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A Sociedade Pós-Capitalista na Era do Acesso, artigo de Thiago Carvalho de Sousa e Paulo Eduardo Azevedo Silveira A nova sociedade será uma sociedade do conhecimento. Durante o século 20, a força predominante política e socialmente fora o operário desqualificado e braçal, mas isto está prestes a mudar. A sociedade baseada no conhecimento quebra as fronteiras: o conhecimento estará ao alcance de todos. É com esse discurso que Peter Drucker traz a tona o que a tecnologia da informação acarretará ao capitalismo. Peter Drucker é o criador da expressão “trabalhador do conhecimento”, ao lado de Fritz Machlup, economista de Princeton, que cunhara “empresas do conhecimento”. Jeremy Rifkin, economista americano, também discursa sobre as mudanças que o conhecimento trará para essa nova era, a qual ele se refere pela “Era do Acesso”; em seu recente livro, de mesmo nome, Rifkin estuda os efeitos desse acesso ao conhecimento para o capitalismo. É sobre este livro que este texto se baseia, após um estudo minucioso de seus capítulos. Alguns trechos se referem a opinião argumentada dos autores deste texto. Em apenas 100 anos, o trabalho agrícola deixou de ser o setor com maior participação da população, para ocupar apenas 25% no início deste século. A maioria ainda se encontra no setor industrial, porém este também vem sofrendo queda percentual. O grupo que mais vem crescendo é o dos “trabalhadores do conhecimento“, cujos empregos necessitam de alto nível escolar. Nos Estados Unidos, esse setor já ocupa um terço da força de trabalho. Os trabalhadores do conhecimento se diferenciam dos operários manuais. Aqueles são “profissionais”, e não “trabalhadores”, isto é, eles utilizam-se de um conhecimento adquirido formalmente (escola, faculdade, …) para realizar o seu trabalho. Esses trabalhadores do conhecimento necessitam de uma educação formal, que concede a eles a habilitação necessária para a sua profissão. E além disso, também precisam estar se renovando sempre, para se

A Sociedade Pós-Capitalista na Era do Acesso

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Artigo de Thiago Carvalho de Sousa e Paulo Eduardo Azevedo Silveira

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A Sociedade Pós-Capitalista na Era do Acesso, artigo de Thiago Carvalho de Sousa e Paulo Eduardo Azevedo Silveira

A nova sociedade será uma sociedade do conhecimento.

Durante o século 20, a força predominante política e socialmente fora o

operário desqualificado e braçal, mas isto está prestes a mudar. A

sociedade baseada no conhecimento quebra as fronteiras: o

conhecimento estará ao alcance de todos.

É com esse discurso que Peter Drucker traz a tona o que a tecnologia da

informação acarretará ao capitalismo. Peter Drucker é o criador da

expressão “trabalhador do conhecimento”, ao lado de Fritz Machlup,

economista de Princeton, que cunhara “empresas do conhecimento”.

Jeremy Rifkin, economista americano, também discursa sobre as

mudanças que o conhecimento trará para essa nova era, a qual ele se

refere pela “Era do Acesso”; em seu recente livro, de mesmo nome,

Rifkin estuda os efeitos desse acesso ao conhecimento para o

capitalismo. É sobre este livro que este texto se baseia, após um estudo

minucioso de seus capítulos. Alguns trechos se referem a opinião

argumentada dos autores deste texto.

Em apenas 100 anos, o trabalho agrícola deixou de ser o setor com

maior participação da população, para ocupar apenas 25% no início

deste século. A maioria ainda se encontra no setor industrial, porém

este também vem sofrendo queda percentual.

O grupo que mais vem crescendo é o dos “trabalhadores do

conhecimento“, cujos empregos necessitam de alto nível escolar. Nos

Estados Unidos, esse setor já ocupa um terço da força de trabalho.

Os trabalhadores do conhecimento se diferenciam dos operários

manuais. Aqueles são “profissionais”, e não “trabalhadores”, isto é, eles

utilizam-se de um conhecimento adquirido formalmente (escola,

faculdade, …) para realizar o seu trabalho.

Esses trabalhadores do conhecimento necessitam de uma educação

formal, que concede a eles a habilitação necessária para a sua profissão.

E além disso, também precisam estar se renovando sempre, para se

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manterem atualizados. A educação terminava quando começava o

trabalho, na sociedade do conhecimento a educação não tem fim.

Trabalhadores altamente qualificados precisam de uma entidade onde

possam aplicar suas especialidades e organizá-las para algum propósito

(chamada de instituição por Phil Agre). Essas instituições sofrem

transformações raras e muito lentas no seu modo de pensar e

funcionar. A sociedade do conhecimento vem iniciando uma nova

mudança.

O conhecimento passa a tomar o lugar de principal recurso econômico.

“Produzir mais, com menos trabalhadores”. Esse é o paradoxo da

indústria na sociedade do conhecimento.

Há 40 anos atrás, o preço da mão de obra representava 30% do preço

final da produção. Hoje não passa de 15%. Os trabalhadores industriais

estão, gradativamente, deixando de ser o principal mercado de

consumo.

Previsões indicam que em 2020 a produção industrial irá dobrar, porém

o número de pessoas envolvidas cairá de 20% para 12%. Nos Estados

Unidos, essa transição já ocorrera.

O declínio da indústria como geradora de riquezas e empregos irá

propiciar o nascimento de um novo protecionismo, como o que

acontecera na agricultura, setor no qual os países desenvolvidos

possuem uma fortíssima estratégia de subsídios governamentais.

Durante o século 20, a indústria foi completamente a favor de um

comércio livre, sem fronteiras. Agora a mesma torna-se inimiga dessa

globalização e a favor de uma prática protecionista de seu mercado.

1- Entrando na Era do Acesso

A Economia de Mercado (capitalista), que é baseada no processo de

vender e comprar mercadorias está ultrapassada. A sociedade está

repensando que tipo de relações quer cultivar. Na nova era, os

mercados estão aderindo ao sistema de redes. O conceito de

propriedade que era tão importante está sendo transformado. Ela deixa

a empresa lenta demais, e como o mundo está com uma cultura cada

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vez mais veloz, a propriedade torna-se quase que imediatamente

desatualizada. A propriedade não irá desaparecer, mas não será mais

negociada em mercados. As pessoas apenas comprarão o acesso a ela.

Na nova era, as empresas podem fazer leasing, alugar ou cobrar taxas

pela utilização de um bem. A relação entre vendedor e comprador é

substituída pelo acesso. Antigamente o capital físico era o fator mais

importante, mas hoje foi superado pelo capital intelectual. A riqueza é

contabilizada pela imaginação e criatividade humana, e não mais pelo

capital físico. E as empresas que possuem capital intelectual têm

vantagem competitiva em relação às outras e exercem controle sobre as

regras a serem seguidas pelos usuários.

A Era do Acesso transforma a cultura humana e a vida como um todo

em commodity, mudando radicalmente o conceito de trabalho. Criou-se

então o comércio baseado em experiências pessoais. As tarefas

rotineiras estão sendo substituídas pela automatização, ou seja,

“máquinas inteligentes”.

Infelizmente, a Era do Acesso apenas é acessível a pessoas com grande

poder aquisitivo, o que caracteriza a defasagem social e econômica.

2-Quando os Mercados dão Lugar às Redes

A computação está transformando o mercado em um sistema nervoso

global, onde o comércio é o ciberespaço e a economia é a rede. Há

vários tipos de redes para empresas de fornecedores, clientes, produtos

e cooperação tecnológica visando o desenvolvimento dos produtos e

otimização dos lucros.

A lei de Moore diz que o processamento de chips dobra a cada 18 meses

e seu custo de produção diminuiria ou tornar-se-ia constante. O ciclo de

vida dos produtos está diminuindo, pois logo que são lançados já

precisam de inovações. Há estimativas de que 20% do conhecimento de

uma empresa ficará obsoleto após um ano. Empresas estão se unindo e

fazendo uma espécie de seguro coletivo para conseguir acompanhar

essa evolução tão rápida.

A indústria cinematográfica é um exemplo a ser analisado, pois o risco

de seu produto (o filme) é grande e os investimentos são bastante altos.

É um mercado onde ter acesso é essencial, assim como ser mutável e

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capaz de acompanhar as rápidas mudanças das condições econômicas.

Estas empresas empregam poucas pessoas pois todo o seu trabalho é

realizado por agentes independentes, que trabalham com elas em

parcerias temporárias para facilitar sua eficácia e agilidade no

acompanhamento dessas mudanças.

3- A Economia sem Peso

O avanço tecnológico está fazendo com que os produtos fiquem cada

vez menores e mais leves. Um computador que antes pesava 20 quilos

hoje pesa 3 quilos e é bem mais potente. Além dos produtos, o que

também está encolhendo são os imóveis. Isso faz com que os

escritórios tornem-se espaços mais sociáveis onde todos trabalham

juntos, facilitando a comunicação. Esses espaços abertos aumentam a

produtividade, pois todo o processo torna-se mais rápido.

Com a utilização da técnica just-in-time, os estoques também estão

perdendo peso. Isso faz com que as empresas economizem no custo de

armazenagem. O dinheiro está se desmaterializando e sendo

comercializado em redes eletrônicas. Isso traz como consequência o

declínio da poupança e o aumento da dívida pessoal, pois o que

prevalece hoje é o ágio rápido e não a acumulação.

4- Monopolizando Ideias

As redes estão invadindo o novo sistema capitalista, no qual o mercado

prevalecia. Nesse tipo de negócio, a relação vendedor-comprador é

substituída por fornecedores e usuários e a propriedade intangível

ganha força em uma era baseada no acesso.

A franchising é um exemplo de negócio entre fornecedor e usuário.

Empresas-mãe concedem a franquia, o acesso a um conceito de negócio

e este conceito está relacionado a ativos intangíveis como marca,

procedimentos, etc. Funciona como um clone do negócio original. Nessa

negociação, o franqueador fornece, além da licença, equipamentos,

treinamento, entre outras coisas para que tudo tenha um padrão, pois

todas as franquias devem ser padronizadas, desde atendimento até o

local físico.

Este é um tipo de negócio onde todos ganham. Hoje, praticamente todo

produto ou serviço intangível está sendo franqueado. Até genes,

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sementes e animais clonados são alugados. Mas a essência do negócio,

que são os aspectos intangíveis, continua sendo propriedade do

franqueador. A verdadeira propriedade é daqueles que possuem know-

how, conceitos e ideias.

5- Tudo São Serviços

Mudanças radicais estão ocorrendo na organização das relações

econômicas. Os produtos são transformados de bens para serviços, ou

seja, os produtos são apenas coadjuvantes, já que o serviço que vem

incluso na compra do bem predomina na hora da compra. Isso porque

os produtos viraram commodities. Um exemplo é o sucesso do leasing,

onde os proprietários continuam sendo os fabricantes ou revendedores.

Eles apenas alugam o bem a seus clientes, que têm apenas o acesso e

não a posse. É a reestruturação do sistema capitalista.

Antigamente, as pessoas pertenciam a terra. Depois foi criada a

propriedade privada que mudou a natureza das relações humanas.

Os serviços foram criados para auxiliar a produção e a distribuição dos

bens. Eles não são classificados como propriedades. São imateriais e

intangíveis. Assim, o conceito que define a vida social não é mais a

propriedade.

Hoje, os produtos recebem melhorias e serviços de valor agregado.

Neste novo sistema, são os serviços e as melhorias que contam no

produto. Vários produtos, como as enciclopédias, estão sendo

desmaterializados em serviços. Isso possibilita economia de recursos,

menos poluição, ou seja, menos prejuízo ambiental. O cliente não

compra o produto em si, e sim o que eles fazem. Assim, a venda

(vendedor-comprador) é substituída pelo acesso (servidor-cliente).

6- Transformando as Relações Humanas em Commodities

Com a superprodução da geração pós-Segunda Guerra Mundial, os

mercados dos clientes ficaram saturados. Daí surgiu a preocupação com

o cliente, pois era preciso diferenciar os produtos para ganhar a

concorrência. Assim, a perspectiva de marketing ganhou papel

importante na vida comercial. Controlar o cliente passa a ser a nova

meta.

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A nova economia traz a Era do Acesso. E ela é definida pela

transformação das experiências humanas em commodities e por novas

perspectivas de marketing, onde a prioridade é estabelecer relações

sólidas com seus clientes.

A preocupação com a participação no mercado foi substituída pela

preocupação com o cliente. O foco não é vender um único produto ao

máximo de clientes e sim vender o máximo de produtos a um único

cliente. Assim se conquista e mantém a fidelidade do cliente. E com as

novas tecnologias de relacionamento, como códigos de barras ou

programas especiais, é possível saber o tipo de cliente, o que ele gosta,

a frequência de compra, etc. Isto é, o feedback permite às empresas

prever e suprir as necessidades do cliente. As empresas passam a atuar

como agentes, encontrando maneiras efetivas de estabelecer, melhorar

e manter o relacionamento com os clientes.

Para atingir a fidelidade do cliente e criar relacionamentos duradouros, é

preciso estabelecer “comunidades de interesse”. Em primeiro lugar,

elas tornam o cliente consciente dos produtos e serviços. Assim, o

cliente se identifica com o produto ou serviço e passa a ter um

relacionamento mais interativo com a empresa. Depois são promovidos

eventos onde os clientes de uma mesma empresa, que possuem

interesses em comum, possam se encontrar. Isso é um marco na nova

forma de condução de comércio.

7- O Acesso Como um Modo de Vida

A Era do Acesso está se solidificando através da troca de valores. O que

antes era representado pela propriedade, hoje é representado pela

economia de rede ou relações de acesso. Com ativos intangíveis,

perspectiva de marketing e a valorização dos relacionamentos, a

reestruturação da economia se desenvolve.