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A letra visigótica Um singular tipo de letra, que acompanhou todo o percurso medieval da Península Ibérica, desde o século V até ao século XIII e que assistiu à fundação do reino de Portugal. Por motivos político-religiosos, foi substituída pela Carolina. Uma síntese de Paulo Heitlinger. O s testemunhos da cultura visigótica em Portugal e Espanha – alguma pouca arquitectura, artes deco- rativas, escultura e epigrafia, legislação, preciosos manuscritos iluminados – são escassos, pouco conhe- cidos do grande público, mal divulgados e frequente- mente mal interpretados. Falamos de um período começado pelas «inva- sões bárbaras», com início em 409, e fortemente afectado pelas invasões muçulmanas no ano de 711. Mas continuado antes, ao longo e depois da Recon- quista: nos manuscritos e nas epígrafes podemos tra- çar a continuidade da escrita visigótica até aos sécu- los xii–xiii. Citemos da excelente (mas incompleta) obra de Maria José Azevedo Santos: «Saliente-se [...] que aquele tipo de escrita não desaparece com a inva- são árabe; as populações moçárabes, de que destaca- mos a camada mais culta – o clero – continuarão a uti- lizá-la e mais tarde, quando emigrarem para as regiões do Norte cristão, i-la-ão aí utilizar e transmitir, natu- ralmente, aos povos autóctones. Aliás, conhecem-se bem as características do chamado <sentimento neo- goticista> que tende a continuar, restabelecer ou res- taurar o passado áureo da sociedade visigoda em todas as suas facetas – e a escrita, um dos mais importantes elementos de identidade de um povo, como se pode provar, fez bem parte daquele sentimento e propó- sito.»

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A letra visigóticaUm singular tipo de letra, que acompanhou todo o percurso medieval da Península Ibérica,

desde o século V até ao século XIII e que assistiu à fundação do reino de Portugal. Por

motivos político-religiosos, foi substituída pela Carolina. Uma síntese de Paulo Heitlinger.

O s testemunhos da cultura visigótica em Portugal e Espanha – alguma pouca arquitectura, artes deco-rativas, escultura e epigrafia, legislação, preciosos

manuscritos iluminados – são escassos, pouco conhe-cidos do grande público, mal divulgados e frequente-mente mal interpretados.

Falamos de um período começado pelas «inva-sões bárbaras», com início em 409, e fortemente afectado pelas invasões muçulmanas no ano de 711. Mas continuado antes, ao longo e depois da Recon-quista: nos manuscritos e nas epígrafes podemos tra-çar a continuidade da escrita visigótica até aos sécu-los xii–xiii. Citemos da excelente (mas incompleta) obra de Maria José Azevedo Santos: «Saliente-se [...]

que aquele tipo de escrita não desaparece com a inva-são árabe; as populações moçárabes, de que destaca-mos a camada mais culta – o clero – continuarão a uti-lizá-la e mais tarde, quando emigrarem para as regiões do Norte cristão, i-la-ão aí utilizar e transmitir, natu-ralmente, aos povos autóctones. Aliás, conhecem-se bem as características do chamado <sentimento neo-goticista> que tende a continuar, restabelecer ou res-taurar o passado áureo da sociedade visigoda em todas as suas facetas – e a escrita, um dos mais importantes elementos de identidade de um povo, como se pode provar, fez bem parte daquele sentimento e propó-sito.»

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R eferindo-se aos manuscritos que estudou, a pe-rita francesa Mireille Mentré comenta: «De modo geral, a percepção da pintura de manus-

critos nos séculos x e xi em Espanha ficou mais bem fundamentada, apesar das pinturas pré-românicas continuarem a ser negligenciadas. O estudo dos ma-nuscritos ganhou em precisão através das análises que E.A. Lowe e R.P. Robinson fizeram a manuscritos do século ix, e através dos estudos preliminares de A. Millares Carló, feitos num âmbito mais geral. A noção de um Spanish script of the 7th to 9th centuries, hoje co-nhecido como <visigótico>, emergiu nesse contexto e este script é idêntico ao que foi achado nos manuscri-tos com decoração (pinturas) moçárabe.»

A escrita visigótica – visigothic script – não começa no século vii, mas já em princípios do século vi, con-forme testemunham várias lápides funerárias pale-ocristãs que mostraremos. Um dos factos relevantes é que este estilo de letra irá, mais tarde, acompanhar todo o percurso até à fundação do reino de Portugal, já que todos os documentos que nos chegaram desta época foram caligrafados com a escrita visigótica. Um dos exemplos é a acta de doação, datada de 1109, mos-trada na página xx.

A unificação política, jurídica e religiosa da Hispâ-nia realizada pela monarquia visigoda reflectiu--se numa arte e cultura dita «visigótica», com

raízes e influências bizantino-gregas, tardo-romanas, paleo cristãs, germâ ni cas e indígenas. Desta síntese de-rivou algo como um estilo «hispano-cristão», que po-deria muito bem substituir a designação «visigótica», que, no fundo, não é apreciada por nenhum dos pes-quisadores da área.

A influência cultural dos invasores germâ ni cos, que tem sido descrita como limitada às artes menores e aos adereços pessoais, aumentou desde o século v, com a adopção de padrões estéticos e culturais bizantinos. Este estilo alcançou o seu apogeu na segunda metade do século vii.

Mérida e Toledo 1) foram os principais focos da arte da corte visigoda, cujas arquitectura, escultura e pin-

1.) Para saber mais sobre Toledo como capital visigótica, consulte o informativo site www.toletumvisigodo.eu.

Uma forma única de apresentar letras: detalhe da coroa

votiva do rei visigodo Recesvinto. As letras representam

o texto RECCESVINTHUS REX OFFERET. Altura do

diadema: 10 cm. Diâmetro: 20,6 cm. Espessura: 0,9 cm.

Foto de Manuel de Corselas, ARS SUMMUM, Centro

para el Estudio y Difusión Libres de la Historia del Arte.

Arte visigoda, estilo bizantino – compare com a coroa

bizantina de Justiniano. Museu de Arqueologia Madrid.

tura decorativa mostram claro protago nismo bizan-tino e até influências norte-afri canas. Centros meno-res associados ao Paleocristia nis mo foram Mértola, Beja, Conímbriga e São Gião (Nazaré). Não esque-cendo as basílicas paleocristãs de Torre de Palma (Alentejo) e a de Castro Marim (Algarve).

A forte influência bizantina – tanto a política como a cultural – na cultura visigótica em terras hispânicas tem sido pouco realçada. A citada inves tigadora Maria José Santos ignorou-a completamente. Vejamos um facto, entre muitos: a luta entre o rei ariano Ágila (549 – 554) e o rei Atanalgildo permitiu aos Bizantinos, insta la dos nas Baleares, ocupar as costas mediterrâ-neas desde Valência até Málaga e depois conquistar Múrcia e Córdova. Uma presença curta, mas que dei-xou claros vestígios.

Outro detalhe: A corte dos reis visigodos, aula regia, assemelhava-se à corte bizantina de Ravena: o príncipe, que já tinha abandonado o vestuário «bár-

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Cruz cristã. Arte visigoda, estilo bizantino. Museu

de Arqueologia de Sevilha. Foto: PH.

Caçador a cavalo,

com o seu falcão.

Arte visigoda, estilo

bizantino. Mértola.

baro» (germânico), estava rodeado pelos seus seniores e era assistido na administração pelo conde da câmara real, pelo conde do tesouro público, pelo conde do património, etc.

Os actos escritos emitidos pela chancelaria real, for-mal mente semelhantes aos de Bizâncio, eram envia-dos aos rectores das províncias e aos curiales das cida-des. Na corte visigoda, alguns príncipes gabavam--se de ser letrados: o rei Reca redo e os seus sucessores Sisebuto e Recesvindo deixaram-nos nas suas poesias e obras hagio gráficas testemunhos do seu «talento literário».

A Escrita visigótica

A quilo que chamo simplificadamente «letra visi-gótica» (ou «hispano-cristã») foi usado exclu-sivamente na Península Ibérica; não existiu em

qualquer outra zona europeia. Começou a aparecer na cultura tardo-romana/cristã a partir do século iv, re-sultado de uma evolução local das letras romanas, com parcial integração do estilo bizantino. Esta Visigótica entrou em uso durante o domínio suevo e visigodo e perdurou, sempre limitada à Península Ibérica, até aos séculos xii – xiii, já em plena Idade Média.

Sobre a Minúscula visigótica existe alguma pes-quisa paleográfica, já que foi usada em diversos manuscritos historicamente muito importantes. Con-tudo, no que se refere à variante versal (as letras maiús-culas, feitas num estilo próprio), não consegui detec-tar muita informação válida. Neste campo, o mais exacto é Bernhard Bischoff, que na sua Paleografia do Latim precisa: «...Here even Capitalis existed along-side uncial and half-uncial, and later Roman cursive of the sixth or seventh centuries is preserved in numer-ous charters, slate tablets, and in several parchment fragments of diplomas...»

C uriosamente, também tem passado desper-ce bido à maioria dos paleógrafos, soberanos desconhece do res da nomenclatura da Caligrafia

e Tipografia, a existência de versaletes, também estes com o seu estilo próprio: letras mais quadradas e mais bold, muito mais pequenas do que as versais.

Para uma abordagem empírica a estes tipos de letra tive de basear-me em fotografias de inscrições. Por exemplo, fotos de estelas funerárias expostas no

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Em cima: estela funerária com o epitáfio de Fistellus,

Mértola. Ano 510 n.E. Inscrição em latim, sobre

mármore: altura 48 cm; largura, 32 cm; espessura, 6 cm.

Em baixo: estela funerária visigoda. Alcalá del Rio

(Sevilha). Século vi-vii. Museu Arqueológico de Sevilha.

Museu de Mértola (Núcleo Visigótico, situado sobre as ruínas da basílica paleo cristã), no Museu de Beja (Igreja de Santo Amaro) e nos museus arqueológi-cos de Mérida, Huelva, Córdova, Sevilha e Badajoz, assim como no Museu Monográfico de Conímbriga, um dos melhores museus arqueológicos de Portugal. As ocorrências epigráficas mais tardias – em território hoje português – parecem ser as inscrições nas paredes do claustro do Mosteiro de Alcobaça, mostradas nesta apresentação.

Os Visigodos em terras hispânicas

A escrita visigótica leva o seu nome dos Visigodos. No século v, a Península Ibérica, depois de vá-rios séculos sob o domínio do Império Roma-

no, foi invadida por povos germânicos – Suevos, Vân-dalos, Alanos e Visigodos. Os Godos eram um povo originário das margens do mar Báltico. Por volta de 230, os grupos étnicos godos separam-se nos seus dois principais ramos: Ostrogodos e Visigodos.

No seu trajecto migratório, os Visigodos voltam--se para a Península Ibérica, onde a sua presença já era sentida pela ocupação, em nome de Roma, sobretudo a partir do reinado de Teodorico ii (453 – 466). O seu

Placa funerária visigoda/paleocristã. Museu

Arqueológico de Badajóz. Foto: P. Heitlinger.

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Epígrafe emeritense da mártir Eulália, no Museu de

Arte Romano de Mérida.

Placa de mármore de cor cremosa, muito bem

conservada. Versais visigóticas. Estão visíveis as

linhas pré-traçadas para servir de alinhamento ao

escultor. Esta placa tem os caractéres epigráficos

típicos das inscrições emeritenses do século vii.

Exibe modalidades que permitem indicar a data da

sua redacção entre 650 e 670 n.e. Vemos algumas

ligaduras típicas da escrita versal visigótica, na sua

fase primária. A transcrição é a seguinte:

HANC DOMUM IU

RiS TUi PLACATA POSSIDE

MARTiR EULALIA *

UT CoGNOSCENS INIMICuS

CoNFUSUS ABSCEDAT *

UT DOMUS HEC CuM HABi

TATORIRUS TE PROPiTiANTe

FLORESCANT / AMEN.

(Ó mártir Eulália: Toma posse pacífica desta casa de

tua propiedade, para que vendo-a,

o inimigo fuja confundido, para que sob

o teu favor prospere esta casa com os

que a habitam. Assim seja).

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sucessor, Eurico (466 – 484), foi o responsável pelo assentamento visigodo duradouro em terras hispâni-cas.

A partir da derrota de Vouille (507), infligida pelos Francos, o reino visigodo confinou-se à Penín-sula Ibérica, embora a capital continuasse a ser Tou-louse, na Gália, não obstante uma progressiva «iberi-zação» do reino visigodo, sobretudo a partir do rei-nado de Teudis (531 – 548).

Inicia-se então o período de auge da monarquia visigoda, sobretudo durante os reinados de Leo vi-gildo e do seu filho, Recaredo i (reinou de 586 a 601), que abandona o Cristianismo da vertente ariana para se converter ao Catolicismo, que passa a ser a religião oficial. À semelhança do seu pai, Recaredo i fez de Toledo a capital do seu reino.

Apesar de episódios de grande brilho, como os dos reinados referidos, ou os de Sisebuto (612 – 621) e Recesvinto (649 – 672), a instabilidade política, com o assassinato da maior parte dos reis e o hábito de nomeação dos monarcas, impedindo a estabili-dade de uma sucessão hereditária, levaram ao defi-nhar da monarquia visigoda.

A mal governada sociedade entrou num processo de feudalização progressiva. O já escasso comércio externo desapareceu; o sistema fiscal, cada vez mais ineficiente, deixou quase de existir. Estas condições de decadência favoreceram o rápido avanço da inva-são militar islâmica de 711, liderada pelo general omí-ada Tariq ibn Ziyad, que comandou a conquista da Península Ibérica a partir do rochedo que leva o seu nome: Gibraltar. Do Norte de África tinha chegado o Cristianismo; do Norte de África veio o Islão.

O idioma falado no reino visigodo

C om o domínio visigodo, a cultura e a unidade política e administrativa romana romperam-se total e definitivamente. Mas os Visigodos, que

em termos demográficos representavam uma peque-na fracção da população, cedo abandonaram a sua cultura e romanizaram-se; fundiram--se com a popu-lação local, adoptaram o Cristianismo e assimilaram o latim vulgar.

Placa funerária visigoda. Letra versal visigótica,

fortemente condensada. Museo Arqueológico de Sevilla.

Em Cacela Velha, no Algarve, identificou-se a lápide

funerária do bispo Iulianus, datada para o século x, cuja

qualidade se aproxima da realidade moçárabe em

Sevilha e Córdova. Letra versal visigótica, regular,

fortemente condensada.

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A organização clerical preencheu, pelo menos par-cialmente, o vácuo político-administrativo. No fim do período visigótico, Rodrigo, o último rei godo, lutou até 711 contra a invasão islâmica, defendendo a seu reino, e (supostamente) a religião cristã. Os governan-tes visigodos tiveram de fugir para o Norte da Penín-sula Ibérica; aí prepararam a Reconquista.

Durante o domínio visigodo falava-se o latim vul-gar, na variante hispano-românica. Só no século v é que se assinala o início do romanço – cujo uso se pro-longa até ao começo do século ix, época em que o latim desemboca numa multiplicidade de línguas. Numa fase de transição aparecem textos escritos nas diversas línguas români cas. Entre esses «falares inter-mediários», é o romanço lusitânico que se instala no território hoje português; dará origem à lingua portu-guesa.

Formas das versais visigóticas

U ma parte dos vestígios paleocristãos/visigóti-cos no Sul de Portugal conserva-se no Museu de Mértola, em cujo Núcleo Visigótico se pode es-

tudar uma rara colecção de lápides funerárias, inscri-tas com formas arcaicas do alfabeto versal visigóti-co. Aqui, as ruínas de uma basílica paleo cristã foram preservadas pelo Campo Arqueoló gico de Mérto-la (www.camertola.pt), sob a direcção do distinto arqueó logo e autor Cláudio Torres.

Neste grupo destacam-se as estelas inscritas em língua grega, datáveis para o século vi. O conjunto de lápides epigrafadas em grego testemunha que em Myrtilis (designação latina de Mértola) existiu uma pequena comunidade originária do Medi ter râneo oriental, com um dos seus membros nascido na Líbia. Seriam famílias ligadas ao comércio e possivelmente relacionadas com movimentos cristãos de carácter monofisita. Aianes, Antónia, Festelus, Amanda, For-tunata ou Rufina – são alguns dos nomes que pode-mos ler nas lápides – foram contemporâneos de um certo Andreas, o regente do coro da basílica.

Usando como referência as inscrições de lápides funerárias cristãs em Mértola, Mérida, Huelva, Bada-joz e Sevilha, definem-se as formas mais característi-cas deste alfabeto:

Um documento excepcional para o conhecimento da

letra visigótica no Sul da Península Ibérica: a lápide

funerária com o epitáfio de Vincomalos, bispo visigodo

da sede episcopal de Niebla, foi descoberta

acidentalmente em Bojeos, Bonares, Huelva.

Vincomalos («o vencedor dos pecadores») viveu de 424

até 509 n.E., foi bispo de Ilipla (Niebla) até 466.

VVINCOMALOS EP[piscopu]S CHR[ist]I SERVVS VIXIT

ANNOS LXXXV EX QVIB[us] IN SACERDOTIO VIXIT

AN[nos] XLIII RECESSIT IN PACE D[ie] IIII NONAS

FEBRVARIAS ERA DXLVII (Vincomalos, bispo, servo de

Cristo, viveu 85 anos, dos quais viveu no sacerdócio 43.

Descansou em paz no dia 4 das nonas de Fevereiro do

547 da Era). Muitos bispos tiveram um papel chave na

vida social, política e económica durante os convulsos

anos entre a eclipse do poder imperial romano e o

estabelecimento definitivo do poder visigodo.

Em baixo: lápide de Muriensis. Fotos: Museu de Huelva,

Andaluzia, Espanha.

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Entre muitos outros belos exemplos da versal visigótica, este é, sem

dúvida, um dos mais importantes, já que o artesão, ao deixar a sua

lápide inacabada, nos mostra nos desenhos em esboço o conceito do

seu «typeface design», antes de proceder à gravação propriamente dita.

Bem visíveis, algumas formas características deste letra, como o D

triangular, o X e O K, etc.

Neste exemplo, a letra ainda não apresenta a condensação típica da sua fase

tardia, nos séculos X - XIII. Inscrição em lápide funerária, exposta no Museu

Arqueológico de Beja. Foto: PH.

• As letras, todas versais, são condensadas. A condensação aumentará no decorrer dos séculos.

• Muitas letras mostram forma rectangular. • O D epigráfico tem forma quase triangular.• O L é bastantes vezes prolongado com um

ascendente. • O X tem a forma de uma cruz inclinada. • O B e o R têm muitas vezes a pança separada do

elemento contíguo.• O K tem uma forma peculiar, os elementos

diagonais são curtos. Influência grega?

• O A tem um remate no vértice; umas vezes tem barra quebrada, outras vezes não tem barra.

• O P apresenta uma pança pequena, colocada no terço superior da haste.

• Existe uma forma do H como se fosse uma minúscula muito alta.

• O E é rectangular – ou tem a forma redonda, característica das Unciais.

• O F, e por vezes o E, se lhes omitimos o travesso inferior, parecem um T alargado, e o braço esquerdo termina frequentemente com uma curvatura pronunciada («corno»).

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Epitáfio de Orania. Ano de 503 n.E. Excelente

testemunho da aplicação de letra visigótica. Lápide

funerária pertencente ao Museu Nacional de

Arqueologia, mas exposta em Mértola.Ano de 544 n.E. Letra versal visigótica. Gradeado de

trama com arcos imbricados, representando uma cerca

de igreja. Lápide funerária de Amanda. Pertencente à

colecção do Museu Nacional de Arqueologia, mas

exposta em Mértola.

Duas epigrafes visigóticas, Museu de Arte Romana, Mérida.

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Epitáfio de Festellus. Ano de 527 n.E.

AIANES HONESTA FEMINAEpitáfio de Aianes. Ano de 524 n.E. As pombas, ou de

modo geral, as aves, simbolizam frequentemente a alma.

Belo exemplo de Versal visigótica.

Epitáfio de Rufina. Ano de 587 n.E.

Imagem em negativo, para melhor leitura da inscrição.

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Epitáfio cristão de Seriano. Letra versal visigótica. Data

indicada na lápide: 541 n.E. Calcário de Ançã. Note o

«K», letra que aparece raramente. «KL» é a abreviação

de Calendas. Museu Monográfico de Conímbriga.

Foto: PH

• O S aparece muitas vezes inclinado. É mais plano que o modelo romano, mais delgado, a sua curva superior pequena, a inferior é maior. Este modelo geral tem excepções.

• O elemento diagonal do N é quase sempre mais curto do que nas versões romanas.

• O V=U parece um Y moderno, composto por uma haste recta e outra oblíqua ou curva, à esquerda. Influência das Unciais?

• Nas inscrições em pedra dos primeiros séculos, as serifas são mais finas do que as serifas «patudas» que mais tarde aparecem nos códices manuscritos.

• Existem muitas ligaduras (TI, CO, etc.) realizadas com letras sobrepostas.

• As abreviaturas não seguem um padrão geral.De modo geral, temos desta letra frequentemente uma impressão semelhante à que nos assalta quando admi-ramos a Arquitectura tardo-romana ou românica: pre-tendeu-se copiar um modelo romano cuja função que já não era percebida. A imitação resulta frequentemen-te numa caricatura do padrão clássico. Apesar de ter nascido como um abastardamento das letras clássicas romanas, a letra versal visigótica mostrou na sua fase madura um certo vigor e originalidade...

A fase tardia das versais

E m contraste com as primeiras manifestações da Versal visigótica em lápides funerárias paleo-cristãs, a versão tardia, que abunda em manus-

critos medievais na Península Ibérica, é muito mais condensada, as formas são mais refinadas e as serifas ou alongamentos são muito elegantes – e observamos uma quantidade espantosa de letras sobre postas e de ligaduras. Na fase final, a letra versal visigótica apre-senta ornamentos «barrocos», e terá, eventualmen-te, integrado alguns elementos da letra uncial. Deste modo, observamos um M redondo (usado em paralelo com um m «direito») e também o E perde por vezes a sua forma rectangular, adoptando a forma curva do e uncial.

A Minúscula visigótica

A grande diversidade de escritas que existiram por toda a Europa resultou das variações regionais sofridas pela Minúscula romana. A designação

Minúscula visigótica é pelo menos tão errada como Mi-

núscula carolina, pois ambas as grafias incluem maiús-culas.

A Escrita visigótica praticou-se em duas ver-sões: cursiva e redonda. A forma cursiva foi usada em documentos como actas de doação, presúria, etc.; a redonda (melhor designada caligráfica ou librária), que integrou elementos da Uncial e Semi-uncial, apa-rece sobretudo nos códices 1).

1.) Quase todas as fontes escritas da época visigótica estão publicadas. As compilações jurídicas (como as Leges Visigothorum ou o Codex Theo do sianum); a epigrafia (inscrições tumulares e as famosas pizarras visigodas); as literárias (Historia Wambæ Regis, de Julián de Toledo; Historia Gothorum, de Isidoro de Sevilha); os modelos notariais (Formulæ

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A Visigótica atingiu a sua forma mais bela e solene como caligrafia librária («belle et soignée», como escreveu Franz Steffens na sua Paléo graphie latine, publicada em 1910); a variante cursiva é irregular e cheia de ligaduras.

A Visigótica caracteriza-se por ter ascendentes e descendentes muito longos – em relação ao corpo da letra, que é de dimensões reduzidas. As suas letras distintivas são: o a aberto, o g estreito, o t de forma «beta invertido», o t designado em espanhol de cope-tudo e o et em ligadura do e com o t. Possui um sis-tema de abreviaturas diferente daquele que se imporá com a Carolina (página 238); no texto corrido não se utilizaram abreviaturas por letras sobrescritas e usa-ram-se profusamente modificações literais.

A Visigótica foi escrita, no início, com cálamo; os traços verticais, horizontais e oblíquos são relativa-mente uniformes, não mostrando grande contraste entre elementos grossos e finos nem fracturas nas letras. Citemos dois importantes códices grafados com esta letra.

O Códice Vigilano (Chronicon Albeldense) é uma obra capital do scriptorium do mosteiro de San Martín de Albelda, centro cultural do reino de Pamplona. Esta compilação contém actas de concílios, decretos ponti-fícios, um calendário moçárabe e vários tratados. Nas páginas finais consta o nome do mosteiro e a data em que se terminou: 976. As ilustrações são de extraordi-nária riqueza, tanto pelo número de fólios iluminados como pela arte das miniaturas no estilo riojano.

Outro belo exemplo de escrita visigótica é o Códice Emilianense 46 da Real Academia de la Historia, que contém o primeiro dicionário enciclo pé dico da Península Ibérica. Acabou de ser copiado (a partir do Códice Vigilano) em 964, no scriptorium de San Millán de la Cogolla (Rioja).

O primeiro documento escrito em Visigótica com datação é de 774, em Espanha; de 882, em Portugal. Os principais centros de difusão foram Toledo (capi-tal do reino visigodo), o Mosteiro de Santo Domingo de Silos (Burgos), o Mosteiro do Lorvão (perto de Coimbra) e o Mosteiro de Leão.

Wisigothicæ); as actas conciliares, os Beatus, etc.

San Martin de Salas. Colegiata de Santa María la Mayor

en Salas, Asturias

A substituição pela Carolina

O declínio desta letra singular começou no século xi, por intolerância religiosa. Decretou-se que a to-letana fosse substituída pela littera gallica (a escri-

ta carolina) – mas a toletana ainda conseguiu sobrevi-ver algum tempo.

A observância cisterciense foi introduzida em mos-teiros portugueses entre 1142 e 1144. O afastamento da Visigótica e a penetração da letra carolina devem--se à reforma monástica cluniacense 1) e à vinda para a região de Portucale de monges, militares e nobres de França. Neste reino emergente, os scriptoria das sés de Braga e de Coimbra foram no século xi os prin-cipais centros onde a Visigótica se escreveu 2). O uso

1.) A ordem de Cluny, reforma da ordem beneditina, foi criada em 910 quando Guilherme i, duque de Aquitânia, doou a vila de Cluny ao papado, para aí fundar um mosteiro.

2) «... à data da fundação de Portugal .... existiam mais de setenta mosteiros “de tradição visigótica”, alguns dos quais aderiram, progressivamente, às novas observâncias monásticas - beneditina, agostinha e cisterciense -, que viriam a implantar-se, em Portugal, no último quartel do século XI e durante a primeira metade do século XII. Embora em níveis diferentes, estas comunidades monásticas, além de centros de espiritualidade e de apoio aos núcleos de cristãos, dispersos à sua volta, constituíram também os únicos centros produtores de escrita e difusores de cultura...» José Marques. Caminhos da escrita no Noroeste de Portugal. Revista da Faculdade de Letras

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desta escrita tradicional prolongou-se pelo século xii e alastrou a centros como o scriptorium do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra.

Um dos fenómenos mais curiosos é que a Versal visigótica sobreviveu à Minúscula visigótica. Em vários manuscritos escritos com letras góticas monásticas (a caligrafia que acaba por substituir tanto a Visigótica como a Carolina), continuamos a verificar a existência de títulos e subtítulos grafados com a Versal visigótica – um apego a uma tradição secular de usar a littera tole-tana...

O ano de 1127 é indicado como a data em que surge em Portugal o primeiro documento redigido em letra carolina. Este primeiro testemunho da assimilação da Carolina foi originado pelas estreitas relações entre o reinado emergente de Portugal e os territórios da França, e pela forte presença dos Beneditinos.

O Sínodo de Léon, concílio reali zado em 1091 sob a presidência do cardeal Rainer (mais tarde, papa Pas-cal ii), proibiu a littera toletana (a Visigótica) na escrita de livros litúrgi cos, como meio de supressão do ritual moçára be, que nessa altura começou a ser substituído pelo ritual romano da Reforma gregoriana.

No Condado Portucalense, o arcebispo de Braga, Geraldo de Moissac, empenhou-se na substituição da liturgia visigótica-moçárabe pela romana, cumprindo o quadro da Reforma gregoriana. (Geraldo nasceu numa família nobre, na diocese de Cahors, em França; professou na abadia cluniacense de Moissac.) Geraldo de Moissac faleceu em 1108, depois de um governo curto mas intenso, em que levou a efeito um conjunto de reformas eclesiásticas e administrativas, reorgani-zando a escola da catedral e o cabido.

Adriana Cardoso escreve na sua obra A língua latino-portuguesa de notários do século xi: «Com a substituição oficial da liturgia hispânica pela litur-gia romana ... os rituais, os textos litúrgicos e a pró-pria celebração eucarística foram radicalmente altera-dos. A estratégia de difusão desta reforma ficou a cargo de bispos franceses que, a partir dessa altura, foram nomeados para algumas dioceses.»

Ciências e Técnicas do Património. Porto 2006-2007I Série vol. V-VI, pp. 291-322

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U m dos aspectos mais incisivos da influência fran-cesa foi a introdução do latim medieval reforma-do. Com esta reforma, a formação dos clérigos

e monges foi alterada, de forma a que pudessem, por exemplo, utilizar os novos livros litúrgicos redigidos num latim mais «clássico». ¶

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Beato de Osma, fólio 139,

«As rãs». Burgo de Osma,

Arquivos da Catedral. Uma

magnífica ilustração, com

texto em Versal visigótica,

versaletes com forma

própria e Minúscula

visigótica. Várias ligaduras.

No famoso Beatus d’Urgell,

um dos mais fascinantes

livros jamais produzidos,

podemos apreciar a alta e

esguia Versal visigótica ao

lado da Minúscula

visigótica, para constatar

que são realmente dois tipos

de grafia diferentes.

Este precioso manuscrito foi

produzido no século xi.

Beatus d’Urgell, folha 184v;

«O Cordeiro vencedor das

Bestas e da Serpente».

Os manuscritos hispânicos designados por Beatus são

outra fonte essencial para o estudo da escrita visigótica

nas suas expressões tardias. O título genérico Beatus

designa o Comentário ao Apocalipse de São João pelo

monge Beato, que viveu no vale de Liébana (daí «Beato

de Liébana»). Os códices denominados Beatus são

cópias executadas em diversos scriptoria dos antigos

mosteiros. Não se conservaram todos os códices; dos 34

que hoje existem, 25 estão mais ou menos completos.

São apreciados como importantes obras de arte.

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Biblia hispalense (Bíblia de Sevilha, ou Códice Toletanus). Um manuscrito da primeira metade do

século X, escrito em latim em escrita visigótica, por pelo menos quatro copistas. Os títulos também

aparecem em hebraico e há notas em árabe nas margens. O manuscrito é composto por folhetos

de oito folhas cada, em pergaminho, sendo o texto dividido em três colunas de 63-65 linhas. Apesar

do formato e conteúdo claramente cristão, a influência árabe da ocupação dos Mouros de

Al-Andalus é notável na ornamentação, no arco duplo em forma de ferradura com motivo

decorativo na forma de flores e folhas típicas da arte islâmica. Os símbolos dos evangelistas, São

Lucas e São João, são incluídos e há desenhos dos profetas Miqueias, Naum e Zacarias, e algumas

iniciais com pássaros e peixe.

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Escrita visigótica, articulada com Minúscula e Versal. Acta de 22 de Fevereiro de 1109. Uma doação real

à Abadia de Cluny: a infante Urraca, dama de Galicia, oferece o Mosteiro de Pombeiro. Confirmado,

entre outros, pelo bispo de Braga. Origem: Biblioteca Nacional de França, Paris.

Transcrição: (chrismon) In Dei nomine. Ego infanta domna Urraka, regis domni Adefonsi filia et totius

Galletie domina, vobis abbati domno Ugoni et omnibus monacis Cluniacensibus, in

domino Deo salutem, amen. Placuit michi liberali animo, nullo cogente imperio, sed mea

propria voluntate atque consilio patris mei imperatoris domni Adefonsi, facere domino

Deo et sancto Petro Cluniacensi et vobis dompno abbati Ugoni et omnibus monacis

ejusdem monasterii hanc cartulam donationis de illo monasterio de Palombario cum

omnibus ajunctionibus tam ecclesiis quam etiam laicalibus sibi pertinentibus. Ego infanta

domna Urracka supra scripta dono atque offero vobis illud monasterium supra scriptum

pro anima mariti mei comitis domni Raimundi et pro remedio animæ meæ et parentum

meorum, ut habeatis et possideatis et secundum vestram voluntatem de eo faciatis, ita de

hodie die vel tempore de juri meo ablato vestro dominio sit tradito et concesso habeatis

vos illud et omnes successores vestri evo per evu et secula cuncta, amen. Si quis tamen de

meis posterioribus tam propinquis quam extraneis aliquid contra vos dixerit vel vobis de

illo monasterio auferre voluerit, quod minime fieri credo, imprimis duplicet quantum

calumpniaverit et insuper decem auri talenta, post haec sit excommunicatus in secula

seculorum donec ad emendationem veniat.

Facta cartula donationis sub era millesima Ca XLa VIIa et quot VIII kalendas marcii.

Ex omni gente regali infanta domna Urraka, totius Galletie domina et imperatoris domni

Adefonsi filia et Constantiæ reginæ nata, hanc cartulam fieri jussi et hoc meum signum

facere precepi (selo).

Didacus Conpostellane sedis et æcclesiæ beati Jacobi apostoli secundus episcopus

confirmat. Mauricius Bragalense sedis episcopus confirmat. Didacus Auriense sedis episcopus

confirmat. Abbas Petrus Celle nove confirmat. Petrus notarius infante domne Urrake confirmat (selo).

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Um excelente exemplo para mostrar a variedade da Escrita visigótica: duas mãos

de Minúscula, articulada com letras maiúsculas; letras versais no título (incipit).

Crónica de Fredegar, datável para 800 n.E.

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?AaBbCDEeFGHIJKLlMmNnOPQR.STtUVWXYdZÆfibcdfi�����abcdefghijklmnopqrstuvwxyzA fonte digital Imperatorum é mais semelhante ao

padrão caligráfico escrito nos manuscritos do

século x e xi. Inclui um jogo de variantes e um jogo

versaletes, que têm aproximadamente um quinto

da altura das versais longas, usadas para letrinas

do documento.

Abundam as formas de letras ligadas e

sobrepostas, por exemplo, o NA.

O primeiro glifo tem o nome de «chrismon».

Este fonte foi processada a partir de scans da obra

«Actas do Concílio de Caledónia de 451»,

um fragmento de finais do século x, recolhido no

Arquivo Distrital de Viseu. Proveniência

desconhecida.

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AÁáâBbCcDEeÊÉÈFGHIíìJKkLlMm

NnOÓòPQR.STtUúVWXYdZÆçÇ

ÃÆBELOLIŒfidi���fl���abcdefghijklmnopqrstuvwxyz versaletes

Visigótica Isidoro: uma letra versal visigótica, vigente no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra.A fonte digital aqui mostrada está baseada nas ver-sais decorativas contidas no manuscrito «Santa Cruz 17», guardado na Biblioteca Municipal Pública do Porto. Trata-se de uma cópia das Ety-mologiæ de Isidoro de Sevilha, um manuscrito datável para o século xii. 0

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AÁBCDEÉFGHIJKLMNOÓPQRSTUVWXYZ,:&COCE&FIFOMEIMAMVNANEOCPPO

LILAFOFIVIVESOSTSATO�?��������������������������,ASTURIANA

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ABCDdEFGHItKLMNOPQRSTUXYZ:

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