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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA A RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NOS ACIDENTES DO TRABALHO ANDRÉ FERNANDO CARVALHO Orientadora: Profª. Sonia Maria Ferreira Roberts Itajaí (SC), novembro de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NOS ACIDENTES DO TRABALHO

ANDRÉ FERNANDO CARVALHO

Orientadora: Profª. Sonia Maria Ferreira Roberts

Itajaí (SC), novembro de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NOS ACIDENTES DO TRABALHO

ANDRÉ FERNANDO CARVALHO

Monografia submetida à Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito

parcial à obtenção do grau de Bacharel em

Direito.

Orientadora: Profª. Sonia Maria Ferreira Roberts

Itajaí (SC), novembro de 2008.

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Meus Agradecimentos:

À Professora Sonia Maria Ferreira Roberts, minha

orientadora, por todo o apoio e incentivo

dispensados durante a realização desta pesquisa;

A todos os demais professores e colegas que

colaboraram direta e indiretamente para a

conclusão deste trabalho.

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Esse trabalho dedico:

Aos meus pais, Arysnaldo e Zita, que além de nunca

terem medido esforços para a minha formação

educacional, sempre serviram de referencial para a

minha formação pessoal, sobretudo por

proporcionarem exemplos constantes de humildade,

coragem e persistência;

À minha namorada Carla, e aos meus irmãos

Álvaro e Laline, por todo o apoio e incentivo

dispensados durante esta trajetória da minha vida.

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da

Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduando André

Fernando Carvalho , sob o título A RESPONSABILIDADE CIVIL DO

EMPREGADOR NOS ACIDENTES DO TRABALHO , foi submetida em 19 de

novembro de 2008 à Banca Examinadora composta pelos seguintes Professores:

Sonia Maria Ferreira Roberts (Orientadora e Presidente da Banca), MSc. Rosane

Maria Rosa (Membro), e aprovada com a nota _____ (________________).

Itajaí (SC), 19 de novembro de 2008.

Profª. Sonia Maria Ferreira Roberts Orientadora e Presidente da Banca

Prof. MSc Antônio Augusto Lapa Coordenação de Monografia

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DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total

responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando

a Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI, a Coordenação do Curso de Direito, a

Banca Examinadora e a Orientadora de toda e qualquer responsabilidade acerca

do mesmo.

Itajaí (SC), 07 de novembro de 2008.

André Fernando Carvalho

Graduando

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com os seus respectivos conceitos operacionais.

Acidente do trabalho:

É o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, ou ainda pelo

exercício do trabalho dos segurados especiais, provocando lesão corporal ou

perturbação funcional que cause a morte, a perda ou redução da capacidade para

o trabalho permanente ou temporário. Michel [2001, p. 29].

Ato ilícito:

Ato praticado em desacordo com a ordem jurídica pré-estabelecida. Silva [2000,

p.97].

Ato lícito:

Ato praticado sob o amparo da lei, ou seja, toda ação permitida pelas normas

jurídicas que não atente contra interesses alheios ou contra a segurança coletiva,

ou quando, os viole, encontre apoio na razão de ter sido praticado por se tornar

absolutamente necessário para a remoção do perigo. Silva [2000, p. 97].

Culpa

É o vínculo de caráter interno a demonstrar a imputabilidade do resultado ao

agente, gerando o dever de restabelecer a situação anterior ao prejuízo. Silva

[2000, p. 103].

Dano

É o prejuízo causado ao bem alheio, patrimonial ou extra-patrimonial. Se o dano

foi causado ao desabrigo de qualquer das excludentes prevista na legislação,

sujeita-se ao correspondente ressarcimento, mas nenhum direito lhe assistirá,

exatamente porque obrou em dissonância ao que determina a lei. Silva [2000, p.

115].

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Responsabilidade civil

É a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou

patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por

pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples

imposição legal. Diniz [2006, p. 40].

Responsabilidade civil subjetiva

É decorrente de dano causado em função de ato doloso ou culposo. Esta culpa,

por ter natureza civil, se caracterizará quando o agente causador do dano atuar

com negligência, imperícia ou imprudência. Gagliano [2006, p. 13].

Responsabilidade civil objetiva

É a responsabilidade que, basta a evidência, a mera ocorrência da lesão e a

constatação de que teve origem em dado comportamento positivo ou negativo,

inexigível a imputação subjetiva ao autor. Diniz [2006, p. 42].

Responsabilidade contratual

Obrigação de indenizar ou de ressarcir os danos causados pela inexecução de

cláusula contratual ou pela má execução de obrigação, nela estipulada. Silva

[2000, p. 714].

Responsabilidade extracontratual

Violação de qualquer dispositivo do ordenamento jurídico, incluindo-se o

descumprimento do dever geral de cautela. Brandão [2006, p. 205].

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SUMÁRIO

RESUMO .............................................................................................................. XI

INTRODUÇÃO........................................................................................................1

Capítulo 1

ACIDENTE DO TRABALHO

1.1 CONCEITO .......................................................................................................4

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO ACIDENTÁRIA... .......................7

1.3 ESPÉCIES DE ACIDENTE DO TRABALHO............... ...................................11

1.3.1 Acidente-tipo................................ ...............................................................12

1.3.2 Doenças ocupacionais......................... ......................................................14

1.3.3 Acidente do trabalho por equiparação......... ............................................18

Capítulo 2

DANOS DECORRENTES DO ACIDENTE DO TRABALHO

2.1 DANO MATERIAL .................................. ........................................................23

2.1.1 Dano emergente ............................... ..........................................................24

2.1.2 Lucros cessantes............................. ..........................................................26

2.2 DANO MORAL ..................................... ..........................................................28

2.2.1 Cumulação com o dano material ................ ..............................................32

2.2.2 Critérios de arbitramento .................... ......................................................33

2.3 DANO ESTÉTICO...........................................................................................36

2.3.1 Cumulação com o dano moral ................... ...............................................39

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Capítulo 3

PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

3.1.1 NOÇÕES PRELIMINARES ACERCA DA RESPONSABILIDAD E CIVIL...42

3.2 PRESSUPOSTOS...........................................................................................43

3.2.1 Ação......................................... ....................................................................43

3.2.2 Culpa........................................ ....................................................................44

3.2.3 Dano......................................... ....................................................................48

3.2.4 Nexo de causalidade.......................... .........................................................51

Capítulo 4

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NOS ACIDENTES DO TRABALHO

4.1 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL............. ....................................53

4.1.1 Responsabilidade civil subjetiva ............. .................................................56

4.1.2 Responsabilidade civil objetiva .............. ..................................................58

4.2 TEORIAS ACERCA DA NATUREZA DO RISCO ............ ..............................65

4.2.1 Risco-proveito ............................... .............................................................65

4.2.2 Risco profissional ........................... ...........................................................67

4.2.3 Risco expecional............................. ...........................................................68

4.2.4 Risco criado................................. ...............................................................68

4.2.5 Risco integral ............................... ..............................................................69

4.3 O ACOLHIMENTO DA TEORIA DO RISCO NO NOVO CÓDIGO CIVIL.......70

4.4 PRESUNÇÃO DE CULPA DO EMPREGADOR............... ..............................76

4.5 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREG ADOR......79

4.5.1 Culpa exclusiva da vítima.................... ......................................................79

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4.5.2 Fato exclusivo de terceiro ................... ......................................................80

4.5.3 Caso fortuito e força maior .................. .....................................................80

4.6 CUMULAÇÃO COM OS BENEFÍCIOS ACIDENTÁRIOS....... . ......................82

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... ...................................................87

REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS ..................... ......................................94

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RESUMO

A presente monografia é o resultado de um estudo

aprofundado acerca da responsabilidade civil do empregador nos acidentes do

trabalho, realizado sob uma perspectiva teórica, à luz da legislação, doutrina e

jurisprudência. Objetiva-se com esta pesquisa, conceituar o acidente do trabalho,

traçar as suas espécies e a sua evolução histórica na legislação acidentária,

demonstrando, em seguida, quais os danos que podem ser eventualmente

resultantes do infortúnio laboral, bem como os pressupostos caracterizadores da

responsabilidade civil, buscando, assim, com apoio em pesquisa bibliográfica e

utilizando-se o método dedutivo, evidenciar como configura-se atualmente a

responsabilidade civil do empregador quando da ocorrência do acidente do

trabalho, retratando quais as espécies de responsabilidade civil existentes no

ordenamento jurídico pátrio, e quais delas são aplicáveis aos acidentes do

trabalho; as teorias que ampliam ou delimitam a sua aplicação; as inovações

trazidas pelo Novo Código Civil no campo da responsabilidade civil; a admissão

da presunção de culpa do empregador; as excludentes de responsabilidade civil,

e a possibilidade de cumulação dos benefícios acidentários com a indenização

civil devida pelo empregador.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objeto a “Responsabilidade

Civil do Empregador nos Acidentes do Trabalho” e, como objetivo institucional,

produzir uma monografia para a obtenção do grau de bacharel em Direito, pela

Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

No que tange ao seu objetivo geral, busca inicialmente

destacar o conceito, as espécies e a amplitude do acidente de trabalho,

denotando, inclusive, a sua evolução histórica frente à legislação acidentária, bem

como os danos eventualmente causados quando da sua ocorrência.

Como objetivos específicos, outrossim, pretende examinar

os elementos caracterizadores da responsabilidade civil, e a sua aplicabilidade

nos acidentes do trabalho; como configura-se atualmente a responsabilidade civil

do empregador em tais acidentes; as espécies de responsabilidade civil à ele

aplicáveis; as inovações trazidas pelo Novo Código Civil no campo da

responsabilidade civil, e, por conseguinte, a aplicação destas nos infortúnios

laborais.

Assim, para a elaboração deste estudo, foram levadas em

consideração as seguintes hipóteses: a) o empregador responde pelos danos

causados em decorrência do acidente do trabalho, independentemente da

existência de culpa; b) as alterações trazidas pelo Novo Código Civil no campo da

responsabilidade civil são aplicáveis aos acidentes do trabalho; c) é admitida a

presunção de culpa do empregador no acidente do trabalho, possibilitando, assim,

a inversão do ônus da prova; d) a possibilidade da vítima ou seus dependentes

receberem qualquer dos benefícios previdenciários acidentários, não exclui a

responsabilidade civil do empregador, nem tampouco podem os valores

percebidos com aqueles serem abatidos da indenização civil devida por este.

Os acidentes do trabalho sempre foram uma constante em

todo o mundo. No Brasil, em que pese toda a influência tecnológica e científica

que vêm sofrendo os postos de trabalho, os índices de acidentes de trabalho

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ainda são bastante alarmantes, motivados, sobretudo, pelo descaso de muitos

empregadores no que diz respeito à observância das normas de segurança e

proteção ao trabalhador.

Ademais, aliado ao crescente número de acidentes do

trabalho ocorridos diariamente em todo o país, são freqüentes os casos em que o

empregado não logra êxito em comprovar a culpa do empregador para a

ocorrência daquele infortúnio, seja pela dificuldade na obtenção de provas

concretas, ou até mesmo pela sua posição desprivilegiada em relação ao

empregador, mais equipado em todos os sentidos, casos em que, portanto, resta

prejudicado o pleito indenizatório.

Por esta razão, a escolha do tema deste trabalho justifica-se

na relevância em aprofundar o estudo do acidente do trabalho e suas nuanças, os

danos que este costumeiramente causa aos empregados, assim como a forma

em que se configura a responsabilidade civil do empregador em tais casos,

mormente pelas incessantes discussões doutrinárias e jurisprudenciais que tal

tema vem suscitando no ambiente jurídico nacional.

A pesquisa realizada foi distribuída em quatro capítulos,

permitindo, assim, a abordagem da temática numa seqüência lógica. O primeiro

capítulo discorre sobre o acidente do trabalho, trazendo o seu conceito legal, as

suas respectivas espécies, bem como a sua evolução histórica frente à legislação

acidentária.

O segundo capítulo, por sua vez, trata dos danos

decorrentes do acidente do trabalho, dividindo-os em: dano material, que por sua

vez divide-se em dano emergente e lucros cessantes, dano moral e dano estético.

O terceiro capítulo aborda os pressupostos da

responsabilidade civil, quais sejam, ação, culpa, dano e nexo de causalidade, com

ênfase na responsabilidade civil decorrente do acidente do trabalho.

O quarto capítulo, por fim, trata do tema central da presente

pesquisa, isto é, da responsabilidade civil do empregador no acidente do trabalho,

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buscando relacionar as espécies de responsabilidade civil aplicáveis; as teorias

que visam a ampliar ou delimitar a responsabilidade do empregador; as

alterações trazidas pelo Novo Código Civil no campo da responsabilidade civil, e

aplicação destas nos infortúnios laborais; as hipóteses de exclusão da

responsabilidade civil do empregador, bem como a possibilidade de cumulação

dos benefícios acidentários previdenciários com a indenização civil devida por

este.

Nas considerações finais apresenta-se breve síntese de

cada um dos capítulos deste trabalho, e a confirmação ou não das hipóteses

levantadas pela pesquisa.

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Capítulo 1

ACIDENTE DO TRABALHO

1.1 CONCEITO

Nos dizeres de Michel [2001, p. 03], o acidente de trabalho

remonta à própria origem humana, ao passo que desde aquela época o homem já

precisara desenvolver alguma atividade produtiva com o fito de garantir o sustento

próprio e o de sua família.

Disso conclui-se, inclusive, que em que pese a sua evolução

histórica, o acidente de trabalho traz em si características que lhe são peculiares,

e que o identificam independentemente do seu marco histórico.

Atualmente encontram-se diversas conceituações

abordando o acidente de trabalho, as quais, em sua maioria, são derivações e ou

complementações da própria Lei nº. 8.213, de 24 de julho de 1991 (Lei de

Benefícios da Previdência Social), que em seu artigo 19, caput, assim o define:

Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

Consoante se observa da redação do mencionado

dispositivo, a lei previdenciária em questão, ao conceituar o acidente de trabalho,

igualou os trabalhadores urbanos e rurais ao incluir em sua abrangência os

segurados previstos em seu artigo 11, inciso VII, que trata especificamente dos

segurados especiais, quais sejam, o produtor, o parceiro, o meeiro e o

arrendatário rural, o pescador artesanal e o assemelhado, excluindo, contudo, o

empregado doméstico, na medida em que este não se encontra disposto em sua

redação como um dos beneficiários ao auxílio-acidente (artigo 18, §1º).

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O conceito trazido por Michel [2001, p. 29], muito se

assemelha ao texto do dispositivo anteriormente transcrito, visto assim o definir:

Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, ou ainda pelo exercício do trabalho dos segurados especiais, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda ou redução da capacidade para o trabalho permanente ou temporário.

Já Theodoro Júnior [1987, p. 03] o entende como “[…] o

acontecimento que determina, fortuitamente, dano que poderá ser à coisa,

matéria, ou pessoa”, definição esta semelhante à trazida por Russomano [1970,

p. 11] para quem “é o vocábulo que indica um acontecimento que determina,

fortuitamente, o dano”. Conceitua-o como “um acontecimento em geral súbito,

violento e fortuito, vinculado ao serviço prestado a outrem pela vítima e que lhe

determina a lesão corporal”.

Nos fundamentos trazidos por Dela Coleta [1989, p. 17], o

acidente do trabalho está vinculado popularmente a toda ocorrência imprevista,

com pequena probabilidade de aparecimento, que não esteja sob o domínio da

pessoa, desencadeando rapidamente e provocando significativas perdas para a

vítima.

Cumpre destacar, que a diferenciação conceitual entre

acidente e doença do trabalho é de interesse meramente doutrinário, porquanto o

legislador brasileiro equiparou, para fins de proteção ao trabalhador, a doença

ocupacional ao acidente do trabalho.

Neste sentido, afirma Russomano [1970, p. 20], de forma

enfática, não ser possível doutrinariamente a identificação dos conceitos de

acidente do trabalho e moléstia profissional, embora, legislativamente, ambos são

tratados da mesma maneira.

Assim, muitos doutrinadores incluem no conceito de

acidente de trabalho a doença do trabalho, dentre estes, destaca-se Diniz [2003,

p. 43], que conceitua o acidente de trabalho como o “[...] evento danoso que

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resulta do exercício do trabalho, provocando no empregado, direta ou

indiretamente, lesão corporal, perturbação funcional ou doença que determine

morte, perda total ou parcial, permanente ou temporária, da capacidade para o

trabalho”.

Para Michel [2001. p. 29], outrossim, considera-se acidente

do trabalho, as seguintes entidades:

Doença profissional: assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício de trabalho peculiar a determinada atividade e constante da relação de que trata o Anexo II do Decreto nº. 611/92; doença do trabalho: assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relaciona diretamente, desde que constante da relação do Anexo II citado.

No mesmo norte, é a lição de Tortorello [1996, p. 09], para o

qual o acidente do trabalho é o “acidente sofrido pelo trabalhador, a serviço da

empresa, e que ocorre pelo exercício do trabalho, provocando lesão corporal,

perturbação funcional ou doença que cause a morte, a perda ou redução

permanente ou temporária da capacidade para o trabalho”.

Em uma abordagem mais profunda, outrossim, Carvalho

[1963, p. 43] consagra o acidente de trabalho como sendo:

[...] o efeito danoso para a pessoa, verificado pelo exercício do trabalho. Tudo quanto, por este exercício, venha a determinar, direta ou indiretamente, lesão corporal, perturbação funcional ou doença, é acidente do trabalho. 2 – Quer o trabalho aja, em seu papel nocivo, concentradamente, quer os seus efeitos maléficos se façam sentir pouco a pouco, tanto que tenha ele agido aguda como cronicamente, de qualquer maneira, enfim, por que se verifiquem as conseqüências danosas, tudo isso será acidente do trabalho, desde que, para tal resultado, o trabalho tenha contribuído como agente provocador direto ou indireto.

No mesmo sentido, aliás, bem esclarece Magano [1976, p.

02], quando ao tratar do vocábulo infortunística, assegura que este abrange tanto

o acidente típico, quanto as doenças profissionais, sendo, portanto, suficiente que

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haja uma relação de causa e efeito entre a lesão sofrida e o labor executado pelo

empregado.

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO ACIDENTÁRIA

A efetiva preocupação com a infortunística laboral teve

origem na Revolução Industrial, porquanto nesta época, com o incremento da

industrialização, houve um sensível aumento no número de mortos e mutilados

em decorrência das precárias condições de trabalho.

Foi, no entanto, na Alemanha, em 1884, criada a primeira lei

específica sobre os acidentes de trabalho, motivada, inclusive, pela política social

de Bismark, a fim de conter, ou pelo menos amenizar, as manifestações

revolucionárias que agitavam aquele país, sob a inspiração de Marx e Engels.

Em seguida, várias nações seguiram o exemplo Alemão, de

forma que países como a Áustria (1887), Noruega (1894), Finlândia (1895),

Inglaterra (1897), Dinamarca, Itália e França (1898) e Espanha (1900), criaram

leis com a mesma finalidade.

De acordo com Theodoro Júnior [1987, p. 08], os países que

buscaram a proteção da infortunística trabalhista não seguiram, naturalmente, os

mesmos padrões legislativos, no entanto, algumas peculiaridades se

manifestaram com maior nitidez em alguns ordenamentos, de forma a permitirem

a sua separação em pelo menos três grandes grupos: a) o germânico; b) o anglo-

saxônico; e c) o francês.

O grupo germânico se orientou, desde logo, para uma

completa intervenção estatal no seguro do acidente do trabalho, assumindo o

Estado e o seu monopólio, e tornando as empresas sujeitas a seguro obrigatório.

Além disso, as indenizações eram fixadas tarifariamente pela lei. Assim como a

Alemanha, seguiram este modelo legislativo a Áustria, Noruega, Dinamarca,

Luxemburgo, Suíça, Portugal, dentre outros países.

Já o grupo anglo-saxônico, a que pertencem a Inglaterra,

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Austrália, Canadá etc, é o do liberalismo, no qual não havia obrigação de seguro,

tampouco jurisdição e garantias especiais, configurando-se num regime

eminentemente contratual.

O grupo francês, por sua vez, caracterizou-se num sistema

intermediário entre os dois anteriores, com a adoção de medidas normativas que

possibilitassem o pagamento de indenizações devidas em razão dos acidentes de

trabalho. Este grupo compreendia, originariamente, a França, Bélgica, Holanda,

Finlândia, Suécia, Espanha, dentre outros países.

Consoante menciona Theodoro Júnior [1987, p. 02], sendo a

infortunística laboral um tema tão dinâmico e sensível, as disposições legislativas

não ficaram estáticas, houve sempre, na verdade, uma grande mobilidade

legislativa ao tratar da matéria.

Diante disto, segundo aquele autor [1987, p. 02], “[…]

paralelamente às leis da infortunística, foram se desenvolvendo outros ramos do

direito social, como o direito do trabalho e o direito da previdência social”.

Tal tendência ganhou amparo universal, sendo, inclusive,

aplaudida e incentivada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), além

de receber, paulatinamente, mais atenção dos países.

No Brasil, apenas normas esparsas tratavam do acidente do

trabalho, a começar pelo Código Comercial de 1850, que assim previa:

Art. 79. Os acidentes imprevistos e inculpados, que impedirem aos prepostos o exercício de suas funções, não interromperão o vencimento do seu salário, contanto que a inabilitação não exceda a 3 (três) meses contínuos.

Art. 560. Não deixará de vencer a soldada ajustada qualquer indivíduo da tripulação que adoecer durante a viagem em serviço do navio, e o curativo será por conta deste; se, porém, a doença for adquirida fora do serviço do navio, cessará o vencimento da soldada enquanto ela durar, e a despesa do curativo será por conta das soldadas vencidas; e se estas não chegarem, por seus bens ou pelas soldadas que possam vir a vencer.

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Há tempos buscava-se a instituição de uma legislação

específica para tratar da infortunística do trabalho. Tal intento resultou na

aprovação do Decreto Legislativo nº. 3.724, de 15 de janeiro de 1919, sendo,

portanto, considerado a primeira lei acidentária brasileira.

Neste diploma, já havia a responsabilidade do empregador

pelo pagamento das indenizações acidentárias, e, em que pese as críticas a seu

respeito, resguardou seu mérito em razão de seu pioneirismo no assunto, o qual,

aliás, nos dizeres de Costa [2003, p. 44] “[…] significou a emancipação da

infortunística do cordão umbilical que a mantinha de alguma forma presa ao

direito comum, reforçando sua autonomia do direito trabalhista específico, não

obstante as resistências dos saudosistas da monarquia”.

Em seguida, foi aprovado o Decreto nº. 24.637, de 10 de

julho de 1934, passando a ser considerado como a segunda lei acidentária, sendo

responsável pela ampliação do conceito de acidente para abranger as doenças

profissionais atípicas, além de estabelecer a obrigação do seguro privado, ou

depósito em dinheiro junto ao Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal, como

forma de garantir o pagamento das indenizações.

Mais tarde, em 10 de novembro de 1944, adveio a terceira

lei acidentária através do Decreto-lei nº. 7.036, o qual fora instituído com base no

pensamento do Ministro do Trabalho à época, Alexandre Marcondes Filho, citado

por Saad [1999, p. 34]:

“A vida humana tem, certamente, um valor econômico. É um capital que produz, e os atuários matemáticos podem avaliá-lo. Mas a vida do homem possui também um valor espiritual inestimável, que não se pode pagar com todo o dinheiro do mundo. Nisto consiste, sobretudo, o valor da prevenção, em que se evita a perda irreparável do pai, do marido e do filho; enfim, daquele que sustenta o lar proletário, e preside os destinos de sua família. Por mais que se despensa com a prevenção racional, ela será sempre menos onerosa que o sistema de indenizações, além de evitar oportunidade de discórdia entre elementos essenciais da produção, capital e trabalho”.

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O Decreto-lei susomencionado foi responsável pela

ampliação do conceito de acidente do trabalho, uma vez que incorporou em sua

redação as concausas, e o acidente “in itinere”. Além disso, instituiu a obrigação

dos empregadores em proporcionar condições favoráveis de higiene e segurança

no trabalho, e, por outro lado, o dever dos empregados em obedecer as normas

de segurança impostas pelos empregadores.

Passados mais alguns anos, surge o Decreto-lei nº. 293, de

28 de fevereiro de 1967, promulgado, inclusive, por força do Ato Institucional nº. 4.

Tal decreto, segundo bem anota Saad [1999, p. 101], “[…] foi um dos diplomas

legais mais impróprios, retrocedendo a tudo quanto de bom havia sido

conquistado na legislação sobre infortunística”.

Embora sua vigência tenha sido de apenas seis meses, o

mencionado Decreto foi responsável por um sensível retrocesso na legislação

acidentária, atribuindo, inclusive, ao seguro-acidente um caráter exclusivamente

privado, ao passo que permitiu a exploração do seguro pelas companhias

seguradoras, em concorrência com o até então Instituto Nacional de Previdência

Social – INPS.

Ainda no decorrer do ano de 1967, em 14 de setembro,

restou promulgada a Lei nº. 5.316, a qual foi responsável pelo resgate de parte

das disposições do Decreto-lei nº. 7.036/44, transferindo ao Instituto Nacional de

Previdência Social – INPS, o monopólio do seguro de acidente do trabalho, além

de criar um plano específico de benefícios previdenciários acidentários.

Dando seqüência à trajetória legislativa acidentária, surge

em 19 de outubro de 1976, a Lei nº. 6.367, a sexta lei tratando do assunto. Este

diploma manteve as premissas da lei anterior, melhorando, contudo, o conceito de

acidente do trabalho e das concausas, além de incluir a doença proveniente de

contaminação acidental do pessoal da área médica como situação equiparada a

acidente do trabalho. Permitiu, ainda, o reconhecimento por equiparação de

doenças não indicadas pela Previdência Social, desde que tais patologias

estivessem relacionadas com as condições especiais em que o serviço foi

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prestado, estendendo, portanto, o campo de atuação do acidente de trabalho.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a qual

instituiu novas diretrizes a serem seguidas pela legislação infraconstitucional,

surge, em 24 de julho de 1991, a Lei nº. 8.213 (Plano de Benefícios da

Previdência Social), que trouxe em seus artigos 19 a 23, disposições que tratam

especificamente do acidente do trabalho, as quais, posteriormente, foram

regulamentadas pelo Decreto nº. 3.048/99, e pela Lei nº. 9.032/95, sendo esta

última responsável pela equiparação dos benefícios acidentários aos benefícios

previdenciários, de forma à não haver distinção de valores entre a prestação por

doença ocupacional ou comum.

Por esta razão, várias críticas foram suscitadas por

considerarem inapropriado o tratamento da infortunística laboral junto ao texto da

mencionada lei previdenciária, sob o fundamento de que a tamanha relevância de

tal matéria já comportaria o seu tratamento em uma lei específica, conforme,

aliás, defende Costa [2003, p. 63], quando mencionada que “[…] a bem da

verdade, o País não tem uma lei de acidentes do trabalho, mas regras

infortunísticas disseminadas nos benefícios da Previdência Social”.

1.3 ESPÉCIES DE ACIDENTE DO TRABALHO

A evolução legislativa mundial frente à proteção acidentária

sempre caminhou em ritmo desacelerado. No Brasil, em especial, tal trajetória

vem se dando em passos ainda mais lentos, motivada, sobretudo, pela forte

resistência da classe empresarial que a vislumbra como um fator de despesas.

Como visto, a questão acidentária pátria é atualmente regida

pela Lei nº. 8.213/91, de 24 de julho de 1991, sendo, por isso, alvo de várias

críticas, dentre elas, a de Costa [2003, p. 64], que evidencia a sua indignação por

não ter o Brasil uma lei própria para tratar da infortunística trabalhista, restando

esta disseminada nos benefícios da Previdência Social, o que culmina não

apenas na dificuldade de sua aplicação, mas também na alteração de seu

objetivo, que deveria ser, primeiramente, a saúde do trabalhador acidentado e o

respectivo ressarcimento dos danos a este causados.

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Segundo bem leciona Brandão [2006, p. 119-120], em

evidente consonância com o texto legal, o infortúnio laboral pode ser classificado

nas seguintes espécies:

a) acidente tipo; b) doenças ocupacionais, que compreendem: doenças profissionais; doenças do trabalho; doenças provenientes de contaminação acidental; c) acidentes por equiparação, ocorridos no ambiente e no horário de trabalho: doenças provocadas por concausas; lesões provocadas por terceiros; danos provocados por agressão injusta, sabotagem ou terrorismo; ofensas físicas intencionais, por causa ligada ao trabalho; acidentes causados por culpa de terceiro; lesões provenientes de pessoa privada do uso da razão; acidentes provocados por força maior; d) acidentes por equiparação, ocorridos fora do ambiente e do horário de trabalho: na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade do empregador; na prestação de serviço para evitar prejuízo ou proporcionar proveito; em viagem de serviço; acidente de percurso; nos períodos de refeição e descanso; nos períodos em que estiver satisfazendo as necessidades biológicas.

1.3.1 Acidente-tipo

O acidente-tipo, também atribuído como “macrotrauma”,

“acidente típico”, constitui-se, basicamente, no acidente modelo ou acidente em

sentido estrito, equivalente àquele conceituado no artigo 19 da Lei nº. 8.213/91,

anteriormente transcrito.

Observa-se que o regramento atual é o mesmo desde a

edição do Decreto-lei nº. 7.036, de 10 de novembro de 1944, que correspondia à

terceira lei sobre acidentes do trabalho, a qual trazia em seu artigo 1º que:

Considera-se acidente do trabalho, para os fins da presente lei, todo aquele que se verifique pelo exercício do trabalho, provocando, direta ou indiretamente, lesão corporal, perturbação funcional, ou doença, que determine a morte, a perda total ou parcial, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

Tal dispositivo foi responsável pela introdução no sistema

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jurídico brasileiro do critério de definição do acidente de trabalho pelo efeito, e não

pela lesão. Neste sentido, ponderam Monteiro e Bertagni [1998, p. 10-11] que “o

efeito é a lesão. A causa é o fato que a gera e que se denomina acidente”.

Discorrem Monteiro e Bertagni [1998, p. 10-11] que:

Trata-se de um evento único, subitâneo, imprevisto, bem configurado no espaço e no tempo e de conseqüências geralmente imediatas, não sendo essencial a violência, podendo ocorrer sem provocar alarde ou impacto, ocasionando, meses ou anos depois de sua ocorrência, danos graves e até fatais, exigindo-se, apenas, o nexo de causalidade e a lesividade”.

Segundo Costa [2003, p. 70], o acidente-tipo caracteriza-se

como “algum dano físico ou psíquico ao ser humano ou tudo quanto o exercício

do trabalho venha a provocar”.

Costa [2003, p .74] admite ser “um ataque inesperado ao

corpo humano ocorrido durante o trabalho, decorrente de uma ação traumática

violenta, subitânea, concentrada e de conseqüências identificadas”.

Sustenta, ainda, a impossibilidade de desvinculá-lo de suas

conseqüências políticas e sociais, estando envolto num universo de questões

complexas, imputadas à realização do trabalho e aos compromissos do

empregador com as medidas preventivas ao justo ressarcimento do vitimado.

Cesarino Júnior [1980, p. 479], que o denomina como

infortúnio do trabalho, entende ser “[…] o evento causal, nocivo para a

capacidade laborativa e relacionado com o trabalho subordinado prestado à

empresa”.

Já Diniz [2006, p. 43] o considera como sendo aquele que

“advier de um acontecimento súbito, violento e involuntário na prática do trabalho,

que atinge a integralidade física ou psíquica do empregado”.

Michel [2001, p. 49], ao analisar o conceito legal dado ao

acidente, considera-o insatisfatório, sobretudo por este partir da premissa da

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ocorrência de prejuízo físico ao empregado (lesões, perturbações e doenças).

Para Michel [2001, p. 49] sob o enfoque da proteção ao

homem, são igualmente importantes os acidentes com e sem lesão, tendo em

vista que não há como se prever quando irá gerar, ou não, lesão ao trabalhador,

razão por que entende ser necessário conceituar o acidente como “qualquer

ocorrência não programada que interfira no processo produtivo, causando perda

de tempo”.

Na mesma linha, é o posicionamento de Zocchio [2002, p.

59-60], quando afirma que o legislador pátrio apenas preocupou-se com as

conseqüências humanas causadas pelo acidente, limitando-se às situações em

que haja efetivamente vítimas, ao passo que sob o enfoque prevencionista,

deveria ter abordado toda a sua extensão de causa e efeito.

Sob este fundamento, Zocchio [2002, p. 60] propõe a

extensão do conceito legal, de forma que o dano não seja limitado às pessoas,

mas também ao patrimônio do empregador, asseverando que “[…] são todas as

ocorrências indesejáveis, que interrompem o trabalho e causam ferimento em

alguém ou algum tipo de perda à empresa, ou ambos ao mesmo tempo”.

Dela Coleta [1989, p. 16], por sua vez, traz um conceito

diferenciado, quando o trata como “[...] uma cadeia de eventos que

freqüentemente tem como ponto de partida um incidente, uma perturbação do

sistema no qual estão inseridos o trabalhador e sua tarefa, e que, após uma série

mais ou menos longa de ocorrência, termine por determinar uma lesão ao

indivíduo”.

1.3.2 Doenças ocupacionais

As doenças provocadas pelo trabalho já eram consideradas

como acidente do trabalho desde a primeira lei acidentária de 1919. No artigo 1º

do Decreto Legislativo nº. 3.724/19, havia menção à “moléstia contraída

exclusivamente pelo exercício do trabalho”.

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Mais adiante, a legislação pátria adotou em seu texto as

doenças profissionais atípicas, que passaram a ser chamadas de “doenças do

trabalho”, a partir da quarta lei acidentária de 1967.

No ordenamento jurídico vigente, é no artigo 20 da Lei nº.

8.213/91, que encontram-se reguladas as doenças ocupacionais, cuja redação

assim prescreve:

Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

Segundo anota Russomano [1983, p. 350-351], o acidente e

a enfermidade possuem conceitos próprios. A equiparação entre eles se faz

apenas no plano jurídico, com efeitos nas reparações e nos direitos que resultam

para o trabalhador nos dois casos. Assim, enquanto o acidente é um fato que

provoca lesão, a enfermidade profissional é um estado patológico ou mórbido, ou

seja, uma perturbação da saúde do trabalhador.

Disso conclui-se, nas palavras de Oliveira [2007, p. 46], que

o acidente caracteriza-se pela ocorrência de um fato súbito e externo ao

trabalhador, ao passo que a doença ocupacional normalmente vai se instalando

insidiosamente e se manifesta internamente, com tendência ao agravamento.

De acordo com Oliveira [2007, p. 46], caracteriza-se como

doença profissional:

[...] aquela peculiar a determinada atividade ou profissão, também chamada de doença profissional típica, tecnopatia ou ergopatia. O exercício de determinada profissão pode produzir ou desencadear

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certas patologias, sendo que, nessa hipótese, o nexo causal da doença com a atividade é presumido. É o caso, por exemplo, do empregado de uma mineradora que trabalha exposto ao pó de sílica e contrai a silicose.

A doença do trabalho, segundo Oliveira [2007, p. 46],

também chamada de mesopatia ou doença profissional atípica, apesar de

igualmente ter origem na atividade do trabalhador, não está vinculada

necessariamente a esta ou aquela profissão. Seu aparecimento decorre da forma

em que o trabalho é prestado ou das condições especificas do ambiente de

trabalho.

Consoante leciona Oliveira [1997, p. 47], nas doenças do

trabalho “[…] as condições excepcionais ou especiais do trabalho determinam a

quebra da resistência orgânica com a conseqüente eclosão ou a exacerbação do

quadro mórbido, e até mesmo o seu agravamento”.

As doenças profissionais e do trabalho estão relacionadas

no Anexo II previsto no artigo 20, I, da Lei nº. 8.213/91, observando-se que uma

lista aponta os agentes ou fatores de risco de natureza ocupacional relacionados

com a etiologia de doenças profissionais e de outras doenças relacionadas com o

trabalho, e a outra indica as doenças infecciosas e parasitárias relacionadas ao

trabalho, de forma que, como prescreve Oliveira [1997, p. 48], “utilizando-se a

Lista A é possível localizar a doença a partir do seu agente causa; pesquisando-

se pela Lista B, ao contrário, pode-se chegar ao agente causal a partir da

doença”.

Da análise do mencionado anexo, constata-se que este não

diferencia doenças profissionais ou do trabalho, uma vez que engloba as duas

hipóteses numa lista única.

Diante desta não diferenciação trazida pelo texto legal,

sugere Brandimiller [1996, p. 148], que “[…] o mais razoável é deixar de lado

estas conceituações formalmente defeituosas e ater-se aos princípios e ao

sentido geral da legislação acidentária que, a propósito, nunca conseguiu

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conceituar precisamente os dois tipos de doenças a que se refere”.

Convém lembrar, também, que a relação das doenças

ocupacionais anexa ao texto legal, mais precisamente, ao Decreto nº. 3.048/99,

não tem caráter exaustivo, mas tão-somente exemplificativo. Assim, o simples

fato de a doença não constar do respectivo rol como uma doença profissional ou

do trabalho, não impede o seu enquadramento como acidente do trabalho,

quando constatado que esta resultou de condições especiais em que o trabalho é

executado e com ele se relaciona diretamente, conforme, aliás, é a determinação

trazida pelo artigo 20, §2º, da Lei nº. 8.213/91:

[...]

§2º. Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho.

Como visto, existem várias patologias ocupacionais

previstas pelo texto legal, bem como há a possibilidade de além destas, outras

virem a ser enquadradas como tal desde que fique comprovado o nexo causal

entre a doença e as condições em que o trabalho era executado.

Em contrapartida, todavia, existem patologias que não são

consideradas como doença do trabalho, restando excluídas, portanto, deste

conceito. Estas, por sua vez, são trazidas pelo artigo 20, §1º, da Lei nº. 8.213/91,

quem assim prescreve:

[...]

§1º Não são consideradas como doença do trabalho: a) a doença degenerativa; b) a inerente ao grupo etário; c) a que não produza incapacidade laborativa; d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

[...]

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De acordo com a lição de Oliveira [1997, p. 50], as hipóteses

mencionadas nesse parágrafo não têm nexo causal com o trabalho, ou seja,

aparecem durante a prestação do trabalho, mas não em razão dele.

Segundo o mesmo autor [1997, p. 50], as doenças

degenerativas ou inerentes ao grupo etário independem do fator laboral e

poderiam aparecer mesmo que o trabalhador estivesse desempregado ou

aposentado.

Não se pode olvidar, entretanto, que muitas doenças

ocupacionais possuem natureza degenerativa, conforme ensina Brandimiller

[1996, p. 155-156], ao referir que:

O processo degenerativo pode ser de natureza biomecânica, microtraumática ou mesmo macrotraumática. O câncer ocupacional também é doença degenerativa, causada por agentes cancerígenos ocupacionais, alguns deles listados na NR-15. A própria surdez ocupacional é um processo degenerativo das células nervosas do órgão Corti. Provada a sua relação direta com a atividade laborativa, deve o processo degenerativo ser caracterizado como doença do trabalho.

1.2.3 Acidente do trabalho por equiparação

Além das lesões tipicamente produzidas durante o exercício

da atividade laboral, e das enfermidades que possuem no trabalho a sua causa

direta ou indireta, há também a possibilidade de ocorrência do que o legislador

denominou de “acidente por equiparação”, restando esta prevista no artigo 21 da

Lei nº. 8.213/91, que assim prescreve:

Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos dela Lei:

I - o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;

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II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em conseqüência de:

a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;

b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;

c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;

d) ato de pessoa privada do uso da razão;

e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;

III - a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;

IV - o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:

a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;

b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;

c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;

d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.

§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.

§ 2º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se

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associe ou se superponha às conseqüências do anterior.

Consoante prescreve Brandão [2006, p. 168], os acidentes

do trabalho por equiparação “são situações em que o infortúnio ocorreu por estar

indiretamente relacionado ao trabalho executado pela vítima”.

Para Monteiro e Bertagni [2005, p. 19], “são hipóteses que,

mesmo quando ocorrem no local e no horário de trabalho, não estão diretamente

relacionadas com a atividade profissional, apesar do vínculo causal indireto”.

Sustenta Oliveira [2007, 57], outrossim, que os acidentes do

trabalho por equiparação podem caracterizar-se, inclusive, por acidentes

ocorridos fora do local ou do horário de trabalho, mas que guardam vinculação

estreita com o cumprimento do contrato laboral.

Neste sentido, complementam Monteiro e Bertagni [2005, p.

19], que “quando o empregado estiver à disposição do empregador,

independentemente do local e dia, em horário de trabalho e no ambiente da

empresa, mesmo sem estar efetivamente trabalhando (períodos destinados às

refeições e a outras necessidades fisiológicas), verificando-se o acidente, este

assume a natureza de acidente do trabalho”.

Dentre as hipóteses de equiparação trazidas pelo dispositivo

supracitado, há de ser ressaltada a figura das concausas ou causas concorrentes

com o acidente do trabalho, equivalente àquelas possibilidades previstas no inciso

I daquele dispositivo.

Nos dizeres de Cavalieri Filho [2003, p. 84], “a concausa é

outra causa que, juntando-se à principal, concorre para o resultado. Ela não inicia

e nem interrompe o processo causal, apenas reforça, tal qual um rio menor

deságua em outro maior, aumentado-lhe o caudal”.

Segundo leciona Oliveira [2007, p. 52], “[…] para o acidente

do trabalho em sentido amplo, podem contribuir causas ligadas à atividade

profissional com outras extralaborais, sem qualquer vínculo com a função

exercida pelo empregado”.

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Afirma Oliveira [2007, p. 52], ainda, que mesmo que o

acidente já tenha ocorrido, este pode ser agravado por outra causa, como, por

exemplo, um erro cirúrgico no atendimento hospitalar ou a superveniência de uma

infecção por tétano, depois de um pequeno ferimento de um trabalhador rural.

Não se pode olvidar, entretanto, que a caracterização da

concausa não dispensa a existência de uma causa eficiente, que efetivamente

tenha contribuído diretamente para o acidente do trabalho ou situação

equiparável, ou seja, exige-se a demonstração da causa de origem ocupacional.

Desta forma, em que pese o reconhecimento das

concausas, faz-se necessário aferir se o trabalho realmente atuou como fator

contributivo do acidente ou doença ocupacional; se atuou como fator

desencadeante ou agravante de doenças preexistentes ou, ainda, se provocou a

precocidade de doenças comuns, mesmo daquelas de cunho degenerativo ou

inerente ao grupo etário.

Conforme ensina Brandão [2006, p. 170-171], as concausas

podem ser classificadas a partir do momento em que atuam contribuindo para a

ocorrência do dano à saúde do empregado, ou até mesmo à sua morte, devendo

estas, portanto, serem classificadas em:

a) anteriores, prévias ou predisponentes: são aquelas em que o trabalhador apresenta uma predisposição latente, que se evidencia, mais tarde, com o infortúnio. Ou seja, causas não relacionadas ao trabalho mas que, a ele associadas, produzem a lesão capaz de levá-lo à redução de sua capacidade laboral ou mesmo à sua morte; b) simultâneas ou concomitantes são aquelas em que os sintomas da enfermidade coincidem com o momento do acidente; c) supervenientes ou posteriores são as que surgem após a ocorrência do acidente, refletindo conseqüências que dele advêm; relacionam-se com o agravamento dos efeitos do acidente, não possuindo, contudo, correlação direta.

Para a sua caracterização, segundo Sousa [1964, p. 36],

“[…] é necessário que o acidente seja incapaz de produzir, de forma isolada, o

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dano (morte ou lesão) ao empregado e que as condições personalíssimas da

vítima se conjuguem à ação do infortúnio para determinar os efeitos danosos à

sua saúde”.

Observa-se que a concausa não provém de causa laboral,

ela tão-somente contribui na produção do resultado, e esse é um fato importante

para que não se confunda com a situação de existirem duas ou mais causas para

o acidente do trabalho ou doença ocupacional, mas, sim, de causas simultâneas

relacionadas ao trabalho, e que sobre estas haja o nexo etiológico direto.

Desta forma, as concausas podem ocorrer por fatores

preexistentes, supervenientes ou concomitantes com aquela causa que

desencadeou o acidente ou a doença ocupacional.

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Capítulo 2

DANOS DECORRENTES DO ACIDENTE DO TRABALHO

2.1 DANO MATERIAL

O acidente do trabalho ou as situações equiparáveis podem

provocar danos de natureza material, moral e ou estética. Cumpre perquirir neste

tópico, acerca da abrangência dos danos materiais, também denominados

hodiernamente de danos patrimoniais.

Na lição de Oliveira [2007, p. 200], “o dano material é o

prejuízo financeiro efetivo sofrido pela vítima, causando por conseqüência uma

diminuição do seu patrimônio, avaliável monetariamente”. Neste sentido,

complementa Theodoro Júnior [2003, p. 36], que “o dinheiro é a forma e o padrão

natural de dimensioná-lo e o instrumento idôneo para bem repará-lo”.

Segundo Diniz [2006, p. 70], para a definição do dano

patrimonial, deve-se partir do conceito de patrimônio, uma vez que o termo “dano

patrimonial” vincula a noção de lesão ao conceito de patrimônio. Para ela, “o

patrimônio é uma universalidade jurídica constituída pelo conjunto de bens de

uma pessoa, sendo, portanto, um dos atributos da personalidade, e como tal,

intangível”.

De acordo com Diniz [2006, p. 71], o dano patrimonial

constitui-se em uma lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio

da vítima, consistente na perda ou deterioração total ou parcial, dos bens

materiais que lhe pertencem, sendo, pois, suscetível de avaliação pecuniária e de

indenização pelo responsável.

Cairo Júnior [2005, p. 37] conceitua o dano material como “a

perda, destruição ou diminuição da utilidade de determinado bem ou interesse

juridicamente protegido, e que tenha conteúdo econômico”.

Em seu artigo 402 outrossim, o Código Civil vigente

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estabelece que o ressarcimento dos danos abrange parcelas de duas naturezas:

o que efetivamente o lesado perdeu e o que razoavelmente deixou de ganhar.

Segundo Oliveira [2007, p. 201], na apuração do que a

vítima perdeu, temos os chamados danos emergentes ou danos positivos, ao

passo que na avaliação do que deixou de ganhar estaremos diante dos lucros

cessantes ou danos negativos.

Complementam Gagliano e Pamplona Filho [2003, p. 45],

que o dano material ou patrimonial, compreende o dano emergente – aquele que

traduz o efetivo prejuízo sofrido pela vítima – e os lucros cessantes, os quais

correspondem àquilo que a vítima razoavelmente deixou de lucrar.

Como assevera Alvim apud Oliveira [2007, p. 201], “pode-se

dizer que o dano ora produz o efeito de diminuir o patrimônio do credor, ora o de

impedir-lhe o aumento, ou o acrescentamento, pela cessação de lucros, que

poderia esperar”.

No tocante à aferição do dano material, entende Diniz [2006,

p 71], que este deve ser mensurado pela diferença existente entre o valor atual do

patrimônio da vítima e aquele que teria, no mesmo momento, se não houvesse a

lesão. Conclui aquela autora, portanto, que o dano estabelece-se pelo confronto

entre o patrimônio realmente existente após o prejuízo e o que provavelmente

existiria se a lesão não tivesse sido produzida.

Em tempo, salienta Diniz [2006, p. 71], que o dano

patrimonial é avaliado em dinheiro e aferido pelo critério diferencial anteriormente

mencionado, contudo, as vezes, não se faz necessário tal cálculo, como na

hipótese de restituição ao “statu quo ante por meio de uma reconstituição natural”.

2.1.1 Dano emergente

Na lição de Oliveira [2007, p. 201], já tratando

especificamente dos danos relacionados aos acidentes de trabalho, constitui-se

como dano emergente:

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25

[...] aquele prejuízo imediato e mensurável que surge em razão do acidente do trabalho, causando uma diminuição no patrimônio do acidentado. É o prejuízo mais visível porque representa dispêndios necessários e concretos cujos valores são apuráveis nos próprios documentos de pagamento, tais como: despesas hospitalares, honorários médicos, medicamentos, aparelhos ortopédicos, sessões de fisioterapia, salários para acompanhantes no caso de a vítima necessitar de assistência permanente de outra pessoa ou, nos casos de óbito, os gastos com funeral, luto, jazigo, remoção do corpo etc.

Diniz [2006, p. 72] conceitua o dano emergente como sendo

também um dano positivo, consistente num déficit real e efetivo no patrimônio do

lesado, isto é, correspondente à uma concreta diminuição em seu patrimônio,

ressaltando a necessidade de que a vítima tenha, efetivamente, experimentado

um real prejuízo, já que não são passíveis de indenização os danos eventuais ou

potenciais, a não ser que sejam conseqüência necessária, certa, inevitável e

previsível da ação.

Tais prejuízos firmam-se no empobrecimento do patrimônio

atual do lesado pela destruição, deterioração, privação do uso e gozo que, em

razão da lesão, teve de realizar.

Neste sentido, esclarece Diniz [2006, p. 72], que a

condenação relativa ao dano emergente poderá processar-se de duas formas: “o

lesante será condenado a proceder à restauração do bem danificado ou a pagar o

valor das obras necessárias a essa reparação”.

Os artigos 948 a 950 do Código Civil vigente mencionam as

despesas de tratamento até a cessação da enfermidade, ou os desembolsos com

o funeral e o luto da família, mas asseguram que também são indenizáveis outras

reparações ou prejuízos que o ofendido prove haver sofrido.

Assim, cabe à vítima relacionar, para fins de ressarcimento,

qualquer outra despesa efetiva que o acidente tenha causado, até porque, como

visto, o propósito da indenização está centrada na recomposição do patrimônio do

acidentado ao mesmo patamar existente antes do acidente.

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26

Convém observar, portanto, que a indenização relativa ao

dano emergente consiste em reparar o patrimônio do lesado no estado em que

anteriormente se encontrava, seja através da reparação pelo próprio lesante, ou

pelo pagamento feito por este objetivando angariar as medidas necessárias para

a reparação.

2.1.2 Lucros cessantes

Também hodiernamente tratado pela doutrina como dano

negativo ou frustrado, os lucros cessantes consistem, nos dizeres de Oliveira

[2007, p. 202], na privação de um ganho futuro pelo lesado, no lucro que ele

deixou de auferir, em razão do prejuízo que lhe foi ocasionado.

Sustenta Diniz [2006, p. 73], que para se computar o lucro

cessante, a mera possibilidade é insuficiente, embora não se exija uma certeza

absoluta, de forma que o critério mais acertado estaria em condicioná-lo a uma

probabilidade objetiva, resultante do desenvolvimento normal dos

acontecimentos, conjugado às circunstâncias peculiares do caso concreto.

Neste sentido, pondera Alvim apud Gagliano e Pamplona

Filho [2004, p. 46], ser “[...] possível estabelecer, com precisão, o desfalque do

nosso patrimônio, sem que as indagações se perturbem por penetrar no terreno

hipotético. Mas, com relação ao lucro cessante, o mesmo já não se dá”.

Diz o mesmo autor [2004, p.46], ao tratar do Código Civil de

1916, que:

Finalmente, e com o intuito de assinalar, com a possível precisão, o significado do termo razoavelmente empregado no art. 1.059 do Código, diremos que ele não significa que se pagará aquilo que for razoável (idéia quantitativa) e sim que se pagará se se puder, razoavelmente, admitir que houve lucro cessante (idéia que se prende à existência de prejuízo). Ele contém uma restrição, que serve para nortear o juiz acerca da prova do prejuízo em sua existência, e não em sua quantidade. Mesmo porque, admitida a existência do prejuízo (lucro cessante), a indenização não se pautará pelo razoável, e sim pelo provado.

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27

No mesmo norte, sustenta Oliveira [2007, p. 201] que “o

critério de razoabilidade expresso na lei indica que a apuração deverá ser

norteada pelo bom senso e pela expectativa daquilo que ordinariamente

acontece”.

Segue afirmando que “com apoio nessa diretriz, é razoável

prever que o acidentado continuaria no emprego, recebendo os seus salários

normais com as devidas correções alcançadas pela categoria profissional”.

De acordo com Oliveira [2007, p. 201], poderia presumir-se

que o empregado viesse a ser promovido recebendo salários mais elevados, mas

também seria possível imaginar que poderia ficar desempregado ou ser vítima de

alguma qualquer outra enfermidade. Afirma, assim, que “para fugir dessas

cogitações que estão no mundo do imponderável, deve o intérprete procurar

sustentação em dados mais concretos e dentro da razoabilidade”.

Pontua Alvim apud Oliveira [2007, p. 202], outrossim, que

deve ser admitido que “o credor haveria de lucrar aquilo que o bom senso diz que

lucraria. Há aí uma presunção de que os fatos se desenrolariam dentro do seu

curso normal, tendo-se em vista os antecedentes”.

Dentro destes fundamentos, muito bem exemplifica Oliveira

[2007, p. 202], que, assim, se uma empresa tiver um plano de cargos e salários

prevendo promoção automática por antigüidade, o valor da indenização deverá

considerar tal hipótese, diante da razoável certeza do fato.

Convém anotar, que em se tratando de acidente de trabalho,

passados os primeiros quinze dias de afastamento, o empregado ficará privado

dos salários e demais vantagens que regularmente percebia em razão do

exercício de sua atividade, configurando-se, neste aspecto, um exemplo clássico

de lucros cessantes, posto que ainda que haja a percepção de qualquer dos

benefícios acidentários pagos pela Previdência Social, estes não servem para

repor ou mesmo compensar os lucros cessantes.

Ademais, levando-se em consideração as disposições dos

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artigos 948 e 949 do Código Civil, que preceituam a possibilidade de indenização

de outras reparações ou prejuízos que o ofendido prove haver sofrido, tem-se a

possibilidade da vítima exercer, concomitantemente, uma outra atividade

profissional e, em razão do acidente, ficar impedida de auferir, também, os

rendimentos advindos desta segunda atividade, restando caracterizado, portanto,

o prejuízo havido, devendo ser demonstrado, entretanto, que os danos têm

relação de causalidade direta e imediata com o infortúnio laboral, a teor do que

prescreve o artigo 403 do Código Civil.

Tais fundamentos evidenciam que, assim como o dano

emergente, os lucros cessantes devem ser exaustivamente comprovados na

pretensão indenizatória, visando impedir, como bem anotam Gagliano e

Pamplona Filho [2003, p. 47], o desenfreado crescimento da “indústria da

indenização”, com a qual vítimas menos escrupulosas, tenham êxito em pleitos

absurdos, sem qualquer fundamento real, buscando não o ressarcimento, mas a

obtenção de lucro abusivo.

Convém anotar, por fim, a recomendação de Cavalieri Filho

[2004 p. 98], ao sustentar que para a constatação dos lucros cessantes, “deve o

juiz mentalmente eliminar o ato ilícito e indagar se aquilo que está sendo pleiteado

a título de lucro cessante seria a conseqüência do normal desenrolar dos fatos; se

aquele lucro poderia ser razoavelmente esperado, caso não tivesse ocorrido o ato

ilícito”.

2.2 DANO MORAL

Quando se trata de indenização, o primeiro pensamento que

surge está relacionado a efeitos patrimoniais, isto é, aqueles mensuráveis

economicamente.

Entretanto, com o avanço da civilização e a crescente

preocupação com a dignidade humana, não se pode mais ignorar o abalo moral

provado por um ato ilícito, já que, em muitos casos, este tem maior relevância do

que o próprio prejuízo material suportado.

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Cumpre lembrar, que o desenvolvimento do dano moral

sofreu forte resistência no Brasil. Com efeito, afirma Oliveira [2007, p. 205], que

havia muito mais resistência quanto à sua aplicação, do que fundamento jurídico

para negar este direito, porquanto o artigo 159 do Código Civil de 1916 já

estabelecia a obrigação de reparar o dano, sem distinguir prejuízo material e

moral. Além disso, o artigo 76 do mesmo diploma legal prescrevia que “para

propor uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral”.

Em verdade, tal resistência restou mantida até o advento da

Constituição Federal de 1988, quando em seu artigo 5º, X, passou a assegurar

que:

[...]

X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

[...]

Como asseveram Abreu e Zimmermann [2004, p. 31], tal

dispositivo refere-se à “ofensa a direitos de personalidade, tais como a honra

(reputação social), a imagem (figura humana), a integridade física e psíquica e a

liberdade”.

O Código Civil de 2002, por sua vez, contempla

expressamente o dano moral ao prever em seu artigo 186, que:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Segundo Oliveira [2007, p. 205], “esse dispositivo genérico

completa o ciclo de positivação do dano moral em nosso ordenamento jurídico,

suplantando de vez os argumentos daqueles que ainda resistiam ao seu

reconhecimento”.

Para Diniz [2006, p. 93], “o dano moral vem a ser a lesão de

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interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato

lesivo”.

Discorre Diniz [2006, p. 93] que:

Qualquer lesão que alguém sofra no objeto de seu direito repercutirá, necessariamente, em seu interesse; por isso, quando se distingue o dano patrimonial do moral, o critério da distinção não poderá ater-se à natureza ou índole do direito subjetivo atingido, mas ao interesse, que é pressuposto desse direito, ou ao efeito da lesão jurídica, isto é, ao caráter de sua repercussão sobre o lesado, pois somente desse modo se poderia falar em dano patrimonial indireto, que decorre de evento que lesa direito extrapatrimonial [...].

Diante de tais fundamentos, conclui Diniz [2006, p. 94] pela

existência de duas espécies de dano moral: o direto e o indireto. Segundo ela, o

dano direto “consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de

um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (como a

vida, a integridade corporal e psíquica, a liberdade, a honra, o decoro, a

intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem), ou nos atributos da

pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família)”.

O dano moral indireto, outrossim, “é aquele que provoca

prejuízo a qualquer interesse não patrimonial, devido a uma lesão a um bem

patrimonial da vítima. Deriva, portanto, do fato lesivo a um interesse patrimonial”.

Ao abordar acerca dos padrões de moralidade, e bem

assim, das hipóteses de cabimento do dano moral, pondera Reis [1994, p. 136]

que “se o Direito busca sempre a entronização do justo, é natural que as normas

jurídicas, sintonizadas com a dinâmica da vida, absorvam aquilo que a

consciência já elegeu como normal, ou que repudia como intolerável”.

Assim, como todo ato ilícito, o acidente do trabalho por culpa

ou dolo do empregador pode vir a provocar danos materiais e morais, ou seja,

danos patrimoniais e extrapatrimoniais.

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Sobre este enfoque, sustenta Oliveira [2007, p. 207], que

torna-se inegável que os acidentes de trabalho e as doenças ocupacionais que

geram a morte ou invalidez repercutem inevitavelmente na vida da vítima e ou de

sua família.

Segundo Oliveira [2007, p. 207], o acidente de trabalho

freqüentemente representa o “desmonte traumático de um projeto de vida, a

‘prisão’ compulsória numa cadeira de rodas, o isolamento da vida em sociedade

ou o desamparo da orfandade”.

Neste sentido, pondera Brandão [2006, p. 136] que:

A partir da compreensão de que a saúde está relacionada ao equilíbrio do homem com o ambiente e vinculada à sua integridade psicofísica, fácil é concluir pela possibilidade de existência de danos morais em virtude do acidente do trabalho. Isso porque, diante da lesão sofrida, o empregado tem atingido o seu patrimônio pessoal, cujos limites ultrapassam os aspectos físicos e psíquicos, produzindo reflexos nas esferas afetiva, familiar, intelectual, ética e até mesmo social, principalmente quando o período de convalescença é prolongado ou dele resultam seqüelas de natureza permanente.

Neste mesmo enfoque, ensina Oliveira [2007, p. 208], que o

arbitramento do dano moral não visa estabelecer um preço para a dor sofrida pela

vítima, mas sim criar possibilidades para que esta possa desenvolver novas

atividades ou entretenimentos, buscando vencer as recordações dolorosas e

superar a dor.

Seguindo esta mesma diretriz, assevera Pereira [2002, p.

317-318] que:

Na reparação por dano moral estão conjugados dois motivos ou duas concausas: I) punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II) pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material.

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Diante de tais ponderações, chega-se a ilação de que a

condenação do infrator em danos morais, não requer tão-somente que este pague

um valor indenizatório à vítima, buscando apenas reparar o abalo sofrido, mas

também possibilitar que, com esta indenização, a vítima possa superar tal dano

da forma que melhor lhe convier, seja com a realização de uma atividade de lazer,

seja com a aquisição de um bem material, etc, cabendo ao órgão julgador

ponderar tais circunstâncias aliadas às particularidades do caso concreto,

conforme, aliás, já restou manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça em um de

seus julgados, cujo excerto convém transcrever:

A indenização, em caso de danos morais, não visa reparar, no sentido literal, a dor, a alegria, a honra, a tristeza ou a humilhação; são valores inestimáveis, mas isso não impede que seja precisado um valor compensatório, que amenize o respectivo dano, com base em alguns elementos como a gravidade objetiva do dano, a personalidade da vítima, sua situação familiar e social, a gravidade da falta, ou mesmo a condição econômica das partes.1

Em idêntico posicionamento, esclarece Diniz [2006, p. 97]

que “o lesado pode pleitear uma indenização pecuniária em razão de dano moral,

sem pedir um preço para sua dor, mas um lenitivo que atenue, em parte, as

conseqüências do prejuízo sofrido, melhorando seu futuro, superando o déficit

acarretado pelo dano”.

2.2.1 Cumulação com o dano material

Assim como a própria aceitação do dano moral no

ordenamento jurídico pátrio, mesmo após o advento da Constituição Federal de

1988, a sua cumulação com o dano material surtiu muita controvérsia.

Neste aspecto, tanto quanto na receptibilidade do dano

moral, os argumentos que vinham contra a sua cumulação com o dano material

1 STJ - AC nº. 38.191-7, 1ª Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Paraná, Relator Juiz Celso

Araújo Guimarães, DJ 10/09/2003.

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eram claramente desprovidos de embasamento lógico e até mesmo jurídico,

posto que, apesar de terem origem no mesmo fato ou ato ilícito, são danos

distintos, com efeitos diversos, razão por que merecem indenizações separadas.

Toda a divergência doutrinária e jurisprudencial, entretanto,

restou pacificada com a edição da Súmula nº. 37 do Superior Tribunal de Justiça,

a qual passou a determinar que:

São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato.

O Código Civil de 2002, outrossim, em seus artigos 948 e

949, caput, relacionou os danos materiais provenientes de atos ilícitos, deixando

margem para a condenação do dano moral ao assegurar que a necessidade de

reparação de outros prejuízos que o ofendido prove haver sofrido.

Neste contexto, conclui Oliveira [2007, p. 209-210], que não

restam dúvidas de que a condenação por dano moral cumulada com o dano

material tenha inteira pertinência nas hipóteses de acidentes do trabalho ou

doenças ocupacionais, causados por dolo ou culpa do empregador, de modo que

assim, aliás, estar-se-á despertando no empregador negligente uma maior

preocupação com a vida e com a saúde dos trabalhadores, já que aqueles

sentirão economicamente tais reflexos.

2.2.2 Critérios de arbitramento

Não obstante toda a dificuldade para a sua constatação, um

dos grandes desafios da ciência jurídica é também a determinação dos critérios

para a quantificação do dano moral, isto é, a fixação do valor da indenização.

Segundo Diniz [2006, p. 101], o arbitramento do dano moral

“é o exame pericial tendo em vista determinar o valor do bem, ou da obrigação a

ele ligado [...], baseado em critérios subjetivos (posição social ou política do

ofendido, intensidade do ânimo de ofender: culpa ou dolo) ou objetivos (situação

econômica do ofensor, risco criado, gravidade e repercussão da ofensa)”.

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De acordo com Diniz [2006, p. 101], a legislação pátria é

omissa quanto ao “estabelecimento do justo montante indenizatório”, de modo

que assim, deve-se buscar todo elemento possível para encontrar, no caso

concreto, o valor que lhe for mais apropriado. Sustenta ela, que em razão da

omissão legislativa, o órgão judicante deve determinar o dano moral por

eqüidade, levando em consideração as circunstâncias de cada caso, de forma

que o valor da indenização corresponda à lesão e não seja à ela equivalente, por

ser impossível tal equivalência.

Se para alguns a fixação da indenização por danos morais

vem a facilitar a atividade judicante, para outros, estar-se-ia retirando dos órgãos

julgadores a liberdade de aplicá-la – eqüitativamente – levando em consideração

as particularidades do caso concreto.

Para Oliveira [2007, p. 213], inclusive, possibilitar que o

arbitramento seja feito pelo Judiciário, permite ao órgão julgador fixar com mais

precisão e liberdade a justa indenização, “[...] sem as amarras normativas

padronizadas, de modo a poder dosar, após análise eqüitativa, o valor da

condenação com as tintas específicas do caso concreto”.

Neste norte, é também o posicionamento adotado por

Pamplona Filho [1999, p. 139], quando afirma que “é preciso, sem sombra de

dúvida, que o magistrado, enquanto órgão jurisdicional, não fique com seu

raciocínio limitado à busca de um parâmetro objetivo definitivo (que não existe,

nem nunca existirá) para todo e qualquer caso, como se as relações humanas

pudessem ser solucionadas como simples contas matemáticas”.

Em verdade, a tendência queda-se para que não seja fixado

qualquer parâmetro para a valoração do dano moral, como, aliás, já aconteceu

em relação aos casos previstos na Lei de Imprensa, após a edição da Súmula nº.

281 do Superior Tribunal de Justiça, que assim prescreve:

A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa.

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De acordo com Noronha apud Oliveira [2007, p. 214]:

A reparação de todos os danos que não sejam suscetíveis de avaliação pecuniária obedece em regra ao princípio da satisfação compensatória: o quantitativo pecuniário a ser atribuído ao lesado nunca poderá ser equivalente a um ‘preço’, será o valor necessário para lhe proporcionar um lenitivo para o sofrimento infligido, ou uma compensação pela ofensa à vida ou à integridade física”.

Para Abreu e Zimmermann [2004, p. 34], outrossim, a

condenação ao dano moral, decorrente do acidente de trabalho:

[...] baseia-se no grau de sofrimento intrínseco do trabalhador ou de seus familiares. Não há parâmetro objetivamente construído para a sua avaliação. Ela deve levar em consideração a extensão do dano – repercussão em relação ao ofendido e a seu meio social -, o grau de dolo e de culpa do lesante, a duração da ofensa e as condições econômicas de ambas as partes, sem, contudo, levar ao enriquecimento sem causa do trabalhador.

Para Pereira [2002, p. 60], a vítima “deve receber uma soma

que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às

circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação

pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de

enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva”.

Neste sentido, tem sido também o entendimento adotado

pelos tribunais pátrios, consoante extrai-se da ementa a seguir transcrita:

DANO MORAL – FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO – A quantificação do dano moral deve atender às necessidades do ofendido e aos recursos do ofensor, de modo a não ser o valor da indenização demasiado alto para acarretar um enriquecimento sem causa àquele que o recebe, nem tão insignificante a ponto de ser inexpressivo para quem o paga. Deve-se considerar, invariavelmente, a intensidade, a gravidade, a natureza e os reflexos do sofrimento experimentado, bem como a repercussão

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de caráter pedagógico que a pena imposta trará ao ofensor.2

Em semelhante ensinamento, prescreve Monteiro apud

Pamplona Filho [1999, p. 138], que “inexiste, de fato, qualquer elemento que

permita equacionar com rigorosa exatidão o dano moral, fixando-o numa soma

em dinheiro. Mas será sempre possível arbitrar um quantum, maior ou menor,

tendo em vista o grau de culpa e a condição social do ofendido”.

Diante destas ponderações, conclui Oliveira [2007, p. 217],

que sabiamente o legislador não adotou parâmetros ou limites para a aferição do

dano moral, deixando ao prudente arbítrio do juiz a sua fixação, em razão das

múltiplas especificidades de cada caso.

Ressalva Oliveira [2007, p. 217-218], entretanto, que alguns

pressupostos já assentados pela doutrina e pela jurisprudência devem nortear a

dosimetria da indenização, tais como, o grau de culpa do empregador, a

gravidade dos efeitos do acidente ou doença ocupacional, a situação econômica

das partes, dentre outros atinentes às peculiaridades do caso concreto.

Além disso, como já evidenciado pelos fundamentos

anteriormente transcritos, o valor arbitrado a título de danos morais, deve levar

em consideração, também, a sua finalidade pedagógica, isto é, demonstrar para o

infrator e para a sociedade a punição exemplar para aquele que desrespeitou as

regras básicas da convivência humana.

2.3 DANO ESTÉTICO

Além das indenizações por dano material e moral, pode ser

cabível também a indenização por dano estético, quando a lesão decorrente do

acidente de trabalho compromete ou pelo menos altera a harmonia física da

vítima.

2 TRT 12ª Região – AC nº. 06654/2003, Relator Juiz Gilmar Cavalhieri, DJ 10/07/2003.

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Para Diniz [2006, p. 84], o dano estético:

[...] é toda alteração morfológica do indivíduo, que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre a sua capacidade laborativa.

Lopez [1999, p. 38] situa o dano estético no plano da

sensibilidade moral. Para ela, “[...] trata-se do sentimento de constrangimento ou

de humilhação e desgosto que prova uma pessoa vendo certas feridas ou de uma

maneira mais geral, certas lesões corporais que prejudicam a estética do corpo e

sobretudo a harmonia dos traços”. Conclui, assim, ser o dano estético “um

sentimento de desgraça física”.

De acordo com Lopez [1999, p. 39], há uma grande

diferenciação entre o tratamento atribuído ao dano estético na esfera penal e civil.

Segundo ela, no campo do Direito Penal, só há a configuração do dano estético

quando as lesões atingem grandes proporções, isto é, as lesões estéticas devem

ser graves para que sejam consideradas criminalmente.

Na esfera do Direito Civil, entretanto, discorre Lopez [1999,

p. 38-39] que basta a pessoa ter sofrido uma transformação, não tendo mais a

aparência que tinha, desequilibrando o passado e o presente, para que seja

configurado o dano estético e, portanto, possa exigir-se a sua indenização.

Neste sentido, é também o posicionamento adotado por

Brandão [2006, p. 142], quando afirma que, para a configuração do dano estético,

basta a pessoa ter sofrido uma transformação que modifique a sua aparência

anterior, provocando um desequilíbrio entre o passado e o presente, numa

mudança para pior, ressaltando, todavia, que só haverá tal configuração, quando

a dano resultar em uma transformação física para pior, alterando a aparência e o

bem-estar da pessoa lesada, de modo que a comparação estética seja feita em

função da forma anterior da vítima, e não ao estereótipo de beleza.

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Aliada à mencionada comparação estética da vítima,

ressalva Lopez [1999, p. 40], que a configuração do dano estético pressupõe,

também, que a lesão praticada seja duradoura, caso contrário não há falar em

dano estético propriamente dito, “[...] mas em atentado reparável à integridade

física ou lesão estética passageira que se resolve em perdas e danos habituais”.

Semelhante sustentação é a fornecida por Stoco [2004, p.

1657], ao afirmar que a transformação física deve ser definitiva, pois “[...] o dano

estético reparável converte-se em dano material, se a alteração na imagem da

pessoa puder ser corrigida, diante do notável avanço da Medicina”.

Em ponderação evidentemente contrária, sustenta Pereira

apud Brandão [2006, p. 142], ser inaceitável impor que a vítima submeta-se à

cirurgia, posto que tal prática equivaleria constranger alguém a exercer uma

escolha altamente subjetiva, de forma que, segundo ele, “[...] caberá sempre ao

ofendido optar diante da alternativa de uma intervenção cirúrgica corretiva de

dano estético ou da indenização em moeda corrente; optando pela primeira

hipótese, restando ainda seqüela estética, cabe ainda a indenização, pois o dano

não foi totalmente satisfeito”.

Sustenta Diniz [2006, p. 87], no mesmo norte, que “[...] não

se pode obrigar a vítima a se submeter a qualquer intervenção cirúrgica, mesmo

com o objetivo de reparar dano estético, expondo-se aos riscos anestésicos para

beneficiar o lesante”.

Não se faz necessário, todavia, que a lesão estética sofrida

seja visível, permanentemente, para caracterizar o dano. Como bem menciona

Lopez [1999, p. 43], “não é necessário que a lesão deformante apareça, seja

visível a toda hora, basta que ela exista no corpo, mesmo em suas partes mais

íntimas”.

Assim, esclarece Brandão [2006, p. 141], que admite-se a

configuração do dano estético mesmo quando o dano se refere à intimidade do

ofendido, como ocorre nas relações matrimoniais, posto que a aparência não é

mais a mesma, logo, “[...] o que era agradável aos olhos do cônjuge ou ao próprio

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39

ego não pode ser mais”.

2.3.1 Cumulação com o dano moral

Como bem anota Oliveira [2007, p. 220], ainda que

reconhecido o instituto do dano moral com o advento da Constituição Federal de

1988, durante algum tempo, predominou o entendimento de que a indenização

deste dano, em razão de sua amplitude, já abrangia o dano estético.

Ressalta Oliveira [2007, p. 220], inclusive, que no IX

Encontro de Tribunais de Alçada, realizado em São Paulo no ano de 1997,

adotou-se, por unanimidade, o entendimento de que “o dano moral e o dano

estético não se cumulam, porque ou o dano estético importa em dano material ou

está compreendido no dano moral”.

Para Diniz [2006, p. 84], entretanto, “[...] o dano estético

estaria compreendido no dano psíquico ou moral, de modo que, em regra, se

pode ter como cumuláveis a indenização por dano estético e a indenização por

dano moral [...]”.

Segundo Lopez [1999, p. 44], o dano estético acarreta um

dano moral, posto que a situação proporciona na vítima humilhações, tristezas,

desgostos, constrangimentos, de forma a sentir-se diferente do que era,

consagrando-se, pois, num sofrimento moral.

De acordo com Oliveira [2007, p. 220], os artigos 948 e 949

do Código Civil vigente deixam espaço indiscutível para a inclusão do dano

estético, sustentando, neste sentido, que o dano estético está relacionado ao

sofrimento pela deformação com seqüelas permanentes, ao passo que o dano

moral está ligado ao sofrimento e todas as demais conseqüências provadas pelo

dano, explicando, neste sentido, que “[...] o acidente do trabalho que acarrete

alguma deformação morfológica permanente gera o dano moral cumulado com o

dano estético, ou apenas o primeiro, quando não ficar qualquer seqüela”.

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Conclui Oliveira [2007, p. 220], portanto, que “o acidentado

que sofreu qualquer deformação deve receber uma indenização por danos morais

agravada, cuja agravante (dano estético) deve ser calculada separadamente”.

O entendimento jurisprudencial dominante tem admitido a

possibilidade de cumulação do dano moral e estético, desde que esses danos

forem passíveis de apuração em separado, devendo a decisão indicar os motivos

de um e outro deferimento, consoante colhe-se dos julgados a seguir

colacionados:

ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA DO EMPREGADOR. DEMONSTRAÇÃO DO DANO MORAL. CUMULAÇÃO COM DANO ESTÉTICO. I - É dever do empregador zelar pela segurança de seus empregados. Portanto, demonstradas sua negligência na manutenção das ferramentas de trabalho e a ausência de investimento na criação de dispositivos capazes de evitar lesões à integridade física e psíquica do prestador de serviços, há que se reconhecer a responsabilidade de reparar o dano. II - A prova do dano moral é sempre indireta, porquanto impossível a demonstração do prejuízo imaterial experimentado pela vítima. Sob este aspecto, basta à constituição da obrigação de indenizar a comprovação das circunstâncias capazes de fazer presumir o abalo moral alegado. III - São cumuláveis as indenizações por prejuízos morais e estéticos, em virtude da autonomia de seus fundamentos. Enquanto o dano moral decorre do sofrimento causado à vítima, o dano estético caracteriza-se pelas cicatrizes, marcas, defeitos e deformidades permanentes deixados pelas lesões ou, ainda, pela limitação de movimentos”.3

Acidente de trabalho. Danos morais e estéticos. Cumulação. Os danos estéticos devem ser indenizados independentemente do ressarcimento dos danos morais, sempre que tiverem causa autônoma. Recurso especial não conhecido.4

3 TRT 12ª Região - Acórdão nº. 9843/2007, Relatora Juíza Ligia M. Teixeira Gouvêa, Publicado no

DJ em 12-07-2007 4 STJ – Resp nº. 217.777, 3ª Turma, Relator Ministro Ari Pargendler, publicado no DJ em 04-

12.2006.

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Ressalva Diniz [2006, p. 85], todavia, “[...] que nem sempre

há cumulatividade do dano estético com o moral [...]”. Esclarece a mencionada

autora, que há algumas lesões que não deformam fisicamente a vítima, mas

afetam o seu psíquico; e outras que atingem o aspecto estético do lesado, mas há

a superação deste sem que haja repercussão psíquica.

Discorre Diniz [2006, p. 85], que a lesão estética, em regra,

constitui um dano moral, que poderá ou não constituir um prejuízo patrimonial,

sustentando, neste sentido, que “pode haver deformidade e não haver redução da

capacidade de trabalho da vítima ou prejuízo patrimonial”.

Conclui Diniz [2006, p. 85], por fim, inexistir um “[...] critério

aritmético para estimar a diminuição estética [...]”, de modo que o dano moral em

decorrência do dano estético, será maior ou menos extenso conforme o sexo,

idade, condição social do lesado etc.

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42

Capítulo 3

PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

3.1 NOÇÕES PRELIMINARES ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL

O vocábulo “responsabilidade”, segundo bem anota Diniz

[2006, p. 39], é oriundo do verbo latino “respondere”, designando o fato de ter

alguém se constituído garantidor de algo. Tal termo contém, portanto, a raiz latina

“spondeo”, fórmula pela qual se vinculava, no direito romano, o devedor nos

contratos verbais.

Para Diniz [2006, p. 40], “a responsabilidade civil é a

aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou

patrimonial causado à terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por

pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples

imposição legal”.

A noção de responsabilidade civil, na expressão de Dias

[1995, p. 3], significa “[...] a situação de quem, tendo violado uma norma qualquer,

se vê exposto às conseqüências desagradáveis decorrentes dessa violação,

traduzidas em medidas que a autoridade encarregada de velar pela observação

do preceito lhe imponha, providências essas que podem, ou não, estar previstas”.

Deve ser observada, entretanto, a necessidade de

existência de um dano suportado pela vítima, visto que a sua causa geradora é

efetivamente restabelecer o equilíbrio jurídico-econômico.

Neste sentido, afirma Sampaio [2003, p. 62], que a

responsabilidade possui como finalidade a recomposição do patrimônio jurídico

lesado de alguém.

Para Cavalieri Filho [2004, p. 24], a responsabilidade civil

expressa a idéia de reparação do dano causado em virtude da violação de um

outro dever jurídico, e a resume como “um dever jurídico que surge para

recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário”.

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Na visão de Stoco [2004, p. 120], a expressão

responsabilidade civil “traduz a obrigação da pessoa física ou jurídica ofensora de

reparar o dano causado por conduta que viola um dever jurídico preexistente de

não lesionar implícito ou expresso em lei”.

Desta forma, conclui Brandão [2006, p. 206], que a

responsabilidade civil caracteriza-se como “a obrigação, genericamente

considerada, atribuída a toda pessoa, física ou jurídica, de reparar o dano

causado, em virtude de sua ação ou omissão, caracterizadora da violação de um

dever jurídico preexistente”.

3.2 PRESSUPOSTOS

Ao ingressarmos no estudo da responsabilidade civil,

cumpre observarmos os pressupostos que a compõem, ou seja, os seus

elementos formadores, os quais, a teor do que prescreve o artigo 186 do Código

Civil, constituem-se em: ação (comissiva ou omissiva), culpa, dano, e nexo de

causalidade.

3.2.1 Ação

Como bem leciona Diniz [2006, p. 43], a ação, enquanto

elemento constitutivo da responsabilidade “[...] vem a ser o ato humano,

comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do

próprio agente ou de terceiro, [...] que cause dano a outrem, gerando o dever de

satisfazer os direitos do lesado”.

Em suas lições, Stoco [2004, p.13] infirma que “o elemento

primário de todo ilícito é uma conduta humana e voluntária do mundo exterior”, de

forma que “não há responsabilidade civil sem determinado comportamento

humano contrário à ordem jurídica”.

Para Cairo Júnior [2005, p. 34] “a responsabilidade civil

requer, necessariamente, a ação ou omissão do ser humano livre, por meio de um

ato próprio, de um terceiro a ele vinculado ou mesmo pelo fato da coisa de que é

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proprietário ou possuidor”.

Sustenta Cairo Júnior [2005, p. 35], ainda, que “a

responsabilidade civil pode surgir de um ato positivo, [...] considerando que a

ordem jurídica impõe o dever geral de não prejudicar a outrem, ou de uma

omissão, ou seja, do não-cumprimento de uma obrigação quando tinha o dever

legal ou contratual de fazê-lo”.

Já Diniz [2006, p. 42] enfatiza que a responsabilidade civil

não advém tão-somente da conduta humana comissiva ou omissiva contrária à

lei, pois segundo ela “há atos que, embora não violem a norma jurídica, atingem o

fim social a que ela se dirige, caso em que se têm atos praticados com abuso de

direito, e, se tais atos prejudicarem alguém, ter-se-á o dever ressarcitório”.

Como exemplo, Diniz [2006, p. 42] traz à lume a questão

tratada no presente estudo, ou seja, a responsabilidade civil do empregador no

acidente de trabalho, quando afirma que “o patrão é obrigado a indenizar o

acidente de trabalho sofrido pelo empregado, se tiver concorrido culposa ou

dolosamente para sua produção, sem que se possa dizer, com certeza, que

praticou ato ilícito”.

Conclui Diniz [2006, p. 42], ao final, que “[...] a obrigação de

indenizar o dano causado a outrem pode advir de determinação legal, sem que a

pessoa obrigada a repará-lo tenha cometido qualquer ato ilícito”.

3.2.2. Culpa

Ao tratar-se da responsabilidade civil, torna-se fundamental

também o estudo da culpabilidade, instituto este que, segundo trata Diniz [2006,

p. 46], representa a violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em

decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela.

Conforme pondera Cairo Júnior [2005, p. 35], a culpa

compreende duas modalidades: a culpa em sentido lato, a qual abrange o dolo; e

a culpa em sentido estrito, na qual encontra-se o elemento objetivo, consagrado

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em um dever ou obrigação preexistente; e o elemento subjetivo, manifestado pelo

aspecto psicológico do agente.

Neste sentido, entende Stoco [2004, p. 132] que “a culpa em

sentido estrito traduz o comportamento equivocado da pessoa, despida da

intenção de lesar ou violar direito, mas da qual se poderia exigir comportamento

diverso, posto que erro inescusável ou sem justificativa plausível e evitável para o

homus medius”.

Traz Stoco [2004, p. 132], ainda, que “a culpa pode

empenhar ação ou omissão e revela-se através da imprudência: comportamento

açodado, precipitado, apressado, exagerado ou excessivo; negligência: quando o

agente se omite deixa de agir quando deveria fazê-lo e deixa de observar regras

subministradas pelo bom senso, que recomendam cuidado, atenção e zelo; e

imperícia: atuação profissional sem o necessário conhecimento técnico ou

científico que desqualifica o resultado e conduz o dano”.

Em consonante sentido, entende Diniz [2006, p. 46] que a

culpa, em sentido estrito, caracteriza-se pela imperícia, imprudência ou

negligência, sem que haja a deliberação de violar um dever, de forma de que o

evento danoso não é querido pelo agente, mas ainda assim recairá sobre este a

responsabilidade pelo fato de não ter tomado cautela sobre o seu ato, nem

tampouco medido as suas conseqüências.

Há, ainda, boa parte da doutrina que classifica a graduação

da culpa em grave, leve e levíssima, consoante expõe Venosa [2003, p. 30].

Assim, segundo esta corrente doutrinária, a culpa grave é aquela que se aproxima

do dolo, porquanto manifestada de forma grosseira. A culpa leve é caracterizada

pela infração a um dever de conduta inerente ao homem médio; e, por fim, a

culpa levíssima é consagrada como aquela decorrente da falta de atenção, a qual

somente uma pessoa muito atenta poderia manifestar.

Sob o mesmo enfoque, entretanto, com maior clareza, traz

Diniz [2006, p. 48] que “a culpa será grave quando, dolosamente, houver

negligência extrema do agente, não prevendo aquilo que é previsível ao comum

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dos homens. A leve ocorrerá quando a lesão de direito puder ser evitada com

atenção ordinária, ou adoção de diligências próprias de um bonus pater familias.

Será levíssima, se a falta for evitável por uma atenção extraordinária, ou especial

habilidade e conhecimento singular”.

Em tempo, acrescenta Venosa [2003, p. 30] que “[…] em

regra, não é a intensidade da culpa que gradua o dano, mas o efetivo valor do

prejuízo”.

No mesmo norte, acrescenta Cairo Júnior [2005, p. 35-36],

que “o legislador nacional, seguindo a máxima in lege aquiliana et levissíma culpa

venit, em geral, não fez qualquer distinção entre os diversos graus de culpa, tanto

para a fixação da responsabilidade quanto para a determinação do quantum

debeatur da indenização”.

Convém salientar, no entanto, a observação feita por Stoco

[2004, p.136], quando afirma que o Código Civil vigente trouxe novamente os

graus de culpa para a fixação do quantum a ser reparado, consoante depreende-

se da redação do artigo 944, parágrafo único, do mencionado diploma legal:

[...]

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.

Desta forma, segundo assevera Diniz [2006, p. 48], tal

dispositivo, acertadamente, autoriza o magistrado a decidir por eqüidade, em

casos de culpa leve ou levíssima, conseqüentemente, “[…] se o agente agiu com

culpa leve ou levíssima, causando grande prejuízo à vítima, o magistrado, em

caso de responsabilidade civil subjetiva, poderá reduzir o quantum indenizatório

ao patamar que entender mais justo”.

Quanto ao conteúdo da conduta culposa, cumpre observar-

se que esta divide-se em: culpa in committendo, in omittendo, in eligendo, in

vigilando, e in custodiendo.

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Sendo assim, Gagliano e Pamplona Filho [2003, p. 145-149]

as definem da seguinte forma: a) culpa in vigilando: oriunda da falta de vigilância,

de fiscalização, em face da conduta de terceiro, por quem nos responsabilizamos;

b) culpa in eligendo: decorre de má escolha do representante, ou do empregado;

c) culpa in custodiendo: assemelha-se à culpa in vigilando, porém empregada

para caracterizar a culpa na guarda de animais ou coisas, sob sua

responsabilidade; d) culpa in committendo: ocorre quando o agente pratica um ato

positivo, violando um dever jurídico. e) culpa in omittendo: decorre da abstração

culposa do agente, ao negligenciar um dever de cuidado.

Esclarecidos tais aspectos, passa-se ao estudo da culpa em

sentido amplo, ou seja, caracterizada pela violação de um dever jurídico,

imputável a alguém, em decorrência de um ato intencional, compreendo, portanto,

o dolo.

Para Diniz [2006, p. 46], “o dolo é vontade consciente de

violar o direito, dirigida à consecução do fim ilícito”.

Assevera Stoco [2004, p. 135], neste sentido, que:

Quando existe intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, há o dolo, isto é, pleno conhecimento do mal e o direto propósito de o praticar. A intenção é o principal atributo do dolo, que se traduz na vontade dirigida a um fim. Esse fim pressupõe-se sempre ilícito, considerando que o agente ou quer obter vantagem, ainda que cause dano a outrem, ou objetiva apenas causar mal e lesar a vítima, sem o desiderato de beneficiar-se.

No tocante à responsabilidade civil em decorrência do

acidente de trabalho, pondera Theodoro Júnior [1987, p. 41] que o dolo “[...] é a

ação voluntária, consciente dirigida ao resultado danoso. [...] Na verdade, quando

tal ocorre, a rigor não há acidente do trabalho, mas apenas um crime cometido

pelo patrão durante a prestação laboral”.

Também ao tratar da responsabilidade civil atinente ao

acidente de trabalho, assevera Oliveira [2007, p. 157], outrossim, que há a

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configuração do dolo “quando o patrão ou algum de seus prepostos,

intencionalmente, atua para violar direito ou praticar o ato ilícito”.

Theodoro Júnior [1987, p. 43], ao referir-se acerca do

entendimento jurisprudencial vigente à época, afirma que “o traço do dolo civil é a

consciência de manter a descoberto o risco tendente a certo resultado danoso”.

Assevera, assim, que “se o empregador tem o dever de prevenir os riscos das

condições de trabalho, age dolosamente se nem mesmo adota comezinhas

cautelas imprescindíveis, optando por uma conduta consciente inadmissível”.

Convém aqui colacionar a afirmação de Gonçalves apud

Theodoro Júnior [1987, p. 43], quando ensina que “[…] geralmente a

responsabilidade civil do empregador deriva da prática de ato ilícito, não só

derivado de dolo, mas também de culpa grave do próprio empregador ou de seus

prepostos”, frisando, neste sentido, que “a jurisprudência dominante reconhece a

culpa grave equiparada ao dolo em hipóteses de violação das obrigações legais

relativas à segurança.

Note-se, neste sentido, que a mera violação de norma legal

de segurança do trabalho, ensejaria a classificação da infração cometida pelo

empregador como grave, equiparando-se ao dolo propriamente dito.

3.2.3 Dano

Assim como os demais elementos anteriormente

mencionados, o dano também constitui um dos pressupostos essenciais da

responsabilidade civil, seja esta contratual ou extracontratual.

Nesta senda, afirma Diniz [2006, p. 64] que “não pode haver

responsabilidade civil sem a existência de um dano a um bem jurídico, sendo

imprescindível a prova real e concreta dessa lesão”.

Para Venosa [2004, p. 33], outrossim, o “dano consiste no

prejuízo sofrido pelo agente”, de modo que a noção de dano está diretamente

relacionada à existência de prejuízo.

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49

Em um conceito mais amplo, pondera Cavalieri Filho apud

Gagliano e Pamplona Filho [2003, p. 40], que:

O dano é, sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em indenização, nem ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano. [...] Tanto é assim que, sem dano, não haverá o que reparar, ainda que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa.

Igual conceito é o trazido por Oliveira [2007, p. 197], ao

sustentar que “pode ocorrer a hipótese de indenização sem culpa, como nos

casos de responsabilidade objetiva, mas não há possibilidade de se acolher

qualquer pedido de reparação quando não houver dano caracterizado”.

Acresce Oliveira [2007, p. 197], ainda, que o vocábulo

indenização significa tornar íntegro, incólume, ileso, restaurado, de forma que “se

não há prejuízo ou lesão, logicamente não há o que reparar; em termos mais

singelos, seria como pretender consertar o que não foi danificado”.

No mesmo norte, sustenta Stoco [2004, p. 1181] que “[…] se

não houver prova do dano, falta fundamento para a indenização. Não se admite o

dano incerto, improvável ou eventual, o dano condicional e nem mesmo o dano

hipotético”.

Como bem anota Oliveira [2007, p. 198], o ato ilícito

isoladamente não produz efeitos no âmbito da responsabilidade civil, uma vez que

para a obtenção da respectiva indenização será imprescindível comprovar que

houve também a lesão de algum direito da vítima.

Aliás, a própria redação do artigo 186, caput, do Código Civil

vigente expressa a necessidade de existência de dano para a caracterização da

responsabilidade civil, posto que aquele dispositivo exige a satisfação

concomitante da violação de direito e a ocorrência de dano a outrem.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que

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exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Salienta Diniz [2006, p. 67], que para que ocorra um dano

indenizável, deverão estar satisfeitos os seguintes requisitos:

a) Diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral, pertencente a uma pessoa, pois a noção de dano pressupõe a do lesado. O dano acarreta lesão nos interesses de outrem, tutelados juridicamente, sejam eles econômicos ou não; [...] b) Efetividade ou certeza do dano, pois a lesão não poderá ser hipotética ou conjetural. O dano deve ser real e efetivo, sendo necessária sua demonstração e evidência em face dos acontecimentos e sua repercussão sobre a pessoa, ou patrimônio desta, salvo nos casos de dano presumido; [...] c) Causalidade, já que deverá haver uma relação entre a falta e o prejuízo causado, ou seja, o dano deverá estar encadeado com a causa produzida pelo lesante; [...] d) Subsistência do dano no momento da reclamação do lesão. Se o dano já foi reparado pelo responsável, o prejuízo é insubsistente, mas, se o foi pela vítima, a lesão subsiste pelo quantum da reparação; [...] e) Legitimidade, pois a vítima, para que possa pleitear a reparação, precisará ser titular do direito atingido. Os titulares poderão ser os lesados, ou seus beneficiários, isto é, pessoas que dele dependam ou possam reclamar alimentos; f) Ausência de causas excludentes de responsabilidade”, caracterizada naqueles casos em que os danos não produzem o dever ressarcitório, como nas hipóteses de caso fortuito, força maior, culpa exclusiva da vítima etc.

Acrescenta Diniz [2006, p. 69], que o dano poderá ser direto

ou indireto em relação ao fato gerador, de forma que “o dano poderá ser direto se

oriundo da ação, como sua conseqüência imediata”, ao passo o dano indireto

consistir-se-á “numa conseqüência da perda mediatamente sofrida pelo lesado,

representando uma repercussão ou efeito da causa noutros bens que não os

diretamente atingidos pelo fato lesivo”;

Em se tratando dos danos na esfera trabalhista, convém

observar que, a teor do que prescreve Oliveira [2007, p. 199], “[…] não é todo

acidente do trabalho que gera direito à indenização para a vítima, ainda que

perfeitamente caracterizados o nexo causal e a culpa do empregador”.

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Sustenta Oliveira [2007, p. 199], que só haverá

ressarcimento se o acidente causar algum tipo de dano ao empregado, que

poderá ser material, moral ou estético, sob o fundamento de que não tendo o

Código Civil vigente incluído todas as espécies de danos, devem ser incluídas

outras reparações ou prejuízos que o ofendido prove haver sofrido, de modo que,

se ficar comprovado qualquer dano juridicamente considerável, causado pelo

acidente, far-se-á cabível o deferimento da indenização correspondente.

Por fim, ressalva Oliveira [2007, p. 200], que a configuração

ou não dos danos indenizáveis, dependerá sempre da análise casuística, com

todas as variáveis, agravantes ou atenuantes do caso concreto.

3.2.4 Nexo de causalidade

Ainda em observância à teoria clássica da responsabilidade

civil, para a satisfação do direito à indenização, deve restar configurado também,

como um de seus pressupostos, o nexo de causalidade entre a culpa do causador

e o dano sofrido pela vítima.

Neste sentido, bem leciona Theodoro Júnior [1987, p. 44]

que “urge ter bem presente, nessa ordem de idéias, que a culpa não é suficiente

para impor o dever de indenizar, nem tampouco se confunde com o nexo causal.

É perfeitamente possível encontrar-se um dano perante uma conduta culposa e

não existir liame de causa e efeito entre tais elementos”.

No mesmo norte, discorre Diniz [2006, p. 110] que “a

responsabilidade civil não pode existir sem a relação de causalidade entre o dano

e a ação que o provocou”.

Anota Oliveira [2007, p. 200] que “o vínculo entre o prejuízo

e a ação designa-se ‘nexo causal’, de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo

da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo representa,

portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o produziu,

de tal sorte que esta é considerada como sua causa”.

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Pondera Cavalieri Filho [2004 p. 130], acerca da presente

temática, que “[…] o conceito de nexo causal não é jurídico; decorre das leis

naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o

resultado. [...] É através dele que podemos concluir quem foi o causador do

dano”.

Relacionando o nexo de causalidade especificamente com a

infortunística trabalhista, prescreve Theodoro Júnior [1987, p. 44] que para que o

empregador seja responsabilizado pela reparação do dano sofrido por seu

empregado, deverá ser cabalmente demonstrado que a lesão sofrida adveio

diretamente da falta grave praticada.

Sustenta Theodoro Júnior [1987, p. 44], neste sentido, que

“numa empresa, por exemplo, onde seja notória a negligência com as medidas de

segurança, é perfeitamente possível que um dado acidente nada tenha a dever à

insegurança existente. Só haverá, pois, a condenação civil se se demonstrar, in

concreto, que o dano adveio realmente da falta de segurança”.

Convém ressaltar, por fim, tomando como base a lição de

Lopes apud Diniz [2006, p. 112], que por ser o nexo de causalidade um dos

pressupostos da responsabilidade civil, ele deverá ser efetivamente provado,

ônus este que incumbirá ao autor da demanda indenizatória.

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53

Capítulo 4

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NOS ACIDENTES

DO TRABALHO

4.1 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

Tão importante quanto os requisitos caracterizadores da

responsabilidade civil, tratados no capítulo anterior, as espécies de

responsabilidade civil guardam também a sua relevância, razão por que buscar-

se-á abordá-las no presente tópico, consagrando-se as suas respectivas

particularidades.

Conforme tratado no capítulo anterior, a premissa central da

responsabilidade civil norteia-se no fato de que, quem infringe um dever jurídico,

causando danos a outrem, responde pelo prejuízo ocasionado.

Consoante assevera Brandão [2006, p. 205], o fato gerador

do direito à reparação do dano pode ser a violação de um ajuste contratual entre

as partes ou de qualquer dispositivo do ordenamento jurídico, incluindo-se o

descumprimento do dever geral de cautela.

Segundo Brandão [2006, p. 205], quando ocorre a primeira

hipótese, tem-se a responsabilidade contratual, ao passo que na segunda

hipótese, estar-se-á diante da responsabilidade extracontratual ou aquiliana.

Convém ressaltar, por oportuno, que a teor do que leciona

Oliveira [2007, p. 93], a denominação “responsabilidade aquiliana”, como

sinônimo de responsabilidade extracontratual, tem origem na “Lex Aquilia”,

denominação ligada ao tribuno “Aquilius”, que propôs um plebiscito por volta do

século III a.C, que culminou na aprovação da Lei das XII Tábuas, a qual se tornou

referencial absoluto a respeito do que se entende por responsabilidade

extracontratual.

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54

Pondera Diniz [2006, p. 130], neste sentido, que a

responsabilidade contratual se oriunda da inexecução de negócio jurídico bilateral

ou unilateral, decorrente, portanto, de ilícito contratual, consistente na falta de

adimplemento ou da mora no cumprimento de qualquer obrigação.

Discorre Diniz [2006, p. 130], que a responsabilidade

contratual caracteriza-se pela infração a um dever especial estabelecido pela

vontade dos contraentes, razão por que oriunda de relação obrigacional

preexistente, que pressupõe a capacidade para contratar.

A responsabilidade extracontratual ou aquiliana, por sua vez,

nos dizeres de Diniz [2006, p. 131], é aquela resultante do inadimplemento

normativo, “da prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz (CC, art.

927), visto que não há vínculo anterior entre as partes, por não estarem ligadas

por uma relação obrigacional ou contratual”. Disso conclui-se, portanto, que a

fonte da responsabilidade extracontratual é a inobservância da lei, a lesão a um

direito, sem que haja uma relação jurídica preexistente entre o ofensor e o

ofendido.

De acordo com Oliveira [2007, p. 93], “a indenização por

acidente do trabalho ou doença ocupacional, enquadra-se como responsabilidade

extracontratual, porque decorre de algum ato ilícito do empregador, por violação

dos deveres previstos nas normas gerais de proteção ao trabalhador e ao meio

ambiente do trabalho”.

Sustenta Oliveira [2007, p. 93], neste sentido, que essa

responsabilidade não tem natureza contratual, posto que não há cláusula do

contrato de trabalho prevendo a “garantia da integridade psicobiofísica do

empregado ou da sua incolumidade”.

No que toca ao seu fundamento, a responsabilidade civil

pode apresentar-se sob duas formas: subjetiva e objetiva.

Segundo Gagliano e Pamplona Filho [2003, p. 14], a

responsabilidade civil subjetiva é a “decorrente de dano causado em função de

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ato doloso ou culposo”, caracterizada quando o agente causador do dano atuar

com negligência ou imprudência.

Sustentam os mencionados autores [2003, p. 15], em

contrapartida, que restará configurada a responsabilidade civil objetiva quando o

dolo ou a culpa do agente causador do dano for irrelevante juridicamente, isto é,

quando se fizer necessária tão-somente a existência do elo de causalidade entre

o dano e a conduta do agente responsável, para que surja o dever de indenizar.

Igual conceito é o trazido por Diniz [2006, p. 131], quando

afirma que a responsabilidade civil subjetiva justifica-se “na culpa ou dolo por

ação ou omissão, lesiva a determinada pessoa”, de modo que a prova da culpa

do agente será necessária para que surja o dever de reparar.

A responsabilidade civil objetiva, nos dizeres de Diniz [2006,

p. 131], funda-se no risco, no fato de o agente haver causado prejuízo à vítima ou

a seus bens, sendo “irrelevante a conduta culposa ou dolosa do causador do

dano, uma vez que bastará a existência do nexo causal entre o prejuízo sofrido

pela vítima e a ação do agente para que surja o dever de indenizar”.

Em semelhante posicionamento, acrescenta Oliveira [2007,

p. 93], que em razão de sua natureza, a responsabilidade civil objetiva é também

hodiernamente denominada de “teoria do risco”, sob o fundamento de que o

agente, no exercício de sua atividade, cria um risco de dano a outrem, devendo

responder pela reparação dos prejuízos, mesmo quando não esteja caracterizada

a sua culpabilidade.

De acordo com Oliveira [2007, p. 94], a indenização por

acidente de trabalho alicerça-se na responsabilidade civil subjetiva, isto é, “exige-

se a comprovação da culpa do empregador, de qualquer grau, para nascer o

direito da vítima”, ressaltando, entretanto, que as inovações trazidas no campo da

responsabilidade civil apontam numa tendência de “socialização dos riscos,

desviando o foco principal da investigação da culpa para o atendimento da vítima,

de modo a criar mais possibilidades de reparação dos danos”.

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56

4.1.1 Responsabilidade civil subjetiva

De acordo com os ensinamentos trazidos no tópico anterior,

no acidente de trabalho, para que surja o dever de indenizar, deve restar

demonstrada a culpa do empregador para a ocorrência daquele infortúnio, ainda

que leve ou levíssima.

Ensinam Gagliano e Pamplona Filho [2003, p. 15], neste

sentido, que a noção básica da responsabilidade civil subjetiva, funda-se no

princípio pelo qual cada um responde pela própria culpa, de modo que por tratar-

se de fato constitutivo de direito, caberá sempre ao autor da demanda o ônus da

prova de tal culpa do réu.

Para Oliveira [2007, p. 95], o dever de indenizar, na

responsabilidade civil subjetiva, funda-se no “comportamento desidioso do patrão

que atua descuidado do cumprimento das normas de segurança, higiene ou

saúde do trabalhador, propiciando, pela sua incúria, a ocorrência do acidente ou

doença ocupacional”.

Assim, segundo Oliveira [2007, p. 95], nesta modalidade de

responsabilidade civil, o acidente não surge do risco da atividade, mas da conduta

culposa do empregador.

Note-se, aliás, que o Código Civil de 1916, em seu artigo

159, já evidenciava a exigência de culpabilidade como pressuposto do ato ilícito e,

portanto, da responsabilidade civil, quando assim prescrevia:

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

O Código Civil vigente, outrossim, buscou manter a redação

daquele diploma precedente, quando em seu artigo 186 passou a assim

determinar:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que

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exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Não se pode olvidar, além disso, que a própria Constituição

Federal de 1988, em seu artigo 7º, que trata especificamente dos direitos dos

trabalhadores, determinou expressamente a necessidade de restar demonstrada

a culpabilidade do empregador para que surja o dever de indenizar, posto que em

seu inciso XXVIII, assim infirma:

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

[...].

Assim, pondera Oliveira [2007, p. 95], que na

responsabilidade civil subjetiva, só caberá a indenização se restarem presentes o

dano (acidente ou doença), o nexo de causalidade do evento com o trabalho e a

culpa do empregador, de modo que se não estiverem simultaneamente presentes

estes pressupostos, não há que se falar em pretensão indenizatória, lembrando

que, nesse caso, o ônus da prova compete ao autor da demanda.

Relatam Brandão [2006, p. 209] e Oliveira [2007, p. 95],

entretanto, que na aplicação prática da responsabilidade civil subjetiva, tem sido

comum a propositura de demandas em que a vítima prova que o infortúnio laboral

tem origem ocupacional, mas não logra êxito em comprovar qualquer falha ou

descumprimento por parte da empresa das normas de segurança, higiene e

saúde do trabalhador ou do dever geral de cautela.

Demonstram aqueles autores [2006, p. 209], pois, que

nestes casos ficam constatados os pressupostos do dano (doença) e do nexo

causal (origem ocupacional), mas inexiste o componente essencial da culpa para

sustentar o pleito indenizatório.

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58

Ante toda essa dificuldade probatória, agravada, inclusive,

por estarem as atividades empresariais cada vez mais complexas, pondera

Oliveira [2007, p. 95] ter sido este o principal motivo da eclosão da teoria da

responsabilidade civil objetiva, baseada tão-somente no risco da atividade,

dispensando que a vítima comprove a culpa patronal, o que culminou, também,

no desenvolvimento da teoria da culpa patronal presumida, as quais passarão a

ser tratadas no decorrer do presente estudo.

4.1.2 Responsabilidade civil objetiva

Como pôde ser acentuado anteriormente, a caracterização

da responsabilidade civil, no acidente de trabalho, pressupõe, dentre os demais

requisitos, a demonstração da culpa do empregador para a sua ocorrência, de

modo a concluir-se, portanto, que a responsabilidade civil, no acidente de

trabalho, é subjetiva, ou seja, requer a cabal demonstração do nexo de

causalidade existente entre o prejuízo sofrido (acidente ou doença) e a culpa

patronal, motivada sobretudo pela inobservância das normas de segurança,

higiene ou saúde do trabalhador.

Salienta Brandão [2006, p. 209], entretanto, que:

A modificação dos acontecimentos da vida em sociedade, como as concentrações da população nos centros urbanos, propiciando a ocorrência de danos; o surgimento de invenções, que aumentaram as causas geradoras de perigo; a inserção de novas tecnologias, como a eletricidade e a radioatividade; a produção dos bens em larga escala; a utilização do automóvel, dentre outros fatores, tornou insuficiente a teoria clássica da culpa para explicar o dever de reparação.

Desta forma, afirma Brandão [2006, p. 209], que muitos

casos ficavam sem solução, posto que em raras oportunidades a vítima

conseguia demonstrar a causa do dano e dela deduzir a culpa do empregador, de

modo que aquela acabava sendo privada do devido ressarcimento,

proporcionando, assim, “[...] um desequilíbrio moral entre os criadores do risco e

as vítimas [...]”, instigando os doutrinadores a buscarem um meio de tornar efetiva

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59

a responsabilização.

Neste sentido, é também o posicionamento de Oliveira

[2007, p. 96], ao afirmar que:

A complexidade da vida atual, a multiplicidade crescente dos fatores de risco, a estonteante revolução tecnológica, a explosão demográfica e os perigos difusos ou anônimos da modernidade acabaram por deixar vários acidentes ou danos sem reparação, uma vez que a vítima não lograva demonstrar a culpa do causador do prejuízo, ou seja, não conseguia se desincumbir do ônus probatório quanto ao fato constitutivo do direito postulado.

Aponta Pereira [2002, p. 16], que a doutrina acerca da

responsabilidade civil objetiva surgiu em 1897, quando Raymond Saleilles

publicou um estudo especializado intitulado “Les Accidents de Travail et la

Responsabilité Civile – Essai d’une théorie objective de la responsabilité

delictuelle”.

Segundo Pereira [2002, p. 16], mais tarde, em 1941, o

professor de Direito Civil da Faculdade de Lyon, Louis Josserand, passou a

defender abertamente a teoria objetiva, afirmando que a causa da constante

evolução da responsabilidade “deve ser procurada na multiplicidade de acidentes,

no caráter cada vez mais perigoso da vida contemporânea”, posto que, de acordo

este professor, “[...] multiplicam-se os acidentes, muitos permanecem anônimos e

sua causa verdadeira fica desconhecida”.

Há, inclusive, um trecho da obra deste professor em que ele

evidencia a sua inconformidade com a aplicação da teoria da responsabilidade

subjetiva nos acidentes de trabalho, ao afirmar que “quando um acidente

sobrevém, em que à vítima nada se pode censurar, por haver desempenhado um

papel passivo e inerte, sentimos instintivamente que lhe é devida uma reparação;

precisamos que ela a obtenha, sem o que nos sentiremos presos de um mal-estar

moral, de um sentimento de revolta; vai-se a paz da nossa alma”.

Pondera Lima [1998, p. 87], neste sentido, que a teoria da

responsabilidade civil objetiva, ou doutrina do risco, teve suas primeiras

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60

manifestações no final do século XIX, afirmando que:

Imprescindível se tornava, para a solução do problema da responsabilidade extracontratual, afastar-se do elemento moral, da pesquisa psicológica do íntimo do agente, ou da possibilidade de previsão ou diligência, para colocar a questão sob o ângulo até então não encarado devidamente, isto é, sob o ponto de vista exclusivo da reparação, e não interior, subjetivo, como na imposição da pena.

Acerca desta teoria, pondera Diniz [2006, p. 50] que:

[...] funda-se num princípio da eqüidade, existente desde o direito romano: aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes [...] Essa responsabilidade tem como fundamento a atividade exercida pelo agente, pelo perigo que pode causar dano à vida, à saúde ou a outros bens, criando risco de dano para terceiros.

Como já observava Moraes apud Brandão [2006, p. 214],

em sua obra datada de 1919, a insuficiência da doutrina da culpa para

fundamentar a reparação dos danos e o fato de o prejudicado entrar em disputa

na justiça com o industrial, mais bem aparelhado em todos os sentidos, fazia com

que, não raras as vezes, o empregado não conseguisse provar a culpa do

empregador.

Desta forma, como preleciona Cavalieri Filho [2004, p. 144],

os juristas passaram a perceber a insuficiência da teoria da culpa para atender

essa transformação social, o que poderia implicar na impossibilidade de

reparação do dano suportado pela vítima, se a ela coubesse comprovar a culpa

do causador.

Por esta razão, sintetiza Cavalieri Filho [2004, p. 145], que

“todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autor e reparado por quem o causou,

independentemente de ter ou não agido com culpa”, isto é, a problemática deve

cingir-se na relação de causalidade, sendo dispensável qualquer juízo de valor

sobre a culpa do responsável.

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Note-se, entretanto, que conforme ponderam Brandão

[2006, p. 215] e Oliveira [2007, p. 98], o processo de evolução da

responsabilidade civil objetiva não se deu de forma repentina, e sim, de forma

gradativa, de modo que seu início foi marcado com o acolhimento pelos tribunais

de uma maior facilidade na prova da culpa, que evoluiu para a admissão da culpa

presumida, com a inversão do ônus da prova e, em seguida, com a ampliação dos

casos de responsabilidade contratual para, finalmente, reconhecer-se o dever de

reparação independentemente de culpa.

Neste ínterim, inclusive, foi editada a Súmula nº. 341 do

Supremo Tribunal Federal, adotada em 1963, a qual passou a prescrever que:

É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.

Assim, com este dispositivo, a teor do que preceitua Oliveira

[2007, p. 98], bastou apenas mais um degrau para, da presunção de culpa,

atingir-se a responsabilidade sem culpa, conforme preconiza a teoria objetiva.

Convém registrar que, como já era de se esperar, a teoria da

responsabilidade civil objetiva coleciona também vários opositores, os quais,

segundo afirma Pereira [2002, p. 271], insurgem-se sob o fundamento de que “[...]

a demasiada atenção à vítima acaba por negar o princípio da justiça social,

impondo cegamente o dever de reparar, e levando-o a equiparar o

comportamento jurídico e injurídico do agente”.

Alegam, assim, que aquele empregador que toma todas as

medidas recomendáveis para evitar os danos, com a aplicação da teoria objetiva,

receberá o mesmo tratamento do outro que atua displicentemente.

Dentre estes opositores, podem ser citados os irmãos

Mazeaud apud Dias [1995, p. 69], os quais afirmam que “a eqüidade exige que

aquele que retira os proveitos suporte os riscos, mas exige também que não se

inquiete aquele cujo procedimento é irrepreensível”.

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Como bem leciona Oliveira [2007, p. 98], a aceitação da

teoria objetiva demandou um prolongado amadurecimento, notadamente pelos

confrontos de idéias antagônicas e das discussões doutrinárias.

Todavia, aquela ganhou notáveis adeptos e uma crescente

corrente doutrinária, razão por que, inclusive, foi incorporada por diversas leis

especiais, em hipóteses onde a comprovação da culpa mostrava-se mais difícil ou

complexa, restando evidente a tendência de que o direito moderno já não visava o

autor do dano, mas sim a vítima.

Em verdade, a responsabilidade civil objetiva já se faz

presente em vários dispositivos da legislação pátria, como, por exemplo, nos

danos nucleares, a teor do que preceitua o artigo 21, XXIII, “c”, da Constituição

Federal de 1988, assim como o artigo 225, §3º, do mesmo diploma, que

estabelece a obrigação de reparar os danos causados pelas atividades lesivas ao

meio ambiente, sem cogitar a existência de dolo ou culpa.

Ademais, conforme lembra Oliveira [2007, p. 100], este

último dispositivo permite a interpretação de que os danos causados pelo

empregador ao meio ambiente do trabalho, logicamente abrangendo os

empregados que ali atuam, devem ser ressarcidos independentemente de culpa,

posto que, inclusive, o artigo 200, VIII, da mesma Constituição, inclui o local de

trabalho no conceito de meio ambiente.

De acordo com Rocha [1997, p. 67], a Lei nº. 6.938/81, que

estabelece a política nacional do meio ambiente, também consagrou a

responsabilidade civil objetiva ao determinar em seu artigo 14, §1º, que:

[...]

§1º. É o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar e reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.

[...]

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Neste viés, sustenta Rocha [1997, p. 67], que o conceito de

poluição, neste dispositivo, alcança boa parte dos fatores causais das doenças

ocupacionais, sobretudo pelo seu artigo 3º, III, prescrever que:

[...]

III - Entende-se por poluição a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem à saúde, a segurança e o bem-estar da população [...].

[...].

Da análise destes dispositivos, conclui Rocha [1997, p. 65],

“que não faz sentido a norma ambiental proteger todos os seres vivos e deixar

apenas o trabalhador, o produtor direto dos bens de consumo, que, muitas vezes,

consome-se no processo produtivo, sem a proteção legal adequada”.

Sustenta a sua irresignação, afirmando que “[...] não se

pode esquecer – apesar de óbvio, deve ser dito – que o trabalhador também faz

parte da população e é um terceiro em relação ao empregador poluidor [...]”.

Neste enfoque, pondera Oliveira [2007, p. 100] que, por

mais curioso que possa parecer, o direito ambiental tem mais receptividade na

sociedade e no meio jurídico, do que a própria proteção jurídica à saúde do

trabalhador.

Segundo Oliveira [2007, p. 100], tamanho é o prestígio dado

ao direito ambiental, que sequer cogita-se a sua flexibilização, tal qual vem

ocorrendo com os direitos trabalhistas, explicando que, supostamente, essa

diversidade resida no fato de que o direito ambiental trabalha com o risco de

exclusão do futuro de todos, ao passo que o direito à saúde ocupacional só atinge

a categoria dos trabalhadores, isto é, “[...] o direito ambiental pretende a

‘salvação’ de todos, enquanto que o direito à saúde do trabalhador só cogita dos

problemas de alguns”.

O Código de Defesa do Consumidor, outrossim, é também

considerado um grande marco no avanço da responsabilidade civil, visto

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contemplar abertamente a teoria objetiva, prevendo a reparação

independentemente da existência de culpa, consoante prescrevem os seus

artigos 12 e 14, os quais, por sua relevância, convém transcrever:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a sua utilização e riscos.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Conforme preceitua Cavalieri Filho [2004 p. 159], o

entendimento doutrinário de que a responsabilidade civil subjetiva era a regra a

ser utilizada no Brasil, restou superado ou, pelo menos abalado, desde a edição

do Código de Defesa do Consumidor, sobre o qual pontua que:

Trata-se de diploma legislativo que, ao fazer da responsabilidade objetiva regra para todas as relações de consumo, conquistou imenso território que antes pertencia à responsabilidade subjetiva [...]. E tudo ou quase tudo em nossos dias tem a ver com consumo, de sorte que não haverá nenhuma impropriedade em se afirmar que hoje a responsabilidade objetiva, que era exceção, passou a ter um campo de incidência mais vasto do que a própria responsabilidade subjetiva.

Todavia, em que pese esse estrondoso crescimento da

teoria objetiva, ressalva Oliveira [2007, p. 99] que “[...] a responsabilidade objetiva

não suplantou, nem derrogou a teoria subjetiva, mas afirmou-se em espaço

próprio de convivência funcional, para atender àquelas hipóteses em que a

exigência da culpa representava demasiado ônus para as vítimas, praticamente

inviabilizando a indenização do prejuízo sofrido”.

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Assim, conforme observa Oliveira [2007, p. 99], “continuará

sendo aplicável a responsabilidade subjetiva, quando a culpa do infrator restar

demonstrada, hipótese em que ficará mais fácil o êxito da demanda para o

lesado, e até com a possibilidade de obter indenização mais expressiva”.

4.2 TEORIAS ACERCA DA NATUREZA DO RISCO

Como conseqüência da consolidação da responsabilidade

civil objetiva, pondera Brandão [2006, p. 219] que surgiram várias correntes

doutrinárias propondo a demarcação de seus limites, criando modalidades

distintas, mas que consistiram, a seu ver, em meras subespécies ou modalidades

da teoria do risco, das quais podem ser destacadas as teorias do risco proveito,

do risco profissional, do risco excepcional, do risco criado e a do risco integral.

4.2.1 Risco-proveito

Para fundamentar a teoria do risco-proveito, preleciona

Varela apud Brandão [2006, p. 219] que “[...] quem introduz na empresa

elementos cujo aproveitamento tem os seus riscos; numa palavra, quem cria ou

mantém um risco em proveito próprio, deve suportar as conseqüências

prejudiciais do seu emprego, já que dele colhe o principal benefício”.

Segundo Brandão [2006, p. 219], a justificativa estaria na

vinculação que necessariamente deve existir entre o dever de reparação por

aquele que percebe os lucros da exploração industrial e os encargos que dela

decorrem, dentre os quais, os acidentes de trabalho.

Nessa linha, é também o entendimento exposto por Venosa

[2003, p. 13], quando sustenta que o responsável pela reparação “é aquele que

tira proveito da atividade danosa, com base no princípio de que, onde está o

ganho, aí reside o encargo”.

Para Lima [1998, p. 119], a teoria do risco-proveito

contribuiu de sobremaneira para o desenvolvimento da responsabilidade

extracontratual, pois dela se originou o risco da diversidade das atividade

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66

humanas.

Segundo Lima [1998, p. 119], a doutrina que apóia essa

teoria enfatiza que os autores dos atos é que são os criadores de risco, posto

que:

Se destas atividades colhem os seus autores todos os proventos ou pelo menos agem para consegui-los, é justo e racional que suportem os encargos, que carreguem com o ônus, que respondam pelos riscos disseminados [...]. Não é justo, nem racional, nem tampouco eqüitativo e humano, que a vítima, que não colhe os proveitos da atividade criadora dos riscos e que para tais riscos não concorreu, suporte os azares da atividade alheia. A questão da responsabilidade, que é mera questão de reparação dos danos, de proteção do direito lesado, de equilíbrio social, deve, pois, ser resolvida atendendo-se somente àquele critério objetivo; quem guarda os benefícios que o acaso da sua atividade lhe proporciona deve, inversamente, suportar os males decorrentes desta mesma atividade.

Para Pereira [2002, p. 281], a teoria do risco-proveito

apresenta-se como sustentáculo da responsabilidade objetiva, porquanto decorre

da premissa de que “é sujeito à reparação aquele que retira proveito ou vantagem

do fato causador do dano – ubi emolumentum, ibi onus”.

Cavalieri Filho [2004, p. 146], outrossim, menciona que a

teoria do risco-proveito refere-se à “idéia de que o dano deve ser reparado por

aquele que retira algum proveito ou vantagem do fato lesivo. Quem colhe os

frutos da utilização de coisas ou atividades perigosas deve experimentar as

conseqüências prejudiciais de que dela decorrem”.

Ressalva Cavalieri Filho [2004, p. 146], entretanto, que o

caráter da mencionada teoria deve ser restrito, isto é, a expressão “proveito” deve

limitar-se aos proveitos de natureza econômica (lucro), de modo que assim, a sua

aplicação caberia apenas aos comerciantes e industriais, excluindo as hipóteses

em que a coisa causadora do dano não fosse fonte de ganho.

Pereira [2002, p. 281-282] coaduna com este entendimento,

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67

sustentando que a dificuldade em precisar-se ao que corresponde o proveito, faz

com que se confunda a teoria do risco-proveito com a do risco integral, pois

“somente um insensato [....] realiza atos sem ser guiado por um interesse de

cunho pecuniário ou moral”.

4.2.2 Risco profissional

De acordo com Brandão [2006, p. 222], a teoria do risco

profissional “compreende o dever de indenizar a partir do prejuízo ocasionado no

desempenho de atividade laborativa ou profissão”.

Segundo Brandão [2006, p. 222], essa teoria passou a ser

adotada para fundamentar os acidentes de trabalho ocorridos sem a culpa do

empregador.

Com efeito, a discussão acerca do tema é antiga, em

verdade, remonta às primeiras leis que reconheceram o direito à reparação pelos

danos ocasionados pelo acidente do trabalho, na medida em que constatava-se

que a maioria dos acidentes tinham origem no risco inerente à própria atividade

desenvolvida, o que, segundo pontua Carvalho [1963, p. 5-6], permitia concluir-se

que “o trabalho estabelece um risco próprio, que lhe é imanente, específico da

sua natureza”.

Segundo Carvalho [1963, p. 06], o risco profissional

apresenta um aspecto próprio, correspondente à sua constante aparição nas

estatísticas, e contingente, posto que na adoção de medidas protecionistas, pode

contribuir para que sejam reduzidos os índices de sua ocorrência,

proporcionando, assim, a diminuição do próprio risco.

Para Oliveira [2007, p. 103], outrossim, “a teoria do risco

profissional considera que o dever de indenizar decorre da atividade profissional

da vítima, sendo que o seu desenvolvimento está diretamente ligado aos

acidentes do trabalho”.

Em semelhante sentido, afirma Cavalieri Filho [2004, p. 146],

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que a teoria do risco profissional veio possibilitar o pleito indenizatório naquelas

hipóteses em que a vítima não lograva êxito em demonstrar a culpa do

empregador, ou, até mesmo, nos casos em que sequer havia a configuração da

culpa deste, sustentando aquele autor que:

A responsabilidade fundada na culpa levava, quase sempre, à improcedência da ação acidentária. A desigualdade econômica, a força de pressão do empregador, a dificuldade do empregado de produzir provas, sem se falar nos casos em que o acidente decorria das próprias condições físicas do trabalhador, quer pela sua exaustão, quer pela monotonia da atividade, tudo isso acabava por dar lugar a um grande número de acidentes não indenizados, de sorte que a teoria do risco profissional veio afastar esses inconvenientes.

4.2.3 Risco excepcional

Segundo Oliveira [2007, p. 103], “a teoria do risco

excepcional justifica o dever de indenizar, independentemente da comprovação

de culpa, sempre que a atividade desenvolvida pelo lesado constituir-se em risco

acentuado ou excepcional pela sua natureza perigosa”.

De acordo com o mesmo autor [2007, p. 103], são exemplos

as atividades com redes elétricas de alta tensão, exploração de energia nuclear,

materiais radioativos, dentre outras.

Pontua Brandão [2006, p. 223], que “a reparação é devida

sempre que o dano é conseqüência de um risco excepcional, que escapa à

atividade comum da vítima, ainda que estranho ao trabalho que normalmente

exerça”.

4.2.4 Risco criado

Conforme preleciona Brandão [2006, p. 223-224], nessa

modalidade de risco, o dever de indenizar é gerado quando, em razão da

atividade, o perigo é criado.

Segundo Brandão [2006, p. 224], nessa hipótese, não se

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cogita do fato ter correspondência a um proveito ou vantagem para o causador do

dano, não havendo, por conseguinte, a subordinação do dever de reparar ao

pressuposto da vantagem, bastando apenas a análise da atividade em si,

“independentemente do resultado que venha proporcionar para quem a

desenvolve”.

Para Pereira [2002, p. 270], o conceito de risco que melhor

se adapta às condições de vida social:

[...] é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamente, o dano é devido à imprudência, negligência, a um erro de conduta, e assim se configura a teoria do risco criado.

4.2.5 Risco integral

Sustenta Oliveira [2007, p. 104], que a teoria do risco

integral é considerada uma modalidade extrema da responsabilidade objetiva,

posto que exige somente o dano para acolher a indenização, ainda que o prejuízo

tenha ocorrido por culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior.

Para Venosa [2003, p. 147], essa teoria constitui-se numa

“[...] modalidade extremada que justifica o dever de indenizar até mesmo quando

não existe nexo causal. O dever de indenizar estará presente tão-somente

perante o dano, ainda que com culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso

fortuito ou força maior”.

No mesmo sentido, considera Brandão [2006, p. 225] tratar-

se do dever de reparação que “surge apenas e tão-somente da ocorrência do

dano, ainda que fruto de casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso

fortuito ou força maior, abstraindo-se a relação de causalidade”.

Em tempo, ressalva Cavalieri Filho [2004 p. 156], que em

razão de sua abrangência, a teoria do risco integral só é adotada em situações

específicas previstas em leis especiais, como, por exemplo, nas indenizações

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devidas às vítimas de acidentes de trânsito, mesmo que não haja culpa do

motorista responsável pelo atropelamento.

4.3 O ACOLHIMENTO DA TEORIA DO RISCO NO NOVO CÓDIGO CIVIL

Em conformidade com o que pôde ser observado no

decorrer do presente estudo, a responsabilidade objetiva no ordenamento pátrio

era considerada exceção à regra principal da teoria subjetiva, porquanto admitida

tão-somente em hipóteses previstas em leis especiais.

Todavia, com o advento do Código Civil de 2002, restou

consagrado que a responsabilidade civil objetiva não tem mais caráter de

exceção, uma vez que foi adotada norma genérica encampando a teoria do risco,

no parágrafo único do artigo 927, que assim passou a prescrever:

[...]

Parágrafo único. Haverá a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem.

Segundo Oliveira [2007, p. 106], “pode-se dizer que esse

dispositivo representa a maioridade da teoria da responsabilidade objetiva no

Brasil, que passa a conviver no mesmo patamar de importância e generalidade da

teoria da responsabilidade subjetiva”.

Para Brandão [2006, p. 232], o acolhimento da teoria

objetiva não é novidade no ordenamento jurídico pátrio, porquanto a Lei nº. 6.453,

de 17 de outubro de 1977, já assegurava tal possibilidade na hipótese de

responsabilidade civil por danos nucleares.

Ademais, segundo o mesmo autor [2006, p. 232], em

observância ao contexto mundial, o Código Civil de países como a Itália e

Portugal já prescreviam a adoção da teoria objetiva na responsabilização dos

infortúnios laborais, possibilitando estes dispositivos, entretanto, o afastamento da

responsabilidade quando houver a prova, por parte do agente, de que tomou

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todas as medidas preventivas para evitar o dano.

Lembra Brandão [2006, p. 233], ainda, que a versão inicial

do artigo 927 Código Civil de 2002, continha na parte final, a ressalva no sentido

de afastar a responsabilidade quando o agente comprovasse a adoção de

medidas preventivas tecnicamente adequadas, de forma que assim, equiparar-se-

ia às legislações italiana e portuguesa.

Além disso, segundo Brandão [2006, p. 233], a natureza da

atividade, capaz de gerar o dever de reparação, deveria envolver risco elevado,

propostas estas que, entretanto, não restaram aprovadas, motivo por que não

integram a redação atual daquele dispositivo, o qual, por essa razão, ampliou o rol

de situações concretas que poderão ser judicialmente decididas à luz da

responsabilidade objetiva.

Sustenta Sampaio [2003, p. 44], neste sentido, que “sempre

que a atividade normalmente exercida pelo autor do dano engendrar qualquer

grau de risco, ele responderá e não poderá fugir de tal responsabilidade, sequer

lhe sendo possível fazer prova de que procedeu diligentemente na adoção de

medidas de precaução tecnicamente adequadas e eficientes”.

Como não poderia deixar de ser, a inovação trazida pelo

novo Código Civil proporcionou incessantes embates jurídicos.

Para Gonçalves [2003, p. 314], a adoção da

responsabilidade objetiva por aquele novel, configurou-se na “[...] mais relevante

inovação introduzida no atual Código Civil, na parte atinente à responsabilidade

civil. Antes, a responsabilidade independentemente de culpa somente existia nos

casos especificados em lei, ou seja, em alguns artigos esparsos do Código Civil e

em leis especiais”.

De acordo com Gonçalves [2003, p. 314], tal modificação

possibilitou que “[...] mesmo inexistindo lei que regulamente o fato, pode o juiz

aplicar o princípio da responsabilidade objetiva, independentemente de culpa,

baseando-se no dispositivo legal mencionado quando a atividade normalmente

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desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos

de outrem”.

Venosa [2003, 14-15] também a entende como a mais

importante inovação em matéria de responsabilidade no Código, ressalvando,

entretanto, que exigir-se-á um cuidado extremo dos tribunais diante do

alargamento do seu conceito, posto que, a seu ver, transferiu-se para a

jurisprudência a tarefa de conceituar o que seja atividade de risco.

Azevedo apud Brandão [2004, p. 291-302], por sua vez, não

vê com bons olhos a abertura concedida à jurisprudência para definir o que seja a

atividade de risco, porquanto entende que além ser muito genérica, o órgão

julgador deverá analisá-la de forma restrita, buscando evitar, sempre que possível

a criação de hipóteses de responsabilidade objetiva.

Neste norte, é também o posicionamento de Gagliano e

Pamplona Filho [2003, p. 155-157], os quais criticam que a maneira como foi

proposto, o mencionado dispositivo formulará diversos questionamentos acerca

do seu alcance e das dificuldades que, na prática, surgirão no intuito de identificar

os seus limites.

Sustentam os mencionados autores [2003, p. 157] que o seu

caráter indeterminado concederá poderes excessivos ao magistrado na definição

do que seja atividade de risco, podendo proporcionar, assim, uma insegurança

nas relações jurídicas.

Em dissonante sentido, afirma Brandão [2006, p. 236] que:

Numa sociedade em transformação, marcada pela multiplicidade das relações sociais e pelo seu caráter mutável, num ambiente de rápidos avanços proporcionados pela tecnologia, tornando obsoleto o que hoje é novidade, não se pode pretender que seja possível ao legislador traçar toda a sua regulamentação por meio de normas caracterizadas pelo conteúdo preciso e definido, albergando valores que por elas são influenciados e também as influenciam.

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Destaca Brandão [2006, p. 236], ainda, que:

No campo específico da proteção à saúde, foco principal do presente estudo, a cada dia são inseridas no processo de produção novas matérias-primas, tecnologias e modificados os processos de fabricação, criando um ambiente propício para a inserção das cláusulas gerais no sistema jurídico, a fim de tornar possível a sua preservação efetiva, razão pela qual agiu acertadamente o legislador quando previu de forma genérica a regra da reparação.

As controvérsias acentuam-se, entretanto, quanto à

aplicação da teoria objetiva na hipótese de acidente do trabalho, isto é, se a partir

do Código Civil de 2002 o empregador deve suportar as indenizações quando da

ocorrência de infortúnio laboral, mesmo quando não resta demonstrada a sua

culpa.

Segundo pontua Oliveira [2007, p. 107], há uma corrente

doutrinária que entende que o parágrafo único do artigo 927 não se aplica nas

hipóteses de acidente do trabalho, sob o fundamento de que a Constituição

Federal de 1988 tem norma expressa estabelecendo como pressuposto da

indenização a ocorrência de culpa do empregador (artigo 7º, XXVIII), de modo

que assim, o novo Código Civil, por ser norma de hierarquia inferior, estaria

contrariando a previsão constitucional.

Sob este enfoque, assevera Stoco [2004 p. 606] que a

Constituição estabeleceu, como princípio, a indenização devida pelo empregador,

com fundamento no direito comum, apenas na hipótese daquele obrar com dolo

ou culpa, razão por que inaplicável – nos acidentes de trabalho – a teoria objetiva

consagrada no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.

Semelhante posicionamento é o trazido por Dal Col apud

Oliveira [2007, p. 107-108], ao sustentar que:

Querer responsabilizar objetivamente o empregador por qualquer acidente sofrido pelo empregado é fadar a relação de trabalho ao insucesso, tornando-a inviável. A ele cabe a responsabilidade pela falha na prevenção, pelo excesso de jornada imposto, pela

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inobservância das regras de ergonomia, segurança e outras, que comprometam a normalidade do ambiente do trabalho ou das condições em que este devia ter-se realizado, ou seja, cria condições inseguras para o trabalhador.

Segundo Dal Col apud Oliveira [2007, p. 108]:

O sistema da culpabilidade subjetiva é, ainda, o mais coerente para fins de reparação de danos, sobretudo quando estabelecido no país um sistema de previdência social, que repara objetivamente o acidente, funcionando como seguro contra a infortunística. E se pudesse ser tido como atividade culposa do empregador, permitir o trabalho em atividades que são perigosas por sua própria natureza, haveria séria justificativa para desestimular a produção, agravando o desemprego, que já assola a sociedade com índices crescentes e alarmantes.

Já a segunda corrente doutrinária, com a qual coaduna

Oliveira [2007, p. 108], funda-se no sentido que o disposto no inciso XXVIII do

artigo 7º, da Constituição Federal de 1988, deve ser interpretado em harmonia

com o que estabelece o caput do artigo, que prevê:

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social.

Assim, sustenta esta corrente, que o rol dos direitos

mencionados no artigo 7º da Constituição Federal não impede que a lei ordinária

amplie os existentes ou acrescente outros que visem à melhoria da condição

social do trabalhador.

Também acerca do caráter meramente exemplificativo do

artigo 7º da Constituição Federal de 1988, e por conseguinte, da aplicação do

artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, leciona Dallegrave Neto [2005, p.

193], que “a melhor exegese sistêmica da ordem constitucional não deixa pairar

dúvidas acerca da legitimidade do mencionado artigo do novo Código Civil, vez

que o caput do art. 7º da CF assegura um rol de direitos mínimos sem prejuízo de

outros que visam à melhor condição social do trabalhador”.

Aliás, como bem observa Oliveira [2007, p. 109], a adoção

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da corrente doutrinária que se opõe ao acolhimento da teoria objetiva nas

indenizações por acidente do trabalho, proporciona conclusões absurdas e, até

mesmo, ilógicas.

Isso porque, sob o fundamento daquela corrente, se um

autônomo ou um empreiteiro sofrer acidente, o tomador de serviços responde

pela indenização, independentemente de culpa, com apoio na teoria do risco; no

entanto, o trabalhador permanente, com os devidos registros formalizados, não

tem assegurada essa reparação.

Discorre afirmando, ainda, que “se um bem ou equipamento

de terceiros for danificado pela atividade empresarial, haverá indenização,

considerando os pressupostos da responsabilidade objetiva, mas o trabalhador,

exatamente aquele que executa a referida atividade, ficará excluído [...]”.

Em evidente consonância, assevera Pamplona Filho [2003,

p. 563] que:

Ao aceitar tal posicionamento, vemo-nos obrigados a reconhecer o seguinte paradoxo: o empregador, pela atividade exercida, responderia objetivamente pelos danos por si causados, mas, em relação a seus empregados, por causa de danos causados justamente pelo exercício da mesma atividade que atraiu a responsabilização objetiva, teria um direito a responder subjetivamente [...] Desculpe-nos, mas é muito para o nosso fígado [...].

Convém salientar, inclusive, que em apoio a corrente

doutrinária que defende a aplicação da teoria objetiva nos acidentes de trabalho,

foi adotado, em outubro de 2006, por ocasião da IV Jornada de Direito Civil

promovida em Brasília pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça

Federal, o Enunciado nº. 377, que assim prescreve:

O art. 7º, inc. XXVIII, da Constituição Federal não é impedimento para a aplicação no disposto no art. 927, parágrafo único, do Código Civil quando se tratar de atividade de risco.

Por tais fundamentos, parece perfeitamente viável a

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aplicação da teoria do risco na reparação civil por acidente do trabalho, como,

aliás, já vem sendo experimentada, no entanto, ante as incessantes discussões

acerca do tema, somente com o tempo e com o posicionamento assentado dos

tribunais superiores é que uniformizar-se o entendimento quanto à sua

aplicabilidade nos infortúnios laborais.

4.4 PRESUNÇÃO DE CULPA DO EMPREGADOR

A teor do que determina o artigo 333, I e II, do Código de

Processo Civil, cabe ao autor o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu

direito e, ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo

do direito do autor.

Todavia, ante a freqüente existência de hipóteses em que o

autor da demanda não conseguia demonstrar o fato constitutivo do seu direito,

sobretudo pela dificuldade de se obterem provas, ou por restarem estas em poder

da parte adversa, evidenciou-se a necessidade do ordenamento jurídico pátrio

alcançar tais situações, possibilitando a trazida das provas aos autos pela parte

que a elas tem maior acesso, isto é, invertendo o ônus da prova.

Buscando amparar esta possibilidade nas relações de

consumo, o Código de Defesa do Consumidor, datado de 11 de setembro de

1990, prescreveu a adoção da inversão do ônus da prova, assegurando ao

consumidor, em seu artigo 6º, VIII, “a facilitação da defesa de seus direitos,

inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando,

a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente,

segundo as regras ordinárias de experiência”.

No entanto, essa freqüente dificuldade probatória

logicamente não se restringe às relações consumeiristas, sendo constante, até

mesmo, no processo trabalhista, posto que nem sempre o reclamante consegue

provar o fato constitutivo do seu direito, especialmente por ter o empregador uma

maior disponibilidade dos meios de prova, estando, por isso, mais apto a

demonstrar em Juízo os fatos controvertidos.

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Em se tratando da infortunística trabalhista, outrossim,

menciona Oliveira [2007, p. 191] que, em não raras oportunidades, a vítima se

depara com enormes dificuldades para comprovar a culpa do empregador, o que,

como visto nos tópicos anteriores, dificulta, senão impossibilita, o pleito

indenizatório.

Neste particular, aliás, pontua Cavalieri Filho [2004, p. 63],

que “a prova da culpa, em muitos casos, é verdadeiramente diabólica, erigindo-se

em barreira intransponível para o lesado”.

Segundo Lima [1998, p. 79], diante desta realidade, a culpa

presumida passou a ser adotada em várias hipóteses em que a vítima

efetivamente encontrava dificuldades para demonstrar o ato ilícito do agente,

sobretudo naquelas onde há um grau de risco maior, de modo que “as

presunções de culpa consagradas na lei, invertendo o ônus da prova, vieram

melhorar a situação da vítima, criando-se a seu favor uma posição privilegiada”.

No ordenamento jurídico nacional, como bem lembra

Oliveira [2007, p. 191], já havia, em 1912, no Decreto nº. 2.681, que regula a

responsabilidade civil das estradas de ferro, a determinação expressa da

responsabilidade presumida destas pelos desastres ocorridos em suas linhas, que

causarem a morte, ferimento ou lesão corpórea aos viajantes, só admitindo-se em

contrário, as provas de caso fortuito, força maior e ou culpa exclusiva da vítima”.

De acordo com Oliveira [2007, p. 192], os fundamentos que

impulsionaram a teoria da culpa presumida também estão presentes nos

acidentes do trabalho, mormente se levarmos em consideração a evidente

dificuldade da vítima para comprovar as causas do acidente, “[...] sem contar as

culpas anônimas ou pouco visíveis dos desgastes do material, jornadas

exaustivas, pressão da chefia, desvio de função, treinamentos inadequados e

tantos outros fatores que contribuem para o infortúnio laboral”.

Para Oliveira [2007, p. 193], a indenização por acidente do

trabalho oscila entre a responsabilidade subjetiva e a teoria do risco, havendo, no

entanto, uma forte tendência para o fortalecimento da responsabilidade de

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natureza objetiva.

Entende Oliveira [2007, p. 193], assim, que ante a

dificuldade probatória atribuída à vítima na teoria subjetiva, e a atual resistência

quanto à aplicação da teoria objetiva, a teoria da culpa presumida configura-se

como uma etapa intermediária – ou como um ponto de transição - entre aquelas

duas teorias, posto que nesta, sem desprender-se da teoria subjetiva, inverte-se o

ônus da prova em favor da vítima, cabendo ao empregador, se for o caso,

comprovar que houve algum fato que possa obstar a pretensão do autor.

Sobre a natureza da presunção de culpa, estabelece

Theodoro Júnior [2003, p. 106-107] que:

Não se trata de dispensar o elemento subjetivo do ato ilícito, mas de deduzi-lo indiretamente por meio da chamada prova crítica. Aliás, o Código não joga apenas com as provas históricas e diretas, pois há expressa previsão legal de que os fatos jurídicos podem ser comprovados, também, por meio de presunções (art. 212, IV). Desde que os indícios sejam graves, precisos e convergentes, o convencimento do juiz pode por meio deles chegar à certeza, com tanta segurança como se o tivesse formado à base de provas diretas. É o que se faz, na jurisprudência, com bastante freqüência, em tema de apuração da culpa ainda que não se compreenda exatamente a causa pela qual o agente se portou de forma anômala, é de presumir-se, segundo a experiência da vida (isto é, do que comumente acontece), que não tenham sido observadas as cautelas necessárias para a impedir o evento danoso. [...] A presunção de culpa cria uma inversão do ônus da prova: em lugar de ter o autor da demanda de provar a culpa do réu, este é que tem de comprovar a ausência de culpa.

Diante destas considerações, chega-se a ilação de que a

teoria da presunção de culpa do empregador, consubstanciada na inversão do

ônus da prova, tende a ganhar cada vez mais espaço nas ações indenizatórias

por acidente de trabalho, podendo representar, inclusive, a teor do que leciona

Oliveira [2007, p. 194], em um “ponto de trégua entre os defensores da teoria do

risco e os adeptos da responsabilidade civil subjetiva”.

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4.5 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREG ADOR

De acordo com o que pôde observado no item 4.3 do

presente estudo, dentre as diversas teorias utilizadas para sustentar a

possibilidade de reparação de danos causados sem a satisfação do requisito

“culpa”, a teoria do risco integral diferencia-se pelo fato de preservar o dever de

reparação, independentemente de qualquer circunstância que possa interferir na

relação de causalidade.

Segundo Brandão [2006, p. 252], nas demais modalidades

de risco, no entanto, “pode verificar-se a presença de elementos causais que

interferem na responsabilização do agente causador do dano”, isto é, há “[...] o

reconhecimento da possibilidade de exclusão por determinados fatos que rompem

o nexo de causalidade entre o fato gerador e o dano, a exemplo da culpa

exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito e força maior”.

4.5.1 Culpa exclusiva da vítima

Sustenta Rodrigues [2002, p. 165-167], que uma vez

demonstrada a culpa exclusiva da vítima, “desaparece a relação de causa e efeito

entre o ato do agente causador do dano e o prejuízo experimentado pela vítima”,

de modo que, segundo o mesmo autor [2002, p. 166], nessa hipótese, “o agente

que causa diretamente o dano é apenas um instrumento do acidente, não se

podendo falar em liame de causalidade entre seu ato e o prejuízo por aquela

experimentado”.

Para Oliveira [2007, p. 147], resta caracterizada a culpa

exclusiva da vítima quando a causa única do acidente tiver sido a sua conduta,

“sem qualquer ligação com o descumprimento das normas legais, contratuais,

convencionais, regulamentares, técnicas ou do dever geral de cautela por parte

do empregador”.

Ressalva Brandão [2006, p. 253], entretanto, que essa

circunstância excludente somente deve ser aplicada quando restar demonstrado

que foi apenas e tão-somente da vítima o ato que gerou o dano, porquanto

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havendo a possibilidade de culpa concorrente entre a vítima e o agente causador,

cada uma delas deverá ser avaliada pelo juiz, a fim de verificar a sua contribuição

para o evento danoso.

Pontua Diniz [2006, p. 103], neste sentido, que na aferição

do montante indenizatório, deverão ser levados em considerações critérios como

o da compensação de culpas; o da divisão proporcional dos prejuízos; o da

gravidade da culpa de cada um e o grau de participação na ocorrência do

resultado.

4.5.2 Fato exclusivo de terceiro

A teor do que leciona Brandão [2006, p. 254], essa

modalidade corresponde ao ato de terceiro que seja a causa única e exclusiva do

evento gerador do dano, o que equivale, segundo ele, “ao caso fortuito ou força

maior, por ser causa estranha à conduta do agente aparente, imprevisível e

inevitável”, que, portanto, impede o nexo de causalidade em face do empregador.

De acordo com Oliveira [2007, p. 152], “será considerado

‘fato de terceiro’, causador do acidente do trabalho, aquele ato ilícito praticado

por alguém que não seja nem o acidentado, nem o empregador ou seus

prepostos”. Frisa o mesmo autor, que “apenas o fato de o acidente ter ocorrido

durante a jornada de trabalho não gera o liame causal para fins de

responsabilidade civil do empregador, se a prestação dos serviços não tiver pelo

menos contribuído para o infortúnio”.

Afirma Pereira [2002, p. 301], outrossim, que “ocorre o dano,

identifica-se o responsável aparente, mas não incorre este em responsabilidade,

porque foi a conduta do terceiro que interveio para negar a equação agente-

vítima, ou para afastar do nexo causal o indigitado autor”.

Conclui Oliveira [2007, p. 153], por fim, que, nesta hipótese,

a vítima terá assegurado os benefícios previdenciários previstos na legislação

acidentária, todavia, não caberá qualquer pleito indenizatório em face do

empregador em razão da ausência do nexo causal do acidente com a prestação

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do trabalho, devendo a vítima, neste caso, postular a sua pretensão indenizatória

em desfavor do causador do dano.

4.5.3 Caso fortuito e força maior

Assim como as causas supramencionadas, o caso fortuito

ou de força maior também caracterizam-se como causas excludentes do dever

ressarcitório, de modo que, a teor do que prescrevem Gagliano e Pamplona Filho

[2003, p. 121-123], os acidentes ocorridos por tais causas, em regra, não

proporcionam a responsabilidade civil do empregador por ausência do nexo

causal direto do evento com o exercício do trabalho.

Sustenta Oliveira [2007, p. 149], que se caracterizam por

circunstâncias ou condições que escapam a qualquer controle ou diligência do

empregador, razão por que nesses acidentes não há a configuração do nexo de

causalidade e, por conseguinte, do dever de indenizar.

Com efeito, várias discussões doutrinárias e jurisprudenciais

são travadas no intuito de diferenciarem, de forma clara, o conceito e a

abrangência isolada de cada uma dessas excludentes, em que pese serem

costumeiramente tratadas de forma conjunta.

Buscando esclarecer a atuação de cada uma delas,

assevera Cavalieri Filho [2004, p. 84-85] que:

Estaremos em face do caso fortuito quando se tratar de evento imprevisível e, por isso, inevitável; se o evento for inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato superior às forças do agente, como normalmente são os fatos da natureza, como as tempestades, enchentes etc., estaremos em face da força maior, como o próprio nome diz. [...] A imprevisibilidade, portanto, é o elemento indispensável para a caracterização do caso fortuito, enquanto a inevitabilidade o é da força maior.

Lembra Oliveira [2007, p. 150], no entanto, que não se pode

adotar um posicionamento definitivo acerca das hipóteses de caso fortuito e força

maior, porquanto, para ele, é preciso avaliar se o empregador, dentro da

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razoabilidade e do estágio atual da tecnologia, poderia adotar medidas

preventivas que poderiam ter evitado o acidente ocorrido.

Segundo Oliveira [2007, p. 151], via de regra, a doutrina e a

jurisprudência não consideram como excludente do nexo causal o caso fortuito

interno, isto, é o fato danoso imprevisível que está ligado à atividade do

empregador e, por isso, abrangido pelo conceito mais amplo de risco do negócio,

posto que somente os casos fortuitos ou de força maior de origem externa

produzem o efeito de excluir o nexo de causalidade.

4.6 CUMULAÇÃO COM OS BENEFÍCIOS ACIDENTÁRIOS

Com o advento da Constituição Federal de 1988, em

especial, com o seu artigo 7º, XXVIIII, restou consolidada a responsabilidade civil

do empregador frente ao acidente de trabalho, em que pese, como visto, as

incessantes discussões acerca da natureza desta responsabilidade, isto é, se a

sua caracterização se dá pela forma subjetiva ou objetiva.

Além disto, outra grande problemática que vem sendo

enfrentada pelos tribunais e pela doutrina, diz respeito a possibilidade de

cumulação das reparações civis com os benefícios acidentários, posto que além

de alguns insistirem no fundamento de que a percepção destes benefícios exclui

a responsabilidade civil do empregador, em não raras vezes, encontram-se

decisões judiciais determinando que do montante indenizatório, devem ser

deduzidos os valores recebidos daqueles benefícios, sob o fundamento de que a

reparação não pode ser superior ao dano causado.

Convém observar, de plano, que a Constituição Federal de

1988, no mencionado dispositivo, assegurou aos trabalhadores a proteção

securitária frente aos acidentes de trabalho, determinando, expressamente, que

essa proteção não deve excluir a indenização a cargo do empregador quando

este incorrer em dolo ou culpa.

Buscando resguardar os ditames da Lei Maior, a Lei nº.

8.213/91, em seu artigo 121, determinou que:

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Art. 121. O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.

Em verdade, a Súmula 229 do Supremo Tribunal Federal,

aprovada em 13.12.1963, já prescrevia que:

A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador.

Muito embora existam posições controvertidas sobre o

assunto, percebe-se, no entanto, que o entendimento jurisprudencial e doutrinário

majoritário vem apontando em consonância com dispositivos supracitados, isto é,

de que o pagamento, pela Previdência Social, de qualquer benefício acidentário,

não exclui a responsabilidade civil do empregador na hipótese deste incorrer em

dolo ou culpa, nem tampouco admite que aqueles benefícios sejam deduzidos da

condenação indenizatória.

Neste sentido, anota Saad [1999, p. 241] que “a reparação

infortunística decorre da teoria do risco, amparada pelo seguro social a cargo da

Previdência Social, enquanto a responsabilidade civil comum tem como

supedâneo a culpa do patrão ou seu preposto. As causas e os sujeitos passivos

da obrigação de reparar são distintos”.

Não se pode olvidar, a teor do que preleciona Oliveira [2007,

p. 83] que a cobertura acidentária prestada atualmente pelo INSS, “[...] deslocou a

sua natureza contratual de seguro de acidente do trabalho para um sistema de

seguro social, de solidariedade mais ampla, cujos benefícios são concedidos ao

acidentado independentemente da prova de culpa, já que qualquer trabalho, de

certa forma, implica riscos”.

Segundo Oliveira [2007, p. 83], esse seguro obrigatório

prestado pela Previdência Social, “não exime o empregador do dever de

diligência, de garantir o direito ao ambiente de trabalho saudável e à redução dos

riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança,

conforme previsto no art. 7º, XXII, da Constituição Federal”.

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Neste rumo, aliás, bem leciona Saad [1999, p. 111] que:

Quando uma vida é ceifada ou uma invalidez é determinada, prematuramente, e de modo definitivo, pela conduta negligente ou imprudente daquele que tem a obrigação de zelar pela segurança física do seu empregado, a responsabilidade migra para o campo do direito comum, levando para o passivo da empresa toda a dimensão do dano e a indenização conseqüente. Indeniza o empregador não pelo risco (elemento intrínseco de seu empreendimento), pois esse é o ressarcido dentro das fronteiras securitárias, mas pela ilicitude da sua conduta.

Assim, pontua Oliveira [2007, p. 83] que “quando o

empregador descuidado dos deveres concorrer para o evento do acidente com

dolo ou culpa, por ação ou omissão, fica caracterizado o ato ilícito patronal,

gerando direito à reparação, independentemente da cobertura acidentária”.

Assevera Oliveira [2007, p. 84], ainda, que com o advento

da Constituição Federal de 1988, restou consolidada a possibilidade de

cumulação dos benefícios acidentários com a indenização civil devida pelo

empregador em caso de dolo ou culpa, bem como a vedação deste compensar do

montante indenizatório os valores recebidos pela vítima ou por seus dependentes

a título de benefícios acidentários, “[...] porquanto o deferimento de um direito não

exclui, nem atenua o outro”.

Segundo o mesmo autor [2007, p. 84], “o seguro acidentário

destina-se a proteger a vítima e não diminuir ou substituir a obrigação do

empregador de reparar o dano causado pelo acidente ocorrido por sua culpa ou

dolo. O fato gerador da indenização não foi, a rigor, o exercício do trabalho, mas o

ato ilícito do patrão”.

Em semelhante posicionamento, assevera Gonçalves [2002,

p. 786] que “a doutrina e a jurisprudência consagram, de forma uníssona, a regra

de que não se reduzem da indenização as quantias recebidas pela vítima, ou

seus beneficiários, dos institutos previdenciários ou assistenciais. Somam-se,

assim, as indenizações previdenciárias, como pensão, seguro, verba recebida a

título de acidente do trabalho, com a indenização determinada pelo ato ilícito”.

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Para Stoco [2004, p. 603], outrossim:

O art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal de 1988 dispõe ser direito dos trabalhadores urbanos e rurais, o “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”. Como se verifica, prevê, ainda, o direito do trabalhador ser indenizado em caso de acidente do trabalho quando decorra de dolo ou culpa do empregador. [...] Essa indenização é independente do seguro-acidente e não será deduzida do valor da indenização do direito comum, conforme Súmula nº. 229 do Colendo Supremo Tribunal Federal.

Também em amparo à matéria, sustenta Cavalieri Filho

[2004, p. 161] que:

Temos, assim, por força de expresso dispositivo constitucional, duas indenizações por acidente do trabalho, autônomas e cumuláveis. A acidentária, fundada no risco integral, coberta pelo seguro social e que deve ser exigida do INSS. Mas, se o acidente do trabalho (ou doença profissional) ocorrer por dolo ou culpa do empregador, o empregado faz jus à indenização comum ilimitada. Noutras palavras, o seguro contra acidente do trabalho só afasta a responsabilidade do empregador em relação aos acidentes de trabalho que ocorrem sem qualquer parcela de culpa; se houve culpa, ainda que leve (e esta deve ser provada), o empregador terá a obrigação de indenizar.

No mesmo norte, vem sendo o entendimento adotado pelos

tribunais pátrios, consoante denotam os excertos a seguir transcritos:

Civil e Processual. Agravo regimental em agravo de instrumento. Ação rescisória. Dedução do quantum devido por força do ilícito civil. Impossibilidade. I. A orientação fixada no Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em face da diversidade de suas origens – uma advinda de contribuições específicas ao INSS e outra devida pela prática de ilícito civil – não pode haver, no pagamento desta última, dedução de quaisquer parcelas pagas à vítima a título de benefício previdenciário. II. Precedentes do STJ.

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III. Agravo regimental improvido.5

Agravo de instrumento. Recurso Especial. Acidente de trabalho. Responsabilidade civil. Pensão previdenciária. Cumulação. Possibilidade. Precedentes. É assente o entendimento nesta Corte no sentido de que a indenização previdenciária é diversa e independente da contemplada no direito comum, inclusive porque têm origens distintas: uma, sustentada pelo direito acidentário: outra, pelo direito comum, uma não excluindo a outra (Súmula n. 229/STF), podendo, inclusive, cumularem-se. Precedentes.6

Pagamento em duplicidade indenização e benefício previdenciário. I. Segundo se extrai do art. 7º, inciso XXXVIII da Constituição, o benefício previdenciário não exclui o direito ali consagrado à indenização por danos moral e material, oriundos da relação de emprego, quando para ele tiver concorrido o empregador por dolo ou culpa, culpa aliás que o pode ser inclusive levíssima. Recurso não conhecido.7

Dentro destes fundamentos, pode-se concluir que os

proventos recebidos pela vítima ou seus dependentes, a título de benefícios

acidentários, podem ser cumulados com a indenização civil devida pelo

empregador quando este incorrer em dolo ou culpa para a ocorrência do infortúnio

laboral, e não podem aqueles benefícios serem deduzidos da condenação

indenizatória, porquanto tais rendimentos constituem-se fatos geradores, institutos

e fundamentos diversos.

5 STJ. AgRg no Ag. n. 540.871/PR, 4ª Turma, Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ

22/03/2004. 6 STJ. Agravo de instrumento n. 689.883, Rel.: Ministro Castro Filho, DJ 6/09/2005. 7 TST.Recurso de Revista n. 449/2004-561-04-00.9, 4ª Turma Rel.: Ministro Barros Levenhagen,

DJ 19/12/2006.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa objetivou investigar, à luz da legislação,

doutrina e jurisprudência nacional, o conceito e a extensão do acidente de

trabalho, os danos que com a sua ocorrência podem ser proporcionados ao

empregado, os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil e, em

especial, como configura-se atualmente a responsabilidade civil do empregador

nos acidentes de trabalho.

A escolha pelo tema abordado justificou-se pelos altos

índices de ocorrência que os acidentes de trabalho ainda ocupam no contexto

nacional, e, sobretudo, pela grande dificuldade que os empregados - vítimas de

tais acidentes - enfrentam na demonstração da culpabilidade do empregador, pois

como visto no decorrer deste estudo, várias são as ações indenizatórias que

restam prejudicadas em razão do empregado não lograr êxito na demonstração

da culpa ou dolo do empregador para a sua ocorrência, proporcionando, assim,

além de uma grande injustiça social, a instigação da doutrina e da jurisprudência

em buscar um meio eficaz de responsabilizar o empregador em tais casos.

Visando a sua estruturação lógica, o trabalho foi dividido em

quatro capítulos.

O primeiro capítulo foi destinado a tratar do conceito de

acidente de trabalho, a sua evolução histórica frente à legislação acidentária, bem

como as suas espécies e formas de configuração.

Com os fundamentos trazidos neste capítulo, restou

evidenciado que o acidente de trabalho caracteriza-se pelo evento danoso

ocasionado pelo exercício de trabalho a serviço do empregador, e até mesmo

pelo trabalho dos segurados especiais, ocasionando lesão corporal, perturbação

funcional ou doença que cause a morte, a perda ou redução permanente ou

temporária da capacidade para o trabalho.

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No que tange à sua evolução histórica, o aludido capítulo

demonstrou que os acidentes de trabalho remontam à própria origem humana,

posto que desde o seu surgimento, o homem precisou exercer alguma atividade

produtiva para garantir a sua subsistência, e para tanto, sempre esteve sujeito

aos riscos que estas atividades o expunham.

Em verdade, como fora visto, a efetiva preocupação com os

acidentes de trabalho teve início com a Revolução Industrial, quando aliados à

implantação de novos métodos de produção, intensificaram-se os acidentes de

trabalho, de modo que a partir de então, ainda que de forma inexpressiva, vários

países passaram a garantir uma maior atenção àqueles, criando legislações

especiais para tratar do assunto.

No Brasil, em especial, após a transição de várias

legislações acerca dos acidentes de trabalho, atualmente, estes não gozam

sequer de uma legislação específica, restando disseminados nos artigos 19 a 23

da Lei de Benefícios da Previdência Social (Lei nº. 8.213/91).

Todavia, em que pese os acidentes de trabalho carecerem

de uma legislação específica no contexto nacional, os poucos artigos da Lei de

Benefícios da Previdência Social, que regulam a sua aplicação, já demonstram

uma profunda preocupação do legislador quanto à extensão da configuração dos

acidentes de trabalho, na medida em que estes restaram divididos em acidentes-

tipo, doenças ocupacionais e acidentes por equiparação, buscando, assim,

acolher todas as situações que podem ocorrer durante a prestação laboral, e que

venham a trazer danos à saúde e ou à integridade física do trabalhador, sem

prejuízo daquelas que, embora não previstas nesta condição, também venham a

ser consideradas como acidentes de trabalho, garantindo, portanto, uma maior

proteção ao empregado vítima de tais acidentes.

Neste capítulo, puderam ser constatadas, ainda, as

patologias que não são consideradas como acidente de trabalho, tais como as

degenerativas, as inerentes ao grupo etário, as que não produzem incapacidade

laborativa etc, sobre as quais, no entanto, dever-se-á ser feita uma minuciosa

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análise casuística, porquanto algumas delas podem levar a conclusão de que não

tenham qualquer ligação com a prestação laboral, mas na verdade a ela se

relacionam diretamente, como, por exemplo, a perda auditiva em razão dos altos

níveis de ruído proporcionados em determinados ambientes de trabalho, que,

muitas vezes, é tratada como uma simples patologia degenerativa, sem qualquer

vínculo com a atividade desenvolvida, não sendo, pois, enquadrada como

acidente de trabalho, prejudicando, por conseguinte, o direito do empregado à

percepção do respectivo benefício previdenciário acidentário, bem como à

postulação da indenização devida pelo empregador.

Dando seqüência à pesquisa, no segundo capítulo, buscou-

se investigar quais os danos que eventualmente podem ser ocasionados às

vítimas de acidentes de trabalho, ou aos seus dependentes.

Dentro deste capítulo, constatou-se que os acidentes de

trabalho ou as suas situações equiparáveis podem provocar danos de natureza

material, moral e ou estética.

Neste sentido, portanto, chegou-se a ilação de que,

dependendo de sua natureza e extensão, os acidentes de trabalho podem

ocasionar danos materiais, os quais dividem-se em danos emergentes e lucros

cessantes, além de danos morais e estéticos.

Os danos emergentes caracterizam-se por aqueles prejuízos

imediatos e pecuniariamente determináveis, tais como as despesas médico-

hospitalares, sessões de fisioterapia, despesas funerárias, dentre tantos outros

passíveis de serem ressarcidos monetariamente.

Assim como os danos emergentes, pôde ser visto no

decorrer desta pesquisa, que os acidentes de trabalho também podem ocasionar

danos de natureza moral à vítima ou aos seus dependentes, posto que a violação

à vida, à saúde, e à integridade física, causada por aqueles infortúnios, quase

sempre proporciona danos que ultrapassam os aspectos físicos e psíquicos,

gerando reflexos nas esferas afetiva, familiar, intelectual, ética e até mesmo

social, razão por que cabíveis, nestas situações, a condenação do empregador ao

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pagamento de danos morais, cabendo ressaltar, neste aspecto, que o montante

indenizatório não deverá visar a restituição de quantia equivalente ao abalo moral

sofrido, porquanto impossível tal equivalência, mas sim num lenitivo que atenue a

dor sofrida pela vítima ou por seus dependentes.

Tanto quanto nos danos morais, o empregador também

deve ser condenado ao pagamento dos danos estéticos que por ventura venham

a ser ocasionados em razão do acidente de trabalho, porquanto a perda ou a

mutilação de um membro, e toda e qualquer circunstância que proporcione um

“afeamento” da vítima, exige a reparação por parte daquele, a qual, aliás, deverá

ser arbitrada cumulativamente com os danos morais, se do acidente de trabalho

também resultarem danos desta natureza, porquanto visto que estes, embora

originários do mesmo fato, possuem naturezas e finalidades diversas, razão por

que a indenização a eles atribuída também deve ser aplicada separadamente.

Neste capítulo pôde ser visto, por fim, que os acidentes de

trabalho também podem ocasionar a condenação do empregador ao pagamento

dos lucros cessantes, porquanto em razão do acidente, a vítima e ou seus

dependentes podem deixar de auferir rendimentos que lhe seriam advindos, caso

não tivesse ocorrido o acidente de trabalho, como, por exemplo, na hipótese da

vítima ocupar dois empregos, e num deles, vir a sofrer o acidente de trabalho, de

forma que assim, embora venha a perceber o benefício previdenciário acidentário,

restará privado dos rendimentos que auferia na sua outra atividade, razão por que

estes também lhe devem ser indenizados.

O terceiro capítulo destinou-se à demonstração dos

pressupostos da responsabilidade civil, sobre a qual foram tecidas breves

considerações e apresentados os seus principais requisitos, consubstanciados

em ação, culpa, dano e nexo de causalidade, buscando-se comparar, assim, se

os requisitos da responsabilidade civil comum são os mesmos exigidos na

responsabilidade civil do empregador, quando da ocorrência dos acidentes de

trabalho.

Com base na pesquisa elaborada dentro deste capítulo,

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pôde-se constatar que para a configuração da responsabilidade civil devem

sempre restar preenchidos os requisitos acima elencados, com a exceção do

elemento culpa, cuja ausência já vem sendo admitida por alguns dispositivos da

legislação pátria, os quais já passaram a admitir a responsabilização do agente

causador do dano, independentemente da existência de culpa.

No quarto e último capítulo, fez-se um estudo acerca da

responsabilidade civil do empregador nos acidentes de trabalho, buscando

investigar em qual contexto tal problemática se encontra atualmente, bem como

os requisitos exigidos para a sua configuração.

Neste capítulo, portanto, pôde-se concluir que a

responsabilidade civil pode ser: subjetiva, quando carece da comprovação do

elemento culpa; objetiva, quando mostra-se desnecessária a comprovação de

culpa por parte do agente; contratual, quando decorre da violação de um contrato

previamente estabelecido entre as partes; extracontratual, quando decorre da

violação de um dever jurídico preexistente.

A partir de tais fundamentos, passou-se a investigar se a

responsabilidade civil do empregador nos acidentes de trabalho é subjetiva ou

objetiva, isto é, se há a necessidade da vítima comprovar a culpa do empregador

para a sua ocorrência, ou exige-se apenas a demonstração do dano e do nexo de

causalidade, conforme preconiza a teoria objetiva.

Feitas as indagações pertinentes, chegou-se a ilação de que

atualmente a responsabilidade civil aplicável aos acidentes de trabalho, é ainda

responsabilidade civil subjetiva, no entanto, ante as crescentes modificações da

vida em sociedade, tais como a inserção de novas tecnologias, a produção de

bens em larga escala, o aumento das causas geradoras de perigo, dentre tantos

outros fatores, passaram a exigir uma maior atenção à vítima, de modo que, a

partir de então, a responsabilidade civil objetiva vem paulatinamente ganhando

mais espaço no ordenamento jurídico pátrio, passando da sua condição de

exceção, para um campo tão amplo quanto o até então ocupado pela teoria

subjetiva.

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Todavia, como a aplicação da responsabilidade objetiva nos

acidentes de trabalho ainda desperta grandes embates jurídicos, a doutrina e a

jurisprudência tem a admitido somente nos casos em que efetivamente restar

demonstrada a dificuldade da vítima em comprovar a culpabilidade do

empregador para a ocorrência daqueles infortúnios, de forma que, enquanto tal

questão não estiver definida no ambiente jurídico nacional, a medida em que vem

se mostrando mais razoável em tais casos, é a presunção de culpa do

empregador, com a conseqüente inversão do ônus da prova, tal como ocorre nas

relações consumeiristas.

Isso porque, assim não estar-se-á admitindo objetivamente a

responsabilidade do empregador na ocorrência do acidente de trabalho, mas em

razão deste possuir uma facilidade maior na trazida das provas controvertidas,

mostra-se mais viável exigir que este comprove a ausência de sua culpabilidade,

ao invés de deixar o ônus da prova a cargo da vítima, que, como visto,

freqüentemente não consegue obter êxito na demanda indenizatória tão-somente

por não conseguir demonstrar a culpabilidade do empregador.

Dentro deste capítulo, foram trazidas, ainda, as teorias que

visam delimitar ou ampliar a aplicação da responsabilidade objetiva, quais sejam,

a do risco-proveito, risco profissional, risco excepcional, risco criado, e a do risco

integral, bem como as hipóteses que excluem a responsabilidade civil do

empregador, consubstanciadas na culpa exclusiva da vítima, fato exclusivo de

terceiro, caso fortuito e força maior.

Por fim, retoma-se as quatro hipóteses básicas da pesquisa:

a) pelo que foi demonstrado no decorrer do estudo, mostra-se plenamente cabível

a responsabilização objetiva do empregador pelos danos causados nos acidentes

de trabalho, muito embora ainda haja uma forte resistência de parte da doutrina e

da jurisprudência em admitir tal realidade; b) as alterações trazidas pelo Novo

Código Civil no campo da responsabilidade civil, sobretudo, com a adoção da

teoria do risco, são aplicáveis aos acidentes de trabalho, porquanto a Constituição

Federal, em seu artigo 7º, XXVIII, garantiu ao empregado, vítima de acidente de

trabalho, o direito a indenização devida pelo empregador quando este incorrer

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com dolo ou culpa para a sua ocorrência, sem prejuízo de outros que visem a

melhoria de sua condição social, razão por que as aquelas alterações trazidas

pelo Novo Código Civil podem ser aplicadas em benefício do trabalhador; c) em

razão da resistência quanto à adoção da responsabilidade objetiva nos acidentes

de trabalho, tem se mostrado perfeitamente viável a aplicação da presunção de

culpa do empregador, com a conseqüente inversão do ônus da prova,

possibilitando, assim, que este demonstre a ausência de sua culpabilidade,

retirando da vítima, portanto, o ônus probatório; d) o fato da vítima ou seus

dependentes virem a perceber benefícios previdenciários acidentários, não exclui,

tampouco atenua a indenização devida pelo empregador, pois como visto, tais

prestações possuem fatos geradores e naturezas completamente diversas,

cabendo ressaltar, portanto, que todas as hipóteses levantadas foram

integralmente confirmadas.

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