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A Resolução nº 75 do Conselho Nacional de Justiça e a definição de atividade jurídica. Um conceito excludente na era da inclusão Walfredo Bento Ferreira Neto Publicado em 09/2010. Elaborado em 09/2010. O presente texto tem por objetivo analisar a definição de atividade jurídica normatizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da Resolução nº 75, de 12 de maio de 2009, discutindo-se algumas de suas finalidades e de seus reflexos sociais. Tal Resolução substituiu a antiga Resolução nº 11/2006, também do aludido Conselho. DA ATIVIDADE JURÍDICA A recente discussão acerca da definição de atividade jurídica surgiu a partir da nova redação dada ao artigo 93, inciso I, da Constituição Cidadã da República, de 1988, pela Emenda Constitucional nº 45, em 08 de dezembro de 2004. Em síntese, assim determina o artigo: "I – ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, (...), exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica (...)." (grifo do autor) Por se tratar de uma expressão até então não regulamentada no ordenamento jurídico nacional, tratou o CNJ, em 2006, de expedir, primeiramente, uma Resolução – a de nº 11, de 31 de janeiro – definindo o significado da então atividade jurídica. Assim disse a Res nº 11/CNJ:

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A Resolução nº 75 do Conselho Nacional de Justiça ea definição de atividade jurídica.

Um conceito excludente na era da inclusão

Walfredo Bento Ferreira Neto

Publicado em 09/2010. Elaborado em 09/2010.

O presente texto tem por objetivo analisar a definição de atividade jurídicanormatizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da Resoluçãonº 75, de 12 de maio de 2009, discutindo-se algumas de suas finalidades e deseus reflexos sociais. Tal Resolução substituiu a antiga Resolução nº 11/2006,também do aludido Conselho.

DA ATIVIDADE JURÍDICA

A recente discussão acerca da definição de atividade jurídica surgiu a partir danova redação dada ao artigo 93, inciso I, da Constituição Cidadã da República,de 1988, pela Emenda Constitucional nº 45, em 08 de dezembro de 2004. Emsíntese, assim determina o artigo:

"I – ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto,mediante concurso público de provas e títulos, (...), exigindo-se dobacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica (...)."(grifo do autor)

Por se tratar de uma expressão até então não regulamentada no ordenamentojurídico nacional, tratou o CNJ, em 2006, de expedir, primeiramente, umaResolução – a de nº 11, de 31 de janeiro – definindo o significado da entãoatividade jurídica. Assim disse a Res nº 11/CNJ:

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"Art. 2° Considera-se atividade jurídica aquela exercida comexclusividade por bacharel em Direito, bem como o exercício de cargos,empregos ou funções, inclusive de magistério superior, que exija a

utilização preponderante de conhecimento jurídico, vedada a contagemdo estágio acadêmico ou qualquer outra atividade anterior à colação degrau.

Art. 3° Serão admitidos no cômputo do período de atividadejurídica os cursos de pós­graduação na área jurídicareconhecidos pelas Escolas Nacionais de Formação eAperfeiçoamento de Magistrados de que tratam o artigo 105,parágrafo único, I, e o artigo 111-A, parágrafo 2º, I, da ConstituiçãoFederal, ou pelo Ministério da Educação, desde queintegralmente concluídos com aprovação." (grifo do autor)

Não obstante a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça, Pedro Lenza (2009,p. 517 e 577), por duas vezes, em sua obra Direito Constitucional Esquematizado,entende que a supracitada definição deveria ter sido regulamentada,obrigatoriamente, por uma lei complementar (LC) do Congresso Nacional, emvirtude da iniciativa ser exclusiva do STF, ou seja, competência reservada.Todavia, persiste hoje a falta dessa LC e, consequentemente, subsiste a definiçãofeita pelo CNJ.

DA FINALIDADE E DOS REFLEXOS INICIAIS

Na interpretação do conceito atribuído pelo CNJ para a expressão atividadejurídica apreendeu-se a preocupação daquele Conselho com a experiênciaprofissional dos magistrados iniciantes na carreira.

Muito salutar sim, tal preocupação. Não só por parte do Conselho, mas comfulcro na própria nova redação dada ao Inc. I, do art. 93, da CRFB/88, pela EC45 (aliás, esse era um dos principais objetivos).

Por outro lado, de maneira bem perceptível, nota-se certo teor excludente nessaResolução, uma vez que para o ingresso na carreira inicial da magistratura obacharel em direito deveria cumprir os requisitos ali estampados, a fim decomprovar o tempo (mínimo de três anos) e a atividade jurídica.

Todavia, e de modo bastante oportuno, o CNJ inseriu na Resolução nº 11 umapossibilidade para os legalmente impedidos e incompatíveis de cumprirem osrequisitos: tratou-se do reconhecimento dos cursos de pós-graduação na área,predominantemente, jurídica, abrangendo-os pelo conceito de atividadejurídica. Ex vi:

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"Art. 3° Serão admitidos no cômputo do período de atividadejurídica os cursos de pós­graduação na área jurídicareconhecidos pelas Escolas Nacionais de Formação eAperfeiçoamento de Magistrados de que tratam o artigo 105,parágrafo único, I, e o artigo 111-A, parágrafo 2º, I, da ConstituiçãoFederal, ou pelo Ministério da Educação, desde queintegralmente concluídos com aprovação." (grifo do autor)

Sendo assim, mesmo aqueles cidadãos brasileiros, bacharéis em Direito,impedidos de atuarem na advocacia ou que não exercem uma daquelasatividades elencadas pelo Conselho Nacional de Justiça, poderiam se valer doscursos de pós-graduação, que na verdade são uma continuação dos estudos naárea jurídica, proporcionando não só o constante contato com temas e casosconcretos em discussão nas Cortes nacionais, como o aprofundamento na ciênciado Direito.

Nesse contexto, mesmo com o certo teor excludente da Resolução nº 11, aprópria norma tratou de abrandar seus efeitos, disponibilizando aos impedidoslegal ou laboralmente de exercerem a atividade jurídica, a figura dos cursos depós-graduação.

DOS EXCLUÍDOS, EM PRINCÍPIO

Vários estatutos podem ser elencados, a fim de caracterizar o teor excludente daResolução. Neste trabalho, logo abaixo, será mencionado, a título de ilustração epela visibilidade que possui, o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogadosdo Brasil (EAOAB – Lei nº 8.906/94). Traz esse Estatuto o seguinte:

"Art. 27 A incompatibilidade determina a proibição total, e oimpedimento a proibição parcial do exercício da advocacia." (grifo doautor)

Explicitamente os artigos 28 e 30 mencionam o rol dos agentes públicos, latosensu, que são considerados incompatíveis (art. 28) e impedidos (art. 30). De sever:

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"Art. 28 A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com asseguintes atividades:

I – chefe do Poder Executivo (...);

(...)

VIII – ocupantes de funções de direção e gerência em instituiçõesfinanceiras, inclusive privadas.

(...)

"Art. 30 São impedidos de exercer a advocacia:

I – os servidores da administração direta, (...);

II – os membros do Poder Legislativo em seus diferentes níveis (...)."(grifo do autor)

Dos incisos I ao VIII, do art. 28, constam, como incompatíveis, vários cidadãosnacionais. Dentre esses, à guisa de exemplo, tem-se os seguintes ocupantes decargos ou funções: direção da Administração Pública; vinculados direta ouindiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário; vinculados à atividadepolicial; militares de qualquer natureza. Já, quanto aos impedidos, (art. 30) orol é bem menor, porém não menos excludente (inciso I e II, excetuando-se aobservação do Parágrafo único, no tocante aos docentes dos cursos jurídicos).

A Lei n.º 8.112/90 (Regimento Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União,das autarquias e das fundações públicas federais) também explicita aincompatibilidade:

"Ao servidor é proibido:

(...)

XVIII – exercer quaisquer atividades que sejam incompatíveis com oexercício do cargo ou função e com o horário de trabalho." (grifo doautor)

Cabe ressaltar que não se trata de hipótese de acumulação de cargo público. Oque traz a lei aqui é o impedimento ou a incompatibilidade para essesservidores públicos de exercerem a atividade jurídica exigida pela Resolução doCNJ.

DO ADVENTO DA RESOLUÇÃO N.º 75 DO CONSELHO NACIONALDE JUSTIÇA - CNJ

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Em 21 de maio de 2009, para grande surpresa de muitos cidadãos nacionais, oConselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 75, que trouxe uma novadefinição de atividade jurídica. De se ver:

"Art. 59. Considera-se atividade jurídica, para os efeitos do art. 58, §1º, alínea "i":

I - aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito;

II - o efetivo exercício de advocacia, inclusive voluntária, mediante aparticipação anual mínima em 5 (cinco) atos privativos de advogado (Leinº 8.906, 4 de julho de 1994, art. 1º) em causas ou questões distintas;

III - o exercício de cargos, empregos ou funções, inclusive de magistériosuperior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico;

IV - o exercício da função de conciliador junto a tribunais judiciais,juizados especiais, varas especiais, anexos de juizados especiais ou devaras judiciais, no mínimo por 16 (dezesseis) horas mensais e durante 1(um) ano;

V - o exercício da atividade de mediação ou de arbitragem nacomposição de litígios. (...)". (grifo do autor)

Opondo-se a Resolução vigente com a anterior (N.º 11) destacam-se algumasmudanças. Mas a surpresa crucial fora a retirada da possibilidade dos cursos depós-graduação suprirem a experiência assim desejada pela nova definição dadaao conceito de atividade jurídica.

Comprova-se, ainda, pela leitura da nova Resolução, que os funcionáriospúblicos lato sensu (direção da Administração Pública e militares, verbi gratia)estão IMPEDIDOS de ingressarem no cargo inicial da magistratura, eis que nãohá a possibilidade de cumprir os requisitos dentre as modalidades previstas naRes. Nº 75, ou os próprios estatutos vedam a atuação, ou, ainda, por questãolaboral, como o horário do trabalho. Sendo assim, esses funcionários públicostornaram-se completamente excluídos dos certames da magistratura.

UM CONCEITO EXCLUDENTE NA ERA DA INCLUSÃO

Surpreende a construção da atual redação dada à definição de atividadejurídica. O Conselho Nacional de Justiça não só restringiu mais o acesso decidadãos brasileiros à carreira da magistratura, como, para muitos, inviabilizouessa possibilidade.

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André Ramos Tavares, Pedro Lenza e Pietro de Jesus Lora Alarcón (coord.)(apud LENZA, 2009, p. 515-516) acreditam que, apesar do fato de a prestaçãojurisdicional não atender aos anseios da população, em razão de vários motivos,dentre esses e em bem menor escala o despreparo de alguns juízes, não sejustifica a exigência de três anos de atividade jurídica com a finalidade desolucionar esse problema.

Ratifica tal entendimento Celso Spitzcovsky (apud LENZA, 2009, p. 516),afirmando que "(...) não se conseguirá apurar a eficiência dos candidatos queacorrem a essa carreira revelando-se, pois, como exigência desarrazoada, alémde alijar do certame potenciais candidatos os quais poderiam melhor atender aointeresse da coletividade". Ademais, podem ser citados vários princípiostransgredidos por essa criação excludente, tais como o binômiorazoabilidade/proporcionalidade.

Como pode, hoje, em pleno século XXI, com todo o aparato e recursosdisponíveis, a fim de selecionar da melhor maneira o candidato mais completopara a respectiva função; com todo o desenvolvimento das técnicas de ensino-aprendizagem, dentre as quais as de avaliação; com toda a previsão legalexistente para impedir que profissionais incapacitados permaneçam no cargo ouna função, mesmo após aprovação em concurso público (vide estágioprobatório), um órgão criado com as atribuições de controle da atuaçãoadministrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveresfuncionais dos juízes elaborar uma definição tão excludente de atividadejurídica? Se essa não foi a mens da ação do CNJ, na prática é o que vemocorrendo, tolhendo inúmeros capazes e habilitados candidatos da carreira damagistratura. Como pode, hoje, com tantas ações criadas visando à inclusão,uma definição ter sido elaborada com um viés tão excludente?

O que se espera são medidas capazes de corrigir possíveis distorções na seleçãodos novos magistrados sem se afetar parte da cidadania legada por meio daconstrução de várias gerações. Afinal de contas, vive-se a Era da Inclusão. Comoexemplos ratificadores desta tese, citam-se as previsões em concursos públicospara os portadores de necessidades especiais:

"Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de seinscrever em concurso público para provimento de cargo cujasatribuições sejam compatíveis (...); para tais pessoas serão reservadasaté 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso." (Lei nº8.112/90, art. 5º, §2º)

Seguindo-se essa mesma linha, dentro de uma racionalidade, tem-se adenominada - e debatida - "lei de quotas", que prevê também uma reserva devagas nas instituições públicas de ensino superior do País, visando à inclusão

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sócio-educacional.

Não obstante, e de certo modo até se contradizendo no tocante àinclusão/exclusão, o CNJ também demonstra está sintonizado com essa novaEra. Na própria Exposição de Motivos da Resolução nº 75, assim mencionou:

"EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS À RESOLUÇÃO SOBRE CONCURSOSPÚBLICOS PARA INGRESSO NA CARREIRA DA MAGISTRATURA –Res nº 75/CNJ

A presente proposta de Resolução, portanto, em linhas gerais, traz asseguintes inovações, dentre outras:

(...)

h) estipula a reserva de 5% (cinco por cento) das vagas, nomínimo, para pessoas com deficiência." (grifo do autor)

Ao mesmo tempo em que a Exposição de Motivos da Resolução nº 75 daqueleEgrégio Conselho trouxe benefícios includentes aos até então "excluídos" dealguns certames (consolidado pelo art. 73, da Resolução supra) -, acarretou, como advento da mesma Resolução, na impossibilidade de grande parte dofuncionalismo público concorrer ao ingresso na magistratura.

É nesse aspecto e sobre o acima relatado que paira uma enorme consternação,diante do paradoxo advindo da Resolução nº 75, e com a revogação da Res nº 11,ambas do CNJ.

Esse paradoxo foi também sentido pela doutrina que estuda o tema:

"Essa postura nos causa estranheza: no final de 2008 o STF, no MS26.682­DF posicionou-se em sentido completamente oposto,admitindo que a pós­graduação, desde que realizada na áreajurídica e, em entidades reconhecidas, fosse, sim, computadanos três anos exigidos.

A nosso ver, outro não poderia ser o entendimento: a teleologiada norma contida nos artigos 93, I e 129, § 3º da CF é selecionarprofissionais preparados para o exercício das relevantesfunções atribuídas aos membros do Poder Judiciário e doMinistério Público. Um dos instrumentos hábeis a conferir a preparaçãoexigida é, sem sombra de dúvida, a freqüência (e o aproveitamento) emcursos de pós-graduação." GOMES, Luiz Flávio. Comentários àResolução 75/09 do CNJ: a nova estruturação das provas. 2009. (grifodo autor)

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Com a finalidade de trazer ao leitor o referido remédio constitucional, resgata-se abaixo parte de seu teor, expedido com caráter liminar:

"MS 26682 MC / DF - DISTRITO FEDERAL

MEDIDA CAUTELAR NO MANDADO DE SEGURANÇA

Relator: Min. CEZAR PELUSO

Julgamento: 13/06/2007

Publicação

As atividades jurídicas necessárias à inscrição no concurso não sãonecessariamente as privativas da advocacia, como deixa claro o próprioart. 1º, par. único, da Resolução nº4/2006, do Conselho Nacional doMinistério Público, que permite o cômputo de cursos de pós­graduação na área jurídica, ‘desde que integralmenteconcluídos com aprovação’.

3. Ante o exposto, defiro a liminar, para que a impetrante possaparticipar de todas as etapas subseqüentes do concurso (...). Publique-se.Int. Brasília, 13 de junho de 2007. Ministro CEZAR PELUSO Relator"(grifo do autor)

O posicionamento acima, tomado pelo Ministro Cezar Peluso, na qualidade deRelator do remédio constitucional, foi acompanhado pelo Tribunal Pleno doSupremo Tribunal Federal, conforme pode se apreender do texto abaixo:

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MS 26682 / DF - DISTRITO FEDERAL

MANDADO DE SEGURANÇA

Relator: Min. CEZAR PELUSO

Julgamento: 15/05/2008

Órgão Julgador: Tribunal Pleno

EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO. Concurso público. Cargo público.Ministério Público federal. Requisito de tempo de atividade jurídicana condição de bacharel em direito. Contagem da data de conclusão docurso, não da colação de grau. Cômputo do tempo de curso de pós­graduação na área jurídica. Liminar confirmada. Concessãode mandado de segurança. Precedente. Inteligência do art. 129, § 3º,da CF. Os três anos de atividade jurídica exigidos ao candidato parainscrição definitiva em concurso de ingresso na carreira do MinistérioPúblico contam-se da data de conclusão do curso de Direito, não dacolação de grau, e incluem tempo de curso de pós­graduação naárea jurídica. (grifo do autor)

De sorte que o CNJ não possui poder jurisdicional, sendo sua competênciaapenas restrita ao âmbito administrativo, não podendo adentrar na análise dosatos jurisdicionais, nem rever o conteúdo da decisão judicial. Esse também é oentendimento de LENZA (2009, p. 575).

O então Ministro Sepúlveda Pertence, do STF, em sede de MS, assimposicionou-se: "(...) Conselho Nacional de Justiça: competência restrita aocontrole de atuação administrativa e financeira dos órgãos do poder Judiciário aele sujeitos (MS 25.879-AgR. DJ de 08.09.2006).

E, mais recentemente, o Ministro Celso de Mello:

"(...) não se desconhece que o Conselho Nacional de Justiça – emboraincluído na estrutura do Poder Judiciário – qualifica-se como órgão decaráter administrativo, não dispondo de atribuiçõesinstitucionais que lhe permitam exercer fiscalização daatividade jurisdicional dos magistrados e Tribunais (...)" (MS27.148-MC?DF, DJU de 26.05.2008 – íntegra no Inf. 507/STF) (grifodo autor)

DA SOLUÇÃO (JÁ EXISTENTE)

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Em observância com o que pregou o CNJ, na edição da Resolução nº 75, de 12 demais de 2009, mais precisamente com a demonstração do espírito dessaregulamentação, o Senhor Ministro João Oreste Dalazen assim proferiu:

"EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS À RESOLUÇÃO SOBRECONCURSOS PÚBLICOS PARA INGRESSO NA CARREIRA DAMAGISTRATURA – Res nº 75/CNJ

(...)

c) Atividade jurídica. Curso de pós­graduação. Conclusão ouinício durante a vigência da Instrução Normativa nº 11/CNJ. A resoluçãopropõe que se revogue a Instrução Normativa nº 11/CNJ e, portanto,que se desconsidere, doravante, para efeito de atividadejurídica, a participação em curso de pós­graduação promovidopor Escolas oficiais de magistratura, na perspectiva de queessa experiência não traduz a vivência jurídica, na aplicaçãodo Direito, de que cogita o mandamento constitucional.Pareceu­nos, enfim, que não é consentâneo com a ConstituiçãoFederal e tampouco conveniente equiparar à atividadejurídica atividades meramente acadêmicas, como os cursos depós­graduação. Entretanto, a fim de preservar a boa-fé e para nãosurpreender o candidato que investiu nessa modalidade de qualificação,estimulado por norma editada pelo Conselho Nacional de Justiça (IN nº11), ressalva-se, em norma de caráter transitório, a situação do candidatoque concluiu ou iniciou curso de pós-graduação durante a vigência daInstrução Normativa nº 11/CNJ." (grifo nosso)

Todavia, pareceu não considerar, o CNJ, que a legislação Pátria já trazmedidas/requisitos que devam ser cumpridos para a verificação da capacidadedo candidato ao cargo de magistratura: trata-se das fases do concurso públicopara o aludido cargo e do estágio probatório, de 2 (dois) anos (vide Lei Orgânicada Magistratura)  .

Notadamente, o candidato que for capaz de (ultra)passar todas essas fases doconcurso será merecedor do aval da sociedade para exercer a função demagistrado. Ainda, caso demonstre um desvio ou algum outro impedimento sejacomprovado, após as etapas do certame, há a previsão do período do estágioprobatório, no qual, conforme preconiza a CRFB/88, pela Reforma feita pela EC19/1998, deve ser realizada a avaliação especial de desempenho por comissãoconstituída para essa finalidade.

Em Consulta ao Conselho Nacional de Justiça realizada por este autor (ConsultaNumeração Única 0005461-65.2009.2.00.0000), com fulcro nos arts. 89 e 4º,inc. XXXII, do Regimento Interno do CNJ, tendo como objeto a apreciação doteor e as conseqüências advindas da Resolução N.º 75, como resposta obteve,

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primeiramente, que a consulta não desafiava conhecimento em face da falta dosrequisitos do interesse e repercussão gerais, condições preliminares para aatuação do Conselho, afirmando que o requerimento da consulta não revelavaqualquer transcendência individual.

Mesmo assim, sabedor de que não estava coerente/justa tal fundamentação (ouescusa em se ater ao teor principal da consulta), prosseguiu e, ao final daResposta, destacou (a título de amenizar a negativa de análise do conhecimentoe, principalmente, por saber da ação excludente que a Resolução impetrou emgrande parcela da sociedade):

"É de se destacar que a referida Resolução foi fruto de um intenso debateestabelecido através da 1ª Consulta Pública aberta por este Conselho(...). O texto final está, portanto, marcado pelo crivo da legitimidade emrazão do debate democrático que o precedeu." (Consulta NumeraçãoÚnica 0005461-65.2009.2.00.0000)

Entretanto, ao se vasculhar o site do CNJ, percebe-se que, no tocante à Res N.º75, poucas foram as intervenções da sociedade nessa discussão. Aliás, pouco foidivulgado em relação a essa importante temática. Quantos cidadãos, direta ouindiretamente, interessados nesse tema foram consultados? (Você foi, caroleitor?)

Mesmo com toda a demonstração da repercussão e do interesse geral que essadefinição de atividade jurídica acarreta - intrinsecamente a sua próprianatureza -, mais oportuno ao Conselho foi emitir um juízo de valor, embora decaráter preliminar, baseando-se em tamanha subjetividade. Acredita-se,indubitavelmente, que essa alteração, per si, já justifica um intenso debate decaráter transindividual e de plenitude nacional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Resolução N.º 75, do Conselho Nacional de Justiça, de 12 de maio de 2009,instituiu uma nova definição - administrativa - ao conceito de atividade jurídic.Em suma, retirou da abrangência do conceito os cursos de pós-graduação, aindaque realizados ou voltados especificamente para a área jurídica.

Tal Resolução, desta forma, trouxe a impossibilidade para uma grande parcelada sociedade brasileira de concorrer ao cargo público da magistratura.Exemplificando, os funcionários públicos, lato sensu, que compõem o rol dosarts. 28 e 30 do Estatuto da OAB (Lei n. 8.906/94), encontram-se,sumariamente, excluídos do processo de seleção para este fim. Tratou-se,

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portanto, de uma Resolução do Conselho Nacional de Justiça que trouxe umviés excludente (logo Injusto) para muitos cidadãos que contribuem, a suamaneira, para o desenvolvimento do País e para a construção da paz social.

A justificativa emanada pelo CNJ, descrita na Exposição de Motivos da aludidaResolução, diz que tal medida tem por objetivo melhorar a qualidade dos novosmagistrados que comporão os quadros do Poder Judiciário. Disse o entãoMinistro João Oreste Dalazen que os cursos de pós-graduação, mesmo na áreajurídica, não traduziriam a prática necessária para o cumprimento dosrequisitos a fim de assunção do cargo/função.

Ora, mas o processo seletivo, legalmente previsto e cumprido pelos Tribunaisde todo o País, já torna mais que suficiente a medida para a verificação dacapacidade dos candidatos. São 5 (cinco) fases, pelas quais são testados não só onível cognitivo do candidato na área jurídica e em outras a esta ligadas, comotambém na área afetiva, seja por meio da entrevista/prova oral, seja por meioda sindicância, do exame psicotécnico e da investigação social do cidadão.

Ademais, caso o candidato (ultra)passe tais dificílimas fases com pleno êxito,seja nomeado e assuma a função, qualquer desvio de conduta ou falha naverdadeira compreensão do que é ser magistrado e da importância que essaatividade exerce no cotidiano do País, ainda haverá o período do estágioprobatório e da respectiva avaliação especial de desempenho, na qual poderáconstar a justificativa para possível exoneração do cargo, cumpridos ospreceitos do devido processo legal.

De se verificar, portanto, que se há falhas no processo seletivo, muito maisdevem estar ligadas a equívocos individualizados e à omissão da banca seletiva,ou, se já em atividade, à não fiscalização devida sobre os atos do novomagistrado por aqueles que possuem tal atribuição legal, dentre esses, convémressaltar, curiosamente, o próprio Conselho Nacional de Justiça.

Sendo assim, pela (re)afirmação da democracia nesse País e pela garantia dolivre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão; pela segurança jurídicae social dos cidadãos e pela continuidade dos ditames vividos na Era daInclusão, na qual impera o lema "Não à discriminação!", convém a revisão daatual definição, excludente, de atividade jurídica estampada e defendida peloConselho Nacional de Justiça, em pleno século XXI.

REFERÊNCIAS

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NOTA

1. Consoante DI PIETRO (2009, p. 512), quanto ao vínculo com o poderpúblico, a natureza jurídica dos membros da Magistratura, como agentespúblicos, é de ordem estatutária, regidos pela Lei Orgânica da Magistratura;embora persista a discussão acerca da categoria: se agente político ouservidor público. Também há na doutrina um novo enquadramento paraesses membros: o de servidores públicos especiais, tendo em vista o carátervitalício do cargo (PAULA FILHO, 2009, p. 37).

Autor

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Pós-graduando em Direito Público e em Direito Militar.Bacharel em Direito. Licenciado em Geografia. Professor deGeografia na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN)

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Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

FERREIRA NETO, Walfredo Bento. A Resolução nº 75 do Conselho Nacional deJustiça e a definição de atividade jurídica. Um conceito excludente na era dainclusão. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2646, 29 set. 2010. Disponívelem: <http://jus.com.br/artigos/17509>. Acesso em: 14 fev. 2014.