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UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE FISIOTERAPIA A TÉCNICA DE DIAFIBRÓLISE PERCUTÂNEA NO TRATAMENTO DAS ADERÊNCIAS E CICATRIZES Paulo Caminha de Amorim Vassouras 2005

A TÉCNICA DE DIAFIBRÓLISE PERCUTÂNEA NO … · 2014-11-17 · para suas atividades de lazer e profissionais, retorna à vida corriqueira. ... segunda guerra mundial. ... • Nas

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UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

CURSO DE FISIOTERAPIA

A TÉCNICA DE DIAFIBRÓLISE PERCUTÂNEA

NO TRATAMENTO DAS ADERÊNCIAS E CICATRIZES

Paulo Caminha de Amorim

Vassouras

2005

UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

CURSO DE FISIOTERAPIA

A TÉCNICA DE DIAFIBRÓLISE PERCUTÂNEA

NO TRATAMENTO DAS ADERÊNCIAS E CICATRIZES

Monografia apresentada pelo

acadêmico Paulo Caminha de

Amorim, orientado pelo Professor

Henrique M. C. Baumgarth, como

requisito para obtenção do grau em

Bacharel em Fisioterapia.

Vassouras

2005

ii

FICHA CATALOGRÁFICA

AMORIM, Paulo Caminha de. A Técnica de Diafibrólise Percutânea no

Tratamento das Aderências e Cicatrizes. Vassouras, 2005 – 50 páginas.

Inclui Bibliografia

Monografia (Bacharelado)

A Técnica da Diafibrólise Percutânea

iii

UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

CURSO DE FISIOTERAPIA

Paulo Caminha de Amorim

A TÉCNICA DE DIAFIBRÓLISE PERCUTÂNEA

NO TRATAMENTO DAS ADERÊNCIAS E CICATRIZES

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)

apresentado ao Curso de Fisioterapia da

Universidade Severino Sombra para obtenção

do grau de Bacharel em Fisioterapia.

Aprovado em Junho de 2005, com média ....................

BANCA EXAMINADORA

______________________________

Professor

______________________________ Professor

______________________________ Professor

Vassouras

2005

iv

A minha mãe, esposa e filhos, pelo

apoio, incentivo e paciência nos

anos de minha graduação.

v

“O professor se liga à eternidade;

ele nunca sabe onde cessa a sua

influência”.

- Henry Adams -

vi

Resumo

O presente trabalho tem a finalidade de esclarecer a respeito da Técnica

de Diafibrólise Percutânea, apresentando sua aplicabilidade, bem como

demonstrar a eficiência de seus resultados no tratamento das aderências e

cicatrizes, servindo também de contribuição para o desenvolvimento e pesquisa

para os diversos profissionais que atuam na área de saúde.

vii

SUMÁRIO

Ficha Catalográfica .............................................................................................. ii

Ficha de Aprovação ............................................................................................. iii

Agradecimento .................................................................................................... iv

Epígrafe ............................................................................................................... v

Resumo ................................................................................................................ vi

Capítulo I

Introdução ..................................................................................................... 8

1.1 – Objetivos ......................................................................................... 9

1.1.1 – Objetivo Geral ................................................................... 9

1.1.2 – Objetivos Específicos ....................................................... 9

1.2 – Justificativa ..................................................................................... 9

Capítulo II

2 – Desenvolvimento ........................................................................................... 10

2.1 – Conceito e Definição ....................................................................... 10

2.2 – A Técnica da Diafibrólise Percutânea ............................................. 10

2.2.1 – Definição ............................................................................ 10

2.2.2 – Histórico ............................................................................. 11

2.2.3 – Os efeitos da Diafibrólise Percutânea ................................ 11

2.3 - A Pele ............................................................................................... 16

2.3.1 – Definição ............................................................................ 16

2.3.2 – Epiderme ............................................................................ 17

2.3.3 – Derme ................................................................................. 21

2.3.4 – Hipoderme .......................................................................... 21

2.4 – O Tecido Conjuntivo e sua importância para o movimento ............. 22

2.5 – Processo de Cicatrização ................................................................ 25

2.5.1 – Definição ............................................................................ 25

2.5.2 – Fatores de crescimento: reguladores do reparo................. 34

2.5.3 – Remodelagem e formação de matriz ................................. 36

Capítulo III

3 - Conclusão........................................................................................................ 47

Referências Bibliográfiacas ................................................................................. 48

Anexos ................................................................................................................. 50

8

CAPÍTULO I

1 - INTRODUÇÃO

A Crochetagem é uma técnica de tratamento fisioterapêutico ainda pouco

conhecida, tanto em suas aplicabilidades quanto em seus resultados.

A proposta deste trabalho é de apresentar a aplicabilidade da técnica e

demonstrar a eficácia de seus resultados para o tratamento das aderências

cicatriciais e suas conseqüências físico-funcionais.

As cicatrizes, provenientes de traumatismos ou de fibrose cicatricial

cirúrgica, geram progressivamente aderências entre os planos teciduais, limitando

o movimento normal entre eles. A Crochetagem percutânea promove uma ação

mecânica nestas aderências causando uma liberação e permitindo que possam

ocorrer novamente deslizamentos entre os planos tissulares.

As aderências cicatriciais também podem trazer conseqüências para o

sistema músculo-esquelético, resultando em alterações funcionais. As amplitudes

totais fisiológicas dos movimentos nas articulações, relacionadas direta e

indiretamente com a região anatômica da cicatriz, podem estar prejudicadas pela

aderência dos tecidos moles provenientes do processo de cicatrização.

A motivação para a realização deste trabalho justifica-se na observação da

técnica durante a prática clínica dos profissionais, nas clínicas fisioterapêuticas, e

no alto índice de eficiência da mesma. Outro fator relevante é a rapidez de

resultados, não sendo raro observar-se à conclusão do tratamento em apenas

uma sessão.

A eficiência e a rapidez de resultados recupera não só a saúde física, como

também atinge a esfera social do paciente. A importância social fica logo

demonstrada quando o paciente, por não sofrer as conseqüências de um

tratamento longo ou de uma enfermidade que de alguma forma seja incapacitante

para suas atividades de lazer e profissionais, retorna à vida corriqueira.

Rapidamente recuperado da disfunção física, este paciente pode retornar às suas

atividades normais sem que tenha sido afetada sua saúde social e, desta

maneira, também se preserva uma possível conseqüência psicológica.

9

No Brasil, a técnica é difundida e utilizada principalmente por

fisioterapeutas, tendo sida aperfeiçoada pelo Fisioterapeuta Professor Mestre

Henrique Baumgarth.

1.1 – Objetivos

1.1.1 – Objetivo Geral

Sensibilizar e despertar o desejo de maior conhecimento sobre a utilização

da Diafibrólise Percutânea no campo da Fisioterapia

1.1.2 – Objetivo Específico

A crochetagem é uma técnica de tratamento fisio terapêutico ainda pouco

conhecida.

Este trabalho tem como objetivo específico apresentar sua aplicabilidade, e

demonstrar a eficácia de seus resultados para o tratamento das aderências

cicatriciais e suas conseqüências físico-funcionais.

1.2 – Justificativa

O presente trabalho se justifica na observação do alto índice de eficiência

da técnica aplicada no projeto de atendimento fisioterapêutico a funcionários da

Universidade Severino Sombra, desenvolvido no laboratório de cinesioterapia:

coordenado pelo Professor Henrique Baumgarth.

10

CAPÍTULO II

2 – DESENVOLVIMENTO

2.1 – Conceito e definição

Conceito de saúde e a importância da rápida reabilitação.

Saúde é o completo estado de bem-estar físico, mental e social e não

somente a ausência de doença ou enfermidade (WORLD HEALTH

ORGANIZATION, 1946). A partir deste conceito percebemos que a saúde do

indivíduo é representada em três esferas. Logo um problema de caráter físico

pode trazer limitações tanto mentais, como sociais, e é neste pensamento que se

caracteriza a importância de um tratamento de resultados rápidos como a

Crochetagem percutânea. O indivíduo que encontra-se prejudicado em sua saúde

física, quando prontamente reabilitado, retornará rapidamente as atividades

profissionais não sendo afetado na esfera social de sua saúde. Este breve retorno

ao trabalho, faz com que o indivíduo não se afaste ou sinta-se ineficiente e

incapaz em seu papel social.

2.2 – A Técnica da Diafibrólise Percutânea

2.2.1 – Definição

Fibrólise: alongamentos, ruptura das fibras.

Percutânea: projeção das estruturas anatômicas sobre a pele.

A Diafibrólise Percutânea ou crochetagem é um método de tratamento das

algias mecânicas do aparelho locomotor, pela destruição das aderências e dos

corpúsculos irritativos inter-aponeuróticos ou mio-aponeuróticos através de

ganchos colocados e mobilizados sobre a pele. (BAUMGART, Henrique 2001)

11

2.2.2 – Histórico

O fundador desta técnica é o fisioterapeuta sueco Kurt Ekman. Ele

trabalhou na Inglaterra ao lado do Dr. James. Cyriax durante os anos pós

segunda guerra mundial. Frustrado por causa dos limites palpatório das técnicas

convencionais, inclusive a massagem transversa profunda de Cyriax, ele elaborou

progressivamente uma série de ganchos e uma técnica de trabalho.

A sua reputação se desenvolveu depois do tratamento com sucesso de

algias occipitais do nervo de Arnold , de epicondilites rebeldes e de tendinites de

Aquiles rebeldes.

Durante os anos 70, ele ensinou seu método para vários colegas, como P.

Duby e J. Burnotte. Estes, perpetuaram o ensino de Ekman lhe dando uma

abordagem menos sintomática da patologia.

De fato, no inicio Ekman tinha uma abordagem direta e agressiva, ou seja,

dolorosa. Esta abordagem prejudicou durante muito tempo a técnica. P. Duby e J.

Burnotte se inspiraram no conceito de cadeias musculares e da filosofia da

osteopatia para desenvolver uma abordagem da lesão mais suave, através da

Diafibrólise Percutânea.

2.2.3 – Os efeitos da diafibrólise percutânea:

Ação mecânica :

• Nas aderências fibrosas que limitam o movimento entre os planos de

deslizamento tissulares.

• Nos corpúsculos fibrosos (depósitos úricos ou cálcios) localizados

geralmente nos lugares de estases circulatório e próximo ás articulações.

• Nas cicatrizes e hematomas, que geram progressivamente aderências

entre os planos de deslizamento.

• Nas proeminências ou descolamentos periósteos.

Efeito circulatório

• A observação clínica dos efeitos da diafibrólise percutânea parece

demonstrar um aumento da circulação sanguínea e provavelmente

12

da circulação linfática. Ainda , o rubor cutâneo que segue uma

sessão de crochetagem parece sugerir uma reação histâmica .

Efeito reflexo

• A rapidez dos efeitos da diafibrólise percutânea, principalmente

durante a crochetagem ao nível dos trigger points ( gatilho , de

inibição , do tipo Knapp , Jones , Travell) sugerem a presença de um

efeito reflexo .

Principais indicações

• As aderências consecutivas a um traumatismo levando a um

derrame tecidual.

• As aderências consecutivas a uma fibrose cicatricial iatrogenica

cirúrgica.

• As algias inflamatórias ou não inflamatórias do aparelho locomotor :

míosite , epicondilites , tendinites , periartrites, pubalgia , lombalgia,

torcicolo .... .

• As nevralgias consecutivas a uma irritação mecânica dos nervos

periféricos , occipitalgia do nervo de Arnold, nevralgia cervico-

braquial , nevralgias intercostais , ciatalgia.

• As síndromes tróficas dos membros: algoneurodistrofia , canal do

carpo .

Principais contra-indicações

• O terapeuta:agressivo ou não acostumado com o método .

• Os maus estados cutâneos : pele hipotrófica, pele com úlceras , as

dermatoses ( eczema , psoríase )

• Os maus estados circulatórios fragilidade capilar sanguínea, reações

hiperhistaminicas , varizes venosas , adenomas

• Pacientes que estão fazendo uso de anticoagulantes

• Abordagens demasiadamente direta em processos inflamatórios

(tenosinovite , ...)

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• Psicológica (estresse , emoções , ... ) idade ( crianças ou idosos ) ou

solicitação do paciente .

Descrição do material:

Depois de ter testado vários materiais tal a madeira, osso, e outros, K.

Ekman , criou uma série de ganchos de aço para atender às exigências do seu

método.

Cada gancho apresenta uma curvatura diferente permitindo o contato com

os múltiplos acidentes anatômicos que se interpõem entre a pele e as estruturas a

serem tratadas .

Cada curvatura se acaba em uma espátula que permite reduzir a pressão

exercida sobre a pele. isto permite reduzir a irritação cutânea provocada pelo

instrumento. Além disso, cada espátula apresenta uma superfície externa

convexa e uma superfície interna plana . Esta configuração cria entre as duas

superfícies um bordo bisoté e desgastado.

Esta estrutura melhora a interposição da espátula entre os planos

tissulares profundos inacessíveis pelos dedos do terapeuta, e permite a

crochetagem das fibras conjuntivas delgadas ou dos corpúsculos fibrosos em

vista de uma mobilização eletiva .

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Descrição do método :

O princípio do tratamento se baseia numa abordagem do tipo "centrípeta".

Na presença de uma dor localizada num local específico, o terapeuta inicia sua

busca palpatória manual nas regiões afastadas ( proximais e distais ) do foco

doloroso.

Esta busca palpatória segue cadeias lesionais que estão em relação

anatômica (mecânica, circulatória e neurológica) com a lesão . Esta concepção

permite evitar o aumento da dor, chamado de efeito rebote, conseqüência de um

tratamento exclusivamente sintomático.

Esta descrição se aplica a um terapeuta destro, que segura seu gancho na

mão direita e que palpa com a mão esquerda.

A técnica da diafibrólise percutânea comporta três fases sucessivas:

palpação digital, palpação instrumental, e fibrólise

Fases:

• Palpação digital:

Esta primeira fase se realiza com a mão esquerda do terapeuta . Ela consiste

em uma espécie de amassamento digital que permite delimitar grosseiramente as

áreas anatômicas a tratar.

• Palpação instrumental:

Esta segunda fase se realiza com ajuda do gancho escolhido em função do

volume da estrutura anatômica a tratar. Ela permite localizar com precisão as

fibras conjuntivas aderentes e os corpúsculos fibrosos.

A espátula do gancho coloca-se ao lado do indicador localizador da mão

esquerda. O conjunto estando perpendicular às fibras tissulares a serem

tratadas.

A mão esquerda cria uma "onda" com os tecidos moles. O polegar

esquerdo coloca a onda dentro do gancho. A penetração e a busca palpatória são

efetuadas através de movimentos lentos antêro-posteriores. Durante esta última

fase o movimento da mão esquerda precede o da mão direita, o que permite

reduzir as solicitações dos tecidos pelo gancho.

A impressão palpatória instrumental traduz por um lado, uma resistência

momentânea, seguida de um ressalto durante a passagem da espátula do gancho

15

num corpo fibroso, e por outro lado, uma resistência seguida de uma parada

brusca quando encontra uma aderência.

Estas últimas impressões só podem ser percebidas quando o gancho está

em movimento, pelo indicador da mão direita repousado no gancho. Estas

sensações se opõem àquelas de fricção e de superfície lisa encontradas nos

tecidos saudáveis.

• A fibrólise

A terceira fase, a fibrólise corresponde ao tempo terapêutico.

Esta fase consiste, no final do movimento de palpação instrumental, em

uma tração complementar da mão que possui o gancho. Este movimento induz,

portanto, um cisalhamento, uma abertura, que se visualiza como um atraso breve

entre o indicador da mão palpatória e a espátula do gancho.

Esta tração complementar é feita para alongar ou romper as fibras

conjuntivas que formam a aderência , ou a deslocar ou a achatar o corpúsculo

fibroso.

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• A Técnica Perióstea

Esta técnica é utilizada para um trabalho de descolamento de áreas de

inserções ligamentares ou tendinosas no periósteo.

Ela consiste em uma " raspagem " superficial da estrutura anatômica, com

ajuda do gancho , associado á uma mobilização manual do tecido no periósteo .

Ela é utilizada para uma abordagem terapêutica articular: por exemplo, o joelho.

2.3 – A PELE

2.3.1 – Definição

A pele recobre a superfície do corpo e apresenta-se constituída por uma

porção epitelial de origem ectodérmica, a epiderme, e uma porção conjuntiva de

origem mesodérmica, a derme. Abaixo e em continuidade com a derme está a

hipoderme, que, embora tenha a mesma origem da derme, não faz parte da pele,

apenas lhe serve de suporte e união com os órgãos subjacentes. A pele é um dos

maiores órgãos, atingindo 16% do peso corporal. Apresenta múltiplas funções,

entre as quais, graças à camada córnea que reveste a epiderme, proteger o

organismo contra a perda de água por evaporação (dessecação) e contra o atrito.

Além disso, através das suas terminações nervosas, está em comunicação

constante com o ambiente; por meio dos seus vasos, glândulas e tecido adiposo,

colabora na termorregulação do corpo. Suas glândulas sudoríparas participam da

termorregulação e da excreção de várias substâncias. Um pigmento que é

produzido e acumulado na epiderme, a melanina, tem função protetora contra os

raios ultravioleta. Na pele se forma vitamina D, pela ação da radiação ultravioleta

do sol sobre precursores sintetizados pelo organismo. Possuindo linfócitos na

derme e células apresentadoras de antígenos na epiderme, a pele tem importante

papel nas respostas imunitárias do organismo aos alérgenos que entram em

contato com ela.

O limite entre a epiderme e a derme não é regular, apresentando saliências

e reentrâncias das duas camadas, que imbricam e se ajustam entre si,

aumentando a coesão entre a epiderme e a derme. As projeções da derme

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recebem o nome de papilas dérmicas. Na pele observam-se várias estruturas

anexas, que são os pêlos, unhas e glândulas sudoríparas e sebáceas.

2.3.2 – Epiderme

É constituída por epitélio estratificado pavimentoso queratinizado, de

origem ectodérmica. A epiderme apresenta ainda três tipos de células: os

melanócitos e as células de Langerhans e de Merkel. Os melanócitos são células

que se originam das cristas neurais do embrião e invadem a pele entre a 12a e a

14.a semanas da vida intrauterina. Essas células produzem, um pigmento

chamado melanina. A espessura e a estrutura da epiderme variam com o local

estudado, sendo mais espessa e complexa na palma da mão e planta do pé.

Nessas regiões atinge a espessura de até 1,5 mm e apresenta, vista da derme

para a sua superfície, as seguintes camadas.

• Camada basal, constituída por células prismáticas ou cubóides repousando

sobre membrana basal que separa a epiderme da derme. Essa camada,

que contém as células-fonte da epiderme, é também chamada de

germinativa.

Apresenta intensa atividade mitótica, sendo responsável pela constante

renovação da epiderme. Calcula-se que a epiderme humana se renova

cada 20 a 30 dias. As células da camada basal contêm filamentos

intermediários constituídos de queratinas. A medida que a célula se

diferencia e avança para a superfície, o número destes filamentos

aumenta, e na camada córnea as queratinas constituem a metade das

proteínas totais desta camada.

• Camada espinhosa, constituída por células poligonais cubóides ou

ligeiramente achatadas, de núcleo central com pequenas expansões

citoplasmáticas que contêm tonofibrilas partindo de cada uma das células

adjacentes. Essas expansões citoplasmáticas se aproximam e se mantêm

unidas através dos desmossomos, o que dá à célula um aspecto

espinhoso. Ao microscópio eletrônico verificou-se que as tonofibrilas são,

na realidade, feixes de filamentos intermediários de queratina que

terminam inserindo-se em desmossomos, estruturas estas freqüentes e

bem desenvolvidas nessas células. As tonofibrilas e desmossomos têm

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importante função na manutenção da coesão das células da epiderme e na

sua resistência ao atrito.

• Camada granulosa, que é caracterizada pela presença de células

poligonais achatadas, com núcleo central, em cujo citoplasma são

observados grânulos grosseiros e basófilos. São os grânulos de

queratohialina, que não são envolvidos por membrana e vão contribuir para

a constituição do material citoplasmático interfilamentoso da camada

córnea.

Além desses grânulos, as células da camada granulosa produzem grânulos

envolvidos por membrana, de substância fosfolipídica associada a

glicosaminoglicanas. Estes grânulos são expulsos das células e contribuem

para a formação do material extracelular que é importante para tornar a

camada granulosa impermeável à água e a outras moléculas. As células da

camada granulosa, e também as da parte mais superficial da camada

espinhosa, apresentam uma camada proteica, elétron-densa, com 10 mm

de espessura, presa à superfície interna da membrana celular. Este

material proteico confere grande resistência à membrana celular.

• Camada lúcida, constituída por uma delgada camada de células

achatadas, eosinófilas, hialinas, cujos núcleos e organelas citoplasmáticas

foram digeridos por enzimas dos lisossomos e desapareceram. O

citoplasma consiste em numerosos filamentos compactados e envolvidos

por material elétron-denso. Ainda se podem ver desmossomos entre as

células.

• Camada córnea, que tem espessura muito variável e é constituída por

células achatadas, mortas e sem núcleo. O citoplasma dessas células

apresenta-se repleto de uma escleroproteína filamentosa e birrefringente, a

queratina, rica em ligações dissulfeto (S-S).

A descrição feita acima corresponde à epiderme na sua maior

complexidade, que é encontrada na planta do pé e palma da mão. Nas outras

regiões do corpo, a epiderme é mais fina e mais simples, faltando-lhe

frequentemente as camadas granulosa e lúcida, e apresentando uma camada

córnea muito reduzida.

19

Durante o processo de queratinização, observa-se, da base para a

superfície da epiderme, um acúmulo gradual de filamentos intermediários de

queratina e de uma substância amorfa, que se acumula entre os filamentos. Na

camada córnea, a estrutura dos feixes de filamentos intermediários de queratina é

reforçada pela transformação das suas ligações sulfidrila (-SH-) em dissulfeto (S-

S). Existem diversos tipos de moléculas de queratina, codificadas por vários

genes.

Em um determinado instante durante a queratinização ocorre liberação das

enzimas líticas dos lisossomos, com digestão de várias organelas citoplasmáticas:

mitocôndrias, aparelho de Golgi e núcleo. Este fenômeno explica o aspecto

hialino e a perda da estrutura celular da camada córnea.

A epiderme é responsável pela impermeabilidade da pele, o que dificulta a

evaporação de água pela superfície corporal.

A melanina (protetora contra raios UV) sintetizada nos melanócitos é

injetada nas células epiteliais, onde se dispõe em posição supranuclear.

A cor da pele resulta de uma série de fatores, entre os quais os de maior

importância são: seu conteúdo em melanina e caroteno, a quantidade de

capilares na derme e a cor do sangue que corre nesses capilares.

A melanina é um pigmento de cor marrom-escura, produzido pelo

melanócito, que se encontra geralmente nas camadas basal e espinhosa da

epiderme.

Trata-se de uma célula de citoplasma globoso, de onde partem

prolongamentos que se dirigem em direção à superfície da epiderme, e com

núcleo de forma irregular e central. Os prolongamentos dos melanócitos penetram

em reentrâncias das células das camadas basal e espinhosa e transferem os

grânulos de melanina para as células dessas camadas.

A síntese de melanina ocorre no interior dos melanócitos e a enzima

tirosinase tem importante participação nesse processo. Devido à ação dessa

enzima, a tirosina é transformada primeiro em 3,4-diidroxifenilalanina (DOPA).

Essa enzima também age sobre a DOPA, produzindo a DOPA-quinona,

que, após uma série de transformações, dá a melanina. Sabe-se que a tirosinase

é sintetizada ao nível do retículo endoplasmático rugoso e acumulada em

vesículas formadas no aparelho de Golgi. Essas vesículas contendo tirosinase

20

receberam o nome de pré-melanossomos e é nelas que se inicia a síntese da

melanina. A medida que se acumula melanina dentro dos pré-melanossomos,

eles se transformam em melanossomos, onde coexistem melanina e atividade de

tirosinase. Quando cessa a síntese de melanina, o melanossomo se abarrota de

melanina e perde sua atividade tirosinásica, recebendo, então, o nome de grão de

melanina. Quando não existe atividade tirosinásica no melanócito ou essa

atividade está muito reduzida, não há produção de melanina. É o que ocorre nos

casos de albinismo.

Uma vez formados, os grânulos de melanina migram pêlos prolongamentos

do melanócito e são injetados, por mecanismo pouco conhecido, no interior das

células epiteliais, que funcionam como depósitos de melanina e contêm,

geralmente, maior quantidade desse pigmento do que os melanócitos. Nas

células epiteliais os grânulos de melanina localizam-se em posição supranuclear

(capuz), onde oferecem máxima proteção ao DNA, contra a radiação ultravioleta

(UV).

O escurecimento da pele por exposição à luz solar ocorre inicialmente

devido ao escurecimento de parte da melanina preexistente e, numa segunda

etapa, pela aceleração da síntese da melanina.

A epiderme contém células de Langerhans, que fazem parte do sistema

imunitário. As células de Langerhans são ramificadas, têm citoplasma claro, que

pode ser evidenciado através de impregnação pelo cloreto de ouro. Encontram-se

localizadas em toda a epiderme entre as células epiteliais, porém são mais

freqüentes na camada espinhosa. Possuem receptores para o segmento Fe das

imunoglobulinas e para o fator C3 do complemento. As células de Langerhans

são apresentadoras de antígenos e fazem parte do sistema imunitário, podendo

processar e acumular na sua superfície os antígenos cutâneos, apresentando-os

aos linfócitos.

Originam-se de células precursoras trazidas da medula óssea, pelo

sangue.

As células de Merkel são tidas como mecano-receptores. Estas células

existem em maior quantidade na pele espessa da palma das mãos e planta dos

pés. Caracterizam-se principalmente pela presença de grânulos citoplasmátícos

elétron-densos com 80 nm de diâmetro. Na base das células de Merkel notam-se

21

terminações nervosas, algumas com forma de disco. Estas terminações não têm

vesículas sinápticas, o que sugere que elas são de natureza sensorial, recebendo

impulsos das células de Merkel, tidas como mecano-receptores. Esta

interpretação, porém, não é universalmente aceita. Alguns pesquisadores

admitem que as células de Merkel sejam secretoras de hormônio.

2.3.3 – Derme

É o tecido conjuntivo sobre o qual se apoia a epiderme. A derme apresenta

espessura variável de acordo com a região observada, atingindo um máximo de 3

mm na planta do pé.

Sua superfície externa é irregular, observando-se saliências que

acompanham as reentrâncias correspondentes da epiderme. A essas saliências

deu-se o nome de papilas dérmicas. As papilas aumentam a área de contato

derme-epiderme, trazendo maior resistência à pele. As papilas são mais

freqüentes nas zonas sujeitas a pressões ou atritos.

Descrevem-se na derme duas camadas, de limites pouco distintos, que são

a papilar, superficial, e a reticular, mais profunda.

A camada papilar é delgada, constituída por tecido conjuntivo frouxo,

derivando seu nome do fato de ser ela que penetra nas papilas dérmicas.

Nesta camada foram descritas fibrilas especiais de colágeno, que se

inserem na membrana basal e penetram profundamente na derme. Estas

fibrilas teriam a função de prender a derme à epiderme.

A camada reticular é mais espessa, constituída por tecido conjuntivo

denso. Ambas as camadas contêm muitas fibras elásticas, responsáveis, em

parte, pela elasticidade da pele. Além dos vasos sanguíneos e linfáticos, e dos

nervos, também são encontradas na derme as seguintes estruturas, derivadas da

epiderme: pêlos, glândulas sebáceas e sudoríparas, e unhas.

2.3.4 – Hipoderme

É formada por tecido conjuntivo frouxo, que une de maneira pouco firme a

derme aos órgãos subjacentes. É a camada responsável pelo deslizamento da

22

pele sobre as estruturas na qual se apóia. Dependendo da região em estudo e do

grau de nutrição do organismo, a hipoderme poderá ter uma camada variável de

tecido adiposo que, quando desenvolvida, constitui o panículo adiposo. Como a

gordura é bom isolante térmico, o panículo adiposo proporciona proteção contra o

frio.

2.4 – O Tecido Conjuntivo e sua importância para o movimento.

Se imaginarmos que ao realizarmos a dissecação do corpo humano, em

vez de usarmos lâmina, mergulhássemos o cadáver em alguma forma de

detergente, que fosse capaz de levar todo material celular para fora e deixasse só

a estrutura de tecido conjuntivo, veríamos toda continuação, desde a camada

basal da pele, passando pelo tecido fibroso contornando revestindo os músculos,

órgãos e ossos.

Isto seria muito importante ao nos mostrar este órgão como contínuo,

enfatizando sua natureza de união e modelagem, ao contrário de vê-lo

simplesmente como a linha onde ocorrem as separações (MYERS, 2001).

Células do tecido conjuntivo não são boas em termos de contração, e

razoáveis como condutoras, mas secretam uma incrível variedade de produtos no

espaço intercelular que contribuem para nossos ossos, cartilagens, ligamentos e

tendões. Em outras palavras, são células que criam o limite para todas as outras,

construindo o "material" forte e flexível que nos mantém unidos, formando um

meio de compartilhamento e comunicação para todas as nossas células - o que

VARELA, 1987, denominou uma forma de "exosimbiose" - nos moldando e

permitindo movimentos dirigidos (MYERS, 2001).

De acordo com Gray (1995), os tecidos conjuntivos desempenham várias funções

essenciais no corpo, estruturais, uma vez que muitos dos elementos

extracelulares possuem propriedades mecânicas especiais, e defensivas, função

que tem um embasamento celular. Frequentemente, também possuem

importantes funções tróficas e morfogenéticas organizando e influenciando o

crescimento e a diferenciação dos tecidos circunvizinhos.

As células de tecido conjuntivo introduzem uma grande variedade de

substâncias estruturalmente ativas no espaço intercelular, incluindo o colágeno, a

23

elastina, e fibras de reticulina e as proteínas interfibrilares aderentes comumente

conhecidas como "substância fundamental". Gray (1995) denomina este

complexo protéico de matriz extracelular.

O termo matriz extracelular (MEC) é aplicado à soma total da substância

extracelular dentro do tecido conjuntivo. Mecanicamente a MEC evoluiu para

distribuir as tensões de movimento e gravidade ao mesmo tempo que mantém a

forma de diferentes componentes do corpo. Também proporciona o meio físico-

químico das células nelas imersas, formando uma estrutura à qual se aderem e

na qual podem se mover, mantendo um apropriado meio poroso, hidratado e

tônico, pelo qual os metabólitos e nutrientes podem se difundir livremente.

(GRAY, 1995).

O tecido conjuntivo é muito bem denominado. Embora as paredes do

tecido atuem para direcionar os fluidos e criar áreas descontinuadas, suas

funções de união são muito mais importantes que as de separação. Ele une cada

célula do corpo às suas vizinhas e ainda conecta a rede interna de cada célula às

condições mecânicas do corpo inteiro. (MYERS, 2001).

Embora haja diferentes células dentro do tecido conjuntivo, são os

fibroblastos e seus parentes próximos que produzem a maioria dos elementos

fibrosos e interfibrilares, de surpreendente variedade e utilidade (MYERS, 2001).

Há três tipos básicos de fibras: colágenas, elásticas e reticulares. As

reticulares são fibras muito finas, um tipo de colágeno imaturo que predomina no

embrião mas é largamente substituído por colágeno no adulto. As fibras elásticas,

como seu nome sugere, são empregadas em áreas como a orelha ou a pele,

onde se necessita de elasticidade. O colágeno, sem dúvida a proteína mais

comum no corpo, predomina na rede fascial, e é bem observável - na realidade,

inevitável – em qualquer dissecação ou até mesmo em qualquer corte de carne

(MYERS, 2001).

Saber que a córnea transparente do olho, os tendões fortes do pé, o tecido

esponjoso do pulmão e a membrana delicada que envolve o cérebro são todos de

colágeno e nos dizem alguma coisa sobre sua utilidade (MYERS, 2001).

Produzida pelos fibroblastos e mastócitos a substância fundamental forma

uma contínua, mas altamente variável, "cola" para ajudar trilhões de minúsculos

24

grupamentos de células a se manterem juntos e ainda se manterem livre para a

troca de inúmeras substâncias necessárias pra viverem (MYERS, 2001).

As células de tecido conjuntivo satisfazem a dupla necessidade de

flexibilidade e estabilidade em estruturas animais misturando uma pequena

variedade de fibras dentro de uma matriz que varia de muito fluida para viscosa e

para sólida (MYERS, 2001).

As células do tecido conjuntivo podem rearranjar a si próprias - dentro de

limites, é claro - em resposta às várias exigências colocadas sobre as mesmas,

por atividade individual e lesão. A tensão através de um material o deforma

"estirando", assim, as ligações entre as moléculas- Isto cria um delicado fluxo

elétrico conhecido como carga pizoelétrica- Esta carga pode ser "lida" pelas

células nas proximidades da carga e as células do tecido conjuntivo são capazes

de responder, aumentando, reduzindo, ou mudando os elementos intercelulares

na área. Deste modo, o tecido conjuntivo responde às exigências a que o corpo é

submetido. Os elementos extracelulares são alterados para satisfazer a exigência

dentro dos limites impostos pela nutrição, idade e síntese de proteína (MYERS.

2001).

Deste modo, o tecido conjuntivo responde a qualquer exigência a que o

corpo é submetido. Os elementos extracelulares são alterados para satisfazer as

exigências dentro dos limites impostos pela nutrição, idade e síntese de proteína

(MYERS, 2001).

Podemos afirmar, sem dúvida, que a elasticidade do tecido conjuntivo

depende unicamente de sua maior ou menor densificação. Quanto mais um tecido

perde a elasticidade, mais suporta solicitações de tensão, mais densifica-se, mais

perde elasticidade, ou seja é um ciclo vicioso (BIENFAIT, 2000).

Noventa por cento de nossas dores são dores de tensão. Como sempre, o

organismo defende-se contra a tensão. Uma segunda tensão rapidamente

neutraliza a tensão inicial (lei das compensações). Esta segunda tensão

compensa-se por uma terceira etc. Apenas a última tensão que não pode ser

compensada torna-se dolorosa. Ela pode situar-se muito longe da tensão

primária. Esta fisiologia da "cadeia antálgica" foi denominada: "reflexo antálgico a

priori" por Françoise Mezieres. É simples entender que apenas o

desaparecimento da tensão inicial levará à cura. O tratamento deverá progredir de

25

dor em dor, de lesão em lesão, de deformidade em deformidade, na realidade de

tensão em tensão, até a tensão primária, pois não existe problema isolado

(BIENFAIT, 2000).

Muitos problemas dolorosos são decorrentes de tensões anormais que a

fascia suporta. Todo sistema músculo-aponeurótico, todo o sistema capsulo

ligamentar são um imenso receptor sensitivo, o da propriocepção. Como todos os

receptores sensitivos, esses milhões de mecanorreceptores tornam-se dolorosos

se sua ativação prolonga-se normalmente; trata-se aqui de uma tensão normal e

persistente. São raramente intensas; em geral são perfeitamente suportáveis. No

entanto, sua duração, sua persistência, suas recidivas freqüentes tornam-se

rapidamente intoleráveis (BIENFAIT, 1999).

Temos que olhar globalmente, agir localmente e então agir globalmente,

para integrar nossos recursos curativos locais na estrutura da pessoa como um

todo. As células da MEC em resposta ás condições focais, que por sua vez,

afetam as condições globais que se reapresentam em condições locais, em um

processo recorrente interminável (VARELA, 1987).

2.5 – Processo de Cicatrização

2.5.1 – Definição

Cicatrização – Fenômeno pelo qual se garantem a restauração e o

fechamento de uma lesão, ferimento, ou da perda de substâncias dos tecidos.

Cicatriz – marca, depois da cura, de um ferimento.

Lesão Tecidual e Tipos de Cicatrização

A lesão ou perda de tecidos causam regeneração ou reparo com fibrose ou

uma combinação de ambos os processos. Alguns anfíbios conseguem regenerar

apêndices amputados, mas os mamíferos quase não têm capacidade de

regeneração de órgãos, com exceção dos ossos e do fígado. A cicatrização com

fibrose, a resposta pós-natal dos mamíferos a ferimentos , dá-se através de uma

26

cascata seqüencial de processos superpostos que restabelecem a integridade

dos tecidos.

A magnitude da lesão tecidual e o grau de contaminação influenciam a

velocidade e o caráter da cicatrização. A lesão pode ocorrer após intervenções

cirúrgicas ou traumatismos acidentais, após queimaduras ou exposição ao frio, ou

após contato com substâncias químicas ou corpos estranhos. Uma ferida

superficial na pele pode remover apenas a camada de células epiteliais,

preservando a membrana basal dermo-epitelial. A cicatrização dá-se , então, por

simples reepitelização sem formação de tecido fibrótico. Ferimentos pequenos,

limpos e fechados cicatrizam rapidamente com mínima formação de tecido

fibrótico, enquanto ferimentos grandes, abertos e contaminados cicatrizam

lentamente com significativa fibrose.

A cicatrização costuma ser classificada como de primeira, segunda ou

terceira intenção. A cicatrização primária ou de primeira intenção ocorre nos

ferimentos fechados cujas bordas são aproximadas, com uma incisão limpa na

pele que é fechada com pontos de sutura. O defeito incisional reepiteliza

rapidamente, sendo fechado graças à deposição de matriz. A cicatrização de

segunda intenção ocorre quando as bordas da ferida não são apostas, como na

biopsia de pele em sacabocado (punch), nas queimaduras profundas e em um

ferimento profundo que é deixado aberto para formar tecido de granulação. O

tecido de granulação preenche a ferida e esta se contrai e reepiteliza. A

cicatrização terciária ou primária tardia ocorre quando uma ferida aberta é

fechada secundariamente alguns dias após a lesão. Esse ferimento é deixado

aberto em virtude de contaminação significativa. Um exemplo clássico consiste na

conduta após a extirpação de um apêndice roto. Após o fechamento do peritôneo

e da fáscia para evitar evisceração, a pele e o tecido subcutâneo são deixados

abertos e a ferida cirúrgica é preenchida (frouxamente) com gaze estéril úmida. A

ferida cirúrgica é fechada alguns dias depois após a redução significativa de sua

contaminação. As feridas de espessura parcial são aqueles defeitos nos quais

apenas o epitélio e a porção superficial da derme foram retirados. Um bom

exemplo é o local de onde se retirou pele para um enxerto de espessura parcial.

Esse tipo de ferida cicatriza quase inteiramente por reepitelização, com pouca

27

necessidade da síntese de matriz e remodelação, que são características de

outros ferimentos.

Tanto as feridas abertas como as fechadas cicatrizam segundo os mesmos

mecanismos básicos de reparo: a reepitelização “sela” a ferida e a síntese de

matriz proporciona força estrutural. Quando houve perda de tecido, a contração

facilita o fechamento da ferida através da tração de tecido normal sobre o defeito.

A contração é diferente da contratura, que consiste em perda de mobilidade

tecidual por causa de uma cicatriz com retração. Os apêndices dérmicos, como as

glândulas sudoríparas e os folículos pilosos, conseguem regenerar-se nos casos

de ferida de espessura parcial, mas não naquelas de espessura total.

A compreensão desses conceitos permite a modulação terapêutica do

processo de cicatrização. Por exemplo, o nível de contaminação bacteriana

governa o risco subseqüente de infecção da ferida. A conversão de uma ferida

maciçamente contaminada ou grave em uma ferida incisional limpa com bordas

em coaptação pode ajudar a obter um reparo tecidual aceitável com menos

morbidade e melhor função.

A maior parte da pesquisa feita em reparo de feridas foi realizada em

cicatrização cutânea e os princípios descritos para o reparo da pele podem ser

aplicados à maioria dos tecidos. Embora determinados tecidos, como nervos,

bexiga, intestino, traquéia, artérias e peritônio, tenham características próprias de

cicatrização, todos compartilham certas características: a formação de tecido de

granulação para preencher o espaço da ferida e a exteriorização do epitélio,

serosa, mucosa, endotélio ou mesotélio

• Processos de Reparo

Para facilitar a descrição, os eventos relacionados ao reparo de feridas são

definidos, em termos conceituais, em inflamação, epitelização, granulação,

fibroplasia e contração. Todavia, a cicatrização da ferida é na verdade, uma

combinação de processos simultâneos, em vez de uma série de etapas distintas.

Existem semelhanças notáveis entre os eventos celulares e moleculares da

cicatrização das feridas, da regeneração, da embriogênese e da neoplasia.

Existem muitas semelhanças no estroma produzido nos ferimentos e nos

tumores, mas uma diferença importante entre eles é o fator de controle: o

28

processo de restauração de uma ferida é autolimitado, enquanto o crescimento

tumoral não o é. A compreensão da regulação desses fenômenos deve

proporcionar substanciais benefícios clínicos potenciais.

• Inflamação

A inflamação é a primeira etapa da cicatrização de feridas. Após a lesão

tecidual, os vasos imediatamente contraem-se, produtos teciduais tromboplásticos

são expostos e as cascatas da coagulação e do complemento são

desencadeadas. As plaquetas retidas na ferida sofrem desgranulação, liberando

substâncias biologicamente ativas que são importantes para a reparação da

ferida. Pelo menos três tipos de organelas de armazenamento estão envolvidos

na desgranulação das plaquetas: (1) grânulos alfa, que contêm fatores de

crescimento como o fator de crescimento derivado de plaquetas (FCDP), o fator

beta de crescimento transformador (FCT-�) e o fator 1 de crescimento insulina-

símile(FCI-1), bem como glicoproteínas, como fibronectina, fibrinogênio,

trombospondina e fator de von Willebrand; (2) corpúsculos densos que

armazenam aminas vasoativas como serotonina, que aumentam a

permeabilidade da microvasculatura; e (3) lisossomas, que contêm hidrolases e

proteases. A coagulação e a ativação plaquetária limitam a perda de sangue e

geram produtos biologicamente ativos que convertem os fibroblastos e as células

endoteliais para um “modo” reparador. Os mecanismos de coagulação ativam a

protrombina em trombina, que converte o fibrinogênio em fibrina. A seguir, a

fibrina é polimerizada em um coágulo estável. Se o coágulo é exposto ao ar,

sofre dessecamento, formando uma crosta que funciona como “cobertura”

temporária da ferida. A fibrina e a fibronectina existentes no coágulo fornecem a

matriz temporária para a migração celular inicial para a ferida.

Os produtos da cascata da coagulação regulam as células na área lesada.

A trombina íntegra atua como um potente fator de crescimento para fibroblastos e

células endoteliais. Os fragmentos de trombina degradados estimulam os

monócitos e as plaquetas. O fibrinogênio contém seqüências peptídicas

promotoras de crescimento, e alguns fibrinopeptídios são quimioatrativos para os

monócitos. O coágulo também induz angiogênese com crescimento dirigido para

dentro de células endoteliais capilares. Esse complexo padrão de interações é

29

mais fácil de compreender quando se pensa que muitos fatores de crescimento

peptídicos envolvidos na cicatrização dos tecidos têm várias origens.

À medida que se forma o trombo, a hemostasia na ferida é atingida. Após a

vasoconstrição temporária, os pequenos vasos locais dilatam-se em resposta às

cininas, aos componentes do complemento e às prostaglandinas. Leucócitos

(primeiro neutrófilos, mais tarde monócitos) e proteínas plasmáticas penetram no

local da ferida. Esse infiltrado inicial de neutrófilos “recolhe” os restos celulares, o

material que contaminava a ferida e as bactérias. Fragmentos ativados do

complemento, atraem neutrófilos e auxiliam na destruição bacteriana. É

interessante mencionar que a cicatrização evolui normalmente na ausência de

neutrófilos em uma ferida limpa.

Os monócitos infiltram o local da ferida mais tarde e se diferenciam em

macrófagos, que são cruciais na orquestração da restauração tecidual. A maioria

dos macrófagos na ferida é convertida em monócitos que são recrutados da

circulação, mas alguns são macrófagos teciduais que conseguem proliferar no

local. Os macrófagos continuam a consumir restos teciduais e bacterianos.

Contudo, o mais importante é que secretam numerosos fatores de crescimento.

Esses fatores de crescimento peptídico atrem e ativam células endoteliais locais,

fibroblastos e células epiteliais, fazendo-as iniciar suas respectivas funções de

restauração, e iniciam a fase seguinte da restauração da ferida – a formação de

tecido de granulação. A depleção de monócitos e macrófagos provoca intensa

modificação na cicatrização da ferida, com debridamento insatisfatório,

proliferação tardia de fibroblastos e angiogênese inadequada. Se as condições da

ferida o justificarem, os macrófagos continuam a recrutar outras células

inflamatórias. Os linfócitos penetram na ferida bem mais tarde, não tendo sido

ainda esclarecido o seu papel no reparo das feridas. A interleucina -1 (IL-1) é um

produto linfocitário que regula a atividade da colagenase, de modo que os

linfócitos podem estar envolvidos na remodelagem do colágeno.

Um ambiente singular é criado no espaço da ferida pela combinação de

ausência inicial de microcirculação e de influxo de leucócitos. Conforme

determinação feita por microeletrodos, o espaço da ferida é hipóxico,

hipoglicêmico, acidótico, hiperpotassêmico, hiperlático e hipercárbico.

30

• Granulação

O tecido de granulação caracteriza-se por seu aspecto vermelho-vivo,

carnoso, uma conseqüência da migração e da divisão das células endoteliais,

com formação de um rico leito de novas redes capilares(angiogênese) no local da

ferida. Os fibroblastos da ferida provêm das células que circundam a ferida e que

modificam seus fenótipos diferenciados e se tornam móveis durante o processo

de replicação. Os fibroblastos migram para a ferida, usando a fibrina recém-

depositada e a matriz de fibronectina como arcabouço. Os fibroblastos proliferam

(fibroplasia) e sintetizam matriz extracelular nova. O crescimento direcionado das

células endoteliais vasculares ocorre ao mesmo tempo da fibroplasia durante a

formação de tecido de granulação, estimulado por produtos de macrófagos

ativados e por plaquetas. Assim sendo, o tecido de granulação é uma matriz

frouxa que aparece em feridas abertas, sendo constituído por colágeno,

fibronectina e ácido hialurônico, com densa infiltração de macrófagos, fibroblastos

e células endoteliais capilares. A granulação é mais proeminente em feridas que

cicatrizam por segunda intenção. O tecido novo que une feridas coaptadas

simples não é exatamente o mesmo que tecido de granulação, embora seja

constituído pelos mesmos elementos teciduais.

A matriz provisória inicial da ferida é constituída por fibrina, fibronectina e

pelo glicosaminoglicano (GAG) ácido hialurônico. Por causa de sua grande

"casca" de hidratação (água), o ácido hialurônico proporciona uma matriz que

reforça a migração de células. As glicoproteínas de adesão, incluindo fibronectina,

laminina e tenascina, são encontradas na matriz inicial e facilitam a fixação e a

migração de células. Os receptores integrina nas superfícies celulares ligam-se

aos GAG da matriz e às glicoproteínas. À medida que os fibroblastos penetram na

ferida e a povoam, eles utilizam hialuronidase para digerir a matriz provisória rica

em ácido hialurônico e, a seguir, depositam GAG maiores e sulfatados. Ao

mesmo tempo, os fibroblastos depositam colágeno em um arcabouço de GAG e

fibronectina de forma desorganizada. Os colágenos dos tipos I e III são os

principais colágenos fibrilares que constituem a matriz extracelular da pele. O

colágeno do tipo III é, a princípio, mais predominante em feridas em comparação

com a pele normal.

31

Contudo, à medida que a ferida amadurece, o colágeno do tipo l é

depositado em quantidades cada vez maiores. A maior parte do colágeno em

feridas e na pele normal é do tipo I.

• Epitelização

Minutos após a agressão já são evidentes alterações morfológicas nos

queratinócitos existentes na borda da ferida. Na pele, a epiderme espessa-se e as

células basais da borda da ferida aumentam de tamanho e migram para a ferida.

Uma vez que a célula comece a migrar, esta não se divide até ser restaurada a

continuidade epidérmica. As células basais fixas em uma zona próxima à borda

cortada da ferida continuam a se dividir, e suas células-filhas achatam-se e

migram sobre a matriz da ferida como uma lâmina. As glicoproteínas de adesão

celular, como a fíbronectina, a vitronectina e a tenascina, formam uma "via férrea"

que facilita a migração de células epiteliais sobre a matriz da ferida. Os

queratinócitos localizam-se sob a laminina e o colágeno do tipo IV como parte de

sua membrana basal. A seguir, os queratinócitos tomam-se colunares e se

dividem à medida que é estabelecida a formação de camadas na epiderme. O

tecido necrótico e os corpos estranhos são, gradativamente, separados da ferida

à medida que as células epiteliais migram sob eles. Após ser obtida a integridade

epitelial. as células "reformam" hemidesmossomas e se ligam à nova membrana

basal, completando assim uma barreira contra contaminação adicional e a perda

de umidade. A queratina é formada à medida que as células amadurecem.

Os queratinócitos também conseguem responder à estimulação por corpos

estranhos através de migração. As suturas nas feridas cutâneas proporcionam

locais ao longo dos quais essas células podem migrar. O subseqüente

espessamento epitelial e queratinização provocam reações fibróticas, cistos e/ou

abscessos estéreis centralizados na sutura.

• Fibroplasia

A evolução final da correção de uma ferida em mamíferos consiste na

formação de uma cicatriz. A cicatriz é definida, do ponto de vista morfológico.

como a ausência de organização tecidual em comparação com a arquitetura do

32

tecido normal circundante. A deposição desorganizada de colágeno é importante

na formação de cicatrizes. Novas fibras de colágeno secretadas por fibroblastos

são encontradas até três dias após o ferimento. À medida que se forma a matriz,

colagenosa, fibras densamente acondicionadas preenchem o local do ferimento.

O equilíbrio entre a síntese e a degradação de colágeno favorece a deposição de

colágeno.

A ferida apresenta remodelagem lenta ao longo de meses até formar uma

cicatriz madura. A inicialmente densa rede de capilares e o infiltrado de

fibroblastos regridem até que só restem relativamente poucos capilares e

fibroblastos. As feridas tornam-se mais fortes com o passar do tempo. A

resistência à tração de uma ferida na pele aumenta rapidamente da primeira à

sexta semana após o ferimento. A partir daí a resistência à tração aumenta de

modo mais lento e comprovadamente aumenta até um ano após o ferimento em

estudos feitos em animais. Varia a resistência global à tração dentre os vários

tecidos lesados. Três semanas após um ferimento, por exemplo, a pele tem 30%

da resistência normal à tração, a fáscia tem cerca de 20%, o intestino tem 65% e

a bexiga tem cerca de 95%. Na melhor das hipóteses, a resistência à tração da

pele ferida atinge apenas cerca de 80% da exibida pela pele íntegra. O resultado

final do reparo é uma cicatriz, que é frágil e menos elástica do que a pele normal,

não apresenta fâneros como folículos pilosos ou glândulas sudoríparas e,

portanto, é menos funcional do que o tecido íntegro circundante. O principal

benefício do reparo pela cicatrização é a reorganização relativamente rápida da

integridade tecidual.

• Contração

A destruição dos tecidos moles e seu reparo envolvem a migração de

inúmeros tipos diferentes de células para o local da ferida, formando uma nova

matriz de tecido conjuntivo. Em uma ferida aberta, a pele íntegra circundante é

"puxada" para o defeito pelo processo de contração da ferida. O aspecto de pele

normal no local do reparo não se deve à regeneração cutânea, mas ao

movimento centrípeto da pele. O tecido recém-depositado que ocupa a área entre

as bordas da pele é fibrótico, sem a arquitetura dérmica normal e sem fâneros. A

pele que foi "puxada" sobre o defeito tem estrutura (fibras dérmicas) e fâneros

33

normais. De modo geral, a contração da ferida é benéfica, porque uma área

reduzida de tecido cicatricial recobre o defeito.

Em oposição à contração da ferida está a contratura da cicatriz (fibrótica),

na qual o processo de contração ocorre após o fechamento da ferida. A contratura

da cicatriz, pode ser deletéria porque o tecido fibrótico estabelecido sofre redução

na área superficial que tem a possibilidade de comprometer a função mecânica

dos tecidos ou das estruturas vizinhas. Os exemplos incluem contratura da

cicatriz sobre uma articulação, restringindo o movimento articular, estenose

esofágica após ingestão de substâncias cáusticas; e a estenose coledociana após

lesão. Embora os mecanismos de contração da ferida ainda estejam sendo

definidos, o processo envolve a interação entre forças celulares e organização do

tecido conjuntivo.

Existem fortes evidências de que a célula responsável pela contração da

ferida é o miofibroblasto, embora não haja dúvidas quanto à participação de

componentes da matriz da ferida. O miofibroblasto é uma célula mesenquimatosa

com características estruturais e funcionais em comum com os fibroblastos e as

células musculares lisas. É o componente celular do tecido de granulação ou do

tecido conjuntivo cicatricial que gera as forças contráteis envolvendo a atividade

contrátil muscular actina-miosina citoplasmática. A contração dinâmica dessas

estruturas citoplasmáticas produz a força que reorienta o tecido conjuntivo

circundante. Essa célula especializada é um aspecto clássico das feridas em fase

de contração e também é encontrada em abundância em doenças fibrocontráteis

como fibromatoses, cirrose hepática, fibrose renal e pulmonar, contratura de

Dupuytren e reações desmoplásicas induzidas por neoplasia. Por conseguinte, o

aparecimento de miofibroblastos indica contração da ferida, e a persistência de

miofibroblastos no local da ferida correlaciona-se à contratura da cicatriz.

O miofibroblasto provém do fibroblasto da ferida, e a característica do

fenótipo miofibroblástico é a expressão da actina alfa da musculatura lisa, a

isoforma da actina prevalente nas células da musculatura lisa vascular. Os

microfilamentos de actina estão dispostos ao longo do eixo longo dos fibroblastos

e estão associados a corpúsculos densos para ligação à matriz extracelular

circundante. Os miofibroblastos exibem outras características de células

musculares lisas. As zônulas de oclusão conectam os miofibroblastos do tecido

34

de granulação, mas não são encontradas em fibroblastos do tecido normal. Os

miofibroblastos também possuem uma singular entidade (fibronexo) que liga o

citoesqueleto à matriz extracelular. O fibronexo é basicamente uma conexão

transmenbrana entre os microfilamentos intracelulares e a fibronectina

extracelular. O tecido de granulação responde às mesmas substâncias a que a

musculatura lisa responde, seja contraindo ou relaxando. Por conseguinte, a força

da contração da ferida é, provavelmente, gerada pêlos feixes de actina nos

miofibroblastos e transmitida para os lados da ferida por ligações célula-célula e

célula-matriz

2.5.2 - Fatores de Crescimento: Reguladores do Reparo

Os fatores do crescimento têm um papel importante na regulação da

cicatrização das feridas. Esses polipeptídeos são liberados por várias células

ativadas no local da ferida e podem estimular ou inibir a proliferação, o movimento

e a atividade de biossíntese das células. Eles podem atuar como fatores

autócrinos (produzidos pela célula para agir em si mesma.) ou parácrinos

(produzidos por um tipo de célula para agir em outro tipo de célula na mesma

área). Os fatores de crescimento também quimioatraem novas células para o local

da ferida. Inúmeros fatores de crescimento podem ser encontrados nas feridas.

Muitos fatores de crescimento têm funções superpostas, e só agora estamos

começando a compreender seus vários efeitos biológicos.

Das muitas citocinas que já foram implicadas na cicatrizaçao de feridas, o

FCT-� afeta todas as fases de cicatrização, incluindo a resposta inflamatória e o

acúmulo de matriz. A aplicação tópica de FCT- � acelera a cicatrização normal. A

denominação FCT- � provém da observação de que células normais expostas ao

FCT- � enquanto crescem em ágar mole proliferam como se tivessem sido

transformadas por vírus. A família de FCT- � de mamíferos consiste em três

isoformas conhecidas- �1.

� 2 e

� 3—que exibem significativa correlação

estrutural e funcional. O FCT- � é liberado por plaquetas e macrófagos na ferida

Além disso, o FCT- � é liberado por fibroblastos e atua de forma autócrina na

estimulação adicional de sua própria síntese e secreção. Muitas células secretam

FCT- � de forma latente associada a uma proteína de ligação que toma o FCT-

35

biologicamente inativo. Esse complexo inativo, ou latente, seria uma forma de

armazenamento da citocina até esta ser ativada por macrófagos ou condições

locais. Através de mecanismos autócrinos e parácrinos, o FCT- � estimula a

deposição de colágeno e de outros componentes da matriz por fibroblastos, inibe

a colagenase, bloqueia o inibidor do plasminogênio e aumenta a angiogênese,

além de ser quimiotático para fibroblastos, monócitos e macrófagos. Através

desses mecanismos, o FCT- � pode aumentar a fibrose no local da ferida.

O FCDP é liberado por grânulos alfa das plaquetas imediatamente após o

trauma. O FCDP atrai neutrófilos, macrófagos e fibroblastos para a ferida e atua

como um poderoso mitógeno. Os macrófagos, as células endoteliais e os

fibroblastos também sintetizam e secretam FCDP. O FCDP estimula os

fibroblastos a sintetizar matriz extracelular nova, predominantemente

componentes não-colagenosos como GAG e proteínas de adesão. O FCDP

também aumenta a quantidade de colagenase secretada por fibroblasto,

indicando uma participação dessa citocina na remodelagem tecidual.

A angiogênese consiste na formação de vasos sanguíneos novos através

do crescimento e da migração dirigidos das células endoteliais. Esse processo

disseminado ocorre no desenvolvimento, no câncer e na cicatrização de feridas. A

angiogênese é estimulada por fatores de crescimento de fibroblastos ácidos e

básicos (FCFa e FCFb, respectivamente). Tanto as células endoteliais como os

macrófagos produzem FCFa e FCFb. Embora o FCFb seja dez vezes mais

potente que o FCF-a, tem efeitos idênticos porque se liga ao mesmo receptor de

FCF. Esses fatores de crescimento ligam-se à heparina e ao GAG-heparan-

sulfato na matriz extracelular. A membrana basal serve como "depósito" de FCFb,

que é liberado quando a membrana basal é degradada por colagenases e por

outras enzimas hidrolíticas após lesão. Outros reservatórios de FCF incluem os

espaços intramedulares de células endoteliais, células musculares lisas e

fibroblastos, que seriam liberados por ocasião de isquemia ou de lesão das

células. Os FCF estimulam as células endoteliais a dividir e formar novos

capilares. Além disso, quimioatraem células endoteliais e fibroblastos.

A epitelização é diretamente estimulada por no mínimo dois fatores de

crescimento: fator de crescimento epidérmico (FCE) e fator de crescimento de

queratinócitos (FCQ). O fator de crescimento epidérmico é liberado por

36

queratinócitos e atua de forma autócrina, enquanto o FCQ é liberado pelos

fibroblastos e atua de forma parácrina na estimulação da diferenciação e divisão

dos queratinócitos. O fator de crescimento epidérmico é a mesma proteína da

urogastrona, um peptídeo encontrado na urina humana que inibe a secreção de

ácido gástrico. O principal efeito do fator de crescimento epidermico é "encorajar"

as células a se manter durante o ciclo celular. Nas feridas, exerce esse efeito

sobre as células epiteliais, sobre fibroblastos e sobre células endoteliais. O fator

de crescimento epidérmico também é quimiotático para as células epiteliais e

aumenta a secreção de colagenases pelos fibroblastos, que é uma etapa

importante na remodelagem tecidual.

Muitos outros fatores de crescimento afetam o reparo das feridas. O FCI-1

estimula a síntese de colágeno pêlos fibroblastos e atua de forma sinérgica com o

FCDP e o FCFb para facilitar a proliferação de fibroblastos. O interferon gama

comprovadamente infra-regula a síntese de colágeno. As várias interleucinas

medeiam as funções das células inflamatórias na ferida.

Em breve, os cirurgiões devem ser capazes de acelerar o reparo das

feridas em processo de cicatrização através do acréscimo ou da deleção de

fatores de crescimento. O emprego da tecnologia de ácido desoxirribonucleico

(ADN) recombinante permitiu o desenvolvimento de um número crescente de

peptídeos reguladores do crescimento endógenos para fins biológicos

terapêuticos. Os pesquisadores aceleraram as taxas de cicatrização através da

adição de fator de crescimento epidérmico (FCE), FCT- �, FCDP ou FCFb. A

adição desses fatores de crescimento também aumentou o reparo em modelos

animais de condições que comprometem a cicatrização de feridas como diabete

melito, uso crónico de esteróides, úlcera duodenal e quimioterapia. Atualmente,

existem estudos clínicos em andamento. Estudos adicionais são necessários para

determinar qual é a combinação ideal de fatores do crescimento para tipos

específicos de ferida.

2.5.3 - Remodelagem e Formação de Matriz

• Colágeno

A matriz extracelular é a estrutura complexa e com ligações cruzadas de

proteínas e polissacarídeos que circunda as células e organiza a geometria dos

37

tecidos. O colágeno é o principal elemento da matriz extracelular (25% da

proteína orgânica total), e cicatriz é definida, de forma vaga, como uma coleção

anormal e desorganizada de colágeno que ocorre após o reparo de uma ferida.

Os colágenos formam um grande grupo de proteínas estruturais com hélice tripla

da matriz . O colágeno do tipo I é o principal componente estrutural dos ossos, da

pele e dos tendões. O colágeno do tipo II é encontrado predominantemente na

cartilagem, enquanto o do tipo III é encontrado em associação ao tipo I, embora a

relação varie nos diferentes tecidos. O colágeno do tipo IV é encontrado nas

membranas basais em associação a mucopolissacarídeos e a laminina, enquanto

o tipo V é encontrado na córnea em associação ao tipo III e é importante na

manutenção da transparência. Outros tipos de colágeno (até o tipo XII) são

encontrados em pequena quantidade em muitos tecidos e têm funções ainda

desconhecidas.

O colágeno é um componente crucial em todas as fases do reparo de

feridas. Logo após a lesão, a exposição do colágeno fibrilar ao sangue promove a

agregação e a ativação de plaquetas e a liberação de fatores quimiotáticos que

iniciam a cicatrização. Os fragmentos de colágeno liberados pelas colagenases

leucocitárias atraem fibroblastos para a área lesada. Mais tarde, o colágeno toma-

se a base da nova matriz extracelular. A derme normal contém cerca de 80% de

colágeno do tipo I e 20% do tipo III. A quantidade de colágeno do tipo III existente

nas feridas em fase de cicatrização aumenta por três a quatro dias antes dos

níveis de colágeno do tipo I aumentarem. Até 24 horas após a lesão, os

fibroblastos "invasores" sintetizam e secretam colágeno dos tipos I e III para

formar a neomatriz. O tecido de granulação tem níveis mais altos de colágeno do

tipo III do que a maioria dos tecidos normais, embora o tipo I ainda seja o principal

componente.

O fibroblasto "fabrica" a molécula do pró-colágeno (tropocolágeno) no

interior das células em ribossomas ligados à membrana, acondiciona o pró-

colágeno em vesículas secretórias no aparelho de Golgi e depois "o exporta"

através da membrana celular para o espaço extracelular. Uma vez fora do

fibroblasto, o pró-colágeno sofre clivagem enzimática da porção não-helicoidal e

libera a molécula de colágeno, que depois, forma as ligações cruzadas inter e

intramoleculares, resultando em alinhamento nas fibrilas do colágeno seguido por

38

agregação em fibras de colágeno semelhantes a cabos. No todo, algumas

características estruturais importantes do colágeno incluem três cadeias alfa-

peptídicas em uma hélice orientada para a direita, a presença de glicina em cada

terceira posição e a presença de dois aminoácidos singulares - hidroxilisina e

hidroxiprolina.

Algumas etapas da síntese de colágeno são incomuns em comparação à

síntese padrão de proteínas. Por exemplo, embora o colágeno extracelular

contenha quantidades significativas de hidroxiprolina a única proteína importante

a fazê-lo, seus genes codificam apenas a prolina. A medida que a cadeia alfa -

peptídica em crescimento sai da rede ribossômica, é inserida no retículo

endoplasmático, onde é glicosilada e 14% de suas prolinas são hidroxiladas por

duas dioxigenases denominadas lisil-hidroxilase e prolil-hidroxilase. A prolil-

hidroxilase é uma das enzimas limitadoras de velocidade na síntese de colágeno.

Substratos e co-fatores como ferro, alfa-cetoglutarato, ascorbato e oxigênio são

importantes nesse processo. Se não houver prolinas suficientes para a

hidroxilação, as cadeias alfa-peptídicas não conseguem formar uma hélice tríplice

estável, o colágeno não pode ser exportado e as cadeias alfa não associadas e

incompletas são rompidas. Por conseguinte, a deficiência de ascorbato

(escorbuto) e a hipoxia têm efeitos semelhantes na síntese de colágeno. Após a

"exportação" da molécula de pró-colágeno de hélice tripla, as extremidades

telopeptídicas da molécula que evitam a polimerização são clivadas. A molécula

de colágeno é polimerizada por vários tipos de ligações químicas, nas quais as

lisinas são oxidadas e condensadas a ligações lisil-lisina pela lisil-oxidase. Essa

etapa é fundamental na ligação cruzada do colágeno. Na ausência dessas

ligações, o colágeno perde a estabilidade estrutural. A formação de ligações

cruzadas pode ser inibida por dois agentes farmacológicos: a beta-

aminopropionitrila inibe a lisil-oxidase e a D-penicilamina liga-se diretamente ao

substrato colágeno para evitar a formação de ligações cruzadas no colágeno.

Atualmente está sendo ativamente pesquisado o que inicia e o que

interrompe a síntese de colágeno. Muitos sinais influenciam a síntese do

colágeno, incluindo fatores de crescimento, elementos nutricionais, a pressão

parcial de oxigênio e a concentração de lactato. Por exemplo, um gradiente de

tensão de oxigênio estende-se desde a periferia perfundida da ferida até o

39

microambiente hipóxico no centro da ferida, que por sua vez pode afetar a

hidroxilação da prolina. Os fibroblastos expostos à hipóxia ou a concentrações

altas de lactato, condições encontradas no microambiente da ferida, aumentam

sua velocidade de síntese de colágeno quando os níveis de oxigênio estão

aumentados. A hipóxia provoca acúmulo de lactato na célula e o lactato estimula

a síntese de colágeno através de pelo menos dois mecanismos: aumento da

transcrição do gene de colágeno e aumento da atividade da prolil-hidroxilase.

Os mecanismos de controle da síntese de colágeno parecem envolver

várias etapas. O lactato (e a hipoxia) reduz a reserva de nicotinamida-adenina-

dinucleotídeo (NAD+) através da conversão de NAD+ em NADH. Isso reduz a

quantidade do metabólito de NAD+, adenosina difosforribose (ADPR), que nada

mais é que NAD+ cuja nicotinamida foi retirada. A forma polimerizada de ADPR

(PADPR) pode normalmente reduzir a transcrição de genes para colágeno no

estado de repouso. A prolil-hidroxilase também é inibida pela ADPR; a retirada de

ADPR ativa a enzima através dos níveis decrescentes de NAD+. Assim sendo, o

lactato modifica tanto a expressão genética das transcrições do gene do colágeno

não-hidroxilado no núcleo das células como a hidroxilação citoplasmática desses

peptídeos. Esse sistema é limitado então apenas pelos substratos da prolil-

hidroxilase-ascorbato e oxigênio.

O acúmulo de colágeno na área da ferida depende da correlação entre a

síntese de colágeno e a sua degradação pelas enzimas locais. Na fase inicial da

cicatrização da ferida, a degradação de colágeno é mínima, mas aumenta à

medida que a ferida amadurece. As colagenases intersticiais são as principais

enzimas degradadoras e são secretadas por granulócitos, macrófagos,

fibroblastos e células epiteliais como zimogênios inativos que são ativados por

proteases. As colagenases intersticiais fragmentam as três cadeias da hélice tripla

do colágeno dos tipos I e III em uma ligação específica, criando dois fragmentos

característicos que representam 3/4 e 1/4 da molécula original. Isto permite que o

colágeno seja desnaturado e se tome suscetível a outras proteases inespecíficas.

A síntese e a atividade das colagenases são moduladas por fatores de

crescimento e por inibidores locais da protease.

O controle da síntese, da secreção, da formação de ligações cruzadas e da

degradação do colágeno não é plenamente compreendido. mas é objeto de muita

40

pesquisa no estudo da cicatrização da ferida. O colágeno é, obviamente,

importante em todas as fases da cicatrização da ferida, sendo fundamental à

recuperação da força e da integridade dos tecidos.

• Proteoglicanos

As alterações na síntese de proteoglicanos (PG) e de seus componentes

GAG correlacionam-se com a proliferação, a migração e a síntese de colágeno

das células que acompanham a cicatrização de feridas em um adulto. Os PG são

um grupo heterogêneo de macromoléculas polianiônicas que consistem em um

cerne protéico ao qual um número variável de cadeias sulfatadas e lineares de

GAG são ligadas de forma covalente. Entre esses proteoglicanos estão versicano,

um grande proteoglicano condroitino-sulfato (CSPG): decorina, um pequeno

proteoglicano dermatan-sulfato (DSPG): e o proteoglicano heparan-sulfato

(HSPG). O ácido hialurônico (AH), com frequência uma molécula GAG maciça

sem grupamentos sulfatados nem proteína central, consiste em repetições de

comprimentos variáveis de dissacarídios, resultando em uma ampla gama de

pesos moleculares. Os GAG sulfatados surgem depois do ácido hialurônico no

processo de cicatrização, tendo sido constatada a correlação entre a redução do

ácido hialurônico e o aparecimento de GAG sulfatados em vários sistemas

embriológicos com a ocorrência de citodiferenciação.

As variações nos cernes protéicos e nos tipos de porções açúcar geram

uma imensa inconstância na estrutura dos proteoglicanos, mas todos

compartilham uma carga elétrica polianiônica que influencia suas interações com

outras macromoléculas e células. Essas variações parecem criar um ambiente

carregado eletricamente e hidratado que facilita a mobilidade das células. Além

disso, os proteoglicanos e os GAG afetam a organização do colágeno da ferida e

a fibrilogênese e, através da ligação a locais específicos no colágeno, controlam

sua taxa de degradação.

• Glicoproteínas de Adesão e Integrinas

À medida que as células se mobilizam durante o reparo da ferida, ocorrem

interações específicas entre elas e a matriz extracelular que, permite o

descolamento e a migração das células. A matriz proporciona o arcabouço para a

41

ligação e a migração das células através de vários componentes glicoprotéicos,

tais como fibronectina, tenascina, laminina, fibrinogênio, trombospondina e

vitronectina. As células ligam -se a essas glicoproteínas de adesão com

receptores de adesão na superfície celular denominadas integrinas, que são uma

família de glicoproteínas de membrana constituídas por dois tipos de

subunidades, alfa e beta. As integrinas proporcionam uma ligação entre o

citoesqueleto da célula, sua matriz extracelular circundante e as células

adjacentes. A direção do movimento das células pode ser determinada pelas

afinidades relativas entre ligando e integrina das várias glicoproteínas de adesão

ligadas à determinada célula.

As fibronectinas são moléculas da matriz proeminentes que estão

envolvidas na contração da ferida, na migração de células, na deposicão de

matriz de colágeno e na reepitelização. A fibronectina é uma das primeiras

proteínas a ser depositada em uma ferida e faz parte da matriz preliminar. A

fibronectina atua como um arcabouço para a migração das células e a deposição

de colágeno. Trata-se de uma glicoproteína complexa constituída por duas

subunidades, cada uma delas com locais específicos de ligação com o colágeno.

As diferenças entre a fibronectina plasmática solúvel e a fibronectina do estroma,

bem como as diferenças entre suas duas subunidades, resultam de modificação

pós-tradução de um único produto gênico da fibronectina. A fibronectina é

produzida por fibroblastos, células epiteliais e macrófagos e consegue ligar-se a

uma ampla variedade de moléculas envolvidas na cicatrização de feridas,

incluindo colágenos, actina, fibrina, ácido hialurônico, heparina, a própria

fibronectina e os receptores na superfície dos fibroblastos. Os fibroblastos do

tecido de granulação são revestidos por uma camada de matriz de fibronectina, e

os miofibroblastos são recobertos por fibronectina, que forma parte da ligação de

fibronexo que efetua a contração da ferida.

A tenascina é uma glicoproteína da matriz que inibe o efeito de adesão

celular da fibronectina e permite que as células se soltem da matriz e migrem. O

aparecimento de tenascina na matriz da ferida correlaciona-se com o início da

migração de células mesenquimatosas e epiteliais. A laminina, um componente

importante da membrana basal, precisa ser reconstituída antes que possa ocorrer

migração epitelial através do defeito de continuidade da ferida.

42

Fatores clínicos que afetam a cicatrização das feridas:

• Nutrição

Ainda não foram definidas as demandas calóricas precisas para a

cicatrização ideal das feridas. Ferimentos grandes como queimaduras aumentam

bastante a taxa metabólica, enquanto feridas menores como fraturas isoladas não

aumentam as demandas nutricionais. A depleção protéica compromete a

cicatrização da fenda se a perda ponderal recente ultrapassar de 15 a 25% o

peso corporal. O risco de deiscência da ferida aumenta nos pacientes com

hipoalbuminemia, denotando o efeito deletério da desnutrição crônica no reparo.

A deficiência de vitamina C (ácido ascórbico) provoca escorbuto. Nos

pacientes com essa deficiência, a cicatrização de feridas é interrompida durante a

fibroplasia. Um número normal de fibroblastos é encontrado na ferida, mas eles

produzem uma quantidade insuficiente de colágeno. A vitamina C é necessária

para a hidroxilação de resíduos lisina e prolina. Sem a hidroxiprolina o colágeno

recém-sintetizado não é transportado para fora das células. Sem a hidroxilisina

não há formação de ligações cruzadas entre as fibrilas de colágeno. No escorbuto

grave, não apenas as feridas recentes não cicatrizam mas as cicatrizes antigas se

abrem, porque a lise contínua de colágeno supera bastante a produção de

colágeno novo.

As demandas de vitamina A (ácido retinóico) aumentam durante a

agressão. Os pacientes com ferimentos graves precisam de vitamina A adicional

para manter níveis séricos normais. A vitamina A também reverte parcialmente o

comprometimento da cicatrização dos pacientes que fazem uso crônico de

esteróides.

A deficiência de vitamina B6 (piridoxina) compromete a formação de

ligações cruzadas do colágeno. As deficiências de vitamina B1 (tiamina) e B2

(riboflavina) provocam síndromes associadas a reparo insatisfatório das feridas.

As deficiências de oligoelementos como zinco e cobre têm sido implicadas

no reparo insatisfatório das feridas, visto que esses cátions divalentes são co-

fatores em muitas reações enzimáticas importantes. A deficiência de zinco está

associada a epitelização inadequada e a feridas crônicas que não cicatrizam.

43

• Oxigênio, Anemia e Perfusão

As feridas precisam de um aporte adequado de oxigênio para boa

cicatrização. O oxigênio é essencial para inflamação, angiogênese, epitelização e

deposição de matriz bem-sucedidas. As feridas isquêmicas não cicatrizam bem e

existe um risco bem maior de infecção. A infecção das feridas é influenciada por

inúmeros fatores, como doença vascular oclusiva, vasoconstrição e hipovolemia.

A maior demanda de oxigênio resultante da infecção e a resposta concomitante

de neutrófilos aumentam ainda mais a demanda total de oxigênio e nutrientes. A

tensão excessiva na sutura provoca isquemia localizada na ferida e complicações

na cicatrização da ferida. Por outro lado, o maior aporte de oxigênio na ferida

incrementa a cicatrização. Em experiências realizadas, a síntese de colágeno

pelos fibroblastos aumenta com a administração suplementar de oxigênio.

A anemia em um paciente normovolêmico não é deletéria para o reparo de

feridas enquanto o hematócrito for superior a 15%, porque o conteúdo de oxigênio

no sangue não afeta a síntese de colágeno na ferida. Todavia, o aumento da Po2

até níveis sanguíneos muito superiores a uma saturação de hemoglobina de

100% permite que mais oxigênio se difunda para a borda da ferida relativamente

pouco vascularizada, e isto supra-regula a síntese de colágeno.

A perfusão tecidual é o fator determinante final da oxigenação e da nutrição

das feridas. Para otimizar o reparo das feridas, os fatores que provocam isquemia

da ferida devem ser evitados. Os pontos de sutura não devem ser muito

apertados. Deve-se manter o paciente aquecido, a dor deve ser bem controlada

para evitar vasoconstrição catecolamina-mediada e a hipovolemia deve ser

corrigida.

• Diabete Melito e Obesidade

A cicatrização de feridas está comprometida nos pacientes diabéticos por

mecanismos desconhecidos. Quando os níveis de glicose estão bem controlados,

a cicatrização melhora. A incidência elevada de fendas cutâneas crônicas nesses

pacientes está relacionada amiúde à combinação de neuropatia, vasculopatia,

comprometimento das defesas do hospedeiro contra infecção e distúrbios

metabólicos. A obesidade interfere no reparo independentemente do diabete. Os

44

pacientes obesos e diabéticos apresentam cicatrização das feridas insatisfatória a

despeito do grau de controle da glicemia e da insulinoterapia. É provável que a

perfusão insatisfatória das feridas e os restos adiposos necróticos comprometam

a cicatrização tanto em pacientes obesos diabéticos como em não-diabéticos.

• Corticosteróides, Quimioterapia e Radioterapia

Os esteróides comprometem a cicatrização, sobretudo quando

administrados nos três primeiros dias após o ferimento. Os esteróides reduzem a

reação inflamatória, a epitelização e a síntese de colágeno nas feridas.

Tanto a radiação como os agentes quimioterápicos exercem seus efeitos

principais nas células em divisão. A divisão das células endoteliais, dos

fibroblastos e dos queratinócitos está comprometida no tecido irradiado, o que

lentifica a cicatrização das feridas. De modo geral, o tecido irradiado exibe alguma

lesão residual das células endoteliais e endarterite, que provoca atrofia, fibrose e

reparo tecidual insatisfatório. Os agentes quimioterápicos não são administrados

até pelo menos cinco a sete dias após a operação para evitar comprometimento

dos eventos iniciais da cicatrização.

• Infecção

A contaminação da ferida por bactérias provoca infecção clínica e retarda a

cicatrização se mais de 105 microrganismos/mg estiverem presentes.

Antigamente, a resposta do hospedeiro a infecção localizada foi descrita como

rubor, dor, calor e tumor (eritema, dor, calor e tumefação). Por conseguinte, as

feridas infectadas são eritematosas e doloridas e comumente apresentam

drenagem. O paciente pode estar febril. É fundamental a abertura imediata da

ferida com retirada dos pontos de sutura e debridamento. A administração de

antibióticos trata a celulite circundante.

• Problema de Formação de Cicatrizes

As cicatrizes e a fibrose dominam algumas doenças em quase todas as

especialidades clinicas e cirúrgicas. Todos os dias os cirurgiões enfrentam as

repercussões da formação exagerada de cicatrizes. As incisões na pele curam

com cicatrizes e algumas vezes processos patológicos como quelóides e

45

cicatrizes hipertróficas são as sequeIas inesperadas. Na cirurgia abdominal,

sempre há formação de aderências fibrosas intraperitoneais e podem ocorrer

crises repetidas de obstrução intestinal de origem mecânica. As estenoses

ocorrem nos locais de anastomose, seja do cólon, de vasos sanguíneos, da

traquéia, do ureter ou do duto biliar. Os cirurgiões pediátricos sentem-se

frustrados pelo trágico problema de atresia biliar em lactentes — uma obliteração

fibrótica progressiva da árvore hepatobiliar. Outros exemplos incluem estenose

esofágica após ingestão de substancias cáusticas, estenose uretral pós-

traumática, aderências tendinosas após cirurgia de mão e perda de transmissão

após lesão de nervos periféricos.

Cicatrizes patológicas e fibrose também ocorrem frequentemente em

especialidades não-cirúrgicas. Os oftalmologistas encontram fibroplasia

retrolenticular em prematuros bem como retinopatia fibrótica em diabéticos. Os

gastroenterologistas tentam aliviar o sangramento, a insuficiência hepática e as

complicações encefalopáticas da cirrose hepática. Os pneumologistas detectam

displasia broncopulmonar (DBP) em prematuros PIG (pequenos para a idade

gestacional), e diagnosticam fibrose pulmonar em tabagistas idosos. Os

radioterapeutas preocupam-se com a fibrose induzida por radiação. Os

cardiologistas desejam aliviar as conseqüências fibróticas da cardiopatia

reumática — a cordoalha tendinosa encurtada e distorcida e os folhetos valvares

fibróticos. Os dermatologistas lidam com a esclerodermia. E esta é uma lista

apenas parcial.

Todos esses problemas são notoriamente difíceis de prevenir e de tratar. A

função terapêutica dos médicos é sobretudo aspirar ao melhor, de forma muito

semelhante àquilo que os médicos faziam no passado quando confrontados com

problemas então sem solução: apendicite até cem anos atrás, infecções

bacterianas até 50 anos atrás e substituição de órgãos recentemente. A

compreensão do processo de cicatrização das feridas fetais pode levar as

estratégias terapêuticas para evitar cicatrizes e fibrose. A cura sem cicatrizes teria

um impacto tremendo tanto na prática clínica como na cirúrgica.

46

Órgão/Sistema Efeito

Pele Trato GI Fígado Pulmão Coração Olhos Nervos Ossos Rins

Quelóide Cicatriz hipertrófica Contratura das queimaduras Esclerodermia Estenose Aderências Pancreatite Crônica Cirrose Atresia biliar Fibrose intersticial Displasia broncopumonar Cardiopatia reumática Aneurisma ventricular Fibroplasia retrolenticular Retinopatia diabética Perda da transmissão Anquilose Osteoartrite Glomerulonefrite

47

Conclusão

Segundo Baumgarth, 2003 a avaliação das aderências cicatriciais sob o

ponto de vista da crochetagem, consiste na aplicação sobre a cicatriz do esquema

em estrela em seis ramos de Maigne. Segundo o esquema em estrela de Maigne,

serão avaliados os seguintes parâmetros de mobilidade do tecido: parâmetro de

flexão, de extensão, de látero-flexão direita e esquerda, de rotação direita e

esquerda e, por último o parâmetro de compressão que avaliará o grau de maciez

e macicez do tecido. Respeitando os parâmetros observados pela avaliação

manual vai desenvolver-se a crochetagem objetivando-se recuperação da

mobilidade do tecido.

O método de tratamento consiste em utilizar o gancho para realizar a

fibrólise nas áreas aderidas da cicatriz, com objetivo de promover a liberação

tecidual. A abordagem da cicatriz segundo a crochetagem pode ser dividida

didaticamente em três etapas, onde a primeira compreenderá quatro trajetos de

aplicação e a segunda, e a terceira, dois trajetos.

Na primeira etapa se realizam movimentos curtos de tração em um eixo

paralelo à cicatriz por todo seu trajeto longitudinal da direita para esquerda e da

esquerda para direita, este procedimento deve ser realizado bilateralmente, de

modo que se completem quatro trajetos de aplicação, dois em cada lado da

cicatriz.

Na segunda etapa os movimentos serão realizados em um eixo

perpendicular a cicatriz, também por todo seu trajeto longitudinal. Estas trações

perpendiculares devem ser realizadas de maneira que cruzem sobre a cicatriz.

Estes movimentos também serão realizados bilateralmente, de modo que sigam

dois trajetos de aplicação de uma extremidade a outra da cicatriz.

Na terceira etapa os movimentos serão realizados de maneira semelhante

à segunda etapa, seguindo os mesmos eixos e trajetos, a diferença será que

nesta etapa os movimentos não cruzarão sobre a cicatriz, ou seja, os movimentos

terão início imediatamente após o bordo mais externo da cicatriz.

48

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50

ANEXOS

Resultado da Técnica

Extensão de tronco antes e depois do tratamento

Flexão de tronco antes e depois do tratamento

Método de Avaliação – Estrela em seis ramos de Maigne

F = Flexão E = Extensão LFD = Latero Flexão Direita LFE = Latero Flexão Esquerda RE = Rotação Esquerda RD = Rotação Direita C = Compressão

O

LFD

F

LFE

RD RE

E

C