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JUAN DIEGO QUESADA Querétaro 20 ABR 2015 - 10:48 BRT

FUTEBOL »

A última farra de Ronaldinho

Aclamado no Estádio Azteca, onde triunfaram Pelé e Maradona, brasileiro vira um ativo

valioso para o seu time, o Querétaro

Arquivado em:   Ronaldinho   Carles Puyol   Quéretano FC   Liga mexicana   FC Barcelona  

Liga futebol   México   América do Norte   América Latina   Futebol   Times esportes   América  

 A última farra de Ronaldinho só poderia mesmo acontecer

no México – um país que acolhe calorosamente os seus

 visitantes mais ilustres, sejam eles o papa João Paulo II ou

o jogador espanhol Emilio Butragueño. O atacante

 brasileiro visitou no sábado o Estádio Azteca, um palco

místico, de onde Pelé e Maradona saíram em triunfo. Em

apenas oito minutos, marcou dois gols e deu uma caneta

num adversário. Ainda que a partida entre o América e os

Gallos de Querétaro já estivesse resolvida (terminou 4 x 0

para os Gallos), Ronaldinho entrou em campo e foi cercado

num canto do gramado por seus companheiros, que o

reverenciaram como se fosse um sultão. Um deles fincou

um joelho no chão e fingiu engraxar as chuteiras do ídolo.

 A festa mexicana do Ronaldinho (Porto Alegre, 1980)

começou em setembro de 2014, quando um dos homens

mais ricos do país, Olegario Vázquez Raña, se empenhou

em contratá-lo para dar brilho à equipe que acabava de

adquirir. O magnata mandou um de seus emissários ao

Brasil e, dois dias depois, com um cheque de dois milhões

de dólares nas mãos, o gaúcho aterrissou no México. A 

operação foi um sucesso comercial –os Gallos ocupam

capas de jornais e horas de televisão–, mas o rendimentoesportivo não é nada do outro mundo.

Em Querétaro, a cidade onde vive, há mais livrarias que

discotecas. Os poetas recitam na rua. Os aposentados

dançam numa praça florida, e os paroquianos se amontoam

ESPORTES

Ronaldinho comemora um gol no Estádio Azteca, no México. / AP

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O jogador na quadra de futevôlei da sua

casa, no sofisticado condomínio El

Campanario, em Querétaro. / TWITTER

nas igrejas na hora da missa. O rastro de Ronaldinho, num

ambiente desses, se torna difuso. Embora pareça

onipresente –todos nesta cidade de 1,8 milhão garantem tê-

lo visto recentemente– não há forma de encontrá-lo. Uma

senhora jura que ele acaba de lhe dar um autógrafo numa

esquina, e um engraxate, no quarteirão seguinte, acredita

que o viu há poucos minutos, a bordo de uma caminhonete

parada num semáforo. Sempre parece estar por perto, mas

não há como alcançá-lo.

Sabe-se que come em uma

taberna espanhola cuja

especialidade é o leitão, que tem

um compartimento reservado

numa churrascaria onde as

garçonetes trabalham só de

sutiã, e de vez em quando dá as

caras em um restaurante

especializado em peixes, o

 Yellow Fish. Vive em El

Campanario, um condomínioplantado no alto de um morro,

com campo de golfe e um

colégio dos Legionários de

Cristo. Os guardas desse luxuoso

bunker  fazem cara de bravos

quando alguém pede para espiar lá dentro.

Tampouco é fácil topar com o jogador no centro de

treinamento do seu clube. Na semana passada, enquanto

seus colegas treinavam sob as ordens de Víctor Manuel

 Vucetich, ex-técnico da seleção mexicana, uma

fisioterapeuta o ajudava a se recuperar de uma lesão na

panturrilha. Chegou às 9h45 e saiu correndo às 11h42.

Pouquíssimos tiveram a chance de vê-lo.

 A contratação do jogador eleito o melhor do mundo em

2005 significou um empurrão para o aspecto comercial do

Querétaro, que até agora vagava a esmo pelo pelotão

intermediário da primeira divisão mexicana. A equipe foi

recebida por 600 pessoas no aeroporto de Veracruz, onde

 jogou em fevereiro. O gaúcho, apesar de apresentar hoje um

futebol mais analógico do que digital, precisou abrir

passagem aos empurrões para atravessar a multidão e

chegar ao ônibus que aguardava a delegação. A loucura é

também administrativa: a sede do clube tem hoje o dobro

de funcionários do que há um ano, o diretor-geral contratou

uma psicóloga conhecida por trabalhar com treinamento

mental na Argentina, e o departamento de imprensa recebe

diariamente uma enxurrada de pedidos de entrevistas com

Ronaldinho, impossíveis de serem todas atendidas.

O brasileiro parece alérgico ao cara a cara. Roberto de

 Assis, seu irmão e empresário, sabe que queremos falar com

ele, mesmo que só para tomar um café, mas suas respostas,

 via Whatsapp, parecem nebulosas. “Estou no Brasil, depoiste digo”, diz ele por mensagem de voz. Não haverá um

depois. Tudo ao redor do Ronaldinho é agora ou nunca.

Os resultados financeiros não acompanham os esportivos.

O jogador chegou vinte dias atrasado para a pré-temporada

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Preparando-se para entrar em campo no

sábado, no Azteca. / AP

(os demais jogadores começaram a treinar no começo de

dezembro) e só em fevereiro se tornou titular. Em nove

 jogos, sete como titular e dois como reserva, marcou dois

gols (sem influir no resultado final) e ofereceu quatro

assistências. Pouco para um dos atletas mais bem pagos do

futebol mexicano. “Veio principalmente por uma questão

de marketing. Ninguém esperava que fosse o melhor

 jogador da liga. O México é um país amistoso e tranquilo,

ideal para uma aposentadoria dourada”, diz o comentarista

esportivo Geo González.

Ronaldinho evoca de vez em

quando seu passado no topo,

sobretudo a época do Barcelona.

Em 13 de abril, alguém o

escutou comentar no vestiário:

“Hoje é o aniversário do meu

capitão”. Naquele dia, em algum

lugar, Carles Puyol estava

soprando 37 velinhas. Nunca se

questiona por ter apeado tãocedo da elite, por ter perdido o

prumo da carreira quando tinha

apenas 27/28 anos? “Essa pode

ser a sua opinião, mas não a

dele. Ele é muito feliz, está

contente por tudo o que a vida

lhe deu, que não é pouco. Não tem nenhum conflito pessoal

com seu passado”, conta uma pessoa que trata do aspecto

psicológico dele. Outras fontes ouvidas concordam que

Ronaldinho não é melancólico por natureza.

“Queríamos um jogador de grife, e era o candidato ideal”,

diz Arturo Villanueva, presidente administrativo do clube e

o homem em quem Ronaldinho mais confia em Querétaro.

“ Rona é uma figura. Só precisa de uma bola e de música

para ser feliz. Está adorando o país, a comida, as mulheres.

Sua contratação foi um sucesso em todos os sentidos”,

comemora.

Embora as estatísticas do jogador sejam medianas, o

discurso otimista da diretoria se impôs em todos os

escalões do clube. Andrea Fernández, a psicóloga argentina,

diz que Ronaldinho é “alguém divino”. Inés Massacessi,

uma fisioterapeuta com ampla experiência, nunca tinha

 visto quadríceps tão desenvolvidos. Os outros jogadores,

quando ele dá as caras no CT, ficam pasmos com os

malabarismos que ele faz com a bola. Atletas de segundo

nível têm a sensação de que, estando ao lado dele, terão

uma boa história que contar aos netos.

 A sensação de sucesso que

rodeia os Gallos levou

Ronaldinho a um estado de

confusão. Em março, publicou

no Twitter uma foto em queaparecia segurando um troféu.

“Esta taça serve de motivação

extra para este final de

temporada”, dizia. Na verdade,

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Foto publicada por Ronaldinho no

Twitter.

não havia ganhado nada que

 valesse a pena comemorar.

Tratava-se apenas de um

amistoso disputado em Frisco, no Texas. No sábado, a

imprensa esportiva mexicana exagerou seu feito com

manchetes como “Ronaldinho comanda a goleada” e “Ronie

humilha o América”. Não há ambiente mais feliz e protetor

para o brasileiro do que este. No México, cada dia mais

perto da sua aposentadoria, Ronaldinho desfruta da que

parece ser sua última farra.

© EDICIONES EL PAÍS, S.L.