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1 Universidade Federal do Rio de Janeiro A REFERENCIAÇÃO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO Letícia de Lima Tupper

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1

Universidade Federal do Rio de Janeiro

A REFERENCIAÇÃO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO

Letícia de Lima Tupper

2

Faculdade de Letras / UFRJ

2013

A REFERENCIAÇÃO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO

Letícia de Lima Tupper

Rio de Janeiro

Abril de 201

Rio de Janeiro

Junho de 2013

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Letras Vernáculas da

Universidade Federal do Rio de Janeiro como quesito

para a obtenção do Título de Mestre em Letras

Vernáculas (Língua Portuguesa).

Orientador: Profa. Doutora Leonor Werneck dos

Santos

3

A Referenciação nos Livros Didáticos de Ensino Médio

Letícia de Lima Tupper

Orientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras

Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas.

Examinada por:

______________________________________________ - Orientadora

Presidente, Profa. Doutora Leonor Werneck dos Santos – UFRJ

_________________________________________________

Profa. Dra. Mônica Magalhães Cavalcante

_________________________________________________

Profa. Dra. Rosa Maria Cuba Riche

_________________________________________________ - Suplente

Profa. Dra. Cláudia de Souza Teixeira

_________________________________________________ - Suplente

Profa. Dra. Regina Souza Gomes

Rio de Janeiro

Junho de 2013

4

Tupper, Letícia de Lima.

A Referenciação nos Livros Didáticos de Ensino Médio/ Letícia de Lima

Tupper. Rio de Janeiro: UFRJ / Faculdade de Letras, 2013.

xiv, 137f.: il.

Orientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Dissertação (mestrado) – UFRJ/ Faculdade de Letras/ Programa de Pós-

graduação em Letras Vernáculas, 2013.

Referências Bibliográficas: f. 132-137.

1. Referenciação 2. Linguística de Texto. I. Santos, Leonor Werneck dos. II.

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-

graduação em Letras Vernáculas. III. A Referenciação nos Livros Didáticos de

Ensino Médio.

5

SINOPSE

Análise da abordagem

teórica e das propostas de

atividades sobre os processos

referenciais em Livros

Didáticos de Português de

Ensino Médio aprovados

pelo PNLEM/2009 e pelo

PNLD-EM/2012.

6

RESUMO

A REFERENCIAÇÃO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO

Letícia de Lima Tupper

Orientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação

em Letras Vernáculas, Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro -

UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras

Vernáculas.

Considerando a referenciação como um processo essencial para a produção e

compreensão de textos, esta pesquisa visa investigar de que maneira os livros didáticos

de português, muitas vezes o único material de consulta do professor de língua materna,

abordam o tema da referenciação – amplamente estudado por autores como Koch (2004,

2005, 2007, 2008), Cavalcante (2011), Koch e Elias (2007, 2009), Marcuschi (2008),

entre outros. Observaremos, principalmente, se esses manuais abordam a referenciação

e se a associam à análise linguística, à produção textual e à leitura. Restringimos nossa

análise aos manuais voltados para o Ensino Médio aprovados pelo Programa Nacional

do Livro Didático, comparando as coleções aprovadas em 2009 (PNLEM) e 2012

(PNLD/EM). Essa comparação permitiu verificar alguns avanços na abordagem da

referenciação, o que julgamos ser o reflexo do progresso dos estudos linguísticos,

principalmente aqueles referentes à Linguística de Texto, nosso principal aporte teórico.

Contudo, ainda há muito a ser feito para associar coerentemente esse mecanismo à

organização textual. Por meio desta análise, é possível ter uma amostra da abordagem

da referenciação nos livros didáticos de Ensino Médio, que se reflete,

consequentemente, no trabalho do professor nas salas de aula de Língua Portuguesa.

Palavras-chave: Referenciação; coesão textual; Linguística de Texto; livro didático de

português; PNLEM 2009; PNLD-EM 2012.

Rio de Janeiro

Junho de 2013

7

ABSTRACT

THE REFERENCIATION IN HIGH-SCHOOL BOOKS

Letícia de Lima Tupper

Guideline: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Abstract of the Master’s dissertation submitted to Programa de Pós- Graduação

em Letras Vernáculas, Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro –

UFRJ, as part of requirements for obtaining the title of Master in Vernacular Letters

(Portuguese Language).

Considering the referenciation as an essential process for the production and

comprehension of texts, this research aims at investigating the way that Portuguese

Schoolbooks, which is, most of the times, the only material native language teachers

consult, approach the issue of the referenciation – widely studied by authors such as

Koch (2004, 2005, 2007, 2008), Cavalcante (2011), Koch and Elias (2007, 2009),

Marcuschi (2008), among others. We will observe, mainly, if these manuals approach

the referenciation and make any link with linguistic analysis, writing or reading. We

have restrained our analysis to schoolbooks designed to High-school grades which have

been approved by Programa Nacional do Livro Didático, comparing them with the ones

approved in 2009 (PNLEM) and 2012 (PNLD/EM). This comparison allowed us to

notice some advances related to the referenciation approach, which, we suppose, is a

reflection of the linguistic studies’ progress, especially those concerning the Text

Linguistics, our main theoretical support. Even though, there is still a lot more to be

done to coherently associate this mechanism to the textual organization mechanism.

Through this analysis, it is possible to have a sample of the referenciation approach in

High-school books, which reflects, consequently, in teacher’s work in his Portuguese

lessons.

Keywords: Referenciation; Text cohesion; Text Linguistics; Portuguese Schoolbooks;

PNLEM 2009; PNLD-EM 2012.

Rio de Janeiro

Junho de 2013

8

À minha avó Laurinda e ao meu marido Rodolfo.

9

AGRADECIMENTOS

E aprendi que se depende sempre

De tanta, muita, diferente gente

Toda pessoa sempre é as marcas

Das lições diárias de outras tantas

pessoas.

(Gonzaguinha)

Confesso que, pela primeira vez na vida, cheguei a pensar que teria que deixar

algo pela metade. Em muitos momentos, acreditei que não seria capaz. Contudo, outras

forças me faziam crer que eu estava no caminho correto e que tudo daria certo ao final.

A maior dessas forças foi Deus, que sempre esteve ao meu lado, me oferecendo

potencial físico e intelectual para superar todos os obstáculos desse caminho, por isso a

Ele agradeço primeiramente.

Agradeço aos meus pais, os primeiros responsáveis por me inserirem nesse

maravilhoso mundo das Letras e delas fazer minha profissão.

Aos meus queridos irmãos, Victor, Victória e Luiza, pelos quais eu batalho

para ser uma pessoa melhor, de sucesso e mais bem sucedida.

À minha avó Laurinda, que não imagina o quanto me ajudou a elaborar esta

dissertação, por meio não só de seu amor e carinho, mas principalmente pelos cuidados

cotidianos, os quais me possibilitavam mais tempo para me dedicar a esta árdua tarefa.

Agradeço imensamente à minha orientadora Leonor Werneck dos Santos, que

me ensinou, por diversos meios, a compreender o real sentido de lecionar Língua

Portuguesa. Agradeço pela real confiança depositada em mim, em meu potencial, pelas

muitas oportunidades obtidas ao longo desses anos; afinal, estivemos juntas desde o

início de minha graduação. Agradeço, também, pelo vasto conhecimento transmitido,

que fizeram minhas aulas e minha vida profissional mais prazerosas, mais produtivas; e,

por fim, agradeço por ter, no momento oportuno, me aberto os olhos para enxergar a

realidade e me fazer progredir.

De modo bastante especial, agradeço ao meu marido, melhor amigo e grande

companheiro Rodolfo, que esteve comigo desde o início de tudo, antes de eu sequer

imaginar que chegaria a este patamar da minha vida, antes mesmo de eu sonhar em

estudar numa universidade pública. Obrigada pela paciência em suportar, em certos

períodos, todo o desespero e todas as minhas crises, para não dizer todas as minhas

lágrimas. Obrigada por todos os momentos de afago que abrandaram uma angústia que

insistia em me habitar. Obrigada, principalmente, por acreditar em mim com tanta força,

mais mesmo do que eu mesma. Com toda certeza, o caminho teria sido bem mais

penoso sem você por perto para me fortalecer. Amo você! Obrigada por tudo!

Agradeço à amiga, professora, madrinha de casamento e tia por tabela Sílvia

Rodrigues Vieira, que, configurando esses múltiplos papéis, me proporcionou

contribuições de todos os tipos: conselhos, avisos, empréstimos de livros, conversas,

10

oportunidades, laços acadêmicos, e, principalmente, exemplo de ética, dedicação e

profissionalismo.

A todos os meus eternos amigos, referências de companheirismo e irmandade,

por tornarem meus dias mais alegres e amenos, por compreenderem minha ausência em

momentos importantes e ouvirem meus desabafos.

Em especial, à amiga Fabiana, querida companheira que adquiri em meio à

pesquisa científica, que esteve sempre ao meu lado, principalmente nos momentos mais

conturbados, me ouvindo, tranquilizando, suprindo dúvidas, enfim, sendo tudo o que ela

é: amiga, generosa, paciente e companheira.

Agradeço, de modo particular, à amiga Carolina Alexandre, pela tradução em

inglês do resumo desta pesquisa e, à Pilar, pela generosidade e interesse em me

emprestar parte das obras que compunham meu corpus. Sem a ajuda de vocês, tudo teria

se tornado bem mais difícil.

A meus familiares em geral, em especial tia Simone, madrasta Carol, sogra

Ana, que sabem a força que me deram e souberam respeitar e compreender os

momentos de reclusão em meu quarto.

As professoras Mônica Magalhães Cavalcante e Rosa Maria Cuba Riche,

pela leitura atenta e pelas generosas considerações e sugestões. Obrigada pela

generosidade e delicadeza.

À UFRJ, que me fez abrir muitas portas e conquistar lugares que jamais

imaginei que pudesse alcançar.

Aos meus alunos, que, mesmo sem saber, me motivaram, de alguma forma, a

estar sempre me aperfeiçoando na área da educação e na prática do magistério.

Cada um de vocês fez parte desse instante que ora se finaliza. A todos, o meu

mais sincero agradecimento!

11

SUMÁRIO

ÍNDICE DE QUADROS , GRÁFICOS E FIGURAS...........................................xii

INTRODUÇÃO.........................................................................................................15

1. A LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO MÉDIO.......................................21

1.1 O Ensino de LP: orientações oficiais.............................................................21

1.2 O livro didático de língua portuguesa no ensino médio.................................29

2. LINGUÍSTICA DE TEXTO E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA....33

2.1 O percurso da Linguística de Texto................................................................33

2.2 O texto como unidade de ensino.....................................................................37

2.3 Coesão e referenciação ..................................................................................41

2.4 Da referência à referenciação..........................................................................44

3. REFERENCIAÇÃO NOS LDP DE ENSINO MÉDIO...................................58

3.1 Metodologia de pesquisa................................................................................58

3.2 Análise da referenciação nos livros didáticos de ensino médio.....................64

3.2.1 Livros aprovados pelo PNLEM 2009.................................................64

3.2.1.1 Abordagem nula do tema........................................................65

3.2.1.2 Abordagem superficial/generalizada do tema.........................66

3.2.1.3 Abordagem textual-discursiva do tema...................................81

3.2.2 Livros aprovados pelo PNLD-EM/2012.............................................89

3.2.2.1 Abordagem nula do tema........................................................89

3.2.2.2 Abordagem superficial/generalizada do tema.........................90

3.2.2.3 Abordagem textual-discursiva do tema.................................104

3.3 Aprofundando a análise...............................................................................122

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................129

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................133

12

ÍNDICE DE QUADROS, GRÁFICOS E FIGURAS

Esquema 1: Mecanismos referenciais (cf. KOCH, 1992)............................................42

Quadro 1: Quadro-síntese dos processos referenciais (cf. CAVALCANTE, 2011a, p.

86)....................................................................................................................................54

Quadro 2: Total de obras analisadas na pesquisa...........................................................59

Quadro 3: Distribuição das obras aprovadas no PNLEM/2009 e no PNLD-EM/2012.60

Quadro 4: Resumo da análise das obras do PNLEM/2009............................................87

Quadro 5: Resumo da análise das obras do PNLD-EM/2012......................................120

Gráfico 1: Partes dos manuais em que o tema da coesão/CR/referenciação foi

encontrado (PNLEM/2009).............................................................................................65

Gráfico 2: Partes dos manuais em que o tema da coesão/CR/referenciação foi

encontrado (PNLD-EM/2012).........................................................................................89

Gráfico 3: Tipo de abordagem da coesão/referenciação realizada pelas coleções do

PNLEM/2009 e PNLD-EM/2012..................................................................................126

Figura 1: Esquema gráfico sinalizando as palavras que retomam outras num parágrafo

de texto – coleção Português – Língua e cultura (FARACO, 2004, p. 221, vol.

único)...............................................................................................................................67

Figura 2: Referência aos numerais como recurso expressivo – coleção Novas Palavras

(AMARAL et al., 2004, p. 241, vol. 1)..........................................................................70

Figura 3: Estudo da coesão sob o título de “Estudo da língua padrão” – coleção Língua

Portuguesa – coleção Vitória Régia (TAKASAKI, 2004, p. 84, vol.

único)...............................................................................................................................71

Figura 4: A classe dos artigos na seção “A gramática do texto” – coleção Português

(NICOLA, 2004, p. 44, vol. 2)........................................................................................74

Figura 5: Comentário sobre o uso dos substantivos como forma de garantir coesão

seguido dos exercícios referentes à classe estudada – coleção Português (NICOLA,

2004, p. 38, vol. 2)...........................................................................................................75

Figura 6: Exemplos de alguns recursos coesivos por meio de frases descontextualizadas

– coleção Português (MAIA, 2004, p. 213, vol. único)..................................................76

Figura 7: Exercícios referentes à coesão – coleção Português (MAIA, 2004, p. 215,

vol. único)........................................................................................................................77

13

Figura 8: Relação entre placas de trânsito e os elementos coesivos – coleção

Português: língua, literatura, produção de textos (ABAURRE et al., 2004, p. 135, vol.

3)......................................................................................................................................79

Figura 9: Atividade referente ao estudo da coesão referencial que se limita à superfície

textual – coleção Português: língua, literatura, produção de textos (ABAURRE et al.,

p. 136, vol. 3)...................................................................................................................80

Figura 10: Exercício referente ao uso dos pronomes demonstrativos – coleção

Português: Linguagens (CEREJA e MAGALHÃES, 2004, p. 96, vol. 2).....................82

Figura 11: Caixa de texto sobre os pronomes e sua relação com a coesão / exercícios

referentes à classe dos pronomes e sua relação textual – coleção Português: linguagens

(CEREJA e MAGALHÃES, 2004, p. 100-101, vol. 2)...................................................83

Figura 12: Atividade sobre retomada lexical – coleção Língua Portuguesa: projeto e

cidadania para todos (MURRIE et al., p. 186, vol. único)............................................85

Figura 13: Atividade sobre retomadas – coleção Língua Portuguesa: projeto e

cidadania para todos (MURRIE et al., p. 183, vol. único)............................................85

Figura 14: Atividade com a classe dos artigos – coleção Língua Portuguesa: projeto e

cidadania para todos (MURRIE et al., p. 185, vol. único).............................................85

Figura 15: Seção “Sujeito e coesão” – coleção Linguagem em movimento

(TORRALVO E MINCHILLO, 2010, p. 390, vol. 2).....................................................92

Figura 16: Exemplos oferecidos para os mecanismos de coesão não contemplam todos

os mecanismos assinalados – coleção Projeto ECO – Língua Portuguesa (ALVES e

MARTIN, 2010, p. 256, vol. 3).......................................................................................94

Figura 17: Exercícios referentes à seção sobre coesão e coerência textual – coleção

Projeto ECO – Língua Portuguesa (ALVES e MARTIN, 2010, p. 260, vol. 3)............95

Figura 18: Continuação dos exercícios referentes à seção sobre coesão e coerência

textuais – coleção Projeto ECO – Língua Portuguesa (ALVES e MARTIN, 2010, p.

261, vol. 3).......................................................................................................................96

Figura 19: Os substantivos como forma de retomar ou resumir informações – coleção

Língua Portuguesa: linguagem e interação (FARACO et al., 2010).............................98

Figura 20: Exercícios relacionando a coesão ao estudo da classe dos substantivos –

coleção Novas Palavras – Nova Edição (AMARAL et al., capítulo 8 de gramática, vol.

1)....................................................................................................................................101

14

Figura 21: Abordagem da coesão na seção “como estou escrevendo?” – coleção Novas

Palavras – nova edição (AMARAl et al., 2010, p. 445, vol. 1)...................................102

Figura 22: Exercício que destaca a função referencial dos pronomes – coleção Novas

Palavras – nova edição (AMARAl et al., 2010, p. 263, vol. 2)...................................103

Figura 23: Menção à referenciação na abordagem da classe dos artigos a partir de

textos – coleção Ser Protagonista Português (BARRETO, 2010, p. 222, vol. 2)........106

Figura 24: Exercícios referentes à seção “Língua Viva: o artigo e a referenciação” –

coleção Ser Protagonista Português (BARRETO, 2010, p. 223, vol. 2)......................107

Figura 25: Texto motivador para questões sobre coesão referencial – coleção Tantas

Linguagens – Língua Portuguesa: Literatura, Produção de textos e Gramática em uso

(CAMPOS e ASSUMPÇÃO, 2010, p. 94, vol. 2).........................................................110

Figura 26: Exercícios sobre coesão referencial referentes ao texto expresso na figura 25

– coleção Tantas Linguagens – Língua Portuguesa: Literatura, Produção de textos e

Gramática em uso (CAMPOS e ASSUMPÇÂO, 2010, p. 95, vol. 2)..........................111

Figura 27: Exercício sobre a classe dos artigos – coleção Português contexto,

interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 364, vol. 2)..................................114

Figura 28: A classe dos artigos e a produção de texto – parte I (exemplo) – coleção

Português contexto, interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 386, vol. 2)..116

Figura 29: A classe dos artigos e a produção de texto – parte II (explicação e proposta)

– coleção Português contexto, interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 387,

vol. 2).............................................................................................................................117

Figura 30: A classe dos artigos e a produção de texto – parte III (prática) – coleção

Português contexto, interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 388, vol. 2)..118

15

INTRODUÇÃO

No ensino de Língua Portuguesa (LP), no que se refere à produção escrita e à

compreensão textual, um aspecto que tem merecido bastante atenção é o estudo da

coesão, um dos fatores essenciais que garantem textualidade. Segundo Antunes (2005,

p. 47), a coesão constitui uma “propriedade pela qual se cria e se sinaliza toda espécie

de ligação, de laço, que dá ao texto unidade de sentido ou unidade temática”. Para a

autora, “reconhecer, então, que um texto está coeso é reconhecer que suas partes, das

palavras aos parágrafos, não estão soltas, fragmentadas, mas estão ligadas, unidas entre

si.” (Ibid.). Cabe, portanto, à coesão a função de promover a continuidade do texto, a

sequência interligada de suas partes, para que não se perca o fio de unidade que garante

a compreensão. Além disso, atualmente a coesão não se restringe às amarras textuais

observáveis na superfície do texto, mas também ao acionamento de conhecimentos

variados, que não se limitam ao linguístico. Desse modo, ela apresenta íntima relação

com a coerência, ambas são inter-relacionadas.

A produção e a compreensão de texto dependem, assim, do domínio de

estratégias coesivas; na sala de aula, entretanto, nem sempre a coesão aparece integrada

aos recursos gramaticais que auxiliam o seu estabelecimento (cf. ANTUNES, 2005;

TUPPER, GONÇALO, CORTES, 2009). Sua abordagem, por vezes, aparece como um

conteúdo à parte do ensino de língua, provavelmente um reflexo da própria abordagem

dos Livros Didáticos de Português (LDP), que apresentam essa separação (cf.

SANTOS, 2009). Acreditamos, portanto, que a abordagem pedagógica dos mecanismos

coesivos, principalmente aqueles feitos por meio de referências, precisa ser ampliada.

Especialistas como Dionisio e Bezerra (2005), Rojo (2005), Batista (2001) e

Tagliani (2011), só para citar alguns que discutem questões relativas ao uso dos

manuais didáticos, defendem que o bom livro didático deve garantir um mínimo de

qualidade no ensino, sistematizando o conhecimento e suprindo a falta de acesso a

livros entre os alunos, principalmente os das camadas populares. No entanto, vários são

os problemas encontrados nos LDP, dentre os quais se destaca a falta de integração

entre as práticas de linguagem, o que acarreta uma abordagem artificial da escrita, da

análise linguística e da leitura (cf. ROJO, 2000).

Para os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa, a

seleção dos conteúdos a serem estudados deve levar em conta sua relevância social e

16

sua contribuição para o desenvolvimento intelectual do aluno. O ensino de tópicos

gramaticais, por exemplo, é necessário ao aluno, desde que lhe permita refletir a

respeito de sua própria língua – como vem alertando Travaglia (1996), ao defender um

ensino de língua portuguesa mais reflexivo –, visando à formação da competência

discursiva do aluno.

Os PCN recomendam, portanto, que o ensino de Língua Portuguesa deve ser

orientado para as práticas de uso e as práticas de reflexão sobre a língua e a linguagem.

Em vista disso, a linguagem deve ser concebida “[...] como uma ação orientada para

uma finalidade específica [...] que se realiza nas práticas sociais existentes, nos

diferentes grupos sociais, nos distintos momentos da história” (BRASIL, 1997, p.22).

Esta concepção sociocognitivo-interacional e discursiva de linguagem vem sendo

defendida, atualmente, pela Linguística de Texto (LT). No ensino da língua, essa

concepção promove um repensar sobre a linguagem, sobre o sujeito aprendiz, sobre o

objetivo do ensino de língua e sobre a didática da língua.

Uma dessas reflexões, atualmente, tem sido sobre a referenciação, processo que

conta com variados fatores: (i) textuais, entre os quais se inclui o conhecimento dos

diversos usos de elementos gramaticais e lexicais de que a língua dispõe para fazer

retomadas ou antecipações de objetos de discurso, que, uma vez inseridos no texto,

podem ser mantidos, recuperados e transformados de acordo com os propósitos

comunicativos do produtor textual; e (ii) extratextuais, como a cultura, os

conhecimentos de mundo dos participantes da comunicação, a interação entre eles, entre

outras condições (cf. CAVALCANTE, 2011; KOCH, 2004).

A fim de tornar ainda mais evidente a importância do ensino da coesão e dos

manuais didáticos em sala de aula, decidimos investigar quais recursos coesivos estão

sendo apresentados nesses manuais e de que modo a coesão é abordada, restringindo

nossa investigação a observar a referenciação: processo amplo de organização e

processamento textual em que temos a possibilidade de nos referirmos a elementos

linguísticos ou extralinguísticos.

A importância do tema decorre da necessidade de observarmos como os

elementos de referenciação colaboram na construção do texto e, consequentemente, na

formação de leitores e produtores competentes, capazes de manejar adequadamente os

recursos linguísticos postos a sua disposição nos mais diversos contextos

17

comunicativos, uma vez que a ação de fazer referência, no texto, a elementos textuais

precedentes ou subsequentes, é frequente e naturalmente praticada pelos usuários da

língua.

Para tanto, recorremos ao campo de estudo da Linguística de Texto, que

contribui significativamente para o estudo da referenciação, uma vez que adota o

pressuposto de que o processamento do texto acontece na interação, considerando o

entorno sociodiscursivo, tendo como objeto central “o texto tido como processo, como

atividade sociocognitivo-interacional de construção de sentidos” (KOCH, 2008, p. 11).

Essa concepção construtivista da referência é adotada, aqui no Brasil, por

estudiosos como Koch, Marcuschi e Cavalcante, que serão tomados como base principal

para discussão e reflexão acerca de nossos estudos.

Pretendemos, pois, a partir dos resultados das pesquisas já realizadas sobre o

tema em questão, observar a abordagem da coesão, especialmente a referenciação,

envolvendo suas estratégias e o modo como são ensinadas nos LDP aprovados pelo

PNLD-EM/2012, a fim de verificar se há contribuições significativas para o aluno

conseguir compreender o texto não como algo pronto e acabado, mas sempre num

processo de construção e reconstrução, de que ele próprio participa ativamente (cf.

KOCH, 2004, 2008; KOCH e ELIAS, 2007 e 2009; MARCUSCHI, 1998).

Dessa perspectiva, resultam os principais problemas a serem discutidos nesta

dissertação: (1) os livros didáticos, aprovados pelo PNLEM/2009 e PNLD-EM/2012

abordam os recursos coesivos relacionando-os à análise linguística, leitura e produção

textual, como exigem os Parâmetros Curriculares Nacionais?; (2) Os Manuais do

Professor presentes nos LDP oferecem arcabouço teórico atual para os docentes sobre

os estudos associados à LT e à referenciação?; (3) houve alguma atualização dos

estudos associados à referenciação entre os manuais analisados em 2009 para os

manuais analisados em 2012?

A fim de compararmos, portanto, o resultado de análises anteriores com as

atuais, há algumas hipóteses que pretendemos confirmar: (1) os LDP já apresentam

mudanças que correspondem às exigências dos PCN e que superam as falhas apontadas

nos manuais analisados pelo PNLEM 2009; (2) já há uma abordagem que relaciona

principalmente a análise linguística aos dois grandes fatores de textualidade – coesão e

18

coerência; (3) o Manual do Professor (MP) deve apresentar, em obras mais recentes,

embasamento teórico sobre os estudos da Linguística de Texto para a referenciação.

Acreditamos, assim, que, no decorrer de cerca de 6 anos, isto é, dos livros

avaliados pelo PNLEM/2009, que correspondem às obras publicadas no ano de 2004,

até as obras analisadas pelo PNLD-EM/2012, que se referem àquelas lançadas até o ano

de 20101, tenha havido alguma mudança significativa na abordagem dos mecanismos de

coesão e, consequentemente, do processo de referenciação. Dessa maneira, esperamos

encontrar associação entre coesão, referenciação e a análise linguística, uma vez que as

críticas feitas no catálogo de Livros Didáticos do PNLEM/2009 já alertavam para essa

necessidade – refletindo as teorias defendidas nos PCN desde 1998. Esperamos, ainda,

encontrar o conceito de referenciação e não somente o de coesão referencial tanto no

livro do professor como no do aluno. No Manual do Professor, esperamos também que

haja subsídios teóricos abarcando as mais importantes e atuais pesquisas feitas sobre o

tema.

Norteada por essas hipóteses, esta pesquisa, situada na linha de pesquisa Língua

e Ensino, apresenta os seguintes objetivos: (i) contribuir para a discussão sobre o ensino

da referenciação e da coesão textual; (ii) observar se ocorreram mudanças na abordagem

da referenciação nos LDP de EM entre o PNLEM/2009 e o PNLD-EM/2012 – e, se

houve, em que consistem tais mudanças; (iii) investigar se/como os recursos da

referenciação são mencionados nos LDP de EM, averiguando em qual parte dos

manuais o assunto é abordado e se os exercícios trabalham a questão; (iv) conferir se os

LDP associam os recursos coesivos, especialmente os referenciais, aos processos de

organização e processamento textual, com o objetivo de mostrar que as nossas escolhas

linguísticas não são aleatórias, mas significativas; (v) observar se o Manual do Professor

oferece explanações eficientes aos docentes para o ensino desse processo de progressão

textual.

Optamos por utilizar como corpus os LDP por dois motivos. Primeiramente,

porque nem sempre se dá a devida atenção a esse material didático, que é, na maioria

das vezes, o único objeto de ensino do professor em sala de aula, assumindo, ao mesmo

1 As obras publicadas até 2004 foram analisadas em 2005, mas o Guia do livro didático foi divulgado

somente em 2009, por isso nos referimos a essa edição como PNLEM/2009. Já as obras publicadas entre

2005 e 2010 foram analisadas em 2011, quando a análise dos livros didáticos passou a se chamar PNLD-

EM/2012.

19

tempo, uma perspectiva de “guardião” do que se deve dizer, de como ensinar e do que

fazer. Dessa maneira, estamos contribuindo com um olhar mais crítico e reflexivo sobre

esse material, tão importante na sala de aula. Em segundo lugar, consideramos que a

análise da referenciação em livros didáticos apresenta-se como uma novidade e uma

necessidade nos estudos do tema, uma vez que, embora amplamente estudada por

diversos autores, pouco se relaciona esse processo a questões mais especificamente

ligadas ao ensino.

Vale ainda destacar, no entanto, que não é nosso objetivo (re)avaliar os LDP de

EM, mas fazer um levantamento da abordagem da referenciação, visando a contribuir

para o ensino de gramática, leitura e produção textual.

No que diz respeito à organização e ao conteúdo das partes deste trabalho,

podemos observar que ele está dividido em 3 capítulos. No primeiro, discutimos

especificamente questões ligadas ao ensino da disciplina língua portuguesa no contexto

do ensino médio. Para tanto, relacionamos as diretrizes oferecidas por documentos

oficiais – considerados importantes para a educação nas últimas décadas – ao ensino de

português, dando maior atenção, porém, àquelas fornecidas pelos PCN de Ensino

Fundamental, já que as maiores contribuições teóricas são arroladas no documento

destinado a este nível de ensino, ficando o do ensino médio, assim como as OCN, como

uma complementação do que foi definido para o nível anterior. Além disso, nesse

capítulo, atendo-nos ao ensino direcionado para a última etapa do ciclo básico escolar,

consideramos relevante traçar um breve histórico do livro didático de LP, uma vez que

este constitui nosso objeto de análise e é também um objeto muito valorizado no

contexto escolar.

No segundo capítulo, serão apresentadas as bases teóricas que sustentam nossas

asserções. Nesse momento, realizamos um apanhado teórico sobre a linha de pesquisa

da Linguística de Texto, abordando as principais fases pelas quais passou a concepção

de texto e o conceito de referenciação. Nessa parte, deixamos clara a visão de texto que

adotamos nessa pesquisa. Consideramos relevante, ainda, mostrar de que forma o

processo de referenciação está atrelado aos conceitos de coesão e coerência, assim como

apontar a distinção entre as noções de referência e referenciação. Nesse espaço,

mostramos a importância da referenciação para o ensino mais produtivo de LP,

destacando suas principais estratégias, articulando-as às questões referentes à leitura,

20

análise linguística e produção textual, contribuindo, assim, para capacitar os alunos a

construírem mais adequadamente os sentidos dos textos.

O terceiro capítulo é destinado aos aspectos metodológicos e à apresentação

detalhada dos livros didáticos que constituem o corpus a ser analisado qualitativamente

neste trabalho. Nesse espaço, dedicamo-nos também a assinalar a quais conclusões foi

possível chegar a partir da análise e comparação dos manuais didáticos, aproveitando

para refletir sobre os possíveis desdobramentos que esta pesquisa pode oferecer aos

estudos da Língua Portuguesa.

Dessa forma, acreditamos que nosso estudo contribuirá para o ensino de LP,

pois, ao investigar a referenciação, estaremos propiciando uma reflexão mais crítica do

que seja trabalhar o texto em sala de aula, principalmente, aqueles contidos nos LDP,

estimulando uma maior integração entre as práticas de linguagem: leitura, produção e

análise linguística. Nesse contexto, sabendo da importância da produção e compreensão

textual e do LDP, como objetos de ensino do professor em sua prática docente, e da

relevância do processo de referenciação na construção e recepção textual, percebemos a

necessidade da articulação entre esse conjunto de fatores, visando à contribuição para

um ensino mais produtivo de Língua Portuguesa.

21

1. A LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO MÉDIO

1.1. O ensino de LP: Orientações oficiais

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) – documento com a função de

orientar o ensino de língua materna – têm sido um valioso objeto de debates nos últimos

anos, suscitando uma série de produtivas discussões e reflexões sobre o ensino. De

acordo com Dionisio e Bezerra (2005, p. 96), podemos “situar a orientação desse

documento como predominantemente sociointeracionista de inspiração discursiva, o que

significa a introdução de um novo paradigma no ensino”, em que o aluno é levado a

participar de maneira crítica diante do uso que faz de sua própria língua.

Dessa forma, percebemos que os PCN propõem um distanciamento dos modelos

cristalizados do estudo de LP, desvalorizando o ensino da gramática pela gramática e

propondo que o estudo parta de textos variados, de modo a preparar o aluno para lidar

com as múltiplas situações comunicativas. Nesse sentido, os PCN reafirmam e tornam

evidente a participação crítica e efetiva do aluno nas práticas comunicativas:

Num mundo contemporâneo, (...), a reflexão sobre as linguagens e seus

sistemas (...) e sobre os processos e procedimentos comunicativos é mais do

que uma necessidade, é uma garantia de participação ativa na vida

social, a cidadania desejada. (BRASIL, 2000, p. 6). [grifos nossos]

Assim, a Língua Portuguesa, trabalhada como objeto de reflexão e análise, deve

ter por objetivo a ampliação da competência discursiva do falante, que chega à escola

dominando um tipo de gramática – a internalizada – e fazendo uso de uma variedade

linguística que ele adquire por meio do contato com outros falantes em uma

comunidade de fala, insuficiente para integrá-lo de forma crítica na sociedade,

principalmente quando tratamos do uso da linguagem escrita. Quanto a essa questão,

Ilari (s.d.), salienta que

a tarefa [do professor de língua] é diferente da dos mestres de outras

disciplinas, porque estes últimos respondem por uma verdadeira iniciação da

criança num novo campo, ao passo que as crianças já são falantes de sua

língua quando chegam à escola.

22

Ou seja, o estudo da língua materna não é uma novidade para o falante, por isso

é necessário ir além de apresentação de nomenclaturas e regras, motivando o aluno a

refletir sobre os diversos usos que a língua nos oferece nas diversas circunstâncias

comunicativas, o que

supõe o planejamento de situações didáticas que possibilitem a reflexão não

apenas sobre os diferentes recursos expressivos utilizados pelo autor do texto,

mas também sobre a forma pela qual a seleção de tais recursos reflete as

condições de produção do discurso e as restrições impostas pelo gênero e

pelo suporte (BRASIL, 1998, p. 27-28).

É nessa perspectiva que os PCN têm colaborado fortemente para o rompimento

da visão tradicionalista de ensino, pois o foco do ensino de LP passa a ser o texto, visto

como um processo em constante elaboração e não mais a frase isolada ou a gramática

com um fim em si mesma. A partir do texto, o aluno será levado a refletir sobre as

possibilidades de uso da língua. Entretanto, quando os PCN e as OCN defendem a

utilização do texto como principal objeto de ensino, muitos professores sentem

dificuldade em pôr essa tarefa em prática devido à falta de conhecimento acerca das

questões defendidas pela Linguística de Texto, que respaldam as postulações desses

documentos, e ao mau uso que se faz dos livros didáticos ou mesmo à falta de qualidade

ou organização desses materiais.

Segundo Santos (2006), o desafio que se apresenta ao professor é, então, mostrar

como trabalhar as três práticas de linguagem apresentadas nos Parâmetros – leitura,

produção e análise linguística – de maneira integrada, uniforme e não isolada como

costumamos ver nos livros didáticos, principalmente de EM, que apresentam uma

fragmentação mais nítida, se comparados aos manuais voltados para o Ensino

Fundamental (EF), em três grandes blocos: gramática (análise linguística), redação

(produção textual) e Literatura. O problema maior ocorre quando essas três partes não

apresentam relação entre si. Conforme advogam os PCN,

As práticas de linguagem são uma totalidade; não podem, na escola, ser

apresentadas de maneira fragmentada, sob pena de não se tornarem

reconhecíveis e de terem sua aprendizagem inviabilizada. Ainda que

didaticamente seja necessário realizar recortes e descolamentos para melhor

compreender o funcionamento da linguagem, é fato que a observação e

análise de um aspecto demandam o exercício constante de articulação com os

demais aspectos envolvidos no processo (BRASIL, 1998, p. 36).

23

Considerando a questão dos LDP, muitos deles têm sido elaborados, conforme

podemos ler nas capas dos manuais, “de acordo com os PCN”. Isso mostra a

importância desse documento para o ensino não só de LP como também das outras

disciplinas. Essa importância é confirmada pelo Programa Nacional do Livro Didático

(PNLD/PNLEM), criado pelo MEC, responsável por avaliar os livros didáticos e

verificar em que medida eles respondem às orientações oferecidas pelos PCN,

assegurando, assim, maior qualidade desse mediador no processo ensino-aprendizagem.

Os resultados das avaliações são publicados no Guia dos livros didáticos, que serve de

base para os professores escolherem as coleções que pretendem adotar com suas turmas.

A grande questão do ensino de LP está mesmo em articular uniformemente as

competências interativa, textual e gramatical, conforme assinalado pelos PCN+

(Orientações Educacionais Complementares aos PCN):

O ensino da língua materna deve considerar a necessária aquisição e o

desenvolvimento de três competências: interativa, textual e gramatical.

Esse tripé, necessariamente inter-relacionado, mesmo não sendo exclusivo da

disciplina, encontra nela [na língua portuguesa] os conceitos e conteúdos

mais apropriados (BRASIL, 2002, p. 55) [grifos nossos].

A primeira dessas competências, interativa, dialoga diretamente com uma das

perspectivas assumidas pela LT, a interacionista, uma vez que, ao usarmos a língua, o

fazemos em contextos que demandam interação entre interlocutores, fato que pressupõe

que todo conhecimento é fruto da relação entre sujeitos: “A interação é que faz ser a

linguagem comunicativa” (BRASIL, 2000, p. 18). Conforme ressaltam os PCN+ (2002),

cabe à escola um importante papel de mediação na aquisição dessa competência, já que

é no diálogo, na troca de experiências que os falantes se constituem. Devido a esse

diálogo entre interlocutores e entre textos é que o texto existe na sociedade e é

considerado produto social e cultural, único em cada contexto. (Ibid., p. 18). Nesses

termos, Ilari (s.d.), em concordância com essas proposições, assevera que “todo texto

real é sempre uma forma de interlocução ou resposta: falamos, no mais das vezes,

reagindo a outra fala.”

A segunda das competências citadas, a textual, remete aos conhecimentos sobre

a estrutura e composição dos textos, materializados em gêneros textuais, que

apresentam características temáticas, composicionais e estilísticas específicas, as quais

devem ser consideradas tanto no processo de leitura quanto no de produção textual. A

24

competência textual apresenta íntima relação com a primeira, já que é na interação que

os sujeitos percebem os elementos determinantes na escolha adequada dos gêneros.

Assim, o texto, materialização de um gênero textual, deve ser a unidade básica de

ensino.

Nesse sentido, os PCN propõem que se abandone a tradicional separação dos

textos em narrativos, dissertativos/argumentativos e descritivos como ponto de partida e

se levem em conta os gêneros que circulam socialmente – iniciativa que tem por

propósito tornar o ensino de LP muito mais significativo. Além disso, os PCN+

sugerem uma lista de mecanismos que, em conformidade com as possibilidades

oferecidas por cada gênero, podem ser empregados; entre eles, os primeiros a serem

citados são os “mecanismos de coesão referencial (retomada pronominal, repetição,

substituição lexical, elipse).” (BRASIL, 2002, p. 80). Em pesquisas anteriores, Santos e

Tupper (2011, p.3) assinalam que “para seguir os PCN, a abordagem [ou competência]

textual tem sido privilegiada nos livros didáticos, mas nem sempre de maneira coerente,

como ocorre com a abordagem do tema referenciação”.

Por último, os PCN citam a competência gramatical, que se refere à

compreensão e uso do sistema linguístico como instrumento de construção/organização

da realidade, ou seja, das articulações que regem esse sistema. De todos os recursos

linguísticos mencionados, é dada fundamental importância aos processos coesivos,

dentre os quais destacamos aqui a referenciação. Visando estimular esse tipo de

competência, os PCN+ sugerem que se avalie, dentre outros procedimentos, “a

propriedade do uso dos recursos lexicais (jogos metafóricos e metonímicos, expressões

nominais definidas, hiponímia, hiperonímia, repetição) em função das estratégias

argumentativas do leitor” (BRASIL, 2002, p. 83).

Ser um produtor e leitor ativo de textos falados ou escritos requer, portanto, a

congruência dessas três competências, que devem ser desenvolvidas de forma

progressiva e nunca de maneira estanque, como ainda se vê em sala de aula e em alguns

livros didáticos.

Concluímos, assim, que

Os objetivos da nova educação pretendida são certamente mais amplos do

que os do velho projeto pedagógico. Antes se desejava transmitir

conhecimentos disciplinares padronizados, na forma de informações e

procedimentos estanques; agora se deseja promover competências gerais, que

25

articulem conhecimentos, sejam estes disciplinares ou não (BRASIL, 2002,

p. 12).

Essa articulação pode ser feita, por exemplo, a partir do trabalho com a coesão

textual e os mecanismos referenciais, que, conforme apontam os PCN e as OCN,

colaboram tanto para estimular a competência interativa, quanto a textual e a gramatical.

Documentos como os PCN e as OCN têm sido de extrema importância para o

ensino, contudo apenas delineiam diretrizes, propostas de ensino, atuando como um

material de apoio para o professor e para o projeto político pedagógico da escola;

portanto, o modo como proceder em sala de aula fica a cargo do corpo docente que,

levando em consideração o perfil do alunado e sendo auxiliado por um bom livro

didático, deverá adequar as propostas para realizar um trabalho mais produtivo a cada

situação. Considerando essa necessidade da adequação, Dionisio e Bezerra (2005, p. 47)

chamam atenção para o fato de que “textos bem escolhidos, mas com abordagens

inadequadas podem não favorecer a aprendizagem da leitura, escrita e análise

linguística”.

Os PCN, assim como as OCN, oferecem subsídios na esfera educacional e,

principalmente, auxiliam os alunos a prosseguirem os estudos e participar de modo

crítico na sociedade. Portanto, como afirma Koch (2008, p. 187), esses documentos

traçam diretrizes gerais, não lhes cabendo aprofundar questões da esfera educacional,

tarefa esta que cabe aos professores de cada área. Assim, apesar de algumas críticas

feitas sobre esses documentos, eles constituem e constituirão por muito tempo, uma

importante e significativa referência para a educação.

O Ensino Médio (EM), considerado a última etapa da educação básica pela LDB

(Art. 36), corresponde ao “período de consolidação e aprofundamento de muitos dos

conhecimentos adquiridos ao longo do Ensino Fundamental (EF)” (BRASIL, 2006),

devendo atuar de maneira que garanta ao aluno a preparação básica para continuação de

seus estudos, a fim de que ele seja inserido no mundo do trabalho, bem como no

exercício cotidiano da cidadania. Assim,

o EM deve ser encarado tanto como sequência coerente do EF — e, portanto,

como sua continuidade — quanto como uma ruptura, dadas as

especificidades de seu alunado e das demandas sociais que a ele estão

associadas (BRASIL, 2011, p. 7).

26

Conforme salienta o guia do PNLD (Ibid., p. 8), isso implica, dentre outras

questões, “retomada e aprofundamento das capacidades de reflexão sobre a língua e a

linguagem” e “sistematização progressiva dos conhecimentos metalinguísticos

decorrentes da reflexão, com o objetivo de levar o aluno a construir uma representação

cientificamente plausível da língua (...)”.

As Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (OCN) (BRASIL,

2006, p. 32) preveem, ainda, que, no decorrer da formação do EM, o “alunado” deva

“conviver, de forma não só crítica, mas também lúdica”, com diferentes tipos de

situações de produção e leitura de textos, com o intuito de perceber a “multiplicidade de

linguagens que ambientam as práticas de letramento (...) em nossa sociedade”, para,

então, ser possível refletir sobre os usos da língua. Além disso, o documento acrescenta

que o convívio com essas diferentes situações auxilia a inserção do aluno em práticas

linguageiras “em que são colocados em funcionamento textos que exigem

conhecimentos distintos daqueles usados em situações de interação informais (...)”

(ibid.).

Em outras palavras, as recomendações assinaladas apontam para a necessidade

de os alunos finalizarem o EM sentindo-se preparados para lidar com diferentes

situações comunicativas, as quais devem ser constantemente simuladas no espaço

escolar, principalmente na disciplina Língua Portuguesa. Só assim, por meio dessas

simulações, em que o aluno será estimulado a interagir por meio da linguagem escrita

ou oral, é que eles poderão refletir sobre o real funcionamento da linguagem.

É, pois, dentro dessa perspectiva que o ensino e a aprendizagem da língua

materna devem procurar desenvolver no aluno do ensino médio uma

competência linguística, cuja essência não se pauta na exclusividade do

domínio técnico do uso da língua “padrão”, mas, sobretudo, no saber

empregar a língua na sua diversidade, em que se leva em consideração o

contexto interativo. (SILVA, 2011, p. 7)

Para tanto, conforme salienta Silva é necessário que o aluno seja capaz de

perceber “a oralidade e a escrita como modalidades de emprego da língua

complementares e interativas nas práticas sociais”, tornando-o produtor e leitor de

textos de diversos gêneros, nas diversas situações de interação comunicativa que exigem

recursos adequados para a consecução de seus objetivos comunicacionais. Em outras

palavras, “pensar o ensino de Língua Portuguesa no ensino médio significa dirigir a

27

atenção não só para a literatura ou para a gramática, mas também para a produção de

textos e a oralidade” (BRASIL, 2002, p. 70). Contudo, como o EM é a etapa final da

educação básica, concordamos com Silva (2011, p. 7) quando afirma que “as práticas

sociais do emprego da língua escrita devem ser enfatizadas na orientação de atividades

escolares”, pelo fato de apresentarem grande valor social e histórico em nossa

sociedade.

Com base nesses pressupostos, acreditamos que o ensino de língua deve partir de

uma concepção sociointeracionista e discursiva da linguagem, o que significa

compreender que toda atividade humana é mediada pela linguagem e que toda forma de

linguagem não é construção individual, mas coletiva: é uma prática social. Assim sendo,

a língua se constrói no discurso, e não em sílabas, palavras, frases soltas e

descontextualizadas. É consequência natural dessa proposta definir, como objeto de

ensino e ponto de partida, o texto empírico, ou seja, um gênero textual específico.

Será preciso, ainda, “reconhecer que o aluno do EM, pela faixa etária em que se

situa, pela escolarização já vivida e pelo tipo de inserção social que o caracteriza, é um

sujeito social bastante diferente do aluno do EF” (BRASIL, 2011, p. 8). Nesse sentido, o

jovem do EM é um ator social que, entre outros traços, conforme aponta o Guia do

PNLD 2012 (Ibid, p. 8), caracteriza-se por:

(i) ser alvo de um discurso mercadológico e publicitário específico,

configurando-se, assim, como um “segmento” do mercado e como um

destinatário particular da indústria cultural; (ii) representar um segmento da

população socialmente identificado a valores culturais opostos e, em certos

aspectos, contraditórios (...).

Levar em conta essa condição juvenil, como denomina o Guia do PNLD, na

organização da vida escolar e nas diferentes instâncias de planejamento do ensino, é,

portanto, um requisito indispensável para o funcionamento adequado e eficaz do EM.

Ainda de acordo com o Guia, no que diz respeito ao que há de particular à disciplina de

LP, esse (re)conhecimento do perfil do alunado deve traduzir-se na definição de

objetivos de ensino-aprendizagem compatíveis, assim como na seleção de conteúdos

adequados e nas orientações metodológicas correspondentes.

Nessa perspectiva, o ensino de Língua Portuguesa deve “desenvolver o potencial

crítico do aluno e, dessa forma, o seu entendimento de mundo, por intermédio do uso

adequado da língua e da linguagem” (SILVA, 2011, p. 10). Por esse motivo, o trabalho

28

com a língua materna deve ser desenvolvido “para além da memorização mecânica de

regras gramaticais” (Ibid.), sendo possível fazer um trabalho com a gramática, mas sem

dispensar uma reflexão sobre ela. Somente a partir dessa reflexão é que será possível

“conduzir o aprendizado de modo a promover, junto ao alunado, as qualificações

humanas pretendidas pelo novo ensino médio”. (BRASIL, 2002, p. 9).

Nesse contexto, consideramos que o estudo de regras e categorias tradicionais

tem seu interesse adequado às necessidades do aluno de EM, à medida que contribui

para seu desempenho linguístico, tanto na recepção quanto na produção de textos

escritos e orais. Isso significa que “as atividades de leitura, produção e interpretação de

texto e exercício com a oralidade, em situações reais de uso, devem ser, também neste

grau, prioritárias no ensino-aprendizagem da área.” (BRASIL, 2011, p. 10).

Não à toa, os PCN, com uma proposta inovadora, que considera as

transformações pelas quais passou e tem passado a educação, defendem que

num mundo como o atual, de tão rápidas transformações e de tão difíceis

contradições, estar formado para a vida significa mais do que reproduzir

dados, denominar classificações ou identificar símbolos, significa saber se

informar, comunicar-se, argumentar, compreender e agir através da

linguagem (BRASIL, 2002, p.9).

Somente indo além desses limites, o discente conseguirá ampliar e articular

conhecimentos e competências que o habilitem a atuar nessa diversidade de situações da

vida em sociedade.

Assim, os PCN salientam que o Ensino Médio, dentro desses novos moldes da

educação, deixa de ser apenas profissionalizante ou um preparatório para o curso

superior e passa a ter o objetivo e responsabilidade de completar a educação básica,

fazendo do aluno um cidadão que saia preparado para a vida, qualificado para a

cidadania e capacitado para o aprendizado permanente, “seja no eventual

prosseguimento dos estudos, seja no mundo do trabalho” (Ib., p.8).

Devemos atentar, entretanto, para o fato de que, para que tudo o que foi debatido

acima seja colocado em prática, é fundamental o papel do professor, que, como

principal mediador do processo educacional, deve

adquirir paulatinamente a consciência do público a quem dirige seu discurso

[alunos do EM], levando em conta o fato de serem adolescentes, trazerem

uma bagagem de conhecimentos adquirida ao longo de seu processo anterior

29

de escolarização, serem parte de um grupo social dotado de características

próprias, que eventualmente os diferencia de outras comunidades (Ibid., p.

75).

O ensino de Língua Portuguesa deve, portanto, tornar os alunos dos anos finais

da educação básica atores sociais, ou seja, um cidadão crítico atuante, com voz própria e

com recursos para expressá-la. Em outras palavras, é necessário tornar o aluno um

crítico dos discursos em circulação, uma vez que sua inserção social se faz por meio da

linguagem.

1.2. O Livro Didático de Língua Portuguesa no Ensino Médio

O livro didático (LD) para o Ensino Médio (EM) ocupa um papel central no

cotidiano escolar, mesmo coexistindo com diversas outras ferramentas, como a internet

e os recursos audiovisuais (cf. RODRIGUES e FREITAS, 2008), e participa de um

contexto de ensino-aprendizagem cujos objetivos vêm sendo delineados, cada vez com

mais precisão, por um conjunto de iniciativas de políticas públicas. Um marco

significativo desse processo foi a promulgação, em 1996, da Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional, que inclui o Ensino Médio na Educação Básica. Neste mesmo

ano, o MEC, preocupado com a qualidade dos livros didáticos, lançou o PNLD,

programa que, como já foi dito, tem por objetivo subsidiar os alunos e professores das

escolas públicas, oferecendo livros de melhor qualidade didática, já que estes têm que

passar por uma avaliação crítica e trabalhosa realizada por profissionais competentes na

área.

Após a promulgação da LDB, outros fatos marcaram o contexto educacional.

Em 1999/2000 publicaram-se os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio (PCNEM); em 2002, divulgaram-se as Orientações Complementares aos

PCNEM, conhecidas como PCN+, entre outros documentos importantes, como as

Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCN). Simultaneamente à publicação

desses documentos, também se instituíram importantes iniciativas em direção a uma

sistemática de avaliação para o EM, como o Exame Nacional do Ensino Médio

(ENEM), realizado a partir de 1997, e a ampliação do Programa Nacional do Livro

Didático para obras de EM, a partir de 2003/2004. Dessa forma, percebemos uma série

30

de acontecimentos que marcaram de vez a história da educação no Brasil, modificando

progressivamente os rumos do ensino no país.

Como vimos na seção anterior, o EM, segundo os PCN, é o momento para o

aluno retomar e aprofundar conteúdos e competências, tanto gramaticais quanto

textuais, apreendidos no EF, uma vez que “graves são os problemas oriundos do

domínio básico instrumental, principalmente da língua escrita” (BRASIL, 2002, p. 17).

Além disso, como postula Santos (2006, p. 59), o objetivo primordial do ensino de LP é

a formação de alunos como coautores do conhecimento e não meros reprodutores. Para

tanto, é necessário – e mais produtivo – levar os alunos a refletirem sobre os usos que

fazem e podem fazer da própria língua. Fica a cargo do EM, portanto, “oferecer aos

estudantes oportunidades de uma compreensão mais aguçada dos mecanismos que

regulam nossa língua” (BRASIL, 2002, p. 55).

Em Santos e Tupper (2011), apontamos que uma das bases essenciais no ensino

de LP é a utilização de elementos coesivos que visem a contribuir para a identificação

de estratégias importantes na hora de ler ou escrever textos, tarefa essa a que estamos

expostos diariamente. Além disso, ressaltamos que, durante esse nível, a preocupação

com vestibular e ENEM é cada vez maior, e os alunos atribuem maior importância à

escrita. Por isso,

(...) é de extrema importância a formação de alunos capazes de produzir

textos coerentes, coesos, expressando sua identidade e mediando sua

intervenção na realidade (ibid., p. 7).

Observamos, por meio do trecho acima, além da importância da construção de

textos com coesão e coerência, um convite ao aluno a participar de forma ativa nesse

processo, devido à necessidade de mobilização de uma série conhecimentos, de ordem

linguística, pragmática ou interacional.

O catálogo do PNLEM/2009 (BRASIL, 2008, p. 19) destaca como devem ser os

LDP direcionados ao EM:

O livro destinado ao ensino médio tem múltiplos papéis, entre os quais se

destacam: (i) favorecer a ampliação dos conhecimentos adquiridos ao longo

do ensino fundamental; (...); e (iii) oferecer informações atualizadas, de

forma a apoiar a formação continuada dos professores, na maioria das vezes,

impossibilitados, pela demanda de trabalho, de atualizarem-se em sua área

específica.

31

Em relação ao que foi exposto no excerto acima, temos observado (cf. SANTOS,

2009; SANTOS e TUPPER, 2011) que escolas já podem adotar livros didáticos que não

enfatizem apenas exercícios mecânicos, elaborados segundo a concepção estruturalista

de linguagem. Os LDP de EM publicados atualmente e aprovados pelo PNLD procuram

dar mais voz aos alunos, incentivando a reflexão e o posicionamento pessoal diante de

certos questionamentos, possibilitando ao aluno, portanto, ampliar os conhecimentos

adquiridos na etapa anterior, conforme ressalta o primeiro item da orientação oficial.

De acordo com o terceiro item, ressaltamos a necessidade de os livros didáticos

constituírem mais que um manual de consulta para o professor, mas uma possibilidade

de aprofundamento e contribuição das pesquisas desenvolvidas nos meios acadêmicos,

tornando-as compreensíveis e acessíveis ao docente.

Quanto a isso, Antunes (2003, p. 120) já ressaltava a necessidade de o professor

criar oportunidades (oportunidades diárias) para o aluno construir, analisar,

discutir, levantar hipóteses, a partir da leitura de diferentes gêneros de textos

– única instância em que o aluno pode chegar a compreender como, de fato, a

língua que ele fala funciona.

Cabe ao professor, portanto, “pensar nos usos diferenciados que um LD pode

permitir, como alterações de sequências, atividades complementares, aspectos diversos

da realidade local etc.”, ou seja, o trabalho com os compêndios “não pode prescindir do

professor” (TAGLIANI, 2011, p. 137). Entretanto, conforme asseveram Dionisio e

Bezerra (2005, p. 35),

O LDP [...] constitui-se, senão o único material de ensino aprendizagem, o

mais importante, em grande parte das escolas brasileiras. Essa importância é

tal, que o interlocutor dos alunos não é mais o professor, mas o autor do

LDP: interlocutor distante, dificultando a interação com os alunos, e porta-

voz presente (professor) quase sem autonomia, seguindo página a página a

proposta do autor.

O livro didático não deve inibir o professor, deixando-o sem oportunidade de

criar seu próprio curso; em outras palavras, não deve dizer o que e como fazer,

dispensando um trabalho mais autônomo e reflexivo. Além disso, é necessário que o

docente não veja o LD como um depositário de verdades absolutas, apresentando um

trabalho autônomo e complementar a esse objeto de apoio.

32

Fica relegada, então, ao professor a tarefa de considerar a experiência cotidiana,

a experiência real em sala de aula, percebendo os problemas e reformulando

constantemente seu trabalho a fim de torná-lo adequado a cada turma. Para isso “basta o

professor explorar sua própria capacidade de pensar, de criar, de inventar para ver como

as oportunidades surgem.” (ANTUNES, 2003, p. 124). Rangel (2005, p. 26) vai além,

defendendo que é também o aluno responsável pelo bom uso do livro didático em sala

de aula:

por melhor e mais especializado que seja um material, parte significativa de

seu caráter didático decorre dos usos que professor e aluno, envolvidos numa

situação de ensino/aprendizagem particular, fazem dele. Podemos dizer,

então, que a eficácia desses recursos resulta da correta formulação de uma

equação entre o seu grau de especialização, o perfil dos sujeitos envolvidos e

as características da situação.

Apesar das críticas, dos erros, do mau uso que, por vezes, se faz do livro didático

na escola, consideramos sua presença como fator fundamental para o ensino, uma vez

que ele faz parte da cultura de muitas gerações e, além disso, representa, em muitos

casos, a única possibilidade de leitura nos ambientes por onde circulam os alunos, como

o escolar e o familiar, por exemplo. Concordamos que “os materiais didáticos, se bem

escolhidos e usados, se de qualidade e adequados ao planejamento do professor, são

grandes instrumentos de apoio no processo de ensino-aprendizagem” (ROJO, 2005, p.

3) e, ainda, permitem a realização de diversas atividades sociais de linguagem.

33

2. LINGUÍSTICA DE TEXTO E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

2.1. O percurso da Linguística de Texto

A Linguística de Texto tal qual a conhecemos hoje passou por diversos

momentos até chegar ao seu atual estágio, em que o texto é considerado numa

perspectiva sociocognitiva. Neste capítulo, serão arroladas as principais etapas por quais

passou o estudo da língua, com o objetivo de mostrar que nem sempre o texto foi visto

com toda essa importância no ensino de língua materna, refletindo, ainda nos dias de

hoje, problemas de toda ordem: confusão entre as noções de coesão e coerência, o texto

sendo utilizado como pretexto, erros conceituais dos fatores de textualidade – como a

coesão e coerência – e a dificuldade em considerá-los numa esfera mais ampla.

Na primeira metade do século XX, o estudo da língua era realizado,

principalmente, por filólogos e gramáticos, que se importavam, de modo particular com

a análise transfrástica, devido à preocupação com as relações estabelecidas entre as

frases e os períodos. O texto, assim, era visto como signo linguístico mais alto na

hierarquia da língua e o contexto como o entorno verbal (cotexto). Nessas

circunstâncias, desenvolveu-se a Linguística Estrutural, que tinha como referência

principal o linguista suíço Ferdinand de Saussure, que se dedicava a depreender a

estrutura da língua, a partir dos dados linguísticos observáveis.

A partir da década de 1960, porém, surgiu, na Europa, a Linguística de Texto

com expressão máxima na Alemanha, como proposta teórica para tentar solucionar

certas problemáticas do texto, que a gramática normativa não conseguia explicar, por se

restringir ao nível da frase.

Nessa época, o percurso de análise partia da frase para o texto, pois o texto não

era considerado um objeto autônomo, nem um objeto de análise. Assim, o estudo

centrava-se nos mecanismos interfrásticos, isto é, “no estudo das relações que se

estabelecem entre enunciados” (KOCH, 2004, p. 3). Desse modo, deu-se uma maior

atenção às relações referenciais e aos recursos de coesão textual, que, por consequência,

era confundida com a coerência, entendida “como mera propriedade ou característica do

texto” (Ibid., p. 5). Quanto a essa questão, Koch (2004, XIII) assevera que

34

o que se pode verificar é que, na época do surgimento da Línguística Textual,

(...), em função do conceito de texto então majoritário, a maioria dos

estudiosos estava debruçada sobre a análise transfrástica e/ou a construção de

gramáticas do texto, de modo que o objeto privilegiado de estudo era a

coesão, ou seja, a prioridade de cohere (hang together), muitas vezes,

equiparada à coerência, já que ambas eram vistas como qualidades ou

propriedades do texto.

Nesse sentido, como lembra a autora, “os estudos das relações referenciais

limitavam-se, em geral, aos processos correferenciais (anafóricos e catafóricos),

operantes entre dois ou mais elementos textuais” (Ibid., p. 4).

Num segundo momento, a Linguística passou a incorporar os ensinamentos da

Gramática Gerativa, de Noam Chomsky, promovendo um deslocamento do estudo da

língua para a esfera psicológica e biológica. Nessa etapa de investigação, considerava-se

que todo falante conhece o que seja um texto – ato de fala complexo; produto que

mobiliza operações e processos cognitivos. Essa competência textual apontava para a

construção de uma gramática de texto, que visava refletir sobre fenômenos linguísticos

inexplicáveis por meio de uma gramática da frase.

Segundo essa tendência, o texto constituía a unidade mais elevada e se

subdividia em unidades menores, igualmente passíveis de classificação. Essa nova

concepção representou um grande avanço em relação à anterior, uma vez que

considerava o texto como um todo dotado de unidade própria e objeto passível de

análises: “Abandona-se, assim, o método ascendente – da frase para o texto” (KOCH,

2004, p. 6). Contudo, o texto era concebido como um produto pronto e finalizado.

Além disso, percebeu-se, que o texto não deveria ser compreendido apenas como

resultado de processos cognitivos. Para Koch (2004), por exemplo, as operações de

natureza mental não ocorrem somente na mente do indivíduo, isto é, não devem ser

vistas apenas como resultado de processos cognitivos, e sim como o resultado da

interação de várias ações conjuntas praticadas por ele. Nesse sentido, Koch (2008, p.

30) salienta ainda que:

Uma visão que incorpore aspectos sociais, culturais e interacionais à

compreensão do processamento cognitivo baseia-se no fato de que grande

parte dos processos cognitivos acontece na sociedade e não exclusivamente

nos indivíduos.

35

Foi necessário, portanto, propor uma teoria de texto que discutisse a

constituição, o funcionamento e a produção de textos numa situação real de interação

verbal, já que o sentido não se encontra unicamente no texto, mas surge na interação

entre o escritor/falante e o leitor/ouvinte. Nas palavras de Koch (2004, p. 14), “já não se

trata de pesquisar a língua como um sistema autônomo, mas sim em seu funcionamento

nos processos comunicativos de uma sociedade concreta”. A língua é vista, assim, como

um tipo de ação conjunta, e o texto como uma unidade em permanente construção.

Dentro dessa concepção, consequentemente, amplia-se a noção de contexto,

correspondente, inicialmente, a cotexto (segmentos textuais precedentes e subsequentes

ao fenômeno em estudo). Assim, com a introdução da Pragmática, o contexto passou a

abranger primeiramente a situação comunicativa imediata e, posteriormente, o entorno

sócio-histórico-cultural, representado na memória por meio de modelos cognitivos, e,

em seguida, passou a constituir a própria interação e seus sujeitos: o contexto constrói-

se, em grande parte, na própria interação. Por tudo isso, podemos afirmar que “texto e

discurso se relacionam de maneira interdependente e imbricada, então não podemos

desvincular o contexto linguístico da situação” (CIULLA E SILVA, 2008, p. 48).

Na etapa atual dos estudos linguísticos, tem-se ainda a interface entre a

Linguística de Texto e Análise do Discurso (AD), duas áreas da Linguística

correntemente confundidas ou colocadas em relação de oposição. Na verdade, trata-se

de duas vertentes que, nos termos de Adam, requerem “ao mesmo tempo, (...) uma

separação e uma complementariedade, nas suas relações mútuas nas ligações com outras

áreas do saber.” (ADAM, 2008, apud CAVALCANTE et al., 2010, p. 228).

Ao mesmo tempo em que apresentam características singulares que justificam

sua separação, por não serem contraditórias, permitem uma aproximação no estudo de

fenômenos da linguagem. Por isso, consideramos necessário tentar estabelecer uma

relação de proximidade entre essas duas ciências, que, juntas, são capazes de contribuir

para uma abordagem mais minuciosa em relação à análise linguístico-discursiva dos

textos,

Para Beaugrande (apud KOCH, 2009, p. 154), “hoje, a Linguística de Texto é

provavelmente melhor definida como subdomínio linguístico de uma ciência

transdisciplinar do texto e do discurso.” Marcuschi (1998) complementa, mostrando que

hoje a LT se configura como “uma disciplina de caráter multidisciplinar, dinâmica,

36

funcional e processual (...)”. Isto é, a Ciência ou Linguística de Texto sente necessidade

de intensificar sempre mais o diálogo que já há muito vem travando com as demais

ciências, procurando, dessa forma, explicar a entidade multifacetada que é o texto –

“fruto de um processo extremamente complexo de interação e construção social de

conhecimento e de linguagem” (KOCH, 2009, p. 157).

Cavalcante et al. (2010, p. 228) apontam: “texto e discurso são pensados de

forma contextualizada, articulada”. Assim, ainda segundo os autores, “qualquer sentido

toma como pilar um determinado posicionamento sociodiscursivo de quem o construiu,

e é, por isso mesmo, passível de reformulações, recategorizações.” (ibid., p. 231). Isso

torna evidente a necessidade de não separar “as noções de linguagem e contexto, pois

que se mostram inevitavelmente imbricadas” (SALOMÃO, 1999, apud

CAVALCANTE et al., 2010, p. 231).

Percebemos, desse modo, que, de seu surgimento até os dias de hoje, a

Linguística de Texto percorreu um longo caminho e continua ampliando e modificando

seus estudos sobre o texto. Ou seja, antes uma disciplina de caráter gramatical (análise

transfrástica, gramáticas textuais), passou pelos estudos pragmático-discursivos até se

transformar em disciplina com tendência sociocognitivista e interacional. Devido,

portanto, ao grande interesse por essa perspectiva sociointeracional-discursiva da

linguagem, no limiar do século XXI, surgem diversos desdobramentos que passam a ser

(re)analisados especificamente na LT, como as formas de progressão textual

(referenciação, progressão referencial, formas de articulação textual, progressão

temática, progressão tópica), o processamento sociocognitivo do texto, os gêneros, a

intertextualidade e muitos outros.

37

2.2. O texto como unidade de ensino

A LT passou por diversas transformações antes de chegar ao estágio atual.

Acompanhando essas transformações, o conceito de texto também precisou ser revisto.

Atualmente, o texto tem sido considerado “não mais como uma estrutura acabada

(produto), mas como parte de atividades mais globais de comunicação.” (BENTES,

2001, p. 268). Nesse sentido, a produção textual passa a ser vista como uma atividade

interacional e, desse modo, podemos perceber que são consideradas as condições de

produção e recepção de textos. Assim, nas aulas de Língua Portuguesa, o texto deve ser

tomado como unidade de ensino para o desenvolvimento da competência comunicativa,

isto é, o texto, conforme já apontava Geraldi (1997), deve ser o ponto de partida, já que

é nele que os alunos devem descobrir os modos de construção, e o ponto de chegada,

porque se espera que, a partir da reflexão sobre textos alheios, os alunos sejam capazes

de construir textos próprios.

Salientamos, porém, como faz Santos (2006, p.1-2), que

Quando se defende o ensino de língua portuguesa numa abordagem textual,

entra em questão o uso de textos como unidade de ensino, e não como mero

pretexto – para destacar dígrafos, substantivos abstratos ou sujeito composto,

por exemplo.

Conforme chama a atenção Bentes (2001), esse ensino atrelado a textos parece

ser pouco questionável, ou mesmo constituir uma real necessidade, apesar de nem

sempre ter sido bem aceito. A grande questão consiste em como instituir, de forma

pertinente e eficiente, o texto como objeto de ensino.

Segundo a Linguística de Texto, deve-se tomar como unidade básica, ou seja,

como objeto particular de investigação, não a palavra ou a frase, mas o texto, já que o

que as pessoas têm a dizer umas às outras não são palavras nem frases isoladas. Ou seja,

o texto compreende a forma específica de manifestação da linguagem. (cf. FAVERO e

KOCH, 1988). Essa concepção de texto norteia os PCN:

Se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e interpretar textos, não é

possível tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem

a palavra, nem a frase que, descontextualizada, pouco tem a ver com a

competência discursiva, que é a questão central. Dentro desse marco, a

unidade básica do ensino só pode ser o texto. Priorizar o texto não significa

que não se enfoquem palavras ou frases nas situações didáticas específicas

que o exijam (BRASIL, 2000, p. 35-36).

38

Vemos, assim, que há lugar para trabalhar o léxico, a ortografia, questões

gramaticais, por exemplo, mas tudo isso pode e deve partir do objeto maior de ensino,

que é o texto, para fazer sentido. Um dos objetivos dessa abordagem textual, em que o

texto atue como principal objeto de ensino, é desenvolver no aluno o seu potencial

crítico e reflexivo, fazendo-o perceber as múltiplas possibilidades de se expressar nas

mais diversas situações linguageiras, ultrapassando a habilidade de memorizar regras e

apontar categorias. Em relação a este fato, Antunes (2003, p. 121) destaca que a

exploração das categorias gramaticais deve ocorrer

conforme cada texto em análise, sem perder de vista, no entanto, que não é a

categoria em si que vale, mas a função que ela desempenha para os sentidos

do texto. Ou seja, mesmo quando se está fazendo a análise linguística de

categorias gramaticais, o objeto de estudo é o texto [grifos da autora].

Portanto, não basta saber, por exemplo, o que é uma conjunção ou um pronome

e saber classificá-los; é preciso saber os efeitos que conseguimos com o uso dessas

categorias dentro do texto, levando em consideração uma série de outros fatores, como

o contexto de produção “para que se garanta seu uso com coerência e adequação

comunicativa” (ANTUNES, 2003, p. 121). Dessa forma,

Praticar o uso de textos, como estudar o texto, é, inevitavelmente, praticar e

estudar gramática.” (...) Só que esse estudo deve ser feito numa perspectiva

eminentemente interacional, o que significa dizer na dimensão de se perceber

como as categorias e regras gramaticais, na verdade, funcionam na

construção dos textos, orais ou escritos, curtos ou longos. (Ibid., p. 124-125)

Segundo Koch (2008, p. 189), não se trata, porém, de eliminar a metalinguagem

e a nomenclatura, nem muito menos “inculcar, na mente dos alunos, complicados

conceitos linguísticos recém-aprendidos na Universidade”, mas de utilizá-los com o

objetivo de subsidiar o desenvolvimento de competências de leitura e competências de

produção textual. A gramática, nesse sentido, não deve ser vista como algo inútil e que

não deva ser ensinado. A grande questão consiste em “ensinar gramática dentro de

práticas concretas de linguagem” (ibid.).

Logo, o deslocamento do foco na gramática normativa para o foco no texto

significa levar o aluno a uma reflexão sobre como se produzem sentidos na interação

por meio da língua, ou seja, por intermédio de textos (cf. KOCH, 2002a, p.3). Dessa

forma, o foco da atenção passa a ser o valor semântico-discursivo das estruturas

39

linguísticas (e não seu aspecto meramente formal), o uso que se faz dos elementos

linguísticos e os efeitos de sentido que eles podem produzir e a sua funcionalidade em

diferentes contextos de produção.

Nessa perspectiva, o texto não serve de pretexto, para identificar e classificar

elementos gramaticais. No lugar dessa abordagem, o estudo do texto como unidade de

ensino preconiza a integração entre as três principais práticas de linguagem defendidas

pelos PCN: prática de leitura, produção e análise linguística. Em relação a essa última

instância, na avaliação de Geraldi (1997, p.74),

O uso da expressão “Análise Linguística” não se deve ao mero gosto por

novas terminologias. A análise linguística inclui tanto o trabalho sobre as

questões tradicionais da gramática quanto questões amplas a propósito do

texto; adequação do texto aos objetivos pretendidos; análise dos recursos

expressivos utilizados (metáforas, metonímias, paráfrases, citações, discursos

direto e indireto, etc.); organização e inclusão de informações etc.

Essencialmente, a prática de análise linguística não poderá limitar-se à

higienização do texto do aluno em seus aspectos gramaticais e ortográficos,

limitando-se a “correções”. Trata-se de trabalhar com o aluno o seu texto

para que ele atinja seus objetivos junto aos leitores a que se destina.

Defendendo também essa visão, o Guia do PNLD-EM/2012 ressalva, no que diz

respeito à reflexão sobre a língua e a linguagem, que o ensino de língua portuguesa deve

ser capaz de “privilegiar, em função de tomar o uso como objeto de reflexão,

abordagens discursivo-enunciativas da língua, não se atendo, portanto, ao nível da

frase” (BRASIL, 2011, p.15). Para tanto, conforme ressalva Koch (2008, p. 187), cabe

oferecer ao professor “subsídios que lhe permitam trabalhar o texto em sala de aula, de

maneira não intuitiva. E esses lhe serão, em grande parte, fornecidos pela Linguística

Textual”.

Acreditamos, assim, que o tratamento do texto em sala de aula deva englobar

aspectos variados, que necessitam ir além do que está escrito ou do que foi falado. É

imprescindível que locutor e interlocutor levem em conta fatores como o suporte onde

circula o texto, o gênero textual a que pertence, a tipologia textual que predomina, os

elementos verbais e os não verbais que constituem esse texto, assim como a interação

entre os participantes do discurso. Como destaca Cavalcante (2011a, p. 17),

Partimos, assim, de uma noção de texto como fenômeno comunicativo, o que

supõe uma visão de coerência/coesão e de textualidade que não depende

exclusivamente de propriedades inerentes à organização dos elementos no

cotexto, mas de um contexto sociocultural mais amplo, o que inclui uma série

de atividades interpretativas dos co-enunciadores.

40

Dessa forma, percebemos que o texto deve ser considerado como elemento

interacional, marcado pela coesão entre seus elementos e pela coerência interna/externa.

A coesão confere legibilidade ao texto, mas não é quesito indispensável para

caracterizá-lo como tal, como se acreditava no início, e a coerência não depende apenas

da relação de significado entre os componentes textuais, mas é definida, principalmente,

pela interação com o leitor/ouvinte.

Em outras palavras, defendemos que a interação pela linguagem ocorre entre

sujeitos num espaço a que denominamos texto e, dessa forma, assumimos a concepção

interacional de língua, vista como prática social. Assim, “os sujeitos são vistos como

atores/construtores sociais” (KOCH, 2008, p. 188) e o texto como o próprio lugar onde

interagem esses atores. Cavalcante vai além dessa concepção, ressaltando ser o texto

uma “unidade funcional que não somente permite a interação, como também viabiliza

diversas formas de representar o mundo” (CAVALCANTE et al. 2010, p. 228).

Dessa forma, consideramos imperativo levar o aluno a perceber que “o texto não

tem um único significado e não é só o autor que sabe o que o texto diz” (ALMEIDA,

2005, p. 16); os sentidos dos textos vão sendo construídos a cada leitura, inclusive de

um mesmo leitor, não sendo possível impor um único sentido preestabelecido pelo

autor. “Por isso, o papel ativo do leitor é essencial na construção de sentidos de textos,

orais ou escritos” (Ibid., p. 17), ou seja, é mais que necessário que o professor ponha o

aluno numa posição ativa, de interação com o texto.

Entretanto, por mais que essa visão se mostre consensual entre pesquisadores e

especialistas em ensino, na sala de aula nem sempre o estudo pautado no texto tem sido

considerado sob essa dimensão interacional. De acordo com Antunes (2003, p. 19),

ainda persiste o ensino de língua sob uma “perspectiva reducionista do estudo da

palavra e das frases descontextualizadas”, de regras gramaticais e nomenclaturas, que,

apesar de importantes em determinados momentos, não deve ser o foco das atenções,

uma vez que o crucial é que o aluno seja capaz de, por exemplo, optar por uma

construção que seja mais adequada a determinado contexto e não a outro. Dessa forma,

os PCN consideram mais significativo que

o aluno internalize determinados mecanismos e procedimentos básicos

ligados à coerência e à coesão do que memorize, sem a devida apreensão de

sentido, uma série de nomes de orações subordinadas ou coordenadas

(BRASIL, 2002, p. 71).

41

Acreditamos, assim, como Geraldi (1997, p. 135), que o texto é o ponto de

partida e o ponto de chegada de todo processo de ensino/aprendizagem de língua, uma

vez que compreende a totalidade do processo de enunciação, revelando-se tanto quanto

forma quanto discurso. É, portanto, na percepção das situações discursivas,

materializadas nos textos, que o aluno poderá se constituir como cidadão e exercer seus

direitos como usuário da língua.

2.3. Coesão e referenciação

A referenciação é uma das formas de estabelecimento da coesão “entendida

como a operação que responde, do ponto de vista textual, pela organização das unidades

linguísticas do texto e pela conservação/progressão das informações nele contidas”

(ALMEIDA, 2005, p. 4). É a coesão, portanto, uma das principais propriedades

responsáveis em conferir textualidade a um conjunto de enunciados. (cf.

BEAUGRANDE e DRESSLER, 1981).

Segundo Antunes (2005, p. 50), ao tratarmos de coesão, não devemos nos referir

apenas às ligações observáveis na superfície textual,

os termos se vão ligando em sequência exatamente porque se vão

relacionando conceitualmente. (...) a continuidade que se instaura pela coesão

é, fundamentalmente, uma continuidade de sentido, uma continuidade

semântica (...).

Dessa forma, a coesão é responsável não só por instaurar os elos da superfície

dos textos como também por apontar onde se encontram esses elos e que partes eles

articulam. Assim, devemos perceber a coesão como um mecanismo intimamente

relacionado à coerência textual, uma vez que o encadeamento dos elementos

linguísticos, artifício básico da língua, também exige que o leitor opere relações várias

que não somente aquelas observáveis na superfície textual, auxiliando, portanto, a

compreensão textual.

Quanto a essa dimensão do fenômeno da coesão, concordamos com Koch

(2002a, p. 89) em dizer que

(...) o fenômeno da coesão é muito mais amplo: não se trata apenas do

estabelecimento de relações entre enunciados ou parte de enunciados, mas de

operar remissões e retomadas referenciais; de criar ou recategorizar objetos-

42

de-discurso; de sumarizar, rotular, muitas vezes estabelecendo orientações

argumentativas; de introduzir recorrências produtoras de sentido

(paralelismos, paráfrases, repetições, etc.); de presidir a seleções lexicais

adequadas ao tema, ao estilo, ao gênero; e assim por diante.

Desse modo, tratar da referenciação é também trabalhar com os conceitos de

coesão e coerência. Em trabalhos mais antigos, porém, a coesão era observada no nível

superficial, apenas por sua capacidade em realizar ligações e estabelecer algumas

relações entre as partes de um texto ou retomadas de elementos textuais. Essa prática –

muito comum ainda em livros didáticos, nos quais predomina a nomenclatura “coesão

referencial” e “coesão sequencial” – não corresponde ao processo da referenciação

sobre o qual nos debruçamos.

Vale lembrar que, antes de efetuar essa repartição da coesão – em referencial e

sequencial – realizada, principalmente, devido a questionamentos sobre a distinção

apontada por Halliday e Hasan (1976) entre referência e substituição, houve muitos

estudos sobre os processos coesivos. Para os autores, havia cinco categorias de fatores

coesivos: (i) referência, (ii) substituição, (iii) elipse, (iv) conjunção e (v) léxico.

A Referência pode ser textual (endófora), à medida que retoma (anáfora) ou

antecipa (catáfora) um termo linguístico textual (presente no cotexto) quanto

extratextual/situacional (exófora), ao passo que se refere a algo que se encontra fora do

texto.

Esse mecanismo pode ser sintetizado pelo seguinte esquema:

REFERÊNCIA

Esquema 1: Mecanismos referenciais (cf. KOCH, 1992)

SITUACIONAL

EXÓFORA

TEXTUAL

ENDÓFORA

Ao que precede

Anáfora

Ao que segue

Catáfora

43

Halliday e Hasan destacavam, ainda, três ramificações para a referência: a

pessoal, realizada por pronomes pessoais e possessivos; a demonstrativa, em que se

utilizam pronomes demonstrativos e advérbios indicativos de lugar; e a comparativa,

quando ocorre por identidades ou similaridades.

A segunda categoria, a substituição, refere-se à troca de um item lexical por

outro e pode ser nominal, quando é obtida por meio de pronomes pessoais, indefinidos,

numerais ou nomes genéricos, ou verbal.

A elipse, por sua vez, consiste na omissão (na substituição por uma categoria

vazia [Ø]) de elementos nominais, verbais ou mesmo oracionais, facilmente

recuperáveis, seja pelo contexto ou mesmo pelas desinências morfológicas da língua.

A conjunção, diferentemente das outras relações coesivas apontadas, não se

refere a uma relação anafórica, sendo considerada um elemento coesivo por excelência.

Ela é realizada por uma diversidade de conectivos, que estabelecem múltiplas relações

semânticas, como aditivas, adversativas, causais, etc.

Por último, o léxico (ou coesão lexical) obtém-se por meio da reiteração, que

equivale à repetição de uma mesma palavra, ou ao uso de sinônimos, hiperônimos,

nomes genéricos, e da colocação, que consiste na utilização de vocábulos pertencentes a

um mesmo campo semântico.

Esse desmembramento da coesão em cinco categorias suscita dois

questionamentos. O primeiro é quanto à separação entre referência, substituição e

elipse, uma vez que esta não deixa de ser uma espécie de substituição por Ø de um

elemento já citado, além de também poder atuar como um mecanismo referencial. Além

disso, consideramos que as formas substitutivas são também uma maneira de

estabelecer referência. O segundo refere-se à separação entre referência e coesão

lexical, pois os itens lexicais funcionam como termos que fazem referência “a

elementos do mundo textual” (KOCH, 1992, p.27).

Em relação à separação entre substituição e referência, Halliday e Hasan alegam

que nesta há compatibilidade referencial e naquela ocorre redefinição, ou seja, uma

nova especificação a ser adicionada. Contudo, Segundo Koch (1992, p. 26), essa visão

se mostra inconsistente, uma vez que considera que “os itens referenciais, vistos como

simples substitutos do referente, poderiam ser sempre trocados por ele”. Diante da

44

problemática, consideramos mais conveniente considerar a referência, a elipse, a

substituição e o léxico como processos referenciais.

Assim, Koch, levando em consideração a função que esse mecanismo exerce na

configuração textual, propôs uma nova classificação da coesão e a dividiu em dois

grandes grupos: (i) referencial e (ii) sequencial.

A coesão sequencial, segundo Koch (1992) e Fávero (1991), é aquela

responsável por fazer o texto progredir à medida que se realizava por elementos

recorrentes (paralelismo, paráfrases, recursos fonológicos segmentais e supra-

segmentais), por isso propõe-se uma sequenciação parafrástica, ou por operadores

discursivos que sinalizam diversas relações semânticas entre os enunciados, apontando

para um outro tipo de sequenciação, a frástica. Em geral, não há, nesse tipo de coesão,

retomada.

Além disso, como o texto não se faz apenas de informações novas, mas também

de remissões a informações já mencionadas, Koch considera outro tipo de coesão: a

coesão referencial (ou remissiva), que corresponde ao mecanismo que permite ao

produtor do texto remeter, por meio de um elemento linguístico, a outros elementos

textuais, anteriores (anáforas) ou subsequentes (catáforas). Koch (1992, p. 30) chama de

coesão referencial “aquela em que um componente da superfície do texto faz remissão a

outro(s) elemento(s) do universo textual.” Ao primeiro, a autora denominava forma (ou

expressão) referencial ou remissiva e ao segundo, elemento de referência ou referente

textual. Nesses termos, a coesão legitimava-se apenas por sua característica remissiva e

antecipatória de informações cotextuais.

2.4. Da referência à referenciação

A visão dos mecanismos coesivos da língua como elementos facilmente

identificáveis na superfície textual apontada no capítulo anterior supõe uma concepção

de língua como representação objetiva da realidade, em que os seres do mundo

apresentam rótulos pré-estabelecidos.

Essa compreensão, conforme aponta Cavalcante (2010, p. 21), gerava uma

confusão entre referência e denotação, como se fossem termos intercambiáveis, uma vez

que a ação de realizar referências seria o mesmo que escolher palavras que refletiriam

uma realidade posta, palavras que seriam encontradas facilmente num dicionário, numa

45

espécie de “relação de espelhamento”, como se a linguagem fosse o reflexo da realidade

em si.

Dentro desses moldes, a língua teria a função de “descrever e representar o real”

(ZAMPONI, 2003, p. 6), a ação de referir compreenderia “tratar de uma relação entre

palavras isoladas e os objetos do mundo real que elas podiam etiquetar”

(CAVALCANTE, 2011a, p. 20) e os referentes seriam, nesse contexto, analisados como

se já estivessem prontos para “classificar” as coisas do mundo. Contudo, conforme

salienta Koch (2004, p. 57):

Nosso cérebro não opera como um sistema fotográfico do mundo, nem como

um sistema de espelhamento, ou seja, nossa maneira de ver e dizer o real não

coincide com o real. Ele reelabora os dados sensoriais para fins de apreensão

e compreensão.

Como percebemos, essas concepções de língua e de referência mostram-se

bastante limitadas, pois não dão conta da maleabilidade na construção dos referentes no

discurso, conforme podemos confirmar com as palavras de Cavalcante (2011b, p. 183):

não se pode falar de referentes [...] como entidades estáticas, congeladas,

registráveis em dicionário, tal como se faz com os significados, senão apenas

como algo que, durante uma interação, podemos imaginar, conceber,

apreender, e que não será igual para todas as pessoas que participam dessa

interação naquele momento (...)

Em outras palavras, dizemos que os elementos referenciais não podem ser

interpretados isoladamente, fora do contexto em que se inserem, pois estarão sempre

relacionados a outros elementos – sociais, culturais, discursivos e cognitivos –

imprescindíveis para a interpretação adequada desses referentes. Além disso, cabe

ressaltar que cada falante construirá uma referência única, particular, que pode se

diferenciar de outras a depender dos conhecimentos de mundo de cada um.

Compreendemos que a atribuição da referência deve, fundamentalmente,

considerar a situação comunicativa na qual os referentes são fabricados. Assim,

conforme apontam Apothéloz e Reichler Béguelin (apud CORTEZ, 2003, p. 24),

a referência é antes de tudo um problema que concerne às operações de

categorização e identificação dos referentes efetuadas pelos sujeitos falantes,

à medida que se desenvolve no discurso, e por isso essas operações

46

dependem muito mais do ponto de vista de um enunciador e do contexto de

interação, do que de uma apreensão estritamente cognitiva da realidade.

Os autores deixam claro que o mais importante para a recuperação de um

elemento referencial é a situação de interação, a análise do enunciado, do referente no

seu contexto de produção. Dessa forma, além do conhecimento de mundo necessário

para a interpretação da referência, recorremos também ao conhecimento interacional.

Para tanto, conforme salienta Custódio Filho (2010, p. 120), cabe aos participantes do

ato comunicativo uma cooperação, ou seja, “aceitar entrar [nessa] interação e

reconhecer a pertinência e a validade dos referentes construídos”.

Em outras palavras, os objetos do mundo não devem ser considerados estáveis e

imutáveis, já que dependem da forma como são percebidos e modelados pelos sujeitos

nas práticas sociais, ou seja, a maneira como percebemos o mundo fabrica os referentes,

que deixam de ser concebidos como objetos de mundo, expressão que não caracteriza a

dinamicidade atinente à questão, e passam a ser vistos como objetos de discurso.

No que diz respeito à concepção de língua, entendemos, dentro desses moldes,

que ela atua como uma ferramenta para agir sobre o mundo, não se limitando à sua

simples correspondência. Conforme aponta Cortez (2003, p. 15),

A língua é, assim, essencialmente, “ação pública realizada e negociada

discursivamente no âmbito das relações sociais que se constituem pelo

partilhamento, refutação, desqualificação e modificação de sentido,

experiências e conhecimentos de várias ordens, para que possa opinar,

interferir, rejeitar, chamar atenção e persuadir, entre outras ações, nesse

mundo verbal polifônico.

Portanto, dizemos que os referentes são reelaborados no discurso – eles podem

ou não estar realizados no cotexto por expressões referenciais – com base em inúmeras

pistas deixadas no conjunto do texto e nos conhecimentos que os participantes da

enunciação compartilham. Mas deixemos claro, assim como faz Custódio Filho (2010,

p. 115), que essa reelaboração da realidade

não significa dizer que o papel dos recursos linguístico-semióticos é o de

“ludibriar”, “disfarçar” a verdade. Não se trata disso porque, no fundo,

quando se assume a perspectiva da instabilidade constitutiva, assume-se

também que não há uma verdade absoluta, não há algo “normal”, “fiel” que

precise ser escondido. Significa apenas que é uma função inerente às

linguagens a (re)elaboração das práticas sociais (...).

47

Sob essa perspectiva, defendemos, reiterando as palavras de Koch, que não se

tomará aqui a referência no sentido que tradicionalmente lhe é atribuída – “como

simples representação extensional de referentes do mundo extramental” (KOCH, 2004,

p. 57), em que o homem, através da linguagem, reproduz as coisas do mundo, sendo a

função da língua representar (refletir) seu pensamento e seu conhecimento de mundo –,

contudo, “a realidade é construída, mantida e alterada não pela maneira como

nomeamos o mundo, mas, principalmente, pela maneira como interagimos com ele”

(KOCH, 2009, p. 79).

Nesse sentido, os segmentos da realidade, concebidos como construtos culturais,

deixam de existir como algo a priori e passam a ser construídos no e pelo discurso –

“atividade linguística e sociocognitiva, ligada, acima de tudo, à interação e à

intersubjetividade” (ZAMPONI, 2003, p. 173) – motivo pelo qual passam a ser vistos

como objetos discursivos (ou objetos-de-discurso).

Inserimos, assim, os referentes numa dimensão interacionista e sociodiscursiva,

em que “os sujeitos são vistos como atores/construtores sociais, [e] o texto passa a ser

considerado o próprio lugar da interação” (KOCH, 2002a, p. 90). De acordo com essa

perspectiva, acredita-se que o discurso constrói aquilo a que faz remissão, assim como é

construído por ele.

Dessa forma, concluímos que a interpretação/recuperação de um referente, ou

melhor, um objeto-de-discurso, configura-se como um fenômeno complexo, em que se

necessita considerar a negociação entre os falantes, a recuperação de informações

“armazenadas” na memória discursiva e não somente decodificar significados de

palavras pré-estabelecidos pela língua, o que requer dos envolvidos nesse processo uma

atitude muito mais ativa, interativa e dinâmica, ou seja, uma colaboração mútua entre

eles.

A referência resulta, portanto, de uma ação colaborativa dos parceiros da

interação e, desse modo, saímos do aspecto estático da referência e partimos para o

processo dinâmico de análise linguística, considerando que há dois grandes processos

de coesão (e não mais mecanismos): a sequenciação e a referenciação. Essa diferença

de terminologia é importante porque esses termos destacam mais adequadamente o

processo que representam, por referirem-se a uma atividade discursiva e interacional de

construção de sentido. É, portanto, dentro de uma enunciação mais ampla, incluindo a

48

dimensão discursiva da linguagem, que situamos nosso ponto de vista sobre a

referenciação.

Considerando todo o percurso traçado até o momento, iniciamos nossas

considerações sobre o processo da referenciação propriamente dita, assumindo que

Ela não privilegia a relação entre as palavras e as coisas, mas a relação

intersubjetiva e social da qual as versões do mundo são publicamente

elaboradas, avaliadas em termos de adequação às finalidades práticas e às

ações em curso dos enunciadores (MONDADA , 2001, apud KOCH, 2009,

p. 61).

Mais adequado, dentro dessa concepção, é dizer que a referenciação consiste na

(re)construção de objetos-de-discurso, categorias cognitivo-discursivas alimentadas pela

atividade linguística e que sofrem transformações na memória discursiva dos

interlocutores ao longo da enunciação.

Durante a interação verbal, portanto, o sujeito utiliza-se do material linguístico

de que dispõe, efetuando escolhas significativas para representar estados de coisas,

visando à concretização da proposta de sentido (KOCH, 2004). Por esses motivos, Koch

e Elias (2007, p. 124) afirmam que “o processo de referenciação são escolhas do sujeito

em interação com outros sujeitos, em função de um querer-dizer”. Segundo Koch (2004,

p. 61), os objetos-de-discurso (re)constroem a realidade extralinguística no processo de

interação, porém com ela não se confundem.

A competência de ler, interpretar e escrever textos requer a ativação de vários

conhecimentos: inferenciais, coesivos, cotextuais e contextuais. Dessa forma, ao

desenvolver no aluno essas habilidades, os professores estão trabalhando a

referenciação:

mesmo quando os professores de Língua Portuguesa não estão tratando de

processos referenciais em sala de aula, inevitavelmente, estão recorrendo a

eles, ainda que não o saibam, para compreender um texto, verbal, não verbal

ou multissemiótico (CAVALCANTE, 2011b, p. 184).

Acrescentamos, ainda, que os elementos referenciais de uma língua têm, assim,

muito a revelar sobre os pontos de vista dos sujeitos, pois refletem não a realidade, nua

e crua, mas as impressões, a ideologia dos envolvidos nessa interação. Ou seja, a

realidade passa por uma transformação cognitiva inerente à natureza humana.

49

Para Koch e Elias, (2007, p. 124), a referenciação constitui uma “atividade

discursiva”, um processo sociocognitivo e constitui-se pela introdução, no texto, de

novos elementos/referentes, que, por serem retomados, transformados e recategorizados,

atuam na orientação da construção de sentido dos textos, sejam eles orais ou escritos,

contribuindo para a progressão referencial. Esses referentes, como vimos, nunca serão

iguais para todos os envolvidos na enunciação, já que cada indivíduo compreende o

mundo de um modo particular.

Para Cavalcante (2011a, p. 53), em relação à introdução de referentes no texto,

há dois grandes processos referenciais: a introdução referencial e a anáfora. Aquela se

refere à introdução formal dos referentes no texto e esta é estabelecida com a retomada

de referentes, contribuindo, significativamente, para a progressão do texto. Quando essa

retomada recupera um mesmo referente, gerando uma relação correferencial, tem-se

uma anáfora direta. Nem sempre, porém, a retomada é do mesmo referente, podendo

ocorrer por meio de âncoras, isto é, um elemento de relação/associação com o qual se

pode estabelecer uma ligação. Nesse sentido, não encontramos um antecedente explícito

na superfície do texto, como ocorre com a anáfora direta, mas uma associação com

algum termo por meio de inferências múltiplas. Nesse caso, falamos em anáforas

indiretas, ditas como não-correferenciais por não recuperarem um termo específico

anteriormente citado no cotexto. Esse tipo de anáfora exige do aluno um maior esforço

cognitivo, por mobilizar conhecimentos variados e, por esse motivo, constitui um ótimo

recurso a ser explorado nos textos levados para a sala de aula.

A notícia abaixo, por exemplo, retirada do site do jornal O Globo, poderia servir

para introduzir o estudo de alguns processos referenciais, vejamos:

Menor de 12 anos é detido por tráfico de drogas em Jundiaí, SP

Plantão | Publicada em 22/10/2010 às 12h12m

SÃO PAULO - Um menino de 12 anos foi detido nesta quinta-feira ao vender drogas

em Jundiaí, a 65 km da capital paulista. Segundo a polícia, ele estava com 17 tubetes

de cocaína, 37 pedras de crack e 54 porções de maconha. Com ele também foram

encontrados R$ 70. O menor foi levado para o plantão policial e liberado com a

chegada do pai, mas (0) deve ficar à disposição da Vara da Infância e Juventude.

Segundo a polícia, a droga estava em um saco plástico. Investigadores observaram o

menino vendendo o entorpecente. Um deles se aproximou de carro da criança,

fingindo estar interessado na compra. O investigador agarrou o menino e o apreendeu.

Um olheiro dos traficantes chegou a apontar uma arma para o investigador, mas (0)

fugiu quando viu que havia vários policiais no local.

A droga era vendida sob uma árvore, dia e noite. O local tem vários pontos de fuga e

fica próximo a uma escola e um local de formação de obra.

http://oglobo.globo.com/cidades/sp/mat/2010/10/22/menor-de-12-anos-detido-por-trafico-de-drogas-

em-jundiai-sp-922844702.asp

50

Nesse texto, há a introdução de vários objetos-de-discurso: menor, droga, São

Paulo, investigadores, olheiro, etc., que não estão relacionados/ancorados a nenhum

elemento anteriormente mencionado e que são retomados anaforicamente ao longo do

texto.

A palavra “menor” é retomada formalmente no cotexto por outras palavras ou

expressões formadas por classes gramaticais diferentes: artigo indefinido + substantivo

(um menino); pronome pessoal reto (ele); artigo definido + adjetivo (o menor),

substantivo (criança) e pronome oblíquo (o). Além desses, contamos também com a

retomada pela elipse, marcada no texto pelo morfema zero (0). Porém, mostrar aos

alunos como são feitas essas retomadas não basta para um ensino que se deseja

produtivo e reflexivo; é necessário – além de apontar como elas colaboram para a

coesão, contribuindo para a progressão textual –, mostrar que, no caso dos textos

jornalísticos, as retomadas tentam evitar a manifestação de juízos de valor. Por meio

dessa verificação, o aluno passa a perceber que o uso dessas classes de palavras não se

restringe a regras e classificações, passando a ter mais significação na vida do aluno,

que passa a compreender como tais elementos atuam na comunicação.

Como consideramos que a língua é inerentemente argumentativa (cf.

CHARAUDEAU, 1983), e que, portanto, todo produtor de um texto possui uma

intenção no seu discurso, é interessante fazer os alunos perceberem que a escolha das

palavras “menor” e “criança”, por exemplo, tentam demonstrar certa imparcialidade,

tendo em vista o gênero em questão: uma notícia de jornal.

Como tarefa, o professor poderia pedir aos alunos que utilizassem outras

palavras enfatizando uma posição negativa a respeito do menino detido por tráfico de

drogas. Certamente, encontraríamos palavras como “delinquente”, “pivete”, “moleque”,

“traficante”, entre outras, que surtiriam novos efeitos de sentido no texto.

Além dessa questão, seria possível trabalhar o uso de hipônimos e hiperônimos

como palavras que indicam ao leitor uma informação nova, que só pode ser assimilada

por meio de sua bagagem cultural, social e histórica. No texto analisado, a expressão “o

entorpecente”, funciona como um hiperônimo do termo “droga” por enquadrá-la numa

categoria mais geral. Contudo, para que o leitor recupere o referente desse termo, é

necessário que ele tenha o conhecimento de que o vocábulo pode se referir a qualquer

substância química que cause sensações inebriantes.

51

Considerando esses aspectos, cabe ressaltar a necessidade de redimensionar a

noção de coesão, considerando-a como um processo que envolve não só o emprego de

elos na superfície textual, mas também a manifestação de inferências múltiplas. O uso,

por exemplo, de hipônimos ou hiperônimos, pode oferecer pistas de leitura. O aluno

deve perceber que saber utilizar palavras mais genéricas ou mais específicas nos textos

pode persuadir o leitor a partilhar do seu ponto de vista. Essa questão do trabalho com o

léxico vem sendo defendida, inclusive, pelos PCN, que, para a prática de análise

linguística, sugerem a

Ampliação do repertório lexical pelo ensino-aprendizagem de novas palavras,

de modo a permitir: escolha, entre diferentes palavras, daquelas que sejam

mais apropriadas ao que se quer dizer ou em relação de sinonímia no

contexto em que se inserem ou mais genéricas/mais específicas (hiperônimos

e hipônimos) (BRASIL, 1998, p. 62).

Em relação às anáforas indiretas, Marcuschi (2000) as relaciona a um processo

de referenciação implícita, já que não depende da necessidade de reativar referentes já

explicitados. Para compreender um pouco mais o fenômeno, vejamos o texto abaixo:

A expressão referencial “o jovem” não retoma nenhum referente explícito no

texto (no cotexto), mas é apresentada como se já fosse conhecida, o que é comprovado

pelo fato de ser introduzida por um artigo definido. Contudo, dizemos que o referente é

inferível a partir de pistas cotextuais/âncoras, isto é, “por conta do processamento

sociocognitivo do texto” (CAVALCANTE, 2012, p. 125): o fato de se estar numa

universidade, auxiliadas pelo conhecimento de mundo de que numa universidade, em

geral, os estudantes são jovens. E é justamente por contar com esse tipo de inferência

por parte do leitor, que o enunciador insere esse referente fazendo uso do artigo

definido, apresentando o anafórico indireto “como se já fosse conhecido, dado, velho”

(CAVALCANTE, 2011a, p. 61), o que pressupõe retomada de informação.

Internacionalização da Amazônia

Durante debate em uma universidade, nos Estados Unidos, o ex-governador do

DF, ex-ministro da educação e atual senador CRISTÓVAM BUARQUE, foi

questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazônia. O jovem

americano introduziu sua pergunta dizendo que esperava a resposta de um Humanista

e não de um brasileiro. (...)

Retirado de: http://inimigo-imaginario.blogspot.com/2010/02/algo-para-se-orgulhar.html

52

Há, ainda, um tipo especial de anáfora indireta, que, de acordo com Cavalcante

(2011a, p. 71), “não retoma nenhum objeto de discurso pontualmente, mas se prende a

conteúdos espalhados pelo contexto”. É chamada encapsuladora por sua característica

principal de sumarizar informações difusas no texto, diferenciando-se, assim, das

anáforas indiretas.

As anáforas encapsuladoras constituem um recurso bastante comum,

principalmente, aos textos de natureza argumentativa por apontarem o ponto de vista do

enunciador a respeito das informações dadas. Assim, no trabalho com o ensino médio –

período em que os alunos são colocados quase que exclusivamente a lidar com variados

gêneros da esfera argumentativa – refletir sobre a orientação argumentativa apontada

pelos encapsuladores no texto constitui uma importante tarefa. Além disso, por

recuperarem um conjunto de informações, devem ser apontados, também, como

importantes para o estabelecimento da coesão na tessitura textual.

Os professores e livros didáticos têm, indiretamente, ensinado esse artifício aos

alunos quando abordam os pronomes demonstrativos, por exemplo, mas é preciso ficar

claro que o encapsulamento não se faz só por esse tipo de pronome, mas também por

outros tipos de pronomes, como os indefinidos e outras classes gramaticais, em especial

os substantivos, sendo necessário, portanto, ampliar a abordagem da questão.

O texto abaixo, retirado de uma das coleções do nosso corpus, aparece no

capítulo “A argumentação causal: a importância dos exemplos”, servindo, basicamente,

para identificação de argumentos contrários e de pontos de vista. Contudo,

consideramos que este artigo de opinião é bastante oportuno para trabalhar uma série de

questões associadas à referenciação, entre elas o encapsulamento.

NOVA HUMANIDADE? (Adaptado)

por Flavio Lobo

Notícias de possíveis bebês clonados esquentam o debate sobre os riscos e promessas da

genética, uma ciência que faz sonhar e tremer.

Numa possível visão do futuro, em breve, a divisão das pessoas em meras

classes sociais será apenas uma doce lembrança. No lugar delas haverá, no mínimo, três

grandes grupos: os super-humanos, os infra-humanos e, em número cada vez menor, os

“só humanos”. A separá-los, não apenas diferenças socioeconômicas ou culturais, mas

características biológicas tão evidentes e intransponíveis quanto as que diferenciam um

pequinês de um dobermann (ambas raças caninas “fabricadas” pelo homem).

53

Seremos uma sociedade repleta de seres humanóides (os “infra’) incompletos,

limitados, obedientes ou vegetativos, criados com a única finalidade de servir, como

escravos ou fornecedores de órgãos, tecidos e células, a seus senhores (os “super”).

Entre os dois extremos, uma nova “classe média” composta de pessoas como você e eu,

ávidos por uma possível, mas improvável promoção à casta superior e sob a constante

ameaça de rebaixamento ao nível subumano. Os seres humanos “tradicionais” ou

“orgânicos” (como os alimentos não transgênicos e sem agrotóxicos) entraram em

processo de extinção, contaminados por características genéticas decorrentes de

manipulação, adquiridas através de terapias e medicamentos gênicos e pela inevitável

miscigenação entre os três grupos biossociais.

Como não há progresso científico sem acidentes de percurso, monstros e

aberrações vão surgir em quantidades crescentes. No início, eles serão gerados e

destruídos ou confinados nos laboratórios, mas, com o tempo, ganharão as ruas e

acabarão por contaminar toda a humanidade ou “pós-humanidade” com seus defeitos e

mutações genéticas incontroláveis.

Outros enxergam um cenário futuro completamente diferente. Uma humanidade

livre de doenças e defeitos genéticos, composta por pessoas orgânicas e

psicologicamente equilibradas que viverão cada vez mais e melhor. Um mundo tão

harmônico e aprazível que até as mais graves lesões e mutilações causadas por acidentes

serão facilmente remediadas por meio da substituição de partes do corpo sem risco

algum de rejeição imunológica ou de falta de estoque. Benefícios estes que seriam

estendidos a parcelas cada vez maiores da população do planeta, como a luz elétrica e o

telefone.

O inferno e o paraíso geneticamente fabricados: duas visões delirantes?

Provavelmente. Mas que são frequentemente evocadas ou sugeridas no debate mundial

sobre as oportunidades e os riscos da ciência genética.

Revista Carta Capital. São Paulo: Confiança, 223, 15 de jan. 2003. In: Amaral et al. Novas Palavras,

nova edição, 2010, p. 458-459, vol. 3.

Trata-se de um texto essencialmente argumentativo, em que o autor apresenta

duas posições antagônicas sobre a clonagem: a contrária – tradicional divisão da

sociedade em classes, no futuro haverá a divisão das pessoas em três grandes grupos (os

super-humanos, os infra-humanos e os só humanos); a favorável – a humanidade do

futuro será “livre de doenças e defeitos genéticos, composta por pessoas orgânicas e

psicologicamente equilibradas que viverão cada vez mais e melhor”.

Marcando seu ponto de vista sobre essas duas posições, na conclusão do texto

esses dois argumentos são encapsulados sob a forma das expressões nominais “o

inferno” e “o paraíso”. A primeira, que sumariza os três primeiros parágrafos – que

argumentam sobre um progresso científico que só prejudicaria os seres humanos, que

seriam limitados a uma condição passiva e servil, – agrega um juízo de valor negativo

do autor; já a segunda, que encapsula todo o quarto parágrafo – que argumenta sobre os

54

prováveis benefícios de uma sociedade transformada pelos avanços genéticos –,

manifesta um ponto de vista positivo acerca do possível modo de vida a ser instaurado.

Por essas características, dizemos que o encapsulamento constitui uma “estratégia

anafórica, na qual uma expressão referencial resume um conteúdo textual, e inclui

outros conhecimentos que temos sobre o que está sendo referido” (CAVALCANTE,

2012, p. 127).

Os processos referenciais acima mencionados são, portanto, importantes na

tessitura textual e podem ser sintetizados da seguinte maneira:

Introdução

referencial

Anáfora (continuidade referencial)

Anáforas diretas

(correferenciais)

Anáforas indiretas

(não correferenciais)

AI (propriamente

dita)

Anáforas

encapsuladoras

Quadro 1: Quadro-síntese dos processos referenciais (cf. CAVALCANTE, 2011a, p. 86).

Cabe mencionar, ainda, certas expressões linguísticas cuja interpretação depende

exclusivamente de relações temporais, espaciais ou situacionais: as expressões dêiticas,

que existem de modo paralelo aos casos de introdução referencial e de anáfora. Para

Bosh (1983, apud CAVALCANTE et al, 2003, p. 68), a anáfora deve se diferenciar da

dêixis, pois aquela apenas mantém “o referente no campo da atenção”, enquanto esta

tem por objetivo “deslocar o campo de atenção para um referente”. Em outras palavras,

é necessário que “o meio utilizado para identificar o referente se apoie nos parâmetros

de lugar, tempo, ou pessoa da situação de enunciação”.

No texto “Nova Humanidade”, reproduzido anteriormente, os termos “eu” e

“você” no trecho: “Entre os dois extremos, uma nova “classe média” composta de

pessoas como você e eu, ávidos por uma possível, mas improvável promoção à casta

superior e sob a constante ameaça de rebaixamento ao nível subumano”, identificam os

interlocutores da situação comunicativa e para interpretá-los adequadamente,

precisamos seguir algumas pistas como saber “quem fala” e “para quem fala”, por

exemplo, que faz com que o leitor vá além do que está explícito na superfície textual.

55

Percebemos, portanto, que, para estabelecermos sentido para os textos com os

quais nos deparamos, não só devemos nos ater aos elementos coesivos, dispostos na

materialidade linguística, como também necessitamos considerar um conjunto amplo de

conhecimentos partilhados pelos interactantes – linguísticos, enciclopédicos e

interacionais. Trabalhar a referenciação significa fazer o aluno perceber, por exemplo, a

importância dessas âncoras, que constituem, inclusive, um ótimo recurso para trabalhar

questões semânticas, como campo lexical e semântico.

Estimular a reflexão sobre esses processos referenciais constitui uma real

necessidade nas aulas de compreensão e produção de texto. Para tanto, é preciso que os

professores não se limitem ao uso dos livros didáticos, que, na maioria das vezes, não

fazem esses desdobramentos.

Cabe ainda pontuar o funcionamento da recategorização referencial, que diz

respeito a uma avaliação da enunciação realizada, atuando como mais do que uma

sumarização. Conforme salienta Cavalcante (2012, p. 106), o fenômeno corresponde à

possibilidade de um referente passar, ao longo do texto, por mudanças intimamente

relacionadas ao direcionamento, não só argumentativo como expressivo, emotivo,

poético, etc, que o produtor pretende dar a seu texto. O texto abaixo exemplifica esse

mecanismo tão comum nos textos que recebemos e produzimos diariamente:

De que lugar do mundo vem o sorvete?

Essa delícia gelada que todos nós apreciamos e que combina com a estação

[verão] vem de uma parte muito distante do mundo: o Oriente.

A guloseima surgiu na China, assim como o macarrão e a seda. O primeiro

relato de que se tem notícia sobre o consumo do sorvete data de 3 mil anos atrás.

Naquela época, como ainda não existiam geladeiras, ele era feito com uma

matéria-prima natural, a neve, e misturado a suco de frutas e mel.

Quem levou a iguaria refrescante para a Europa foi Alexandre, o Grande, rei

da Macedônia. No século 13, o veneziano Marco Polo voltou de uma de suas muitas

viagens à China (ele era fascinado por aquele lugar) e trouxe na bagagem de volta a

receita (0) para os cozinheiros italianos. Sabe o que eles fizeram? Adicionaram um

ingrediente que deixou o sorvete ainda mais cremoso, o leite.

A partir daí, o quitute virou uma febre no Ocidente e passou a ser consumido

na mesa dos nobres, por ser considerado um alimento raro. (...)

(TAKAIAMA, Shaonny. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 25 fev. 2006. Estadinho). In:

SARMENTO, Leila Lauar. Português: leitura, produção, gramática. São Paulo: Moderna, 2009, p.

106.

56

Num primeiro momento, no título do texto, o enunciador informa sobre o tópico

central do texto, “o sorvete”, mas, à medida que a narrativa progride, percebemos que

esse termo vai sendo retomado e modificado, principalmente, a partir das expressões

“essa delícia gelada”, “a guloseima”, “a iguaria refrescante” e “o quitute”, adquirindo

novas feições. Essas expressões são anáforas recategorizadoras e apontam uma posição

positiva e elogiosa sobre o sorvete. Vemos, assim, “que o fenômeno da recategorização

referencial é um elemento fundamental para a tessitura textual” (CAVALCANTE, 2012,

p. 108).

Todos esses exemplos mostram como os textos que lemos e produzimos contam

com o aparato da referenciação para a construção de objetos discursivos. Além disso, a

utilização de recursos linguísticos referenciais auxilia na construção de sentido e na

(re)construção da coesão, tornando oportuna, por consequência, a coerência textual.

Neste sentido, o trabalho com a referenciação, como um processo que envolve intenção

e interação, constitui aspecto crucial nas atividades de produção e, principalmente,

compreensão textual, à medida que permite aos estudantes refletirem de modo mais

satisfatório sobre os textos que leem e/ou escrevem.

Por todas essas características, a referenciação é definida amplamente por

Cavalcante (2012, p. 113) como o

conjunto de operações dinâmicas, sociocognitivamente motivadas,

efetuadas pelos sujeitos à medida que o discurso se desenvolve, com o intuito

de elaborar as experiências vividas e percebidas, a partir da construção

compartilhada dos objetos de discurso que garantirão a construção de

sentido(s) [grifos da autora].

Utilizar o texto como o eixo condutor das aulas de língua portuguesa tem sido

uma tarefa pouco questionada pelos professores de português. Contudo, o trabalho com

o texto, principalmente no que tange ao ensino de leitura e produção textual, deve

colaborar para a formação de leitores críticos, que sejam capazes de refletir sobre as

especificidades que a nossa língua compreende, o que não tem sido adequadamente bem

trabalhado em muitos livros didáticos.

A referenciação, como prática discursiva é de grande importância nas atividades

de produção textual e, por consequência na leitura de diversos textos, formando leitores

e produtores que, refletindo sobre os mecanismos e usos da língua, tornam-se capazes

57

de melhor utilizar/compreender os recursos linguísticos postos a sua disposição nos

variados contextos comunicativos.

Assim, a referenciação não deve ser trabalhada apenas por sua característica em

evitar repetições num cotexto. Nas palavras de Cavalcante (2011b, p. 186), ela se presta

a “organizar o texto, a argumentar, a resumir, a introduzir novas informações, a definir,

a veicular diferentes vozes ou pontos de vista discursivos, a chamar atenção do leitor”.

Considerando tudo o que foi exposto neste capítulo, percebemos que recursos

referenciais configuram estratégias discursivas essencialmente relevantes para a

construção de um texto, seja ele de qualquer natureza. Por esse motivo, dizemos que os

mecanismos de referenciação presentes num texto colaboram fortemente para a

construção de seu sentido, e, consequentemente, para a construção da coerência.

Percebemos, então, que a referenciação, como atividade ao mesmo tempo textual e

discursiva, “é um processo em permanente reelaboração, que, embora opere

cognitivamente, é indiciado por pistas linguísticas e completado por inferências várias.”

(cf. CAVALCANTE et al., 2010, p. 234). Além disso, todas essas afirmações servem

para confirmar que não se pode dicotomizar as noções de linguagem e contexto,

inevitavelmente imbricadas.

É de suma importância os elementos de referenciação na construção de sentido

dos textos e, por consequência, na formação de leitores e produtores competentes, que,

conscientes das estratégias de que podem lançar mão, selecionam com maior adequação

os recursos linguísticos capazes de atingir os objetivos pretendidos em cada situação

comunicativa: familiar, escolar, profissional e social.

58

3. REFERENCIAÇÃO NOS LDP DE ENSINO MÉDIO

3.1. Metodologia de pesquisa

Nesta seção, apresentaremos de forma mais detalhada as obras aprovadas pelas

duas análises que nos serviram de base (PNLEM/2009, PNLD-EM/2012) e que

constituem nosso corpus, bem como pontuaremos as etapas da nossa pesquisa.

Como já foi dito, esta dissertação é continuação de pesquisas realizadas

anteriormente, durante nossa Iniciação Científica. De início, à época da pesquisa de

graduação, foi feito um levantamento da abordagem da referenciação nos manuais

didáticos publicados em 2004 analisados pelo PNLEM/2009, considerando as 11

coleções aprovadas. Nesse momento, contávamos com um total de 21 livros didáticos,

já que 6 obras eram dispostas em volumes únicos e 5 obras eram divididas em três

volumes.

Numa segunda etapa, que coincidiu com o início dos estudos da pós-graduação,

foi lançada uma nova listagem, em 2011, com as coleções aprovadas pelo PNLD-

EM/2012, que deu margem para ampliarmos as pesquisas já realizadas sobre o assunto,

sendo possível estabelecer uma comparação de ambas as análises, investigando quais

foram as mudanças, os progressos referentes ao tema em estudo. Nesta nova listagem,

novamente tivemos 11 coleções aprovadas; desse número, 3 coleções haviam

permanecido da análise anterior e 8 novos livros entraram nessa nova relação de livros

didáticos aprovados pelo PNLD-EM/2012. No total, portanto, tivemos mais 33 volumes

de livros didáticos, já que todas as obras dessa segunda análise apresentam-se em três

volumes.

Esperamos encontrar nos LDP aprovados mais recentemente alguma atualização

em relação à abordagem da referenciação. Além disso, por meio dessa comparação, será

possível verificar quais foram os principais ganhos obtidos e se as falhas apontadas,

tanto pelos Guias quanto pela nossa análise feita durante a IC, foram corrigidas em

função de um ensino mais produtivo de análise linguística, leitura e produção textual no

que concerne à referenciação.

Somando as coleções analisadas nas duas análises, trabalhamos com um total de

22 coleções, distribuídas em 54 livros didáticos, incluindo nessa soma as três obras que

permaneceram, já que elas tiveram que passar por uma nova análise, como observamos

no quadro 2:

59

PNLEM

2009

PNLD 2012 Obras

Anteriores

Novas

Obras Total

Nº TOTAL DE COLEÇÕES

APROVADAS 11 11

22

Nº total de obras distribuídas em três

volumes 5 3 8

Nº total de obras distribuídas em

volume único 6 0 0

TOTAL de livros didáticos analisados

(obras x volumes) 21 33 54

Quadro 2: Total de obras analisadas na pesquisa.

Para ilustrar a distribuição dessas obras pelas duas edições do PNLEM/PNLD,

relacionamos, no quadro 3 abaixo, todas as coleções, mostrando as obras referentes a

cada análise.

Em relação às três obras que se mantiveram em ambas as análises, nossa

intenção era analisá-las de modo mais específico, a fim de observar mais atentamente se

ocorreram mudanças na abordagem da referenciação/CR/coesão ou algum progresso –

e, se tivesse havido, verificar em que consistiriam tais mudanças. Essas obras poderiam

servir de amostragem do que tem sido levado em consideração pelos autores de livros

didáticos no que se refere ao ensino de língua portuguesa, já que entre uma publicação e

outra esperamos que haja atualização, não só de textos, mas de teorias, acompanhando a

constante evolução dos estudos linguísticos. Contudo, observamos que apenas a coleção

Novas Palavras – Nova Edição, de Amaral et al. elaborou uma nova edição; as outras

obras, Português: Língua e Cultura, de Faraco, e Português: Linguagens, de Cereja e

Magalhães, foram quase uma reprodução da publicação anterior, com algumas pequenas

alterações de textos, sendo os exercícios os mesmos. A coleção de Faraco pareceu

apenas ter sido dividida em três volumes. Ou seja, não houve nenhuma mudança

significativa nessas duas coleções, por isso não as consideramos nessa nova análise,

atentando-nos às 8 coleções novas e à de Amaral et al.

60

Quadro 3: Distribuição das obras aprovadas no PNLEM/2009 e no PNLD-EM/2012.

OBRAS /EDITORAS

PNLEM

2009

PNLD

2012 Português – Projetos (Vol. único)

Carlos Emilio Faraco e Francisco Marto de Moura / Ática

Português (Vol. único)

João Domingues Maia / Ática

Português de olho no mundo do trabalho (Vol. único)

Ernani Terra e José de Nicola Neto

Textos: leituras e escritas (Vol. único)

Ulisses Infante / Scipione

Português (Vol. 1, 2 e 3)

José de Nicola Neto

Português: Língua, Literatura, Produção de Textos (Vol. 1, 2 e 3)

Maria Luiza Abaurre, Marcela Regina Nogueira Pontara e Tatiana Fadel

Língua Portuguesa – Coleção Vitória Régia (Vol. único)

Heloisa Harue Takasaki

Língua Portuguesa – Projeto Escola e Cidadania para todos (Vol. único)

Harry Vieira Lopes, Zuleia de Felice Murrie, Jeosafá Fernandez Gonçalves e

Simone Gonçalves da Silva

Língua portuguesa – Linguagem Interação (Vol. 1, 2 e 3) Carlos Emílio Faraco, Francisco Marto de Moura e José Hamilton Maruxo Júnior

/ Ática

Linguagem em movimento (Vol. 1, 2 e 3)

Carlos Cortez Minchillo e Izeti Fragata Torralvo / FDT

Português – Contexto, Interlocução e Sentido (Vol. 1, 2 e 3) Marcela Pontara, Maria Bernadete M. Abaurre e Maria Luíza M. Abaurre /

Moderna

Português – Literatura, Gramática, Produção de texto (Vol. 1, 2 e 3) Douglas Tufano e Leila Lauar Sarmento / Moderna

Projeto Eco – Língua Portuguesa (Vol. 1, 2 e 3)

Roberta Hernandes Alves e Vima Lia de Rossi Martin / Positivo

Ser Protagonista Português (Vol. 1, 2 e 3) Ricardo Gonçalves Barreto (coord.) / Edições SM

Tantas Linguagens – Língua Portuguesa: Literatura, Produção de textos e

Gramática em uso (Vol. 1, 2 e 3)

Maria Inês Batista Campos e Nívea Assumpção / Scipione

Viva Português (Vol. 1, 2 e 3)

Elizabeth Campos, Paula Marques Cardoso e Sílvia Letícia de Andrade / Ática

Novas Palavras – Nova edição (Vol. 1, 2 e 3) Emília Amaral, Mauro Ferreira, Severino Antonio, Ricardo Leite / FDT

Português Linguagens (Vol. 1, 2 e 3)

William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães /Saraiva

Português: língua e cultura (Vol. único – 2004 e Vol. 1, 2 e 3 – 2010) Carlos Alberto Faraco / Base Editorial

61

Reiteramos que a comparação entre os resultados obtidos pelas duas análises é

bastante válida, pois, ao longo de 6 anos – dos livros avaliados pelo PNLEM/ 2009, que

equivalem às obras publicadas no ano de 2004, até as obras analisadas pelo PNLD-

EM/2012, que se referem àquelas lançadas até o ano de 2010 – deve ter havido alguma

mudança significativa na abordagem dos mecanismos de coesão e, consequentemente,

do processo de referenciação, assim como da abordagem textual, em geral.

Como adiantamos na introdução desta pesquisa, ao analisar a referenciação nos

LDP de EM de ambas as análises, observamos se e como esse processo era trabalhado,

ou seja, quando observado, averiguamos de que modo era feita a sua abordagem:

integrada aos textos, numa dimensão discursiva, ou utilizando o texto como pretexto,

apenas com o foco em nomenclatura e identificação de referentes. Cumpre salientar que,

como a maioria dos livros não aborda o conceito de referenciação, optamos por

investigar se e como eram abordados os conceitos de Coesão Referencial (CR) ou

mesmo como era feito o estudo da coesão de um modo geral, verificando se, quando ela

era abordada, era feita alguma relação, mesmo que indireta, ao fenômeno da

referenciação.

Além disso, observamos em qual parte dos manuais o tema era tratado: Produção

de texto; Gramática, com ou sem associação com elementos gramaticais; nos exercícios

de Leitura; em capítulos avulsos; ou se não havia abordagem do tema. Conferimos,

portanto, se os LDP associam os mecanismos referenciais aos processos de organização

e processamento textual e à análise linguística com o objetivo de mostrar que as nossas

escolhas linguísticas não são aleatórias, mas significativas. Para elucidar os resultados

encontrados nesse item de investigação, optamos por apresentar um gráfico para cada

fase da análise, revelando resultados percentuais sobre o lugar no qual a abordagem da

referenciação/CR/coesão é realizada.

As obras destinadas ao Ensino Médio, geralmente, são dividas em três grandes

partes – Literatura, Gramática e Produção Textual –, porém, não consideramos o bloco

de Literatura, por não termos encontrado nenhum dado significativo para o tema em

estudo. Assim, focalizamos a parte gramatical, onde são estudadas, principalmente, as

classes de palavras, procurando dar maior atenção àquelas que, de certa forma, auxiliam

na atribuição da referenciação, ou seja, observamos mais detalhadamente os capítulos

referentes às classes dos substantivos, artigos, pronomes, adjetivos, numerais e

62

advérbios, verificando se havia alguma relação com a sua contribuição para a

construção da referência e dos sentidos nos/dos textos. Dessa maneira, esperamos

encontrar associação entre esse grande mecanismo e a análise linguística, visto que as

críticas feitas no catálogo de Livros Didáticos do PNLEM/2009 já alertavam para essa

necessidade (cf. BRASIL, 2008) – refletindo as teorias defendidas nos PCN desde 1998.

Enfatizamos na nossa análise o bloco de exercícios de leitura/interpretação,

observando se estimulavam a prática das teorias estudadas. Ressaltamos, porém, que

não foi nosso objetivo analisar as respostas oferecidas pelos autores para essas questões.

Assim, observamos apenas se os exercícios exploravam ou não os recursos referenciais

e de que modo isso era realizado. Eventualmente, apontaremos sugestões de como

proceder com abordagens que julgarmos inadequadas, contudo não faremos dessa

prática algo constante. Verificamos, finalmente, capítulos esparsos nas coleções, pois

em algumas delas o tema é tratado em capítulos/seções isolados.

Cabe reiterar que nosso objetivo não é reanalisar essas coleções nem questionar

o que foi feito nas edições do PNLEM/2009 e PLND-EM/2012, mas investigar a

abordagem do processo de referenciação nos manuais didáticos. Destacamos, também,

que nossa pesquisa adquire um caráter essencialmente qualitativo, mas, em alguns

casos, recorremos a uma análise quantitativa para ilustrar e esclarecer alguns resultados

obtidos.

Como temos interesse em realizar uma análise comparativa entre as publicações

das obras aprovadas, consideramos necessário dividir a análise em duas partes – a

primeira referente à análise das obras do PNLEM/2009 e a segunda referente às obras

do PNLD-EM/2012 –, para em seguida compararmos os resultados obtidos pelas

análises realizadas.

Objetivando tornar os resultados encontrados compreensíveis, resolvemos

agrupar as coleções de acordo com critérios específicos, igualmente utilizados para as

duas análises (PNLEM/2009 e PNLD-EM/2012). Por isso, criamos três blocos para

abarcar as obras no que se refere à abordagem da referenciação/CR/coesão: (i)

abordagem nula do tema, para as coleções que não se referem em momento algum à

questão da coesão; (ii) abordagem superficial ou generalizada do tema, obras que

exploram a coesão ou de modo muito restrito ou de forma generalizada; e (iii)

abordagem textual-discursiva do tema, referindo-se àquelas obras que tratam o tema

63

numa perspectiva interacional e/ou processual da construção da referência, integrando

os mecanismos de coesão à sua dimensão textual e discursiva.

Ao final das análises, apresentamos um quadro-síntese, em que consta um

resumo dos resultados gerais encontrados em cada uma das obras, na ordem em que

foram expostas ao longo da análise. Neste resumo, ressaltamos os principais pontos

negativos e positivos encontrados em cada coleção.

Ressaltamos que a análise do Manual do Professor (MP), que faz parte de tais

compêndios, será feita de modo paralelo à análise do livro do aluno2. Nesse sentido,

observaremos, principalmente, se a teoria defendida no MP é, de fato, colocada em

prática no manual do aluno, já que a experiência obtida pela análise das obras do

PNLEM/2009 permitiu verificar que, algumas vezes, não se encontra relação entre o

que é exposto no MP e o que é efetivamente trabalhado no livro do aluno.

Além disso, observaremos se esses manuais oferecem referências bibliográficas

básicas sobre os estudos linguísticos atuais e também instruções e/ou sugestões para os

docentes, que somente com as informações/instruções contidas no manual do aluno, na

maioria dos casos, não obtêm respaldo suficiente para realizar um trabalho adequado

sobre o tema em estudo. Assim, nessa etapa de investigação, centramos nossa atenção

em três principais aspectos: (i) a postura teórica relativa aos estudos sobre o tema da

referenciação assumida pelo manual destinado especificamente aos docentes; (ii) o

embasamento teórico oferecido para o trabalho com o tema. e (iii) a efetiva relação

entre o que é posto no MP e o que é colocado em prática no livro do aluno.

Recorremos também às resenhas que constituem o Guia do Livro Didático de

2009 e de 2012, procurando observar se nesses documentos, que fazem uma análise

geral dos manuais didáticos, sem focar num determinado tema como fazemos aqui,

havia alguma crítica sobre a questão da coesão ou da referenciação e, por vezes, nos

deparamos com observações relevantes para nossa investigação, contribuindo com um

novo olhar sobre o tema analisado.

Por meio desta análise, será possível ter uma amostragem da abordagem da

referenciação nos livros didáticos de Ensino Médio, que se reflete, consequentemente,

no trabalho em sala de aula. E, dessa forma, o professor de Língua Portuguesa poderá

perceber que repensar o ensino dessa disciplina tem sido um objetivo constante e

2 Dentre todos os MP, não tivemos acesso somente à coleção Língua Portuguesa – coleção Vitória Régia,

de Takasaki (2004), aprovada no PNLEM/2009.

64

necessário, em vez de enfatizar apenas o aprendizado de nomenclaturas e exercícios de

classificação. Afinal, o objetivo central do ensino da língua deve ser o de análise das

funções que os elementos linguísticos desempenham nos textos que lemos e

produzimos, entre eles os processos referenciais, por exemplo.

3.2. Análise da referenciação nos livros didáticos de ensino médio

A presente seção objetiva apresentar os resultados obtidos em cada uma das

etapas de investigação. No que se refere à abordagem da referenciação nos LDP de EM,

faremos, inicialmente, uma breve exposição dos resultados obtidos na análise anterior,

que corresponde aos livros aprovados pelo PNLEM/2009. Após essa etapa,

apresentaremos a análise atual, referente aos manuais listados no PNLD-EM/2012,

elencando as principais mudanças e apontando os equívocos que persistem.

3.2.1. Livros aprovados pelo PNLEM 2009

Em relação à análise dos livros do PNLEM/2009, o primeiro obstáculo que

encontramos nessa etapa de investigação sobre a referenciação foi a ausência dessa

nomenclatura nos manuais. Nenhum dos livros aprovados no PNLEM/2009 usa o termo

referenciação, por isso analisamos de que maneira os LDP abordavam a coesão

referencial (CR).

Além disso, a análise permitiu verificar outros problemas, como a

superficialidade das abordagens sobre a CR. Em dez das onze coleções aprovadas, fala-

se em retomada coesiva, referência, até mesmo em coesão sequencial ou sequenciação,

mas quase nada se menciona sobre a CR explicitamente. Foi necessário, então, observar

o tratamento dado à coesão de modo geral, verificando se, ao abordar esse item, as obras

citavam elementos que auxiliam na CR, fazendo alguma menção, mesmo que

indiretamente.

Além desses problemas, outra questão que dificultou nossa análise foi não haver

um local recorrente, pontual para a abordagem da coesão nos manuais, fazendo com que

tivéssemos que analisar toda a obra em busca de alguma ocorrência que nos servisse de

dado. A maioria dos manuais tratou do tema na seção de Produção Textual ou em

capítulos isolados. Algumas coleções realizaram um estudo da coesão paralelo ao

65

estudo das classes gramaticais que a auxiliavam, como os pronomes, artigos e numerais.

Houve casos em que os autores optavam por abrir um capítulo estanque na seção de

gramática, sem associá-lo ao restante da coleção. Alguns só abordaram tangencialmente

o tema em exercícios de leitura, na maioria das vezes, relacionados ao uso dos

pronomes. E houve também os que não abordaram o tema sob nenhum aspecto. Cumpre

ressaltar que, como algumas obras realizaram uma abordagem fragmentada do tema, a

quantificação a respeito da parte do manual onde o tema é tratado foi repetida, como

comprovamos no gráfico 1:

Gráfico 1: Partes dos manuais em que o tema da coesão/CR/referenciação foi encontrado

(PNLEM/2009).

3.2.1.1. Abordagem nula do tema

Das coleções aprovadas no PNLEM/2009, apenas uma não apresentou o tema da

coesão/CR/referenciação: Português - Projetos, de Faraco e Moura (2004). Nesse

manual, observamos uma dedicação quase exclusiva da Literatura, ficando as partes de

produção e gramática em segundo plano. Confirmamos isso ao observar,

principalmente, que a apresentação dos itens linguísticos é feita de forma bastante

38%

31%7%

8%8%

8%

Produção de Texto

Capítulos avulsos

Não abordam o tema

Exercícios de leitura

Gramática - sem associação às classes gramaticais

Gramática - com associação às classes gramaticais

66

limitada, reduzindo-se à explanação de pontos gramaticais em forma de apêndice, ao

final do manual, sem desdobramentos. Consequentemente, a dimensão textual de tais

elementos linguísticos não é contemplada.

Devido a esses problemas, o MP não apresenta uma base sólida relacionada à

coesão, por isso é necessário que o docente, em relação à abordagem das estratégias de

leitura e produção textual, busque a sua maneira de explorar mais detalhadamente o

efeito dos elementos linguísticos na construção do texto, uma vez que não há uma

sistematização dos conteúdos linguísticos, que aparecem sob a forma de fichamento, e,

consequentemente, não se contempla a relação entre os pontos gramaticais apresentados

e sua dimensão textual.

3.2.1.2. Abordagem superficial/generalizada do tema

Neste bloco, agrupamos 8 coleções que apresentam uma análise superficial e,

por vezes, generalizada da referenciação. Decidimos apresentar as coleções desse grupo

seguindo uma gradação: aquelas que apresentam um maior grau de superficialidade até

chegar àquelas que apresentam uma abordagem menos superficial ou generalizada.

Fazem parte desse grupo as coleções (i) Português – Língua e cultura, de Faraco; (ii) e

Português de olho no mundo do trabalho, de Terra e Nicola; (iii) Novas Palavras, de

Amaral et al.; (iv) Língua Portuguesa – Coleção Vitória Régia, de Takasaki; (v) Textos:

leituras e escritas, de Infante; (vi) Português, de Nicola; (vii) Português, de Maia; e

(viii) Português: Língua, Literatura, Produção de Texto, de Abaurre et al.;

Português – Língua e cultura, apesar de apresentar algumas menções a questões

de ordem semântica, como o uso de sinônimos e antônimos, não relaciona esse tema à

construção da coesão textual. O mesmo ocorre na apresentação das classes de palavras.

No estudo da classe dos artigos, por exemplo, ressalta-se que eles têm a “função de

acompanhar o substantivo, assinalando-o como fazendo referência a um ser já

conhecido ou mencionado” (FARACO, 2004, p. 289, vol. único). No estudo dos

pronomes demonstrativos, há uma breve menção à sua função coesiva, em que se

ressalta a sua possibilidade de fazer “referência a assuntos já tratados sem precisar

repeti-los” (Ibid., p. 415, vol. único), dando como exemplo o uso do pronome “isso” e

pedindo como exercícios a identificação da localização do seu antecedente. Em relação

67

à distinção entre o uso dos pronomes estes/esses, o autor a concebe como artificial

(FARACO, p. 415, vol. único), sem tratar do fato de que, na escrita formal, são eles os

responsáveis, em grande parte, pelo estabelecimento da coesão textual e também pela

eliminação de ambiguidades.

Um ponto positivo foi o tratamento dado à repetição, que, segundo Faraco

(2004, p.64, vol. único)

(na medida certa) pode ser (...) um recurso tão adequado para fazer nova

referência a um elemento já mencionado no texto quanto o uso dos pronomes

ou da elipse. Tudo vai depender da situação e das intenções do autor.

No capítulo que trata do texto informativo, o autor apresenta um esquema de

retomadas bastante relevante para o ensino da referenciação textual, uma vez que

sinaliza as retomadas realizadas por diversas classes de palavras com o objetivo de

“desenvolver a capacidade de percepção da estrutura textual (que é sempre mais que o

ajuntamento de sentenças)” (FARACO, 2004, p. 27, MP). O esquema serve como

exemplo para que o aluno faça o mesmo trabalho com o restante do texto base (ver item

d no esquema abaixo), mostrando todas as palavras/expressões que servem para

estabelecer retomadas, inclusive, a elipse.

Figura 1: Esquema gráfico sinalizando as palavras que retomam outras num parágrafo de texto – coleção

Português – Língua e cultura (FARACO, 2004, p. 221, vol. único).

68

Esse esquema de retomadas, em vez de limitar-se à identificação, poderia

estimular reflexões acerca da função recategorizante dos objetos de discurso, que vão se

construindo e transformando com base nos conhecimentos partilhados dos

interlocutores. Dessa forma, a expressão nominal “um lobo-guará”, introduzida por um

artigo indefinido por se tratar de uma informação nova, é recuperada, por exemplo, pelo

seu hiperônimo “bicho” e pela expressão nominal “o maior canídeo da América do Sul”,

revelando que as retomadas são mais do que uma substituição de referentes, pois

estimula no leitor a recuperação de informações contextuais.

Além disso, outro ponto a destacar em relação a esse esquema consiste na

introdução de objetos de discurso por meio de anáforas indiretas, como, por exemplo, o

termo “embalagens”, associado ao referente “comida” anteriormente mencionado.

Entretanto, os autores não fazem nenhuma relação entre o esquema de retomadas com a

questão da coesão ou mesmo da referenciação.

O MP desta coleção demonstra uma grande preocupação com o ensino da

língua-padrão, deixando em segundo plano a abordagem textual. Nas sugestões

bibliográficas referentes à Linguística de Texto, há somente uma indicação de leitura.

Concluímos, assim, que a coleção, apesar de fixar o texto como objeto central,

restringe-se aos elementos do entorno verbal, não contemplando questões de ordem

interacional ou cognitiva.

A segunda coleção, Português de olho no mundo do trabalho, faz da gramática

mais do que um manual de consultas: um manual de regras a serem seguidas,

priorizando o estudo excessivo da metalinguagem (ver seção “A teoria na prática” ao

final dos capítulos que abordam as categorias gramaticais), apontando categorias e

nomenclaturas e ignorando questões mais discursivas e reflexivas. A resenha do

PNLEM confirma nossa visão, ao afirmar que, “Na seção de Gramática, alguns textos

chegam a servir apenas de ‘pretexto’ à exposição de aspectos gramaticais ou à

formulação de exercícios de identificação, classificação ou (re)escrita” (BRASIL, 2008,

p. 61).

Os autores, de modo bem sucinto, falam sobre coesão e coerência textuais, sendo

a primeira manifestada “no plano da superfície do texto” e a segunda “no plano do

conteúdo” (TERRA e NICOLA, 2004, p. 54, vol. único), o que aponta uma abordagem

atrelada à perspectiva da década de 1980. Ao tratar da coesão, os autores a relacionam

69

às relações lógicas entre os segmentos do texto (os conectivos) e ao estabelecimento de

retomadas a “elementos presentes na estrutura textual” (ibid.). Os exercícios,

relacionados à coesão referem-se, por consequência, ao uso de conectivos e à

identificação de retomadas realizadas por pronomes, mesmo na seção dedicada a

questões de vestibular, como vemos no exemplo a seguir: “Na frase ‘Mas sabemos que

em sua grande maioria eles estão ativos’, as palavras em destaque funcionam como

elementos de coesão textual. Explique por quê” (TERRA e NICOLA, 2004, p. 55, vol.

único).

O MP dessa coleção oferece indicações bibliográficas desatualizadas, que não

contemplam os avanços obtidos pela LT nos últimos tempos, o que parece refletir nos

procedimentos adotados na apresentação das categorias gramaticais, principalmente.

Toda a abordagem da coleção contraria a expectativa que criamos com a leitura do título

da obra, que já demonstra preocupação com a inserção do aluno no “mundo do

trabalho”. Para isso, seria preciso levar o aluno a refletir sobre as várias estratégias que

a língua disponibiliza para adequarmo-nas aos nossos propósitos comunicativos.

Além disso, há divergências entre o que é exposto no MP e o que é, de fato,

posto em prática. Lemos no MP que o caminho ideal nas aulas de LP é o ensino de

gramática “de um modo reflexivo, expondo o aluno a variados tipos de textos e

levando-o a refletir sobre fatos da língua” e também que “os textos (devem ser a

matéria-prima do professor no trabalho com a língua. Eles devem ser o ponto de partida

e o ponto de chegada (...)” TERRA e NICOLA, 2004, p. 6, MP), mas, como

percebemos na análise, não é isso o que acontece.

Na terceira coleção, Novas Palavras, observamos total falta de integração entre

itens gramaticais e sua funcionalidade textual. Ao tratar dos numerais (p. 241, vol. 1),

por exemplo, os autores mostram que eles podem ser usados apenas como recurso

expressivo (ver Figura 2), sem mencionar a possibilidade de também servirem como

recurso coesivo.

70

Figura 2: Referência aos numerais como recurso expressivo – coleção Novas Palavras (AMARAL et al.,

2004, p. 241, vol. 1).

Em contrapartida, no MP desta obra, sugere-se ao docente que, no trabalho com

os pronomes, deve-se dar destaque ao estudo das funções morfológicas devido ao seu

papel no estabelecimento da coesão textual (AMARAL et al., 2004, p. 32, MP). Ou

seja, os pronomes são mostrados como os principais recursos da coesão dos textos, mas

não é citado que outras classes gramaticais também colaboram para a progressão

textual.

Ainda no MP desta obra, vemos no item “Complementação teórica” (Ibid.) uma

rápida explicação sobre a natureza fórica dos pronomes pessoais, ou seja, das funções

anafórica e catafórica, mas como a abordagem é superficial, não há recursos para que o

professor possa se aprofundar, nem mesmo leituras complementares sobre o assunto.

Os autores consideram que “pela maior importância dos demonstrativos e dos

relativos no estabelecimento dos vínculos de coesão e progressão textuais, convém que

a eles seja dada maior ênfase” [grifos dos autores] (p. 35, MP). No livro dos alunos, na

parte dos pronomes demonstrativos, são apresentados alguns exercícios que trabalham,

basicamente, com a identificação de referentes recuperados por esse tipo de pronome,

com o intuito de sinalizar que eles são “fundamentais para estabelecer as relações de

coesão entre partes de um enunciado” (AMARAL, et al., 2004, p. 163, vol. 2).

Na quarta coleção, Língua Portuguesa – Coleção Vitória Régia, encontramos

um fato curioso sobre a abordagem da coesão. A análise total das obras nos permitiu

verificar que não há um local único em que os autores optem para falar sobre coesão:

alguns a exploram na parte de produção textual, outros na parte da gramática, em

capítulos à parte ou mesmo atrelado a algum assunto em estudo. Entretanto, nesta obra,

a coesão é mencionada pela primeira e única vez no capítulo 7 (p. 84) numa seção

avulsa, não recorrente ao longo da obra, sob o título “Estudo da língua padrão” (Figura

3), insinuando que a coesão é encontrada somente nessa variedade da língua. Apesar

71

dessa apresentação inusitada do tema, os exercícios são adequados, embora não sejam

suficientes para o desenvolvimento do tema, que não é retomado nas análises de textos.

Dessa forma, o Guia do PNLEM/2009 sugere que “o professor complemente os

conceitos sobre a linguística textual, que fundamenta a obra, utilizando os textos

específicos referidos na bibliografia.” (BRASIL, 2008, p. 123).

Figura 3: Estudo da coesão sob o título de “Estudo da língua padrão” – coleção Língua Portuguesa –

coleção Vitória Régia (TAKASAKI, 2004, p. 84, vol. único).

Como posto na metodologia (seção 3.1), não tivemos acesso ao MP da coleção

Língua Portuguesa – coleção Vitória Régia, por esse motivo, não teceremos comentário

a respeito do manual dessa coleção.

A quinta coleção Textos: leituras e escritas dedica um pequeno espaço para

tratar da coesão e da coerência na parte de produção de texto (O texto escrito - parte I e

72

II); a abordagem limita-se a teorizar, sem expor exemplos, sobre questões de repetição,

progressão, não contradição e relação. Os exercícios dessa parte (p. 144) não oferecem

muito espaço para reflexão sobre os conceitos tratados, pois se preocupam, quase

exclusivamente, com a identificação de retomadas realizadas por alguns demonstrativos

e com a estrutura do conto – gênero no qual as atividades se baseiam.

O ponto mais positivo nessa obra foi encontrado ao final da abordagem das

classes gramaticais, numa caixa que relaciona as classes gramaticais estudadas a sua

contribuição para a leitura e produção textual. Dentre as classes de palavras utilizadas

para estabelecer a coesão, encontramos observações relevantes na parte dos

substantivos, adjetivos, pronomes e numerais sobre a importância dessas classes para a

construção de sentido dos textos. Destacamos aqui as considerações a respeito dos

substantivos e numerais, que destoam positivamente das demais obras analisadas.

Em relação ao substantivo, o autor advoga que

Os substantivos desempenham um papel importante nos mecanismos de

coesão e coerência textuais. Um substantivo, como vimos, é a ‘palavra com

que se nomeiam os seres, atos ou conceitos’. Devido a essa característica, é

normalmente por meio do substantivo que se apresenta pela primeira vez

num texto o ser, ato ou conceito de que estamos tratando. Depois disso,

utilizam-se substantivos que mantêm com esse primeiro relações variáveis de

significado, num processo de retomada que é parte importante da progressão

textual. Por meio desse processo, delimita-se ou expande-se a abrangência do

sentido dos conceitos analisados. Esse processo pode, ao mesmo tempo,

evidenciar o ponto de vista do produtor do texto sobre o tema tratado

(INFANTE, 2004, p. 284, vol. único).

Já em relação ao numeral, o autor aponta que eles

também podem ser empregados na produção e interpretação de textos

dissertativos escritos. (...) as palavras dessa classe gramatical compartilham

com os pronomes a capacidade de retomar dados anteriormente expostos e de

inter-relacionar partes do texto. Podem ser, por isso, elementos importantes

para a obtenção de coesão textual (INFANTE, 2004, p. 398, vol. único).

Os comentários são extremamente relevantes para a nossa análise, uma vez que

sinalizam exatamente o que esperaríamos de todas as obras: integração entre análise

linguística, leitura e produção textual. Porém, faltam exercícios que explorem essas

questões tão importantes para que o estudo dessas classes faça sentido na vida do aluno.

O MP afirma que são apresentados os principais tópicos do ensino de

gramática da língua padrão e que as atividades de aplicação dos conteúdos gramaticais

73

são meramente “práticas”. Explicita, ainda, a opção pela intersecção entre a Análise do

Discurso e a Linguística de Texto, principalmente na seção Do texto ao texto. De acordo

com o MP, a seção Gramática aplicada aos textos segue a perspectiva das obras de

Luiz Carlos Travaglia (Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramatica

no 1º e 2º graus; Gramática – Ensino Plural). Portanto, há, nesse aspecto, contradição

entre o que se propõe no MP e o que efetivamente é feito na obra: o que é chamado de

“gramática aplicada aos textos”, nesta coleção, tende a reproduzir a tradição gramatical

e não se mostra inovadora sequer nas propostas de atividades, pois a aprendizagem de

aspectos gramaticais está voltada à repetição exaustiva de atividades estruturais não

vinculadas ao uso real da língua.

Já a sexta coleção, Português, de Nicola, no volume 1, ao abordar os processos

de comunicação, aponta alguns “recursos textuais para a montagem da mensagem”,

entre eles a referenciação extratextual, marcada pelo uso de dêiticos, e a textual, feita

por meio de relações anafóricas e catafóricas. Ressaltamos, porém, que, apesar de o

autor citar o termo referenciação e fazer menção a relações extratextuais, a abordagem

se restringe a identificar referentes no texto e a destacar o tipo de estratégia referencial

empregada, se exofórica ou endofórica: “explique o tipo de referenciação do advérbio

lá, que aparece duas vezes, comparando os casos (NICOLA, 2004, p. 156, vol. 1).

Mais à frente, o autor dedica um capítulo exclusivamente ao estudo da coesão e

coerência textuais (capítulo 7, parte 2, vol. 1), destacando mecanismos do que chama

coesão gramatical – realizada por pronomes (pessoais, possessivos, relativos,

demonstrativos, indefinidos), conectivos, advérbios, ordenadores, elipse e pela omissão

– e da coesão semântica (repetição, sinonímia, hiperonímia e hiponímia e campo

semântico), mas não aprofunda a questão, realizando uma abordagem superficial,

principalmente no que se refere aos exercícios sugeridos para essa parte. No volume 3, a

obra apenas retoma todos esses recursos, relacionando-os à organização dos textos.

Apesar de considerarmos superficial o tratamento da coesão e seus mecanismos,

nesta coleção, observamos uma tentativa de relacionar os mecanismos gramaticais e a

sua importância para a construção de sentido dos textos: na maioria das unidades sobre

classes gramaticais, o autor insere um subcapítulo intitulado “A gramática do texto”,

onde sinaliza, principalmente, o caráter fórico dos artigos (p. 44, vol. 2 – ver Figura 4),

pronomes (demonstrativos e pessoais, p. 98-99, vol. 2) e advérbios (p. 159-161, vol. 2),

74

mostrando como essas classes contribuem para a coesão e, consequentemente, para a

produção textual. Essa integração vai ao encontro do MP da obra, que afirma que “saber

lidar com as estruturas gramaticais é o ponto de partida para a produção e leitura de

textos” (NICOLA, 2004, p. 8-9, MP).

Figura 4: A classe dos artigos na seção “A gramática do texto” – coleção Português (NICOLA, 2004, p.

44, vol. 2).

Além de apontar o caráter fórico das categorias mencionadas, ao final do

capítulo dos substantivos, a obra sinaliza o uso desses elementos como estratégia

coesiva, já que eles evitam redundâncias (ver Figura 5), mas falta explorar melhor os

75

exercícios, que, como podemos ver adiante, não contemplam essa estratégia.

Figura 5: Comentário sobre o uso dos substantivos como forma de garantir coesão seguido dos exercícios

referentes à classe estudada – coleção Português (NICOLA, 2004, p. 38, vol. 2).

76

A sétima coleção, Português, de Maia, é dividida em 47 unidades e cada uma

delas é subdividida em 8 capítulos – Texto, Margens do texto, Horizonte do texto,

Intertextualidade, Exame de textos, Literatura, Produção de textos e Gramática –, mas é

apenas nesta última que o autor opta por abordar a coesão e a coerência textuais,

fragmentadas em duas partes (coesão e coerência I – unidade 19 - e coesão e coerência

II – unidade 20). Na primeira, o autor faz uma breve apresentação sobre os conceitos de

coerência e coesão, mostrando que esta “deve-se a uma série de elementos que

permitem os encadeamentos linguísticos, à maneira como são ligados os elementos

gramaticais, semânticos e discursivos do texto (a concatenação das frases)” (MAIA,

2004, p. 202, vol. único). Na segunda parte, a obra direciona a abordagem mais

especificamente para a coesão textual e seus recursos (substituição ou sinonímia;

referência; elipse e conectores), oferecendo exemplificações por meio de frases

descontextualizadas, como podemos observar na Figura 6.

Figura 6: Exemplos de alguns recursos coesivos por meio de frases descontextualizadas – coleção

Português (MAIA, 2004, p. 213, vol. único).

Além disso, o autor menciona que esses recursos linguísticos servem para fazer

“referência às distintas partes de um texto sem a necessidade de repetir as mesmas

77

palavras” (MAIA, 2004, p. 213), o que dá a entender que repetir palavras ou expressões

prejudica a coesão ou é um erro. Por meio da análise dos exercícios apresentados ao

final do capítulo (Figura 7), podemos perceber que, além de superficiais, já que se

limitam ao emprego de conectivos e outros elementos cotextuais ou à identificação de

termos da superfície textual, as funções anafórica e catafórica são mencionadas pela

primeira vez nos exercícios sem a sua devida sistematização.

Figura 7: Exercícios referentes à coesão – Coleção Português (MAIA, 2004, p. 215, vol. único).

Quanto aos exercícios, o Guia do PNLEM/2009 advoga que “boa parte das

atividades propostas na seção Exercícios limita-se a cobrar a aplicação das regras

prescritas pela gramática normativa, frequentemente desarticulada da leitura e da

78

produção de textos.” (BRASIL, 2008, p. 52). Assim, reiteramos que a obra não

apresenta relação entre os conteúdos abordados e a construção de sentido do texto.

O MP dessa obra interessa-se, basicamente, por oferecer o gabarito das questões,

sem nenhum desdobramento ou sugestão de atividades extras. A preocupação com a

gramática fica clara em muitos pontos da apresentação da proposta pedagógica, como

no trecho que destacamos:

Os conteúdos gramaticais são “ensinados” desde o primeiro até o quarto ciclo

do ensino fundamental. No entanto, a maioria dos alunos chega ao ensino

médio sem ter aprendido o suficiente dos conceitos gramaticais. Portanto,

consolidar os conhecimentos gramaticais no ensino médio significa na

verdade ensiná-los bem e de uma vez por todas, para dissipar a frustração que

provavelmente acompanha o aluno que constata não ter aprendido o

suficiente no ensino fundamental. Agora é o momento de aprender. Cabe a

nós professores e autores do ensino médio, resgatar essa dívida da escola para

com os alunos (MAIA, 2004, p. 4, MP).

O trecho acima suscita uma série de questionamentos: o que seria ensinar “bem”

a gramática?; o que seria aprender o suficiente?; por que “agora”, no ensino médio é “o

momento de aprender?” É com essas dúvidas e com muitas outras que o professor pode

se deparar ao consultar o MP dessa coleção.

A última coleção que compõe esse bloco, Português: Língua, Literatura,

Produção de Texto, dentre as onze do PNLEM/2009, é a única que usa o termo coesão

referencial, demonstrando que há três tipos de coesão: lexical, referencial e sequencial

(p. 134-139, vol. 3). Contudo, ao falar desse tipo de coesão, considera que ela se

manifesta apenas por meio da anáfora e da catáfora. Além dessa limitação, as autoras

citam que “são os mecanismos de coesão sequencial que fazem o texto progredir” (p.

139, vol. 3) [grifo nosso], ignorando que a CR também é responsável pela progressão

textual.

Como trabalham com o conceito de CR e não de referenciação, a obra aborda o

assunto dando ênfase às retomadas observáveis na superfície textual, relacionando os

procedimentos linguísticos coesivos a placas de trânsito (Figura 8), a fim de salientar

como algumas palavras orientam a leitura de um texto, fazendo retomadas, acréscimos

ou antecipações:

79

Figura 8: relação entre placas de trânsito e os elementos coesivos – coleção Português: língua, literatura,

produção de textos (ABAURRE et al., 2004, p. 135, vol. 3).

Dessa forma, a maioria dos exercícios limita-se à superfície textual, ao cotexto,

exigindo do aluno apenas que identifique elementos anafóricos ou catafóricos, como,

por exemplo, na atividade demonstrada na Figura 9.

80

Figura 9: Atividade referente ao estudo da coesão referencial que limita-se à superfície textual – coleção

Português: língua, literatura, produção de textos (ABAURRE et al., p. 136, vol. 3).

81

O MP da coleção Português: Língua, Literatura, Produção de Texto oferece,

além de referenciais teóricos para cada unidade (Literatura; Língua e Prática de leitura e

produção), explicações pertinentes sobre a perspectiva pedagógica adotada pela obra, as

quais demonstram uma preocupação em relacionar questões discursivas ao estudo da

língua. Contudo, tal proposta não reflete, em geral, no que é posto em prática no manual

do aluno, que não demonstra essa preocupação. Acreditamos que, se as autoras

seguissem fielmente os pressupostos explicitados no MP, a obra teria um viés mais

textual-discursivo.

3.2.1.3. Abordagem textual-discursiva do tema

Neste grupo, que apresenta um tratamento com um viés mais textual-discursivo

do tema, contamos com duas coleções: Português: Linguagens, de Cereja e Magalhães

e Língua Portuguesa – Projeto escola e cidadania para todos, de Murrie et al.

Na coleção Português: Linguagens, encontramos algumas menções, em

pequenas caixas de texto, sobre a contribuição da coesão para os textos. O volume 1

desta coleção apresenta uma abordagem mais prescritiva. No capítulo que aborda a

classe dos pronomes, por exemplo, os autores ressaltam a contribuição desses elementos

para a síntese, clareza, coerência e coesão, citando que eles “substituem, acompanham

ou retomam palavras e orações já expressas” (CEREJA e MAGALHÃES, 2004, p.101,

vol. 2). Contudo, apesar de mencionar indiretamente que os pronomes contribuem para

a referenciação, não há exemplos, na coleção, que mostrem a relevância desses

elementos na construção textual, por exemplo. Ou seja, como ressalta a resenha da

coleção, “a análise dos conteúdos propriamente gramaticais é feita fundamentalmente

com base nas gramáticas de cunho mais prescritivo.” (BRASIL, 2008, p. 31), ficando o

trabalho de viés reflexivo acerca dos elementos linguísticos a cargo dos professores.

Além disso, a resenha do PNLEM comenta que

As categorias e os fatos gramaticais são descritos quase exclusivamente com

base em enfoques normativos, o que, (...) dificulta a exploração dos

conhecimentos linguísticos como base para o desenvolvimento das atividades

de leitura e produção. (Ibid, p. 32).

Na sistematização dos pronomes demonstrativos, por exemplo, a obra assinala,

mesmo que indiretamente, a propriedade de sinalizarem relações correferenciais

82

anafóricas e catafóricas, mas, no exercício referente a esse tipo de pronome, prefere a

abordagem prescritiva, já que se preocupa com a imposição de um padrão linguístico. É

o que percebemos por meio do item b na Figura 10, que poderia estimular uma

importante reflexão acerca da referenciação, mas prioriza a verificação do que os

autores chamam de uso padrão da língua.

Figura 10: Exercício referente ao uso dos pronomes demonstrativos – Coleção Português: Linguagens

(CEREJA e MAGALHÃES, 2004, p. 96, vol. 2).

Ao final dos capítulos referentes às classes de palavras, a obra destina um espaço

para associar o item gramatical abordado à sua contribuição para a construção do texto.

Nesse momento, esperávamos encontrar algo positivo para nossa pesquisa, porém o

compêndio utiliza, na maioria dos casos, o texto como pretexto, pedindo que os alunos

retirem elementos gramaticais do texto e os reproduzam no exercício (ver Figura 11), o

que, de certa forma, contraria o MP, que “afirma que serão privilegiados as abordagens

baseadas na Linguística de Texto, na pragmática e nas diversas teorias do discurso”

(BRASIL, 2008, p. 31).

83

Figura 11: Caixa de texto sobre os pronomes e sua relação com a coesão + exercícios referentes à classe

dos pronomes e sua relação textual – coleção Português: linguagens (CEREJA e MAGALHÃES, 2004, p.

100-101, vol. 2).

Na Figura 11, percebemos que as questões de número 1 e 4 ilustram a

abordagem tradicional da identificação e classificação de elementos do texto, em lugar

de uma abordagem propriamente discursiva e reflexiva da língua e seus diversos usos.

Além disso, observamos que a caixa Para que servem os pronomes? aponta a

84

importância dessa classe gramatical para a coesão textual. Essa informação poderia ser

dada nas demais classes, principalmente substantivos, artigos, adjetivos, numerais e

advérbios, mas na parte dos artigos (p. 66, vol. 2), por exemplo, aparece a mesma caixa

informando sobre a sua funcionalidade e nada se menciona sobre a sua função coesiva.

No volume 2 dessa obra, encontramos um capítulo dedicado exclusivamente a

tratar de questões textuais e discursivas: “Texto e discurso – intertexto e interdiscurso”.

Nesse capítulo, observamos a seção “Textualidade, coerência e coesão”, em que

encontramos uma abordagem mais discursiva desses dois grandes temas. Contudo, o

foco é o emprego “adequado” de conjunções, pronomes e preposições, que ligam ou

retomam palavras expressas no cotexto.

Já no capítulo 13 (p. 145-147, vol. 3), de produção de texto, faz-se o estudo do

gênero “Carta do leitor” e ao final encontramos a seção “Escrevendo com coerência e

coesão”, que trabalha com a articulação de palavras, associada à coesão e a articulação

de ideias, associada à coerência. Porém, o objetivo da seção, mais uma vez, é o emprego

de conectivos e alguns exercícios abordam a questão das retomadas e antecipações,

pretendendo mostrar que elas “são importantes para que o texto possa ter continuidade e

progressão de ideias” (CEREJA e MAGALHÃES, 2004, p. 147, vol. 3).

A coleção Língua Portuguesa – Projeto escola e cidadania para todos merece

destaque por sua abordagem dos fenômenos coesivos. Embora os autores abordem as

relações coesivas em um capítulo à parte: “Falando de textos: coesão” (p. 177-208, vol.

único) –, o fazem sempre com base em textos prontos ou a serem elaborados pelos

próprios alunos (ver Figuras 13 e 14). Para os autores dessa obra, as retomadas podem

ser gramaticais ou lexicais: no primeiro caso, a coesão é feita por meio de palavras

gramaticais, sem significado próprio (pronomes, artigos, numerais e advérbios); no

segundo, a coesão é realizada por palavras lexicais, que têm um significado próprio,

“ligado às ações que ocorrem no mundo, aos serem reais e imaginados do mundo e às

qualidades de tais seres e ações” (MURRIE et al., 2004, p. 183, vol. único) –

substantivos, adjetivos, verbos. Além das retomadas, fala-se da coesão por repetição

como um mecanismo produtivo.

Os autores chegam a citar outros tipos de expressão, como a fotografia, o

cinema, a dança etc (MURRIE et al. p. 197, vol. único), como forma de estabelecer

coesão, porém não dão exemplo de como isso acontece nesses casos.

85

A coleção acerta ao tratar atividades sobre retomadas numa perspectiva mais

produtiva, como observamos por meio das Figuras 12 e 14, principalmente. Essas

atividades, além de estimular a reflexão sobre a coesão, fazem os alunos exercitarem de

diferentes maneiras os mecanismos coesivos apresentados ao longo da exposição

teórica, ora levando-os a produzir textos, como visto nas Figuras 12 e 14 ora levando-os

a identificar de palavras remissivas (Figura 13), mas sempre tentando mostrar aos

alunos os efeitos de sentido que essas retomadas produzem no texto.

Um aspecto relevante para nossa pesquisa foi encontrado na definição para o

processo da coesão nessa coleção:

mecanismo linguístico, formal, que estabelece relação entre palavras,

expressões e frases no texto. Essa relação pode referir-se tanto à retomada

Figura 14: Atividade com a classe dos artigos – coleção Língua

Portuguesa: projeto e cidadania para todos (MURRIE et al., p.

185, vol. único).

Figura 12: Atividade sobre

retomada lexical – coleção Língua

Portuguesa: projeto e cidadania

para todos (MURRIE et al., p. 186,

vol. único).

Figura 13: Atividade sobre retomadas – coleção

Língua Portuguesa: projeto e cidadania para todos

(MURRIE et al., p. 183, vol. único).

86

de elementos como ao estabelecimento de nexos de significação e

progressão entre eles” (MURRIE et al., 2004, p. 197, vol. único) [grifos

nossos].

A maioria dos autores define coesão como a ligação entre as partes do texto, mas

Murrie et al. vão além, mostrando que a coesão pode ser mais do que encadeamentos

visíveis na planície textual.

No MP dessa obra, os autores elencam dez habilidades específicas para esse

capítulo sobre coesão, listadas a seguir, dentre as quais grifamos as que julgamos mais

se aproximarem das habilidades necessárias para a compreensão do processo de

referenciação:

(i) identificar e compreender os elementos coesivos como garantia de

textualidade; (ii) identificar o caráter polissêmico do léxico, compreendê-

lo e utilizá-lo nas retomadas coesivas; (iii) compreender a função dos

elementos de coesão na progressão textual; (iv) especificar os elementos

coesivos na narração; (v) aplicar os mecanismos de coesão estudados, na

produção de texto; (vi) aplicar os sequenciadores temporais/espaciais e

ordenadores espaciais em texto narrativo-descritivo; (vii) compreender e

analisar os operadores discursivos enquanto elementos de encadeamento

discursivo; (viii) compreender a função textual dos tempos verbais pretéritos

e sua utilização na produção dos textos; (ix) analisar e aplicar os operadores

discursivos na recepção e produção textual e (x) identificar e compreender

os elementos de coesão (MURRIE et al., p. 65-66, MP).

O quadro abaixo apresenta uma síntese das principais questões apresentadas na

análise das obras aprovadas pelo PNLEM/2009, oferecendo um panorama geral dos

resultados obtidos nesta pesquisa. Para tanto, apontamos pontos positivos e negativos

encontrados em cada uma das coleções analisadas nesta etapa da pesquisa, restringindo-

nos a apontar apenas as questões encontradas no manual do aluno.

87

OBRA AUTOR(ES) /

EDITORA

CONSIDERAÇÕESS NEGATIVAS CONSIDERAÇÕES POSITIVAS

Português –

Projetos

Francisco Marto

de Moura, Carlos

E. Faraco / Ática

Apresenta a gramática como um

manual de consulta, sem

desdobramentos sobre questões

importantes que os elementos

linguísticos propiciam para a produção

e compreensão textuais; por

consequência, não aborda o tema da

coesão, tampouco o da referenciação.

Não houve.

Português –

Língua e

Cultura

Carlos Alberto

Faraco / Base

Editorial

Quando se faz alguma menção à

função coesiva de elementos

gramaticais, privilegia a superfície

textual, aproximando-se dos estudos da

primeira fase da Linguística de Texto,

desconsiderando, pois, aspectos

interacionais e cognitivos; preocupação

excessiva com o ensino da norma

padrão.

Apresenta um esquema de retomadas

bastante propício para o estudo dos

mecanismos coesivos, principalmente

aqueles que se fazem por meio de

referências; vê a repetição como um

recurso importante “para fazer nova

referência a um elemento já

mencionado no texto”.

Português – de

olho no mundo

do trabalho

Ernani Terra, José

de Nicola Neto /

Ática

Preocupação excessiva com o ensino

da norma padrão da língua, priorizando

o estudo de nomenclaturas e da

metalinguagem em detrimento das

propriedades textuais.

Não houve.

Novas Palavras Emília Amaral,

Mauro F. do

Patrocínio,

Severino Antônio

M. Barbosa,

Ricardo S. Leite /

FDT

Não faz integração entre as classes

gramaticais que auxiliam na

coesão/referenciação. Mostra o

numeral como recurso expressivo,

ignorando a sua função coesiva nos

textos. Oferece informações muito

limitadas aos professores sobre o que é

anáfora e catáfora.

Destacam alguns tipos de pronomes

como importantes para estabelecer a

coesão, como os relativos e os

demonstrativos.

Língua

Portuguesa –

Coleção Vitória

Régia

Heloísa Harue

Takasaki / IBEP

Associa o estudo da coesão ao estudo

da língua padrão, como se a coesão

estivesse presente apenas nessa

variação da língua. Fala-se em

retomadas, mas não se trabalha com a

referenciação, e os exercícios se

limitam à superfície textual.

Vê a repetição como recurso coesivo.

Textos: Leituras

e escritas

Ulisses Infante /

Scipione

Demonstra poucos recursos que servem

para a retomada, como o uso de

sinônimos, hipônimos e hiperônimos.

No capítulo destinado à produção

textual, cita a repetição, a não

contradição, a relação e a progressão

como formas de “progressão” textual.

Português

Jose de Nicola

Neto / Scipione

Os exercícios propostos são pouco

explorados.

Faz relação das classes gramaticais

com aspectos coesivos na seção

“gramática de texto”; destina uma

boa parte para falar sobre coesão. No

capítulo de produção textual, aborda

o advérbio como elemento dêitico; no

âmbito extratextual, cita a anáfora e

catáfora. No capítulo sobre coesão,

cita alguns mecanismos de coesão

gramatical e semântica, como os

pronomes, advérbios, os hipônimos,

hiperônimos e o campo semântico.

Na parte destinada às figuras de

construção, cita brevemente que as

anáforas servem como recurso

88

Quadro 4: Resumo da análise das obras do PNLEM/2009.

coesivo.

Português João Domingues

Maia / Ática

Aborda a coesão como conteúdo

estanque, na parte de gramática, sem

associá-la aos assuntos relacionados ao

seu estabelecimento e não retoma as

informações posteriormente em

exercícios, relacionando com alguma

classe gramatical ou na parte de

produção textual. Aponta exemplos

com frases descontextualizadas, não

considerando o texto como ponto de

partida. Apresenta a anáfora e a

catáfora pela primeira vez num

exercício.

Cita alguns importantes recursos

coesivos e assinala que a

concordância e a regência também

contribuem para estabelecer coesão.

Português,

Língua,

Literatura,

Produção de

texto

Marcela Regina

N. Pontara, Maria

Luiza M.

Abaurre, Tatiana

Fadel / Moderna

Falta utilizar o texto para pôr em

prática os conceitos estudados. Os

exercícios referentes ao estudo da

coesão referencial priorizam a

identificação de referentes textuais

anafóricos e catafóricos, ou seja,

limitando-se à superfície do texto.

É a única obra que menciona o termo

coesão referencial. Na parte em que

trata dos pronomes, faz algumas

observações quanto a sua função de

fazer referência às pessoas do

discurso. (vol. 2). Compara os

elementos coesivos a placas de

trânsito, com o objetivo de mostrar

como eles encaminham a leitura de

um texto. Faz uma breve explicação

de coesão referencial, sequencial e

lexical e cita como elas se

manifestam (vol. 3).

Português

Linguagens

Willian Roberto

Cereja, Thereza

A. C. Magalhães /

Saraiva

Ao final da apresentação de cada classe

gramatical, há um tópico que relaciona

cada uma dessas classes ao modo como

contribuem para a construção do texto.

Nesse momento, pensa-se que o autor

associará o item como um elemento

importante na construção textual,

relacionando-o a fatores de

textualidade como a coesão, mas faz

uma abordagem mais gramatical,

usando, na maioria dos casos, o texto

como pretexto. Na parte das orações

adjetivas, cita que é possível

subordinar orações por meio de

conjunções e pronomes, o que evita

repetições, contribuindo para um texto

coeso, como se a repetição fosse vista

sempre como algo negativo para os

textos. Preocupação excessiva com o

padrão culto da língua.

Cita o numeral como elemento que

pode substituir um termo. Na parte

dos pronomes, faz uma observação à

parte, dizendo que eles servem como

elementos que substituem,

acompanham ou retomam palavras ou

expressões já expressas. Apresenta

algumas seções relacionadas

diretamente à coesão, como

“Escrevendo com coesão e

coerência” (cap. 13, vol. 3).

Apresenta algumas questões que

contemplam a reflexão sobre os

mecanismos linguísticos, numa

perspectiva mais discursiva da

linguagem.

Língua

Portuguesa –

projeto escola e

cidadania para

todos

Harry Vieira

Lopes, Zuleika de

F. Murrie, Jeosafá

F. Gonçalves,

Simone G. da

Silva / Brasil

Aborda a coesão em capítulo à parte,

sem integrá-la ao restante dos

conteúdos estudados.

Destina uma boa parte do livro para

tratar da coesão. Fala sobre muitos

recursos coesivos, associando-os a

textos. Trata a repetição como

estratégia de coesão, relaciona

elementos coesivos ao encadeamento

argumentativo e estimula a produção

textual como forma de exercitar os

conteúdos estudados no capítulo.

89

9%

37%

9%18%

27%

Produção de Texto

Capítulos avulsos

Exercícios de leitura

Gramática - sem associação às classes gramaticais

Gramática - com associação às classes gramaticais

3.2.2. Livros aprovados pelo PNLD-EM/2012

A verificação dos livros aprovados na última análise do PNLD-EM/2012 nos

permitiu observar alguns progressos na abordagem da referenciação, embora ainda haja

muito a ser feito para associá-la coerentemente aos mecanismos de organização textual.

Nesta análise, no que se refere à observação do local onde a abordagem da

referenciação/CR/coesão foi encontrada, nesta análise, todas as obras abordam o tema:

Gráfico 2: Partes dos manuais em que o tema coesão/CR/referenciação foi encontrado (PNLD-

EM/2012).

3.2.2.1. Abordagem nula do tema

Nesta nova análise, não encontramos nenhuma obra que realizasse uma

abordagem nula do tema em estudo. Todas, de certa forma, trabalham a questão da

coesão referencial/referenciação.

90

3.2.2.2. Abordagem superficial/generalizada do tema

Nesta seção, apresentaremos um total de 6 coleções que realizam uma

abordagem de modo superficial e generalizado do tema: (i) Português – Literatura,

Gramática, Produção de texto, de Sarmento e Tufano; (ii) Linguagem em movimento,

de Torralvo e Minchillo; (iii) Língua Portuguesa – Projeto ECO, de Alves e Martin

(2010); (iv) Língua Portuguesa: linguagem e interação, de Faraco, Moura e Júnior

(2010); (v) Viva Português, de Campos, Cardoso e Andrade; e (vi) Novas Palavras, de

Amaral et al.

Dentre as coleções supracitadas, há três que mantêm um tratamento mais

tradicional à Coesão Referencial: Português – Literatura, Gramática; Produção de

texto; Linguagem em movimento e Língua Portuguesa – Projeto ECO. Além de uma

abordagem superficial, essas coleções destinam capítulos avulsos ao tema sem associá-

los ao resto da coleção, oferecem exemplos descontextualizados e atribuem maior

importância ao estudo da coesão sequencial, isto é, dos conectivos.

A primeira obra que compõe esse bloco, Português – Literatura, Gramática,

Produção de texto, não relaciona as classes gramaticais estudadas à coesão, mas dedica

um capítulo no estudo de produção textual para tratar do assunto (p. 351, capítulo 19,

vol. 1). Os autores reduzem a coesão ao uso dos conectivos que garantem a coesão

sequencial e há, apenas, menção ao termo coesão referencial, mostrando que ela se faz

por meio de retomadas realizadas por pronomes pessoais de 3ª pessoa, pronomes e

certos advérbios, demonstrativos, possessivos, ignorando as remissões feitas por meio

de repetições, expressões lexicais, elipse, etc (SARMENTO e TUFANO, 2010, p. 353,

vol. 1). Entretanto, os autores reconhecem que a coesão referencial colabora na

progressão textual.

No volume 3 dessa coleção, no capítulo referente ao estudo do texto dissertativo-

argumentativo (p. 346-347), em que se relaciona a coesão aos argumentos, os autores

recuperam as informações fornecidas sobre coesão dadas nos volumes anteriores.

Contudo, novamente o foco está no estudo dos conectivos como elementos coesivos, o

que, de certa forma, contraria as indicações fornecidas no MP, que defendem a

importância da reflexão linguística.

As atividades abaixo, baseadas num texto dissertativo-argumentativo, ilustram

91

esse enfoque nos elementos conectivos dos textos:

No desenvolvimento do texto, o emprego dos elementos coesivos mantém a

conexão entre os argumentos, nos parágrafos.

a) No segundo parágrafo, a palavra que funciona como elemento de coesão

em três momentos. Explique como ocorre a coesão em cada caso.

b) Que sentido expressão a locução por isso, no segundo parágrafo?

c) Com base nos itens abaixo, liste nos caderno os elementos coesivos do

terceiro ao quinto parágrafos que estabelecem conexões entre orações e

parágrafos, expressando: acréscimo; oposição; comparação; continuidade ou

progresso; inclusão; conformidade; finalidade (SARMENTO e TUFANO,

2010, p. 346-347, vol. 3) [grifos dos autores].

Na segunda coleção analisada, Linguagem em movimento, encontramos algumas

seções explicitamente relacionadas à coesão textual, como “Função fática e coesão” (p.

42, vol. 1), “Pronomes: coesão e ambiguidade” (p.156, vol. 2), “Sujeito e coesão

textual” (p. 388, vol. 2). Esta última nos chamou especial atenção, uma vez que

apresenta uma relação entre uma função sintática e um fator de textualidade, querendo

mostrar o uso de formas nominais como estratégia para retomar ideias anteriormente

mencionadas. Concluímos isso, principalmente por meio da análise do item 2, ilustrado

na Figura 15.

92

Figura 15: Seção “Sujeito e coesão” – coleção Linguagem em movimento (TORRALVO E

MINCHILLO, 2010, p. 390, vol. 2).

Pelo objetivo do exercício e pelo gabarito oferecido pelo manual, podemos

perceber que os autores trabalham com o encapsulamento, uma vez que exigem do

aluno que construa uma oração que sintetize as informações expressas no parágrafo

precedente. Esse tipo de atividade exige do leitor uma maior reflexão sobre o texto.

Um fato que nos chamou a atenção foi que, no MP (p. 16), ao falar sobre a

produção escrita, os autores, baseando-se em Koch, afirmam se apoiarem numa

93

concepção interacional (dialógica) da língua, mostrando que a escrita é uma atividade

que demanda do escritor a utilização de estratégias variadas, mas não abordam a

referenciação como uma dessas estratégias.

Ressaltamos que, apesar do viés tradicional da abordagem teórica realizada por

essa coleção, os poucos exercícios propostos não possuem esse caráter tradicional, o que

confirma, em parte, a posição expressa pelo MP, que defende que “o estudo da língua

ultrapasse os exercícios de identificação e classificação (que podem aparecer como

etapas do estudo, nunca como objetivo final) e supere a abordagem meramente

prescritiva” (TORRALVO e MINCHILLO, 2010, p. 8 – MP).

Na terceira coleção mencionada, Língua Portuguesa – Projeto ECO, todas as

unidades dividem-se em três grandes partes: “Literatura”, “A língua em uso” e

“Produção de texto”. A parte de conhecimentos literários apresenta nítido destaque. A

seção “A língua em uso” é destinada a tratar dos aspectos gramaticais e é nessa parte

que os autores optam por abordar questões sobre coesão e coerência. Assim, no capítulo

15 do volume 3 da coleção, dedica-se uma pequena seção para os estudos sobre a

coesão, onde são listados alguns mecanismos, como o uso de pronomes, artigos,

numerais ordinais e advérbios (p. 256-257, vol. 3). Contudo, no capítulo destinado a

essas categorias, nada se menciona sobre a sua função coesiva. Um único ponto positivo

que pode ser destacado nesta coleção é a inclusão dos artigos, numerais ordinais e

advérbios como elementos que servem para retomar ou antecipar ideias (ver item 1,

Figura 16), pois em análises anteriores essas classes pouco eram mencionadas com essa

função. Contudo, o exemplo oferecido contempla apenas o uso dos artigos como

elemento coesivo e nada mais se fala sobre as outras classes.

94

Figura 16: Exemplos oferecidos para os mecanismos de coesão não contemplam todos os mecanismos

assinalados – coleção Projeto ECO – Língua Portuguesa (ALVES e MARTIN, 2010, p. 256, vol. 3).

Os autores apontam outros mecanismos coesivos, como o uso de sinônimos,

nomes genéricos e de conectivos, porém os exercícios dessa parte são mais relacionados

à interpretação de textos e não há nenhuma questão diretamente relacionada ao uso dos

mecanismos apresentados, como podemos verificar nas Figuras 17 e 18.

95

Figura 17: Exercícios referentes à seção sobre coesão e coerência textual – coleção Projeto ECO –

Língua Portuguesa (ALVES e MARTIN, 2010, p. 260, vol. 3).

96

Figura 18: Continuação dos exercícios referentes à seção sobre coesão e coerência textuais – coleção

Projeto ECO – Língua Portuguesa (ALVES e MARTIN, 2010, p. 261, vol. 3).

97

O capítulo 15, referente aos pronomes (p. 217-226, vol. 2), dedica-se

especialmente à questão da colocação pronominal, tanto na parte teórica quanto prática,

o que mostra uma preocupação maior com o ensino da norma padrão da língua do que

com a função coesiva dos pronomes.

Confirmando a nossa visão sobre essa obra, o Guia do PNLD-EM/2012 advoga

que

os conhecimentos linguísticos merecem um tratamento, por parte do

professor, que enfatize a reflexão acerca da natureza e do funcionamento da

língua e da linguagem, deixando-se em segundo plano a preocupação com os

testes do vestibular ou do Enem” (BRASIL, 2011, p. 36).

No MP, lemos que esta coleção “trabalha com os conhecimentos linguísticos (...)

tomando sempre o texto como ponto de partida para a exploração e sistematização das

propriedades da língua e de seu funcionamento.” (ALVES e MARTIN, 2010, p. 11,

MP). Contudo, na seção “Língua em uso”, onde se aborda o tópico “coesão e

coerência”, dois fatores contradizem o mencionado acima: (1) o assunto é abordado em

uma seção à parte, desvinculado, por exemplo, das classes gramaticais e dos recursos

estudados, como pronomes, numerais ou ironia, e que contribuem diretamente para a

coesão e coerência; (2) a análise dos mecanismos coesivos apresentados não parte de

textos, mas de pequenos recortes de textos, e não há atividades referentes a esses

mecanismos. Como sugestão de atividade complementar, são oferecidos, no MP, três

exercícios: um relacionado à coerência e os outros à identificação de retomadas

realizadas na superfície textual.

No volume 1 da quarta coleção analisada desse bloco, Língua Portuguesa:

linguagem e interação, ao final da apresentação da classe dos substantivos, na seção

“Prática de linguagem” (p.125-126), observamos o estudo da “nominalização” como um

recurso que pode garantir a síntese de informações nos textos. Pela análise dos

exemplos reproduzidos na Figura 19, observamos que os termos “cenário” e “número”,

são substantivos que atuam como encapsuladores ou recategorizadores. Apesar de

pouco explorada, a questão pode servir de ponto de partida para a exploração desses

dois mecanismos por parte do professor. Mais à frente, na seção “Língua – análise e

reflexão”, os autores apontam o uso de hipônimos como estratégia para evitar

repetições.

98

Figura19: os substantivos como forma de retomar ou resumir informações – coleção Língua Portuguesa:

linguagem e interação (FARACO et al., 2010).

O volume 2 da coleção apresenta, antes da primeira unidade, um capítulo

introdutório: “Os textos, a coesão e a coerência”. Essa seção de abertura é recorrente em

todos os volumes, mas com enfoques temáticos diferentes. Os exercícios dessa parte,

portanto, exploram mais as retomadas cotextuais. Além disso, o tema não é retomado ao

longo desse volume.

No volume 3 da coleção, na seção “Língua – análise e reflexão”, são

apresentados alguns “mecanismos sintáticos de coesão e coerência linguísticas”. A

apresentação é dividida em três partes: a primeira aborda a questão da concordância; a

segunda trata da regência como processos que indicam a conexão sintática entre os

termos da oração; já a terceira trata da coordenação, destacando as relações obtidas

pelas conjunções coordenativas. Além desses mecanismos, na apresentação dos

pronomes, os autores chamam atenção para o fato de que essa classe contribui para a

coesão com a “criação de redes de referência, por meio da retomada ou da antecipação

referencial” (FARACO et al., 2010, p. 131, vol. 3), mas os exercícios limitam-se a

substituições de termos por pronomes equivalentes.

De acordo com o Guia do PNLD-EM/2012 (BRASIL, 2011, p.28), essa coleção

apresenta como ponto forte “a abordagem dos conhecimentos linguísticos por destacar

as dimensões textual e discursiva da língua”. Entretanto, no que se refere ao estudo da

99

referenciação, a abordagem não se encaixa nessa dimensão. Os exercícios propostos,

por exemplo, na maioria das vezes, apresentam uma abordagem reducionista dos

elementos gramaticais estudados, sem apontar de que forma eles poderiam contribuir

para garantir a coesão e a progressão textuais, como no exemplo: “indique a quem (ou a

que) se referem os termos destacados”. Além disso, a noção de coesão oferecida nessa

obra restringe-se às ligações textuais: “coesão pode ser entendida como ligação”

(FARACO et al., 2010, p. 131, vol. 3).

No que se refere ao MP dessa obra, encontramos pressupostos teóricos

referentes a gêneros textuais, oralidade, mas nada se menciona sobre

coesão/referenciação. Por tudo o que foi pontuado, acreditamos que se faz necessário

uma maior contribuição do professor na tarefa de criar atividades mais consistentes

sobre o tema.

A quinta coleção, Viva Português, no volume 1, faz uma explanação sobre os

tipos de sujeito. Com essa abordagem, os autores mostram a existência de “recursos

linguísticos que permitem evitar a repetição de termos em um texto e, ao mesmo tempo,

acrescentar informações a ele ou revelar o ponto de vista de quem o produz” (CAMPOS

CARDOSO e ANDRADE, 2010, p. 183, vol. 1), como a elipse e a substituição por

pronomes. Essa abordagem é bastante inovadora e vai ao encontro dos estudos sobre a

referenciação.

Porém, no volume 2, de forma totalmente desarticulada com o restante da obra,

apresentam-se alguns recursos “estilísticos” (sic), entre eles o uso de hipônimos e

hiperônimos e a anáfora, apresentada como “recurso linguístico de coesão textual em

que um termo gramatical (pronome, advérbio, substantivo) recupera um outro termo ou

expressão” (Ibid., p. 71, vol. 2). Além do equívoco de considerar recurso estilístico um

mecanismo coesivo, as atividades propostas não contemplam nenhum desses recursos,

focalizando apenas a questão do paralelismo sintático e semântico.

Por fim, no volume 3, nos exercícios referentes ao capítulo destinado ao estudo

da dissertação, encontramos questões que trabalham a repetição como importante

recurso coesivo, “porque retoma elementos para reforçar a argumentação” (Ibid., p. 276,

vol. 3). Logo em seguida, outro exercício aborda a coesão referencial, sinalizando

retomadas realizadas por meio de pronomes, advérbio de lugar, artigo definido,

expressões sinônimas, etc. Em outros termos, podemos dizer que a obra trabalha

100

mesclando exercícios tradicionais de identificação e classificação de formas gramaticais

descontextualizadas com atividades que estimulam a reflexão e inferências.

No que se refere ao MP dessa obra, cumpre salientar que ele apresenta uma

exposição detalhada sobre a inserção da LT nos estudos sobre o texto. As autoras

dedicam uma parte significativa para esclarecer ao professor como surgiu essa linha

teórica, chamando atenção para o fato de se considerar o texto como um processo em

construção, mas nada se menciona especificamente sobre a referenciação.

A sexta e última coleção que pertence a esse grupo, Novas Palavras: Nova

Edição, que também consta na análise anterior – permitiu verificar algumas evoluções

no que tange a abordagem dos aspectos coesivos.

A primeira foi a menção à coesão – antes não trabalhada – inicialmente, na parte

prática referente à classe dos substantivos, em que há um exercício que mostra o uso do

substantivo como recurso textual de retomada. O item B do exercício proposto na

página 353 (ver Figura 20), baseado no trecho de um livro, é bastante coerente com a

proposta reflexiva de análise linguística que defendemos aqui, pois mostra de que forma

a classe dos substantivos contribui na produção e compreensão textual, auxiliando o

produtor/leitor a ampliar as formas de lidar com os textos com os quais se defronta.

101

Figura 20: Exercícios relacionando a coesão ao estudo da classe dos substantivos – coleção Novas

Palavras – Nova Edição (AMARAL et al., capítulo 8 de gramática, vol. 1).

As demais menções à coesão são feitas na parte de “Redação e Leitura”. No final

dos capítulos referentes a essa parte, encontra-se uma seção intitulada Como estou

escrevendo?, em que encontramos questões relacionadas à coesão de forma progressiva.

A primeira informação, por exemplo (p. 445, vol. 1), objetiva auxiliar os alunos a

observarem o uso de elementos coesivos, mostrando que conjunções, pronomes,

sinônimos e elipses podem evitar frases soltas e repetições desnecessárias. Para tanto,

apresentam um exercício de reescrita em que se pede que o aluno utilize elementos

coesivos para fugir a tais tipos de repetições (ver Figura 21).

102

Figura 21: Abordagem da coesão na seção “como estou escrevendo?” – coleção Novas Palavras – nova

edição (AMARAl et al., 2010, p. 445, vol. 1).

Mais à frente, nesta mesma seção (p. 458, capítulo 7, vol. 1), afirma-se que a

escolha vocabular e a criação de uma sequência progressiva de ideias “constituem

importantes fatores de coesão textual”, retomando e ampliando o que foi dito sobre o

assunto anteriormente. Os exercícios apresentados trabalham os dois fatores

mencionados.

Finalizando a abordagem da coesão no volume 1 dessa coleção, no capítulo que

trata da narração (p. 467, capítulo 8, vol. 1), também na seção já mencionada, os autores

sinalizam que alguns elementos coesivos colaboram para garantir a coerência e,

103

principalmente, a progressão temporal. Nos exercícios, pede-se justamente que o aluno

utilize elementos de progressão temporal para tornar o texto mais coeso.

No volume 2, no capítulo dos pronomes (p. 250), aparece uma caixa com o título

Para que saber? sobre a importância dos pronomes para a coesão textual. Adiante,

ainda no capítulo dos pronomes, a obra dedica duas páginas para tratar especificamente

da relação entre pronomes pessoais e a coesão textual (p. 257, vol. 2), chamando

atenção para a referência desses tipos de pronomes às pessoas do discurso. Destaque

semelhante é dado aos pronomes demonstrativos, que “também constituem um grupo de

palavras importantes para a coesão textual, pois seu papel é justamente estabelecer

relações de referência tanto a elementos do próprio texto como a elementos de fora do

texto” (AMARAL et al., p. 270, vol. 2) e aos pronomes relativos, que recebem uma

pequena seção à parte para realçar sua relação com a coesão textual (p. 277-278, vol. 2).

Na parte prática, chamou nossa atenção um exercício (Figura 22) que ressalta a

função referencial dos pronomes, levando o aluno a saber que “para compreender um

texto, é necessário, entre outras coisas, identificar adequadamente as relações de

referência estabelecidas pelos pronomes.” (AMARAL et al., p. 263). Outros exercícios

trabalham desta maneira, de forma menos explícita, mas bastante satisfatória.

Figura 22: Exercício que destaca a função referencial dos pronomes – coleção Novas Palavras – nova

edição (AMARAl et al., 2010, p. 263, vol. 2).

104

Na parte de “Redação e leitura” deste volume, os autores tornam a referir-se à

coesão na seção Como estou escrevendo?, estimulando a reescrita e o uso consciente

dos elementos de coesão já estudados (p. 438-439, capítulo 3, vol. 2).

Pudemos perceber, portanto, que o tema pesquisado foi encontrado basicamente

na seção Como estou escrevendo?, na parte de “Redação e Leitura”, que ganhou

destaque na análise do PNLD, ao salientar que a seção “apresenta critérios de avaliação

e reelaboração a partir dos quais o aluno é estimulado a refletir sobre seu próprio texto”

(BRASIL, 2011, p. 38).

Diferentemente da publicação anterior, esta edição da obra de 2010 apresenta

muito mais informação acerca das funções coesivas dos elementos estudados,

relacionando sempre que possível à produção textual. Se antes não se fazia relação entre

a coesão e as classes gramaticais estudadas, agora essa ligação é mais nítida,

apresentando inclusive seções exclusivas para o assunto. Além disso, o MP, intitulado

Conversa com o professor, traz orientações específicas sobre a coesão, embora sirva,

principalmente, como auxílio aos exercícios propostos.

3.2.2.3. Abordagem textual-discursiva do tema

Das onze coleções analisadas do PNLD-EM/2012, três apresentaram uma

abordagem voltada para a dimensão textual-discursiva: Ser Protagonista – Português, de

Barreto (coord.); Português, contexto, interlocução e sentido, de Abaurre et al. e Tantas

Linguagens – Língua Portuguesa: Literatura, Produção de textos e Gramática em uso,

de Campos e Assumpção.

Iniciamos a apresentação deste bloco por uma coleção que nos chamou bastante

atenção pelo fato de trabalhar com o termo referenciação explicitamente: Ser

Protagonista – Português. No volume 1, há o capítulo “As palavras e as coisas” (p.

242-251, vol. 1), dedicado a tratar de questões exclusivamente semânticas, entre elas, a

sinonímia, a antonímia, a hiponímia e hiperonímia. Num primeiro momento, na

introdução da seção, o manual estabelece um forte diálogo com a LT, tecendo

considerações sobre a linguagem na representação do mundo. A obra, aproveitando esse

espaço, poderia explicar mais detalhadamente o processo de referenciação, mas, nem

105

mesmo na subseção “As referências que o sujeito cria na língua” faz menção ao

processo, reservando para outro momento o tratamento do tema em estudo.

Em seguida, o capítulo “As tramas da língua” dedica-se ao estudo da coesão e da

coerência como fatores de textualidade que contribuem para a construção dos sentidos

dos textos, além de tratar da repetição como recurso coesivo, à medida que garante a

progressão textual. Em relação à coesão, a obra apresenta alguns de seus mecanismos,

como a referência, a elipse, as conjunções e a coesão lexical, que consiste na “retomada

de um referente por sinônimos, hipônimos, hiperônimos ou expressões de sentido

equivalente” (BARRETO (coord.), 2010, p. 296, vol. 1), exemplificando com o trecho

de uma reportagem. Os exercícios elaborados para esse capítulo retomam tudo o que foi

apresentado e estimulam a participação mais ativa dos alunos, levando-os a refletirem

sobre as possibilidades de uso da língua.

No volume 2, percebemos uma abordagem mais detalhada da referenciação. As

atividades são elaboradas de modo a desenvolver a capacidade reflexiva e crítica dos

alunos, integrando as classes de palavras, como artigos e numerais, à sua importância

para a construção de sentido do texto. Como ressalta a resenha do catálogo do PNLD-

EM/2012 dessa obra: “As atividades exploram diferentes estratégias cognitivas, tais

como compreensão global, produção de inferências, localização e retomada de

informações” (BRASIL, 2011, p. 62). A integração mencionada acima entre os artigos e

numerais é feita nas seções intituladas “O artigo definido e a referenciação” (p. 222, vol.

2 – ver Figuras 23 e 24) e “O numeral como recurso coesivo” (p. 224, vol. 2), em que

observamos questões desenvolvidas partindo do texto, que destacam a colaboração de

ambas as classes para a referenciação.

106

Figura 23: Menção à referenciação na abordagem da classe dos artigos a partir de textos – coleção Ser

Protagonista Português (BARRETO (coord.), 2010, p. 222, vol. 2).

107

Figura 24: Exercícios referentes à seção “Língua Viva: o artigo e a referenciação” – coleção Ser

Protagonista Português (BARRETO (coord.), 2010, p. 223, vol. 2).

108

Como percebemos pela análise das Figuras 23 e 24, em especial as questões de

número 2, 4 e 5, a abordagem dessa obra é muito mais voltada para análise crítica e

reflexiva da língua, confirmando o posicionamento do MP da obra:

(...) nessa etapa de sistematização de conceitos, não se exige dos alunos uma

simples identificação ou classificação de fenômenos. Aposta-se na fixação

desses conceitos por meios da investigação significativa da sua relação com a

produção de efeitos de sentido (BARRETO (coord.), 2010, p. 19).

E, além dos exercícios de leitura, há propostas de produção textual que

estimulam a prática do que foi estudado – nesse caso, o uso de artigos definidos e

indefinidos para introdução e retomadas de objetos de discurso, como pode ser visto no

bloco “Texto em construção” ao final da página 223 (Figura 24).

Além disso, essas seções, eventualmente, são retomadas ao longo da coleção.

Esse foi o caso da seção “o numeral como recurso coesivo”, que torna a aparecer no

capítulo dedicado ao estudo do gênero “artigo expositivo”, na seção “Entre o texto e o

discurso – a progressão textual”. Nesta parte, objetiva-se demonstrar de que forma o

gênero textual em estudo realiza a progressão textual, destacando a repetição como uma

das importantes estratégias para esse fim.

A proposta pedagógica da obra quanto à referenciação, ressaltada no MP, é

bastante coerente com o trabalho realizado no livro do aluno. Além disso, o MP mantém

um diálogo claro e amplo com o docente, buscando “garantir que o professor se sinta

permanentemente amparado para quaisquer aprofundamento que se façam necessários”

(BARRETO (coord.), 2010, p.18, MP).

A segunda coleção Tantas Linguagens – Língua Portuguesa: Literatura,

Produção de textos e Gramática em uso se refere aos mecanismos de coesão de forma

interacional, por tratar também da referência aos elementos da situação discursiva,

como poucas coleções fazem.

elementos que auxiliam o leitor a acompanhar a progressão, fazendo referência –

retomadas e antecipações – a palavras, expressões ou segmentos do enunciado

ou da situação comunicativa a que ele se refere.

Antes de iniciar os estudos sobre a CR no capítulo dedicado exclusivamente para

esse fim, as autoras parecem querer antecipar esse tema; no final do estudo sobre a carta

109

opinativa, as autoras trabalham com questões que pedem que os alunos identifiquem, no

gênero textual em estudo, elementos que servem para retomar palavras no texto,

fazendo o aluno perceber qual “a importância do recurso linguístico da retomada na

carta do leitor” (CAMPOS e ASSUMPÇÃO, p. 90, vol. 2).

Apesar de as autoras utilizarem a nomenclatura CR, que não corresponde ao

amplo processo a que se refere a referenciação, e apresentarem o tema em capítulo à

parte, verificamos uma apresentação bastante atualizada, ampla e satisfatória sobre a

questão, principalmente nas atividades sugeridas (ver Figura 25), que exploram a

reflexão crítica do aluno sobre os elementos de retomada e antecipações, fazendo-o

perceber a finalidade dos mecanismos de referenciação, sempre tomando como base o

texto.

110

Figura 25: Texto motivador para questões sobre coesão referencial – coleção Tantas Linguagens –

Língua Portuguesa: Literatura, Produção de textos e Gramática em uso (CAMPOS e ASSUMPÇÃO,

2010, p. 94, vol. 2).

111

Figura 26: Exercícios sobre coesão referencial referentes ao texto expresso na Figura 25 – coleção

Tantas Linguagens – Língua Portuguesa: Literatura, Produção de textos e Gramática em uso (CAMPOS

e ASSUMPÇÃO, 2010, p. 95, vol. 2)

112

O texto da Figura 25 trata da dificuldade da sociedade em aceitar o diferente,

partindo do exemplo de um índio que foi o primeiro caso de um estrangeiro a ocupar

uma cadeira na Câmera dos Deputados e que não foi bem aceito pela sociedade, que o

taxava de criança e inferior juridicamente.

As questões expressas na Figura 26 trabalham, basicamente, com a identificação

de retomadas lexicais, que, segundo as autoras, podem ser feitas por meio de

nominalizações, nomes genéricos, sinônimos, expressões nominais explicativas e

rotuladoras ou classificatórias. Porém, em vez de somente pedir a identificação de

palavras que retomam outras, pedem que os alunos reflitam e expliquem o sentido, o

efeito e a finalidade dessas retomadas. Na questão 3 (Figura 26), por exemplo, trabalha-

se especificamente com a reconstrução de objetos de discurso, ao induzir o aluno a

perceber que algumas anáforas são mais do que simples retomadas de termos

anteriormente expressos, uma vez que carregam a intenção e ponto de vista do autor do

texto. Assim, ao mostrar que a palavra “inimigo” foi gradativamente retomada por “o

criminoso em potencial” e “a própria subversão em figura de gente”, o autor revela sua

oposição a tais rótulos, já que considera que o índio não deveria ser rotulado dessa

maneira. A questão 5 trabalha o encapsulamento de palavras, expressões ou porções de

texto ao induzir o aluno a perceber que o vocábulo “caso” retoma toda a situação vivida

pelo índio apontada no decorrer do texto.

Além disso, as autoras apontam as retomadas gramaticais encontradas no texto

de apoio, ressaltando que elas podem ser feitas pela substituição ou acompanhamento de

nomes, com o auxílio das classes dos advérbios, dos artigos, dos pronomes e dos

numerais.

Para finalizar, as autoras apresentam, na seção “Usando os mecanismos

linguísticos-discursivos”, uma subseção: “A coesão referencial em artigo” (p. 103, vol.

2). Essa parte poderia ser dedicada a trabalhar a referenciação como artifício de

argumentação, uma vez que a escolha foi do gênero artigo, propício para o

estabelecimento de pontos de vista; contudo, os exercícios se repetem, pois exigem que

o aluno reflita, identifique, explique as formas de CR encontradas para fazer referências.

Após essa seção, apresenta-se uma série de atividades de vestibulares em que se

trabalham exercícios referentes à questão da CR, que também exigem mais

especificamente a localização de retomadas nos textos.

113

Em resumo, consideramos que, apesar de ser dado maior destaque aos elementos

da superfície textual, essa obra também valoriza a referência a “elementos (...) da

situação comunicativa exterior a ele [o texto]” (CAMPOS e ASSUMPÇÃO, 2010, p.

93, vol. 2), realizando uma abordagem mais discursiva dos elementos referenciais.

Entretanto, concordamos com o Guia do PNLD-EM/2012 que “cabe ao professor

explicitar as habilidades e estratégias necessárias para o estudo dos textos a serem lidos

ao longo da coleção” (BRASIL, 2011, p.71). Uma dessas estratégias é a referenciação.

O Manual do Professor, denominado “Assessoria pedagógica”, amplia as

possibilidades de uso da coleção, trazendo orientações e um conjunto de referências

bibliográficas atuais e significativas para cada unidade dos volumes. Além disso, as

autoras oferecem algumas sugestões sobre como trabalhar os conteúdos desenvolvidos.

Por exemplo, na exploração dos mecanismos linguísticos, sugerem que as atividades

propostas no capítulo destinado a tratar da coesão referencial sejam intercaladas “com

exposição de conceitos e discussões” (CAMPOS e ASSUMPÇÃO, 2010, p.32, MP).

Consideramos que, com essa orientação, o professor possa, por exemplo, ampliar o

conceito de CR, chegando à questão da referenciação.

A terceira coleção, Português, contexto, interlocução e sentido, destacou-se por

apresentar vários pontos positivos na abordagem dos fenômenos coesivos a na

articulação entre análise linguística, leitura e produção textual, conforme sugerem os

PCN. As autoras demonstram uma forte preocupação em considerar o contexto de

produção dos textos e sinalizá-lo para os alunos de forma clara e reflexiva,

principalmente no que tange aos exercícios propostos.

No volume 1, no tratamento da gramática, há uma unidade totalmente voltada

para questões discursivas da linguagem. Assim, a primeira relação com a coesão é

proposta a partir de algumas relações lexicais, como o uso de sinônimos, hipônimos e

hiperônimos, que auxiliam na articulação das frases, dos períodos e parágrafos de um

texto, estabelecendo, assim, a coesão textual. Ao final da apresentação, as autoras

propõem exercícios baseados em textos que estimulam o senso crítico do aluno, que

adquire um papel mais autônomo ao desenvolvê-los.

Na seção destinada à produção de texto (p. 34-69), também há um aporte teórico

embasado nas teorias de texto e discurso. Esse espaço proporciona, tanto para o aluno

114

quanto para o professor, meios para desenvolver e progredir as habilidades textuais-

discursivas.

O volume 3 é o que oferece mais contribuições acerca de nossa pesquisa, pois

fica ainda mais clara a preocupação com uma abordagem centrada nos aspectos textuais

e contextuais das diversas categorias linguísticas. Nas atividades referentes ao estudo

dos substantivos e artigos (Figura 27), por exemplo, dentre as várias questões de fundo

textual-discursivo, escolhemos algumas para demonstrar esse tipo de abordagem:

Figura 27: Exercício sobre a classe dos artigos – coleção Português contexto, interlocução e sentido

(ABAURRE et al., 2004, p. 364, vol. 2).

No item 1, apesar de se explorar a classificação de categorias, o exigido, logo em

seguida, na setinha, é mais do que identificação e classificação de categorias. Para o

aluno responder o que é retomado pelos pronomes demonstrativos usados na tirinha, ele

terá que perceber que o pronome “essa” retoma toda a fala da mãe anterior “estou

procurando o Haroldo” e o pronome “isso” encapsula toda a situação implícita nos

quadrinhos anteriores. Esse mesmo tipo de abordagem se sucede no estudo dos

adjetivos, pronomes, numerais e advérbios.

115

Quanto à análise linguística, o Guia do PNLD-EM/2012 ressalta que

A perspectiva com que os recursos da língua são tratados apoia-se na

dimensão funcional da linguagem, o que implica sua inserção em eventos da

interação comunicativa, o que, ainda, significa dizer, em textos reais, que

circulam nas mais distintas esferas da vida social. Sendo assim, a abordagem

dos fatos gramaticais – mesmo daqueles que remontam à gramática

tradicional – articula-se com os outros eixos do ensino, sobretudo com

aqueles da leitura e da produção de textos. (BRASIL, 2011, p.45)

Além de exercícios que levam o estudante a adquirir uma postura mais

consciente da estrutura da língua e seus usos, há, ainda, atividades que exigem produção

textual, sempre com vista a pôr em prática o que foi estudado. Um exemplo bastante

produtivo disso é percebido na parte dos artigos, como mostram as Figuras 28-30.

Observamos também que essas atividades de produção textual, sugeridas na seção

“Pratique”, são sempre antecedidas de exemplos bem similares às tarefas sugeridas ao

aluno, possibilitando que ele tenha maior “oportunidade de criar textos fazendo uso

intencional e consciente das formas estudadas” (ABAURRE et al., 2010, p. 23, MP).

Diante de tudo o que foi exposto, ressaltamos que o professor, diante de uma

obra como essa e que deseja realizar uma abordagem dos conhecimentos linguísticos

nos moldes da gramática tradicional terá de realizá-la autonomamente.

116

Figura 28: A classe dos artigos e a produção de texto – parte I (exemplo) – coleção Português contexto,

interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 386, vol. 2).

117

Figura 29: A classe dos artigos e a produção de texto – parte II (explicação e proposta) – coleção

Português contexto, interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 387, vol. 2).

118

Figura 30: A classe dos artigos e a produção de texto – parte III (prática) – coleção Português contexto,

interlocução e sentido (ABAURRE et al., 2004, p. 388, vol. 2).

119

As instruções dadas em vermelho auxiliam em muito o trabalho do professor em

sala de aula. Na Figura 30, por exemplo, informa-se ao professor do objetivo da

atividade, que consiste em “levar os alunos a refletirem sobre o efeito que a presença

dos artigos provoca na construção de sentido do texto”. Em relação a essas atividades de

produção textual, o Guia do PNLD-EM/2012 salienta que

os objetivos de produção textual, nessa seção, estão relacionados aos aspectos

linguísticos estudados (...) na parte “Produção de texto”, os conceitos

apresentados estão de acordo com o que têm divulgado os estudos

linguísticos contemporâneos voltados para o texto e o discurso (BRASIL,

2011, p.45-46).

Ao final do capítulo dos pronomes, insere-se uma “Seção especial: coesão e

coerência textuais: a articulação textual” (p. 374-379), em que são expostos dois tipos

de coesão: a referencial e a sequencial. A coesão referencial é definida pelas autoras

como “aquela que cria, no interior do texto, um sistema de relação entre palavras e

expressões, permitindo que o leitor identifique os referentes sobre os quais se fala no

texto” (ABAURRE et al., 2010, p. 375, vol. 2). Percebemos, por meio dessa definição,

uma visão ultrapassada sobre esse mecanismo, já que são considerados apenas os

referentes textuais, desconsiderando, por exemplo, os elementos discursivos. Esse

tratamento contraria, de certa forma, toda a abordagem da obra, que se mostra

preocupada em trabalhar noções de texto e discurso. Além desse ponto negativo, há o de

não haver exercícios sobre esses mecanismos. Apesar de ressaltarmos a necessidade de

atividades mais específicas sobre o tema da referenciação, ressaltamos como ponto

positivo da obra serem quase inexistentes questões de classificação, identificação e

substituição, diferentemente das demais coleções analisadas.

Em relação aos advérbios, a obra ressalta a relação entre esses elementos

linguísticos, o estabelecimento de pontos de vista e a construção de ligações coesivas,

tudo exemplificado a partir do texto. Além disso, pede-se uma atividade de produção

textual, que leva o aluno a colocar em prática essas relações, fazendo-o compreender e

refletir sobre o conteúdo desenvolvido ao longo do capítulo referente a essa classe

gramatical, que passa a ter mais relevância nas situações comunicativas nas quais os

alunos interagem.

Para finalizar, ressaltamos a seção “Montando sua estante” no MP, que apresenta

indicações bibliográficas específicas para cada tema abordado, seguidas de informações

120

resumidas sobre cada um dos livros indicados para aprofundamento do professor.

Entretanto, não há orientações voltadas para o estudo da referenciação.

Assim como fizemos com as coleções analisadas pelo PNLEM/2009, expomos a

seguir um quadro-síntese com a análise das obras aprovadas pelo PNLD-EM/2012,

ressaltando o que encontramos de mais produtivo e também os pontos fracos de cada

coleção analisada, focalizando o manual do aluno apenas.

OBRA AUTOR(ES) CONSIDERAÇÕES

NEGATIVAS

CONSIDERAÇÕES

POSITIVAS

Novas Palavras

– Nova Edição

Emília Amaral,

Mauro Ferreira,

Severino Antonio,

Ricardo Leite /

FDT

Os exercícios ainda são, em

grande parte, superficiais.

Relaciona os aspectos coesivos à

produção de textos de forma

progressiva, apresentando

exercícios sobre o que foi

discutido. Alguns exercícios

destacam a função referencial

dos pronomes. Apresenta mais

informações a respeito do

processo de coesão que na

publicação anterior.

Português –

Literatura,

Gramática,

Produção de

texto

Douglas Tufano e

Leila Lauar

Sarmento /

Moderna

Não relaciona as classes

gramaticais ao estudo da coesão;

dedica um capítulo à parte para

tratar da coesão. A CR é

relacionada apenas ao recurso

das retomadas cotextuais. Foco

no estudo dos conectivos como

elementos de coesão.

Reconhece a CR como

contribuinte da progressão

textual.

Língua

Portuguesa –

linguagem e

interação

Carlos Emílio

Faraco, Francisco

Marto de Moura e

José Hamilton

Maruxo Júnior /

Ática

Não retoma as questões

apontadas no capítulo destinado

ao estudo da coesão. A noção de

coesão reduz-se ao

conhecimento das relações

estabelecidas pelos conectivos.

Exercícios superficiais de

retomadas cotextuais e

substituição de termos por

pronome.

Aponta o substantivo como

forma de resumir informações

textuais; apresenta um capítulo

introdutório para apresentar

noções sobre coesão como fator

de textualidade.

Viva Português Elizabeth

Campos, Paula

Marques Cardoso

e Sílvia Letícia de

Andrade / Ática

Escassez de exercícios que

pratiquem os conteúdos

estudados. Falta de integração

entre teoria e prática e entre as

partes do livro.

Aponta a repetição como

importante recurso coesivo.

Projeto Eco –

Língua

Roberta

Hernandes Alves

Falta de integração entre classes

gramaticais e a coesão.

Incluem os artigos, numerais

ordinais e advérbios como

121

Quadro 5: Resumo da análise das obras do PNLD-EM/2012.

Portuguesa e Vima Lia de

Rossi Martin /

Positivo

Exemplos descontextualizados e

falta de exercícios sobre os

mecanismos coesivos

apresentados. Preocupação com

o uso da língua padrão.

elementos que servem para

retomar ou antecipar ideias.

Linguagem em

movimento

Carlos Cortez

Minchillo e Izeti

Fragata Torralvo /

FDT

Abordagem muito superficial,

quase nula do tema.

Apresenta seções

especificamente relacionadas à

coesão.

Ser Protagonista

Português

Ricardo

Gonçalves

Barreto (coord.) /

Edições SM

Oferece maior parte da atenção

para a parte de Literatura.

A única coleção que usa o termo

“referenciação”. Faz integração

entre a referenciação e algumas

classes gramaticais responsáveis

pelo seu estabelecimento.

Exercícios contextualizados, que

retomam os conceitos estudados.

MP cumpre a função de auxiliar

o professor.

Tantas

Linguagens –

Língua

Portuguesa:

Literatura,

Produção de

textos e

Gramática em

uso

Maria Inês Batista

Campos e Nívea

Assumpção /

Scipione

Trabalha o conceito de CR e não

de referenciação, num capítulo

avulso.

Os exercícios estimulam a

capacidade de reflexão sobre os

usos da língua, indo além de

classificações e identificação de

referentes no texto. Há seções

que dão margem para o trabalho

com a referenciação.

Português –

Contexto,

Interlocução e

Sentido

Marcela Pontara,

Maria Bernadete

M. Abaurre e

Maria Luíza M.

Abaurre /

Moderna

Trabalha o conceito de CR e não

de referenciação.

Observa os elementos

linguísticos em sua dimensão

textual-discursiva. Exercícios

exploram a capacidade crítica e

reflexiva do aluno,

principalmente no que se refere

aos exercícios propostos.

Relaciona as três práticas de

linguagem entre si.

122

3.3. Aprofundando a análise

A partir das análises dos LDP aprovados no PNLEM/2009 e no PNLD-

EM/2012, no que se refere à referenciação, percebemos que a maioria dos LDP não

consegue dar conta da abordagem desse processo de forma a permitir que os alunos

sejam capazes de aprimorar recursos já aprendidos para melhor compreensão do sentido

de textos, pois, na maior parte das vezes, utilizam-se os textos como pretexto.

Entretanto, verificamos que, em geral, os LDP mais recentes vêm melhorando na

abordagem do assunto de forma a garantir um ensino que, conforme a proposta dos

PCNEM+ (BRASIL, 2002, p. 52), busque

(...) desenvolver no aluno seu potencial crítico, sua percepção das múltiplas

possibilidades de expressão linguística, sua capacitação como leitor efetivo

dos mais diversos textos representativos de nossa cultura. Para além da

memorização mecânica de regras gramaticais.

A obra de Amaral et al. (2010) nos serviu como uma amostragem dessa melhora,

mostrando o que tem sido levado em consideração por parte dos autores de livros

didáticos na reedição de suas obras. Nesta coleção, percebemos um progresso em

relação à abordagem da coesão. Na edição de 2004, este manual apresentou uma

abordagem quase nula do tema, porém, na edição de 2010, mostrou uma preocupação

em apresentar aos alunos noções importantes sobre coesão, auxiliando-os,

principalmente, na produção textual escrita. Apesar do progresso, consideramos que é

necessário avançar ainda mais, fazendo da referenciação uma noção necessária para

percepção das amarras textuais e contextuais nos textos lidos e produzidos pelos alunos.

Muitas coleções analisadas demonstraram não perceberem ou mesmo não se

preocuparem com a importância da referenciação para as atividades de leitura e

produção textual. Conforme defendemos ao longo desta pesquisa, essa questão é mais

do que necessária e quanto a isso não estamos sós. De acordo com Marquesi (2007,

p.216),

no diálogo imprescindível entre escrita e leitura, a abordagem da

referenciação constitui questão prioritária, uma vez que, por meio dela, de um

lado, o escritor constrói seu objeto de discurso, e, de outro, o leitor orienta-se

no exercício da construção de sentidos, imprescindível à leitura de quaisquer

textos.

123

De acordo com Koch (2004), há mecanismos de vital importância para o

estabelecimento da referenciação/CR, representados por mecanismos gramaticais, como

os pronomes, advérbios locativos, numerais e elipse, e lexicais, como a reiteração de

itens lexicais, sinônimos, hiperônimos, nomes genéricos e expressões nominais. No

entanto, ao tratar de tais recursos, muitos LDP aprovados no PNLEM/2009 não os

relacionam ao texto, para demonstrar qual sua significância na construção de sentido

dos textos, diferentemente das coleções aprovadas pelo PNLD-EM/2012, que

demonstraram maior preocupação em relacionar análise linguística à coesão.

Dentre as categorias linguísticas relacionadas à coesão, os pronomes constituem

a classe mais relacionada à coesão nas coleções, principalmente os demonstrativos.

Consideramos que isso ocorre, provavelmente, pelo fato de a gramática tradicional ditar

regras de uso dos pronomes em sua dimensão espacial, textual e extratextual. Além da

relação desses pronomes com a coesão como ponto em comum das obras analisadas nas

duas etapas, notamos um grande número de obras que abordam mecanismos coesivos

lexicais, como o uso de hipônimos e hiperônimos.

Outro fato que nos chamou atenção foi o tratamento dado à repetição. Muitas

coleções do PNLEM/2009 ignoravam-na como um recurso coesivo, vendo-a, algumas

vezes, como prejudicial à coesão textual; entretanto, as obras do PNLD-EM/2012

exploram mais a repetição como recurso coesivo, apontando para o fato que ela também

contribui para garantir a progressão textual.

No que se refere aos exercícios propostos pelos manuais, pudemos perceber um

progresso nos compêndios aprovados no PNLD-EM/2012, que demonstraram uma

preocupação maior com os aspectos textual-discursivos. Contudo, ainda encontramos

muitos exercícios apenas de retomadas e identificação de referentes cotextuais. Em

outras palavras, os exercícios priorizam as anáforas diretas, em que o objeto-de-discurso

se encontra saliente no próprio texto, exigindo a habilidade em “apontar” no cotexto os

referentes retomados. Poucos foram os exercícios que exigiam que o leitor retomasse

informações difusas no contexto, como encapsulamento e anáforas indiretas.

Em relação a esse resultado, Gonçalo (2013) revela que também em LDP de

ensino fundamental há predominância de exercícios referentes a anáforas diretas. No

ensino médio, esperávamos encontrar mais atividades que explorassem casos de

anáforas indiretas, já que esse nível de ensino objetiva retomar os conteúdos estudados

124

no ensino fundamental, aprofundando-os e exigindo do aluno uma capacidade mais

reflexiva e não meramente de classificação e/ou identificação de elementos linguísticos.

Entretanto não foi isso que ocorreu.

Consideramos que esse predomínio de exemplos e exercícios com anáforas

diretas talvez decorra do fato de se pensar que essas anáforas são mais fáceis de serem

identificadas. Porém, segundo Morais (2012), que analisou a referenciação em relatos

esportivos, há, muitas vezes, necessidade de inferências complexas para identificar os

referentes cotextuais, corroborando o que defende Ciulla e Silva (2008) sobre os graus

de inferencialidade das anáforas diretas. Enfim, o tema é complexo, mas os LDP de EM

o tratam ainda superficialmente.

Rompendo esses limites, muitas propostas de atividades relacionadas à

referenciação têm sido realizadas em estudos atuais, como as de Cavalcante (2012) e

Santos, Cuba Riche e Teixeira (2012), que propõem uma didática abordagem textual e

discursiva das estratégias referenciais.

Essa abordagem textual-discursiva sociointeracional que aqui defendemos não

ocorre em muitos LDP, que ainda utilizam o texto como pretexto para explorar

superficialmente atividades linguísticas, categorias gramaticais. Comprovamos isso ao

observar as frases descontextualizadas para ilustrar recursos coesivos e a presença de

textos apenas para exemplificação, sem explorar como os elementos linguísticos

aprendidos contribuem para a construção de sentido desses textos. Muitos textos ficam a

serviço apenas de retiradas de pronomes ou conjunções, por exemplo, sem qualquer

integração entre os conteúdos abordados e a sua relação com a compreensão de textos.

A respeito disso dessa construção de sentido dos textos, Custódio Filho (2010, p. 112)

advoga que

(...) produzir sentidos implica construir propostas de entendimento sobre

algo; esse “algo” remete, indubitavelmente, ao mundo (visível ou invisível,

concreto ou abstrato) que nos cerca. É por isso que a missão de investigar as

relações entre linguagens e sentidos passa pela questão da referência.

Confirmando essa visão, Cavalcante et al. (2010, p. 255) ressaltam que

o foco em processos/atividades de construção (...) da referenciação (...) é um

direcionamento necessário para que seja possível melhor compreender a

natureza dos processos de produção textual-discursiva.

125

Vale chamar atenção para o fato de que a coleção Português – Contexto,

Interlocução e Sentido de Abaurre et al., do PNLD-EM/2010 foi quase uma reprodução

da publicação anterior, de 2004. Como uma autora entrou no lugar de outra e o título da

coleção foi trocado, não pudemos reconhecê-las oficialmente como uma mesma

coleção. Além disso, pela comparação entre as edições, percebemos um grande

progresso do tratamento das categorias gramaticais, que adquiriram uma dimensão mais

ampla, incluindo seções que se dedicavam a analisar os usos das classes de palavras

estudadas em diferentes textos, por exemplo.

Assim, a obra de Abaurre et al., apesar de trabalhar com o conceito de CR, o faz

nos moldes mais atuais da LT, integrando os elementos linguísticos a sua dimensão

textual-discursiva e a sua importância para a produção e compressão textual. Na análise

das obras do PNLEM/2009, não encontramos nenhum manual que trabalhasse

efetivamente a questão da referenciação. Nas obras mais atuais, a menção efetiva ao

termo referenciação foi encontrada apenas na obra de Barreto – coord. (2010); as

demais utilizaram, como fez Abaurre et al., o conceito de Coesão Referencial.

Entretanto, cabe ressaltar que essas duas obras destacaram-se das demais por abordarem

os mecanismos de referenciação, apontando como as classes de palavras podem servir

de instrumentos de coesão e persuasão, refletindo mais diretamente os recentes estudos

realizados pela LT.

Há ainda um desencontro quando a questão é o local nos LDP onde se abordam

questões relacionadas à coesão. Comparando os resultados encontrados pelas duas

análises, pudemos observar que tanto nos manuais do PNLEM/2009 quanto nas

coleções do PNLD-EM/2012 preferiu-se abordar a questão da coesão em capítulos

avulsos, dedicados, na maior parte das vezes, a tratar os fatores de textualidade ou

questões semânticas, o que julgamos não ser a opção mais adequada de abordagem, uma

vez que, dessa forma, fica mais difícil fazer o aluno compreender que as classes

gramaticais que ele estuda têm uma função textual e não meramente classificatória.

Além disso, esse fato contraria uma das principais orientações fornecidas pelos PCN: a

integração entre as práticas de linguagem de análise linguística, leitura e produção

textual.

126

Mendonça (2005, p. 113) confirma a pertinência dessa proposta articulada entre

as práticas de linguagem, enfatizando, também, sua contribuição para o

desenvolvimento da capacidade de reflexão sobre a língua:

Várias pesquisas já apontaram a ineficiência do ensino de nomenclaturas ou

de regras gramaticais desvinculadas de seus efetivos contextos de uso e

funcionamento – o texto – seja como objeto de leitura ou de produção. Nessa

perspectiva, o estudo de tópicos gramaticais só teria sentido se servisse ao

desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita ou, em séries mais

avançadas, como objeto de conhecimento numa perspectiva de reflexão sobre

os fenômenos linguísticos.

Consideramos ideal associar os recursos gramaticais e lexicais ao

estabelecimento da coesão, além de mostrar como ela colabora para as amarras e

progressão textuais, sempre tomando como base as atividades de leitura e produção

textual, o que só percebemos em algumas obras mais atuais. Acreditamos, como foi

ressaltado no primeiro capítulo desta pesquisa, que somente dessa forma o estudo das

categorias gramaticais poderá gerar maior sentido para os alunos, uma vez que estes

passariam a compreender os usos delas dentro do texto. Esse método de ensino de

gramática torna-se mais relevante para o aluno, e o texto passa a ser um lugar de

constante diálogo e interação, deixando de servir apenas para retirar elementos

gramaticais.

Dentre as 20 coleções consideradas nas duas edições do PNLD, – já que não

contamos com as coleções de Cereja e Magalhães (2010) e de Faraco (2010) aprovadas

pelo PNLD-EM/2012, que foram uma reprodução da publicação anterior – 70% das

obras analisadas realizaram uma abordagem superficial/generalizada da

coesão/referenciação:

Gráfico 3: Tipo de abordagem da coesão/referenciação realizada pelas coleções do PNLEM/2009 e

PNLD-EM/2012.

70%

25%

5%

TIPO DE ABORDAGEM DA COESÃO/REFERENCIAÇÃO

Superfial / Generalizada

Textual-discursiva

Nula

127

Observamos, assim, que a maior parte dos manuais didáticos realiza uma

abordagem ainda bastante vinculada às concepções teóricas que embasam as duas

primeiras fases da Linguística de Texto, não considerando o dinamismo e a interação

envolvidos no estudo da coesão e da referenciação.

Vale ressaltar também as definições dadas à coesão, que nos chamaram a

atenção. A maioria dos livros a conceitua como ligação textual, amarração de ideias ou

das partes do texto, conexão linguística etc. Percebemos, desse modo, que todas essas

definições contribuem para a premissa de que os principais elementos de coesão são os

conectivos. Quanto a essa superficialidade, já nos alertava Antunes (2005, p. 43):

Percebo que os professores falam em coesão, em texto coeso, mas não têm

uma ideia muito clara do que seja exatamente essa coesão e de como ela é

conseguida. Falam de coesão como uma coisa meio abstrata e vaga, uma

espécie de zona indefinida que tudo abarca, que comporta tudo o que não

sabem o que é. Tudo o que a gente não consegue explicar bem é,

genericamente, apontado como uma questão de coesão ou de coerência.

A autora também destaca (id, p. 48) que, ao elaborar um texto coeso,

“pretendemos que seja preservada sua continuidade, a sequência interligada de suas

partes, para que se efetive a unidade de sentido e das intenções de nossa interação

verbal”. Não se trata de mecanismo de simples identificação. Por isso, dizemos que a

coesão estabelece profunda relação com a coerência, constituindo fatores essenciais no

processo de leitura e produção de textual.

Assim, conforme postulamos no capítulo 2 desta pesquisa, a coesão deve ser

compreendida não apenas como ligação entre as partes do texto, mas como um recurso

intimamente relacionado à coerência textual, uma vez que, para compreendê-la e

construí-la, é necessário que o leitor ative, não só conhecimentos linguísticos, mas

também conhecimentos inferenciais, culturais, e interacionais, para que seja possível

recuperar referentes, alcançar o estabelecimento de posições nos textos, etc.

Redimensionando a questão, Cavalcante et al. (2010, p. 255) consideram a

coesão como “uma articulação de todos os indícios cotextuais e, ao mesmo tempo, das

inferências engatilhadas por eles, num amplo processo que envolve muito mais que o

mero emprego de elos na superfície textual.” Em outras palavras, a coesão é a

“articulação de relações semânticas, pragmáticas, discursivas, sociocognitivas (...)”.

(Id.). Nesse sentido, percebemos que atualmente se considera a coesão e,

128

consequentemente, a coerência numa perspectiva mais abrangente, considerando

também as inferências, o contexto.

Percebemos que os MP das coleções aprovadas no PNLEM/2009 preocupam-se

em apresentar gabaritos das atividades, em vez de oferecer ao professor informações a

respeito de conhecimentos atualizados e/ou especializados indispensáveis à adequada

compreensão de aspectos específicos de um determinado conteúdo, exercício ou mesmo

de toda a proposta pedagógica da obra. Já as coleções aprovadas pelo PNLD-EM/2012,

de maneira geral, tratam, no MP, de mecanismos linguístico-discursivos, apresentando

uma visão atualizada sobre o tema e procurando trazer um conjunto de referências

bibliográficas atuais e significativas para cada unidade dos volumes.

Assim, a análise dos LDP aprovados no PNLD-EM/2012 permitiu verificarmos

uma evolução referente à problemática da escassez de referenciais teóricos para o

professor, pois essas coleções apresentam mais referências teóricas atualizadas,

confirmando uma de nossas hipóteses.

Por outro lado, alguns compêndios se contradizem ao apresentar uma proposta

de abordagem textual coerente com as orientações dos PCN, mas, na prática, dão

preferência à abordagem normativa dos conteúdos. Ou seja, alguns manuais, como os de

Alves e Martim (2010), apesar de oferecerem um arcabouço teórico atualizado para o

professor defendendo uma abordagem mais reflexiva a respeito do estudo da língua, na

prática ignoram essa orientação; outros, como os de Terra e Nicola (2004), demonstram

diversas incoerências entre o que se impõe no MP e o que, de fato, é cobrado dos

alunos.

Dessa forma, cabe ao professor se atualizar sobre os estudos linguísticos para

poder preencher as lacunas deixadas por alguns manuais didáticos. Contudo,

acreditamos que somente com a colaboração simultânea entre professor, autores de

livros didáticos e pesquisadores, assim como com o auxílio dos estudos dos cursos de

Letras, sobre o ensino de língua portuguesa, será possível avançar no que tange à

abordagem crítica e reflexiva dos fenômenos textuais.

129

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, observamos de que forma os LDP aprovados pelo Programa

Nacional do Livro Didático trabalham com a coesão, dando particular atenção ao

processo de referenciação, procurando verificar se esses manuais abordam esse processo

tão importante para as atividades de análise linguística, leitura e produção textual.

Em resposta ao primeiro dos questionamentos levantados na introdução deste

trabalho, a análise comparativa entre os manuais publicados em 2004 e os publicados

em 2010 nos permitiu concluir que, apesar da constante evolução dos estudos

linguístico-textuais propostos, principalmente pela Linguística de Texto e Análise do

Discurso, e também da maior valorização de documentos oficiais como os PCN e as

OCN, os LDP ainda não absorveram de forma completa questões de grande interesse

para o desenvolvimento e real integração das práticas de linguagens. Esse problema já

vinha sendo posto em foco por Antunes (2005, p. 24). A autora, sete anos atrás, já

ressaltava a necessidade de se considerar a evolução desses estudos por parte dos

autores de livros didáticos: “Os livros didáticos ainda têm concedido muito pouca

atenção às questões mais especificamente textuais, sobretudo em relação a determinados

pontos teóricos”.

Em síntese, os LDP publicados até 2004 e aprovados pelo Programa Nacional do

Livro Didático de Ensino Médio (PNLEM/2009) não apresentam abordagem teórica

consistente, não mostram integração entre a referenciação e análise linguística e não

fazem um trabalho progressivo; ao contrário, apresentam a coesão como conteúdo

isolado da análise linguística ou mesmo do texto, confirmando nossa segunda hipótese.

Assim, dizemos que é precária a menção sobre a contribuição e importância da coesão e

seus desdobramentos quando se apresenta um elemento gramatical que serve para

auxiliar a referenciação, por exemplo. Além disso, muitas vezes, os LDP sequer citam o

processo da referenciação, pois, quando tratam de coesão e coerência, não costumam

relacionar esses fatores de textualidade à construção de sentido do texto.

Desse modo, coube-nos ampliar o escopo da pesquisa, observando se manuais

mais recentes já realizavam uma abordagem mais atualizada e consistente dos recursos

coesivos, entre eles, a referenciação. Como resultado dessa segunda etapa de

investigação, confirmando nossa primeira hipótese levantada, pudemos concluir que

130

houve um avanço na abordagem da referenciação e da coesão nos manuais aprovados

pelo PNLD-EM/2012, superando algumas falhas apontadas na análise anterior, uma vez

que mais obras demonstraram uma abordagem de fundo textual-discursivo e, em certos

casos, um trabalho efetivo com o processo de referenciação, conforme as

recomendações oferecidas pelos PCN.

Os Manuais do Professor, confirmando a nossa terceira hipótese, estão deixando

de ser apenas a parte que oferece os gabaritos das atividades propostas e têm sido mais

embasados teoricamente por estudos atuais na área de Linguística de Texto e Análise do

Discurso, o que tem contribuído para uma abordagem textual-discursiva nos

compêndios mais atuais; entretanto, é necessário um embasamento teórico diretamente

voltado para a formação e atualização do professor, que muitas vezes tem o livro

didático como único ponto de apoio na sala de aula.

Assim, apesar de encontrarmos coleções que realizassem um trabalho adequado

com a coesão e questões afeitas a ela, as obras aprovadas, no geral, ainda apresentam

uma grande deficiência em relação aos estudos da referenciação e tudo o que ela

compreende, carecendo de uma abordagem mais ampla sobre a temática. Por esse

motivo, a análise que, em princípio, se restringiria apenas à referenciação, teve que ser

ampliada para a análise da coesão em geral, observando toda e qualquer menção à

coesão, tanto teórica quanto prática.

Dessa forma, a crítica que fazemos aos LDP consiste, principalmente, no fato de

eles não conseguirem acompanhar a evolução dos estudos linguísticos, desconsiderando

questões atuais e que estimulam uma postura mais crítica e reflexiva por parte de

professores e alunos. Nessa perspectiva, consideramos improdutivas as atividades que

exigem dos alunos apenas identificação e classificação de elementos coesivos nos

textos, muito frequentes em grande parte dos manuais analisados, uma vez que não

estimulam a leitura mais atenta e crítica dos textos assim como não colaboram com a

construção do aluno como protagonista no processo de produção e recepção.

Nesse sentido, a crítica aos manuais é válida quando acusa uma postura de tratar

o estudante como um depósito de informações, um sujeito passivo, que deve memorizar

conhecimentos discutíveis, sem a capacidade de compreendê-los em uma perspectiva

pessoal e contextualizada. Há, portanto, a necessidade de reflexão, por parte de

professores e autores de LDP, acerca das ferramentas utilizadas para a construção de

131

textos diversos.

Como proposta de desdobramento para este trabalho, poderíamos sugerir novas

análises dos livros a serem aprovados nos próximos anos e distribuídos às escolas de

nosso país, verificando em que medida eles têm acompanhado ou não a evolução dos

estudos linguísticos. Outra possibilidade seria a analisar os gabaritos das atividades

referentes à coesão/referenciação sugerido pelos MP, observando quais os objetivos

propostos pelos autores e verificando em que medida esses objetivos correspondem aos

estudos da LT e da AD. Além disso, também seria produtivo propor trabalhos que

desenvolvessem/ampliassem essas atividades textuais encontradas nas coleções de LDP,

principalmente, nas mais atuais, já que se mostram, muitas vezes, oportunas para essa

exploração, como vimos, por exemplo, no obra de Faraco (2004), entre outros exemplos

expostos ao longo das análises das coleções. Outro possível desdobramento seria

analisar a ficha de avaliação do PNLD, objetivando observar os critérios para aprovação

dos manuais para perceber se há algum que incentive os manuais a trabalharem com os

recursos coesivos, entre eles, os referenciais.

Em resumo, a análise da referenciação em livros didáticos de português nos

permitiu verificar que:

- o foco na prescrição de regras tem sido gradativamente substituído pela

tentativa em articular as três práticas de linguagens – análise linguística, produção de

texto e leitura;

- por consequência, o texto vem cada vez mais ganhando espaço nos estudos da

língua, sendo, muitas vezes, o ponto de partida para os estudos linguísticos. Contudo,

ainda há muito caminho a percorrer para que ele tenha, de fato, o seu lugar na sala de

aula;

- a coesão e a coerência, como fatores fundamentais que garantem textualidade,

têm recebido mais destaque nos manuais didáticos, mas ainda é preciso mais esforço

para relacioná-las aos itens gramaticais e lexicais;

- o conceito de referenciação ainda não tem recebido o merecido destaque nas

obras distribuídas para as escolas do país. Ainda se fazem necessários muitos avanços,

que têm sido percebidos por meio da iniciativa em substituir, em alguns manuais, o

conceito de CR pelo de referenciação, ou seja, trocando a mera identificação de

132

referentes no cotexto por uma abordagem que se volta para a compreensão mais

reflexiva dos itens linguísticos presentes no texto ou no contexto discursivo;

- as atividades sugeridas pelos LDP merecem mais atenção por parte dos autores

de livros didáticos, que devem compreender que a proposta da referenciação só pode ser

plenamente compreendida se incluída num panorama mais amplo, em que se percebam

as relações entre este fenômeno e o(s) conceito(s) de texto;

- os Manuais do Professor têm contribuído mais efetivamente com o trabalho do

professor em sala de aula, já que estão mais preocupados em oferecer um embasamento

teórico que auxilie o docente a ampliar seus conhecimentos sobre conteúdos, não se

restringindo somente a apontar os gabaritos dos exercícios.

Diante de tudo o que aqui foi exposto e discutido, julgamos que este trabalho

pode contribuir para tornar evidente a importância de associar a referenciação às

práticas de leitura, produção e análise linguística, auxiliando o professor a encontrar

caminhos para explorar, de forma mais autônoma, os textos com os quais se depara nos

livros didáticos, que, muitas vezes, não trabalham questões relacionadas à coesão ou o

fazem de forma superficial. Só assim, como mediador do processo de ensino-

aprendizagem, o professor será capaz de levar o aluno a construir adequadamente os

sentidos dos textos, a sua orientação argumentativa e a sua intencionalidade. Por isso,

ressaltamos que o estudo dos processos referenciais se faz mais do necessário na escola,

principalmente no ensino médio, uma vez que requer conhecimentos variados: culturais,

contextuais e linguísticos.

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