirmava Pietro Ubaldi que, embora sobrevivendo, a personalidade hu-mana deve experimentar mutaes que lhe fazem perder seus atributos humanos,seus sinais de identificao psquica e as caractersticas que lhe eram prprias noambiente terrestre.

    Paul Davies tambm de opinio que a personalidade no sobrevive na suatotalidade, porque uma grande parte das nossas faculdades est ligada s necessi-dades e capacidades do corpo. O Espiritismo kardecista j fazia esta mesma afirma-o.

    Uma comunicao de um ST denominado "Tcnico" refora essa suposio:Evidentemente, o mundo dos espritos conhece sentimentos; mas estes sototalmente diversos dos sentimentos humanos: no podem ser descritos com suaspalavras, nem comparados com as emoes e os sentimentos humanos".

    Charles Tart observou no ser provvel que venhamos a despertar, depois damorte, mantendo intacto o nosso habitual sentido do eu, porque o nosso eu poderiavir a ser, depois da morte, muito diferente daquilo que ele no estado de viglia.

    Wately Carrington tambm admitia a sobrevivncia pessoal, mas com reser-vas quanto sua forma:

    "Quiero decir por esto que no tengo humanamente hablando ninguna dudade que el hombre sobrevive a la muerte en cierto sentido y hasta cierto punto,

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    pero no estoy ni de lo uno ni de lo otro, ni lo que significa la supervivencia, ni eltiempo que puede durar."

    As experincias de memria extracerebral sugerem que o SHT pode retornar

    vida fsica como ser humano, conservando o seu FS de algumas vidas passadas. Oque se questiona se todos os SHTs voltam uma vez ou vrias vezes condiohumana e se aqueles que retornam, (pois no se sabe se todos retornam) preser-vam o seu FS, ao menos de sua ltima vida passada.

    Na pesquisa do SHT, procura-se investigar no apenas se ele ainda guardalembranas do ser humano que j foi, mas se ainda mantm interesse em relaoaos seres e coisas do mundo material com os quais interagiu, quando era fisicamen-te vivo. possvel que a grande maioria dos SHTs no tenha esse interesse, pois,afinal, para que eles deveriam provar que continuam sendo a pessoa que morreu,se eles agora so um novo ser?!

    Muitas pessoas que passaram pela experincia da quase-morte ou EQM a-

    firmaram que perderam seu interesse pela vida material e desejavam no mais vol-tar vida fsica.Camilo Flammarion j havia observado que os mortos se comunicam com

    mais freqncia nos primeiros dias aps a morte e que a freqncia das comunica-es vai rareando com o passar do tempo at a sua extino total.

    Modernamente, os fenmenos denominados de transcomunicao instru-mental ou TCI demonstraram que pessoas falecidas, na maioria das vezes, se co-municam com parentes e amigos no perodo de 24 horas depois de sua morte.

    Embora evidenciada a existncia do FS no SHT, deixamos em aberto a dis-cusso do problema da existncia do FS em animais, conforme relatos de algumascomunicaes medinicas e de experincias xamnicas.

    Aqui, devemos lembrar a distino entre AP e MB. O AP a pessoa que ma-nifesta fenmenos paranormais e o MB aquela que constitui o meio orgnico peloqual os SHTs agem sobre o universo fsico, produzindo fenmenos transcendentais.Por conseguinte, a Transcendentologia lida com os MBs por eles serem um dos e-lementos fundamentais para a investigao da RT.

    As informaes fornecidas pelo AT sobre a RT no so adequadas investi-gao cientfica, pois no h como comprov-las ou refut-las. No entanto, o ma-terial de que dispomos, apesar de sua complexidade e pouca confiabilidade, paraelaborar um modelo, mesmo precrio, da RT.

    No sculo passado, Allan Kardec havia advertido que os Espritos no possu-am nem a plena sabedoria, nem a cincia integral e que todo saber de que dispu-

    nham se circunscrevia ao seu grau de evoluo. Portanto, tudo o que eles diziamtinha o valor de uma opinio pessoal. E cautelosamente ressaltou que a possibili-dade e exatido das comunicaes no dependiam do mdium nem do Esprito.

    Aksakof asseverou que as comunicaes medinicas no nos podem dar no-o alguma razovel acerca do mundo espiritual e de seus habitantes, pois o mundotranscendental uma concepo to incomensurvel para o mundo fenomenalquanto a idia da quarta dimenso. Por isso, disse ele, no podemos formar qual-quer juzo a seu respeito.

    A investigao transcendentolgica, no entanto, admite a possibilidade de seelaborar um modelo unificado e coerente da RT, no como dogma religioso, mas

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    como paradigma epistemolgico, suscetvel de desdobramentos, aprofundamentose revises, em face da prpria dinmica da realidade.

    Se marchamos para uma teoria unificada da realidade no universo fsico,

    no podemos excluir, desta tentativa de unificao, a RT por mais complexa que elaseja.

    Classificao dos fenmenos transcendentais

    H dois tipos de fenmenos transcendentais:a) fenmenos transcendentais subjetivos;b) fenmenos transcendentais objetivos.Os fenmenos transcendentais subjetivos so aqueles em que o SHT interage

    telepaticamente com o MB, o qual, na maioria das vezes, transmite a sua mensa-gem por psicografia, sob forma personificativa ou no.

    Eles se apresentam sob as seguintes modalidades:a) comunicao transcendental subjetiva (telepatia e comunicao trans-cendental subjetiva personificativa);

    b) apario subjetiva;c) percepo transcendental (clarividncia, experincia fora do corpo ou

    EFC e experincia de quase-morte ou EQM);d) cognio transcendental (memria extracerebral, xenoglossia e criativi-

    dade psi).Os fenmenos transcendentais objetivos so aqueles em que o SHT se co-

    munica com os seres humanos ou age sobre o mundo fsico, utilizando, quase sem-pre, os recursos orgnicos do MB. Suas modalidades so as seguintes:

    a) ao transcendental (escrita direta ou pneumatografia, pintura ou dese-nho diretos, escotografia, telecinesia, levitao, "poltergeist", curas trans-cendentais e metafanismo);

    b) comunicao transcendental objetiva (voz direta ou pneumatofonia etranscomunicao instrumental ou TCI);

    c) apario objetiva.A apario a forma pela qual um SHT percebido por uma s pessoa (fe-

    nmeno transcendental subjetivo) ou por vrias pessoas simultaneamente (fen-meno transcendental objetivo).

    No primeiro caso, a apario denominada de apario subjetiva, porqueresulta de uma alucinao teleptica visual produzida pelo SHT sobre uma pessoa.

    No segundo caso, a apario denominada de apario objetiva, porque oSHT se apresenta, sob forma fsica, podendo realizar diretamente aes fsicas einclusive tocar e ser tocado pelas pessoas. Este fenmeno que, em Parapsicologia,denominamos de personificao objetiva, conhecido, no Espiritismo, pelo nomede materializao.

    Nos fenmenos transcendentais subjetivos, o SHT se comunica indiretamen-te, atravs de um MB, com os seres humanos, seja falando (psicofonia), seja escre-vendo (psicografia), seja pintando (psicopictografia), seja compondo msicas (psi-comusicografia). Ele pode identificar-se e fornecer as informaes que comprovemo seu FS.

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    Nos fenmenos transcendentais objetivos, o SHT se comunica diretamentecom os seres humanos, ora se tornando fisicamente visvel (apario objetiva), orafalando (voz direta), ora escrevendo (escrita direta), ora pintando (pintura direta)

    ora imprimindo sua imagem em pelcula fotogrfica (escotografia), ora se utilizan-do dos meios eletrnicos (transcomunicao instrumental).

    H fenmenos que podem ser considerados transcendentais subjetivos, por-que sugerem a ao autnoma da mente em relao ao organismo e a sua interfacecom a RT, como as EFCs e as EQMs. Tambm a memria extracerebral se incluinesta categoria. Estes fenmenos constituem indcios da sobrevivncia post-mortemdo ser humano, favorecendo a hiptese do SHT, assim como da existnciade uma possvel RT.

    H fenmenos que podem ser considerados transcendentais objetivos, por-que parecem ultrapassar as potencialidades do ser humano e, por isso, sugerem ainterveno do AT no universo fsico. Esses fenmenos so o metafanismo, a levita-

    o e certos tipos de telecinesia e de "poltergeist", como tambm as curas espiritu-ais ou "milagrosas". medida que os fenmenos inslitos sejam ser melhor explicados pelo AT,

    eles passam categoria de transcendentais. Teremos, porm, de admitir a existn-cia de fenmenos inslitos mistos que so aqueles que podem ser explicveis tantopela Parapsicologia como pela Transcendentologia.

    As interaes entre a realidade fsica e a transcendental

    Admitida a existncia da RT, temos de discutir como uma realidade no-fsica pode interagir com a realidade fsica, j que ambas possuem propriedades

    to diferentes.No sabemos como a mente influi sobre o organismo e, ainda muito menos,sobre o mundo exterior, como acontece nos fenmenos de psi-kapa, e, por isso, a-penas conjeturamos como um ser no-fsico pode atuar sobre o universo fsico. Po-demos postular que a relao matria e mente seja a mesma entre matria e energi-a. Matria no seria apenas energia, mas tambm mente congelada. Ou ser que,na verdade, mente, energia e matria formam uma trindade, interagindo entre siem converses recprocas?

    Yajnavalkya afirmava que entre a matria e a mente s h diferena de grau.O ocasionalismo, representado por Geulincx e Malebranche sustentava que

    tudo o que ocorre no universo "ocasio" para que Deus intervenha nele. Na ver-dade, a relao entre matria e esprito um contnuo milagre de Deus do qual so-mos meros espectadores.

    Conforme Malebranche, inexiste comunicao entre mente e corpo. Por isso,o esprito se encontra impossibilitado de tomar conhecimento do que se passa nomundo. Mas, como existe em Deus as idias de todas as coisas e Ele est imanenteem todos os espritos, podemos tomar conhecimento, atravs d'Ele, do que aconte-ce no mundo. Estes acontecimento no so causais, mas sincrnicos. Compare-seesse princpio da sincronicidade na teoria das mnadas de Leibniz, na teoria do o-casionalismo de Geulincx e Malebranche e, modernamente, na teoria da sincroni-cidade de Jung.

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    Jung admitiu a possibilidade de que a relao entre a alma e o corpo seja denatureza sincrnica, porque " difcil ver como processos qumicos sejam jamaiscapazes de produzir processos psquicos" e como uma psique imaterial possa mo-

    vimentar a matria.J. B. Rhine admitiu que a telepatia e a psicocinesia constituem o meio de

    comunicao entre os seres da realidade fsica e da RT.Poder-se-ia argumentar da dificuldade quase intransponvel de se distinguir

    se a mente de uma pessoa viva que, a nvel inconsciente, est produzindo fen-menos psi, ou se um SHT que est manipulando o inconsciente desta pessoa.

    Se a interao entre o SHT e o ser biolgico uma relao mente a mente ese a ao psquica capaz de produzir modificaes na matria, inclusive modelan-do formas, por que no poderia o SHT agir psiquicamente sobre o mundo material,ainda que com o auxlio energtico de um MB?

    Descartes asseverou que a interao entre o esprito e a matria era mediada

    pela glndula pineal. E sculos depois, em mensagem psicografada pelo mdiumFrancisco Cndido Xavier, a epfise ou glndula pineal foi destacada por apresentaro papel mais importante no exerccio medinico de qualquer modalidade.

    Alguns pesquisadores acreditam que o lobo temporal direito do crebro nospermite perceber outras realidades e, talvez, penetrar nelas. Michael Schroeter, fi-lsofo e cientista da Universidade de Heidelberg, Alemanha, admite que o lobotemporal direito a rea do crebro onde ocorre a interao entre a mente e o cor-po.

    David Bohm, entrevistado por Rene Weber, asseverou que talvez a consci-ncia seja uma forma mais rarefeita de matria e movimento, um aspecto mais sutildo holomovimento. Isto posto, admissvel que um SHT possa influenciar, telepa-

    ticamente, a mente de um MB, induzindo-a a agir sobre o seu prprio organismoou sobre o mundo exterior, exercer uma ao sobre o universo fsico, utilizando aenergia orgnica do MB, ou, ainda, agir diretamente sobre a matria.

    Na concepo religiosa, a comunicao entre os dois mundos se processa a-travs dos estados alterados de conscincia ou, de maneira mais ostensiva, nos fe-nmenos de "incorporao" ou de "possesso". No h, na verdade, uma incorpo-rao ou mesmo possesso, pois no se trata de ocupao de um corpo, mas deuma conexo com o mesmo. A mente no pode ocupar o corpo, pois o que no-fsico no pode ocupar um lugar no espao, no caso, o organismo. No sabemos,ainda, como a mente se interconecta com o corpo e, por isso, tambm ignoramoscomo outra mente pode faz-lo, estabelecendo duas conexes simultneas.

    A comunicao entre o universo fsico e o transcendental recebeu um novonome: chanellingou canalizao.Jon Klimo definiu a canalizao ou chanellingcomo o "processo de receber

    informao de algum nvel da realidade diverso do nvel fsico comum ou de forado eu como o entendemos normalmente". A canalizao "inclui mensagens dequalquer fonte mental que seja externa conscincia ou inconsciente normal doindivduo, no se tratando de nenhuma outra pessoa encarnada no nvel fsico darealidade".

    Segundo Bozzano, alguns SHTs informaram que, "quando se acha imersona "aura" vitalizante do mdium, o Esprito volve, por instantes, s condiesterrrestres, o que faz que no seu sensrio automaticamente se reavivem os senti-

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    mentos emocionais e as particularidades que se produziram na ltima crise trgi-ca de sua existncia planetria" e disto resulta na sua impossibilidade de evitarque essas emoes sejam transmitidas ao MB.

    Podemos teorizar que, quanto menor se torna esta conexo, mais a mente seafasta do corpo, diminuindo a sua ao sobre ele e, em conseqncia, sofrendomenos a sua influncia. Neste estado, a pessoa perceberia, superpostamente, a rea-lidade fsica e a realidade espiritual como se fossem uma s, observando, ao mesmotempo, seres humanos e SHTs. No extremo deste afastamento, ela no mais per-ceberia a realidade fsica, mas apenas a transcendental e, assim, em algumas situa-es, teria a impresso de que morreu.

    As descries de George Ritchie, enquanto estava clinicamente morto e an-dava por alguns lugares da Terra, confirmam as mensagens medinicas de Francis-co Cndido Xavier sobre as atividades de SHTs ainda ligados vida fsica, tentandoinutilmente exercer atividades materiais, mas conseguindo influenciar pessoas.

    Nesta viagem extracorprea, Ritchie estava sendo guiado por um Ser de luz, possi-velmente um ST.Na prtica, h uma extrema dificuldade de se distinguir se a mente de uma

    pessoa que, a nvel inconsciente, est produzindo fenmenos psi, ou se o seu in-consciente que est sendo manipulado por um SHT.

    Parece evidente que a mente, quando ainda est vinculada ao universo fsico,sofre sua influncia e est submetida s suas leis. Ora, se no sabemos o que men-te, na sua interao com o organismo biolgico, tambm ignoramos o que ela seja,uma vez desligada definitivamente do universo fsico e em seu habitat natural. Por-tanto, no podemos avaliar a capacidade do desempenho do SHT nas suas relaescom o universo material.

    Porque vivemos num universo material, temos a propenso de tentar expli-car todos os fenmenos psquicos luz das leis da Fsica ou como alteraes bio-qumicas do crebro.

    Podemos, metaforicamente, falar num espao da conscincia, mas no daconscincia ocupando um lugar no espao. Podemos observar indiretamente a aopsquica por seus efeitos sobre os organismos e a matria em geral, como tambmmensur-los. Na verdade, tratamos a conscincia como se fosse algo fsico paratorn-la inteligvel no universo sensorial, embora saibamos que se trata apenas deum recurso analgico, de uma estratgia pedaggica, de um expediente simblico.E, por isso, falamos em peso da conscincia, em conscincia leve ou pesada. Afinal,qual a forma, a cor, o aroma, a contextura da conscincia? O poeta poder melhor

    compreend-la com as suas metforas do que o cientista com os seus instrumentosde medio. Alis, tambm os cientistas se do ao luxo de usar metforas, quandodefinem cor e sabor nos quarks. A rigor, qual a materialidade das partculas at-micas, fundamento da materialidade das coisas fsicas?

    Umas das questes fundamentais da Transcendentologia a aptido do SHTde agir sobre o universo fsico. Por isso, poderemos questionar se o SHT:

    a) mantm as mesmas aptides de agir sobre o mundo fsico como o faziaquando era um ser humano;

    b) mantm estas aptides, porm reduzidas e dependentes das condiesmedinicas de uma pessoa viva;

  • 7/25/2019 A Realidade Transcendental (Valter Da Rosa Borges)

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    c) apresenta aptides maiores de agir sobre o mundo fsico do que qualquerser humano.

    No sabemos se um SHT tem um poder maior, menor ou igual ao que um

    ser humano possui de agir sobre o universo fsico. Se, em determinadas circunstn-cias, o SHT parece ter sua ao sobre o mundo fsico submetida s condies medi-nicas de uma pessoa, em outras, demonstra um conhecimento superior e uma ca-pacidad